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11º Seminário Internacional de Transporte e Desenvolvimento

Hidroviário Interior
Brasília/DF, 22-24 de outubro de 2019
Análise geométrica e microdureza de cordões de solda FCAW robotizada
empregadas em painéis navais
Lino Alberto Soares Rodrigues, PRODERNA/UFPA, Belém/Brasil, lino@ufpa.br
Diogo Henrique Brito da Silva, FEM/UFPA, Belém/Brasil, engemecdiogo@hotmail.com
Dalmir dos Santos Matos, PPGEM/UFPA, Belém/Brasil, dalmir.matos.s@gmail.com
Tárcio dos Santos Cabral, PRODERNA/UFPA, Belém/Brasil, tarcio_cabral@yahoo.com.br
Elaine Nascimento Freitas, PPGEM/UFPA, Belém/Brasil, elainendf@gmail.com
Eduardo de Magalhães Braga, FEM/FENAV/PRODERNA/UFPA, Belém/Brasil, edbraga@ufpa.br

Resumo
Não diferente de outros setores, a indústria naval tem requerido elevada capacidade de produção com o
emprego de novas tecnologias e qualidade da mão de obra, porém nestes quesitos a região norte do Brasil ainda
possui grandes atrasos quanto a outras regiões do país e do mundo. Dessa forma, usando o processo FCAW-G
robotizado com 100% de CO2 como gás de proteção empregando elevada velocidade de soldagem (100 cm/min)
para soldar enrijecedores em chapas (800 mm X 1200 mm X 9,5 mm) de aço naval ASTM A131 grau AH32, que
corresponde a 10% do tamanho de um painel real, muito utilizados em costado e convés de balsas de navegação
interior, busca-se implementar uma proposta de soldagem automatizada aplicada à construção naval. As soldas
dos painéis foram avaliadas por ensaios não destrutivos (LP - líquido penetrante e US – ultrassom). Sendo ainda
possível observar que as soldas de duplo filete contínuos obtiveram acabamento superficial e reforço muito bons,
além de uma excelente penetração e Zona Termicamente Afetada (ZTA) muito pequenas (análise geométrica), o
que favoreceu para a qualidade da junta soldada corroborados pelos perfis de microdureza obtidos.

tecnologia da soldagem. No entanto, mesmo sendo


1. Introdução o processo de fabricação para união de metais mais
utilizado na produção de peças ou produtos de
Longe estão os dias de métodos intensivos de elevadas proporções, como é o caso da sua inserção
trabalho com milhares de pessoas construindo uma na construção naval, para que sejam
embarcação. Hoje, a ênfase está na flexibilidade e implementadas melhorias ou inovações, é
automatização, com um navio sendo projetado, necessário que as características quantitativas e
planejado e construído em questão de semanas, qualitativas sejam garantidas ou, de outra forma,
não em anos, como no passado (Rooks, 1997; serão descartadas ou precisarão de adaptação até
Mandal, 2017). que haja a possibilidade de serem empregadas.
Logo, com o aumento na concorrência da Igualmente, nem só por produtividade foram
construção naval para determinados tipos de implementadas melhorias nos processos de
embarcações e a competitividade entre as soldagem, outras foram absorvidas a fim de reduzir
empresas que dominam os nichos de mercado, tem a introdução de imperfeições iniciais de fabricação
estimulado alternativas para o aumento da nos painéis enrijecidos, fato este que gera
produtividade, qualidade e redução dos tempos de preocupação, devido ao acúmulo na perda de
fabricação, assim como uma equalização dos custos resistência estrutural dos painéis até os blocos
de produção (Lameira, 2015; Rooks, 1997). acabados, segundo afirma Khedmati et al. (2007) e
Segundo Boekholt (1996), o método de construção Gaspar et al. (2011).
naval mais utilizado atualmente, que é a montagem Desta forma, a fabricação de embarcações por
por blocos, resulta do desenvolvimento da natureza é geralmente amplo e precisa de um

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grande número de soldas corridas e grandes em
comprimento. Assim, sabe-se que, com a inserção
de robôs na linha de produção promove-se
aumentos significativos de produtividade causando
um efeito nos tempos e custos de produção, além
de soldas mais precisas e de excelente qualidade,
quase eliminando totalmente as condições de
retrabalho. Portanto, buscando a automatização de
uma célula de trabalho para a produção de painéis
enrijecidos (10% do tamanho real), similares aos
empregados em um estaleiro local, foi utilizada a
soldagem FCAW-G (soldagem arame tubular com
proteção gasosa) robotizada implementando
velocidades de soldagens elevadas de 100 cm/min,
aproximadamente 3 vezes maior que o máximo Figura 1 - Chapa e enrijecedor e suas respectivas
utilizado em sistemas semiautomáticos. medidas

