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Almeida I.*, Corte A.**, Rato C.**,Silvestre A.**,Grande M.***, Gil G.***, Martins C.***
* Psiquiatra da Infância e da Adolescência no Hospital Nª Srª do Rosário,SA, Barreiro; ** Enfermeira; *** Educadora de Infância
limitarem a entregar folhetos e efectuar ses- no mundo social no qual nos encontramos
sões de educação sem as adequarem aos co- imersos desde o nascimento.
nhecimentos que as crianças possuem? A família, guardiã do desenvolvimento huma-
Sem querermos ser então demasiado exaus- no, garante não só a sobrevivência física da
tivos e “megalómanos” deixamos aqui a nossa criança, como encerra os ingredientes básicos
perspectiva e contributo relativo a uma inter- para que se realizem as aprendizagens neces-
venção no pré-escolar criando um modelo de sárias à autonomia e à identidade.
articulação (MISE – Modelo Interventivo em
Saúde Escolar) entre os serviços educativos No entanto, existem outros factores, caracte-
e de saúde. rísticas inerentes à criança e contextos em
que se insere a sociabilização (jardim de
1– UMA ABORDAGEM ECOLÓGICA infância, escola, colegas e família), que
Os seres humanos desenvolvem-se e apren- têm influência sobre o desenvolvimento da
dem em interacção com o mundo que os mesma. Pode assim dizer-se, que junto com
rodeia. A criança, quando inicia a educação o património genético, existe uma herança
pré-escolar, já sabe muitas coisas sobre este cultural que condiciona o comportamento e
“mundo”. o desenvolvimento humano.
A área de Conhecimento do Mundo, englobada Se a linha natural do desenvolvimento está
nas Orientações Curriculares para a Educação vinculada aos processos maturativos, a linha
Pré-Escolar, enraíza-se no desejo da criança social e cultural relaciona-se com os proces-
saber e compreender porquê. Neste domínio sos de sociabilização e aculturação, e em es-
são abordados o seu desenvolvimento e os pecial, com a educação e o ensino.
aspectos que se relacionam com os processos
de aprender: a capacidade de observar, o A educação pré-escolar e a escola em geral,
desejo de experimentar, a curiosidade de encerram contextos de aprendizagem diferen-
saber e a atitude crítica. ciados dos da família, definidos por regras
Alguns dos temas transversais, enunciados de interacção, padrões de comportamento
na Área da Formação Pessoal e Social, como e códigos necessários à comunicação, de
por exemplo, a Educação para a Saúde e a forma, a que a criança ao integrá-los, possa
Educação Ambiental, relacionam-se directa- relacionar-se com o outro alcançando um
mente com o Conhecimento do Mundo. bem estar somatopsíquico e social.
Assim, para que a mensagem educativa seja
Uma das grandes metas do desenvolvimento interiorizada, o educador deve não só conhecer
humano é conseguir uma integração efectiva o processo evolutivo, suas leis e princípios
suas relações sociais. Os educadores e a es- ção, o pensamento estático, a não reversi-
cola em geral, para além de definir padrões de bilidade, os pré-conceitos e já no final o pen-
interacção na sala, devem proporcionar um samento intuitivo. A criança revela uma in-
ambiente favorável ao processo de aquisição, capacidade de se descentrar, de pôr-se
compreensão e desenvolvimento das capaci- no lugar do outro. Tem uma apreensão
dades sociais. As necessidades, sentimentos, global das situações e associa numa lógica
predisposições e comportamento das crian- aparente elementos que não estão ligados.
ças variam, pelo que tratá-las todas da mes- Atribui à realidade características subjectivas
ma forma seria injusto. Um ambiente social (realismo), e atribui características de seres
saudável é aquele em que as diferenças e vivos a objectos (animismo). Ela raciocina
necessidades individuais das crianças rece- de maneira unidimensional e o pensamento
bem uma resposta que denota igual preocu- intuitivo existe ainda numa dependência das
pação e respeito. Olhar a criança, como percepções.
indivíduo, devolve-lhe o sentimento de ser
compreendida e respeitada. A linguagem, quer a capacidade verbal quer
a forma e o conteúdo como os pensamentos
2.1 - A CRIANÇA EM IDADE PRÉ-ESCOLAR são formulados, permitem à criança ser
A criança em idade pré-escolar encontra-se ouvida e compreendida pelo outro. A lingua-
no período pré-operatório que se inicia no gem e o seu desenvolvimento, jogam assim,
fim do segundo ano e termina por volta dos um papel importante na relação que a cri-
7-8 anos, segundo Jean Piaget 4 (1977). ança estabelece com o mundo à sua volta, o
As competências sociais, afectivas, psicomo- modo como organiza o pensamento e como
toras e linguísticas, interligam-se numa constrói as representações do corpo, aceden-
malha de progressiva complexidade e equilí- do à aprendizagem.
