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ISSN 2177-2940

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ISSN 1415-9945
(Impresso)
http://dx.doi.org/10.4025.dialogos.v22i3

“Conflito” e “humanidade”: as antropologias


históricas de Reinhart Koselleck e Jörn Rüsen
http://dx.doi.org/10.4025.dialogos.v22i3.42131

Gustavo Castanheira Borges de Oliveira


Universidade Federal de Ouro Preto, UFOP, Brasil. E-mail: gustavocbo@gmail.com
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Palavras-chave: Resumo: O foco deste artigo é analisar as antropologias históricas dos historiadores Reinhart Koselleck e Jörn
Rüsen, com o objetivo de pontuar as similaridades e as diferenças entre elas. Para tal, partimos do significado
Koselleck; Rüsen;
que Koselleck atribui à teoria da história, entendida por ele como teoria das “condições de possibilidade da
antropologia histórica. história”, tendo como objeto de estudo aquilo que é comum a toda experiência histórica, que a estrutura e a
torna possível. Assim, Koselleck trabalhou a partir de pares de categorias antropológicas, ou universais, tais
como ter de morrer/poder matar e interno/externo. Rüsen também fez algumas análises a partir do uso de pares
antropológicos. A partir da análise e comparação das teorias destes dois historiadores chegamos à tese de que
Koselleck constrói uma antropologia histórica baseada no “conflito”, enquanto a de Rüsen é calcada na noção
de “humanidade”, sendo esta uma grande diferença epistemológica entre os autores.

Key words: Koselleck; "Conflict" and "humanity": the historical anthropologies of Reinhart Koselleck and Jörn Rüsen
Abstract: The aim of this article is to analyze the historical anthropologies of historians Reinhart Koselleck
Rüsen; historical
and Jörn Rüsen, intending to contrast the similarities and the differences between them. Thus, we start from the
anthropology. meaning that Koselleck attributes to the theory of history, understood by him as a theory of the " history`s
conditions of possibility ", which has as object of study what is common to all historical experience. Thus,
Koselleck worked from pairs of anthropological, or universal, categories such as having to die/able to kill and
internal/external. Rüsen also made some analyzes from the use of anthropological pairs. Through the analysis
and comparison of the theories of these two historians we conclude that the thesis that Koselleck develops a
historical anthropology based on "conflict", while that Rüsen’s is based on the notion of "humanity", and this
is a great epistemological difference between the authors.

Palabras clave: "Conflicto" y "humanidad": las antropologías históricas de Reinhart Koselleck y Jörn Rüsen
Resumen: El foco de este artículo es analizar las antropologías históricas de los historiadores Reinhart
Koselleck; Rüsen;
Koselleck y Jörn Rüsen, con el objetivo de puntuar las similitudes y las diferencias entre ellas. Para ello,
antropología partimos del significado que Koselleck atribuye a la teoría de la historia, entendida por él como teoría de las
"condiciones de posibilidad de la historia", teniendo como objeto de estudio aquello que es común a toda
histórica.
experiencia histórica, que la estructura y la hace posible. Así, Koselleck trabajó a partir de pares de categorías
antropológicas, o universales, tales como tener que morir/poder matar e interno/externo. Rüsen también hizo
algunos análisis a partir del uso de pares antropológicos. A partir del análisis y comparación de las teorías de
estos dos historiadores llegamos a la tesis de que Koselleck construye una antropología histórica basada en el
"conflicto", mientras que la de Rüsen es calcada en la noción de "humanidad", siendo esta una gran diferencia
epistemológica entre los autores.

Artigo recebido em: 23/03/2018. Aprovado em: 27/10/2018


GCB Oliveira. Diálogos, v.22, n.3, (2018) 166-185 167

Koselleck: uma antropologia baseada no humana: desenvolvendo-se entre nascimento e


