Circulação Interna
TEORIA E PRÁTICA EM
PSICOPEDAGOGIA
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Unidade I
Conhecendo a Psicopedagogia: Um pouco de conceito,
suas bases e fundamentação teórica
Certamente, no decorrer deste curso, você já teve contato com o conceito de
Psicopedagogia e conheceu as suas principais formas de atuação. Mas, para começar a
nossa disciplina, é necessário rever alguns desses conceitos e contextualizar de que
forma as teorias e práticas da Psicopedagogia Institucional podem colaborar com as
práticas pedagógicas no cotidiano escolar.
Assim como a aprendizagem pode estar presente em todos os momentos de nossa vida,
as dificuldades que ela representa também podem surgir em qualquer nível de ensino.
Desta forma, uma pessoa pode ter sido um ótimo aluno, com excelente rendimento
escolar até o final do Ensino Fundamental e apresentar grandes dificuldades para
aprender no Ensino Médio, ou até mesmo na universidade. Isso porque, mesmo com as
estruturas cognitivas amadurecidas, um determinado assunto ou área de estudo pode se
tornar árduo para a nossa aprendizagem, do ponto de vista afetivo, e reagimos negando-
a.
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Visca, Alicia Fernandez e Sara Paín. Ainda na Argentina, a Psicopedagogia tem o seu
eixo teórico em três áreas da Psicologia. São elas: a Psicologia Genética de Jean Piaget,
A Psicanálise de Freud e a Psicologia Social de Pichon-Rivière. Posteriormente, muitas
outras teorias contribuíram e enriqueceram a teoria psicopedagógica, tais como a teoria
de Vygotsky, a psicogênese da língua, tão bem defendida por Ana Teberosky e Emília
Ferreiro. No entanto, ressaltamos que o berço, a gênese, o nascimento da
Psicopedagogia acontece, de fato, com essas três teorias: Psicanálise (Freud), Psicologia
Genética (Piaget), Psicologia Social (Pichon-Rivière) e, é claro, com a herança francesa.
Não podemos deixar também de citar os nossos representantes brasileiros, que tanto têm
contribuído para o desenvolvimento da Psicopedagogia e produzido trabalhos de
qualidade na área, tais como Maria Lúcia Weiss, Aglael Borges, Nadia Bossa, Beatriz
Scoz e Heloísa Padilha, dentre outros. É importante também dizer que, no Brasil, a
formação do psicopedagogo se dá por meio de cursos de pós-graduação lato sensu,
enquanto na Argentina o curso é de graduação e teve o seu início na Universidade de
Buenos Aires, há mais de três décadas. No entanto, podemos atuar em diversos espaços
educacionais, não necessariamente com a função de “psicopedagogo”, mas com um
olhar e uma postura psicopedagógica diante da aprendizagem. Por exemplo, quando
compreendemos o ato de aprender como um processo contínuo e singular, quando
entendemos de que maneira os processos afetivos de um aluno estão interferindo na sua
aprendizagem e, ainda, quando preparamos nossas aulas pensando no desenvolvimento
cognitivo de nosso público, como alguém que prepara uma roupa sob medida.
Áreas da Psicopedagogia
A Psicopedagogia vem evoluindo e crescendo bastante ao longo dos anos. Hoje, temos a
Psicopedagogia Clínica, de caráter predominantemente curativo. Seu espaço de trabalho
é o consultório e o atendimento individualizado é a forma mais comum. A
Psicopedagogia Institucional possui caráter predominantemente preventivo, e
normalmente a atuação ocorre com pequenos grupos de alunos, trabalhadores, pessoas
em geral.
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ainda, nos vínculos afetivos, a intervenção curativa grupal deve ocorrer no ambiente
institucional.
A expressão epistemologia foi muito utilizada pelo professor Jorge Visca, na Argentina.
Por definição, o termo epistemologia significa o estudo do conhecimento, da área, da
matéria. A utilização da palavra convergente se justifica pela proposta de integração, de
interdisciplinaridade que a Epistemologia Convergente propõe. Em outras palavras, para
a Psicopedagogia, Epistemologia Convergente significa a integração de três escolas
importantes para a base dos conhecimentos psicopedagógicos. São elas: a Escola
Psicanalítica, a Escola Piagetiana e a Escola da Psicologia Social, de Pichon-Rivière.
Essas três escolas convergem para um único ponto e a Psicopedagogia vai se utilizar da
interseção deste saber. Todos nós nos lembramos das aulas de Matemática no início de
nossa vida escolar. Nestas aulas, aprendemos o conceito de interseção e recordamos que
ela significa o que há de comum entre pontos, conjuntos ou áreas. No nosso caso, ela
representará o que há de comum entre essas três teorias. Você pode imaginar qual seria
esse ponto de convergência? A aprendizagem! Cada qual com o seu enfoque e com a
sua forma de perceber o homem e seus processos internos e externos. Dessa forma, é
possível afirmar que a epistemologia convergente pode significar uma posição teórica,
mas também pode representar uma prática (VISCA, 1987). Ou seja, podemos estudar as
contribuições das três escolas e atuar sobre a aprendizagem dos nossos alunos de forma
que os três enfoques teóricos (afetivo, cognitivo e social) sejam contemplados.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE II
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Voltemos aos desafios presentes no ambiente escolar. São inúmeros, como já dissemos,
mas, como o nosso curso não pretende esgotar nenhum assunto, ao contrário, pretende
colaborar para o exercício da reflexão de questões aqui propostas e das que possam
surgir, elegemos alguns desafios contemporâneos para iniciar a nossa conversa. São
eles:
1. o fracasso escolar;
2. o currículo;
3. o planejamento com enfoque psicopedagógico;
4. a avaliação da aprendizagem;
5. conselho de classe;
6. trabalho com projetos;
7. afetividade e aprendizagem;
8. reuniões de pais;
9. formação continuada de profissionais da educação;
10. indisciplina na escola;
11. inclusão.
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Fracasso escolar
Eis um problema nacional. Por que tantas crianças e jovens não conseguem aprender?
Especialmente no período da alfabetização, o problema do fracasso escolar tem tirado o
sono dos professores. Ao analisar a questão, procuramos as causas no próprio aluno,
muitas vezes atribuindo os seus resultados à falta de interesse, à ausência de
investimentos na aprendizagem e até mesmo à existência de alguma deficiência que
impede a aprendizagem de transcorrer normalmente. É comum também que o problema
seja atribuído ao contexto familiar, às condições sociais do aluno e, ainda, à privação
cultural. Todos esses fatores podem representar, certamente, causas para o não-
aprender. Ou, ainda, o fracasso escolar pode ter origem num conjunto de causas
anteriormente apresentadas que se entrelaçam. No entanto, é preciso ter cuidado para
não “responsabilizar” o aluno pelo seu fracasso escolar, pois nem sempre o problema
está localizado no próprio sujeito. Recomenda-se que o professor também reflita sobre a
sua prática pedagógica, especialmente sobre as atividades repetitivas e sobre as
experiências de aprendizagem que são oferecidas, que nem sempre respeitam a
individualidade dos alunos. Todos nós, crianças ou adultos, temos os nossos modelos
próprios de aprendizagem e, dessa maneira, a aprendizagem torna-se um processo muito
singular.
Aprender algo requer interesse pelo objeto; numa linguagem psicopedagógica, requer
desejo. É preciso que a escola faça sentido na vida do aluno e que ele não pense que
alguns nasceram para estudar e outros não, caindo nas armadilhas do sistema capitalista
e neoliberal. Mas nós só conseguimos desejar aquilo que possui algum significado para
nós. Aí entra o papel do professor na hora de eleger as oportunidades de aprendizagens
significativas. Procurar mostrar para os alunos o sentido da educação e seus benefícios,
bem como a necessidade de investimentos a longo prazo, também produz efeitos
interessantes e, é claro, é bom evitar os discursos preconceituosos como “estudar para
vencer na vida”, “estudar para ser alguém”. O mestre Paulo Freire pode nos ajudar a
organizar um discurso de convencimento respeitoso e dialético sobre a importância do
ato de estudar.
