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AFOGAMENTOS - Preparar para Prevenir - ESPECIAL / BUSCA E SALVAMENTO


AQUÁTICO

Article · March 2013

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David Szpilman
Brazilian Lifesaving Society - Sobrasa
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ESPECIAL / BUSCA E SALVAMENTO AQUÁTICO

PREPARAR
PARA PREVENIR

ZPara reduzir números alarmantes


de afogamentos no Brasil,
prevenção é palavra de ordem
ARQUIVO ASCOM CBMPA

22 Emergência MARÇO / 2013


U m acampamento em família à beira de
um rio. Almoço bem servido, conversa,
diversão, uma bebida para descontrair.
E, por que não entrar na água para se refrescar,
cias na água, é importante diferenciar, ainda,
ambas nomenclaturas que recebe: salva-vidas
e guarda-vidas – esta segunda, a mais utilizada
atualmente. Em entrevista concedida à Revista
já que é verão? Todos adotam a ideia e aproveitam Emergência, em novembro de 2012, Szpil-
a ocasião. Brincadeiras e alegria fazem parte do man dissertou sobre este tema. “Antigamente,
cenário, até que algo não sai conforme o esperado. usávamos salva-vidas. No entanto, isto denota
Um dos jovens presentes no passeio se distancia uma atitude reativa, ou seja, ele parte para sal-
um pouco do grande grupo e percebe que já não var. A nomenclatura mudou para guarda-vi-
toca o fundo do rio com os pés. Inicia aí uma das, e não foi aqui no Brasil, foi lá fora, pois
cena angustiante de afogamento. O irmão, toma- agora o profissional não salva apenas, mas
do pelo desespero de tentar ajudar, chega próximo guarda a vida. Então, ele tem uma atitude
da vítima e acaba vivenciando a mesma situação. proativa e reativa. A palavra guarda-vidas de-
Ao ver os dois filhos à beira da morte, o pai, exí- nota uma amplitude maior de responsabilidade
mio nadador e confiante na sua experiência, joga- e de trabalho”, registrou. A palavra salva-vidas,
se na direção dos jovens. Os três, movidos pelo porém, ainda é utilizada em alguns estados do
instinto de sobrevivência, tentam agarrar uns nos Brasil, como Rio Grande do Sul e Bahia.
outros e acabam morrendo, juntos.
A cena descrita acima é fictícia, porém, muito NÚMEROS
comum. Mais de 70% dos afogamentos com O artigo “Afogamento – Perfil epidemiológi-
morte registrados no Brasil acontecem em água co no Brasil ano de 2010” (http://www.sobra-
doce, longe dos serviços especializados que são sa.org/biblioteca/obitos_2010/Perfil_afoga-
os responsáveis pelo salvamento aquático e busca. mento_Brasil_2012.pdf), publicado por Szpil-
man, em 2012, informa que, de acordo com a
DIFERENÇAS OMS (Organização Mundial de Saúde), 0,7%
Ao citarmos este tipo de serviço, é importante de todos os óbitos no mundo ocorrem por
esclarecer as diferenças entre o resgate de vítima afogamento não intencional, totalizando mais
submersa e a busca de cadáver. David Szpilman, de 500 mil óbitos anuais passíveis de preven-
diretor médico e fundador da Sobrasa (Socieda- ção (8,5 óbitos/100 mil habitantes). No mes-
de Brasileira de Salvamento Aquático), explica – mo contexto, mais de 10 milhões de crianças
no Manual de Salvamento Aquático da entidade entre um e 14 anos são internadas por esta
– que a linha que separa uma situação da outra se causa (uma a cada 35 hospitalizações leva a
baseia no tempo máximo de parada cardiorres- óbito). Estes números, porém, não são exatos,
piratória da vítima. O especialista, que é referência uma vez que deve-se considerar casos não
internacional em salvamento aquático, aponta que notificados e sem confirmação de óbito.
o tempo limite de submersão com possibilidade No Brasil, em 2010, 6.590 pessoas morreram
de ressuscitação é de uma hora – registrado no afogadas, sendo que esta foi a segunda causa
relógio, já que em situações de forte estresse e- geral de óbitos na faixa entre cinco e nove anos,
mocional esta contagem pode ser estimada de for- terceira entre um e 19 anos e quinta entre 20 e
ma errada –, sendo este parâmetro adotado úni- 29 anos. Trata-se de uma constatação que não
ca e exclusivamente para casos de afogamento é motivo de orgulho, já que somos o país que
ou hipotermia, que possuem tolerância muito ocupa a terceira posição no ranking de mortes
maior quanto à falta de oxigênio. Após uma hora por afogamento. Nesta perspectiva, calcula-se
de submersão, a vítima já é considerada corpo que quatro crianças com idade até 14 anos mor-
ou cadáver. Neste caso, trata-se de busca ao cor- rem afogadas por dia no Brasil. Comparado
po, que não é tratada como urgência e o efetivo aos acidentes de trânsito, o risco de morte por
de guarda-vidas é desativado, permanecendo um exposição ao afogamento é 200 vezes maior.
pequeno grupo no local para continuação das Além da questão que concerne o óbito, a per-
buscas. Vale lembrar que, geralmente, este traba- da de vidas, esta estatística onera de forma con-
lho deve-se à evolução da vítima de submersão tundente os cofres públicos. Os custos dos afo-
não encontrada e que o guarda-vidas precisará gamentos na orla somam mais de 228 e 273
de maior apoio de equipamento e de uma equipe milhões de dólares no Brasil e nos EUA, res-
de mergulho, pois a situação requer uma técnica pectivamente. São números alarmantes para
mais apurada e aparelhagens que já se distanciam uma realidade cada vez mais presente. Porém,
da atividade fim deste profissional.
Citando o socorrista especializado em ocorrên- Reportagem de Sabrina Becker
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Emergência 23
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é possível eliminar em 100% este tipo
de ocorrência? Não. Mas, de acordo com
Szpilman, os números podem ser redu-
zidos drasticamente. “Afogamento não
é acidente, não acontece por acaso, tem
prevenção, e esta é a melhor forma de
tratamento. Ela pode reduzir, em média,
de 85% a 90% o número de afogamen-
tos”, aponta.

