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Investir em ações é como montar um time de futebol, e para ser um bom técnico
você precisa, dentre diversas características e habilidades, ter conhecimento
detalhado sobre cada jogador
do seu time para saber em quem confiar na hora de fazer a escalação – como no
filme “Moneyball”, com Brad Pitt.
Neste artigo você entenderá como a contabilidade pode te ajudar nas suas decisões
de investimento.
Deve ser assustador se ver no meio de um jogo importante, mas sem saber com
quem pode contar para cada situação – principalmente se esse for o jogo mais
importante da sua vida (financeira).
Essa série de textos que eu produzi para o TradersClub tem a função de ajudar
vocês, investidores brasileiros, a usarem a informação contábil para auxiliar no seu
processo de tomada de decisão.
Feita esta introdução, vamos aos tópicos específicos que serão tratados nessa série
de textos:
Vamos juntos!
Se abrirmos uma torneira, a água sairá de um lugar e irá para outro. Quando
usamos uma caneta para escrever, a tinta sai da caneta e vai para o papel. Tudo
que usamos ou fazemos na vida tem uma origem e uma aplicação. Neste texto você
entenderá como funciona a contabilidade, por meio de um sistema chamado de
método das partidas dobradas.
O MÉTODO DAS PARTIDAS DOBRADAS QUE FAZ COM QUE O ATIVO SEJA
IGUAL AO PASSIVO MAIS O PATRIMÔNIO LÍQUIDO
O método das partidas dobradas é o sistema que nos permite registrar as origens e
aplicações dos recursos das empresas, considerando que cada evento gerará um
débito e um crédito correspondente e de igual valor. Por isso nome de “partida
dobrada”.
O método das partidas dobradas foi divulgado pela primeira vez no livro “Summa de
Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalita”, do Frei Luca Pacioli, em
1494. Como o Summa é um livro de matemática e o método é matemático, talvez
por isso as pessoas achem que a contabilidade é uma ciência exata.
Fora o método, que é exato, a contabilidade não tem muito mais coisas exatas,
como deixarei claro no final deste artigo. Por isso devemos ter muito cuidado ao
analisar empresas!
Pode parecer estranho o porquê de um bem que você comprou ter origem
devedora, mas explico isso quando for falar da natureza das contas no próximo
texto.
Passado o primeiro mês, teremos que dar baixa em parte da dívida e ainda
reconhecer uma parte da depreciação no resultado da empresa (vamos supor que
de R$ 1.500,00 por mês).
O leitor que já conhece um pouco das contas deve ter percebido que nenhum
lançamento desse afetou o lucro da empresa. Apenas mexemos em contas
patrimoniais. Nada de lucro. Ainda!
Agora a conta de “Contas a Pagar” que tinha um saldo credor de R$ 80.000,00, tem
saldo credor de R$ 60.000,00, porque pagamos uma parcela de R$ 20.000,00.
Como vocês sabem, as coisas tendem a se desvalorizar por diversos motivos. Um
deles é a depreciação que é o “consumo” do bem que a empresa tem e esse
“consumo” do bem reduzirá também o lucro do período, por isso reconheceremos a
despesa de depreciação e reduziremos o montante registrado na conta de veículos:
Apesar de o sistema ser bom, as pessoas é quem registram os fatos e esses fatos
podem ser registrados de uma forma que não representem bem a realidade da
empresa, mesmo havendo um débito correspondente e de igual valor. No exemplo
que dei acima, a empresa, para melhorar o seu lucro e atrair mais investidores,
poderia ter registrado uma depreciação menor.
Agora que vocês já sabem o que é débito e crédito em contabilidade e que quando
uma empresa compra um bem o lançamento é feito com um débito na conta do bem
e um crédito na conta de quem pagou o bem.
Mas por que isso acontece? Por que a coisa “boa” (o bem) é débito e a coisa “ruim “
(a obrigação de pagar) é crédito? Já pensou nisso?
Sabendo disso, quando uma empresa inicia as suas atividades, qual é o primeiro
evento contábil mais simples que pode existir? Se você pensou que são os donos
do capital (sócios) emprestando dinheiro para a empresa,você pensou
corretamente.
Por isso, as contas do ativo têm natureza devedora (os ativos são bens usados pela
empresa, porém ela deve isso a quem financiou as suas atividades). E as do
passivo, têm natureza credora(é o crédito que os financiadores têm na empresa).
O primeiro conceito que acaba por resumir uma das principais funções da
informação contábil é o patrimônio.