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O currículo
Seja qual for a escola, seja qual for a sociedade, uma coisa é certa: há um currículo
definido para ser ensinado e que serve à sociedade no qual ele está inserido. Ou seja, a
escola “presta serviços” à sociedade educando os seus cidadãos e entregando- os à
sociedade para servi-la. Em contrapartida, a sociedade “diz” para a escola o que ela
precisa ensinar aos seus cidadãos. Portanto, no momento da organização do currículo
escolar, devemos nos perguntar o que precisamos ensinar aos nossos alunos de acordo
com a nossa cultura. Isso nos faz concluir que nenhum currículo é neutro, ao contrário,
está permeado de fatores sociais, políticos e econômicos.
O planejamento é uma das atividades mais privilegiadas do cotidiano escolar, pois ele
representa um momento de reflexão sobre o que vamos ensinar, sobre os conteúdos que
precisam ser fixados, revisados, ou, ainda, ensinados de uma outra forma. Conhecemos
vários níveis de planejamento que se traduzem em planos, pois o planejamento é a
atitude de planejar e o plano é a atividade.
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A aprendizagem ocorre com mais facilidade quando sentimos prazer no ato de aprender
e quando o conteúdo possui significado simbólico ou prático para nós. É aí que entra a
criatividade do professor para organizar experiências de aprendizagem significativas,
vibrantes, que envolvam os educandos. A experimentação também é uma ótima
alternativa. Quando os alunos praticam, pesquisam ou experimentam, as chances de
compreender as bases teóricas do conhecimento são maiores. Partir da prática para a
teoria facilita a compreensão e evita a memorização sem compreensão. Por exemplo, ao
ensinarmos uma fórmula de Física ou Matemática, podemos procurar fazer
demonstrações práticas e deduções até chegarmos à fórmula em si.
Uma queixa muito comum das escolas, em geral, é a falta de materiais e re-cursos
técnicos para o desenvolvimento das aulas. É certo que os recursos ajudam bastante,
especialmente na facilitação do dia-a-dia, colaborando para que a turma fique mais
motivada, mas, para a Psicopedagogia, que valoriza muito o componente afetivo para a
aprendizagem, os únicos “recursos” que não podem faltar são o desejo de aprender e o
desejo de ensinar. Com materiais simples e com muita criatividade, professores e alunos
podem construir mecanismos de grande utilidade para a aprendizagem.
É importante que fique claro que, ao avaliar, o professor não deve prestar atenção
somente no aluno e sim na aprendizagem. Para isso, ele não precisa neces¬sariamente
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fazer uso de testes e provas. Atividades de sala de aula, como trabalhos em grupo,
exercícios, projetos e a observação do professor, podem dizer muito sobre a
aprendizagem dos alunos.
Avaliação de aprendizagem
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Conselho de classe
Afetividade e aprendizagem
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Reuniões de pais
A sociedade mudou, assim como os nossos pais e alunos também mudaram. O número
de mulheres no mercado de trabalho, em algumas regiões do Brasil, muitas vezes, é
superior ao número de homens, sendo que muitas delas mantêm suas famílias sozinhas.
Em suma, a família mudou bastante ao longo dos anos e isso nos faz pensar que as
relações entre a escola e a família não podem ser as mesmas.
É comum ouvirmos queixas, por parte das escolas, sobre a pouca participação dos pais
na vida escolar dos filhos, inclusive que nas reuniões de pais a freqüência é baixíssima,
e também é freqüente ouvir dos pais que a escola possui alguma falha e que gostariam
de ser mais ouvidos pelos professores e equipe técnica. Refletir sobre esses
desencontros é necessário para o bem da aprendizagem de nossos alunos.
Por exemplo, as reuniões podem variar de dia e horário, a fim de concentrar o maior
número possível de pais. Ou, ainda, mantermos um horário fixo, depois de ter levantado
a disponibilidade dos pais. As reuniões devem ser breves e respeitar o horário marcado.
Além disso, é bom que tratemos dos assuntos coletivos, e os individuais devem ser
agendados para uma conversa em particular.
Quando se tem uma visão psicopedagógica, enxergamos os pais de nossos alunos como
seres também em processo de aprendizagem e, por isso, em alguns momentos da
reunião, cabem “prescrições”, sugestões de como os pais podem agir em casa para
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conduzir os estudos de seus filhos, sem, com isso, tornarem-se professores particulares
dos filhos. Muitos pais afirmam textualmente, especialmente quando o problema é o
comportamento, que não sabem o que fazer com seus filhos. Devemos acreditar nesse
“não saber” e colaborar com eles, oferecendo-lhes leituras, pequenos vídeos, estudos de
caso, algumas atividades práticas, enfim, tornar a nossa reunião o mais produtiva
possível.
Se permitirmos que os pais de nossos alunos falem, vamos aprender com eles e
descobrir talentos que podem ser úteis para a escola.
Phillipe Perrenoud nos orienta que uma das competências do professor deve ser gerir a
própria formação. Como profissionais da educação e da aprendizagem, sabemos que a
nossa formação é um processo contínuo, sem fim. Participar das oportunidades de
formação continuada oferecidas pelo nosso local de trabalho, bem como participar
autonomamente de outros, é uma forma de aprimorar o nosso trabalho.
As leituras de livros e periódicos diversos também são ótimos recursos, pois colaboram
para que o professor passe de leitor para autor de conhecimentos e, por que não, um
professor-pesquisador. Pedro Demo afirma que o professor que nunca foi pesquisador
também nunca foi professor, pois ele torna-se um mero repetidor de informações, no
lugar de produzir conhecimento.
Indisciplina na escola
Talvez um dos grandes desafios de nossos tempos: a construção dos limites e da ética
dentro da escola. Um tema tão polêmico quanto importante, tanto que mereceu, em
nosso estudo, uma aula específica.
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problema também pode não estar no aluno nem no professor, mas na relação que os une,
que é o conhecimento.
Inclusão
Inclusão é um tema bastante amplo, pois ela não se restringe aos portadores de
necessidades especiais. Os excluídos nesse grande Brasil são muitos e as exclusões vão
desde questões raciais e étnicas até os problemas de desemprego. O fracasso escolar
também merece uma análise sobre inclusão, pois, na verdade, esses alunos “não estão na
escola”. No entanto, como teremos uma aula específica sobre fracasso escolar,
trataremos aqui brevemente do desafio da inclusão do portador de necessidades
especiais na escola.
Durante muito tempo, esses alunos estiveram fora da escola, recebendo uma educação
segregada. Os professores, por sua vez, não recebiam, em seus cursos de formação, uma
qualificação adequada para trabalhar com os portadores de necessidades especiais. No
entanto, a inclusão se faz hoje uma realidade presente na maioria das escolas e,
preparados ou não, esses professores estão recebendo os alunos especiais.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE III
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Muitos autores se preocuparam com o tema. Para Alicia Fernandez, por exemplo, todo
sujeito tem a sua modalidade de aprendizagem e os seus meios para construir o próprio
conhecimento, e isso significa uma maneira muito pessoal para se dirigir e construir o
saber. Para a autora, esse processo inicia-se desde o nascimento e constitui-se em molde
ou esquema, sendo fruto do nosso inconsciente simbólico. O desejo de aprender reside
no inconsciente (BOSSA, 2000) e, é claro, é fruto da história de cada sujeito e das
relações que ele consegue estabelecer com o conhecimento ao longo da vida.
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Para Sara Paín, o não-aprender pode representar um sintoma e não um problema, pois,
por meio dele, o professor pode ter contato com a modalidade de aprendizagem do
aluno.
Vamos entender o que significa cada termo e abordagem. Comecemos pelos níveis de
aprendizagem.
É interessante comentar como Jorge Visca relaciona essas etapas da aprendizagem. Para
o autor, desde que nascemos, inicia-se um processo de aparecimento e estabilização de
condutas que permitem definir quatro níveis consecutivos de aprendizagem (são as já
citadas: proto-aprendizagem, deuteroaprendizagem etc.). Vejamos que o autor utiliza a
palavra “consecutivos”, o que significa que cada nível de apren¬dizagem ocorre após o
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Quando a criança avança para o segundo nível, que é a deuteroaprendizagem, para Jorge
Visa, é como se a placenta tivesse sofrido uma terceira mudança e ampliação. A
primeira seria na ocasião do nascimento, a segunda na ocasião da proto-aprendizagem e
a terceira na deuteroaprendizagem. Nesse segundo nível de aprendizagem, a criança tem
contato com as estruturas de conhecimento e com a cultura do grupo em que vive. É o
que Visca vai chamar de axiologia do grupo. O mesmo substrato biológico que servia à
proto-aprendizagem servirá à deuteroaprendizagem. A proto-aprendizagem modificava
o substrato biológico e a deuteroaprendizagem modificará a proto-aprendizagem.
