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05/02/2016 A HEGEMONIA JESUÍTICA (1549­1759). Colônia ­ Período Jesuítico (1500­1759). Períodos.

 História, Sociedade e Educação no Brasil ­ HISTED…

A HEGEMONIA JESUÍTICA (1549­1759)
 
                            Sônia Maria Fonseca
 
É  consensual  afirmar  que,  nos  trinta  primeiros  anos  da  colonização  do  Brasil,  Portugal
dedicou­se  exclusivamente  à  exploração  das  riquezas  sem  efetivo  projeto  de  povoamento.  Os
índios que ocupavam o território brasileiro, nas palavras de Pero Magalhães Gandavo,
não tinham as letras ‘F, nem L, nem R’, não possuindo ‘Fé, nem Lei, nem
Rei’  e  vivendo  ‘desordenadamente’.  Essa  suposição  de  uma  ausência
lingüística  e  de  ‘ordem’  revela,  um  tanto  avant  la  lettre,  o  ideal  de
colonização trazido pelas autoridades portuguesas: superar a ‘desordem’,
fazendo obedecer a um Rei, difundindo uma Fé e fixando uma Lei. [...] (
Apud VILLALTA, 2002, p.332).
 
“Língua, instrução e livros, nesse quadro, em termos das expectativas metropolitanas, deveriam
desenvolver­se sob a égide de um Rei, uma Fé e uma Lei”. (VILLALTA, IDEM).
A  vinda  dos  jesuítas,  em  1549,  proporcionava  assim  a  expansão  da  Fé  e  do  Império,
reunindo  mercadores  e  evangelizadores  sob  a  mesma  empresa,  tal  como  Antonio  Vieira  irá  se
referir posteriormente na obra História do Futuro.  Com  sua  política  de  instrução  –  uma  escola,
uma  igreja  –,  edificaram  templos  e  colégios  nas  mais  diversas  regiões  da  colônia,  constituindo
um sistema de educação e expandindo sua pedagogia através do uso do teatro, da música e das
danças,  “multiplicando  seus  recursos  para  atingir  à  inteligência  das  crianças  e  encontrar­lhes  o
caminho do coração”. (AZEVEDO, 1943, p.290).
Os  jesuítas  tiveram  grande  importância  no  campo  das  artes.  A  propagação  de  um  estilo
jesuítico  nas  artes  foi  tamanha,  que  pode  ser  dedicado  um  capítulo  inteiro  aos  jesuítas  na
História  da  Arte  no  Brasil.      Tal  importância  pode  ser  constatada  na  Carta  que  comunicava  a
supressão  da  Companhia,  e  determinava  a  abolição  de  “cada  um  dos  seos  officios,  Residências
(...) Costumes e Estilos”, quando das reformas pombalinas que culminaram com a sua expulsão
das terras brasileiras.
Com o aprendizado das artes e dos mais diferentes ofícios adquiriram auto­suficiência na
fatura  dos  mais  diversos  objetos  de  uso  pessoal  e  para  a  lida  cotidiana,  de  pares  de  sapatos  a
embarcações para transportar os padres e irmãos entre as possessões no Amazonas e ao longo
do  litoral  da  Bahia,  Pernambuco,  São  Paulo,  Rio  de  Janeiro  e  Espírito  Santo.  A  produção  das
reduções jesuíticas, por exemplo, tinha caráter notável.  Na região dos Sete Povos das Missões,
além  das  atividades  de  agricultura  e  pecuária,  com  produção  de  excedentes,  foram  construídas
oficinas  para  fatura  de  instrumentos  musicais,  assim  como  para  imaginária  e  adornos  usados
nos  templos.  Os  indígenas  sob  a  orientação  de  mestres  jesuítas  executavam  a  talha  e  a
escultura  em  madeira  e  pedra,  empregando  em  profusão  elementos  da  flora  e  fauna
circunvizinhas aos aldeamentos.
A  adaptação  aos  costumes  locais  em  respeito  à  diversidade  das  regiões  sob  domínio
jesuítico,  para  a  eficácia  da  catequese,  era  orientação  que  constava  nas  Constituições  da
Companhia  de  Jesus,  apresentada  por  Inácio  de  Loyola,  em  1550,  aos  padres  e  irmãos  que
estavam em Roma.
De  fato,  os  jesuítas  empreenderam  no  Brasil  uma  significativa  obra
missionária  e  evangelizadora,  especialmente  fazendo  uso  de  novas
metodologias,  das  quais  a  educação  escolar  foi  uma  das  mais  poderosas
e  eficazes.  Em  matéria  de  educação  escolar,  os  jesuítas  souberam
construir a sua hegemonia. Não apenas organizaram uma ampla ‘rede’ de
escolas  elementares  e  colégios,  como  o  fizeram  de  modo  muito
organizado  e  contando  com  um  projeto  pedagógico  uniforme  e  bem
planejado,  sendo  o  Ratio  Studiorum  a  sua  expressão  máxima.
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(SANGENIS, 2004, p.93)
 