2. Materiais e Métodos As chapas foram soldadas utilizando o processo


Foram utilizadas chapas de aço naval ASTM A 131 FCAW robotizado com arame tubular E71T-1 da
grau AH32 com dimensões de 1200 mm por 800 mm classe AWS 5.20 com 1,2 mm de diâmetro e CO2
e espessura de 10 mm (estas dimensões puro como proteção gasosa em corrente CC+. Os
correspondem a 10% do valor real de um painel parâmetros de soldagem utilizados estão na Tabela
industrial). As cantoneiras de aço SAE 1020 (Tabela 3. O tipo de solda utilizado foi na forma de duplos
01) de perfil L com dimensões 76,2 mm (3´´) por 800 filetes contínuos. A montagem da célula de trabalho
mm de comprimento e 6,35 mm (1/4´´) de está disposta na Figura 2, apresentando a
espessura foram utilizadas como enrijecedores. A disposição dos equipamentos usados para
composição química da chapa e dos enrijecedores e soldagem. No detalhe, o braço robótico em
as propriedades mecânicas medidas da chapa estão conjunto com o sistema de deslocamento linear,
nas Tabela 1 e 2, respectivamente. A Figura 01 fonte de soldagem e tocha especial com sensor de
mostra o esquema ilustrativo de um painel soldado. contato a choque e ambos com interface para
A distância padrão entre os enrijecedores foi de 240 acoplar ao robô.
mm.
Tabela 3 – Parâmetros de soldagem
Parâmetros de soldagem FCAW robotizado
Tabela 1 – Composição química da chapa e do
Tensão de soldagem 34 V
enrijecedor
Velocidade de alimentação de arame 19,05 m/min
ASTM C Mn Si P S
A-131 Corrente de soldagem 350 A
grau 0,22 1,23 0,24 0,022 <0,001 Vazão de gás 20 L/min
AH32
Ângulo de ataque 0º
AISI
0,21 0,40 0,31 0,32 0,03 Ângulo de trabalho 45º
1020
DBCP 20 mm
Velocidade de soldagem 100 cm/min
Tabela 2- Propriedades mecânicas da chapa Velocidade de deslocamento e 2m/s
LE (MPa) LRT (MPa) ε (%) posicionamento do robô
ASTM
A131- grau 315 440-590 20
AH32

Medidas 325 520 19

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Figura 2 - Célula de Trabalho
Figura 4 – Modelo das distâncias padrões de análise
Foram adotadas três sequências de soldagem dos dos perfis dos cordões de solda. Onde: I – largura do
painéis objetivando a melhor distribuição de cordão, h – altura do cordão, G – garganta da solda
dissipação do calor de soldagem sem uso de e P – penetração da solda.
restrições às chapas. A Figura 3 mostra os esquemas
dos percursos de cada sequência, observando a
numeração dos enrijecedores e a numeração dada
as soldas e a devida direção de soldagem. A
soldagem robotizada dos painéis pode ser vista na
Figura 4.

Figura 5 – Esquema do particionamento da junta


soldada para o cálculo da diluição. AD – área
depositada e AP – área penetrada e δ corresponde
Figura 3 – Sequências de soldagem ao valor da diluição em percentual.