conflito morte, o Ser é essencialmente um fenômeno
temporal e histórico, condicionado pela
O tema de uma antropologia histórica possibilidade, e certeza, da morte.
aparece em Koselleck através do significado e A partir da noção de finitude, Koselleck
da função que o autor atribui à teoria da propõe quatro pares conceituais que revelariam
história, entendida por ele como teoria das a estrutura possibilitadora de toda história:
“condições de possibilidade da história”. Ela amigo/inimigo, mestre/escravo, homem/mulher
deve tratar “dos elementos prévios, no plano e dentro/fora. A intenção era a de delinear um
teórico, que permitem compreender por que as “espaço histórico” no qual as experiências
histórias ocorrem, como elas podem ocorrer e humanas se desenvolvem e as relações e
também por que e como devem ser analisadas, conflitos entre os indivíduos acontecem. Já nesta
representadas ou narradas” (KOSELLECK, carta o autor esboçava sua ontologia histórica, a
2014, p. 93). Tendo como objeto de estudo qual viria a desenvolver mais profundamente
aquilo que é comum a toda experiência com o passar dos anos. Apesar da confessada
histórica, que a estrutura e a torna possível, tal influência de Heidegger, o par amigo/inimigo
teoria pode ser encarada como uma espécie de foi encontrado em Schmitt, curiosamente o
“ontologia histórica”, preocupando-se assim interlocutor de Koselleck neste fértil diálogo por
com os fundamentos mais básicos e universais cartas.
da experiência histórica. Na clássica obra O conceito do Político,
Como nos mostra Olsen, ainda em publicada originalmente em 1932, Schmitt
meados da década de 1950 Koselleck já procura uma definição do conceito de político
demonstrava preocupação com a possibilidade, “através da identificação e verificação das
e necessidade, de uma ontologia histórica categorias especificamente políticas.”. O autor
(OLSEN, 2011). Em uma carta endereçada a procede a sua busca através da identificação de
Carl Schmitt, datada de 1953, o historiador pares conceituais que expressem os limites
revela sua busca por estruturas existenciais da condicionais da dimensão da vida a que eles
condição humana, que fundamentam e dizem respeito. Assim, no campo da moral as
possibilitam toda história. Baseada em diferenciações são entre bom e mau; no estético,
conceitos fundamentais, tal ontologia foi feio e belo; no econômico, útil e prejudicial, ou
pensada a partir da obra Ser e Tempo, de rentável e não rentável. No âmbito do político as
Heidegger, da qual Koselleck retirou a noção relações são estabelecidas a partir da
de “finitude” (Endlichkeit), entendida por ele diferenciação entre amigo e inimigo:
como um elemento estruturante da condição
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A diferenciação entre amigo e inimigo tem referirem aos outros, mas há uma diferença
o propósito de caracterizar o extremo grau
de intensidade de uma união ou separação, substancial quando os termos são mutuamente
de uma associação ou desassociação,
podendo existir na teoria e na prática, sem reconhecidos e aceitos ou quando, pelo
que, simultaneamente, tenham que ser
empregadas todas aquelas diferenciações
contrário, são utilizados de maneira
morais, estéticas, econômicas ou outras. O depreciativa. O tratamento entre “empregador” e
inimigo político não precisa ser
moralmente mau, não precisa ser “empregado” é diferente daquele entre
esteticamente feio; ele não tem que se
apresentar como concorrente econômico e, “explorador” e “material humano”, assim como
talvez, pode até mesmo parecer vantajoso
fazer negócios com ele. Ele é precisamente “católico” e “protestante” diferem da relação
o outro, o desconhecido e, para sua
essência, basta que ele seja, em um sentido entre “adorador de ídolo” e “infiel”. Todas as
especialmente intenso, existencialmente designações que são frutos de relações baseadas
algo diferente e desconhecido, de modo
que em caso extremo, sejam possíveis no uso depreciativo são chamadas por Koselleck
conflitos com ele, os quais não podem ser
decididos nem através de uma de “conceitos antitéticos assimétricos”
normalização geral empreendida
antecipadamente, nem através da sentença (KOSELLECK, 2002, p. 191 et seq.). Antitético
de um terceiro “não envolvido” e, destarte,
“imparcial”. (SCHMITT, 2008, p. 28)
porque são opostos, usados por duas entidades
para se referirem uma à outra; assimétricos
A teoria do autor assume assim um porque esta oposição é desigual, sempre com um
caráter “adversarial”: o inimigo, que é sempre lado imprimindo uma carga negativa ao outro.
um inimigo público, coletivo, e nunca privado, Koselleck examina então três pares
não carrega necessariamente a marca da destes conceitos, utilizados em situações
“maldade”, ou do concorrente econômico, mas históricas: as oposições entre helenos e
representa perigo à existência de um bárbaros, cristãos e pagãos e, por fim, entre
determinado grupo (ALVES; OLIVEIRA, homem e não homem, ou super-homem e sub-
2012, p. 245). Só há política quando existe o homem. É característica da primeira oposição a
inimigo, e a possibilidade sempre presente da referência a grupos separados espacialmente,
irrupção da guerra é o fator que caracteriza uma atribuindo carga negativa aos estrangeiros, mas
determinada inimizade, representando o ao menos os reconhecendo como tal. Uma
extremo desta relação. espiritualização dos conceitos sucede sua
Baseado em tais considerações, temporalização, e a relação cristão/pagão, típica
Koselleck procede a uma historicização do da Idade Média, traz uma dinâmica da negação
conflito político, preenchendo o par conceitual do outro diferente das vistas na Antiguidade não
antropológico amigo/inimigo com conceitos cristã. Já a última oposição, utilizada pelos
utilizados em situações concretas e particulares. nazistas, apresentou uma exigência de
O autor nos mostra que é comum que os seres universalidade tão grande que não havia espaço
humanos utilizem denominações para se para os que não se encaixassem na categoria
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aceita. dois conceitos formam uma oposição simétrica,


Uma característica desta última a qual será preenchida com conceitos
oposição, bem anotada por Koselleck, é que assimétricos de acordo com cada situação
apenas um grupo é precisamente definido pelos concreta. Assim, todo conflito terminado
conceitos. “Não é possível se deduzir, nem do representa o início de outros, perpetuando a
conceito de ariano nem mesmo do conceito de dinâmica histórica do político (KOSELLECK,
não ariano, quem são os não arianos” 2002, p. 230 - 231).
(KOSELLECK, 2002, p. 230). O não ariano Em outra ocasião, em comemoração ao
nada mais é do que a negação do ariano. A aniversário de Gadamer, Koselleck retomaria a
perseguição especial aos judeus não pode ser oposição amigo/inimigo e a ela somaria outras,
deduzida desta oposição, na verdade nenhum com a intenção de construir uma “antropologia
inimigo específico pode, sendo que o fato é que histórica”. A fala de Koselleck é elaborada a
tal conceitualização tão ampla e abstrata pode partir de uma divergência de posição entre ele e
ser instrumentalizada por quem assumir o poder o homenageado: a hermenêutica de Gadamer,
e a máquina de guerra. Podemos estender esta afirma Koselleck, se pretende como a grande
observação também aos outros dois pares: disciplina, ou atividade, responsável pela
“bárbaro” indica apenas aquele que não é compreensão da existência. A teologia, a
heleno, mas não incorpora a pluralidade de jurisprudência, a poesia e a história estariam
identidade dos que viviam fora da Grécia; por abarcadas pelo grande campo hermenêutico.
sua vez, o termo “pagão” não esclarece as Mas, Koselleck contesta tal amplitude: se é
diferenças e singularidades dos que não eram verdade que a narrativa histórica, e os estudos
cristãos. Parece que esta é uma característica de com fontes históricas escritas, fazem parte do
toda oposição do tipo “nosso grupo/todo agrupamento hermenêutico, o mesmo não se
estranho ao grupo”. pode dizer de uma teoria da história que se
Koselleck, ao final do texto em que preocupa não em conhecer as histórias
realizou esta teorização, atribuiu a Schmitt “o singulares do passado, mas se volta para as
mérito científico de formalizar as oposições condições de possibilidade da história,
fundamentais, ideologicamente manipuladas, de representadas por elementos extralinguísticos,
classes e de povos, de modo a permanecer pré-linguísticos, mesmo que estes sejam
visível apenas a estrutura básica das possíveis expressos pela linguagem.
oposições.”. Tal estrutura é a oposição A tese de Koselleck é a de que se
amigo/inimigo, que, na visão de Koselleck, realmente “existem essas precondições da
representa “uma fórmula insuperável como história, que não se esgotam na linguagem nem
condição para uma política possível”, pois estes dependem de textos, o estatuto epistemológico
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da teoria da história não pode ser enquadrado de fronteiras e demarcação de territórios,


