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Sistema Atlas - conversor DOCX linearizado PNLD2018 - Copyright © 2017 Editorial 5


Arte por toda parte: volume único
Solange dos Santos Utuari Ferrari, Daniela Leonardi Libâneo Sardo, Fábio Sardo, Pascoal Fernando
Ferrari
FTD
Pá gina 1

Arte por toda parte


VOLUME ÚNICO
ENSINO MÉ DIO

COMPONENTE CURRICULAR
ARTE

Solange dos Santos Utuari Ferrari


Mestre em Artes na á rea de Artes visuais pela Universidade Estadual Paulista.
Especializaçã o em Antropologia pela Fundaçã o Escola de Sociologia e Política de Sã o Paulo
(instituiçã o complementar da Universidade de Sã o Paulo).
Especializaçã o em Arte-Educaçã o pela Escola de Comunicaçã o e Artes da Universidade de Sã o
Paulo.
Licenciada em Educaçã o Artística pela Universidade de Mogi das Cruzes.
Artista plá stica e ilustradora, formadora de educadores em Arte, assessora de projetos educativos e
culturais, autora de materiais didá ticos e de livros para formaçã o em diversos níveis.

Daniela Leonardi Libâ neo Sardo


Mestre em Artes pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas.
Licenciada em Pedagogia pela Pontifícia Universidade de Sã o Paulo.
Bailarina e professora de dança por 17 anos, professora universitá ria, gerente acadêmica,
pesquisadora institucional e consultora educacional.

Fá bio Sardo
Mestre em Artes (á rea de concentraçã o: Processos de Criaçã o Musical) pela Escola de Comunicaçã o
e Artes da Universidade de Sã o Paulo.
Bacharel em Mú sica pela Faculdade de Artes Alcâ ntara Machado.
Professor de mú sica em escolas particulares de Sã o Paulo e elaborador de projetos para a rede
pú blica paulista voltados a CEUs, ONGs e fundaçõ es. Violonista, instrumentista, arranjador e
interventor musical em ambientes corporativos.

Pascoal Fernando Ferrari


Mestre em Ensino de Ciências (á rea de concentraçã o: Ensino de Ciências) pela Universidade
Cruzeiro do Sul.
Especializaçã o na á rea de Sociologia pela Fundaçã o Escola de Sociologia e Política de Sã o Paulo
(instituiçã o complementar da Universidade de Sã o Paulo).
Licenciado em Pedagogia pela Universidade Camilo Castelo Branco.
Licenciado em Psicologia pela Universidade Braz Cubas.
Professor universitá rio, ator, diretor de teatro, consultor em projetos culturais em Artes Cênicas e
autor de materiais didá ticos para cursos de formaçã o de professores em ambientes virtuais.

2ª ediçã o
Sã o Paulo – 2016
FTD
Pá gina 2

FTD

Copyright © Solange dos Santos Utuari Ferrari, Daniela Leonardi Libâ neo Sardo, Fá bio Sardo e Pascoal Fernando
Ferrari, 2016.

Diretor editorial Lauri Cericato


Gerente editorial Flá via Renata P. A. Fugita
Editora Angela C. Di Cesare M. Marques
Editores assistentes Roberta Vaiano, José Alessandre S. Neto, Lilian Ribeiro de Oliveira
Gerente de produção editorial Mariana Milani
Coordenador de produção editorial Marcelo Henrique Ferreira Fontes
Gerente de arte Ricardo Borges
Coordenadora de arte Daniela Má ximo
Projeto gráfico Casa Paulistana, Roque Michel Jr., Tania Abreu
Projeto de capa Bruno Attili
Foto de capa Thais Falcã o/Olho do Falcã o
Modelos da capa: Andrei Lopes, Angélica Souza, Beatriz Raielle, Bruna Soares, Bruno Guedes, Caio Freitas, Denis Wiltemburg,
Eloá Souza, Jardo Gomes, Karina Farias, Karoline Vicente, Letícia Silva, Lilith Moreira, Maria Eduarda Ferreira, Rafael Souza,
Tarik Abdo, Thaís Souza
Supervisores de arte Roque Michel Jr., Daniela Má ximo
Editora de arte Lidiani Minoda
Diagramação Casa de Ideias, Lidiani Minoda, Lucas Trevelin
Tratamento de imagens Eziquiel Racheti
Coordenadora de ilustrações e cartografia Marcia Berne
Ilustrações Ricardo Dantas, Tarumã , Luís Moura
Infográficos Marla Cruz
Coordenadora de preparação e revisão Lilian Semenichin
Supervisora de preparação e revisão Viviam Moreira
Revisão Aline Araú jo, Caline Devè ze, Marcella Arruda, Pedro Fandi, Sô nia Cervantes
Coordenador de iconografia e licenciamento de textos Expedito Arantes
Supervisora de licenciamento de textos Elaine Bueno
Iconografia Cristina Mota, Rosa André
Diretor de operações e produção gráfica Reginaldo Soares Damasceno

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Arte por toda parte : volume ú nico / Solange dos Santos Utuari Ferrari... [et al.]. – 2. ed. – Sã o Paulo : FTD, 2016.
Outros autores: Daniela Leonardi Libâ neo Sardo, Fá bio Sardo, Pascoal Fernando Ferrari
Componente curricular: Arte
ISBN 978-85-96-00364-3 (aluno)
ISBN 978-85-96-00365-0 (professor)
1. Arte (Ensino mé dio) I. Ferrari, Solange dos Santos Utuari. II. Sardo, Daniela Leonardi Libâ neo. III. Sardo, Fá bio. IV. Ferrari,
Pascoal Fernando. V. Sé rie.
16-03479
CDD –700
Índice para catálogo sistemático: 1. Arte : Ensino mé dio 700

Reproduçã o proibida: Art. 184 do Có digo Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Todos os direitos reservados à


EDITORA FTD S.A.
Rua Rui Barbosa, 156 – Bela Vista – Sã o Paulo-SP
CEP 01326-010 – Tel. (0-XX-11) 3598-6000
Caixa Postal 65149 – CEP da Caixa Postal 01390-970
www.ftd.com.br
E-mail: central.atendimento@ftd.com.br

Em respeito ao meio ambiente, as folhas deste livro foram produzidas com fibras obtidas de árvores de florestas plantadas, com origem
certificada.

Impresso no Parque Grá fico da Editora FTD S.A.


CNPJ 61.186.490/0016-33
Avenida Antonio Bardella, 300
Guarulhos-SP – CEP 07220-020
Tel. (11) 3545-8600 e Fax (11) 2412-5375
Pá gina 3

APRESENTAÇÃ O
Sons, imagens e gestos inventam a arte.

Podemos estar em um show de mú sica, ouvindo instrumentos feitos com os mais inusitados
materiais, andar por uma instalaçã o cheia de cores e formas, assistir a uma peça de teatro,
interpretá -la na escola ou simplesmente estar em um terminal de ô nibus, em uma estaçã o
ferroviá ria, no metrô , e depararmos com uma bailarina que de repente começa a dançar...

A arte é assim: pode estar aqui, ali, acolá , é preciso estar atento para perceber as muitas
linguagens que nos convidam a pensar, sentir e criar.

Estudar arte é conhecer diferentes linguagens e compreender como construímos


conhecimento por meio de sons, gestos, movimentos e imagens. No estudo de Arte aprendemos a
entender a natureza estética e criativa da humanidade em diversos tempos e lugares, a reconhecer
as vá rias maneiras de expressar pensamentos, ideologias, crenças, estilos, formas, sonhos...

A arte proporciona uma reflexã o sensível, necessá ria para a compreensã o de como reagimos
diante de acontecimentos da vida e de como nos expressamos.

O estudo e a criaçã o da arte englobam muitas razõ es e emoçõ es. Mergulhar no universo de
artistas, de obras, de processos de criaçã o e de linguagens da arte pode ser instigante, incô modo,
prazeroso e desafiador. Essa aventura vale a pena!

Convidamos você, entã o, para uma conversa sobre arte. Vamos?

Os autores
Pá gina 4

Conheça o seu livro


Esta obra apresenta o conteú do do curso dividido em seis capítulos, de modo organizado e orgâ nico,
para proporcionar a construção do conhecimento em arte de forma significativa.

Abertura de capítulo
Na abertura de cada capítulo, há sempre uma imagem e um texto que estã o relacionados com o conteú do que
será abordado. Cada capítulo é composto de quatro temas.

Temas
Em cada tema, há textos, obras e conceitos pertinentes ao assunto de cada capítulo e aos territó rios abordados,
que convidam para a investigaçã o e reflexã o em arte.
Pá gina 5

Giro de ideias
A seçã o promove a reflexã o e a discussã o sobre o territó rio abordado, com o levantamento de conhecimentos
prévios e experiências estéticas e culturais. Valoriza a oralidade e a construçã o de ideias com base no debate
coletivo.

A arte de
A proposta é ir além de uma biografia e pontuar de modo sucinto alguns pontos significativos da trajetó ria do
artista.

Palavra do artista
Neste boxe, buscamos apresentar a elaboraçã o do pensamento artístico e a discussão sobre arte, propondo um
diá logo direto com o artista.

Ofício da arte
O objetivo deste boxe é apresentar algumas possibilidades profissionais que envolvem o trabalho e os ofícios
da arte.
Conexões
A seçã o contempla textos e discussõ es que abordam as diferentes dimensõ es do ser humano: éticas, estéticas,
culturais, histó ricas, profissionais e saberes interdisciplinares.
Pá gina 6

Projeto experimental
A seçã o propõ e uma diversidade de atividades artísticas que contemplam as linguagens cênica, plá stica e
musical, proporcionando situaçõ es de aprendizado que estimulam a compreensã o e a produçã o significativa
em Arte.

Infográficos
Ao final de cada capítulo, os infográ ficos aparecem como uma forma de expandir e complementar o conteú do
estudado. Tornam o aprendizado mais claro e dinâ mico, ao unir duas abordagens: a verbal e a visual.
Pá gina 7

Fique de olho: Enem e vestibulares


Questõ es de vestibulares e exames nacionais são apresentadas e relacionadas com os conteú dos abordados no
livro.

Expedição cultural
A seçã o propõ e açõ es e percursos educativos que despertem a atençã o e a experiência significativa dos
espaços onde a sociedade está inserida.

Diário de bordo
A seçã o retoma conceitos e debates provocados pelos conteú dos temá ticos do capítulo.
Pá gina 8

SUMÁ RIO

Adriana Varejão. 2012. Ó leo sobre fibra de vidro e resina. Coleção particular, Zurique. Foto: Eduardo Ortega

CAPÍTULO 1 O que é arte? 12

Tema 1 – O sentido das coisas 14


A arte de O Teatro Má gico 15
A linguagem e a poética do palhaço 16
O que é arte? 17
A arte de Paulo Bruscky 18
Giro de ideias: O que é arte? 19
Conexões: Arte e Histó ria 19
Projeto experimental 20

Tema 2 – Procurando pela arte 21


De repente, a arte! 22
A arte de Regina Silveira 22
Provocações da arte 23
Giro de ideias: Linguagens contemporâ neas 24
Tudo pode ser arte? 25
A arte de Andy Warhol 27
Giro de ideias: Arte poética 27
Conexões: Arte e Filosofia 28
Projeto experimental 29

Tema 3 – Arte é experiência? 30


A arte de Pina Bausch 32
Giro de ideias: Experiência estética 33
Conexões: Arte e Saú de 34
Projeto experimental 36

Tema 4 – Tempo: o compositor de histórias 37


A arte de Sheila Hicks 38
Giro de ideias: Ler uma obra de arte 38
Conexões: Arte, Histó ria e Ciência 39
Projeto experimental 41
Infográfico: A arte sempre foi arte? 42
Fique de olho: Enem e vestibulares 44
Expedição cultural 46
Diário de bordo 47

Michel Boutefeu/Getty Images

CAPÍTULO 2 Por línguas e línguas 48


Tema 1 – A proposição das linguagens 50
A arte de Hélio Oiticica 51
A arte de Lygia Clark 52
Giro de ideias: Arte propositora: você aceita o convite? 52
Os “espect-atores” 54
A arte de Augusto Boal 54
Giro de ideias: O “espect-ator” 55
Conexões: Arte e Filosofia 55
Arte pública 56
O teatro popular de rua 56
Sopros poéticos ao pé do ouvido 56
A rua é o espaço cênico 56
Arte em todos os lugares 57
Giro de ideias: Cotidiano e arte 59
Conexões: Arte e Comunicaçã o 60
Projeto experimental 61
Tema 2 – Linguagens que se misturam 63
A arte de Alex Flemming 64
Giro de ideias: Meu autorretrato 65
Conexões: Arte e Língua Portuguesa 66
As muitas linguagens da arte 67
A arte de Adriana Varejã o 67
Conexões: Arte, Geografia e Identidade 68
Projeto experimental 70
Tema 3 – A tecnologia transformando as linguagens 72
A arte de June Paik 73
A arte contemporânea: linguagens e tecnologias 73
Mundo visual que se transforma 74
Ilustradores do mundo 75
Imagem e brasilidade 76
Do susto ao olhar Matrix 76
Pá gina 9

Cultura visual 77
A tecnologia a favor da arte 78
Giro de ideias: As novas tecnologias e a captaçã o de imagens 79
Conexões: Arte e Tecnologia 80
Projeto experimental 82

Tema 4 – As linguagens artísticas no tempo 83


A concepção de arte na Antiguidade 83
Classificações das artes na Idade Média 85
Giro de ideias: A arte de desenhar 86
Conexões: Arte e Afrodescendência 87
Projeto experimental 89
Infográfico: As mil e uma linguagens da arte 90
Fique de olho: Enem e vestibulares 92
Expedição cultural 94
Diário de bordo 95

CAPÍTULO 3 A criaçã o 96

Tema 1 – Intervenção como criação 98


A arte de Alexandre Orion 99
A arte de Gabriel o Pensador 100
A língua da arte: o grafite reverso 100
Giro de ideias: Liberdade de expressã o 101
Criação como improvisação 102
Improvisaçã o como técnica teatral 103
Giro de ideias: Jogo de improvisaçã o teatral 104
Conexões: Arte e Meio ambiente 104
Conexões: Arte e Língua Portuguesa 105
Projeto experimental 108

Tema 2 – Criação e registro 109


A arte de Rudolf Laban 109
O desenho da mú sica 111
A arte de Raymond Murray Schafer 112
Giro de ideias: Percepçõ es 112
Conexões: Arte e Ciências 113
Projeto experimental 114

Tema 3 – Lugares para criar 116


Reunindo-se para criar 118
Trabalhos colaborativos 119
Giro de ideias: Amigos artistas 119
Conexões: Arte e Língua Portuguesa 120
Conexões: Arte e Matemá tica 122
Projeto experimental 123

Tema 4 – “Dom”: virtude, gênio ou curiosidade? 127


Arte é conhecimento 129
Coisas para observar, registrar e imaginar 130
Observar a luz 130
Imaginar mundos 132
Giro de ideias: Criatividade e talento artístico 132
Conexões: Arte e Ciências 133
Projeto experimental 135
Infográfico: Tempos e “ismos” na arte 136
Fique de olho: Enem e vestibulares 138
Expedição cultural 142
Diário de bordo 143

CAPÍTULO 4 Matérias da arte 144

Tema 1 – Corpo e arte 146


Materialidades da arte 146
O corpo como suporte 147
A arte de Regina Advento 148
As marcas no corpo 149
A valorização do corpo 151
Giro de ideias: Ela dança, ele dança, eu danço 152

Marcos André/Opção Brasil


Pá gina 10

Michelangelo Buonarroti. 1501-1504. Mármore. Galleria dell’ Accademia, Florence. Foto: Tupungato/Shutterstock/Glow Images

Giro de ideias: A tatuagem 154


Giro de ideias: Nosso corpo 155
Conexões: Arte e Tecnologias 156
Conexões: Arte e Pluralidade cultural 157
Projeto experimental 158
Projeto experimental 159
Tema 2 – Se a criação é mais, tudo é coisa musical! 161
A arte de Hermeto Pascoal 161
Há alguma coisa no ar! 162
A materialidade do som 163
O som das cordas 164
A arte de Fernando Sardo 164
Giro de ideias: Criando um som 166
Conexões: Arte e Biologia 167
Projeto experimental 168
Tema 3 – A alquimia da arte 170
Do Oriente ao Ocidente, a arte é um fazer 172
A arte sumi-ê 172
A arte de Massao Okinaka 174
A pintura a ó leo 174
Tudo azul! Pigmentos como crenças e poéticas contemporâneas 176
O azul de Yves Klein 178
A arte de Yves Klein 179
Giro de ideias: O significado das cores 179
Conexões: Arte e Química 180
Conexões: Arte e Meio ambiente 181
Projeto experimental 182
Tema 4 – Poética da matéria 185
A arte de Vik Muniz 187
Conexões: Arte e Cultura indígena 188
Projeto experimental 189
Infográfico: A arte e a matéria 190
Fique de olho: Enem e vestibulares 192
Expedição cultural 194
Diário de bordo 195
CAPÍTULO 5 A arte em sua forma, a forma em seu conteú do 196
Tema 1 – As formas e os conteúdos da arte 198
E a luz se fez 200
A poetisa da luz 202
A arte de Lucia Koch 203
Giro de ideias: Quem tem medo do escuro? 204
Conexões: Arte e Ciências 205
Projeto experimental 207
Tema 2 – A gramática visual 208
A linha poética 209
Giro de ideias: Traçando linhas 211
Conexões: Arte e Matemá tica 212
As formas e os movimentos 214
Fotografia: o mundo visto pela lente 215
Um olhar curioso! 216
A arte de Geraldo de Barros 216
Giro de ideias: As fotoformas 217
Conexões: Arte, Física e Química 218
Um mundo em cores para ver 220
Giro de ideias: Cores e coisas 221
Conexões: Arte e Biologia 222
Escolhendo cores 224
A poética da cor 225
A arte dos impressionistas 226
Projeto experimental 227
Projeto experimental 228
Tema 3 – O conjunto da obra 229
Giro de ideias: Roda da dança 230
Conexões: Arte e religiã o 230
A língua do corpo 231
A arte de Charles Chaplin 231
A maquiagem no cinema 232
Giro de ideias: Gestos no cinema 233
Pá gina 11

Jean-Pierre Lescourret/Getty Images

O teatro na história 234


O espaço cênico no teatro 234
Um lugar para se ver 236
A forma na comédia 236
Giro de ideias: A catarse 238
Conexões: Arte e Histó ria 239
Dramaturgias da luz e do gesto 241
Conexões: Arte e Literatura 242
Projeto experimental 242

Tema 4 – Os parâmetros do som 243


Ouvindo vozes 244
A arte de Chelpa Ferro 245
Giro de ideias: Dimensõ es de sons 246
Conexões: Arte, mitologia e Literatura 247
Projeto experimental 249
Infográfico: O que tem na mala do teatro? 250
Fique de olho: Enem e vestibulares 252
Expedição cultural 254
Diário de bordo 255

CAPÍTULO 6 BAGAGEM CULTURAL 256

Tema 1 – Tudo o que me compõe 258


A arte de Geoffrey Farmer 259
Vidas privadas e públicas 259
Abstracionismo e outros “ismos” 260
A arte de Jackson Pollock 261
Giro de ideias: Imagens marcantes 261
Conexões: Arte e Histó ria 262
Projeto experimental 263

Tema 2 – Música popular brasileira e gerações de ouvintes 264


De tempos em tempos, a música se renova: Cartola e Cazuza 266
A arte de Emicida 267
Giro de ideias: O que é passado e presente? 268
Festivais de música 269
Mú sica brasileira – arte, protesto e festival 269
Mú sica em festivais mundo afora 270
Giro de ideias: Trilhas sonoras 271
Conexões: Arte e Histó ria 272
Vamos comer! 274
Movimento cultural sincrético 275
A arte de Chico Science 277
Conexões: Arte, pluralidade cultural e meio ambiente 278
Projeto experimental 280

Tema 3 – Tem gente que guarda cada coisa! 281


Colecionismo: a mania de guardar 282
Sensações para guardar 283
A arte de Brígida Baltar 284
Giro de ideias: Coleçõ es de arte 284
Conexões: Arte e Língua Portuguesa 285
Projeto experimental 286

Tema 4 – O patrimônio nosso de cada dia 287


Prédio tombado também cai? 289
As maravilhas do mundo 289
Operaçã o Salvamento 291
Giro de ideias: S.O.S. bens patrimoniais 291
A matéria do imaterial 292
A arte de J. Borges 293
Giro de ideias: Bens imateriais 295
Coisas preciosas para guardar 295
A arte de Ana Teixeira 295
Giro de ideias: O patrimô nio da minha cidade 297
Conexões: Arte e Literatura 298
Conexões: Arte e Língua Portuguesa 300
Conexões: Arte e Geografia 302
Projeto experimental 303
Projeto experimental 303
Infográfico: O bem indígena 306
Fique de olho: Enem e vestibulares 308
Expedição cultural 310
Diário de bordo 311

Referências 312
Lista de Instituições Promotoras de Exames 319
Crédito das imagens dos infográficos 319

J. Borges. 2003. Xilogravura. Coleção particular


Pá gina 12

CAPÍTULO 1 O QUE É
ARTE?

Anderson Moreira Fotografia

Bailarinas do grupo O Teatro Mágico em performance aérea durante show.

“[...]
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte


noutra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?”

GULLAR, Ferreira. Traduzir-se. In: ______. Na vertigem do dia. 17. ed. Rio de Janeiro: José Olympio,
1980. p. 335.
Pá gina 13

PARA ESTUDAR

• O sentido das coisas


• Procurando pela arte
• Arte é experiência?
• Tempo: o compositor de histórias
Pá gina 14

TEMA 1 O SENTIDO DAS


COISAS
"Nem toda palavra é
Aquilo que o dicioná rio diz
Nem todo pedaço de pedra
Se parece com tijolo ou com pedra de giz
[...]

Descobrir o verdadeiro sentido das coisas


é querer saber demais
Querer saber demais
[...]"

O TEATRO MÁ GICO. Sonho de uma flauta. In: ______. O Teatro Mágico: segundo ato. [S.l.]: independente, 2008. 1 CD.
Faixa 9. Disponível em: <http://www.vagalume.com.br/o-teatro-magico/sonho-de-uma-flauta.html>. Acesso em: 9
fev. 2016.

Marcos Hermes/Acervo OTM


Fernando Anitelli em apresentação do grupo O Teatro Mágico, em São Paulo, SP, em 2012.

Durante a busca motivada pelo interesse em compreender algo, em saber os sentidos


das coisas, geralmente encontramos vá rios caminhos. Podemos procurar explicaçõ es ló gicas,
científicas, baseadas em nossa vivência ou em nossas crenças.

Em meio a tanta diversidade, como explicar o que é arte? Ao nos dizer, na letra de sua
mú sica, que “Nem toda palavra é aquilo que o dicioná rio diz”, o grupo O Teatro Má gico pode
nos indicar algumas pistas sobre esse tema.

Uma palavra, por pertencer a uma linguagem, pode ser manipulada pelo autor de uma
obra, como um poeta ou um escritor, por exemplo, e assumir muitos usos e diversas
interpretaçõ es. Em um espetá culo de arte contemporâ nea, como o do grupo O Teatro Má gico,
encontramos a arte de bailarinos, atores, poetas, mú sicos e artistas circenses, além de
programadores visuais, iluminadores, sonoplastas e tantos outros artistas dos bastidores, que
têm sua importâ ncia na construçã o de um produto cultural, nesse caso, um show. Essas
mú ltiplas linguagens sã o reunidas no mesmo palco para mostrar, contar e cantar algo, para
transmitir mensagens por meio das linguagens da arte.

Arte contemporânea: expressã o que usamos para nos referir à s produçõ es artísticas que vã o da segunda metade
do sé culo XX até nossos dias.

Para o filó sofo italiano Luigi Pareyson (1918-1991), a arte é uma linguagem que se
reinventa constantemente para construir, conhecer e expressar questõ es dos seres humanos
(Pareyson apud BOSI, 1989). Entretanto, realizada de diversos modos e formas, a arte, muitas
vezes, faz e provoca perguntas em vez de apresentar respostas prontas. O artista cria com base
em suas ideias e intençõ es, mas quem aprecia a obra também cria por meio de suas
interpretaçõ es. Nã o podemos estabelecer uma verdade absoluta sobre o que as obras de arte
querem dizer porque sempre há a interpretaçã o de quem as olha, prova, toca ou ouve, ou seja,
o espectador, o apreciador de arte.

Para compreender a arte, precisamos nos deixar levar pelo seu teor poético, pelo que ela
nos provoca, e entrar no universo de sentimentos, pensamentos e sensaçõ es que ela nos
propõ e, desprovidos de respostas esquematizadas e verdades preestabelecidas. Conhecer arte
é observar, sentir e nos permitir descobrir o inesperado.
Pá gina 15

A arte de O TEATRO MÁ GICO


Com elementos de circo, mú sica e artes cênicas, entre outras linguagens artísticas, o
grupo O Teatro Má gico, conhecido como OTM, tem se apresentado em vá rios espaços culturais
desde 2003. Sua origem é paulista, da cidade de Osasco. A proposta do grupo de artistas, criado
pelo ator, mú sico e compositor paulista Fernando Anitelli (1974-), é apresentar poesia, mú sica,
dança e filosofia em espetá culos que utilizam linguagens diversificadas, efeitos visuais e
tecnologias aliados à singeleza da linguagem circense. Seus componentes misturam sons e
gêneros musicais originá rios de diversos contextos culturais.

O OTM acredita na acessibilidade de mú sicas e vídeos via internet, por meio da


flexibilizaçã o do direito autoral. Na visualidade de seus shows, há mú sicos, atores e bailarinos
vestidos de palhaço, com maquiagem e roupas que exploram a ideia de que cada um de nó s
tem um personagem escondido, um clown, um poeta a se revelar por meio da arte.

Clown: termo usado para se referir à figura do palhaço, um arqué tipo que faz as pessoas rirem.

Palavra do artista

“Nó s queremos brincar com essas mais variadas expressõ es artísticas e simplificar as
coisas que acontecem dentro de um sarau. [...] Nascemos com essa proposta. A ideia do projeto
era justamente mesclar variadas expressõ es artísticas.”

Fernando Anitelli

O QUE pensa o líder do Teatro Má gico. SelesNafes.Com, 2 ago. 2014.

José de Holanda/Divulgação OTM

Foto do artista Fernando Anitelli, vocalista de O Teatro Mágico, com o rosto pintado.
Luiza Prado/Acervo OTM

O grupo O Teatro Mágico brinca com as linguagens da arte em suas apresentações. Foto de 2013.

Ofício da arte

Produtor(a) cultural

A profissã o de produtor cultural tem muita importâ ncia para a arte, pois é ele quem
planeja, elabora e executa projetos artísticos. També m busca recursos para as produçõ es,
organiza a agenda dos artistas e exerce outras funçõ es que permitem ao grande pú blico ter
acesso à arte e à cultura.

Há muitos campos de atuaçã o para esse profissional: organizaçã o de espetá culos de


mú sica, teatro, artes visuais, dança, festas populares, entre outros. Alguns artistas ou grupos
fazem sua pró pria produçã o cultural; outros contratam profissionais, formados nas mais
diferentes á reas, para realizar esse trabalho.
Pá gina 16

A linguagem e a poética do palhaço


O palhaço é um personagem criado há mais de 4 mil anos. Em cada lugar e cultura, sua
figura aparece associada aos mais diversos sentimentos e características humanas.

A imagem do palhaço nos remeterá ora a pessoas engraçadas, sensíveis e espertas, ora à
figura do trapalhã o, de pessoas desajeitadas ou até mesmo ingênuas.

Muitos atores vestiram-se de palhaço, desenvolveram habilidades, aprofundaram


saberes e criaram personagens em vá rias linguagens artísticas.

O ator inglês Charles Chaplin (1889-1977) estudou a linguagem gestual, a poética do


clown e a pantomima dos palhaços para construir alguns de seus personagens, entre eles, o
palhaço Calvero do filme Luzes da Ribalta, 1952 (o personagem aparece em cena do filme, na
imagem ao lado). Ele costumava se caracterizar até mesmo nos ensaios para esse filme, no qual
atuou como ator e diretor.

Charles Chaplin criou muitos personagens, o mais famoso é Carlitos, presença marcante
em muitos filmes.

Hulton Archive/Getty Images

Cena do filme Luzes da Ribalta, 1952, em que Charles Chaplin interpreta o personagem Calvero, que aparece em frente a
um espelho se caracterizando de palhaço.

Outro ator que incorporou à sua arte os gestos do palhaço e a linguagem nã o verbal da
mímica foi o francês Marcel Marceau (1923-2007). Assim como Chaplin, ele estudou os gestos
e a poética do palhaço, preocupou-se com a estética, usou técnicas de maquiagem e compô s um
figurino singular para criar o personagem Bip, um palhaço que ficou conhecido por usar
camisa listrada e chapéu amassado com uma flor espetada, e ter o rosto coberto de branco com
os lá bios bem marcados em vermelho e os olhos com contornos em preto.
Marcel Marceau e Charles Chaplin inspiraram e continuam inspirando muitos atores
que, como eles, escolheram trabalhar com a estética e a poética do palhaço para expressar
sentimentos por meio de gestos e da mímica, construindo uma linguagem silenciosa com um
intenso trabalho corporal.

Michel Boutefeu/Getty Images

O personagem Bip, criado por Marcel Marceau, elevou a mímica a uma forma de arte suprema.

A figura do palhaço já sofreu diversas transformaçõ es e recebeu vá rios nomes ao longo


da histó ria, em diferentes idiomas: bobo da corte, bufã o, clown, arlequim, gleeman, jongleurs...

Mesmo sendo um personagem muito antigo, o palhaço está presente no trabalho de


vá rios artistas contemporâ neos brasileiros, como vimos na trupe de O Teatro Má gico.

Estudar a poética do palhaço é coisa séria, na opiniã o das atrizes Paola Musatti e Vera
Abbud, da companhia de teatro Las Ventanas. O palhaço faz parte da experiência de criaçã o
artística dessas duas atrizes que pesquisam essa linguagem nascida no circo, mas que tem
migrado constantemente para os palcos de teatro.

Ao falar sobre o processo de criaçã o do espetá culo Pelo cano (2013), a atriz Paola
Musatti diz: “A construçã o de um personagem como o palhaço passa pelo processo de
descobrir a si mesmo. O ator precisa perceber sua comicidade, seu ridículo, descobrir um
modo de como as pessoas podem rir desse personagem, encontrar o tom da comédia. Há
muitas formas de aprender a linguagem do palhaço, desde a tradiçã o dos circos, em que isso
era passado de pai para filho, muitas vezes, ou até mesmo na escola.”.

Pintar o rosto, vestir roupas engraçadas, convidar as pessoas a rir, a sonhar, a poetizar...
Esse é o objetivo de vida dos palhaços, que ainda encantam plateias de todas as idades.

Cena do espetá culo Pelo cano. 2012. Direção Paola Mussati e Vera Abbud.

As atrizes Vera Abbud e Paola Musatti, em cena do espetáculo Pelo cano.


Pá gina 17

O que é arte?
Esse questionamento que move nosso estudo neste capítulo é feito até mesmo por
artistas. Na 29ª Bienal de Arte de Sã o Paulo, em 2010, o pernambucano Paulo Bruscky (1949-)
fez essa pergunta ao pú blico. Na obra O que é a arte? Para que serve?, de 1978, o artista
multimídia e poeta questiona a todos sobre a funçã o da arte. Para muitos pode parecer
estranho um artista fazer esse tipo de indagaçã o, pois é comum as pessoas acreditarem que os
artistas sempre sabem o que é arte e qual é sua funçã o na sociedade. Contudo, além de os
artistas em geral se questionarem constantemente sobre os significados e as dimensõ es da
arte, ela tem mudado tanto nos ú ltimos tempos que mesmo um artista pode fazer essa
pergunta sem causar espanto. Fazer perguntas a si mesmo e aos outros é natural nos seres
humanos, que buscam tentar compreender todas as coisas, o que inclui a arte.

Na contemporaneidade, as maneiras de criar arte sã o ainda mais variadas. Responder à s


questõ es feitas pelo artista Paulo Bruscky requer investigar como os seres humanos produzem
arte e cultura. Assim como as pessoas, a cultura está em constante movimento, em fluxos de
pensamentos, valores e gostos.

Ao longo dos tempos, criamos diferentes modos de fazer arte, por razõ es diversas. O
papel da arte não é o mesmo em cada época, lugar ou cultura. A maneira como nos
relacionamos com a arte também está sempre em mudança. Encontrar respostas para esse tipo
de questionamento pode parecer difícil, mas é possível perceber algumas pistas observando a
pró pria arte.
Paulo Bruscky. 1978. Ampliação fotográfica em preto e branco sobre papel fotográ fico fosco. Galeria Nara Roesler

O que é a arte? Para que serve?, de Paulo Bruscky, 1978. Documentação de ação da impressão em papel fotográfico fosco,
40 cm × 29 cm. Na imagem, uma das quatro fotografias expostas na 29ª. Bienal de Arte de São Paulo, em 2010.
Pá gina 18

A arte de PAULO BRUSCKY

Paulo Bruscky. 1978. Ampliação fotográfica em preto e branco sobre papel fotográ fico fosco. Galeria Nara Roesler

Outra fotografia exposta na 29ª Bienal de Arte de São Paulo, em 2010. Documentação de ação da impressão em papel
fotográfico fosco, 29 cm × 40 cm.

Paulo Bruscky criou a obra O que é a arte? Para que serve? para provocar uma reflexã o
sobre o tema. Ele escreveu essas duas perguntas em um cartaz de papelã o e “vestiu” o material
como um homem-sanduíche. O termo “homem-sanduíche” é usado para identificar pessoas
que trabalham nas ruas das cidades carregando cartazes pendurados no corpo. O artista ficou
exposto em uma vitrine de livraria e andou pela rua entre as pessoas, fazendo o que chamamos
de performance.

Performance: linguagem artística realizada em um espaço com uma açã o efetuada por um artista ou um grupo de
artistas que podem utilizar diversas formas de expressã o. No caso de Paulo Bruscky, sua arte aconteceu em pleno espaço da
cidade do Recife, cercado de transeuntes curiosos com as atitudes daquele “homem-sanduíche”.

A linguagem da performance requer fundamentalmente a realizaçã o de algo em que os


artistas que estã o se expressando possam utilizar diversos recursos e materiais. Como toda
açã o (acontecimento) é efêmera, a ú nica maneira de mostrar a obra em outros momentos e
lugares, além de reapresentá -la, é fazer um registro do evento, que pode ser por meio de
fotografias ou de gravaçã o de imagem e á udio (uma filmagem).

A performance de Paulo Bruscky foi registrada em quatro fotografias expostas em vá rios


lugares, um deles na 29ª Bienal de Arte de Sã o Paulo. A obra é de 1978, época em que o Brasil
vivia um regime político autoritá rio, no qual os meios de comunicaçã o e as expressõ es
artísticas eram monitorados pelo governo de regime militar. A intençã o do artista era provocar
a reflexã o sobre os critérios escolhidos por galerias e museus ao determinar o que era arte e o
que nã o era.

Palavra do artista
“A arte é uma forma de comunicaçã o global, mesmo muito antes da internet. Nã o é luxo
ou uma forma de elite. Em vez disso é uma arena de esperança em algumas épocas e lugares,
ou até mesmo uma ú ltima esperança.”

Paulo Bruscky

PAULO BRUSCKY. Das artes. Disponível em: <http://dasartes.com.br/pt_BR/agenda/paulo-bruscky-cccsp>. Acesso


em: 21 dez. 2015.

Leo Caldas/Folhapress

Artista plástico e poeta Paulo Bruscky, Recife (PE). Foto de 2003.


Pá gina 19

Giro de ideias: O que é arte?


O que é arte? Se alguém lhe fizer essa pergunta, o que você vai responder? E seus
colegas, que conceitos têm sobre esse tema? Para conhecer as opiniõ es da turma, organize um
fó rum. Pode ser na sala de aula ou em algum ambiente virtual. Escreva aqui a conclusã o a que
você chegou depois de ter participado da discussã o sobre “O que é arte?“.

Conexõ es Arte e Histó ria


Ideia e opinião
A arte pode comunicar uma ideia? Sobre o que a arte fala? Que ideia ela transmite?

Os objetos do cotidiano podem comunicar. Em épocas de governos ditatoriais, por exemplo,


muitos objetos foram utilizados artisticamente como “armas” na resistência contra a opressã o,
como a que aconteceu no Brasil entre os anos de 1964 a 1985. Eram tempos de censura e medo,
que impunham o silêncio à maioria da populaçã o. Quem ousava expor suas ideias podia ter sua
liberdade e até a pró pria vida ameaçada pela ditadura militar. O jornalista Vladimir Herzog, uma
das centenas de pessoas que morreram pelo direito à democracia no Brasil durante a ditadura, foi
assassinado na prisã o em Sã o Paulo, no ano de 1975. Sua morte fez crescer a ocorrência de
manifestaçõ es pú blicas e artísticas em prol do fim da repressã o política e a luta por um estado
democrá tico, em que os direitos civis pudessem ser respeitados.

Mesmo quando é proibido dizer o que se pensa, é pró prio da natureza humana encontrar
meios para se expressar. A arte é uma dessas maneiras. Cildo Meireles (1948-), artista plá stico
carioca, criou a obra Inserçõ es em circuitos ideoló gicos: Projeto Cédula, na qual ele carimbou a
frase “Quem matou Herzog?” sobre cédulas de dinheiro. O artista realizou essa intervençã o no
mesmo ano da morte do jornalista.

Como o artista usou cédulas de dinheiro corrente, era quase impossível saber de quem era a
autoria daquele tipo de arte, e o artista pô de levar suas ideias ao pú blico. A arte nã o estava nos
museus, mas nas ruas, e foi ao encontro das pessoas em suas açõ es mais corriqueiras, como o uso
de uma nota de dinheiro. Trata-se de uma arte conceitual, uma voz que circula e sussurra nos
ouvidos do cotidiano pedindo justiça e liberdade em quaisquer situaçõ es nas quais nã o sejam
respeitadas.

E quanto a você? O que lhe causa incô modo nos dias atuais? O que você gostaria de falar, por
meio da linguagem da arte, sobre as injustiças sociais, a violência ou outros temas? Que tal criar
com seus amigos um trabalho de intervençã o artística? Você pode utilizar objetos do cotidiano
como fez Cildo Meireles.
Cildo Meireles. 1970-1975. Carimbo sobre cédula em circulação. Coleção particular. Foto: Pat Kilgore

Inserções em circuitos ideológicos: Projeto Cédula, do artista Cildo Meireles, 1970-1975. Carimbo sobre cédula em
circulação.
Pá gina 20

Projeto experimental
A arte do encontro: vamos criar um sarau?
Vimos que o grupo O Teatro Má gico tem como linguagem essencial a mú sica; no entanto, usa
também outras linguagens, entre elas a circense. As linguagens podem se misturar muitas vezes,
como acontece em um sarau, onde há o encontro de diferentes artistas e linguagens.

A palavra “sarau” remete à ideia de uma reuniã o festiva entre amigos. O termo tem raiz latina
— serotinus —, que diz respeito a açõ es realizadas no final do dia, pró ximo ao anoitecer, mas
chegou a nó s por meio do catalã o sarau, baile noturno popular.

Nã o podemos afirmar onde os saraus tiveram origem, mas há relatos de que na Grécia e na
Roma antigas as pessoas já se juntavam para cantar e ouvir mú sica, conversar, dançar, recitar
poemas e contar histó rias.

Durante o Renascimento, as famílias nobres realizavam eventos noturnos com o mesmo


objetivo. A chegada da família real portuguesa trouxe esse tipo de evento para o Brasil, e no
decorrer do século XIX eles se tornaram bem populares. Na França, no início do século XX, artistas
ligados aos movimentos de arte moderna se reuniam à noite em cafés para realizar saraus e
conversar sobre arte. Atualmente, esse tipo de evento é cada vez mais popular.

Processos de criaçã o

Para realizar um sarau, você, seus amigos e professores precisam pensar na organizaçã o do
evento:

Espaço

Escolha um espaço, pense na quantidade de pessoas e em como elas vã o se acomodar. Esse


espaço pode ser a pró pria escola ou um local adequado na comunidade.

Haverá palco? Será preciso mudar a disposiçã o de alguns objetos? O lugar terá decoraçã o?

Equipamentos

O evento pode ser mais íntimo, para poucos amigos, mas se a proposta for o encontro de
muitas pessoas, talvez seja preciso caixa de som, microfone ou outros instrumentos musicais.

Você pode pedir ajuda a seus familiares ou pessoas da comunidade. Pense na possibilidade
de conseguir patrocinadores no comércio local para alugar os equipamentos necessá rios.

Artistas convidados

Pesquise se na comunidade há poetas, mú sicos ou outros artistas que gostariam de


participar. Você e seus amigos também podem ser os artistas.

O sarau pode ser específico, com foco em uma ú nica linguagem, ou misturar vá rias
linguagens, inclusive a circense, como faz o grupo O Teatro Má gico.
Divulgação

Você e seus amigos podem criar um site ou uma pá gina em redes sociais para divulgar e
postar fotos do sarau.

Vocês nã o precisam pensar na verba para este item, porque podem usar serviços gratuitos
ou criar cartazes com desenhos e frases para convidar o pú blico.

Dicas de materialidades

Que tal pesquisar figurinos, maquiagens e gestos expressivos para se apresentar no sarau? A
linguagem do palhaço também pode ser pesquisada e utilizada.

Para fazer as pinturas de palhaço, existem vá rias possibilidades. Você pode usar tinta à base
de farinha, bem como talco e produtos de maquiagem para criar e dar vida a palhaços bem
interessantes.

Pesquise em sites os tipos de pintura utilizados para intensificar as expressõ es faciais e


assista também a vídeos que mostram como fazê-las, passo a passo.

DICA
Para navegar

Para se inspirar, você pode navegar pelo site do grupo O Teatro Má gico, <http://tub.im/ewmhmb>
(acesso em: 2 dez. 2015).
Pá gina 21

TEMA 2 PROCURANDO PELA


ARTE
"[...]
Com a roupa encharcada, a alma repleta de chã o
Todo artista tem de ir aonde o povo está
Se foi assim, assim será
[...]"

BRANT, Fernando; NASCIMENTO, Milton. Nos bailes da vida. In: NASCIMENTO, Milton. Uma travessia musical. Rio
de Janeiro: Reader’s Digest, 1999. 1 CD. Faixa 10.

Museus, galerias, teatros, casas de espetá culos para dança e mú sica, centros culturais,
pontos de cultura etc. sã o os locais determinados para se encontrar arte. Entretanto, será
apenas nesses espaços o lugar da arte?

Tais lugares sã o extraordiná rios para termos contato com a arte, é muito importante
frequentá -los, mas a arte pode estar mais perto do que imaginamos. Andando pelas ruas,
podemos encontrar obras arquitetô nicas histó ricas ou contemporâ neas, esculturas, mosaicos,
pinturas em grafites...

Hoje, as cidades oferecem espaços para espetá culos de rua nas linguagens da dança, do
teatro, da mú sica e das artes visuais, abertos a toda a populaçã o. Podemos ter acesso a acervos
virtuais de museus e galerias do mundo todo navegando pela internet, no computador mais
pró ximo, em celulares e tablets. Há muitos espaços da arte dentro e fora de instituiçõ es
culturais. Muitos artistas têm o desejo, como disseram o cantor, mú sico e compositor Milton
Nascimento (1942-) e o jornalista e compositor Fernando Brant (1946-2015), de “ir aonde o
povo está ”; como fez, por exemplo, o artista espanhol Jaume Plensa com a instalaçã o da
escultura de 12 metros de altura na Praia do Botafogo no Rio de Janeiro (RJ).
Olhar nos meus sonhos (Awilda), de Jaume Plensa, 2012. Essa escultura gigante, que retrata o rosto de uma mulher, é feita
de resina de poliéster.

Jaume Plensa. 2012. Praia de Botafogo, Rio de Janeiro. Foto: Alex Ribeiro/dpa/Corbis/Latinstock
Pá gina 22

De repente, a arte!
Além das pinturas e esculturas e outras linguagens pú blicas que podemos encontrar
pelas ruas das cidades, é capaz que, tendo sorte, você encontre alguns artistas fazendo
performances ou uma intervençã o urbana. Na arte contemporâ nea, muitas linguagens inovam
na forma de criar arte, como também na maneira de encontrar o pú blico, como é o caso das
intervençõ es urbanas. Esse tipo de arte procura interagir com o pú blico e surpreendê-lo,
geralmente criando formas de provocaçã o para que as pessoas reflitam sobre a arte e a
sociedade. Observe a imagem ao lado: uma mosca gigante sobrevoa a cidade em uma noite. O
que isto significa? A intervençã o urbana é uma linguagem artística das cidades. Ela tem a
intençã o de “ir aonde o povo está ”. Dessa forma, a intervençã o urbana é feita nas mais variadas
linguagens, entre elas as performances, os happenings, o teatro de rua, entre outras
manifestaçõ es.

A artista gaú cha Regina Silveira (1939-) fez surgir moscas luminosas sobre prédios,
muros e transeuntes da cidade de Sã o Paulo na intervençã o urbana Transit (Trâ nsito), de
2001, em meio à s luzes dos edifícios e luminosos que dominam a metró pole à noite. A artista
relata, ao falar dessa obra, que sentiu como se pudesse desenhar sobre “a epiderme da cidade”.

Assim como no caso das performances, as intervençõ es urbanas também podem ser
filmadas para depois serem apresentadas em vá rias situaçõ es. É o caso do vídeo produzido
para registrar a obra Transit, que está disponível em vá rios sites.

Regina Silveira. 2001-2009. Gobo, projetor e carro em movimento. Foto: Renato Pera

Transit, intervenção urbana de Regina Silveira, 2001-2009, em São Paulo (SP). Gobo, projetor e carro em movimento.

A arte de REGINA SILVEIRA


Regina Silveira (1939-) é uma artista muito criativa que experimenta muitos materiais e
linguagens desde o início de sua carreira. Artista consagrada no Brasil e no exterior, ela
acredita que a arte contemporâ nea lhe oferece mú ltiplas possibilidades de criaçã o: pintura,
gravura, desenho, artes grá ficas e uso de novas tecnologias como a projeçã o de imagens
usando a cidade como suporte.

Regina é uma artista que experimenta tudo: tanto as técnicas tradicionais quanto as
novas, criadas a partir dos avanços tecnoló gicos. Usando o melhor que cada técnica pode lhe
oferecer para expressar sua poética.

Palavra do artista

“Das intervençõ es em espaços pú blicos, as que me parecem mais pró ximas das funçõ es
transformadoras que acredito que a arte deva ter, antes de qualquer coisa, sã o as que sã o
efêmeras ou que têm um formato transitó rio, no sentido de provocar seu efeito e logo
desaparecer.”

Regina Silveira

HAAG, Carlos. Regina Silveira: a mágica das sombras. Pesquisa Fapesp, ed. 178, p. 11-15, dez. 2010. Disponível em:
<http://revistapesquisa.fapesp.br/2010/12/01/regina-silveira-a-m%C3%A1gica-dassombras/>. Acesso em: 17 dez. 2015.

João Sal/Folhapress

Regina Silveira explora diferentes linguagens artísticas em sua obra. Foto de 2007.

Ofício da arte

Designer grá fico

O profissional da á rea de Design Grá fico desenvolve projetos de comunicaçã o visual;


pensa no visual de sites, blogs e panfletos; projeta embalagens; pode criar logotipos de marcas
e estabelecer a identidade visual de jornais, livros, revistas e vinhetas para TV.

O designer grá fico pode trabalhar em editoras, agências de design e de publicidade, birô s
de computaçã o grá fica e produtoras, apoiando artistas plá sticos, entre outros. É uma profissã o
que vem ganhando espaço em razã o do surgimento e desenvolvimento de novas mídias e
tecnologias, além da ampliaçã o das já existentes, como a publicidade, a internet, a telefonia
celular e as mídias impressas.

DICA
Para navegar

Conheça um pouco mais sobre a arte de Regina Silveira navegando pelo site: <http://tub.im/nk8ez6>
(acesso em: 14 dez. 2015).
Para visitar

Procure algum local em sua cidade onde possa encontrar arte, como um ponto de cultura (locais
mantidos por grupos que recebem incentivos do governo para manter atividades artísticas e culturais). Esses
lugares oferecem cursos e outras atividades. Visite-os!
Pá gina 23

Provocaçõ es da arte
Toda revoluçã o sempre traz em sua histó ria muitos personagens. Nas transformaçõ es
provocadas pela arte dadaísta nã o foi diferente. Artistas questionavam os moldes de arte que
recebiam influência da concepçã o de belo clá ssico e técnicas tradicionais. Buscavam um novo
sentido para arte em meio à s turbulências da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). A obra
Fonte (1917), do pintor, escultor e poeta francês Marcel Duchamp (1887-1968), apresentada
no final da pá gina, coloca em evidência os questionamentos sobre a arte e seu futuro.

Arte dadaísta: Surgiu durante a Primeira Guerra Mundial. Os artistas e intelectuais, que aderiram a esse
movimento, posicionaram-se de modo crítico em relaçã o à cultura do Ocidente do início do sé culo XX. Em meio à s
contradiçõ es sociais, entre avanços tecnoló gicos e a barbá rie da guerra, manifestavam a intençã o de romper fronteiras entre
linguagens, delimitaçõ es de materiais ou regras como outra forma de fazer arte, criando assim o movimento Dadaísta.

Duchamp, como outros artistas atuantes nessa época, começou a utilizar objetos
“prontos”, retirados do cotidiano, para dar-lhes novos significados e sentidos, determinando-
lhes um cará ter estético e poético, transformando-os em arte conceitual, os denominados
ready mades. Na obra Fonte, Duchamp escolheu uma peça de cerâ mica pintada com esmalte
branco fabricada pela R. Mutt (uma indú stria da época). Era apenas um mictó rio para uso em
sanitá rios, um urinol, mas o artista deu o título de Fonte, assinou com o nome do fabricante da
peça e enviou-a para um concurso de arte. Você pode imaginar o debate desencadeado por
essa obra em 1917? Duchamp entrou para a histó ria como uma das figuras de destaque na
provocaçã o da discussã o sobre o que é arte.

Desde esse período, diversas mudanças têm ocorrido em pouco tempo, e, até hoje, na
arte contemporâ nea, há ainda quem pergunte “O que é arte? Para que serve?”.

Arte conceitual: manifestaçã o artística que prima por uma arte mental, fortemente ligada ao discurso do artista e à
interpretaçã o de quem a aprecia. Trata-se de uma arte de intensidade intelectual, divergindo da narrativa ou da forma como
o mundo estava acostumado apreciar arte antes do início do sé culo XX.

Ready made: expressã o inglesa que significa “objeto pronto”. Marcel Duchamp, por exemplo, em vez de criar um
novo objeto, como uma escultura ou uma tela pintada, apropriava-se de objetos do cotidiano, produzidos pela indú stria em
sé rie, modificando-os, ressignificando sentidos e atribuindo funçõ es esté ticas a esses objetos.
Marcel Duchamp. 1917/1964. Porcelana. Galeria de Arte de Barbican, Londres. Foto: Dan Kitwood/Getty Images

Fonte, de Marcel Duchamp, réplica (1964) em exibição em Londres. Foto de 2013.


Pá gina 24

Depois dos objetos cotidianos trazidos para o cená rio da arte pelos artistas dadaístas,
muitos outros se aventuraram por caminhos estranhos aos olhos do pú blico e da crítica. Na
segunda metade do século XX, muitas concepçõ es de arte já tinham sido aceitas, tanto que, em
1967, o pintor, desenhista, cenó grafo e professor Nelson Leirner (1932-) enviou um porco
empalhado, em um engradado, com um presunto pendurado no pescoço, para o IV Salã o de
Arte Moderna de Brasília. Sua obra Porco empalhado foi aceita e o artista veio a pú blico
indagar os critérios para considerar um porco empalhado como forma de arte. Observe-a.

Nelson Leimer. 1967. Acervo Documental Fotográfico da Pinacoteca do Estado de São Paulo

Porco empalhado (Happening para a crítica), ou O porco, de Nelson Leirner, 1967. Objeto, engradado de madeira e porco
empalhado, 83 cm × 159 cm × 62 cm.

O que o artista fez foi um happening, provocando a crítica para que participasse do
debate. A palavra happening é usada para descrever uma linguagem artística em que artes
visuais e teatro podem estar unidos em um acontecimento provocado pelo artista. As pessoas
podem ser envolvidas em uma situaçã o ou convidadas a participar dela. No caso, os críticos de
arte e os jurados do IV Salã o de Arte Moderna de Brasília foram envolvidos sem perceber no
happening de Nelson Leirner. O artista planejou a situaçã o, esperando, com sua percepçã o do
panorama da arte na época, que as pessoas participassem involuntariamente, o que de fato
aconteceu. Tal atitude provocou polêmica e muita discussã o entre a crítica e o pú blico, fazendo
vir à tona mais uma vez o debate sobre o que é arte.

Giro de ideias: Linguagens contemporâ neas


Ready made, performance, happening sã o linguagens artísticas contemporâ neas.
Observe novamente as obras criadas pelos artistas Marcel Duchamp, Paulo Bruscky e Nelson
Leirner e converse com os colegas a respeito dessas produçõ es.

Imagine que você e sua turma estã o em um museu e se deparam com essas produçõ es.
Que reaçã o vocês teriam? Um urinol, uma pessoa com um cartaz pendurado no corpo, um
porco empalhado podem ser considerados arte? Analise comparativamente qual pode ter sido
a intençã o dos artistas ao utilizar essas materialidades e linguagens. Que outros artistas
atualmente utilizam essas linguagens artísticas em suas criaçõ es?

Pesquise e converse com seus amigos e professores sobre essas linguagens e


materialidades.
Escreva aqui a sua opiniã o e o que você descobriu em sua pesquisa.
Pá gina 25

Tudo pode ser arte?


Os objetos que existem ao nosso redor também foram produzidos por meio do
pensamento estético e artístico. A palavra arte, de origem latina (artis), corresponde, em grego,
ao termo tékne (origem também de técnica, relativa à arte, ao saber) e nasceu da ideia de que o
ser humano sempre fez coisas, desde sua origem. Entretanto, não é válido atribuir à arte
simplesmente o significado de ser uma técnica para “fazer coisas”. Para que algo seja arte, é
necessá rio um sentido ou uma intençã o. Nã o há uma funçã o cotidiana na arte, como
encontramos em outros objetos, mas sim uma funçã o poética, estética e artística. Entã o, o que
isso significa?

Em nosso dia a dia, encontramos objetos criados com a intençã o de agradar ao olhar, ao
tato, aos ouvidos... Como um objeto tecnoló gico, um celular, uma simples caneta. Todo o
processo de produçã o desses objetos nasceu de um desenho (design) pensado por alguém que
quis torná -los mais atraentes. Esses objetos têm uma funçã o utilitá ria, que pode ser a de
mandar uma mensagem eletrô nica ou a de escrever uma carta manualmente para alguém.
Nesse processo, há criaçã o e organizaçã o de formas, cores, texturas, dimensõ es nos objetos em
nossa volta, mas nem todos sã o considerados arte, embora carreguem pensamento estético em
sua criaçã o e elaboraçã o. Nas ruas também encontramos imagens, prédios, jardins, ouvimos
sons... Sã o lugares, objetos e ambientes criados para o deleite e o uso das pessoas. No cená rio
em que vivemos, principalmente nas grandes cidades, há muitas linguagens (escritas, faladas,
cantadas, desenhadas, modeladas etc.), algumas criadas com intençõ es artísticas e outras que
carregam elementos artísticos e estéticos, mas que estã o ligadas a funçõ es de uso cotidiano.

Observe a imagem a seguir.

Bilderbox/Age Fotostock/Easypyx

Mulher observando uma prateleira de supermercado. Foto de 2013.


Quando estamos diante de uma prateleira de supermercado, nossos olhos sã o
preenchidos com tantas cores e formas das embalagens que podemos até ficar admirados com
o apelo visual desses produtos. Contudo, estar diante de uma obra de arte é outra experiência,
mesmo que tal obra apresente formas e cores semelhantes à s que encontramos nas prateleiras
dos supermercados.
Pá gina 26

O artista plá stico e cineasta estadunidense Andy Warhol (1928-1987) trouxe para suas
pinturas imagens de produtos que podemos encontrar em prateleiras de supermercados. Ele
escolheu trabalhar com tais imagens em suas obras para provocar o pensamento crítico a
respeito de como a sociedade produz e consome imagens. Andy Warhol é considerado um dos
mais importantes artistas da Pop Art.

Pop Art: no início da dé cada de 1960, muitos artistas questionavam o crescimento dos meios de comunicaçã o de
massa, como a televisã o, aparelho que abriu um novo canal de divulgaçã o de produtos para o consumo. A publicidade
começava a conduzir o gosto e o desejo das pessoas para a aquisiçã o de objetos e a busca por padrõ es sociais de estilo de
vida. Nesse cená rio, a Pop Art surgiu como um movimento artístico que se apropriou da cultura de massa em tom crítico.
Nascido na Inglaterra, o movimento espalhou-se para outros países. A sociedade e a cultura dos Estados Unidos serviram de
inspiraçã o para diversos artistas que questionavam em suas obras o estilo de vida estadunidense.

A embalagem de um produto na prateleira do supermercado nã o é arte, mas sua imagem


na obra do artista pode ser. Quando Andy Warhol pintou imagens de latas de sopa na obra
Campbell’s Soup Cans (1962), modificou a funçã o cotidiana da imagem do produto, atribuindo
a ela um novo sentido, poético e estético. Sua intençã o era discutir a funçã o dos ró tulos, dos
produtos em série, do sistema capitalista que leva ao consumismo.

EI Chapulin/Alamy/Glow Images

Mulher observa a obra Campbell’s Soup Cans (conjunto de 32 quadros em tinta de polímero sintético sobre tela, 50,8 cm ×
40,6 cm), de Andy Warhol, 1962, no Museu de Arte Moderna (MOMA), Nova York, (Estados Unidos). Foto de 2010.

É comum a Pop Art ser lembrada na histó ria da arte como um movimento de protesto.
No entanto, ela foi além, porque provocou diá logos entre os estilos de vida e a arte, entre a
estética e o conceito de visualidade da segunda metade do século XX. Ofereceu, também,
possibilidades de reflexã o sobre a fama desencadeada pelas mídias em um tempo no qual os
meios de comunicaçã o de massa começavam a oferecer um universo de imagens em cores,
formas e movimentos em dimensõ es até entã o nunca vistas pelas pessoas, mudando estilos de
vida e valores estéticos, com uma influência que perdura até os nossos dias.

Hoje, é cada vez mais perceptível como os meios de comunicaçã o dominam nossa
cultura. Pessoas e produtos ficam conhecidos de uma hora para outra quando colocados em
evidência pela mídia, assim como também sã o esquecidos rapidamente quando estã o fora dos
meios de comunicaçã o.
Pá gina 27

A arte de ANDY WARHOL


Uma imagem de latas de sopa pode ser considerada arte? As prateleiras de
supermercados, com suas cores vibrantes e formas repetidas, com objetos produzidos em série
e colocados em sequência, inspiraram a maneira de como Andy Warhol compô s a obra
intitulada Campbell’s Soup Cans (1962). A marca de sopas Campbell’s era muito popular nos
Estados Unidos na época, e seus produtos eram servidos até em cenas de seriados de televisã o.
Warhol pintou individualmente 32 quadros de 50,8 cm × 40,6 cm com tinta acrílica sobre tela
nas cores do produto original. Depois, ele colocou as 32 telas arrumadas uma ao lado da outra,
tal qual os arranjos que encontramos em prateleiras de lojas e supermercados. As pinturas em
cores vibrantes e combinadas em vá rios tons contrastantes e a repetiçã o de imagens sã o
pontos marcantes da obra de Andy Warhol, como podemos observar em seu Autorretrato
(imagem ao lado).

Andy Warhol. 1966. Tinta serigráfica sobre pintura polímero sintético sobre tela. Museu de Arte Moderna, New York. VG-Bild-Kunst Bonn/Fine Art Images/Glow Images

Autorretrato, de Andy Warhol, 1966. Serigrafia e acrílico sobre tela, 57,2 cm × 57,2 cm.

Embora o movimento Pop Art tenha começado na Inglaterra, foi nos Estados Unidos,
país de origem de Andy Warhol, que ganhou maior força. Os artistas desse movimento usaram
cores vibrantes, imagens com visual de histó rias em quadrinhos, de celebridades de cinema e
televisã o e embalagens de produtos que eram símbolos de consumo. As linguagens usadas
foram bem variadas, desde pinturas e serigrafias a fotografias e vídeos, entre outras.
Destacaram-se também nesse movimento artistas como Roy Lichtenstein (EUA, 1923-1997) e
Richard Hamilton (Inglaterra, 1922-2011), que trouxeram as imagens da vida cotidiana para
os espaços de exposiçõ es de galerias e museus.

Giro de ideias: Arte poética


Arte é poética? O que é poética? A arte pode espalhar e espelhar uma ideia, uma opiniã o
sobre um fato ou uma ideologia. A poética é a força de uma obra de arte, é o que faz a diferença
entre um objeto do cotidiano e as produçõ es artísticas. Todos nó s fazemos diversas atividades
no dia a dia; algumas açõ es sã o mecâ nicas, outras mais conscientes, intencionais (porque
escolhemos fazê-las de determinada maneira). Contudo há , coisas que fazemos de modo tã o
significativo que podemos até dizer: “Isso ficou bom! Isso mostra quem eu sou! Essa é a minha
poética!”.
Na arte, a maneira como o artista produz sua obra pode mostrar quem ele é. Seus estilos
e pensamentos podem ser revelados na linguagem da arte por meio dos procedimentos e
materialidades escolhidas por ele.

Estudamos que muitas coisas podem se tornar arte se tivermos a intençã o de dar
significados novos aos objetos e à s imagens do cotidiano. De embalagens, imagens de
celebridades até uma mosca gigante, uma nota de dinheiro ou um cartaz pendurado em
alguém, tudo pode ser assunto para uma obra de arte.

Para criar também é preciso experimentar diferentes materialidades e verificar qual


material tem mais relaçã o com nossa intençã o, nossa poética. Qual linguagem você gostou de
conhecer e gostaria de utilizar na criaçã o de sua obra? Qual assunto, qual tema o influencia e
estimula? Enfim, qual é a sua poética? Escreva a respeito.
Pá gina 28

Conexõ es Arte e Filosofia


Estética e poética
A estética, como um ramo de discussã o filosó fica, atua na reflexã o sobre o papel da arte na
vida, sua natureza, seus valores e suas concepçõ es e discute compreensõ es de beleza ao longo dos
tempos.

A poética é um ramo da filosofia da arte que estuda a qualidade das obras artísticas em
funçã o de como sã o produzidas, do que expressam e do que provocam na sociedade. Para os gregos
existiam critérios para dizer se uma obra tinha poética ou nã o. Podemos dizer também que a
poética é o modo singular com que fazemos as coisas, ou, ainda, o jeito particular com que fazemos
arte. A poética representa as ideias dos artistas.

Na base dos estudos da filosofia da arte estã o os debates sobre mímesis, ideias discutidas por
filó sofos gregos como Platã o (427-347 a.C.) e Aristó teles (384-322 a.C.).

Segundo Alfredo Bosi (1986), Platã o dizia em seus discursos que a arte é uma mímesis da
vida, como a sombra de um reflexo. A palavra grega mímesis (mimese, em português) apresenta a
ideia de imitaçã o, reproduçã o, representaçã o. Para Platã o, a mímesis na arte era a representaçã o da
natureza, mas como uma có pia, um reflexo da vida. E a vida, por sua vez, era também um reflexo do
mundo das ideias. Assim, a arte seria a có pia da có pia. Já Aristó teles dizia que a arte é a
representaçã o da vida como manifestaçã o poética do ser humano, defendendo que o conhecimento
advém da percepçã o dos sentidos. Os artistas criam arte por meio da poética. A arte imita a vida,
porém de modo mais belo, sublimado.

Rafael Sanzio (1483-1520), pintor renascentista, representou os dois filó sofos em sua obra
Escola de Atenas. Platã o e Aristó teles aparecem no centro da pintura e sã o representados como
amigos que discutiam e refletiam as formas de pensar a filosofia.

As ideias ainda hoje estudadas para compreender a natureza estética e poética da arte e a
concepçã o de belo sublimado, colocadas por Aristó teles, influenciaram muitos períodos da histó ria
da arte. A arte como funçã o poética foi estudada pelos gregos antigos e é investigada até hoje em
razã o da necessidade de compreender o que é arte e por que a fazemos.

Será que a concepçã o de arte como imitaçã o da vida ou o conceito de beleza sublimada ainda
fazem parte de imagens que criamos em nosso tempo, tanto na arte como nos meios de
comunicaçã o? Vamos pensar sobre isso?
Rafael Sanzio. 1509. Stanza della Segnatura, Vaticano. Foto: Image Asset Managemen/World History Archive/Grupo Keystone

Escola de Atenas (1509-1510), de Rafael Sanzio. Afresco. 5,00 m × 7,00 m.


Pá gina 29

Projeto experimental
Um mundo visual
O artista pop analisa a cultura visual de seu tempo, principalmente sob o prisma dos valores
e costumes, e traz para sua arte essa visualidade por ter sido marcado e tocado por ela. Enquanto
Andy Warhol criava imagens com rostos de celebridades, como a obra Marilyn Monroe (Marilyn)
apresentada a seguir, ele mesmo se tornou uma delas. Até hoje sua obra e suas ideias continuam a
fazer sucesso. Por causa do destaque ainda dado a esse artista na mídia e no mundo da arte, o
fabricante de sopas Campbell’s criou uma ediçã o limitada com embalagens que trazem as cores
utilizadas por ele e a estampa de seu rosto.

Andy Warhol, 1967. Composição e folha,Série de serigrafias. Staatsgalerie Museum,Stuttgart/Michael Latz/AFP/Getty Images

Visitante ao lado da obra Marilyn Monroe (Marilyn), de Andy Warhol, 1967. Composição e folha, 91,5 cm × 91,5 cm. Série
de serigrafias. Foto de 2008, no Staatsgalerie Museum, em Stuttgart, Alemanha.

Em suas investigaçõ es, Andy Warhol criou composiçõ es artísticas em que utilizou uma ú nica
imagem repetida vá rias vezes, para provocar o pensamento crítico sobre a sociedade de consumo.

Diante do exposto, como você vê a relaçã o entre a arte e o mundo capitalista? Reflita sobre
isso.

A vida dos artistas pode nos inspirar, mas é importante olhar para nossa pró pria realidade e
refletir sobre a cultura que estamos vivenciando e como sã o os valores e as imagens que marcam
nossa histó ria.

Como experiência artística, vamos fazer uma composiçã o baseada no princípio da repetiçã o.
Escolha uma imagem que marcou sua vida (ró tulos, embalagens, logotipos, imagens de pessoas etc.,
tire có pias na quantidade que considerar suficiente para causar o efeito de repetiçã o que você
deseja e cole essas figuras no espaço de uma folha A4 ou de uma cartolina. Faça intervençõ es com
lápis de cor, canetas ou tinta transparente (pode ser guache diluída em á gua, por exemplo). Você
pode criar à vontade, colocando palavras, frases, outras figuras e desenhos. Solte sua imaginaçã o!

Como podemos perceber a poética na obra dos artistas?

Escolha uma obra da sua preferência e faça uma aná lise sobre a poética do artista.
Reuters/Latinstock

Edição limitada de latas das sopas de tomate Campbell’s com cores usadas por Andy Warhol e imagens do rosto do artista.
Foto de 2012.
Pá gina 30

TEMA 3 ARTE É
EXPERIÊNCIA?
"A arte existe porque a vida nã o basta."

Pronunciamento de Ferreira Gullar durante a FLIP de 2010.

Vivemos experiências desde os primeiros minutos de nossas vidas. Algumas sã o


esquecidas, outras marcam para sempre nossa histó ria. É pró prio dos seres humanos contar
suas histó rias. Quando, por exemplo, nos deparamos com algo que nos emociona, podemos
dizer que tivemos uma experiência marcante. Você acha que, para ter experiências na arte, é
preciso estar aberto à poesia?

A arte pode nos tocar de modos diferentes. Ter contato com a arte pode proporcionar
experiências significativas. Quando observamos uma imagem, assistimos a um filme, a um
espetá culo de dança, a uma peça de teatro ou quando ouvimos uma mú sica, sentimos emoçõ es.
Essas emoçõ es podem ser bem agradá veis como também podem nos provocar sensaçõ es de
estranhamento ou incô modo. Cada um sente a arte de um jeito diferente porque somos
pessoas com histó rias e experiências diversas. Já aconteceu de você ir ao cinema com um
amigo e um de vocês se emocionar com as cenas e a histó ria do filme, e o outro, não? Isso
acontece porque somos seres singulares, com emoçõ es e opiniõ es exclusivas. Podemos estar
em estado de estesia ou anestesiados. À s vezes, temos a intençã o de entrar nesse estado
sensível, mas pode acontecer de estarmos distraídos. No entanto, podemos ser atraídos por
uma mú sica, uma cena de filme, um trecho de um poema ou uma imagem que nos coloca nesse
estado e nos emociona.

Estesia: palavra usada pelos gregos antigos para dizer que, quando nos emocionamos com algo, é porque estamos
abertos à poesia, em um estado de estesia, ou seja, estamos propícios a sentir.

A coreó grafa e bailarina alemã Philippine Bausch (1940-2009), mais conhecida como
Pina Bausch, mergulhava nas emoçõ es humanas e acreditava que cada bailarino precisava
encontrar sua poética, uma maneira singular de expressar os gestos e os movimentos, de
desenvolver a coreografia com sinceridade, emoçã o.
Anne-Christine/AFP/Getty Images

A bailarina alemã Pina Bausch durante a performance da peça Café Müller, no Festival d’Avignon, França, em 1995.
Pá gina 31

Sergei Karpukhin/Reuters/Latinstock

Um observador ao lado da escultura Big Baby, do artista australiano Ron Mueck, na Casa de Leilão Christie, em Moscou,
Rússia. Foto de 2011.

O artista australiano Ron Mueck (1958-) especializou-se em criar esculturas hiper-


realistas. Algumas sã o gigantes, como a escultura Big Baby acima; outras, bem pequenas,
cabendo até na palma da mã o. Estar diante de obras de arte como as dele pode nos provocar
sempre algum tipo de reaçã o, seja de estranhamento, admiraçã o ou espanto, entre outras.

Sã o imprevisíveis as sensaçõ es que alguém pode sentir diante da arte, por causa do
repertó rio cultural de cada um. A emoçã o diante das coisas, sejam arte ou nã o, pode acontecer
em diferentes espaços e situaçõ es. Também nos emocionamos com a visã o da natureza ou com
o sabor de um alimento. No filme brasileiro O contador de histó rias(2009), há uma cena em
que a educadora Margherite, vivida pela atriz portuguesa Maria de Medeiros, leva o menino
Roberto Carlos Ramos, personagem vivido pelo ator adolescente Paulinho Mendes, para ver o
mar pela primeira vez. O garoto se emociona e corre para as ondas: o personagem vive uma
experiência sensível. Quando assistimos a essa cena do filme, também podemos nos emocionar
com a reaçã o do menino que olha o mar pela primeira vez. Somos envolvidos por uma cadência
de emoçõ es provocadas pela visã o da natureza na existência do personagem e pela apreciaçã o
da cena criada na linguagem do cinema.

Nosso conhecimento é construído com base em observaçõ es do mundo, pelo acervo da


memó ria, pela leitura, pelo estudo e pela imaginaçã o. O jeito de olhar mais sensível vai além de
visõ es externas e adentra a maneira como elas nos tocam. Para que isso ocorra, é preciso
estarmos “abertos” para senti-las — em estado de estesia.
Filme de Luiz Villaça. O contador de histó rias. Brasil. 2009. Foto: Acervo da Nia Filmes

Cena do filme O contador de histórias, em que contracenam os atores Maria de Medeiros e Paulinho Mendes. Direção de
Luiz Villaça. Brasil: Warner Bros Pictures, 2009.
Pá gina 32

A arte de PINA BAUSCH


Pina Bausch propô s em sua arte a uniã o de duas linguagens artísticas, a dança e o teatro,
que, misturadas, fizeram nascer o termo dança-teatro. Há espetá culos teatrais com
coreografias criadas para explorar o palco de forma nã o convencional: espaços verticais,
movimentos cadenciados dos atores, apresentaçõ es sem palavras e exploraçã o do corpo como
suporte expressivo. Do mesmo modo, na dança-teatro há espetá culos que incorporam textos,
personagens, materiais, objetos, adereços de cena, movimentos trazidos do cotidiano e o corpo
como suporte de sons e gestos.

Sã o intençõ es que primam por abusar da criaçã o poética de atores e bailarinos para
romper barreiras entre linguagens, para criar linguagens híbridas (misturadas). Observe a
seguir, a imagem de Pina Bausch atuando em cena da peça teatral Café Mü ller. Muito do que
vemos em espetá culos de artes cênicas contemporâ neos teve influência das pesquisas
realizadas por Pina e outros artistas da dança, como o austro-hú ngaro Rudolf von Laban
(1879-1958) e a estaduniense Isadora Duncan (1878-1927), que estudaram o corpo como
materialidade expressiva nas artes cênicas e impulsionaram a dança como a arte do
movimento.

David Lefranc/Kipa/Corbis/Latinstock

Pina Bausch em cena da peça Café Müller, baseada em memórias de sua infância, no Festival d’Avignon, França em 1995.

Palavra do artista

“Eu nã o classifico nada em minha vida! É apenas uma festa de parte do que eu gosto, e eu
gosto de tantas coisas...”

Pina Bausch

ENTREVISTA com Pina Bausch (Reportagem de Fabio Cypriano para Revista BRAVO!). Poéticas teatrais, 14 ago.
2010. Blog. Disponível em: <http://poeticasteatrais.blogspot.com.br/2010/08/entrevista-com-pina-bausch.html>. Acesso
em: 17 dez. 2015.
Henning Kaiser/DdpImages/AFP

Coreógrafa Pina Bausch, fundadora da companhia de dança-teatro de Wuppertal. Foto de 2008.


Pá gina 33

Ofício da arte

Coreó grafo(a)

Coreó grafo é o profissional que cria e organiza sequências de movimentos corporais no


espaço, com ou sem mú sica, e que resultam em uma dança ou coreografia. O coreó grafo
também pode atuar como professor de dança, auxiliando os alunos a desenvolver e ampliar o
seu potencial físico e artístico.

Normalmente, esse profissional se especializa em algum tipo de dança. Sua formaçã o


passa pelo bacharelado e pode chegar até o pó s-doutorado. As companhias e os grupos de
danças sã o os maiores empregadores dessa á rea.

Giro de ideias: Experiência estética


O que é ter uma experiência estética?

A experiência estética acontece quando nos sensibilizamos com algo.

Você se lembra de uma situaçã o em que viveu uma experiência estética com uma obra
de arte? Pode ter sido ao assistir à cena de um filme, ao visualizar uma imagem, ao ouvir uma
mú sica.

No filme O sorriso de Monalisa, há cenas em que é possível apreciar um encontro


significativo com a arte, revelando-nos que experiências estéticas podem acontecer.

Descreva no espaço a seguir uma experiência significativa que você vivenciou por meio
de alguma linguagem artística. Se preferir, você também pode fazer um desenho, em uma folha
à parte, que represente essa experiência. Compartilhe sua produçã o com seus colegas.

Filme de Mike Newell. O sorriso de monalisa. EUA. 2004


Filme O sorriso de Monalisa. Direção de Mike Newell. EUA: Columbia Pictures, 2004.
Pá gina 34

Conexõ es Arte e Saú de


Dance mais!
Com tantas facilidades oferecidas pela vida contemporâ nea, as pessoas acabam por se
movimentar cada vez menos. O resultado disso sã o doenças ligadas ao sedentarismo. Dançar faz
bem à saú de porque, seja qual for o tipo de dança escolhido, realizamos movimentos que diferem
do que fazemos no dia a dia. Movimentos repetidos realizados no trabalho, por exemplo, sã o
responsá veis por enfermidades que levam à aposentadoria pessoas jovens, que poderiam produzir
por mais tempo no mercado de trabalho.

Conhecer o pró prio corpo, tomar consciência do que ele nos proporciona de prazer e dor
também é produtivo. Para começar, vamos perceber nosso corpo do ponto de vista bioló gico. Preste
atençã o nas proporçõ es, nos pontos de articulaçã o, nos esforços que fazemos e em como sentimos
essa matéria do qual somos recheio.

Um dos desenhos mais famosos da histó ria da arte é o Homem vitruviano, do artista
renascentista italiano Leonardo da Vinci (1452-1519), feito por volta de 1490. Esse desenho ficou
famoso por mostrar que nosso corpo tem medidas proporcionais; por exemplo, a cabeça de um
homem adulto mede cerca de um oitavo da medida da altura do corpo todo. As mediçõ es feitas por
Da Vinci mostram ainda as proporçõ es de vá rias partes do corpo entre si. O desenho também é
conhecido como o Câ none das proporçõ es humanas.

Observe o Homem vitruviano na imagem ao lado. Você já parou para pensar que o nosso
corpo pode ser medido e contém muitas relaçõ es proporcionais? Faça um desenho no qual possa
encaixar seu corpo seguindo a ideia de proporçã o de Da Vinci. Usando lápis de cor, realce os pontos
das articulaçõ es. Elas formam um dos sistemas que proporciona movimento ao nosso corpo.
Também aponte, usando outra cor, as á reas de seu corpo que você mais movimenta no dia a dia.
Você sente dor ou incomô do em alguma parte do corpo por causa de movimentos repetitivos
cotidianos? Registre essa á rea usando outra cor.

Ao dançar, usamos nossa capacidade motora, de criar movimentos, e mental, de


concentraçã o; memó ria e imaginaçã o. Outro motivo para incentivar todos a dançar é o benefício ao
nosso lado psicoló gico. Criar, expressar-se, fruir, enfim, fazer arte é sempre saudá vel. Mesmo que a
pretensã o nã o seja ser um bailarino profissional, todos podem experimentar os movimentos da
dança.
Pá gina 35

Leonardo da Vinci. 1492. Desenho. Galeria da Academia, Veneza

Homem vitruviano, de Leonardo da Vinci, c. 1490. Desenho, 34,4 cm × 24,5 cm.


Pá gina 36

Projeto experimental
Movimento das manhã s
Linguagem da arte: dança

Rudolf von Laban, um dos precursores da dança moderna ocidental, também pesquisou
sobre os movimentos corporais cotidianos para a criaçã o coreográ fica na dança. Para ele, o corpo se
expressa mesmo nos movimentos mais corriqueiros. Perceber esses movimentos e aprender a
conhecer o pró prio corpo, matéria-prima para a dança, é importante para o dançarino que investiga
as potencialidades expressivas do movimento.

Se mesmo dormindo costumamos movimentar nosso corpo, sem perceber, ao acordar essa
movimentaçã o se amplia consideravelmente. Em geral, nos espreguiçamos antes de levantar,
esticando articulaçõ es, mú sculos... Viramos de um lado para o outro, pensando em tudo o que temos
de fazer no dia. Mesmo quem tem algum tipo de imobilidade física, temporá ria ou permanente,
precisa praticar alguma forma de movimentaçã o, se necessá rio com a ajuda de outras pessoas.
Esses simples movimentos cotidianos podem ser estudados por você e usados em criaçõ es
artísticas na dança.

Fred Hildenbrandt/Lebrecht/Otherimages

Rudolf von Laban com o grupo de bailarinos do Staatsoper Unter den Linden (Berlin State Opera), do qual foi diretor no
período de 1930 a 1934. Foto de 1930.

Processos de criaçã o

Vamos fazer experimentos sobre os movimentos das manhã s? Pensem em movimentos feitos
durante as açõ es que vocês realizam todas as manhã s, ao acordar.

• Repitam alguns desses movimentos.


• Escolham, individualmente, três movimentos e definam uma forma de repeti-los algumas
vezes.

• Em grupos de três ou quatro pessoas, cada um deve ensinar seus três movimentos aos
outros.

• Todos devem memorizar os movimentos dos colegas e repeti-los duas vezes antes de
mudar para outro movimento.

• Ensaiem e memorizem a sequência.

• Coloquem mú sica (até mesmo mais de uma e de estilos diferentes) e peçam aos grupos que
façam a “dança das manhã s”.
Pá gina 37

TEMA 4 TEMPO: O
COMPOSITOR DE HISTÓRIAS
"[...]
Compositor de destinos
Tambor de todos os ritmos
Tempo, Tempo, Tempo, Tempo..."

VELOSO, Caetano. Oraçã o ao tempo. Inté rprete: Caetano Veloso. In: VELOSO, Caetano. Cinema transcendental.
[S.l.]: Verve, 1979. 1 disco sonoro. Faixa 2.

Como nos relacionamos com o tempo, esse “compositor de destinos”?

Na Grécia antiga, acreditava-se que Cronos (Khronos ou Chronos), o senhor do tempo,


teria surgido no princípio de tudo e encontrado Ananke, deusa do destino. De acordo com a
mitologia, os dois deuses uniram-se e passaram a reger tudo o que conhecemos. Segundo essa
crença, somos regidos tanto pelo tempo quanto pelo destino.

Estudar a histó ria da arte talvez seja como olhar para um reló gio perdido em um
emaranhado de fios de memó rias, como na obra da artista Sheila Hicks (1934-), exposta na
30ª. Bienal de Arte de Sã o Paulo em 2012 e reproduzida no final desta pá gina.

Olhar a arte com base no panorama histó rico é uma tentativa de contextualizar este
“tempo embaralhado”. Estudar épocas, estilos, artistas e obras na tentativa de desembaralhar
os fios da memó ria e da histó ria.

Entre os mitos criados na Grécia antiga sobre o tempo, temos ainda o mito do deus
Kairó s, filho de Cronos. Dizem que era belo, atlético, rá pido e que só possuía cabelos na parte
da frente da cabeça. Por isso, costuma-se dizer, até hoje, que devemos “agarrar as
oportunidades pelo topete”. É o deus do momento certo, da ocasiã o propícia. Sabe aqueles
momentos de prazer que passamos com amigos, familiares, em uma festa, viagem ou
realizaçã o de algo importante? Aquele tempo tã o marcante e significativo que nem vimos
passar? Esse é o tempo do deus Kairó s (tempo significativo).

Os artistas, ao longo da histó ria da arte, apresentaram suas impressõ es, nã o do passado
nem do futuro, mas do exato momento em que viviam. Olhar para a histó ria da arte é viajar
para outros tempos e tentar compreender como os artistas vivenciaram seu tempo Kairó s
(significativo) e como sua obra ficou marcada no tempo Cronos (tempo contado e datado).
Detalhe da obra da artista Sheila Hicks na 30.ª Bienal de São Paulo

Obra (sem título) de Sheila Hicks exposta na 30ª. Bienal de Arte de São Paulo, 2012.
Pá gina 38

A arte de SHEILA HICKS


A artista Sheila Hicks tem explorado em seu trabalho fios, amarras, entrelaçamentos,
mistura de cores e texturas. Ela procura romper com as barreiras entre arte e artesanato,
propondo uma arte tá til/têxtil em que podemos tocar e sentir os fios, que sã o uma espécie de
caminhos vividos.

Nascida nos Estados Unidos, Sheila viajou por vá rios países do continente americano.
Nessas experiências, conheceu técnicas de tecelagem que influenciaram a sua obra. Nela,
mistura técnicas antigas, como a tecelagem artesanal, com linguagens contemporâ neas, como a
instalaçã o.

Na obra observada na pá gina anterior, percebemos um modo poético de mostrar o


tempo construído com fios que ora sã o contínuos, ora sã o interrompidos; aparecem
emaranhados, entrelaçados, com ou sem nó s, construindo fluxos de linhas que lembram
acontecimentos na vida.

Giro de ideias: Ler uma obra de arte


Ao olhar para uma obra de arte, percebemos que ela é “aberta”, ou seja, possibilita
diversas interpretaçõ es. Cada um pode observá -la e tirar suas pró prias conclusõ es. No entanto,
há pinturas carregadas de símbolos e histó rias que acabam influenciando nossa leitura de
imagem.

É o caso da pintura Uma dança para a mú sica do tempo, do artista barroco francês
Nicolas Poussin (1594-1655). O título da obra nos sugere que a vida é uma dança, realizada ao
ritmo de Cronos (Tempo).

Barroco: movimento artístico que aconteceu entre o sé culo XVII e meados do sé culo XVIII, inicialmente na Itá lia,
difundindo-se em seguida pelos países da Europa e da Amé rica.

Observe a imagem a seguir, composta de vá rios símbolos ligados à percepçã o do tempo.


Nicolas Poussin. 1636. Ó leo sobre tela. Coleção Wallace, Londres

Uma dança para a música do tempo, de Nicolas Poussin, 1636. Óleo sobre tela. 82,5 cm × 104 cm.
Pá gina 39

Agora, registre os elementos que mais chamaram a sua atençã o nesta obra.

Conexõ es Arte, Histó ria e Ciência


Ao sabor de Cronos
"Um adulto normal nunca ocupa sua cabeça com problemas como tempo e espaço. Em
sua opiniã o, tudo o que havia a aprender sobre esse assunto foi aprendido na infância. Eu, ao
contrá rio, me desenvolvi tão lentamente que só comecei a me questionar sobre tempo e espaço
quando já era adulto."

EINSTEIN, Albert. In: NACHMANOVITCH, Stephen. Ser criativo. São Paulo: Summus, 1993. p. 111.

Você, certamente, já ouviu falar sobre a teoria da relatividade de Einstein, ou já a estudou em


Física. Este cientista mostrou que espaço, tempo, massa e gravidade estã o intimamente ligados.

Assim como Albert Einstein (1879-1955) se interessou pelo tempo, muitos artistas também
se interessaram e quiseram exprimir essa relaçã o em suas obras. Filmes de ficçã o científica e outras
modalidades de expressã o artísticas já foram criados tendo por base as ideias desse e de outros
cientistas fascinados pela passagem do tempo.

A instalaçã o Fontes (1992/2008), criada pelo artista brasileiro Cildo Meireles (1948-), foi
feita com 6 mil fitas métricas, mil reló gios e 500 mil nú meros de vinil, formas de marcar, medir e
enumerar as coisas, inclusive o tempo.

Acervo Cildo Meirelles

Instalação Fontes, (1992/2008), de Cildo Meireles 300 cm × 600 cm × 600 cm.


Pá gina 40

Há diversos instrumentos para marcar e medir o tempo e existe também uma ciência que
estuda a ordem dos acontecimentos de fatos histó ricos, a Cronologia. A origem do termo está ligada
ao nome do deus Cronos, que deu origem a muitas outras palavras de nosso cotidiano ligadas à
ideia de tempo. A palavra cronologia é composta pela junçã o de duas palavras: chronos (tempo) e
logos (estudo). Assim, a Cronologia é o estudo do tempo.

Para estudar a histó ria da arte no tempo de Cronos (cronologicamente), podemos escolher
algum territó rio da arte e partir de um ponto na linha do tempo (data/período). Com base nele, é
possível investigar os movimentos e artistas ligados ao período escolhido. Também podemos
escolher um local no mundo. Com o tempo e o local definidos, vamos começar nossa viagem.

Considere, por exemplo, o ano de seu nascimento como ponto de partida.

1. Cole vá rias folhas de papel (formato ofício ou A4) na posiçã o horizontal para conseguir
uma linha bem comprida.

2. Selecione canetas, giz de cera e outros materiais para fazer anotaçõ es e desenhos na sua
linha do tempo.

3. Agora, com a linha do tempo em mã os, vamos começar nossa viagem no tú nel do tempo.

4. Marque na sua linha do tempo o ano do seu nascimento e faça um desenho que represente
esse acontecimento. Deixe espaço para marcar o que aconteceu no passado (antes do seu
nascimento) e o que vem acontecendo até os nossos dias.