PREVENÇÃO
Este é um consenso entre especialistas
em resgate e salvamento aquático e so-
corristas que atendem este tipo de ocor-
rência: a prevenção é a única maneira
de reduzir os óbitos por afogamento.
“Nada substitui o trabalho do guarda-
vidas. Porém, é impossível que este pro-
fissional esteja em todos os lugares, por
isto, o trabalho de prevenção deve ser
muito forte”, destaca o presidente da So-
brasa, coronel RR Joel Prates Pedroso.
Ele destaca que o trabalho da entidade
tem seus pilares fixados na prevenção,
com o objetivo de diminuir a mortalida-
de por afogamento, por meio da consci-
entização de toda população em diferen-
tes faixas etárias. “Para isto, contamos
com dirigentes da diretoria em 22 esta-
dos”, diz. Para chegar a este objetivo, a
Sobrasa realiza inúmeras atividades du-
rante todo o ano, eventos esportivos, re-
creativos, culturais e educacionais, por
intermédio dos serviços de salvamento
estaduais ou regionais, por todo Brasil.
“Cada estado possui uma realidade. Al-
guns têm praia durante o ano inteiro. Em
outros, a época de praia é sazonal. Ou-
tros não contam com litoral, mas pos-
suem praias de água doce, piscinas etc.
Sendo assim, os estados se responsabili-
zam pelo serviço de salvamento e é com
eles que atuamos para implementar, cada
vez mais, ações para a prevenção”, deta-
lha Prates.

