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FUNDAMENTOS LÓGICOS DA CONTABILIDADE

Flávio Dias dos Santos Correia

I - NOÇÕES PRELIMINARES

Origem; Definição; Caracterização científica; Objeto de estudo; Objetivo;


Finalidade; Campo de aplicação; Classificação; Técnicas; Usuários; Áreas de
Atuação dos Profissionais da Contabilidade

O que hoje denominamos de Contabilidade teve suas origens quando o homem


necessitou controlar seus pertences. Ao longo dos séculos as ações humanas sobre a
natureza tornaram-se cada vez mais intensas, concorrendo para aumentar e diversificar
os recursos à sua disposição, requerendo a formação de complexos institucionais que
hoje denominamos de empresas, associações, sociedades, entidades e outros, ou seja,
células sociais. Tal complexidade passou a exigir cada vez mais a ação de um
instrumento controlador da riqueza vinculada a esses complexos.

Vestígios de controles dos pertences humanos foram encontrados nas paredes das
cavernas por meio de inscrições e assim interpretadas por especialistas em arqueologia.
Em todo o tempo durante os séculos passados de desenvolvimento das civilizações
humanas, esses registros encontrados em ossos, chifres, pedras, tabletes de cerâmica,
madeira, pergaminho, papiro e papel, contam uma história da evolução de um sistema
de controle da riqueza vinculada ao homem, culminando com a estruturação de uma
ciência denominada Contabilidade, assim caracterizada, a partir do século XVIII.

Esta denominação “Contabilidade” se deve às idéias dos primeiros doutrinadores


“contistas”, que iniciaram com uma publicação de Nicolo D’Anastasio em 1803. Tais
doutrinadores concentraram seus estudos nas “contas”, o que dava a idéia de que a
Contabilidade tinha o seu foco no estudo dos fatos ou das contas, já que as contas
exprimiam a essência dos fatos. O conjunto dessas contas formava o livro Razão, daí o
termo contabilidade em italiano ser Ragioneria, pois, razão, em italiano é ragione,
proveniente do latim Ratio.

“Visto que a razão de ser de uma coisa é sua essência necessária ou substância expressa
na definição, assume-se às vezes por ‘razão’ a própria substância ou a sua definição.
Este é um significado frequente na filosofia aristotélica ou nas correntes nela
inspiradas.” (ABAGNANO, 2000, p. 824)

Valendo-se do raciocínio aristotélico, Lopes de Sá (2000, p. 10 e 11), caracteriza a


conta, modernamente, como “um registro complexo, de fatos patrimoniais” e afirma que
a mesma reúne essência (objeto, finalidade, dimensões) e forma (título, histórico,
cronologia, causa, efeito e saldo).

Para dar uma ideia prática do que é e, como funciona a Contabilidade, pode-se dizer que
trata-se do processo de elaboração de uma representação do patrimônio, ou seja, da
riqueza, recursos vinculados às células sociais, de forma que se possa vislumbrar os
seus mais diversos aspectos, valores, evolução, tendências etc., e, a fazer as
interferências cabíveis e necessárias, para o cumprimento eficaz dos propósitos de tais
células.

Para melhor entender esse processo de elaboração de uma representação, poder-se-ia


comparar a Contabilidade com a Engenharia, pois esta, por meio de seus estudos, ao
elaborar plantas de uma edificação, apresenta, por meio delas, os mais diversos aspectos
da edificação, permitindo uma visão clara do número de cômodos com suas medidas,
janelas, portas, rede de energia elétrica, rede hidráulica e de esgotos, dentre outros. Tais
plantas não são a edificação, mas a representam. Assim o faz a Contabilidade quando
empreende seus estudos sobre o patrimônio e elabora os relatórios reveladores dos mais
diversos aspectos do mesmo.

Atualmente pode deduzir-se que Contabilidade é a ciência que estuda o patrimônio das
entidades econômico-administrativas, objetivando o controle. Esta área do
conhecimento humano é caracterizada por alguns autores como uma arte, por outros
como uma técnica e ainda como uma ciência.