Esses três itens que formam o patrimônio são usados para mensurar a posição
patrimonial e financeira da empresa e podem também ser representados pela
equação patrimonial, em que Ativos = Passivos + Patrimônio Líquido.
Ativo
Como foi apontado na natureza das contas, é no ativo que alocamos as aplicações
dos recursos que a empresa captou.
Passivo
Já o passivo é uma fonte de captação (origem) de recursos para a empresa, que,
contabilmente, é definida como uma obrigação presente, derivada de eventos
passados, cuja liquidação se espera que resulte na saída de recursos da empresa
que poderiam ser usados para gerar benefícios econômicos no futuro.
Receitas
As receitas são as “entradas” de recursos na empresa que são obtidas (dinheiro de
fato ou contas a receber), por meio da venda de produtos ou serviços.
Assim sendo, resultam em aumentos do PL, e que não estejam relacionados com a
contribuição dos detentores dos instrumentos patrimoniais (os investidores).
Dessa definição, nós extraímos que o aumento do PL por meio da emissão de
ações não pode ser considerado uma receita, enquanto que a venda de produtos
pode, apesar de as duas terem gerado aumento dos ativos.
Despesas
Por fim, mas não menos importante, temos as despesas, que são definidas como
decréscimos nos benefícios econômicos.
Em algum momento da vida, todos nós já escutamos alguém dizer que “tudo na vida é
equilíbrio”. Nas empresas não é diferente e o Balanço Patrimonial (BP) é um retrato fiel
disso.
Sendo assim, olhando para o balanço, você encontra todos os bens que a empresa controla
(lado esquerdo, por convenção), bem como todas as dívidas que ela tem (lado direito, por
convenção).
Como no BP nós identificamos todos os bens que a empresa controla, bem como tudo o que
ela deve, podemos verificar, assim, a sua situação patrimonial e financeira em uma data
específica.
Por isso que costuma-se dizer que o BP é uma foto do patrimônio da empresa em uma data
específica (fechamento do período).
O investidor precisa ficar atento ao fato de que os números reportados no BP estão em uma
data específica porque essa demonstração contábil trata de “estoque de recursos”, diferente
de como vocês poderão perceber na Demonstração do Resultado do Exercício, por
exemplo, que não representa o estoque de recursos em uma data específica, mas sim o
“fluxo de recursos” durante um período.
Dessa forma, é no BP que observamos no final de cada trimestre quanto a empresa tinha de
recurso estocado em cada conta, conforme podemos observar no exemplo abaixo da
Sanepar, que tinha, em 31/12/2018, um estoque de R$ 639,1 milhões de contas a receber.
Além de verificar o estoque de cada conta, podemos analisar as relações entre elas, a
exemplo da comparação dos valores a receber com os valores a pagar, de modo a atestar a
capacidade de pagamento da empresa.
Sim, é possível. Isso acontece quando a empresa está em dificuldades financeiras e não
tem gerado lucro o suficiente para manter as suas atividades, precisando recorrer a um nível
alto de endividamento e atraso no pagamento das suas contas. Nesses casos, a empresa
tem mais passivos do que ativos e para a equação patrimonial fechar, o PL fica negativo.
No exemplo abaixo nós temos apenas um extrato do que seria o patrimônio líquido (PL) da
empresa. Cmo vocês podem perceber, o PL é negativo. Nos casos em que o PL é negativo,
nós damos um outro nome técnico: passivo a descoberto.
Essa empresa teve tanto prejuízo acumulado ao longo do tempo que a soma dos seus
passivos superou à soma dos seus ativos.
Para entender mais sobre as contas específicas, é preciso recorrer às notas explicativas. No
final dessa série vocês encontrarão um texto específico sobre esse assunto.
Felipe Pontes
A Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) é talvez a demonstração contábil mais
prestigiada pelos investidores. Os mais iniciantes, principalmente, tendem a valorizar demais
a última linha dessa demonstração, conhecida como Lucro ou Prejuízo do período.
Neste texto você entenderá que existe muito mais informações além do lucro ou prejuízo!
O regime de caixa está na vida das pessoas de forma geral. Quando fazemos a nossa
planilha de controle de receitas e gastos mensais, estamos usando o regime de caixa,
porque inserimos na planilha as receitas que recebemos, bem como inserimos na planilha
os gastos que fazemos, todos no momento da entrada ou saída do recurso.
Perceba que se passaram 3 (três) meses desde o primeiro evento, mas a despesa foi
reconhecida já no primeiro mês, independente se você ainda está ou não pagando. Isso é
regime de competência.
