Você está na página 1de 8

FAPERJ/Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Projeto: “Narrativas nos livros didáticos de história tradições e rupturas”.


Bolsa de Iniciação Científica
Processo: E-26/201.946/2018
Matrícula: 201620518711
Relatório Final
Bolsista: Gabriel da Conceição Fernandes

Síntese da proposta

O projeto Narrativas nos livros didáticos de História: tradições e rupturas, do qual


sou bolsista, é o desdobramento - que conta com o apoio de bolsa Prociência FAPERJ/UERJ
- do projeto Narrativas nos livros didáticos: diálogos e tensões, que teve início em 2013, com
apoio do edital Jovem Cientista de Nosso Estado. O projeto atual - Narrativa nos livros
didáticos de história tradições e rupturas - tem como objetivo principal a análise das
narrativas dos livros didáticos de História do PNLD 2011 visando compreender as
recorrências e singularidades de suas narrativas e, a partir deste processo, contribuir com o
conhecimento existente sobre as narrativas apresentadas nos livros didáticos de História e,
por conseguinte, para o aperfeiçoamento de seu uso e da escrita de novas narrativas. O
projeto se dedica especialmente às temporalidades relacionadas à Idade Moderna e da
Contemporaneidade, buscando pontos de conexão entre a história mundial e a história do
Brasil. Para tal empreendimento, conta com a minha colaboração como bolsista FAPERJ, de
um bolsista CNPQ e bolsistas voluntários em uma pesquisa coordenada pela professora
Helenice Rocha.

O que foi feito desde então

Antes de informar os processos realizados na bolsa, tomo como necessário destacar


que o projeto “Narrativas nos livros didáticos de História: tradições e rupturas”, no qual estou
inserido, é um desdobramento do projeto Narrativas nos livros didáticos: diálogos e tensões e,
por conta disso, tomo como importante esclarecer que as pesquisas realizadas no atual projeto
contou com um grande aproveitamento de alguns resultados e principalmente das
experiências e do acúmulo de materiais de pesquisa produzidos pelo projeto inicial.
Considero que faz-se necessário explanar um breve panorama dos trabalhos efetuados no
primeiro projeto. O projeto “Narrativas nos livros didáticos: diálogos e tensões”, visou
mapear o conjunto de narrativas e os temas tratados nos livros didáticos. Para tal, foram
realizadas análises e sínteses das narrativas presentes no conjunto de 15 coleções de livros
didáticos de história que foram aprovadas no Programa Nacional do Livro Didático (PNLD),
em sua edição de 2011. Os livros presentes nas coleções analisadas totalizam 60 volumes de
livros didáticos de história do ensino fundamental.

Foram elaboradas sínteses sobre os temas previamente definidos entre grandes


temporalidades - Antiguidade, Idade Média, Idade Moderna, Idade Contemporânea e, ainda,
História do Brasil (Colônia, Império e República), tais sínteses foram fundamentadas em uma
análise sistemática que teve como base destacar os fatores desencadeadores dos
acontecimentos e processos históricos no desenvolvimento das narrativas; os conceitos
relevantes mobilizados para explicação de acordo com cada autor; nos agentes históricos, ou
seja, os sujeitos recorrentes nas narrativas; as relações entre eventos e estruturas; e, por fim,
buscou destacar se deu, nas narrativas, as relações com o presente e a ideia de história como
legado ou patrimônio. A seguir a essa análise, foram elaborados relatórios sobre cada tema.
Porém, o projeto Narrativas nos livros didáticos: diálogos e tensões não concluiu o trabalho
com todos os temas planejados e, por conta disso, a coordenadora propôs um novo projeto e,
este novo projeto, recebeu o nome Narrativas nos livros didáticos de História: tradição e
rupturas. Nele, ela pretende estabelecer as conexões entre temas nacionais e mundiais,
levando em conta que a história contada nos livros didáticos se apresenta como integrada.