5. Pesquise o que estava acontecendo no mundo da arte no ano em que você nasceu. Que
mú sica fazia sucesso? Aconteceu alguma exposiçã o importante? Qual filme foi lançado? Algum jogo
de videogame fazia sucesso? Enfim, o que estava acontecendo? Para fazer essa pesquisa, você pode
perguntar a seus pais e familiares ou fazer buscas na internet.

6. Depois de descobrir o que aconteceu no ano em que você nasceu e enquanto dava os seus
primeiros passos neste mundo, amplie a sua pesquisa usando os outros capítulos deste livro para
encontrar obras e acontecimentos artísticos ocorridos antes do seu nascimento.

7. Na sequência, investigue o que aconteceu depois do ano em que você nasceu. Enquanto
você crescia, o que mudou na arte?

8. Anote o que você descobriu na sua linha do tempo. Você pode escrever, desenhar, colar
figuras... a criaçã o da visualidade neste projeto é livre.

9. Capriche em seu trabalho e, no final, exponha a sua linha do tempo na sala de aula.

DICA
Para assistir

Para conhecer mais sobre a teoria da relatividade, você pode assistir ao filme de ficçã o científica
Interestelar, dirigido por Christopher Nolan e lançado no Brasil em 2014.
Pá gina 41

Projeto experimental
Tempo Cronos e tempo Kairó s
Ao conhecer as concepçõ es sobre o tempo, a histó ria e a arte, e ao usar como metá fora a
mitologia grega, podemos apresentar as datas de duas formas: cronoló gica, de Cronos, ou dos
momentos significativos, seguindo a linha de Kairó s. Qual momento você gostaria de reviver na
histó ria da arte?

No filme Meia-noite em Paris, lançado no Brasil em 2011 e dirigido por Woody Allen (1935-),
o personagem principal faz viagens no tempo para viver épocas consideradas “de ouro” e conhecer
personagens que marcaram a histó ria da arte em vá rias linguagens.

Nessa fantasia com tom de comédia româ ntica, podemos encontrar artistas do passado como
o escritor Ernest Hemingway (1899-1961) e os artistas plá sticos Pablo Picasso (1881-1973),
Salvador Dalí (1904-1989), Man Ray (1890-1976), Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1901), Paul
Gauguin (1848-1903) e Edgar Degas (1834-1917), entre outros, que viveram, cada um a seu modo,
os dois tempos Kairó s e Cronos.

O filme retrata ainda a vida nos ateliês e cafés da cidade-luz, Paris. Como dica, a turma
poderia assistir a este filme ou outro, inclusive filmes do gênero cinebiografia, para conhecer mais
sobre os tempos significativo e cronoló gico, nos quais artistas de diferentes épocas e contextos já
estiveram mergulhados. Depois de estudar sobre um artista ou grupo, você e seus colegas podem
debater os seguintes temas:

• Como vivemos nossos tempos?

• Somos protagonistas da nossa histó ria e marcamos presença no tempo?

• Cada época, no filme, apresenta um contexto cultural. Será que, para compreender a
histó ria da arte, temos de estudar nã o apenas o tempo cronoló gico, mas também o contexto de cada
época? Compreender suas ló gicas e oportunidades?

• Ao estudar sobre artistas de tempos passados ou do presente, como percebemos a forma


pela qual eles lidaram com seus conflitos nos processos de criaçã o?

Agora, você é convidado a criar! Muitos artistas sã o inspirados por outros da mesma época
ou épocas anteriores. E você, que artista o inspira ou influencia seu processo criador? Que tal
escolher uma linguagem artística (materialidades, temas, elementos dessa linguagem) e criar sua
pró pria obra? Uma pesquisa ampliada sobre o processo de criaçã o dos seus artistas preferidos pode
ajudá -lo neste projeto.
Filme de Woody Allen. Meia Noite em Paris. Estados Unidos e Espanha. 2011

Cartaz do filme Meia-noite em Paris (2011), de Woody Allen.


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PRÉ-HISTÓRIA

Reproduçã o do Bisã o ferido, pintura rupestre, Era Paleolítica, c. 15000-10000 a.C., na


caverna de Altamira, Espanha. Foto de 2011.

Durante muito tempo, a intençã o foi criar imagens, sons, gestos e movimentos a serviço de
concepçõ es má gicas e religiosas. Os historiadores até hoje discutem se quem produziu essa imagem
queria relatar um fato ocorrido ou projetar um desejo de caça bem-sucedida, isto é, essa pintura
poderia ser uma atividade "má gica", por meio da qual seria possível capturar a alma do animal
antecipadamente e, assim, dominá -lo no momento da caça.

Flauta de osso de pá ssaro, c. 40000 e 35000 ac., foi descoberta em caverna de Hohle Fels,
Alemanha.

Os sons da natureza inspiravam os seres humanos a criar instrumentos e cantos. Os


primeiros instrumentos eram flautas feitas de ossos de animais. Depois, surgiram os instrumentos
feitos de cerâ mica, madeira, couro e metais.

Má scara ritualística, c. 9000 a.C.

As má scaras e adereços produzidos na Pré-Histó ria eram usados em prá ticas ritualísticas e
cerimoniais. As má scaras eram feitas de madeira, palha, barro e outros materiais que se
deterioraram com o passar do tempo.

IDADE ANTIGA
Tutancâ mon (l336 a l327 a.C.).

No Egito antigo, havia a crença em obras com a finalidade de eternizar a vida. Segundo o
historiador de arte Ernst Gombrich, a expressã o "escultor" em egípcio, podia significar "aquele que
mantém vivo". Muitos palá cios, templos e tumbas foram construídos e ricamente decorados com
afrescos e relevos, a exemplo da tumba de Tutancâ mon.

Discó bolo, de Myron de Eleuteras, c. 450 a.C. Réplica em má rmore do original em bronze, 155
cm de altura.

Os gregos antigos desenvolveram teorias filosó ficas sobre o belo. A beleza no período
clá ssico grego poderia ser apreciada na escultura, que mostrava corpos esbeltos, denotando
movimentos e grande preocupaçã o com a proporçã o, como podemos observar na escultura,
copiada pelos romanos, do atleta momentos antes de arremessar o disco.

Afresco da poetisa Safo (c. 620 a 568 a.C.)

Os romanos tinham fascínio por retratar pessoas de formas bastante reais, por isso
utilizaram-se da pintura e da escultura para eternizar cidadã os romanos, entre 753 a.C. e 476 d.C.
Um exemplo dessa arte é o retrato da poetisa Safo (século VII a.C.).

IDADE MÉDIA

Trovadores com instrumentos musicais medievais. O alaú de e arrabal. c. 1280.


A mú sica europeia na Idade Média estava muito contagiada pela fé cristã , assim como as
outras linguagens. O papa Gregó rio I (540 a 604) organizou a mú sica litú rgica. O nome canto
gregoriano é uma homenagem a esse papa. Fora das igrejas, a mú sica era apresentada pelos
trovadores e menestréis.

Buda de Leshan na China. A arte em harmonia com a natureza.

Na Idade Média, enquanto no Ocidente estabelecia-se uma arte para Cristo, no Oriente,
durante a Dinastia Tang (618-907), foram criadas obras monumentais para exaltar Buda. O Buda
gigante de Leshan recebe esse nome porque tem 71 metros de altura e foi esculpido na pedra da
montanha em Leshan, China.

A lamentaçao, (1754), afresco na parede da Capela de Scrovegni, 185 cm × 200 cm, em


Pá dua, na Itá lia.

O artista Giotto di Bondone (1267-1337), pintou a obra A lamentaçã o (1305) e criou


personagens bíblicos mais humanizados, expressando suas emoçõ es, diferentemente da arte
româ nica, que tinha a preocupaçã o de contar uma histó ria.

IDADE MODERNA

Davi, de Michelangelo, 1501-1504. Está tua em má rmore com 5,5 m de altura.

No Renascimento, a arte se volta para além dos dogmas religiosos, o homem torna-se o
centro do universo. Muitos artistas iniciavam seus estudos em escolas de artes e ofícios. Ficaram
conhecidos como grandes mestres da arte renascentista, como o italiano Leonardo da Vinci
(1452›1519) e Michelangelo (1475›1564). Muitos instrumentos foram criados, e a mú sica ganhou
notoriedade.
Moça com brinco de pérola (1665), de Johannes Vermeer (1632›1675). Ó leo sobre tela, 46,5
cm × 40 cm.

Apó s o Renascimento, outras correntes artísticas surgiram na cultura ocidental. Houve


tensõ es em relaçã o à s tradiçõ es e rupturas estéticas, sempre provocando debates sobre o que é
arte. No Barroco (século XVIII), alguns artistas começaram a criar retratos de pessoas comuns; a
pintura e a escultura receberam toques dramá ticos, resultando em formas mais teatrais e
expressivas.

A Liberdade guiando o povo (1830), de Eugene Delacroix (1798-1863). Ó leo sobre tela, 260
cm × 325 cm.

No Romantismo (século XVIII e XIX), o sentimento era mais importante do que as normas
clá ssicas para criar imagens na arte. As imagens emotivas e dramá ticas foram valorizadas e houve
uma ruptura com as técnicas rígidas do Neoclassicismo. A mú sica e a literatura também foram
muito apreciadas por esse movimento.

IDADE CONTEMPORÂNEA

Câ mera Mamute.

No final do século XIX, as concepçõ es de belo sã o questionadas e o mundo se transforma


velozmente diante dos acontecimentos e das conquistas industriais e tecnoló gicas. O
Impressionismo e outros “ismos" transformaram a arte nesse período. A fotografia e o cinema
instauravam um novo modo de ver o mundo por meio das lentes.

Bailarina Isadora Duncan (1877-1927)

Na dança vemos o abandono das sapatilhas de ponta, e o pé nu toca o solo em expressivos


movimentos. Isadora Duncan rompe com os padrõ es rigorosos do academicismo pesquisando
novos caminhos para a expressã o por meio do movimento corporal.

O Tã o Esperado. Escultura de Patricia Piccinini (1965-)


A arte e a cultura estã o sempre em movimento e, no fluxo da histó ria, as concepçõ es de
beleza e de sentido da arte foram se transformando. Um grito estético e poético em meio a tantas
mudanças que vemos acontecer à s portas do século XX.
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FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
1. (Vunesp-SP) A peça Fonte foi criada pelo francês Marcel Duchamp e apresentada em
Nova Iorque em 1917.

(Fonte – obra de Marcel Duchamp, fotografada por Alfred Stieglitz.)

A transformaçã o de um urinol em obra de arte representou, entre outras coisas,

a) a alteraçã o do sentido de um objeto do cotidiano e uma crítica à s convençõ es


artísticas entã o vigentes.

b) a crítica à vulgarizaçã o da arte e a ironia diante das vanguardas artísticas do final do


século XIX.

c) o esforço de tirar a arte dos espaços pú blicos e a insistência de que ela só podia existir
na intimidade.

d) a vontade de expulsar os visitantes dos museus, associando a arte a situaçõ es


constrangedoras.

e) o fim da verdadeira arte, do conceito de beleza e importâ ncia social da produçã o


artística.

2. (UEL-PR) Observe as imagens a seguir, ambas da década de 1970.


Cildo Meireles. Foto: Pat Kilgore

(Inserção em circuitos ideológicos)

Cildo Meireles. Foto: Pat Kilgore

(Quem matou Herzog?)

(Disponível em: <www.macvirtual.usp.br>. Acesso em: 18 out. 2009.)

Assinale a alternativa que contém as informaçõ es corretas com relaçã o ao autor de


ambos os trabalhos, assim como o contexto brasileiro do qual fizeram parte.

a) Hélio Oiticica, no contexto de pressã o, fruto da crise da bolsa de valores de Nova


Iorque de 1929 que afetou o mundo.
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b) Artur Barrio, no contexto do surgimento da bossa nova, importante momento cultural


do país.

c) José Leonilson, no contexto de celebraçã o, em virtude da industrializaçã o recente no


Brasil.

d) Waltércio Caldas, no contexto da popularizaçã o do carnaval, o que implicava


destaque internacional para o país.

e) Cildo Meireles, no contexto de censura e medo, derivados da repressã o e do regime


militar.

3. (Unicamp-SP)

Eugène Delacroix. 1830. Ó leo sobre tela, 260 cm × 325 cm. Museu do Louvre, Paris

Observe a obra do pintor Delacroix, intitulada A Liberdade guiando o povo (1830), e


assinale a alternativa correta.

a) Os sujeitos envolvidos na açã o política representada na tela sã o homens do campo


com seus instrumentos de ofício nas mã os.

b) O quadro evoca temas da Revoluçã o Francesa, como a bandeira tricolor e a figura da


Liberdade, mas retrata um ato político assentado na teoria bolchevique.

c) O quadro mostra tanto o ideá rio da Revoluçã o Francesa reavivado pelas lutas
políticas de 1830 na França quanto a posiçã o política do pintor.
d) No quadro, vê-se uma barricada do front militar da guerra entre nobres e servos
durante a Revoluçã o Francesa, sendo que a Liberdade encarna os ideais aristocrá ticos.
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EXPEDIÇÃO CULTURAL

Fox Photos/Hulton Archive/Getty Images

Operário no parapeito de um telhado adjacente tomando notas sobre o desmoronamento de um edifício na rua Cornhill em Londres,
em agosto de 1927.

Vamos começar uma expediçã o cultural?

Que tal fazer registros sobre lugares da sua cidade? Pode ser um lugar em que você
esteja, um lugar que se transformou com o tempo ou sobre como sente e percebe o mundo
neste local.

Observaçõ es sobre o cotidiano podem registrar fatos importantes, como na imagem


acima, em que vemos um operá rio fazendo anotaçõ es sobre o desmoronamento de um prédio
comercial. Ao mesmo tempo, um fotó grafo registra o desmoronamento e o registro feito pelo
operá rio. Ao lado, vemos uma pá gina do caderno de anotaçõ es de Leonardo da Vinci com
desenhos, esquemas ilustrativos e textos que mostram diferentes formas de capturar
momentos e ideias e processos de criaçã o de arte.

Leve sempre com você, nestas expediçõ es, um caderno de anotaçõ es (seu diá rio de
bordo) para registrar sensaçõ es ou momentos que você considerar marcantes, e para
desenhar, escrever, colar coisas que você encontrar pela vida.
Leonardo da Vinci. Século XV. Biblioteca do Congresso, Washington, D.C. Foto: SPL/Latinstock

Página do caderno de anotações de Leonardo da Vinci, publicada no século XIX.


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DIÁRIO DE BORDO
Como podemos responder à pergunta: “O que é arte?” Há apenas uma ú nica resposta? Se
conseguirmos chegar a alguma conclusã o, essa ideia poderá mudar futuramente?

É da natureza humana pensar sobre tudo, ter novas ideias e concepçõ es. Podemos
chamar de arte tanto as obras que estã o expostas em museus e galerias quanto os
acontecimentos artísticos, como as performances ou intervençõ es urbanas? Por quantas
linguagens a arte se expressa? Sã o muitas e diversas as linguagens artísticas: mú sica, dança,
teatro, performance, escultura, pintura, gravura, desenho etc. Entã o, onde está a arte? Dentro
ou fora das instituiçõ es culturais? Como conhecê-la e reconhecê-la?

Ao observarmos as obras dos artistas destacados neste capítulo, podemos concluir que a
arte tem mudado nos ú ltimos tempos e que, em cada tempo e lugar, ela teve papéis e funçõ es
diferentes. Cada artista criou com base em sua poética e visã o de mundo, cada civilizaçã o
reagiu à s criaçõ es artísticas, aceitando-as ou não, emocionando-se, tendo experiências
estéticas ou nã o, mas o fato é que a arte está sempre em fluxos, em movimentos, gerando
acontecimentos estéticos que mostram como os seres humanos sentem o mundo.

Por essa razã o, sabemos que a arte é importante, sabemos o que ela já foi, mas nã o
sabemos o que será , porque a arte está sempre nos surpreendendo e se renovando. Nã o
poderia ser diferente, porque a arte é produto da cultura humana. É a cultura em fluxos.

Reflita, com base nos conteú dos apresentados no capítulo, sobre as indagaçõ es a seguir.
Registre suas reflexõ es no seu caderno de anotaçõ es que chamaremos de Diá rio de bordo.

• Diante das obras apresentadas neste capítulo, o que mais lhe chamou a atençã o? Sobre
o que você gostaria de saber mais?

• Qual é a sua opiniã o sobre o que é arte?

• Suas ideias a respeito de arte mudaram depois de estudar este capítulo?

• Você ficou com vontade de criar em alguma linguagem artística? Qual?


Anderson Moreira Fotografia
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CAPÍTULO 2 POR LÍNGUAS E LÍNGUAS

© Cortesia/Cé sar e Claudio Oiticica

Invenção da cor, Penetrável Magic Square nº 5 – De Luxe, de Hélio Oiticica, 1977. A obra faz parte de um grupo de seis
trabalhos que são propostas de edificações ao ar livre. Encontra-se no Instituto Inhotim, MG. 4,70 m × 15 m × 15 m.

PARA ESTUDAR

• A proposição das linguagens


• Linguagens que se misturam
• A tecnologia transformando as linguagens
• As linguagens artísticas no tempo
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“Museu é o mundo;
é a experiência cotidiana...”
Hélio Oiticica, 1966. Disponível em: <http://pt.museuberardo.pt/exposicoes/helio-oiticica-
museu-e-omundo#sthash.cYV9dmY5.dpuf>. Acesso em: 18 jan 2016.
Pá gina 50

TEMA 1 A PROPOSIÇÃO DAS


LINGUAGENS
"Nó s somos os propositores: nó s somos o molde, cabe a você soprar dentro
dele o sentido da nossa existência.
Nó s somos os propositores: nossa proposiçã o é o diá logo. Só s, nã o existimos.
Estamos à sua mercê.
Nó s somos os propositores: enterramos a obra de arte como tal e chamamos
você para que o pensamento viva através de sua açã o.
Nó s somos os propositores: nã o lhes propomos nem o passado nem o futuro,
mas o agora."

CLARK, Lygia. Livro-obra. Rio de Janeiro, 1983. p. 233. [Republicado no Catá logo da Fundació Antoni Tà pies,
Barcelona, 1977.]

Você já ouviu falar em artista propositor? O que será que isso quer dizer?

A ideia de proposiçã o na arte surgiu no Brasil com o movimento Neoconcreto (entre as


décadas de 1950-1960), no qual os artistas buscavam ampliar a ideia de arte como experiência
estética, expressiva, como uma linguagem em fluxo com a vida e com a cultura. Eles viam a arte
como a criaçã o de um espaço para discursos poéticos que pudessem ser lidos pelos olhos e
pelo corpo; desejavam que o pú blico tivesse uma atitude mais ativa diante das obras.

O artista carioca Hélio Oiticica (1937-1980) e a artista mineira Lygia Clark (1920-1988)
foram personalidades importantes para a divulgaçã o da ideia da arte propositora no lugar da
arte contemplativa. Eles defendiam que o pú blico tivesse uma atitude ativa em relaçã o à arte,
ou seja, que fizesse parte do processo de criaçã o ou interaçã o com a obra. Os artistas que
apresentam esse tipo de proposta em suas exposiçõ es ou espetá culos sã o conhecidos como
artistas propositores.

Na concepçã o do artista propositor, a arte precisa estabelecer relaçõ es com quem a cria
e também com quem a aprecia. O artista não é o ú nico criador da obra e sim um coautor do
processo de criaçã o, dado por um projeto descrito pelo artista, mas para o qual é feito um
convite ao pú blico para que participe. Sã o projetos que propõ em percursos poéticos,
convidando as pessoas a penetrarem na obra de arte, para além da apreciaçã o como mero
espectador, e, portanto, a participarem ativamente da criaçã o.
Hélio Oiticica. 1964. Plástico e tecido. Cortesia do Projeto Oiticica, Rio de Janeiro. Foto: Andreas Valentin

Parangolé, P4, Capa 1, com Nildo Mangueira, de Hélio Oiticica, 1964. Plástico e tecido, 150 cm × 110 cm × 20 cm.
Pá gina 51

A arte de HÉ LIO OITICICA


Hélio Oiticica, artista propositor, pintor e escultor carioca, rompeu com as barreiras da
arte. Ele explorou vá rias linguagens artísticas e diversas materialidades. Para incentivar o
pú blico a interagir com suas obras, Oiticica criava espaços com vá rios materiais alojados em
salas e ninhos que convidavam as pessoas a adentrar lugares labirínticos. O espectador
capturado era levado a viver uma experiência sensorial. Toques, cheiros, sons e imagens eram
oferecidos para a proposiçã o de uma arte vivencial. Esse tipo de obra é chamada de instalaçã o
porque o artista modifica o lugar, criando um espaço novo em que sensaçõ es podem ser
vividas pelo pú blico ao percorrer esse espaço tridimensional. As instalaçõ es penetrá veis,
termo criado por Hélio Oiticica, eram, assim, um lugar para sentir a arte com o corpo todo, um
espaço aberto a sensaçõ es corpó reas e mentais, como na imagem a seguir.

Em outra obra, Oiticica fez “esculturas de vestir”, denominadas Parangolés (veja imagem
na pá gina anterior). Feitas com tecidos, plá sticos e outros materiais, as estruturas criadas pelo
artista podiam ser vestidas pelo espectador e, conforme ele se movimentava e dançava, as
formas, cores e texturas se mostravam. Mais um exemplo da linguagem da arte como
experiência entre o artista e o pú blico.

Na arte contemporâ nea, muitos artistas se preocupam em criar uma obra que nã o seja
apenas contemplada, mas também “vivenciada” pelo espectador. A obra nã o é mais apenas
para ser vista: dela se pode participar.

Hélio Oiticica. 1967. Cortesia Projeto Hélio Oiticica, Rio de Janeiro. Foto: César Oiticica Filho

Instalação Tropicália, Penetráveis PN2 e PN3, dimensões variáveis, de Hélio Oiticica, 1967. Os penetráveis são espaços
táteis e, muitas vezes, performáticos. Esta obra é composta por materiais como tecidos, pedras, água, areia e madeira, entre outros,
um convite para o público interagir com a obra.

Palavra do artista
“Eu nã o sei o que eu faço, porque cada coisa que eu faço, é que me estabelece a
referência de que estou fazendo alguma coisa, se as coisas estã o sendo feitas, isto é inventadas,
inauguradas, elas estã o inaugurando, cada vez uma situaçã o, uma realidade nova.”

Hé lio Oiticica

OITICICA, Hé lio. Carta de Hé lio Oiticica a Ligia Clark de 11 de julho de 1974. In: Figueiredo, L. (org.). Ligia Clark -
Hélio Oiticica: Cartas 1964-1974. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996, p. 227.

Cortesia/César e Claudio Oiticica

Hélio Oiticica é considerado um revolucionário artístico. Ele buscou inspiração em diferentes cenários históricos e cenas
sociais para criar. Foto de c.1965-66.
Pá gina 52

Ofício da arte

Profissional de expografia

O artista Hélio Oiticica pensou em vá rios projetos de instalaçõ es que pudessem ser feitos
e refeitos mesmo depois de sua época. Por isso, podemos vivenciar exposiçõ es desse artista
mesmo apó s sua morte. Quem faz a execuçã o de um projeto da instalaçã o é o profissional
formado na á rea de expografia.

Esse profissional é responsá vel pela montagem e organizaçã o de exposiçõ es artísticas; é


ele que pensa nos recursos necessá rios para a realizaçã o de uma exposiçã o, como iluminaçã o
do espaço, localizaçã o das obras, a programaçã o visual e difusã o do evento, entre outras
funçõ es para que o acesso do pú blico ocorra da melhor forma possível.

A arte de LYGIA CLARK


Mineira de Belo Horizonte, Lygia Clark (1920-1988) acreditava que a arte se renovava a
cada dia e o artista precisava criar sempre integrado ao seu tempo e a partir de suas
experiências. A artista também defendia o direito à liberdade de criaçã o, ao exercício da licença
poética e à ideia de que a arte deve estar ligada à vida.

Desafiando a tradiçã o da arte que estabelecia que o artista é quem cria a obra e o
espectador aquele que apenas aprecia, Lygia Clark, assim como outros artistas propositores,
convidou o pú blico para participar do ato criador em seus projetos artísticos.

Um exemplo de sua arte propositora é a obra Caminhando (1963) em que arte e vida se
entrelaçam. Nessa proposta, a artista nos convida a fazer um percurso poético e a refletir sobre
arte e vida.

Giro de ideias: Arte propositora: você aceita o convite?


Para Lygia Clark, é o ato de criar coletivamente (artista e pú blico) que dá sentido à obra
de arte. Este processo nos coloca em constante exercício poético e, talvez, desencadeie também
reflexõ es sobre arte e vida.

Para criar a obra Caminhando, a artista apropriou-se dos estudos do matemá tico e
astrô nomo alemã o August Ferdinand Mö bius (1790-1868) e, usando uma folha de papel,
elaborou uma faixa de Mö bius. Esse elemento é usado na sua obra com a proposta de escolher
os caminhos para seguir metaforicamente por meio do corte da tesoura sobre uma folha de
papel. Na medida em que é cortada, a folha vai criando muitos desdobramentos em linhas que
se integram a outras ou se separam, assim como nossa vida que ora os caminhos se integram
aos de outras pessoas, ora se desencontram. Neste exercício poético, a artista nos convida a
refletir e a criar. Você aceita o convite para criar uma obra propositora semelhante à obra
Caminhando?

Faixa de Möbius: é uma fita em que há apenas uma face contínua, ou seja, nã o há lado de dentro e nem lado de fora.
Em sua aplicaçã o prá tica, pode ser encontrada em mecanismos que usam correntes como as esteiras de aeroporto.

Veja como você pode realizar esta proposta. Siga o passo a passo a seguir:
1. Corte ao meio uma folha de papel, obtendo duas faixas com formato retangular.
Escolha uma delas para construir sua faixa de Mö bius.

Xica Lima
Pá gina 53

2. Passe cola em uma das extremidades da faixa que você escolheu.

Xica Lima

3. Torça a faixa de papel e aproxime as duas extremidades. Em seguida, cole as duas


pontas, formando um oito na horizontal.

Xica Lima

4. Agora você tem uma faixa de Mö bius.

Xica Lima

5. Escolha um local dentro da faixa de Mö bius e comece a fazer um corte paralelo a um


dos lados da faixa, você pode relacionar esta açã o a alguma coisa presente em sua vida ou a
algum sentimento que esteja experimentando no momento.

Xica Lima

6. Siga cortando e fazendo escolhas de direçõ es, tamanho e largura das fitas criadas
nesta açã o. Procure nã o romper a fita de papel, mas se isso acontecer nã o se preocupe.
Xica Lima

Xica Lima

7. O resultado é imprevisível, mas geralmente percebemos que a primeira faixa de


Mö bius se multiplica em vá rias outras faixas de tamanhos diferentes.

Xica Lima
Pá gina 54

Os “espect-atores”
Solicitar ao pú blico que participe da obra tem sido uma prá tica bastante presente na arte
contemporâ nea. Isso acontece nã o apenas nas artes visuais, mas também em outras
linguagens, como na proposta de teatro do artista carioca Augusto Boal (1931-2009). Boal
dizia que todo espectador pode ser ator. Dessa forma, Boal estabelecia que todos podiam fazer
teatro, do burocrata de um escritó rio ao operá rio de uma fá brica, todos, sem exceçã o. Segundo
Boal, espect-ator é o termo proposto para nos referirmos à ideia de que todos os seres
humanos sã o espectadores, porque observam, e também atores, porque agem.

Retirar a característica de passividade de quem assiste a uma encenaçã o teatral é


primordial. A passividade não combina com a proposiçã o de arte trazida por Boal. A proposta é
transformar, encontrar saídas para os problemas expostos no teatro e na vida. Nada está
pronto e acabado, ao contrá rio: tudo está por se fazer.

Convidando o pú blico a participar das artes cênicas, e nã o somente ficar assistindo ao


espetá culo de forma passiva, a linguagem do teatro torna-se disponível a todos, rompendo
barreiras entre artistas e plateia. Esse tipo de proposta teatral incentivou grupos de teatro
contemporâ neo a convidar o pú blico para uma atitude ativa na experiência cênica.

A arte de AUGUSTO BOAL


Augusto Boal (1931-2009), diretor, dramaturgo e teó rico carioca, criou um método de
concepçã o e encenaçã o teatral que reú ne exercícios (monó logos corporais) e jogos (diá logos
corporais) com a utilizaçã o de diversas técnicas, ao qual ele chamou de Teatro do Oprimido,
conhecido pela sigla TO. O método foi pensado para um fazer teatral de atores e nã o atores,
tendo como principais objetivos:

• democratizar os meios de produçã o teatral;

• dar acesso ao universo teatral à s camadas sociais menos favorecidas;

• transformar a realidade por meio do diá logo e da representaçã o teatral.

A prá tica do Teatro do Oprimido busca a (des)mecanizaçã o física e intelectual dos atores
ou dos não atores.

O Teatro do Oprimido é uma invençã o brasileira, difundida no mundo inteiro. A ideia


surgiu na década de 1970, quando Boal era diretor da companhia Teatro de Arena, na cidade
de Sã o Paulo. Podemos considerar Boal e seu método uma referência do teatro e da
dramaturgia brasileira. Um exemplo de artista propositor.

Palavra do artista

“Aquele que transforma as palavras em versos transforma-se em poeta; aquele que


transforma o barro em está tua transforma-se em escultor; ao transformar as relaçõ es sociais e
humanas apresentadas em uma cena de teatro, transforma-se em cidadã o.”
Augusto Boal

TEATRO do Oprimido. Ctorio.org.br. Disponível em: <http://ctorio.org.br/novosite/arvore-do-to/teatro-


dooprimido/>. Acesso em: 18 jan. 2016.

© Instituto Augusto Boal

Augusto Boal em um dos momentos de reflexões e exercícios do Teatro-Fórum.

Ofício da arte

Dramaturgo(a)

Profissional que cria ou adapta textos para as linguagens das artes cênicas (peças
teatrais, novelas e filmes). A maior oportunidade de trabalho nesta á rea se encontra em
cidades onde se concentram as grandes emissoras de TV, os grandes teatros, os grupos teatrais
e as produtoras.
Pá gina 55

Giro de ideias: O ”espect-ator”


Augusto Boal chamava de “espect-ator” à s pessoas da plateia que participavam
diretamente de suas encenaçõ es. O termo proposto refere-se à ideia de que todos os seres
humanos sã o espectadores, porque observam, e atores, porque agem.

• Há pessoas que sã o mais observadoras e outras mais atuantes. E você? Como você se
vê?

• Você acredita, como Boal, que todos podem fazer teatro? O que achou da proposta
desse artista?

DICA
Para navegar

Augusto Boal criou vá rios exercícios e propostas para que você possa se expressar por meio da
linguagem teatral. Para conhecer mais sobre o Centro do Teatro do Oprimido, instituiçã o que desenvolve a
metodologia criada por Boal, visite o site <http://tub.im/s4n6g3> (acesso em: 14 mar. 2016). Fazendo uma
pesquisa na internet, você também encontrará livros escritos por Boal, disponíveis para leitura, em formato
digital.

Conexõ es

Arte e Filosofia
Teatro-fó rum
"Ser cidadã o não é viver em sociedade, é transformá -la"

Augusto Boal, 1996.

A produçã o artística de Augusto Boal deu-se principalmente nos tempos de repressã o militar
no Brasil (1964-1985). Era uma forma de resistência à s políticas de silêncio em relaçã o à expressã o
artística.

Uma das proposiçõ es de Boal é o teatro-fó rum. Trata-se de um processo de criaçã o em


grupo. Os temas podem surgir do cotidiano das pessoas, das coisas que nos incomodam todos os
dias, que nos oprimem, das situaçõ es-problema para as quais precisamos encontrar soluçõ es,
buscar alternativas. No teatro-fó rum, o texto pode ser a obra de algum autor (dramaturgo) ou
construído pelos participantes, mas nas duas formas o pú blico e os atores dã o opiniõ es sobre o
desenvolvimento da peça e a soluçã o do conflito gerado na trama.

Vamos criar um teatro-fó rum na sala de aula? Escolha um tema da atualidade, uma questã o
polêmica que possa render uma boa discussã o. Uma parte da turma formará o grupo de atores, que
pode improvisar personagens e diá logos ou se basear em algum texto; a outra parte da turma
representará os espectadores. Escolha alguém para ser o curinga e/ou multipicador, aquele que
conduz a interaçã o entre os atores e o pú blico.
Curinga e/ou multipicador: na concepçã o do teatro-fó rum, mediador é a pessoa que organiza o debate e pode
convidar uma pessoa da plateia para participar da cena com os atores a qualquer momento. Pode também provocar
questõ es que levem o pú blico a refletir sobre o problema e a encontrar possíveis caminhos para transformar a sociedade.
Pá gina 56

Arte pú blica
A arte pú blica pode estar por todos os lados, em sua cidade ou em outras localidades que
você poderá visitar. Sã o instalaçõ es, esculturas, intervençõ es urbanas, pinturas em fachadas de
prédios e outras ocorrências também da linguagem das artes cênicas e audiovisuais, como as
projeçõ es artísticas.

O teatro popular de rua


O teatro popular de rua é um exemplo dessa arte que se realiza em espaço aberto, com
uma plateia que, minutos antes da encenaçã o, ainda não era plateia, formada por pessoas que
estavam naquele local ou transeuntes que, pela curiosidade, ali pararam para assistir ao
espetá culo. Durante a apresentaçã o, essa plateia é livre, pode comer pipoca, ir embora se nã o
gostar, rir ou chorar a qualquer momento do espetá culo, até mesmo comentar a cena. O
importante é participar, é se envolver com o clima da encenaçã o apresentada.

Misturando teatro, dança, mú sica, circo, em uma combinaçã o de vá rias linguagens


artísticas, o teatro popular de rua é uma arte híbrida. A histó ria de sua origem é antiga, passa
pela existência nos rituais da Pré-Histó ria, pelas criaçõ es dos gregos da histó ria antiga,
percorrendo castelos e burgos medievais, chegando até os dias de hoje.

As performances e intervençõ es urbanas sã o linguagens exploradas também em


apresentaçõ es cênicas.

Sopros poéticos ao pé do ouvido


A vida cotidiana contemporâ nea nas cidades é tã o corrida que, muitas vezes, as pessoas
não se permitem estar disponíveis à poesia. Assim, o grupo performá tico francês Les
Souffleurs (Os sopradores), por meio de sua arte, oferece oportunidades para que as pessoas
tenham acesso a discursos poéticos e possam desacelerar o ritmo do dia a dia. Esse grupo
declama poesias nos ouvidos das pessoas que passam pelas ruas das cidades do mundo inteiro
por onde viajam, até mesmo no Brasil, onde já estiveram vá rias vezes. Eles utilizam canos de
fibra de vidro, carbono ou papelã o de aproximadamente 1,80 m de comprimento para soprar
as poesias nos ouvidos do pú blico, que experimenta novos modos de apreciar a arte das
palavras. Dessa prá tica nasceu o nome do grupo (Os sopradores) que vem desenvolvendo esse
tipo de linguagem pú blica desde 2001.

Mr. Lopes - Les Souffleurs commandos poétiques

Performance do grupo Les Souffleurs, em Paris, França, no ano de 2004.


A rua é o espaço cênico

Acervo da Cia EnvieZada

Imagens do espetáculo Caminhos – uma intervenção urbana, da Cia EnvieZada, nas ruas do Rio de Janeiro, RJ, 2012.

No Brasil, há vá rios grupos de teatro que também pesquisam a linguagem de


intervençã o urbana nas artes cênicas. Imaginem uma cidade com suas ruas e praças... Um
grupo de atores faz sua arte acontecer em pleno espaço da rua. As pessoas que passam sã o
convidadas a assistir ao espetá culo que ali se desenvolve e sã o estimuladas nã o apenas a
acompanhar os atores que usam o espaço da cidade como palco, mas a ouvir o texto teatral por
meio de aparelhos de MP3 com a gravaçã o e a trilha sonora. As palavras remetem a trechos de
poemas que se misturam aos sons da rua e aos do
Pá gina 57

espetá culo na intimidade da audiçã o de cada um. O pú blico segue os atores e participa
da encenaçã o, que tem por linguagem a intervençã o urbana.

Como exemplo dessa açã o artística, pode ser citado o espetá culo Caminhos – uma
intervençã o urbana, que aconteceu em diversas cidades do Brasil, como parte das atividades
culturais do Projeto Arte Coletiva. Realizada pelo grupo de teatro Cia EnvieZada, criado em
2003 na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), a intervençã o urbana
Caminhos segue a proposta da companhia, que é a de desenvolver uma prá tica teatral de
inclusã o social, com espetá culos gratuitos para estimular a formaçã o de pú blico e também
capacitar jovens para as artes. O grupo utiliza uma linguagem de intervençã o urbana
“caminhante”, que é um tipo de açã o artística que se faz durante caminhadas pela cidade.

DICA
Para navegar

No site da Cia EnvieZada, você pode ouvir a trilha dessa montagem e ver vídeos das apresentaçõ es,
entre outros trabalhos da companhia. Visite o endereço em: <http://tub.im/eghbfc> (acesso em: 28 mar.
2016).

Arte em todos os lugares


Você pode ser surpreendido pelas linguagens artísticas ao perceber imagens, sons, luzes
que iluminam uma cidade, ao deparar com uma escadaria toda colorida, ou ao sentar-se em um
banco de praça. Isso é arte pú blica!

Em vá rias partes do Brasil podemos encontrá -la; a seguir veremos alguns exemplos.

Em 2012, em Sã o Paulo, aconteceu a Urbe – Mostra de Arte Pú blica. A cidade foi invadida
pela linguagem da arte, em um projeto no qual obras foram colocadas em locais em que o
pú blico podia simplesmente encontrá -las ao virar uma esquina, passar sobre um viaduto ou
atravessar uma rua. A tecnologia também foi usada nessa mostra, que coloriu o espaço pú blico
com luzes e imagens projetadas.

Arte pública: manifestaçã o artística realizada em espaço pú blico. Contempla desde esculturas como també m as
manifestaçõ es de pinturas murais, outdoors, grafites, performances, intervençõ es urbanas, entre outras.

Observe a projeçã o feita na fachada do prédio da Prefeitura de Sã o Paulo, na foto abaixo.


© Urbanscreen

Identidade, do coletivo Urbanscreen, 2012. Projeção na fachada do prédio da Prefeitura de São Paulo, SP, que fazia parte do
projeto Urbe – Mostra de Arte Pública (2012), promovido pelo Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB).
Pá gina 58

No Rio de Janeiro, o artista Jorge Selaró n (1947-2013) trabalhou durante anos em uma
escadaria situada entre os bairros da Lapa e de Santa Teresa. A escadaria do pintor e ceramista
autodidata é conhecida como Escadaria Selaró n, também chamada de “homenagem ao povo
brasileiro”, como ele dizia. Selaró n era chileno e morava no Rio de Janeiro desde 1990, ao lado
da escadaria. Iniciada em 1990, a obra estava em constante elaboraçã o, sendo feita
inicialmente com os materiais que o artista tinha disponíveis. Eram, por exemplo, restos de
construçã o, mas com o tempo a escada ganhou fama e azulejos foram enviados por pessoas de
mais de 80 países. Cerca de duas mil peças foram colocadas na escada pelo artista até 2013,
compondo um enorme mosaico. Hoje, o local é uma arte pú blica muito visitada no Rio de
Janeiro. Veja ao lado a foto da escadaria.

Em Fortaleza, no Ceará , há a Praça dos Leõ es, onde se pode sentar ao lado da escultura
Rachel de Queiroz, obra em tamanho natural feita em bronze pelo artista paulista Murilo Sá
Toledo, em 2012. A escritora e jornalista Rachel de Queiroz (1910-2003) foi a primeira mulher
eleita para a Academia Brasileira de Letras (ABL), em 1977.

G. Evangelista/Opção Brasil

Escadaria Selarón, de Jorge Selarón, elaborada entre 1990 e 2013, no bairro da Lapa, Rio de Janeiro, RJ. Também conhecida
como escadaria do Convento de Santa Teresa, tem 215 degraus e 125 m de comprimento. Foto de 2008.

DICA
Para navegar
O artista paulista Murilo Sá Toledo já realizou vá rias obras em espaços pú blicos. Vale a pena conhecer e
apreciar suas esculturas, ver os locais em que essas obras estã o expostas, visite o site: <http://tub.im/7ci54b>
(acesso em: 28 mar. 2016).

Murilo Sá Toledo. 2005. Bronze. Praça dos Leõ es, Fortaleza. Foto: LC Moreira/Futura Press

Rachel de Queiroz, de Murilo Sá Toledo, 2005. Estátua em bronze, na Praça dos Leões, em Fortaleza, CE. Monumento em
homenagem à escritora Rachel de Queiroz. Foto de 2013.
Pá gina 59

Giro de ideias: Cotidiano e arte


Vamos fazer uma enquete para pensar sobre o seu contato com a arte. No dia a dia,
usamos linguagens para nos comunicar e expressar sentimentos e ideias.

Algumas pessoas sã o mais extrovertidas, outras sã o mais quietas; algumas gostam de


desenhar, outras de cantar ou escrever poemas.

• Qual linguagem artística você e seus colegas mais utilizam para se expressar?

• Qual linguagem artística você costuma apreciar com mais frequência?

• Você ou alguém da turma conhece alguma obra de arte pú blica em sua cidade? Que tal
vocês irem até lá ? Em que lugar ela fica?

Na pesquisa sobre arte pú blica em sua cidade ou em alguma localidade vizinha,


investigue a histó ria, o significado, o tipo de linguagem das obras de arte, o autor, os materiais
e os processos de criaçã o, entre outros aspectos. Os saberes descobertos e suas experiências
no contato com a arte pú blica nessa visita podem ser registrados no seu diá rio de bordo. Leve-
o sempre com você, porque nunca se sabe onde podemos encontrar a arte. Depois de fazer a
pesquisa sobre arte pú blica, anote um aspecto que você considera interessante comentar.
Pá gina 60

Conexõ es Arte e Comunicaçã o


Divulgando a Arte
As obras de arte pú blica podem ficar expostas, acontecer por um tempo ou ser permanentes
em determinado local. Agora que você começou a estudar sobre arte pú blica, procure visitar algum
espaço em que as linguagens artísticas estejam acontecendo ou estejam em exposiçã o permanente.
Nos sites das Secretarias de Cultura municipais e estaduais, e também nos de outras instituiçõ es
culturais, é possível encontrar endereços de obras ou a programaçã o cultural da sua localidade.

Obras de arte que estã o em espaços pú blicos podem apresentar diferentes assuntos ou ter
sido criadas pelos mais variados motivos e contextos, respeitando a diversidade religiosa e cultural
brasileira.

A obra de Tatti Moreno (1944-), no Dique do Tororó em Salvador, Bahia é um exemplo de


arte pú blica. Para compor a obra o artista criou um conjunto de esculturas em metal policromado e
o colocou sobre o espelho de á gua. As esculturas representam divindades religiosas presentes na
cultura afrodescendente. Você pode conhecer um pouco mais sobre esta obra visualizando a
imagem ao lado.

Cultura afrodescendente: é o conjunto de manifestaçõ es artísticas, religiosas ou de costumes que vieram de povos
africanos e de seus descendentes. Assim como vá rias outras culturas, a afrodescendente contribuiu muito para o
desenvolvimento da cultura brasileira.

Mauricio Simonetti/Pulsar

Conjunto de esculturas em metal do artista Tatti Moreno alocadas no Dique do Tororó, na cidade de Salvador, feitas em
homenagem à cultura afrodescendente brasileira.

Que tal pesquisar se pró ximo a você há esculturas pú blicas e qual seu tema, conteú do,
contexto ou motivo do seu surgimento?

Como sugestã o de pesquisa de onde encontrar obras de arte pú blicas, acesse o site
<http://tub.im/96565g> para obter mais informaçõ es sobre Urbe – Mostra de Arte Pú blica.
Enquanto você pesquisa e se envolve na aventura de visitar obras pú blicas em sua cidade ou
localidade é importante fazer registros por meio de fotografias, anotaçõ es em seu diá rio de bordo,
ou em seu celular. Atuando como um repó rter, você pode entrevistar as pessoas que passam por
esses locais perguntando o que elas pensam a respeito da arte pú blica.

É importante socializar as informaçõ es que você recolheu nessa experiência. Para isso, você
pode criar um blog, uma pá gina em uma rede social, um jornal ou uma revista impressa. Além das
obras de arte pú blica da sua cidade ou localidade, você pode pesquisar e apresentar obras de outras
partes do mundo.

Para começar a criar sua pá gina virtual, jornal ou revista impressa, faça um mapa das
principais ideias e informaçõ es que pretende disponibilizar. Pense nas cores, nas imagens, nos
modelos de letras, nas formas, em outros recursos visuais de uma pá gina eletrô nica ou impressa, a
fim de conseguir uma programaçã o visual bem dinâ mica e atraente. Pensando nisso, o que você
considera importante colocar?
Pá gina 61

Projeto experimental Nó s, os “espect-atores”

© Instituto Augusto Boal, Rio de Janeiro

O diretor de teatro e dramaturgo Augusto Boal durante palestra ministrada na década de 1990.

Pensando em transformar o espectador (nã o ator) em ator, Augusto Boal propõ e que as
pessoas interessadas em fazer teatro façam alguns experimentos.

O teatro, como linguagem, pode explorar situaçõ es presentes no cotidiano das pessoas, de
forma viva e em constante mudança, nã o como um produto acabado. As técnicas teatrais podem
ajudar a construir essa linguagem de forma apurada. Sã o situaçõ es que proporcionam a
compreensã o de como essa linguagem se constitui.

Chame alguns colegas e experimente se expressar pela linguagem teatral.

A seguir, como aquecimento, vamos fazer alguns exercícios.

Processos de criaçã o

Hipnotismo com a mão

Esse jogo teatral, inspirado na proposta de Boal, visa buscar novos movimentos corporais,
quebrando a mecanizaçã o do corpo. É um jogo bem divertido e dinâ mico. O importante é que sejam
feitos movimentos corporais inusitados, para que cada um possa “desmecanizar” seus gestos e
estimular sua consciência corporal.

Faça esse exercício em duplas. Um participante, que será o hipnotizador, deve colocar a
palma da mã o, aberta, a uma distâ ncia de uns 20 cm do nariz do outro participante, que será o
hipnotizado. A regra do jogo é que o hipnotizado nã o deve afastar o nariz da mã o do hipnotizador,
mantendo, a qualquer custo, a mã o na distâ ncia inicial. O hipnotizador inicia um movimento com a
mã o, fazendo o hipnotizado ir para a frente, para trá s, para baixo e para cima. Todas as
possibilidades de movimentos devem ser estimuladas, até mesmo passar por baixo das pernas do
hipnotizador, por exemplo.
Pá gina 62

Adivinhando a mímica

A mímica é um jogo que visa trabalhar unicamente a comunicaçã o nã o verbal, estimulando a


comunicaçã o exclusiva do corpo, sem o uso de qualquer palavra.

Organize a turma em dois grupos. Aqui a ideia é comunicar um nome de filme, livro, peça de
teatro ou mesmo de uma novela ou série sem usar as palavras, apenas com gestos e expressõ es
corporais e faciais.

Um animador, que pode ser o professor, convidará um representante de cada grupo e falará
em tom baixo, no ouvido dos representantes, o nome escolhido, sem que os grupos escutem. Ao
sinal do animador, os representantes deverã o retornar para o grupo de origem e transmitir,
somente por meio de sua expressã o corporal, o nome que ouviu do animador.

O grupo que acertar o nome primeiro ganha ponto, gerando uma disputa saudá vel e
divertida. Vocês podem fazer quantas rodadas desejarem, mas combinem antes o nú mero total.

Conhecendo e potencializando o corpo

É fundamental o conhecimento do pró prio corpo. Por meio de exercícios, a proposta é


perceber limites e possibilidades corporais. Você pode, por exemplo, saltar, correr, movimentar-se
lentamente, fazer um gesto com intensidade, outro com leveza, e assim por diante. Explore sua voz
na entonaçã o de palavras, combinadas com expressõ es fisionô micas e em outros exercícios que
possam revelar as potencialidades de seu corpo. O corpo humano é muito expressivo, e podemos
potencializar ainda mais essa expressã o por meio de jogos teatrais. Por exemplo, em vez de dizer
algo na linguagem verbal, utilize a linguagem corporal, comunicando-se sem palavras, apenas com
gestos.

Chame os colegas e combine que cada um vai escrever uma palavra em um pedaço de papel
qualquer e, depois, colocá -lo em uma caixa. A caixa ficará no centro de uma roda formada por vocês.
No jogo, um de cada vez vai até o centro da roda, retira uma palavra e apresenta seu sentido, nã o
em linguagem verbal, como costumamos fazer quando estamos conversando, mas usando gestos
corporais, com o corpo todo, ou apenas com expressõ es faciais.

O teatro jornal

Como sugestã o de mais um jogo teatral, vale a pena experimentar o teatro jornal. Escolha
uma notícia de jornal e a apresente de forma improvisada. Uma pessoa lê a notícia e outra cria um
modo de mostrá -la com gestos em cena.

Dramaturgia simultânea

Na dramaturgia simultâ nea, a proposta de jogo explora a interaçã o do pú blico. A atividade


requer que se escolha um trecho de um texto teatral de autores conhecidos, como Ariano Suassuna,
Gianfrancesco Guarnieri, Chico Buarque de Holanda, Shakespeare, ou outro texto de algum autor
que vocês possam pesquisar e estudar. No caso de Romeu e Julieta, dois amigos devem realizar a
cena em que os jovens namorados morrem, o ponto alto da tragédia. Contudo, no momento da
“decisã o”, a cena deve ser interrompida, e outra dupla, que esteja assistindo à cena, decide com os
atores da primeira dupla se esse é o melhor final. Assim, espectadores e atores podem sugerir
outras soluçõ es para o drama de amor impossível do casal.
Nesse tipo de técnica, o pú blico participa do espetá culo, podendo dar palpites e sugerir
soluçõ es, debatendo a situaçã o e exercitando a compreensã o e a argumentaçã o sobre a histó ria
desenvolvida.
Pá gina 63

TEMA 2 LINGUAGENS QUE SE


MISTURAM

Alex Flemming. 1998. Tinta cerâmica sobre vidro. Acervo do Metrô de Sã o Paulo, São Paulo. Foto: Rita Demarchi

Obra de arte pública Estação Sumaré, de Alex Flemming, 1998. Tinta cerâmica sobre vidro, 175 cm × 125 cm × 1 cm. Foto
de 2010.

"A língua é minha pá tria


E eu nã o tenho pá tria
Eu tenho má tria
E quero frá tria
Poesia concreta, prosa caó tica
Ó tica futura"

VELOSO, Caetano. Língua. In: Língua. Rio de Janeiro: Universal Music, 2006. CD. Faixa 14.

As linguagens artísticas nascem da necessidade humana de se comunicar e agir no


mundo, de estabelecer diferentes maneiras de dialogar sobre tudo o que o ser humano
percebe, vive e sente. Linguagens que foram criadas por pessoas que precisavam contar sobre
suas experiências, manifestar expressõ es, opiniõ es e poéticas. Os artistas criaram e continuam
a criar linguagens na arte.

Muitas vezes, vemos pinturas e desenhos, lemos livros, ouvimos mú sicas, assistimos a
peças teatrais, a espetá culos de dança, a filmes de modo tã o natural que nã o nos damos conta
de como essas linguagens sã o construídas. Em cada tempo e lugar, as linguagens tiveram um
modo e um propó sito ao serem criadas, e também receberam algum tipo de valor ou grau de
importâ ncia. Estudar sobre as linguagens artísticas possibilita ampliar conhecimentos e
desenvolver habilidades para que possamos ler e criar em arte.

As linguagens podem estar misturadas ou nã o. Na poética do artista Alex Flemming


(1954-), pintor, escultor e gravador paulistano, observamos um exemplo de como as
linguagens podem se misturar. Ao entrar e sair dos trens na estaçã o de metrô Sumaré, em Sã o
Paulo, o pú blico encontra fotografias de pessoas comuns acrescidas de intervençõ es feitas pelo
artista: ele colocou trechos de poemas de vá rios autores sobre os rostos retratados para criar a
obra de arte pú blica Estaçã o Sumaré. Parte dessa obra pode ser observada no início desta
pá gina.
Pá gina 64

Com essa obra, o artista estabelece uma proposta de diá logo com as pessoas, desejando
que o pú blico que frequenta a estaçã o de metrô “converse” com ela. Ao olhar os rostos das
pessoas, que, para os passageiros do metrô , podem ser desconhecidas, o artista propõ e ao
pú blico que se aproxime da obra e, motivados pela curiosidade, percebam letras, palavras,
imagens e, com isso, pensem a respeito.

Questionamentos podem surgir no contato com esse tipo de arte: “Quem será essa
pessoa?”; “Do que ela gosta?”; “Quais sã o seus sonhos?”; “Que poesia pode haver em um rosto
desconhecido?”. Para o artista, todos nó s, em nossa essência, temos poesia.

A arte de ALEX FLEMMING


Alex Flemming tem pesquisado e desenvolvido uma arte mista. Ele usa tanto a
linguagem verbal quanto a visual como fotografias, design e pinturas. A relaçã o entre a
linguagem visual e a verbal é recorrente em vá rias de suas produçõ es.

Quando a estaçã o de metrô Sumaré, em Sã o Paulo, estava sendo construída, Flemming


instalou uma cabine de fotografia em uma avenida movimentada da cidade e pediu à s pessoas
que passavam que se deixassem fotografar. Depois, o artista escolheu um poema para cada
rosto e fez montagens com a imagem e as palavras dos poemas. Ele nã o expô s o poema de
forma linear como estamos acostumados a ler em pá ginas de livros, por exemplo. Ele
estabeleceu uma composiçã o explorando um jogo entre formas, letras e palavras que desafiam
a interpretaçã o do pú blico.

Depois de elaborar os arranjos das linguagens verbal (palavras) e visual (fotografias)


nas produçõ es, Flemming mandou imprimir as imagens em placas de vidro com pintura
industrial. Técnicos contratados montaram a instalaçã o que compõ e a obra da estaçã o Sumaré.

A obra de arte pú blica Estaçã o Sumaré também ficou conhecida como Os paulistanos.
Nela, trabalharam vá rios outros profissionais para as etapas de construçã o de sua obra,
procedimento comum na arte contemporâ nea. Ao todo sã o 21 imagens que se repetem dos
dois lados da estaçã o de metrô , entre elas há também a do pró prio artista (ver abaixo), e
podem ser observadas pelo pú blico que passa todos os dias ao ir para o trabalho, para a escola
ou para seus passeios.
Alex Flemming. 1998. Tinta cerâmica sobre vidro. Acervo do Metrô de Sã o Paulo, São Paulo. Foto: Rita Demarchi

Obra de arte pública Estação Sumaré, de Alex Flemming, 1998. Tinta cerâmica sobre vidro, 175 cm × 125 cm × 1 cm. Foto
de 2009.

Palavra do artista

“Eu sempre achei que artista é a pessoa que produz muito e produz bem. Acho que o
importante é o artista mudar sempre. Artista é Picasso, é Matisse, é Max Ernst, é Volpi. Sã o
pessoas que mudaram muito o seu pró prio estilo, produziram muito, nã o tiveram medo de
ousar. Entã o, todo artista muda, porém sempre numa cadeia, você muda, mas permanece o
mesmo, por mais incrível que isso pareça e por mais estranho que isso soe.”

Alex Flemming

EM BERLIM, Alex Flemming fala sobre arte, melancolia e caos. Não só o gato, 3 jul. 2014. Disponível em:
<http://www.naosoogato.com.br/cultura/em-berlim-alexflemming-fala-sobrearte-melancolia-e-caos/>. Acesso em: 18 jan.
2016.

Tuca Vieira/Folhapress

Alex Flemming e sua obra de esmalte sobre metal da série Olhos, ainda não exibida no Brasil. Foto de 2006.
Pá gina 65

Giro de ideias: Meu autorretrato


Leia o poema a seguir:

O autorretrato

No retrato que me faço


- traço a traço -
à s vezes me pinto nuvem,
à s vezes me pinto á rvore...

à s vezes me pinto coisas


de que nem há mais lembrança...
ou coisas que nã o existem
mas que um dia existirã o...

e, desta lida, em que busco


- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,

no final, que restará ?


Um desenho de criança...
Corrigido por um louco!

QUINTANA, Má rio. O autorretrato. In: QUINTANA, Má rio. Apontamentos de História Sobrenatural. Rio de Janeiro
Alfaguara. © by Elena Quintana.

Da mesma forma que os pintores, escultores e artistas, o poeta Má rio Quintana também
construiu seu autorretrato, mas em vez de tintas e pincéis, usou a métrica e as palavras e, no
lugar da tela, apresentou-nos um poema.

Métrica: é a medida do verso de um poema, definida pelo nú mero de sílabas poé ticas que ele possui.

Poema: gê nero literá rio que se organiza em versos e estrofes.

Nesse poema, o lírico se pinta de forma metafó rica com elementos da natureza e coisas
imaginá rias, fazendo uso da linguagem figurada. O autorretrato é mais sugestivo do que
descritivo, revelando que a sua autoimagem não está acabada, mas que é feita e refeita a todo
momento com coisas vividas e com aquelas que ainda vai viver.

Metáfora: em sentido estrito, é a substituiçã o do significado de uma palavra por outro, a partir de uma semelhança.
Disso, resulta a acumulaçã o de dois significados diferentes na mesma palavra. Em sentido amplo, é qualquer uso de palavra
em sentido figurado.

Linguagem figurada: é a linguagem simbó lica, nã o literal, utilizada principalmente em textos literá rios.

Como você construiria o seu autorretrato? Que elementos selecionaria para compor sua
imagem em forma de poema? Com momentos importantes de sua vida? Fazendo referência a
pessoas que marcaram sua histó ria?
Você pode escrever um poema rimando as palavras ou em versos brancos, como fez
Má rio Quintana. Dê asas a sua imaginaçã o!

Versos brancos: versos sem rimas.

Ao finalizar o seu poema, escolha uma fotografia sua que represente sua identidade. Tire
uma có pia, imprima e sobre esse material escreva o seu poema da maneira que achar mais
adequada para expressar o seu eu lírico tanto na linguagem verbal quanto na visual. No final,
você terá criado um autorretrato em uma linguagem híbrida.

Você e seus amigos poderã o fazer uma exposiçã o dos autorretratos.


Pá gina 66

Conexõ es Arte e Língua Portuguesa


Palavras e imagem
[...]
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo Tupi.

Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci;
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi.
[...]

DIAS, Gonçalves. I-Juca-Pirama. In: MINISTÉ RIO DA CULTURA. Fundaçã o Biblioteca Nacional. Departamento
Nacional do Livro. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bn000007.pdf>. Acesso
em: 14 mar. 2016.

Alex Flemming. 1998. Tinta cerâmica sobre vidro. Acervo do Metrô de Sã o Paulo, São Paulo. Foto: Rita Demarchi
Obra de arte pública Estação Sumaré, de Alex Flemming, 1998. Tinta cerâmica sobre vidro, 175 cm × 125 cm × 1 cm.
Nesta imagem vemos o autorretrato do artista.

Você sabe o que é uma linguagem híbrida?

O hibridismo na arte acontece quando há a junçã o de vá rias linguagens em uma composiçã o


artística.

O artista Alex Flemming nos apresenta um exemplo desse tipo de linguagem artística que
mistura linguagens e poéticas. E como dissemos anteriormente isso pode provocar um desafio na
leitura dessas obras.

Vamos aceitar esse desafio?

Observe a imagem acima criada por Flemming. O que você percebe? Agora leia o trecho do
poema I-Juca-Pirama, apresentado acima, de Gonçalves Dias (1823-1864), importante poeta do
Romantismo brasileiro, especialmente na temá tica literá ria do indianismo. Que interpretaçã o você
faz desses versos? Você conhece a histó ria do personagem que protagoniza o poema? Agora
observe a imagem novamente. Você consegue identificar as palavras sobre a imagem?

Analise a maneira como o artista fez essa composiçã o entre palavras e imagem. Como você
interpreta esse conjunto de palavras e imagem? Converse com seus amigos e professor sobre a
percepçã o, a aná lise e a interpretaçã o possíveis ao ler essa imagem. Será que todos tiveram a
mesma ideia ou será que uma obra como essa abre muitas possibilidades de interpretaçã o?

Você pode conferir mais obras de Alex Flemming visitando o site: <http://tub.im/atcfyu>
(acesso em: 11 abr. 2016).
Pá gina 67

As muitas linguagens da arte

Adriana Varejão. 1996. Ó leo sobre tela e porcelana. Coleção Brondesbury Holdings Ltd., Caracas. Foto: Eduardo Ortega

Carne à moda de Frans Post, de Adriana Varejão, 1996. Óleo sobre tela e porcelana, 60 cm × 80 cm (tela), 60 cm × 150 cm
(total).

Pensando nas inú meras ramificaçõ es das linguagens na contemporaneidade, seria


importante contá -las ou classificá -las? As linguagens artísticas podem estar ligadas umas à s
outras ou dentro umas das outras. Portanto, nã o há necessidade de se estabelecer fronteiras
rígidas entre elas.

A artista plá stica Adriana Varejã o (1964-) admite que, em sua produçã o, trabalha com
muitas linguagens. Para ela, as fronteiras entre uma linguagem e outra estã o cada vez mais
tênues. Essa artista cria imagens que impressionam o pú blico pela variedade de materialidades
e efeitos, como observamos na obra Carne à moda de Frans Post. Ela diz não se importar se
está fazendo uma obra que será classificada como pintura ou escultura; ela apenas cria sua
obra. Como a artista mesmo afirma, sua produçã o está cada vez mais híbrida.

Com tantas possibilidades de manipulaçã o de materiais e maneiras de fazer arte, as


fronteiras entre uma linguagem e outra ficam cada vez mais difíceis de definir. Desde tempos
remotos, as linguagens artísticas sã o inventadas e reinventadas. Uma linguagem nã o morre
quando aparece outra; elas se misturam, se transformam.

A arte de ADRIANA VAREJÃ O


Um olhar repousa sobre a cor vermelho sangue. Será que mira o presente, o futuro ou o
passado? Frutas brotam da superfície. Sã o de comer? Sã o para ver? Será isso uma pintura? Um
objeto? Será arte? Qual é a linguagem?
Adriana Varejão. 2012. Ó leo sobre fibra de vidro e resina. Coleção particular, Zurique. Foto: Eduardo Ortega

Mestiça, de Adriana Varejão, 2012. Óleo sobre fibra de vidro e resina, 80 cm de diâmetro × 9 cm de espessura.

A arte da brasileira Adriana Varejã o (1964-) pode nos proporcionar muitas indagaçõ es.
Isso é muito bom, porque as perguntas nos colocam em situaçã o de reflexã o, e assim podemos
aprender mais sobre as linguagens artísticas.

Adriana cria sem se preocupar em dar ró tulos para as linguagens que explora: escultura,
pintura, objetos, fotografias, desenhos... Para ela, o que importa não é classificar em categorias
rígidas, e sim permitir-se a mistura, o hibridismo, procurando, dessa maneira, construir uma
poética pessoal. A artista faz pesquisas de imagens presentes na histó ria da arte brasileira e
usa tais imagens como referências em seus trabalhos, apresentando essas imagens antigas de
modo totalmente novo.
Pá gina 68

Conexõ es Arte, Geografia e Identidade


Você já foi entrevistado ou presenciou alguém respondendo a uma pesquisa? No Brasil,
vá rias pesquisas sã o feitas para recolher dados que ajudam a compreender quais características
constituem a populaçã o brasileira. O censo, pesquisa oficial realizada pelo IBGE, levanta dados
sobre toda a populaçã o.

Em uma entrevista como essa, os pesquisadores do IBGE visitam os domicílios do Brasil e


fazem perguntas sobre a formaçã o da família, renda familiar, características do domicílio e dos
moradores.

Dependendo do tipo de questioná rio, as perguntas podem possuir alternativas para resposta
ou nã o. Para a questã o: “Qual é a cor da sua pele?” existem cinco respostas possíveis em questõ es
fechadas: branca, parda, preta, amarela e indígena. Em questõ es abertas, o entrevistado tem espaço
para manifestar sua percepçã o sobre a cor de sua pele.

O resultado de algumas pesquisas mostra que o brasileiro é muito criativo e plural ao


escolher termos para definir a cor de sua pele. Termos como “morena melada”, “morena rosada”,
“clarinha”, “cor firme”, “encerada”, “café com leite”, “morenã o”, “queimada de sol” e outros, bem
inusitados, aparecem como resposta à questã o. E você, o que responderia?

A artista plá stica Adriana Varejã o gosta do termo “branca melada” para definir a cor da sua
pele, mas acredita que somos constituídos de vá rias outras “tonalidades”.

Greg Salibian/Folhapress

Adriana Varejão, artista plástica carioca, e parte da série Polvo Portraits III, produzida por ela. Foto de 2014.

Com base nos resultados das pesquisas realizadas pelo IBGE, ela coletou dados sobre as
definiçõ es de cores mencionadas pelos brasileiros e criou 33 tintas com base nos tons de pele
mencionados, como vemos no estudo apresentado a seguir.
Vicente de Mello/Atelier Adriana Varejão

Parte do estudo do desenvolvimento de cores para tons de pele realizado por Adriana Varejão.

Vicente de Mello/Atelier Adriana Varejão

Tintas a óleo Polvo (2013), 33 cores criadas por Adriana Varejão com base em pesquisas feitas pelo IBGE sobre os tons de
pele brasileiros. Técnica mista, 36 cm × 51 cm × 8 cm.
Pá gina 69

Mas a artista nã o parou por aí. Dando continuidade ao seu processo criativo e utilizando seu
autorretrato como base para a série Polvo Portraits III, ela usou as diversas cores de tinta e criou
formas inspiradas na cultura indígena brasileira sobre o seu rosto. O resultado foi uma série de
trabalhos que apresentam um olhar sensível sobre a questã o da identidade cultural brasileira,
como vemos na imagem abaixo.

Assim, percebemos que Adriana Varejã o mistura nã o apenas linguagens e integra á reas do
conhecimento, mas também explora diferentes temas relacionados à s raízes do nosso povo e à
identidade cultural.

Agora, você e seus colegas podem aprofundar a pesquisa sobre temas e linguagens artísticas
que trabalham com a ideia de identidade individual e cultural. Compartilhe as descobertas que
fizeram.

Eduardo Ortega/Atelier Adriana Varejão

Série Polvo Portraits III (2014) em que a artista Adriana Varejão apresenta seus autorretratos com desenhos feitos sobre o
rosto, utilizando as diversas tonalidades de tintas a óleo desenvolvidas por ela. Óleo sobre tela. 33 telas de 52 cm × 45,5 cm e 12
telas de 52 cm.
Pá gina 70

Projeto experimental
Espelhos da alma

Gustave Courbet. 1844-1845. Ó leo sobre tela. Coleção particular

Autorretrato (O homem desesperado), de Gustave Courbet, c. 1844-1845. Óleo sobre tela, 45 cm × 55 cm.

Blue Landscape, de Cecília Paredes, 2007. Foto sobre papel fotográfico, 100 cm × 100 cm.

Cecilia Paredes. 2011. Pintura. El Tiempo/GDA/Zuma Press/Glow Images


Van Gogh. 1888. Ó leo sobre tela. Museu Van Gogh, Amsterdã

Autorretrato diante de um cavalete, de Vincent van Gogh, 1888. Óleo sobre tela, 65,5 cm × 50,5 cm.
Pá gina 71

Fernanda Manéa. 2009. Desenho a pincel. Acervo da artista

Autorretrato à luz de velas III – 4 peças, de Fernanda Manéa, 2009. Desenho a pincel – corretor líquido sobre disquete.
Tamanho aproximado 18 cm × 18 cm.

A linguagem da arte
Na histó ria da arte, temos muitos exemplos de autorretratos de pintores como Gustave
Courbet, Van Gogh e Salvador Dalí. Cada artista busca revelar detalhes de sua identidade e
personalidade, indicar pistas de seus mistérios, como faz a artista peruana Cecília Paredes que se
autocamufla em seus autorretratos. Alguns utilizam linguagens como a pintura, a gravura, o
desenho, a fotografia, entre outras possibilidades. Há autorretratos que mostram apenas o rosto;
outros podem apresentar toda a figura do artista.

Nas redes sociais, vemos hoje vá rios exemplos de autorretratos nos perfis pessoais cuja
linguagem mais utilizada é a fotografia.

Processos de criaçã o

Fazer um autorretrato é escolher um modo de dizer algo sobre você mesmo. Assim, nã o há
regras fixas, o que vale é a autoaná lise e a criatividade na escolha de uma forma que seja
considerada adequada tanto na linguagem como nos materiais e na maneira de compor a obra.

Você pode escolher fotografar a si mesmo com um celular ou uma câ mera, mas antes observe
as diversas possibilidades para criar seu autorretrato escolhendo essa ou outras linguagens.

Ao fazer um autorretrato para uma rede social, quais seriam suas preocupaçõ es? E os
cuidados que você tomaria? O que você gostaria de ressaltar e o que esconderia?
Salvador Dalí. 1941. Ó leo sobre tela. Fundação Galas Salvador Dalí, Figueiras. Foto: The Bridgeman Art Library/Superstock/Glow Images

Autorretrato mole com toucinho frito, de Salvador Dalí, 1941. Óleo sobre tela, 61 cm × 50 cm.
Pá gina 72

TEMA 3 A TECNOLOGIA
TRANSFORMANDO AS
LINGUAGENS
"Uma das tarefas mais importantes da arte foi sempre a de gerar uma
demanda cujo atendimento integral só poderia produzir-se mais tarde. A histó ria
de toda forma de arte conhece épocas críticas em que essa forma aspira a efeitos
que só podem concretizar-se sem esforço num está gio técnico, isto é, numa nova
forma de arte. […] Toda tentativa de gerar uma demanda fundamentalmente nova,
visando à abertura de novos caminhos, acaba ultrapassando seus pró prios
objetivos."

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade té cnica. In: BENJAMIN, Walter. Magia e Técnica, Arte e
Política – Obras escolhidas I. Trad. Rouanet. Sã o Paulo: Brasiliense, 1985.

Em nosso tempo, as linguagens nascem e se multiplicam. Dentro de cada linguagem, há


outras que se misturam, se conectam, se adaptam e se transformam com os meios de produçã o
e comunicaçã o de cada tempo. Happenings, performances, intervençõ es urbanas, videoartes,
artes no computador, entre outras, nascem, desenvolvem-se e transformam as artes visuais. A
dança-teatro, as mú ltiplas possibilidades de dança de rua, os grupos performá ticos, o novo
circo, os vá rios segmentos da dança contemporâ nea, as encenaçõ es realizadas dentro e fora
das casas de espetá culos e em espaços alternativos, os novos e antigos modos e métodos de
lidar com o corpo e sua poética sã o tendências e linguagens que surgiram para transformar as
artes cênicas. Trilhas sonoras de filmes, documentá rios, videoclipes e mú sicas dos mais
diversos estilos e produzidas de vá rias maneiras – da mú sica dos repentistas à mú sica dos
concertos, em diferentes combinaçõ es e experimentaçõ es – compõ em o cená rio
contemporâ neo musical.

A videoarte é uma linguagem artística que influenciou a criaçã o de vá rias linguagens,


como a videoinstalaçã o, a videoescultura, a arte via satélite, a web arte e a arte com princípios
robó ticos, entre outras. Trata-se de uma linguagem contemporâ nea que nasceu a partir do
acesso ao vídeo, em meados dos anos 1960. Os artistas perceberam nessa tecnologia um
grande potencial como linguagem. As conquistas dos programas de computadores que se
seguiram fizeram a videoarte crescer em importâ ncia e aparecer em mostras temporá rias ou
permanentes de arte, em galerias e museus. Essa linguagem explora principalmente as
imagens em movimento, trabalha com o cotidiano, com a pró pria cultura visual, expondo, além
da ideia do artista ou do grupo de artistas, diversos contextos culturais. É uma arte híbrida,
porque mistura contextos e mídias: fotografia, vídeo, transmissõ es e efeitos sonoros de rá dio e
televisã o, depoimentos de pessoas, imagens e sons da cidade, outdoors e cartazes, mú sica de
diferentes estilos e linguagens, ou seja, uma infinidade de possibilidades.
A videoarte também dialoga com outras linguagens contemporâ neas, como as
instalaçõ es, as performances e os happenings. A produçã o de algumas linguagens da arte
contemporâ nea tem como característica a coletividade, ou seja, é realizada por muitas pessoas,
além dos artistas que têm a ideia inicial.

Nam June Paik. 1994. Técnica mista. Kunstmuseum, Wolfsburg. Foto: Album/Akg-Images/Latinstock

Andy Warhol Robot, de Nam June Paik, 1994. Técnica mista: nove telas coloridas, nove carcaças de TV antigas, caixa em
acrílico do original Brillo Box, de Andy Warhol, sete latas de Sopa, cinco filmes de câmeras de 8 mm, dez câmeras, partes de um
projetor de 35 mm, filme de 35 mm, lâmpadas titulares, dois suportes sobre rodas, dois reprodutores de vídeos, 34 videoclipes em
dois monitores e páginas coladas do catálogo de exposição de Estocolmo, no Kunstmuseum de Wolfsburg.
Pá gina 73

A arte de JUNE PAIK


Trazida pelos aparelhos de televisã o, uma nova linguagem de comunicaçã o de massa
inspirou geraçõ es e ainda continua a exercer grande influência sobre as pessoas. Na década de
1960, o artista sul-coreano Nam June Paik (1932-2006) começou a explorar as possibilidades
estéticas desse novo meio de comunicaçã o usando a linguagem televisiva.

Nam June Paik foi um dos primeiros a lançar novas linguagens unindo vídeos, mú sicas e
outras linguagens artísticas, criando a videoarte, que explora tanto imagens gravadas como as
linguagens de instalaçõ es e de performances, a exemplo da obra Arte Cibernata (1967), em que
a violoncelista Charlotte Moorman (1933-1991) faz uma performance na qual ele utilizou
também o pró prio aparelho de televisã o. Dessa forma, as linguagens das artes visuais e da
mú sica em uma mesma obra sã o caminhos para a construçã o das linguagens híbridas e para a
arte e a tecnologia.

Elliot Erwitt/Magnum Photos/Latinstock

O artista sul-coreano Nam June Paik e a violoncelista Charlotte Moorman. Ambos produziram uma série de trabalhos em
que Paik construía instrumentos e aparelhos fantásticos para Charlotte Moorman tocar. Foto de 1982.

Palavra do artista

“É preciso conhecer a tecnologia o bastante para subvertê-la, para humanizá -la.”

Nam June Paik

LOPES, Rodrigo Garcia. Vozes e visões: panorama da Arte e da Cultura Norte-americanas hoje. Sã o Paulo:
Iluminuras, 1996. p. 212.
Graziano Arici/Easypix

As performances de experimentações eletrônicas de Nam June Paik influenciaram gerações de novos artistas. Foto de
1993.

A arte contemporâ nea: linguagens e


tecnologias
Vivemos imersos em um ambiente de imagens artísticas, publicitá rias, impressas,
projetadas, está ticas, movimentadas, bidimensionais, tridimensionais, antigas, novas, em alta
resoluçã o, 3D em ambientes exclusivos para exposiçõ es ou em espaços abertos e ruas da
cidade.

Como podemos olhar apenas uma em meio a tantas imagens? Como vemos este mundo
repleto de imagens? O que nos faz olhar uma imagem e pensar sobre ela?

Ao entrar em salas de exposiçõ es de arte contemporâ nea, podemos encontrar projeçõ es


de vídeos, filmes de animaçã o, computadores criando efeitos, com os mais diferentes recursos
multimídia. Mas como isso tudo começou?

Na década de 1960, experimentos com vídeos em salas de exposiçõ es fizeram surgir o


termo videoinstalação. Mais tarde, com os programas de computador foi possível criar
imagens digitalizadas. Essa uniã o entre vídeo e computador ampliou as ferramentas
disponíveis aos artistas, que puderam inventar uma arte multimídia. Hoje temos artistas que
em suas poéticas criam na linguagem da videoarte, como Bruce Nauman (1941-) e Bill Viola
(1951-).

Arte multimídia: arte que utiliza diversas linguagens e materialidades, podendo misturar projeçã o de vídeos,
imagens, vá rias tecnologias, mú sicas, performances ou proposiçõ es interativas para se expressar.
Pá gina 74

Hoje temos muitas formas e tecnologias de criaçã o de imagens digitais, que também
produzem arte.

Um exemplo é o Festival da Luz, que acontece em vá rios países e mostra o quanto a arte
mudou, usando o que a cultura contemporâ nea da sociedade tecnoló gica tem de melhor.

O futuro da arte... quem sabe? Talvez possa ser entendido como um mergulho luminoso,
como na obra de Cedric Le Borgne (1972-), Les voyageurs (2006), criada para a ediçã o do
Festival da Luz em Genebra, na Suíça (observe-a abaixo). Ou pode ser algo inventado por você
e seus amigos!

Fabrice Coffrini/AFP/Getty Images

Les voyageurs, performance de Cedric Le Borgne em Genebra, Suíça, em 2006.

Mundo visual que se transforma


As imagens sempre fizeram parte do universo humano, desde as primeiras
representaçõ es na arte rupestre à s imagens eletrô nicas da contemporaneidade. Imagens que
comunicam, exibem significados e expressõ es em cada cultura. Constituem-se como cultura
visual que apresenta valores e escolhas em cada época, mas que estabelecem diá logos que
podem ser atemporais.

Imagens abstratas ou figurativas que foram inventadas para registrar um momento,


mostrar símbolos, descrever um lugar, doutrinar por meio de concepçõ es religiosas, fazer
registros de um instante, revolucionar. Sã o muitas as finalidades e os pretextos que
inventamos ao longo da histó ria para produzir e reproduzir imagens.

Na Idade Média, as imagens tiveram grande importâ ncia para doutrinar as pessoas na
religiã o do Cristianismo. Em fachadas de igrejas na Europa, como a da Igreja de St. Trophime,
em Arles (França), construída em c. 1180, vemos um exemplo de arte româ nica. Nessa
imagem, a figura de Cristo é mostrada com ele sentado em um trono, com uma das mã os sobre
o livro da lei (segundo essa religiã o) e outra apontando para cima, em um gesto que quer dizer:
“Aos pecadores, o julgamento de Deus, e aos justos, o reino dos céus”. Era uma mensagem que
as pessoas podiam ver logo na entrada das igrejas e vinha carregada de simbolismo.

Arte românica: estilo de arte sacra da Idade Mé dia. As imagens sã o criadas com formas mais simbó licas e tinham a
funçã o de ensinar as passagens bíblicas aos fié is.

Diana Mayfield/Lonely Planet Images/Getty Images

Fachada da Igreja de St. Trophime, em Arles, na França, construída c. 1180, um exemplo de arte românica.
Pá gina 75

No exemplo de obra da arte gó tica, do italiano Giotto di Bondone (1267-1337), vemos o


espaço entre as figuras e a dramaticidade na narrativa. Nessa obra, A lamentaçã o, podemos até
perceber a dor que as pessoas estã o sentindo ao velar o corpo de Cristo. É possível perceber a
emoçã o, mesmo das figuras que estã o de costas. Esse artista cria uma visã o mais humana dos
personagens bíblicos e se preocupa em dar maior realismo à s cenas. A intençã o é produzir
planos na pintura para nos dar a sensaçã o de adentrarmos nos espaços e participar das cenas.

Arte gótica: estilo artístico do final da Idade Mé dia. Aparece em um momento da histó ria em que a vida urbana
ganha força e as construçõ es destinadas à religiã o cató lica começam a mudar, apresentando uma arquitetura com foco na
grandiosidade e na luminosidade, com ambientes claros e amplos. Luzes entram pelas janelas das igrejas por meio de vitrais
e rosá ceas e destacam a presença de arcos gó ticos (ogivais) em sua arquitetura. Nas esculturas, as figuras sã o alongadas. Na
pintura, os temas sacros ainda estã o presentes, mas há tendê ncias em retratar cenas com temas mais cotidianos e com
intençõ es mais realistas.

No período do Renascimento (sécs. XV a XVI), os artistas criavam suas obras com


imagens que buscavam imitar a realidade. A perspectiva, enquanto arte de criar ilusõ es de
profundidade, foi estudada nessa época, como também as técnicas de luz e sombra, para criar
volumes e efeitos tonais em pinturas como podemos observar no afresco Trindade.

Giotto di Bondone. Capela Arena, Itália. Foto: World History Archive/Alamy/Glow Images

A lamentação (1754), de Giotto di Bondone (1267-1337). Afresco na parede da Capela Degli Scrovegni, 185 cm × 200 cm,
em Pádua, Itália.

Masaccio. 1428. Afresco. Basílica de Santa Maria Novella, Florença. Foto: Atlantide Phototravel/Corbis/Latinstock
Homem apreciando a imagem em afresco Trindade (1428), do renascentista Masaccio (1401-1428), na Basílica de Santa
Maria Novella, 640 cm × 318 cm, em Florença, Itália.

Ilustradores do mundo
Hoje, as imagens viajam pelo mundo na velocidade da internet, mas como isso ocorria no
passado? Entre os séculos XV e XIX, principalmente nos séculos XVIII e XIX, artistas viajantes
percorriam o mundo em busca de imagens. Eram obras que mostravam paisagens, pessoas,
plantas e animais das terras chamadas de “Novo Mundo” pelos povos europeus, imagens
criadas em desenhos, gravuras e pinturas.

No Brasil, os artistas chamados “ilustradores de mundos” criavam imagens que


transitavam pela Europa para mostrar as riquezas naturais da nossa terra. Registros feitos sob
um “olhar estrangeiro”. Os artistas eram influenciados por suas culturas e mostravam cenas
com paisagens, tipos étnicos, fauna e flora de modo idealizado. Sã o imagens que parecem
descritivas, porém apresentam estética europeia, como na obra Mulher Tapuia, do artista
holandês Albert Eckhout (1610-1666), que esteve no Nordeste brasileiro no século XVII, em
que vemos uma indígena com pedaços de corpos humanos sendo carregados como alimento. A
pose nessa imagem nã o é natural e lembra as poses de retratos europeus. Observe-a ao lado.

Albert Eckhout. c. 1641. Ó leo sobre tela. Museu Nacional da Dinamarca

Mulher Tapuia (c. 1641), de Albert Eckhout. Óleo sobre tela, 272 cm × 165 cm. Museu Nacional da Dinamarca, Copenhague.
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Imagem e brasilidade
No início do século XX, obras antropofá gicas criadas pela artista Tarsila do Amaral
agitaram o mundo com imagens brasileiras e abriram caminho para outros artistas, que foram
criando trabalhos cada qual seguindo seus princípios estéticos, poéticos e suas intençõ es
pessoais. Dentro do movimento modernista, vemos nascer um mundo visual, arte brasileira
criada por vá rios artistas, de mú ltiplas culturas e etnias, uma arte que buscava a brasilidade, a
identidade nacional, ao mesmo tempo que acompanhava tudo que estava sendo feito pelo
mundo. A arte no Brasil a partir desse período segue o fluxo de transformaçõ es em funçõ es de
vá rias correntes estilísticas que acontecem no país e no mundo.

Do susto ao olhar Matrix


As imagens em alta resoluçã o, com a profundidade que vemos hoje, começaram a ser
forjadas no Renascimento. As pessoas, quando viam uma imagem pintada com os efeitos de
perspectiva nessa época, chegavam a colocar a mã o sobre a pintura para ter certeza de que ali
não havia um buraco. Era difícil acreditar que em uma superfície plana (bidimensional)
poderia haver percepçã o de tridimensionalidade. Será que essa mania de criar realidades ficou
só no passado? Hoje, ao entrar nas salas de cinema, vemos imagens em 3D, efeitos para 4D...
Será uma versã o potencializada da perspectiva renascentista?

Na França, em 1895, quando as pessoas assistiram ao filme L’Arrivée d’un train à La


Ciotat (A chegada de um trem em La Ciotat), no Salã o Grand Café, em Paris, exibido pelos
Irmã os Lumière por meio de um cinemató grafo, saíram correndo com medo de serem
atropeladas pelo trem. Assim como as pessoas da época do Renascimento, o pú blico do filme
também se espantou. Aquele jeito de ver imagens era muito diferente para as pessoas, o que
causou estranhamento e susto. Imagine se essas pessoas estivessem em nossas atuais salas de
cinema, com tecnologia de filmes em 4D, que superam as projeçõ es em 3D por estimular as
percepçõ es sensoriais para além da alta qualidade das imagens multidimensionais? É possível
sentir calor, frio, ventar, movimentos e até cheiros com tecnologias que monitoram o ambiente
e os sistemas de som e imagem nas salas de projeçõ es em 4D de filmes atuais.
Lumiere Pictures/Album/Latinstock

Cena do filme L’Arrivée d’un Train à La Ciotat (A chegada de um trem em La Ciotat), dirigido pelos Irmãos Lumière, 1895.
Pá gina 77

O olhar Matrix (olhar influenciado pelo filme Matrix), dado pela tecnologia para
capturar e apresentar imagens na técnica conhecida como bullet time (tempo de bala), mudou
nosso jeito de ver o mundo. Depois de olhar imagens em 360° (graus), criamos uma
expectativa ao ver imagens em açã o. Parece que estamos sempre a espera de um detalhe, ou
melhor, de milhares de detalhes da mesma cena, vá rios â ngulos de visã o, um voo no ar em
câ mera lenta ou até mesmo ver a trajetó ria de uma bala. Criamos modos de ver a velocidade
em seus mínimos detalhes. O filme estadunidense Matrix, de 1999, dirigido pelos irmã os
Wachowski, foi considerado um divisor de tempos para a linguagem cinematográ fica. Hoje,
muitas produçõ es têm sido realizadas com efeitos semelhantes, cada vez mais aprimorados.

Bullet time: (tempo de bala), té cnica usada no filme Matrix (1999) que utilizou uma tecnologia de simulaçã o
digital com câ meras fotográ ficas de velocidade variá vel, que mudou o olhar em relaçã o aos efeitos especiais. Para capturar
cada â ngulo de açã o, 120 câ meras fotográ ficas digitais de alta resoluçã o foram posicionadas em torno da cena, enquanto
outras câ meras de filmagem registravam os movimentos dos atores. Esse tipo de efeito nos permite ver os mínimos detalhes
de uma cena.

Há cada vez mais profissionais empenhados nessa procura tecnoló gica pela evoluçã o
nos efeitos especiais. Daqui a pouco tempo, talvez achemos obsoletas as imagens que nos
fascinam hoje.

The Hollywood Archive/Keystone

Cena do filme Matrix (1999), dirigido pelos irmãos Wachowski.

Cultura visual
O mundo de imagens criado pela tecnologia nos oferece viver em meio a uma cultura
visual intensa. Na Avenida Paulista, na cidade de Sã o Paulo, em 2013, uma exposiçã o chamou a
atençã o das pessoas que ali passavam apressadas, todos os dias. A mostra Play!, uma projeçã o
de imagens em tela gigante, no prédio da Federaçã o das Indú strias de Sã o Paulo (Fiesp),
mostrava etapas de jogos de videogames antigos, a maioria dos anos 1980, que fizeram histó ria
nessa arte eletrô nica. Os transeuntes podiam, por meio de programas interativos de
computadores, jogar o videogame olhando para uma imagem que era projetada no prédio. Os
meios mudaram, as linguagens também, mas continuamos fascinados por imagens e pela
possibilidade de movimentá -las e interagir com elas. Observe a seguir uma imagem da mostra
Play!.
Anderson Ferreira

Imagem da mostra Play!, primeira exposição interativa de game arte a céu aberto no Brasil, realizada em arte multimídia
na Avenida Paulista, na cidade de São Paulo, no prédio da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), 2013.
Pá gina 78

A tecnologia a favor da arte


Já vimos que a criaçã o artística pode acontecer com a utilizaçã o de mais de uma
linguagem, misturando mú ltiplas maneiras de expressã o. Atualmente, há linguagens artísticas
que sã o intermídias.