O Ratio Studiorum ou Plano de Estudos – o método pedagógico dos jesuítas, publicado em
1599  foi  sistematizado  a  partir  das  experiências  pedagógicas,  que  tiveram  início  no  Colégio  de
Messina, primeiro colégio aberto na Sicília, em 1548. A par dessa primeira experiência na Itália
a disputa entre o modus italicus e o modus parisiensis foi vencida pelo último, com o predomínio
do modelo da Universidade de Paris, por onde passaram muito dos jesuítas, inclusive o próprio
Loyola. 
Este  código  de  ensino  ou  estatuto  pedagógico  era  composto  de  um  conjunto  de  regras,
que envolvia desde a organização escolar e orientações pedagógicas até a observância estrita da
doutrina católica. O método de estudos contido no Ratio compreendia o trinômio estudar, repetir
e  disputar,  prescrito  nas  regras  do  Reitor  do  Colégio,  e  como  exercícios  escolares  havia  a
preleção,  lição  de  cor,  composição  e  desafio,  práticas  pedagógicas  essas  que  remetem
diretamente  à  escolástica  medieval,  configurando­se  como  Pedagogia  Tradicional,  que  na  sua
vertente  religiosa,  tornava  a  educação  sinônima  de  catequese  e  evangelização.  A  educação
almejada  pelo  Ratio  tinha  como  meta  a  formação  do  homem  perfeito,  do  bom  cristão  e  era
centrada em um currículo de educação literária e humanista voltada para a elite colonial.
 
 
A  concepção  pedagógica  tradicional  se  caracteriza  por  uma  visão
essencialista  de  homem,  isto  é,  o  homem  é  concebido  como  constituído
por  uma  essência  humana  e  imutável.  À  educação  cumpre  moldar  a
existência particular e real de cada educando à essência universal e ideal
que  o  define  enquanto  ser  humano.  Para  a  vertente  religiosa,  tendo  sido
o homem feito por Deus à sua imagem e semelhança, a essência humana
é considerada, pois, criação divina. Em conseqüência, o homem deve se 
empenhar para fazer por merecer a dádiva sobrenatural.
A  expressão  mais  acabada  dessa  vertente  é  dada  pela  corrente  do
tomismo, que consiste numa articulação entre a filosofia de Aristóteles e
a  tradição  cristã;  tal  trabalho  de  sistematização  foi  levado  a  cabo  pelo
filósofo  e  teólogo  medieval  Tomás  de  Aquino  [...]  E  é  justamente
tomismo  que  está  na  base  do  Ratio  Sudiorum  [...]  (  SAVIANI,  2004,  p.
127)
 
Ainda que não tenham sido os jesuítas os primeiros a pisar a Terra de Santa Cruz – vale
lembrar  que  junto  com  Pedro  Álvares  Cabral  vieram  os  franciscanos.  Essa  primazia  dos
franciscanos, no entanto, não legou à posteridade o mesmo alcance que tiveram os jesuítas, que
durante duzentos e dez anos, a partir da chegada em 1549 até a expulsão em 1759, detiveram o
monopólio da educação. É certo que esse monopólio não explica isoladamente a sanha despótica
do  Marquês  de  Pombal  contra  a  Companhia  de  Jesus.  Tinham  os  jesuítas  domínio  sobre  as
fronteiras  ao  norte  do  Rio  Amazonas,  e  as  suas  missões  naquela  região  praticavam  o  comércio
das  drogas  do  sertão,  sendo  isentas  de  contribuição  à  coroa  portuguesa,  e  ao  Sul  dos  rios
Uruguai  e  Paraguai,  onde  havia  resistência  ao  uso  dos  indígenas  para  povoar  e  defender  o
interior  e  regiões  fronteiriças.  “A  Companhia  de  Jesus  foi  uma  das  vítimas  mais  evidentes  dos
acontecimentos  postos  em  marcha  pelas  pretensões  imperiais  do  governo  de  Pombal  e  pelas
tentativas de nacionalizar setores do sistema comercial luso­brasileiro.”(MAXWELL, 1995, p.42)