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Bacia Amazônica, mas não se considerava se ele tinha adquirido uma noção espacial
real e, ainda, uma visão crítica da utilização do meio ambiente. A visão psicopedagógica
da aprendizagem concebe o conteúdo como instrumento para construir conhecimento,
mas o conteúdo não pode ter um fim em si mesmo, principalmente porque ele é
mutante. Portanto, interessa-nos que o aluno se aproprie dos conteúdos para construir
estruturas mentais cada vez mais sofisticadas e aprenda a lidar e a buscar novos
conhecimentos.
Para aprender, é necessário que exista uma relação integrada entre o indivíduo e o seu
meio, pois o produto aprendizagem é fruto de uma relação de condições externas e
condições internas, por meio de um processo sensório-neuropsicológico (FONSECA,
1995). Ainda para este autor, a aprendizagem envolve complexos processos
neurológicos, reações químicas, atividades bioelétricas, arranjos moleculares das células
nervosas, eficiências sinápticas, redes interneuronais, metabolismo protéico etc.
Vamos Lêr?
Vítor da Fonseca
A aprendizagem visa utilizar o potencial humano adaptativo, utilizando, para isso, todos
os recursos, sejam internos ou externos. Isso acontece quando variáveis
neurobiológicas, socioculturais e psicoemocionais estão em equilíbrio, pois a
aprendizagem normal e satisfatória exige condições de integridade desses aspectos.
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Para a Psicopedagogia, a nossa forma de ensinar possui uma relação direta com a nossa
forma de aprender. São os modelos de aprendizagem que criamos ao longo da vida.
Como é a sua forma de aprender? De que maneira você costuma aprender melhor?
Cada autor aqui exposto possui uma concepção de aprendizagem que certamente pode
contribuir para a concepção de cada um de nós e fundamentar as nossas práticas
pedagógicas. Podemos encontrar um ponto comum entre todos: é importante
desenvolver no aluno um autoconceito positivo e a percepção da capacidade de
aprender.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE IV
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Alunos que não aprendem são sempre um desafio para nós, professores, não é mesmo?
Para aquele que possui estas dificuldades, a situação não é menos difícil. Não conseguir
acompanhar o seu grupo destrói a auto-estima e deixa o aluno à margem de um processo
que deveria ser plenamente integrador. As causas do não-aprender podem ser diversas.
Para Maria Lúcia Weiss, a prática psicopedagógica deve considerar o sujeito como um
ser global, composto pelos aspectos orgânico, cognitivo, afetivo, social e pedagógico.
Vamos entender a participação de cada aspecto na compreensão da dificuldade de
aprendizagem. O aspecto orgânico diz respeito à construção biológica do sujeito;
portanto, a dificuldade de aprender de causa orgânica estaria relacionada ao corpo. O
aspecto cognitivo está relacionado ao funcionamento das estruturas cognitivas. Nesse
caso, o problema de aprendizagem residiria nas estruturas do pensamento do sujeito.
Por exemplo, uma criança pode estar no estágio pré- operatório e as atividades escolares
exigirem que ela esteja no estágio operatório- concreto. O aspecto afetivo diz respeito à
afetividade do sujeito e de sua relação com o aprender, com o desejo de aprender, pois o
indivíduo pode não conseguir estabelecer um vínculo positivo com a aprendizagem. O
aspecto social refere-se à relação do sujeito com a família, com a sociedade, seu
contexto social e cultural. E, portanto, um aluno pode não aprender porque apresenta
privação cultural em relação ao contexto escolar. Por último, o aspecto pedagógico, que
está relacionado à forma como a escola organiza o seu trabalho, ou seja, o método, a
avaliação, os conteúdos, a forma de ministrar a aula etc. Para esta autora, a
aprendizagem é a constante interação do sujeito com o meio. Podemos dizer também
que é a constante interação de todos os aspectos apresentados. Em contrapartida, a
dificuldade de aprendizagem é o não-funcionamento ou o funcionamento insatisfatório
de um dos aspectos apresentados ou, ainda, de uma relação inadequada entre eles. Uma
rede de aspectos não-satisfatória para a aprendizagem.
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Jorge Visca (1987, p. 58) afirma que a explicação dos fenômenos atuais deve ser
buscada em causas atuais e o intento de explicar fenômenos contemporâneos somente
pelo passado é reducionismo. Para este autor, as causas patológicas a-históricas que
dificultam a aprendizagem são o obstáculo epistêmico, o obstáculo epistemofílico e o
obstáculo funcional. Os obstáculos epistêmicos referem-se a duas alterações da estrutura
cognitiva: a detenção do desenvolvimento e a lentidão, e é derivado do nível de
operatividade do sujeito. Ninguém pode aprender além do que a sua estrutura cognitiva
permite. O obstáculo epistemofílico refere-se ao vínculo afetivo que o aluno estabelece
com a aprendizagem. Um vínculo inadequado, para Jorge Visca, pode dificultar ou até
mesmo impedir a aprendizagem. O obstáculo funcional aparece como uma hipótese
auxiliar e funciona como uma transitoriedade entre as explicações piagetianas e as
explicações freudianas para o não-aprender.
Maria Lúcia Weiss considera algumas hipóteses para o não-aprender de nossos alunos: a
criança pode apresentar alguma dificuldade para aprender antes de entrar na escola, mas
o problema não foi observado. Como a cultura em nossas escolas é a cultura
conteudista, enquanto não há conteúdo, não há dificuldade. Mas será assim mesmo?
Claro que não. As crianças podem dar sinais de dificuldade para aprender mesmo
quando os conteúdos não fazem parte da vida delas, quando, por exemplo, demonstram
muita dispersão, falta de habilidade com atividades do dia-a-dia etc. Ou, ainda, a
dificuldade de aprendizagem se constitui dentro da escola, por causa de práticas
pedagógicas inadequadas, ou quando a criança não tem a dificuldade de fato, mas uma
crise temporária, como uma situação familiar que pode prejudicar a aprendizagem. O
autor recomenda também que se busque uma adequação entre a escola e a criança, que
veremos no texto complementar desta aula.
Vamos refletir um pouco, nesse momento, sobre como agimos diante das dificuldades
dos nossos alunos. É comum prestarmos maior atenção às dificuldades, pois elas saltam
aos olhos com muito mais evidência que as potencialidades. No entanto, a
Psicopedagogia recomenda uma ação diferente A intervenção psicopedagógica
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Organizar as turmas para o trabalho em grupo, juntando alunos que aprendem com
facilidade e alunos que apresentam dificuldades, também pode ser uma boa alternativa,
pois as crianças e os adolescentes “falam a mesma língua” e podem funcionar como
professores particulares uns dos outros.
Como todo professor, queremos que os nossos alunos acertem sempre, mas é bom
adquirir um novo olhar sobre o erro na aprendizagem. O erro é um indicador de como o
aluno está pensando e como ele compreendeu o que foi ensinado. Analisando com mais
cuidado o erro dos alunos, podemos elaborar a reformulação das práticas docentes de
modo que elas fiquem mais perto da necessidade dos alunos.
É importante que o professor reflita sobre as causas do fracasso escolar não para se
culpar, mas para se responsabilizar. Responsabilizar-se significa abraçar a causa e
procurar alternativas para solucionar o problema. Não podemos nos satisfazer com
aprendizagens parciais. Procurar compreender como ocorre o conhecimento, os fatores
que interferem na aprendizagem, seus diferentes estágios, e as diferentes teorias que
podem transformar o trabalho do professor em processo científico, e assim ele
percorrerá o caminho prática-teoria-prática.