Arte intermídia é um termo usado a partir da segunda metade do século XX para fazer
referência a artistas e à s suas produçõ es que usam duas ou mais linguagens. O termo também é
usado para falar de produçõ es que, além de vá rias linguagens, utilizam recursos diversos,
inclusive os tecnoló gicos.

Uma linguagem inventada há menos de um século foi decisiva para transformar as


linguagens artísticas que fazem uso das tecnologias: a linguagem biná ria. Essa linguagem, por
meio de combinaçõ es numéricas, permite que os computadores decodifiquem sons, imagens,
palavras, comandos etc. Esse processo pode ser considerado como a base da linguagem de
programaçã o e representa um grande avanço para a “era digital”.

A linguagem biná ria é só um exemplo de como a chegada de novas soluçõ es tecnoló gicas
transformam a cada dia a nossa maneira de ver, ouvir e perceber o mundo.

O desejo de criar e utilizar os avanços tecnoló gicos a favor da arte, motivou o artista
Waldemar Cordeiro, na década de 1960, a pesquisar sobre programas de computador e como
torná -los ferramentas para criar imagens. Desta forma, ele inaugurava a Computer Art no
Brasil.

Ele fez vá rias experiências e pesquisas sobre digitalizaçã o de imagens. Em uma época
em que a digitalizaçã o de imagens nã o existia, teve de fazer o processo manualmente; o
trabalho durou vá rios dias. Estudou também funçõ es matemá ticas e suas derivadas para criar
suas obras, como, por exemplo, a obra A mulher que nã o é B.B (1971), em que o artista fez uso
da linguagem biná ria para reproduzir, com a ajuda de um antigo computador, o rosto de uma
menina vietnamita queimada por bombas de Napalm.
Coleçã o Família Cordeiro

O artista Waldemar Cordeiro fez um paralelo entre a “destruição” da imagem da menina vietnamita e a destruição causada
pela guerra, na obra A mulher que não é B.B (1971), computer graphic, 30,5 cm × 45,5 cm. Coleção Família Cordeiro.

Waldemar Cordeiro fez parte do grupo concretista Ruptura que surgiu em Sã o Paulo, em
1952, e também era formado por artistas como Geraldo de Barros (1923-1998), Lothar
Charoux (1912-1987) e Anatol Wladyslaw (1913-2004), entre outros.

O grupo realizou estudos, reuniõ es e manifestos para divulgar as ideias de uma arte que
tinha como foco a exploraçã o dos elementos visuais e o abandono à representaçã o da
realidade, pois a arte representativa já não respondia mais à s demandas de um mundo em
constante mudança.
Pá gina 79

Giro de ideias: As novas tecnologias e a captaçã o de imagens


Você já ouviu falar em performance capture (captura de movimento)?

Você saberia dizer em que linguagens fazemos uso deste efeito tecnoló gico?

Mesmo que você nã o tenha conversado sobre isto antes, é prová vel que já conheça o
efeito e viu em algum filme ou jogo de videogame, principalmente, se você tem ido ao cinema
nos ú ltimos anos ou jogado videogame com algum amigo.

O efeito performance capture é obtido com a ajuda de computadores para gravar e


capturar os movimentos de atores, que utilizam roupas e acessó rios especiais, com o objetivo
de produzir efeitos, manipular movimentos ou tornar os personagens mais reais. No filme
Avatar, por exemplo, podemos observar que as expressõ es dos personagens sã o bastante
realistas, pois as imagens que focalizam o rosto foram criadas com o uso dessa tecnologia.

The Picture Desk/Twentieth Century-Fox Film Corporation/The Kobal Collection/AFP

O ator Sam Worthington utilizou equipamentos especiais para a captura de imagens de seu rosto nas gravações do filme
Avatar (2009).

Agora que você já sabe que a performance capture é utilizada no cinema, videogame,
videoarte e em vídeos veiculados pela internet, procure obras em que essa técnica foi utilizada
e analise como essa seleçã o de cenas ou imagens pesquisadas pode se transformar em uma
exposiçã o virtual (blog, site da escola, rede social). Nã o se esqueça de consultar seu professor
sobre os direitos das imagens que serã o utilizadas e expostas.

Você e seus amigos podem fazer encontros para realizar a aná lise das imagens dos
filmes e jogos selecionadas, observar e discutir como a arte e a tecnologia vêm mudando nosso
modo de produzir e de ver imagens.

Apó s a aná lise, descreva as cenas mais marcantes e a que filmes ou jogos elas pertencem.
Pá gina 80

Conexõ es Arte e Tecnologia


Mergulhos virtuais
Na chamada era da informaçã o, iniciada no século XX e vivenciada potencialmente hoje por
nó s, os modos de conhecer as coisas do mundo se ampliam e mudam rapidamente, oferecendo
também mú ltiplas oportunidades de acesso para conhecer a arte.

Atualmente, temos disponíveis ferramentas que podem nos ajudar a visitar e conhecer
acervos de museus de vá rios países. Os museus virtuais sã o espaços interativos em que podemos
conhecer patrimô nios histó ricos, artísticos e culturais. Em vá rios deles é possível, inclusive,
percorrer esses espaços virtualmente, simulando uma visita real. Há ambientes virtuais que
utilizam efeitos de imagem em profundidade que proporcionam a ilusã o de se estar dentro da sala
de exposiçã o. Trata-se de uma experiência que pode ampliar muito seu repertó rio cultural.
Pesquise espaços virtuais de arte na internet. Você encontrará sites oficiais de artistas plá sticos e
de grupos de teatro, dança e mú sica, de galerias de arte e outros espaços culturais.

O Google Art Project, por exemplo, mostra acervos de vá rios museus de todo o mundo, nos
quais podemos fazer um passeio virtual e conhecer o que está sendo apresentado como exemplos
de arte. Obras do passado e do presente podem ser encontradas no site: <http://tub.im/5ad2ro>
(acesso em: 30 mar. 2016).

Depois de um giro pela internet para conhecer o que outras pessoas no mundo estã o
considerando como arte, combine com os colegas a montagem de uma exposiçã o virtual com as
obras de arte favoritas da turma. Nã o se esqueça de verificar o uso de direitos de imagens, mú sicas,
textos etc.

http://www.googleartproject.com#collections/
http://www.googleartproject.com#collections/

Reproduções de páginas do projeto Google Art que mostra o acervo da Coleção Frick, Nova York, EUA.
Pá gina 81

Museus do amanhã
Estamos tã o acostumados a ter experiências trazidas pelas tecnologias que quem acha que
museu é coisa do passado vai ter de rever seus conceitos sobres esses lugares que mostram tanto
coisas que já fizemos como as coisas que estã o acontecendo hoje e aquelas que ainda estã o por vir.

Para provocar os frequentadores desses espaços de cultura, os recursos audiovisuais sã o


cada vez mais empregados. Seja em um museu de arte ou de ciências, as linguagens artísticas se
misturam e aparecem em forma de imagens, vídeos, sons, painéis que contam com a interaçã o do
pú blico etc.

Sã o exemplo desta nova ordem de museus o Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, projetado
pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, e o Centro de Arte e Mídia, em Karlsruhe, na Alemanha,
entre outros espalhados pelo mundo. A tendência é que a arte, a ciência e a tecnologia caminhem
juntas para mostrar e criar obras de arte midiá ticas interativas.

Pró ximo ao lugar onde você mora existem museus, galerias, centros culturais ou exposiçõ es
temporá rias que aliam arte à s novas mídias? Que tal procurar em seu bairro ou cidade lugares onde
possa ocorrer a interaçã o entre arte e tecnologia?

Picture-Alliance/Dpa/Latinstock

Centro de Arte e Mídia, na Alemanha. Espaço aberto à experimentação e ao encontro entre arte, ciência e tecnologia. Foto
de 2003.
Daniel Derevecki/La Imagem/Fotoarena

Museu do Amanhã inaugurado em 2015, na Praça Mauá, no Rio de Janeiro. Foto de 2016.
Pá gina 82

Projeto experimental
Videoarte
Linguagem da arte

Atualmente, existem muitas possibilidades de criar projetos em arte explorando recursos


audiovisuais e outras tecnologias. O artista estadunidense Bill Viola (1951-) é um videoartista que
cria trabalhos explorando a linguagem do vídeo usando tudo o que o mundo tecnoló gico oferece.
Observe ao lado uma fotografia da obra Ascensã o de Tristan.

Bill Viola. Ascensão de Tristan (o som de uma montanha em uma cachoeira), 2005. Vídeo instalação/som. Cor de alta definição projeção de vídeo; quatro canais de som com subwoofer
(4.1). Tamanho da tela: 580 cm × 326 cm. Foto: Kira Perov

Ascensão de Tristan (o som de uma montanha em uma cachoeira), 2005, de Bill Viola, em que ele simula a ascensão da
alma após a morte. Performance: John Hay. Videoinstalação/som. Cor de alta definição, projeção de vídeo, quatro canais de som com
suboofer, 580 cm × 326 cm.

Utilizando esses recursos, ele procura passar mensagens simples por meio de sua arte com
temas relacionados à vida e suas fases – nascimento, amadurecimento e morte.
A proposta do artista é provocar as pessoas, chamar a atençã o e convidá -las para que façam
uma pausa em suas tarefas do dia a dia por alguns instantes e mergulhem em universos
imperceptíveis aos olhos rotineiros. Para atingir esse objetivo, ele faz uso dos vídeos, que abusam
da passagem do tempo e de corpos humanos em câ mera lenta. Para conhecer mais sobre o trabalho
desse artista, você pode visitar o site: <http://tub.im/abqpx7> (em inglês). Acesso em: 16 jan.
2016.

Processos de criaçã o

Vamos criar usando a técnica do vídeo como linguagem expressiva?

Procure escolher algo que tenha vida e movimento para a filmagem ficar mais dinâ mica. Você
pode realizar esse projeto em grupo; convide seus amigos.

Apó s a gravaçã o, as imagens podem ser transferidas para um computador para que sejam
trabalhadas em relaçã o à forma, luzes, intensidade de cores, duraçã o e outros efeitos. Com a ajuda
de programas específicos, as imagens também podem ser manipuladas em relaçã o à dinâ mica do
movimento, acrescentando recursos de câ mera lenta, por exemplo.

Depois de editado, o vídeo pode ser projetado em um espaço da escola ou em paredes de


prédios da sua cidade. Esta pode ser uma forma de criar intervençõ es urbanas com a ajuda de
recursos tecnoló gicos.
Pá gina 83

TEMA 4 AS LINGUAGENS
ARTÍSTICAS NO TEMPO

Jacopo Robusti (Tintoretto). Século XVI. Ó leo sobre painel. Castelvecchio Museum, Verona. Foto: Bridgeman/Keystone

Contest between Muses and Pierides (Disputa entre as Musas e Pierides), de Tintoretto, século XVI. Óleo sobre painel, 46
cm × 91 cm. Uma pintura do italiano Jacopo Robusti, conhecido como Tintoretto (1518-1594), um dos principais pintores da fase
final do Renascimento na Itália, representando as nove musas das artes.

"Dizei agora a mim, Musas que a olímpica morada tendes,


Pois vó s sois deusas, presentes estais e sabeis tudo –
Enquanto nó s a fama apenas ouvimos, nada sabemos –
Quem os chefes dos dâ naos e seus condutores eram."

HOMERO, Ilíada, II, 484-487.

Na contemporaneidade, temos muitas linguagens artísticas. Classificá -las por ordem de


importâ ncia, atualmente, nã o é muito utilizado nem considerado apropriado. No entanto,
houve um tempo em que as linguagens sofreram classificaçõ es em funçã o de crenças e
contextos culturais.

Na Antiguidade, tínhamos as nove musas, seres mitoló gicos que, segundo a lenda,
inspiravam o ser humano a realizar nove artes. A cada musa era atribuído um talento. Calíope
estava ligada ao canto e à poesia épica; Clio, à histó ria; Polímnia, à retó rica e à mú sica
cerimonial; Euterpe, à mú sica; Terpsícore, à dança; É rato, ao canto e à poesia lírica;
Melpô mene, à criaçã o de textos e à atuaçã o de atores nas tragédias; Tá lia, à comédia; e Urâ nia,
à astronomia. Observe acima, na pintura de Tintoretto, a forma como ele representou as nove
musas.
A concepçã o de arte na Antiguidade
É importante ressaltar que a concepçã o de arte nã o tinha o mesmo significado que
possui hoje. “Arte” podia significar além da poética e estética, técnica bem executada, como por
exemplo os grandes feitos, que podiam ser artísticos, científicos e até militares. A escultura, a
pintura e a arquitetura nã o estavam entre os “talentos” dados pelas musas porque eram
trabalhos ligados a ofícios braçais, destinados a escravos e à s pessoas do povo.
Pá gina 84

A mú sica era considerada um grande feito artístico porque estava ligada à doutrina do
Ethos, filosofia da educaçã o de jovens para a compreensã o das leis do universo e do espírito
humano. A importâ ncia da mú sica estava em ter a capacidade de estabelecer a formaçã o moral
e estética que determinaria o cará ter e a conduta das pessoas. Segundo o filó sofo grego
Aristó teles (384-322 a.C.), a mú sica era capaz de representar os estados da alma humana,
assim como influenciar e expressar suas paixõ es. A mú sica também estava ligada ao sagrado.
Nos cultos a Dionísio, o aulo, um instrumento de sopro, era geralmente usado. Como
observamos abaixo na obra Cena de banquete: homem reclinado em um banco e um jovem
tocando aulo, de Euaion. Já nos cultos ao deus Apolo, os instrumentos mais utilizados eram os
de corda, como a cítara e a lira, a exemplo da está tua do deus Apolo tocando lira (ao lado). Os
instrumentos geralmente acompanhavam os cantos. O canto era uma manifestaçã o artística
importante naquele tempo, principalmente porque trabalhava com a linguagem da poesia. Os
instrumentos de sopro e de corda eram considerados produtores de sons dos deuses e,
portanto, a verdadeira arte. Já os sons de percussã o eram considerados primitivos e ligados à
Terra. Por esse motivo, as musas ligadas à arte da mú sica estã o sempre representadas com
instrumentos de cordas ou sopro. A mú sica na Grécia antiga era tão importante que era um
saber obrigató rio na formaçã o de um cidadã o bem-educado.

Aulo: instrumento de sopro característico da Gré cia antiga. Por ter palheta, tem um som pró ximo ao do oboé , um
instrumento contemporâ neo.

Séc. II d.C. Mármore. Museus Vaticanos. Vaticano. Foto: Bettmann/Corbis/Latinstock

Estátua do deus grego Apolo tocando lira, de autoria não identificada, século II d.C. Mármore, 2,2 m.

O termo musa deu origem à s palavras museu e mú sica. No século XIX, a pintora inglesa
Kate Elizabeth Bunce (1856-1927) retratou a musa da mú sica na obra Melody (Mú sica),
abaixo. A pintura no tempo da crença nas nove musas nã o era considerada arte nobre, assim
como uma mulher também nã o podia ser artista, valores que foram mudando ao longo dos
tempos.

Kate Elizabeth Bunce. c. 1895-1897. Ó leo sobre tela. Museu de Arte de Birmingham, Alabama

Melody (Música), de Kate Elizabeth Bunce, c. 1895-1897. Óleo sobre tela, 51 cm × 76,3 cm.

Euaion. c. 460-450 a.C. Cerâmica. Museu do Louvre, Paris. Foto: Corbis/Latinstock

Cena de banquete: homem reclinado em um banco e um jovem tocando aulo, de Euaion, c. 460-450 a.C. Cerâmica, 31 cm.
Pá gina 85

Classificaçõ es das artes na Idade Mé dia


Durante a Idade Média, também havia separaçõ es e classificaçõ es entre artes mais
importantes e outras de valor considerado menor. As tradiçõ es artísticas eram divididas entre
artes liberais e artes mecâ nicas. As artes liberais eram atribuídas à s pessoas que sabiam
escrever textos literá rios e poemas usando com maestria a gramá tica a favor da poética. Os
artistas criavam poesias e narraçõ es de histó rias de contos imaginá rios ou fatos histó ricos,
trabalhavam a arte da palavra em sua criaçã o escrita, textos que contavam sobre batalhas,
acontecimentos, amores e amizades no Ocidente e em muitos casos ligados à tradiçã o cristã .

Era considerado artista nas artes liberais aquele que tinha aptidã o para a retó rica, a arte
da palavra na oralidade. As pessoas tinham como há bito ficar em volta desses mestres, para
ouvir histó rias e notícias, muitas vezes em forma de versos e acompanhados por mú sica, como
ilustrado na obra O Decameron (veja abaixo), do pintor britâ nico John William Waterhouse
(1849-1917). Como nessa época nã o existiam os meios de comunicaçã o atuais, a arte da
oralidade era importante nã o apenas para as questõ es estéticas, mas também como forma de
comunicaçã o e transmissã o dos contos de tradiçã o oral de geraçã o para geraçã o.

A mú sica era ainda uma linguagem artística considerada nobre na Idade Média,
principalmente as mú sicas ligadas à s tradiçõ es religiosas, como os cantos gregorianos (veja na
pró xima pá gina um exemplo de notaçã o musical). Contudo, os cantos religiosos fazem parte de
tradiçõ es bem mais antigas, reportam à época das sinagogas, no tempo de Jesus Cristo, ou
ainda à Antiguidade, em que religiã o e arte sempre tiveram relaçõ es muito pró ximas.

Canto gregoriano: mú sica sacra que recebeu esse nome em homenagem ao papa Gregó rio I (540-604), que
estabeleceu normas e procedimentos litú rgicos na religiã o cristã ocidental. O canto gregoriano é um gê nero de mú sica vocal
monofô nica em que todos cantam a uma só melodia.

John William Waterhouse. 1916. Ó leo sobre tela. Galeria de Arte Lady Lever, Liverpool. Foto: The Bridgeman/Keystone
O Decameron, de John William Waterhouse, 1916. Óleo sobre tela, 101 cm × 159 cm.
Pá gina 86

Nas tradiçõ es religiosas judaica e cristã , cantavam-se os salmos e os câ nticos do Antigo


Testamento, e depois, na Era cristã , do Novo Testamento, consolidando-se na cultura que se
seguiu até a Idade Média e que permanece ainda hoje. Foi na Idade Média que Guido D’Arezzo
(992-1050), monge e mú sico italiano, estabeleceu um sistema de notaçã o musical com pautas,
usado até hoje, com as notas DO, RÉ , MI, FÁ , SOL, LÁ e SI. O papel pautado no qual se registram
as mú sicas com esse sistema é chamado de partitura.

Album/AKG/Latinstock

Notação musical de canto gregoriano. Miniatura de um antifonário (livro de cânticos) de 1405. Têmpera e ouro em
pergaminho, 56,8 cm × 38,9 cm.

Giro de ideias: A arte de desenhar


Já sabemos que as linguagens influenciam umas à s outras, como é o caso das imagens.

Desde as imagens criadas no passado até à s do presente, os procedimentos de pintar,


desenhar, gravar, entre outros, podem ser misturados na construçã o da arte. Fique atento a
tudo o que você vê e pense a respeito.

Quais sã o as imagens que influenciam seu olhar?

As mudanças que acontecem por causa da tecnologia sã o inevitá veis, e isso nã o poderia
ser diferente na arte. Embora o momento atual nos ofereça muitas possibilidades tecnoló gicas,
a arte também pode ser criada usando materiais simples. Um desenho feito com grafite sobre
uma folha de papel também pode ser arte.

A escolha entre usar tecnologia ou não é sempre de quem pensa na obra, nas muitas
possibilidades de linguagens artísticas e também na criaçã o de outras que as necessidades de
expressã o possam estimular.
Que tal criarmos na linguagem do desenho? Escolha um suporte e esboce imagens que
rondam seus pensamentos.

DICA
Para navegar

Você também pode usar as tecnologias disponíveis hoje para realizar trabalhos em arte eletrô nica ou
multimídia. No site <http://tub.im/4kyrme> (acesso em: 15 mar. 2016), você encontrará mais informaçõ es
sobre a arte e a tecnologia.
Pá gina 87

Conexõ es Arte e Afrodescendência


Afrodescendência e brasilidade
Como um artista escolhe os assuntos ou temas em suas obras? Os caminhos podem ser os
mais variados. Mas olhar para sua essência, identidade e poética pode ser um deles. De maneira
geral, esses elementos sã o influenciados pela cultura do povo no qual o artista está inserido.

O desenvolvimento da cultura de um povo está relacionado a histó ria da formaçã o de sua


populaçã o. No caso dos brasileiros houve a influência de muitas culturas, mas podemos dizer que
três culturas formam nossa base inicial:

• cultura indígena, cultura europeia e cultura africana.

A cultura do povo brasileiro nasceu dessa mistura cultural, assim como a arte brasileira, pois
cada artista (ou grupo) brasileiro tem sua identidade e influências em suas origens que
desencadeiam poéticas e interesses ao criar nas diferentes linguagens artísticas.

Por conta do modo como nossa cultura foi formada inicialmente, quando falamos em arte
afro-brasileira podemos considerar aquela que carrega temas e conteú dos da cultura
afrodescendente. No contexto da cultura e da histó ria, a palavra “afrodescendente” pode
compreender traços étnicos, culturais, religiosos, usos, costumes, linguagem, arte e outros aspectos,
que tiveram como origem os povos que vieram de vá rias partes do continente africano e que, no
curso da nossa histó ria, influenciaram a nossa brasilidade.

Brasilidade: refere-se a características tipicamente brasileiras, que envolvem afinidades com o país e
peculiaridades do povo.

Um tema ou assunto relacionado à brasilidade do povo brasileiro pode chamar a atençã o de


artistas que investigam e criam obras de arte. Um exemplo de pesquisa e criaçã o com base em
nossa brasilidade sã o os chamados afrossambas, gênero musical que tem início com as aná lises
poéticas, rítmicas e linguísticas de Vinicius de Moraes (1913-1980) e Baden Powell (1937-2000) e
que resultou no á lbum, de 1966, Afrosambas.

Os artistas Vinicius de Moraes e Baden Powell tiveram contato com a cultura


afrodescendente em rodas de samba, capoeira e casas religiosas do Rio de Janeiro e da Bahia e se
encantaram pelos sons do berimbau, caxixi, atabaques, bongô , agogô e afoxé, instrumentos
oriundos da cultura afrodescendente, que foram misturados à flauta, ao violã o, ao sax, à bateria e ao
contrabaixo instrumentos musicais de influência europeia e americana.

A língua africana iorubá também influenciou as letras das mú sicas que fazem parte do á lbum
Afrosambas e também de outras composiçõ es da mú sica popular brasileira. O iorubá é uma língua
que chegou ao Brasil por volta do século XVIII com os povos africanos conhecidos aqui como nagô s,
oriundos principalmente de Benin. Muitas palavras dessa língua foram incorporadas ao nosso
idioma e ecoaram em nossa brasilidade. Dessa maneira, fizeram parte da composiçã o dos
afrossambas que foram cantados por milhares de brasileiros, acompanhando a voz do poeta
Vinicius de Moraes e a mú sica do instrumentista Baden Powell. O Brasil, país de pluralidade
cultural, proporcionou encontros e parcerias artísticas que influenciaram o sincretismo cultural e a
riqueza da nossa arte.
Pá gina 88

Os afrossambas apresentados por Vinicius de Moraes e Baden Powell marcaram a histó ria da
mú sica popular brasileira. O á lbum de 1966 foi um divisor de á guas porque mistura o samba,
gênero consagrado da nossa mú sica, que já havia nascido por misturas culturais (ritmos africanos e
modas de viola de origem europeia), e as palavras e sonoridades afrodescendentes.

Veja a seguir a capa desse á lbum e também um trecho da mú sica Canto de Xangô .

"Tudo é só amor, para mim


Xangô Agodô
Hoje é tempo de amor
Hoje é tempo de dor, em mim"
MORAES, Vinicius de; POWELL, Baden. Canto de Xangô. Disponível em: http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-
br/musica/discos/os-afrosambas. Acesso em: 11 abr. 2016.

Forma. 1966

Capa do álbum Os Afrosambas (Forma, 1966), parceria entre Vinicius de Moraes e Baden Powell.

O artista Vinicius de Moraes também gravou seus afrossambas em parceria com outros
artistas brasileiros, como Toquinho (1946-). Veja a seguir a capa do á lbum e um trecho da letra da
mú sica Canto de Ossanha.

"O canto da mais difícil


E mais misteriosa das deusas
Do candomblé baiano
Aquela que sabe tudo
Sobre as ervas
Sobre a alquimia do amor"

MORAES, Vinicius de; POWELL, Baden. Canto de Ossanha. Disponível em: https://www.letras.mus.br/vinicius-de-
moraes/86520/. Acesso em: 11 abr. 2016.
RGE. 1975

Capa do álbum O Poeta e o Violão (RGE, 1975), parceria entre Vinicius de Moraes e Toquinho.

As mú sicas de Vinicius influenciaram e continuam influenciando artistas brasileiros como,


por exemplo, Jorge Ben Jor (1945-), Chico Science (1966-1997), Tereza Cristina (1968-), Gilberto
Gil (1942-) e tantos outros mestres da mú sica brasileira.

Que tal ouvir os afrossambas para conhecer a sonoridade da mú sica e da língua que compõ e
a brasilidade do povo brasileiro, além de poder perceber a influência da mú sica afrodescendente na
composiçã o dessas mú sicas? Você e seus amigos, com seus professores, podem organizar um sarau
com o tema “Afrossambas e suas influências na mú sica popular brasileira“ e nesta ocasiã o
promover debates sobre afrodescendência e brasilidade.
Pá gina 89

Projeto experimental
Curtas-metragens
Linguagem da arte: cinema

O cinema é considerado a arte das linguagens. Classificado como modalidade das artes
visuais, também aplica outras linguagens em sua produçã o. Mú sica, dramaturgia, roteiro,
visualidade sã o muito potentes nessa linguagem. Ricciotto Canudo (1879-1923), teó rico italiano
especialista em cinema, foi quem nomeou o cinema como “a sétima arte” ao escrever o manifesto O
nascimento da sétima arte, publicado em 1911. Ricciotto Canudo defendeu a ideia de que o cinema
é uma arte que reú ne as outras, aquela na qual as artes plá sticas, como artes do espaço, interagem
com a mú sica e a poesia, consideradas artes do tempo.

Com uma câ mera na mã o e uma ideia na cabeça, podemos criar na linguagem do cinema.
Hoje, os celulares estã o equipados com câ meras digitais, o que pode facilitar a criaçã o.

Processos de criaçã o

Há diversos gêneros no cinema: comédia, drama, suspense, terror, ficçã o científica, entre
outros. Escolha um gênero, crie um roteiro e elabore seu filme planejando as tomadas de cenas.
Além disso, luz, foco, â ngulos de câ mera e planos (close e geral, por exemplo) e outros aspectos
necessá rios para compor a imagem sã o preocupaçõ es importantes.

Na produçã o de filmes, muitos profissionais estã o envolvidos diretamente, como roteiristas,


figurinistas, cenó grafos, técnicos de luz e som, mú sicos, editores de imagem até o diretor e atores,
que sã o os mais conhecidos pelo pú blico, e indiretamente, como marceneiros, motoristas,
cozinheiros, cabeleireiros, maquiadores, enfim, profissionais necessá rios das mais diversas á reas. É
uma arte que se faz coletivamente e que conta com trabalhos de muitas pessoas na pré e pó s-
produçã o.

Combinem, em grupos, o papel de cada membro e planejem todo o processo. Definam o


roteiro e o tempo do filme. Uma proposta é realizar um filme em um minuto. Existem vá rios
festivais do minuto ou com outros limites de tempo, em que as produçõ es sã o apresentadas em
curtas-metragens. Criem, inventem e depois apresentem aos colegas.

Curta-metragem: termo usado para definir filmes de curta duraçã o. Há festivais de cinema criados especialmente
para esse formato de filme. Há regras internacionais que estabelecem que um filme de curta-metragem deve ter no má ximo
40 minutos. No Brasil, a orientaçã o estabelece apenas 15 minutos. Existem festivais de cinema em que o desafio é criar um
filme em apenas um minuto.

Para começar, escreva um resumo do roteiro do seu filme, ou seja, o que irá acontecer e em
qual ordem.

Os criadores de cinema também usam o storyboard como recurso de planejamento.

Storyboard: termo em inglê s que se refere a desenhos (ilustraçõ es) que mostram a sequê ncia das cenas de um
filme. É uma ferramenta de visualizaçã o pré via muito usada no processo de criaçã o da linguagem do cinema. Esse recurso
també m é usado na publicidade como forma de planejamento.
Comece a criar seu storyboard. Faça desenhos em sequência mostrando como serã o as cenas,
os â ngulos de visã o, a luz e outros detalhes importantes na composiçã o da linguagem
cinematográ fica. Descreva também o que acontece em cada cena.

DICA
Para navegar

Há vá rios sites que dã o dicas sobre a produçã o de filmes. Para saber mais sobre curtas-metragens,
visite o site: <http://tub.im/5y5jka> (acesso em: 15 mar. 2016).
Pá gina 90

AS MIL E UMA LINGUAGENS DA ARTE

Qual foi a primeira linguagem artística criada pelo ser humano? Ninguém sabe ao certo. O
fato é que pintar, desenhar, cantar, batucar, assobiar, dançar, dramatizar... sã o açõ es realizadas
pelas pessoas muito antes da elaboraçao dos primeiros sistemas de escrita. No decorrer dos
tempos, linguagens foram criadas e transformadas, como ocorre com as culturas e civilizaçoes. E
assim é até hoje.

ESCULTURA

Pietá , de Michelangelo Buonarroti, c. 1498-1499.

Escultura em má rmore, 174 cm × 195 cm. Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni


(1475-1564), pintor, escultor, poeta e arquiteto italiano, é um dos principais representantes das
artes no Renascimento.

PINTURA

A leitora, de Jean-Honoré Fragonard, c. 1770. Ó leo sobre tela, 82 cm × 65 cm. Entre as obras
mais populares do francês Fragonard (1732-1806) estao as pinturas de gênero, que destacam
pessoas em uma atmosfera de intimidade.
TEATRO

O teatro, enquanto forma ritualística, esteve sempre presente na vida do ser humano, desde a
Pré-Histó ria, por isso sua difusã o em todas as regiõ es do mundo, conforme as características de
cada cultura. No mundo ocidental, o teatro já era considerado uma arte nobre desde os gregos
clá ssicos.

A PARTIR DO SÉ CULO XV

Na Grécia antiga (séculos XX a ll a.C.), algumas linguagens artísticas, como a pintura e a


escultura, foram consideradas menores durante certo tempo, por serem associadas a trabalhos
braçais. No Renascimento italiano (séculos XV e XVI), era identificado como artesã o aquele que
fazia a mesma peça repetidas vezes, enquanto artista era quem criava um ú nico exemplar de uma
obra. Assim, diferenciava-se artesanato de arte. Nesse tempo, a arte da pintura e a da escultura, que
antes eram vistas como menores, começaram a ganhar status, passando a ter um reconhecimento
maior da sociedade, sendo consideradas artes plá sticas nobres até o início do século XX.

Desde o Renascimento, os aprendizes entravam para o ateliê de um mestre famoso,


geralmente ainda muito jovens, para aprender os ofícios da arte. O mestre tinha o conhecimento, as
ferramentas e o material necessá rio para ensinar aos interessados em seguir o ofício. No início, os
estudantes nã o criavam, somente ajudavam seus mestres na produçã o das encomendas feitas ao
ateliê ou à casa de ofícios. Quando um aprendiz era competente para criar a sua pró pria obra, ele
realizava o sonho da “obra-prima” (primeira obra). Posteriormente, esse termo passou a ser usado
para designar a obra mais importante do artista, mesmo que feita em sua maturidade.

As mulheres sempre produziram arte, mas nem sempre essas produçõ es eram reconhecidas
e evidenciadas, em funçã o de aspectos culturais que subjugavam o papel da mulher nas diversas
sociedades.

A partir do século XV, a figura do artista ganhou maior visibilidade e status. Alguns deles
tornaram-se célebres, requisitados para a produçã o em vá rias linguagens, classificadas a partir de
entã o como “belas-artes” em seis campos: mú sica, dança, pintura, escultura, teatro e
Iiteratura.Tanto no Ocidente quanto no Oriente, cada cultura criava a seu modo nessas seis
linguagens das artes, que eram conhecidas há muito tempo.
PINTURA

A Pintura (alegoria), de Almeida Jú nior, 1892. Ó leo sobre tela, 250 cm × 125 cm. O paulista
José Ferraz de Almeida Jú nior (1850-1899), reconhecido pelo talento no trabalho da luz nas
pinturas, foi um dos primeiros artistas brasileiros a retratar, nas telas, as pessoas durante o
cotidiano.

TEATRO

Sarah Bernhardt (1844-1923), atriz francesa fotografada por Felix Nadar, em 1859. O talento
como atriz dramá tica a levou aos principais palcos da Europa e das Américas e a tornaram
conhecida mundialmente. Foi, por isso, considerada a mais famosa atriz da histó ria.

ESCULTURA

A francesa Camille Claudel (1864-1943) frequentou ateliês de escultores famosos em sua


época, no século XIX, na busca pela obra-prima. Marcou a histó ria da arte criando figuras fortes e
expressivas, ao mesmo tempo delicadas e mergulhadas em sentimento de paixã o linguagem da
escultura.
Pá gina 91

MÚ SICA

O menestrel, de Kate Elizabeth Bunce, 1890. Ó leo sobre tela, 73,6 cm × 142,2 cm. Algumas
das obras da pintora inglesa Kate Elizabeth Bunce (1856-1927) tiveram como tema a mú sica,
considerada uma das belas-artes. Nesta obra, o menestrel recita e canta poemas a serviço dos
nobres.

DANÇA

O minueto, de Frederik Hendrik Kaemmerer, c. 1890. Ó leo sobre tela, 160 cm × 98 cm, A
dança passa a ser mais do que simples atitudes para deleite das cortes europeias, como
representado nesta pintura do holandês Frederik Hendrik (1839-1902) para ocupar os palcos como
espetá culo de arte.

NO FINAL DO SÉ CULO XIX

O advento do cinema, no final do século XIX, é considerado o surgimento da sétima arte. Com
a pesquisa da produçã o de imagens por meio de outros processos que utilizavam a luz e produtos
químicos, é criada a linguagem da fotografia, classificada como a oitava arte. As histó rias em
quadrinhos (HQ) também entraram nessa lista e, hoje, é comum afirmar que sã o a nona arte. Alguns
defendem que o videogame seja a décima arte; outros, que a arte digital (que integra artes grá ficas
computadorizadas em 2D, 3D e programaçã o de computadores), feita com softwares, seja a décima
primeira arte.

A gravura e o desenho, atualmente, sã o valorizados como linguagens artísticas com


representatividade pró pria, ou seja, nã o precisam estar a serviço de outra linguagem para se
destacar.
CINEMA

Clark Gable (1901-1960) e Mirna Loy (1905-1993), atores estadunidenses nos bastidores
das filmagens de Sob o céu dos tró picos (Too hot to handle), comédia dirigida por Jack Conway, em
1938. O cinema nasceu do fascínio de capturar, movimentar e projetar imagens.

HISTÓ RIA EM QUADRINHOS (HQ)

A primeira HQ de Os Vingadores foi publicada nos Estados Unidos em 1963, criada por Stan
Lee, Jack Kirby e Dick Ayers. Hoje o grupo também está em adaptaçõ es da Marvel Comics para
cinema, desenho animado e videogames.

VIDEOGAME

Cena do jogo Final Fantasy, franquia multimídia de ficçã o científica e fantasia criada por
Hironobu Sakaguchi centrada em uma série de jogos eletrô nicos do gênero RPG (role-playing game
- jogo de interpretaçã o de papéis ou jogo de representaçã o). O primeiro titulo da serie foi lançado
em 1987.
PERFORMANCE E HAPPENING

Registro fotográ fico da performance The artist is present (A artista está presente), de Marina
Abramovic, no Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), em 2010. A artista performá tica
passou 700 horas em silêncio, interagindo somente pelo olhar com as pessoas que sentavam à sua
frente. Podemos dizer que a obra aproximou-se do happening, pois exigiu também a participaçã o da
plateia.

ARTE MULTIMÍDIA

Apresentaçã o de uma performance com video mapping ou 3D mapping (mapeamento de


vídeo), instalaçã o audiovisual que mescla vídeo com atuaçã o ao vivo. Trata-se de uma técnica que
utiliza softwares especiais e projetores de grande potência para adaptar e manipular imagens à
superfície escolhida, promovendo uma reconstruçã o do espaço real existente com a adiçao de
espaço virtual.

NA CONTEMPORANEIDADE

Hoje, as linguagens estä o cada vez mais híbridas. A preocupaçã o é compreender as muitas
linguagens artísticas existentes e, se preciso, criar outras.

Atualmente, todas as linguagens artísticas sã o consideradas importantes, sem nível


hierá rquico. Por isso, é mais apropriado classificá -las por sua forma e estrutura linguística. Assim,
temos: artes visuais (pintura, escultura, gravura, desenho), artes audiovisuais (Videoarte, cinema),
artes cênicas (teatro, dança e circo), mú sica e literatura. Também temos linguagens que sã o
hibridas (arte performá tica e intervençõ es artísticas - ou performances e happenings, objetos
combinados e ressignificados...), multimídias (instalaçõ es e performances que usam muitos
materiais, mídias e recursos), artes tecnoló gicas (Videoarte, videodança e outras criadas com o uso
de tecnologias de informá tica presencial ou remota).

Classificar linguagens artísticas por ordem de importâ ncia deixou de ser relevante. A
proposta é compreender que somos seres de cultura e linguagem. Inventar linguagens e intervir no
mundo faz parte da nossa natureza!
Pá gina 92

FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
1. (UFG-GO) Leia a imagem e o texto a seguir e responda à questã o.

Cortesia/César e Claudio Oiticica

Imagem de parangolés feitos por espectadores a partir da Proposição/Performace Capas Feitas no Corpo, 1968, de Hélio
Oiticica.

Parangolé é o nome dado pelo artista carioca Hélio Oiticica (1937-1980) para as suas “obras para vestir”. Daí surgiram
capas/estandartes usadas pelos passistas da Escola de Samba Mangueira. De acordo com o crítico de arte Mário Pedrosa, em artigo
de 1966, para o Correio da Manhã, “foi durante a iniciação ao samba que o artista passou da experiência visual, em sua pureza, para
uma experiência do tato, do movimento, da fruição sensual dos materiais, em que o corpo inteiro, antes resumido na aristocracia
distante do visual, entra como fonte total da sensorialidade”.

O artista plá stico Hélio Oiticica queria ressaltar com seus “Parangolés”

a) a transgressã o dos valores da indú stria da moda de sua época, apenas referenciada na
cultura europeia.

b) a relaçã o total da arte com o corpo, a vida, a mú sica, as artes visuais e a dança.

c) a inclusã o da arte nas favelas, onde nã o havia manifestaçõ es artísticas.

d) a valorizaçã o dos passistas da Escola de Samba.

2. (UFG-GO)
Alex Flemming. Série Sumaré, 1998.

Na instalaçã o do artista Alex Flemming, fotografias em grande escala foram plotadas no


espaço do metrô Sumaré, na cidade de Sã o Paulo. No exemplo citado, a compreensã o da cidade
como espaço educativo pode ser assim formulada:
Pá gina 93

a) formaçã o de sujeitos reflexivos na relaçã o com o meio do qual fazem parte.

b) reafirmaçã o do talento do artista em detrimento das demais competências sociais.

c) delimitaçã o de espaços individualizados em á reas de interaçã o coletiva.

d) universalizaçã o das aná lises de significados dos símbolos urbanos.

3. (Enem-MEC)

Teatro do Oprimido é um método teatral que sistematiza exercícios, jogos e técnicas


teatrais elaboradas pelo teatró logo brasileiro Augusto Boal, recentemente falecido, que visa à
desmecanizaçã o física e intelectual de seus praticantes. Partindo do princípio de que a
linguagem teatral nã o deve ser diferenciada da que é usada cotidianamente pelo cidadã o
comum (oprimido), ele propõ e condiçõ es prá ticas para que o oprimido se aproprie dos meios
do fazer teatral e, assim, amplie suas possibilidades de expressã o. Nesse sentido, todos podem
desenvolver essa linguagem e, consequentemente, fazer teatro. Trata-se de um teatro em que o
espectador é convidado a substituir o protagonista e mudar a conduçã o ou mesmo o fim da
histó ria, conforme o olhar interpretativo e contextualizado do receptor.

Companhia Teatro do Oprimido. Disponível em: www.ctorio.org.br. Acesso em: 1 jul. 2009 (adaptado).

Considerando-se as características do Teatro do Oprimido apresentadas, conclui-se que

a) esse modelo teatral é um método tradicional de fazer teatro que usa, nas suas açõ es
cênicas, a linguagem rebuscada e hermética falada normalmente pelo cidadã o comum.

b) a forma de recepçã o desse modelo teatral se destaca pela separaçã o entre atores e
pú blico, na qual os atores representam seus personagens e a plateia assiste passivamente ao
espetá culo.

c) sua linguagem teatral pode ser democratizada e apropriada pelo cidadã o comum, no
sentido de proporcionar-lhe autonomia crítica para compreensã o e interpretaçã o do mundo
em que vive.

d) o convite ao espectador para substituir o protagonista e mudar o fim da histó ria


evidencia que a proposta de Boal se aproxima das regras do teatro tradicional para a
preparaçã o de atores.

e) a metodologia teatral do Teatro do Oprimido segue a concepçã o do teatro clá ssico


aristotélico, que visa desautomaçã o física e intelectual de seus praticantes.
Pá gina 94

EXPEDIÇÃO CULTURAL
O verbo “seguir“ é muito usado na internet para designar a açã o de acompanhar um
debate, as açõ es de alguém, as ideias etc. Assim, nas redes digitais, quando você “segue” algo ou
alguém é porque está acompanhando a maneira como as coisas ocorrem.

Desse modo, fique atento à s mudanças na arte e nas programaçõ es culturais de sua
cidade, e vá ver de perto como as linguagens artísticas sã o criadas e expressas na mú sica e nas
artes cênicas e visuais.

Anote suas impressõ es e críticas sobre o que você vê, ouve e sente em relaçã o à s
linguagens na arte. Trace mapas para procurar as linguagens artísticas; você pode
compartilhar as experiências com os colegas, como na imagem abaixo, que apresenta a
Cartografia da arte, com curadoria independente de Mona Carvalho, reunindo espaços de arte
e ateliês da cidade de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul. Em que lugares podemos vê-las,
ouvi-las, senti-las?

Você pode organizar a cartografia da arte em linguagens como nos sites de mú sicas em
que é possível ouvir playlists criados por outras pessoas e até compartilhá -los.

Na linguagem dos audiovisuais podemos investigar as ú ltimas novidades sobre cinema,


vídeo e videoarte. Na internet você também pode acessar sites de fotó grafos e de museus para
ficar sabendo o que está acontecendo e o que há de novidade na arte contemporâ nea.

Quando encontrar uma linguagem artística de que você gostar, divulgue-a para os
colegas da maneira que puder, por exemplo, por meio das redes sociais de que você participa.
Assim, você pode formar uma teia de informaçõ es e, além de ser um apreciador de linguagens
artísticas, transformar-se em um dinamizador cultural.
cartografiadaarte.com.br/Curadoria Independente de Mona Carvalho. Arte de: Nicole Nissola

O projeto Cartografia da arte com o intuito de aproximar o público dos artistas fez o mapeamento de ateliês da cidade de
Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul.
Pá gina 95

DIÁRIO DE BORDO
Os seres humanos sempre usaram materiais para produzir as linguagens artísticas. Com
a era industrial e tecnoló gica, novos meios surgiram e ainda surgem para se fazer arte. Meios
mecâ nicos e eletrô nicos sã o utilizados para produzir linguagens que trabalham com sons,
imagens, letras. Vimos que as linguagens artísticas foram nascendo e modificando-se,
misturando-se e tornando-se híbridas.

A ideia de hibridismo está ligada ao contexto cultural contemporâ neo. O híbrido nasce
de situaçõ es culturais germinadas por relaçõ es sociais e meios de comunicaçã o. As tecnologias
trouxeram mais possibilidades de materiais expressivos, mas o que faz nascer uma linguagem
é a capacidade dos seres humanos de pensar, o que instiga a vontade de criar sempre. O
caminho trilhado pela cultura, principalmente nos ambientes urbanos, trouxe uma nova
concepçã o de arte, que é produzida ainda de forma artesanal, mas que se expande para os
meios tecnoló gicos. As linguagens artísticas já nã o podem ser classificadas por nú meros ou
grau de importâ ncia, sã o linguagens que se comunicam por muitos meios e vozes.

Diante das linguagens artísticas apresentadas neste capítulo, qual mais chamou a sua
atençã o?

Você conheceu alguma linguagem nova? Quais linguagens sã o mais veiculadas em sua
cidade?

Existem espaços dedicados à arte na sua cidade?

Registre no seu diá rio de bordo e compartilhe com seus amigos as suas descobertas.
© Cortesia/Cé sar e Claudio Oiticica
Pá gina 96

CAPÍTULO 3 A CRIAÇÃ O

Alexandre Orion. 2006-2011 (www.alexandreorion.com). Acervo do artista

Ossário, intervenção urbana, de Alexandre Orion, 2006-2011. Remoção da poluição depositada pelos automóveis na lateral
da estrutura do Túnel Max Feffer, São Paulo, SP.
Pá gina 97

“A gente pensa que vive num lugar


onde se fala o que pensa.
[...]
Eu não conheço esse lugar!
A gente pensa que é livre pra falar tudo
que pensa mas a gente sempre pensa
um pouco antes de falar!
[...]
Pensa! O pensamento tem poder.
Mas não adianta só pensar.
Você também tem que dizer! Diz!
Porque as palavras têm poder.
Mas não adianta só falar.
Você também tem que fazer! Faz!
[...]”

O PENSADOR, Gabriel; LIMA, Aninha; LIMINHA. Se liga aí. Inté rprete: Gabriel o Pensador. In: Seja você mesmo
(mas não seja sempre o mesmo). Sã o Paulo: Sony, 2001. CD. Faixa 1.

PARA ESTUDAR

• Intervenção como criação


• Criação e registro
• Lugares para criar
• “Dom”: virtude, gênio ou curiosidade?
Pá gina 98

TEMA 1 INTERVENÇÃO COMO


CRIAÇÃO

Alexandre Orion. 2006-2011 (www.alexandreorion.com). Acervo do artista

Alexandre Orion durante a execução da intervenção urbana Ossário, 2006-2011, em São Paulo, SP.

"Pintamos, esculpimos, compomos, escrevemos com sensaçõ es. Pintamos,


esculpimos, compomos, escrevemos sensaçõ es. As sensaçõ es, como perceptos, nã o
sã o percepçõ es que remeteriam a um objeto (referência): se se assemelham a algo,
é uma semelhança produzida por seus pró prios meios, e o sorriso sobre a tela é
somente feito de cores, de traços, de sombra e de luz."

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Fé lix. O que é a filosofia? MUÑ OZ, Alberto Alonso; PRADO JR., Bento (trad.). Sã o Paulo:
Editora 34, 1992. p. 215.

Uma das características marcantes dos seres humanos é a criaçã o. Trata-se de uma
habilidade desenvolvida há muito tempo e que faz toda a diferença entre nó s e as outras
espécies do planeta. E como se dá a criaçã o na arte? Será inspiraçã o, genialidade ou a vontade
incontrolá vel de dizer algo utilizando uma linguagem?

Lembrando que a linguagem, no caso de nosso estudo, é artística, a criaçã o nasce desse
desejo que o mú sico e compositor Gabriel o Pensador (1974-) canta na mú sica Se liga aí
(2001) apresentada na abertura do Capítulo 3. Gabriel nos conta que o pensamento tem poder,
mas é preciso encontrar um modo de dizer o que esse pensamento expressa e uma forma de
fazer que ele se torne realidade.

Quando criamos também exploramos nossas percepçõ es e sensaçõ es, assim como as de
outras pessoas que podem entrar em contato com a nossa obra. Como está dito no texto dos
filó sofos franceses Deleuze (1925-1995) e Guattari (1930-1992), apresentado acima, um
artista ao criar arte inventa um mundo imaginá rio, cheio de sentidos, percepçõ es, direçõ es e
sensaçõ es. Tanto um sorriso pintado em uma tela com tinta a ó leo quanto as caveiras criadas a
partir da fuligem no grafite de Alexandre Orion (1978-) ativam nossas sensaçõ es e atribuímos-
lhes sentido, de acordo com nossas interpretaçõ es, reflexõ es e visõ es de mundo. As imagens
artísticas sã o textos visuais carregados de poética, sentidos e sensaçõ es.

Quando um artista cria algo, de onde surge a ideia? O artista paulista Alexandre Orion
(1978-) desejou dizer algo à s pessoas da cidade mais populosa do Brasil, Sã o Paulo. Pensou,
pesquisou, escolheu um lugar, os materiais, e se pô s a criar. Em plena metró pole, o artista
começou a executar sua obra. Observe no início desta pá gina a obra e o artista durante a
intervençã o. As pessoas que passavam por um tú nel no momento da criaçã o da obra Ossá rio
(2006) talvez tenham ficado curiosas, incomodadas ou indiferentes. Geralmente, os motoristas
e pedestres passam apressados pelos tú neis das grandes cidades e as autoridades também nã o
esperam que aconteça alguma coisa fora do habitual, como uma intervençã o artística, nesses
locais.

A criaçã o artística é a construçã o de um discurso que se constitui de ideias, materiais,


linguagens e argumentos poéticos e a necessidade de expressá -los de algum modo. Cabe a
quem cria descobrir, mesmo em meio a uma caó tica cidade, uma potência que deflagre um
processo de criaçã o.

Os seres humanos sempre fizeram intervençõ es em seu ambiente. Em meio a florestas e


desertos, criaram cidades, mudaram a direçã o de rios e construíram objetos capazes de
modificar a vida natural. Nesse sentido, realizar intervençõ es foi um modo que nó s, seres
humanos, encontramos para criar.
Pá gina 99

A intervençã o urbana, como linguagem artística, procura uma comunicaçã o direta com o
pú blico. É mais uma forma que os artistas encontram para manifestar seus pensamentos.
Trata-se de uma potência poética, uma linguagem expressiva e explícita, pois o cidadã o que
passa pelo local em que está acontecendo a intervençã o urbana geralmente não escolhe ver ou
ouvir, ele é “capturado” pela obra de arte e estabelece um contato com o discurso do artista,
expressado sob a forma de esculturas, grafites, cartazes, cenas de teatro, dança e mú sica ao ar
livre, projeçõ es de imagens, entre outras manifestaçõ es artísticas. Esse tipo de arte procura
interagir com o pú blico e surpreendê-lo. Apresenta uma provocaçã o para que as pessoas
reflitam sobre a vida, as sociedades, os ambientes...

Alexandre Orion escolheu a superfície das estruturas da parede do Tú nel Max Feffer, na
capital do estado de Sã o Paulo. Usou a pró pria poluiçã o da cidade, em grande parte depositada
como poeira e fuligem vinda do escapamento dos carros que ali passam todos os dias, e
pedaços de pano como ferramentas para desenhar. Esses eram os materiais para construir seu
argumento. Sua arte surgiu de onde só havia uma superfície escura, na forma de uma imagem
perturbadora composta de muitas caveiras, como em um ossá rio de seres humanos que
pereceram na cidade, contaminados pela poluiçã o.

Na arte, criar é dar forma a algo que antes nã o estava ali – ou pelo menos nã o era
facilmente perceptível –, é transmitir o que se pensa, é construir argumentos com base em
imagens, palavras, gestos ou sons. Na obra Ossá rio, a imagem fala por si mesma, porque foi
elaborada com o mesmo material que contamina as pessoas que vivem nas grandes cidades. O
artista pensa e seu pensamento tem um poder, o que em arte é chamado de potência criativa.
Como precisa dizer algo, o artista cria uma forma poética de discursar, de construir um
argumento, um modo de fazer algo com materiais e procedimentos, de dar uma forma a suas
ideias. Há todo um processo a ser construído entre pensar e fazer.

A arte de ALEXANDRE ORION


Alexandre Orion (1978-) fez a intervençã o Ossá rio em vá rias etapas de trabalho nas
estruturas das paredes do Tú nel Max Feffer, na cidade de Sã o Paulo (SP), entre os meses de
julho e agosto de 2006. Trabalhando de madrugada, vá rias vezes foi questionado pelas
autoridades policiais e fiscais, que viam com estranheza e como provocaçã o a técnica do
artista. Contudo, o que Orion fazia nã o podia ser considerado um crime, porque ele utilizou a
técnica do grafite reverso (també m conhecido pelas expressõ es inglesas reverse graffitti, eco-
tagging ou green graffiti), que consiste em remover a matéria da superfície em que trabalha.
No caso da obra Ossá rio, usando uma má scara para se proteger da fuligem, ele limpou á reas da
estrutura das paredes do tú nel com pedaços de pano, criando as caveiras. No processo de
relaçã o entre figura e fundo, positivo e negativo, ele foi revelando um conjunto de imagens que
chegou a ter 160 metros de extensã o.

O processo de criaçã o da obra Ossá rio pode ser visto no site do artista (veja a indicaçã o
no boxe Dica para navegar) e em outros sites na internet. É muito comum os artistas fazerem
registros de suas obras, principalmente das intervençõ es urbanas, que sã o artes efêmeras.

Arte efêmera: tipo de arte que nã o tem cará ter de permanê ncia. Os artistas geralmente fazem registros das suas
obras em fotografias e vídeos para apresentá -las a outras pessoas em outros locais e momentos diferentes daqueles em que
a intervençã o tenha ocorrido, ou somente para documentar a realizaçã o do projeto.

Palavra do artista
“Meus projetos surgem do pensamento, penso muito antes de começar algo. [...] Sempre
me preocupou a ideia de o grafite ser egoísta, de usar o espaço pú blico para expressar algo
pessoal, e eu queria que ele fizesse parte da vida, queria que a cidade nã o fosse apenas o
suporte, mas a plataforma. [...] Em Ossário a demanda era outra. Visitei um dos tú neis de Sã o
Paulo, saí de lá com a certeza de que podia desenhar limpando, mas também assustado com a
quantidade de poluiçã o que encontrei. A ideia da intervençã o concretizou-se quando entendi
de que maneira eu usaria a técnica para construir o discurso. E esse é o dado mais importante
do Ossário: a relaçã o intrínseca entre a técnica, o local e o discurso. Uma coisa conduz a
outra.”

Alexandre Orion

BRAZ, Endrigo Chiri. A arte urbana de Alexandre Orion. Revista Cult, ed. 145, abr. 2010. Disponível em:
<http://revistacult.uol.com.br/home/2010/04/a-arte-urbana-de-alexandre-orion/>. Acesso em: 5 jan. 2016.

Ivan Shupikov

O artista multimídia Alexandre Orion interage com a cidade de maneira singular. Foto de 2014.
Pá gina 100

A arte de GABRIEL O PENSADOR


Mú sico, compositor e escritor, Gabriel o Pensador tem sua arte marcada pela crítica e
criatividade na maneira de expressã o sobre assuntos polêmicos como política, economia,
educaçã o, violência, qualidade de vida, entre outros. Ele começou sua carreira na década de
1990, e vem se destacando desde entã o como um dos mais populares mú sicos do rap, ritmo
que, assim como a linguagem do grafite, está ligado à cultura hip hop. No entanto, Gabriel nã o
se limita a um ú nico gênero musical, e está sempre pesquisando outros sons, ritmos e rimas em
que possa misturar letras e melodias de mú sicas de outros compositores, poesias e citaçõ es de
poetas e pensadores. Embora busque se nutrir esteticamente de outras obras e tenha vá rios
parceiros em suas criaçõ es, a mistura que ele faz acontece dentro de um estilo pró prio, um
modo pessoal de expressã o, sobre o qual observa, guarda em sua memó ria e imagina o que
possa ser um mundo melhor. Nesse processo, ele acumula em seu repertó rio cultural uma
imensa quantidade de frases, fatos, sonhos, criando, assim, sua obra. É assim que esse artista
acaba deixando um recado: para que as pessoas “se liguem”, pensem, porque o pensamento
tem poder. Para criar é preciso ser um pensador, como ele.

Cultura hip hop: manifestaçã o cultural que tem sua origem na dé cada de 1970 em locais urbanos de países como
Jamaica, Estados Unidos e alguns países da Amé rica Latina, entre estes o Brasil. De forte influê ncia das camadas
afrodescendentes desses países, a cultura hip hop (do inglê s hip – quadril; e hop – pulo) tem como proposta criar
principalmente mú sica e dança, em ritmos de batidas bem marcadas, com pausas e rimas que se repetem, divulgando um
pensamento contestador e crítico sobre a realidade, os sonhos e as esperanças por um mundo melhor. Há muitas
manifestaçõ es dentro dessa cultura que podem ser vistas nos grandes centros urbanos em todo o mundo, uma vez que essa
esté tica artística e social se espalhou e se adaptou a cada lugar e cultura local. Fazem parte da cultura hip hop o rap (rhythm
and poetry – ritmo e poesia), o DJ (disc-jó quei), o MC (master of cerimonies – mestre de cerimô nias), as danças de
movimentos improvisados, como o breakdance, a street dance (dança de rua) e as linguagens do grafite. També m podemos
perceber um estilo de se vestir e falar dos adeptos dessa tendê ncia cultural. Atualmente, há muitas outras manifestaçõ es
artísticas nascendo com base nessa esté tica, uma vez que a cultura está sempre fluindo.

Palavra do artista

“O rap traz coragem para um garoto adolescente, estimula o cara a ter opiniã o pró pria, a
querer se expressar, de estar consciente, de se informar, de evoluir intelectualmente.”

Gabriel o Pensador

DAMIÃ O, Renato. “Meu rap é para um pú blico misturado”, diz Gabriel O Pensador ao unir hip-hop e forró . UOL, 23
dez. 2012. Disponível em:<http://musica.uol.com.br/noticias/redacao/2012/12/23/meu-rap-epara-um-publico-misturado-
dizgabriel-o-pensador-ao-unir-hiphop-e-forro.htm>. Acesso em: 5 jan. 2016.

Celso Pupo/Fotoarena/Folhapress

Gabriel o Pensador apresentando-se no Museu de Arte Moderna (MAM), no Rio de Janeiro, RJ, em dezembro de 2010.

Ofício da arte

Grafiteiro(a)
O grafite durante muito tempo foi considerado uma linguagem marginal, porém com a
preocupaçã o da revitalizaçã o urbana, o trabalho do grafiteiro alcançou respeito e notoriedade.
O trabalho desse profissional pode cobrir grandes á reas ou deixar marcas em detalhes pelas
paredes da cidade, e dependendo da técnica, poética e reconhecimento profissional do artista,
esse trabalho pode ser bem remunerado.

Por meio de alguns cursos e oficinas disponíveis no mercado é possível se especializar


em uma das linguagens do grafite e atuar de forma autô noma.

A língua da arte: o grafite reverso


No processo de criaçã o em arte, é importante conhecer técnicas e materiais já
empregados em diferentes épocas, mas também é fundamental que o artista experimente,
arrisque-se a criar com materiais inusitados. O grafite reverso é uma possibilidade de
expressã o artística que experimenta novos materiais e maneiras de criar arte. Os artistas que
exploram esse procedimento usam poeira, sujeira, á gua, gelo e outros materiais, dos mais
variados. O princípio do grafite reverso é a subtraçã o (retirada de matéria do suporte), ao
contrá rio da pintura em tela, que usa o procedimento de adiçã o (colocaçã o de tinta sobre o
suporte, por exemplo).

Grafite reverso: linguagem artística ligada ao grafite em que o artista remove materialidades. Poeira, tipos de
sujeiras, vegetaçã o e outros materiais sã o removidos com vá rias ferramentas (desde um pedaço de pano a má quinas de
limpeza), em vez de adicionar tinta, como acontece em outros tipos de grafite. Esse tipo de arte geralmente está ligada a
ideologias em defesa do meio ambiente, conscientizaçã o do uso dos espaços urbanos e críticas sociais.

Alexandre Orion. 2006-2011 (www.alexandreorion.com). Acervo do artista

O artista Alexandre Orion em ação. Detalhe da intervenção urbana Ossário, 2006-2011, na estrutura do Túnel Max Feffer,
em São Paulo, SP.
Pá gina 101

No Brasil e em outras partes do mundo, artistas fazem experiências com materiais que
possam servir para seus projetos. Na pá gina anterior, podemos observar mais um detalhe da
intervençã o urbana de Alexandre Orion. Na Bélgica, o artista Stefaan De Crook, conhecido
como Strook, utilizou á gua como matéria e uma lavadora de alta pressã o como ferramenta
para fazer uma intervençã o em um muro da cidade de Leuven. Muros antes cobertos por
musgos tornaram-se suporte para sua arte. O musgo na parede é a marca do tempo, e a á gua
que limpa ao mesmo tempo desenha. Observe a imagem do artista em açã o.

Stefaan De Crook. 2011. Acervo do artista (www.strook.eu)

Stefaan De Crook em ação na produção de grafite reverso, em Leuven, Bélgica, 2011.

Muitos artistas, antes de executarem seus projetos, fazem esboços, enquanto outros
criam diretamente sobre o material escolhido. Assim, estudar e compreender as relaçõ es entre
figura e fundo e contrastes entre tons claros e escuros pode ajudar na execuçã o do projeto
artístico. No grafite reverso, os artistas exploram esses contrastes para fazer surgir a imagem.

E você? Onde pode encontrar suportes e materiais para fazer um grafite reverso? Pode
ser, por exemplo, o quadro da sua sala de aula com as marcas de giz. O desenho pode ser feito
com um pano umedecido com á gua. O muro da escola pode ter marcas do tempo, como fuligem
ou musgo. Um vidro de carro empoeirado ou com sereno da madrugada também pode se
tornar a sua base. Tudo pode servir para experimentar e fazer arte.

Giro de ideias: Liberdade de expressã o


Como você e seus colegas acham que uma obra de arte é criada, seja uma mú sica ou um
grafite? Vamos conversar a respeito de processos de criaçã o na arte?

Na letra da mú sica Se liga aí, de Gabriel o Pensador, que abre este capítulo, há um trecho
que diz:

“A gente pensa que vive num lugar onde se fala o que pensa.
[...]
Eu nã o conheço esse lugar!
A gente pensa que é livre pra falar tudo que pensa mas a
gente sempre pensa um pouco antes de falar!
[...]”

O PENSADOR, Gabriel; LIMA, Aninha; LIMINHA. Se liga aí. Inté rprete: Gabriel o Pensador. In: Seja você mesmo
(mas não seja sempre o mesmo). Sã o Paulo: Sony, 2001. CD. Faixa 1.
Pá gina 102

Agora, analisando o que foi dito sobre as obras de Gabriel o Pensador e de Alexandre
Orion neste capítulo, reflitam:

• O que você e seus colegas pensam sobre a liberdade de expressã o?

• Para criar, é importante ter liberdade?

• Como vocês interpretam esse trecho da letra?

• Como veem o processo de criaçã o da obra Ossá rio, de Alexandre Orion?

• E sobre as linguagens do rap e do grafite na intervençã o urbana, o que vocês têm a


dizer?

Escreva aqui sobre suas conclusõ es apó s as reflexõ es com os colegas.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre a intervençã o urbana Ossá rio consultando este site: <http://tub.im/xxk8p5>
(acesso em: 21 abr. 2016). Alexandre Orion nasceu em Sã o Paulo, estudou artes visuais e tem se dedicado a
fazer grafites e intervençõ es urbanas desde 1995. Em sua arte, ele mistura as linguagens da fotografia, do
vídeo, da pintura, do desenho, procurando sempre utilizar materiais inusitados.

Criaçã o como improvisaçã o


Imaginem a cena: o amanhecer. Teatro lotado, um ator no palco, dormindo em sua cama,
e outros na coxia, esperando sua vez de entrar em cena. Todos ainda no escuro do início do
espetá culo. Ouve-se o terceiro sinal, a peça vai começar. Surge o som de um galo cantando,
sugerindo o anunciar do amanhecer. A ideia da cena inicial era o amanhecer em uma fazenda.
Entretanto, a luz que representaria o amanhecer simplesmente nã o acendeu. O que fazer? A
primeira fala do texto é: “Ah! Que lindo amanhecer! O dia será ensolarado!”. Contudo, a luz nã o
acendeu e o dia não clareou. Qual a soluçã o do problema? O espetá culo nã o pode parar.

Para o espetá culo teatral continuar, o grupo deve improvisar uma saída para o
problema. O que o ator vai fazer? Improvisar uma fala? E o técnico de iluminaçã o, como
resolverá o problema? E os outros atores, o que farã o?

O teatro, como uma arte do “aqui e agora”, recorre, em vá rios momentos, à improvisaçã o
como saída para problemas que surgem inesperadamente. Um ator que esquece o texto deve
improvisar outro imediatamente. Um objeto que cai inesperadamente em cena ou uma
interferência sú bita de alguma pessoa da plateia também devem ser considerados. Sã o
inú meros os casos em que os atores em cena se veem obrigados a improvisar algo para
continuar o espetá culo.

Além dessas possibilidades, em que a improvisaçã o em cena é a tentativa de uma


soluçã o para resolver um problema, exigindo criatividade e agilidade, há outra forma de
improvisaçã o. Trata-se da improvisaçã o como técnica ou recurso, da qual o grupo de atores e
atrizes se apropria como proposta de criaçã o para determinado espetá culo.
Pá gina 103

Improvisaçã o como técnica teatral


A improvisaçã o no teatro pode acontecer em funçã o de um problema que surge na hora
do espetá culo, mas há companhias de teatro que criam jogos teatrais em que a improvisaçã o
faz parte da técnica e da concepçã o cênica adotada na criaçã o da peça.

Um jogo teatral com improvisaçã o pode acontecer em vá rios locais, com base em muitas
situaçõ es. Para que ele aconteça, precisamos que as pessoas que jogam estejam predispostas a
brincar, a jogar e a enfrentar os desafios na improvisaçã o. É preciso fazer alguns combinados
para que o jogo teatral de improvisaçã o dê certo:

• Quem serã o os jogadores.

• Quais serã o as regras.

• Qual será a duraçã o do jogo.

• Qual será o problema que vai gerar a improvisaçã o.

O jogo de teatro com improvisaçã o é uma forma de criaçã o artística que mostra que
aprender e criar podem ser processos divertidos e prazerosos. O grupo teatral Jogando no
Quintal tem como proposta a improvisaçã o. Assim, o grupo convida a plateia para participar do
espetá culo a todo o momento. A proposta desse grupo é o jogo, e para que isso aconteça cria
um ambiente no cená rio que lembra uma partida de futebol. Placar, bola, figurinos com roupas
de times, um juiz e outros detalhes dã o o tom ao espetá culo. Os atores caracterizam-se de
palhaços. Mú sicos criam uma atmosfera de torcida, em que o pú blico é convidado a participar
dessa turma de jogadores e torcedores. Tudo com muito humor e criatividade. Ideias e
problemas sã o escolhidos pelos jogadores assim como objetos e membros da plateia, que
ajudam a criar desafios e soluçõ es e se tornam cenas de espetá culos. Cada vez que assistimos a
um espetá culo como esse do Jogando no Quintal, vemos uma peça diferente, porque a dinâ mica
do jogo e da improvisaçã o cria novas situaçõ es. O grupo faz uma mistura do palhaço, da
pantomima, do roteiro e da improvisaçã o. Cada espetá culo é ú nico.

Pantomima: Representaçã o teatral em que os atores exprimem unicamente por meio de gestos os sentimentos, as
paixõ es, as ideias, utilizando a expressã o facial e corporal.

Improvisação: recurso de encenaçã o teatral pelo qual se procura obter a açã o dramá tica com base na
espontaneidade e na habilidade de adaptaçã o à s situaçõ es vividas pelos atores.
Cena da peça teatral Jogando no Quintal. Desde 2001. Direção: Cesar Gouveia. Foto: Acervo do Grupo de teatro

Nesta imagem, o grupo Jogando no Quintal cria e improvisa um carro usando apenas dois pneus.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre o grupo Jogando no Quintal, seu método e seus projetos visitando este site:
<http://tub.im/3unq6f> (acesso em: 25 abr. 2016).
Pá gina 104

Giro de ideias Jogo de improvisaçã o teatral


Nas montagens do grupo Jogando no Quintal, o que torna cada jogo tã o especial é o fato
de todas as cenas serem criadas na hora, ao calor da situaçã o, e com toda a anarquia e a
irreverência de seus jogadores. Por esse motivo, podemos dizer que cada partida é um
espetá culo ú nico, que jamais se repetirá .

Qualquer objeto pode dar uma boa cena de teatro. É só ter a disposiçã o de inventar!
Convide os colegas para esse tipo de jogo!

Vamos experimentar jogar e improvisar no teatro? Combine com os colegas:

• cada um deve trazer para a aula um objeto qualquer;

• coloquem os objetos dentro de uma caixa;

• formem grupos de cinco a sete pessoas para jogar de cada vez (quem nã o estiver
jogando atua como plateia);

• uma pessoa da plateia vai até a caixa e retira um objeto e, com base no que o objeto
pode sugerir, propõ e um desafio para o grupo de atores/jogadores;

• os jogadores têm de criar uma cena para resolver o desafio dado;

• a plateia também pode dar palpites sobre como o desafio pode ser resolvido.

Agora, registre os desafios e as cenas que achou mais interessantes e por quê.

Conexõ es Arte e Meio ambiente


Açã o artística
A poluiçã o deixa marcas concretas nas cidades. Ao passar a mã o em uma parede, um piso ou
na superfície de um objeto qualquer, é possível percebermos as manchas escuras: é a sujeira da
cidade. A crítica feita pelo artista Alexandre Orion, ou melhor, sua argumentaçã o poética, na
intervençã o urbana Ossá rio, causou polêmica nas esferas pú blicas e repercutiu na imprensa. A
poeira usada pelo artista pode estar nos muros e tú neis da sua cidade? Como você vê as políticas
pú blicas para diminuir a poluiçã o em centros urbanos?

Nos debates internacionais sobre o meio ambiente, algumas questõ es têm sido colocadas
como prioritá rias nas açõ es do poder pú blico e na iniciativa de empresas privadas. Entre elas estã o:
a reduçã o de impostos para atitudes que previnem a poluiçã o ambiental, a educaçã o para uma
responsabilidade ambiental coletiva e o incentivo ao desenvolvimento de propostas para
tecnologias ambientalmente sustentá veis.

Você sabe dizer como sua cidade tem lidado com essas questõ es? Promova uma discussã o
sobre meio ambiente com base no discurso feito pelo artista Alexandre Orion em sua obra Ossá rio.
Pesquise sobre outros artistas que tratam de questõ es ambientais em suas obras de arte.
Esse tipo de intervençã o artística já aconteceu em sua cidade? O que você acha do tema poluiçã o
para criar um projeto de arte e meio ambiente? Faça uma pesquisa sobre as intervençõ es urbanas e
o meio ambiente.
Pá gina 105

Conexõ es Arte e Língua Portuguesa


Metá foras em diferentes contextos
Há concursos de mú sica em forma de desafios no rap, as letras elaboradas no improviso
fazem parte do freestyle (estilo livre), que se preocupa com a qualidade e a coerência da
argumentaçã o que se forma em letras de mú sica. Além da rima, outras características sã o
importantes, como a capa cidade de se expressar por metá foras e analogias. Isso ocorre nã o apenas
no rap, mas em outros gêneros musicais da mú sica popular brasileira (MPB), como o samba, a
bossa nova, entre outros, e também em outras linguagens artísticas.

A metá fora consiste em transferência de significados. É criada com base em uma relaçã o de
semelhança que pressupõ e um processo anterior de comparaçã o. Trata-se de uma figura de
linguagem utilizada por letristas e poetas para estabelecer uma analogia de significados entre
palavras ou expressõ es. Pode brincar com a imaginaçã o, enriquecer uma frase poética e criar
possibilidades de duplo sentido ou ambiguidade. Na arte, usar metá foras é mais do que migrar
significados, é construir um discurso que estabelece relaçõ es e inter-relaçõ es entre o que está
sendo dito e seus possíveis sentidos.

Estudar a língua pá tria é importante para vá rios aspectos da nossa vida, tanto pessoais
quanto profissionais. E quanto mais conhecemos a língua do nosso país, por exemplo, mais
capacitados estamos para criar metá foras em letras de mú sicas. É como em um jogo, em que é
preciso conhecer as regras para compreender e fazer as melhores jogadas.

O compositor, mú sico e poeta baiano Gilberto Gil (1942-) criou uma cançã o para falar da
metá fora na arte. Observe como ele trata o tema no trecho da mú sica Metá fora (1982):

"Uma lata existe para conter algo.


Mas quando o poeta diz: “Lata”
Pode estar querendo dizer o incontível
[...]"

GIL, Gilberto. Metá fora. In: Um Banda Um. Rio de Janeiro: Warner, 1982. CD. Faixa 3.

Há um discurso na linguagem dessa mú sica que fala do processo de criar arte. O compositor
também diz que as palavras podem assumir outros significados em funçã o da poética de cada
artista. Conheça a letra na íntegra e ouça a mú sica Metá fora, fazendo buscas em sites da internet.

Na palavra metá fora, originada do grego antigo, meta indica tempo, lugar ou direçã o,
enquanto fora significa “levar”. O processo metafó rico permite-nos ver as coisas diferentemente,
para pensar em novas ideias, novas relaçõ es entre palavras, sons, imagens, gestos...

Outro exemplo de metá fora na mú sica popular brasileira é a cançã o Cá lice (1973), do
compositor e escritor carioca Chico Buarque de Hollanda (1944-) em parceria com Gilberto Gil, em
que a sonoridade da palavra “cá lice” é utilizada com duplo sentido pelos autores. É feita uma
analogia entre o objeto “cá lice”, que tem relaçã o com passagens do Novo Testamento da religiã o
cristã, pela hesitaçã o entre fugir ou ser pego em pleno sofrimento, e a forma verbal “cale-se”, no
contexto da imposiçã o do silêncio, que, na época, era determinada pelo governo militar, que
impunha a censura nos tempos de ditadura no Brasil (1964-1985). Observe a imagem e o trecho a
seguir.
Pá gina 106

Acervo Memórias Reveladas do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro

Reprodução do veto à música Cálice, de Chico Buarque e Gilberto Gil. Na imagem, é possível visualizar o carimbo de MJ-
DPF-DCDP/DR/GB (Ministério da Justiça – Departamento de Polícia Federal – Divisão de Censura de Diversões Públicas – Delegacia
Regional – Guanabara). A data provável de autorização definitiva desse ato de censura é 10 de maio de 1973, como está manuscrito
no visto do documento.
Pá gina 107

"[...]
Pai! Afasta de mim esse cá lice
De vinho tinto de sangue
Talvez o mundo nã o seja pequeno (Cale-se!)
Nem seja a vida um fato consumado (Cale-se!)
Quero inventar o meu pró prio pecado (Cale-se!)
Quero morrer do meu pró prio veneno (Pai! Cale-se!)
Quero perder de vez tua cabeça! (Cale-se!)
Minha cabeça perder teu juízo. (Cale-se!)
Quero cheirar fumaça de ó leo diesel (Cale-se!)
Me embriagar até que alguém me esqueça (Cale-se!)"

BUARQUE, Chico; GIL, Gilberto. Cá lice. In: BUARQUE, Chico. Chico 50 anos, o político. Rio de Janeiro: Polygram,
1994. CD. Faixa 3.

A letra foi censurada em 1973 e liberada somente em 1978, quando Chico Buarque gravou a
mú sica com Milton Nascimento (1942-) e o grupo MPB4 (grupo instrumental e vocal masculino em
atividade desde 1965). Ainda em 1978, a cantora baiana Maria Bethâ nia (1946-) regravaria a
mú sica. Em 2010, a cantora baiana Pitty (1977-) fez uma versã o rock e, recentemente, o paulista
Criolo (1975-), cantor muito influenciado pelo rap, criou outra versã o de letra para a melodia, em
que retrata a realidade atual dos bairros da periferia das grandes cidades ao mencionar questõ es
relacionadas a segurança, drogas, entre outras.

"Como ir pro trabalho sem levar um tiro


Voltar pra casa sem levar um tiro
Se as três da matina tem alguém que frita
E é capaz de tudo pra manter sua brisa
[...]
Pois na quebrada escorre sangue, pai.
Pai
[...]"

CRIOLO. Cá lice. In: Nó na orelha. Rio de Janeiro: Universal, 2011. CD. Faixa 4.

Pesquise mais sobre a metá fora, tanto em mú sicas quanto em outras linguagens da Arte.
Nelson Antoine/Estadão Conteú do

O cantor Criolo, nome artístico de Kleber Cavalcante Gomes, mistura os ritmos do rap com vários outros estilos, como
funk e soul estadunidenses, samba e MPB. Na foto, Criolo apresentando-se na Virada Cultural, evento com 24 horas seguidas de
apresentações artísticas, em São Paulo, SP, em maio de 2013.
Pá gina 108

Projeto experimental
Improvisaçã o e ritmo
O rap é um gênero musical que mistura sons e poesia, palavras quase faladas, ritmadas em
sons que dã o pausas e marcas sonoras repetidas. Há uma pulsaçã o entre sons e falas (já criados ou
improvisados) que expressam o pensamento do artista. O cantor de rap, se quiser, pode utilizar
técnica vocal para imitar os sons e as pausas, como os que ouvimos quando um DJ manipula um
disco de vinil ou cria efeitos em uma mesa de som ou computador. No caso do grupo do cantor
Marcelo D2, há também a presença do artista Fernandinho Beat Box, que, além da funçã o de
backing vocal (vocal de apoio), realiza o beatbox. Observe abaixo a foto desses dois artistas se
apresentando.

Beatbox: termo que significa “caixa de batida”, usado para especificar uma té cnica de percussã o vocal da cultura
hip hop, imitando os sons produzidos pelo DJ ou acrescentando outros sons. Essa té cnica, alé m da voz, també m pode usar o
corpo como suporte, como instrumento musical. Na maioria das vezes, nã o é o cantor principal quem utiliza essa té cnica em
uma apresentaçã o ou gravaçã o, mas um convidado ou vocal de apoio.

Há muitos estilos usados no rap. Um deles é conhecido como freestyle (estilo livre), que
explora a improvisaçã o. Em outros gêneros musicais, artistas também utilizam o improviso na
criaçã o, como no repente.

Repente: tipo de poesia musicada da cultura brasileira, principalmente na regiã o Nordeste, realizada por mú sicos
repentistas e cordelistas. Os repentistas exploram instrumentos como violã o, violas, sanfonas, triâ ngulos e outros. Muitas
vezes criam mú sicas rimadas e poemas de improviso.

A composiçã o de um rap pode ser feita como em um jogo entre você e os colegas. Nesse
momento, é oportuno o questionamento: o que você e a turma estã o descobrindo sobre processos
de criaçã o na arte?

A obra de intervençã o urbana Ossá rio, de Alexandre Orion, e a mú sica Se liga aí, de Gabriel o
Pensador e seus parceiros, foram apresentadas como exemplos de criaçã o na arte. Quando tratamos
dos processos de criaçã o em arte, quais palavras vêm à cabeça?

Escreva as palavras que vierem à sua mente cada uma em um pedaço de papel, dobre o papel
e coloque-o em uma caixa.

Para obter mais palavras e deixar o jogo mais divertido, convide os colegas a fazer o mesmo.

Para jogar, um colega vai até a caixa e tira uma palavra e, em ritmo de rap, cria uma frase (ou
mais, conforme quiser) com base nessa palavra. Na sequência, outro colega ou você mesmo tira
mais uma palavra, e o fluxo do jogo segue de forma improvisada na criaçã o de rimas até que
acabem todas as palavras de dentro da caixa ou até que vocês decidam parar.

Observe a seguir algumas dicas para que o jogo fique mais dinâ mico e divertido.

• Se algum componente do grupo tiver dificuldade em criar a rima, a turma pode ajudá -lo,
dando a ele a chance de retirar mais uma palavra.
• Enquanto o colega estiver pensando, a turma pode dar a ele mais um tempo para a
elaboraçã o da rima (para que o jogo nã o perca o ritmo, combinem antes um refrã o que todos
possam cantar até que o colega prossiga com a brincadeira).

• Como se trata de uma criaçã o coletiva, ela exige a cooperaçã o e a compreensã o de todos.
Coloque-se sempre no lugar do colega. Como pode haver maior potência criativa em uma palavra
que em outras, nã o se deve desvalorizar a rima dos colegas; ao contrá rio, deve-se dar apoio para
que o resultado, que é a mú sica, fique interessante e rico nas rimas e na mensagem.

• Enquanto uma parte do grupo estiver criando rimas, outros colegas anotam a letra da
mú sica composta.

• Outra parte da turma pode fazer sons, criando o ritmo da mú sica com a boca, as mã os ou
com objetos disponíveis.

• Se na escola tiver um toca-discos (vitrola ou, como os DJs chamam, pickup), um colega pode
ser o DJ e brincar com sons entre pausas, repetiçõ es e outros efeitos.

• Formem também um grupo de dança; se vocês sentirem vontade de dançar, é só seguir o


ritmo.

• Certamente, esse momento será ú nico e especial. Entã o, que tal fazer um vídeo para
registrar essa criaçã o? Além de assisti-lo e fazer sessõ es para apresentar a produçã o do grupo a
outras turmas, vocês podem socializar a apresentaçã o na internet, se todos concordarem.

Janilton Eloy/D.A Press

Marcelo D2 e Fernandinho Beat Box apresentando-se no Estádio Olímpico João Havelange (Engenhão), no Rio de Janeiro, RJ,
em março de 2012.
Pá gina 109

TEMA 2 CRIAÇÃO E REGISTRO


da mú sica.

"Ora, talvez a dança seja a forma de manifestaçã o artística que guarda a


ligaçã o mais íntima com o corpo. É a ú nica forma de expressã o em que o corpo do
artista se torna plenamente uma obra de arte"

BARRENECHEA, Miguel Angel; CASANOVA, Marco Antonio; DIAS, Rosa; FEITOSA, Charles (org.). Assim falou Nietzsche III:
para uma filosofia do futuro. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2001. p.35.

Tobias Schwarz/Reuters/Latinstock

Dançarinos durante show de dança e música do Ballet Revolución, em Berlim, em 2012.

Na dança contemporâ nea, há a preocupaçã o em valorizar a criaçã o com base nas


emoçõ es e percepçõ es do universo particular dos atores bailarinos. Em muitas companhias de
dança, o trabalho acontece de modo colaborativo, em que todos contribuem dando ideias e
opiniõ es sobre a criaçã o de uma coreografia. Os movimentos do dia a dia também podem ser
pesquisados para a criaçã o na linguagem da dança, sendo possível explorar tarefas das mais
corriqueiras, como escovar os dentes, à s mais complexas, como criar um movimento em uma
coreografia. Nosso corpo traz a expressã o que vem de uma vida caracterizada pelas dimensõ es
psicoló gica, afetiva e cultural. Aprendemos a nos expressar por meio de movimentos. Ao
estudar nosso corpo e o que ele pode fazer, ou seja, como se mexe, dobra, salta, se posiciona,
entre outras experiências do movimento, desenvolvemos a consciência corpó rea,
conhecimento fundamental para a criaçã o na linguagem da dança.
Para estudar os elementos da dança, pensem em como seu pró prio corpo se move. Em
que tempo: rapidamente, lentamente, de maneira contínua ou em pausas? Qual a intensidade
do movimento? Vocês colocam muita força ou fazem movimentos leves? Como seu corpo e o
dos colegas se movimentam na sala ou no pá tio? Fazem movimentos pró ximos ao chã o ou dã o
saltos, alcançando planos mais amplos? Em que direçã o os movimentos sã o feitos? Na fluência
dos movimentos, como os corpos interagem uns com os outros? Qual a dinâ mica do
movimento? Como vocês estã o fazendo os movimentos?

Pensar nessas questõ es pode motivar sua percepçã o corporal para começar a
compreender os elementos na dança descritos pelo bailarino hú ngaro Rudolf Laban (1879-
1958). Na linguagem da dança, Laban chamava a atençã o para o estudo dos seguintes
elementos de linguagem corporal: tempo, força/peso, espaço e fluência. Com base inicial nesse
estudo, podemos criar partituras de dança que registram os movimentos corporais.

A arte de RUDOLF LABAN


Rudolf Laban (1879-1958), considerado um dos principais criadores da dança-teatro, foi
um artista hú ngaro pesquisador da arte da dança. Sempre valorizou o estudo do movimento,
desde aquele presente nas açõ es cotidianas até os que formam as mais elaboradas
coreografias. Para Laban, o movimento está sempre em processo de mudança, em mutaçã o.
Fazemos uma açã o e logo em seguida criamos outras. A cada açã o, reorganizamos o
movimento em ritmos, intensidades e fluências. Podemos criar uma partitura de movimentos
ao prestar atençã o em nossas açõ es. O movimento, para Laban, é uma linguagem e, portanto,
tem seus pró prios có digos, que podem ser organizados e reorganizados para construir sentido,
demonstrar sentimentos, ideias, sensaçõ es e, assim, criar na arte da dança.
Pá gina 110

Embora tenha deixado explicado que somos livres para criar nossos movimentos, Laban
também criou vá rios estudos mostrando uma sintaxe do movimento do corpo. Alguns aspectos
de aná lise do movimento no estudo de Laban:

• no estudo do corpo, investigou como ele se move, organiza gestos, posturas e interage
com o espaço e outros corpos;

• sobre o esforço, pesquisou as qualidades do movimento, tanto interno quanto externo,


os ritmos, as dinâ micas e como o corpo se move determinado pelas relaçõ es com peso, fluxo,
tempo e espaço (movimentos que podem acontecer de modo individual ou em grupo);

• a forma também foi investigada para perceber as possibilidades em relaçã o ao volume


(as formas podem ser contínuas ou pontuais);

• na pesquisa sobre o espaço, Laban explorou a ideia de kinesfera. Imagine um corpo


dentro de um círculo ou outra forma geométrica. Dentro dessa forma, podemos imaginar esse
corpo se movimentando em vá rias direçõ es e alturas. É o estudo de como o corpo ocupa o
espaço, como podemos observar na imagem ao lado.

Kinesfera: conceito estudado por Laban para representar a forma do limite de ocupaçã o do espaço de cada um. É o
estudo de como ocupamos o nosso espaço individual e como podemos alcançar limites ao esticar as partes do nosso corpo
em qualquer direçã o, a partir de um ponto de apoio.
Julie Lemberger/Corbis/Latinstock

Esquema apresentando o conceito de kinesfera. Cena do Ballet Contemporâneo Alonzo King em Scheherazade, Mônaco,
Monte Carlo, 2009.

Palavra do artista

“[...] O movimento, portanto, revela evidentemente muitas coisas diferentes. É o


resultado ou da busca de um objeto dotado de valor ou de uma condiçã o mental. Suas formas e
ritmos mostram a atitude da pessoa que se move numa determinada situaçã o. Pode tanto
caracterizar um estado de espírito e uma reaçã o, como atributos mais constantes da
personalidade. O movimento pode ser influenciado pelo meio ambiente do ser que se move.”

Rudolf Laban

LABAN, Rudolf. Domínio do movimento. Traduçã o de Anna Maria Barros de Vecchi e Maria Sílvia Mourã o Netto.
Sã o Paulo: Summus, 1978. p. 20.
Ullstein Bild Bild/Getty Images

Rudolf Laban é considerado o maior teórico da dança do século XX. Foto de 1930.
Pá gina 111

O desenho da mú sica
Na mú sica também há a percepçã o de sons do cotidiano. Essa escuta nos ajuda a deixar
os ouvidos atentos e a apreciar melhor nosso universo sonoro, incluindo a mú sica.

Raymond Murray Schafer (1933-), compositor canadense, também mú sico, pedagogo


musical, educador e investigador do ambiente sonoro, desenvolve em suas pesquisas a ideia de
que temos um mundo para ouvir e criar sons, mas é preciso aprender a ouvir de forma
significativa para criar.

A escuta sensível aguça a percepçã o das nuances e parâ metros do som.