A DRE é uma demonstração contábil que apresenta o confronto das receitas com as
despesas de um período (geralmente trimestres ou anos), segundo o regime de
competência de modo a apurar o resultado do período.
Se o resultado for positivo, nós chamamos de lucro. Se o resultado for negativo, nós
chamamos de prejuízo.
Diferente do balanço patrimonial, que nos apresenta o estoque de recursos nas diversas
contas que compõem o patrimônio da empresa, a DRE nos apresenta os valores de forma
mais dinâmica, como sendo um fluxo de recursos.
Por isso o balanço patrimonial, por exemplo, do 4º trimestre de 2018 tem a data do último
dia do ano (31/12/2018) e a DRE tem a data do ano inteiro (de 01/01/2018 a 31/12/2018, ou
simplesmente o 2018), porque o resultado foi apurado no decorrer do ano, em forma de
fluxo e não de estoque.
O objetivo central da DRE é apresentar o resultado do período, por meio do confronto das
receitas com as despesas, porém saber se a empresa teve lucro ou prejuízo não é a
informação mais importante que podemos extrair dessa importante demonstração contábil.
Na DRE nós podemos encontrar informações a respeito dos seguintes pontos, não se
limitando a eles:
● Eficiência com relação aos custos para se obter a receita (analisando a relação entre
a receita operacional líquida e o custo dos produtivos vendidos ou serviços
prestados);
● Margens bruta, operacional e líquida (analisando a relação entre o lucro bruto,
operacional e líquido com a receita operacional);
● Evolução na contenção de despesas etc.
Muitas vezes esse tipo de informação é mais importante do que apenas saber se a empresa
teve ou não lucro, porque pode indicar que há um esforço para fazer sobrar mais da receita
da empresa para a geração de lucros.
Existe muito mais informação além do lucro ou prejuízo na DRE, a exemplo de empresas
que têm prejuízo apenas por uma variação cambial que nem sequer afetou o seu caixa.
Basta usar a criatividade para analisar os números. No texto sobre análise das
demonstrações contábeis existem mais detalhes sobre esse assunto.
6 – Demonstração do resultado abrangente: o lucro é o fim?
Felipe Pontes
No texto anterior vocês conheceram a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) e
viram que olhar apenas o lucro ou prejuízo (resultado) pode te levar a tomar decisões
erradas com relação à análise do desempenho das empresas.
Neste texto vocês perceberão que o lucro realmente não é o fim. Existem outras
informações mais amplas que podem afetar a sua percepção sobre o desempenho da
empresa.
Essas informações mais amplas são chamadas de outros resultados abrangentes que não
foram reconhecidos na DRE, porém afetam o patrimônio líquido.
São itens que podem transitar pela DRA e não pela DRE:
● Ganhos ou perdas atuariais com planos de pensão com benefício definido para os
empregados da empresa;
● Ganhos e perdas derivados de conversão de demonstrações contábeis de operações
no exterior;
● Ganhos e perdas derivados de alguns instrumentos de hedge;
● Entre diversas outras aplicações definidas no Pronunciamento Contábil CPC 26 ou
outros pronunciamentos específicos.
Como visto anteriormente no texto sobre a DRE, o confronto das receitas com as despesas
nos apresenta o resultado realizado no período considerando o regime de competência.
Contudo, é possível que existam outros itens que não foram ainda realizados, mas que
poderão afetar o desempenho futuro da empresa (por meio do lucro e do caixa).
O exemplo abaixo é a DRA da Sanepar em 2018, onde podemos ver que a empresa teve
um ganho pelo bom gerenciamento do seu passivo atuarial (obrigação que a empresa tem
com relação à aposentadoria dos funcionários, em linhas gerais), compensando uma perda
atuarial em 2017. Esses itens não afetaram o lucro do ano, mas são indicadores de que
podem afetar no futuro e o investidor espera que o impacto seja positivo, para que a
empresa não tenha que desembolsar recursos adicionais.
A título de curiosidade, se buscarmos nas notas explicativas podemos observar que os
investimentos feitos para o plano de aposentadoria e de assistência médica dos funcionários
da Sanepar (que gerou esse ganho atuarial) investe basicamente em renda fixa (77%) e
muito pouco em renda variável (6,8%) e que a prática de day-trade é vedada. Mas notas
explicativas é um assunto para outro texto e veremos que às vezes elas não são tão
explicativas assim.