brio necessário à maturação cognitiva que
permitirá a escolarização. As crianças em idade pré-escolar experimen-
tam uma diversidade de dificuldades sociais
A grande conquista neste período é o aces- que podem ter inúmeras causas subjacentes.
so à função simbólica que a criança vai A criança, ainda em grande dependência
desenvolver através de diferentes condutas: a dos pais e adultos, conjuntamente com a
imitação diferida, o jogo simbólico, o desenho, dificuldade em expressar os seus sentimentos
as representações mentais e a linguagem. O e desejos, bem como as razões da suas prefe-
pensamento da criança nesta fase está mar- rências e /ou dos seus direitos, poderá tender
cado por limites: o egocentrismo, a centra- ao isolamento, ou incapaz de mentalizar con-
• Conteúdos:
Conceitos Procedimentos Atitudes
Conhecimento do seu corpo Partir do que a criança Incentivar descobertas no próprio
e a importância do seu equi- conhece e sente para a desco- organismo e na natureza;
líbrio para o bom funciona- berta do seu organismo e do Relacionar conhecimentos que
mento. equilíbrio que ele estabelece já se têm com os conhecimentos
com o meio envolvente: acabados de adquirir;
vestuário, alimentação, higiene.
Motivar a criança à aquisição
de novos hábitos ou alteração
de hábitos anteriores.
• Necessidades: • alimentação
As necessidades das crianças em idade pré- • afecto
escolar no âmbito da saúde escolar prendem- • competência social
se sobretudo com as necessidades básicas de • segurança
qualquer ser humano: • higiene
A alimentação é igualmente rotina do jardim tos, projecção por falta de cinto de segurança),
de infância, para que as crianças desde cedo será pois uma tarefa a ter em conta já que o
adquiram bons hábitos alimentares, impli- meio envolvente deverá ser facilitador de
cando estratégias e actividades cujo objectivo descobertas, mas muitas vezes é permissivo e
é: desatento à capacidade quase genial com que
• aquisição de regras sociais; a criança se expõe a situações de risco.
• conhecer os alimentos;
• promover hábitos alimentares saudáveis; No entanto, existem outras situações de risco
• ensinar a criança a beber água. não menos perigosas, mas que aparecem
É necessário facultar à criança saberes, que dissimuladas, para as quais é necessário
lhe permitam contactar e conviver diaria- alertá-los:
mente com condições adversas, sem que se • evitarem desconhecidos;
verifiquem prejuízos para a sua saúde ou • saírem de perto dos pais;
para o seu desenvolvimento. O equilíbrio que • deixarem mexer no seu corpo;
se desenha entre o papel activo que a criança • fazerem favores a desconhecidos;
desempenha na sua interacção com o meio A educação para a saúde e higiene fazem
e as condições favoráveis que o mesmo lhe parte do dia a dia do jardim de infância,
devolve, estabelece o binário necessário à onde a criança terá oportunidade de cuidar
aprendizagem e desenvolvimento. Também da sua higiene e saúde e de compreender as
aqui, e como vimos referindo, a experiência razões porque lava as mãos antes de comer,
social é decisiva. No conhecimento do se agasalha no Inverno, usa roupa mais
corpo, na construção do esquema corporal, leve quando está calor, porque deve comer
não bastam a maturação neurológica e a horas certas e porque não deve abusar de
sensorial. Na realidade, antes de passarmos determinados alimentos.
a conhecer o nosso corpo conhecemos o do Estas questões podem levar à mobilização de
outro. O desenvolvimento de habilidades determinados conhecimentos sobre:
motoras facilita a exploração do meio e das * o conhecimento do corpo e cuidados a ter
interacções que a criança estabelece com o com ele;
seu corpo. • funcionamento do corpo;
• higiene oral;
Sensibilizar a criança para situações conside- • peso e crescimento;
radas perigosas, tais como os acidentes do- • importância da vacinação;
mésticos (quedas, envenenamentos, queima- • características que distinguem os alimen-
duras) e acidentes rodoviários (atropelamen- tos.
ARS DGE
U.I.S.E.