“O I Congresso Brasileiro de Contabilidade, realizado em setembro de 1924, aprovou a


seguinte definição: Contabilidade é a ciência que estuda e pratica as funções de
orientação, controle e registro relativos aos atos e fatos da administração econômica.”
(D’ÁURIA, 1953, p. 69)

“Contabilidade – Ciência que estuda os fenômenos patrimoniais sob o aspecto do fim


aziendal; é a ciência que tem por objetivo estudar o sistema da riqueza administrativa a
fim de observar se ela atinge os fins propostos pelo sujeito aziendal.” (LOPES DE SÁ,
1983, p. 80)

“A Contabilidade é, objetivamente, um sistema de informação e avaliação destinado a


prover seus usuários com demonstrações e análises de natureza econômica, financeira,
física e de produtividade, com relação à entidade objeto de contabilização.” (FIPECAFI,
2003, p.48)

“Contabilidade é uma arte. É a arte de registrar todas as transações de uma companhia.


E é também a arte de informar os reflexos dessas transações na situação econômico-
financeira dessa companhia.” (GOUVEIA, 1976, p. 1)

Para que a contabilidade seja praticada nas entidades econômico-administrativas e


alcance seus fins, não importa muito se ela seja considerada arte, técnica ou ciência. No
entanto, para que se tenha um entendimento racional, que proporcione o
desenvolvimento de ações conscientes e, por conseguinte, eficientes na busca da
eficácia, faz-se necessário tal discernimento, ou seja, considerar a Contabilidade,
fundamentalmente como uma ciência. Este pressuposto tem a ver, também, com aqueles
que tratam da concepção de teorias concernentes à criação de novos meios, técnicas,
métodos de aplicação da contabilidade para torná-la mais eficaz.

Nós a definimos como ciência pelo fato da Contabilidade constituir-se um estudo


sistemático do patrimônio das entidades econômico-administrativas, que é o seu objeto
de estudo; por exigir, para este estudo, o uso de métodos e técnicas próprios; estar
fundamentada por princípios específicos constatados universalmente; por ter sido
estruturada a partir de práticas, teorias, hipóteses, onde se vê correntes de pensamentos
que, ao longo de séculos e ainda hoje discutem, apresentando suas lógicas e
fundamentações para comprovar epistemologicamente suas idéias; por possuir a
qualidade da essencialidade e da aplicabilidade; dentre outros.

Já que a contabilidade é a CIÊNCIA QUE ESTUDA O PATRIMÔNIO, logo, analisando


sintaticamente esta oração, chega-se a uma conclusão:
Ciência ou Contabilidade é o sujeito
Estuda é o verbo transitivo direto
Patrimônio é o objeto direto

Assim, se o verbo é a ação do sujeito. A ação de estudar é desenvolvida pela ciência


contábil sobre o objeto, que é o patrimônio das entidades econômico-
administrativas. Por isso é que se afirma ser o patrimônio o objeto de estudo da
Contabilidade, ou simplesmente, o objeto da Contabilidade.

A ação de estudar, se desenvolve quando a Contabilidade processa a apreensão;


classificação; avaliação; registro dos fenômenos ou fatos que se realizam no patrimônio,
provocando aí mudanças qualitativas e/ou quantitativas; elaboração de relatórios,
exposição do estado patrimonial, ou seja, da condição em que se encontra o patrimônio.
Para constatar situações específicas de aspectos financeiros, econômicos, patrimoniais, e
outros, os relatórios são também submetidos a análises. Tais relatórios podem ser
também auditados, para se constatar a sua autenticidade ou veracidade. Por isso,
registrar, demonstrar, analisar, auditar, constituem o que se chamou de estudar, ou
seja, a ação da Contabilidade sobre seu objeto.

A expressão patrimônio aziendal, patrimônio da entidade econômico-administrativa,


empresa ou azienda, como é ressaltado pelos diversos autores da área, é simplesmente
para diferenciar da generalização utilizada para o termo patrimônio, com um significado
amplo, identificando-o não só como recursos materiais, mas também como recursos
humanos, inteligência, conhecimento etc.

Entidade, empresa, azienda, citadas anteriormente, podem ser caracterizadas como um


complexo formado pelo conjunto de recursos materiais (objetivos), pessoais
(subjetivos), com finalidade econômica, independente de ser lucrativa ou ideal,
buscando sempre a satisfação das necessidades humanas.

Desse conjunto, o que estamos denominando de patrimônio da entidade econômico-


administrativa e, portanto objeto de estudo da contabilidade, é o recurso material, ou
seja, aquele que pode ser representado monetariamente, ou simbolizado e, portanto,
quantificado por moeda.

