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A FÍSICA E A IRRADIAÇÃO DE ALIMENTOS

Oliveira, Laura C. a [laura@curiango.ipen.br]


Medeiros, Ilca M.M.A. a [immamed@yahoo.com.br]
Zamboni, Cibele B. a [cbzamboni@curiango.ipen.br
Maschio, Marco A. a,b [lamaschio@ig.com.br]

a
Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - IPEN - CNEN - SP
b
Colégio Franciscano João XXIII - São Paulo - SP

Resumo

Este trabalho tem por objetivo descrever os processos físicos que envolvem a
irradiação de alimentos, as radiações utilizadas, os efeitos que causam nos alimentos
bem como vantagens e desvantagens com relação ao seu emprego.

Introdução

Com a descoberta da radioatividade em 1896, por Henri Becquerel, verificou-se


em laboratório que as radiações ionizantes afetavam os sistemas biológicos. Os
primeiros experimentos envolvendo a irradiação de alimentos foram realizados em
1899, no Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT–EUA), e alguns anos depois,
por volta de 1914 na Europa, inicialmente na Alemanha e França e somente na década
de sessenta na URSS e Israel. Esses estudos foram realizados com diversos alimentos e
mostraram que a irradiação possuía a capacidade de desinfestar frutos, vegetais e grãos,
atrasar sua decomposição, eliminar e/ou diminuir organismos patogênicos bem como
aumentar o tempo de prateleira de carnes, frutos do mar, frutas, sucos de frutas sem a
necessidade do uso de refrigeração.
No ano de 1963 a FDA (Food and Drug Administration) permitiu a irradiação de
trigo e derivados, assim como do bacon, entretanto, os resultados dessas pesquisas não
foram animadores, pois o processo de irradiação provocava alterações que
comprometiam a aceitação do produto pelos consumidores. Mesmo assim , as pesquisas
com irradiação de alimentos prosseguiram e, paralelamente, diversos órgãos ligados a
saúde, como a Organização Mundial de Saúde (OMS), em conjunto com Organização
das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e com a Agência
Internacional de Energia Atômica (IAEA), tem acompanhado os resultados desses
estudos através de uma série de reuniões com especialistas de diversos países do mundo.
Assim, em setembro de 1997, a conclusão final foi divulgada: a OMS aprova e
recomenda a irradiação de alimentos, em doses que não comprometam suas
características organolépticas, sem a necessidade de testes toxicológicos. Atualmente, a
irradiação de alimentos já foi aprovada pelas autoridades de saúde em mais de 40
países. Particularmente no Brasil a legislação sobre irradiação de alimentos existe desde
1985 (Portaria DINAL no. 9 do Ministério da Saúde, 08/03/1985) e apenas uma
empresa realiza esse tipo de serviço o Centro de Energia Nuclear para Agricultura
(CENA), órgão da Universidade de São Paulo. Já, o Instituto de Pesquisas Energéticas e
Nucleares (IPEN), órgão da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), além de
pesquisas na área, realiza trabalhos junto aos produtores, mostrando os benefícios da
irradiação de alimentos.
Inicialmente os alimentos irradiados foram servidos a voluntários, astronautas,
pacientes imunodeprimidos e militares de várias partes do mundo e hoje faz parte da
dieta de grande parte da população mundial. Entretanto, a opinião pública se tornou
mais crítica e passou a exigir uma série de explicações, tais como: Os alimentos
irradiados são radioativos? A irradiação produz toxinas nos alimentos ou acarreta a
perda de nutrientes? As doses de radiação empregadas são seguras para a saúde e para o
meio ambiente? Desde então, inúmeras pesquisas vem sendo realizadas, grande parte
delas realizadas nos EUA, com intenção de responder a estas questões. Com o intuito
de esclarecer estas questões este trabalho discute os mecanismos físicos envolvidos no
processo de irradiação.

Processos físicos envolvidos

As formas de radiação utilizadas no processo de irradiação de alimentos provocam


ionização, ou seja, criam cargas positivas ou negativas, portanto trata-se de um processo
que se passa em nível atômico. A formação dessas cargas resultam em efeitos químicos
e biológicos que impedem a divisão celular em bactérias, pois muitas vezes chegam
atingir seu material genético.
O alimento quando irradiado não entra em contato direto com a fonte de radiação.
Alem disso, as radiações utilizadas, a saber, Raios Gama, Raios X e Elétrons, não
possuem energia suficiente para provocar uma reação nuclear no alimento , e assim não
deixam nenhum resíduo radioativo após sua irradiação. Assim, os átomos que compõem
o alimento irradiado são momentaneamente transformado em íons positivos, pois

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perdem elétrons (íons negativo) deslocando-se para o meio, impulsionados pela energia
cinética adquirida no processo. Esta energia, por sua vez, é então dissipada através da
interação (colisões) com elétrons de outros átomos, encontrados em sua trajetória, ate
serem capturados pelas moléculas do meio.
A escolha do tipo de irradiação (Raios Gama, X ou Elétrons) depende do alimento.
Os irradiadores de feixe de elétrons podem ter vantagens econômicas sobre irradiadores
gama quando a demanda de produtos é grande e o tamanho ou espessura do produto a
ser tratado é pequena, como é o caso de grãos. Já, os irradiadores gama são preferíveis
quando o produto a ser irradiado possui dimensões maiores, tipo engradados, latas, etc,
visto que os raios gama possuem um poder maior de penetração comparativamente aos
elétrons.