Ao dar início no trabalho, como novo bolsista, no projeto atual - Narrativas nos livros
didáticos de História: tradição e rupturas -, fora apresentado para mim uma organização de
um cronograma interno de trabalho. Seguindo este cronograma, em um primeiro momento,
fui inserido em um grupo de estudo, com leituras do projeto, do plano de trabalho e com
distribuições de leituras de aprofundamento, leituras estas que me forneceram o amparo
teórico-metodológico necessário para desempenhar as minhas funções no projeto. O projeto
atual - Narrativas nos livros didáticos de História: tradição e rupturas - trabalha com o
mapeamento já realizado e com as informações disponibilizadas pela fase inicial do projeto.
Por conta do potencial de combinações entre os temas, foi possível elaborar relatórios a partir
de comparações do tratamento dos conteúdos entre as diferentes coleções. Esses relatórios
foram objeto de discussão e análise no grupo de bolsistas com a coordenadora em encontros
periódicos. Considerando a existência de integração dos temas nacionais aos mundiais, foram
escolhidos temas que formam núcleos temporais com conexões produtivas para a pesquisa.
A partir da elaboração das sínteses e das análises comparativas, foram realizadas
reuniões com especialistas acerca dos temas explorados pelo projeto, como, por exemplo,
uma reunião com o professor da Universidade do Oeste do Paraná, Moisés Antiqueira, sobre
o seu artigo, Modelos causais e a escrita da história, publicado pela revista História da
Historiografia1. O tema desta conversa foi a questão da causalidade, pois, como ficará claro
futuramente, este é um tema caro ao projeto, tendo em vista que os fatores detonadores
presentes nas narrativas possuem uma grande potencialidade pedagógica e, em alguns temas,
podem ocupar o lugar chave para o desenvolvimento, ou não, das narrativas.

Além destas reuniões, foram organizados seminários com especialistas sobre as


conclusões preliminares do projeto, como por exemplo, o evento “O ensino de História em
Projetos na FFP”, promovido pelo projeto Narrativa História, realizado no dia 21/10/2019,
que contou com mesas debates e exposições de pôsteres. Em particular, participei de uma das
mesas, intitulada: “As navegações portuguesas nos livros didáticos: a causalidade em
questão”, que contou com a participação de outro bolsista do projeto, da doutoranda Luiza
Sarraf e da Profa. Dra. Célia Tavares.

Resultados Parciais Obtidos

Os relatórios de síntese dos temas explorados pelo projeto têm oportunizado achados
de pesquisa específicos, produções de trabalhos e, além destes fatores, provocam debates e
levantam considerações em aspectos gerais do projeto. Trago abaixo os destaques em cinco
temas (Mercantilismo, Iluminismo, Absolutismo, Revolução Francesa e Conflitos no Oriente
Médio durante a segunda metade do século XX), que foram diretamente trabalhados por
mim, como primeiro resultado parcial obtido.

Ao examinar o conjunto das coleções do PNLD de 2011, podemos apreender que, ao


tratar do tema do Mercantilismo, tais coleções apontam para uma direção comum. Segundo
as coleções, nos tempos do feudalismo, a principal medida de riqueza era a terra, porém, com
o ressurgimento do comércio e a ascensão burguesa, o indicador de riqueza de uma pessoa ou
um país passou a ser, além das terras, o dinheiro. Para conseguir riqueza e poder, a maioria
das monarquias absolutistas adotaram um conjunto de ideias e práticas econômicas, entre os
séculos XV e XVIII que, mais tarde, foi chamado de mercantilismo. O tema do
Mercantilismo é explorado nas conexões como o modelo econômico da Era Moderna. Sendo

1ANTIQUEIRA, M.. Modelos causais e a escrita da história. História da Historiografia, v. 14, p. 11-26,
2014.
assim, o Mercantilismo é evocado em diferentes narrativas sobre diferentes temas presentes
nas coleções.

Em relação ao tema do Absolutismo, os diferentes autores dos livros didáticos


mobilizaram variados sujeitos, conceitos, fatores detonadores e recortes temporais diversos.
Evidentemente surgem recorrências dentro das narrativas, por exemplo, constatei que todas
as quinze coleções têm como fator detonador do absolutismo a transição do mundo feudal
para o mundo moderno e a consequente ascensão da burguesia atrelada a queda do poder da
nobreza que proporcionou a centralização do poder nas mãos dos reis; uma outra constatação
é que a realeza de Luís XIV é tida como o modelo de absolutismo para algumas coleções; e
onze de quinze coleções destacam a sociedade francesa como retrato da lógica estamental do
Antigo Regime. Porém, neste tema, surgem rupturas notáveis, pois, os autores divergem em
pontos diversos, como por exemplo, um grupo de dez das quinzes coleções mobilizam o
conceito de Mercantilismo que, para elas, está intimamente associado ao absolutismo mas,
para as restantes, sequer há uma menção; ou, por exemplo, um grupo de três das quinze
coleções que associam o Absolutismo ao Renascimento, enquanto o restante das coleções não
emite nada sobre isso; além disso, destacam-se as divergências nas linhas temporais, pois, as
nove coleções que utilizam o conceito de absolutismo para explicar as administrações e
transições dos reinos ingleses ficam em dúvida em dizer qual dos Henriques deram o início
ao processo de centralização absoluta, três dizem que originou-se com Henrique II no século
XII, enquanto as outras seis atribuem a Henrique VII a partir de 1485. Vale frisar que as
divergências presentes entre a comparação das narrativas sobre o absolutismo não param nas
que estão sendo citadas neste relatório.