(Unidades Interventivas em Saúde
Escolar/Equipas alargadas)
COMUNIDADE
plano coordenador efectivo entre ambos os ção ao contexto analisando as suas caracte-
ministérios, o qual se concretize na aplica- rísticas de modo a aproximar sempre a Escola
bilidade do Programa de Saúde Escolar. e os Serviços de Saúde, UNINDO UM POUCO
Vive-se actualmente num momento de car- MAIS A COMUNIDADE NO ÂMBITO DA SAÚDE
ência de um modelo de intervenção que real- NA ESCOLA.
mente responda às necessidades de saúde
da nossa população em idade escolar. Sendo Quer as instituições de saúde, quer as
assim denota-se “um esgotar” da capacidade instituições educativas fazem parte de uma
interventiva dos moldes actuais, justificando- comunidade, não podendo estas trabalhar
se cada vez mais um repensar nas práticas de à margem dela. Há então que adoptar uma
saúde e educativas. posição de consciencialização da realidade
Decorrente desta necessidade e de um mo- numa perspectiva de saúde da comunidade
delo geral de intervenção em saúde escolar educativa. Reportamo-nos então a uma
em que estes dois serviços coexistam com mudança não só de práticas mas também
objectivos comuns, promovemos a geminação de atitudes de todos os membros da equipa
conceptual e metodológica DE UMA UNIDADE pluridisciplinar que actua nesta possível uni-
EM SAÚDE ESCOLAR, fundamentada num dade de saúde escolar. Todos em conjunto
conceito sistémico e pluridisciplinar de inter- com uma atitude mais positiva, utilizando
venção, exigindo uma grande proximidade os seus recursos favorecendo a autoestima, o
entre a equipa de saúde escolar e os sistemas autoconceito e o desenvolvimento pessoal da
próximos em que a criança e a sua família se população escolar.
enquadram - A Escola, o Centro de Saúde, a
Comunidade num sentido mais amplo. Assim No âmbito deste modelo, os diferentes ele-
antes demais há que fazer um diagnóstico de mentos da equipa de saúde escolar neces-
uma comunidade educativa, quais as suas sitam de estruturar e definir estratégias de
necessidades em termos de saúde, compre- intervenção de uma forma dinâmica, consi-
endendo o contexto institucional, quer o edu- derando-se que cada elemento é um recurso
cativo, quer o de saúde. complementar para um fim comum, isto é,
Quando se tenta percepcionar esta realidade, para atingir os objectivos do modelo. Para
nunca o poderemos fazer prescindindo do que haja complementaridade na intervenção
contexto comunitário em que estas institui- é indispensável a definição e articulação das
ções estão inseridas, dos seus problemas e actividades a desenvolver por cada um dos
recursos. Portanto o primeiro ponto de qual- intervenientes (serviços educativos, sociais
quer estratégia de articulação, é a aproxima- e da saúde).
Isto implica que a equipa técnica formalize têm de assumir juntos e em parceria o
por escrito linhas orientadores (GUIDELINES) trabalho no “comportamento quotidiano”
da acção a desenvolver: das nossas crianças e jovens. Este sim, é o
- Estabelecer uma rede entre os serviços de grande desafio para os serviços que servem
Saúde/ Jardins de Infância e a comunidade a comunidade educativa. Há efectivamente
para a implementação das actividades rela- uma necessidade de reorganização das
cionadas com a prevenção e promoção da estruturas que participam no processo de
saúde. implementação do programa de saúde esco-
- Definir os objectivos e respectivos critérios lar, não é uma necessidade formal, mas sim
de avaliação. uma necessidade real.
- Apoiar e supervisionar a implementação do Há que aprender a trabalhar juntos e há que
programa de saúde nas escolas. dar a todos e a todas as instituições a mesma
- Criar protocolos de actuação e normas de pro- responsabilidade e a mesma oportunidade
cedimento que facilitem a articulação entre na proposta de dar mais e melhor saúde nas
os vários intervenientes da equipa técnica, nossas escolas.
por forma a determinar a intervenção de
cada um, desde o planeamento passando 5 – CONCLUSÃO
pela execução e terminando na avaliação. A criança em idade pré-escolar tem um co-
- Criar um fluxo de informação eficaz entre a nhecimento amplo e articulado do mundo
criança/família/escola/equipa técnica. que é adquirido desde muito cedo em contacto
- Incrementar ligações protocolares com ser- com a rotina diária de actividades e a interac-
viços de saúde comunitários de forma co- ção permanente com os objectos e as pes-
ordenada e integrada e outras instituições e soas. A inserção da criança num mundo de
serviços implicados no processo de actuação experiências enriquecedoras, tal como conce-
da equipa. bemos o jardim de infância, contribuirá
- Definir um elemento da Comunidade para a eficácia das aprendizagens através da
Educativa que sirva de elo de ligação entre motivação, do envolvimento e da familiaridade
a criança, a família, a escola e a equipa com o material de aprendizagem, permitindo
técnica. através do conhecimento que o educador tem
- Elaborar projectos de intervenção espe- de cada criança, uma melhor “performance”
cíficos para os vários contextos educativos das suas competências.
abarcando a área de influência da equipa.