como uma divisão da hermenêutica.” organizando geograficamente o mundo que o
(KOSELLECK, 2014, p. 92). O autor cerca. Uma variante desta oposição, sempre
desenvolve seu argumento a partir de uma segundo Koselleck, é a de “público” e “secreto”,
leitura de Ser e tempo. Koselleck acredita ser estruturante de ritos de iniciação em
necessário complementar a finitude da analítica comunidades de culto, demarcando o espaço
existencial heideggeriana, e para isso ele parte entre aquilo que pode ser conhecido por todos e
dos universais antropológicos “ser- aquilo que não é acessível a qualquer um.
arremessado” e “antecipação da morte”, Um quarto par antitético é formado por
elaborados por Heidegger, complementando Koselleck a partir da oposição entre “ser-
cada um com outro universal. arremessado”, da teoria de Heidegger, e
“Antecipação da morte”, ou “geratividade”: a primeira categoria diz respeito
inevitabilidade da morte, é complementada pela à necessidade de cada um aceitar ter nascido, a
categoria do “poder matar”, constituindo assim partir do qual tem inicio a vida e a morte; a
um par de universais antropológicos sem o qual segunda se refere à capacidade biológica de
nenhuma história seria possível. A luta pela geração de filhos, e implica a relação entre pais
sobrevivência, os conflitos armados, o uso da e filhos, ou seja, entre gerações. O confronto
violência, nada disso pode ser pensado, e entre gerações é uma das condições
vivido, fora do horizonte da possibilidade da fundamentais de histórias, e as diversas
própria morte e da de poder matar. O possibilidades, como reforma, perpetuação ou
interessante é como este par conceitual ruptura geracional, estão condicionadas por este
determina a possibilidade da história, ou seja, par conceitual.
da vida, justamente a partir da possibilidade de Por fim, Koselleck elabora o quinto par
extinguir a existência de outrem, ou de ter a sua conceitual: senhor e escravo, ou, em termos
própria extinguida. Por trás deste par antitético formais, “acima” e “abaixo”. Tal oposição
há um segundo: a já mencionada oposição entre expressa a relação de hierarquia presente em
amigo e inimigo, e que numa situação extrema, toda sociedade humana, sendo que “forte” e
concretizam as situações em que se pode matar “fraco” é uma das possíveis variações. As
e morrer, ou, se for o caso, é necessário matar relações de poder, condições de possibilidade de
para não ser morto. histórias, são estruturadas a partir deste par
Esta oposição nos revela outro par conceitual, expresso de maneira explícita em
conceitual: “interior” e “exterior”, constituidora situações particulares como revoluções, tomadas
da “espacialidade histórica”, referente à de decisões em guerras e relações comerciais
organização do homem a partir da delimitação internacionais.
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Além destes cinco pares conceituais, “projeto historiográfico” a partir da concepção


Koselleck destaca a relação entre linguagem e de finitude, utilizando-se de pares conceituais de
fato, admitindo que a diferença entre eles universais antropológicos que determinam as
constitui uma experiência primária, ou seja, condições de possibilidade de histórias.
antropológica: “Precisamos distinguir entre a Gadamer, por sua vez, se volta para o tópico da
história dos efeitos que acontecem na linguagem, entendendo a compreensão como um
continuidade de uma tradição e de uma exegese elemento antropológico, atividade pela qual o
textual e a história dos efeitos que, mesmo homem procura interpretar o mundo e
possibilitados e mediados pela linguagem, comunicar-se com os outros indivíduos. Assim,
permanecem sempre além da linguagem” a história seria uma entre as inúmeras maneiras
(KOSELLECK, 2014, p. 109). Talvez até pelas quais o ser humano busca compreender a
mesmo o conceito de “história” seja “um desses existência (PEREIRA, 2011).
conceitos que se consomem quando expostos à Nas palavras da autora:
realidade.” Tal afirmação só deixa mais claro a
posição do autor sobre a diferença entre a O filósofo [Gadamer] procura entender a
linguagem em termos aristotélicos como
história como narrativa, fruto de pesquisa e aquilo que distingue fundamentalmente os
homens dos animais. Com a linguagem, o
esforço de interpretação do passado, e a homem descreve estados de coisas, e ao
mesmo tempo produz incertezas, propõe e
realidade dos acontecimentos os quais o ser projeta um futuro. Em todo conhecimento
vivencia. Fica subentendido assim o caráter da histórico há também um compreender, um
processo hermenêutico. Somente esse
“história” como uma elaboração intelectual reconhecimento pode explicar o interesse no
mundo objetivo e a formação de questões
humana, uma maneira de dar sentido às nossas relevantes que podem ser levantadas no
trabalho histórico, o que não pode ser
experiências e às passadas. Tal elaboração explicado pelas metacategorias de
Koselleck. Ao contrário, as metacategorias
ocorre necessariamente por meio da linguagem, só podem ser operacionalizadas e produzir
que nunca consegue comportar totalmente a histórias reais no âmbito das questões e
interesses desenvolvidos no campo
realidade a qual ela faz referência.1 linguístico do vínculo com as tradições.
Para Gadamer, o bom pesquisador não é
Em um texto dedicado justamente a simplesmente aquele que domina uma
metodologia, pois a sua tarefa decisiva é a
estes diálogos entre Koselleck e Gadamer, fantasia. (PEREIRA, 2011, p. 258)
Luísa Rauter Pereira reitera o fato de que os
dois autores trilham caminhos diferentes a A diferença entre os dois autores
partir de um mesmo ponto: a filosofia de evidencia uma interessante característica das
Heidegger. Koselleck procurou elaborar um formulações de Koselleck. Gadamer confere um
“peso ontológico” à compreensão, entendendo-a
1
O autor considera a análise do próprio conceito de
“história”, entendida por ele como “um exercício de como fundamental para a realização do ser
crítica da ideologia”, como uma das principais tarefas a humano enquanto ser-no-mundo. Koselleck não
serem constantemente realizadas pelos historiadores. Cf:
(KOSELLECK, 2013, p. 63 et seq.)
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nega a universalidade da linguagem, mas, pelo transformação das carências de orientação da