Ao tratar do tema do Iluminismo, os autores das coleções afirmam que foi durante o
Antigo Regime, que os governos absolutistas intervieram intensamente nas atividades
econômicas. Segundo os autores, a criação de companhias de comércio, a exploração colonial
e a definição dos monopólios faziam parte das preocupações dos reis e seus ministros, que
estabeleceram um conjunto de práticas e políticas econômicas conhecido como
mercantilismo. A partir deste ponto, alguns autores salientam que entre os séculos XVI e
XVIII, o comércio e as manufaturas se desenvolveram em alguns Estados da Europa
Ocidental. Neles, a economia rural também passou por transformações, ao mesmo tempo em
que eram explorados os recursos econômicos das colônias da América, da África e da Ásia.
Tudo isso se deu em ritmos diferentes e em sociedades diversas. De modo geral, esse
processo levou ao crescimento da influência da burguesia mercantil e financeira (grandes
comerciantes e banqueiros), principalmente na França e na Inglaterra. Muitos burgueses
tomaram consciência de sua importância social e econômica e passaram a defender seus
interesses. Seu principal objetivo era livrar-se da interferência do governo em seus negócios.
Passaram, então, a criticar as monarquias absolutistas. Por fim, as coleções acrescentam que a
forma como os intelectuais iluministas pensavam a política e a economia atendia
especialmente aos anseios da burguesia. Eles acreditavam que o Antigo Regime precisava ser
combatido em vários aspectos. O absolutismo monárquico era um deles, pois mantinha os
privilégios da nobreza, impedindo o predomínio dos ideais e das práticas dos burgueses.
Outro aspecto a ser combatido era o mercantilismo, fundamentado na intervenção do Estado
na economia, que dirigia a iniciativa privada.

No tema da Revolução Francesa foi possível perceber que os autores dos livros
didáticos mobilizam com frequência os mesmos conceitos, sujeitos e fatores detonadores para
a abordagem do tema e a apresentação do conteúdo para os alunos. Tais recorrências
demonstram que há uma narrativa consolidada referente à Revolução Francesa. Estas
constatações nos levam a crer que há uma manutenção de uma tradição no tema. Para dar
concretude a hipótese levantada, empreendi um trabalho que teve como objetivo compreender
a justificativa para a consolidação e a permanência da narrativa escolar existente sobre a
Revolução Francesa. Para isso, examinei de maneira aprofundada, dentro dos textos
referentes à Revolução Francesa, a presença da narrativa sobre a Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão. As narrativas que se remetem à Declaração são apresentadas dentro de
treze das quinze coleções que tratam do tema da Revolução e é tida como um documento
considerado como a principal contribuição da Assembleia Constituinte ao processo
revolucionário; como um importante ícone contrário a lógica estamental da sociedade
absolutista do antigo regime; e, além disso, por conta das reivindicações por igualdade e
defesa da liberdade, é apresentada como uma inspiração para o ideal de república e como um
pilar para a democracia tal qual concebemos hoje. Percebe-se, a partir das informações
recolhidas, que há uma ampla associação do seu legado ao mundo contemporâneo.
Averiguou-se, portanto, que o valor da Declaração é um dos principais fatores que justifica a
permanência do tema da Revolução Francesa nos livros didáticos, pois, afinal de contas, a
ideia de "herança histórica" permanece como um dos principais motivos que determinam o
que deve ser ensinado nas narrativas escolares, ou seja, justifica a permanência do ensino de
história.
A partir desta breve síntese das narrativas presentes nas coleções, é possível
compreender que os temas presentes nas narrativas dos livros didáticos se desenvolvem em
texto de natureza diversas. Os capítulos do tema da Revolução Francesa, por exemplo,
possuem uma ênfase narrativa, enquanto os capítulos dos temas mercantilismo e absolutismo
são temas conceituais, que aparecem em capítulos, mas especialmente em tópicos, como
características da idade moderna. Cada coleção aplica o conceito a determinados povos
europeus, de determinada temporalidade. O tema do Iluminismo, por outro lado, possui uma
narrativa mais descritiva, caracterizando personagens ou “sujeitos” que tiveram influência no
processo. Além disso, há a clara relação entre os temas, podemos evidenciar, por exemplo, a
relação antagônica entre o conceito de absolutismo e a Revolução Francesa. Tal conceito, que
surge no volume anterior, como já afirmado, retorna aqui para ser alvo do combate de
iluministas e burgueses franceses. Nos livros, a narrativa enfatiza a insatisfação dos diferentes
segmentos sociais com a nobreza e o clero, bem como o repúdio ao absolutismo. Interessa ao
projeto analisar ainda se e como os livros relacionam o absolutismo com a situação colonial,
que vai, nesse período se desfazer, com as independências. É interessante observar como o
absolutismo, sendo um conceito estabelecido tão longe, na narrativa, será utilizado para a sua
recuperação, interessa ao projeto, portanto, perceber que estratégias serão usadas para a sua
recuperação. E interessa perceber se, e como, os livros os livros estabelecem conexões entre
as independências e a revolução francesa, considerando-se a discussão contemporânea de
originalidade dos processos coloniais e suas conexões com a Europa como referência de
metrópole. Um interesse derivado deste tema, por exemplo, foi o estudo, já destacado
anteriormente neste relatório, sobre como o tema dos direitos universais do homem, que é um
ícone do tema da Revolução Francesa, é trabalhado nos livros didáticos.