TÉCNICAS
As técnicas para busca e resgate aquá-
tico variam de acordo com a situação e
com o local onde ocorrem. Entretanto,
Szpilman enfatiza a preocupação em
unificar os treinamentos a fim de for-
necer todo o conhecimento necessário
aos guarda-vidas, onde quer que atuem.
“Estamos voltados para a prevenção e
para unir todos os profissionais no senti-
do de termos uma grade curricular úni-
ca, ou seja, para que o guarda-vidas que
seja formado no Rio de Janeiro seja pare-
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cido com o do Rio Grande do Norte e

DAVID SZPILMAN
com o da Bahia. Então, temos uma gra-
de curricular em que o guarda-vidas de
piscina tem que fazer 52 horas/aula na
sua formação; o guarda-vidas de rio, 90
horas/aula e o guarda-vidas de praia, 110
horas/aula. Existe uma diferença que é
justamente para o guarda-vidas de pisci-
nas, pois sobre o mar, corrente, oceano-
grafia, tempo, estes temas não precisam
ser ensinados”, reitera Szpilman.
De acordo com o “Manual de Salva-
mento Aquático da Sociedade Brasilei-
Sobrasa pretende unificar
ra de Salvamento Aquático – Sobrasa”, os treinamentos para
uma vez que resgate de vítima submersa guarda-vidas
e busca de cadáver são duas situações
diferentes, as técnicas para quem atua cientes de varredura que variam em fun- por quadro, sem deixar nenhum ponto
nestas ocorrências também se diferem. ção dos recursos disponíveis e das con- de fora. Outra opção é a varredura cir-
A publicação aponta três ocasiões e as dições locais: visibilidade da água, cor- cular, a partir de um ponto fixo, poden-
técnicas usadas no resgate de vítimas rente marinha, número de socorristas ou do ser realizada por uma ou duas pes-
submersas (veja Box Técnicas para Res- mergulhadores disponíveis, tipo de fun- soas. Por último, a varredura pendular,
gate de Vítimas Submersas). do, tamanho e formato da área de pes- que é feita em locais de forte corrente-
O manual informa, ainda, que a difi- quisa, etc. Entre estes, está a técnica de za. Para qualquer destas técnicas, um kit
culdade da busca de cadáver está em 90°, a mais indicada para um guarda-vi- básico é necessário: nadadeiras, máscara,
estabelecer um método que assegure que das, porém, depende da visibilidade da snorkel, corda, uma boia de marcação e
todos os pontos próximos à área sejam água. um peso.
observados ou varridos. Um único pon- Existe também a varredura linear, fei- Com quase 20 anos de experiência em
to sequer que fique fora pode, teorica- ta de maneira quadricular, na qual o treinamento de resgate, o especialista em
mente, ser o lugar onde o corpo será en- guarda-vidas conta com o auxílio de um Fisiologia Humana e do Esforço, Ronal-
contrado. Existem vários métodos efi- cabo de cerca de dois metros, quadro do Furlan Tafuri, explica pontos impor-

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ESPECIAL / BUSCA E SALVAMENTO AQUÁTICO
tantes. “Para ações no mar existem equi- das ao redor de muitas piscinas em clu- mo um todo, deveria começar nas esco-
pamentos diversos, como o cesto para bes para fazer o lançamento às vítimas las. “Com aulas de segurança, aciona-
resgate com helicóptero, nadadeiras, RT que estejam correndo risco de afoga- mentos dos sistemas locais de emergên-
(Rescue Tube), no Brasil conhecido como mento. “Este lançamento deve ser feito cia e primeiros socorros, com palestras
salsichão de resgate, prancha de resga- com a boia amarrada a uma corda, pas- e cursos nas comunidades, núcleos de
te, além de equipamentos como Jet ski sando para a vítima primeiramente agar- bairros ou subprefeituras e manter e am-
e outras embarcações. Já nas piscinas, rar a corda e depois a boia”, avisa. “O pliar os treinamentos empresariais a to-
os equipamentos básicos e necessários uso do RT e do throw bag com mano- dos, não somente à brigada. Desta for-
são o RT e o throw bag, que no Brasil é bras treinadas em exaustão em piscinas ma, cobriríamos o município todo. Den-
conhecido como cabo da vida ou cabo e mar levam a um resgate seguro para tro de cada casa teria pelo menos uma
de lançamento e também o mais indica- ambas as partes, sem muito desgaste do pessoa com conhecimento de emergên-
do em água doce em geral”, informa. profissional e sem trauma ou, pelo me- cia e noções de segurança, seja o filho
Tafuri alerta, ainda, para o uso de boias nos, minimizando possíveis traumas pela escola, o pai ou a mãe pela empresa,
circulares, que são colocadas pendura- para as vítimas”, conclui Tafuri. os cuidadores, parentes ou moradores
vizinhos pelos núcleos de bairros. Isto