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Em Portugal, cabia aos jesuítas o direito exclusivo de ensinar Latim e Filosofia no Colégio
de  Artes,  curso  preparatório  obrigatório  para  ingresso  nas  faculdades  da  Universidade  de
Coimbra.  A  Universidade  de  Évora  era  também  uma  instituição  jesuítica.  No  Brasil  os  colégios
jesuíticos  ofereciam  quase  com  exclusividade  a  educação  secundária.  Nos  domínios  de  Portugal
na  Ásia  havia  sido  a  força  dominante  desde  os  primórdios  da  expansão  portuguesa  no  Oriente,
sendo que alguns dos jesuítas chegaram a ser mortos no cumprimento da ação evangelizadora.
A  Companhia  de  Jesus  estava  presente  desse  modo  como  fator  de  empecilho  às  reformas
econômicas  e  educacionais  de  Pombal,  o  que  explica,  à  primeira  vista,  a  sua  expulsão  e
proscrição. Quando da supressão da ordem, em 1773, contavam os inacianos com 578 colégios e
150 seminários em todo o mundo.
  
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 
AZEVEDO, Fernando de. O Sentido da Educação Colonial. In: A Cultura Brasileira. Rio de
Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1943. p.289­320.
 
FRANCA,  Leonel.  O  Método  Pedagógico  dos  Jesuítas:  o  “Ratio  Studiorum”.  Rio  de  Janeiro:
Livraria Agir Editora, 1952.
 
_____. História  da  Companhia  de  Jesus.  São  Paulo;  Rio  de  Janeiro:  CJS/  Petrobrás,  2005.  4
vols.
 
MATTOS, Luiz Alves. Primórdios  da  Educação  no  Brasil: O  Período  Heróico  (1549­1570).  Rio
de Janeiro: Gráfica Editora Aurora, 1958.
 
MAXWELL,  Kenneth.  A  Devassa  da  Devassa  ­  a  Inconfidência  Mineira:  Brasil  e  Portugal­
1750­1808. 3 ed. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1995.
 
__________________.  Marques  de  Pombal:  paradoxo  do  iluminismo.  Rio  de  Janeiro;  Editora
Paz e Terra, 1996.
 
NEVES,  Luiz  Felipe  Baeta.  O  Combate  dos  Soldados  de  Cristo  na  Terra  dos
Papagaios:Colonialismo e Repressão Cultural. Rio de Janeiro: Forense­Universitária,1978.
 
PAIVA,  José  Maria.  Colonização  e  Catequese.  São  Paulo:  Cortez;  Campinas:  Autores
Associados, 1982.
 
SANGENIS,  Luiz  Fernando  Conde.  Franciscanos  na  Educação  Brasileira.  In:  STEPHANOU,  Maria;
BASTOS,  Maria  Helena  Câmara.  Histórias  e  Memórias  da  Educação  no  Brasil  –  Vol.  I  –
Séculos XVI­XVIII. Petrópolis: Editora Vozes, 2004. p.93­107.
 
SAVIANI,  Dermeval.  Educação  e  Colonização:  as  idéias  pedagógicas  no  Brasil.  In:  STEPHANOU,
Maria; BASTOS, Maria Helena Câmara. Histórias e Memórias da Educação no Brasil – Vol. I
– Séculos XVI­XVIII. Petrópolis: Editora Vozes, 2004.p.121­130.
 
VILLALTA, Luiz Carlos. O Que se Fala e o Que se Lê: Língua, Instrução e Leitura. In: História da
Vida Privada No Brasil I: Cotidiano e Vida Privada na América Portuguesa. São Paulo: Companhia
das Letras, 2002. p.331­445.

(Início) Mestre em História da Arte e da Cultura pela Universidade Estadual de Campinas, no ano de 2001 e doutoranda 
em Educação na área “História, Filosofia e Educação”, pela Universidade Estadual de Campinas.

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