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Ciência Social
Antropologia:
Cultura e Sistema
Simbólico
Unidade 1 - A Formação da
Antropologia Enquanto Ciência Social
Introdução
Todas as outras ciências humanas se ocupam em estudar o homem, mas não
com tanta complexidade e amplitude como a Antropologia, a ciência social capaz de
estudar o homem como criador de culturas, chegando a estudá-las e ainda compará-
las, para um melhor entendimento dessas obras humanas em um contexto geral. O
estudo do homem é bastante diversificado e por isso a Antropologia é dividida em
estudos especializados, como a Antropologia Física, que é comparada às ciências
biológicas devido a ambas estudarem as características biológicas, e a Antropologia
Cultural, que talvez seja a disciplina mais ampla, porque estuda a constante criação
dos homens como seres sociais. Há ainda outras como a Antropologia Social, que se
identifica bastante com a Sociologia; a Etnologia, que é um estudo que compara a
cultura com os problemas de costumes; a Linguística, estudo das diferentes
linguagens; a Arqueologia, que se ocupa em estudar os materiais de trabalho e sua
evolução histórica. Existem outras divisões, mas não são bem definidas devido à
dificuldade e falta de consenso.
Um bom profissional em qualquer área precisa estar ligado a diversos estudos
de diferentes ramos das ciências. A Antropologia apresenta três setores de
concentração e cada um trabalha sempre relacionado a outras ciências, até porque
para que se tenha uma pesquisa de qualidade nenhum ramo desse pode ser isolado.
Como exemplos, temos a Antropologia Física, na qual o estudioso precisa ter um bom
relacionamento com a Biologia, a Zoologia e a Paleontologia, já que o ramo de estudo
utiliza técnicas comuns a estas ciências. A Arqueologia é considerada uma
Antropologia Social, mas com uma diferença: ela se ocupa a estudar as sociedades
primitivas que já desapareceram, portanto é relacionada aos estudos da História,
Geografia e de outros ramos das ciências naturais. O terceiro ramo é o da Antropologia
Social ou Cultural, que se refere aos diversos tipos de culturas inseridos nos diferentes
tipos de sociedades e, por ser um setor muito amplo, pode ser estudado em conjunto
com todos os outros ramos.
Antropologia: Cultura e Sistema Simbólico - Unidade 1 - A Formação da Antropologia Enquanto
Ciência Social
1. Apresentação do Curso
Um enorme desafio está lançado a partir de agora: compreendermos juntos o
fabuloso mundo de uma ciência humana e social, sobre a qual pode-se dizer que é
apaixonante e certamente te dará estímulo para se aprofundar ao longo dos
principais temas da disciplina.
Falaremos de tudo aquilo que a Antropologia representa no campo
acadêmico, no cotidiano social, como ela pode ajudar na sua vida prática e nas
reflexões que permeiam seus estudos seja de que área do conhecimento você for.
Ao longo desse semestre passaremos a traçar um percurso longo, mas que
será gratificante quando concluirmos, afinal a riqueza intelectual que a Antropologia
agrega aos indivíduos é necessária e importante para enriquecer a noção de seres
humanos e de humanidade que devemos ter.
Trata-se do exercício de olhar o outro como diferente e não como inferior ou
superior a nós ditos “civilizados”, ou até mesmo da noção meramente econômica que
norteia as atividades econômicas mundiais, para tecermos classificações como
emergentes, subdesenvolvidos, ou desenvolvidos, potências etc.