Editoria de Arte

Figuras rítmicas para notação musical. A Semibreve é considerada a unidade ou o inteiro, na divisão proporcional de
valores. As outras são frações da semibreve. As figuras, segundo a ordem de seus valores, valem o dobro da seguinte e metade da
anterior. Por exemplo, se a Semibreve durar 4 tempos, a Mínima terá a duração de 2 tempos e assim sucessivamente.

Os sons podem ser registrados por meio de gravaçã o ou da escrita. O registro dos sons
por meio da escrita pode ser feito de muitas maneiras. Uma forma bastante utilizada é a
notaçã o por meio do pentagrama ou pauta, as linhas em que sã o escritas as notas musicais e as
figuras rítmicas usadas para registrar a duraçã o do som. Outra possibilidade é realizar
registros de modo nã o convencional, por meio de desenhos. Como observamos na imagem
abaixo.
Acervo pessoal

Registro gráfico de sons feitos com base na música O Trenzinho do Caipira (1930), de Heitor Villa-Lobos (1887-1959).

Os sons têm qualidades, parâ metros sonoros. Os compositores descrevem essas


qualidades/parâ metros em suas partituras. Sã o có digos combinados na linguagem da mú sica,
convençõ es de uma linguagem inventada há muito tempo e adotadas em todo o mundo. Os
mú sicos estudam esses sinais para identificar as notas, sua altura, duraçã o, intensidade, timbre
e densidade.

Veja um exemplo de partitura, representaçã o grá fica das partes vocais e instrumentais
de uma mú sica, na imagem abaixo.

Acervo pessoal

Exemplo de partitura convencional, representação gráfica das partes vocais e instrumentais de uma música.

Mú sicos e coreó grafos pesquisam os elementos de linguagem e criam fazendo


experiências e registros em pautas ou desenhos, assim como os artistas visuais quando fazem
esboços de seus projetos.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre vida e obra do compositor Heitor Villa-Lobos, visitando o site:
<http://tub.im/bms8bo>. Acesso em: 11 maio 2016.
Pá gina 112

A arte de RAYMOND MURRAY SCHAFER


Além de se preocupar com o universo da mú sica, Schafer investiga também o universo
dos sons de modo geral. Em suas pesquisas, defende a ideia de que o mundo se tornou muito
ruidoso e que esse excesso de sons nos tirou a percepçã o mais atenta e sensível. Para ele, a era
industrial apresenta ao ser humano um mundo de sons produzidos por má quinas, em
contraponto ao campo, que apresenta sons naturais. É preciso explorar nossos sentidos, nossa
percepçã o, para tirar proveito desse mundo sonoro, aprendendo a ouvir e explorar as
potencialidades de sons para criar mú sica e paisagens sonoras no “resgate de uma cultura
auditiva significativa” (SCHAFER, 2001, p. 288). Esse mú sico criou diferentes jeitos de registrar
os sons de uma paisagem sonora ou mú sica.

Paisagem sonora: estudo sobre o mundo sonoro em que vivemos e como essa escuta pode ser ainda mais sensível.
O conceito tem sido difundido por vá rios mú sicos contemporâ neos. R. Murray Schafer, em seus estudos, explora a percepçã o
de sons em diversas situaçõ es e locais, na ampliaçã o de repertó rio e desenvolvimento de escuta sensível.

Palavra do artista

“[...] Se o objetivo da arte é crescer, precisamos viver perigosamente; essa é a razã o por
que digo aos meus alunos que os seus erros sã o mais ú teis que os seus sucessos, pois um erro
provoca mais pensamentos e autocrítica. Uma pessoa bem-sucedida, em qualquer campo, é
muitas vezes alguém que parou de crescer.”

Raymond Murray Schaffer

SCHAFER, Raymond M. O ouvido pensante. Traduçã o de Marisa Trench de O. Fonterrada, Magda R. Gomes da Silva
e Maria Lú cia Pascoal. Sã o Paulo: UNESP, 1991. p. 282.

Frank Lennon/Toronto Star Getty Images

Raymond Murray Schafer é um dos compositores mais renomados do seu país (Canadá). Foto de 1973.

Giro de ideias Percepçõ es


Vamos fazer uma enquete!

• Como percebemos os sons no dia a dia?

• Quando uma ideia vem à sua cabeça, você costuma registrá -la? Como?
Combine com os colegas e faça registros grá ficos de sons, como vimos na pá gina
anterior, que vocês podem perceber no caminho de ida e volta entre sua casa ou trabalho e a
escola. Observando esses registros, conversem sobre como cada um nota esses sons e também
como fazem seus registros.

Agora, resuma aqui suas conclusõ es sobre a enquete, os registros e as conversas com os
colegas sobre as percepçõ es que vocês captaram.
Pá gina 113

Conexõ es Arte e Ciências


Todo mundo cria!
"Eu acredito na intuiçã o e na inspiraçã o. A imaginaçã o é mais importante que o
conhecimento. O conhecimento é limitado, enquanto a imaginaçã o abraça o mundo inteiro,
estimulando o progresso, dando à luz a evoluçã o. Ela é, rigorosamente falando, um fator real na
pesquisa científica."

Albert Einstein. In: Sobre religião cósmica e outras opiniões e aforismos, 1931. Disponível em:
<http://super.abril.com.br/blogs/superblog/frase-dasemana-a-imaginacao-e-mais-importante-que-o-conhecimento-
einstein/>. Acesso em: 2 maio 2016.

Bettmann/Corbis/Latinstock

Albert Einstein (1879-1955), físico alemão que desenvolveu a teoria da relatividade. Suas pesquisas transformaram o modo
de pensar no século XX. Foto de c. 1920-1930.

O conhecimento nasce dos encontros na trajetó ria das buscas humanas, que sã o motivadas
pela curiosidade. Diante do que sabemos e do que descobrimos, procuramos dar forma a nossos
pensamentos.

Uma mente inquieta e investigativa encontra meios para criar nas artes, na ciência, em tudo
que está a sua volta. Uma mente inquieta pode provocar outras mentes inquietas a criar.

Os cientistas, como os artistas, criam ideias. Nas ciências, essas ideias se manifestam em
fó rmulas, equaçõ es, teorias que explicam a vida em nosso planeta e até fora dele. Na arte, as ideias
se manifestam em linguagens artísticas. Para criar, é preciso investigar e também estar aberto à
dú vida. É a incerteza que move o mundo. À s vezes, é preciso uma pitada de ó cio para nos colocar a
pensar e descobrir mais dú vidas, hipó teses, possibilidades que nos motivem a criar o novo.

O físico e teó rico alemã o Albert Einstein (1879-1955) dizia que, à s vezes, gostava de ficar por
um tempo sentado em uma poltrona em frente a uma janela, parado, pensando. Talvez algumas
pessoas, ao verem essa cena, dissessem que ele nã o estava fazendo nada. Contudo, pensar é fazer.
Imaginar é importante no processo de criaçã o. Depois, ele tinha o mesmo prazer em passar horas e
dias fazendo anotaçõ es e cá lculos, até chegar a conclusõ es científicas que mudaram a visã o sobre a
Física e sobre o Universo.

A verdade, as ideias dos cientistas, assim como as dos artistas, nem sempre sã o
compreendidas em seu tempo. Artistas e cientistas podem ter processos parecidos na criaçã o de
suas obras e enfrentar as mesmas dificuldades na aceitaçã o de suas ideias. É preciso ter raciocínio e
intuiçã o para criar, e isso nã o tem nada a ver com loucura, mas sim com a capacidade de observar,
memorizar, indagar, investigar e imaginar.

A mente sempre foi um terreno repleto de mistérios para o ser humano. Pesquise processos
de criaçã o nas artes e nas ciências. Observe também que o processo de criaçã o ocorre tanto na
proposta de novos rumos nas ciências e nas artes como nos acontecimentos cotidianos.

Você já passou por uma situaçã o em que precisou ser criativo? Desenhe ou escreva sobre
essa experiência.
Pá gina 114

Projeto experimental
Registros artísticos
1. Movimentos, criaçã o e registros

Explorando as habilidades em observar, lembrar e imaginar, vamos criar coletivamente uma


coreografia. Combine com os colegas um momento de observaçã o dos movimentos de outras
pessoas. Pode ser durante a ida para a escola, no ô nibus, no metrô , no trem ou andando na rua.
Observe como as pessoas se movimentam, discretamente.

Na escola, proponha uma roda em que você e os colegas possam ver o movimento uns dos
outros. Uma pessoa entra na roda e faz o movimento que foi percebido antes, na sessã o dedicada à
observaçã o. Os demais componentes do grupo interpretam esse movimento e dizem que açã o é. Na
continuidade da proposta, imaginem e criem outro movimento para continuar o primeiro. Assim,
vocês estarã o criando uma sequência coreográ fica. Lembre-se de que você e a turma podem
explorar os elementos e aspectos de aná lise que o bailarino Laban investigou.

Com os movimentos criados e aperfeiçoados, escolham uma sequência de seis ou mais para
organizar uma coreografia. O uso de mú sicas, de sons com o pró prio corpo, de algum instrumento
ou objeto é de escolha do grupo, que pode criar uma dinâ mica interessante à apresentaçã o. Quando
trabalhamos em um projeto colaborativo é importante sempre discutir e escolher em comum
acordo com o grupo. Converse com seu grupo sobre as qualidades do movimento na dança e como
cada um gostaria de fazer o que está sendo criado.

Apó s a realizaçã o dos movimentos na dança com a turma, desenhe como foi essa dança. O
desenho pode ser feito criando imagens abstratas ou figurativas. Use linhas para representar os
elementos tempo, força/peso, espaço e fluência. A proposta é criar uma pauta de movimentos.
Jack Mitchell

A bailarina Martha Graham (1894-1991) marcou a história da dança com seu estilo expressivo e por criar um método de
dança que recebeu seu nome e se baseia na relação entre a respiração, o movimento e o contato com o solo.
Pá gina 115

2. Registro sonoro

Bruno Fischer

De-Cantação, exemplo de notação sonora, não convencional, com base na escuta de sons. Ilustração de Bruno Fischer,
março de 2016.

Observe a partitura grá fica acima. Você pode criar desenhos e imagens de sons e de
combinaçõ es musicais, como neste exemplo. Na mú sica também podemos criar com base no que
observamos, lembramos ou imaginamos. Acompanhe as etapas a seguir.

• Primeiro vamos fazer uma coleta de sons. Pode ser ao andar pela cidade, na escola, em sua
casa, ou outro lugar de sua preferência. Combine com os colegas que cada um utilizará o diá rio de
bordo para fazer anotaçõ es e desenhos para cada som. Trata-se de um processo de criaçã o livre e
cada um terá sua percepçã o e ideia para representar os sons coletados.

• Procure perceber as qualidades e parâ metros de cada som e como podemos desenhar um
som longo, curto, agudo, grave, leve, pesado, á spero, liso. Os desenhos sã o representaçõ es de
paisagens sonoras, sem padrõ es de certo ou errado.

• Com a turma reunida, cada um contará quais sons recolheu e mostrará como os
representou. Procure se lembrar de como era o som observado e reproduza-o com a boca, mã os, um
objeto ou instrumento de sua preferência.

Sugerimos também outra proposta de projeto no registro sonoro. Acompanhe as etapas a


seguir.

• A turma será dividida em dois, quatro ou mais grupos.

• Crie com sua equipe uma partitura que será executada por outro grupo.
• Ensaie com seu grupo como será a execuçã o da partitura que receberam de outra equipe.

• Com a turma reunida, cada equipe vai tocar a partitura que foi composta pelo outro grupo.
Os sons podem ser reproduzidos com a boca, as mã os, um objeto ou instrumento de sua
preferência.
Pá gina 116

TEMA 3 LUGARES PARA


CRIAR
"A uma arte assim cosmopolita, assim universal, assim sintética, é evidente
que nenhuma disciplina pode ser imposta, que nã o a de sentir tudo de todas as
maneiras, de sintetizar tudo, de se esforçar por de tal modo expressar-se que
dentro de uma antologia de arte sensacionista esteja tudo quanto de essencial
produziram o Egipto, a Grécia, Roma, a Renascença e a nossa época. A arte, em vez
de ter regras como as artes do passado, passa a ter só uma regra - ser a síntese de
tudo. Que cada um de nó s multiplique a sua personalidade por todas as outras
personalidades."

PESSOA, Fernando. Páginas Íntimas e de Autointerpretação. Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e
Jacinto do Prado Coelho. Lisboa: Á tica, 1966.

Nã o há um lugar determinado para criaçã o e nem regras, como nos apresenta Fernando
Pessoa no texto que abre o tema. Cada pessoa encontra um canto, um jeito de organizar os
materiais e as ideias para o processo criativo. Na arte contemporâ nea, os artistas usam
materiais muito diversos e seus locais de trabalho podem ser nada convencionais. A arte
também pode acontecer na rua, e um ateliê pode ser montado em local pú blico.

O ateliê pode expressar um universo particular ou coletivo. Na obra do artista francês


Gustave Courbet (1817-1877), que tem como título O ateliê do pintor. Alegoria real, resumo de
7 anos da minha vida de artista (1855), vemos nã o apenas um espaço com objetos e materiais
de pintura, mas o universo particular desse artista. Amigos, familiares, pessoas do povo,
personalidades da época e até animais fazem parte da representaçã o de seu espaço de criaçã o.
Uma visã o do ateliê que nã o contém apenas objetos, um lugar repleto de pensamentos
significativos para a criaçã o. Observe com atençã o esses detalhes na obra apresentada logo
abaixo.
Gustave Courbet. 1854-1855. Ó leo sobre tela. Museu d’Orsay, Paris

O ateliê do pintor. Alegoria real, resumo de 7 anos da minha vida de artista, de Gustave Courbet, 1854-1855. Óleo sobre
tela, 359 cm × 598 cm.
Pá gina 117

Há ocasiõ es em que espaços sã o criados para a produçã o de uma obra ou exposiçã o. Na


época em que o ítalo-brasileiro Victor Brecheret (1894-1955) trabalhou na criaçã o do
Monumento à s bandeiras (1954), um ateliê foi improvisado em um galpã o instalado no Parque
do Ibirapuera, em Sã o Paulo. Observe ao lado a foto do artista nesse ateliê improvisado.
Brecheret fazia estudos e preparava as peças que hoje compõ em a grande escultura, que fica
na Praça Armando de Sales Oliveira, na cidade de Sã o Paulo. Essa obra demorou a ser
concluída e o ateliê ficou nesse local por um bom tempo. Encomendado em 1921, o projeto
começou a ser elaborado em 1936 e só finalizado em 1953, sendo inaugurado no ano seguinte,
com o Parque do Ibirapuera, para comemorar o IV Centená rio da cidade de Sã o Paulo.

Instituto Victor Brecheret, São Paulo

Victor Brecheret no ateliê do Parque do Ibirapuera, durante o processo de criação do Monumento às bandeiras. Foto da
década de 1940.

Embora o processo criativo possa acontecer em locais pouco convencionais, ao sabor do


artista e da arte a ser desenvolvida, há locais específicos para ensaios e para a criaçã o de
espetá culos em dança e teatro, com salas equipadas ou adaptadas. Existem estú dios de mú sica
com equipamentos e aparelhos eletrô nicos e com ambiente com acú stica em salas isoladas,
apropriados à pesquisa de sons. Cada tipo de linguagem pode exigir um ambiente específico
para sua criaçã o.
Marcos André/Opção Brasil

Monumento às bandeiras, de Victor Brecheret, 1954. Com 240 blocos de granito, cada um pesando 50 toneladas, 50 m × 16
m.
Pá gina 118

Reunindo-se para criar


Além de lugares como os ateliês, à s vezes os artistas se encontram para conversar e criar
arte. Pode ser na casa de alguém, em um clube, praça ou centro cultural. Muitos artistas criam
grupos para discutir suas ideias e para produzir peças teatrais, espetá culos de dança ou
exposiçõ es em artes visuais. Grandes eventos culturais que influenciaram a arte já foram
criados assim, em grupo. À s vezes, a criaçã o de um grupo ocorre intencionalmente, com
pessoas convidadas a participar. Em outras, os grupos sã o formados de maneira espontâ nea,
em círculos de amigos.

Os artistas paulistas Má rio de Andrade (1893-1945), Oswald de Andrade (1890-1954),


Tarsila do Amaral (1886-1973), Anita Malfatti (1889-1964) e Menotti del Picchia (1892-1988),
apó s a polêmica Semana de Arte Moderna (també m chamada de Semana de 22), formaram o
Grupo dos Cinco, que se encontrava para conversar sobre os caminhos estéticos, políticos e
sociais do Brasil no início do século XX. Observe nesta pá gina a pintura de Anita Malfatti
retratando os componentes do grupo de forma criativa.

Grupo dos Cinco: grupo que defendia as ideias da Semana de Arte Moderna (Semana de 1922), expoente do
movimento modernista brasileiro, formado por Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Menotti del Picchia, Má rio de Andrade e
Oswald de Andrade.

Anita Malfatti. 1922. Tinta de caneta e lápis de cor sobre papel. Coleçã o de Artes Visuais do Instituto de Estudos Brasileiros da USP, Sã o Paulo

O Grupo dos Cinco, de Anita Malfatti, 1922. Tinta de caneta e lápis de cor sobre papel, 26,5 cm × 36,5 cm.

Do Grupo dos cinco, a ú nica artista que nã o participou da Semana de Arte Moderna de
1922 foi Tarsila do Amaral. A pintora só começou a fazer parte do grupo de artistas meses
depois, quando regressou da Europa. Apesar de não ter participado do evento no Teatro
Municipal de Sã o Paulo, ela é considerada uma das referências do movimento modernista, por
sua atuaçã o entre os artistas desse período e pelo estilo de suas obras.

Apresentada ao grupo de artistas por Anita Malfatti, Tarsila e o grupo de amigos


começaram a se encontrar para conversar e produzir poemas, textos, pinturas, desenhos, cada
um pesquisando sua linguagem artística preferida. Suas discussõ es marcaram a histó ria da
arte brasileira. Como em qualquer grupo de amigos, eles conversavam sobre tudo e à s vezes
havia desavenças, mas os diá logos entre esses artistas e o reflexo dessas discussõ es em suas
obras mostram um momento de ruptura entre valores anteriores, acadêmicos e a estética
moderna. Para o artista modernista, a criaçã o, a poética pessoal, o discurso singular sã o pontos
importantes.

Tarsila do Amaral. 1922. Ó leo sobre tela. Acervo dos Palácios do Governo do Estado de São Paulo. © Tarsila do Amaral Empreendimentos

Retrato de Mário de Andrade, de Tarsila do Amaral, 1922. Óleo sobre tela, 54 cm × 46 cm.

Na mú sica brasileira, o desejo de pesquisar novos arranjos e descobrir sons e


possibilidades musicais é personificado pelo nosso grande compositor e maestro Heitor Villa-
Lobos (1887-1959), que nasceu no Rio de Janeiro, estudou mú sica clá ssica e pesquisou sobre a
cultura brasileira popular e seus diferentes ritmos. Criou mú sicas que valorizam a nossa
cultura, misturando elementos da mú sica clá ssica. Uma de suas obras mais famosas faz parte
da peça Bachianas brasileiras (1930-1945) e é um trecho bem popular, a composiçã o O
trenzinho do caipira. Villa-Lobos compô s algumas mú sicas com características impressionistas,
entre elas uma série intitulada Cirandas, de 16 peças para piano inspiradas em temas
folcló ricos.
Pá gina 119

Em muitos momentos – pró ximos, em outras ocasiõ es, viajando para fazer estudos para
suas produçõ es artísticas –, esses artistas mantinham contato pelo modo habitual da época,
escrevendo cartas. Essas cartas foram documentadas e, hoje, podemos estudar o processo de
criaçã o deles ao ler os trechos de suas correspondências. Numa delas, Má rio de Andrade,
escritor modernista, escreveu para a amiga Tarsila do Amaral, em 1924, que estava na Europa,
dizendo que ela voltasse para o Brasil porque era em sua terra natal que encontraria o que
precisava para criar, nã o em terras estrangeiras. Observe o retrato do escritor na pá gina
anterior.

Trabalhos colaborativos
A expressã o “trabalho colaborativo” tem sido difundida no campo das artes e em outras
á reas, tendo como proposta estabelecer processos de criaçã o em grupo. A equipe respeita cada
ideia colocada e as singularidades de cada membro. Isso pode acontecer tanto em grupos de
teatro, dança, mú sica ou grafiteiros, por exemplo, como no escritó rio de uma empresa ou no
setor de uma fá brica.

Em um grupo de pessoas, cada um tem seus conhecimentos específicos, o que pode


tornar a troca de ideias e informaçõ es muito enriquecedora. A percepçã o de cada um sobre um
impasse ou problema pode proporcionar diferentes soluçõ es, cabendo ao grupo escolher a
decisã o mais adequada à situaçã o.

A coordenaçã o de projetos, seja na arte ou em situaçõ es do cotidiano, é compartilhada


no processo colaborativo. No documentá rio Rastros de processo colaborativo (direçã o e
roteiro de Danilo Chaia. Brasil, 2010. 18 min) podemos assistir a depoimentos de artistas da
linguagem teatral. Entre esses depoimentos, podemos conhecer o grupo Teatro da Vertigem,
que vem desenvolvendo essa proposta em seus projetos. Cada integrante do grupo pode
influenciar os outros. Desta forma, as cenas e ideias vã o sendo construídas por todos.

Cena do espetá culo Kastelo. 2010. Direção: Eliana Monteiro. Foto: Angelo Lorenzetti

Cena do espetáculo Kastelo, do grupo Teatro da Vertigem, 2010, em São Paulo. Na cena, os atores Marçal Costa e Roberto
Audio.

Giro de ideias Amigos artistas


Em seu círculo de amigos, há quem goste de produzir arte em alguma linguagem? Quem
no grupo gosta de desenhar, grafitar, criar poesias, compor mú sicas, dançar, fazer teatro ou
outro tipo de linguagem? Qual a sua opiniã o sobre as produçõ es feitas por seus amigos?
Escreva suas consideraçõ es abaixo.

Escreva um e-mail para alguém que você conhece que cria em alguma linguagem
artística e comente sobre essa produçã o. Você, seus amigos e colegas também podem organizar
um espaço na rede social para discutir sobre a produçã o de grupos de artistas. Pesquisem e
descubram que na histó ria da arte há vá rios exemplos de grupos de artistas que também eram
amigos e criavam juntos em vá rias linguagens. Compartilhem as descobertas.
Pá gina 120

Conexõ es Arte e Língua Portuguesa


Os manifestos da arte
Os artistas modernistas, em suas discussõ es, manifestavam o repú dio a modelos
preestabelecidos para a criaçã o da arte. Para eles, todos podem ser influenciados por outras
culturas e produçõ es de artistas. No entanto, para criar uma obra pró pria, é preciso descobrir suas
pró prias referências culturais e poéticas pessoais. Os artistas modernistas brasileiros defendiam a
liberdade para fazer uma arte brasileira, uma arte sincera, expressando a mistura do povo
brasileiro em cores nacionais, mas com teor crítico, político e polêmico, como Morro da favela, de
Tarsila do Amaral, que você observa no final da pá gina.

Escritores, pintores, escultores, gravuristas, atores e mú sicos questionavam as influências de


fó rmulas clá ssicas de expressã o artística herdadas da estética europeia, trazida para o Brasil pela
Missã o Artística Francesa, grupo de artistas europeus que chegaram em 1816 para fundar a
primeira Academia de Arte no Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, e que estabeleceram um
gosto acadêmico, neoclá ssico. Essas influências teriam determinado o modo de criar arte no Brasil
durante muito tempo, mas no movimento modernista essas regras começariam a mudar.

Tarsila do Amaral. 1924. Ó leo sobre tela. Coleção particular. © Tarsila do Amaral Empreendimentos

Morro da favela, de Tarsila do Amaral, 1924. Óleo sobre tela, 64,5 cm × 76 cm.
Pá gina 121

Tarsila do Amaral. 1929. Ó leo sobre tela. Acervo Fundação José e Paulina Nemirovsky, Sã o Paulo. © Tarsila do Amaral Empreendimentos

Antropofagia, de Tarsila do Amaral, 1929. Óleo sobre tela, 126 cm × 142 cm.

"A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrã o e de ocre nos verdes da favela, sob o
azul cabralino, sã o fatos estéticos."

Oswald de Andrade. Manifesto da Poesia Pau-brasil. Correio da Manhã, 18 mar. 1924. Disponível em:
<http://www.ufrgs.br/cdrom/oandrade/oandrade.pdf>. Acesso em: 22 maio 2016.

No início do século XX, as cidades começaram a crescer em todo o Brasil. O cinza do concreto
iniciou sua contraposiçã o à visã o da natureza e suas cores tropicais. A vida das pessoas na cidade se
diferenciava das cenas encontradas nos campos, e esse mundo moderno em contraste com o mundo
natural foi tema de muitos poemas e pinturas, entre outras produçõ es deixadas pelos artistas
modernistas brasileiros.

A estética e a ideologia que compunham a produçã o artística brasileira do Modernismo


podem ser lidas e estudadas nos manifestos e pinturas da época. Estude os textos dos manifestos e
compare com as pinturas, como você pode observar na pintura Antropofagia, da artista Tarsila do
Amaral, acima.

A arte com cunho de “poesia pau-brasil” acontece na literatura e na pintura de Tarsila do


Amaral, assim como o “movimento antropofá gico”, expressõ es criadas e divulgadas nos manifestos
modernistas.
Outros grupos de artistas também se reuniram para criar e defender suas ideias, e marcaram
a histó ria e a cultura brasileiras. Pesquise sobre eles para ampliar saberes sobre processos de
criaçã o em grupo.

No Brasil e no mundo, é comum os artistas criarem manifestos para defender suas ideias.
Escreva um manifesto de arte com os colegas defendendo como vocês acreditam que deve ser a arte
em nossos dias.
Pá gina 122

Conexõ es
Arte e Matemá tica

Parcerias para criar: a tangência perfeita


"Encontrei a tangente que vai permitir que a cú pula pareça apenas pousada na laje."

Fala de Joaquim Cardozo a Oscar Niemeyer em relato presente no documentá rio O artista e o matemático, de Sé rgio
Zeigler. In: ZEIGLER, Sé rgio. Arte & Matemática. Sã o Paulo, TV Cultura, 2001. Disponível em:
<http://blogdopetcivil.com/2012/12/17/engenheiros-notaveis-joaquim-cardozo-2/>. Acesso em: 22 maio 2016.

Na época em que Brasília estava sendo construída, o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012)
e o engenheiro calculista Joaquim Cardozo (1897-1978) procuravam criar as formas em curvas que
hoje compõ em a paisagem da capital do Brasil. Niemeyer fez os esboços do projeto, mostrando
formas curvas ao amigo engenheiro, que tinha como tarefa fazer os cá lculos matemá ticos para que a
estrutura em concreto comportasse as formas suaves. Muitas horas de cá lculos e reflexã o foram
necessá rias até que Joaquim Cardozo encontrasse as equaçõ es que resolvessem a apresentaçã o das
tangências adequadas, o que permitiu que as suaves linhas curvas, criadas na mente do arquiteto,
pudessem se materializar nas construçõ es que hoje compõ em o Patrimô nio Artístico e Cultural
tombado pela Organizaçã o das Naçõ es Unidas para a Educaçã o, a Ciência e a Cultura (Unesco) como
obra urbanística.

Joaquim Cardozo e Oscar Niemeyer entraram em estado de “vigília criativa”. Esse estado
mental acontece quando nos colocamos imersos na busca para dar forma ao que queremos criar.
Ambos procuravam aquilo que consideravam a beleza traduzida em formas curvas, representada
tanto em imagens desenhadas nos croquis do arquiteto como nos cá lculos do engenheiro. Esse
trabalho colaborativo entre artista e calculista é um exemplo dos processos de criaçã o na parceria
entre Arte e Matemá tica.

Pesquise mais sobre as relaçõ es entre pessoas de diferentes á reas que se unem para criar um
projeto específico.
Marcel Gautherot. c.1958-1960. Acervo Instituto Moreira Salles, São Paulo Marcel Gautherot. c.1958-1960. Acervo Instituto Moreira Salles, São Paulo

Imagens do Palácio do Congresso Nacional em construção. Esplanada dos Ministérios, em Brasília, no Distrito Federal, c.
1958-1960.
Pá gina 123

Projeto experimental
Espaços para criar
1. Criando em um ateliê

"Por necessidade, o artista é impelido a agir. Uma açã o como tendência, certamente,
complexa que se concretiza por meio de uma operaçã o poética registrada nos
documentos do processo."

SALLES, Cecília Almeida. Gesto inacabado: processo de criaçã o artística. 3. ed. Sã o Paulo: Fapesp/Annablume,
2007. p. 27.

O ateliê, um lugar cheio de objetos, pincéis, telas espalhadas, papéis com anotaçõ es, livros,
um mural com ideias, prepara futuros trabalhos. Como você imagina um lugar em que os artistas
criam suas obras? Como você e os colegas podem organizar um lugar para a criaçã o artística?

Patricia Amaral

Imagem do mural de ideias e estudos no ateliê de Rosana Paulino. Foto de 2012.

No ateliê da artista contemporâ nea brasileira Rosana Paulino (Sã o Paulo, 1967-), vemos um
mural de ideias. Um painel feito com madeira, coberto de cortiça, em que a artista coloca imagens,
trecho de textos, poemas, anotaçõ es, esboços, provas de gravuras e outras coisas que servem para
compor seus trabalhos.
Pá gina 124

Na obra do pintor e ilustrador estadunidense Norman Rockwell (1894-1978), vemos a


imagem do artista criando um autorretrato em que usa como referência sua figura refletida em um
espelho e imagens de autorretratos de outros artistas.

Norman Rockwell. 1960. Ó leo sobre tela. Printed by permission of the Norman Rockwell Family Agency. Copyright © 1960 The Norman Rockwell Family Entities. Norman Rockwell
Museum Collections, Stockbridge, MA

Autorretrato triplo, de Norman Rockwell, 1960. Óleo sobre tela, 113 cm × 88,3 cm.

O artista alemã o Arno Stern (1924-) criou, na década de 1940, na França, um tipo de ateliê
em que as pessoas podiam fugir do cotidiano e se dedicar a processos de criaçã o na linguagem da
pintura e do desenho. Essa proposta ainda é divulgada em vá rias partes do mundo. O ateliê ficou
conhecido como Closlieu, e consiste em uma sala com papéis colocados nas paredes em diferentes
posiçõ es e tamanhos. Veja imagem do ateliê abaixo. No centro da sala, geralmente se coloca uma
bancada com tintas de vá rias cores e diversos pincéis. Cada participante entra no local, escolhe um
lugar e começa a fazer uma arte de modo livre e particular. Pessoas de todas as idades podem criar
juntas nesse espaço de atitude inventiva. As sessõ es podem ser combinadas em horá rios e dias em
que todos desejem se encontrar para criar.

Quais sã o as suas referências para criar um desenho ou pintura? Que imagens você procura
observar para nutrir seu repertó rio cultural? Qual o motivo dessas escolhas?

Pesquise obras produzidas por outros artistas, imagens fotográ ficas, poemas e outros
recursos que estimulem a criaçã o do seu pró prio trabalho. Escolha um local em que possa observar
esses materiais e manter contato com essas referências. Depois, escolha uma linguagem artística
visual e produza sua pró pria obra.

Outra proposta é criar um ateliê closlieu e convidar vá rias pessoas para criar juntas. A ideia
desse tipo de ateliê é motivar a espontaneidade na criaçã o e o momento de cada um. Nã o tem a
obrigatoriedade de criar produçõ es para exposiçõ es, e sim promover um momento de criaçã o livre
e descomprometida com o mundo fora desse espaço.
Walter Limot/AKG/Latinstock

Oficina de pintura para crianças, de Arno Stern, em Paris, França, em foto de 1966.
Pá gina 125

2. “Musicoteca” – um lugar para ouvir e fazer mú sica

Há locais apropriados para produzir arte. No entanto, podemos adaptar ambientes para
estudar e experimentar processos de criaçã o. Procedimentos criativos em métodos tradicionais ou
contemporâ neos, com ou sem tecnologias, podem acontecer nesses ambientes.

Que tal fazer uma experiência para ouvir e fazer mú sica?

New York Times Co./Archive Photos/Getty Images

John Cage (1912-1992) alterando a afinação de seu piano ao colocar moedas e parafusos entre as cordas no auditório
Gaveau, em Paris, França, em foto de 1949.

Na imagem apresentada no final da pá gina, vemos Murray Schafer, com pessoas deitadas em
silêncio praticando a escuta sensível. Nesse mesmo lugar foram feitas experiências sobre criaçã o de
sons para paisagem sonora e registros grá ficos de sons.

É possível você criar isso dentro de sua escola? Uma “musicoteca” é como uma biblioteca,
mas, em vez de livros, nesse local vocês podem colocar instrumentos e objetos que produzam sons.
Vocês podem trazer para esse espaço acervos de discos antigos, DVDs e CDs de mú sica, partituras,
aparelhos de som e até mesa de som, entre outros materiais ligados à linguagem da mú sica.

Uma campanha em sua regiã o, com a participaçã o da comunidade, pode ajudar na doaçã o de
materiais para compor a “musicoteca” da turma. Esse local também servirá de laborató rio de
mú sica, no qual você e os colegas poderã o ouvir e fazer novos sons.
SOCAN

Murray Schafer em experiência em uma escola no final dos anos 1960 e começo dos anos 1970.
Pá gina 126

3. O ambiente das artes cênicas

Uma sala ampla, com piso adequado, espelhos, instrumentos ou aparelhos de sons podem
ajudar os bailarinos a estudar seu corpo, o ritmo de mú sicas para dançar, sequências coreográ ficas,
assim como um teatro com aparelhos de iluminaçã o e mesa de som pode ajudar os atores a criar
peças teatrais. Hoje há muitas alternativas de locais para esses fins, com toda a estrutura ou
adaptados. Esse universo dos ambientes de arte inspirou vá rios artistas, como o impressionista
francês Edgar Degas (1834-1917), pintor, gravurista, escultor e fotó grafo que criou pinturas e
desenhos retratando bailarinas em espaços de aprendizado e ensaios de dança. Observe abaixo a
obra desse artista.

Para que você e seus colegas criem mais nas linguagens do teatro e da dança, procurem saber
se pró ximo à escola há espaços pú blicos como teatros, centros culturais ou pontos de cultura, que
vocês possam frequentar e conhecer mais sobre ambientes de ensaios dessas linguagens. Outra
possibilidade é improvisar um espaço na escola em que as linguagens do teatro, da dança ou outras,
como performances, possam ser criadas por vocês. Ter locais adequados com todos os
equipamentos necessá rios é importante, mas nã o é determinante na criaçã o da arte. Caso nã o
existam espaços culturais em sua regiã o, que tal criar um? Além de mobilizar a pró pria
comunidade, vocês podem organizar pedidos às autoridades pú blicas, fazer movimentos pela
internet e abaixo-assinados. Muitos espaços culturais surgiram da reivindicaçã o popular.

Edgar Degas. c. 1872. Ó leo sobre madeira. Museu Metropolitano de Arte, Nova York

Aula de dança, Edgar Degas, c. 1872. Óleo sobre madeira, 19,7 cm × 27 cm.
Pá gina 127

TEMA 4 “DOM”: VIRTUDE,


GÊNIO OU CURIOSIDADE?

Michelangelo. c. 1508-1512. Afresco. Capela Sistina, Cidade do Vaticano

A criação do homem (detalhe), de Michelangelo, 1508-1515. Afresco da Capela Sistina, 280 cm × 570 cm.

Gustave Moreau. 1891. Ó leo sobre madeira. Museu d’Orsay, Paris

Hesíodo e a Musa, de Gustave Moreau, 1891. Óleo sobre madeira, 59 cm × 34 cm.


"Se procurar bem, você acaba encontrando
nã o a explicaçã o (duvidosa) da vida,
mas a poesia (inexplicá vel) da vida."

ANDRADE, Carlos Drummond de. Lembrete. In: Corpo, de Carlos Drummond de Andrade. Companhia das Letras.
Sã o Paulo. Carlos Drummond de Andrade © Grañ a Drummond www.carlosdrummond.com.br

Carlos Drummond de Andrade acreditava que para criar era preciso apenas procurar a
poesia escondida nas pequenas coisas da vida. Precisamos de inspiraçã o para criar? Onde
podemos encontrá -la? Você certamente já ouviu falar que todo artista é sensível e criativo.
Entretanto, a criatividade nã o é exclusividade dos artistas, ela é inerente a todos os seres
humanos e está presente em muitas á reas do conhecimento.

O conceito de criatividade é histó rico e social, ou seja, em cada época e sociedade foi
dada uma explicaçã o para o seu significado. Uma das ideias mais comuns é a de que ser criativo
ou talentoso para as artes é um “dom”. Essa concepçã o vem da época das musas inspiradoras
da mitologia grega. Depois, foi transferida para a concepçã o de criatividade como “dom” dado
por “Deus”. Assim, ser criativo seria um presente, um ato sobrenatural de determinado ser
sagrado, pensamento encontrado em muitas culturas.

Nas imagens desta pá gina que abrem este tema, observamos duas versõ es sobre a ideia
de criatividade como “dom”: na pintura em afresco A criaçã o do homem, do italiano
Michelangelo (1475-1564), está representada a criaçã o divina, tanto do ser humano quanto de
tudo o mais que ele cria; na pintura Hesíodo e a Musa, do francês Gustave Moreau (1826-
1898), uma musa dá o “dom artístico” a Hesíodo (século VIII a.C.), mú sico, poeta e escritor da
Antiguidade grega.

Afresco: té cnica de pintura que usa a parede ou o teto como suporte em que as tintas sã o aplicadas diretamente
sobre a argamassa ainda ú mida.
Pá gina 128

A concepçã o de criatividade ou talento em funçã o de um dom, uma graça recebida, está


ligada à ideia de merecimento. Atualmente, determinar quem merece e quem nã o merece ser
criativo é algo a ser totalmente questionado, levando em consideraçã o que vivemos
mergulhados em pluralidade cultural, ou seja, há muitas formas de criar.

Outras explicaçõ es foram dadas para justificar o ato criativo. O virtuosismo e a


genialidade foram qualificaçõ es encontradas para classificar quem era um bom artista diante
da técnica apresentada. Na mú sica, por exemplo, o artista italiano Niccolò Paganini Bocciardo
(1782-1840) é conhecido até hoje como um grande violinista e compositor, ou seja, um
virtuoso. Em sua época, o pú blico idolatrava a maestria na técnica perfeita de execuçã o de um
instrumento. O retrato do mú sico do período do Romantismo foi feito em 1831 pelo pintor
francês Eugène Delacroix (1798-1863). Delacroix procurou captar nã o apenas a técnica e o
virtuosismo de Paganini, mas também sua paixã o pela mú sica. Os artistas desse período, tanto
mú sicos como pintores, entre representantes de outras linguagens artísticas, eram
estimulados pela ideia de superar os pró prios limites, sobretudo a liberdade e a expressã o
sensível de suas emoçõ es.

Ainda hoje há artistas que se preocupam em alcançar o virtuosismo ao tocar um


instrumento, cantar, dançar, interpretar um personagem ou fazer um desenho realista, por
exemplo. Essas inquietaçõ es sã o pertinentes para quem quer alcançar a técnica. No entanto,
apenas a técnica e seu aperfeiçoamento nã o bastam. Para se expressar de modo criativo, é
preciso encontrar uma poética, um estilo de fazer arte que marque um modo singular de
expressã o. O estilo de mú sicos como Paganini e pintores como Delacroix deixaram sua marca
poética na histó ria da arte.

A explicaçã o de um talento artístico, assim como qualquer outra habilidade, pode ter
muitas verdades ou alusõ es. Contudo, é fato que as conquistas no campo do conhecimento e
das habilidades dos seres humanos nã o se desenvolveram sem um conjunto de influências,
situaçõ es e rede de interaçõ es presentes em diversas fases da vida. Dom, técnica,
predisposiçã o natural ou o interesse em pesquisar e expressar-se poeticamente podem ser
diferentes maneiras para explicar a razã o de as pessoas, artistas ou não, serem criativas.

O ato criador é uma forma de dizer o que pensamos ou desejamos, e pode acontecer na
interaçã o entre o ser humano e o mundo culturalmente vivido. A necessidade de criar se
origina de situaçõ es que vivemos e delas guardamos uma memó ria da observaçã o e da
interpretaçã o sobre as coisas. É também a capacidade de projetar o futuro, de imaginar outras
situaçõ es pelas quais podemos ainda passar. Criar é pesquisar, é indagar. Por vezes, esse
processo pode ser angustiante, porque “o ato criador, seja na ciência ou na arte, surge sempre
de uma dor. Nã o é preciso que seja uma dor doída. Por vezes a dor aparece como aquela
coceira que tem o nome de curiosidade”, como define criativamente o escritor Rubem Alves
(2008, p. 12).
Eugène Delacroix. 1831. Ó leo sobre cartão em painel de madeira. Coleçã o Philips, Washington, D.C. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone

Paganini, de Eugène Delacroix, 1831. Óleo sobre cartão em painel de madeira, 44,8 cm × 30,2 cm.
Pá gina 129

Arte é conhecimento
A cultura à qual pertencemos deflagra nossa forma de criar, como no caso do mú sico
brasileiro Ricardo Herz (1979-). Esse violinista paulista desenvolveu uma técnica considerada
virtuosa pela crítica. Em seu processo de criaçã o, ele realiza pesquisas e mistura o som de um
instrumento tradicionalmente clá ssico, como o violino, ao som de gêneros populares como o
samba, o choro, a valsa e os ritmos nordestinos. Observe a imagem do artista com seu
instrumento em apresentaçã o para o pú blico.

Mite Kuzevski/Demotix/Corbis/Latinstock

O músico Ricardo Herz em apresentação no Skopje Jazz Festival, na Macedônia, em 2012.

Em nossa cultura, temos uma enorme diversidade de ritmos que nos influenciam e
formam nosso repertó rio. Dessa forma, cunhamos nossa bagagem que pode fazer diferença na
habilidade de criaçã o. Assim, para criar, é preciso ter repertó rio e, com base nele, escolher o
que queremos fazer.

Na linguagem da dança, durante longo período de tempo, o virtuosismo dos bailarinos


foi um dos critérios mais valorizados. Na dança contemporâ nea, a valorizaçã o da técnica está
aliada à expressã o poética e à diversidade cultural. Uma vez que o conhecimento, tanto o
estudado quanto o adquirido na vivência do cotidiano, é muito importante para criar nas
linguagens artísticas, conhecer o pró prio corpo é essencial para criar e se expressar por meio
dos movimentos na dança.

Dança é movimento expressivo. Ela ocorre quando pelo menos uma pessoa que se
movimenta procura se expressar. Nã o necessariamente precisa haver mú sica para que a dança
seja estabelecida. O dançarino pode guiar-se pelas batidas de seu coraçã o, pelos sons externos
do mundo ao redor ou por uma mú sica que “toca” em sua mente. Também nã o é obrigató rio
haver técnica. Quem dança pode se expressar pelos movimentos que já possui em seu
repertó rio pessoal cotidiano, buscando fluência e harmonia. A técnica, independentemente de
qual seja, tem o objetivo de ajudar a expressar as ideias da criaçã o; ela nã o pode ser uma
amarra nem impor barreiras. Uma das maiores habilidades do artista está em transmitir uma
expressã o de maneira tã o autêntica que faça a técnica utilizada parecer algo espontâ neo,
mesmo sendo fruto de um á rduo trabalho desenvolvido.

Outro mito no universo da dança é o da necessidade de se ter um corpo magro. Por


muito tempo, convencionou-se que apenas pessoas magras poderiam ser dançarinas. Hoje,
entretanto, isso é diferente. Qualquer pessoa pode encontrar uma forma de se expressar por
meio da dança, incluindo pessoas com deficiências físicas, como cadeirantes.

Rudolf Laban (1879-1958), importante bailarino, coreó grafo e pesquisador da dança já


apresentado em capítulos anteriores, defendia a tese de que nã o há movimento feio, e sim
movimento que consegue ou nã o expressar sentimentos. Pina Bausch (1940-2009), outra
importante artista da dança, também já apresentada neste livro, valorizava o conhecimento do
corpo e das possibilidades expressivas para dançar. Levando em consideraçã o as opiniõ es
desses especialistas, com as quais muitos outros artistas concordam, podemos concluir que:
investigar cada parte do corpo em seu movimento é se autoconhecer; pesquisar sobre as
técnicas é ampliar saberes e possibilidades; perceber e sentir o mundo a nossa volta é sentir-se
vivo. Todas essas açõ es sã o importantes para quem quer, assim como Laban e Pina, se
expressar por meio da dança.
Pá gina 130

Coisas para observar, registrar e imaginar


As ideias podem sair da nossa cabeça. Mas como elas entram lá ? Será que elas entram ao
observarmos algo ou quando prestamos atençã o em alguma coisa que passa pela frente? Será
que temos um baú cheio de memó rias e, quando necessá rio, vamos lá e encontramos aquilo
que é preciso para ter novas ideias? Ou apenas imaginamos e imaginar é “coisa de louco”,
criança ou coisa de poeta?

Podemos experimentar processos de criaçã o em arte e em outras á reas. A relaçã o entre


observaçã o, memó ria e imaginaçã o pode deflagrar uma ideia criativa. Uma paisagem, por
exemplo, pode ser representada de muitas formas. Os artistas româ nticos criavam paisagens
com base na relaçã o de valorizaçã o da visã o pessoal do artista e da sua emoçã o ao representar
as coisas. Era uma época em que muitas regiõ es do mundo estavam sendo exploradas, e os
artistas viajantes tiveram um importante papel na representaçã o de paisagens das terras
conhecidas como o “novo mundo”.

Artistas viajantes: entre os sé culos XV e XIX, vá rios artistas fizeram parte das missõ es científicas, com o objetivo de
registrar imagens de animais, plantas e pessoas que viviam em localidades fora da Europa. Esses artistas sã o considerados
os ilustradores do “novo mundo”. Muitas das imagens que vemos nos livros de histó ria do Brasil sã o reproduçõ es das obras
criadas por eles ou inspiradas nelas. As linguagens mais utilizadas nesses registros eram a pintura, o desenho e a gravura.

Os artistas que vieram para as terras brasileiras como integrantes de missõ es científicas
durante a colonizaçã o portuguesa tiveram a experiência de observar as belezas naturais e as
pessoas que aqui viviam. Eles recebiam a encomenda de fazer registros fiéis ao que estavam
observando. Contudo, alguns desses artistas foram além da observaçã o científica e criaram
composiçõ es em pinturas, desenhos e gravuras. O alemã o Johann Moritz Rugendas (1802-
1858), por exemplo, enfrentou conflitos entre o registro fiel exigido pelo cará ter da missã o
científica e o desejo pessoal de criar suas pró prias interpretaçõ es a respeito daquilo que via.
Ele fazia esboços de vá rias partes de uma mata e depois montava em seu ateliê uma imagem de
paisagem, como é o caso da tela Paisagem na mata virgem do Brasil (1830), ao lado. Ele usou
tanto a observaçã o quanto a memó ria e a imaginaçã o para compor as paisagens que parecem
reais, mas na verdade sã o montagens idealizadas de uma visã o do Brasil no século XIX.
Rugendas. 1830. Ó leo sobre tela. Fundação Prussiana de Palácios e Jardins, Berlim

Paisagem na mata virgem do Brasil, de Johann Moritz Rugendas, 1830. Óleo sobre tela, 62,5 cm × 49,5 cm.

Observar a luz
Os impressionistas buscavam enfatizar a observaçã o ao representar uma paisagem, mas
é claro que também havia uma interpretaçã o em relaçã o ao que viam. Como a pintura era
realizada geralmente no local da observaçã o, esses artistas estudavam como captar a luz e
traduzi-la em cores vibrantes, explorando os contrastes entre luzes e sombras em pinceladas
soltas e imprecisas. O objetivo dos pintores era transmitir a impressã o daquele momento,
capturar a sensaçã o atmosférica, a percepçã o de um instante que logo iria passar... Assim, uma
pintura de paisagem ao ar livre era feita em poucas horas.

Impressionismo: movimento artístico que ocorreu no final do sé culo XIX (iniciado em 1862, em Paris), no qual os
artistas realizavam processos de criaçã o na pintura ao ar livre com interesse principal nas mudanças da atmosfera e suas
consequê ncias na cor e na luz. O termo impressionismo foi inicialmente utilizado para definir pinturas inacabadas. Os
artistas seguidores desse movimento sã o chamados de impressionistas.
Pá gina 131

Na pintura Nascer do Sol, Impressã o (1872), o artista francês Claude Monet (1840-
1926) nos apresentou sua percepçã o pessoal de um momento do dia em que a luz começa a
surgir em meio à névoa da manhã , assim como na obra do artista brasileiro Antô nio Parreiras
(Rio de Janeiro, 1860-1937), que nos traz a sensaçã o de calor em Dia de mormaço (1900)
apresentada a seguir. No processo de criaçã o de uma pintura impressionista, o artista nã o faz
uso apenas da visã o, ele tenta se apropriar de todos os sentidos humanos possíveis e
transmitir nas obras essas impressõ es. Observar nã o é apenas a açã o de olhar a paisagem e sim
de senti-la, percebê-la, em toda a sua atmosfera.

Claude Monet. 1872. Ó leo sobre tela. Museu Marmottan Monet, Paris

Nascer do Sol, Impressão, de Claude Monet, 1872. Óleo sobre tela, 48 cm × 63 cm.

Antonio Parreiras. 1900. Ó leo sobre tela. Acervo Documental Fotográ fico da Pinacoteca do Estado de São Paulo

Dia de mormaço, de Antônio Parreiras, 1900. Óleo sobre tela, 68 cm × 106 cm.

Na pintura do francês Pierre-Auguste Renoir (1841-1919) há uma observaçã o dentro de


outra. Renoir retratou seu amigo Claude Monet em plena atividade artística, criando sua obra,
em Claude Monet pintando em seu jardim em Argenteuil (1873). Observe-a com atençã o.
Renoir. 1873. Ó leo sobre tela. Galeria Wadsworth Atheneum, Hartford

Claude Monet pintando em seu jardim em Argenteuil, de Pierre-Auguste Renoir, 1873. Óleo sobre tela, 61 cm × 50 cm.
Pá gina 132

Imaginar mundos
Outros estilos artísticos surgiram no século XX. No Surrealismo, o foco era a imaginaçã o
e a memó ria; as coisas eram apresentadas de forma lírica, como em um sonho. Nesse estilo, as
paisagens e outros temas nã o seguem uma ló gica racional: uma á rvore pode ser criada em
cores que fogem do mundo natural, figuras se misturam formando seres híbridos, animais que
não voam podem voar, pode até parecer que o mundo está de ponta-cabeça, um mundo
imaginá rio que se abre na criaçã o dos artistas. É a experiência de criar mundos lú dicos e
fantá sticos, como na obra Le poison (O veneno) do belga René Magritte (1898-1967). Observe-
a.

Surrealismo: movimento do sé culo XX (iniciado na dé cada de 1920) que explora os aspectos psicoló gicos e
imaginá rios da mente, rompendo com a linearidade de narrativas e da racionalidade na arte investigando as imagens do
subconsciente e o lirismo dos sonhos.

René Magritte. 1939. Guache sobre papel. Coleção particular. Foto: Christie’s Images/Corbis/Latinstock

Le poison (O veneno), de René Magritte, 1939. Guache sobre papel, 36 cm × 41,5 cm.

Giro de ideias Criatividade e talento artístico


Converse com os colegas sobre criatividade e talento artístico. Qual é a opiniã o da
turma?

Para direcionar a conversa e torná -la mais dinâ mica, pegue um dado e cole em cada face
pedaços de papel com as palavras: dom, virtuosismo, genialidade, curiosidade, expressã o
poética, outra explicaçã o. A conversa começa quando alguém joga o dado e fala a respeito do
que sabe e pensa sobre a palavra que cair para cima. Em seguida, a turma expressa sua opiniã o
sobre o mesmo tema, e assim o fluxo da conversa vai evoluindo com a pró xima rodada
podendo se transformar em um debate.
Escreva a seguir o resumo das principais opiniõ es que apareceram nessa atividade.
Pá gina 133

Conexõ es Arte e Ciências


As mú ltiplas e geniais faces de um artista e cientista
curioso
Estamos no século XV. Na Itá lia, na cidade de Florença, vá rios artistas puseram-se a fazer
pesquisas e produçõ es em diversas linguagens artísticas. Além de desenvolver esses estudos, as
oficinas de arte também eram escolas para jovens aprendizes. Um jovem chamado Leonardo da
Vinci (1452-1519) tinha 14 anos quando entrou para o ateliê de um mestre famoso chamado
Andrea del Verrocchio (1435-1488), a fim de aprender os ofícios da arte. Esse mestre tinha as
ferramentas e o material necessá rio para o ensino dos interessados em seguir esse ofício.
Aprendizes como Leonardo, no início, nã o criavam, apenas ajudavam seu mestre nas encomendas
feitas à casa de ofícios.

Quando um aprendiz adquiria competência para criar a pró pria obra, ele realizava o sonho
da “obra-prima”(primeira obra). Posteriormente esse termo passou a ser usado para designar a
obra mais importante do artista, mesmo que realizada em sua maturidade, como no caso da pintura
Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, apresentada ao lado.

Leonardo da Vinci. c. 1503-6. Ó leo sobre madeira. Museu do Louvre, Paris

Mona Lisa, de Leonardo da Vinci, c. 1503-1506. Óleo sobre madeira, 77 cm × 53 cm.

A “primeira obra” de Leonardo da Vinci foi uma pequena interferência em uma obra assinada
por seu mestre Verrocchio, a pintura O batismo de Cristo (1472-1475), hoje no Museu de Uffizi, na
Itá lia, veja a reproduçã o dessa obra na pá gina seguinte. Leonardo teria pintado o jovem anjo de
cabelos cacheados que segura o manto de Jesus. Os detalhes criados por Leonardo e sua técnica na
expressã o da figura geraram uma diferença notá vel com o restante da pintura.

A racionalidade e o rigor científico, aliados à cultura mais humanista, fizeram surgir uma
arte que se relaciona com a Matemá tica e com a Ciência. Leonardo, como um homem do seu
tempo, envolveu-se com muitas á reas do saber. Sua mente inventiva e o cená rio político e
econô mico propício para produçõ es na Arte, Ciência e Engenharia motivaram esse artista a
criar.

Leonardo observava a natureza para conhecer melhor o movimento das asas dos
pá ssaros e desenhava engenhocas que já prenunciavam a aerodinâ mica, que futuramente
criaria má quinas voadoras capazes de chegar ao espaço.

Da Vinci escreveu o Tratado da pintura com os princípios técnicos do sfumato,


chiaroscuro, perspectiva aérea e outros ensinamentos, que correram as academias de arte dos
séculos seguintes. Um homem criativo, dono de uma mente curiosa que marcou o seu nome na
histó ria, foi considerado muitas vezes um gênio.

Sfumato: termo em italiano que designa uma té cnica de pintura pesquisada e desenvolvida por Leonardo da Vinci.
Esse procedimento dá à s imagens, sobretudo nos detalhes das figuras humanas, um efeito suavizado, matizado de tons em
transiçã o entre claros e escuros. Propõ e que o pintor coloque contínuas camadas de cor, que sã o misturadas de forma
gradual para dar a impressã o de volume e profundidade.

Chiaroscuro: termo em italiano que significa “claro e escuro”. Refere-se à s té cnicas desenvolvidas por Leonardo da
Vinci para conseguir efeitos de tonalidades, contrastes de planos e volumes.

Perspectiva aérea: conhecimento de que as cores e os tamanhos dos elementos em uma composiçã o se alteram de
acordo com a distâ ncia. No Renascimento, té cnicas foram desenvolvidas utilizando matizes de cores para conseguir efeitos
de profundidade na pintura.
Pá gina 134

Andrea del Verrocchio, Leonardo da Vinci e Sandro Botticelli. 1475. Galeria dos Escritórios, Florença. Foto: FineArt Alamy/Glow Images

Andrea del Verrocchio, Leonardo da Vinci e Sandro Botticelli. 1475. Galeria dos Escritórios, Florença. Foto: FineArt Alamy/Glow Images

O batismo de Cristo (1472-1475), de Verrocchio. Óleo e têmpera sobre tela. 180 cm × 151,3 cm.
Pá gina 135

Projeto experimental
Processos de criaçã o
1. Criando tintas, descobrindo cores e transparências

Neste projeto, você poderá usar vá rios materiais para desenhar ou pintar, inclusive tintas.
Sugerimos, agora, que você mesmo crie as cores das suas tintas como a aquarela, material que foi
muito usado pelos pintores viajantes, como na pintura de Rugendas, Sagui-de-cara-branca, que
você pode observar ao lado.

Rugendas. 1822. Aquarela, nanquim e lápis. Coleção particular

Sagui-de-cara -branca, de Johann Moritz Rugendas, 1822. Aquarela, nanquim e lápis, 21,2 cm × 26,7 cm.

Siga as etapas necessá rias para preparar sua tinta aquarela.

• Coloque em um copo de plá stico descartá vel uma colher (sopa) de goma arábica (tipo de
cola vendida em papelarias) e cinco gotas de anilina comestível (usada em bolos e doces) de
qualquer cor. Misture os dois ingredientes e está pronta sua tinta aquarela.

• Repita esse procedimento com outras cores. Nã o há necessidade de fazer a cor branca:
deixe sem pintar as partes do papel ou da tela em que você quiser representar as á reas mais claras.

• Use á gua para diluir a tinta e obter nuanças de cores entre claras e escuras. Essa tinta é
solú vel em á gua, ou seja, se você colocar mais á gua, a tinta ficará clara; se você colocar menos á gua,
conseguirá tons mais escuros.

A característica da aquarela é a transparência, as cores podem ser percebidas por baixo de


outras. Você terá a oportunidade de estudar e explorar as possibilidades expressivas desse
material.
Use papéis encorpados como suporte. Um exemplo é usar cartolinas brancas para fazer sua
pintura em aquarela. Como se usa á gua nessa técnica, papéis de gramaturas mais finas que a
cartolina podem enrugar.

2. Imagens para observar, lembrar e imaginar

Neste projeto, vamos criar explorando as habilidades de observar, lembrar e imaginar.

• Primeira atividade: escolha um tema, que pode ser uma paisagem, como por exemplo, uma
á rvore ou outro elemento que desejar. Faça um desenho ou pintura de observaçã o, usando seus
sentidos para registrar a reproduçã o da paisagem.

• Segunda atividade: procure lembrar-se de uma paisagem que você tenha visitado um dia e
represente essa imagem usando apenas sua memó ria.

• Terceira atividade: use a imaginaçã o. Crie e inove nas cores e formas de uma paisagem
imaginá ria, em uma dimensã o em que tudo pode ser diferente da nossa realidade, como se você
estivesse sonhando ou visitando outro planeta.

Qual das três atividades você mais gostou de fazer? Mostre suas produçõ es para os colegas.
Vocês podem organizar uma mostra de artes visuais com esses estudos. Você pode utilizar as tintas
feitas no projeto anterior, fazendo suas pinturas em folhas de cartolina ou outro tipo de papel.
Aproveite para analisar as semelhanças e diferenças entre as criaçõ es com base nas mesmas ideias,
mas feitas de modos diferentes.
Pá gina 136

TEMPOS E "ISMOS" NA ARTE

Que nome tem o tempo? Qual é o nome da arte? Pesquisadores nomea ram tempos e
tendências artísticas para facilitar o estudo da arte no decorrer da histó ria. A histó ria geral, dentro
de uma concepçã o ocidental, conta e nomeia os tempos como:

Contemporâ neos - o termo vem do latim contemporaneus e significa "junto do tempo"ou


"pertencente ao mesmo tempo"; artistas de uma mesma época sã o contemporâ neos, assim como
você é contemporâ neo de seus artistas atuantes preferidos. Usa-se esse termo, também, para falar
da arte criada nos ú ltimos anos até hoje. Assim, arte contemporâ nea nã o deve ser confundida com
idade Contemporâ nea (1789-hoje).

Modernos ou modernistas - o termo modernismo refere-se aos movimentos artísticos da


virada do século XIX até a primeira metade do século XX. O tempo do Modernismo pode ser
considerado o tempo das vanguardas artísticas. Assim, Modernismo nã o deve ser confundido com
Idade Moderna (1453-1789).

Vanguardas - o termo vem do francês avant-garde e significa "estar na linha de frente de uma
bataIha". Na arte, refere-se aos movimentos estéticos e artísticos que Iideraram mudanças
culturais.

"ISMOS" DO MODERNISMO

Você já reparou que na língua portuguesa há muitas palavras que terminam em “ismo”? De
origem greco-latina,”ismo" é um sufixo, elemento linguístico que, acrescentado ao final de algumas
palavras, forma nomes de religiõ es, doutrinas filosó ficas ou tendências estéticas e artísticas. No
universo da arte, vimos nascer inú meras palavras que contêm o sufixo "ismo" para pontuar
movimentos artísticos e culturais, estilos e tendências estéticas. Veremos alguns deles ao lado.

O violeiro, de Almeida Jú nior, 1899. Ó leo sobre tela, 141 cm × 172 cm.

REALISMO

Surge na segunda metade do século XIX na Europa. Há, entre os artistas, o desejo de retratar
a vida como ela é, sem recorrer ao belo sublimado tã o valorizado em outras épocas, mostrar o povo,
os lugares, enfim, os acontecimentos do dia a dia, uma vez que a vida havia mudado com a
sociedade industrial. Desenvolveu-se nas artes visuais um olhar mais expressivo ao retratar
situaçõ es reais: no campo, os trabalhadores rurais; nas cidades, pessoas simples vivendo suas
rotinas.
Recanto do morro de Santo Antô nio, de Eliseu d'Angelo Visconti, c. 1920. Ó leo sobre tela, 70
cm × 96 cm.

IMPRESSIONISMO

Movimento que se inicia por volta de 1862, em Paris. Ao realizar pinturas ao ar livre, artistas
fizeram pesquisas sobre as mudanças na atmosfera e suas consequências na composiçã o da cor e da
luz. Com base nessas pesquisas, eles usavam em suas obras cor e luz compondo imagens fluidas e
sem contornos, linhas dissolvidas, mergulhadas em manchas e nuances cromá ticas.

Tarde de domingo na Ilha de Grande Jatte, de Georges Pierre-Seurat, 1884-1886. Ó leo sobre
tela, 207,6 cm × 308 cm.

NEOIMPRESSIONISMO

Neoimpressionismo ou Pó s-Impressionismo, foi um momento da histó ria da arte


(reconhecido oficialmente a partir de 1886) em que os artistas continuaram suas pesquisas sobre a
luz e a cor ampliando para experiências e estudos de com posiçã o, geometrizaçã o de formas, espaço
e efeitos ó pticos com base nas técnicas do pontilhismo e do divisionismo.

De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?, de Paul Gauguin, 1897-1898. Ó leo sobre
tela, 139,1 cm × 374,6 cm.

SIMBOLISMO

Movimento que expressa questoes mais subjetivas do ser humano e radicaliza os ideais
romanticos. Surge por volta de 1880 e procura questionar os estados mentais, sem focar em
questõ es sociais, como ocorria no Realismo e no Naturalismo, tendo preferência por temas místicos
e imaginá rios. A arte simbolista revela, por meio de símbolos, uma realidade que escapa à
consciência.
Pá gina 137

FAUVISMO

Retrato de Madame Matisse, de Henri Matisse, 1905. Ó leo sobre tela, 40,5 cm >< 32,5 cm.

Os artistas que criaram o Fauvismo, iniciado na França entre 1905 e 1907, eram conhecidos
como fauves (feras). Nas suas pinturas, percebemos o uso de cores puras, composiçõ es que abusam
do contraste e da intensidade das cores. Os fauves nã o se preocupavam com a realidade, criando
imagens provocadoras, explorando contrastes e novas composiçõ es cromá ticas.

EXPRESSIONISMO

O grito, de Edvard Munch, 1893.Ó leo sobre tela, 91 cm x 74 Entre 1893 e 1910, Munch fez
quatro versõ es da pintura, para substituir as originais conforme fossem vendidas. Muitas outras
có pias foram feitas ao longo dos anos.

Nasceu na Alemanha, no início do século XX, em meio a conflitos e guerras. Os


expressionistas refletiam a respeito das condiçõ es sociais da existência, subvertiam o equilíbrio na
composiçã o e na harmonia tradicional no uso da cor, buscando maior dinamismo. A arte, para os
expressionistas, estava ligada ã açã o, algumas vezes violenta, e aos conflitos humanos.

CUBISMO

As senhoritas de Avignon (Les demoiselles d´Avignon), de Pablo Picasso, 1907. Ó leo sobre
tela, 243,9 cm x 233,7 cm.
Do Pó s-Impressionismo ao Cubismo (entre 1907 e 1914), imagens foram criadas por meio da
aná lise das formas. Paul Cézanne (1839-1906) traduziu cenas da natureza em paisagens
geometrizadas, em estudos que tempos depois inspirariam artistas como Pablo Picasso (1881-
1973) e Georges Braque (1882-1963) a criarem o Cubismo.

FUTURISMO

Movimento artístico originado na Itá lia, em 1909, com o lançamento do Manifesto Futurista.
O ser humano sempre foi fascinado por imagem e movimento. Nas pinturas em cavernas,já havia
representaçã o de animais que parecem ter sido registrados em plena açã o. Nas obras do Futurismo,
as imagens sã o representadas com dinamismo de formas, linhas e cores, revelando o fascínio do ser
humano pela velocidade das má quinas e pela visualidade do cinema.

Formas ú nicas de continuidade no espaço, de Umberto Boccioni, 1913. Escultura em bronze,


111,2 cm (altura) >< 88,5 cm (comprimento) >< 40 cm (largura).

MURALISMO

Usar a arte como forma de provocar reflexao crítica sobre a sociedade e os sistemas políticos
também foi um dos aspectos do Muralismo mexicano nas primeiras décadas do século XX. Artistas
como Diego Rivera (1886-1957), José Clemente Orozco (1883- 1949) e Davi Alfaro Siqueiros (1896-
1974) construíram discursos em forma de pinturas gigantes em prédios pú blicos e muros das
cidades do México. A situaçã o politica vivida naquele país incentivava a luta com teor marxista em
prol da classe trabalhadora.

EI pueblo ala Universidad y la Universidad al pueblo (0 povo na universidade e a


universidade para o povo), de David Alfaro Siqueiros, 1952-1956. Escultura de ferro, cimento e
mosaicos de vidros, 30,4 m >< 15 m. Mural no edifício administrativo da Universidade Nacional
Autô noma do México (Unam), no campus da Cidade do México.

DADAÍSMO
Ar de Paris, de Marcel Duchamp, 1919. Ready- made, ampola de vidro, 6,35 cm >< 13,3 cm de
diâ metro.

Manifestou-se segundo uma concepçã o de arte sem delimitaçõ es entre as linguagens (poesia,
teatro, mú sica e artes visuais). Principais representantes: Tristan Tzara, pseudô nimo de Samuel
Rosenstock (1896- 1963), Jean Arp (1887-1966), Kurt Schwitters (1887-1948), Frans Picabia
(1879-1953), Man Ray (1890-1976) e Marcel Duchamp (1887-1968). impulsionou ao longo de todo
o século XX muitas outras tendências.

SURREALISMO

Movimento surgido no início do século XX, em Paris, fruto da influéncia de Sigmund Freud e
de todas as transformaçõ es políticas e econô micas ocorridas na Europa nesse período. O grande
marco foi o lançamento do Manifesto Surrealista, escrito por André Breton em 1924. Esse manifesto
tinha o propó sito de criar uma nova maneira de ver e entender a arte segundo alguns princípios:
ausência da ló gica, adoçã o de uma realidade diferenciada, exaltaçã o da liberdade de criaçã o, de um
mundo irracional, onírico e inconsciente, entre outros ideais.

The Anthropomorphic Cabinet, de Salvador Dalí, 1979-1982. Escultura em bronze, 60 cm ><


30 cm.

ABSTRACIONISMO

Composiçã o II em vermelho, azul e amarelo, de Piet Mondrian, 1930. Ó leo sobre tela, 86 cm ×
66 cm.

A arte abstrata surgiu no início do século XX e passou a ser um movimento tã o extenso que
precisou ganhar sentidos particulares, desmembrando -se em outros "ismos": Expressionismo
abstrato, Suprematismo, Construtivismo, Neoplasticismo, Espacialismo, Minimalismo abstrato,
entre outros.
Pá gina 138

FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
1. (Enem-MEC)

Imagem da obra Mercado de Artes/Mercado de Bananas de Paulo Nazareth

(Tradução da placa: “Não me esqueçam quando eu for um nome importante.”) NAZARETH, P. Mercado de Artes/Mercado de
Bananas. Miami Art Basel, EUA, 2011. Disponível em: www.40forever.com.br. Acesso em: 31 jul. 2012.

A contemporaneidade identificada na performance/instalaçã o do artista mineiro Paulo


Nazareth reside principalmente na forma como ele

a) resgata conhecidas referências do modernismo mineiro.

b) utiliza técnicas e suportes tradicionais na construçã o das formas.

c) articula questõ es de identidade, territó rio e có digos de linguagens.

d) imita o papel das celebridades no mundo contemporâ neo.

e) camufla o aspecto plá stico e a composiçã o visual da sua montagem.

2. (Enem-MEC)

A mú sica e a matemá tica se encontram na representaçã o dos tempos das notas musicais,
conforme a figura seguinte.
Editoria de arte

Um compasso é uma unidade musical composta por determinada quantidade de notas


musicais em que a soma das duraçõ es coincide com a fraçã o indicada como fó rmula do
1
compasso. Por exemplo, se a fó rmula de compasso for , poderia ter um compasso ou com
2
duas semínimas ou uma mínima ou quatro colcheias, sendo possível a combinaçã o de
3
diferentes figuras. Um trecho musical de oito compassos, cuja fó rmula é , poderia ser
4
preenchido com ,

a) 24 fusas.

b) 3 semínimas.

c) 8 semínimas.

d) 24 colcheias e 12 semínimas.

e) 16 semínimas e 8 semicolcheias.
Pá gina 139

3. (UFRGS-RS) Observe a figura ao lado.

Abaporu Tarsila do Amaral. 1928. Ó leo sobre tela, 85 cm × 73 cm.

A Semana de Arte Moderna, realizada em Sã o Paulo em 1922, representou um marco na


cultura brasileira. Tarsila do Amaral trouxe a pú blico, em 1928, a obra o Abaporu, que passou
a ser representativa do Manifesto Antropofá gico. Esse manifesto:

a) defendia a migraçã o de europeus para diminuir a importâ ncia dos brasileiros.

b) propunha a “deglutiçã o” da cultura europeia remodelada e devidamente enraizada à


terra brasileira, sintetizada na conhecida frase “Tupi or nor tupi, that’s the question”.

c) exalava a cultura europeia e o transplante cultural e artístico do Velho para o Novo


Mundo.

d) valorizava a presença da cultura estrangeira no Brasil e também a manutençã o de


padrõ es arcaicos.

e) justificava a mentalidade subserviente e o sentimento de inferioridade do brasileiro


em relaçã o aos europeus.

4. (Enem-MEC)

IMODESTO “As colunas do Alvorada podiam ser mais fá ceis de construir, sem
aquelas curvas. Mas foram elas que o mundo inteiro copiou”

Brasília 50 anos. Veja. nº 2138, nov. 2009.


Veja, nº 2138. nov. 2009

Utilizadas desde a Antiguidade, as colunas, elementos verticais de sustentaçã o, foram


sofrendo modificaçõ es e incorporando novos materiais com ampliaçã o de possibilidades.
Ainda que as clá ssicas colunas gregas sejam retomadas, notá veis inovaçõ es sã o percebidas, por
exemplo, nas obras de Oscar Niemeyer, arquiteto brasileiro nascido no Rio de Janeiro em 1907.
No desenho de Niemeyer, das colunas do Palá cio da Alvorada, observa-se

a) a presença de um capitel muito simples, reforçando a sustentaçã o.

b) o traçado simples de amplas linhas curvas opostas, resultando em formas marcantes.

c) a disposiçã o simétrica das curvas, conferindo saliência e distorçã o à base.

d) a oposiçã o de curvas em concreto, configurando certo peso e rebuscamento.

e) o excesso de linhas curvas, levando a um exagero na ornamentaçã o.


Pá gina 140

FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
5. (Enem-MEC)

Era um dos meus primeiros dias na sala de mú sica. A fim de descobrirmos o


que deveríamos estar fazendo ali, propus à classe um problema. Inocentemente
perguntei: — O que é mú sica?

Passamos dois dias inteiros tateando em busca de uma definiçã o.


Descobrimos que tínhamos de rejeitar todas as definiçõ es costumeiras porque elas
nã o eram suficientemente abrangentes.

O simples fato é que, à medida que a crescente margem a que chamamos de


vanguarda continua suas exploraçõ es pelas fronteiras do som, qualquer definiçã o
se torna difícil. Quando John Cage abre a porta da sala de concerto e encoraja os
ruídos da rua a atravessar suas composiçõ es, ele ventila a arte da mú sica com
conceitos novos e aparentemente sem forma.

SCHAFER, R. M. O ouvido pensante. Sã o Paulo: Unesp, 1991 (adaptado).

A frase “Quando John Cage abre a porta da sala de concerto e encoraja os ruídos da rua a
atravessar suas composiçõ es”, na proposta de Schafer de formular uma nova conceituaçã o de
mú sica, representa a

a) acessibilidade à sala de concerto como metá fora, num momento em que a arte deixou
de ser elitizada.

b) abertura da sala de concerto, que permitiu que a mú sica fosse ouvida do lado de fora
do teatro.

c) postura inversa à mú sica moderna, que desejava se enquadrar em uma concepçã o


conformista.

d) intençã o do compositor de que os sons extramusicais sejam parte integrante da


mú sica.

e) necessidade do artista contemporâ neo de atrair maior pú blico para o teatro.

6. (Enem-MEC)
Iotti/Jornal Zero Hora, 2 mar. 2006.

Jornal Zero Hora, 2 mar. 2006.


Pá gina 141

Na criaçã o do texto, o chargista Iotti usa criativamente um intertexto: os traços


reconstroem uma cena de Guernica, painel de Pablo Picasso que retrata os horrores e a
destruiçã o provocados pelo bombardeio a uma pequena cidade da Espanha. Na charge,
publicada no período de carnaval, recebe destaque a figura do carro, elemento introduzido por
Iotti no intertexto. Além dessa figura, a linguagem verbal contribui para estabelecer um
diá logo entre a obra de Picasso e a charge, ao explorar

a) uma referência ao contexto, “trâ nsito no feriadã o”, esclarecendo-se o referente tanto
do texto de Iotti quanto da obra de Picasso.

b) uma referência ao tempo presente, com o emprego da forma verbal “é”,


evidenciando-se a atualidade do tema abordado tanto pelo pintor espanhol quanto pelo
chargista brasileiro.

c) um termo pejorativo, “trâ nsito”, reforçando-se a imagem negativa de mundo caó tico
presente tanto em Guernica quanto na charge.

d) uma referência temporal, “sempre”, referindo-se à permanência de tragédias


retratadas tanto em Guernica quanto na charge.

e) uma expressã o polissêmica, “quadro dramá tico”, remetendo-se tanto à obra pictó rica
quanto ao contexto do trâ nsito brasileiro.

7. (Enem-MEC) A capa do LP Os Mutantes, de 1968, ilustra o movimento da


contracultura. O desafio à tradiçã o nessa criaçã o musical é caracterizado por

a) letras e melodias com características amargas e depressivas.

b) arranjos baseados em ritmos e melodias nordestinos.

c) sonoridades experimentais e confluência de elementos populares e eruditos.

d) temas que refletem situaçõ es domésticas ligadas à tradiçã o popular.

e) ritmos contidos e reservados em oposiçã o aos modelos estrangeiros.


Os Mutantes. Polydor records. 1968
Pá gina 142

EXPEDIÇÃO CULTURAL
Você observou que costumamos criar com base em nosso repertó rio cultural. Assim,
procure saber o que está acontecendo em sua cidade nas diversas linguagens artísticas. Se
possível, assista aos espetá culos, visite ensaios, museus e ateliês, converse com os profissionais
e artistas e registre em seu diá rio de bordo como você percebe o processo de criaçã o deles.

Para criar é importante pesquisar, observar como outras pessoas criam, fazer escolhas
de temas, linguagens, materialidades... Em sua cidade existem ateliês, salas de dança,
musicotecas ou teatros abertos à visitaçã o? Você conhece grupos de amigos que se reú nem
para criar? Visite-os.

Enfim, para criar é importante ter repertó rio cultural. Por isso, amplie o seu,
aventurando-se em expediçõ es culturais, como observamos na imagem abaixo.

Leo Caldas/Pulsar

Grupo de estudantes visita a Casa Museu do Mestre Vitalino, em Alto do Moura (PE). Foto de 2010.
Pá gina 143

DIÁRIO DE BORDO
Neste capítulo, você teve acesso a algumas informaçõ es sobre processo de criaçã o.
Conheceu artistas de diferentes períodos da histó ria da arte. Dizemos “algumas informaçõ es”
porque esse campo é muito vasto e há muito ainda para conhecer e estudar. Pesquise mais
sobre os temas apresentados e reflita sobre tudo o que você viu neste capítulo. A seguir,
responda:

• O que mais chamou sua atençã o? Sobre o que você gostaria de saber mais?

• Você ficou com vontade de criar em alguma linguagem artística? Qual?

• Descreva como poderia ser um projeto de arte em que você colocasse sua poética
pessoal. Que temas, materiais, linguagens você trabalharia? Gostaria de criar sozinho ou em
parceria com outras pessoas?

• Faça um esboço do seu projeto no diá rio de bordo. À s vezes você tem uma ideia genial
e ela se perde em meio aos acontecimentos do dia a dia. Você pode usar o seu diá rio de bordo
também como um caderno para registro de ideias.
Alexandre Orion. 2006-2011 (www.alexandreorion.com). Acervo do artista
Pá gina 144

CAPÍTULO 4 MATÉ RIAS DA ARTE

Filme de Wim Wenders. Pina. Alemanha. 2010. Foto: Everett Collection/Keystone

Cena do documentário Pina. Direção de Wim Wenders, 2010.

PARA ESTUDAR

• Corpo e arte
• Se a criação é mais, tudo é coisa musical!
• A alquimia da arte
• Poética da matéria
Pá gina 145

“[...]
o corpo sabe letras com gosto
de carne osso unha e gente
o corpo lê nas entrelinhas
[...]
o corpo não mente
o corpo quer dizer o que sabe
o corpo sabe
o corpo quer
o corpo diz:
– fala palavra!!!

palavracorpo corpopalavra”

CHACAL. Palavra corpo. In: ______. Belvedere [1971-2007]. Sã o Paulo: CosacNaify, 2007. p.76-77.
Pá gina 146

TEMA 1 CORPO E ARTE

Jose Farinha/Demotix/Corbis/Latinstock

Bailarina da companhia de Pina Bausch durante apresentação do espetáculo Vollmond (Lua cheia), em Londres, em 2013.

"o corpo sabe


o corpo quer
o corpo diz:
– fala palavra!!!

palavracorpo corpopalavra"

CHACAL. Palavra corpo. In: ______. Belvedere [1971-2007]. Sã o Paulo: CosacNaify, 2007. p.76-77.

Nosso corpo é complexo e sensível como expressa o poeta Chacal no poema Palavra
corpo, que abre o Capítulo 4 e o Tema 1. “O corpo sabe, o corpo quer, o corpo diz” de forma
metafó rica, ele nos diz que o corpo fala, ou seja, utiliza vocá bulos pró prios, expressos por meio
de gestos, olhares, comunicaçã o e sensibilidade à flor da pele. Essa pele guarda na memó ria
tudo o que já viveu. O corpo também guarda uma poética, maneira de ser de cada um.

Ao usar materialidades seja o corpo, tintas, pedras, madeiras ou elementos naturais, o


artista transforma-os em arte por meio de sua poética. Será que fazer arte é transformar
materialidades em poesia? A materialidade é um tema de estudo em Arte, pois nos permite
conhecer como a arte é constituída, ganha corpo e se torna perceptível.

Materialidades da arte
A materialidade nas obras de arte é constituída, basicamente, por suporte, ferramenta e
meios. Ela proporciona consistência física à s obras de arte, quando o artista transfere suas
obras do plano das ideias para o plano real, no momento da produçã o do seu projeto.

O suporte é o material que segura, que dá sustentaçã o à obra. Costumamos pensar na


tela no caso da pintura, por exemplo, mas o suporte também pode ser, nas artes visuais, além
da tela, o muro, o bronze, o má rmore, e tantos outros tipos; na mú sica, a pessoa que toca ou
canta; no teatro e na dança, a pessoa e seu pró prio corpo em movimento.

As ferramentas, por sua vez, sã o os “equipamentos” que possibilitam a produçã o da arte:


pincéis, goivas, instrumentos musicais, a voz e, mais uma vez, o pró prio corpo (no caso do
teatro e da dança ele é basicamente suporte e ferramenta).

Goivas: sã o ferramentas usadas na criaçã o de matrizes em xilogravuras; têm a funçã o de fazer cortes e sulcos na
madeira. Essas ferramentas também sã o utilizadas por marceneiros e escultores.
Pá gina 147

Os meios (ou matéria) sã o os materiais necessá rios para a arte se concretizar, por
exemplo: a tinta e o grafite do lá pis nas artes visuais, o ar por onde os sons da mú sica se
propagam, o espaço em que os movimentos expressivos e gestos nas artes cênicas (teatro e
dança) acontecem.

A arte pode ser feita em diferentes linguagens e materialidades, e as mú ltiplas


possibilidades de misturas sã o permitidas, pois dã o forma à s linguagens híbridas na arte
contemporâ nea.

Cada artista manipula a materialidade da maneira que melhor lhe convém em funçã o de
suas ideias, intençõ es, inspiraçõ es... Essas escolhas podem também ser conhecidas como
“poéticas da materialidade”. Há obras de arte que precisam ser expressadas em determinadas
materialidades para existirem. Assim a poética, as ideias e expressõ es dos artistas podem viver
e se constituir por meio das infinitas materialidades da arte.

O corpo como suporte


Conhecer o material com o qual se trabalha é importante para conseguir tirar o melhor
proveito e potencializar o que se quer mostrar. Nos movimentos de uma bailarina ou nos
gestos de um ator, podemos compreender o que é usar o corpo como um suporte, uma
ferramenta, como meio para fazer arte. A coreó grafa e bailarina alemã Pina Bausch explorou a
matéria “corpo” de uma forma excepcional, além de ter sido mestre no ensino da arte da dança.
Com um mergulho nos sentimentos humanos, sua técnica articulava no palco tanto seu corpo
quanto dos bailarinos da companhia Wuppertal Tanztheater Pina Bausch. Na pá gina ao lado,
veja a expressividade e emoçã o da bailarina no espetá culo Vollmond (Lua cheia). Pina dizia
que cada bailarino precisa encontrar sua pró pria poética, maneira singular de expressar o
gesto, os movimentos, de desenvolver a coreografia com sinceridade, emoçã o. O método criado
pela coreó grafa explora o conhecimento do corpo, da mente e das emoçõ es em conjunto, na
intençã o de descobrir o que essa mistura pode criar com o corpo que se movimenta com
estética e poética.

A dança é a arte do movimento, mas o que se movimenta? O corpo sempre foi usado para
manifestar emoçõ es, crenças ou explorar o prazer, as sensaçõ es que o mundo nos oferece. À s
vezes, nos lembramos desse “material” apenas quando sentimos um incô modo ou dor.
Entretanto, o corpo nos acompanha em nossos pensamentos e expressõ es de sentimentos. O
corpo físico e emotivo é usado na dança para criar arte.

No início da cultura humana, a dança estava mais ligada a ló gicas místicas e religiosas,
mas com o tempo foi adquirindo mais significados e seguindo rumos expressivos na vida das
pessoas em diversas culturas. Hoje, a dança é considerada movimento expressivo. É a
expressã o artística que se dá por meio dos desenhos construídos pelo corpo ao som da mú sica
ou do silêncio. Ela pode ser elaborada para projetos artísticos específicos de dança, para teatro,
cinema e televisã o, para apresentaçõ es em espaços alternativos, para mostrar sensaçõ es,
sentimentos e visõ es de mundo, e também para externar prazer e alegria em festas e
comemoraçõ es. Pode ser fruto de um impulso interno, de reaçã o a uma mú sica ou batida
(como fazem bebês e crianças pequenas) ou entã o expressã o de uma cultura ou de um povo.
Também dessa linguagem nascem outras que expandem, se misturam na arte contemporâ nea,
como as performances, as intervençõ es urbanas e a videoarte.
Pina Bausch, em sua explosã o criativa, explorava em suas coreografias cada parte dos
corpos dos bailarinos para que esses corpos revelassem sua alma. Em uma de suas criaçõ es,
além dos corpos ela também utilizou outras materialidades, colocando no palco uma rocha e
á gua caindo sobre os bailarinos e se espalhando no chã o, por exemplo. Todo esse cená rio sob o
efeito de luzes que proporcionavam a sensaçã o de uma noite ao luar. Uma luz que, como
material, criava uma Lua imaginá ria, sensorial. É o espetá culo Vollmond (Lua cheia), de 2006,
cuja imagem pode ser apreciada na pá gina de abertura deste capítulo e na pá gina ao lado.
Pá gina 148

A arte de REGINA ADVENTO


Na companhia Tanztheater Wuppertal Pina Bausch há participaçõ es de bailarinos de
vá rios países, inclusive de brasileiros, como Regina Advento (1965-), que participa da
companhia há mais de vinte anos. Nas orientaçõ es dadas por Pina, ela aprendeu que dançar é
conhecer o pró prio corpo; que os movimentos da mã o, dos dedos, do cotovelo sã o importantes,
que o bailarino precisa usar todas as juntas e explorar todo movimento que o corpo pode
proporcionar. Regina começou a dançar ainda criança, aos 10 anos, em Belo Horizonte, nos
projetos do Grupo Corpo. Foi do elenco do grupo de 1984 a 1990. Depois foi para a Alemanha,
entrando na companhia de Pina Bausch em 1993.

Bernd Thissen/DPA/AFP/Otherimages

Regina Advento, bailarina da companhia Tanztheater Wuppertal Pina Bausch, durante ensaio geral no teatro em
Wuppertal, Alemanha. Foto de 2004.

Palavra do artista

“Aprendi muito observando as pessoas, o quanto os movimentos sã o bonitos, coisas tão


simples. Quando cheguei, na primeira produçã o que fiz, a Pina nos deu pelo menos uns setenta
movimentos, todos de braço. Podíamos brincar, conhecer os movimentos para fazer a nossa
coreografia, que depois virariam a coreografia da companhia. Para o estilo da Pina, fui
aprendendo a me moldar.”

Regina Advento

BENVEGNU, Marcela; OLIVEIRA, Flá via Fontes. O sol de Regina Advento. Revista de Dança, Sã o Paulo: FM, ano 2, 8
mar. 2015. Disponível em: <http://revistadedanca.com.br/o-sol-de-reginaadvento>. Acesso em: 26 jan. 2016.
Robbie Jack/Corbis/Latinstock

Regina Advento em apresentação no Festival Internacional de Edimburgo, Escócia. Foto de 2014.

Ofício da arte

Bailarino(a)

Profissional que pode fazer parte de um grupo de dança, um corpo de baile, montar e
dirigir espetá culos de dança ou nú meros coreografados para musicais, teatro, cinema ou TV,
além de espetá culos solo. Em quaisquer dessas atividades, empregam-se os movimentos
corporais, executados de maneira rítmica, com a finalidade de narrar uma histó ria ou
expressar uma ideia ou emoçã o. Pode trabalhar, ainda, em coreografia, definindo os passos e
os movimentos que os bailarinos executarã o em um espetá culo ou apresentaçã o. Há trabalhos
também em instituiçõ es sociais, penais e de saú de, que costumam contratar o profissional de
dança para ajudar na recuperaçã o e na reintegraçã o de adolescentes, crianças e pessoas com
deficiência física e mental, além de cursos de conscientizaçã o corporal para leigos. Para atuar
como bailarino profissional, além de cursos específicos, é preciso atestado de capacitaçã o
profissional fornecido pelos sindicatos da categoria. Para obter o documento, é necessá rio
passar por uma análise de currículo e uma prova prá tica. Quem faz licenciatura está habilitado
para dar aulas de dança ou expressã o corporal na educaçã o bá sica ou em cursos livres.