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O professor deve, ainda, cuidar da linguagem que é utilizada em sala, para garantir uma
comunicação eficaz com seus alunos. Muitas vezes, o aluno é originário de um
ambiente onde há privação cultural em relação à escola, ou há diferença acentuada de
cultura, causando conflito e dificuldade de comunicação. É comum ouvirmos de alguns
familiares que o filho não nasceu para estudar. Será mesmo? Para Vygotsky, todos os
seres humanos são capazes de aprender, mas é necessário que adaptemos a nossa forma
de ensinar.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE V
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Almeida (2002) afirma que, na década de 90, vivemos uma profunda transformação no
cenário educacional, sendo que essas reformas possuem bases neoliberais. Tais
concepções se mostram especialmente nos planos político-pedagógico, organizacional e
de financiamento.
Consideramos importante uma leitura social das dificuldades de aprendizagem para que
não se cristalize a idéia de que o problema do não-aprender está localizado somente no
aluno, ou no professor, ou no método. É claro que todas essas possibilidades existem,
assim como o conjunto delas, mas uma leitura crítica dos modelos educacionais
propostos que ratificam uma política de acumulação de riquezas para poucos, bem como
uma política de desigualdade, pode ajudar a solucionar e desvelar as causas do não-
aprender.
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É muito importante que o professor, ao analisar as dificuldades de seus alunos, faça isso
de maneira consciente, pois, no senso comum, encontramos profissionais da área de
educação classificando crianças como disléxicas, quando, na verdade, há um forte hiato
social e econômico entre o mundo do professor e o universo do aluno. As experiências
de aprendizagem que são propostas pela escola não fazem sentido para o aluno e,
portanto, não pode haver aprendizagem significativa.
Figueiredo (2002) nos lembra que o fato de pertencer a um grupo social permite ao
sujeito viver suas semelhanças, seus processos de identificação. Os grupos sociais
compõem-se basicamente de diferenças e semelhanças, e isso é inegável, da mesma
forma que é inegável que as diferenças trazem crescimento para o sujeito e para o
grupo. A diversidade se faz presente tanto no plano social como no plano individual.
A escola que possui uma proposta socializadora e integradora não pode, de maneira
alguma, servir de reprodutora de desigualdades, especialmente utilizando-se do
instrumentochave que é a nossa prática pedagógica.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE VI
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Jean Piaget destaca-se ainda atualmente devido à grande contribuição de seus estudos
para o entendimento do desenvolvimento humano. Entenderemos aqui como
desenvolvimento humano o desenvolvimento mental e o crescimento orgânico.
Piaget demonstrou que a criança tem uma forma própria de ver o mundo e entender o
que a cerca, e que, em cada faixa etária ou etapa de desenvolvimento, a concepção de
mundo sofre alterações.
Piaget divide o desenvolvimento humano em períodos e estabelece uma faixa etária para
cada um deles. É fato que as faixas etárias aqui apresentadas não são rígidas, mas
servem de referência para os educadores.
Como o nome já diz, a criança conquista o mundo por meio das sensações e das
percepções. A inteligência, nessa fase, é prática e se manifesta por intermédio dos
movimentos. Não há diferença entre o eu e o mundo, e o desenvolvimento muscular
garante um domínio maior sobre o ambiente.
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mais um aspecto do mundo exterior e o levou para dentro de si, num constante processo
de interação.
Acredito que nenhuma teoria substitui inteiramente outra, pois o trabalho do professor é
sempre interdisciplinar e pode buscar fundamentação teórica em diversas concepções,
ainda que estas pareçam antagônicas em alguns momentos. Dessa forma, a teoria de
Piaget pode enriquecer o trabalho do professor na medida em que traz concepções
interessantes sobre o processo de aprendizagem, especialmente quando nos apresenta o
conceito de assimilação e equilibração para a efetivação da aprendizagem.
Vygotsky valoriza bastante a prática docente e seus estudos são voltados para a atuação
do professor em sala de aula. Ele esclarece que, se temos 20 alunos em sala, temos,
então, 20 zonas proximais diferentes, pois cada aluno chega à sala de aula com uma
história diferente e com um repertório diferente, e a cada informação que o professor
fornece, a cada proposta de novas experiências, essa zona proximal se altera, formando
um novo repertório. Logo, o professor não possui nenhum tipo de controle sobre a zona
proximal de seus alunos.
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O trabalho em grupo é uma prática valorizada pelo autor, dada a força da interação
social na sua teoria. Por meio das trocas, o aluno interioriza conceitos e aprende,
apropriando-se do mundo.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE VII
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Pichon-Rivière também elaborou a “teoria dos três D”. O que seria? Depositante,
depositado e depositário. Esta teoria acredita na interação depositante/depositário por
meio do depositado. O depositante é o cliente, no nosso caso, o aluno; o depositado é o
capital que, para nós, representa o conteúdo, o conhecimento; e o depositário é o
professor. A teoria de Pichon-Rivière nos faz concluir que a aprendizagem acontece por
meio de um processo de interação entre aluno, professor e o conteúdo, e que esta
relação é permeada de afetividade e conflitos.
Muito embora os termos citados sejam novos para muitos professores, na prática, a
maioria de nós já experimentou essas situações, sem saber como elas se denominavam,
seja na experiência de professor ou de aluno. Quem nunca teve medo de aprender? Ou,
ainda, quem nunca sentiu ansiedade diante de um novo conteúdo, ou diante de uma
avaliação?
Para a Psicologia Social, nenhuma obra pode ser compreendida fora da complexidade
das relações sociais, e toda obra cultural é a expressão do social em forma de
sensibilidade e interpretação. Portanto, para este autor, nenhum conhecimento se
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A técnica do grupo é justificada por ser uma experiência social e um sistema de relações
que pretende atender às demandas dos seus participantes. Pichon-Rivière também
possui um conceito muito importante para compreendermos a aprendizagem: o ECRO -
Esquema Conceitual Referencial e Operativo, que representa a orientação para o ato de
aprender, as experiências e a afetividade do aluno, ou do sujeito como um todo.
Portanto, ele é único e não há um ECRO igual ao outro. Para que essa aprendizagem se
configure, é necessário que haja o vínculo, que se define como a estrutura de
complexidade que inclui um sujeito, um objeto e a relação que ocorre entre ambos. O
vínculo pode se tornar patológico quando o sujeito perde suas relações com a realidade,
que é o caso de doenças como a esquizofrenia.
O corpo biológico funciona como uma dimensão da mente, na qual estão situados os
objetos internos, mas não há uma divisão entre as dimensões do ho¬mem, pois a única
dimensão é a humana. O corpo biológico é o que vai ensinar à criança o limite do
mundo.
A Psicologia Social também contribuiu bastante para a Didática e, nesse caso, tem a
função principal de modificar a atitude do sujeito. Para este modelo de didática, a
aprendizagem é a apropriação instrumental da realidade, para transformá-la. E, assim, o
processo ensino-aprendizagem e professor-aluno formam uma única unidade.
Pichon-Rivière ressalta que a técnica do grupo operativo só pode ser aprendida por meio
da experiência pessoal, da mesma forma que, para ser professor, é preciso ter sido
aluno, e a tarefa deste grupo é aprender um assunto, utilizando como técnica de
aprendizagem a interação com todos os componentes.
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Se observarmos as turmas que já passaram por nós, vamos perceber que, em cada uma,
havia o aluno que fazia o papel do engraçado, o aluno que era o modelo de intelectual, o
indisciplinado, não é mesmo? Os anos passam, as turmas mudam, mas os papéis
permanecem. É como se o grupo precisasse de determinadas funções
Com uma visão renovada de conteúdo, entendemos que a matéria a ser ensinada não se
resume somente aos estudos da Língua Portuguesa ou da Matemática, mas questões
sobre ética, indisciplina, dilemas, podem fazer parte das aulas dos nossos alunos, a fim
de se promover uma construção moral mais sólida. Nesse caso, o grupo operativo pode
ser um grande aliado do professor na construção da moralidade, mas também da
afetividade.
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O grupo operativo é uma técnica formulada com base na Teoria do Vínculo, também de
Pichon-Rivière. Hoje, é bastante utilizada em empresas por psicopedagogos e
psicólogos, para acompanhar o desenvolvimento dos profissionais na execução de uma
tarefa e na compreensão das relações interpessoais. A utilização da técnica em empresas
e a pouca utilização na educação não significa que a técnica seja imprópria para o
segundo caso, mas existe sim, na verdade, a falta da cultura da proposta entre os
educadores.