Antropologia: Cultura e Sistema Simbólico - Unidade 1 - A Formação da Antropologia Enquanto
Ciência Social
Você quer ler? Recomendamos essa leitura, que é uma das mais importantes em
termos de Introdução à Antropologia. O Autor é Roque de Barros Laraia, grande
antropólogo brasileiro que se debruçou nos conceitos de Cultura. Vale a Pena! Segue
trecho:
(…) Em suma, a nossa espécie tinha conseguido, no decorrer de sua evolução, estabelecer uma
distinção de gênero e não apenas de grau em relação aos demais seres vivos. Os fundadores de nossa
ciência, através dessa explicação, tinham repetido a temática quase universal dos mitos de origem,
pois a maioria destes preocupa-se muito mais em explicar a separação da cultura da natureza do que
com as especulações de ordem cosmogônica. (Laraia, 1986, 28-29)
Ele afirma que os fenômenos sociais, assim como os fenômenos das ciências
naturais, apresentam leis gerais que podem ser desvendadas pelo cientista. As leis
existem e estão na sociedade para ser investigadas. O que molda características dos
indivíduos é a sociedade à qual pertence o indivíduo, são as representações coletivas
daquele determinado grupo. Toda sociedade representa e essa representação dá
sentido ao mundo social, de tal modo que as representações individuais são
determinadas pelas representações coletivas. Os padrões morais, os costumes e os
aspectos culturais formam um consenso entre os indivíduos que determinam os
fenômenos sociais. Apesar de algumas limitações, é importante destacar que
Durkheim inaugura o campo de investigação que vai permitir caminhos de pesquisa
para outras ciências, como a Antropologia. Segundo, Thomas Kuhn, nenhum
paradigma é irretocável, pois o que é paradigma na ciência é, na verdade, um certo
consenso científico que se estabelece por um tempo até que seja superado por um
outro paradigma, ou seja, por uma outra explicação mais detalhada e convincente. O
que nos interessa nesse autor é que ele abre o campo de estudo das representações.
Segundo Durkheim, as sociedades são regida por leis gerais, sejam aquelas
ditas “primitivas”, sejam as modernas. É destacado na obra que a sociedade determina
o indivíduo, pois é nela que o fenômeno simbólico é considerado como elemento
primordial e princípio fundante do social. Durkheim está instaurando o campo da
investigação simbólica. Em As formas elementares da vida religiosa, as representações
sociais tornam-se fundamento explicativo do social. A religião é um sistema simbólico
que se organiza e representa o todo. A religião é um fator de coesão moral porque ela
é um sistema de significação e de classificação do mundo, que organiza o mundo,
classificando-o e dando sentido ao mundo.
O sistema de representação coletiva se faz, então, da comunicação e do
relacionamento entre os indivíduos. Assim, aprendemos os nossos hábitos, costumes,
crenças, comportamentos, gostos etc., de tal maneira que o estudo das representações
sociais nos ajuda na compreensão dos acontecimentos em nosso cotidiano, que faz
parte do processo de socialização, construção e reconstrução dos aspectos culturais e
simbólicos.
Você sabia? Tylor foi considerado como o pai da Antropologia cultural por ter
fornecido a primeira definição formal de cultura ou civilização: “(...) é aquele todo
complexo que inclui conhecimento crença, arte, moral, lei, costume e quaisquer outras
capacidades e hábitos adquiridos pelo homem na condição de membro da sociedade.”
(CASTRO, 2005, p. 69). Essa definição seria utilizada para o entendimento de leis do
pensamento e da ação humana, na busca de fenômenos recorrentes na humanidade,
ou seja, o fazer antropológico é a comparação de costumes e crenças.
Tylor volta o interesse em tratar os grupos como humanos, visto que fazemos
parte de uma mesma espécie - humanidade -, que apenas nos diferencia em estágios
evolutivos. Dessa forma, a tarefa do pesquisador é utilizar os dados coletados e
classificar os grupos os distribuindo na geografia, história, e na relação existente entre
Antropologia: Cultura e Sistema Simbólico - Unidade 1 - A Formação da Antropologia Enquanto
Ciência Social
eles, ou seja, o papel do antropólogo é ter um método científico que busque leis e
regularidades das sociedades.
O autor apresenta que a tarefa do etnógrafo é investigar as causas que
produzem os fenômenos de cultura e das leis, montando um esquema de evolução. O
objetivo da ciência, portanto seria esboçar o curso teórico da civilização humana,
utilizando o método comparativo para investigação dos estágios evolutivos.
Em 1908, James George Frazer já consagrado como antropólogo, teria a
condição de se tornar professor de uma disciplina chamada Antropologia Social. Na
Universidade de Liverpool, o autor realizou uma palestra que daria o nome de O
escopo da antropologia social. A Antropologia foi uma das últimas ciências a se firmar,
que tinha como objetivo fazer um estudo abrangente do homem como um todo, não
só em termos de estrutura física e mental, mas também comparar as raças de homem,
seguindo a evolução do pensamento e das instituições humanas. Para Frazer, “a
antropologia, no sentido mais amplo da palavra, visa descobrir as leis gerais que
regularam a história humana no passado e que, se a natureza for realmente uniforme,
é de se esperar que a regulem no futuro.” (CASTRO, 2005, p.104).