DICA
Para visitar

Em muitas cidades há centros culturais, pontos e casas de cultura ou projetos ligados a secretarias de
cultura estaduais e municipais que oferecem aulas gratuitas de dança. Procure saber mais sobre isso em sua
cidade.
Pá gina 149

As marcas no corpo
"[...]
Quero ser a cicatriz risonha e corrosiva
Marcada a frio, ferro e fogo
Em carne viva
[...]"

BUARQUE, Chico; GUERRA, Ruy. Tatuagem. Inté rprete: Chico Buarque. In: Chico canta (Calabar). Rio de Janeiro:
Universal, 1972. LP (relançado em CD). Faixa 3. Disponível em:
<http://www.chicobuarque.com.br/construcao/mestre.asp?pg=tatuagem_72.htm>. Acesso em: 2 fev. 2016.

Muitas linguagens artísticas utilizam o corpo como suporte. Manifestaçõ es que usam
como método marcar, pintar, perfurar ou modelar o corpo de alguma maneira sã o chamadas
de body art. O artista francês Marcel Duchamp (1887-1968), pintor, escultor e poeta
participante dos movimentos dadaísta e surrealista e um dos precursores da arte conceitual,
na obra intitulada Tonsura (1921), raspou parte da pró pria cabeça, deixando uma imagem de
estrela e uma linha que se alongava até a parte da frente do rosto. Hoje, isso nã o é mais
novidade, muitos cabeleireiros fazem penteados dessa maneira para seus clientes do dia a dia,
mas na época era incomum até no meio artístico. Duchamp estava experimentando
materialidades que pudessem servir como suporte para suas ideias, inclusive o corpo. Entã o,
por que nã o a pró pria cabeça?

Body art: é a arte do corpo; o termo nasceu no sé culo XX, mas há prá ticas culturais mais antigas. Nessa linguagem, o
corpo é usado como material expressivo (suporte ou ferramenta). Happenings e performances podem estar associados a ela,
explorando o corpo em intervençõ es plá sticas temporá rias ou permanentes.

Hoje, muitas pessoas, artistas ou nã o, fazem interferências no seu pró prio corpo
(penteados, maquiagens, pinturas corporais, tatuagens). O corpo pode ser utilizado também
como suporte ou ferramenta em outras circunstâ ncias culturais ou artísticas, como é possível
observar nas duas imagens desta pá gina.

Faz parte de muitas tradiçõ es culturais usar o corpo como suporte, como mostra a foto
de um Maori sendo tatuado. Na imagem abaixo, vemos o artista Yves Klein preparando o corpo
de uma modelo para ser usado como ferramenta (pincel) em sua obra Antropometria.
Rene Burri/Magnum Photos/Latinstock

Yves Klein em seu estúdio, em 1961, dirigindo uma modelo para a performance Body Art Painting. Nessas performances, as
quais Klein chamou de Antropometria, modelos tinham seus corpos nus cobertos com tinta e se movimentavam ou fixavam sobre o
papel para criar as imagens.

George Steinmetz/Corbis/Latinstock

George Steinmetz/Corbis/Latinstock

A tatuagem faz parte da tradição do povo Maori, da Nova Zelândia. Na foto, uma tatuagem é realizada no rosto de um
homem, processo que pode levar vários dias. Chamada de Moko, essa tatuagem facial geralmente é feita em dois dias, em duas
sessões de quatro horas cada. Foto de 1995.
Pá gina 150

Nas artes visuais, o corpo pode ser tanto o suporte como a ferramenta. O artista francês
Yves Klein (1928-1962) criou obras trabalhando com modelos que tiveram seus corpos
manipulados como se fossem pincéis, ou seja, como as ferramentas para a criaçã o das obras.
Klein passava a tinta nos corpos das modelos e depois os pressionava sobre um suporte como
folhas gigantes de papel, que eram colocadas na parede ou no chã o. Por vezes, ele propunha
performances em que as modelos entintadas arrastavam umas as outras para criar as pinturas,
acompanhadas pela apresentaçã o de mú sicos ao vivo. Tratava-se de um modo diferente de
pintar, explorando novas materialidades e procedimentos e provocando reflexõ es sobre as
formas de concepçã o artística. Um dos resultados deste tipo de pintura você vê na imagem
abaixo, em que o artista criou vá rios trabalhos em tons de azul, pigmentaçã o criada por ele
mesmo, imprimindo as formas das modelos sobre os suportes (papéis, tecidos) na técnica de
frotagens (do francêsfrottage, frotter; que significa “esfregar”), performances em que os corpos
das modelos eram pintados e “esfregados” como pincéis “vivos” no papel para criar as
pinturas.

Muito antes de classificarem a arte de utilizar o corpo como suporte ou ferramenta com
o nome de body art, as pinturas corporais – permanentes ou temporá rias – já eram muito
conhecidas em técnicas e procedimentos em tradiçõ es culturais. A tatuagem geralmente é uma
arte permanente no corpo, aplicada na pele por meio de instrumentos com agulhas com tintas.
Ao longo do tempo, os artistas desenvolveram infinidades de tintas, instrumentos, técnicas e
imagens para os adeptos dessa arte marcarem o seu corpo. Os adeptos também podem optar
por tatuagens temporá rias, como as de hena, que desaparecem com o desgaste da tinta.

A tatuagem é uma manifestaçã o antiga existente em muitas culturas, tendo vestígios


encontrados até em corpos mumificados. Nas técnicas contemporâ neas, sã o usadas como
ferramentas agulhas de metal (esterilizadas e descartá veis, por questõ es de saú de), mas em
prá ticas mais antigas, grupos culturais utilizavam ossos de aves como ferramentas e materiais
como fuligem de madeira queimada, gordura de animais, resinas vegetais e pigmentos naturais
como matérias. Segundo algumas versõ es sobre a histó ria da tatuagem, os termos tattoo
(inglês), tattow ou tatau (taitiano) eram uma referência ao som emitido quando os
instrumentos de ossos eram batidos para introduzir a tinta na pele no momento da execuçã o
da tatuagem.

Atualmente, a arte da tatuagem ainda é referência em vá rias culturas. Em algumas, ainda


há o aspecto religioso e sagrado, em outras serve para distinguir grupos e papéis sociais. Na
maioria dos casos, as pessoas escolhem a linguagem da tatuagem para enfeitar ou modificar o
corpo, evidenciar formas de pensar ou prestar homenagens. Em alguns nú cleos sociais, ainda
há muito preconceito em relaçã o à tatuagem, uma vez que esse procedimento também foi
muito usado dentro de presídios, para sinalizar mensagens de protesto ou identificar
pertencimento a certos grupos. Enfim, há muitos motivos para o uso da linguagem da
tatuagem, determinados pela cultura e pelos valores aos quais cada indivíduo ou cada grupo de
seres humanos pertencem.
Yves Klein. 1960. Impressão, pigmento e resina sintética em corpo em papel sobre tela. Coleçã o particular. Foto: AKG/Latinstock

Antropometria: ANT 130, de Yves Klein, 1960. Impressão, pigmento e resina sintética em corpo em papel sobre tela, 194 cm
× 127 cm.
Pá gina 151

A valorizaçã o do corpo
"A arte carnal nã o procura purificaçã o, mas busca transformar o corpo em
língua"

Depoimento da artista ORLAN em uma palestra no Brasil, em 2008, sobre a arte de modificar o pró prio corpo com
cirurgias.

Na cultura de um povo, os eventos nã o acontecem de repente de um momento para o


outro. As ideias e os movimentos artísticos e sociais sã o frutos de processos, discursos poéticos
e açõ es. A artista performá tica francesa ORLAN (1947-), que escreve seu nome com todas as
letras em maiú sculo, já como uma manifestaçã o artística, utiliza vá rias linguagens e tem
causado polêmica com suas obras de body art e suas performances, principalmente naquelas
em que usa cirurgia plá stica como procedimento artístico. Nesses casos, bisturis, anestesias e
outros materiais médicos estã o a serviço nã o apenas da medicina, mas também da arte.

A discussã o em obras como as de ORLAN está relacionada à s culturas e à s convençõ es


que deixam marcas nos corpos das pessoas. Atualmente, o nú mero de cirurgias plá sticas e suas
técnicas tem aumentado consideravelmente. Todos os anos algumas mortes acontecem em
razã o da busca exagerada das pessoas pelo corpo perfeito, dentro de um padrã o de beleza
ditado pelas mídias e pela indú stria da moda em geral, que recorrem, muitas vezes, a
profissionais desqualificados e a procedimentos perigosos.

O trabalho da artista critica essas ideias. Suas cirurgias plá sticas objetivam questionar
esses valores. ORLAN nã o quer ficar “bonita”, pelo menos nã o na concepçã o do senso comum
ou das mídias. Ela pretende colocar em seu corpo traços culturais presentes em imagens
conhecidas na histó ria da arte, como a da pintura de Vênus (1490-1500), do artista
renascentista Botticelli (1445-1510), essa imagem é um dos símbolos de beleza ideal.

Desta forma, a artista utiliza-se de vá rias imagens criadas em diferentes movimentos


artísticos e que exaltam o ideal de beleza clá ssico para criar a sua obra. Ela seleciona as
imagens de referência e depois mistura tudo em seu rosto em dois tipos de projetos: artes
grá ficas e vídeos (cria imagens feitas em programas de computadores misturando vá rias
imagens a seus autorretratos) e em performances e body art (realiza cirurgias plá sticas para
mudar suas feiçõ es inspirada nas imagens de obras de arte de vá rias épocas). ORLAN relata
que a sua intençã o ao escolher esses procedimentos é demonstrar o quanto estamos presos à
ditadura de padrõ es de beleza e à s convençõ es.

O conceito de beleza é relativo, nã o é um valor universal e ú nico. Assim, o que é belo


para uns pode parecer grotesco para outros, mas todos temos o direito de ser da forma que
quisermos. Seres híbridos, belos em sua essência, não apenas seguindo uma aparência
específica para agradar a alguém que quer ditar o que e como devemos ser.

A artista ORLAN usa imagens de diferentes culturas e tempos e sua pró pria imagem para
fazer composiçõ es usando o computador. Vamos experimentar com a mistura de imagens?
Pense nos valores que você quer transmitir com suas escolhas. Tire uma có pia de uma imagem
sua e trabalhe essa imagem, fazendo interferências por meio de um programa de computador
ou usando os seguintes materiais: recortes de revistas feitos com tesoura ou à mã o, cola e
canetas hidrográ ficas.
Podemos também fazer performances artísticas e body art usando nosso corpo como
suporte. Pintar partes do corpo é fazer body art, assim como usar roupas de uma ú nica cor
para transmitir uma mensagem também pode ser um tipo de performances utilizando o corpo
como suporte. O que vale é a intençã o e a poética artística! Qual é a sua?

Justin Tallis/AFP

A artista ORLAN posa diante das pinturas (estudos) de Vênus, de Botticelli, referências como “padrão de beleza” para suas
obras. Foto de 2016.
Pá gina 152

Giro de ideias: Ela dança, ele dança, eu danço

Foto: Agnaldo Passos/Acervo do projeto Bailarina Projétil

Deise Gabrielle, bailarina do Projeto Bailarina Projétil, em Ferrovia, Salvador, BA. Foto de 2013.

Ainda hoje existe a ideia de que a dança é apenas a clá ssica ou de que essa arte é
somente para o gênero feminino. A dança, assim como a sociedade, está em constante
mudança, e hoje temos uma imensa variedade de estilos de dança artística praticados tanto por
homens quanto por mulheres. Observe e compare as semelhanças e diferenças entre a
bailarina apresentada nesta pá gina e a bailarina na pintura de Degas na pá gina seguinte. Na
linguagem da dança, principalmente em nossa época, há muitas manifestaçõ es expressivas.

A visã o sobre quem dança também mudou. Muitas vezes, temos a imagem de como os
artistas sã o por conta da histó ria que nos foi contada. Quando você pensa em uma bailarina, o
que vem à sua mente? O que vem à sua memó ria é a figura de uma jovem com roupas
esvoaçantes dançando com sapatilhas de ponta? Esse tipo de figurino ainda existe e muitas
companhias de balé escolhem compor espetá culos no estilo do ballet clá ssico, estética artística
da dança que nasceu nas cortes europeias e que teve seu apogeu na França, na corte de Luís
XIV, conhecido como o “Rei Sol”. Ele foi um grande incentivador das artes, criando uma série de
instituiçõ es destinadas a promovê-las, dentre as quais a Académie Royale de Danse, em 1661.
Em seu reinado, surgiram as figuras do professor e do coreó grafo de dança. Suas
características referem-se à linearidade nos movimentos; à verticalidade; à utilizaçã o de
narrativas associadas aos contos de fadas, histó rias de príncipes e princesas; ao padrã o
estético definido: bailarinos e bailarinas magros, altos, de pernas longas, em busca pelo etéreo,
divino, além do humano.

Nesse contexto, surgiu a sapatilha de ponta e o coque nos cabelos das mulheres.

A tradiçã o do balé clá ssico trouxe uma imagem de senso comum sobre a figura da
bailarina. Repensando essa ideia, surgiu o projeto Bailarina Projétil, que procura ressignificar a
visã o do corpo e a postura nessa arte. A ideia é contrapor a ambientaçã o e os corpos artísticos
padrã o, focando na arte corpó rea brasileira. O projeto quer romper com estigmas de que
qualidade técnica e beleza estã o diretamente ligados a padrõ es estéticos, corpó reos e
ambientais predeterminados. Acesse a pá gina do projeto na internet:
<http://tub.im/kw468p> (acesso em: 26 jan. 2016) e veja as imagens de bailarinas de
diferentes tipos étnicos e em diversos cená rios de vá rias cidades brasileiras.
Pá gina 153

Assim, com o coraçã o e a mente desprovidos de preconceitos, permita-se conhecer mais


sobre o universo da dança.

Como atividade para analisar a dança em seu cotidiano e romper com preconceitos,
reú na-se com os colegas para uma conversa. Vocês podem assistir a um trecho de um
espetá culo de dança e depois debater sobre como os bailarinos utilizam seus corpos de modo
expressivo.

Converse com seus amigos sobre como vocês se relacionam com a arte da dança.
Costumam dançar com seus amigos? Que tipo de dança vocês gostam mais? Vocês consideram
que é preciso ter um tipo físico específico para dançar? Todos podem dançar? Escreva abaixo a
opiniã o da turma.

Edgar Degas. c. 1876-1878. Monotipia e pastel sobre papel. Museu d’Orsay, Paris

A primeira bailarina, de Edgar Degas, c. 1876-1878. Monotipia e pastel sobre papel, 58 cm × 42 cm.
Pá gina 154

DICA
Para navegar

Você também pode pesquisar mais sobre pessoas que dançam atualmente, principalmente em nosso
país, como o Grupo Corpo, acessando o site: <http://tub.im/4ikp7g> (acesso em: 26 jan. 2016).

Para assistir

Há vá rios DVDs de espetá culos e também vídeos na internet. É possível assistir à coreografia Vollmond
(Lua cheia) e outras da artista Pina Bausch no documentá rio Pina, filme dirigido pelo cineasta, dramaturgo e
fotó grafo alemã o Wim Wenders (1945-). Esse filme também ganhou uma versã o em 3D, o que nos aproxima
ainda mais dos movimentos dos bailarinos.

Filme de Wim Wenders. Pina. Alemanha. 2010.

Reprodução da capa da versão em 3D do documentário Pina. Direção de Wim Wenders. Alemanha/França/Reino Unido:
Imovision, 2010. 103 min.

Giro de ideias: A tatuagem


Na reproduçã o da pintura Tattoo artist (O artista tatuador), o artista estadunidense
Norman Rockwell (1894-1978) retrata um tatuador e seu cliente. O que está acontecendo na
cena? Para descobrir, vamos fazer uma leitura da imagem, seguindo o roteiro de perguntas.
Norman Rockwell. 1944. Ó leo sobre tela. The Brooklyn Museum of Art. Printed by permission of the Norman Rockwell Family Agency. Copyright © 1944 The Norman Rockwell Family
Entities. Norman Rockwell Museum Digital Collections, Stockbridge, MA

Tattoo artist (O artista tatuador), de Norman Rockwell, 1944. Óleo sobre tela, 109,54 cm × 84,13 cm.

• Ao primeiro olhar, o que é possível perceber nessa imagem?

• O que está escrito no braço da pessoa que está sendo tatuada? E nas imagens ao fundo,
o que você vê?

• Em que local essa cena acontece?

• Que cores e formas o artista usou para compor a imagem?

• Por que será que o artista escolheu esse tema?

• Na maioria dos casos, as pessoas optam por tatuagens permanentes na pele. Qual a sua
opiniã o sobre isso?

• Você conhece alguém que usa o pró prio corpo como suporte para a arte, como a
tatuagem? O que você acha do uso do corpo como suporte para arte?

• Quais outros temas relacionados à body art podem ser debatidos além da tatuagem?
Pá gina 155

Escreva aqui um resumo da leitura de imagem que você fez.

Giro de ideias: Nosso corpo


Crie um fó rum com os seus amigos e compartilhem as opiniõ es sobre as questõ es a
seguir.

• Você gostaria de mudar algo em seu corpo para se tornar uma pessoa mais atraente?

• Como você vê a ditadura da beleza imposta pela mídia e pelo mercado?

• Como, em geral, lidamos com nosso corpo e o que a sociedade nos cobra?

• Pesquise sobre os temas: body art, o corpo como tabu e objeto de exploraçã o e escreva
o que você descobriu.
Pá gina 156

Conexõ es Arte e Tecnologias


A desmaterializaçã o do corpo
Desde a segunda metade do século XX, misturas e fusõ es entre as artes e a tecnologia vêm
gerando variadas expressõ es artísticas, nas quais a questã o da combinaçã o de materialidades
também é constantemente questionada.

No curta-metragem Ghostcatching (1999, 7 min.), realizado pelos artistas digitais Paul


Kaiser (Alemanha, 1956-) e Shelley Eshkar (EUA, 1970-), o bailarino e coreó grafo estadunidense
Bill T. Jones (1952-) parece uma animaçã o grá fica computadorizada. Veja ao lado imagem do filme.
No filme, dança e cinema interagem com o vídeo, o computador e a internet, abrindo uma nova
tendência para as artes do movimento: a desmaterializaçã o do corpo. A proposta do filme é
capturar o essencial do movimento por meio de processos digitais. Foram gravadas primeiro cenas
do dançarino girando e dançando, captadas também por meio de sensores ó pticos colados ao corpo
em movimento. Depois, essas imagens sã o multiplicadas e editadas, promovendo uma interaçã o
umas com as outras, nas quais sã o aplicados, ainda, efeitos de computaçã o grá fica. O desenho de seu
corpo foi apagado e apenas seus movimentos foram preservados. A ideia foi apresentar a dança sem
o pró prio corpo, ou seja, sem o suporte e a ferramenta, restando apenas o movimento da matéria.
Essa técnica é semelhante à usada em efeitos especiais e caracterizaçã o de personagens de muitos
filmes, principalmente de animaçã o.

Paul Kaiser, Shelley Eshkar e Bill T. Jones. 1999. Foto: Acervo dos artistas
Imagem do filme Ghostcatching, realizado pelos artistas digitais Paul Kaiser e Shelley Eshkar, 1999. Efeitos de computação
em imagens gravadas fazem o dançarino Bill T. Jones parecer uma animação gráfica.

Que tal fazer uma pesquisa sobre esse tema na internet procurando descobrir outras obras
que usaram essa técnica? Como é realizado o processo? Quais sã o as ferramentas digitais
necessá rias?

DICA
Para navegar

Você pode visitar o site do projeto Ghostcatching e visualizar mais imagens do projeto acessando:
<http://tub.im/4xnmys> ou assistir a um trecho do filme na internet no site: <http://tub.im/hi88h9>
(acessos em: 26 jan. 2016).
Pá gina 157

Conexõ es
Arte e Pluralidade cultural

Marcas culturais
"Muitos deles ou quase a maior parte dos que andavam ali traziam aqueles bicos de osso
nos beiços. E alguns, que andavam sem eles, tinham os beiços furados e nos buracos uns
espelhos de pau, que pareciam espelhos de borracha; outros traziam três daqueles bicos, a
saber, um no meio e os dois nos cabos. Aí andavam outros, quartejados de cores, a saber,
metade deles da sua pró pria cor, e metade de tintura preta, a modos de azulada; e outros
quartejados de escaques."

Trecho da Carta de Pero Vaz de Caminha. Disponível em: <http://www.culturatura.com.br/dochist/carta/5.htm>. Acesso


em: 2 fev. 2016.

Sergio Ranalli/Pulsar

Pintura corporal indígena. Festa do Djawari na Aldeia Aiha, etnia Kalapalo, no Parque Indígena do Xingu, Mato Grosso, em
foto de 2011.

O quanto podem parecer estranhas as formas que cada povo escolhe para se enfeitar?
Imagine em 1500, quando os portugueses aqui chegaram e encontraram nossos povos indígenas.
No trecho da famosa carta de Pero Vaz de Caminha (1450-1500), escrivã o da esquadra comandada
por Pedro Á lvares Cabral, enviada ao rei de Portugal, D. Manuel I, temos algumas impressõ es sobre
esse encontro.

Caminha descreve como os indígenas se apresentavam no momento da chegada dos


portugueses na costa brasileira, expostos aos olhares curiosos dos estrangeiros. Ao citar na carta
que os índios se apresentam “quartejados de escaques”, ele se refere às pinturas corporais de
padrõ es geométricos, feitas com tintas de tons pretos azulados conseguidas a partir do sumo do
jenipapo, fruta popular no Norte e Nordeste. Caminha compara os padrõ es geométricos das
pinturas com desenhos do jogo de xadrez. Observe acima a imagem que retrata a pintura corporal
indígena com padrõ es geométricos.

Darcy Ribeiro (1922-1997), importante antropó logo, escritor e político, estudioso das
culturas no Brasil, em sua obra O Povo Brasileiro, de 1995, comenta que os indígenas têm uma
“necessidade de beleza” e, por essa razã o, criam adornos de plumas, enfeitam seus corpos com
pinturas e outros elementos e, assim, criam a arte indígena. As concepçõ es de beleza e arte estã o
relacionadas à s particularidades culturais de cada naçã o ou etnia indígena. Cada naçã o indígena
produz desenhos diferenciados e usa os mais variados materiais disponíveis na natureza, como a
tinta feita de jenipapo descrita na carta de Caminha. Essa tinta possui alta capacidade de fixaçã o na
pele e, por essa razã o, demora a sumir, durando, à s vezes, mais de uma semana. Outras cores sã o
conseguidas com semente de urucum, para a tinta vermelha, e com calcá rio, para a branca, além da
utilizaçã o de outros materiais para diversas cores.

Arte indígena: é toda manifestaçã o artística realizada por comunidades indígenas. Artesanato em geral, como
cestaria e cerâ mica, instrumentos, mú sica, dança, arte plumá ria e pinturas corporais sã o exemplos de arte indígena.

Como sã o os desenhos geométricos criados pelos indígenas? O que representam?

Como temos no Brasil uma grande pluralidade de culturas, é natural que cada povo indígena
tenha ideias diferentes. Desse modo, as pinturas podem apresentar vá rios motivos e significados,
como aquelas feitas para a guerra, as de casamentos e outras festas, aquelas para ritos de passagem
ou apenas para servir como adorno ou proteçã o contra mosquitos.

As imagens criadas pelas culturas indígenas apresentam riqueza de detalhes e significados


locais. Pesquise se pró ximo de onde você mora existe alguma comunidade indígena e como essa
populaçã o vive e desenvolve sua cultura. Talvez você e a turma possam visitá -la, e conhecer mais
sobre sua arte e cultura, como fez o antropó logo Darcy Ribeiro, que durante sua vida se dedicou a
saber sobre a nossa brasilidade composta por vá rios povos.
Pá gina 158

Projeto experimental
O corpo tem alguém como recheio
A frase “O corpo tem alguém como recheio” é de autoria de Arnaldo Antunes e faz parte da
mú sica Momento VIII. Para ler a letra na íntegra, acesse o site: <http://tub.im/nyof4h> (acesso em:
5 abr. 2016).

Como você interpreta essa frase? Converse com seus amigos a respeito disso.

1. Minha parte favorita

Vamos movimentar esse corpo? Conhecer o pró prio corpo é fundamental na arte da dança. A
coreó grafa Pina costumava perguntar aos bailarinos: Qual a parte preferida do seu corpo? Com base
na resposta, ela sugeria que o bailarino explorasse essa parte. Por exemplo, se um dançarino
escolhia as mã os, ela o estimulava a pensar e praticar como poderia transformar essa parte
expressiva do corpo, utilizando movimentos de dedos, do pulso, movimentando as mã os
separadamente ou unindo-as. E se fossem os olhos, a boca, o nariz, o pé, o tronco, as pernas, pois
cada um tinha uma preferência, ela também assim procedia. Escolha a sua parte corporal preferida
e explore-a, primeiro de modo individual, criando movimentos diversos, de preferência em frente a
um espelho. Depois, em grupo, cada um pode apresentar seu movimento com a parte do corpo
escolhida. Em seguida, a turma pode criar uma coreografia coletiva. O que acham? Já descobriu qual
a sua parte preferida?

2. A dança das cadeiras

O corpo do bailarino pode receber reforços comunicacionais por meio de elementos


cenográ ficos, como adereços, figurinos, cenografias, iluminaçã o ou objetos de cena.

Que tal criarmos movimentos com cadeiras? Dentro de um ambiente apropriado, ou seja, um
espaço escolhido para dançar, junte-se aos colegas e disponham algumas cadeiras na forma que
quiserem. Em seguida, criem movimentos com esses objetos. Exemplos: circulem entre as cadeiras
sem tocá -las, dancem com uma cadeira como se ela fosse seu par ou façam movimentos interagindo,
dançando em planos distintos (em cima da cadeira, embaixo, do lado, de longe, de perto...). Vale
criar como acharem melhor. Explorem mú ltiplas possibilidades.

3. Roda de adereços

Ao colocar e tirar um adereço, o ator pode trocar de personagem e, ainda, na cena seguinte,
desligar-se dessa má scara e assumir perante o pú blico sua identidade pessoal. Um objeto ou parte
do cená rio pode mudar de funçã o, de banco para cama ou para barco, por exemplo.

Na mesma perspectiva, a luz possui uma funçã o estética nos espetá culos de dança e teatro.
Em uma combinaçã o de cores, por meio de filtros, e de intensidades (mais forte, mais suave), ao
iluminar corpos, objetos e adereços cênicos, a luz pode transformar a configuraçã o, o sentido, a
materialidade, a textura, o tamanho, a cor, o volume, o contorno, o peso, o brilho daquilo que está
sob seu foco.
Sã o muitas as possibilidades que essas materialidades podem dar a um espetá culo. Para
experimentar criar uma dança com adereços, você e os colegas podem escolher um objeto, como
um chapéu, um lenço, um pedaço de tecido, uma má scara ou qualquer outro artefato fá cil de
manipular. Passe-o de mã o em mã o e, a cada vez que chegar em uma pessoa, ela deve improvisar
uma dança com o adereço.
Pá gina 159

Projeto experimental
Arte corporal
Meu corpo é suporte para minha arte

Vimos que o corpo pode ser usado como suporte em pinturas, performances e outras
linguagens artísticas ligadas à body art. A artista cubana naturalizada estadunidense Ana Mendieta
(1948-1985) explorou seu pró prio corpo como materialidade. Na obra A á rvore da vida (1976), ela
cobriu o corpo com barro e materiais retirados da vegetaçã o do lugar, integrando seu corpo ao
meio ambiente. Essa linguagem artística também pode ser considerada uma land art. Observe a
particularidade dessa arte na imagem ao lado.

Land art (ou Earth art): o que há de potencial em um lugar, uma paisagem e como o artista pode intervir ou
integrar-se ao ambiente é o foco central dessa linguagem artística que usa o mundo como suporte. Trata-se de mais uma
forma que os artistas encontraram para explorar materiais, lugares e assuntos para fazer arte.

Ana Mendieta. 1976. Fotografia colorida. © The Estate of Ana Mendieta Collection – Courtesy Galerie Lelong, New York

Tree of Life (A árvore da vida), de Ana Mendieta, 1976. Fotografia colorida, 50,8 cm × 33,7 cm. Nesta performance, a artista
usa o corpo, barro e vegetais do meio ambiente como materiais para criar a sua arte.

Há pintores que usam o corpo como se fosse uma tela. Outros artistas usam o corpo para
fazer performances e até para fazer mú sica.
Agora, que tal cada um escolher uma linguagem artística usando o corpo para criar uma
obra? As razõ es podem ser as mais diversas. Pense! Que razõ es você teria para criar na linguagem
da arte corporal? Que tipo de técnicas e materiais você gostaria de usar? Pode ser uma proposta
individual ou em grupo.

Veja algumas sugestõ es:

1. Pintura corporal

Sugerimos, a seguir, como fazer uma tinta corporal natural. Como base, use mandioca
(também conhecida como macaxera ou aipim) ou cola de farinha.

• Mandioca: cozinhe a quantidade de mandioca que achar suficiente; depois de fria,


amasse e passe em uma peneira para ficar apenas a massa mais fina.

• Farinha: misture uma xícara de farinha de trigo em um litro de á gua fria; depois de
dissolver bem, leve ao fogo brando, mexendo sempre para nã o empelotar (quando começar a
engrossar, retire do fogo e continue mexendo até ter uma massa homogênea e deixe esfriar).

• Anilinas comestíveis para criar as cores (pigmentos): coloque a base (de mandioca ou
de farinha em potes) e acrescente o corante (anilinas comestíveis) na intensidade da cor
desejada.

Está pronta a sua tinta! Crie uma body art, usando seu corpo como suporte para as pinturas.

Use tintas temporá rias, que podem ser retiradas com facilidade, e nã o tó xicas.
Pá gina 160

2. Percussã o corporal

O grupo musical Barbatuques cria sons percutidos batendo palmas e explorando os sons por
meio do uso de vá rias partes do corpo. Vamos experimentar?

• Explore os sons que suas mã os podem fazer: bata palmas com os dedos separados, com as
mã os em forma de concha, estale os dedos, entre outras possibilidades.

• Bata as mã os nas coxas, na barriga, no peito, nas pernas, e veja que tipos e qualidades de
sons podem ser conseguidos.

• Depois de explorar as possibilidades sonoras de seu pró prio corpo, convide mais colegas
para criar uma “banda corporal”.

• Primeiro, escolha três tipos de batidas, como bater palmas uma vez, bater as mã os nas
pernas e estalar os dedos.

• Depois, vá brincando com essa ideia e criando mais batidas, que podem ser organizadas em
sequências para criar vá rios efeitos sonoros.

Explore os sons com o corpo, faça mú sica com percussã o corporal.

DICA
Para navegar

O grupo Barbatuques, que cria mú sicas com as possibilidades sonoras do corpo, já se apresentou por
todo o país e em outros lugares do mundo, utilizando muita linguagem teatral também. Aprecie os vídeos,
textos, sons e imagens acessando o site: <http://tub.im/mhyyk2> (acesso em: 26 jan. 2016).

Rogério Vieira
Grupo Barbatuques, em apresentação do espetáculo Ayú, em São Paulo, em setembro de 2015.
Pá gina 161

TEMA 2 SE A CRIAÇÃO É MAIS,


TUDO É COISA MUSICAL!
"Hermeto foi na cozinha
pra pegar o instrumental:
do facã o à colherinha tudo é coisa musical.
Trouxe concha e escumadeira, ralador, colher de pau,
barril, terrina, e peneira – tudo é coisa musical.
[...]"

GUINGA; BLANC, Aldir. Chá de panela. Inté rprete: Leila Pinheiro. In: Catavento e girassol. Rio de Janeiro: EMI,
1996. CD. Faixa 6. Disponível em: <http://www2.uol.com.br/leilapinheiro/catavento.htm>. Acesso em: 2 fev. 2016.

Tudo pode ser coisa musical, como canta a paraense Leila Pinheiro (1960-). A vontade
de criar e experimentar tem movido os mú sicos a comprovar isso. No estudo da materialidade
na linguagem da mú sica, podemos relacionar desde a voz humana e instrumentos produzidos
de modo artesanal até instrumentos elétricos e eletrô nicos, que usam tecnologias para
funcionar e emitir sons.

No canto, o corpo é matéria. Ao cantarmos, nosso corpo funciona como um instrumento


de sopro. O diafragma potencializa o ato de respirar e cantar. O ar, ao entrar e sair, atrita as
cordas vocais, o que provoca a emissã o do som. A habilidade de cantar compreende o domínio
da respiraçã o, do fluxo de ar, da articulaçã o da boca, da movimentaçã o da língua. Os ó rgã os que
deixam fluir o som, as ressonâ ncias sonoras que habitam o organismo fazem nascer a mú sica,
arte na materialidade do corpo humano.

A arte de HERMET0 PASCOAL


Para Hermeto Pascoal, os sons orgânicos que surgem do canto dos pá ssaros, da voz
humana e de outros elementos naturais constituem os sons da aura. Ao vermos o compositor,
arranjador e multi-instrumentista alagoano Hermeto Pascoal (1936-) mergulhado em suas
pesquisas, percebemos o quanto a ideia citada é certeira. Seja em suas apresentaçõ es nos
palcos do mundo, ou seja imerso em um rio, Hermeto faz mú sica tirando sons de coisas da
natureza, como a á gua, ou da indú stria, como uma peça qualquer de cozinha. Esse mú sico nã o
dá sossego para o som e está sempre em estado de investigaçã o. Como diz a letra da mú sica
Chá de cozinha, de Guinga (1950-) e Aldir Blanc (1946-), ele está sempre à procura de coisas
musicais, que só darã o bom som “se a criaçã o for mais, e se o mú sico for bom.”

Palavra do artista

“Som da Aura é a vibraçã o sonora da alma de cada um, refletida pela sua fala, que faz a
ligaçã o entre mente e corpo”.
Hermeto Pascoal

PASCOAL, Hermeto. Som da aura. Hermeto Pascoal. Disponível em: <http://tub.im/ys4gvw>. Acesso em: 26 jan.
2016.

Chad Batka/The New York Times/Latinstock

Hermeto Pascoal, compositor, arranjador e multi-instrumentista brasileiro, apresentando-se em Nova York, em 2010.
Pá gina 162

Ofício da arte

Compositor(a)

O compositor é quem cria a mú sica, ou seja, o autor de uma realizaçã o artística musical.
A mú sica pode ser instrumental (somente com instrumentos musicais) ou cantada
(acompanhada de voz, com ou sem um texto, também chamado de letra da mú sica).

Quando ouvimos uma mú sica, na maioria das vezes, conseguimos identificar uma forma
pessoal na criaçã o, ou seja, as características de determinado compositor de fazer a melodia ou
a letra da mú sica. O compositor pode criar uma mú sica dentro de um gênero musical existente,
por exemplo, rock, mú sica clá ssica, choro, jazz etc., ou criar uma nova forma para sua mú sica.
No Ocidente, a figura do compositor passou a ter reconhecimento somente a partir da
Renascença (século XV).

DICA
Para navegar

No site <http://tub.im/5pxgsg> (acesso em: 27 jan. 2016), você encontra a biografia e a discografia de
Hermeto Pascoal, assim como fotos, notícias, partituras e pode fazer downloads gratuitos de criaçõ es do
artista.

Há alguma coisa no ar!


O som se propaga pelo ar. Há ondas sonoras espalhadas por aí que, se arranjadas de
alguma forma coordenada, podem se tornar mú sica. Contudo, como em qualquer linguagem
artística, é preciso ter a intençã o de fazer o arranjo, de compor. Como o mú sico Jean Michel
Jarre, que, ao tocar seus instrumentos potencializados pelos avanços tecnoló gicos, possibilita a
milhares de pessoas ouvirem o som de sua mú sica. “A produçã o musical ocorre por meio de
dois eixos – a criaçã o e a reproduçã o – que garantem três possibilidades de açã o: a
interpretaçã o, a improvisaçã o e a composiçã o” (BRITO, 2003, p. 57), conforme nos explica Teca
Alencar de Brito, professora de mú sica da USP.

A capacidade de ouvir, organizar e criar sons é um aspecto de nossa inteligência. A


composiçã o resulta da coordenaçã o de nossas ideias em um projeto musical. A mú sica nasce
dessa percepçã o e paixã o que os seres humanos têm pelos sons.
Rune Hellestad/Corbis/Latinstock

Concerto de Jean Michel Jarre (1948-), instrumentista, compositor e produtor musical francês, na Arena Wembley, em
Londres, em maio de 2009.
Pá gina 163

As ondas sonoras só “viajam” por meio de materialidades, sejam elas só lidas, líquidas ou
gasosas, como a madeira, a á gua, o ar. Em cada matéria, o som se propaga de modos e com
velocidades diferentes. Nã o há som no vá cuo, por exemplo, porque sempre é preciso haver
matéria para que o som se propague.

Podemos ouvir os sons até determinadas distâ ncias e medir as ondas sonoras em hertz
(Hz). Embora tenhamos um sofisticado ó rgã o de audiçã o, temos limites, só captamos os sons
que estã o na frequência entre aproximadamente 20 Hz e 20000 Hz.

A materialidade do som
Há dois modos de os sons se propagarem entre os materiais: irregular ou regular. O
ruído é característico do primeiro caso. O segundo modo pode ter como exemplo uma peça
musical, mas apenas como uma das possibilidades, porque há diversos gêneros musicais que
fazem uso desses dois conceitos, por meio dos sons de uma bateria, do uso de objetos do
cotidiano como instrumentos de percussã o, por exemplo.

O som que passa por materiais vibra entre frequências, tempos, se relacionando com
espaços internos e externos. Esse conhecimento foi precioso para os mú sicos, que aprenderam
a construir instrumentos com materiais que oferecessem diversos tipos de sons e timbres
sonoros.

O timbre é a característica que diferencia e personaliza cada som. Todo instrumento


possui uma qualidade de som pró pria, em funçã o do material do qual é composto e de sua
forma. Por exemplo, o timbre de uma flauta é diferente do timbre de um violã o. Como os sons
sã o ondas que vibram, cada timbre tem um tipo específico de combinaçã o de ondas.

A construçã o de vá rios instrumentos envolve um trabalho artesanal. O profissional que


constró i instrumentos de corda com caixa de ressonâ ncia, como violino, violã o, violoncelo,
cavaquinho, entre outros, é o luthier. Esse artesã o também é especializado no reparo desses
tipos de instrumentos. Trata-se de um trabalho que requer muita especializaçã o e exige do
profissional conhecimentos sobre a física do som (como ele se propaga), sobre as
características sonoras na mú sica e que tipo de materiais podem alcançar a produçã o de sons
idealizada pelo mú sico, que geralmente tem suas preferências sobre instrumentos e estilos
musicais. O luthier pode, assim, produzir um instrumento personalizado, restaurá -los ou fazer
adaptaçõ es.

Há mú sicos que preferem utilizar materiais com tecnologias atuais e sons sintetizados
por aparelhos eletrô nicos. Outros desejam redescobrir os sons do passado e trazê-los para o
presente e compartilhar com o pú blico. Diante das escolhas de gêneros e estilos, existem
mú sicos que trabalham com essas duas tendências paralelamente. Sobre a questã o da
linguagem musical, o pesquisador, professor e mú sico Edilson Vicente de Lima comenta que
“nã o existe som sem um suporte que o sustente (seu corpo vital) nem sem um espaço físico
que o comporte. Ambos, seu suporte material e o local onde acontece, participam de sua
produçã o e lhe imprimem características; qualidades” (depoimento dado para este livro). Em
suas pesquisas, ele investiga o repertó rio camerístico e orquestral (referente à mú sica de
orquestra) dos séculos XVII e XVIII. Com base em pesquisa de repertó rio e de documentos, ele
encomenda a um luthier a confecçã o de instrumentos barrocos, que faz o trabalho com base
nas características do instrumento encomendado.
Camerístico: termo relacionado à mú sica de câ mara, isto é , a qualquer formaçã o instrumental que se limite a
poucos executantes e destinada a pequenos espaços.

O processo de produzir um instrumento antigo é bastante complexo. É preciso adquirir


uma planta do instrumento (desenho) para ver todos os detalhes, medidas e características.
Essa planta geralmente pode ser comprada em museus de mú sica ou de colecionadores. A
pesquisa continua na busca do material mais adequado (tipo de madeira, cordas etc.) e na
procura de um artesã o com a maestria dos antigos construtores de instrumentos.

Acervo do artista

Durante uma apresentação, o músico Edilson Vicente de Lima toca uma teorba, instrumento de cordas criado na Itália, no
fim do século XVI, e um tipo de predecessor do alaúde.
Pá gina 164

O som das cordas


A caixa acú stica do violã o e de outros instrumentos de corda, como violino, violoncelo,
cavaquinho, viola, bandolim, entre outros, tem como objetivo amplificar o som emitido. A
escolha das madeiras utilizadas exerce uma funçã o importante na qualidade sonora dos
instrumentos. Para vibrar, a madeira do tampo deve ser flexível. As madeiras do fundo e das
laterais, por sua vez, devem ser mais resistentes. A ponte ou o rastilho, além da funçã o de
prender uma das extremidades da corda, conduz a vibraçã o até o tampo do instrumento. A
caixa acú stica amplifica o som que sai pelo furo localizado no tampo, a boca do violã o.

O som da guitarra elétrica é produzido por meio dos captadores (sensores


eletromagnéticos). Quando as cordas vibram, produzem um impulso elétrico, que é
transformado em onda mecâ nica, gerando o som. Como a guitarra é maciça, não há caixa
acú stica. Entã o, é necessá rio o uso de um amplificador.

Para criar mú sica, é importante percebermos os sons e suas características, conhecer os


materiais e explorá -los. Com as novas tecnologias, podemos manipular os sons e fazer muitos
arranjos. Com os instrumentos, podemos explorar os diferentes timbres que nascem dos
materiais e dos formatos dos quais sã o feitos esses objetos. Ainda temos a possibilidade de
criar objetos sonoros com coisas do cotidiano, como faz Hermeto Pascoal. Nos ú ltimos tempos,
a mú sica vem sendo modificada pelo avanço tecnoló gico, proporcionando novas formas de
produçã o, interaçã o e apreciaçã o. A linguagem da mú sica é encontrada no nú cleo de todas as
culturas.

Com a criaçã o do gravador de fita, por volta da década de 1930, foi possível manipular o
som, ou seja, alterar o andamento da gravaçã o. Dessa forma, além de modificar a nota musical,
o ritmo e o timbre, também foi possível sobrepor vá rios sons provenientes de instrumentos
musicais ou mesmo de sons da natureza, de ruídos, de trens, entre outros. Até entã o, os
compositores utilizavam, na maioria das vezes, instrumentos convencionais para criar suas
obras.

Outro equipamento revolucioná rio na á rea da mú sica eletrô nica foi o sintetizador, que
chegou ao mercado em 1964. Basicamente, o sintetizador cria sons artificialmente, podendo
reproduzir sons dos instrumentos musicais convencionais ou outros sons que podem ser
inventados. Popularmente, a mú sica eletrô nica também é conhecida como a mú sica dançante
criada na década de 1980. Na contemporaneidade, encontramos grupos musicais que utilizam
apenas aparelhos celulares para produzir o som de guitarras, baixos e baterias e como
microfones, por exemplo. E, assim, podem espalhar seu som pelo ar em qualquer lugar.
Elisanth/Shutterstock.com

Elisanth/Shutterstock.com

Esquema representativo das partes de um violão.

A arte de FERNANDO SARDO


O paulista Fernando Sardo (1963-) é mú sico, luthier, artista plá stico e arte-educador.
Cria instrumentos musicais, esculturas e instalaçõ es sonoras com os mais diversos materiais,
obtendo o registro de uma enorme variedade sonora e objetos incríveis. Trabalhando formas e
sons constituídos de materialidades, Sardo explica que esculturas sonoras “sã o obras plá sticas-
musicais construídas artesanalmente que proporcionam ao pú blico a apreciaçã o visual, aliada
à interaçã o artística e lú dica, por meio de fontes sonoras timbrísticas e meló dicas” (disponível
em: <http://tub.im/cobfb5>; acesso em: 27 jan 2016).
Pá gina 165

Sardo desenvolve outras criaçõ es com instrumentos musicais, esculturas e instalaçõ es


sonoras que inventa e que muitas vezes não partem de uma ideia de um instrumento que já
existe dentro do universo dos instrumentos tradicionais. Para essas criaçõ es, algumas vezes
ele parte de uma ideia de forma plá stica e sonoridade que imagina e a partir disso pesquisa os
materiais mais adequados. Outras vezes, as criaçõ es surgem simplesmente da experimentaçã o
dos materiais que acabam por si só abrindo a visã o de uma criaçã o, como, por exemplo, certa
vez em que tocou em uns tubos de alumínio com arcos de violino e, ao perceber o resultado
sonoro, teve a ideia de fazer uma escultura sonora que batizou de Pá ssaro.

Para ele, o resultado dessa pesquisa na á rea da luthieria amplia o universo sonoro com
que pode fazer mú sica.

Leia, a seguir, um trecho da entrevista especial que Fernando Sardo concedeu para esta
obra, na qual nos conta como escolhe os materiais para construir instrumentos e esculturas
sonoras.

Miriam Matsuda

Fernando Sardo em seu ateliê, entre os instrumentos que o próprio luthier criou.

Palavra do artista

“Quando me proponho a construir instrumentos tradicionais, como violã o, violino,


marimbas ou flautas, escolho os materiais com os quais esses instrumentos foram
desenvolvidos na histó ria da mú sica e luthieria e que já fazem parte da expressã o cultural de
uma sociedade. O mesmo se dá quando construo instrumentos de origem indígena brasileira:
utilizo os materiais característicos desses instrumentos, ou quando faço um koto japonês e
utilizo as madeiras que sã o pró prias para esse instrumento. Ou seja, quando faço um
instrumento tradicional, procuro fazê-lo com a sonoridade parecida com a dos que já existem.
Para que isso ocorra, tanto a forma do instrumento quanto as características dos materiais sã o
importantes. [...]

Quando invento instrumentos, por outro lado, minha busca é explorar novas
sonoridades e descobrir diferentes timbres, e para isso é natural experimentar diversos
materiais. Quando construo um tipo de violino com a caixa acú stica feita de cabaça, ele fornece
uma sonoridade bem diferente da de um instrumento similar com a caixa acú stica feita de lata,
ou plá stico ou papel, como também da de um violino tradicional; cada um terá uma identidade
sonora pró pria.”

Fernando Sardo

Entrevista concedida especialmente para esta obra.

Miriam Matsuda

O luthier Fernando Sardo construiu mais de 100 instrumentos musicais com matérias alternativas, orgânicas e sintéticas.
Pá gina 166

Ofício da arte

Luthier

Luthier é o profissional especializado na construçã o e no conserto de instrumentos


musicais. Antigamente, essa palavra de origem francesa designava apenas quem construía o
alaú de, mas hoje ela dá nome ao profissional que constró i ou repara qualquer instrumento
musical. Um luthier que ficou bastante conhecido foi o italiano Antonius Stradivarius (1644-
1737), especialista em construçã o de violinos, violas, violoncelos e contrabaixos. A luthieria
associa o conhecimento de outras á reas, como marcenaria, marchetaria, matemá tica, desenho,
pintura, eletrô nica, entre outras.

DICA
Para navegar

Fernando Sardo disponibiliza em sua pá gina na internet informaçõ es sobre mú sica, instrumentos
criados e tradicionais, artes plá sticas e arte-educaçã o. Para conhecer mais sobre esses assuntos navegue no
site: <http://tub.im/cobfb5> (acesso em: 2 fev. 2016).

Giro de ideias Criando um som


Como será que os instrumentos foram criados? Que materiais fascinaram os ouvidos
humanos? Será que, ao provocar o impacto entre duas pedras, o ser humano percebeu que um
som percutia? Ou em sua leitura de mundo sensível foi capaz de ouvir o vento que assobia ao
passar entre as á rvores? Trovõ es, ventos, á guas inspiraram e ainda motivam os seres humanos
a criar e combinar sons para fazer mú sica.

O mú sico estadunidense John Cage (1912-1992), em uma performance no programa Eu


tenho um segredo, na televisã o dos Estados Unidos, em 1960, provocou risos ao descrever os
elementos que utilizaria em sua apresentaçã o: um liquidificador, quatro rá dios, uma banheira,
um regador com á gua, um pato de borracha, torradeira, chaleiras e baldes. Imagine a cara das
pessoas ao ver que um mú sico iria fazer som com objetos domésticos!

Cage pertenceu ao Grupo Fluxus, movimento artístico iniciado na década de 1960 nos
EUA. Observe ao lado a imagem de John Cage durante uma performance. Para os integrantes
desse grupo, não havia limites para a criaçã o do artista. E para você, há limites na mú sica?
Qualquer objeto pode ser “coisa musical”?

Pesquise também sobre os instrumentos musicais: do que sã o feitos, como sã o


produzidos, a histó ria de cada um. O passado pode despertar para novas ideias de criaçã o no
presente. Vamos fazer um som? Sempre vale a pena tentar!

Converse com os colegas e proponha uma sessã o de experimentaçã o de sons de objetos,


como nas
Herve Gloaguen/Gamma-Rapho/Getty Images

O músico e compositor John Cage e a Companhia de Dança Merce Cunningham durante performance na Fundação Maeght,
em Saint Paul de Vence, França, em 1966.
Pá gina 167

pesquisas que mú sicos como Hermeto Pascoal fazem. Alguém do grupo pode fazer um
mapa dos sons que os objetos sonoros produzem (por exemplo, um traço para sons longos e
um círculo para outro tipo de som). Explore sua percepçã o e sensibilidade.

Registre aqui um comentá rio sobre a sua pesquisa.

Conexõ es Arte e Biologia


A voz
"Cantar
Desnudar-se diante da vida
Cantar é vestir-se com a voz que se tem"

CRISTINA, Teresa. Cantar. Disponível em: <https://www.letras.mus.br/teresa-cristina-grupo-semente/1089288/>.


Acesso em: 11 abr. 2016.

Temos, em nosso corpo, conjuntos de ó rgã os que formam aparelhos responsá veis por vá rias
funçõ es e açõ es que praticamos. Ao cantar, por exemplo, usamos o aparelho fonador, composto de
boca, língua, pregas vocais, laringe e faringe. Quando inspiramos, as cordas vocais (como
popularmente sã o conhecidas as pregas vocais) se afastam e o ar entra nos pulmõ es, mas quando
vamos emitir algum som, como a fala ou o canto, as cordas se aproximam, o ar sai de nossos
pulmõ es e passa pela laringe, pelas cordas vocais e provoca vibraçõ es que resultam na produçã o do
som. Os diferentes tipos de voz, de entonaçõ es, ou seja, o timbre, sã o resultado da manipulaçã o, da
articulaçã o do som, que é feita pelos movimentos da língua, de nossos lá bios e da mandíbula.

O diafragma é o principal mú sculo da respiraçã o, situado na base do pulmã o. Quando


inspiramos, o diafragma é estendido. Quando expiramos, ele volta à posiçã o de origem. Para cantar,
utilizamos muito esse mú sculo. Aprender a cantar envolve desenvolver uma forma de respirar que
permita que o ar flua melhor. Assim, durante o canto há preocupaçõ es com a postura, a
concentraçã o e a percepçã o dons sons. Além disso, sã o necessá rios conhecimentos sobre o som e
sua fluência e sobre aspectos musicais como altura (frequência), entonaçã o e projeçã o.
Fábio Guinalz/Fotoarena

A artista brasileira Teresa Cristina canta samba com sua bela voz e é uma das revelações da nova geração de sambistas
brasileiros.
Pá gina 168

Projeto experimental
Os sons que ecoam em nossa afrodescendência
A mú sica sempre esteve associada à s tradiçõ es e à s culturas de povo e cada época. No Brasil,
temos sons que vieram com a cultura africana, representada pelas pessoas de vá rios povos que
foram escravizadas e trazidas durante a colonizaçã o portuguesa. Esses sons, entre tantos outros
elementos culturais, incorporaram-se à sociedade que se formava, caracterizando a influência da
cultura afrodescendente no Brasil. Vamos conhecer um desses sons?

Encontramos no Brasil vá rios instrumentos que foram trazidos pelos africanos, como afoxé,
agogô , caxixi, claca, cuíca, djembe, kalimba, kora, maracá , reco-reco, xilofone etc.

Que tal fazermos uma kalimba? Trata-se de um instrumento feito de lâ minas de metal ou de
bambu presas a uma cabaça, que serve como caixa de ressonâ ncia. É tocado com as duas mã os, e as
lâ minas sã o “beliscadas” pelos polegares. Em algumas regiõ es, é conhecido como sanza.

Ray Moller/Dorling Kindersley/Getty Images

Kalimba ou sanza, instrumento originário do Zaire. Na foto, instrumento encontrado em Angola.

AGE RM/Otherimages

As kalimbas atuais geralmente são feitas com cabaças ou cascas de coco; são bem pequenas, mas possuem uma boa
sonoridade.

Construçã o da kalimba
Você pode fazer sua kalimba usando diferentes materiais. Sugerimos usar uma lata de metal
como caixa acú stica, mas se preferir você pode usar uma cabaça redonda cortada ao meio.
Apresentamos, abaixo, os materiais necessá rios:

• Uma lata de metal grande.

• Um frasco de cola forte.

• Uma chave de fenda.

• Dois parafusos 3 × 25 mm.

• Um pedaço de fio de arame de 2 mm.

• Um pedaço de madeira do mesmo tamanho da parte superior da lata (a medida pode variar
de acordo com o tamanho do material que você estiver usando).

• Três pedaços pequenos de madeira, com cerca de 5 cm (esta medida também pode variar).

• Cinco grampos de cabelo grandes.

• Dois grampos de cabelo pequenos.

• Um pedaço de fita adesiva preta (tipo isolante).

• Uma furadeira com brocas finas para madeira e uma serra tipo copo para madeira (este
material deve ser manipulado com a ajuda de um adulto ou com a orientaçã o dele, para evitar
acidentes).

Fotos: Xica Lima


Pá gina 169

Processo de construçã o

Veja o passo a passo para construir sua kalimba com a lata metá lica.

1. Vamos preparar o tampo: meça a parte de cima da lata e corte um pedaço de madeira
nesta medida.

• Tire a medida novamente do tampo de madeira e divida-o em três partes proporcionais.

• Peça orientaçã o aos seus professores e familiares para cortar uma forma circular (cerca de
20 mm de diâ metro), em uma das extremidades da madeira. Geralmente, usa-se uma serra tipo
copo que facilita este processo de corte. O diâ metro deve ser pequeno para dar um bom resultado
sonoro.

Editoria de Arte

2. Faça dois furos em um dos pedaços de madeira e passe o fio de arame, prendendo-o bem
ao pedaço de madeira e à base. Cole o outro pedaço de madeira sobre o tampo um pouco mais
abaixo. Entre os dois, faça dois furos, e também no pedaço de madeira que sobrou, como mostra a
imagem ao lado.

Fotos: Xica Lima

3. Abra os grampos e utilize apenas uma parte, a mais lisa. Isole a ponta mais á spera na fita
adesiva formando um leque, colocando os grampos grandes no centro e os pequenos nas pontas,
conforme apresentado na foto.

4. Prenda os grampos sobre a base com a ajuda do pedaço de madeira que tinha sobrado.
Aperte bem os parafusos.
5. Deixe uma borda na lata e passe cola na superfície. Encaixe a base madeira que você
montou sobre a lata e espere secar bem. Decore como quiser.

6. Sua kalimba está pronta! Use os polegares para tocar.

DICA
Para ouvir

Que tal conhecer os sons da kalimba, este instrumento milenar da cultura africana? Assista ao vídeo:
<https://tub.im/4tcex7> (acesso em: 12 abr. 2016).
Pá gina 170

TEMA 3 A ALQUIMIA DA ARTE

Marcos André/Opção Brasil

Pintura rupestre datada entre 5000-3000 a.C., na Toca do Boqueirão da Pedra Furada, Parque Nacional da Serra da
Capivara, no Piauí. Foto de 2009.

"Eles sã o discretos e silenciosos


Moram bem longe dos homens
[...]
Sã o pacientes, assíduos e perseverantes"

BEN, Jorge. Os alquimistas estã o chegando. In: BEN, Jorge. A Tábua de Esmeralda. Phonogram, 1974. Faixa 1.

Na mú sica Os alquimistas estã o chegando, o carioca Jorge Ben Jor (1942-) cantou em
homenagem à s pessoas que se dedicaram a experimentos, misturas de substâ ncias, reaçõ es
químicas, tentativas de experiências, algumas com características místicas e esotéricas.
Igualmente, foram os pintores que, ao longo dos tempos, assim como os alquimistas,
misturaram e experimentaram substâ ncias, como cientistas da arte, criando tintas e outros
meios, ferramentas, procedimentos, além de suportes dos mais variados tipos.

Quando os seres humanos criaram a arte rupestre nos paredõ es das cavernas
nordestinas brasileiras, na regiã o do atual Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí,
colocaram ali sua visã o e impressã o do mundo da época, como é possível observar na pintura
acima. Usaram a linguagem das imagens com desenhos e pinturas. Imagens enigmá ticas, aos
olhos do pú blico que visita esse sítio arqueoló gico hoje. Nã o sabemos com certeza o que
aquelas pessoas queriam expressar, mas especulamos que a vontade de se comunicar era forte
e, assim, foram criando materiais, experimentando procedimentos, maneiras de fazer imagens
que nos intrigam até agora. Era um “pintor-caçador” que usava as imagens como magia,
buscando uma forma de ter sorte na açã o da caça? Queria comunicar uma mensagem, ou
relatar um modo de vida? Há muitas hipó teses e explicaçõ es, dadas por arqueó logos e outros
cientistas que estudam essas imagens.

Arte rupestre: designa gravaçã o, traçado e pintura sobre suporte rochoso.


Pá gina 171

A forma de criar imagens desses povos antigos deu início a procedimentos de pintura
utilizados até hoje. Em relaçã o à s técnicas de pintura, o princípio segue a ló gica de composiçã o
química de tintas, em que se misturam três elementos bá sicos: aglutinante, pigmento e
solvente (diluente). Há casos, também, em que podemos ter um quarto elemento, chamado de
aditivo.

Aglutinantes sã o substâ ncias que fazem o pigmento (material responsá vel pela cor)
aderir à superfície (qualquer tipo de suporte). Gordura, resinas, ó leos podem ser aglutinantes.
Carvã o, argila, plantas, minerais e até sangue, entre outros, sã o materiais usados como
pigmentos na composiçã o de tintas.

Solventes ou diluentes sã o substâ ncias (a maioria em estado líquido) que servem para
dissolver ou dar um tipo de textura e consistência à tinta. Á gua, á lcool, terebintina e outras
substâ ncias servem como solventes.

Aditivos podem ter vá rias funçõ es na composiçã o química de tintas, como alterar a
consistência, o tempo de secagem ou de conservaçã o, entre outras funçõ es que dependem da
composiçã o de cada tipo de tinta.

A oferta de elementos ú teis na produçã o de tintas é abundante na natureza, tanto no


meio mineral quanto no vegetal e no animal. Com o processo industrial na produçã o de tintas,
há ainda mais variedade de composiçõ es. Sã o conhecimentos desenvolvidos ao longo do
tempo, da arte rupestre à contemporaneidade, passando pela pesquisa de muitos artistas e
químicos em todas as partes do mundo. É a química na arte de pintar, a alquimia da arte.
Andrii Chernov/Alamy/Glow Images

Resina de cor amarela extraída do tronco de uma árvore.


David Evison/Shutterstock/Glow Images

Pigmentos indianos utilizados na composição de tintas.


Pá gina 172

Do Oriente ao Ocidente, a arte é um fazer


“A arte é um conjunto de atos pelos quais se muda a forma, se transforma a matéria
oferecida pela natureza e pela cultura” (BOSI, 1986). Além disso, o que realmente transforma a
matéria em “arte” é a quantidade de poética que se coloca nas materialidades. Ou seja, fazer
arte é transformar materiais com poesia, seja aqueles que encontramos na natureza ou os
produzidos por complexos processos industriais.

Na arte oriental, há um tipo de tinta que apresenta como solvente (diluente) a clareza e a
fluidez da á gua; como pigmentos, a escuridã o do carbono obtido por queimas de materiais
(fuligem); e como aglutinante, a consistência da resina vegetal (goma ará bica). Outra variaçã o
mais antiga dessa técnica usa como pigmento a tinta produzida por moluscos (polvos e lulas).
A combinaçã o de outros materiais encontrados na natureza forma uma das tintas mais antigas
no mundo, usada tanto para escrever como para desenhar, a tinta nanquim. Ela recebeu esse
nome porque foi inventada pelos moradores da cidade chinesa chamada Nanjing (Nanquim).

O artista plá stico pernambucano Gil Vicente (1958-), apesar de ter à sua disposiçã o
materiais produzidos com altas tecnologias, admira a tinta nanquim por suas qualidades.

"Como qualidades plá sticas desta tinta de origem oriental, destaco o poder do
seu pigmento, sua opacidade, a discreta cor sépia que eleva a temperatura das suas
aguadas e a aveludada profundidade do preto quando conseguido por camadas."

Depoimento de Gil Vicente em seu site oficial. Disponível em:


<http://www.gilvicente.com.br/atelier/atelier_nanquim.html>. Acesso em: 2 fev. 2016.

Em sua obra Sem título (2008), o papel é invadido pelo negro do nanquim, que contrasta
com a figura nua em tons de cinza do pró prio Gil Vicente contemplando o vazio da folha escura.
Um autorretrato, um mergulho em si mesmo ou contemplaçã o distante? O que pensa o artista
ao olhar para o espaço em meio à escuridã o?

Gil Vicente. 2008. Nanquim sobre papel. Coleção Ernani Vilachan. Licenciado por InArts.com. Foto: Flavio Lamenha. Licenciado por InArts.com
Sem título, de Gil Vicente, 2008. Nanquim sobre papel, 228 cm × 280 cm.

A arte sumi-ê
Cada artista tem interesse em determinados materiais em funçã o do que quer dizer por
meio de suas imagens, sua poética. Os artistas praticantes da arte sumi-ê (pintura com tinta)
apresentam a ideia de que a produçã o do ser humano na arte ou em qualquer outra atividade
deve ter profunda ligaçã o com a natureza. Esses artistas fazem delicadas pinturas com sumi
(tinta nanquim) e com pincéis chamados de fude, criando efeitos com aguadas em tons que vão
do preto puro a infinitos tons de cinza sobre o papel. Nessa tradiçã o artística, podemos
apreciar imagens que mostram elementos como plantas, flores, á rvores e traços abstratos que
lembram a fluidez da á gua, do vento etc.
Pá gina 173

Na arte sumi-ê, o artista encontra, além do prazer estético, a possibilidade de praticar


atividades zen-budistas, que primam pelo desenvolvimento da paciência, da humildade e da
simplicidade. Uma arte antiga nascida da tradiçã o da escrita chinesa em templos budistas
durante a dinastia Sung (960-1274), a arte sumi-ê foi para o Japã o e, atualmente, espalhou-se
pelo mundo, divulgada por mestres como o artista Massao Okinaka. Os mestres de sumi-ê
ensinam seus alunos a criar desenhos com traços rá pidos, mas ao mesmo tempo suaves e,
dessa forma, buscar a definiçã o de formas encontradas na natureza. Essa técnica era ensinada
aos samurais da Antiguidade, para que exercitassem a decisã o de gestos sem hesitaçã o. Tanto
na arte do sumi-ê como em uma luta de espadas, depois da açã o feita, não há como efetuar
correçã o: um gesto é um gesto, seja o traço no papel, seja o golpe de uma espada. Veja ao lado
uma artista criando um sumi-ê em seu estú dio em Nikko, Japã o.

Photo Japan/Alamy/Glow Images

Nesta imagem, um dos principais materiais utilizados na arte sumi-ê: pincel para tinta especial tipo nanquim. Também
podem ser usados carimbos com indicações da cidade ou filosofia que influenciou a obra.

A tinta nanquim, como vimos, é muito antiga. Utilizada na contemporaneidade, oferece-


nos muitos efeitos. Na arte sumi-ê, os artistas exploram o conceito de isocromia. Observe, na
imagem a seguir, que há uma cor predominante, o preto. Ao diluir essa cor em á gua,
conseguimos vá rios tons de cinza. Isocromia é o nome dado a esse tipo de harmonia, em que
usamos vá rios tons de uma cor diluída em solvente, no caso, a á gua.
Massao Okinaka. 1993. Sumi-ê sobre papel washi. Acervo Documental Fotográfico da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Fotó grafa: Isabella Matheus

Uahu-Zumi-Sakura (Cerejeiras), de Massao Okinaka, 1993. Sumi-ê sobre papel washi, 69,8 cm × 135,5 cm.
Pá gina 174

A arte de MASSAO OKINAKA


Nascido em Kyoto, no Japã o, Massao Okinaka (1913-2000), cujo nome artístico é Bunsen
(dado por seu mestre em pintura japonesa, Onishi Kakyo, herdeiro da Escola Sanae), viveu
muitos anos em Sã o Paulo, onde firmou carreira artística. Conhecido como um importante
representante da arte nipo-brasileira, foi responsá vel por divulgar no Brasil a arte sumi-ê,
tanto por meio de produçã o de pinturas como pelo ensino dessa tradiçã o. Fez parte da turma
do Seibi (Seibikai), um grupo de artistas japoneses imigrantes no Brasil que se reuniu para
criar um espaço de discussã o que promovesse o aprimoramento técnico e a divulgaçã o de suas
obras. A partir da década de 1940, artistas nipo-brasileiros participaram e organizaram vá rios
eventos artísticos, projetando em nossa histó ria da arte muitos nomes, como Tomie Ohtake
(1913-2015), Flá vio-Shiró (1928-2015) e Manabu Mabe (1924-1997).

No grupo Seibi, cada artista desenvolveu sua pró pria linguagem e pesquisou as
materialidades com base em filosofias de vida e pensamentos influenciados pelas tradiçõ es
religiosas e culturais do Japã o, a terra do Sol Nascente.

Palavra do artista

Mestre Massao comenta em seu diá rio de artista que há três elementos bá sicos no sumi-
ê: simplicidade, simbolizaçã o e naturalidade.

“O sumi-ê é uma arte subjetiva. A expressã o livre que brota por meio da cor sumi e dos
movimentos do pincel reflete com serenidade o cará ter e a personalidade do autor, induzindo-
o ao prazer das descobertas.”

Massao Okinaka

OKINAKA, Massao. Sumi-ê – A arte em preto e branco. Made in Japan. n. 53, 2 mar. 2006. Disponível em:
<http://madeinjapan.uol.com.br/2006/03/02/sumie-a-arte-em-preto-e-branco/3/>. Acesso em: 19 maio 2016.

Acervo da família

Massao Okinaka trabalha em seu sumi-ê O silêncio, de 1993.

A pintura a ó leo
"Usando ó leo em vez de ovo, podia trabalhar muito mais devagar e com
maior exatidã o. Podia fazer cores lustrosas, suscetíveis de serem aplicadas em
camadas transparentes ou ‘vidradas’; podia adicionar cintilantes detalhes em
relevo com um pincel de ponta fina, e realizar todos aqueles milagres de precisã o e
minú cia que espantaram seus contemporâ neos e cedo levaram à aceitaçã o geral do
ó leo como o veículo pictó rico mais adequado."

GOMBRICH, Ernst H. A história da arte. Traduçã o Á lvaro Cabral. 16 ed. Rio de Janeiro: LTC, 1999. p. 240.

Enquanto na arte da pintura oriental os artistas dedicaram-se, na tradiçã o sumi-ê, para


conseguir traços sutis e capturar a síntese das coisas, no Ocidente, no período da Renascença,
artistas buscaram a realidade na representaçã o de imagens. Para isso, exploraram materiais
que pudessem oferecer contrastes entre luzes e sombras, cores brilhantes, infinitas
combinaçõ es de tonalidades, além de proporcionar a representaçã o de espaços com
profundidade.

A tinta a ó leo foi uma alternativa no período do Renascimento e influenciaria a produçã o


de muitas obras também em outros momentos da histó ria da arte. Segundo o historiador Ernst
Gombrich (1909-2001), o artista Jan van Eyck (c. 1390-1441) teria sido um dos primeiros a
explorar a tinta a ó leo na pintura artística.
Pá gina 175

A tinta era preparada pelos pintores ou seus aprendizes, que pesquisavam os pigmentos
e as misturas. O ovo era utilizado como aglutinante para fazer a tinta têmpera. Contudo, essa
tinta secava rá pido, o que dificultava realizar matizes de tons, levando artistas a misturar ó leo
de sementes de linho (Linum usitatissimum, ó leo de linhaça) e terebintina (produzida com base
na resina de pinheiros) na receita de tinta.

Nascia a tinta a ó leo, material usado em pinturas famosas, como O casamento dos
Arnolfini (1434), de Jan van Eyck, e a Mona Lisa (c. 1503-1506), de Leonardo da Vinci (1452-
1519). Na investigaçã o de materialidades, Da Vinci explorou a técnica da pintura a ó leo,
ampliando os estudos sobre esse material realizados antes, e deixou vá rios escritos sobre o
tema. Como um alquimista, o artista pesquisou e misturou muitos materiais em suas pinturas,
para criar obras como A ú ltima ceia (1495-1498), pintada no refeitó rio do mosteiro de Santa
Maria da Graça, em Milã o, Itá lia.

Jan Van Eyck. 1434. Ó leo sobre painel. Galeria Nacional de Londres

O casamento dos Arnolfini, de Jan van Eyck, 1434. Óleo sobre painel, 83,7 cm × 57 cm. Caracterizado pelo naturalismo e
realismo, o artista representa nessa obra a burguesia comerciante belga.
Leonardo da Vinci. 1495-1497. Técnica mista com predominância da têmpera e ó leo sobre duas camadas de preparação de gesso aplicadas sobre reboco. Igreja Santa Maria delle Grazie,
Milã o

A última ceia, de Leonardo da Vinci, 1495-1497. Técnica mista com predominância da têmpera e óleo sobre duas camadas
de preparação de gesso aplicadas sobre reboco, 460 cm × 880 cm.
Pá gina 176

Tudo azul! Pigmentos como crenças e


poéticas contemporâ neas
"[...] O oliva da nuvem chumbo
ficando
pra trá s da manhã
e a seda azul do papel
que envolve a maçã "

VELOSO, Caetano. Trem das cores. In: Cores, Nomes. Rio de Janeiro, Polygram, 1982. CD. Faixa 3. Disponível em:
<http://www.caetanoveloso.com.br/discografia.php>. Acesso em: 2 fev. 2016.

Paul Vinten/Shutterstock/Glow Images

Escultura e hieróglifo egípcio na parede do interior de um templo egípcio, c. 3000 a.C.

O azul é uma das cores que mais traz significados. Cor da noite, do mar, do céu, da
calmaria, da espiritualidade, da suavidade, dos fluxos de sentidos nas culturas. Como
representar tantos significados? Como materializar tantas formas imaginadas nas mentes
humanas?

Essas questõ es moveram pessoas a pesquisar pigmentos e processos para a criaçã o de


materiais sintéticos. No Egito antigo, técnicas para criar tintas sintéticas já tinham sido
exploradas. Para conseguir o azul egípcio, com forte simbolismo na religiã o desse povo em
ideias de eternidade, eram misturados os elementos: ó xido de cobre e de cobalto com
bicarbonatos de só dio e cá lcio, aquecendo tudo em altas temperaturas, cerca de 700 graus
Celsius. Há outras versõ es dessa receita de azul egípcio, estudada até nossos dias por químicos,
historiadores e artistas, que você pode ver como exemplo no fundo da imagem acima.
Pá gina 177

Os chineses também adoravam a cor azul, que tinha significados culturais como, por
exemplo, a pureza espiritual. Assim, desenvolveram um tipo de azul usando uma mistura
parecida com a composiçã o egípcia, mas alterando os sais de cá lcio para sais de bá rio,
produzindo um azul mais pró ximo do roxo, conhecido como o azul chinês. Muitas técnicas
foram desenvolvidas pelos chineses, que se tornaram mestres na produçã o de porcelana fina e
delicada. Com vernizes associados a pigmentos e elementos químicos, depois de queimas em
fornos em altas temperaturas, os mestres chineses criaram diversas figuras e padronagens nas
porcelanas azuis, como podemos observar nas imagens abaixo.

Zou Yanju/Getty Images

Detalhe do Muro dos Nove Dragões, no Parque Beihai, em Pequim, na China. Construído em 1402 com mais de 270 tijolos
esmaltados. Possui 29,4 m de comprimento e 3,5 m de altura.

Museu de Arte de Indianápolis, EUA. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone

Vaso de porcelana chinesa pintado com o azul chinês, c. 1426-1435.


Eduardo Enomoto/Agencia Estado/Xinhua Press/Corbis/Latinstock

Apresentação do circo chinês Shenyang Acrobatic Troupe, em São Paulo, SP, em 2011.
Pá gina 178

O circo chinês Shenyang Acrobatic Troupe apresentou um espetá culo no Brasil, em 2011
(veja imagem na pá gina anterior), com um visual que trouxe a tradiçã o do tom azul na cultura
daquele país. Uma cor criada em tempos distantes, na dinastia Han (206 a.C.-220 d.C.), e que,
agora, até brilha no escuro. Esses azuis, hoje, sã o as luzes da tecnologia.

O azul de Yves Klein


"No início nã o há nada
depois um nada profundo
e depois uma profundidade azul."

BACHELARD, Gaston apud MAGNO, Lucas. Pincé is vivos. ABD Conceitual, n. 5, p. 24, nov./dez. 2012.

A paixã o pelo azul que moveu artistas a criar pigmentos nos tempos mais antigos chegou
até à contemporaneidade. Já no século XX, o artista francês Yves Klein (1928-1962), o mesmo
que trabalhou com o corpo de modelos como pincéis humanos, patenteia um azul vivo com o
nome de International Klein Blue (IKB, =PB29, =CI77007). Klein criou diversas obras
utilizando o tom, como podemos observar em S41, Blue Venus, ao lado. Esse tom de azul ficou
tão famoso que foi usado por estilistas e designers em roupas e objetos. Pode ser que você
tenha alguma peça em seu guarda-roupa com esse azul tão popular. Observe alguns exemplos
nas imagens abaixo.

Azul egípcio, azul chinês, Klein Blue, esses tons de azul ainda continuam por aí, não
apenas em roupas e objetos, como também em espetá culos e obras de arte. A adoraçã o pela cor
azul atravessou os tempos e continua presente nos dias atuais.

Yves Klein. 1962. Pigmento azul em resina sintética sobre plaste. Coleçã o particular. Foto: Christie’s Images/Corbis/Latinstock
S41, Blue Venus, escultura de Yves Klein. Pigmento azul em resina sintética sobre plaste, 70 cm × 30 cm × 20 cm.

Da esquerda para direita, de cima para baixo: Sagir/Shutterstock/Glow Images, Gregory Gerber/Shutterstock/Glow Images, Adisa/Shutterstock/Glow Images, Karkas/Shutterstock/Glow
Images, Igor Stramyk/Shutterstock/Glow Images e S.Z./Shutterstock/Glow Images

Blusa feminina, batom, esmalte, sombra, cachecol, sapato, pulseira, brincos e bolsa em tons de Klein Blue.
Pá gina 179

A arte de YVES KLEIN


Yves Klein (1928-1962) nasceu em Nice, França, em um ambiente totalmente artístico,
uma vez que seus pais também trabalhavam com arte. Um universo de cores e formas
rodeavam o ambiente do menino, que cresceu convivendo com arte, tornando-se um artista
que experimentou vá rias linguagens, como fotografia, pintura, escultura e performance.

O fascínio de Klein pela cor azul começou em uma viagem ao Japã o, na qual teve contato
com o zen-budismo. Culturas em fluxos viajando entre o Oriente e o Ocidente marcam a criaçã o
desse artista, que pesquisou tons de azul misturando pigmentos com seu amigo químico
Edouard Adam até criarem o International Klein Blue (IKB): arte e química de mã os dadas.

Yves Klein morreu jovem, mas fez experimentos com outras cores, embora tenha ficado
mais famoso por seu mergulho no infinito e profundo azul, mergulhando em pigmentos para
traduzir a poética do vazio.

Palavra do artista

“A missã o do pintor é realizar uma obra-prima ú nica: ele pró prio, de forma constante...
transformando-se assim uma espécie de gerador atô mico de radiaçã o constante, capaz de
impregnar a atmosfera com a sua presença pictó rica, a qual permanece gravada no espaço
apó s a sua passagem. É este o significado real da pintura, no século XX.”

Yves Klein

Registro de Klein em seu diá rio, em setembro de 1957, publicado postumamente sob o título O meu livro. In:
ADAGEISA. Noveau Réalisme − Yves Klein, p. 7. Disponível em: <https://adageisa.files.wordpress.com/2008/09/yves-
klein.pdf>. Acesso em: 29 jan. 2016.

Pierre Boulat/Cosmos/Glow Images

Yves Klein e suas esponjas azuis. Foto de 1957.

DICA
Para navegar
A biografia de Yves Klein, artista de diversas linguagens visuais, além da reproduçã o de vá rias obras e o
registro de performances você encontra neste site (em inglês e francês): <http://tub.im/shed6i> (acesso em:
29 jan. 2016).

Giro de ideias: O significado das cores


O significado das cores pode ter uma referência cultural. Que tal fazer uma enquete
sobre as cores e preferências da turma?

• Qual a sua cor preferida? Por que você acha que escolheu essa cor?

• Converse com seus colegas a respeito das cores que cada um prefere e dos motivos
dessa preferência. A preferência é unâ nime? E os motivos?

Agora faça uma pesquisa para saber sobre o significado das cores em diferentes culturas
e depois compartilhe a sua descoberta com seus colegas.
Pá gina 180

Conexõ es Arte e Química


As tintas
Muitas cores estã o presentes por toda parte, sã o cores químicas que tingem a cidade como
na obra Scala (2006-2008), do artista alemã o Horst Glä sker (1949), um grafite colorido para
lembrar das nuances das relaçõ es humanas. Observe a imagem ao lado. O artista pintou uma
escadaria em uma vila na cidade de Wuppertal, na Alemanha, formando uma verdadeira paleta de
cores a céu aberto.

Vimos como a química está intimamente ligada à produçã o de tintas. Na arte rupestre, eram
utilizadas gordura de animais e resinas de plantas, entre outros materiais. A resina tem a funçã o de
acumular partículas de pigmentos, o que dá à cor consistência, brilho, durabilidade e aderência à
superfície. O aglutinante também pode agir como um tipo de verniz. A albumina e a lecitina
presentes na gema do ovo, por exemplo, usadas como aglutinantes em tintas têmperas, ajudam a
conter as partículas de pigmentos sobre a superfície. As misturas feitas no Egito antigo para
conseguir cores sintéticas usavam reaçõ es químicas por contato ou calor.

Sã o muitas as ligaçõ es entre arte e química. Fazer experimentos nessas á reas pode ser uma
aventura no universo tanto da arte como das ciências. Pensando na composiçã o química das tintas,
vamos explorar sua produçã o com os elementos bá sicos: aglutinantes, pigmentos, solventes e
aditivos.

Horst Gläsker. 2006-2008. Pintura acrílica. Cidade de Wuppertal, Alemanha. Foto: Acervo do artista

O artista Horst Gläsker, na obra Scala, 2006-2008, pintou 112 degraus e escreveu palavras sobre relações humanas, como
amor e simpatia.

Tinta têmpera

Misture uma gema de ovo a uma colher (de sopa) de pigmento à base de ó xido de ferro (pó
industrializado inorgâ nico e ató xico com alto poder de tingimento) na cor desejada. Coloque á gua
para controlar a consistência. Um pouco de ó leo de cravo ajuda a dar brilho, maciez, além de
proporcionar um cheiro mais agradá vel. Você pode também colocar algumas gotas de vinagre para
evitar formaçã o de fungos na pintura, mas o ó leo de cravo também ajuda nisso.

Como suporte, use embalagens de papel (como as de pizza). Limpe a superfície, escolha o
tamanho e o formato desejado e depois passe uma base de tinta lá tex branca ou á gua com gesso (1
xícara de gesso para cada litro de á gua), mexa bem e aplique essa base imediatamente.

Agora, com os materiais prontos, e só criar sua arte. Como a base é a gema de ovo, esse tipo
de tinta fica com um aspecto opaco. Veja a seguir outras sugestõ es.

Tinta têmpera com brilho

Você pode mudar a textura e o brilho desse tipo de tinta acrescentando um pouco de ó leo de
linhaça ou de banana. Colocando clara no lugar da gema, você pode conseguir uma tinta mais
transparente, parecida com a aquarela. Acrescente o ó leo de cravo em todas as variaçõ es, pois isso
ajuda na conservaçã o.

Faça mais experiências e analise os resultados. Misture outros tipos de pigmentos. Veja como
as tintas reagem à s proporçõ es dos ingredientes e como se comportam em diferentes tipos de
suporte.

Aventure-se, mas tome cuidado! Se for mexer com elementos tó xicos ou corrosivos, faça isso
apenas na presença de um especialista.
Pá gina 181

Conexõ es Arte e Meio ambiente


Fora do lugar

Na linguagem da land art e intervençã o urbana, o artista egípcio naturalizado neozelandês


Konstantin Dimopoulos (1954-) criou a obra de arte efêmera The blue trees (As á rvores azuis), em
que á rvores tiveram seus troncos pintados com uma tinta a base de á gua, nã o tó xica. Tratava-se de
uma açã o de arte social, ativista, que queria chamar a atençã o das pessoas para a importâ ncia das
á rvores em nosso ecossistema. As á rvores sã o o pulmã o do planeta e as pessoas parecem se
esquecer disso. O artista mudou a cor do tronco das á rvores para que, saindo do comum,
chamassem a atençã o das pessoas, que talvez se sensibilizassem e pensassem a respeito do
desmatamento.

Com intençã o semelhante, o artista paulistano Eduardo Srur (1974-) criou uma intervençã o
urbana com garrafas de plá stico gigantes, PETS (2008), colocadas às margens do rio Tietê, em Sã o
Paulo. Muitas garrafas PET já foram jogadas nesse rio superpoluído, mas garrafas gigantes
chamaram a atençã o de milhares de pessoas que passaram pelas margens em que fica situada uma
importante via expressa.

Pense a respeito desses exemplos. Observe as imagens abaixo. Sã o artistas tirando as coisas
do lugar para colocar alguma coisa na cabeça das pessoas sobre arte e meio ambiente.

ZUMA Press, Inc./Alamy/Glow Images

The blue trees (As árvores azuis), de Konstantin Dimopoulos, 2012, Califórnia, Estados Unidos.
Patricia Santos/Estadão Conteudo

PETS, de Eduardo Srur, 2008. Intervenção urbana com garrafas gigantes fazem parte da instalação às margens do rio Tietê,
em São Paulo, SP.
Pá gina 182

Projeto experimental
1. Pincéis e tintas para a arte sumi-ê
Vamos, agora, criar pinturas com nanquim inspirados na arte sumi-ê. Observe uma
ilustraçã o, no final da pá gina, feita em nanquim. Escolha pincéis com cerdas macias e longas. Pincéis
desse tipo podem ser caros, mas você pode fazer seu pró prio material. Consiga um cabo para o
pincel (palito de churrasco, graveto, bambu sã o algumas possibilidades).

Para as cerdas, você pode usar materiais como um pouco de cabelo (procure em algum
cabeleireiro pró ximo). Consiga, também, elá stico de borracha, barbantes e cola quente ou adesivo
multiuso.

Com todo o material reservado, vamos começar a montar o pincel. Arrume os fios de cabelo,
de modo a formar uma mecha. A quantidade de cabelo determinará a espessura do pincel, assim
podemos fazer pincéis mais grossos (com mais fios de cabelo) e mais finos (com menos fios de
cabelo). Passe cola quente ou adesivo multiuso líquido em uma extremidade do cabo, coloque a
mecha de cabelo (se estiver usando cola quente, cuidado: é melhor colocar a mecha sobre uma
mesa e ir rodando o cabo, de modo que os cabelos possam aderir ao local onde há cola). Depois,
reforce a colocaçã o do cabelo no cabo com o elá stico. Para fazer um acabamento, passe o barbante
vá rias vezes em torno do cabo, para que os cabelos fiquem bem presos e nã o soltem enquanto você
estiver pintando. Na finalizaçã o desse material, use uma tesoura para cortar o excesso de fios e
modelar a forma das cerdas do pincel. Você pode fazer cortes na diagonal, retos, arredondados, ou
outra forma que desejar. Pense antes como quer o seu.

Você também pode usar a tinta nanquim industrializada. Se preferir, há vá rias marcas no
mercado, ou pode se aventurar a ser um alquimista da arte e criar sua pró pria tinta. O pigmento
para a tinta nanquim é obtido da queima de materiais (carbono) também conhecidos pelos nomes
de negro de fumo, negro de carbono ou negro vegetal. Esse material é abundante no meio em que
vivemos, pois frequentemente queimamos coisas, tanto que a poluiçã o vem aumentando no
planeta, em consequência do uso do petró leo. Você pode, também, usar a fuligem que se acumula
em escapamentos de carros, por exemplo, sujeiras de churrasqueiras, lareiras, ou queimar um
pedaço de jornal (essa deve ser a ú ltima alternativa, porque já há muita produçã o de carbono na
atmosfera).

O pigmento deve ser colhido e peneirado, porque vamos precisar de partículas bem finas que
possam ser misturadas à goma arábica (tipo de cola vendida em papelarias). A receita pede uma
colher de sopa de pó de pigmento negro para uma colher de café de goma.

Essa medida pode variar dependendo da consistência que você quer dar à tinta. Como
solvente, você já sabe que vamos usar á gua. O papel deve ser mais encorpado, especial para pintura,
ou podemos utilizar cartolinas brancas, de preferência. Existem muitos tipos de papel especiais
para esse trabalho. A qualidade dos papéis varia de acordo com a gramatura, o que ajuda a absorver
melhor a tinta e evitar que fique com ondas.

Antes de começar a obra definitiva, faça vá rios exercícios como teste, para se familiarizar
com o material.
Altemar Domingos. 2013. Nanquim aquarelado sobre papel. Coleção do artista

Ilustração Samurai, de Altemar Domingos, 2013. Nanquim aquarelado sobre papel, 20 cm × 28 cm.
Pá gina 183

2. Ferramentas para pintar


Nas artes visuais, as materialidades sã o muitas. Como vimos, os suportes na arte podem ir do
corpo de uma pessoa a tudo o mais que está no mundo. As ferramentas para pintura vã o de pincéis
à s máquinas com compressã o de ar e outras tecnologias.

Iago Mazza Chiaravalloti/NurPhoto/AFP

Imagem de grafite da 3ª Bienal Internacional Graffiti Fine Art, no Pavilhão das Culturas Brasileiras, no Parque do
Ibirapuera, São Paulo, SP, de abril a maio de 2015.

Povos antigos usavam ossos, em que colocavam pigmentos (minerais moídos com cor) e
sopravam sobre uma superfície impregnada com algum tipo de aglutinante (resina, gordura etc.). O
pigmento, entã o, aderia ao suporte (a rocha de cavernas, por exemplo). Nesse processo, criavam
imagens. Mã os marcadas no tempo, pintura conseguida pelo processo conhecido hoje como graffiti
stencil (estêncil), que nada mais é que uma matriz – geralmente feita de papel, plá stico ou metal –
em que um desenho tem partes cortadas para proporcionar furos por onde a tinta passa. No caso
dos pintores do passado, as mã os eram usadas como stencil.

Processos que envolvem ar comprimido (que sofreu compressã o) como parte de


ferramentas para pintar sã o muito usados hoje na indú stria e na arte, como o caso do aeró grafo (ou
caneta aeró grafo), principalmente em ilustraçõ es e criaçõ es de HQs (histó rias em quadrinhos).