Para Bock (2002), o grupo operativo possui grupos abstratos enquanto se desenvolve, e
assim se classificam:
Com essa concepção, é possível concluir que o aprender e o não-aprender fazem parte
da mesma unidade e que, portanto, uma criança pode oscilar entre esses dois processos,
da mesma forma que o professor pode procurar compreender os caminhos da
aprendizagem dessa criança e atingir o seu não-aprender pelas potencialidades e não
pelas dificuldades. O não-aprender pode ter a sua causa centrada na identidade social.
Pichon-Rivière descobriu isso trabalhando com imigrantes, quando constatou que os
problemas que seus pacientes possuíam tinham como causa a transculturação e a perda
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dos vínculos internos. Muitas vezes, a cultura do aluno diverge da cultura da escola e do
professor e, embora a criança não tenha mudado de país, há um rompimento com os
seus vínculos originários, que são os de sua família. Nesse caso, é necessário que a
família “autorize a criança a aprender”, caso contrário, ela pode se considerar um
“estrangeiro” na escola. Não é essa a leitura que muitas crianças fazem da escola? “Isso
aqui não é para mim”, “não nasci para isso”, “não é o meu mundo”.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE VIII
A indisciplina na escola e os distúrbios de conduta como
problemas reativos de aprendizagem
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A escola contemporânea tem se defrontado com diversos dilemas éticos, tais como o
roubo, o uso de drogas, a vida sexual precoce, a gravidez na adolescência, a permissão
ou não do namoro na escola etc. Nós, profissionais de educação, olhamos para trás,
buscando em nossa formação teorias que nos ajudem a compreender e intervir nas
situações éticas, porém nem sempre encontramos. A sociedade mudou bastante no que
diz respeito aos valores morais e os problemas na escola são cada vez mais inéditos.
O fato é que cada escola acaba resolvendo os seus conflitos éticos, um a um, adotando o
critério “cada caso é um caso”, muitas vezes contrariando ou em consonância com a
própria concepção de homem e de educação. Os conflitos e dilemas éticos são muitos,
mas, nesta aula, vamos nos deter na indisciplina na escola.
A partir do conceito de indisciplina que foi aqui exposto, vamos agora tratar de como a
criança recebe as regras e a autoridade do adulto e do ambiente social durante o seu
desenvolvimento.
Até por volta dos dois anos de idade, a criança está na fase da anomia, que significa
ausência total de regras. Significa que nessa fase ela não é capaz de discernir o certo do
errado e a aquisição das regras virá pela formação dos hábitos. A rotina de horários e
atividades será um ótimo recurso para a apreensão da disciplina e das regras sociais. No
entanto, a criança não é capaz, ainda, de compreender o sentido semântico das
expressões verbais e o que demarca se ela está errando ou acertando é a expressão facial
do adulto e o tom de voz utilizado. Isso ocorre porque as crianças, no período da
anomia, não são capazes de compreender as regras e, por isso, sorriem quando um
adulto pede para não mexer na tomada elétrica, por exemplo, e continuam colocando o
dedinho. Também é comum encontrar crianças de turmas de maternal resolvendo seus
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problemas com outras crianças na “base da mordida”. É o sensório falando mais alto e o
corpo precisa “participar” das decisões, já que a cognição não está preparada para isso.
Depois de dois anos de idade começa o período da heteronomia moral, quando o ser
humano passa a compreender a presença das regras, mas não é capaz de utilizá-las com
autonomia e, portanto, necessita do adulto para conduzi-lo. A heteronomia aparece,
inclusive, nas atividades do dia-a-dia, como, por exemplo, quando a criança espera que
alguém mande lavar-se ou que entregue a refeição ou, ainda, que avise que está no
horário de fazer o dever de casa etc. A heteronomia também vai se caracterizar pelo
cumprimento das regras a partir da presença da autoridade. A autoridade é quem
controla o respeito pela lei, pois as regras ainda não foram absorvidas pelo indivíduo. É
o exemplo de um motorista que só respeita as leis de trânsito se houver a presença de
um guarda nas avenidas, caso contrário, ele desrespeita, muito embora seja consciente
de todas elas.
Depois de 11 anos de idade, a criança pode ou não adquirir a autonomia moral, já que,
segundo Piaget, uma parcela muito pequena da sociedade atinge essa fase de
desenvolvimento. A autonomia moral se caracteriza pela compreensão e cumprimento
das regras, pela consciência da necessidade e da importância delas e não pela punição
que pode ocorrer, como no caso da heteronomia. A presença ou ausência de um guarda
de trânsito é indiferente para o cumprimento das regras, porque já foram interiorizadas
pelo sujeito.
Ainda para Piaget (1977), a forma como o adulto vai demarcar os limites e corrigir as
infrações cometidas pelas crianças pode levar o sujeito à autonomia moral ou à
heteronomia moral. Vejamos como isso ocorre.
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A maioria dos alunos com problemas de indisciplina fica com a imagem muito
desgastada na escola e a relação com a equipe pedagógica nem sempre é positiva.
Faz-se necessário, também, que a escola tenha seus limites e códigos de conduta
bastante claros, deixando evidentes, também, as suas formas de sanção, ou seja, como
trata cada situação de indisciplina. É relevante, por exemplo, diferenciar as sanções por
gravidade e por situação.
Isso significa que ela pode não estar conseguindo resolver algum problema, não
sabendo como expressar-se e a forma escolhida pelo seu inconsciente é a indisciplina.
Nesse caso, essa reação surge como um sintoma e não como um problema em si. Cabe
aos educadores criar mecanismos para fazer o aluno expressar a razão de seu
comportamento.
A razão do problema pode estar ainda no contexto familiar. Nesse caso, havendo uma
mudança brusca de comportamento, é necessário que a família seja convidada para
oferecer dados e receber ajuda dentro dos limites e possibilidades da escola.
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EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
Cite um dilema ético que surge na escola e merece mais atenção dos educadores.
UNIDADE IX
Construção da ética e da moralidade no cotidiano escolar:
uma leitura piagetiana
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Para Bock (2000), a escola cumpre o papel de preparar as crianças para viverem no
mundo do adulto, trabalhando e assimilando a cultura, as regras sociais, os
conhecimentos básicos, os valores morais coletivos, os comportamentos considerados
adequados pela sociedade, estabelecendo uma mediação entre a criança e a sociedade. É
bom lembrar que esta é uma tarefa muito complexa, pois a escola não trabalha com um
valor padrão, mas com um conjunto deles, já que cada criança e adolescente traz de casa
um conjunto de valores construídos dentro do grupo familiar.
PARA REFLETIR
Da mesma forma que nenhum currículo é neutro e recebe todas as influências sociais, a
escola também não é neutra quando os valores morais entram em cena. Eles aparecem
no discurso do professor, nos livros didáticos, no uniforme, na proposta pedagógica e,
especialmente, nas relações interpessoais que são construídas no espaço escolar.
Para Piaget, existe uma homogeneidade entre os aspectos cognitivo, afetivo, social e
ético. Para ele, a moral é a tendência de aceitar e seguir um sistema de regras que
regulam o comportamento interpessoal. Essas regras são absorvidas de forma gradativa.
A prática das regras passa por diferentes estágios, até que se possa, ao nível da ação,
realizar o que se está pensando.
O comportamento moral
No período entre 4 e 7 anos, a criança passa pelo estágio egocêntrico e não importa se
ela conhece ou não as regras sociais. Ela não leva em consideração o ponto de vista de
outras pessoas e concentra-se somente no seu. O egocentrismo afeta não só a
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linguagem, como também o comportamento moral. Creio que todos nós lembramos que
certo dia achamos que a lua estava nos seguindo e que ela andava na medida em que nós
andávamos. Esse é um exemplo do pensamento egocêntrico infantil. A criança julga que
o mundo gira em torno dela, o que nada tem a ver com o egoísmo. As coisas existem
porque a criança existe, nessa fase. É comum, também, as crianças pensarem o mesmo
sobre a existência de seus professores e da escola. No final de semana, como ela não vai
à escola, é como se todos os profissionais “adormecessem” e aguardassem o seu retorno
na segunda-feira. Nessa fase, as crianças podem estar brincando em grupo, mas as
brincadeiras são individuais.