Após a soldagem, foi realizado os ensaios não Logo após a análise metalográfica foi realizada as
destrutivos de LP e US. Em seguida, foi efetuado o medições de microdureza, usando como padrão a
corte dos painéis para a obtenção dos perfis das norma DNV DNVGL-RU-SHIP-Pt2 Materials and
soldas, as distâncias padrões analisadas serão welding Chapter 4 Fabrication and testing (2019).
conforme a Figura 4. Foram obtidas 3 amostras de Considerando a simetria da solda, as análises foram
cada cordão de solda, porém foi utilizado o realizadas de acordo com o padrão da Figura 6.
resultado que apresentou dados mais próximos da Onde são mostradas as regiões e os pontos de
média. medição. Vale ressaltar que a distância entre os
Para o mesmo perfil, foram calculadas as áreas das pontos em linha foi de 0,5 mm e pré-carga de 0,3
regiões dos cordões a fim de encontrar os valores HV.
de diluição para cada junta soldada. A imagem a
seguir (Figura 5) representa a forma esquematizada 3. Resultados e discussões
para o cálculo das regiões. Onde foi utilizada uma Apesar das dificuldades iniciais para sincronizar o
fórmula adaptada para o cálculo da diluição, braço robótico e a fonte de soldagem e obter bons
considerando a área depositada (AD) e a área resultados, ao menos, visualmente satisfatórios, foi
penetrada (AP), conforme a equação 1: necessário realizar ensaios preliminares que
favoreceram para os resultados finais que podem
𝐴𝐷1+𝐴𝐷2
𝛿 = 𝐴𝑃1+𝐴𝑃2+𝐴𝐷1+𝐴𝐷2 (1) ser melhor explorados no trabalho de Freitas
(2015). A Figura 7, exibe a soldagem realizada pelo
robô.

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de soldagem, aproximadamente 185% maior que a
aplicada no caso de soldagem semiautomática de
35 cm/min exercida pelos soldadores. Este valor
refere-se a valores de campo com soldagem
manual.

Figura 6 – Representação Esquemática dos pontos e


regiões de medição de microdureza na junta
soldada para um cordão de solda apenas.
a)
Com a montagem da tabela de parâmetros, os
resultados encontrados foram bons quanto a
continuidade e homogeneidade da superfície dos
cordões de solda, onde pode-se perceber a
convexidade e excelente acabamento a Figura 8(a)
mostra um dos painéis soldados e 8(b) um perfil do Figura 8 - (a) Painel como soldado. (b) Superfície do
cordão encontrado. Os ensaios END de LP e US, cordão de solda.
mostraram ausência de descontinuidades como b)
falta de fusão, falta de penetração ou inclusão de
escória em ambos lados dos cordões de solda dos
enrijecedores mostrando a homogeneidade da
junta soldada.

Figura 8 – Perfis dos cordões da junta de solda da


sequência 2

Os valores com os parâmetros geométricos


Figura 7 – Soldagem dos painéis com FCAW medidos da seção transversal do cordão de solda
estão disponíveis na Tabela 4, os valores de
Os perfis dos cordões de solda apresentaram penetração (P) e garganta (G) são as medidas
excelentes curvatura quanto a convexidade, verticais do cordão e l e h as horizontais do cordão
similares ao esquema da Figura 5, conforme a Figura (Figura 4). Os valores de P e G corroboram no
8 – Sequência 2. Os resultados representam a boa entendimento de quanto a solda penetrou na junta.
aplicabilidade do processo de soldagem para a As médias equivalem, respectivamente, 6,2 mm e
situação em questão: a fabricação de painéis 3,6 mm. A sequência 3 apresentou os menores
enrijecidos; considerando a velocidade de soldagem valores, o que afetou diretamente na formação da
de 100 cm/min exercida pelo robô. Alguns painéis menor área da zona termicamente afetada (ZTA). E
apresentaram cordões com convexidade baixa, de diluição no caso do cordão C2.
muito provavelmente, devido a elevada velocidade

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Tabela 4 – Valores geométricos dos cordões de solda e diluição por sequência de soldagem
Área
Cordão de Diluição Desvio
Sequência P (mm) G (mm) l (mm) h (mm) ZTA
solda (%) padrão
(mm2)
C1 6,23 3,60 4,84 6,40 40 0,04
SEQ01 33,71
C2 6,43 3,66 5,68 4,78 38 0,04
C1 6,47 3,79 5,59 5,05 47 0,04
SEQ02 29,26
C2 6,50 3,61 4,90 4,78 46 0,04
C1 5,65 3,42 5,78 3,75 40 0,04
SEQ03 22,79
C2 5,62 3,42 5,22 4,28 37 0,04
Média ------ 6,2 3,6 5,3 4,8 28,6 41,3 -------