contrário, tenciona-a a partir da oposição com o vida prática em questões científicas, quando a
“fato”, o extralinguístico. Ele faz algo consciência histórica passa a trabalhar o passado
semelhante com as categorias heideggerianas de forma mais elaborada, orientada teórico e
“ser arremessado” e “antecipação da morte”, metodologicamente.
opondo-as a outras duas categorias, criando Segundo Rüsen, a história, enquanto
assim dois pares conceituais. Ao que parece, elaboração intelectual com objetivo de gerar
para Koselleck, a compreensão, de maneira sentido à mudança temporal, é apreendida em
geral, se dá na tensão entre o par universal três dimensões: empírica, formal e funcional.3 A
“linguagem e fato”, assim o autor destaca o primeira dimensão diz respeito aos
caráter ontológico da hermenêutica sem acontecimentos passados, que só se tornam
precisar operar fora do esquema dualista. Com “históricos” quando inseridos em perspectiva
isso, a autonomia da “realidade” é preservada, o temporal, constituindo sentido a partir da
que o permite caracterizar a teoria da história relação com o presente e com o futuro. O
como “teoria das condições de possibilidade de histórico aqui é apreendido a partir das
histórias”, e reiterar o caráter específico da “experiências” humanas, baseado na
história frente a outras disciplinas representação do fluxo temporal e referente a
marcadamente hermenêuticas, como a uma filosofia “material” da história. A segunda
jurisprudência e a teologia. dimensão diz respeito às formas de pensar e
apresentar os acontecimentos históricos, sendo
Rüsen: a categoria de humanidade e as que o princípio determinante é o da
determinações de sentido “narratividade”, e a filosofia formal da história é
a área que se ocupa de tais questões. Por fim, a
A estratégia de delinear pares terceira dimensão se refere à orientação que o
conceituais com o objetivo de identificar os pensamento histórico exerce na vida prática,
universais antropológicos que condicionam a dando ênfase à formação de identidade, a qual é
possibilidade de histórias foi utilizada também estudada pela filosofia funcional da história
por Rüsen. Ausente em sua trilogia da década (RÜSEN, 2015, p. 114 et seq.).
2
de 1980 , tal estratégia aparece na revisão que o Tais dimensões dizem respeito,
autor fez sobre sua Teoria da História, respectivamente, a conteúdo, forma e função do
publicada já nos anos 2000. O tema é discutido conhecimento histórico, o que nos leva a
na seção destinada ao tratamento da
3
Para mais detalhes sobre esta classificação, é
2
Composta pelas obras Razão histórica, Reconstrução aconselhável a leitura de um artigo de Rüsen
do passado e História Viva. Cf: (RÜSEN, 2001; 2010a; recentemente traduzido e publicado no Brasil. Cf:
2010b). RÜSEN, 2017.
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enxergar nesta tipologia a matriz disciplinar de já foram esboçadas por Koselleck, enquanto as
Rüsen, como se uma parte refletisse o todo: a outras doze são uma contribuição original de
dimensão empírica sintetiza parte dos Rüsen. Esta rede de universais é chamada pelo
princípios de carências de orientação e de autor de “gerador antropológico de
perspectivas orientadoras da experiência do temporalidade”, pois cada uma destas tensões
passado; a dimensão formal sintetiza o representa um desafio de superação aos
princípio das formas de apresentação do indivíduos, dando à existência um caráter
conhecimento histórico; e a dimensão funcional dinâmico e temporal. O autor, diferentemente de
sintetiza o princípio das funções de orientação Koselleck, estabeleceu uma oposição como
existencial. O único princípio não representado sendo o princípio fundante de tal antropologia:
é o dos métodos de pesquisa, situado entre as agir-sofrer. O sofrer diz respeito ao fato do ser
perspectivas orientadoras e as formas de humano nascer em um mundo no qual já existe
apresentação. uma rede de condições, sociais, naturais e
Rüsen encaminha sua análise da biológicas, em constante tensão, influenciando
dimensão empírica a partir da busca por assim a nossa existência. Ao sofrermos tais
elementos antropológicos, que, ao que nos influências, agimos a partir de determinadas
parece, representam uma “estrutura” a partir da condições com o objetivo de compreendê-las e
qual o pensamento histórico trabalha, superá-las, se for o caso. No fundo, a
constituindo sentido das experiências passadas. antropologia de Rüsen se resume ao princípio de
Assim, o autor esboça uma “filosofia da que o homem é um ser de “carência” estrutural,
história em bases antropológicas”, vinculada à já que os meios para satisfazer-se nunca são o
ideia de Koselleck de uma teoria das bastante: o “homem tem de viver, por
“condições de toda história possível”. O autor conseguinte, em meio a uma assimetria
fez uma lista de dezessete tensões às quais todo fundamental entre suas carências e as
grupo social e todo ser humano vive sob: possibilidades de satisfazê-las” (RÜSEN, 2015,
natureza / cultura; centro / periferia; homem / p. 122). Assim, nesta dialética entre exigência e
mulher; idoso / jovem; poder / impotência; agir satisfação, o homem sempre encontra uma nova
/ sofrer; pobre / rico; individualidade / carência após suprir uma antiga, sendo esta sua
sociabilidade; inconsciência / consciência; marca estrutural.
imanência / transcendência; humano / não Outro elemento interessante que Rüsen
humano; bem / mal; acima / abaixo; interno / adicionou à sua antropologia é uma
externo; amigo / inimigo; senhor / escravo; ter “determinação de sentido” presente em todos os
de morrer / poder matar. pares conceituais e que faz com que os homens
Como se vê, as cinco últimas oposições vão além da situação dada. Na oposição
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natureza-cultura, por exemplo, a determinação do autor sobre o político, baseada na oposição


