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TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. 3ª ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2010. cap.
6. p. 73-82

Destoando de sua produção predominantemente formalista, o filósofo e crítico


literário franco-búlgaro Tzvetan Todorov, escreve A literatura em perigo. O autor,
que voltou a maior parte de seu trabalho em crítica literária à análise das estruturas
narrativas, como nos livros As estruturas narrativas, Poética da prosa e Introdução à
literatura fantástica, mostra em A literatura em perigo arrojo e desprendimento ao
seguir por uma linha diversa da até então percorrida.

O impacto da literatura na formação acadêmica e pessoal dos indivíduos e


sua importância na sociedade em geral são abordados com simplicidade de
linguagem e pertinência por Todorov em A literatura em perigo. O livro está dividido
em sete títulos nos quais o autor propõe, entre outras coisas, uma renovação da
abordagem da literatura no ambiente cotidiano e, sobretudo, escolar. Um dos títulos
que mais se dedica a convidar o leitor a se atentar às possibilidades que a literatura
traz é o penúltimo: O que pode a literatura? É este título em específico que
analisaremos, de forma resumida, a seguir.

Todorov inicia o título O que pode a literatura? citando exemplos de impactos


reais que esta causou na vida de figuras públicas (no caso, o filósofo e economista
John Stuart Mill, a escritora Charlotte Delbo e o próprio autor). A literatura fora
importante na cura de uma depressão de Mill, na estadia de Delbo em Auschwitz e
na travessia por dias de desgosto por Todorov.

O autor ressalta que a literatura tem não somente o poder de trazer


vislumbres de esperança a períodos de depressão, estreitar os laços humanos,
proporcionar ao leitor melhor compreensão de mundo e qualidade de vida, como
também o poder de transformar o indivíduo a partir de seu próprio interior. Neste
momento, Todorov critica a ideia que muitos professores, críticos e até escritores
defendem de que a literatura é puramente autorreferencial e celebra o leitor que
ainda se permite procurar na literatura sentidos para sua própria vida.
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O autor compara, então, a literatura à psicologia, sociologia e filosofia. Todorov


ressalta que, embora circundem a mesma matéria, isto é, a experiência humana, a
literatura o faz de modo diferente das outras áreas. Enquanto a filosofia, por
exemplo, preocupa-se em estabelecer conceitos e blocos de ideias gerais
geralmente expressos por abstração e de maneira exata (ao menos até que se
prove, cientificamente, o contrário), a literatura traz esses conceitos e blocos de
ideias implícitos em si mesma e com riqueza de detalhes através de seus enredos,
personagens e abordagens. Nas palavras do autor, “a obra literária (...) abala nosso
aparelho de interpretação simbólica” (p. 78). Para Todorov, essas diferenças fazem
com que o texto literário seja, normalmente, mais compreensível por leitores
variados que o texto filosófico, que atinge melhor os leitores habituados a esse tipo
de leitura. Em suma, enquanto a filosofia expõe uma tese, a literatura convida o
leitor a ser mais ativo em seu contato com o texto.

O autor passa, então, a questionar a ideia de que o pensamento do indivíduo


deva se formar sem influências e que, como defendia a filosofia socrático-platônica
por exemplo, o indivíduo se afaste de textos literários a fim de que seu pensamento
se forme autonomamente e não sob o manto de outras ideias. Entretanto, Todorov
afirma que ideias chegam ao indivíduo não só pela literatura: “a televisão já passou
por lá" (p.80). Neste sentido, o autor afirma que a literatura pode representar ajuda
real ao indivíduo na busca por verdades e significados. Todorov afirma, ainda, que
por não estabelecer parâmetros ou teses a ser seguidos ou em que se acreditar
(como o fazem a religião, a política e a moral), a literatura tem mais facilidade de
alcançar o leitor neste aspecto que textos filosóficos ou científicos teriam.

O autor aborda, em seguida, pesquisa do filósofo Richard Rorty, que propõe


que as transformações realizadas pela literatura têm menos a ver com a descoberta
de uma “verdade” que com minimização do individualismo do ser humano atual.
Segundo o que propõe Rorty, a grande contribuição da literatura reside na
possibilidade de ligação entre os indivíduos, a alteridade, a ampliação de horizontes
de contato humano provocados pela interação entre o leitor e o personagem
(sobretudo quando apresentam diferenças pontuais entre si). "O horizonte último
dessa experiência (a leitura) não é a verdade, mas o amor, forma suprema da
ligação humana" (p. 81).
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Por fim, Todorov questiona se é realmente necessário definir o que ele chama
de "compreensão ampliada do mundo humano" (p. 81) provocada pela literatura
como a retificação de nosso individualismo, como propõe Rorty, ou como a
descoberta de verdades. Todorov conclui que a resposta a esse questionamento
não tem muita importância, desde que se aceite a relação intrínseca entre mundo e
literatura, bem como a contribuição do discurso literário em face do discurso
abstrato. Fazendo um paralelo entre a importância da literatura como meio eficaz de
compreendermo-nos enquanto indivíduos e a relação precária do mundo atual com a
literatura, Todorov ressalta a importância de todos os textos literários como forma de
acesso à literatura para que o leitor possa construir sua “primeira imagem coerente
do mundo” (p. 82), em detrimento de quaisquer possíveis preconceitos literários. O
autor conclui este título afirmando que, conforme as leituras avançam em
complexidade, avançam também as referidas imagens de mundo do leitor.

Por/by: Paola Cristina Ribeiro MARCELLOS

(Letras Inglês/IFB)

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