A antropologia social, diferente da sociologia, tem um departamento particular
de interesse, e não pretende tratar da totalidade da sociedade humana, passada,
presente e futura, segundo Frazer a pretensão seria buscar a infância, a meninice, o
estudo do passado no presente.
de nossa história passada. Aqui o que entra em debate é perceber nos evolucionistas
pensadores de seu tempo. Eles buscavam um modo de se fazer ciência, e a
classificação dos grupos não é apenas um instrumento utilizado pelos evolucionistas.
Nesse momento, era um modelo próprio de se fazer ciência, o que trouxe certos
equívocos para o pensamento evolucionista.
O período subsequente ao evolucionismo traz novos desafios no estudo da
Antropologia. Pensar na sociedade como formas inferiores e superiores na escala de
evolução não era mais consenso e não respondia mais às novas questões que se
colocava a ciência antropológica. O pensamento evolucionista, ao analisar outros
grupos humanos, o fez sob a ótica de valores do mundo ocidental. A diversidade
cultural é complexa e, para ser entendida, requer o esforço de observar a partir de seu
próprio universo, e não uma imposição. A compreensão passa pelo modo com que
cada povo dá sentido à sua própria existência. Cabe ao antropólogo o desafio de
buscar nos grupos humanos as respostas para suas questões. É imprescindível o
esforço de reconhecer que a produção cultural de cada sociedade é legítima e lógica
dentro do seu próprio modo de viver e produzir significados. Para isso, a Antropologia
precisa se desenvolver para questionar sobre a humanidade a partir das
particularidades e sistematizar as respostas a partir do sentido e significado que os
grupos humanos oferecem a sua existência. É nesse sentido que abrimos as discussões
para o método da observação participante e o trabalho de campo da Antropologia
cultural.
Ele viveu entre o grupo estudado e recolheu todos os materiais necessários para
entender a cultura por dentro, sem interferência do mundo ocidental. É através desse
autor que a Antropologia se torna uma ciência da alteridade no estudo das
características particulares dos grupos humanos. Os costumes dos povos da Ilha
Trobriand têm significação e coerência. Esse esforço do autor em pensar sobre essa
lógica resulta na elaboração da teoria funcionalista. Ele parte do modelo das ciências
da natureza que cada indivíduo sente certo número de necessidades. Cada cultura tem
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o faz entender que, como grupo, ele pode encarar que seja um grupo melhor que os
outros.
O etnocentrismo não é um fenômeno exclusivo de uma sociedade. Os
indivíduos enxergam o mundo, sociedade ou grupo em que eles vivem como sendo
um mundo positivo e o que não está nele é algo negativo. Isso pode ser percebido na
colonização, em que os índios não faziam parte de uma visão de mundo ocidental,
que era cristão, dita civilizada. Os europeus percebiam os índios como sendo
diferentes, inferiores, pois eram incapazes de reconhecer o outro como sendo de uma
cultura diferente, com costumes, hábitos, valores diferentes dos deles. Por não
pensarem dessa forma, eles impuseram sua visão de mundo aos índios, acreditando
que esse seria um caminho civilizador.
O que se pode apreender é que o etnocentrismo pode ser usado para
valorizarmos o que somos, mostrando ao outro que temos algo de bom, que podemos
apresentar como lidamos com o mundo e vice-versa. E que não devemos usar o
etnocentrismo para julgar, inferiorizar o outro, não é uma visão errônea de raça que
vai dizer o que realmente somos, e sim a forma como agimos, pensamos, vemos e
vivenciamos o mundo.
Percebemos ao longo do estudo sobre a antropologia que ela se torna cada
vez mais fundamental em questões que envolvem conflitos culturais. Na obra
Relativizando, de Roberto DaMatta, a ideia do etnocentrismo dá lugar ao relativismo,
em que aprendemos que existe uma diversidade cultural e que essa diversidade deve
ser respeitada. Nessa perspectiva a obra consiste em uma leitura do mundo sobre o
ponto de vista do autor. Oferece caminhos para compreender sociedades complexas.