é a busca por “equilíbrio” entre a apropriação e entre amigo e inimigo, é contraposta à dos
a preservação dos recursos naturais. Entre autores iluministas, considerados, também por
acima e abaixo o critério é o de legitimidade da isso, apolíticos (PEREIRA, 2011, p. 261).
diferença social, representado pelo conceito de Algo a ser esperado é o uso do par
“justiça”. Entre homem e mulher pode-se conceitual amigo/inimigo intentando explicitar
deduzir um direcionamento temporal à grupos opostos que concorriam pela tomada e
“igualdade”. A oposição entre rico e pobre manutenção do poder à época, como, por
ganha sentido pela ideia de distribuição justa exemplo, “monarquistas e republicanos”, ou
dos bens econômicos, sintetizada no critério de “absolutistas e iluministas”. Estas seriam o
“adequação”. Por sua vez, a oposição entre “preenchimento” da oposição abstrata,
amigo e inimigo é mediada por critérios de semelhante ao que Koselleck realizaria com a
“paz”. Assim como estes pares conceituais têm análise das assimetrias heleno e bárbaro, cristão
seus critérios de sentido, todos os outros da lista e pagão, humano e não humano. No entanto, em
de Rüsen também possuem algum. seu doutoramento o autor demonstrou uma
É evidente que Rüsen promoveu uma faceta diferente dos pares: ele analisou a crítica
ampliação considerável da rede de universais iluminista diretamente a partir do par
antropológicos estabelecida por Koselleck, amigo/inimigo, concluindo que ela era apolítica
passando de cinco a dezessete. É interessante justamente por operar fora desta oposição,
observar como tais categorias, alegadamente transferindo a política para o campo da moral.
meta-históricas, influenciam o trabalho Poderíamos então, a partir disto, pensar que este
historiográfico realizado pelos autores, caso representa uma espécie de “desvio”, ou
evidenciando a relação entre a teoria da seja, grupos sociais estavam pensando a política
história, então preocupada com as condições “fora” do universal antropológico que determina
universais, e as histórias particulares, pautadas a dimensão do político?
em relatos e vestígios singulares. Pereira faz Mas a pergunta mais importante não
uma análise perspicaz do papel das categorias parece ser esta, mas a seguinte: a oposição entre
universais na obra de Koselleck. Segundo a amigo e inimigo não seria então mais uma
autora, elas desempenham um papel teorização datada, influenciada diretamente pelo
“paradoxal”, pois reclamam para si um caráter contexto histórico de Koselleck? Esse é o risco
extralinguístico, meta-histórico, mas em textos que corre toda teoria com pretensões
historiográficos elas se transformam em universalizantes, especialmente no campo da
elementos de diálogo com as fontes. Este é o historiografia: o de ter suas bases questionadas
caso de Crítica e crise, em que a compreensão pela particularidade das situações históricas.
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Uma análise sobre algumas categorias de Rüsen para uma policêntrica, ou seja, o poder tenderá a
pode enriquecer a nossa polêmica. Dentre as se tornar menos concentrado nos centros de
determinações de sentido listadas pelo autor, irradiação. Rüsen entende que tal tendência já
encontramos a de equilíbrio, relativa à tensão fora formulada por Kant como a representação
entre cultura e natureza, a de policentrismo, de uma “paz perpétua”. Provavelmente o
entre centro e periferia, a de paz, entre amigo e fenômeno da globalização é um dos motivos que
inimigo e a de igualdade entre mulher e leva Rüsen a acreditar que esta tendência de
homem. descentralização do poder político está
Observando atentamente tais categorias realmente em curso. Para além das controvérsias
notamos a carga de contemporaneidade que que esta interpretação possa acarretar, o que vale
elas carregam, ou seja, elas são altamente aqui é ressaltar a influência que o contexto
ligadas ao contexto histórico em que Rüsen histórico particular de Rüsen o fez construir uma
nasceu, viveu e escreveu. Tal fato é bastante rede de “determinações de sentido” baseada nas
compreensivo, tendo em vista que estas especificidades de sua época.
“determinações de sentido” representam a Este exercício realizado por Rüsen, o
evolução histórica sofrida no campo de cada qual Koselleck se isentou, é interessante à
uma daquelas dezessete tensões. As relações de medida que revela um ponto de contato entre a
gênero têm caminhado, através de muita luta, história, representada pelos universais
para o reconhecimento da igualdade entre antropológicos que determinam a condição de
homens e mulheres e pela conquista de direitos sua possibilidade, e as histórias, acontecimentos
por elas. Note-se então que a atribuição desta particulares, com toda concretude que os fatos
determinação de sentido por Rüsen reflete a podem ter. Koselleck nos mostrou uma forma
atualidade de sua experiência histórica. A que essa relação pode assumir: quando conceitos
consciência da necessidade de equilíbrio nas de um momento histórico específico assumem o
nossas relações com o meio ambiente é uma lugar das categorias antropológicas. Este é o
tópico igualmente típico das últimas décadas, já caso das oposições entre bárbaro e heleno ou
que a necessidade da preservação de recursos cristão e pagão, preenchendo o par amigo-
naturais nunca foi tão urgente. Termos como inimigo. Já Rüsen parece ter adicionado outra
“sustentabilidade” e “ecologicamente correto” maneira de evidenciar o particular no universal:
atestam estas preocupações tão típicas de fins suas determinações visam estabelecer o sentido
do século XX. o qual uma certa tensão está tomando a partir de
Quanto à relação entre centro e um ponto na evolução histórica da mesma, e
periferia, o autor enxerga uma tendência de este ponto é o nosso presente, de onde o autor
passagem de uma perspectiva monocêntrica faz suas análises. As determinações de Rüsen
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contém um elemento ético, pois o autor não noção de humanidade, entendida como “recurso
somente identifica que as tensões estão fundamental e uma referência à natureza cultural
seguindo um dado sentido, mas acredita que dos seres humanos na orientação da vida
elas “devem” evoluir assim para que a humana e ao alinhamento desta orientação com
sociedade se torne mais justa e humana. o princípio da dignidade humana. Suas
Assim, quando se trata da tensão entre dimensões empíricas e normativas são ambas
amigo e inimigo, Rüsen pensa na paz como a universais.” A amplitude desta noção representa
determinação de sentido, ao invés de “a unidade da humanidade, bem como a sua
estabelecer conceitos que atualmente manifestação em formas de vida cultural
preencheriam tal tensão, como, por exemplo, diversas e em mudança” (RÜSEN, 2012, p.
“terrorista” e “antiterrorista”. Ao falar da 524). Assim, nas discussões envolvendo cultura
relação antropológica entre natureza e cultura o histórica e ensino de história, fomentadas a
autor evidencia o equilíbrio no uso dos recursos partir do início da década de 1990, Rüsen
naturais como determinação de sentido, ao assinalava a necessidade de uma “didática
invés de tematizar os conflitos que envolvem humanista da história”, comprometida com o
esta questão a partir da tensão entre respeito à pluralidade de culturas e narrativas.
“ambientalistas” e “capitalistas”, para utilizar Quando o autor trata das determinações
uma oposição corrente na vida prática. Ao que de sentido inseridas nas tensões antropológicas
nos parece, a explicação para tal é a de que ele também recorre a uma noção fundamental.
existe uma profunda diferença entre as Justiça, equilíbrio, paz, igualdade,
antropologias de Rüsen e Koselleck, e ela residi policentrismo, legitimidade, entre outras
justamente no fundamento de cada uma delas. determinações – “como sistematizar suas
Poderíamos dizer que Rüsen pensa sua relações?” A solução se encontra na
antropologia a partir da noção de “humanidade”: “na extensão temporal
“humanidade”, enquanto que o que Koselleck intergeracional das formas de vida, é o critério
faz nos parece uma antropologia do “conflito”, superior segundo o qual o campo histórico da
ou seja, suas análises estão, mesmo que nem experiencia é apreendido (melhor dizendo: pode
sempre de maneira explícita, fundamentadas na ser apreendido) materiallmente pela filosofia da
noção de “conflito” como definidor do que é o história” (RÜSEN, 2015, p. 130). A implicação
ser humano. de tal categoria para o pensamento histórico é a
A argumentação de Rüsen é na verdade de que todo o passado deve ser visto como
um esforço para tornar possível o diálogo e o humano “na medida em que se trata do agir e do
entendimento entre as diferentes identidades e sofrer dos homens sob condições não humanas”,
as múltiplas narrativas históricas. Tal elo seria a ou seja, sob condições que foram
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constantemente trablhadas pelo homem visando e menos desumana. Nisto parece residir a
a sua superação. No entanto, deve-se falar em antropologia de Rüsen.
desumanidade quando os fatos passados Já a antropologia histórica de Koselleck,
exigirem tal conotação, para que assim ele não como dissemos, parece girar em torno da ideia
seja camuflado e o estudo histórico seja de conflito. Para o autor, “como Dasein, o
realista. Em suma, “A humanidade, como homem ainda não se abriu ao próximo – eis uma
critério superior de sentido, inspira um modo temática de Löwith – e tampouco se viu livre em
peculiar de consdierar a experiência do sua conflituosidade com seus semelhantes”
passado, que segue esse critério: seria (KOSELLECK, 2014, p. 94). As temporalidades
necessário poder mostrar como as coisas históricas não podem ser “reduzidas a uma
deveriam ter efetivamente ocorrido”( RÜSEN, existência particular”, mas são constituídas
2015, p. 130). necessariamente “pelas relações humanas”.
Humanidade, então, parece assumir um Koselleck inicia a construção de seus pares a
duplo caráter. Primeiro, é a noção essencial partir de uma crítica às categorias
para que haja diálogo e respeito entre os heideggerianas: termos como “assumir o
diferentes, expressando uma relação desejável destino”, “história como destino”, “povo”,
entre contemporâneos. Segundo, ela assume a “morte”, “culpa” e “consciência determinada
forma de um critério normativo na relação do pela antecipação da morte” não foram
presente com o passado, representado pelo suficientemente formulados com cuidado
mote “mostrar como as coisas deveriam ter metodológico a ponto de não darem margem a
efetivamente ocorrido”. Todas aquelas interpretações políticas. Após 1945 tais
determinações de sentido, como paz e categorias não escapariam a uma interpretação
equilíbrio, repousam sobre o critério ideológica, evidenciando anda mais suas
fundamental de humanidade. É importante deficiências.
observar como Rüsen insere movimento em sua Mas a crítica à carga ideológica de tais
antropologia: se humanidade é um critério categorias não é o único ponto a ser notado na
antropológico, as determinações de sentido teoria de Koselleck. É preciso deixar claro que
representam o movimento histórico, na forma não é óbvia a estruturação de uma antropologia
de “evolução”, indicando o sentido que as a partir de pares conceituais, e, no entanto, foi
tensões sociais assumem. Ao que nos parece, as isto o que foi feito por este autor. É significativo
lutas por igualdade, paz, equilíbrio, que, ao iniciar a lista de seus universais,
policentrismo, justiça, representam uma Koselleck elege duas categorias heideggerianas
conquista rumo a uma existencia mais humana, e as contrapõe a outras duas criadas por ele, as
tencionando a partir de tal contraposição. O
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“ser-arremessado” e a “antecipação da morte”, “secreto”, variantes do par anterior, formaram