A partir dos 7 anos, inicia o estágio da cooperação incipiente, que não significa o
trabalho para um mesmo fim, e sim o fato de o jogo adquirir uma característica mais
social. A competição também aparece nessa fase. A linguagem socializada surge e a
criança começa a levar em consideração o ponto de vista do ouvinte.
Aos 11, 12 anos, surge o último estágio do comportamento moral, que é a cooperação
genuína. Nessa fase, há o completo domínio das regras. Existe uma regra comum e
dentro da regra é que se tenta vencer o adversário. As regras têm tanta importância
nessa fase que discutir sobre elas pode ter mais significado que o jogo em si. Portanto, o
comportamento moral ocorre em três estágios: estágio egocêntrico, cooperação
incipiente e cooperação genuína.
Concepção de regras
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Piaget estudou, ainda, como as crianças julgavam moralmente os conflitos éticos. Para
isso, ele utilizou-se de pequenas histórias que envolviam temas como culpa, castigo,
mentira e entrevistou várias crianças para chegar à formulação de sua teoria. O autor
descobriu que, entre 4 e 7 anos, a criança julga a culpa, por exemplo, levando em
consideração a quantidade e o tamanho. Por exemplo, quem quebrou 15 xícaras é
sempre mais culpado do quem quebrou 4, independentemente de como ocorreu o
episódio, se de maneira acidental ou proposital.
É importante que o professor construa regras com seus alunos e que saiba o que eles são
capazes de compreender e o que não são, a partir da fase ou estágio em que se
encontram. De toda sorte, a construção de valores deve fazer parte do currículo não
como um conteúdo a ser ensinado, ou como tarefa de uma disciplina específica, como
aconteceu no passado com a Educação Moral e Cívica e como acontece ainda hoje com
a religião na escola, mas como uma proposta pedagógica da escola. Uma boa alternativa
é levar sempre os conflitos éticos que surgirem na sala a julgamento do grupo para
facilitar a apreensão das regras.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
De que maneira podemos ensinar valores na escola sem que eles se tornem
conteúdos programáticos?
UNIDADE X
A construção do currículo na escola segundo a
psicopedagogia
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Se fizermos uma ponte com as profissões que também são valorizadas pela mesma
sociedade, vamos verificar que elas se concentram na área biomédica, tecnológica e
algumas da área humana. Ou seja, se um filho adolescente comunica à família o seu
desejo de ser médico, advogado ou engenheiro, o fato é comemorado, mas se este
mesmo jovem expõe o desejo de ser músico, a família certamente demonstrará
preocupações com o seu futuro. Logo, não é à toa que as disciplinas recebem a carga
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horária na estrutura do currículo, não é mesmo? De certa forma, a sociedade “diz” para
a escola o tipo de cidadão que ela deve formar. Isso explica também o papel de
reprodução das desigualdades sociais que algumas escolas desempenham.
Zabala (1999) faz uma diferenciação entre os métodos globalizadores e os enfoques que
trabalham diferentes relações entre os conteúdos. Nos primeiros, os conteúdos de ensino
não se apresentam nem se organizam a partir de uma estrutura disciplinar, mas a partir
de um tema ou problema, por meio do qual os conteúdos são estudados. O referencial
organizador do trabalho pedagógico é o aluno e suas necessidades educativas. Os
conteúdos estão condicionados aos objetivos de formação do aluno. Os segundos se
caracterizam pelo tipo de relação que se estabelece entre as disciplinas; não se referem a
uma metodologia concreta, mas a uma determinada maneira de organizar e representar
os conteúdos, a partir das disciplinas. A prioridade básica são as matérias e sua
aprendizagem. Zabala observa que as relações entre as disciplinas constituem um
problema essencialmente epistemológico, quer dizer, uma concentração de
preocupações com a construção do conhecimento, e, como conseqüência, uma questão
escolar.
Este autor apresenta quatro tipos diferentes de relações entre as disciplinas que têm
aplicação no campo do ensino. São elas:
É fato que não podemos continuar trabalhando com alunos utilizando a porta da escola
como limite isolante do mundo. A realidade vivida e sentida garante aprendizagens
significativas. Muitos conteúdos se tornam amorfos porque estão desconectados da
realidade, e as aulas tornam-se enfadonhas, intermináveis, gerando o baixo rendimento.
Há necessidade de refletir sobre o conhecimento, questionando o acúmulo de conteúdo
que de pouco valerá na vida dos nossos alunos. Principalmente porque o
desenvolvimento tecnológico atual é de ordem tão variada que fica impossível atuar
com a velocidade necessária para produzir e acumular tanto conhecimento. Isso também
não é necessário. O conhecimento deve ser construído para a produção de competências
e para a construção da autonomia intelectual, objetivo maior da Psicopedagogia.
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Posteriormente, a equipe deve se reunir mais uma vez para cuidar da elaboração de um
currículo, que é algo que deve ser feito em equipe, pois, se ninguém educa sozinho, e na
sala de aula os alunos recebem influências das relações de toda a escola, no momento de
elaborar um currículo, essa unidade deve permanecer. Durante a elaboração, a equipe
deve considerar os parâmetros nacionais, pois as diferenças devem ser respeitadas.
Considerando esta unidade, a equipe da escola pode começar a estabelecer o que é
importante saber na sociedade em que vivemos e, principalmente, na comunidade onde
a escola está inserida. Aí temos mais uma gama de desafios. Muitas escolas se
ressentem da falsa liberdade que possuem para elaborar seus currículos. Classificam
essa liberdade como falsa porque afirmam que são reféns do vestibular e de outros
mecanismos de acesso e, portanto, a liberdade não existe. É necessário ensinar o que os
concursos ditam. Temos mais um desafio: para a Psicopedagogia, já vimos, a escola
possui uma função socializadora, uma repressora e outra transformadora. A socialização
representa a transmissão de uma cultura vigente às novas gerações, e isso é tarefa da
escola e, portanto, do currículo. A função repressora diz respeito aos limites
estabelecidos e a função transformadora, à quebra de paradigmas e à mudança das
desigualdades sociais. Dessa maneira, a escola tem como função, por meio do currículo,
transmitir e transformar, funções completamente dicotômicas, não é mesmo? É um
desafio e vencê-lo é necessário. Construir um currículo, equilibrando todas essas
dimensões, é nossa tarefa.
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
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UNIDADE XI
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Mas o eixo de nossa discussão não é o plano em si, ou seja, os documentos. Isso você já
aprendeu a fazer durante a sua formação docente. O que nos interessa agora é a atitude,
ou seja, o planejamento. Planejar é uma das atividade docentes mais importantes,
porque faz com que o professor reflita sobre a sua prática diária, sobre os objetivos que
deseja alcançar e sobre a forma como pretende alcançá- los. É a forma mais eficiente,
junto à avaliação, é claro, que o professor possui de controlar a aprendizagem de seus
alunos e garantir a forma de intervenção mais adequada para cada momento. Portanto,
se o planejamento é uma forma de controlar a aprendizagem, bem como promovê-la, o
professor pode trabalhar na esfera da prevenção das dificuldades de aprendizagem,
planejando de maneira a respeitar as características do seu público e também as
necessidades que este apresenta.
Planejar um conteúdo além das possibilidades do aluno pode impedir que ele aprenda,
já que o que estamos oferecendo está além de suas possibilidades cognitivas. Trabalhar
aquém dessas possibilidades não proporciona aprendizagem e desenvolvimento, haja
vista que as experiências de aprendizagem não incitam nenhum movimento intelectual.
Atualmente, trabalhamos com o conceito de plasticidade cerebral da teoria de Vygotsky.
Para este autor, o cérebro é “plástico”, pois tem a capacidade de se desenvolver, mas,
para que isso ocorra, é necessário que haja intervenção pedagógica, quer dizer, o
espontaneísmo não existe para Vygotsky e a intervenção do professor tem um
importante papel para a aprendizagem.
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Seja qual for o enfoque do professor, este deve estar em consonância com a proposta da
escola e com o processo didático. Ao planejar, é preciso que o professor acompanhe e
avalie os seus alunos de modo a resgatar aqueles que possuem dificuldades e que
considere o vínculo desses alunos com o ato de aprender.