Como prevenir
não é novidade, há anos é realizado em
países desenvolvidos”, completa, afir-
mando ainda que a responsabilidade
também é dos administradores munici-
ZAções educativas e de conscientização são as principais pais. “Se somarmos a estas ações boa
ferramentas para reduzir números alarmantes de afogamentos vontade dos poderes públicos em levan-
tarem e cruzarem dados de acidentes em
Para prevenir o afogamento, um dos impactando a população, como pela represas, lagoas, bairros, agressões físi-
pontos iniciais é trabalhar diretamente mídia, mostrando e alertando que acon- cas, idade das vítimas etc, teríamos como
com a população. Por isto, ações que for- tece com qualquer um. Assim, ela se mapear o município e, a curto e médio
neçam informação, que esclareçam e, sensibiliza desta possibilidade e procu- prazo, inserir programas de segurança
principalmente, alertem para a iminência ra conhecer melhor a prevenção”, de- na sociedade de acordo com a realidade
do perigo de afogamentos, são essenci- fende David Szpilman, diretor médico local”, diz o fisiologista.
ais. “O afogamento envolve, principal- e fundador da Sobrasa. Neste sentido, a Sobrasa atua enfatica-
mente, o comportamento do banhista. O especialista em Fisiologia Humana mente para que o conhecimento se mul-
Em tese, todo espelho d’água é perigoso. e do Esforço, Ronaldo Furlan Tafuri, di- tiplique em todo o território nacional por
Em São Paulo, temos afogamentos em vide a mesma opinião. “Este é o grande meio de cursos, ações e projetos realiza-
baldes, vasos sanitários, entre outros. Os problema, digo sempre: o Brasil não tem dos periodicamente. Em cada encontro
países que conseguiram controlar este cultura nem educação em segurança”, efetivado, são entregues panfletos infor-
tipo de acidente, o fizeram principal- declara. Ele defende que a prevenção mativos sobre prevenção em todos os
mente por meio da educação. Campa- não somente de afogamentos, mas co- cenários como lago, rio, piscina, mar, em
nhas educativas são fundamentais. O
banhista, seja de praias, represas, rios ou
piscinas, deve ser esclarecido sobre co- CUIDADOS QUE PODEM AUXILIAR NA
mo deve se comportar nestes locais”, é PREVENÇÃO DE AFOGAMENTOS
o que afirma o subcomandante do GBMar
(Grupamento de Bombeiros Marítimo de 1 Contratar um guarda-vidas para festas em
6 Desligar o filtro em caso de uso da piscina,
São Paulo), major PM Carlos Eduardo residências com piscina; pois diminui o risco de sucção;
Smicelato. Segundo ele, para evitar es- Isolar a piscina, colocando grades ao redor Não permitir mergulhos de cabeça em locais
tas ocorrências, alguns itens são funda- 2 com, no mínimo, 1,5 metro de altura. Esta
7 de profundidade menor que 1,8 m. Fixar aviso;
mentais, como conhecer o local, saber iniciativa pode reduzir os afogamentos em
onde nadar, onde não entrar, evitar bebi- 50 a 70%; 8 Não praticar hiperventilação para aumentar
o fôlego sem supervisão confiável;
das alcoólicas antes do banho de mar, 3 Ensinar adultos e, principalmente, crianças
ou rio, etc. “E, principalmente, só entrar a nadar. Apesar de parecer um pouco contro- 9 Evitar a ingestão de bebidas alcoólicas e
alimentos pesados antes do banho de piscina;
em locais protegidos por guarda-vidas. verso para alguns, o ideal seria a partir de
Este profissional é a pessoa habilitada dois anos. Porém, existe natação para bebês
10 Sair imediatamente da piscina se houver
para informar sobre a segurança dos lo- com seis meses, que ensina a flutuação etc; relâmpagos;
cais de banho, bem como para fazer o 4 Incentivar o uso de coletes salva-vidas para
11 Não permitir brincadeiras violentas que au-
salvamento quando necessário”, comple- crianças menores de cinco anos ou pessoas mentem o risco de trauma craniano e perda
ta. “Precisamos impactar a população, sem conhecimento de natação. Não permitir súbita da consciência;
fazê-la acreditar que o afogamento é o uso de objetos de flutuação, como boias
uma possibilidade que atinge a todos.
de braço, pranchas, pneus, bolas e outros; 12 Evitar a hidrocussão ou choque térmico. Antes
de entrar na água, molhar a face e a nuca.
Eu acho que este é o ponto X da ques- 5 Evitar deixar brinquedos próximos à piscina,
tão. Só conseguiremos atuar realmente isto atrai as crianças; Fontes: Sobrasa e Waltecir Lopes