na ontologia de Heidegger, expressam a um dos principais elementos que estruturaram
finitude da existência humana delimitando-a Crítica e Crise: de maneira explícita na
entre nascimento e morte. O modo como estas dicotomia entre as sociedades secretas,
categorias são trabalhadas fazem referência à especialmente a maçonaria, e o Estado
vida de um indivíduo, isolada de qualquer absolutista; de maneira talvez um pouco mais
contexto. Ao opor estas categorias a outras implícita na relação entre o foro moral privado e
duas, Koselleck muda a perspectiva de análise e a esfera pública. Este é mais um exemplo de
constrói sua antropologia a partir do social, e como os pares de categorias universais se
não do individual. transformam, em obras historiográficas, nos
Ao opor “antecipação da morte” à meios de diálogo com as fontes. O mesmo
“poder matar”, e “ser-arremessado” à ocorreu com a oposição entre amigo e inimigo,
“geratividade”, Koselleck instaura o conflito na como já falamos anteriormente.
sua análise: se em cada existência individual a
morte é um dado biológico inexorável, no plano Antropologia filosófica: pensar o Homem ... e
social a possibilidade de matar é o que a História
possibilita os conflitos e a paz; se nascer é a
condição fundamental para a existência de um As antropologias de Rüsen e de
indivíduo, no plano social a capacidade de Koselleck nos mostram que em toda concepção
gerar filhos e a consequente relação entre de história existe também uma concepção de
diferentes gerações possibilita os conflitos e homem. Pensar a historicidade do ser humano é
diferenças entre os mais novos e os mais pensar “quem”, ou “o quê”, é este ser. As
velhos. categorias que vimos até aqui dizem respeito
A espacialidade do Dasein, que para tanto às condições de possibilidades da história
Heidegger é tão originária quanto o próprio quanto a uma ideia de homem, que, ao que nos
“ser-no-mundo”, foi dividida por Koselleck em parece, para Koselleck é amparada na noção de
um “espaço interior e um espaço exterior”, já conflito e para Rüsen na de humanidade. Na
que “Todas as entidades sociais ou políticas se busca por dados antropológicos, as ideias destes
constituem por delimitação com outras dois historiadores guardam alguma proximidade
entidades.”. O espaço é pensado pelo viés do com a importante corrente da antropologia
conflito, e as categorias de “interno” e filosófica desenvolvida na Alemanha no século
“externo” condicionam noções como fronteira, XX.
divisa e soberania, componentes de uma Vaz define a antropologia filosófica
“espacialidade histórica”. “Público” e como a busca pelo “centro conceptual que
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unifique as múltiplas linhas de explicação do fisiologia, a psicologia, a linguística e outras