Os valore de l e h, correlacionam-se para mostrar, apenas a sequência de deposição dos cordões de


de fato, a altura e a largura do cordão. O que reflete solda. O valor máximo de microdureza encontrado,
o comportamento do ângulo de trabalho da tocha 251 HV, localiza-se no metal de solda da junta da
na execução da soldagem mostrando que foi bem Sequência 3, devido o metal possuir uma
feita. composição química com elementos de liga
No mais, os valores de diluição disponíveis na adquiridos através do fluxo que aumentam a
Tabela 4 mostram uma média de 41,3% de diluição resistência mecânica. O tratamento térmico
e desvio padrão de 0,04. O menor valor de diluição produzido pelo calor da fonte térmica de soldagem
pertence a sequência 3 com 37%. Se comparado ao gerou uma microdureza média de 185 HV, na ZTA.
maior valor, que é o da sequência 2 (47%), tem-se De maneira geral, os valores de microdureza, tanto
um ganho significativo de 33%. Já que a diluição os picos (encontrados na ZF) quanto a ZTA e MB, são
representa o quanto do metal de base (MB) se similares aos resultados obtidos por Rodrigues
incorpora ao metal da zona fundida (ZF), tornando (2011), com uma variação de 10 a 15 HV
o metal da junta menos nobre quanto as qualidades considerando a relação dos dados.
metalúrgicas e mecânicas.
De maneira geral, os valores de diluição são
similares aos encontrados por Hackenhaar (2016),
com leve variação para mais, considerando apenas
o formato da junta, porém aceitável devido à
proximidade de valores. Muito provavelmente, os
valores de diluição foram afetados pelo valor
elevado de corrente utilizado para soldar, porém
necessário, já que se trata de soldas com
penetração total. O que de outra forma, poderia
gerar falta de penetração da solda, ocasionando em
descontinuidades. Um outro fator que
possivelmente afeta a diluição, no caso dos painéis
com duplas soldas de filete, é o tempo de execução
da sequência de soldagem, onde o segundo cordão Figura 9 – Microdureza (HV) das juntas soldadas das
de solda quando depositado logo em seguida gera três sequências consideradas
um menor gradiente de temperatura favorecendo a
maior penetração. 4. Conclusões
Os valores medidos de microdurezas estão na
Partindo-se dos dados obtidos, pode-se concluir
Figura 9, onde foram plotados os valores em linha,
que o trabalho apresentou excelentes resultados
apesar de se ter medido em zonas conforme o
favorecendo à implantação de células de trabalho
esquema da Figura 5. Esta disposição gráfica, foi
robotizadas na fabricação de painéis navais
elaborada a fim de se obter uma figura que
empregando elevadas velocidades de soldagem. O
facilitasse o efeito comparativo e o entendimento
que agrega resultados significativos para a
dos valores obtidos conforme as regiões da junta
construção naval local e nacional direcionada para
soldada. Sendo que os valores obtidos apresentam
o aumento da produtividade além de outras
bastante similaridades uma vez que foi alterado

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vantagens intrínsecas a indústria naval como um
todo.

5. Referências Bibliográficas
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advanced welding. Elsevier, 2005.
2. BOEKHOLT, Richard. Welding Mechanisation
and Automation in Shipbuilding Worldwide:
Production Methods and Trends Based on Yard
Capacity. Elsevier, 1996.
3. FREITAS, Elaine. N. Estudo Operacional de
Manipulador Robótico Aplicado ao Processo de
Soldagem FCAW Na Construção Naval.
Dissertação de Mestrado – UFPA – Universidade
Federal do Pará, 2014.
4. GASPAR, B. TEIXEIRA, A. P. GUEDES SOARES, C.
and WANG, G. Assessment of IACS-CSR implicit
safety levels for buckling strength of stiffened
panels for double hull tankers. Mar. Struct.
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5. KHEDMATI, MR.; GHAVAMI, K.; RASTANI, M. A
comparative study on three diferente
construction methods of stiffened plates
strength behavior and ductility characteristics.
Revista Escola de Minas. 2007. 60(2): 365-379.
6. LAMEIRA, P. D. O. – Estudo de planejamento e
análise de processos de fabricação com
aplicação de um braço robótico na fabricação de
embarcações fluviais. Dissertação Mestrado.
PPGEM UFPA - Universidade Federal do Pará,
Belém, 2015.
7. MANDAL, N. R. Ship construction and welding.
Springer Singapore, 2017.
8. ROOKS, Brian. Robot welding in shipbuilding.
Industrial Robot: An International Journal, v. 24,
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9. HACKENHAAR, William. Avaliação da eficiência
térmica e de fusão na soldagem MAG em
diferentes geometrias de juntas. 2016.
10. RODRIGUES, L. A. S. Caracterização
microestrutural e de propriedades mecânicas de
soldas do aço ASTM A 131 pelos processos
FCAW convencional e com adição de arame frio.
2011.

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