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ESPECIAL / BUSCA E SALVAMENTO AQUÁTICO
casa, além da reação de como tratar o demos citar a Lei Ordinária nº 8802, de
afogado. Também oferece um adesivo 20 de janeiro de 2011, no município de
de geladeira que tem a função de fazer a Belém, no Pará.
família absorver informação e não dei- Entretanto, não existe legislação fede-
xar a criança se afogar na piscina de casa. ral sobre o tema, o que gera um ciclo
Também disponibiliza em seu site e per- que apenas demanda mais regulamenta-
fis em redes sociais, vídeos de prevenção ção. “Esta é uma área pouco explorada
de afogamento em praia e água doce. no Brasil. Como não há lei, pelo menos
“Temos o Campeonato Brasileiro de Sal- na maioria dos estados, que obrigue a
vamento Aquático e Sul-Americano, em ter um guarda-vidas nas piscinas, isto fi-
que reunimos, pelo menos, 16 estados, ca por conta de quem? De quem quiser
mais os países como Portugal, Espanha, botar. Então, normalmente, hotéis cinco
Chile, Argentina, Uruguai e Venezuela. estrelas colocam porque isto é uma exi-
Temos um curso de emergências aquáti- gência de padrão de qualidade interna-
cas básico e um avançado. Básico para cional, mas a formação dele não segue
leigos que querem fazer um curso me- nenhum parâmetro como o guarda-vi-
nor, de cinco horas, gratuito, para ensi- das de praia e isto dá uma qualidade mui-
nar como salvar e como não se afogar. to desigual, infelizmente”, aponta Szpil-
Além disto, oferecemos outro curso que man. Ele exemplifica o caso do Rio de
é o de emergências aquáticas avançado, Gibi da Sobrasa
Janeiro, onde existe legislação que obriga
para profissionais de saúde, em que o a presença de guarda-vidas nas piscinas,
programa é semelhante ao básico, só que em primeiro lugar, é necessário que um entretanto o preparo destes profissio-
conversamos um pouco sobre atendi- adulto supervisione a criança 100% do nais e as condições de trabalho não a-
mento avançado, incluindo como entu- tempo, já que as estatísticas mostram que companham esta norma. Neste caso, se-
bar, como fazer a ressuscitação, quais 89% dos afogamentos ocorrem por fal- gundo o especialista, a qualificação é
são as medidas, ou seja, todo o aparato ta de supervisão, principalmente na hora muito difícil e a quantidade de piscinas,
necessário para fazer o resgate avançado do almoço ou logo após. extensa, demandando a formação de um
deste afogado. Sendo um curso gratuito número grande de socorristas. “Outra
também”, afirma Szpilman. REGULAMENTAÇÃO dificuldade é o salário que é muito bai-
Os corpos de bombeiros também ofe- A questão da regulamentação para o xo. Diante disto, o nível e a quantidade
recem palestras de conscientização e serviço de guarda-vidas em piscinas é dos interessados em seguir esta profis-
realizam projetos sociais, como o “Bom- um tema controverso. No Brasil, atual- são é muito pequena. No Rio de Janeiro
beiro Mirim”, que busca apresentar as mente, existem legislações locais, que não acontece tanto, mas no resto do Bra-
crianças ao universo dos guarda-vidas, versam sobre a obrigatoriedade da pre- sil, onde não tem legislação, quem cui-
mostrando como é feito seu trabalho, sença deste profissional em piscinas de da da piscina é quem limpa, quem arru-
além de passar informações importantes uso público (hotel, academia, etc). Em ma o vestiário, etc. Às vezes, até tem uma
sobre prevenção de afogamentos. Wal- âmbito estadual, o Rio de Janeiro tem o técnica porque procurou, às vezes não,
tecir Lopes, conselheiro da Sobrasa, tra- Decreto nº 4.447/81, de 14 de agosto mas não existe um padrão de qualifica-
balha com treinamentos nesta área há de 1981, Santa Catarina conta com a Lei ção profissional que é fundamental.
19 anos e afirma: “as mortes por afoga- nº 11.339, de 8 de janeiro de 2000, e tam- Assim, a pessoa atende o afogamento
mento podem ser prevenidas com ações bém existe a Lei nº 2.846, de 27 de maio porque está presente, mas não está pre-
educativas e corretivas”. Ele aponta que, de 1981, em São Paulo. Além disto, po- parada, não sabe muito bem o que fazer,
então imagine a responsabilidade dela”,
FOX - TREINAMENTO DE RESGATE INTERNACIONAL