Mamede (1983), citando Luria, considera que competências como a escrita, leitura e
cálculo intencionais são patrimônios exclusivos da espécie humana, provida de um nível
superior de funcionamento mental dedicado ao processamento de tais informações
complexas, quer dizer, o funcionamento cortical. O homem destaca- se dentre os
animais, na medida em que avança para além dos automatismos, pela capacidade de
elaboração, transformação e simbolização dos dados recebidos e programação de
respostas diferenciadas, observadas em atividades motoras e mentais revestidas de
intencionalidade. Isso significa que a intervenção do professor, devidamente planejada,
tem muito poder na ação pedagógica e na construção da aprendizagem, haja vista que a
interação social é a grande provocadora da elaboração de estruturas mentais superiores.
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O componente afetivo também não pode ser esquecido. Para Mamede (1993), o
momento em que a criança entra em contato com o mundo é considerado um marco
inicial na construção do conhecimento e inseparável da afetividade. Esta assume o papel
de comportamento energético que age na relação do sujeito com o objeto, enquanto que
o aspecto cognitivo é caracterizado por suas estruturas hierárquicas.
Piaget considera a aprendizagem não como cada criança relaciona os conceitos de cada
matéria, mas como ela relaciona o conhecimento geral, amplo, no qual o mais específico
estaria inserido como composição do conhecimento maior. Logo, conhecimento não é
um agrupamento de particularidades, mas uma estrutura organizada e resultado das
trocas com o mundo exterior.
Sugestões de formulários
Abaixo, você encontrará sugestões de formulários para a coleta de dados que ajudarão
na organização de um planejamento mais adequado e mais funcional para a
aprendizagem.
Nome: ___________________________________________________________
Idade: ___________________________________________________________
Série: ____________________________________________________________
Lógico-matemática _________________________________________________
Lecto-escrita ______________________________________________________
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Escola: _____________________________________________
Objetivos ___________________________________________
Conteúdo/assunto ____________________________________
Dúvidas e dificuldades da aula anterior que precisam ser sanadas antes da apresentação
do novo conteúdo____________________________________
Na dimensão afetiva_______________________
__________________________________________________________
Avaliação _________________________________________________
EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
UNIDADE XII
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A maioria dos profissionais que atuam nessa realidade são professores leigos, que
exercem com grande empenho o seu trabalho. Então, cabem aqui algumas perguntas:
qual é a melhor escola? O que é uma boa escola? O que os instrumentos de avaliação
externa entendem por qualidade de ensino? Qual é o padrão desejado por eles?
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Cabe aqui ressaltar que, ao elaborar instrumentos de avaliação, o professor deve rever
os objetivos de ensino que foram descritos no planejamento e a correção desses
instrumentos deve contemplar os objetivos para que o processo seja justo.
É importante diversificar os procedimentos de aula e refletir sobre o que cabe para cada
assunto em termos de procedimentos de ensino. É impossível, por exemplo, que o aluno
tenha o domínio da resolução de expressões numéricas sem praticar e que o faça
somente com a leitura de exemplos do livro-texto. Da mesma forma, não faz sentido que
algumas aprendizagens se dêem por conta da imaginação de nossos alunos. Imaginar
como é a Floresta Amazônica, imaginar as mudanças de estado da água. Há sempre um
vídeo, um cartaz que pode ser mostrado e uma experiência que pode ser realizada em
sala, mesmo quando a escola não possui laboratório, desde que preservemos as
condições de segurança, é claro. O que o aluno experimenta ou visualiza é muito mais
fácil para memorizar, para despertar o desejo de aprender e, portanto, estimular a
aprendizagem.
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EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
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UNIDADE XIII
A psicopedagogia institucional na escola inclusiva
Nesta aula, vamos abordar um dos temas mais polêmicos da contemporaneidade: a
inclusão. Durante muito tempo, só se dirigiam para a Educação Especial, área
responsável pela educação de pessoas portadoras de necessidades educacionais
especiais, aqueles profissionais ou estudantes que se interessavam pelo tema, pois os
alunos especiais não freqüentariam as classes regulares, logo, não havia porque estudar
sobre o assunto. O tempo passou, e as coisas mudaram muito. Alguns documentos
surgiram para modificar a realidade educacional. O primeiro documento importante na
mudança do cenário da exclusão foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos,
datada de 1948. Embora não seja um documento específico da Educação Especial,
colaborou bastante para a formulação de novas reflexões sobre a inclusão, como
veremos a seguir.
Muito se tem falado sobre o processo de inclusão, e quase sempre com a conotação de
que inclusão e integração escolar seriam sinônimos. Na verdade, a integração insere o
sujeito na escola, esperando uma adaptação deste ao ambiente escolar já estruturado,
enquanto que a inclusão escolar implica redimensionamento de estruturas físicas da
escola, de atitudes e percepções dos educadores, adaptações curriculares, dentre outros.
A inclusão, num sentido mais amplo, significa o direito ao exercício da cidadania, sendo
a inclusão escolar apenas uma pequena parcela do processo que precisamos percorrer. A
cidadania do portador de necessidades especiais é um caminho recente e que evolui
timidamente, pois toma corpo somente na década de 90, com o movimento de
“Educação para todos”, apesar de ter início em forma de diretrizes políticas, pelo menos
desde 1948, quando da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos
(SANTOS, 2001). A Declaração Universal dos Direitos Humanos representa, sem
dúvida, um grande marco no processo de inclusão social da pessoa portadora de
necessidades especiais. Ainda que não seja um documento especificamente destinado à
Educação Especial, favorece indiretamente o movimento de inclusão social do portador
de necessidades educativas especiais, pois propõe a igualdade entre os homens e o
direito à educação a todos os indivíduos.
A inclusão educacional trata do direito à educação comum a todas as pessoas, sendo que
esse direito deve ser exercido, sempre que possível, junto às demais pessoas nas escolas
regulares. As tendências mais recentes dos sistemas de ensino são:
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“Se por um lado, a educação inclusiva exige que o professor do ensino regular
adquira formação para fazer frente a uma população que possui características
pecu¬liares, por outro, exige que o professor de educação especial amplie suas
perspectivas, tradicionalmente centradas nessas características” (BUENO, 1999,
p. 162).
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O artigo 208 da mesma Constituição ressalta que o “dever do Estado com a educação
será efetivado mediante a garantia de, dentre outros (...) atendimento educacional
especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de
ensino”.
A forma como a Educação Especial está expressa nas Leis de Diretrizes e Bases
formuladas ao longo dos anos traduz o tratamento dado a ela pela sociedade e interfere
na distribuição de verbas, na divisão de recursos e, especialmente, nas ações educativas.
Se a Educação Especial fará do sistema geral de educação ou se estará à margem deste,
deve fazer parte das definições das diretrizes da Educação Especial.
Art. 4.°, III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência será feito
preferencialmente na rede regular de ensino.
Art. 58 - entende-se por Educação Especial, para os efeitos desta lei, a modalidade de educação
escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para portadores de necessidades
especiais.
É preciso ter claro que, para a conquista do processo de inclusão de qualidade, algumas
reformulações no sistema educacional se fazem necessárias. Seriam elas: adaptações
curriculares, metodológicas e dos recursos tecnológicos, a racionalização da
terminalidade do ensino para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a
conclusão do Ensino Fundamental, em virtude das necessidades especiais, a
especialização dos professores e a preparação para o trabalho, visando à efetivação da
cidadania do portador de necessidades especiais.
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A escola, por sua vez, para promover a inclusão, deve eliminar barreiras que vão além
das arquitetônicas, mas principalmente as atitudinais. São necessárias algumas
adaptações de grande e pequeno porte, tais como a adaptação curricular, a adaptação do
sistema de avaliação da aprendizagem, de materiais e equipamentos, a preparação dos
recursos humanos e a preparação dos alunos e pais de alunos que receberão o portador
de necessidades especiais. Sem as devidas adaptações, um processo de inclusão pode ser
mais segregador que a exclusão declarada, pois entendemos que a inclusão não pode se
restringir à convivência social, mas deve zelar pela aprendizagem da criança com
necessidades especiais.