O objetivo desta ação da contabilidade sobre o patrimônio das entidades é o controle.


Pois, com este estudo a contabilidade cria uma representação do patrimônio físico por
meio de registros, ou seja, palavras, números, que se materializam nas contas,
facilitando uma visão total ou de partes do patrimônio, num plano resumido, permitindo
as mais diversas análises para constatar suas condições, seus aspectos, suas
possibilidades de cumprimento dos propósitos pré-determinados.

O campo de aplicação da contabilidade é a entidade. Pois aí está o patrimônio que


constitui o seu objeto de estudo. O resultado dos estudos empreendidos pela ciência
contábil são aplicados, não apenas no gerenciamento da própria entidade, como também
partilhados com outros usuários carentes dessas informações. Tais estudos não geram
apenas registros e demonstrações contábeis, mas também, e, com base nelas, análise de
custos de produção; elaboração de preços de venda; cálculos dos mais diversos
indicadores econômico-financeiros como rentabilidade, liquidez, rotatividade, ponto de
equilíbrio, alavancagem operacional e financeira etc.; planejamento tributário, de
vendas, de produção etc.; e outros. Os administradores utilizam as informações geradas
pela contabilidade para suas tomadas de decisões no gerenciamento da própria entidade
e os outros usuários, na satisfação das suas necessidades.

Conforme a natureza do campo de aplicação, isto é, das entidades, a contabilidade aí


aplicada pode ser classificada como Contabilidade Pública ou Contabilidade Privada.
Se o sujeito proprietário da entidade for o estado, então ela é pública; se o sujeito não
for o estado, ela é privada.

Conforme a ramo de atividade do campo de aplicação, isto é, se a entidade desenvolve


sua atividade no setor comercial, industrial, bancário etc., então a contabilidade pode
denominar-se Contabilidade Comercial, Contabilidade Industrial, Contabilidade
Bancária, Contabilidade Securitária, Contabilidade de Cooperativas, Contabilidade
Rural etc.

Na aplicação prática da contabilidade, as técnicas básicas utilizadas para consumar seus


fins, são as seguintes:

Escrituração Contábil – Trata-se do processo de registro dos fatos contábeis. Todos os


fenômenos que provocam alterações quantitativas (que modificam o valor real da
riqueza patrimonial, isto é, o seu valor líquido) ou qualitativas (que não modificam o
valor real da riqueza) no patrimônio da entidade devem ser registrados, pois só assim
poderá ser assegurada uma representação real do patrimônio.

Demonstrações Contábeis – É a exposição sistemática dos resultados do registro dos


fatos contábeis. As demonstrações são a base para as informações necessárias a um
gerenciamento eficiente, pois são elas que possibilitam as análises acerca dos diversos
aspectos patrimoniais.

Análise de Balanços – Define-se como a decomposição, comparação e interpretação


das demonstrações contábeis. As demonstrações contábeis devem ser segregadas em
suas partes mais simples para que, ao serem estas comparadas, possam prover
informações detalhadas sobre o estado e aspectos do patrimônio da entidade, a saber, a
viabilidade operacional, lucratividade, liquidez etc.

Auditoria Contábil – Trata-se da constatação da veracidade das demonstrações


contábeis. O trabalho desenvolvido pelo ser humano é passível de distorções
propositadas ou involuntárias. A auditoria contábil pretende, por meio de amostragens,
verificar se as demonstrações contábeis espelham a realidade do patrimônio da entidade,
apresentado por elas, considerando os princípios contábeis e a legislação pertinente.

À medida que os empreendimentos humanos na área econômico-financeira vão se


tornando mais complexos, mais indispensável torna-se a presença da ciência contábil na
provisão das mais diversas informações necessárias para que a gestão destes seja
empreendida com eficiência. Os principais interessados nos resultados dos estudos
elaborados pela contabilidade são os Sócios ou Proprietários, Administradores, Governo
ou Fisco, Instituições Financeiras, Investidores, Fornecedores, Clientes, Empregados,
Comunidade em geral etc.

O Bacharel em Ciências Contábeis, segundo sua aptidão ou especialização poderá


desenvolver suas funções, com vínculo empregatício ou como profissional liberal
autônomo, sendo Contador, Auditor contábil ou fiscal, Perito contábil, Consultor,
Árbitro, Professor etc.

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