lamenta.
Pensando nestes e em outros proble-
mas verificados durante sua atuação nos
estados, a Sobrasa propôs, em 2003, um
projeto de lei para reconhecimento da
profissão de guarda-vidas em geral. De-
pois de longa tramitação na Câmara, o
PLC 66/2011 aguarda parecer da Co-
missão de Assuntos Sociais do Senado
Federal. “A nossa proposta de aprovação
desta lei federal envolve o que é preciso
para ser um guarda-vidas, quanto tempo
de treinamento é preciso, quem é o res-
Reconhecer e regulamentar a ponsável por este treinamento e quem
profissão de guarda-vidas aumentará deve organizar este treinamento. Isto é
a segurança em áreas espelhadas
fundamental”, comenta Szpilman. Quem
28 Emergência MARÇO / 2013
acompanha de perto o andamento do que abranja todo o território nacional e ponsabilidade direta dos SISSAR. No
PL é o tenente-coronel Márcio Morato, que aponte especificações para a atuação caso de emergências com navios, embar-
do Corpo de Bombeiros do Distrito Fe- destes profissionais em diferentes locais, cações, etc, a responsabilidade é do Ser-
deral. “Hoje, este serviço é desempenha- carga horária obrigatória também para viço de Busca e Salvamento Marítimo
do pelo Corpo de Bombeiros e onde es- os diferentes fins, salário, funções, en- (Salvamar), da Marinha do Brasil, que a
tas corporações estão não tem tanto pro- tre outras questões. “Nosso objetivo é seu critério aciona os recursos da FAB”,
blema. Mas em locais que não contam o reconhecimento e a regulamentação informa Silvio Monteiro Junior, piloto
com este serviço, quem atende?”, ques- da profissão, para aumentar a segurança e coordenador de Operações SAR.
tiona, apontando o aumento da quali- em áreas espelhadas. Atualmente não é Cada estado possui suas característi-
dade e segurança deste serviço como regulamentado. Portanto, é função, não cas, particularidades e sistemas. O Rio
foco da necessidade de uma legislação profissão”, afirma. de Janeiro, por exemplo, registra uma si-
tuação diferenciada, já que o Comando