As materialidades estã o disponíveis para o artista fazer arte, mas com poesia. Assim, artistas
grafiteiros (que sã o muito diferentes dos pichadores de rua) lotam as cidades com suas imagens
poéticas. Esse grupo de artistas utiliza, entre outros materiais, latas de tinta spray e matrizes de
estêncil, ferramentas inspiradas nos processos de pinturas antigas com ar, mas que no caso do
spray usa soluçã o de gá s líquido conhecida como sol (soluçã o aerossol).

Uma lata de tinta spray é uma ferramenta de pintura formada por um mecanismo composto
de vá rias partes. Na parte de cima, há um bico ou biqueira, peça por onde a tinta sai, cujo tamanho e
tipo regulam o diâ metro e a quantidade de tinta que é projetada, pulverizada. Algumas latas
possuem um círculo que identifica a cor da tinta na saída do bico. Ligada a esse bico há um tubo de
plá stico que vai até o final da lata. A tinta (conhecida como produto) e o gá s (conhecido como
propelente) estã o dentro da lata, comprimidos, em um processo essencial para que as ferramentas
de pintura com princípios aeró grafos funcionem. A pressã o interna da lata é maior que a externa,
pois a tinta e o gá s estã o comprimidos. Assim, quando acionamos o bico, o gá s que está sob alta
pressã o tende a sair da lata, empurrando o produto líquido até o topo do tubo de plá stico e daí para
fora, através do bico. Para melhor saída da tinta, é recomendá vel utilizar a lata sempre em pé. A
vá lvula é o mecanismo que pega a tinta na parte inferior da lata e a conduz para fora, a partir da
pressã o feita no bico para abrir e soltar a tinta e o gá s, que estã o sob alta pressã o dentro da lata.
Assim, o gá s tende a sair devido a diferença de pressã o.

Africa Studio/Shutterstock/Glow Images

Lata de spray em uso.

Ilustração: Ricardo Dantas

Esquema ilustrativo do interior de uma lata de spray.


Pá gina 184

Ainda há dois detalhes importantes para que tudo dê certo: uma pequena bola que fica
dentro da lata tem a funçã o de misturar a tinta e o gá s para que ela saia mais homogênea; o formato
do fundo da lata, em desenho cô ncavo, proporciona maior estrutura e ajuda a esgotar o conteú do,
pois se o fundo fosse reto, o gá s, por causa da pressã o, empurraria o metal para fora e, para esvaziar
o líquido, teríamos que inclinar a lata, como fazemos quando queremos tomar um copo de
refrigerante com um canudinho.

Há muitos conhecimentos científicos contidos nessa ferramenta de pintar que você pode
estudar em Física e Química, como a ideia de ocupaçã o de corpos dentro de um espaço, pressã o,
líquidos e gases, densidades, conceito da lei dos gases etc. Sã o vá rios saberes científicos dentro de
uma latinha! E tudo começou com alguém soprando pigmentos por um osso e deixando suas marcas
na histó ria da arte, como as pinturas feitas na Caverna das mã os, na Patagô nia (Argentina), em
cerca de 7300 a.C.

Alamer/Iconotec/Keystone

Caverna das mãos, arte rupestre, c. 7300 a.C., Província de Santa Cruz, na Patagônia, Argentina.

Você pode experimentar vá rios traços ao utilizar uma lata de spray. Para definir que tipo de
traço você quer é importante escolher o tipo de bico que será usado, pois esse mecanismo é
responsá vel pela saída da tinta. Há bicos para traços grossos e finos. Você também pode fazer traços
finos retirando um pouco de ar de dentro da lata. Para isso, coloque a lata de cabeça para baixo
(apenas nesse momento) e aperte o bico: no início, a tinta sai também, mas, logo em seguida, sai
mais ar, e com menos ar o traço fica mais fino. Nesse procedimento, você retira um pouco de
pressã o da lata, por essa razã o o traço fica mais fino. Há marcas de tintas spray que já vêm com a
variaçã o de pressã o para traços grossos ou finos, você pode conferir nos ró tulos dos produtos.
Tome cuidado para nã o retirar todo o ar, senã o a tinta nã o sairá mais. Para pintar, use sempre a lata
com o bico para cima.

Outro detalhe para conseguir efeitos de traços é a distância em relaçã o à parede. Quanto
mais perto, mais consistente será seu traço. A força que você coloca no bico também determina
quanta tinta você quer que saia. Para conseguir traços contínuos e sem gotejamento, faça o traço
com maior velocidade. Se a intençã o for conseguir um traço grosso e com a cor bem intensa, a
velocidade deve ser lenta. Se você nã o estiver familiarizado com essa ferramenta, faça algumas
experiências antes para definir os diferentes tipos de traços. Depois, vá se arriscando mais, criando
formas, linhas, misturando as cores sobre o suporte, que pode ser uma parede ou um papel.
Para criar com estêncil, faça um desenho em uma folha de papel grosso ou papelã o (ou outro
material pouco flexível, como radiografias velhas, por exemplo). Depois, com um estilete ou tesoura
(tome cuidado para nã o se machucar), retire as partes do desenho por onde você quer que a tinta
passe. Essa proposta explora as relaçõ es entre figura e fundo, positivo e negativo. É nesse jogo que
surgem as imagens. Outros efeitos podem ser trabalhados, como aplicar as cores em vá rias
camadas. Isso dá efeitos de tonalidade, luminosidade e profundidade.
Pá gina 185

TEMA 4 POÉTICA DA MATÉRIA


A arte tem amplas opçõ es de materialidades. Cada artista ou grupo pesquisa para
encontrar a melhor materialidade para construir sua obra. Essa matéria está sempre ligada a
intençõ es dos artistas, estilos e poéticas.

"Cada materialidade abrange, de início, certas possibilidades de açã o e outras


tantas impossibilidades. Se as vemos como limitadoras para o curso criador,
devem ser reconhecidas também como orientadoras, pois dentro das delimitaçõ es,
através delas, é que surgem sugestõ es para se prosseguir um trabalho e mesmo
para ampliá -lo em direçõ es novas."

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processo de criação. 21. ed. Petró polis: Vozes, 2007. p. 32.

O grupo musical UAKTI, formado em Belo Horizonte (MG), atuando de 1978 a 2015,
pelos mú sicos Marco Antô nio Guimarã es, Artur Andrés Ribeiro, Paulo Sérgio Santos e Décio
Ramos, realizou vá rios estudos a partir da observaçã o de fenô menos físicos naturais, como o
som da á gua que cai sobre um material ou que flui entre coisas, fato que possivelmente os
seres humanos que criaram os primeiros instrumentos observaram e experimentaram. Tendo
como paixã o a pesquisa e a mú sica, o grupo UAKTI utilizou instrumentos criados com
materiais inusitados. Seus mú sicos além de explorar qualidades sonoras dos materiais,
pesquisaram os sons de instrumentos tradicionais misturados a novos materiais e modos de
tocar. Essas pesquisas marcaram histó ria na exploraçã o das materialidades na mú sica.
Grupo UAKTI. Foto: Sylvio Coutinho

Grupo musical UAKTI em apresentação no Grande Teatro do Palácio das Artes, em Belo Horizonte, MG, em dezembro de
2006.
Pá gina 186

A mú sica, a dança, o teatro, as artes visuais e audiovisuais e todas as linguagens híbridas


têm seus materiais e procedimentos específicos para sua elaboraçã o. As obras de arte
apresentadas nesta pá gina sã o exemplos da diversidade de materiais utilizados em sua criaçã o.
Do fogo que queima e forja a cerâ mica, que um dia antes era barro, das esculturas em
modelagem de terracota dos Guerreiros de Xian, encontradas em 1974 pró ximas do mausoléu
do primeiro imperador da China (Qin Shi Huang, c. 259-210 a.C.), ao má rmore esculpido do
italiano Michelangelo (1475-1564), do bronze no casal que dança na escultura da francesa
Camille Claudel (1864-1943) à s PETs do artista Eduardo Srur, que você viu no Tema 3, dos
pigmentos antigos aos atuais, tudo pode estar a serviço da poética do artista e nos oferecer
obras artísticas em vá rias linguagens. Até do lixo pode surgir uma matéria extraordiná ria,
como exemplificado no documentá rio Lixo extraordiná rio, sobre a obra do artista plá stico,
pintor e fotó grafo paulista Vik Muniz.

Imagebroker Dp/Otherimages

Réplica dos Guerreiros de Xian, em exposição em Weilburg, na Alemanha, em 2011.


Camile Claudel. c. 1900. Bronze. Museu Rodin, Paris. Foto: Christie’s Images/Corbis/Latinstock

Valsa, de Camille Claudel, c. 1900. Bronze, 43,2 cm × 23 cm × 34,3 cm.

Michelangelo Buonarroti. 1501-1504. Mármore. Galleria dell’ Accademia, Florence. Foto: Tupungato/Shutterstock/Glow Images

Imagem da obra Davi, de Michelangelo, 1501-1504. Estátua em mármore, com 5,5 m de altura.
Pá gina 187

A arte de VIK MUNIZ


Vicente José de Oliveira Muniz, conhecido como Vik Muniz (1961-) nasceu em Sã o Paulo
e vive entre Nova York, nos Estados Unidos, e o Rio de Janeiro. Filho de pernambucanos, o
artista costuma experimentar materiais variados – muitos deles perecíveis – para fazer suas
produçõ es em diversas escalas de tamanho e tira fotografias para registrar permanentemente
o resultado das obras. As séries de fotografias com suas criaçõ es sã o expostas em vá rias partes
do mundo e vendidas. O artista também usa a popularidade adquirida pelas obras para auxiliar
projetos sociais. Pintor, fotó grafo, desenhista e gravador, o artista também trabalha com
mídias tecnoló gicas. Na obra ao lado, por exemplo, Vik pintou as imagens dos cantores e
compositores Arnaldo Antunes, Marisa Monte e Carlinhos Brown somente com chocolate e
á gua. Em seguida, fotografou a pintura para a capa do CD e do DVD do grupo Tribalistas,
projeto musical criado pelos mú sicos em 2002.

Tribalistas. Arnaldo Antunes,Marisa Monte e Carlinhos Brown.Gravadora: Phonomotor Records, EMI.2002

Capa do DVD do grupo Tribalistas, obra de Vik Muniz, 2002.

Palavra do artista

“O que faz de uma imagem arte, e de outra, nã o arte? A imagem artística tem o poder de
engajar o indivíduo para ele transcender o tema da imagem. Tem o poder de fazer o espectador
pensar o que é uma imagem. Cria um diá logo. Aí tem ainda uma questã o ética. Mesmo se eu
não estou falando de política, a imagem tem um efeito político por esclarecer a realidade em
torno da pessoa, dando a ela mais ferramentas para lidar com coisas mais prá ticas. O artista
tem muita responsabilidade em relaçã o à ideia futura da representaçã o. O mundo a gente está
fazendo o tempo todo, com as ferramentas que recebeu e com aquelas que estamos
inventando.”

Vik Muniz
SIMÕ ES, Eduardo. Vik Muniz fala à ARTE! Brasileiros sobre seu catá logo raisonné. Brasileiros, 10 dez. 2015.
Disponível em: <http://brasileiros.com.br/2015/12/vik-muniz-fala-artebrasileirossobre-seu-catalogo-raisonne/>. Acesso
em: 2 fev. 2016.

Martin Zabala/Xinhua Press/Corbis/Latinstock

O artista brasileiro Vik Muniz posa diante de uma parte do seu trabalho exibido no Instituto Universitário Nacional de Arte,
em Buenos Aires, Argentina. Foto de 2015.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre a arte de Vik Muniz, sua biografia atualizada, galeria com reproduçã o de obras em
todo o mundo e trechos de livros, jornais e revistas com entrevistas e estudos sobre o estilo de suas criaçõ es e
sobre as linguagens da arte, acessando o site: <http://tub.im/uz6b7i> (acesso em: 2 fev. 2016).

Para ouvir

Você pode saber mais sobre a cantora Marisa Monte e o grupo Tribalistas, ver as capas do CD e do DVD
produzidas pelo artista plá stico Vik Muniz, assistir a vídeos do grupo, baixar partituras e cifras e acompanhar
as letras das mú sicas no site: <http://tub.im/tix9bx> (acesso em: 2 fev. 2016).
Pá gina 188

Conexõ es Arte e Cultura indígena


Pluralidade cultural
Sabemos que muito antes da chegada dos primeiros colonos a nossas terras, o povo indígena
já existia e aqui vivia com sua pluralidade e cultura local. As técnicas e influências artísticas de
culturas antigas como a santarém e a marajoara podem ser sentidas na produçã o da arte indígena
brasileira e atestam esse passado cultural. Além disso, vasos, bonecas e pinturas corporais revelam
técnicas de padronagens simétricas e geométricas presentes nessas culturas.

As culturas indígenas criam padronagens geométricas, com grafismos simbó licos inspirados
na natureza e com base em seu universo mitoló gico. Sã o imagens que os povos indígenas
aprenderam a ver, interpretar e criar. Assim, cada grupo cultural pode atribuir significados
simbó licos diferentes para cada desenho das padronagens que criam.

Os desenhos em padronagens geométricas, utilizados nas pinturas corporais, também sã o


encontrados em cestarias e pinturas em peças de cerâ mica. A natureza é a inspiraçã o dessas formas
abstratas. Linhas podem representar espinhas de peixes, folhas de açaí, estrelas, entre outros
elementos. Observe os desenhos nas imagens ao lado e seus usos na arte indígena.

Agora, que tal realizar uma pesquisa para descobrir desenhos em padronagens de vá rias
etnias indígenas brasileiras?
Renato Soares/Pulsar Mario Friedlander/Pulsar Renato Soares/Pulsar

Desenhos em padrão são compostos por elementos visuais iguais que se repetem sequencialmente ou periodicamente.

Cerâ mica. Museu Nacional do Rio de Janeiro. Foto: Rômulo Fialdini/Tempo Composto
Cerâmica karajá representando a pintura corporal e o penteado tradicional das indígenas Karajá. Aldeia de Santa Isabel,
Araguaia, Goiás. Artesã Xuréia. Cerâmica, 14, 8 cm × 11 cm.
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Projeto experimental
Padrõ es abstratos
Desenhos em padrã o sã o compostos por elementos visuais iguais que se repetem
sequencialmente ou periodicamente. Algumas padronagens criadas por grupos indígenas
contemporâ neos inspiram-se na natureza.

Cada grupo cultural pode atribuir significados simbó licos diferentes para cada desenho que
cria. No nosso cotidiano também encontramos desenhos em padronagens geométricas: em
estampas de roupas, objetos decorativos e até mesmo na capa do celular ou do caderno.

Observe o mundo ao seu redor e descubra essas padronagens.

Agora é a sua vez! Vamos criá -las?

Você vai precisar de lá pis ou caneta preta e uma folha de papel.

Escolha um arranjo de formas e linhas. Depois repita essa mesma imagem vá rias vezes sobre
uma folha de papel. Você pode se inspirar na natureza, em elementos presentes em objetos ou na
arquitetura, porém crie padrõ es abstratos.

Dorival Moreira/Pulsar
Renato Soares/Pulsar

Os indígenas realizam diversos estudos de desenhos em padronagens antes de realizar suas pinturas e fabricar produtos
artesanais.
Pá gina 190

A ARTE E A MATÉ RIA

Pedra, madeira, plastico, aço, corpo, terra, tecido, computador...

TUDO PODE VIRAR ARTE?

Criamos arte quando temos intençã o e poética para fazê-la. Para dar corpo à s ideias
artísticas, escolhemos materiais. Estes podem vir da natureza (terra, carvã o, corpo) ou da cultura
(materiais forjados artesanalmente, industrializados, tecnoló gicos...).

A ARTE DO FOGO

O fogo e' um elemento da natureza, mas seu uso é um fato cultural.

Os primeiros seres humanos foram, aos poucos, incorporando saberes ao domínio do fogo.
Esses conhecimentos mudaram o destino da humanidade, que, com o passar do tempo, criou
as”artes do fogo”. Terra, areia, metais sã o transformados em objetos como esculturas, joias,
instrumentos musicais, potes, panelas. Entre as artes do fogo, a cerâ mica (do grego keramikos ¬
argila queimada) atravessou os tempos e teve papel fundamental no desenvolvimento dos povos.
Fotografia de queima de cerâ mica raku e abertura de forno.Fotos de 2014. Esse ofício é
considerado patrimô nio histó rico e cultural do Brasil.

Os sons dos instrumentos antigos também podem ser forjados em cerâ micas. A arqueologia
acú stica estuda a origem e o som das flautas de cerâ mica criadas desde mais de 12 mil a.C. Sã o as
OCARINAS, encontradas nas culturas andina, chinesa, entre outras. Na cultura chinesa, uma flauta
de ceramica em formato de ovo, com um orifício na parte superior e oitos furos, e conhecida como
XUN. Acreditafse que esse instrumento foi criado na regiã o ainda no periodo Paleolítico. Uma
variaçã o desse instrumento é conhecida como Tsuchibue.

Na pesquisa por materiais que pudessem compor novos timbres, os musicos do passado
tambem criaram instrumentos de metal no periodo conhecido como Idade dos Metais (5 mil f 3 mil
a.C.). Na mú sica oriental, por exemplo, chineses criaram um conjunto de sinos chamado
BIANZHONG. Cada SINO tem um tom diferente, e, dessa forma, o mú sico pode criar brincando com
as notas de uma melodia.

Na Grécia antiga, a arte da cerâ mica ganhou sofisticaçã o na riqueza de detalhes. Os vasos
tinham diferentes formatos, cada um deles com uma funçã o. A cor da cerâ mica pode variar de
acordo com a origem da coleta desse material. Por exemplo, o barro que nã o contem percentagens
elevadas de ó xidos metá licos pode ficar mais branco depois de cozido. Já o material que tem taxas
mais elevadas de Ó xidos de ferro e de manganês pode apresentar tonalidades mais avermelhadas
depois da queima. Os gregos usaram tintas esmaltadas que, levadas a altas temperaturas,
produziam figuras escuras sobre o fundo vermelho (cor natural da peça), ou vermelhas sobre o
fundo preto (partes esmaltadas).
Pá gina 191

Se você gosta de mú sica e estuda algum instrumento de metal (como trompete, trombone,
tuba) ou que contenha partes desse material (como saxofone, bateria, xilofone, flauta), saiba que ele
também existe em funçao da descoberta das"artes do fogo". Ha muito tempo, as pessoas
pesquisaram e encontraram maneiras de transformar materialidades em arte. Nesse fluxo histó rico
de artes e culturas, tudo pode virar arte, qualquer material, aliado a um toque de ideias criativas,
desejos e poéticas.

O compositor e arranjador brasileiro Paulo Moura (1932- 2010) foi considerado um dos
principais nomes da mú sica instrumental do Brasil, reconhecido mundialmente. Suas
especialidades eram o saxofone e o clarinete.

O ser humano, quando dominou ofogo, deu um grande salto nas questoes de sobrevivência.
Como somos seres de linguagem, também usamos o fogo para criar formas e figuras na arte da
cerâ mica. Nas feiras de muitas localidades do Brasil, artistas põ em a mao no barro para fazer sua
arte: sã o os ceramistas populares, como dona Isabel Mendes da Cunha (1924 - 2014). Desde
criança,ela brincava com barro e começou a criar esculturas de cerâ mica de bonecas (neste
exemplo, boneca. 2008, cerâ mica policromada) com roupas cheias de detalhes, flores e rendados. É
a estetica da arte popular, que mostra, pelas mã os de artistas como dona Isabel, um retrato da
mulher brasileira do sertao do \/ale do Jequitinhonha (MG).

Marcel Duchamp (1887-1968), ao pesquisar a arte conceitual, criou ready-mades usando


peças prontas, dando-lhes novos significados e sentidos. Na obra.Fonte (1917 - 1964), urinal de
porcelana, réplica, 60 cm >< 48 cm >< 35 cm), o artista escolheu uma peça de ceramica pintada (um
urinol), material transformado pelo fogo. O uso de peças forjadas pelas altas temperaturas do fogo
também provocou transformaçõ es na arte moderna e ainda hoje está presente no cená rio artístico
mundial.
Templos e palá cios eram enfeitados com lindos mosaicos coloridos na Antiguidade. O Portal
de Ishtar na Babilô nia (construído para adoraçã o da deusa Ishtar, por volta do ano de575 a.C., a
mando do rei Nabucodonosor II), tinhaparedes decoradas com azulejos e pinturas de animais
sagrados em tons de azul e amarelo, cores esmaltadas sobre a cerâ mica.

No Brasil, pesquisas apontam que, por volta de 40 a.C., iniciou-se o cultivo de alimentos e a
queima de argila para criar vasos e urnas funerarias- era a arte da ceramica. Na cultura de um povo
da regiã o do baixo rio Tapajó s, conhecida como cultura Santarém (c. 1000 a 1400 d.C.), encontram-
se peças de cerâ mica com estilo muito característico: linhas, furos e cortes criam formas
zoomó rficas (figuras de animais) e antropomorfas (figuras de homens e mulheres - como este vaso
representando uma figura feminina sentada).

A cultura Marajoara (c.400 - 1400 d.c) é outro exemplo de acervo de povos ceramistas que,
segundo historiadores, alcançou grande complexidade cultural e artística (veja, ao lado, vaso
encontrado na Ilha de Marajó , no Pará ). Suas técnicas eram bem elaboradas: exploravam,
sobretudo, a simetria, criando padronagens equilibradas, algumas vezes com peças geométricas e
quase abstratas, em outras insinuando figuras humanas e animais da nossa fauna, sempre com forte
significaçä o simbó lica. Entre o povo Karajá , a fabricaçã o de bonecas mostra que a arte do fogo ainda
acende a cultura ceramista dospovos indígenas brasileiros.
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FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
1. (Enem-MEC)

TEXTO I

http://www.fumdham.org.br

Toca do Salitre - Piauí

TEXTO II

Arte Urbana. Foto: Diego Singh

Arte urbana. Disponível em: <http://www.diaadia.pr.gov.br>. Acesso em: 27 jul. 2010.

O grafite contemporâ neo, considerado em alguns momentos como uma arte marginal,
tem sido comparado à s pinturas murais de vá rias épocas e à s escritas pré-histó ricas.
Observando as imagens apresentadas, é possível reconhecer elementos comuns entre os tipos
de pinturas murais, tais como

a) a preferência por tintas naturais, em razã o de seu efeito estético.


b) a inovaçã o na técnica de pintura, rompendo com modelos estabelecidos.

c) o registro do pensamento e das crenças das sociedades em vá rias épocas.

d) a repetiçã o dos temas e a restriçã o de uso pelas classes dominantes.

e) o uso exclusivista da arte para atender aos interesses da elite.


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2. (Enem-MEC)

O artista grá fico polonês Pawla Kuczynskiego nasceu em 1976 e recebeu diversos
prêmios por suas ilustraçõ es. Nessa obra, ao abordar o trabalho infantil, Kuczynskiego usa sua
arte para

KUCZYNSKIEGO, Pawla. Ilustração, 2008.

Ilustração do artista polonês Pawla Kuczynskiego sobre o trabalho infantil.

a) difundir a origem de marcantes diferenças sociais.

b) estabelecer uma postura proativa da sociedade.

c) provocar a reflexã o sobre essa realidade.

d) propor alternativas para solucionar esse problema.

e) retratar como a questã o é enfrentada em vá rios países do mundo.

3. (Enem-MEC)

A dança é um importante componente cultural da humanidade. O folclore


brasileiro é rico em danças que representam as tradiçõ es e a cultura de vá rias
regiõ es do país. Estã o ligadas aos aspectos religiosos, festas, lendas, fatos
histó ricos, acontecimentos do cotidiano e brincadeiras e caracterizam-se pelas
mú sicas animadas (com letras simples e populares), figurinos e cená rios
representativos.

SECRETARIA DA EDUCAÇÃ O. Proposta Curricular do Estado de São Paulo: Educaçã o Física. Sã o Paulo: 2009
(adaptado).

A dança, como manifestaçã o e representaçã o da cultura rítmica, envolve a expressã o


corporal pró pria de um povo. Considerando-a como elemento folcló rico, a dança revela

a) manifestaçõ es afetivas, histó ricas, ideoló gicas, intelectuais e espirituais de um povo,


refletindo seu modo de expressar-se no mundo.
b) aspectos eminentemente afetivos, espirituais e de entretenimento de um povo,
desconsiderando fatos histó ricos.

c) acontecimentos do cotidiano, sob influência mitoló gica e religiosa de cada regiã o,


sobrepondo aspectos políticos.

d) tradiçõ es culturais de cada regiã o, cujas manifestaçõ es rítmicas sã o classificadas em


um ranking das mais originais.

e) lendas, que se sustentam em inverdades histó ricas, uma vez que sã o inventadas, e
servem apenas para a vivência lú dica de um povo.
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EXPEDIÇÃO CULTURAL
Quando estamos diante de uma obra de arte, geralmente ficamos mais preocupados com
o sentido, o significado e as mensagens que a arte pode nos passar. Entretanto, pode ser bem
interessante também prestar atençã o nas materialidades e nos procedimentos artísticos que
fazem nascer as obras de arte. Observar como um bailarino ou ator de teatro utiliza seu corpo
como material expressivo, perceber como nossos cantores prediletos usam sua voz e como os
instrumentistas tiram o má ximo de som e arranjos de suas guitarras, violõ es, baterias,
investigar como cada pintor, em diferentes culturas, aplica as tintas para conseguir cores que
fascinam nosso olhar, todos esses detalhes podem acrescentar informaçõ es. O lixo que pode
virar arte, por exemplo, nos traz uma nova consciência sobre o meio ambiente. Observe as
materialidades presentes em obras de arte que estã o pró ximas a você: a escultura na praça, a
pintura no muro, as pinturas dentro de museus e galerias ou as instalaçõ es.

Vimos também que o corpo pode ser suporte. Pesquise em quais linguagens podemos
perceber o corpo e sua potencialidade. Você pode assistir a espetá culos de dança, um canto em
uma açã o artística etc. Procure assistir a shows, espetá culos de dança, teatro ou outra
manifestaçã o artística, como festejos populares.

Estudamos neste capítulo também a respeito de que qualquer materialidade pode virar
arte, inclusive o lixo (resíduos descartados) não contaminados. Hoje, muitas pessoas usam
materiais descartados para fazer outros objetos, alguns com intençã o artística. Como é o caso
do artista Jota Azevedo. Pesquise se em sua localidade há pessoas que tenham a mesma
atitude. Para saber mais sobre este tema, sugerimos também assistir ao documentá rio do
artista Vik Muniz, Lixo extraordiná rio.

Jota Azevedo.2014.Técnica: reciclagem. Recife. Foto: Edu Rocha

Tatu-bola, da coleção Animales e Insectos Robots, de Jota Azevedo, 2014. Resíduos tecnológicos e reciclados. Montagem e
colagem, 49 cm × 48 cm × 9 cm.
Filme de Lucy Walker. Lixo Extraordinário. Brasil. 2009

Capa do DVD do documentário Lixo extraordinário, direção de Lucy Walker, Brasil: O2 Filmes/Downtown Filmes, 2009.
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DIÁRIO DE BORDO
Neste capítulo, apresentamos vá rias materialidades utilizadas na criaçã o de obras de
arte. Desde a utilizaçã o do pró prio corpo aos mais diversos materiais fabricados ou
encontrados na natureza, os seres humanos criam arte.

Reflita sobre as questõ es a seguir e registre suas conclusõ es no seu diá rio de bordo.

O que você aprendeu de novo?

Gostaria de investigar e fazer seus pró prios instrumentos, tintas e outros materiais para
fazer arte?

Qual a linguagem artística de que você mais gosta e que tipo de material mais chama sua
atençã o?

A partir de sua observaçã o em relaçã o à s materialidades nas obras de arte com que você
teve contato, escreva uma relaçã o de palavras que você encontrou (barro, pedra, voz, corpo).
Procure perceber se a matéria era intrinsecamente importante para a ideia e poética do artista,
como, por exemplo, o azul de Yves Klein.

Para ampliar seus conhecimentos sobre histó ria da arte, você pode pesquisar que
materiais foram importantes na histó ria da civilizaçã o e cultura, como, por exemplo, a
pigmentaçã o para conseguir cores na arte egípcia, chinesa, japonesa e outras.

Convide seus amigos para produzir arte em vá rias linguagens, usando os mais variados
materiais. Depois, organize uma mostra de arte com os trabalhos realizados.

Registre os processos, as descobertas e os percursos em seu diá rio de bordo.


Filme de Wim Wenders. Pina. Alemanha. 2010. Foto: Everett Collection/Keystone
Pá gina 196

CAPÍTULO 5 A ARTE EM SUA FORMA, A


FORMA EM SEU CONTEÚ DO

Alessandro Bianchi/Reuters/Latinstock

Apresentação do espetáculo Botanica, do grupo de dança Momix, no Teatro Olímpico de Roma, em fevereiro de 2010.
Pá gina 197

forma
reforma
disforma
transforma
conforma
informa
forma

Grü newald, José Lino. Apud ARANHA, Maria Lú cia de Arruda. Filosofando: introdução à filosofia. Sã o
Paulo: Moderna, 1986. p. 412.

PARA ESTUDAR

• As formas e os conteúdos da arte


• A gramática visual
• O conjunto da obra
• Os parâmetros do som
Pá gina 198

TEMA 1 AS FORMAS E OS
CONTEÚDOS DA ARTE
"[...]
As coisas têm peso, massa, volume,
tamanho, tempo, forma, cor,
posiçã o, textura, duraçã o
[…]"

GIL, Gilberto; ANTUNES, Arnaldo. As coisas. Inté rpretes: Caetano Veloso e Gilberto Gil. Tropicália 2. Rio de janeiro:
Polygram, 1993. LP. Faixa 7.

Tudo que vemos e percebemos ao nosso redor tem peso, massa, volume, tamanho,
tempo, forma, cor, posiçã o, textura, duraçã o, como expressa a letra da mú sica As coisas, de
Gilberto Gil (1942-) e Arnaldo Antunes (1960-). As coisas podem ter muitos significados em
funçã o de suas características e formas. A arte, como um modo de apresentar, expressar,
representar, de falar, enfim, sobre as coisas do mundo, e abordar os mais diversos assuntos,
utiliza-se de elementos como pontos, linhas, planos, formas, cores, tempos, volumes, texturas,
dimensõ es, movimentos, luzes, e tantos outros componentes para criar poesias, pinturas,
mú sicas, dramatizaçõ es e outras manifestaçõ es artísticas. É a forma e o conteú do na arte!

A construçã o da linguagem artística acontece como na linguagem escrita, em que letras


combinadas formam vocá bulos, palavras formam frases organizadas pelas pontuaçõ es,
princípios e elementos linguísticos sã o descritos e regidos pela gramá tica. Do mesmo modo,
cada linguagem artística possui seus pró prios có digos, elementos linguísticos que, combinados,
constroem as formas e os conteú dos na arte.

As linguagens artísticas possuem sua pró pria “gramá tica”. O mesmo elemento de
linguagem pode ser base da comunicaçã o e expressã o de vá rias linguagens artísticas, como o
espaço, o tempo, a luz.

O elemento de linguagem espaço é observá vel nos gestos dos corpos de atores,
dançarinos ou artistas performá ticos, que o ocupam e exploram; no espaço tridimensional, da
escultura, dos sons da mú sica que se propagam; no espaço bidimensional, do papel em que as
linhas do desenhista se espalham.
Hiroyuki Ito/Hulton Archive/Getty Images

O maestro João Carlos Martins conduzindo a Filarmônica Bachiana SESI-SP no Avery Fisher Hall, em Nova York, EUA, em
setembro de 2010.
Pá gina 199

O elemento de linguagem tempo é observá vel na relaçã o entre imagem e movimento, no


cinema; na duraçã o de uma nota ou do silêncio, na mú sica; no tempo marcado pelos gestos da
regência do maestro Joã o Carlos Martins (1940-), observe a imagem na pá gina anterior; no
tempo presente também no passo do bailarino; no gesto e na palavra do ator; em instalaçõ es,
entre tantas outras linguagens artísticas.

O elemento de linguagem luz pode ser observado invadindo palcos nas artes cênicas, em
pinturas, em intervençõ es urbanas, transformando-se em espetá culo visual tanto no palco
como na plateia nos shows de mú sica e de importâ ncia fundamental no cinema e na televisã o.

A luz em uma obra artística pode ser apresentada de muitos modos, à s vezes como tema,
como materialidade ou elemento expressivo. Na obra do artista italiano Giancarlo Neri
(1955-), a luz e o tempo sã o um espetá culo à parte que acontece no espaço pú blico. Em 2012,
na Praça Paris, do bairro da Gló ria, no Rio de Janeiro, esse artista apresentou a obra Má ximo
silêncio em Paris, veja abaixo. Essa obra foi composta por cerca de 9000 globos luminosos (em
lâ mpadas de LED) que, de tempos em tempos, mudavam de cor, apresentando aos olhos dos
espectadores um universo de luzes e cores que se espalhavam no espaço. O artista também
trabalhou com a efemeridade do tempo, uma vez que a obra foi exposta ao pú blico durante
pouco mais de uma semana. Trata-se de um exemplo importante do uso do espaço, do tempo e
da luz como elementos de linguagem da arte.

Giancarlo Neri. 2007. Circo Máximo, Roma. Foto: Alessandra Tarantino/AP/Glow Images

Máximo silêncio em Paris, de Giancarlo Neri, 2007. Lâmpadas de 25 cm que mudam de intensidade e cor.
Pá gina 200

E a luz se fez
"[...]a luz e o ar sã o os elementos que ativam um espaço e fazem surgir, ali, um
lugar."

KOCH, Lucia. Apud SALAZAR, Carmem. Gabinete – Lucia Koch. Revista eletrô nica Luz & Cena, ed. 91, Seçã o Galeria, 24 fev.
2007.

A artista gaú cha Lucia Koch (1966-) usa a luz como assunto e como materialidade. Na
obra O gabinete (1999), ao lado, instalaçã o exposta na II Bienal do Mercosul, em Porto Alegre,
no mesmo ano, ela utilizou filtros coloridos e transparentes, colocados nos vidros das janelas
de um velho armazém localizado à s margens do rio Guaíba. No decorrer do dia, a luz do Sol, ao
passar pelos filtros coloridos, projetava, no chã o e nas paredes do lugar, padrõ es de formas
abstratas e geométricas. Refraçã o, transparências, cor, luz e o tempo vagaroso do cair da tarde
compuseram a obra. Assim, o tempo também foi tema nessa obra, como um dos agentes
construtores das imagens projetadas no chã o e na parede ao passar do dia.

O ser humano sempre expressou concepçõ es imaginá rias e simbó licas sobre a luz. Vá rias
culturas contam histó rias sobre como o mundo foi criado em meio ao surgimento da luz, sobre
a origem de deuses e mitos que vieram com a luz, ou moram na luz, seja a luz da Lua, do Sol,
das estrelas... A luz sempre exerceu um fascínio nas pessoas, sendo encontrada em temas ou
formas na arte, à s vezes até como materialidade, a exemplo da obra de Koch, ou de forma
simbó lica, mostrando dualidades, passagens entre mundos.

A luz pode representar a conexã o entre mundos, mesmo que seja apenas entre os
mundos interno e externo, em cenas do cotidiano, como nos mostra a pintura do artista
barroco holandês Johannes Vermeer (1632-1675), Mulher com o alaú de (c. 1663), em que uma
luz sutil convida a moça a olhar para fora, em um momento de distraçã o durante o estudo de
mú sica. Observe a obra desse artista na pá gina ao lado.

Quando pensamos em luz, logo nos lembramos das sombras, que assumem na arte
muitos significados. À s vezes, as sombras sã o usadas como parte da composiçã o da imagem.
Em outros momentos, podem revelar um destino inevitá vel, como a morte, ou ainda enfatizar a
luz, que revela um conhecimento.
Fotos: Lucia Koch. 1999. Chapas de acrílico em janelas e frestas da oficina de reparos do antigo cais do porto. 2.ª Bienal do Mercosul, Porto Alegre. Fotos: Acervo da artista

O gabinete, de Lucia Koch, 1999. Chapas de acrílico em janelas e frestas da oficina de reparos do antigo cais do porto de
Porto Alegre. Instalação apresentada na II Bienal do Mercosul, em Porto Alegre, RS.
Pá gina 201

Johannes Vermeer. c. 1662-1663. Ó leo sobre tela. Museu Metropolitano de Arte, Nova York

Mulher com o alaúde, de Johannes Vermeer, c. 1662-1663. Óleo sobre tela, 51,4 cm × 45,7 cm.

Observe abaixo a obra A menina do sapato (1949). É o desenho de uma menina


completado por um pé de sapato que projeta sua sombra sobre a imagem. Trata-se de uma
fotografia do artista Geraldo de Barros, que gostava de fazer essas combinaçõ es entre formas,
sombras e luz do Sol, como veremos adiante.

E a outra imagem no final da pá gina, o que será ? Pintura ou fotografia? Trata-se de uma
pintura hiper-realista do artista canadense Jason de Graaf (1971-), que persegue a ilusã o de
verossimilhança com as coisas do mundo sob uma ó tica muito pessoal. Ele explora efeitos de
profundidade, reflexos, contrastes entre volumes, luzes e sombras. Graaf gosta de trabalhar as
transparências, os movimentos e a maneira como a luz se comporta na incidência sobre os
objetos.

Geraldo de Barros. 1949. Fotografia. Coleção particular. © Fabiana de Barros


A menina do sapato, de Geraldo de Barros, 1949. Matriz-negativo (fotografia, 38,2 cm X 28,2 cm).

Jason de Graaf. 2009. Acrílico sobre tela. Acervo do artista

Vesalius skeleton, de Jason de Graaf. Acrílico sobre tela, 91 cm × 61 cm.


Pá gina 202

Em HQs, quando algum personagem tem uma ideia, a luz pode ser representada por uma
lâ mpada acesa como a que vemos sobre a cabeça do Snoopy. Talvez essa imagem tenha origem
em outras bem antigas, como vemos em Pitá goras, obra pintada em 1762 pelo italiano Pietro
Longhi (1702-1785), uma analogia entre o conhecimento e a luz. A vela acesa clareia uma á rea
da pintura, o livro e a face do filó sofo; em meio ao restante do ambiente, embebido na
escuridã o, como se a obra nos dissesse que o conhecimento se revela na luz.

Pietro Longhi. 1762. Ó leo sobre tela. Galeria dell”Academia,Veneza, Itá lia. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone

Pitágoras, de Pietro Longhi, 1762. Óleo sobre tela, 130 cm × 91 cm.

Observe com atençã o a pintura do artista Pietro Longhi. Que cores ele escolheu para
compor? O que você percebe? Tons de marrons, tons terrosos, laranjas, amarelos, outros
ainda? Será que ele desejava capturar a luz da vela em suas cores misteriosas?

Um foco de luz parece iluminar em um ponto a pintura. Esse recurso era bem comum na
época, a intençã o era dar maior dramaticidade à cena e, talvez, provocar a nossa imaginaçã o.

A cena nos remete a um ambiente fechado, um espaço interno e íntimo, possivelmente,


um local para estudos, meditaçõ es ou para ter grandes ideias, como as de Pitá goras!
Snoopy, personagem das tirinhas do cartunista Charles Schulz.

A poetisa da luz
Você já parou para pensar que a forma como percebemos a luz e criamos maneiras de
iluminar as coisas pode ter mudado nossa forma de perceber o mundo? Quando as pessoas
descobriram que podiam iluminar a escuridã o noturna usando o fogo, transformaram a cor da
noite. Hoje, podemos até mesmo usar filtros para mudar a cor de ambientes e criar efeitos
incríveis com a luz ou a ausência dela. Observe a obra da artista Lucia Koch e veja como ela
muda a atmosfera dos ambientes.

Muitos artistas usaram tintas para colorir, a que chamamos de cores químicas ou cores
pigmentos. Lucia Koch pinta os ambientes com cores físicas ou cores luz. Ela utiliza filtros de
cor, parecidos com os que vemos em vidros de carros, mas com cores. Esse material também é
usado para criar efeitos de cores e luzes em espetá culos de dança ou peças de teatro. Depois,
ela escolhe um lugar e começa a fazer intervençõ es que transformam os lugares por onde
circula o pú blico. A artista cobre janelas e aberturas com formas que vã o desde imagens
geométricas a delicadas padronagens. Em muitas de suas obras, ela usa a luz natural do sol
como matéria que passa por esses filtros coloridos e assim faz o processo da cor luz (ou cor
física). Koch é uma poetisa da cor luz.

Peanuts, Charles Schulz © Peanuts Worldwide LLC./Dist. by Universal Uclick


Pá gina 203

A arte de LUCIA KOCH


Muitos artistas têm fascínio pela luz. É o caso da artista gaú cha Lucia Koch (1966-). Em
suas intervençõ es ou instalaçõ es, ela estabelece diá logos entre cor, forma e espaço, criando
efeitos, atmosferas, imagens, mudando lugares e rompendo com as rotinas. Em suas pesquisas,
procura explorar os efeitos que a luz pode proporcionar. Observe a obra Correçõ es de luz
abaixo.

Lucia Koch tem andado pelo mundo para fazer experiências com a luz e com o espaço
tanto em ambientes contemporâ neos como em lugares histó ricos.

Lucia Koch. 2008. Chapas de acrílico recortadas a laser em janelas. Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre. Foto: Acervo da artista

Correções de luz, de Lucia Koch, 2008. Chapas de acrílico recortadas a laser em janelas.

Palavra do artista

“Minha opçã o por usar, sempre que possível, luz natural, tem a ver com a instabilidade
que ela impõ e. Pensar uma transformaçã o que nã o só opera no espaço, mas também é afetada
pela luz que se projeta e move no espaço, muda de intensidade e cor. Fica muito mais claro
também que o que eu ocupo é um lugar no tempo.”

Lucia Koch

NEM DENTRO, nem fora: conversa com Lucia Koch. Disponível em:
<http://luciakoch.com/textos/PDF_pt/nemdentro_nemfora_pt.pdf>. Acesso em: 15 fev. 2016.
Zanone Fraissat/Folhapress

A artista da luz Lucia Koch. Foto de 2013.

Ofício da arte

Iluminador(a)

Profissional que trabalha com iluminaçã o, principalmente de peças teatrais. Para atuar
nessa á rea, é preciso conhecer técnicas e conceitos ligados a eletricidade, saber como usar as
“gelatinas” (filtros usados nos refletores), e a gama de cores e intensidades de luz sobre a cena
no palco.

É importante conhecer também as tecnologias, porque as mesas de luz estã o cada vez
mais computadorizadas. No entanto, é fundamental ter um olhar sensível e poético.
Pá gina 204

Giro de ideias: Quem tem medo do escuro?


A representaçã o da luz em algumas imagens pode construir relaçõ es simbó licas. No
cinema, além da funçã o inicial de iluminar atores e ambientes, a luz é também um elemento de
linguagem artística, ao ser usada para criar atmosferas e nos passar sensaçõ es.

O diretor e roteirista mexicano Guillermo del Toro (1964-) tem nos efeitos de luzes e
sombras a sua marca registrada. Em seus filmes, a maioria dos personagens sã o fruto da
imaginaçã o, dos medos de infâ ncia, de contos de fada e de terror. Em O labirinto do fauno
(Espanha/México/EUA: Warner Bros., 2006), por exemplo, a luz é usada em tons â mbar,
explorando as variaçõ es entre tons de amarelo, vermelho, laranja e marrom, como percebemos
na cena com o personagem Homem Pálido, veja cena ao lado. Em outras cenas, o diretor
explora cores frias para transmitir atmosferas ú midas e sombrias, em que a luz é acesa em foco
luminoso sobre os personagens que estã o cercados de vá rios tons claros e escuros de azul
acinzentado. Os leves reflexos amarelados dã o um toque luminoso à cena envolta em sombras.
Observe a imagem em que aparecem os personagens Ofélia e Fauno.

Âmbar: substâ ncia só lida, espé cie de resina fó ssil. É encontrada em variaçõ es de cor entre amarelo e castanho (o
âmbar de origem vegetal) e preto (o de origem animal). Dissemos cor de âmbar para fazer relaçõ es com imagens com
variaçõ es entre tons de amarelo, ocre, laranja, vermelho e marrom, pelo fato de o conjunto dessas cores lembrar a cor de
uma pedra de â mbar.

Picturehouse/Courtesy Everett Collection/Keystone

Cena do filme O labirinto do fauno, do diretor Guilhermo del Toro, 2006, mostra o personagem Homem Pálido.
Picturehouse/Courtesy Everett Collection/Keystone

Cena do filme O labirinto do fauno, do diretor Guilhermo del Toro, 2006, mostra os personagens Ofélia e Fauno.

Agora, levando em consideraçã o os detalhes relacionados à luz e à s cores de cada cena


do filme O labirinto do fauno, analise:

• Que sensaçõ es podemos sentir ao olhar para essas imagens?

• A luz projetada sobre os personagens vem da mesma direçã o em ambas as imagens?

• Nas duas imagens, a luz foi usada da mesma maneira em relaçã o ao foco e à cor? O que
mais chama sua atençã o nas imagens?

• Pense em outras imagens no cinema em que a luz foi trabalhada de forma expressiva.
Em uma roda de conversa, apresente a seus colegas as cenas de filmes que você analisou.
Pá gina 205

Conexõ es Arte e Ciências


Luz, arte e vida
As relaçõ es entre arte, ciências e tecnologias estã o cada vez mais comuns na
contemporaneidade. Muitas vezes, o artista busca parcerias com especialistas em informá tica,
engenheiros de robó tica e bió logos para realizar obras artísticas. Há também muitas parcerias
feitas entre artista e pú blico, em propostas de interatividade na criaçã o.

O artista carioca Eduardo Kac (1962-) cria arte usando ciência e tecnologia. Ele explora o
campo das imagens e dos conceitos científicos. Já expô s inú meros trabalhos em diversos países, nos
quais utiliza vá rias linguagens, como poemas holográ ficos, fotografia, performances, grafites,
painéis eletrô nicos, instalaçõ es robó ticas e de telepresença. Trabalha com linguagens que lidam
com recursos multimídia e até com conhecimentos de Biologia, como a fotossíntese, em obras
caracterizadas como bioarte.

A interaçã o com o pú blico também costuma ser foco de suas obras. Nessa proposta, a
internet tem sido uma ferramenta fundamental em instalaçõ es de telepresença. Nesse tipo de
proposiçã o artística, as pessoas podem participar mesmo de longe do local em que a obra está
exposta. Como isso funciona? Vamos descrever a obra Teleportando um estado desconhecido
(Teleporting an unknown state), de Eduardo Kac. Essa instalaçã o, criada em 1994, já percorreu
vá rios países e em cada ocasiã o foi feita de um modo. Vamos descrever a seguir a ideia central da
obra.

Eduardo Kac. 1994. Acervo do artista

1.º) Captura de uma imagem de um lugar remoto por câmera digital.


Eduardo Kac. 1994. Acervo do artista

2.º) Envio da imagem pelo celular ou computador para o site da instalação.

Eduardo Kac. 1994. Acervo do artista

3.º) Imagem da página interativa da instalação (Teleportando um estado desconhecido), na qual os internautas escolhem
quais imagens de lugares do mundo querem enviar para banhar a plantinha de luz e provocar o processo de fotossíntese.
Pá gina 206

Eduardo Kac. 1994. Acervo do artista

4º) Planta recebendo a luz da imagem enviada de um lugar remoto (várias cidades do mundo).

5º) A planta que recebe a luz se desenvolve no espaço da galeria ou museu.

Eduardo Kac. 1994. Acervo do artista

Imagine uma sala escura de uma galeria de arte. Nesse local, um pedestal com um pouco de
terra acomoda uma semente de planta. A plantinha recebe fraçõ es de luzes vindas de uma câ mera
que recebe imagens recolhidas de webcams (câ meras de computadores e celulares conectados à
internet) em cidades diferentes do mundo. Em tempo real, é possível enviar luz para a plantinha
por meio das imagens eletrô nicas. A plantinha germina por meio da participaçã o de pessoas que
estã o em locais remotos. Para isso, os internautas acessavam um dos links no site criado para a
instalaçã o. Trata-se de fotossíntese em tempo e realidade virtual, de natureza e cultura produzindo
vida. O pú blico, que ajuda o artista a criar sua obra, ao mesmo tempo contribui para que uma
plantinha cresça, de forma tímida, mas persistente, sob um tênue facho de luz. É vida natural
nascendo de relaçõ es artificiais, arte criada com conhecimento estético, tecnologias de comunicaçã o
e Biologia.

DICA
Para navegar

Como a instalaçã o Teleportando um estado desconhecido, de Eduardo Kac, foi realizada em vá rios
lugares e em momentos diferentes, para saber em detalhes como ela ocorreu em cada versã o, você pode
acessar o site: <http://tub.im/3eyarr> (acesso em: 9 fev. 2016). Nesse site, o artista explica cada uma de suas
obras. É um mergulho no mundo da arte e da ciência.
Pá gina 207

Projeto experimental
Linhas de luz
A linha também pode ser feita com luz. Como assim? Certa vez, o pintor, escultor e
desenhista espanhol Pablo Picasso (1881-1973), usando uma lanterna em uma sala escura,
experimentou criar desenhos no ar. Foi em 31 de dezembro de 1948, e o fotó grafo da revista
estadunidense Life, Gjon Mili, que estava presente, aproveitou para registrar a cena. Veja, a seguir, o
resultado dessa experiência em forma de imagens.

Fotos: Gjon Mili//Time Life Pictures/Getty Images

Registro fotográfico em que Pablo Picasso cria com luz (light painting) em sua casa e em uma olaria, na França, em
dezembro de 1948.

Essa técnica é chamada light painting (pintura com luz). Para conseguir esse efeito, é preciso
haver uma exposiçã o de luz durante um tempo diante da câ mera. Há câ meras fotográ ficas que já
possuem recursos de tempo de exposiçã o que podem ser regulados.

Vamos experimentar criar desenhos com linhas de luz? Como o artista Pablo Picasso, escolha
uma sala escura, leve uma lanterna e uma câ mera fotográ fica. Aventure-se, faça vá rias experiências
em relaçã o ao tempo de exposiçã o e regulagens da máquina fotográ fica. Depois, relate como foi a
experiência de desenhar com luz.
Pá gina 208

TEMA 2 A GRAMÁTICA VISUAL


"[...]
Fiz carvã o do baton que roubei de você
E com ele marquei dois pontos de fuga
E rabisquei meu horizonte
[...]"

LEGIÃ O URBANA. Acrilic on canvas. Dois. Sã o Paulo: EMI Music, 1986. CD. Faixa 3.

Para construir imagens, muitos artistas pesquisaram quais seriam os elementos bá sicos
de composiçõ es visuais. Alguns chegaram à conclusã o de que sã o três: ponto, linha e plano.

O ponto é o início, ele marca um começo. À s vezes, é um ponto que nos chama a atençã o
em uma paisagem, que pode ser um ponto de foco de interesse em uma obra, um ponto
geométrico ou o início de uma linha.

Na imagem Disks Bearing Spirals (Discos de Rolamento Espirais), 1923, criada pelo
francês Marcel Duchamp (1887-1968), veja abaixo, você consegue ver os pontos? Além de
pontos geométricos, também sã o pontos de interesse visual, uma vez que atraem nosso olhar
para uma direçã o. Também percebemos a linha, outro elemento de linguagem, nessa imagem
de Duchamp. Elas sã o curvas, grossas e finas.
Marcel Duchamp. 1923. Lápis, tinta e papel. Museu de Arte de Seattle, EUA. Foto: Corbis/Latinstock

Disks Bearing Spirals (Discos de Rolamento Espirais), de Marcel Duchamp, 1923. Lápis, tinta e papel, 108,2 cm de diâmetro.

As linhas sã o deslocamentos de pontos ou o pró prio ponto em movimento. Por exemplo,


pegue um lá pis e faça um ponto em uma folha de papel. Depois, arraste esse ponto para alguma
direçã o por algum tempo. O que temos? Observe que criamos, nesse traçado, o rastro do ponto,
ou seja, a linha.

Podemos deslocar as linhas sobre uma superfície, um plano que possui altura e largura.
Elas podem ser de muitos formatos e seguir em variadas direçõ es, sendo puras ou criando
texturas e formas. A linha é a poesia da forma. Das linhas podem nascer formas.

Pontos e linhas se acomodam em planos e formas, que podem ser geométricas,


orgâ nicas, abertas, fechadas. Sã o muitas as possibilidades de criar na arte com esses três
elementos bá sicos: ponto, linha e plano. As linhas nascem e criam formas, texturas, movimento,
criam poéticas visuais.
Pá gina 209

A linha poética
As linhas nascem no papel ou na cabeça do artista? Quem comanda o riscador? Mã os,
cérebro, sentimentos? Linhas nascem de muitos riscadores, desde os mais antigos, como giz,
carvã o, lá pis, bico de pena, até as canetas eletrô nicas que levam para o computador as linhas
virtuais. O carvã o, material usado para riscar (desenhar), citado na mú sica do grupo musical
brasileiro Legiã o Urbana, é um dos riscadores mais antigos da histó ria da arte, mas ainda
muito presente nas produçõ es contemporâ neas.

A linha pode ser “pura”, feita com um ú nico traço, ou pode ser composta por um tipo de
textura resultante de vá rias linhas que se aproximam ou se entrelaçam. A escolha pela linha
pura ocorre quando ela já é suficiente para o que o artista pretende, não há intençã o de criar
texturas ou efeitos de luz e sombra. No entanto, quando estã o pró ximas, em grande
quantidade, criam tramas tonais, nuances entre á reas claras ou escuras. Com esses efeitos é
possível gerar a percepçã o de volume e a sensaçã o tridimensional.

Há artistas como a paulista Edith Derdyk (1955-), que cria linhas no espaço
tridimensional de uma sala. A linha não é mais desenhada sobre um papel ou outro suporte
bidimensional, mas sobre o pró prio espaço. É um desenho que se expande, ganha grandes
dimensõ es, transgride o espaço tradicionalmente bidimensional para ganhar mais espaço na
tridimensionalidade, uma concepçã o contemporâ nea de desenho expandido.

Edith Derdyk. 1998. Espaço Torreão, Porto Alegre. Foto: RAR

Tramas, de Edith Derdyk, 1998. Instalação com 9000 m de linha preta de algodão, 5000 grampos e que levou três dias para
ser montada.
Edith Derdyk. 1998. Acervo da artista

Esboço do projeto da obra Tramas, de Edith Derdyk, 1998.

Uma nova maneira de apresentar a linguagem usada desde os tempos mais remotos da
nossa histó ria cultural, o desenho. Na contemporaneidade, os artistas buscam formas de
ampliar as possibilidades expressivas do desenho, criando com técnicas, materialidades e em
diferentes meios, que podem ser tanto materiais como eletrô nicos (desenhos feitos em
grandes escalas, explorando o espaço tridimensional, como a obra de Edith Derdyk, entre
outras possibilidades). Observe o efeito das linhas no espaço da sala na obra Tramas na foto
acima.
Pá gina 210

Em cada linguagem artística, a linha se comporta de forma diferente porque ganha corpo
com a matéria. Na gravura, ela pode ser riscada na matriz, na chapa de cobre, sobre os veios da
madeira etc. Na escultura, a linha pode se apresentar mais grossa, mais fina, reta, curva,
pesada, suave, feita em aço, concreto, arame e outros materiais.

Observe abaixo a obra do artista paulista Luiz Sacilotto (1924-2003). Como as linhas e
formas se apresentam nessa escultura? Como você acha que elas foram feitas?

Em vá rios momentos da histó ria da arte, os artistas se reuniram para conversar e


divulgar suas ideias. Sacilotto participou do Grupo Ruptura, que desenvolveu no Brasil a arte
concreta. Uma ramificaçã o dos movimentos abstracionistas que aconteceram em vá rios países
no século XX. Em 1952, no Brasil, exposiçõ es de arte abstrata deram início a esse movimento. O
Grupo Ruptura era formado por artistas abstracionistas que não estavam interessados em
representar coisas do mundo natural, e sim em criar imagens com conceitos matemá ticos em
composiçõ es que exploravam a gramá tica visual. Esse movimento artístico também teve
manifestaçõ es na literatura, por meio da poesia concreta.

Nesse momento da histó ria da arte brasileira, os artistas ligados a essa corrente artística
gostavam de criar imagens na abstraçã o geométrica e exploravam os elementos de linguagem
nas artes visuais com pontos, linhas e planos. Pesquisavam também sobre cores, formas,
texturas, luminosidades e movimentos em composiçõ es abstratas. Buscavam a arte em suas
formas mais puras, a poética da forma.

A linha, por meio do gesto do artista, pode construir formas abstratas ou figurativas. Ela
dá forma ao desenho como linguagem, obra pronta, ou é usada em esboços, projetos, para
depois renascer em outras linguagens. Observe, por exemplo, o esboço feito para a instalaçã o
Tramas, de Edith Derdyk, cuja imagem você viu na pá gina 209.
Luiz Sacilotto. 1958. Latão. Coleção particular

Concreção 5816, de Luiz Sacilotto, 1958. Latão polido, 45 cm × 45 cm × 45 cm.


Pá gina 211

Giro de ideias: Traçando linhas


A linha está muito presente em nossa vida. É só olhar ao redor. Se hoje grande parte das
pessoas fica ligada aos seus celulares, ouvindo mú sica ou acessando a internet, em aplicativos
também repletos de linhas, algumas pessoas ainda podem riscar linhas em um papel enquanto
esperam passar o tempo, ou quando alguém indica um caminho, marcando em mapas.

Ainda hoje as crianças costumam rabiscar e desenhar em papéis e até nas paredes de
casa. A linha é o primeiro elemento visual em que nos aventuramos a criar imagens. Ao
desenhar com linhas, criamos um mundo imaginá rio.

Observe ao seu redor e identifique os tipos de linhas que você puder: reta, curva, grossa,
fina, contínua, tracejada etc. Crie o seu pró prio projeto de arte: faça um desenho com as linhas
que você encontrou nesse rá pido olhar. Mostre seu desenho para os colegas e converse com
eles sobre como cada um criou seus desenhos com linhas.

Registre as suas percepçõ es a seguir.


Pá gina 212

Conexõ es Arte e Matemá tica


Ponto de vista
Ao observar uma imagem, notamos que alguns pontos podem nos atrair para determinada
direçã o. Os artistas do Renascimento estudaram essa característica e criaram verdadeiros tratados
matemá ticos. Esse conhecimento proporcionou a construçã o de imagens em profundidade. Assim,
foram criadas imagens em perspectiva que, em nosso tempo, possibilitaram as imagens em 3D, com
efeitos de profundidade tã o pró ximos do real que impressionam. Você já deve ter visto esses efeitos
aplicados em videogames, filmes, sites e programas de televisã o.

Haus-Rucker-Co. 1977. Aço. Documenta, Kassel, Alemanha. Foto: Rita Demarchi

A instalação Rahmenbau oder Landschaft im Dia, do grupo Haus-Rucker-Co, 1977, criada para a exposição Documenta 6,
em Kassel (Alemanha), tornou-se permanente. Aço, 31 m × 14 m × 16,5 m.

Para estudar como nossos olhos veem as imagens e como podemos representá -las por meio
de pontos, linhas e planos, os artistas do passado utilizavam uma espécie de moldura com linhas
para registrar as imagens e depois reproduzi-las. Durante a Renascença, o arquiteto e escultor
italiano Filippo Brunelleschi (1377-1446) desenvolveu vá rios experimentos.

O elemento visual linha pode nos direcionar a pontos de fuga para algum lugar no horizonte.
Trata-se da perspectiva linear, que proporciona a visã o de profundidade em imagens.

Perspectiva linear: visã o científica (matemá tica) das aparê ncias do mundo, que proporciona criar profundidade
por meio de linhas e pontos de atençã o. Conhecida por povos antigos, teve suas normas estruturadas no Renascimento,
mudando para sempre a forma de construir e ver imagens.

Na arte contemporâ nea, o grupo de artistas austríacos Haus-Rucker-Co criou, na cidade de


Kassel, na Alemanha, em 1977, uma instalaçã o de proporçõ es gigantescas para homenagear os
estudos de artistas renascentistas. Trata-se de uma estrutura de aço com 31 m de comprimento, 14
m de altura e 16,5 m de largura, em relaçã o a qual o pú blico pode se posicionar para ver as linhas e
o ponto de fuga no horizonte. Observe a imagem da instalaçã o acima.
Pá gina 213

Um dos significados para a palavra perspectiva é “ver através”. Também temos definiçõ es
que consideram a perspectiva como tudo aquilo que nossos olhos podem ver, alcançar.

Experimente ver o mundo dessa forma: pegue uma placa de vidro (ou acetato) retangular e
trace (com caneta hidrográ fica) um ponto e linhas (uma linha horizontal no meio da placa, no
centro dessa linha um ponto e outras linhas que saem de cada ponta do retângulo e vã o se
encontrar no centro – o ponto de fuga). Observe o exemplo a seguir.

Sergei25/Shutterstock/Glow Images

Esquema de indicação de perspectiva em imagem de píer na cidade de Palanga, na Lituânia.

Escolha uma paisagem e olhe através da placa. Procure perceber onde está o ponto de fuga, a
linha do horizonte e outras linhas. Em nosso exemplo, mostramos apenas um esquema bá sico, mas
você pode traçar mais linhas na placa para mostrar aquelas que fogem para o ponto que pode estar
no centro (ou em vá rias posiçõ es na linha do horizonte). Aproveite para criar desenhos
representando a paisagem observada usando linhas e pontos de fuga.
Pá gina 214

As formas e os movimentos
Nas artes visuais, podemos citar duas maneiras de perceber o movimento: na
representaçã o e na forma dinâ mica.

Na pintura, por exemplo, em algumas produçõ es, podemos observar a representaçã o do


movimento por meio da articulaçã o dos elementos de linguagem, como cores, linhas, formas,
luz, espaço.

Na arte cinética, o movimento é parte da forma dinâ mica, ou seja, está ligado de algum
modo à s engrenagens que o geram. Esse tipo de arte rompeu com a tradiçã o de imagens
estáticas. Nessa arte, as imagens surgem em funçã o de um sistema motriz. Observe como o
francês Marcel Duchamp (1887-1968) criou um sistema motriz na imagem ao lado. Há uma
estrutura mecâ nica com círculos e roldanas que recebeu o título de Demisphere Rotary
(Semiesfera rotativa: ó ptica de precisã o), de 1925. Nessa estrutura, há um círculo com linhas
que, quando em movimento, revelam imagens.

Arte cinética: as experiê ncias entre objetos com movimento e imagens já existia desde o início do sé culo XX, mas o
termo só surge em 1955, quando um grupo de artistas se reuniu para realizar a exposiçã o Le Mouvement (O Movimento),
em uma galeria parisiense. Entre esses artistas, Marcel Duchamp (1887-1968) apresentou obras que mais pareciam
engenhocas, mas que criavam imagens com efeitos visuais ao serem colocadas em movimento.
Marcel Duchamp. 1925. Museu de Arte Moderna, Nova York. Foto: Burstein Collection/Corbis/Latinstock

Demisphere rotary (Semiesfera rotativa: óptica de precisão), de Marcel Duchamp, 1925. Papel machê pintado e montado
em disco revestido de veludo, círculo em cobre com cúpula de fibra de vidro, motor, polia e base metálica, 148,6 cm × 64,2 cm ×
60,9 cm.

Os círculos criados por Marcel Duchamp na obra Discos de Rolamento Espirais, vistos na
abertura deste tema, foram elaborados com base em estudos que o artista realizou para suas
obras de arte cinética. Observamos que sã o composiçõ es em que ele usou os elementos de
linguagem pontos, linhas e formas. Alguns desses estudos ele colocou em movimento, criando
uma arte cinética.

Você pode encontrar um jeito só seu de fazer arte cinética. Crie desenhos para colocar
em um mecanismo que fará a imagem girar.

Para fazer uma arte cinética, você precisa de algum tipo de motor (ou outra forma
dinâ mica) que faça a imagem se mover: uma roda de bicicleta, o motor de um liquidificador ou
outro material que possa provocar movimento.

É fá cil conseguir vá rios efeitos, variando e trabalhando com pontos, linhas e formas.

DICA
Para ver
O interesse de Marcel Duchamp por má quinas capazes de produzir efeitos ó pticos motivou-o a criar
vá rios experimentos. A maioria das imagens produzidas por ele com esse conceito sã o compostas por círculos
que, organizados na superfície do disco, criam efeitos ao girar. O artista fez vá rias filmagens de seus inventos
ó pticos, e você pode assistir a alguns desses filmes na internet, acessando: <http://tub.im/8xfex2> (acesso
em: 22 fev. 2016).
Pá gina 215

Fotografia: o mundo visto pela lente


Você já parou para pensar nos inventos criados pelos seres humanos para ampliar nossa
maneira de ver o mundo? Com que frequência olhamos o mundo por meio de lentes ou visores
de câ meras fotográ ficas?

O desejo de capturar as impressõ es do momento vivido, na pintura e na mú sica, teve


influência no invento da fotografia. Experimentos de Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833) e
Daguerre (1787-1851) e outros estudos mudaram a forma de registrar os momentos e o
mundo das imagens.

Uma nova técnica de captura de imagens proporcionou uma febre de retratos no lugar
de pinturas e outras linguagens tradicionais (desenho, escultura e gravura). Com a novidade,
era possível realizar retratos com uma câ mera fotográ fica e por meio de processos de
revelaçã o.

Michael Freeman/Alamy/Latinstock

Primeira câmera fotográfica, conhecida como Daguerreótipo, inventada pelo francês Daguerre em 1839.

O uso de lentes para observar imagens de modos diferentes já era conhecido por povos
da Antiguidade que usavam pedras transparentes, como cristais e gemas preciosas. Com o
tempo novos materiais surgiram, o vidro foi descoberto e a tecnologia possibilitou a invençã o
de lentes cada vez mais precisas. Nos dias atuais, existe uma grande quantidade de lentes, com
diferentes funçõ es, materiais, tamanhos e modelos para serem usadas em câ meras
fotográ ficas.
Daniel Valla FRPS/Alamy/Latinstock

Em 1925, surgiu a câmera Leica I, que revolucionou o mundo da fotografia graças à alta qualidade das imagens e sua
portabilidade.

As câ meras fotográ ficas possuem ajustes e recursos técnicos que possibilitam capturar a
imagem de um pá ssaro em pleno voo, por exemplo, como fez o fotó grafo Alan Murphy que
conseguiu capturar com precisã o o momento do voo de dois pá ssaros, como vemos na imagem
abaixo.

Das má quinas fotográ ficas mecâ nicas à s nossas supercâ meras digitais, muita coisa
mudou, muita coisa foi feita e experimentada. O uso da fotografia alcançou proporçã o
inigualá vel no desenvolvimento da cultura visual. Com o advento da fotografia, surgiu também
a figura do fotó grafo, profissã o que se tornou nobre na sociedade. A fotografia, na
contemporaneidade, é utilizada nã o só para uso artístico, mas também para registrar
acontecimentos do dia a dia e capturar o que se passa ao nosso redor.

Alan Murphy/BIA/Minden/Latinstock

O fotógrafo britânico Alan Murphy flagrou dois pássaros em pleno voo.

Rasch/Shutterstock.com
Visor de câmera digital mostrando uma paisagem. Foto de 2014.
Pá gina 216

Um olhar curioso!
Por volta da década de 1950, a fotografia já era bem popular e existiam no mercado
muitos modelos de câ meras analó gicas (manuais). O artista Geraldo de Barros (1923-1998)
olhava pelas lentes das câ meras fotográ ficas e tinha um olhar curioso que o impulsionava a
criar de forma diferente, inovadora. Ao olhar de forma sensível, via formas geométricas,
orgâ nicas, figurativas, abstratas, bidimensionais, tridimensionais e criava com base nessas
formas nas linguagens da fotografia, do desenho, da pintura e da gravura; muitas vezes,
também misturava linguagens.

Ele também estudou sobre linhas, superfícies, texturas, tonalidades, contrastes,


luminosidades, transparências e composiçõ es para enriquecer o seu trabalho, na forma e no
conteú do, com as artes visuais.

Observe as imagens abaixo e perceba as diferentes formas de composiçã o exploradas


por Geraldo de Barros.

Suas pesquisas ficaram conhecidas como Fotoformas. Usando a fotografia como base, ele
sobrepunha imagens, combinava formas, criava atmosferas de luzes ou aproveitava a luz
ambiente. Conseguir efeitos, sombras e reflexos era seu principal interesse nas composiçõ es
das “fotoformas”.

Geraldo de Barros. 1950. Fotografia. Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro. © Fabiana de Barros

Fotoformas, de Geraldo de Barros, 1950. Fotografia, 40 cm × 30 cm.


Geraldo de Barros. 1950. Fotografia. Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro. © Fabiana de Barros

Homenagem a Stravinsky, de Geraldo de Barros, 1950. Matriz-negativo (fotografia, 38,2 cm × 28,2 cm).

A arte de GERALDO DE BARROS


Geométricas, orgâ nicas, figurativas, abstratas, bidimensionais, tridimensionais, as
formas sã o apresentadas de muitos modos na arte.

Geraldo de Barros (1923-1998), artista nascido em Chavantes, interior de Sã o Paulo, se


expressou em vá rias linguagens: pintor, gravador, artista grá fico, designer. Mas foi como
fotó grafo que se destacou como um artista curioso, que gostava de fazer experiências com as
maneiras de criar imagens. Chegou a construir sua pró pria câ mera fotográ fica no início de sua
carreira. Estudou sobre a forma e criou vá rias obras com a gramá tica visual. Por essa razã o, na
histó ria da arte brasileira, Geraldo de Barros ficou conhecido como um dos precursores da
fotografia experimental.

Em suas imagens, explorou tanto a figuraçã o como a abstraçã o em fotografias, pinturas e


gravuras.
Pá gina 217

Palavra do artista

“A fotografia é para mim um processo de gravura. [...] Acredito também que é no ‘erro’,
na exploraçã o do acaso, que reside a criaçã o fotográ fica. Me preocupei em conhecer a técnica
apenas o suficiente para me expressar, sem me deixar levar por excessivos virtuosismos. [...]
Acredito que a exagerada sofisticaçã o técnica, leva a um empobrecimento dos resultados, da
imaginaçã o e da criatividade, o que é negativo para a arte fotográ fica.”

Geraldo de Barros

FERNANDES JR., Rubens. A fotografia expandida. In: GRECCO, Priscila Miraz de Freitas. “Felizmente existem os
restos”: Sobras de Geraldo de Barros e a autobiografia atravé s da fotografia. Domínios da Imagem, Londrina, ano V, n. 9,
p. 110, out. 2011. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/dominiosdaimagem/article/viewFile/23387/17083>. Acesso em: 17 fev.
2016.

Pami de Souza/Folhapress

Artista plástico, fotógrafo e designer Geraldo de Barros. Foto de 1986.

Ofício da arte

Fotógrafo(a)

Profissional e/ou artista da fotografia que domina o uso de má quinas, lentes e filmes,
bem como as técnicas de revelaçã o, ampliaçã o e tratamento de imagens analó gicas e digitais.
Utiliza técnicas de iluminaçã o e enquadramento com o objetivo de captar a melhor imagem
possível do objeto fotografado. Sua produçã o pode ser jornalística, documental, comercial ou
artística.

O fotó grafo pode atuar como profissional contratado ou autô nomo em jornais, revistas,
sites, emissoras de TV, no cinema, em agências de publicidade e propaganda, além de empresas
de eventos, familiares e corporativos.

Giro de ideias: As fotoformas


Vimos como o artista Geraldo de Barros organizava suas pesquisas. Nas imagens que
criava com fotografias, ele realizava interferências, à s vezes fazia cortes, desenhava ou pintava
sobre as imagens, trabalhava sobreposiçõ es, alterava a luz, entre outros tipos de
experimentaçõ es artísticas.

Agora, que tal você experimentar criar fotoformas?

Pesquise mais sobre as possibilidades de criaçã o na proposta das fotoformas. Encontre


locais, objetos, monte imagens e fotografe-as. Depois, imprima as fotografias e faça mais
interferências sobre elas.

Registre suas observaçõ es nas linhas abaixo.

Depois, que tal fazer uma exposiçã o virtual das fotoformas?


Pá gina 218

Conexõ es Arte, Física e Química


Os processos físico-químicos da fotografia
Olha o passarinho!

Você já ouviu essa expressã o?

Sabe como ela surgiu? Quando a fotografia foi inventada uma das modalidades mais comuns
era o retrato. É curioso pensar que os retratos e os autorretratos também estã o em evidência hoje
na produçã o de fotografias. A diferença é que fazer uma selfie ou fotografia de alguém nos dias
atuais é bem mais rá pido do que no passado. No final do século XIX, para fazer um retrato
utilizando a técnica da fotografia era preciso que as pessoas posassem durante algum tempo, à s
vezes, por cerca de 30 minutos. Para distrair os retratados durante o tempo de espera,
principalmente as crianças, alguns fotó grafos tinham em seus estú dios gaiolas com pá ssaros e era
comum dizerem: Olha o passarinho!

Xica Lima

Reprodução de câmera fotográfica artesanal conhecida como “lambe-lambe”, em exposição no Sesc Boulevard, Belém (PA).

Agora que já descobrimos a origem da expressã o, vamos entender o processo. O tempo de


espera para conseguir uma imagem fotográ fica era necessá rio porque as fotografias eram feitas por
um processo físico-químico que envolve tempo de exposiçã o à luz e uso de componentes
específicos.

Os papéis fotográ ficos sã o sensíveis à luz, porque sã o compostos por uma emulsã o de
gelatina animal e sais de prata. Quando expostos à luz, gravam a imagem e formam o “negativo”. O
processo de revelaçã o e fixaçã o da imagem capturada utiliza materiais que reagem entre si, sob a
açã o da luz e o tempo de exposiçã o a ela.

A invençã o do Daguerreó tipo, aparelho que produzia imagens fotográ ficas, abriu caminhos
para a histó ria da captura e fixaçã o de imagens pelo processo físico-químico. Este invento
funcionava da seguinte maneira:

• Uma placa de cobre é sensibilizada com vapor de iodo, formando assim o iodeto de prata.

• Depois da formaçã o do iodeto de prata, a placa é exposta à luz ao ser colocada dentro de
uma câ mara escura por cerca de 25 minutos. Durante este período, ocorre o processo físico-
químico em que a luz transforma os cristais de iodeto de prata em prata metá lica formando a
imagem.

• A imagem formada era revelada com a ajuda do vapor de mercú rio aquecido.

• Para fixar a imagem na placa, usava-se o tiossulfato de só dio.

O processo físico-químico do Daguerreó tipo influenciou os inventores das câ meras


fotográ ficas analó gicas.

Câmeras fotográficas analógicas: a cada clique, o obturador da câ mera se abre e permite a entrada de luz. A luz
registra a imagem em um filme fotossensível que tem de ser “revelado” em laborató rio com o uso de substâ ncias químicas
para revelar e fixar a imagem e, finalmente, produzir as impressõ es em papel. Por causa deste processo nã o é possível
apagar as imagens gravadas, como fazemos com as câ meras digitais.
Pá gina 219

Pincel de luz
Vamos criar imagens com base no processo químico da fotografia? Para criar com a técnica
de “pincel de luz”, você vai precisar dos seguintes materiais:

• Líquido revelador (específico para revelaçã o de fotografias P&B);

• Papel fotográ fico (exposto à luz);

• Alguns pincéis macios de tamanhos variados.

Você pode pensar em um tema e, a partir dele, criar desenhos e imagens, com linhas, formas
e texturas, ou desenhar ao acaso. Molhe o pincel no líquido revelador e passe sobre o papel
fotográ fico, sensibilizado pela luz, fazendo linhas, criando formas e á reas mais claras e outras mais
escuras. Linhas paralelas e pontos criam efeitos de textura.

Em um primeiro momento, os desenhos nã o aparecerã o e a sensaçã o é que o papel apenas


está ficando “molhado”. Porém, apó s alguns minutos, a má gica acontece e começam a surgir
graduaçõ es de cinza até o preto.

Faça vá rios desenhos e aproveite a experiência que une arte, fotografia e química.

Miguel Chikaoka/Kamara Kó Fotografia

Desenhos feitos com “pincel de luz” em papel fotográfico, em oficina realizada por Miguel Chikaoka com apoio de Irene
Almeida, no Mercado Ver-o-Peso, em Belém (PA).

DICA
Para navegar
A Associação Paraense Fotoativa desenvolve a cultura fotográ fica na regiã o amazô nica e é uma das
mais atuantes e criativas organizaçõ es culturais do país, navegue pelo site e conheça esse trabalho:
<http://tub.im/hg8kks> (acesso em: 25 jan. 2016).
Pá gina 220

Um mundo em cores para ver


O pintor holandês Albert van der Eckhout (c. 1610-c. 1666), quando esteve no Brasil, a
serviço do conde Maurício de Nassau (1604-1679), entre os anos de 1637 e 1644, deve ter
enchido seus olhos com as cores e se deliciado com os sabores dos frutos de nossa terra. Na
pintura Bananas, goiaba e outras frutas, vemos as cores das frutas em tons de vermelho,
amarelo, verde, entre outros. Observe a percepçã o sensível do artista da cor luz, traduzida, na
pintura em ó leo sobre tela, em cores pigmentos. Repare no detalhe em vermelho da goiaba
suculenta na composiçã o da pintura de Eckhout.

Albert Eckhout. s. d. Ó leo sobre tela. Nationalmuseet, Copenhague, Dinamarca. © The National Museum of Denmark, Ethnographic Collection

Bananas, goiaba e outras frutas, de Albert Eckhout, s.d. Óleo sobre tela, 91 cm × 91 cm.

Quando olhamos para uma goiaba vermelha cortada ao meio na natureza, vemos a cor
vermelha porque essa fruta absorve todas as outras cores e reflete apenas o vermelho, que é a
sua cor. Assim acontece com as cores pigmentos, as tintas. O pigmento é uma materialidade
proveniente de alguma substâ ncia de origem mineral, vegetal, animal ou sintética (compostos
químicos). Dependendo da natureza da cor da tinta (cor pigmento), ela absorve, refrata ou
reflete as ondas luminosas da luz. Por isso vemos a representaçã o da goiaba vermelha, que se
mostra apetitosa, ao lado de outras, em destaque que pode até nos dar á gua na boca e vontade
de prová -la, um convite feito pela imagem criada pelo pintor Albert Eckhout.

O retrato da atmosfera e do ser humano em sua essência inspirou vá rios artistas, entre
eles um brasileiro, o paulista José Ferraz de Almeida Jú nior (1850-1899), considerado um
pintor característico do Realismo. A realidade nã o está apenas nos temas ou nas cenas em
pinturas realistas, pode estar também na escolha de cores na paleta do pintor. Para isso, o
artista deve olhar de maneira mais atenta ao seu redor e perceber luminosidade, cor, forma e
temas pró ximos, regionais. Observe ao lado essas características na pintura O violeiro (1899).
José Ferraz de Almeida Jú nior. 1899. Ó leo sobre tela. Pinacoteca do Estado de São Paulo, Sã o Paulo.

O violeiro (1899), de Almeida Júnior (1850-1899). Óleo sobre tela, 141 cm × 172 cm.

Almeida Jú nior esteve em viagem de estudos na Europa por uma temporada, chegando a
estudar na Escola Superior de Belas Artes, em Paris. De volta ao Brasil, começou a perceber
que a paleta de cores usada por seus colegas parisienses por vezes era em tons mais frios. Para
representar o clima brasileiro e sua atmosfera tropical, ele precisava de uma paleta mais
quente. Foi uma escolha pela brasilidade da cor para mostrar a quentura do ar, as luzes e cores
da nossa terra, criando pinturas com atmosferas carregadas de regionalismo e percepçã o da
natureza.
Pá gina 221

As cores podem nos provocar sensaçõ es diversas. Cada pessoa pode ter uma reaçã o
particular. Imagine entrar em um local todo impregnado da cor vermelha. Qual seria sua
reaçã o? O artista carioca Cildo Meireles (1948-) nos faz esse convite em sua instalaçã o Desvio
para o vermelho, que está em cará ter permanente no Centro Cultural Inhotim, em Minas
Gerais, desde 2006. Observe-a.

Cildo Meireles. 1967-84. Instituto Cultural de Inhotim. Foto: Eduardo Eckenfels

Desvio para o vermelho – I: Impregnação, II: Entorno, III: Desvio, de Cildo Meireles, 1967-1984. Instalação com materiais
diversos, 100 cm × 500 cm (cada uma das partes). Segunda de três versões.

Giro de ideias: Cores e coisas


As cores dos ambientes podem nos proporcionar vá rias sensaçõ es. Uma sala escura, por
exemplo, pode nos dar a impressã o que é menor que uma sala pintada com cores mais claras,
mesmo que a metragem de ambas seja a mesma. O teto, quando pintado de uma cor mais
escura que a da parede, também pode nos causar sensaçã o de achatamento.Designers de
interiores sã o profissionais que estudam a cor e a relaçã o com o espaço.

Observe o local em que você e os colegas estã o neste momento e analise as relaçõ es
entre cor e espaço. Volte à imagem da obra Desvio para o vermelho, de Cildo Meireles. Que
relaçõ es podemos estabelecer com as cores e as coisas? Ao adquirir algum objeto, você pensa
sobre a predileçã o de cores, emoçõ es e sensaçõ es?

Continuando nossas observaçõ es sobre as cores, amplie o debate com sua turma. Você
considera que haja relaçõ es entre cores e símbolos? Por exemplo, para muitas pessoas, o
vermelho é a cor da paixã o; o azul representa a tranquilidade; o branco, a cor da paz; o amarelo
é energia. Essas ideias estã o em todas as culturas? Quem determinou que deveria ser assim?
Apó s o debate, registre as conclusõ es a que você e o grupo chegaram.
Pá gina 222

Conexõ es Arte e Biologia


Olhares sabidos
Por meio de nossos olhos, aprendemos a observar o mundo e ir além das aparências das
coisas, imaginando e criando arte. Na escultura Olho (2010), do artista multimídia estadunidense
Tony Tasset (1960-), essa parte do corpo humano foi expressa em dimensõ es gigantescas,
chamando a atençã o de olhares curiosos na cidade de Chicago, Estados Unidos.

Segundo a teoria da evoluçã o das espécies, o olho humano se desenvolveu e se adaptou à luz
do Sol, o que nos garante a sensibilidade na percepçã o da cor. A Biologia explica que registramos as
frequências do espectro eletromagnético visível, ou seja, a porçã o do espectro em que a radiaçã o é
composta por fó tons que sensibilizam nossos olhos. As cores sã o percebidas em faixas de
frequência de radiaçã o entre os tons de vermelho e ultravioleta. Para cada frequência, percebemos
a faixa de luz visível de uma cor.

Cada olho humano, ou bulbo ocular, é composto de um sistema em que temos a có rnea, a
parte transparente que cobre o elemento colorido do olho, ao qual chamamos de íris. No centro da
íris, temos a pupila, responsá vel por receber a luz. A lente, também presente no olho, é uma
estrutura gelatinosa que focaliza a luz, formando imagens na retina, que é composta pelos cones e
bastonetes.

Sã o essas partes que, juntas, proporcionam a percepçã o de cores, de formas, de imagens,


graças à existência da luz e da fisiologia do olho. Observe na pá gina seguinte um esquema que
mostra a formaçã o de uma imagem no olho humano.

Precisamos de mais luz que alguns outros animais para enxergar. Os felinos sã o mestres em
enxergar no escuro porque precisam de menos luz. O ser humano, ao observar como os animais
veem as cores, desenvolveu instrumentos para também enxergar melhor, como os binó culos
infravermelhos, usados para ampliar a capacidade de enxergar em ambientes com pouca luz.
Tony Tasset. 2010. Fibra de vidro e aço. Pritzer Park, Chicago. Foto: Scott Harrison/Retna Ltd./Corbis/Latinstock

Olho, de Tony Tasset, 2010. Fibra de vidro, aço, 9,14 m de diâmetro. Em exibição no Pritzker Park, Chicago, EUA.
Pá gina 223

Ilustração: Luís Moura

Esquema representando a visão humana de um objeto distante.

Saberes em Biologia e Física nos ajudam a compreender como vemos as cores. Com tais
conhecimentos podemos fazer pinturas, como a obra do artista paulista Antonio Peticov (1946-),
veja abaixo.

Antonio Peticov. 1980. Madeira, cerâmica e neon. Acervo do artista

Natura, de Antonio Peticov, 1980. Madeira, cerâmica e neon, 21 cm × 100 cm × 21 cm.

Também podemos criar arte a partir de saberes em Química e Física. Vamos fazer uma
pintura que só aparece no escuro? Para isso, vamos precisar de protetor solar, uma sala escura e
uma lâ mpada ultravioleta (luz negra).

1. Escolha uma superfície de cor branca (pode ser tecido, papel ou plá stico).

2. Molhando um pincel no protetor solar, trace linhas e desenhe aquilo que quiser.
3. Coloque seu desenho em uma sala escura com uma lâ mpada de luz negra acesa.

4. Você verá seu desenho em destaque no escuro.

Isso acontece porque as lâ mpadas de luz negra sã o preparadas com vidros especiais, mais
escuros, dos quais é eliminado o fó sforo que geralmente reveste os vidros das lâ mpadas comuns.
Dessa forma, a luz ultravioleta passa diretamente pelo vidro e reflete em superfícies brancas. O
protetor solar bloqueia os raios ultravioletas e, assim, seu desenho aparece.
Pá gina 224

Escolhendo cores

Ola-ola/Shutterstock.com

Círculo cromático com transição para o preto no centro.

O círculo cromá tico é um esquema que apresenta as cores e como se relacionam quanto
a suas tonalidades. Há artistas que escolhem usar as cores vizinhas, chamadas de cores
análogas. Você já ouviu falar que os opostos se atraem? Assim, alguns pintores gostam de
explorar os contrastes e escolhem cores que estã o opostas no círculo, por exemplo, o azul e o
laranja (em combinaçõ es entre azul e laranja, vermelho e verde, amarelo e roxo e suas
variaçõ es cromá ticas chamamos de arranjos complementares).

Há , também, escolhas em relaçã o à s “temperaturas” das cores, quentes ou frias, em uma


classificaçã o sensorial, relacionada à s sensaçõ es que as cores podem transmitir. Veja no círculo
quais cores sã o quentes e quais sã o frias.

Uma cor pró xima a outra provoca interferência. Se pintarmos uma tela com 70% de tons
em amarelo e 30% de roxo, por exemplo, o roxo, mesmo considerado frio, parecerá mais
quente. A cor verde é considerada fria, porém, se em sua composiçã o, colocarmos amarelo e
azul e a proporçã o de amarelo for maior que a de azul, a sensaçã o será de um tom de verde
mais cítrico, mais quente.

Podemos ainda estudar as cores (pigmentos) primá rias, secundá rias, terciá rias e
neutras. A cor física, que é aquela derivada da luz, também pode ser um foco de estudo.
Há ó timas tintas industrializadas, mas você pode sempre pesquisar materiais e
procedimentos para inventar suas pró prias tintas. Assim, vale experimentar e escolher como
você quer apresentar as cores em sua pintura e com que forma poética.

Artefficient/Shutterstock.com

Cores neutras: do cinza ao bege.


Pá gina 225

A poética da cor
Observe, a seguir, as imagens criadas pelo espanhol Pablo Picasso (1881-1973). Na
primeira, ele usou mais tons de azul. Na segunda, predominam tons de rosa. As pinturas
apresentam a cor em consonâ ncia com a intençã o do artista quando as criou. Essas pinturas
fazem parte de dois momentos importantes do processo de criaçã o do artista que, na ocasiã o,
pesquisava sobre a poética da cor. O que isto quer dizer? Pablo Picasso era um artista dedicado
e intenso ao criar, sempre mergulhava em suas pesquisas ao estudar temas, materialidades,
técnicas e elementos de linguagem, como conseguir encontrar um caminho poético e
expressivo por meio de linhas, formas, cores... Nas fases que ficaram conhecidas como azul e
rosa, ele traduziu em cores suas percepçõ es sobre vida, particular e social.