fenômeno humano e no qual se inscrevam as áreas, relacionando-as a partir de categorias
categorias fundamentais que venham a fundamentais (GEHLEN, 1993). O autor utiliza
constituir o discurso filosófico sobre o ser do conceitos como os de “ação”, “distanciamento”
homem ou constituam a Antropologia como e “descarga”, capazes de abarcar tanto o aspecto
ontologia” (VAZ, 1991, p. 12). Desde os físico quanto o psíquico. Permeando os diversos
primórdios da sistematização do pensamento temas trabalhados pelo autor, como as relações
filosófico, geralmente situado na Grécia antiga, entre natureza e cultura e a questão da técnica ao
até o século atual, a pergunta sobre “o que é o longo da evolução humana, está o tópico das
homem” ocupa um importante lugar na “instituições”. Aguilera ressalta que, para
especulação filosófica. A procura por Gehlen, “as instituições são os diques que
elementos universais, essenciais e inerentes ao protegem o homem da barbárie, como o
ser humano é o que há de comum entre as casamento protege os cônjuges do pathos
diferentes abordagens que o problema já anímico, objetivando as relações, alienando-as
recebeu. para que o biológico, o econômico e a
O século XX viu surgir uma série de desecendência dominem sobre as pessoas”
pensadores que procuraram desenvolver, cada (AGUILERA, 1993, p. 9).4
um a seu modo, tais questões. Max Schler, Odo Influenciado por Herder, e também por
Marquard, Arnold Gehlen e Helmuth Plessner Nietzsche, Gehlen pensa o homem como um ser
são alguns dos principais nomes da de “carências”, pois não está totalmente
antropologia filosófica alemã contemporânea. capacitado a viver na natureza de maneira tão
Grosso modo, os estudos desta corrente se adaptada como os outros animais, estes já mais
desenvolveram pensando a relação entre cultura harmonizados com o meio ambiente. O ser
e natureza: o ser humano está ligado a esta humano passa a construir seu mundo social a
última através de sua dimensão corpórea e partir da transformação da natureza,
biológica, condicionantes da sua existência; desenvolvendo cultura. Assim sendo, as
mas, o ser humano é portador de espírito, instituições formam aquilo que é necessário para
produtor de cultura e consciente da sua história, garantir entendimento mútuo e convivência
o que o capacita a ir além de sua condição entre os membros de uma sociedade. As normas,
natural. organizações e padrões das instituições
Gehlen afirma que para que a organizam o mundo humano, já que os instintos
antropologia filosófica consiga construir uma não são o suficiente para tal (VERNAL, 2009).
imagem de homem da maneira mais completa
4
As citações em língua estrangeira ao longo do texto
possível, é necessário abarcar a morfologia, a foram traduzidas livremente por nós, com o intuito de
manter a fluidez do texto.
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A instituição é assim um elemento central na sempre a unidade sintética de ambos (o


antropologia de Gehlen. particular e o universal)”. A particularidade dos
Outro importante autor que, apesar de acontecimentos, por exemplo, sequer é um
não ser um expoente da antropologia filosófica, critério suficiente para caracterizar a história em
mas possui alguns temas em comum com ela, oposição à natureza:
foi Ernst Cassirer. Na obra An essay on man,
originalmente publicada em inglês e traduzida Um geólogo que nos oferece uma descrição
das várias camadas da terra em diferentes
para o espanhol como Antropología Filosófica: períodos geológicos nos proporciona um
relato de acontecimentos concretos e
Introducción a uma filosofia de la cultura, o únicos. Esses acontecimentos não podem
repetir-se; nem ocorrer na mesma ordem
autor estrutura suas análises tendo como norte pela segunda vez. A descrição de um
os tópicos da natureza e da cultura. Partindo da geólogo não difere assim da de um
historiador que, como faz Gregorovius, nos
pergunta “que é o homem?” o autor discute conta a história da cidade de Roma na Idade
Média. Mas o historiador não se limita a
alguns elementos fundamentais para a oferecer uma série de eventos em uma
ordem cronológica definida; estes não são
compreensão da existência humana, como, por mais que uma carapaça em que ele busca
uma vida humana e cultural, uma vida de
exemplo, a religião, o mito, a linguagem, a arte ações e paixões, perguntas e respostas,
e, o mais importante aqui, a história. tensões e soluções. O historiador não pode
inventar uma nova linguagem e uma nova
Para Cassirer, o confronto entre o ser lógica para tudo isto, não pode pensar ou
falar sem usar termos gerais, mas ele insufla
e o devir, tematizado pela filosofia desde a em seus conceitos e palavras seu próprio
sentido íntimo e, assim, lhes fornece um
antiga Grécia, é falseado se nos guiarmos pela novo som e uma nova cor, a cor de uma
vida pessoal. (CASSIRER, 1967, p. 161)
convicção em um repouso absoluto ou em uma
mudança absoluta. Consequentemente, a
O mais explícito no trecho acima, e que
história não pode ser entendida simplesmente
resume bem o pensamento de Cassirer, é a busca
em termos de mudança. Citando e fazendo coro
pela síntese entre o universal e particular, que,
com o historiador alemão Jacob Burckhardt,
embora se referindo ao caso específico da
Cassirer entende “a tarefa de historiador como
história, é uma relação que o autor utiliza no
uma tentativa para estabelecer os elementos
trato de todas as outras questões na obra em
constantes, recorrentes, típicos, porque tais
questão. Por um lado o historiador não pode
elementos podem evocar um eco ressonante em
abrir mão de conceitos gerais, a linguagem e a
nosso intelecto e em nosso sentimiento”
lógica utilizadas carregam uma certa carga de
(CASSIRER, 1967, p. 148). É igualmente
universalidade, mas por outro, “uma vida
equivocado acreditar que a história é
pessoal” habita seus conceitos e palavras,
caracterizada pelo recurso à particularidade, em
guardando, certamente, a singularidade de cada
contraposição absoluta às ciências da natureza,
experiência histórica.
referentes à universalidade: “Um juízo é
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Outro ponto interessante na citação interpretação histórica. Assim, é a partir da