Cenários específicos
de Bombeiros de Atividades de Salva-
mentos Marítimos, atua de forma inin-
terrupta. “Como aqui é verão o ano in-
teiro, o treinamento ocorre durante todo
ZAções dos guarda-vidas têm suas especificações de acordo o período. Sendo que no verão estas ins-
com cada estado, porém, com muitos aspectos comuns truções ficam paradas por conta da utili-
zação de todos os militares nas praias
No Brasil, os Corpos de Bombeiros ma de Busca e Salvamento Aeronáutico da orla de todo o estado, de Paraty a
de cada estado são os responsáveis pe- (SISSAR), constituído pela portaria Campos”, afirma o coronel Marcos Al-
las ações que envolvem resgate e salva- 1.162/GC3/05, prevê como sua finali- meida, comandante das atividades de
mento nas águas internas e nas praias dade trazer de volta à segurança vítimas salvamentos marítimos da corporação.
num limite de até 20 milhas da costa. de acidentes aeronáuticos e marítimos. Desde então, o comando é o responsá-
Além deste limite, é acionada a Marinha Assim sendo, a FAB participa de todas vel por traçar todas as determinações e
do Brasil, que por meio de Acordo Ope- as emergências aeronáuticas e marítimas diretrizes a serem executadas nas instru-
racional, pode solicitar reforço da FAB que tem conhecimento. Importante res- ções tecnoprofissionais, como resgate
(Força Aérea Brasileira) e de outras saltar que os casos de aeronaves em e- no mar, aquisição de equipamentos, pri-
corporações governamentais (Polícia, mergência sobre o mar são consideradas meiros socorros, RCP, prevenção, orien-
Bombeiros, Defesa Civil, etc). “O Siste- Operações SAR aeronáuticas e sob res- tação de banhistas, entre outras. Anual-

MARÇO / 2013 Emergência 29


ESPECIAL / BUSCA E SALVAMENTO AQUÁTICO
contratações, contamos com o apoio lo-
1º SARGENTO MARCELO CIRO