Mas a inclusão não se faz somente por meio do aluno e da escola. A família tem um
papel muito importante neste processo. Os sentimentos da família sobre a deficiência de
seus filhos são cíclicos e podem transitar entre a aceitação e a negação, especialmente
nas mudanças de fases da criança. Por exemplo, quando o filho entra na adolescência, é
comum os pais o compararem com os demais jovens e, na maioria das vezes, o
resultado dessa comparação é negativo, considerando sempre o que ele não é capaz de
fazer e, muitas vezes, desconsiderando o quanto já evoluiu.
A escola também pode colaborar dando sugestões aos familiares de como eles podem
agir em casa, de maneira que se tornem co-autores do processo de inclusão de seus
filhos. Muitas vezes, as estratégias educacionais que são desenvolvidas em sala de aula
não têm uma continuidade dentro de casa. É comum, por exemplo, a escola não permitir
o uso de fraldas e incentivar que a criança utilize o banheiro quando necessário, mas,
em casa, o uso das fraldas continuar existindo.
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EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
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UNIDADE XIV
Família e aprendizagem
O mundo mudou bastante neste século e, com ele, a família. Qual o conceito de família
no mundo contemporâneo? Você saberia explicar, por exemplo, qual o grau de
parentesco da nova mulher do pai de seu aluno com a criança? Se você pensou em
madrasta, errou! É correto usar a palavra madrasta quando a mãe da criança é falecida.
Já consegue se lembrar de algum termo para denominar esse grau de parentesco? Não
tente... Ele não existe! A família mudou tanto, tanto, que a Língua Portuguesa não
acompanhou essas mudanças. Na Língua Inglesa, encontramos os termos step- mother,
stepfather, mas, na Língua Portuguesa, eles não existem. Diante de tantas alterações, a
educação não poderia deixar de receber as influências dessa importante instituição
social que é a família.
Desde o ingresso da criança na escola, é necessário que a família “autorize” a ida de seu
filho para esse novo espaço, caso contrário, a criança terá dificuldades de adaptação
desde a sua entrada. É comum assistirmos a cenas no portão de escolas de Educação
Infantil de choros e birras por parte de crianças muito pequenas, e, quando as crianças
entram na escola, sem ao menos olhar para trás, são os pais que choram no portão.
Sentem-se abandonados pelos filhos e enciumados quando estes começam a demonstrar
carinho por seus professores. Muitas vezes, esses sentimentos não estão no plano de
nossa consciência, mas eles surgem nas relações e são demonstrados em algumas
atitudes.
A participação dos pais na vida escolar dos filhos é fundamental para a aprendizagem, e
participar não significa estar todos os dias na escola ou ensinar o dever de casa. Pais
analfabetos podem participar da vida escolar dos filhos organizando formas para que
eles tenham momentos de estudos diários em casa e conversando sobre a sua
dificuldade com os professores.
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seu filho se recupere de uma nota baixa, mas decide viajar nas vésperas das provas da
criança, alegando que ela pode levar os livros para estudar durante a viagem. Sem
querer, esta família está dizendo ao seu filho que existem coisas muito mais importantes
que a escola, e pior, que estudar pode ser feito de qualquer forma, em qualquer lugar.
Sabemos que não deve ser assim, pois o ato de estudar, por ser uma atividade artificial,
inventada pelo homem, exige esforço pessoal e disciplina para se transformar
verdadeiramente em hábito. Por meio de suas atitudes, uma família pode dizer ao seu
filho se estudar é algo importante ou não.
Uma criança também pode desejar não aprender (de maneira inconsciente, é claro), para
continuar fazendo parte de sua família. Ou seja, vamos imaginar que esta criança possui
pais e irmãos mais velhos analfabetos e ela, somente ela, teve a oportunidade de ir à
escola. Essa criança pode “decidir” não aprender por fidelidade à família, pois, se
aprender, ficará tão diferente de seu grupo que deixará de pertencer a ele. Assim, opta-
se pelo fracasso. Curioso, não? Mas esse fato é bem mais freqüente do que se imagina
no ambiente escolar.
Seja qual for o problema, ficaríamos durante muito tempo listando todos eles. É certo
que nem a escola nem a família podem prescindir uma da outra. Ambas são co-autoras
no processo de aprendizagem das crianças e jovens e possuem papéis muito específicos.
É comum ouvirmos de educadores que a família moderna tem depositado muito de seus
papéis na escola e deixado de cumprir com suas funções, acreditando que a escola
poderá suprir todas as lacunas. Mas é importante perguntar até que ponto a escola
também não aceitou essas funções e deixou de estabelecer limites claros de atuação.
Uma não pode executar o papel da outra, mas devem, sim, serem complementares na
ação de um único objetivo, que é a aprendizagem de seus filhos e alunos.
Ter a família como parceira do processo educativo de nossos alunos facilita o trabalho
da escola e amplia a capacidade de participação dos pais na vida escolar dos filhos.
Muitos pais se queixam que são chamados apenas para ajudar a resolver problemas e
dificilmente para receber elogios, e todos nós sabemos o poder reforçador de um elogio.
Então, vale a pena experimentar. A criança sente grande prazer em ampliar os seus
vínculos com a escola quando percebe que seus pais são valorizados pelo contexto
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escolar. Uma boa sugestão para isso é convidar os pais para fazer “palestras” para a
turma de seus filhos sobre o seu trabalho, a sua profissão e a sua experiência de vida. Há
sempre uma avó que pode ensinar às nossas turmas a fazer pães deliciosos, contar
histórias do tempo antigo e ajudar os professores a ampliar o afeto de seus alunos pela
aprendizagem.
Algumas escolas têm desenvolvido uma atividade denominada “escola de pais”. Trata-
se de um encontro semanal para conversar sobre temas inerentes à educação dos filhos.
Educar um filho é uma das tarefas mais difíceis, pois os pais aprendem no processo, no
decorrer do desenvolvimento dos filhos e o encontro com outros pais que estejam
vivenciando a mesma situação pode ajudar os componentes do grupo a encontrar
soluções para diversos problemas, além de reconhecer que existem muitos pais na
mesma condição de dúvida, de conflito etc.
Nessa ótica, acredito que as reuniões de pais podem assumir uma característica diferente
da usual na maioria das escolas. Pode se tornar um momento de real participação dos
pais na vida dos filhos, além de tomar ciência das notas. Além disso, é importante que a
escola incentive os pais a construir uma relação mais saudável com a aprendizagem de
seus filhos. Na adolescência, quando os filhos não se sentem apoiados pelos pais nas
suas dificuldades escolares, é comum esconderem provas e resultados insatisfatórios.
Esse comportamento é um sintoma de uma relação familiar que precisa ser reconstruída.
Da mesma forma, pais que se surpreendem com a reprovação dos filhos denunciam a
falta de participação na vida deles. Afinal, ninguém reprova repentinamente.
Quanto mais os filhos crescem, mais os pais se afastam da escola e, muitas vezes, isso
acontece a pedido dos filhos. Quando os filhos estão na Educação Infantil, há uma
proximidade muito grande dos pais com os professores e a existência de estreitos laços
afetivos. Ao ingressar no Ensino Fundamental, especialmente no período da
alfabetização, os filhos ainda podem contar com a presença dos pais na escola, mas
quando chega a adolescência e com ela o desejo de romper limites e de conquistar a
liberdade, é normal que os filhos não se sintam à vontade ao serem levados até a porta
da escola ou de encontrar seus familiares no pátio. Perante os colegas, parece que o
adolescente ainda é um bebê, idéia essa que é enfaticamente rejeitada. No entanto,
respeitar esse desejo dos filhos adolescentes não significa que os pais devam se afastar
da vida escolar de seus filhos. Afinal, eles pensam já ter condições de se cuidar de
maneira independente, mas todos nós sabemos que é apenas fruto do sentimento
fantasioso de onipotência da adolescência.
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EXERCÍCIOS DE CONCLUSÃO:
Descreva como é a participação da família na vida escolar dos filhos nos dias de
hoje.
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Referências
GLAT, R.; DUQUE, M. A. Convivendo com Filhos Especiais: o olhar paterno. Rio de
Janeiro: Sette Lettras, 2003.
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PIAGET, Jean. Seis Estudos de Psicologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985.
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ATIVIDADES AVALIATIVAS
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