A melhoria da qualidade de vida das popu- Ainda assim, a criança dependente do seu
lações é uma tarefa de todos, e nunca acabada, meio envolvente, encontra-se sujeita a facto-
por isso serviços de saúde e de educação res de risco, que desencadeiam os mecanis-
em plena mutação, e como este processo é 3 - MOREIRA, P. “Para uma prevenção que
um continuum na existência do homem, previna”. Coimbra. Quarteto Editora, 2001
serve para todos nós, (intervenientes no meio 4 - PIAGET J., ”Seis estudos de psicologia”,
escolar ) como máxima o seguinte: Lisboa, Publicações D. Quixote, 1977
Intervir na Escola de modo a assegurar 5 - Diário da República, Dec.-Lei n.º 240/2001
um espaço e um tempo privilegiados, de 30 de Agosto (anexo 1)
simultaneamente de Educação e de Pro- 6 - SILVA, I., “Orientações Curriculares para a
moção de Saúde será sem dúvida a Educação Pré-Escolar”, Lisboa, Ministério
finalidade da Saúde Escolar. É neces- da Educação, 1997
sário que cada vez mais todos nós con-
tribuamos para que: “as pessoas, desde a 7 - STANHOPE, M., LANCASTER, J. “Enferma-
infância até ao fim da vida possuam um gem Comunitária - Promoção da Saúde de
conhecimento dinâmico do mundo, dos Grupos, Famílias e Indivíduos”, Lisboa:
outros e de si mesmas”. Lusociência, 1226 p., 1999
8 - DELORS, J. et al. “Educação – um tesouro
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS a descobrir”. 5.ª Ed. Porto: Edições Asa,
1 - NAVARRO, F., “Modelos de Intervenção 77-78p., 1999
em Saúde na educação pré-escolar e nos 9 - NATÁRIO, Emília - A Escola promotora
ensinos básico e secundário. In simpósio: de saúde - conceito e princípios de inter-
”A educação para a saúde. O papel da venção. “Promover a Saúde Na Escola.
Educação Física na promoção de estilos de Texto de Apoio n.º 1”. Lisboa: Direcção-
vida saudáveis”. Lisboa. Escola Superior de Geral da Saúde, Direcção de Serviços de
Comunicação Social, 5 de Dezembro1995 Saúde Escolar e Ocupacional, Núcleo de
2 - FORMOSINHO, J.; KATZ , L.; MCCLELLAN, D.; Saúde Escolar, 1993, 14 p.
LINO, D. (2001) - “Educação Pré-Escolar - A
construção Social da Moralidade” - Lisboa
- 3ª Edição. Texto Editora, 2001.
ANEXOS
ANEXO I • conhecer as diferenças entre alimentação
individual e colectiva
ÁREAS TEMÁTICAS – • reconhecer a interacção da alimentação e
OBJECTIVOS PEDAGÓGICOS desenvolvimento emocional
• identificar os hábitos alimentares, a influ-
A – SAÚDE, EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE ência social e cultural
• reconhecer o papel da alimentação na saú-
• construir o conceito de saúde, educação e de. As escolhas, a influências dos mass
educação para a saúde media, pares e família
• definir os objectivos gerais da educação • reconhecer o interesse sobre a intervenção
para a saúde sobre as opções alimentares os processos
• explorar as vantagens da aprendizagem de produção e o ambiente.
participativa no contexto de educação para
a saúde. 2. A Saúde Oral
• conhecer a prevalência da cárie dentária
B – PROMOÇÃO DA SAÚDE. EVOLUÇÃO DO
em meio escolar no nosso país
CONCEITO. ESTRATÉGIAS
• reconhecer o papel das medidas de pre-
• clarificar a expressão “promoção da saúde” venção da cárie dentária
e as suas implicações. • conhecer o papel activo do educador na par-
• Clarificar a expressão Escola Promotora da ticipação no Programa de Saúde Oral na
Saúde e as suas possíveis implicações na DGS
educação para a saúde na escola • Treinar as competências para a adminis-
• Identificar medidas favoráveis à construção tração de flúor em meio escolar
de um clima favorável à promoção da saú- • Conhecer as recomendações e orientações
de. em saúde oral.
• Construir e avaliar programas de Educação
3. Os Acidentes. Prevenção de acidentes. Pri-
para a Saúde/Promoção da Saúde.
meiros socorros
• reconhecer a dimensão do problema dos
C – SAÚDE DA CRIANÇA
acidentes
1. Alimentação • identificar situações de risco de acidentes
• conhecer as bases da alimentação saudável domésticos, lazer, rodoviário e escolar
• conhecer as necessidades alimentares re- • desenvolver atitudes preventivas
comendadas • explorar os manuais de educação rodoviária