A partir destes exemplos podemos apreender que há elementos que permitem


consolidar tradições, estabelecer rupturas nas narrativas dos livros didáticos, mobilizar
conceitos para a explicação e para cumprir determinadas finalidades pedagógicas. E o
objetivo descritivo de nosso trabalho é esmiuçar materiais e efetuar sínteses para que, em
outro momento, sejam investigados fatores que propiciam tais permanências ou eventuais
rupturas.

O passo seguinte da produção desses relatórios é a oportunidade de inserir os seus


achados na comparação com livros didáticos mais recuados no tempo ou mais atuais,
procurando perceber as mudanças ao longo do tempo do mesmo livro ou de livros em
conjunto e analisar o seu diálogo com a historiografia atual ou passada. Os relatórios parciais
configuram-se em valiosos instrumentos de análise já que, a partir destas sínteses, é possível
considerar diálogos (ou não) entre a produção historiográfica e a produção escolar, como a
presença do eurocentrismo (e outros centros e periferias) e a busca de alternativas a ele; o
tratamento da alteridade na apresentação e atribuição de agência aos sujeitos históricos de
diferentes grupos étnicos e nacionalidades; a apresentação de grupos identitários e a
valorização de sua memória e história como estratégias de formação de identidades.

Por fim, ressalto como resultado parcial alcançado, a participação de eventos nos
quais tive a oportunidade de apresentar os achados sobre os temas mencionados acima. Tomo
como exemplo a apresentação do painel denominado O absolutismo como um conceito
explicativo na narrativa didática dos Estados modernos que foi exposto na 28ª edição da
Semana de Iniciação Científica (SEMIC), no campus UERJ-Maracanã. Além do painel ser
aceito da SEMIC, a exposição foi recompensada como um dos destaques, recebendo menção
honrosa e concorreu ao Prêmio de Iniciação à Ciência Elizabeth Macedo, na modalidade IC-
Humanidades.

Se acha que vai cumprir integralmente o projeto, no prazo.

Finda a etapa do projeto ao qual me dediquei à confecção das sínteses informativas,


ou seja, a elaboração das análises sobre como os temas são trabalhados nas diferentes
coleções, foi possível, a partir da produção destas sínteses, em um primeiro momento,
estabelecer as relações sincrônicas e diacrônicas entre os temas presentes nas coleções -
entende-se, neste relatório, por relações sincrônicas, a investigação e comparação de como
um tema é desenvolvido nas diferentes coleções do PNLD de 2011 e, por relações
diacrônicas, investigar o desenvolvimento das narrativas sobre este tema com os PNLD’s
anteriores e posteriores ao de 2011. Além disso, como uma nova etapa do projeto, buscamos
analisar os temas encarando-os dentro de uma perspectiva holística; ou seja, buscando
identificar como um tema se relaciona com o outro, e que elementos ou conceitos coligativos
são elaborados e evocados para promover estas ligações. É tendo em mente esta perspectiva
holística que o projeto busca identificar tanto finalidades pedagógicas, ou seja, elementos que
sustentem as presenças das narrativas, além, é claro, da já citada busca das tradições e
rupturas presentes nos livros didáticos.
Além dos elementos citados, buscaremos também progredir no projeto e ampliar os
resultados parciais e finais da pesquisa, através da promoção de discussões em seminários
internos com especialistas, ou em seminários periódicos abertos ao público e na apresentação
de trabalhos em eventos da área e publicação de artigos sobre o tema dos livros didáticos de
história, em ações tais como o evento “O ensino de História em Projetos na FFP”, citado
anteriormente.

Dificuldades Surgidas

Por conta das medidas de isolamento, em razão do combate à pandemia, estou, desde
março, afastado do laboratório de pesquisa, onde o projeto se desenvolve. O laboratório de
pesquisa é de grande importância para o projeto, pois, no laboratório, além do material
necessário para a pesquisa, existe tanto a troca de experiência com os outros bolsistas, quanto
o necessário auxílio da coordenadora. Estar afastado do laboratório impediu o
desenvolvimento normal do projeto. No entanto, apesar das circunstâncias, a coordenadora
está buscando recuperar formas de desenvolvimento para que o projeto possa prosseguir.

Você também pode gostar