Emoçõ es e sensaçõ es ligadas ao viver em meio a lutas sociais, discussõ es políticas,


momentos de angú stia ao testemunhar injustiças, pessoas passando fome, perdas de pessoas
queridas e o sentimento de tristeza, foram traduzidos em tons de azul. É como se o artista
tivesse usado uma metá fora em forma de cores: uma fria manhã de inverno coberta de nevoa
ú mida ou as cores de uma noite sombria que custa a passar.

Na fase rosa, sã o celebrados os momentos com amigos, a percepçã o do amor e da


ternura familiar, as risadas, as pequenas alegrias diá rias e sutis que nem todos percebem, mas
que sã o preciosas. As cores que a representam sã o como as cores do entardecer de um dia
quente, que findam carregados de tons de rosa.

Artistas como Picasso sentiram o mundo, o interpretaram e usaram a poética da cor


para pintar percepçõ es de momentos de suas vidas.

Reflita e faça um exercício de percepçã o sobre o tema “poética da cor”, com base no
texto expositivo e nas pinturas, A Tragédia (1903), da fase azul, e Família de acrobatas com
macaco (1905), da fase rosa. Que relaçõ es você percebe sobre as cores escolhidas pelo artista?
Que cores você escolheria para representar o seu universo?
Pablo Picasso. 1903. Ó leo sobre madeira. National Gallery of Art, Washington DC. Foto: Francis G. Mayer/Corbis/Latinstock

A Tragédia, de Pablo Picasso, 1903, de sua fase azul. Óleo sobre madeira, 105,3 cm × 69 cm.

Pablo Picasso. 1905. Guache sobre papel. Museu de Artes de Gotemburgo, Sué cia. Foto: Painting/Alamy/Glow Images

Família de acrobatas com macaco, de Pablo Picasso, 1905, de sua fase rosa. Guache sobre papel, 104 cm × 75 cm.
Pá gina 226

A arte dos impressionistas


Há artistas considerados coloristas por aplicarem muitas cores em seus trabalhos. Os
impressionistas, como eram chamados os artistas seguidores do Impressionismo, saíram dos
ateliês para registrar como o olho vê as cores e como poderiam traduzir essas visõ es
cromá ticas em imagens pictó ricas.

Ao realizar pinturas ao ar livre, esses artistas fizeram pesquisas sobre as mudanças na


atmosfera e suas consequências na composiçã o da cor e da luz. Com base nessas pesquisas,
eles usavam em suas obras cor e luz compondo imagens fluidas e sem contornos, linhas
dissolvidas, mergulhadas em manchas e nuances cromá ticas.

O termo Impressionismo foi inicialmente usado pela crítica de modo pejorativo para se
referir a pinturas “inacabadas”. Depois, os artistas seguidores desse movimento assumiram o
termo, já que se tratava de capturar as impressõ es de cada momento, como podemos notar na
obra Nascer do sol, impressã o, de Claude Monet (1840-1926), apresentada no capítulo 3. Os
impressionistas também observavam a vida e o cotidiano. Este artista, como forma de
aprofundar suas pesquisas sobre a visã o da cor e a pintura, fez vá rios estudos de vistas da
Catedral de Rouen, na França. Em cada pintura, utilizou cores diferentes, em funçã o da
percepçã o de mudanças na iluminaçã o da luz do Sol e das influências de materiais na
atmosfera, como o ar e sua umidade. Dos estudos de Monet aprendemos que, a cada momento
do dia ou período do ano, a mesma paisagem pode mudar de cor. Observe as pinturas de Monet
nesta pá gina.

Outros artistas impressionistas, como Degas (1834-1917), Manet (1832-1883), Pissarro


(1830-1903), Renoir (1841-1919), Sisley (1839-1899), Mary Cassat (1844-1926), Berthe
Morisot (1841-1895) e Marie Bracquemond (1840-1916), marcaram a histó ria da criaçã o de
imagens dentro desse estilo.

Que tal fazermos como os impressionistas? Escolha um parque ou praça em sua cidade,
leve telas, tintas e se aventure a criar observando a pró pria natureza.

Claude Monet. 1894. Ó leo sobre tela. Galerie Beyerler, Basel


Claude Monet. 1894. Ó leo sobre tela. Museu Metropolitano de Arte, Nova York

Claude Monet. 1894. Ó leo sobre tela. Museu Marmottan, Paris

Três das 50 imagens da série A Catedral de Rouen, de Claude Monet. Essa série foi pintada em horários diferentes, entre
1893 e 1894, reproduzindo as diferentes incidências de luz. Óleo sobre tela, 110 cm × 73 cm; 100 cm × 65 cm; 100 cm × 65 cm
(respectivamente).
Pá gina 227

Projeto experimental
A cor significa
Na escolha de cores para pintar, podemos elencar vá rios critérios. Que significados as cores
têm para você? Você tem uma cor preferida? O artista francês Henri Matisse (1869-1954), (veja as
pinturas ao lado), assim como o brasileiro Cildo Meireles, já citado, criou obras em que
predominam a cor vermelha. Escolha uma cor e pinte uma superfície (um suporte). Você pode optar
por trabalhar com guaches prontos, mas experimente fazer suas pró prias tintas. Depois faça algum
tipo de interferência sobre sua pintura, usando imagens impressas, objetos, palavras, enfim, nã o há
regras, mas procure estabelecer relaçõ es entre a cor e um assunto, tema, ou significado.

Henri Matisse. 1908. Ó leo sobre tela. Museu Hermitage, St. Petersburgo. Foto: Album/Joseph Martin/Fototeca H. Matisse/Latinstock

A sobremesa: harmonia em vermelho, de Henri Matisse, 1908. Óleo sobre tela, 180 cm × 220 cm.

Henri Matisse. 1911. Ó leo sobre tela. Museu de Arte Moderna, Nova York. Foto: VG-Bild-Kunst Bonn/Glow Images

O estúdio vermelho, de Henri Matisse, 1911. Óleo sobre tela, 181 cm × 219,1 cm.

Veja agora uma maneira de fazer tintas. Para fazer cada cor, reserve os materiais a seguir.
• Uma gema de ovo (que funcionará como um aglutinante – ver Capítulo 4).

• ½ copo de á gua (a á gua funciona como solvente e dá fluidez à tinta, ou seja, você pode
controlar a quantidade de á gua para obter uma tinta mais rala ou mais densa).

• Pigmentos (você pode usar pigmentos naturais, como urucum, açafrã o, beterraba etc., ou,
pigmentos minerais de vá rias cores, como ó xido de ferro, que é vendido em casas de materiais para
construçã o, ou, ainda, anilinas comestíveis, que sã o vendidas em supermercados).

• Copos descartá veis, panos para limpeza e pincéis de vá rios tamanhos e espessuras.

Para fazer a tinta à base de ovo, misture os materiais: para cada gema de ovo (sem a
película), acrescente de uma a duas colheres de sopa de á gua. Lembre-se de que você pode escolher
entre tintas mais aguadas e tintas mais espessas, variando a quantidade de á gua. Depois acrescente
o pigmento na cor desejada. Se o pigmento estiver em estado líquido, coloque 1 colher de sopa; se o
pigmento se apresentar em pó , você pode acrescentar 2 colheres de sopa. A quantidade de
pigmento, seja líquido ou pó , dependerá da consistência da tinta que você deseja obter. Desse modo,
a proposta é a de que você faça experiências e eleja qual é o melhor tipo de tinta para o seu projeto.
Pá gina 228

Projeto experimental
Criando imagens incríveis

© Ben Heine 2013 – benheime.com

Composição de desenho e fotografia da série Pencil Vs Camera, 2011. Projeto artístico do artista belga Ben Heine.

Há artistas que apresentam como característica principal na criaçã o de suas obras a mistura
de linguagens. É o caso das composiçõ es com fotografias e desenhos do artista belga Ben Heine
(1983-).

Em seu processo de criaçã o, Heine escolhe uma cena, cria desenhos e coloca-os sobre a cena,
em uma posiçã o previamente planejada, de modo que pareçam estar na mesma perspectiva. Entã o,
ele fotografa a imagem, obtendo resultados surpreendentes.

Faça sua arte usando imagens fotográ ficas e traços. Há vá rios tipos de materiais para os
desenhos, que chamamos de riscadores. Pesquise e escolha o seu. Também há muitos modos de
fazer a linha no desenho. Invente seu jeito, crie em sua poética. Escolha cenas interessantes para
colocar os desenhos e fotografar. Você pode usar até uma câ mera de celular para fazer esse tipo de
trabalho.

DICA
Para navegar
Saiba mais sobre o artista belga Ben Heine e sobre sua obra acessando este site:
<http://tub.im/wk4er9> (acesso em: 9 fev. 2016).
Pá gina 229

TEMA 3 O CONJUNTO DA
OBRA
"Nó s, seres-humanos, possuímos a mesma geometria e uma estrutura
corporal organizada nos mesmos padrõ es de movimento. E, mesmo assim, nos
expressamos gestualmente das maneiras mais variadas possíveis. [...]"

MÉ TODO BERTAZZO. Os caminhos de Bertazzo. [2015?]. Disponível em: <http://metodobertazzo.com/sobre.php>. Acesso


em: 18 abr. 2016.

Ivaldo Bertazzo (1949-), bailarino e coreó grafo paulista, diz que mesmo tendo a mesma
estrutura biofísica a nossa formaçã o cultural nos torna pessoas que se expressam na dança ou
por meio de gestos de forma completamente diferente.

Na dança e no teatro, a açã o dramá tica ocorre prioritariamente, mas não


exclusivamente, por meio do movimento. Nesse caso, dramaturgia é o nome que damos à s
histó rias que os corpos em movimento contam. Temos danças que sã o populares, étnicas ou
folcló ricas, danças religiosas, danças teatrais, danças terapêuticas e danças educativas, cada
qual expressando dramaturgias de determinada comunidade ou grupo de pessoas.

Na histó ria das danças teatrais, o balé clá ssico, por exemplo, nasceu com base em uma
dramaturgia que representava os valores da nobreza europeia, para em seguida se
transformar em uma representaçã o dos valores das mulheres de uma época, com base nos
contos de fada: mulheres frá geis, dependentes dos homens e sem poder de decisã o. Hoje, o
balé clá ssico prevalece, porém, contando as mais variadas histó rias, em uma pluralidade de
conteú dos. A forma, contudo, permanece, por meio das linhas retas, dos movimentos precisos,
dos pés esticados em sapatilhas, dos giros e virtuoses técnicas.

O hip hop, outro exemplo, é uma dança que expressa a dramaturgia de algumas pessoas
e seu estilo de vida, seus conceitos e ideias, assim como o frevo (típico do Nordeste do Brasil),
o vira (de Portugal), o tango (da Argentina), entre tantos outros estilos. Os conteú dos
manifestados na dança expressam histó rias, sentimentos e visõ es de mundo.
Value Stock Images/Glow Images

Rapaz praticando street dance, um tipo de dança contemporânea de rua. Foto de 2011.

Pilobolus é uma companhia estadunidense de dança (Pilobolus Dance Theatre) e um


instituto de ensino e aprendizagem (Pilobolus Institute). Em seu espetá culo Shadowland (Ilha
das sombras), criado em 2009 e continuamente apresentado, (veja ao lado uma imagem do
espetá culo) eles transformam as sombras em vida. Os bailarinos e bailarinas, escondidos atrá s
de uma tela, brincam com as luzes e as projeçõ es de suas sombras. Os movimentos criados pela
coreografia possibilitam, nesse jogo de sombras, que se transformem em animais, objetos e
personagens de fantasia.

Timothy A. Clary/AFP

Os dançarinos do grupo Pilobolus brincam com as sombras no espetáculo Shadowland, em novembro de 2015.

DICA
Para navegar

Informe-se sobre danças do seu estado, de outros estados brasileiros e países, como a Pilobolus Dance
Theatre, companhia estadunidense de dança acrobá tica. Veja um trecho do espetá culo Shadowland (2009),
dessa companhia navegando pelo site: <http://tub.im/5tfoph> (acesso em: 24 fev. 2016).
Pá gina 230

Giro de ideias: Roda da dança


Há muitos estilos de dança. Você já deve ter visto ou participado de alguma
apresentaçã o, ou mesmo dançado algum estilo específico em uma festa ou confraternizaçã o.
Procure na internet a histó ria de uma dança de que você goste ou que tenha curiosidade de
conhecer.

Se possível, entreviste ou converse com profissionais ligados à dança que possam ajudá -
lo.

Registre suas observaçõ es nas linhas abaixo.

Conexõ es Arte e religiã o


Linguagem da arte: dança
A dança sempre esteve presente como manifestaçã o artística ou religiosa. Ainda hoje ela
pode estar ligada a ritos religiosos, como as danças nas religiõ es afro-brasileiras, na cultura de
grupos indígenas e nas coreografias de corais evangélicos ou cató licos.

A dança pode estar nas ruas, nas casas noturnas ou nos cultos religiosos. E em cada contexto
cultural ela tem um significado específico.

A dança como louvaçã o


Na Turquia, um grupo religioso conhecido como dervixes acredita que a maneira de chegar
mais pró ximo de Deus é por meio da poesia, da mú sica e da dança.

A dança dos dervixes rodopiantes é feita em uma sala apropriada, eles vestem longas tú nicas
brancas e um chapéu cô nico na cabeça. A mã o direita se eleva ao céu para recolher as graças divinas
que sã o enviadas à terra e a mã o esquerda aponta em direçã o ao solo, e nesta posiçã o, eles
rodopiam diversas vezes.

Pesquise sobre as danças ligadas à cultura do sagrado, que acontecem dentro de religiõ es ou
manifestaçõ es culturais étnicas. Discuta esse assunto com o professor e os colegas. Na sua
comunidade, essas manifestaçõ es de dança acontecem? Quais significados elas apresentam?
Kenan Kahraman/Shutterstock.com

Os dervixes rodopiantes em apresentação no Mevlana Culture Center, em Konya, Turquia. Foto de 2015.
Pá gina 231

A língua do corpo
A dança e o teatro sã o linguagens cênicas. Assim, como as palavras sã o os vocá bulos da
língua que falamos e escrevemos, podemos dizer que os movimentos sã o os vocá bulos cênicos
da dança, do teatro e de suas versõ es filmadas. Podemos ler essas linguagens na pele do ator,
na expressã o fisionô mica, ao perceber o esforço dos mú sculos, dos nervos no corpo do
bailarino. Enfim, nosso corpo fala. O que diz? Em nossos gestos, falamos por linguagem nã o
verbal. A comunicaçã o não se dá apenas por palavras, mas também por gestos. Gestos
expressivos que mostram se estamos felizes, tristes, furiosos ou em estado de euforia. Essa
forma de comunicaçã o gestual é muito antiga e está presente tanto na arte quanto nas atitudes
mais corriqueiras, como em um cumprimento, no modo de chamar alguém, em jogos
esportivos e outras situaçõ es.

Linguagem cênica: pró pria de uma representaçã o artística na qual o corpo é o principal suporte dessa arte. A
dança, o teatro, o circo, a mímica, entre outras formas de arte, sã o consideradas linguagens cê nicas.

Para a montagem de um espetá culo de dança ou teatro, sã o pesquisados o espaço, as


roupas que serã o usadas (figurino), como será a luz, o som e outros detalhes, mas,
principalmente, os bailarinos e atores pesquisam sobre como farã o cada movimento e gesto. À s
vezes, um gesto é “lapidado”, exaustivamente, trabalhado vá rias vezes até que atores,
diretores, bailarinos e coreó grafos fiquem satisfeitos. Geralmente, quando vemos tudo pronto
em cena, nã o pensamos que, por trá s de um simples gesto, há tanto trabalho.

Existe uma arte cênica que nã o utiliza palavras. O foco é o gesto. O mímico é um artista
dos gestos que conta suas histó rias por meio da pantomima (ou mímica). A arte da pantomima
originou-se na Grécia antiga. Uma versã o histó rica conta que esse termo nasceu do nome de
um ator chamado Pantomimus. Ele usava má scaras e dançava se comunicando somente por
gestos. Essa tradiçã o atravessou os tempos e ainda hoje é uma forma de arte. À s vezes, é
possível vermos mímicos pelas ruas, com má scaras ou o rosto completamente maquiado e
luvas brancas, expressando-se por meio da linguagem não verbal, por meio dos gestos.

Mímico: ator que usa a mímica (pantomima, a arte dos gestos) como forma de expressã o; mimo; pantomimeiro.

No cinema, em seus primó rdios, a arte da mímica também foi explorada por artistas
como o inglês Charles Chaplin (Charles Spencer Chaplin, 1889-1977). Um exemplo de seus
personagens é o inesquecível Carlitos, protagonista de vá rios filmes.
Filme de Charles Chaplin. O Grande Ditador. EUA. 1940. Foto: Everett Collection/Latinstock

Charles Chaplin, na famosa cena de O grande ditador, 1940.

A arte de CHARLES CHAPLIN


Charles Spencer Chaplin (1889-1977), mais conhecido como Charlie Chaplin, nasceu em
Londres, Inglaterra. Foi ator, diretor, roteirista, bailarino e mú sico, começando sua carreira nos
primó rdios da linguagem do cinema. Muitos de seus trabalhos hoje sã o considerados clá ssicos
nessa arte.

A expressividade gestual foi ponto fundamental na carreira de Chaplin, em um tempo em


que as palavras ainda não podiam ser ouvidas nas salas de projeçõ es. Era ainda a época do
cinema mudo, a linguagem e a expressã o do gesto eram o que valia, e o personagem Carlitos
tornou-se uma de suas grandes estrelas.

Chaplin chegou a fazer alguns filmes no cinema falado, como O grande ditador (1940),
filme que ganhou vá rios prêmios na época. As cenas em que ridiculariza um ditador, inspirado
em Adolf Hitler, entraram para a histó ria do cinema como um momento de crítica aliada à
graça. Contudo, lembramos desse artista principalmente por seus gestos e expressõ es
fisionô micas, por sua arte nã o verbal, por sua linguagem corporal e cênica.

Palavra do artista

“A arte é uma emoçã o adicional justaposta a uma técnica apurada.”

Charles Chaplin

CHAPLIN, Charles. In: CÓ RDULA, Raul. Utopia do olhar. Recife: Fundarpe, 2013. p. 13.
Bettmann/Corbis/Latinstock

Charles Chaplin no Lincoln Center, em Nova York (EUA). Foto de 1975.


Pá gina 232

Ofício da arte

Diretor(a) de cinema/Cineasta

Profissional que transforma um roteiro literá rio, verídico ou ficcional, em imagens


cinematográ ficas. O diretor de cinema conta com a ajuda de diversos profissionais
especializados para produzir sua histó ria (curta, média ou longa duraçã o) e exibir em salas de
cinema, em emissoras de TV ou em sites.

O trabalho do diretor de cinema consiste em escolher os atores e o figurino, pensar nos


cená rios das gravaçõ es e nos espaços a serem locados, nos efeitos especiais a serem utilizados,
na trilha sonora, ou seja, em planejar o passo a passo de todas as etapas de filmagem e da
finalizaçã o técnica, até o filme ficar pronto para ser exibido.

Para trabalhar na á rea é preciso estudar em uma escola de cinema ou fazer um curso de
comunicaçã o com especializaçã o na á rea. A melhor maneira de iniciar a carreira é por meio de
está gios ou como assistente de direçã o.

A maquiagem no cinema
Pintar o rosto é uma prá tica muito antiga que também está presente no cinema.
Maquiagens podem transformar as expressõ es dos atores e criar personagens fantá sticos.

Na arte do circo, encontramos as famosas pinturas de rosto dos palhaços, como vimos no
capítulo 1. A tradiçã o de pintar o rosto com maquiagem vem desde a Antiguidade. Nas cortes
dos reinos da China, havia atores cô micos que pintavam o rosto para divertir o imperador e
uma seleta plateia. Na Roma antiga, no surgimento da comédia, existiam atores que pintavam
os rostos, usavam má scaras e figurinos exagerados. Mas foi na Idade Média que começaram a
surgir atores andarilhos, que viviam de cidade em cidade e ganhavam a vida contando
histó rias engraçadas. Eles se apresentavam vestidos como palhaços, e eram os ú nicos que
ironizavam os nobres sem sofrer ameaças.

Da Idade Média para a atualidade, a arte de pintar o rosto se modificou e se diversificou


segundo a expressã o cultural de cada país. No cinema, muitos personagens ficaram famosos
por causa do tipo de maquiagem que caracterizou os atores que os interpretaram.

Alguns casos sã o tã o impressionantes que fica quase impossível reconhecer os atores,


como é o caso do personagem Chapeleiro Maluco interpretado por Johnny Depp no filme Alice
no País das Maravilhas (2010), dirigido por Tim Burton. O ator passou horas na sala de
maquiagem e precisou de sombras, pó branco, cílios postiços, peruca e, até mesmo, lentes de
contato para ganhar o rosto rosado, as sobrancelhas felpudas e os olhos eletrizantes que dã o
vida ao seu personagem.

A figura do maquiador é muito importante no processo de caracterizaçã o e, com a ajuda


do diretor de arte, colhe informaçõ es relevantes sobre as características psicoló gicas e físicas
do personagem, sentimentos que ele deve exprimir, o universo em que está inserido e em que
época vive. Vá rias pesquisas sã o realizadas até que se defina a paleta de cores e produtos que
serã o utilizados na maquiagem.
No cinema, a maquiagem é parte fundamental do processo de criaçã o de um
personagem, pode transformar as expressõ es dos atores e até mesmo dar vida a seres
fantá sticos.

NG Collection/Interfoto/Latinstock

A caracterização e a maquiagem do personagem Chapeleiro Maluco, interpretado por Johnny Depp, foi reconhecida e
premiada por instituições internacionais.
Pá gina 233

Giro de ideias: Gestos no cinema


Junte-se aos colegas e façam uma lista de títulos de filmes, séries, desenhos e novelas
que todos conheçam. Dividam-se em duas equipes. Cada equipe fica com metade da lista. Em
seguida, cada grupo escolhe uma pessoa para apresentar um dos títulos fazendo mímica. A
outra equipe deve adivinhar qual é o título que está sendo representado. Depois, os grupos
invertem os papéis.

Anote suas impressõ es sobre as atividades:

• No jogo de mímica, você achou mais difícil descobrir o título ou apresentar a mímica?

• Em que situaçõ es você usa ou usou mais gestos do que palavras para se comunicar?
Pá gina 234

O teatro na histó ria


Embora o teatro já existisse desde a Pré-Histó ria em forma ritualística e em cerimô nias
ao deus Dionísio na Grécia, foi na época do imperador grego Pisístrato (600 a.C.-528 a.C.) que
foram criados os concursos de teatro em Atenas. Dois gêneros surgiram como os mais
importantes: a comédia e a tragédia. Vá rios autores despontaram, tornando-se conhecidos na
posteridade, como Só focles, Eurípedes e Aristó fanes.

O estudo do filó sofo grego Aristó teles (384 a.C.-322 a.C.), sobre as artes ficou conhecido
como Poética. Sua teoria legitimou a importâ ncia da linguagem teatral na Antiguidade e
atravessou os tempos, sendo estudada ainda hoje.

Os estudos dos filó sofos e artistas gregos sobre os gêneros dramá ticos contribuíram
para a sistematizaçã o do estudo da arte. Antes a arte estava a serviço da religiã o. Com base
nesses estudos, a arte firma-se como produçã o do espírito humano com o objetivo de levar à
reflexã o sobre a vida e o mundo. A estética passa a ser um ramo da filosofia.

A cultura dos povos que ajudaram a formar o que conhecemos como “povo grego” era
rica em rituais religiosos com dança, poesia, câ nticos e encenaçõ es sobre a trajetó ria dos
deuses. Com o tempo, as histó rias dos deuses passaram a ser contadas como expressã o da
cultura mitoló gica. Assim, nascia uma arte em funçã o da arte, não mais ligada apenas à religiã o,
embora ainda tivesse relaçõ es diretas com ela. O que hoje conhecemos como teatro e dança
nasceu dessas tradiçõ es.

O espaço cênico no teatro


Os lugares onde acontecem o teatro e outras linguagens cênicas (como dança, circo e
outras manifestaçõ es) sã o conhecidos como “espaços cênicos”. Estes podem acontecer em
lugares abertos ou fechados, tradicionais ou inovadores, locais preparados especialmente para
este fim ou totalmente inusitados. Enfim qualquer lugar pode ser transformado em um espaço
cênico, até mesmo o pá tio da sua escola!

Na Grécia antiga, as manifestaçõ es em homenagem ao deus do vinho, Dionísio, eram


apresentadas a céu aberto. As tragédias e comédias gregas aconteciam em palcos inicialmente
muito simples. Para o pú blico, arquibancadas de madeira, degraus nos barrancos e degraus de
pedra em volta do palco. As forças naturais exerciam papel vital. O céu e a trajetó ria do Sol
conferiam vida e dramaticidade aos espetá culos.

Com o passar do tempo, os teatros, criados para abrigar manifestaçõ es culturais,


começaram a ser construídos nas encostas de montanhas, pois existia uma preocupaçã o com a
acú stica: era necessá rio que o pú blico nã o só visse como ouvisse a encenaçã o dos atores. Para
uma boa visualizaçã o do espetá culo, os assentos eram dispostos em degraus. Ainda hoje se
constroem teatros com essa disposiçã o de lugares.
CM Dixon/Heritage Images/Glow Images

LOIC VENANCE/AFP/Getty Images

Os teatros romanos eram construções colossais. A disposição dos assentos em degraus é usada até os dias atuais.
Pá gina 235

Os romanos também criaram locais para entretenimento, e eram construçõ es colossais.


As representaçõ es teatrais em Roma tiveram seu auge no século III a.C. A obra arquitetô nica
mais famosa é sem dú vida o Coliseu, cuja construçã o foi concluída no ano 80 d.C., no governo
de Tito, filho do imperador Vespasiano.

Uma das construçõ es mais fascinantes dos romanos, o Coliseu abrigou tanto a arte
quanto os esportes sanguiná rios e os jogos de diversã o. A cultura dos jogos romanos como
entretenimento para o povo fez nascer o circo.

Em Roma, havia os ludi scaenici (jogos cênicos). Nos palcos, onde antes havia apenas
espetá culos de circo, corridas de cavalo e lutas, passaram a acontecer os jogos cênicos com
atores, mú sicos e dançarinos.

Na Europa medieval, entre os séculos V e XV, o teatro ganha vida no interior das igrejas
com encenaçõ es de temas religiosos. Para as peças mais elaboradas, o espaço escolhido sã o as
praças, inicialmente em frente à s igrejas, e depois nas praças centrais. Para a igreja, o teatro se
torna um instrumento de disseminaçã o ideoló gica, obediência e submissã o aos valores da
época. A partir do século XII, pequenas casas montadas lado a lado eram chamadas de mansõ es
e usadas como cená rio. Usavam-se também os “carros-palco”, que se moviam diante de um
pú blico que, por sua vez, permanecia estático. No Brasil colonial, procissõ es encenadas ao ar
livre para catequizar os indígenas utilizavam elementos como a dança e o canto.

Na Inglaterra, assuntos sobre a histó ria do país eram trazidos à cena em pá tios de
hospedarias e prédios teatrais simples de madeira ou pedra, em formato circular ou hexagonal,
com balcõ es e galerias. Na Itá lia, a commedia dell’arte exerceu papel importante no teatro
itinerante que teve início no século XV com características de um teatro popular apresentado
nas ruas e praças pú blicas, em carroças ou em pequenos palcos improvisados.

Na virada do século XV para o século XVI, nasce um novo modelo de espaço teatral: o
palco italiano. Evoluçõ es cênicas permitem a mobilidade de cená rios, portanto maior
versatilidade nas apresentaçõ es. Neste novo espaço cênico a boca de cena é arredonda e há
luzes na ribalta. Mais uma inovaçã o: uma cortina esconde o cená rio. Telõ es pintados agregam
perspectiva e sã o manipulados por mecanismos pró prios. Plateia e camarotes estã o dispostos
em forma de ferradura. Abandona-se a luz à vela. Vem o gá s e, entã o, a energia elétrica.

Na Rú ssia, a busca por novas concepçõ es arquitetô nicas teatrais é parte do espaço
cênico realista. Há melhores condiçõ es visuais e acú sticas e os cená rios realistas aproximam o
pú blico da encenaçã o, e a encenaçã o da vida.

Apoiando-se ao conceito de teatro clá ssico e tradicional, o dramaturgo alemã o Bertold


Brecht (1898-1956) propõ e um teatro narrativo que leva o espectador a refletir com atitude
crítica. Espaço e tempo sã o indeterminados. A peça acontece no palco, na plateia, no corredor,
na rua... Em sua pró pria companhia teatral, o Berliner Ensemble, nã o se faz necessá rio haver
coxias. Os equipamentos técnicos estã o à mostra, e os elementos cenográ ficos sã o poucos e
têm uma funçã o específica que nã o é apenas decorativa.

Na segunda metade do século XX o Brasil vive o regime militar e ouve-se também pelo
teatro as vozes de protesto contra esse sistema de governo. Formam-se teatros em espaços
populares, teatros de rua, se apresentando em locais abandonados ou nã o utilizados pela
sociedade. Em espaços como esses, busca-se a maior interaçã o e identificaçã o com o pú blico.
Destacam-se o Teatro Oficina, no bairro do Bixiga, em Sã o Paulo; o Grupo Balcã o, nas ruas de
Belo Horizonte; e o Teatro da Vertigem, que intriga com as locaçõ es inusitadas de seus
espetá culos.

Na arte contemporâ nea, os espaços cênicos sã o os mais variados e as escolhas


dependem do projeto, da poética e da intençã o de cada grupo de teatro.

Jean-Pierre Lescourret/Getty Images

Maior anfiteatro do mundo, o Coliseu de Roma tinha capacidade para 45 mil pessoas.
Pá gina 236

Um lugar para se ver


Teatro é a arte em que um ator, ou conjunto de atores, interpreta uma histó ria cujo
objetivo é apresentar uma situaçã o e despertar sentimentos, sensaçõ es e reflexõ es no pú blico.
Que sentimentos seriam esses? Os mais variados possíveis. Na comédia, o teatro nos faz rir. Na
tragédia, nos faz entrar em contato com dramas humanos profundos.

Em geral, o teatro está ligado a uma narrativa, a uma histó ria com começo, meio e fim.
Como a arte de contar histó rias por meio da açã o e do diá logo, o teatro tem uma extensa
histó ria na produçã o cultural da humanidade.

Um espetá culo de teatro pode originar-se de um texto em forma de monó logo, diá logo
ou musical, e é interpretado por um ator ou por um elenco de atores. Além do texto, dos atores
e da equipe de montagem (que envolve profissionais de direçã o, figurinos, maquiagem,
iluminaçã o, sonoplastia, cenografia, maquinaria etc.), para o espetá culo acontecer é primordial
a presença do pú blico. É para ele que tudo isso é criado. É a plateia que vai receber toda a
informaçã o e a beleza do espetá culo.

A palavra teatro vem do grego théatron, que significa “lugar aonde se vai para ver”. O
teatro era um importante meio de educar os cidadã os que iam fazer as escolhas políticas que
determinariam o futuro da cidade. Assim, ele nasceu também ligado à política. Alguns
estudiosos apontam a origem do teatro ligada aos rituais sagrados dedicados ao deus grego
Dionísio, considerado, por isso, o protetor do teatro e dos atores.

No Brasil, o teatro teve início na época da colonizaçã o, organizado pelos padres jesuítas.
Eles usavam as encenaçõ es para catequizar os indígenas. Nelas misturavam aspectos da vida
local com o evangelho e a vida dos santos.

A Comédia e a Tragédia desencadearam, ao longo dos tempos, muitos gêneros e


concepçõ es teatrais. Cada gênero tem sua pró pria maneira de ser e de se expressar.

A forma da comédia
No início do século XVI surge uma forma popular de teatro na Itá lia, denominada de
commedia dell’arte (comédia de arte), também chamada de commedia all’improviso (comédia
do improviso). Usada como linguagem cênica em algumas montagens teatrais até hoje, trata-se
de uma forma de se fazer teatro que exige muita habilidade e agilidade do ator ou atriz para
improvisar, tornando-se uma arte burlesca e fundamentada na inspiraçã o do momento.

No período de origem, era considerada uma arte profana, na qual os artistas nã o


estavam presos a temas religiosos impostos pela Igreja. Por essa razã o, foi alvo de muitas
críticas e proibiçõ es por parte dos religiosos. Suas apresentaçõ es eram feitas pelas ruas e
praças pú blicas, em carroças que viravam palcos improvisados.

As companhias da commedia dell’arte, por serem itinerantes, ao chegarem em uma


cidade, pediam permissã o à s autoridades locais para se apresentarem. Geralmente, as
companhias eram formadas tradicionalmente por famílias de artistas, e um ator ou atriz
representava os mesmos personagens por toda sua vida, uma vez que a estrutura da commedia
dell’arte trabalhava com personagens de características fixas, mas que reagem conforme a
situaçã o improvisada.

As apresentaçõ es seguiam um roteiro, chamado de canovaccio. Os diá logos da peça eram


criados pelos atores, durante a encenaçã o, de forma improvisada. Muitas vezes, essas falas
traziam questõ es locais, inspirando-se em situaçõ es baseadas em relaçõ es de patrõ es com seus
empregados, em amores proibidos e personagens da sociedade da época, nos quais a plateia
reconhecia essas questõ es e podiam refletir sobre elas. Todavia, a commedia dell’arte

Canovaccio: expressõ es e diá logos que marcam os momentos e o ritmo, geralmente cô micos, da peça teatral dentro
do gênero da commedia dell´arte.
Pá gina 237

tinha como funçã o principal divertir o povo. Quando os comediantes agradavam, os


espectadores retribuíam e pagavam mais, uma vez que o pagamento era uma contribuiçã o
espontâ nea dada pela plateia. Na pintura acima, podemos observar uma representaçã o de um
grupo da commedia dell’arte se apresentando.

Os personagens mais característicos e conhecidos da commedia dell’arte sã o:

• Arlequim (criado fofoqueiro muito esperto e acrobata);

• Brighella (trapaceiro de pouca moral e desmerecedor de confiança);

• Pantalone (velho muito rico e muito avarento);

• Il Capitano (soldado farrista, covarde e mentiroso);

• Scaramouche (contador de mentiras muito covarde, usa uma má scara de veludo


negro);

• Doutor (velho rico e falador);

• Colombina (bela e inteligente, esperta, irô nica e fofoqueira, par do Arlequim).

Esses personagens eram fixos. A estrutura de cada um seguia o roteiro, mas os atores e
atrizes possuíam liberdade total de improvisaçã o das falas, açõ es e reaçõ es.

A má scara é um importante elemento dessa forma de se fazer teatro. Além dos figurinos,
era o adereço característico e marcante de um personagem da commedia dell’arte, pois
compunha e caracterizava os personagens apresentados nos roteiros. Geralmente, era o
pró prio ator que confeccionava sua má scara.
French School. c. 1580. Ó leo sobre painel. Museu Carnavelet, Paris, França.

The Commedia dell’Arte Company, obra anônima, c. 1580. Óleo sobre painel, 95 m × 147 m.
Pá gina 238

Giro de ideias: A catarse


Quem já não ouviu a célebre frase:

“Ser ou nã o ser, eis a questã o!”?

Na imagem ao lado, a representaçã o do personagem Hamlet, do texto dramá tico escrito


pelo inglês William Shakespeare (1564-1616), é criada na pintura Hamlet e Horá cio com os
dois rú sticos (1839), do pintor francês Eugène Delacroix (1798-1863). Na peça Hamlet, escrita
entre 1599 e 1601, o protagonista, príncipe Hamlet, vive as contradiçõ es da alma humana
entre ser bom, ruim, justo ou cruel. Dilemas também vividos por muitas pessoas, razã o de a
peça continuar atual e ser montada em todo o mundo até hoje e ter vá rias adaptaçõ es para o
cinema.

O teatro na Grécia antiga já era considerado arte fundamental na educaçã o das pessoas.
Para o filó sofo Aristó teles (384 a.C.-322 a.C.), a atuaçã o de um ator na interpretaçã o de um
texto dramá tico pode provocar catarse. É como viver as emoçõ es dos personagens ao assistir a
uma peça teatral ou a um filme. Esse tipo de experiência, segundo Aristó teles, podia levar o
pú blico a refletir sobre suas pró prias vidas, emoçõ es e desejos.

Catarse: nome dado pelos gregos antigos para se referir a uma experiê ncia em sentimentos e emoçõ es vivida pelo
pú blico ao assistir a uma peça teatral. O pú blico pode se identificar com as situaçõ es vividas pelos personagens do texto no
teatro, cinema, televisã o, texto literá rio e outras linguagens e refletir sobre sua pró pria vida.

Eugène Delacroix. 1839. Ó leo sobre tela. Museu do Louvre, Paris

Hamlet e Horácio com os dois rústicos, de Eugène Delacroix, 1839. Óleo sobre tela, 81,5 cm × 65,5 cm.
Você já viveu uma catarse ao assistir a uma peça de teatro ou a um filme? Se a sua
resposta for sim, descreva o que você sentiu.

Quem era o personagem com o qual você se identificou?

Para ampliar seus estudos sobre os gestos e as artes cênicas, faça uma pesquisa em
livros, revistas ou na internet sobre outras formas expressivas de teatro, como:

• teatro de formas animadas (sombra, fantoches, bonecos...)

• performances (dança, teatro...)

• monó logo ou diá logo

Que tal combinar com seus colegas e professor a montagem de uma peça teatral
escolhendo uma dessas formas?
Pá gina 239

Conexõ es Arte e Histó ria


Os autos: ontem e hoje
Na linguagem teatral da Idade Média, a temá tica predominante era a religiosa. Temas nã o
religiosos também eram abordados, mas ficaram conhecidos como teatro profano.

Sabemos que o teatro já existia desde a Antiguidade, mas desenvolveu-se e aprimorou suas
técnicas com o surgimento dos primeiros dramas litú rgicos e dos textos teatrais inspirados na
Bíblia.

Os dramas litú rgicos eram apresentados inicialmente durante as missas. Depois, o pú blico
teatral aumentou e as apresentaçõ es passaram a ser feitas fora das igrejas.

A freira Rosvita (c. 935-c. 973), de Gandersheim, territó rio germâ nico, foi uma das primeiras
dramaturgas da Europa e escreveu seis peças. Ela reelaborou a dramaturgia clá ssica e abordou
temas edificantes escritos em latim.

A partir do século XII, o teatro deixa de ficar restrito à s igrejas e vai para a cidade, por
iniciativa das confrarias (irmandades laicas ou religiosas) e dos saltimbancos, companhias teatrais
do final da Idade Média que escrevem as peças e as apresentam. Nesse momento, convivem textos
profanos e sacros. O teatro profano, apresentado nas festas de Carnaval, cria o gênero teatral das
farsas e do burlesco.

Na Espanha, por volta do século XII, surgem os autos, que podem ser religiosos ou profanos,
sérios ou cô micos, mas possuem um sentido moralizador.

As procissõ es na Idade Média eram chamadas de laudes e reuniam pessoas que caminhavam
cantando, declamando e representando assuntos de temá tica religiosa. Para conferir mais realismo
à s encenaçõ es de cunho religioso, foram criadas as chamadas mansõ es.

Mansões: espaços cê nicos, comuns na Idade Mé dia, construído para abrigar apresentaçõ es dos atos religiosos.

Até chegar a esses espaços, o pú blico caminhava com os atores e havia a presença de um
diretor de cena, que ditava o ritmo do espetá culo. Muitas vezes, o pú blico também participava do
ato dramá tico, como figurante.

Essas formas de fazer teatro ou fazer grandes festas para as encenaçõ es, permanecem até os
dias de hoje. Como exemplo, temos as festas do Círio de Nazaré na cidade de Belém do Pará . De
cunho religioso, o evento reú ne milhõ es de pessoas que participam de autos e procissõ es.

O Auto do Círio é um evento de rua, realizado pela Escola de Teatro e Dança da Universidade
Federal do Pará (UFPA), que está inserido na programaçã o do Círio de Nossa Senhora de Nazaré.
Une artistas,
Pá gina 240

pesquisadores e a populaçã o em geral, formando um dos maiores cortejos dramá ticos


realizados no mundo. O cortejo realizado pelas ruas do bairro Cidade Velha, em Belém, no Pará , une
o erudito e o popular em um espetá culo que foi considerado pelo Iphan como bem imaterial,
juntamente com a festa do Círio de Nazaré.

Procure mais informaçõ es sobre os autos. Em sua cidade existem eventos ou festas
populares que exploram o gênero? Você já assistiu ou leu peças em forma de autos?

Autores como o português Gil Vicente (1465-1537) e o brasileiro Ariano Suassuna (1927-
2014) dominaram a arte de escrever autos.

Pesquise sobre a obra de Gil Vicente ou Ariano Suassuna, ou ainda outro autor que trabalhe
com o gênero auto, e escolha uma obra. Você e seus amigos podem montar uma peça ou encenar um
trecho dessa obra.

Para começar, leiam a peça em forma de leitura dramá tica.

Organizem o grupo e combinem quem fará cada personagem. Apó s essa definiçã o, a leitura
pode começar.

Cada um deve ler a fala do seu personagem dando impostaçã o à voz, enfatizando olhares e
gestos, procurando interpretar e nã o apenas ler.

Quem assistir à leitura dramá tica deve ter noçã o do que está acontecendo na histó ria. Assim,
combine com seus amigos e capriche nessa leitura dramá tica.

Mauricio Lima/AFP

Performance durante o Círio de Nazaré, em Belém (PA). Foto de 2008.


Pá gina 241

Dramaturgias da luz e do gesto


Na linguagem teatral, independentemente do significado da palavra dita, é o conjunto de
sua pronú ncia, do volume e da entonaçã o em determinado contexto que influenciará os
significados dos diá logos. O corpo, por meio da exploraçã o da voz e do gesto, é como a pá gina
de um livro (ambos como suportes), em que as palavras sã o escritas e reescritas pelos atores e
espectadores, pelo sentido atribuído e pela expressã o vivida. As palavras podem nã o existir
oralmente, mas estar contidas nos gestos.

Cena do Espetáculo Saudades em terras d’água. Cia de Teatro Dos à Deux. Foto: Xavier Cantat

Cena da peça Saudades em terras d’água, da Cia. Dos à Deux, 2005. A iluminação em tons de azul mostra o momento em que
o personagem está em alto-mar.

No espetá culo Saudades em terras d’á gua (2005), os atores da Cia. Dos à Deux, grupo de
teatro franco-brasileiro criado em 1997, (observe a cena ao lado) contam uma histó ria sem
verbalizaçã o de palavras, mas, mesmo assim, as palavras ressoam no silêncio das emoçõ es e
dos gestos. A iluminaçã o dá o tom e mostra a quem assiste os momentos e lugares em que se
passa a histó ria. Há momentos em que ela ocorre no litoral, perto da á gua, e sã o usadas luzes
em cores azuis e tons frios e refrescantes. Em outras cenas do espetá culo, quando a histó ria se
passa em terras secas, a iluminaçã o projeta cores em tons de vermelho, amarelo, laranja e
marrom, tons quentes e dramá ticos. Observe abaixo a imagem que retrata uma cena com essas
características.

Em obras nas quais prevalece o teatro gestual, os atores não utilizam a opçã o de
verbalizar o texto, que é expresso por meio de gestos, enfatizando as linguagens visual e
sonora. Os movimentos e gestos “lapidados”, as coreografias detalhadas e cuidadosas e a
iluminaçã o poética compõ em esse tipo de espetá culo, que une forma e conteú do cunhados em
gestos, cores e sons.
Cena do Espetáculo Saudades em terras d’água. Cia de Teatro Dos à Deux. Foto: Xavier Cantat

Cena da peça Saudades em terras d’água, da Cia. Dos à Deux, 2005. Em relação à imagem anterior, a iluminação muda para
indicar a terra que seca, trabalhando tons de vermelho e amarelo.
Pá gina 242

Conexõ es Arte e Literatura


Caminhante
Há produçõ es em que atores ou dançarinos utilizam textos como referência ou foco. Nesses
casos, o texto pode ser dito tanto por meio de palavras como de gestos. O teatro gestual é uma
modalidade cênica caracterizada pelo menor uso possível de palavras e o maior uso de gestos. É a
arte de narrar com o corpo.

Poemas curtos podem nos ajudar a criar gestos nas artes cênicas. Existem também outras
possibilidades, como a criaçã o de uma sequência coreográ fica com base nos trajetos que você faz
todos os dias.

Usando apenas linhas, faça desenhos mostrando como é o trajeto de sua casa até a escola. Do
ponto de partida até a chegada.

Agora, vamos representar esse trajeto por meio de gestos. Na sala de aula, escolha os pontos
de saída e de chegada. Olhando para o desenho traçado com as linhas, siga o trajeto, imaginando
que a sala de aula é o caminho que você faz todos os dias. Ao andar pela sala, olhe para algum colega
e faça algum tipo de cumprimento, porém sem palavras, apenas com gestos. Essa etapa da atividade
acaba quando você chegar ao ponto final. O mesmo vale para os colegas que estã o participando
desse aquecimento.

Agora, faça novamente o mesmo percurso, usando o desenho com as linhas que marcam seu
trajeto, mas, dessa vez, com uma mú sica de fundo. Durante o trajeto, explore nã o apenas o plano do
solo no andar, mas dê saltos, gire, se movimente em laterais com os braços e pernas, enfim, amplie
as possibilidades de movimentos e gestos expressivos ao caminhar.

Esse tipo de atividade tem o objetivo de proporcionar o conhecimento do que seu corpo pode
fazer.

Agora, vamos voltar ao poema. Crie com os colegas uma sequência coreográ fica, expressando
com o corpo, por meio de gestos, a interpretaçã o de um poema curto. Nã o há regras
preestabelecidas, vale a criaçã o na linguagem do teatro gestual.

Projeto experimental
Teatro de sombras
Você sabia que o teatro de sombras é uma arte muito antiga?

Há relatos de que seja proveniente da China. Inicialmente, os artistas trabalhavam sob a luz
do Sol para criar os contrastes de luz e sombras. Depois, os chineses começaram a usar velas, acesas
ao cair da noite, por trá s da cortina, e assim criaram um mundo lú dico e má gico por séculos e
séculos. Essa arte se espalhou por todo o mundo e ainda é muito praticada, tanto no teatro como na
dança, como recurso cênico com efeitos de iluminaçã o.
Zeng Nian/Corbis/Latinstock

Exemplo de teatro de sombra chinês. Foto de 2005.

Processos de criaçã o

Vamos criar um teatro de sombras?

Aproveite para reciclar chapas de acetato (como as usadas em radiografias), caixas de


papelã o, ou use cartolina preta para fazer as silhuetas. Primeiramente, com os colegas, planejem
quais serã o os personagens, os movimentos e os diá logos (se houver, porque o teatro pode ser
apenas de movimentaçã o e gestos). Pensem também nos sons e na trilha sonora para sua peça de
teatro de sombras.

É importante estudar os detalhes das figuras. Faça esboços para estudar as formas e os
pontos vazados na figura. Recorte com cuidado a silhueta dos personagens. Os detalhes podem criar
efeitos incríveis.
Pá gina 243

TEMA 4 OS PARÂMETROS DO
SOM
"A poesia é a emoçã o expressa em ritmo através do pensamento, como a
mú sica é essa mesma expressã o, mas direta, sem o intermédio da ideia."

PESSOA, Fernando. Páginas íntimas e de autointerpretação. Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e
Jacinto do Prado Coelho. Lisboa: Á tica, 1966.

Assim como as linguagens das artes visuais e cênicas, a mú sica também tem seus
pró prios có digos. As cores luz sã o ondas eletromagnéticas que podem viajar no vá cuo, já as
ondas sonoras precisam de matéria para se mover. Ou seja, não há som no vá cuo. Tanto cores
como sons podem ser medidos em frequências. Essas frequências vã o de infrassons a
ultrassons e sã o medidas em hertz (Hz).

As ondas sonoras sempre vã o precisar de uma fonte e vã o durar no paço tempo. Assim, o
tempo e o espaço sã o suportes para a mú sica. As ondas sonoras percorrem tempo e espaço de
duas formas: em frequências regulares (som constante e ordenado, como as notas de um
instrumento) e frequências irregulares (sem ordem e indeterminada, como os ruídos).

O som é produzido pela vibraçã o de algum objeto. Um exemplo é a vibraçã o da corda de


um violã o. A vibraçã o gera ondas que sã o transmitidas pelo ar ou qualquer outro meio de
conduçã o. Ao chegar aos nossos ouvidos, essas ondas transportam a informaçã o para o
cérebro que, por sua vez, identifica o som de vá rias formas, entre as quais, como uma vibraçã o
regular (que tem altura definida, produzida, por exemplo, por um instrumento musical como
violã o, flauta, entre outros) e como uma vibraçã o regular (que nã o tem altura definida,
identificada como chiado ou barulho, por exemplo, o som de um vidro quebrando ou muitas
pessoas conversando ao mesmo tempo).

Os gregos antigos diziam que os sons de instrumentos como a lira e a flauta eram
capazes de provocar a sintonia entre seres humanos e deuses. Observe ao lado a imagem do
deus Apolo tocando lira. Trata-se de sons em harmonias, sons regulares. Harmonia, na mú sica,
tem dois sentidos: pode ser a junçã o de duas ou mais notas tocadas simultaneamente (o que
produz o acorde) ou a sequência de acordes que sã o encadeados.
Má rmore. Ny Carlsberg Glyptotek, Copenhagen. Foto: Prisma Archivo/Alamy/Glow Images

Apolo, divindade olímpica greco-romana. Era imperial. Escultura em mármore, 2,5 m de altura. Foto de 2012.

A mú sica pode ser entendida como a intençã o de organizar materiais sonoros, tais como
melodia, ritmo, harmonia, ruídos. Esses materiais podem ser organizados uma ú nica vez ou
combinados de diversas maneiras, por exemplo, melodia e ritmo ou harmonia e melodia.

Os parâ metros do som sã o as características presentes em todas as sonoridades


existentes. Sã o eles: altura, duraçã o, timbre, intensidade e densidade.

Ao classificarmos o som como grave ou agudo, estamos falando sobre a altura. Essa
classificaçã o depende da frequência da vibraçã o do som por segundo, ou seja, os sons agudos
têm mais vibraçõ es por segundo do que os sons mais graves.

O hertz (Hz) é a unidade usada para medir a frequência de vibraçõ es e ondas, como já
vimos acima, e 1 hertz é a referência de um ciclo por segundo. Por meio das frequências é
possível identificar as notas musicais. Por exemplo, a frequência da nota Dó central do piano é
de 261,6 Hz, a nota Lá tocada na quinta corda solta do violã o ou guitarra é de 110 Hz.
Pá gina 244

Veja na partitura representada abaixo como as notas graves e agudas ficam dispostas.

Tarumã

Em uma partitura tradicional as notas graves ficam na parte de baixo e as agudas em cima.

A duraçã o refere-se ao tempo de ressonâ ncia de um som que pode ser curto ou longo.
Quando um sino é tocado tem um som de longa duraçã o, mas se tocarmos uma madeira com
outra temos um som curto.

O timbre é a característica que diferencia cada som, possibilitando, dessa forma,


identificar sua origem. Quando ouvimos um instrumento em uma gravaçã o é possível
identificá -lo apenas pelo som, sem precisarmos vê-lo. O violã o tem um som (timbre)
característico que o difere do som de uma flauta, pandeiro, saxofone etc.

A intensidade é o volume do som que é produzido, pode ser forte ou fraco, dependendo
do ataque, ou seja, a força aplicada para gerar um som. Já a densidade se refere à quantidade
de sons produzidos ao mesmo tempo. Uma orquestra, por exemplo, tocando com 80
instrumentos ao mesmo tempo tem uma densidade maior do que um som produzido por um
ú nico instrumento.

A mú sica se encontra no nú cleo de todas as culturas, e em cada uma explora formas e


conteú dos de modos bem particulares.

O silêncio pode ser compreendido como um elemento na arte contemporâ nea. John Cage
(1912-1992), compositor, escritor e teó rico musical estadunidense, chocou o pú blico ao
propor o silêncio como elemento expressivo da peça musical 4’33”, composta em 1952. Em
sua carreira, esse mú sico explorou sons, investigou possibilidades expressivas de elementos de
linguagem e materialidades. Na apresentaçã o da obra 4’33”, durante 4 minutos e 33 segundos
a orquestra de mú sicos se manteve em silêncio. Sons e ruídos ecoaram pelo espaço da sala de
concerto, mas nenhuma nota foi emitida. Essa obra mostra que o silêncio absoluto não existe,
porque estamos sempre cercados de sons ora regulares, ora irregulares, separada ou
simultaneamente.

DICA
Para assistir
Algumas das pesquisas de John Cage foram filmadas ou gravadas, permitindo acesso do pú blico ao
percurso criativo desse artista. Assista a um trecho da peça 4’33”, que está disponível em:
<http://tub.im/dgrugp> (acesso em: 27 fev. 2016).

Ouvindo vozes
Em obras contemporâ neas, as linguagens se misturam. À s vezes, o mesmo elemento de
linguagem pode fazer parte da composiçã o dessas obras. Quando temos duas medidas
(dimensõ es), comprimento e largura, dizemos que algo é bidimensional. Já para o conceito de
tridimensional, temos como base três medidas (dimensõ es): comprimento, largura e
profundidade. A tridimensionalidade, por exemplo, é uma das características de como as
formas de uma escultura sã o apresentadas em um espaço. Em imagens, podemos conseguir
efeitos de tridimensionalidade também explorando e articulando cores, texturas, pontos,
linhas, direçõ es, posiçõ es e contrastes, entre outras possibilidades. A mú sica se propaga no ar,
espaço tridimensional, assim como os bailarinos e atores se movem nesses lugares, que
chamamos de espaços cênicos.
Pá gina 245

Em vá rias obras contemporâ neas, temos as instalaçõ es, que sã o tridimensionais.


Adentramos esse espaço e percebemos todo o seu comprimento, largura e profundidade.
Podemos ir a uma apresentaçã o de coral, por exemplo, e nã o encontrar nenhum cantor ou
cantora, apenas a ressonâ ncia de suas vozes no espaço tridimensional. Observe o exemplo ao
lado.

A obra Acusma (2008) aborda a relaçã o entre as linguagens e seus elementos. Trata-se
de uma instalaçã o com vasos de cerâ mica, alto-falantes e sistema de som ligados em canais de
frequência (os fios que ligam os alto-falantes também sã o usados como material artístico da
instalaçã o). A obra foi criada pelo grupo Chelpa Ferro (composto pelos artistas Jorge Barrã o,
Luiz Zerbini e Sergio Mekler em 1995) para ocupar o espaço do Museu de Arte da Pampulha,
em Belo Horizonte, Minas Gerais.

A palavra acusma, de origem grega (ákousma), com significado de ato, assume o sentido
de “alucinaçã o auditiva em que se ouvem vozes, instrumentos musicais, rumores e outros
sons” (Fonte: iDicioná rio Aulete. Disponível em: <http://aulete.com.br/acusma>. Acesso em:
17 abr. 2016.). O grupo Chelpa Ferro tem pesquisado e criado instalaçõ es tirando proveito de
materialidades para estabelecer diá logos entre as artes visuais e a mú sica, como em Acusma,
uma arte híbrida em que as linguagens tradicionais e contemporâ neas se entrelaçam entre fios
e vasos. Estar nessa sala permite-nos ouvir as vozes em solfejos, por meio de materialidades do
passado (cerâ mica, arte do fogo) e do presente (mú sica eletrô nica, arte da tecnologia) que se
encontram, formando simbiose entre culturas. Uma das propostas dessa instalaçã o é romper
as fronteiras entre mundo visual e sonoro. Observe que tanto a cerâ mica quanto a mú sica sã o
tridimensionais.

Barrão, Luiz Zerbini e Sergio Mekler. 2008. Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte

Acusma, de Chelpa Ferro, 2008. Instalação do grupo criado pelos artistas plásticos Jorge Barrão, Luiz Zerbini e Sergio
Mekler. Exposição no Museu de Arte da Pampulha, Belo Horizonte (MG).

A arte de CHELPA FERRO


O grupo Chelpa Ferro é um grupo multimídia carioca formado pelos artistas Luiz
Zerbini, Jorge Barrã o e Sergio Mekler que apresenta trabalhos em diversos formatos:
instalaçõ es sonoras, vídeos, apresentaçõ es em palcos e discos inovadores, utilizando os
instrumentos musicais de forma não convencional.

As experimentaçõ es feitas com a composiçã o imagética é a marca registrada do trio. As


suas obras musicais flertam com as artes visuais e produzem uma arte híbrida e inovadora.

Como vimos anteriormente, a obra Acusma, montada em forma de instalaçã o, apresenta


uma espécie de mú sica matemá tica, em que nú meros sã o cantados por 30 vozes que saem de
dentro de vasos espalhados pelo chã o do museu. Uma escultura para ser vista e ouvida.

Palavra do artista

“O trabalho deve existir por ele mesmo. Deve falar por si mesmo.”

Sergio Mekler

MARTÍ, Silas. Chelpa Ferro retorna em filme e instalação. 26 nov. 2009. Disponível em:
<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/acontece/ac2611200902.htm>. Acesso em: 27 fev. 2016.

Leandro Moraes/Folhapress

Os artistas Sergio Mekler, Jorge Barrão e Luiz Zerbini, do grupo Chelpa Ferro, na instalação Sonorama, no Centro Cultural
Banco do Brasil. Foto de 2008.
Pá gina 246

Ofício da arte

Técnico(a) de gravação

O técnico de gravaçã o é o profissional responsá vel pela captaçã o do á udio falado,


cantado, tocado ou, até mesmo, das sonoridades ambientes. Na maioria das vezes, também é a
pessoa responsá vel pela mixagem (processo de juntar tudo que foi gravado em diversos canais
para consolidaçã o do produto final).

É importante que este profissional tenha um bom conhecimento dos equipamentos de


á udio como microfones, mesa de som, equalizadores, compressores, amplificadores etc. Além
de dominar programas de gravaçã o e ediçã o e a produçã o de efeitos. Seu trabalho pode ser
realizado em estú dios de gravaçã o, em shows, espetá culos, instalaçõ es e eventos, programas
de rá dio e TV.

Giro de ideias: Dimensõ es de sons


Feche os olhos por um minuto e atente para os sons que estã o perto e aqueles que estã o
longe. Como você percebe a tridimensionalidade do som?

O que é mú sica para você e para seus colegas? Bata um papo com a turma sobre o
sentido da mú sica na vida de vocês.

Música para ouvir

"[...]
Mú sica para pular carnaval
Mú sica para esquecer de si
Mú sica pra boi dormir
Mú sica para tocar na parada
Mú sica pra dar risada
[...]"

ANTUNES, Arnaldo; SCANDURRA, Edgard. Mú sica para ouvir. Inté rprete: Arnaldo Antunes. In: Um som. Rio de Janeiro: BMG,
1998. CD. Faixa 1.

Depois registre aqui a sua opiniã o e a dos colegas.


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Conexõ es Arte, mitologia e Literatura


A ó pera
Durante o Barroco, grandes teatros para concertos musicais foram criados, e a vida cultural
ganhou visibilidade. A mú sica instrumental passou a ter a mesma importância da mú sica vocal.

Nesse período, Claudio Monteverdi (1567-1643) compô s a ó pera L’Orfeu (1607), uma obra
com quase duas horas de mú sica, encenada com cená rios deslumbrantes. Na Grécia antiga, as
linguagens artísticas do teatro, mú sica e dança nã o eram separadas de forma rígida como ocorreu
em outros períodos. A ó pera volta a unir essas três linguagens, além de fortalecer as artes visuais na
criaçã o de cená rios ricos em formas e cores.

Segundo a mitologia grega, Orfeu era um semideus, seu canto era muito poderoso e capaz de
encantar a natureza, os seres vivos e também os seres divinos.

Acreditando no poder do seu canto, Orfeu, acompanhado de sua lira, vai em busca de sua
esposa Eurídice no Inferno, de onde nenhum outro humano conseguiu retornar. A mú sica de Orfeu
consegue encantar todos os seres sombrios e, até mesmo, os reis do Inferno (Hades e Perséfone), e
ele atinge o seu objetivo de resgatar Eurídice. Porém, uma condiçã o havia sido imposta pelos reis: a
de que Orfeu só poderia olhar para sua esposa quando os dois tivessem saído do mundo dos
mortos. Quando estavam prestes a voltar ao mundo dos vivos, Orfeu olha para trá s para certificar-
se de que Eurídice o seguia e, assim, perde a sua amada para sempre nos abismos do Inferno.

Monteverdi revisitou o mito de Orfeu e acreditou no poder do texto combinado à mú sica;


desta forma, a mú sica na ó pera L´Orfeu nã o estava subordinada ao texto, mas o reforça e faz com
que as emoçõ es humanas sejam experimentadas de forma intensa, no todo artístico e nã o só na
beleza das palavras recitadas.

A ó pera L´Orfeu é considerada a primeira obra que foi além da poesia lírica musicada,
marcando o início da escrita da ó pera da forma como conhecemos nos dias atuais. Observe uma
cena dessa ó pera logo abaixo.
Robbie Jack/Corbis/Latinstock

Apresentação contemporânea da ópera L’Orfeu, de Monteverdi.


Pá gina 248

Da ó pera ao teatro
Muito anos depois, o mito de Orfeu ganhou uma releitura em forma de peça musical
idealizada e escrita por Vinicius de Moraes, chamada Orfeu da Conceiçã o (Tragédia carioca em três
atos). A histó ria é ambientada no Rio de Janeiro, os personagens sã o negros e moradores da favela,
mas o final trá gico do casal Orfeu e Eurídice permanece.

O espetá culo estreou no Teatro Municipal do Rio de Janeiro em setembro de 1956 e marcou
o encontro de grandes nomes das artes brasileiras, como Tom Jobim, que musicou todo o
espetá culo, e Oscar Niemeyer, que ficou responsá vel pela criaçã o dos cená rios.

Leia um trecho dessa peça e observe um cartaz que serviu para divulgar a peça naquela
época.

ORFEU DA CONCEIÇÃO

Tragédia carioca em três atos

“[...] Sã o demais os perigos desta vida


Para quem tem paixã o, principalmente
Quando uma lua surge de repente
E se deixa no céu, como esquecida.
E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma mú sica qualquer
Aí entã o é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher.
Deve andar perto uma mulher que é feita
De mú sica, luar e sentimento
E que a vida nã o quer, de tã o perfeita.
Uma mulher que é como a pró pria Lua:
Tã o linda que só espalha sofrimento
Tã o cheia de pudor que vive nua. [...]”

MORAES, Vinicius de. Orfeu da Conceição: tragé dia brasileira em trê s atos. Disponível em:
<http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/teatro/pecas/orfeu-daconceicao>. Acesso em: 29 fev. 2016.
Orfeu da Conceição. Odeon. 1956

Capa do CD da peça musical Orfeu da Conceição, 1956, com músicas de Tom Jobim.

DICA
Para navegar

Para ampliar seu repertó rio e compreensã o global da peça musical de Vinicius de Moraes Orfeu da
Conceição, navegue por este site: <http://tub.im/fu7c5f> (acesso em: 17 abr. 2016).
Pá gina 249

Projeto experimental Mú sica


O que é um som para você e seus colegas?

Vocês percebem os parâ metros do som no dia a dia?

Conseguem prestar atençã o à altura, à duraçã o, à intensidade, ao timbre e à densidade dos


sons?

Vamos ouvir! Escolha uma mú sica instrumental.

Observe: duraçã o das notas, intensidade dos sons, energia que o mú sico coloca ao tocar o
instrumento (ataque) etc.

Você consegue identificar os diferentes sons produzidos por materialidades como madeira,
couro, metais, cordas, entre outros?

Qual é a sua percepçã o dos sons agudos e graves?

E em relaçã o ao conjunto? Há um ou mais instrumentos? O que você observou?

Agora, percebam outro aspecto: o som é regular ou irregular?

O artista visual, poeta, compositor, mú sico e cantor Arnaldo Antunes, em sua mú sica Um
som, composta em parceria com o mú sico, cantor e compositor paulista Paulo Tatit (1951-), fala
sobre a percepçã o do som.

Um som

"[...]
é só
um som
a dor de ser alguém
de longe longe vem
[...]"

ANTUNES, Arnaldo; TATIT, Paulo. Um som. Inté rprete: Arnaldo Antunes. In: Um som. Rio de Janeiro: BMG, 1998.
CD. Faixa 17. Disponível em: <http://www.arnaldoantunes.com.br/new/sec_discografia_list.php.> Acesso em: 19
maio 2016.

A mú sica é formada por sons organizados no tempo e pode apresentar estilos diferentes, de
acordo com épocas, regiõ es, instrumentos, culturas e compositores.

Para compreender como a mú sica seguiu seu curso através dos tempos, pesquise mú sicas de
diferentes culturas e épocas.

Que tal você e os colegas também se aventurarem em criar usando as qualidades e


parâ metros sonoros da mú sica? Arrisquem-se e inventem.
DICA
Para navegar

Para saber mais sobre a vida e a obra do mú sico e compositor Paulo Tatit, visite o site:
<http://tub.im/bv2p8g> (acesso em: 19 abr. 2016).
Pá gina 250

TEATRO: FORMA DE EXPRESSÃ O ARTÍSTICA

Os primeiros teatros gregos datam dos séculos VII eVl a.C. Essas construçõ es surgiram para
receber os ritos de DIONISO (deus dosciclos vitais, da alegria e do vinho, na mitologia grega),
relacionados, principalmente, a comemoraçã o das colheitas de uva para produçã o de vinho. As
apresentaçoes teatrais eram pú blicas e tinham um cará ter mais religioso do que artistico. Com o
passar do tempo, as comemoraçõ es ritualisticas dionisíacas foram se transformando, e o fteatro
grego se desenvolveu como forma de expressã o artística.

Teatro de Epidauro, localizado no sítio arqueoló gico do Santuá rio de Asclépio, na regiã o do
Peloponeso, Grécia.

OS ATORES E O CORO

Pintura localizada sobre uma cratera grega (século IV a.C.). A imagem encontra-se no Museu
arqueoló gico nacional, Ná poles, Itá lia, e retrata um ator segurando uma má scara e vestindo o
figurino.

Téspis (século Vl a.C.) é considerado o criador do oficio de ator. Ele vestiu uma tú nica e usou
uma má scara para interpretar o deus Dioníso, criando assim a arte da dramaturgia. Conta-se que
ele viajou pela Grécia com uma trupe, apresentando-se em cima de uma carroça, que ficou
conhecida como”carro de Téspis”, dando origem as companhias teatrais. A figura do protagonista
(personagem principal de uma peça) também surgiu graças a Téspis. Nos dias atuais, a palavra é
utilizada para designar o ator ou atriz principal de uma peça teatral ou de uma produçã o
audiovisual (TV, cinema, internet).

O CORO desenvolvia o papel de mediador entre os atores e a plateia, refletindo os


pensamentos e sentimentos do povo. Era formado pelos narradores da histó ria que, por meio de
representaçã o, danças e cançõ es, relatavam a trajetó ria dos personagens.

MÁ SCARAS
Adereço presente em vá rias culturas

como parte de rituais. No teatro grego, as eram usadas por atores e pelos participantes dos
coros. Quando um mesmo ator (protagonista) fazia dois personagens, a má scara era um recurso de
diferenciaçã o entre os personagens. Esses acessó rios possibilitavam a plateia acompanhar a açã o
cênica pelas expressõ es que mostravam. A boca da má scara era um recurso acú stico para amplificar
a voz do ator, fazendo-a alcançar toda a plateia. Ja os lá bios da má scara eram feitos para ampliar o
alcance da voz do ator.

Má scaras (feminina e masculina, respectivamente) usadas nas tragédias

e comédias clá ssicas gregas.

O QUE TEM NA MALA DO TEATRO?

Grupo de teatro Cia.TeatraI Crias da Casa nomusical infantojuvenil Tres Marias"

O teatro é uma linguagem composta por inumeros elementos expressivos. Os “lugares”do


teatro sã o chamados de ESPAÇOS CÊ NICOS e podem ser: praças, ruas ou prédios, também
conhecidos como TEATRO. A palavra teatro vem do grego theatron, que significa “lugar onde se vai
para ver" assim, essa palavra reporta-se tanto à linguagem quanto ao lugar em que essa arte
acontece.

O teatro é PATRIMÔ NIO e faz parte da BAGAGEM CULTURAL da humanidade. Pode ser
classificado como bem MATERIAL (espaços construídos e destinados ao fazer teatral) e bem
IMATERIAL (a linguagem cênica, os gêneros de dramaturgia e as tradiçõ es teatrais herdadas ou
específicas de uma comunidade).
Pá gina 251

A FACE E O GESTO

O teatro pode ter diá logos ou monó logos e também pode ser feito apenas com gestos e
expressõ es faciais. O teatro de mímica nasceu da pantomima, que tinha como característica
personagens com o (rosto pintado de branco, historias sem fala, gestos ilustrativos e fins cô micos.
Atualmente, podemos encontrar a mímica como expressã o corporal e cênica em apresentaçõ es de
rua, em programas de televisã o, no cinema e em espetá culos de teatro e dança contemporâ neos.

Grandes artistas, como Charles Chaplin (1889 -1977) e Marcel Marceau (1923 - 2007),
destacaram-se nessa arte nã o verbal.

PEÇAS TEATRAIS

No acervo da dramaturgia em língua portuguesa, temos grandes obras como o Auto da Barca
do Inferno (1517), escrita pelo português Gil Vicente (1465-1537), e o Auto da Compadecida
(1955), escrita pelo brasileiro Ariano Suassuna (1927-2014). Os textos teatrais também podem ser
adaptados e transformados em filmes, novelas e outras linguagens.

O escritor Ariano Suassuna, homenageado pelo Galo da Madrugada. Foto de 2014.

DRAMATURGIA

É a arte de escrever textos destinados a representaçã o feita por atores. Como tradiçã o do
teatro grego, a dramaturgia nasce inspirada nas historias da mitologia grega. Inicialmente, aparece
em dois diferentes estilos: a tragédia (era considerada o mais nobre dos gêneros, pois falava de
personagens elevados e era capaz de suscitar os sentimentos mais elevados) e a comédia (era
considerada um género menor, pois falava de pessoas comuns e tinha cará ter satírico).Todavia, a
importâ ncia da comédia era a possibilidade democrá tica que ela criava de se criticarem as situaçõ es
ou fatos da época por meio das sá tiras.
É dipo e a Esfinge. Pintura em vaso grego. Século V.

DRAMATURGO

William Shakespeare (1564-1616) consagrou-se como um dos mais célebres dramaturgos


mundiais, deixando como acervo tragédias e comédias que sã o encenadas até os dias atuais, como
peças teatrais e adaptaçõ es para o cinema e para a televisã o.

William Shakespeare (1847), de Louis Coblitz (1814-1803). Ó leo sobre tela.

O CONJUNTO DA OBRA

No teatro, encontramos ainda outros elementos teatrais como: o cená rio composto por
mó veis, objetos, efeitos e maquiná rios que constroem uma cena; figurino, o conjunto das roupas e
acessorios de uma peça teatral; a maquiagem, pintura facial ou corporal dos atores; a iluminaçã o, as
luzes que iluminam o palco e os atores, os efeitos luminosos de uma cena e a sonoplastia, os efeitos
sonoros e as musicas que compõ em o espetá culo.

O tradicional teatro japonês Kabuki, apresentando sua riqueza em forma de cená rio e
figurino. Performance de agosto/2015.

O PÚ BLICO

Quem atua, representa para uma plateia, para o grupo de pessoas que assistem ao
espetá culo. O teatro é feito de muitas açõ es e de vá rios elementos, mas há um que se destaca:
VOCÊ O PÚ BLICOI
Pá gina 252

FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
1. (Enem-MEC)

Ao ouvir uma flauta e um piano emitindo a mesma nota musical, consegue-se diferenciar
esses instrumentos um do outro. Essa diferenciaçã o se deve principalmente ao(à )

a) intensidade sonora do som de cada instrumento musical.

b) potência sonora do som emitido pelos diferentes instrumentos musicais.

c) diferente velocidade de propagaçã o do som emitido por cada instrumento musical.

d) timbre do som, que faz com que os formatos das ondas de cada instrumento sejam
diferentes.

e) altura do som, que possui diferentes frequências para diferentes instrumentos


musicais.

2. (Enem-MEC)

Associação Cultural O Mundo de Lygia Clark

Lygia Clark, Bicho de Bolso. 1956. Ref.20361. Fotógrafo desconhecido.

O objeto escultó rico produzido por Lygia Clark, representante do Neoconcretismo,


exemplifica o início de uma vertente importante na arte contemporâ nea, que amplia as funçõ es
da arte. Tendo como referência a obra Bicho de bolso, identifica-se essa vertente pelo(a)
a) participaçã o efetiva do espectador na obra, o que determina a proximidade entre arte
e vida.

b) percepçã o do uso de objetos cotidianos para a confecçã o da obra de arte,


aproximando arte e realidade.

c) reconhecimento do uso de técnicas artesanais na arte, o que determina a consolidaçã o


de valores culturais.

d) reflexã o sobre a captaçã o artística de imagens com meios ó ticos, revelando o


desenvolvimento de uma linguagem pró pria.

e) entendimento sobre o uso de métodos de produçã o em série para a confecçã o da obra


de arte, o que atualiza as linguagens artísticas.
Pá gina 253

3. (Uerj-RJ)

Olavo Bilac. Gazeta de Notícias. 13/1/1901

O cinema se popularizou no Brasil depois de esta crô nica ter sido escrita. Nela, porém, o
autor já antecipa o advento do novo meio de comunicaçã o. Um trecho que comprova tal
afirmativa é:

a) E ainda a ciência humana há de achar o meio de simplificar e apressar a vida (l. 10-
11)

b) toda a explicaçã o vem da gravura, que conta conflitos e mortes, (l. 14-15)

c) nada impede que seja anexado ao animató grafo um gramofone de voz tonitruosa, (l.
21)

d) a má quina fotográ fica funciona sempre sob a égide da soberana Verdade, (l. 25-26)
Pá gina 254

EXPEDIÇÃO CULTURAL
Que tal fazermos um passeio pela escola ou por algum ambiente externo? Pensem qual
seria o lugar mais interessante pró ximo de vocês e decidam.

Nesse lugar, observem como sã o as linhas, as cores, as formas, os elementos sonoros


(como altura, timbre, intensidade, duraçã o...). Registre em seu diá rio de bordo tudo o que você
descobrir sobre os elementos de linguagem.

Combine com os colegas e vá a espetá culos de dança, teatro ó pera e mú sica e também
visite exposiçõ es. Preste atençã o em como os artistas usam os elementos de linguagem que
você estudou neste capítulo e de que forma esses artistas criam com os elementos que
escolheram.

Percebam, ainda, os gestos que usamos para nos comunicar e que também fazem parte
das expressõ es em artes cênicas, na expressã o poética do corpo.

Que elementos estã o presentes em uma ó pera? E em um show ou espetá culo de dança?
Observe a imagem abaixo de uma cena de uma ó pera encenada no teatro Amazonas, em
Manaus.

Bernardo Gutiérrez/Folhapress

Espetáculo de ópera apresentado no teatro Amazonas, em Manaus. Foto de 2008.


Pá gina 255

DIÁRIO DE BORDO
Vimos que os elementos em cada linguagem estã o sempre a serviço da mente criadora
do artista. Cabe ao artista descobrir suas intençõ es poéticas e dar rumos a esses elementos.
Trata-se da licença poética de cada um.

Ao articular esses elementos bá sicos, podemos construir formas simétricas ou


assimétricas, bidimensionais ou tridimensionais, dar movimento e profundidade à s imagens,
criar texturas, estabelecer escalas de tamanho, proporçã o, direçã o, constituir tonalidades,
utilizar cores puras ou misturar matizes cromá ticos para conseguir efeitos de contraste ou
harmonia, configurar luzes e sombras, entre outras possibilidades.

Na linguagem da mú sica podemos usar o silêncio, o tempo, a intensidade, os timbres e


muitas outras formas de organizar os sons ou explorar sons que estã o ao nosso redor. Nas
artes cênicas, podemos usar nosso corpo explorando os gestos e a voz, trabalhando com o
espaço, o tempo, a força. Ao articular os elementos de linguagens, podemos figurar, abstrair e
transmitir temas e assuntos, ou ainda causar sensaçõ es naquele que aprecia a obra artística.

Observe que toda essa articulaçã o de elementos de linguagem deve estar atrelada a um
jeito singular de criaçã o de cada artista, sua poética pessoal. Você também pode conhecer e
realizar experiências artísticas explorando a forma e o conteú do na arte.

Neste capítulo, conversamos sobre a forma e o conteú do na arte. Pense sobre essas
questõ es.

• O que você aprendeu sobre os elementos de linguagem em cada á rea expressiva?

• O que mais chamou sua atençã o?

• O que você mais gostou de fazer nos projetos de experimentaçã o artística?

• Gostaria de aprofundar seus estudos em uma linguagem da arte? Qual?


Alessandro Bianchi/Reuters/Latinstock
Pá gina 256

CAPÍTULO 6 BAGAGEM CULTURAL

Geoffrey Farmer. 2012. Life Magazine (1935-1985), grama alta, madeira, colagem de dimensõ es variáveis. Foto: Rita Demarchi

Pessoas observam a obra Leaves of grass (Folhas de grama), de Geoffrey Farmer, 2012, feita com recorte de edições da
revista Life de 1935 a 1985, hastes de madeira de alturas variadas, grama alta e cola. Com aproximadamente 18 m de comprimento,
esteve exposta no festival de arte Documenta 13, em Kassel, Alemanha.

“[...]
Sou pássaro no pé do vento
Que vai voando a esmo em plena primavera
Cantando eu vivo em movimento
E sem ser mais do mesmo
Ainda sou quem era.
[...]”

GADÚ , Maria; KRIEGER, Edu. No pé do vento. Intérprete: Maria Gadú . In: GADÚ Maria, Mais uma
página. Rio de Janeiro: Som Livre, 2012. CD. Faixa 1. Disponível em: <http://letras.mus.br/maria-
gadu/1997764>. Acesso em: 5 fev. 2016.
Pá gina 257

PARA ESTUDAR

• Tudo o que me compõe


• Música popular brasileira e gerações de ouvintes
• Tem gente que guarda cada coisa!
• O patrimônio nosso de cada dia
Pá gina 258

TEMA 1 TUDO O QUE ME


COMPÕE
"Cantando eu vivo em movimento
E sem ser mais do mesmo ainda sou quem era."

GADÚ , Maria; KRIEGER, Edu. No pé do vento. Inté rprete: Maria Gadú . In: GADÚ , Maria. Mais uma página. Rio de
Janeiro: Som Livre, 2012. CD. Faixa 1. Disponível em: <http://letras.mus.br/maria-gadu/1997764>. Acesso em: 5
fev. 2016.

Sã o situaçõ es, vivências e visõ es que nos pertencem, que constroem histó rias e
identidades. Isso acontece, talvez, como diz a mú sica de Maria Gadú (1986-), porque vivemos
em movimento, no pé do vento, em culturas em fluxos. Entre aquilo que consumimos e
apreciamos e aquilo que expressamos e descartamos, vamos construindo nossa bagagem, que
nos permite fazer mil viagens, mesmo que sejam imaginá rias.

Geoffrey Farmer. 2012. Life Magazine (1935-1985), grama alta, madeira, colagem de dimensõ es variáveis. Foto: Rita Demarchi

Detalhe de outro ângulo de Leaves of grass (Folhas de grama), de Geoffrey Farmer.

Quantas imagens você já viu até hoje? Quantas mú sicas já ouviu? Ver, ouvir, sentir sã o
situaçõ es que acontecem a cada instante. Encontramos muitas coisas em nossos caminhos...
objetos, cenas, sons... Tropeçamos em linguagens artísticas, em pessoas com as quais
conversamos ou que falam frases soltas, em livros, mú sicas, imagens em cartazes, em outdoors,
na TV, no celular, na internet... Vamos vivendo o dia a dia, e na maioria das vezes nã o nos
damos conta de que sã o essas coisas que compõ em nossa bagagem cultural, nosso repertó rio,
nosso patrimô nio cultural.

Além da cultura visual, também estamos mergulhados em um mundo sonoro. Podemos,


por exemplo, selecionar mú sicas, fazer playlists e compartilhar com amigos em sites de
relacionamento. Essa seleçã o de mú sicas mostra nossas escolhas, do que gostamos e, dessa
forma, apresenta quem somos. Ao compartilhá -las, expomos nã o apenas as mú sicas, mas
também um pouco de nó s a outras pessoas. É comum também as pessoas colocarem seleçõ es
de imagens em redes de relacionamento. Sã o fotos com amigos, familiares, namorados, lugares
em que estiveram, lugares em que gostariam de estar, frases, momentos que marcam a histó ria
de cada um. Tudo isso é acervo pessoal, que se torna pú blico quando exposto.

Playlist: termo inglê s que significa lista de mú sicas, sons ou vídeos em meio eletrô nico, podendo ser virtual, e que
pode ser apreciada por quem a criou ou por outras pessoas em vá rios momentos e lugares remotos. É uma espé cie de
acervo, coleçã o de som e imagem.

O artista canadense Geoffrey Farmer (1967-) pesquisou imagens que marcaram épocas
e geraçõ es, parte do repertó rio cultural de muita gente que leu a revista estadunidense Life
entre os anos de 1935 e 1985. Essa revista foi uma das mais lidas do mundo (sua ú ltima ediçã o
foi em 2000). Apresentava a vida de celebridades e fatos que marcaram a histó ria. O artista
recortou milhares de imagens dessa revista e as colocou em estruturas de madeira, criando
uma colagem de imagens em composiçã o tridimensional que podemos observar na obra
Leaves of grass, apresentada acima.
Pá gina 259

A arte de Geoffrey Farmer


Geoffrey Farmer se apropria de imagens do cotidiano, como recortes de revistas, e cria
arranjos colando pedaços de imagens em outras, o que faz surgir composiçõ es inusitadas. As
imagens, bidimensionais na linguagem da fotografia, da pintura ou do desenho, tornam-se
tridimensionais nas instalaçõ es e esculturas de papel que esse artista inventa. Ele também usa
objetos, tecidos, jogos de luzes e projeçã o de imagens para fazer outras instalaçõ es.

Sua arte tem sido mostrada mundo afora, como na exposiçã o Documenta, que acontece a
cada cinco anos, na cidade alemã de Kassel, e é considerada uma das mais importantes
exposiçõ es de arte do mundo. Essa exposiçã o dura cem dias e mostra obras de artistas
contemporâ neos de todo o mundo. Imagens da obra do artista Geoffrey Farmer foram
registradas na exposiçã o Documenta 13, de 2012, pela fotó grafa paulista Rita Demarchi
(1969-).

Geoffrey Farmer. 2012. Life Magazine (1935-1985), grama alta, madeira, colagem de dimensõ es variáveis. Foto: Rita Demarchi

Mais um detalhe de Leaves of grass (Folhas de grama), de Geoffrey Farmer, 2012.

Palavra do artista

“Em Kassel, o trabalho é exibido no segundo andar da Neue Galerie, que é um longo
corredor, escultural, com enormes janelas arqueadas com vista para o parque. A visã o trouxe à
mente a miniaturizaçã o do mundo. Eu já estava pensando em como a fotografia tem uma
tendência a fazer escultura, e gostei disto [...].”

Geoffrey Farmer

FARMER, Geoffrey apud HEATHER, Rosemary. Geoffrey Farmer discusses his big Documenta hit. Canadian Art, 30
ago. 2012. Disponível em: <http://canadianart.ca/features/geoffrey-farmer-reveals-processbehind-documenta-13-hit/>.
Acesso em: 17 fev. 2016.
Wolfgang Stahr/Laif/Glow Images

Geoffrey Farmer diante de sua obra na Documenta 13. Foto de 2012.

Vidas privadas e pú blicas


Antes da internet, outras mídias eram canais importantes para compartilhar notícias
sobre a vida pú blica ou privada das pessoas. As revistas foram e ainda sã o importantes mídias
de informaçã o, mas no passado elas tinham um valor ainda maior, porque eram um meio para
saber das notícias mais recentes sobre as celebridades.

O pintor estadunidense Jackson Pollock (1912-1956) teve uma reportagem sobre sua
vida publicada na revista Life em 1949. Esse artista se tornou uma celebridade da arte nos
Estados Unidos na metade do século XX. A revista mostra o artista trabalhando em seu estú dio,
em Long Island (EUA), em meio a suas telas de estilo expressionista abstrato, seguindo a
tendência da action painting, ou pintura gestual estadunidense (falaremos sobre essas
linguagens logo adiante).

Arnold Newman/Getty Images

O pintor estadunidense Jackson Pollock com uma de suas obras em fotografia publicada na revista Life, em 1949.
Pá gina 260

A fotografia de Jackson Pollock publicada nessa ediçã o da Life faz parte da obra de
Geoffrey Farmer, que recebeu o título de Leaves of grass (Folhas de grama), e foi exposta no
Documenta 13, realizado na cidade de Kassel, Alemanha, em 2012. Trata-se de uma obra
contemporâ nea que apresenta imagens de outras épocas. Apresenta vidas que eram privadas,
particulares, mas se tornaram pú blicas e passaram a fazer parte do acervo de memó ria de
pessoas que consumiram esse tipo de mídia, as revistas.

A partir do século XX, a fotografia tornou-se um modo importante de registro de


imagens, inclusive para fotografar outras linguagens, como pintura, desenho, escultura,
arquitetura. Os fotó grafos sã o profissionais responsá veis pela captura de imagens que podem
ficar gravadas em nossa memó ria, passando a fazer parte de nosso acervo visual.

Fotó grafos que trabalharam para a revista Life, como Martha Holmes (1923-2006) e
Arnold Abner Newman (1918-2006), estiveram com Jackson Pollock, polêmico artista
estadunidense. A imagem mostra um desses encontros entre a fotó grafa e o universo da
pintura. O artista é visto mergulhado em açã o, ao pintar, com seus gestos compondo uma
imagem abstrata.

Geoffrey Farmer. 2012. Life Magazine (1935-1985), grama alta, madeira, colagem de dimensõ es variáveis. Foto: Rita Demarchi

Detalhe de Leaves of grass (Folhas de grama), de Geoffrey Farmer, 2012.

Abstracionismo e outros “ismos”


A forma, tão importante nas artes visuais em outros tempos, foi sendo desconstruída até
ser totalmente abstraída nas vá rias vertentes do movimento conhecido como Abstracionismo.

Abstracionismo: uma tendê ncia de arte desprendida da imitaçã o do mundo, ou seja, da figuraçã o. Historicamente,
está ligada à s vanguardas europeias do início do sé culo XX. Esta corrente estilística desencadeou vá rias ramificaçõ es, como o
abstracionismo geométrico e o expressionismo abstrato, entre outras.
A arte abstrata surgiu no início do século XX e passou a ser um movimento tão extenso
que precisou ganhar sentidos particulares, desmembrando-se em outros “ismos”:
Expressionismo abstrato, Suprematismo, Construtivismo, Neoplasticismo, Espacialismo,
Minimalismo abstrato, entre outros.

Expressionismo abstrato: uma das tendê ncias do expressionismo, movimento que nasceu no início do sé culo XX.
Em meio a conflitos e guerras, os artistas refletem a respeito das condiçõ es sociais da existê ncia. Na pintura do movimento
expressionismo abstrato, vemos uma arte emocional e dinâ mica, em que ficam registrados as marcas de pincé is ou os
movimentos feitos pelo artista ao jogar a tinta na tela. Sã o os registros da energia do gesto colocada no momento da criaçã o
da pintura.

Nas imagens abstratas, os elementos de linguagem se bastam, e nã o vemos figuras que


representam “coisas reconhecíveis” na natureza (como paisagens ou seres vivos) ou na cultura
(como os objetos).

Martha Holmes/Time Life Pictures/Getty Images

Pintor Jackson Pollock trabalhando em seu estúdio, fotografado por Martha Holmes para a revista Life, em 1949.
Pá gina 261

Apó s a ruptura com a representaçã o de imagens como imitaçã o do mundo que sempre
marcou as artes visuais, vemos nascer nesse movimento imagens que se concretizam pela
exploraçã o de elementos como linhas, formas, cores, planos e pontos.