gístico de empresas que nos auxiliam com


materiais, etc”, detalha o subcomandante
do GBMar, major Carlos Smicelato. Em
São Paulo, a média anual de salvamentos
realizados é de 4.000 nas praias.
Uma das maiores operações realiza-
das com foco na prevenção de afoga-
mentos é a Operação Golfinho, no Rio
Grande do Sul. Realizada há 25 anos, a
iniciativa abrange todo o litoral gaúcho,
de norte a sul, além de toda a costa doce
balneável. “Onde tem praia pública, tem
No Rio de Janeiro, treinamento salva-vidas”, afirma o tenente-coronel
ocorre o ano inteiro Vinicius Correa, chefe de Estado Maior
e comandante dos Socorros Públicos do
mente é realizado o CSMar (Curso de busca e resgate em todo o estado”, infor- Corpo de Bombeiros do RS. Para 2013,
Salvamento no Mar), com duração de ma o major Silva Junior, da Brigada Mi- a estrutura disponível abrange 1.100 sal-
sete meses, que forma os militares da litar do Pará. va-vidas distribuídos em mais de 350
corporação e os novos recrutas em guar- guaritas em todo estado, 20 ambulânci-
da-vidas. Sua estrutura conta com 19 MAIS ESTRUTURAS as, três helicópteros, barcos e motos
motos aquáticas e 25 botes infláveis de Em São Paulo, o Corpo de Bombeiros aquáticas. Em 2012, a Operação Golfi-
resgate, além de dez embarcações de da PMESP tem uma grande estrutura nho registrou 1.400 salvamentos. É um
combate a incêndio e salvamento e duas atuante na proteção a banhistas. “No li- dos casos em que é trabalhada a pre-
aeronaves. Isto tudo está disponível para toral, temos uma unidade especializada venção desde cedo, já que durante as
os quatro grupamentos marítimos e os na prevenção e salvamento no mar, o atividades da operação, é realizado tam-
quatro quartéis híbridos que atendem to- GBMar (Grupamento de Bombeiros bém o projeto ‘Salva-Vidas Mirim’, que
da orla do estado, empregando 1.050 Marítimo). Na Capital, temos também treina as crianças a orientarem os a-
guarda-vidas. “Na orla do Estado do Rio um Posto Aquático no 4º Grupamento dultos. “É na infância que se tem edu-
de Janeiro, em 2012, foram registrados de Bombeiros, que é formado por guar- cação, onde se faz a mudança de com-
17.154 salvamentos, com 25 óbitos”, da-vidas especializados na proteção aos portamento”, informa o comandante.
quantifica Almeida. banhistas nas represas de Guarapiranga O diretor médico e fundador da So-
Já o Estado do Pará, vive uma realida- e de Bilings. Ao longo do interior do brasa, David Szpilman, afirma que, atu-
de diferente. “Possuímos cerca de 200 estado, durante o verão, em algumas re- almente, o Brasil dispõe de todo o co-
guarda-vidas especializados e 60 mergu- presas, o Corpo de Bombeiros designa nhecimento nesta área, o que falta é
lhadores, além de 18 embarcações de di- efetivos para o trabalho de proteção aos espalhá-lo para todo o território. “Pu-
versos portes para apoio nas ocorrênci- banhistas. No litoral, o GBMar, possui blicação recente que fizemos mostra que
as no meio aquático, em todo o estado. um efetivo de 600 guarda-vidas o ano to- o Brasil está em primeiro lugar”,
Porém, a maioria dos recursos huma- do, sendo reforçado no verão. Este ano, mensura, referindo-se ao artigo “Afoga-
nos especializados estão no Grupamen- 380 guarda-vidas temporários foram con- mento: tragédia sem atenção” que pu-
to Marítimo Fluvial, localizado na Re- tratados pelas prefeituras e 500 guarda- blicou no New England Journal of Medicine
gião Metropolitana de Belém, que fica vidas por tempo determinado, contrata- em 2012. Conforme Szpilman, o Brasil
encarregado das maiores demandas de dos pelo Estado de São Paulo. Além das está aumentando e especializando seu
conhecimento na área para enfrentar a
realidade dos afogamentos. Entretanto,
FATORES DE RISCO PARA O AFOGAMENTO: é unânime entre especialistas a necessi-
Sexo masculino; dade de duas ferramentas: prevenção e
ARQUIVO ASCOM CBMPA

Idade inferior a 14 anos; regulamentação. Prevenir os afo-


Consumo de álcool; gamentos é possível por meio de ações
simples - muitas que já vêm sendo reali-
Baixa renda familiar;
zadas, junto à sociedade - em busca da
Baixo nível educacional; conscientização quanto ao risco iminen-
Residência rural; te de ocorrências de afogamentos. Junto
Maior exposição ao meio aquático; a isto, a regulamentação da atuação dos
Comportamento de risco; guarda-vidas em território nacional já
Falta de supervisão. vem sendo discutida e buscada há anos.
Por meio de legislação específica, o traba-
Fonte: Artigo Afogamento: tragédia sem atenção, de
David Szpilman, Anthony Handley e James Orlowski, lho destes profissionais terá a referência
publicado no New England Journal of Medicine, em 2012. e o respaldo de que tanto necessita.
30 Emergência MARÇO / 2013
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