Efeitos sobre a constituição dos alimentos


A irradiação de alimentos pode induzir a formação de algumas substâncias
chamadas de produtos radiolíticos. Estas substâncias não são radioativas e nem
exclusivas dos alimentos irradiados sendo que muitas delas são encontradas
naturalmente nos alimentos ou produzidas durante o processo de aquecimento (glicose,
ácido fórmico, dióxido de carbono). A água, presente em quase todos os alimentos,
quando irradiada sofre radiólise (quebra da molécula de água pela radiação) que
resulta em alguns produtos primários como: OH- (radical hidroxila), e-aq (elétron
aquoso), H (átomo de hidrogênio), H2 ( hidrogênio), H2 O2 (peróxido de hidrogênio),
H3 O+(próton hidratado), levando à sua ionização e consequentemente seu rearranjo
eletrônico, o que pode ocasionar a produção de radicais livres. Estes, por serem
altamente reativos, interagem quimicamente entre si ou com moléculas próximas e,
como conseqüência, novas moléculas podem ser danificadas passando a disputar
elétrons com o meio. Portanto, os alimentos sólidos, por possuírem menor quantidade
de água, são favorecidos com a irradiação.

Quais são as doses seguras para a saúde


De acordo com a OMS, alimentos irradiados com doses de até 10KGy não
necessitam de avaliação toxicológica ou nutricional.
A dose de radiação é medida em Grays (G) ou quilograys (kGy), onde 1 Gray =
0,001 kGy = 1 Joule de energia absorvida por quilograma de alimento irradiado.
Usualmente, para retardar o amadurecimento de frutas, por exemplo, não é necessário

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mais do que 1 kGy. Já, para inibir o brotamento de raízes e tubérculos (batata, cebola,
alho, etc.) a dose necessária varia de 0,05 a 0,15 kGy e para prevenir que os grãos
sejam infestados por insetos, 0,1 a 2kGy são suficientes.

Vantagens e desvantagens da Irradiação de Alimentos

Estudos dos possíveis problemas dos efeitos da radiação gama comprovaram que
não há efeitos negativos em relação a toxicologia, perda nutricional e geração de
microorganismos. Do ponto de vista nutricional, as perdas de glicídios e proteínas são
pequenas. Com relação a alimentos com grande quantidade de gorduras, que
rancificam com facilidade por oxidação, quando submetidos a irradiações apresentam
melhorias nas suas propriedades organolépticas. Assim, a irradiação de alimentos possui
uma série de vantagens sobre os métodos tradicionais. Trata-se de um processo a frio
que pode descontaminar alimentos congelados sem causar efeitos indesejáveis em suas
propriedades organolépticas e físico-químicas; facilita a distribuição e venda de frutas
frescas, vegetais e carnes pelo aumento da vida útil desses produtos, sem alterar a sua
qualidade; substitui os tratamentos químicos que deixam resíduos nos alimentos e
particularmente no caso de produtos avícolas, a irradiação oferece um método de custo
efetivo para garantir ao consumidor proteção contra doenças transmitidas por alimentos,
principalmente salmonelose e campilobacteriose; além disso atinge organismos (ovos e
larvas de insetos, vermes, etc.) dentro dos alimentos.
Com relação as desvantagens, certos alimentos podem sofrer modificações no
odor, cor, sabor, textura e, em alguns casos, pode acarretar na diminuição, embora
muito pequena, de algumas vitaminas e produção de produtos radiolíticos, alguns dos
quais podem ser tóxicos.

Referências
DOVLE, M. Ellin. Food Irradiation. Food Research Institute, University of Wisconsin
– Madison, 1999. < http://www.wisc.edu/fri/briefs/foodirrd.htm >. Acesso em: 14 de
abril de 2004.

INTERAÇÃO BIOLÓGICA DA RADIAÇÃO IONIZANTE – Site na Internet


<http://rt.no.sapo.pt/RB/intbio.html> Acesso em: 23de abril de 2004.

MCVITAMINS. Irradiated Foods, 2000 - 2004. Site na internet


<http://www.mcvitamins.com/irradiated_foods.htm>.Acessado em: 15 de abril de 2004.

MUÑOZ, Ricardo A. B.; SÁNCHEZ, Mario M. V.; UZCÁTEGUI, Edgar G. A.;


VACA, Carlos E. F.. Preservación de Alimentos por Irradiación. 363 p. Escuela
Politecnica Nacional, Quito, 1985.

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