A Antropologia Social estuda o que ainda é desconhecido ou pouco conhecido das
sociedades, tornando o conhecimento sobre si mesmo infinito. Em suas discussões,
DaMatta trata de modelos evolutivos que apenas legitimam modos de viver ocidentais
que fomentaram as expansões e colonizações.
Superar esse pensamento era a verdadeira evolução da ciência antropológica,
de constituir o olhar ao entendimento entre homens e o meio onde está inserido na
busca de conhecimento mais humanizado do “outro” como caminho de compreensão
de nós mesmos. O esforço constante dos pesquisadores é tornar o familiar em exótico
e o exótico em familiar, essa é a missão de produção de conhecimento na
Antropologia. As Ciências Sociais estudam eventos complexos, bem diferente do
objeto das Ciências da Natureza. A principal característica das Ciências Sociais é
estudar eventos inerentes aos acontecimentos humanos. O pesquisado e pesquisador
são parte de um mesmo plano e diferenciam-se apenas em seus modos de viver. O
cientista social faz parte do mesmo universo do pesquisado e seu olhar se lança na
interpretação dos fenômenos sociais a partir dos atores sociais. DaMatta destaca a
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Ciência Social
Você quer ver? O filme Dicionário de Cama conta a história de amor entre o jovem
oficial britânico John Truscott e sua intérprete Iban Selima. A situação apresentada se
passa na década de 1930 e tem como pano de fundo os conflitos entre comunidades
na Malásia colonial, subjugada à Inglaterra. A paixão dos protagonistas surge como
ponto de divergência entre colonos e nativos, o que provoca uma guerra.
(..) tudo se mistura, tudo o que constitui a vida propriamente social das
sociedades que precederam as nossas – até as da proto-história.
Nesses fenômenos sociais “totais”, como nos propomos chamá-los,
exprimem-se, ao mesmo tempo e de uma só vez, toda espécie de
instituições: religiosas, jurídicas e morais – estas políticas e familiais ao
mesmo tempo; econômicas – supondo formas particulares de
produção e de consumo, ou antes, de prestação e de distribuição, sem
contar os fenômenos estéticos nos quais desembocam tais fatos e os
fenômenos morfológicos que manifestam estas instituições. (Mauss,
1974, p. 41).
E ainda nos revela que se aparentemente o ato de dar, receber e retribuir era
espontâneo ao aprofundar o olhar percebemos que eles eram obrigatórios. Em todas
as sociedades, tradicionais ou modernas, é possível observar o sistema de
reciprocidade que conduz a tríplice obrigação coletiva de doação, de recebimento e
devolução dos bens simbólicos e materiais é o que ele entende por Dádiva. Esse ato é
anterior aos interesses contratuais e às obrigações legais e nos traz uma nova
perspectiva sobre as relações sociais. A ideia de uma ação social neste ato do que é
dado, recebido e retribuído interfere diretamente na distribuição dos membros do
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Ciência Social
Síntese
Antropologia: Cultura e Sistema Simbólico - Unidade 1 - A Formação da Antropologia Enquanto
Ciência Social
Nesta unidade, vimos que a cultura é produzida a partir de aspectos que são
compartilhados numa sociedade. As práticas, costumes, ritos são parte da cultura. A
cultura é um sistema de símbolos. Observamos que desde a teoria evolucionista, os
pesquisadores no esforço do seu tempo demonstraram a partir de dados colhidos por
relatos a diferença técnica entre os povos, apesar de distinguir os grupos humanos
por etapas evolutivas. Era necessário entender que o homem é um ser pensante que
produz cultura.
Em resumo, nesta unidade aprendemos que:
● Cada grupo humano tem seus aspectos culturais particulares e foi nesse
caminho que a ciência começa a constituir novos desafios a partir da teoria
funcionalista trazida por Malinowski;
● A observação participante e o trabalho de campo inauguraram uma prática
antropológica seguida até hoje pelos cientistas sociais na Antropologia;
● As instituições, organizações, ritos, costumes, comportamento geram
significados e são dotados de sentido pelos indivíduos;
● Os símbolos são construídos socialmente e foram eles que impulsionaram as
obras de Durkheim sobre a religião e Dádiva de Mauss;
● A maneira que cada grupo humano produz cultura e constroem seu sistema
simbólico é o que nos diferencia.
Bibliografia
MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a dádiva, Lisboa, Edições 70. 1988 (1924)