acima é a referência à geologia, a qual também relação entre inovação e repetição que Koselleck
foi utilizada por Koselleck na formulação de pensa o tempo histórico, colocando como
uma das suas mais importantes teorias. O autor principal questão a possibilidade de analisar e
fez um paralelo entre as camadas geológicas e expor por estratos as proporções das
os estratos do tempo, evidenciando a combinações entre estas duas dimensões
“simultaneidade do não simultâneo”, ou seja, a (KOSELLECK, 2006).
convivência de diferentes temporalidades que As noções históricas de “atraso” e
influenciam e condicionam as histórias vividas. “aceleração” seriam explicadas a partir destas
Já Cassirer procurou apenas destacar o caráter duas categorias. Se em período histórico ocorrer
único que cada camada geológica possui, cada vez menos repetições e mais inovações,
argumentando que a singularidade de teríamos a sensação de que o tempo está
ocorrências não é um elemento específico da acelerado e a sociedade está em mudança
história. As “coincidências” entre os trabalhos contínua. Mas, quando vivenciamos uma época
destes dois autores vão muito além desta em que as inovações quase não ocorrem, e as
referência à geologia, chamando mais a atenção estruturas de repetição são muito consolidadas,
o trabalho que o autor dos Estratos do tempo temos a sensação de que estamos “atrasados”,
realizou a partir das categorias de “duração” e ou “parados” no tempo. De tal modo, as
“singularidade”, similares à relação entre combinações destas duas categorias, em suas
repouso e mudança, trabalhada por Cassirer. diversas proporções, podem “pluralizar as
Data de 2006 um texto, provavelmente épocas sem cair na determinação por períodos,
um dos últimos que o autor escreveu já que este que nada ou pouco dizem, se eles são ‘antigos’,
é o ano de seu falecimento, no qual Koselleck ‘médios’ ou ‘novos’.” (KOSELLECK, 2006, p.
volta a tematizar a questão dos estratos do 21).
tempo. Segundo o autor, nem a categoria de A partir desta perspectiva, Koselleck
“duração”, entendida como a continuidade do elabora cinco graduações, ou níveis, de
mesmo, nem a de “singularidade”, referente aos estruturas de repetição. Primeiramente temos as
eventos únicos que vão se sucedendo condições extra-humanas, independentes de nós,
diacronicamente, são adequadas, por si e que condicionam a nossa própria existência. O
mesmas, para interpretar a história humana. A cosmos é a grande referência neste nível, já que
natureza humana é estruturada exatamente a possibilita os movimentos dos corpos celestes,
partir da percepção da inovação constante e da responsáveis pelas mudanças dos dias e das
repetição permanente, sendo que apenas um noites e das estações, elementos de suma
destes polos isoladamente é insuficiente para a importância para a nossa noção de tempo. Em
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segundo lugar há o nível das condições da repetição para serem utilizadas. Exemplo
biológicas, muitas das quais compartilhadas disto é a metáfora, recurso linguístico que só é
com os outros animais, como a reprodução, as compreendida e utilizável a partir de
diferenças sexuais, o nascimento e a morte. determinados conhecimentos prévios e de seu
Koselleck situa aqui as oposições entre antes e uso contínuo.
depois, no tocante às mudanças ocorridas na Observando este conjunto de graduações
natureza e nas organizações sociais, acima e apresentado por Koselleck, percebemos a
abaixo, relativa à hierarquia, e dentro e fora, similaridade de sua teoria com a antropologia
referente à organização territorial. O terceiro filosófica. Primeiramente, a abordagem do autor
nível é formado por estruturas de repetição parte dos elementos mais amplos e universais
geradas exclusivamente pelos seres humanos, até chegar aos menos abrangentes e mais
representadas pelas “instituições”. O autor cita específicos. Ao listar condições extra-humanas,
o “trabalho”, o “direito” e a “religião” como dados biológicos, muitos dos quais
representantes das instituições humanas, compartilhados com outros animais, instituições
possibilitadas pela duração e estabilidade de tipicamente humanas, constantes sociais e
dogmas, leis, normas, práticas e concepções. continuidades presentes na linguagem, o autor
As gradações anteriores dizem respeito faz um exercício comum aos filósofos que
às condições sincrônicas de acontecimentos citamos anteriormente, evidenciando, por vezes,
possíveis, os dois outros níveis são reservados os mesmos tópicos de análise. Cassirer afirma
aos pressupostos diacrônicos do curso dos que “a descrição e análise do caráter específico
eventos. A profecia, o prognóstico e o que assumem o espaço e o tempo na experiência
planejamento são utilizados em favor do humana constituem uma das tarefas mais
argumento de que nós só conseguimos imaginar importantes e atraentes de uma antropologia
e planejar o futuro porque existem estruturas de filosófica” (CASSIRER, 1967, p. 40). Neste
repetição as quais nos possibilitam analisar o contexto, o autor expõe a busca humana pela
passado e o presente, procurando por padrões e compreensão do cosmos, fazendo assim uma
constantes que condicionam nossas interessante análise histórica.
experiências. Este nível deixa evidentes as Outro ponto interessante é o destaque
constantes sociais que, em menor ou maior dado à biologia. Para Koselleck o
grau, reaparecerão futuramente. Por fim, “condicionamento biológico é a base de toda
chegamos às estruturas de repetição da antropologia histórica” (KOSELLECK, 2006, p.
linguagem. Enquanto a gramática e a sintaxe se 25), o que deixa em evidência um outro
mantêm estáveis por longo tempo, a semântica elemento estrutural em sua teoria, bem como na
muda rapidamente, mas todas as três dependem de Cassirer e da de Gehlen: a relação entre
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natureza e cultura. Os três autores, cada um a mudanças sociais e culturais, evidenciam a


seu modo, salientam as determinações naturais carga de inovação.
da existência e o trabalho humano de
constituição de cultura a partir da tais Considerações finais
condições. Gehlen e Koselleck apresentam em
comum o uso da noção de “instituição”: para o Nosso ponto de partida se baseou na
primeiro ela é uma forma de “estabilizar” um concepção Koselleckana de uma teoria da
animal inseguro e instável por natureza, história como “teoria das condições de
oferecendo a ele um meio de orienta-se possibilidade da história”, o que remete aos
existencial e socialmente; para o segundo, que dados antropológicos que podem ser
praticamente não desenvolve muito o conceito, encontrados nas histórias. Para Rüsen, uma
ela é uma criação humana que, geração após antropologia histórica é também uma resposta à
geração, oferece normas, regras, ideias, necessidade de encontrar elementos comuns a
diretrizes e práticas a serem adotadas e toda diversidade cultura, possibilitando a
repretidas. Em ambos os casos, de maneira construção de canais de diálogo entre as
sintética, a instituição pode ser entendida como múltiplas identidades nacionais, étnicas ou
uma criação humana, símbolo da capacidade religiosas.
humana de gerar cultura, fornecendo orientação Ficou claro que a busca por dados
para a vida em sociedade. antropológicos é algo que nossos dois autores
A leitura do texto de Koselleck nos analisados têm em comum, e a estratégia de
desperta a questão: as categorias de repetição e identificação de pares conceituais foi utilizada
inovação poderiam tornar-se um par de por ambos. A nossa interpretação é a de que,
universais antropológicos, compondo a lista de apesar da opção em comum pelo uso de pares de
Rüsen e Koselleck? Nos parece que sim, afinal, conceitos, a antropologia histórica destes autores
a percepção temporal e histórica do ser humano é claramente diferente naquilo que as
é fundada na distinção entre um antes e um fundamenta: Koselleck pensa a história e o ser
depois, sendo que a percepção sobre o que humano a partir do conflito; Rüsen se atém à
muda e o que permanece é tão antropológica categoria de “humanidade”, a qual representa a
quanto as categorias de espaço de experiência e unidade dos seres humanos e a possibilidade de
horizonte de expectativa. A relação entre diálogo e convivência, apesar de todas as
duração e inovação se modifica de acordo com diferenças.
o momento histórico, no caso da modernidade,
por exemplo, as constantes descobertas Referências
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