Pollock criava pinturas classificadas no estilo expressionismo abstrato, uma das


ramificaçõ es do Abstracionismo, movimento que se desenvolveu de diferentes modos pelo
mundo. Nos Estados Unidos, esse estilo teve grande adesã o de artistas que faziam uma arte
gestual, pintura de açã o conhecida como action painting. Nesse estilo, o processo de criar na
linguagem da pintura era também uma performance artística, em que a pintura torna-se
registro do gesto dos artistas. Na imagem de Pollock, apresentada na pá gina anterior, podemos
ver a energia do gesto da açã o do artista ao olhar manchas formadas pelas tintas lançadas
sobre a tela e relevos que ele conseguia jogando diversos materiais, como areia. Gestos que
mostram a personalidade desse artista conhecido também por seu temperamento inquieto.

Action painting: termo inglê s que significa pintura de ação. Está ligado ao movimento de arte informal que
defende a gestualidade e a improvisaçã o no ato de criaçã o da pintura. Expressa a personalidade e o sentimento de liberdade
do artista, ato cinesté sico que estabelece o trabalho simultâ neo entre corpo e mente. Um dos adeptos desse tipo de produçã o
foi Jackson Pollock.

A arte de Jackson Pollock


Pollock criou imagens na linguagem da pintura que, em sua época, desafiavam os olhos
mais conservadores, mas que também fascinavam o pú blico que gostava de conhecer novas
propostas em arte. Essa maneira de fazer arte dividiu a opiniã o do pú blico nos Estados Unidos.
Na reportagem citada na revista Life de 8 de agosto de 1949, há um tom de ironia que coloca a
pergunta: “É este o maior pintor vivo nos Estados Unidos?”.

Palavra do artista

“Eu nã o pinto a natureza, eu sou a natureza.”

Jackson Pollock

POLLOCK, Jackson. Apud Ars, Sã o Paulo: ECA-USP, p. 13, 2003. Disponível em:
<https://pt.wikiquote.org/wiki/Jackson_Pollock>. Acesso em: 17 fev. 2016.

DICA
Para navegar

Um vídeo mostrando a performance de Jackson Pollock ao pintar, fazendo sua arte em action painting,
chegou a ser exibido para uma plateia no Museu de Arte de Nova York, em 1951. São exemplos das linguagens
da pintura e da performance registradas em vídeo. Você pode ver esse vídeo na internet, acessando:
<http://tub.im/yii6wr> (acesso em: 26 fev. 2016).

Giro de ideias: Imagens marcantes


Na obra do artista Geoffrey Farmer aparecem imagens que marcam geraçõ es.
Você já parou para pensar que imagens marcaram sua infâ ncia e adolescência? Quais
imagens sã o importantes para você e seus colegas hoje?

Para ampliar nossos estudos sobre acervos e repertó rios visuais, que tal fazermos um
fó rum de imagens? Pode ser presencial (na sala de aula), entre você, os colegas e o professor,
ou em algum ambiente virtual a escolher. Selecione uma imagem que marcou sua histó ria.
Pode ser uma imagem de seu passado ou algo mais recente. Mostre essa imagem para a turma
e faça um breve comentá rio sobre a razã o de a imagem ser importante para você.

Com base nessa conversa, você e toda a turma sã o convidados a apreciar as imagens
apresentadas.

Escreva, a seguir, as principais impressõ es comentadas no fó rum de imagens.


Pá gina 262

Conexõ es Arte e Histó ria

LatinContent/Getty Images

Exemplo de fotojornalismo esportivo: equipe brasileira de nado sincronizado em apresentação nos jogos Pan Americanos
de Guadalajara, em 2011.

Fotojornalismo
Fotojornalismo é um gênero de jornalismo que privilegia a fotografia como elemento
informativo das notícias. É também o trabalho desempenhado pelo fotojornalista ou repó rter
fotográ fico, jornalista responsá vel pelo registro fotográ fico de quaisquer fatos ou assuntos de
interesse jornalístico.

A fotografia jornalística pode mostrar, revelar, expor, denunciar, opinar, informar e reforçar
a credibilidade da informaçã o textual. Desse modo, pode ser usada em vá rios suportes, desde os
jornais e revistas, impressos e virtuais, até em exposiçõ es, livros e boletins empresariais, além de
sites e blogues.

Temos, entã o, conforme o teor do assunto a ser abordado, vá rios temas fotojornalísticos,
como: fotojornalismo social, cultural, esportivo, policial, de guerra. Todos esses tó picos, no â mbito
geral, constituem a fotografia jornalística como um documento histó rico.

O domínio das linguagens, técnicas e equipamentos fotojornalísticos é muito importante


para qualquer profissional da comunicaçã o. A fotografia digital e os progressos nas
telecomunicaçõ es e na informá tica trouxeram ao fotojornalismo grandes potencialidades para a
informaçã o, como a velocidade, a maleabilidade e a utilizaçã o da fotografia em diferentes meios e
contextos.
Além de informar, o fotojornalismo leva milhõ es de pessoas a exposiçõ es e fornece ao mundo
fotolivros de qualidade, beleza, interesse e potencial informativo, por meio da força atrativa das
imagens desenvolvida pela aplicaçã o da linguagem das artes visuais.

Você se lembra de algum fato ou notícia que ficou marcado pela fotografia que a
acompanhava? Pesquise em jornais, revistas e na internet assuntos que foram registrados e
eternizados pelas lentes de profissionais da comunicaçã o e apresente para a turma a fotografia que
você considerou mais marcante.
Pá gina 263

Projeto experimental
Essa imagem é a minha cara!
O fotó grafo estadunidense Arnold Newman (1918-2006) fez muitos registros de imagens de
políticos e personalidades artísticas. Algumas dessas imagens compõ em a fotografia feita em 1988
por Abe Frajndlich (1946-), que retratou Arnold Newman com uma má scara de papel em que foram
coladas vá rias das fotografias feitas por ele.

Do mesmo modo, as fotografias que tiramos ou gostamos de olhar também contam um pouco
sobre nó s. Admiramos pessoas, ideias, e somos inspirados por elas.

Com base em pesquisas em revistas e jornais, selecione de dez a vinte imagens com as quais
você tenha algum tipo de identificaçã o. Escolha um suporte, pode ser uma caixa de papelã o, um
saco de papel ou outro que possa servir como um tipo de má scara. Crie uma composiçã o com essas
imagens, colando-as sobre o suporte. Deixe espaço para os olhos e para você respirar.

Cada um fará a sua pró pria má scara de imagens com as referências que fazem parte da sua
vida e que, assim, sã o a sua “cara”. Que tal fazer uma foto da turma com as má scaras? Será
divertido!

Photograph © Abe Frajndlich 2013

Arnold Newman, fotografado por Abe Frajndlich, no livro Penelope’s hungry eyes – Portraits of photographers (Olhos
famintos de Penélope – retratos de fotógrafos) (Nova York: Schirmer/Mosel, 1988).

Uma celebridade em minha vida!


Atualmente, algumas celebridades acabam por se tornar amigas dos fotó grafos de eventos.
Pensando nisso, outra proposta de projeto artístico é fazer uma fotografia de alguém que é uma
celebridade na sua vida, um amigo, por exemplo, um membro da família, um professor.
Planeje como essa foto será feita: pense na luz, no fundo (cená rio), na pose ou atitude em que
a “celebridade” (a pessoa que você escolheu) está , alguma açã o que indique sua profissã o ou algo
que gosta de fazer, como nas fotos que retratam o artista Jackson Pollock envolvido em seu trabalho
ou posando em frente a suas obras.

Reflita por que escolheu essa pessoa e como pretende fazer a fotografia retratando sua
“celebridade”.

DICA
Para navegar

Conheça os retratos criativos que o fotó grafo alemã o Abe Frajndlich (1946-) cria e publica em livros,
revistas, sites e outras mídias e espaços de exposição pelo mundo. Nos ú ltimos trinta anos, ele tem se dedicado
a retratar os fotó grafos mais famosos do mundo, misturando linguagens e materiais. Há vá rias imagens
disponíveis em: <http://tub.im/f6hf5j> (acesso em: 26 fev. 2016). Pode ser até que você já tenha visto
algumas de suas imagens por aí.
Pá gina 264

TEMA 2 MÚSICA POPULAR


BRASILEIRA E GERAÇÕES DE
OUVINTES
"Todos os dias quando acordo,
Nã o tenho mais o tempo que passou
Mas tenho muito tempo:
Temos todo o tempo do mundo.
[...]"
RUSSO, Renato. Tempo perdido. In: Legiã o Urbana. Dois. Rio de Janeiro: EMI Music, 1986. Faixa 6. Disponível
em:<http://www.legiaourbana.com.br/discografia>. Acesso em: 18 fev. 2016.

Como vivemos nosso tempo e construímos memó rias? Que mú sicas gostamos de ouvir?
Na mú sica Tempo perdido, da banda brasileira Legiã o Urbana, a letra de Renato Russo (1960-
1996) expressa percepçõ es sobre o tempo. Como percebemos o tempo passar? Como nos
relacionamos com as pessoas, as coisas, as linguagens artísticas? O que guardamos de nossa
histó ria?

Outra mú sica que também fala sobre o tempo foi composta e gravada em 1982 por Lulu
Santos (1953-). Trata-se da mú sica Tempos modernos, divulgada no á lbum do mesmo nome,
ainda no tempo do disco de vinil. Essa mú sica já foi regravada por vá rios artistas. Uma das
mais recentes releituras dessa obra é de 2013, do grupo Jota Quest. Talvez você já tenha
ouvido nas rá dios, na televisã o ou na internet.

Disco de vinil: mídia criada na dé cada de 1940 com a finalidade de reproduzir mú sicas e outros tipos de material
em á udio. Feito de maté ria plá stica, necessita de um aparelho com agulha especial para fazer vibrar os sons e reproduzir a
mú sica, chamado de vitrola ou toca-discos e, atualmente, de pickup. Foi amplamente consumido até os anos de 1990, no
formato de LP (long-plays, com cerca de 5 a 7 mú sicas em cada lado – lado A, lado B) e na versã o compacto (simples, com
uma mú sica de cada lado, ou duplo, com duas mú sicas de cada lado). Essa é poca trouxe outras tecnologias de gravaçã o e
reproduçã o de mú sicas e sons, como os CDs e o MP3. Atualmente, essa mídia tem sido revisitada por DJs e colecionadores,
fã s do “vinil”.

A mú sica Tempos modernos, de Lulu Santos, foi um enorme sucesso na década de 1980,
época em que explodiam no Brasil vá rios grupos de rock. Esse gênero já era conhecido desde
os anos 1950, mas a Geraçã o 80 (que engloba toda a década de 1980) buscava um rock
nacional, contemporâ neo, em que se pudesse usar tudo que essa época oferecia de tecnologia e
ideias novas na arte.

Geração 80: Movimento de jovens artistas que tiveram a intençã o de inovar e questionar sobre os acontecimentos
do mundo e da cultura por meio de criaçã o artística em vá rias linguagens, principalmente na mú sica, com grande
repercussã o nos estilos do pop e, principalmente, do rock brasileiros. O Brasil atravessava um momento de transiçã o entre a
ditadura militar (1964-1985) e a democracia (1985-), e os grupos de jovens artistas se uniram para criar e discutir sobre
arte. Eventos artísticos e culturais aconteceram em todo o país. No Rio de Janeiro, por exemplo, em 1984, na Escola de Artes
Visuais do Parque Lage, aconteceu a exposiçã o Como vai você, Geração 80?
"[...] Vamos viver tudo o que há pra viver
Vamos nos permitir"

SANTOS, Lulu. Tempos modernos. In:. Tempos modernos. Rio de Janeiro: WEA, 1982. LP. Faixa 1. Disponível em:
<http://www.radio.uol.com.br/#/letras-e-musicas/lulu-santos/tempos-modernos/954696>. Acesso em: 18 fev.
2016.

Capa do Disco Tempos modernos. Lulu Santos. 1982

Capa do disco Tempos modernos, de Lulu Santos, lançado em 1982.

Patrimô nios culturais se constroem no tempo; assim formamos nossa bagagem cultural,
nossa histó ria no decorrer do tempo. Algumas mú sicas ficam no passado, fazem parte da
histó ria, outras sã o revisitadas em adaptaçõ es e regravaçõ es. As obras artísticas de diferentes
linguagens podem transitar do passado ao presente, vestindo novas roupagens, recebendo
novos contextos e tecnologias. Podemos assistir a videoclipes e baixar mú sicas pela internet.
As tecnologias de informaçã o nos aproximaram ainda mais da linguagem da mú sica, com obras
criadas hoje ou que marcaram geraçõ es passadas.
Pá gina 265

Antes da época da Geraçã o 80, o movimento do Tropicalismo tinha aberto terreno para
uma concepçã o de arte brasileira inovadora na mú sica. O Tropicalismo, surgido no final da
década de 1960 com as apresentaçõ es de Caetano Veloso (1942-) e Gilberto Gil (1942-) no
Festival de Mú sica Popular realizado em 1967, pela TV Record, buscava mesclar inovaçõ es
estéticas que ocorriam em outros países com elementos da cultura brasileira. Nos anos do
período do militarismo, surge no Brasil a arte de protesto, que se manifesta em vá rias
linguagens artísticas, como na mú sica, nas artes visuais e no teatro.

Tropicalismo (movimento tropicalista): manifestaçã o artística da dé cada de 1960 que se revelou em vá rias
linguagens da arte, como no teatro, na poesia, nas artes plá sticas, no cinema e, principalmente, na mú sica. Na linguagem
musical, artistas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Os Mutantes, Gal Costa, Tom Zé , Torquato Neto, Jorge Mautner, Rogé rio
Duprat, entre outros, misturam ritmos brasileiros, africanos, pop e rock and roll e outros sons, inclusive mú sica clá ssica,
criando composiçõ es que mesclam contextos culturais, marcando a histó ria da arte brasileira e influenciando
comportamentos.

Outro movimento de mú sica popular brasileira, a Bossa Nova, agitou o mundo da mú sica
entre as décadas de 1950 e 1960. Esse estilo musical se desenvolveu no Rio de Janeiro, tendo
como características marcantes a “batida” do violã o introduzida por Joã o Gilberto e seu jeito de
cantar à meia voz. Por meio da Bossa Nova, mú sicos e compositores como Tom Jobim (1927-
1994), Vinicius de Moraes (1913-1980), Joã o Gilberto (1931-), Carlos Lyra (1939-), Roberto
Menescal (1937-), Johny Alf (1929-2010), entre outros, inventaram um ritmo e um modo
diferentes de harmonizar as cançõ es na mú sica brasileira, que influenciou também o estilo de
cantar das geraçõ es seguintes. A Bossa Nova misturou ritmos como o jazz e o samba e ganhou
o mundo no embalo de Garota de Ipanema, mú sica de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, entre
tantos outros sucessos.

"Olha que coisa mais linda


Mais cheia de graça [...]"

MORAES, Vinicius de; JOBIM, Tom. Garota de Ipanema, 1962. Disponível em:
<http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/article.php3?id_article=947>. Acesso em: 18 fev. 2016.

Tom e Vinicius também olharam para a vida nos morros do Rio de Janeiro, além de
cantar a beleza da mulher e das praias brasileiras. A mú sica O morro não tem vez fez muito
sucesso primeiramente na voz da cantora Elis Regina (1945-1982).

"O morro nã o tem vez


E o que ele fez já foi demais
[...]"

MORAES, Vinicius de; JOBIM, Tom. O morro não tem vez, 1962. Disponível em:
<http://www.viniciusdemoraes.com.br/site/article.php3?id_article=1154>. Acesso em: 18 fev. 2016.

Outras vozes cantaram mú sicas sobre o morro, as favelas e sobre o samba. Vá rios
sambistas ficaram conhecidos por cantar as belezas e dificuldades de morar nas favelas do Rio
de Janeiro. Um deles foi Cartola (1908-1980), que viveu no morro da Mangueira e foi um dos
fundadores da Escola de Samba Estaçã o Primeira de Mangueira.

O samba é um gênero que se apresenta em vá rias formas: samba de enredo (samba-


enredo), samba-cançã o, samba de breque, samba-rock, entre outros. A mú sica Pelo telefone,
composta pelo carioca Donga (1889-1974) em parceria com Mauro de Almeida (1882-1956),
em 1916, é considerada o primeiro samba a ser gravado no Brasil, em 1917. Essa mú sica
aparece gravada em vá rias versõ es ao longo da histó ria da mú sica brasileira. Décadas depois,
Gilberto Gil faria a mú sica Pela internet, que tem como referência o clá ssico e cita um trecho da
letra, fazendo uma contextualizaçã o entre essas tecnologias e as mudanças que as envolvem,
exemplificadas nos comportamentos e há bitos das épocas em que foram compostas. Veja a
comparaçã o a seguir.
Pá gina 266

Mú sica de Donga:

"O chefe da polícia pelo telefone mandou me avisar


que na Carioca tem uma roleta para se jogar [...]."

DONGA; ALMEIDA, Mauro de. Pelo telefone. In. MPB NAS ESCOLAS. Rio de Janeiro: Instituto Cultural Cravo Albin,
2016. 1 CD. Faixa 1. Disponível em: <http://institutocravoalbin.com.br/mpb-nas-escolas/musicas/>. Acesso em: 18
fev. 2016.

Versã o na mú sica de Gil:

"Que o chefe da polícia carioca avisa pelo celular


Que lá na praça Onze tem um videopô quer para se jogar [...]."

GIL, Gilberto. Pela internet 2009. Disponível em: <http://www.gilbertogil.com.br/sec_musica.php?>. Acesso em:
18 fev. 2016.

Heitor Villa-Lobos (1887-1959), que participou da Semana de Arte Moderna de 1922, foi
um dos mais importantes mú sicos e compositores do Brasil no que se refere ao estudo de
ritmos, tanto brasileiros quanto de outros países. Ele uniu sons do chorinho (gênero popular
da época) com a maneira de fazer mú sica criada na época do Barroco europeu pelo mú sico
alemã o Johann Sebastian Bach (1685-1750), criando a composiçã o Bachianas brasileiras,
determinando um estilo pessoal de revisitar o passado da mú sica trazendo coisas de seu
tempo e de sua cultura.

DICA
Para navegar

Vocês e seus amigos podem ouvir a mú sica Tempo perdido e conhecer mais sobre a banda Legiã o
Urbana, suas obras e sua trajetó ria navegando por este site: <http://tub.im/u8tjjz> (acesso em: 14 abr. 2016).

Para assistir

Assista ao filme Somos tã o jovens, direçã o de Antô nio Carlos da Fontoura. Brasil: Fox filmes, 2013.
(104 min), que mostra a formaçã o de vá rias bandas da Geraçã o 80, principalmente da Legiã o Urbana,
retratando a juventude do mú sico Renato Russo (1960-1996).

De tempos em tempos, a mú sica se renova:


Cartola e Cazuza
"Ai, esse bojo perfeito
Que trago junto ao meu peito
Só você, violã o, compreende [...]"

CARTOLA. Cordas de aço, 1976. Disponível em: <http://www.cartola.org.br/letra/20_letra_cordas_de_aco.htm>.


Acesso em: 18 fev. 2016.
Angenor de Oliveira era seu nome de batismo, mas ficou conhecido como Cartola (1908-
1980), deixando sua marca na mú sica popular brasileira como um artista que criou belas
mú sicas, tanto na poesia de suas letras como nos acordes de seu violã o. Menino pobre, nasceu
e se criou ao som do violã o, porque seu pai era mú sico. Entretanto, o pai de Cartola tinha
outros planos para a vida profissional do filho, em vã o, pois o som do violã o já estava
impregnado e esse artista humilde cantou a vida de seus iguais, pessoas moradoras de favelas
ou á reas pobres da cidade, e que, ainda assim, não perdiam a capacidade de sonhar e poetizar.
Suas mú sicas inspiraram e ainda movem geraçõ es. Muitos mú sicos brasileiros regravam suas
cançõ es de tempos em tempos.

Agenor de Miranda Araú jo Neto, mais conhecido como Cazuza (1958-1990), dizia que
sua mú sica fazia parte de sua histó ria. Viveu, quando menino, cercado de mú sicos que
frequentavam sua casa, amigos de seus pais. Por meio do repertó rio dos pais, cresceu ouvindo
mú sica de todas as épocas. Ainda na adolescência, fazia versos
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que depois se tornaram potências para suas cançõ es. Participou de uma banda
importante no cená rio do rock nacional, criada nos anos 1980, o grupo Barã o Vermelho.
Depois, seguiu carreira solo de grande sucesso. Iniciou, com o Barã o Vermelho, uma arte
contestadora, que se desenvolveu principalmente durante a Geraçã o 80 e que continuaria em
outros discos. Ainda com o Barã o Vermelho, esteve na primeira ediçã o do festival de mú sica
Rock in Rio, em 1985. Um jovem que prestava atençã o em tudo que estava sendo produzido na
arte de seu tempo. Um poeta da mú sica, apaixonado por outros poetas, como Cartola, de quem
era admirador e regravou mú sicas. A obra de Cazuza também tem sido revisitada por mú sicos
das novas geraçõ es.

"Ainda é cedo, amor,


mal começastes a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irá s tomar [...]"

CARTOLA. O mundo é um moinho, 1976. Disponível em:


<http://www.cartola.org.br/letra/13_letra_o_mundo_e_um_moinho.htm>. Acesso em: 18 fev. 2016

Kenji Honda/AGE/Estadão Conteú do

O músico Cartola durante apresentação no Zicartola, em 1975.

A Geraçã o 80, por exemplo, o apresenta aos jovens da época pela voz do cantor e
compositor Cazuza que regravou O mundo é um moinho. Coincidentemente, Cartola e Cazuza
tinham quase o mesmo nome de batismo, Agenor (por um erro do cartó rio, Cartola ficou
registrado como Angenor). Os dois sã o exemplos de artistas que, ao criar mú sicas, deixaram
um acervo de obras que, por sua qualidade, sã o revisitadas. Obras musicais que sã o
patrimô nios culturais brasileiros.
Ricardo Leoni/Agência O Globo

Cazuza, em apresentação do Barão Vermelho no primeiro Rock in Rio, em 1985.

DICA
Para ouvir

A arte de Cartola e outros mestres da mú sica brasileira pode ser ouvida em suas pró prias gravaçõ es e
nas vozes de diversas geraçõ es, entre elas, nas de criativas e talentosas cantoras. Nos sites a seguir, investigue
e acrescente em sua playlist a arte de Cartola: <http://tub.im/ivj7xd>; Jesuton: <http://tub.im/sxoj9g>;
Roberta Sá: <http://tub.im/6xjfu4>; Tereza Cristina: <http://tub.im/irjicd>; Zélia Duncan:
<http://tub.im/9wth7o>. Todos acessados em: 2 mar. 2016.

A arte de EMICIDA
"Vejo alvorada no morro, fazer pá quá da vitrola
Como se eu tivesse dentro daquele samba do Cartola
[...]
É isso, (isso) assim mantenho meu compromisso
Minha índole nã o se encarde, à tarde a rima vem disso
As beleza me brinda com a inspiraçã o dos antigo [...]"

EMICIDA. Só isso. Inté rprete: Emicida. In: ______. Pra quem já mordeu um cachorro por comida, até que eu
cheguei longe... Sã o Paulo: Laborató rio Fantasma, 2009. CD. Faixa 8. Disponível em:
<http://www.vagalume.com.br/emicida/so-isso.html>. Acesso em: 2 mar. 2016.
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O rapper paulistano Leandro Roque de Oliveira (1985-), artisticamente conhecido como


Emicida, é mais um exemplo das novas geraçõ es que revisitam e sã o influenciadas por grandes
mú sicos do passado.

Ouvir de tudo e perceber o mundo sonoro e musical a sua volta, criticar o preconceito e
aprender com a sabedoria dos mú sicos brasileiros do passado e do presente: essas sã o as
mensagens que ele nos traz em sua mú sica Só isso. Esse rapper e produtor musical brasileiro
tem como estilo principal a cultura do hip-hop. É , também, um pesquisador das manifestaçõ es
musicais populares brasileiras e, inspirado nelas, cria letras que revisitam essas riquezas
nacionais, como a arte de Cartola.

Palavra do artista

“[...] Eu nasci num bairro [...] bem pobrinho [...] quando cresci nã o tinha nada. Cresci ali,
como eu falo na mú sica, zombando da morte, andando no meio do fio da navalha. [...] Só que
acho que o que salvou a minha vida foram duas coisas, o hip hop e a leitura [...]. A leitura
começou a abrir um outro universo para mim. [...] Acho que quando você nasce num bairro
violento, a pior coisa que aquele ambiente faz para você é destruir a sua humanidade. E isso é
uma coisa que é incomensurá vel, nã o tem como você quantificar o quanto de compaixã o
aquela pessoa perdeu por estar em um ambiente muito agressivo.”

Emicida

CARNEIRO, Jú lia Dias; MENDONÇA, Renata. ‘A pior coisa é você perguntar as horas e a pessoa esconder a bolsa’, diz
Emicida sobre racismo no Brasil. BBC Brasil, 1º set. 2015. Disponível em:
<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/09/150824_entrevista_emicida_jc_rm>. Acesso em: 2 mar. 2016.

Joyce Cury/A Cidade/Futura Press

Emicida, durante show, usando a camiseta “Hip-hop salvou minha vida”. Foto de 2012.

Ofício da arte

DJ

O DJ (abreviaçã o de disc jockey) trabalha com materiais musicais previamente gravados,


atuando em diversos eventos e locais como festas, shows, lançamentos de produtos, desfiles de
moda, danceterias, bares, entre outros, utilizando vinis, CDs, laptops, softwares. O DJ também
pode criar suas pró prias mú sicas, trabalhar com releituras ou remixes, produzindo um
caminho criativo para suas apresentaçõ es.

A atividade de DJ teve início nas rá dios, com o uso do vinil, e passou para festas, bailes e
pistas de danceterias. Nas ú ltimas décadas, surgiram vá rios equipamentos e softwares
específicos para criaçã o e ediçã o de mú sicas e efeitos sonoros nesta á rea. Atualmente, muitos
DJs seguem carreira com trabalhos personalizados, fazem temporadas de shows e participam
de festivais de mú sica eletrô nica.

DICA
Para ouvir

Para ouvir um exemplo de versõ es contemporâ neas de mú sicas de outros tempos, acesse o link:
<http://tub.im/9ki9cw> (acesso em: 2 mar. 2016) e aprecie a releitura da obra musical Sim, de Cartola e
Oswaldo Martins, apresentada pelo rapper Emicida, que fez vá rios shows com releituras do repertó rio de
Cartola.

Giro de ideias: O que é passado e presente?


Vimos que, na mú sica popular brasileira, a divisã o temporal passado-presente é tênue,
porque podemos ouvir mú sicas em arranjos e adaptaçõ es feitos atualmente, que nos soam
como criaçõ es novas, mas que já foram consagradas em outros tempos.

Você conhece alguma mú sica antiga que foi regravada recentemente? Pesquise sobre
regravaçõ es de mú sicas, grupos e cantores, gêneros musicais e outros detalhes.

Apresente a mú sica escolhida para a turma e comente sobre o resultado da sua pesquisa.
Pá gina 269

Festivais de mú sica
Mú sica brasileira – arte, protesto e festival
A histó ria da mú sica brasileira é caracterizada pela presença de muitos festivais,
organizados por emissoras de rá dio, redes de televisã o e movimentos de estudantes. Entre os
anos de 1965 a 1985, diversas emissoras de televisã o do Brasil produziram e transmitiram
festivais nacionais de mú sica popular brasileira (MPB). Nesse período também tivemos
festivais regionais e alguns nacionais que nã o alcançaram grande repercussã o, inclusive por
falta de apoio da grande mídia.

Esses festivais ajudaram a divulgar a mú sica brasileira e a revelar e consolidar


compositores, mú sicos e intérpretes como Caetano Veloso (1942-), Chico Buarque (1944-),
Edu Lobo (1943-), Elis Regina (1945-1982), Gilberto Gil (1942-), Jair Rodrigues (1939-2014),
Milton Nascimento (1942-), Nara Leã o (1942-1989), Paulinho da Viola (1942-), Ivan Lins
(1945-), Djavan (1949-), Oswaldo Montenegro (1956-), Eduardo Dusek (1958-), Leila Pinheiro
(1960-), Tetê Espíndola (1954-) e muitos outros.

Os festivais de mú sica desse período tiveram grande contribuiçã o para a expressã o


cultural brasileira, popularizaram a mú sica e a sigla MPB, além de demonstrarem a diversidade
de estilos em todo o Brasil. As pessoas formavam torcidas pelas mú sicas e intérpretes, como
nos jogos esportivos. Os artistas também aproveitaram a visibilidade dos festivais como meio
de protesto contra a ditadura militar (1964-1985). Entre algumas das mais conhecidas
mú sicas diretamente relacionadas a essa perspectiva, chamadas popularmente de mú sica de
protesto, podemos citar Pra nã o dizer que nã o falei das flores, de Geraldo Vandré, Roda viva,
de Chico Buarque, É proibido proibir, de Caetano Veloso.

"Ainda fazem da flor seu mais forte refrã o


E acreditam nas flores vencendo o canhã o"

VANDRÉ , Geraldo. Pra nã o dizer que nã o falei das flores. In: ______________. Pra não dizer que não falei das flores.
Sã o Paulo: RGE,1979.

Os versos da cançã o Pra nã o dizer que nã o falei das flores, de autoria do paraibano
Geraldo Vandré (1935-), eram cantados por milhares de pessoas que torciam para que ela
fosse vencedora do I Festival de Mú sica Popular Brasileira (1968). A cançã o foi classificada em
segundo lugar e marcou a histó ria brasileira; sua letra foi cantada pela geraçã o da época e
pelas seguintes, que foram à s ruas clamar por democracia na época das eleiçõ es diretas. A
mú sica de Vandré se tornou um hino contra a ditadura militar.

A partir da década de 1960, também se estabeleceu na televisã o brasileira a cultura de


programas musicais, entre os quais o Jovem Guarda, apresentado por Roberto Carlos,
Vanderleia e Erasmo Carlos, e o Fino da Bossa, comandado por Elis Regina e Jair Rodrigues,
que contribuíram para difundir novas perspectivas à mú sica brasileira. Durante as décadas de
1970 a 1990, os programas serviram como uma vitrine dos artistas de destaque ou como
documentá rios sobre a histó ria da mú sica no Brasil. A TV Cultura de Sã o Paulo e a TV
Educativa do Rio de Janeiro (atual TV Brasil) tiveram como destaque a produçã o de programas
que documentaram a histó ria da mú sica brasileira, como o programa Ensaio, produzido desde
1990 até hoje, e programas que buscam mostrar a produçã o de novas pesquisas e propostas
musicais no Brasil.

A televisã o tornou-se cada vez mais popular e a cultura audiovisual passou a ocupar um
espaço considerá vel na vida das pessoas. A experiência coletiva de recepçã o de obras de arte
(mú sica, dança, teatro, pinturas) provoca experiências em massa e dá origem ao que
chamamos de cultura de massa. Com a mú sica no Brasil não foi diferente – a televisã o, a partir
da década de

Cultura audiovisual: reconhecida nas formas de comunicaçã o que combinam som e imagem, e os produtos criados
com estes recursos ou para serem veiculados em mídias com estas características.

Cultura de massa: conjunto de açõ es, atitudes, experiê ncias e escolhas feitas e vividas coletivamente.
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1960, tornou-se uma vitrine, os festivais televisionados e os programas de auditó rio


colocaram milhares de pessoas em contato com a experiência de assistir a uma apresentaçã o
artística gravada em vídeo, ouvir a mesma mú sica, apreciar imagens que mostravam a maneira
de se vestir de uma cantora ou grupo de artistas... Essa experiência influenciou a moda, o
comportamento da juventude da época e ajudou a lançar artistas e a consolidar suas carreiras.
Também alavancou o mercado de venda de discos, na época de vinil.

Assistimos pela telinha da televisã o a formaçã o de importantes movimentos artísticos na


mú sica popular brasileira como o Tropicalismo, com suas mú sicas que valorizavam a cultura
afro-brasileira e os ritmos da Bahia na década de 1980; o rock da Geraçã o 80 e os grupos que
apareceram a partir da década de 1990 que sã o considerados a nova geraçã o da mú sica
popular brasileira.

Vale a pena você estudar e conhecer mais sobre quais foram os artistas que podem ter
influenciado os mú sicos que você curte ouvir hoje. Nossa mú sica popular brasileira é muita
rica!

De cima para baixo, da esquerda para direita: RGE. 1966, Biscoito Fino. 2007/2009, Philips. 1972, Philips. 1966, Warner. 2002, RCA Victor. 1985

Muitos artistas, como Elis Regina, Chico Buarque, Milton Nascimento, entre outros, se consagraram nos Festivais e ficaram
conhecidos como grandes nomes da MPB.

DICA
Para navegar

• No site do Dicioná rio Cravo Albin da Mú sica Popular Brasileira você encontra informaçõ es sobre a
histó ria da MPB, seus artistas e criaçõ es, assim como informaçõ es sobre todos os festivais realizados, as obras
e artistas participantes, com comentá rios sobre os resultados e as polêmicas. Visite o endereço:
<http://tub.im/6pymb2> (acesso em: 3 mar. 2016).

• Veja pô steres com artistas da mú sica popular brasileira de vá rias épocas. Navegando pelo site:
<http://tub.im/umimix> (acesso em: 3 mar. 2016), ao clicar sobre a imagem de cada artista, além de saber seu
nome, você pode pesquisar sobre sua histó ria e suas obras.

Mú sica em festivais mundo afora


Nos Estados Unidos, em 1969, aconteceu o lendá rio festival de Woodstock
(posteriormente transformado em disco e documentá rio), marco daquela geraçã o e da
contracultura. Reunindo mais de 500000 pessoas em três dias, nele estiveram presentes
alguns dos grandes artistas da época e outros que ficariam famosos apó s o festival, como The
Who, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Jefferson Airplane, Carlos Santana, Joan Baez, Joe Cocker, entre
outros. Tudo isso em plena época de Guerra Fria contra a Uniã o Soviética e a crise sociopolítica
dos EUA com a guerra contra o Vietnã. O Woodstock representou o á pice da contracultura e da
contestaçã o dos jovens.

No ano de 1985, é criado no Brasil o Rock in Rio, até entã o o maior festival de mú sica na
América Latina tendo o rock como gênero principal. A primeira ediçã o teve 10 dias de
apresentaçõ es, com a presença de aproximadamente 1300000 pessoas. A partir de 2004, o
evento passa a ter ediçõ es também em Lisboa (Portugal), Madri (Espanha) e Las Vegas
(Estados Unidos).
Pá gina 271

O Lollapalooza é um festival anual criado em 1991 nos Estados Unidos, que conta com
artistas consagrados e revelaçõ es das vá rias vertentes do rock alternativo. Em 2010, teve
início a versã o do festival em outros países, começando no Chile. Em 2011, o evento chegou ao
Brasil e à Argentina e, posteriormente, na Alemanha e na Colô mbia.

Outros festivais que aconteceram e, eventualmente, têm reediçõ es sã o o Monsters of


Rock, originado na Inglaterra em 1980 e voltado exclusivamente para o rock pesado (a sexta
ediçã o brasileira aconteceu em 2015), e o SWU Music & Arts Festival (a sigla é de Stars With
You – Estrelas com você), evento que foi criado no Brasil, ligando a mú sica à preocupaçã o com
a sustentabilidade e o meio ambiente, e reuniu artistas da mú sica de todo o mundo em 2010 e
2011.

Rock in Rio. 1985

Cartaz da primeira edição do Rock in Rio, em 1985, com a lista dos artistas que se apresentaram no evento.

DICA
Para assistir

• Uma noite em 67. Direçã o: Renato Terra e Ricardo Calil. Produçã o: João Moreira Salles. Rio de Janeiro:
Videofilmes, 2010. DVD. Documentá rio (93 min.).

Documentá rio sobre o III Festival da Mú sica Popular Brasileira (TV Record), em 1967. Entre os
finalistas, Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil com Os Mutantes, Roberto Carlos, Edu Lobo e Sérgio
Ricardo. Registra momentos do tropicalismo, dos debates artísticos e políticos durante a ditadura e o destaque
de nomes que se tornariam ícones da mú sica brasileira. Há trechos disponíveis para visualizaçã o na internet.

• Woodstock – 3 dias de paz, amor e mú sica. Direção: Michael Wadleigh. Estados Unidos, 1994. DVD
(225 min.).

Registra o festival de Woodstock e suas principais apresentaçõ es. A primeira ediçã o, lançada nos
cinemas e em vídeo em 1970, tinha 184 min. Em reconhecimento ao significado cultural, histó rico e estético do
festival, a ediçã o original do documentá rio foi incluída no Registro Nacional de Filmes da Biblioteca do
Congresso dos Estados Unidos. Na internet há vá rios trechos disponíveis para visualização.
Giro de ideias: Trilhas sonoras
Já ouvimos falar em trilhas sonoras de filmes, novelas, minisséries de TV, lemos sobre os
festivais de mú sica no Brasil e no mundo, mas será que podemos pensar em criar trilhas
sonoras para nossa vida? Quais as mú sicas de que você mais gosta e colocaria em uma playlist?
Converse com os colegas sobre as semelhanças e diferenças nas escolhas musicais de cada um,
sobre a importâ ncia de respeitá -las como partes da histó ria da vida das pessoas.

Vamos criar um jogo com playlists de mú sicas.

• Primeiro, cada um vai escolher e gravar (no celular, por exemplo) cinco mú sicas que
considera importantes por algum motivo e trazer para a aula.

• Escreva o nome de cada mú sica e coloque em uma caixa.

• Um jogador retira um papel da caixa com o nome de uma mú sica que será ouvida por
todos.

• Depois de ouvir a mú sica, quem fez a escolha comenta o motivo. Para evitar repetiçõ es,
quem tiver escolhido a mesma mú sica também pode comentar nesse momento.

• Entrem em acordo sobre o tempo de duraçã o dos comentá rios e do jogo, pois, afinal, é
prová vel que todos tenham muitas mú sicas que sã o “trilha sonora” de histó rias da sua vida.
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Conexõ es Arte e Histó ria


Na mala da memó ria
"Nã o me iludo
Tudo permanecerá do jeito que tem sido
Transcorrendo
Transformando
Tempo e espaço navegando todos os sentidos
[...]"

GIL, Gilberto. Tempo rei. In: ______________. Raça humana. Rio de Janeiro: Warner, 1984. LP/CD. Faixa 4. Disponível
em: <http://www.gilbertogil.com.br/sec_disco_interno.php?id=24>. Acesso em: 3 mar. 2016.

Evandro Teixeira

Foto feita na Cinelândia, Rio de Janeiro, durante o discurso do então presidente da União Metropolitana dos Estudantes
(UME), Vladimir Palmeira, em 26 de junho de 1968, na Passeata dos 100 Mil, que reuniu estudantes, intelectuais e artistas do Rio de
Janeiro e de São Paulo em protesto contra a ditadura. Na foto, do centro até o canto direito, podemos ver os cantores e compositores
Caetano Veloso e Gilberto Gil, a cantora Nana Caymmi e o ator Paulo Autran, entre outros artistas.
Pá gina 273

Claudemiro/Acervo UH/Folhapress

Apresentação de Gilberto Gil com o grupo Os Mutantes (formado por Rita Lee, Sérgio Dias e Arnaldo Baptista) no III Festival
de Música Brasileira, em 1967, concorrendo com a música Domingo no parque, de Gil, que ficou em 2.º lugar.

O que um artista como Gilberto Gil (1942-) possui em sua bagagem cultural? O que traz
na “mala” da memó ria? Esse artista participou da histó ria do Brasil em momentos importantes.
Em 1968, estava na passeata contra a ditadura militar no Brasil, entre mais de cem mil pessoas.
Estudantes e artistas estavam reunidos para manifestar sua opiniã o sobre os acontecimentos
da época. Também participou de festivais de mú sica e esteve ao lado de outros artistas que
mudaram os rumos da mú sica popular brasileira com o Tropicalismo (movimento
tropicalista). No início da década de 1980, o Brasil reivindicava democracia e, em 1984, Gil
participou das grandes manifestaçõ es pelo direito ao voto direto para presidente. Era o tempo
em que o Brasil gritou “Diretas Já !”. Assim como Gilberto Gil, muitos outros artistas
participaram desse momento histó rico, estimulando a populaçã o a atuar politicamente e
exercer sua cidadania, e se mantêm criativos e participativos até hoje.

E você e os colegas? Como vocês convivem com os acontecimentos atuais? Vivemos e


pertencemos a um tempo histó rico. Contudo, podemos escolher apenas seguir o fluxo da
histó ria ou nos sentir pertencentes a um contexto e ter participaçã o ativa nele. O sentimento
de pertencimento desenvolve a ideia de não apenas estar na histó ria, mas de ter o poder de
transformá -la. É dizer: “Eu me alimento disso, isso me pertence!”. E, assim como Gilberto Gil,
seguir “[...] transcorrendo, transformando, tempo e espaço navegando [...]”.

Faça um desenho de algum acontecimento atual que chamou a sua atençã o, tentando
expressar também as sensaçõ es e reflexõ es que esse acontecimento provocou. Apresente o
desenho para a turma e organize uma exposiçã o dos trabalhos na sala de aula.
Fernando Santos/Folhapress

O comício das Diretas Já! na Praça da Sé, São Paulo, em 1984, com a participação de políticos, esportistas e artistas, reuniu
milhares de pessoas.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre Gilberto Gil, sua histó ria e sua arte no site do artista: <http://tub.im/t6n4cc>
(acesso em: 26 fev. 2016) no qual você encontrará mú sicas, fotos, vídeos e reportagens. Trata-se de material
que apresenta a uniã o entre arte e histó ria, memó ria cultural que vai além do artista, retratando aspectos
socioculturais de um país.
Pá gina 274

Vamos comer!
O que é comer, devorar culturas? Na mú sica Vamo comer, de Caetano Veloso (1942-),
assim, sem o “s” do plural mesmo, como costumamos falar com os amigos no dia a dia, o poeta
e mú sico baiano que participou do movimento tropicalista expressa bem essa ideia.

"[...] Vamo comer


Vamo comer cançã o
Vamo comer
Vamo comer poesia
Se tiver
Se não tiver entã o
Ô , ô , ô , ô [...]"

VELOSO, Caetano; COSTA, Toni. Vamo comer. Inté rpretes: Caetano Veloso e Luiz Melodia. In: ______________. Caetano.
Rio de Janeiro: Universal, 1987. LP/CD. Faixa 6. Disponível em:
<http://www.caetanoveloso.com.br/discografia.php>. Acesso em: 24 fev. 2016.

O poeta modernista Oswald de Andrade (1890-1954) fez pesquisas no início do século


XX sobre o ritual antropofá gico presente na cultura dos povos da naçã o Tupinambá . Ao
retomar essa ideia, Oswald queria afirmar tanto um resgate da histó ria do Brasil como a
necessidade da cultura em absorver as influências estrangeiras.

Ele escreveu o Manifesto Antropofá gico para difundir as ideias do movimento


antropofá gico brasileiro. Oswald defendia no manifesto o resgate da cultura primitiva, sem
deixar de lado as ideias e a arte que chegavam do estrangeiro. Era necessá rio alimentar-se de
tudo o que chegava no Brasil para dar forma à brasilidade, uma produçã o artística rica, ú nica e
pró pria.

Antropó fago é aquele que come carne humana para nutrir seu corpo físico, mas, em
algumas culturas, também há a ideia de que essa prá tica pode nutrir o espírito, absorvendo a
coragem, a força e o conhecimento da pessoa que serve de alimento. No caso da ideia de
antropofagia expressada pelos artistas, esse termo é usado como metá fora, para fazer
referência a um ser humano que se alimenta de culturas para nutrir seu repertó rio, digerir e
criar novas coisas que serã o “comidas” (arte que será consumida e interpretada) por outras
pessoas, em um ciclo de vida cultural contínuo.
Theodore de Bry. 1592. Gravura colorida. Coleção particular. Foto: The Bridgeman Art Library/Getty Images

Cenas de canibalismo, de Theodore de Bry, 1592. Gravura colorida, 24,2 cm × 33,1 cm.
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Movimento cultural sincrético


"[...] Somos todos juntos uma miscigenaçã o
E não podemos fugir da nossa Etnia
[...]

Maracatu psicodélico
Capoeira da pesada
Bumba meu rá dio
Berimbau elétrico

Frevo, samba e cores


Cores unidas e alegria
Nada de errado em nossa ETNIA."

SCIENCE, Chico; MAIA, Lú cio. Etnia. Inté rprete: Chico Science & Naçã o Zumbi. In: _____. Afrociberdelia. Rio de
Janeiro: Sony Music, 1996. CD. Faixa 3. Disponível em: <http://www.recife.pe.gov.br/chicoscience/>. Acesso em: 24
fev. 2016.

No Brasil, a mistura de povos provocou, também, o encontro das culturas de grupos


diferentes. Esse processo de fusã o de culturas é chamado de sincretismo cultural. Isso
acontece quando duas ou mais culturas se misturam em sua fé, sua arte e seus costumes. Dessa
simbiose cultural podem surgir movimentos culturais sincréticos, como o movimento
Manguebeat.

Manguebeat: (também escrito como manguebit ou mangue beat) é um movimento cultural (principalmente na
mú sica) criado por volta de 1990, no Recife, estado de Pernambuco, que ficou conhecido internacionalmente. Mangue é um
ambiente formado por á rvores de raízes longas que se espalham pelas areias à beira de rios pró ximos a litorais. Ambientes
naturais ricos em crustá ceos (principalmente caranguejos e siris), peixes e moluscos. No Brasil, muitas populaçõ es
ribeirinhas e litorâ neas vivem da extraçã o de recursos desses locais. Beat é uma palavra da língua inglesa que, em
portuguê s, significa bater, batida. Na mú sica, esse termo é usado geralmente para fazer referê ncia ao toque, batida, cadê ncia,
ou seja, o jeito de tocar, bater, executar um ritmo. As mú sicas desse movimento têm como referê ncia ritmos nordestinos,
principalmente o maracatu, misturando-o a estilos musicais diversos. Seus temas abordam principalmente a crítica aos
preconceitos e à s injustiças sociais, alé m da valorizaçã o e respeito ao meio ambiente.

Fazer misturas culturais, olhar ao redor e criar grupos de pessoas que compartilham das
mesmas ideias e interesses é frequente na histó ria da mú sica popular brasileira. Na letra da
mú sica Etnia, apresentada acima (1996), de Chico Science (1966-1997), gravada por ele com o
grupo Naçã o Zumbi, lemos que “Somos todos juntos uma miscigenaçã o”; nó s, nossos gostos,
influências e escolhas culturais. É natural termos necessidades e vontades. Entã o, pense sobre
isso e pergunte-se: “Quem sou eu? O que eu gosto de ouvir, de ver, de cantar, de dançar, de
curtir na arte?”.
Afrociberdelia. Chico Science & Nação Zumbi. Gravadora: Sony Music. 1996

Reprodução da capa do CD Afrociberdelia, de Chico Science & Nação Zumbi, 1996. No centro da capa, o músico Chico
Science (de camiseta verde).
Pá gina 276

O movimento Manguebeat propô s, desde seu início, na década de 1990, misturar


tradiçõ es folcló ricas e ritmos nordestinos, principalmente o maracatu, com rock, hip-hop e
mú sica eletrô nica, explorando a fusã o entre culturas locais e mundiais. Percebemos nos ritmos
musicais escolhidos pelos adeptos desse movimento cultural e artístico a tradiçã o e a
modernidade. Usam instrumentos e efeitos sonoros dados pelas tecnologias (como guitarras
elétricas, sintetizadores sonoros, entre outros) e também instrumentos tradicionais da cultura
popular brasileira (como tambores, atabaques, alfaias). Ainda hoje, grupos como Mestre
Ambró sio e Sheik Tosado, além do pró prio Naçã o Zumbi, vêm desenvolvendo essa mistura.

Os artistas do Manguebeat também se preocupam com a vida social e o meio ambiente,


principalmente em relaçã o à preservaçã o da natureza dos mangues e da tradiçã o cultural de
seus moradores. Os principais divulgadores do movimento foram Chico Science e o grupo
Naçã o Zumbi, Fred Zero Quatro (ou Fred 04), Monbojó e o grupo Mundo Livre S/A.

Movimentos como o Modernismo, o Tropicalismo e o Manguebeat sã o exemplos do


antropofagismo cultural, que ocorre a partir da nutriçã o estética. O que isso quer dizer? Entre
outras coisas, que tudo que você degusta de mú sica e outras formas de arte pode influenciar
em sua criaçã o.

Com base na ideia de antropofagia cultural, pense nesta pergunta: Você se “alimenta” de
quê? Que produtos culturais você costuma consumir para nutrir o seu repertó rio cultural?

Mundo Livre S.A. Vs Nação Zumbi. Gravadora Deck. 2013

O caranguejo de manguezal, uma das fontes de sustento dos povos da região, tornou-se também símbolo do movimento
Manguebeat.
Pá gina 277

A arte de Chico Science


"[...] E a cidade se apresenta
Centro das ambiçõ es
Para mendigos ou ricos
E outras armaçõ es
Coletivos, automó veis,
Motos e metrô s
Trabalhadores, patrõ es,
Policiais, camelô s [...]."

SCIENCE, Chico. A cidade. Inté rprete: Chico Science & Naçã o Zumbi. In: _____. CSNZ. Rio de Janeiro: Sony Music, 1997.
CD. Disco 2. Faixa 3. Disponível em: <http://www.recife.pe.gov.br/chicoscience/>. Acesso em: 25 fev. 2016.

O pernambucano Francisco França (1966-1997), artisticamente conhecido como Chico


Science, foi um dos fundadores e líder do grupo musical pernambucano Naçã o Zumbi (1990-).
Em suas composiçõ es musicais, Chico Science sempre utilizou a fusã o de referências, mas
mantendo a construçã o de identidades culturais autênticas. Foi responsá vel pela composiçã o
de vá rias mú sicas que misturavam literatura de cordel a temas urbanos. Envolveu-se
ativamente em movimentos sociais pela melhoria de vida das pessoas e valorizaçã o da cultura
nordestina e afrodescendente, como a cultura hip-hop. Com o grupo Naçã o Zumbi, desenvolveu
uma mú sica que misturava ritmos e gêneros nordestinos, como o maracatu, com outras
influências musicais, passando pelo rock, hip-hop, punk rock, samba, reggae e mú sica
eletrô nica. Foi líder do movimento Manguebeat, com o grupo Naçã o Zumbi, ao lado de grupos
como Mestre Ambró sio, Mundo Livre S/A, Sheik Tosado, entre outros.

Marcelo Soubhia/Folhapress

Chico Science em show com figurino inspirado nas fantasias do maracatu. Foto de 1994.

Palavra do artista
“Eu acho que essa tensã o cultural é sofrida no Brasil inteiro. É uma questã o de trabalhar
os ritmos regionais. De você ter o que fazer e ter elementos para trabalhar. Nã o só no Nordeste
como no resto do Brasil.”

Chico Science.

SILVA, Walter de. Interview: Chico Science − do mangue para o mundo. Brazilian Music Up to Date. Disponível em:
<http://www2.uol.com.br/uptodate/up3/interind.htm>. Acesso em: 25 fev. 2016.

Tasso Marcelo/Estadão Conteú do

Cantor e compositor Chico Science, líder da banda Nação Zumbi. Foto de 1994.

DICA
Para navegar

Para conhecer mais sobre a obra de Chico Science, sua forma de ver a sociedade e a arte e como ele
registrou as misturas de culturas do nordeste brasileiro e do mundo em seus trabalhos com o grupo Naçã o
Zumbi, visite os sites a seguir:

• Acervo de Chico Science na internet: <http://tub.im/8be2gc> (acesso em: 25 fev. 2016).

• Entrevista com Chico Science: <http://tub.im/zts9fa> (acesso em: 25 fev. 2016).

• Pá gina de Chico Science: <http://tub.im/8cj44a> (acesso em: 25 fev. 2016).


Pá gina 278

Conexõ es Arte, pluralidade cultural e meio ambiente


Tudo junto e misturado
Os artistas costumam criar com base em suas referências e seus olhares para si, para o que
está à sua volta, para o mundo todo e para todo o mundo, observando e percebendo tanto o local
quanto o global.

No Brasil, é forte a influência de pertencermos a um povo miscigenado, mestiço, formado por


muitas etnias, e essas mistura é captada pela sensibilidade de muitos artistas. Isso acontece, por
exemplo, com o movimentos artístico Manguebeat, originado no Recife no início dos anos 1990.
Para expressar e divulgar suas ideias, os membros de movimentos artísticos criam textos em forma
de Manifesto. Essa também foi a atitude tomada por Fred Zero Quatro (1965-), jornalista e mú sico
pernambucano da banda Mundo Livre S/A que, em 1992, escreveu o manifesto Caranguejos com
cérebro, em que falava sobre o sentido das mú sicas e os objetivos desse movimento cultural
sincrético conhecido como Manguebeat.

Movimento cultural sincrético: (ou de sincretismo cultural) refere-se ao movimento artístico que se baseia na
fusã o de elementos culturais diversos ou de culturas distintas.

Hans Von Manteuffel/Pulsar

Escultura de caranguejo, de Augusto Ferrer, na Rua da Aurora, no Recife (PE). O caranguejo, ligado à cultura de subsistência
na região do mangue, fonte de alimento e de renda da população ribeirinha. Sucata de ferro, com tratamento especial para evitar
oxidação, 7 m × 5,5 m.

Leia, agora, alguns trechos do manifesto Caranguejos com cérebro:

“Mangue, o conceito.

Estuá rio. Parte terminal de rio ou lagoa. Porçã o de rio com á gua salobra. Em suas
margens se encontram os manguezais, comunidades de plantas tropicais ou subtropicais
inundadas pelos movimentos das marés. Pela troca de matéria orgâ nica entre a á gua doce e a
á gua salgada, os mangues estã o entre os ecossistemas mais produtivos do mundo.

[...]

Nã o é por acaso que os mangues sã o considerados um elo bá sico da cadeia alimentar


marinha. [...] para os cientistas sã o tidos como símbolos de fertilidade, diversidade e riqueza.

Manguetown, a cidade

A planície costeira onde a cidade do Recife foi fundada é cortada por seis rios. Apó s a
expulsã o dos holandeses, no século XVII, a (ex)cidade ‘maurícia’ passou a crescer
desordenadamente à s custas do aterramento indiscriminado e da destruiçã o de seus
manguezais.
Pá gina 279

Em contrapartida, o desvario irresistível de uma cínica noçã o de ‘progresso’, que elevou


a cidade ao posto de ‘metró pole’ do Nordeste, nã o tardou a revelar sua fragilidade. Bastaram
pequenas mudanças nos ventos da histó ria, para que os primeiros sinais de esclerose
econô mica se manifestassem, no início dos anos setenta. Nos ú ltimos trinta anos, a síndrome
da estagnaçã o, aliada à permanência do mito da ‘metró pole’ só tem levado ao agravamento
acelerado do quadro de miséria e caos urbano.

Mangue, a cena

Emergência! Um choque rá pido ou o Recife morre de infarto! [...] O modo mais rá pido,
também, de infartar e esvaziar a alma de uma cidade como o Recife é matar os seus rios e
aterrar os seus estuá rios. O que fazer para nã o afundar na depressã o crô nica que paralisa os
cidadã os? Como devolver o â nimo, deslobotomizar e recarregar as baterias da cidade? Simples!
Basta injetar um pouco de energia na lama e estimular o que ainda resta de fertilidade nas
veias do Recife.

Em meados de 91, começou a ser gerado e articulado em vá rios pontos da cidade um


nú cleo de pesquisa e produçã o de ideias pop. O objetivo era engendrar um ‘circuito energético’,
capaz de conectar as boas vibraçõ es dos mangues com a rede mundial de circulaçã o de
conceitos pop. Imagem símbolo: uma antena parabó lica enfiada na lama.

Hoje, os mangueboys e manguegirls sã o indivíduos interessados em hip-hop, colapso da


modernidade, caos [...], Jackson do Pandeiro, Josué de Castro, rá dio [...], mú sica de rua, conflitos
étnicos, midiotia [...]. Bastaram poucos anos para os produtos da fá brica mangue invadirem o
Recife e começarem a se espalhar pelos quatro cantos do mundo. A descarga inicial de energia
gerou uma cena musical com mais de cem bandas. No rastro dela, surgiram programas de
rá dio, desfiles de moda, videoclipes, filmes e muito mais. Pouco a pouco, as artérias vã o sendo
desbloqueadas e o sangue volta a circular pelas veias da Manguetown.”

ZERO QUATRO, Fred. Trechos de Caranguejos com cérebro (manifesto), o primeiro manifesto do Mangue, em sua
versã o original de 1992. Disponível em: <http://www.recife.pe.gov.br/chicoscience/textos_manifesto1.html>. Acesso em: 3
mar. 2016.

Pensando nas discussõ es levantadas nesse manifesto, o que há de bom em sua comunidade?
Quais os problemas a resolver? Que tal criar um movimento cultural e colocar suas ideias em um
texto na forma de um manifesto?
Pá gina 280

Projeto experimental
Criando um novo som
"[...] Eu organizo o movimento
Eu oriento o carnaval
Eu inauguro o monumento no planalto central
Do país
Viva a bossa-sa-sa
Viva a palhoça-ça-ça-ça-ça [...]"

VELOSO, Caetano. Tropicá lia. In: ______________. Caetano Veloso. Rio de Janeiro: Universal, 1967. LP/CD. Faixa 1.
Disponível em: <www.caetanoveloso.com.br/discografia.php>. Acesso em: 3 mar. 2016.

Artistas se conectam e organizam movimentos, criam arte juntos, podem debater sobre
ideias do passado e sobre os acontecimentos recentes. Os tropicalistas compartilhavam da ideia de
antropofagia, que Oswald de Andrade já tinha anunciado por meio do Manifesto Antropó fago, em
1928.

Os artistas do movimento tropicalista deram um novo rumo à arte brasileira, a partir da


década de 1960. Nesse movimento havia muita experimentaçã o. Sons de instrumentos usados
tradicionalmente em um gênero musical, como o pandeiro no samba ou a guitarra no rock, podiam
estar tudo junto e misturado em uma ú nica mú sica tropicalista. Na salada de culturas que se
alimentavam umas das outras, essa mistura apresentou ao Brasil e ao mundo um som original: um
som tropicalista.

Pesquise mais sobre esse movimento artístico. Depois, crie com os colegas um laborató rio
musical, misturando gêneros musicais, culturas, sons... Veja algumas sugestõ es a seguir.

Sons misturados – Se na turma tiver quem toque algum instrumento, vocês podem criar
mú sicas usando vá rios tipos de instrumentos em uma ú nica composiçã o. Outra proposta é
pesquisar na internet vá rios sons de diferentes instrumentos e fazer arranjos mixados, misturando
os sons, colocando para tocar todos ao mesmo tempo ou combinados em dois ou três sons por vez.

Jogo musical – Um jogo para misturar sons pode ser divertido de fazer com a turma. Cada um
deve trazer o som de um instrumento, ruído ou voz gravado em celulares (ou outro material). Vocês
também precisarã o de um dado para jogar. Um jogador lança o dado. Se cair no nú mero dois, um
par de sons de diferentes instrumentos ou vozes é tocado. Se o resultado for o três, o jogo segue da
mesma maneira, tocando três sons ao mesmo tempo.

Jogue e experimente misturar sons! Você é o artista!


Capa do disco Tropicalia ou panis et circencis. Gravadora: Philips. 1968

Capa do disco-manifesto do movimento tropicalista Tropicalia ou panis et circencis, de 1968. Em sentido horário: Arnaldo
Baptista, Caetano Veloso (com uma foto de Nara Leão), Rita Lee, Sérgio Dias, Tom Zé, Torquato Neto, Gal Costa, Gilberto Gil (com uma
foto de Capinam), Rogério Duprat.
Pá gina 281

TEMA 3 TEM GENTE QUE


GUARDA CADA COISA!
"Guardar uma coisa nã o é escondê-la ou trancá -la.
[...]
Guardar uma coisa é olhá -la, fitá -la, mirá -la por
admirá -la, isto é, iluminá -la ou ser por ela iluminado.
[...]"

CICERO, Antonio. Guardar. In: ______________. Guardar. Rio de Janeiro: Record, 1996. Disponível em:
<http://www2.uol.com.br/antoniocicero/>. Acesso em: 24 maio 2016.

Uma coleçã o pode se iniciar por muito motivos, mas a mania de guardar coisas existe
desde o início das civilizaçõ es. Na Grécia antiga, nas escolas de Filosofia, conhecidas como
liceus, os mestres filó sofos guardavam coisas para servir de estudos. Nos mosteiros da Idade
Média, havia salas fechadas a sete chaves que guardavam objetos considerados profanos,
tesouros da Antiguidade ligados a culturas diferentes do cristianismo. Já os nobres guardavam
de tudo em seus castelos, em salas chamadas de gabinetes, nas quais colecionavam desde
objetos antigos e obras de arte até animais em taxidermia (empalhados).

No decorrer dos tempos, muitas coisas foram colecionadas. Observe a foto a seguir.

Wellcome Library, London

Major-general Horatio Gordon Robley com parte da sua coleção de cabeças Maori tatuadas, 1895. Fotografia, 18,4 cm ×
21,4 cm.
Essa foto revela uma das coleçõ es mais estranhas da histó ria: o acervo de cabeças
tatuadas do major-general português Horatio Gordon Robley (1840-1930). Essas cabeças eram
de membros da civilizaçã o Maori, de chefes da tribo que os indígenas preservavam por meio de
processo de mumificaçã o. A tatuagem era um costume entre esse povo, cujos desenhos
possuíam vá rios significados e ainda hoje sã o escolhidos por pessoas que gostam de marcar
seus corpos com imagens. O major Robley comprou boa parte da sua coleçã o em lojas de
curiosidades na Europa. A coleçã o chegou a ter 35 cabeças que, hoje, pertencem a maioria a
museus, expostas ao pú blico como exemplo dessa cultura.
Pá gina 282

Colecionismo: a mania de guardar

Galit Seligmann/Alamy/Glow Images

Museu de Arte Contemporânea de Niterói, Rio de Janeiro. Projeto de Oscar Niemeyer inaugurado em 1996. Foto de 2008.

Uma coleçã o geralmente tem um tema em comum a todos os objetos. Para algumas
pessoas, pode ser um hobby; para outras, um negó cio, uma mania. Em outros casos, sã o de
interesse cultural de uma sociedade. Temos notícias de coleçõ es de carros, moedas, pedras,
sapatos, brinquedos, reló gios, figurinhas, revistas, livros, álbuns de mú sicas, coleçõ es de obras
de arte, entre tantas.

Os itens de uma coleçã o sã o de interesses e escolhas de cada colecionador ou grupo. As


coleçõ es podem ser particulares ou pú blicas, individuais ou coletivas. Podem ser de interesse
artístico, histó rico, técnico, científico ou de cará ter pessoal, à s vezes envolvendo mais de um
desses aspectos.

Há instituiçõ es criadas para abrigar coleçõ es, como os museus, que preservam esses
acervos para apreciaçã o do pú blico. Temos museus para muitos temas. Engana-se quem acha
que museu é lugar de guardar coisas velhas. Há museus de arte contemporâ nea, de ciência, de
arte e tecnologia e outros saberes atualíssimos, além daqueles voltados aos acervos antigos.
Praticamente tudo pode ser importante para guardar, conservar e, naturalmente, compartilhar
com o pú blico, como bem nos alerta o poeta, filó sofo e escritor carioca Antonio Cicero (1945-),
irmã o da cantora e compositora Marina Lima (1955-), no poema que abre este tema.
Emiliano Di Cavalcanti. 1955. Ó leo sobre tela. Acervo da Fundação Cultural Ema Gordon Klabin

Retrato de mulata, de Di Cavalcanti, 1955. Óleo sobre tela, 100 cm × 81 cm.

Vaso (Aryballos) de Corinto, Grécia. Cerâmica pintada, séc. VI a.C.

Acervo da Fundação Cultural Ema Gordon Klabin


Pá gina 283

DICA
Para navegar

O Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), oferece o Guia dos museus brasileiros, que traz dados sobre
mais de 3000 museus, incluindo 23 museus virtuais, já mapeados pelo Ibram em territó rio nacional. Nele você
pode localizar o museu mais pró ximo da sua casa ou da escola e aventurar-se nesse ambiente que prioriza as
diversas linguagens da arte e suas origens. Visite: <http://tub.im/hvpraa>(acesso em: 8 mar. 2016). Conheça
mais sobre os museus de todo o Brasil.

Sensaçõ es para guardar


Guardar objetos pode ser importante, mas há artistas que preferem guardar sensaçõ es,
como o francês Marcel Duchamp (1887-1968) e a brasileira Brígida Baltar (Rio de Janeiro,
1959-).

Você já esteve em um lugar ou viveu um momento de que gostou muito? Um dia com os
amigos, com a família, uma festa, uma viagem... Duchamp provavelmente gostava muito da
sensaçã o de estar em Paris. Por essa razã o, guardou o ar dessa cidade em um frasco, em 1919.
A cidade de Paris, entre o final do séc. XIX e início do séc. XX, era o berço da arte. Muitos
artistas, famosos ou nã o, passaram pela metró pole conhecida como Cidade Luz. Guardar o ar
de Paris dessa época foi como conservar as fragrâ ncias dos perfumes franceses, dos cafés, das
praças, das exposiçõ es, o ar cheio de conversas sobre arte. O artista lacrou um pequeno objeto
de vidro (observe ao lado) e, assim, estava pronto mais um de seus ready mades, chamado de
Ar de Paris. Trata-se de um tipo de arte também conhecido como arte conceitual.

A artista carioca Brígida Baltar faz coletas de neblina, orvalho, maresia e guarda em
pequenos receptá culos. Ao recolher essas sensaçõ es e atmosferas, a artista elabora
performances que sã o fotografadas e filmadas. Observe abaixo a foto da artista em plena coleta.
Nas galerias e museus, essas fotos e vídeos sã o exibidos com as instalaçõ es e objetos artísticos
que a artista cria. Assim como na obra de Duchamp, trata-se de uma arte subjetiva, conceitual,
que captura as sensaçõ es e percepçõ es do tempo e do espaço.
Marcel Duchamp. Séc. XX. Ready made: ampola de vidro. Museu de Arte Moderna, Paris. Foto: RMN/Otherimages

Ar de Paris, de Marcel Duchamp, 1919. Ready made: ampola de vidro, diâmetro 6,35 cm × 13,3 cm.

Brígida Baltar. 1999. Galeria Nara Roesler, São Paulo

A coleta da neblina, de Brígida Baltar, 1999. Fotografia, 40 cm × 60 cm.


Pá gina 284

A arte de BRÍGIDA BALTAR


Brígida Baltar (1959-) nasceu no Rio de Janeiro, cidade onde ainda vive e trabalha. A sua
arte a representa em vá rios regiõ es do mundo. Já participou de bienais e mostras de arte
coletivas e fez diversas exposiçõ es internacionais em países americanos e europeus. Seus
trabalhos foram selecionados para vá rias coleçõ es em museus e galerias brasileiras, dos
Estados Unidos e do México, por exemplo.

Brígida Baltar começou a desenvolver sua obra na década de 1990, por meio de
pequenos gestos poéticos realizados na sua casa, que também é seu ateliê. Durante cerca de
dez anos, a artista colecionou materiais da vida doméstica, como a á gua de goteiras ou a poeira
dos tijolos das paredes para suas criaçõ es. As açõ es domésticas foram se expandindo para o
espaço da rua, originando obras como a série Coletas, da qual já vimos uma amostra na pá gina
anterior. Essa forma de arte, conceitual e subjetiva, por basear-se em elementos tão comuns e
conhecidos, redimensionados em suas percepçõ es de espaço e tempo, pode provocar
sensaçõ es muito pessoais em cada um que a aprecia.

Palavra do artista

“Nos anos noventa descobri a casa como matéria de investigaçã o para meu trabalho. Ali,
comecei certas açõ es e algumas escavaçõ es que foram se tornando cada vez maiores [...]. Com
tijolos desenvolvi uma série de pequenas esculturas e quando me mudei desta casa levei
aqueles que havia retirado, agora em pó . [...] Tornar a casa em pó dá um sentido de
desmaterializaçã o que sempre me interessou e ainda dá a ideia de desconstruir ao transformar
um material rígido em tã o maleá vel. É também como levar a casa para outros lugares, uma
casa mó vel, que viaja pelo mundo.”

Brígida Baltar

GALERIA Nara Roesler. Brígida Baltar: portfó lio. Rio de Janeiro: Galeria Nara Roesler, 2015. p. 3. Disponível em:
<www.nararoesler.com.br/usr/library/documents/main/34/portfolio-gnr-br-gida-baltar-web_res_2015.pdf>. Acesso em: 4
mar. 2016.

Julia Moraes/Folhapress

Brígida Baltar expõe grande parte de suas obras na galeria Nara Roesler. Foto de 2007.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre a artista Brígida Baltar, seu processo de criaçã o, sua poética e suas obras
visualizando o portfó lio ilustrado e comentado criado pela galeria Nora Roesler, que representa a artista. No
site: <http://tub.im/uqhhnu> (acesso em: 4 mar. 2016).

Giro de ideias: Coleçõ es de arte


Bibliotecas possuem acervos de livros, pinacotecas têm coleçõ es de pinturas, filmotecas
guardam e cuidam de produtos audiovisuais, como coleçõ es de filmes, minisséries, novelas de
TV, desenhos de animaçã o e outras gravaçõ es de imagens em movimento, assim como uma
“musicoteca” guarda arquivos em á udio, mú sicas, partituras (escritas musicais), instrumentos
e gravaçõ es em vídeos, como videoclipes e documentá rios relacionados à mú sica. Cada tipo de
acervo leva um nome específico.

Você coleciona ou já colecionou alguma coisa? Qual o nome da sua coleçã o? Conhece
alguém que faz coleçõ es? Reflita sobre:

• o objeto que você coleciona ou irá colecionar. Por que escolheu este objeto?

• o espaço que terá para acomodar os objetos da sua coleçã o. Você usará pastas, caixas
ou espaços maiores para armazená -la?

• a origem de sua coleçã o. Você fará a coleçã o com objetos comprados, doados ou
presenteados?

• a coleçã o pode ser vista por todos ou só por você?

Que tal criar uma exposiçã o das coleçõ es da turma? Certamente será curioso, divertido e
instrutivo compartilhar esses acervos.
Pá gina 285

Conexõ es Arte e Língua Portuguesa


Gavetas para me guardar
Herá clito de É feso (535 a.C.-475 a.C.) falava sobre os devires das coisas, em que tudo que
está no mundo flui. Uma das suas frases mais famosas diz que nã o podemos entrar duas vezes no
mesmo rio, pois ele já nã o será o mesmo, nem nó s. A cada instante mudamos, assim como as á guas
do rio, que no momento seguinte já percorrem outros territó rios. Clarice Lispector (1920-1977)
escreveu que é importante estarmos sempre na iminência de mudanças.

"É . Parece que estou mudando o modo de escrever. [...] Escrevo em traços vivos e
ríspidos de pintura. Estarei lidando com fatos como se fossem as irremediá veis pedras
de que falei. Embora queira que para me animar sinos badalem enquanto adivinho a
realidade. E que anjos esvoacem em vespas transparentes em torno de minha cabeça
quente porque esta quer se transformar em objeto-coisa, é mais fá cil.
Será mesmo que a açã o ultrapassa a palavra?
Mas que ao escrever – que o nome real seja dado à s coisas. Cada coisa é uma palavra.
E quando nã o se a tem, inventa-se-a."

LISPECTOR, Clarice. A hora da estrela. 23. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995.

Apesar de estarmos em mudança, podemos guardar o que já fomos. Gavetas, caixas, baú s
podem abrigar coisas que guardamos por algum motivo, sã o objetos significativos para nossa
histó ria. Onde você costuma conservar seus guardados, objetos, suas experiências? O que tem em
suas gavetas, caixas, baú s? Que linguagens artísticas podemos usar para contar sobre nossos
guardados?

Na arte, há muitas linguagens por meio das quais podemos nos expressar. Clarice Lispector
escolheu a linguagem das palavras, a arte da literatura.

O pintor catalã o Salvador Dalí (1904-1989) fez uma série de imagens surrealistas em que
trata do tema “gavetas” e seus guardados, abordando o universo do subconsciente, daquilo que está
escondido, mas que pode se revelar a qualquer momento. Dalí escolheu para essas imagens a
linguagem da escultura, do desenho e da pintura. Na pá gina seguinte, trazemos uma imagem que
mostra uma escultura. O paulista Candido Portinari (1903-1962) colocou em vá rias de suas
pinturas pequenos baú s ao lado de pessoas retirantes. Um povo migrante, humilde, que de um lugar
para o outro sempre carregava seu baú de guardados. Em que linguagem artística você quer se
expressar para falar sobre suas memó rias, guardados, sonhos, mudanças?
André Neves

Uma das salas da exposição Clarice Lispector – a hora da estrela, em Bogotá, Colômbia, em 2012. Transformada em um
imenso gaveteiro, com 2000 gavetas, das quais só 65 delas tinham chaves e podiam ser abertas, e nas quais os visitantes
encontravam alguns dos tesouros de Clarice, como frases, cartas e objetos. Essa exposição teve início no Museu da Língua
Portuguesa, em São Paulo, SP, em 2007.
Pá gina 286

Salvador Dalí. 1979-1982. Bronze com pátina escura. Coleção particular. Foto: Araldo de Luca/Corbis/Latinstock

The Anthropomorphic Cabinet, de Salvador Dalí, 1979-1982. Escultura em bronze com pátina escura, 60 cm × 30 cm.

Candido Portinari. 1936. Ó leo sobre tela. Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro. Reprodução autorizada por João Candido Portinari. Imagem do acervo do Projeto Portinari

Retirantes, de Candido Portinari, 1936. Óleo sobre tela, 60 cm × 73 cm.

DICA
Para navegar

Assistir à entrevista com a escritora Clarice Lispector é mergulhar em um mar de possibilidades e


personalidades humanas. Essa entrevista foi dada para a TV Cultura de Sã o Paulo, no programa Panorama
Especial, em 1977, um pouco antes de sua morte, e está disponível em: <http://tub.im/6utgg4> (acesso em:
26 fev. 2016).

Projeto experimental
Coletas sensoriais
Você pode imaginar alguém que escolheu, entre tantas coisas que existem no mundo,
guardar o ar de Paris? Ou coletar a neblina? A brisa do mar? Vimos essa atitude artística nas obras
de Marcel Duchamp e Brígida Baltar. E você, se fosse guardar uma sensaçã o, como faria? Onde
guardaria? Usaria um objeto como um pote de vidro? Ou fotografaria essa sensaçã o?
Há momentos que queremos guardar para sempre. Vamos tentar? Pense em um projeto
sobre guardar sensaçõ es, atmosferas, percepçõ es sensíveis das situaçõ es e dos ambientes ao seu
redor.

Escolha os materiais e as linguagens que considerar apropriados para fazer seu projeto
artístico.

Maria José Braga Falcão

Projeto Tempo de Arte: duração para coletas subjetivas. Realizado pelos alunos de uma escola pública da cidade de
Itapetininga, São Paulo. Acervo pessoal da professora Maria José Falcão, coordenadora do projeto. Foto de 2013.
Pá gina 287

TEMA 4 O PATRIMÔNIO
NOSSO DE CADA DIA

Laurent Guerinaud/Keystone

Vista de Brasília, DF, com destaque para a Catedral Metropolitana, parte da Esplanada dos Ministérios e o Palácio do
Congresso Nacional ao fundo. Foto de 2013.

"[...] Só há um meio eficaz de assegurar a defesa permanente do patrimô nio


de arte e de histó ria do país: é o da educaçã o popular [...]"

ANDRADE, Rodrigo Melo Franco de. In: Educação patrimonial: reflexos e prá ticas. Á tila Bezerra Tolentino (org.). Joã o
Pessoa: Superintendê ncia do Iphan na Paraíba, 2012.

Os museus, prédios histó ricos, praças e monumentos pú blicos sã o como a nossa casa,
nos pertencem, fazem parte do nosso patrimô nio, sã o nossa herança cultural. Somos donos de
objetos, de lugares e até de cidades inteiras, como a cidade de Brasília, Sã o Luís, no Maranhã o,
e o bairro do Pelourinho, em Salvador.
Nestor Javier Beremblum/LatinContent/Getty Images

Vista da arquitetura do Pelourinho, bairro histórico de Salvador, BA. Foto de 2012.


Pá gina 288

Luis Salvatore/Pulsar

Casario colonial no centro histórico de São Luís (MA), exemplo de patrimônio material. Foto de 2012.

A palavra patrimô nio tem sua origem no grego pater, que significa “pai” ou “paterno”.
Patrimô nio, portanto, está relacionado com tudo aquilo que é transmitido ou deixado de pai
para filho. Com o decorrer do tempo, porém, a palavra patrimô nio passou a ser utilizada para
designar bens de natureza material e imaterial considerados importantes para a identidade
das sociedades, sejam eles culturais ou naturais.

Acervos de museus, cidades histó ricas, parques ecoló gicos, sítios arqueoló gicos, prédios,
teatros e outros que podemos tocar sã o nossos bens materiais. Já os bens imateriais sã o os
demais, por exemplo os costumes, as danças (como o frevo), mú sicas, festas, a Feira de
Caruaru, a capoeira, o modo artesanal de fazer o queijo de minas e os quitutes do tabuleiro das
baianas, as matrizes do samba, no Rio de Janeiro, ou mesmo algumas religiõ es, como o
candomblé.

No Brasil, o ó rgã o responsá vel por cuidar do Patrimô nio Histó rico Brasileiro é o Iphan
(Instituto do Patrimô nio Histó rico e Artístico Nacional). Quando o patrimô nio cultural é
preservado legalmente e na prá tica, a memó ria e a identidade de uma sociedade sã o
conservadas.

Zoonar GmbH/Alamy/Glow Images


Detalhe de bateria de escola de samba, exemplo de patrimônio imaterial. Foto de 2012.

Marco Antô nio Sá/Pulsar

Grupo folclórico Maracatu Leão Colorado, na Noite dos Tambores Silenciosos, em Olinda, PE, exemplo de patrimônio
imaterial. Foto de 2010.
Pá gina 289

DICA
Para navegar

Conheça os projetos de preservaçã o, restauro e tombamento de bens patrimoniais, materiais ou


imateriais, disponibilizado pelo Instituto do Patrimô nio Histó rico e Artístico Nacional (Iphan) navegando pelo
site: <http://tub.im/dndshz> (acesso em: 26 fev. 2016).

Pré dio tombado também cai?


Ao observarmos a Torre de Pisa, na Itália, podemos temer que ela possa tombar,
literalmente, ou seja, cair. Entretanto, ela está resguardada desse destino porque pertence ao
Patrimô nio Mundial da Humanidade e, em funçã o disso, está tombada no outro sentido, o de
que seja preservada e protegida para que nunca caia. Pelo menos essa é a intençã o.

Questõ es ligadas ao tipo de solo, material empregado e maneira de construí-la


provocaram o problema da inclinaçã o. Muito do que se conhece na tecnologia em construçã o já
foi empregado nesse bem material para que continue a fascinar milhares de pessoas que
visitam o conjunto arquitetô nico de Pisa.

Os bens materiais e imateriais sã o patrimô nios. Eles passam por um processo de


pesquisa e validaçã o e, entã o, sã o “tombados”. O processo de tombamento equivale a registrar,
com o objetivo de proteger, controlar, cuidar e guardar (documentar). Esse registro é feito no
livro do “Tombo”. Daí vem o nome tombamento.

Uma vez registrado o bem, podem ser elaborados projetos e políticas pú blicas que
envolvam açõ es necessá rias à preservaçã o dessa manifestaçã o.

Joana Kruse/Alamy/Glow Images


Torre de Pisa, na Itália. Com 14700 toneladas e 55,86 metros de altura. Iniciada em 1173, sua construção só foi concluída
em 1350.

As maravilhas do mundo
Cada monumento tem sua histó ria. Na Índia, o Taj Mahal (construído entre 1632 e 1653)
foi um desejo do príncipe Shah-Jehan para abrigar o corpo da princesa Mumtaz Mahal, como
prova de amor eterno.

A eternidade também foi o motivo pelo qual fez surgir no meio do deserto as pirâ mides,
a esfinge e outras construçõ es que marcaram a civilizaçã o egípcia. Muitas obras construídas
sã o inspiradas em histó rias de amor, em crenças religiosas ou nas formas da natureza.
Algumas obras sã o muito antigas e outras mais recentes.

Na contemporaneidade, o Templo de Bahai, inaugurado em 1996, recebe milhares de


pessoas para contemplar as formas simétricas da forma da flor-de-ló tus. A imagem dessa flor
está presente como um signo sagrado para religiõ es como o hinduísmo, o budismo e o
islamismo. A flor-de-ló tus representa sabedoria, purificaçã o, vida longa, espiritualidade e boa
sorte, e suas delicadas formas já eram encontradas em esculturas e pinturas no Egito antigo.
Esse templo sagrado é símbolo da harmonia porque respeita e atende vá rias crenças.

Waj/Shutterstock/Glow Images

Taj Mahal, na cidade de Agra, na Índia, inaugurado em 1648. Faz parte do Patrimônio Cultural da Humanidade. Foto de
2010.
Pá gina 290

saiko3p/Shutterstock/Glow Images

Templo de Bahai (com suas pétalas e as piscinas), conhecido como Templo de Lótus, projeto do arquiteto Furiburz Sabha,
em Délhi, Índia. Foto de 2012.

Por todo o mundo temos patrimô nios espalhados, tanto materiais como imateriais. Do
mundo antigo à contemporaneidade, os monumentos e costumes precisam ser preservados.

Encravada nas montanhas do Peru está a cidade de Machu Picchu. Ao olhar para essas
ruí nas, podemos imaginar o que acontecia ali, como era a cultura desse povo, do que gostavam
e no que acreditavam. Será que no futuro outras pessoas vã o olhar para o lugar em que você
mora e fazer as mesmas perguntas?

Jarno Gonzalez Zarraonandia/Shutterstock/Glow Images

Vista das ruínas da cidade de Machu Picchu, no Peru, berço da civilização Inca, hoje patrimônio mundial da humanidade.
Foto de 2010.
Pius Lee/Shutterstock/Glow Images

Vista de Esfinge e Pirâmide de Gizé, no Cairo, Egito, outro patrimônio mundial da humanidade. Foto de 2010.

DICA
Para ouvir

Você provavelmente conhece a mú sica Taj Mahal, do cantor, compositor e mú sico carioca Jorge Ben Jor
(1942-). Ela conta um pouco da histó ria que motivou a construçã o desse templo. Você pode ouvi-la e
acompanhar sua letra acessando: <http://tub.im/h8t8rr> (acesso em: 26 fev. 2016).
Pá gina 291

Operaçã o Salvamento
Monumentos estã o por todas as cidades, mas nem sempre sabemos quem sã o seus
criadores nem suas origens. Muitas vezes, pouco sabemos da programaçã o de centros
culturais, teatros e museus. Infelizmente, nem todos têm a consciência de que os patrimô nios
artísticos espalhados pelas cidades sã o de todos e devem ser preservados. Ainda hoje, muitas
açõ es de vandalismo acontecem.

Em 2008, o artista paulista Eduardo Srur (1974-) fez uma interferência urbana com o
título de Sobrevivência que chamou a atençã o dos passantes nas ruas de Sã o Paulo. Foram
vá rios os monumentos que receberam coletes salva-vidas especialmente fabricados para vestir
as esculturas. Essa intervençã o artística no cotidiano da cidade nos mostra um modo de alertar
para a importâ ncia de conservar o patrimô nio cultural material.

Na imagem ao lado, vemos um dos monumentos escolhidos por Eduardo Srur para
realizar a intervençã o artística.

Eduardo Srur. 2008. Museu do Ipiranga, São Paulo. Foto: Hilton de Souza

Sobrevivência, de Eduardo Srur, 2008. Intervenção urbana no Monumento da Independência, nos jardins do Museu do
Ipiranga. Foto de 2008.

Giro de ideias: S.O.S. bens patrimoniais


À s vezes, estamos tã o imersos no cotidiano que nosso olhar fica anestesiado e nã o
percebemos os bens patrimoniais em nosso caminho.

Vamos abrir nossos olhos, ouvidos e ver como podemos cuidar melhor dos nossos bens
patrimoniais? O artista Eduardo Srur tem como uma de suas propostas fazer as intervençõ es
nos monumentos colocando coletes salva-vidas neles, para chamar a atençã o das pessoas para
essas obras e reativar esses bens pú blicos, muitos dos quais estã o abandonados ou
simplesmente nã o sã o percebidos pelo pú blico.

Converse com os colegas sobre essa problemá tica. Como cuidar melhor dos bens
patrimoniais? Um fó rum em rede social pode ser um instrumento interessante e prá tico para o
debate sobre esse assunto.

Registre aqui as ideias discutidas pelo grupo.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre os projetos do artista Eduardo Srur, que desenvolve sua arte visual trabalhando
com pintura, fotografia, escultura, vídeo, performances, instalaçõ es e intervençõ es urbanas, navegando pelo
site: <http://tub.im/gz8kj3> (acesso em: 26 fev. 2016).
Pá gina 292

A matéria do imaterial
Danças, mú sicas e demais expressõ es artísticas vã o compondo pouco a pouco o nosso
patrimô nio histó rico, para que nã o caiam no esquecimento e se percam com o passar do
tempo. Podemos pesquisar, divulgar e até mesmo praticar essas manifestaçõ es como uma
forma de preservar nossa memó ria.

Entre as danças e mú sicas que constituem o patrimô nio histó rico brasileiro imaterial
estã o a capoeira, o samba de roda do Recô ncavo Baiano, o bumba meu boi. O frevo também se
tornou Patrimô nio Cultural Imaterial da Humanidade em 2012.

A capoeira foi desenvolvida pelos africanos e seus descendentes no Brasil como forma
de resistir aos opressores e preservar sua cultura. Trata-se de uma forma de expressã o que
une mú sica, dança, luta e brincadeira. A roda de capoeira serve para o “jogo”, a brincadeira,
que é espetá culo e treinamento, e é formada por mú sicos que tocam e cantam. As mú sicas que
acompanham esse misto de dança e defesa pessoal podem ser em forma de cançã o, com
estrofes intercaladas por um refrã o, ou em forma de ladainhas narrativas. Podemos encontrar
a mesma letra em vá rias regiõ es do Brasil. O canto do coro pode ser definido como
“responsorial”, ou seja, um canto coletivo em que uma voz canta uma frase que é respondida
pelo coro.

O ritmo e o estilo do jogo da capoeira sã o, muitas vezes, determinados pela mú sica. O


principal instrumento utilizado é o berimbau, dividido em três tipos, conforme a variaçã o da
afinaçã o, podendo ser o berimbau gunga (som mais grave), o médio (som na regiã o
intermediá ria) e o viola (som agudo). Entretanto, a capoeira também pode ser acompanhada
por atabaque, caxixi, pandeiro, agogô e ganzá.

Tunart/Getty Images

Roda de capoeira em Jericoacoara, CE. Foto de 2011.

O samba de roda do Recô ncavo Baiano é outro exemplo de bem imaterial que faz parte
do Patrimô nio Histó rico Brasileiro. É uma manifestaçã o cultural que une mú sica, dança e
poesia, tendo influenciado a origem do samba do Rio de Janeiro e servido de referência para
todo o samba nacional. É acompanhado por instrumentos de origem africana, como atabaques,
reco-reco e ganzá . A influência portuguesa está presente na língua cantada e na introduçã o de
instrumentos como a viola, o violã o e o pandeiro.

Delfim Martins/Pulsar

Boi Caprichoso, no Festival de Folclore de Parintins, AM. Foto de 2010.


Pá gina 293

É lcio Carriço/SambaPhoto

Roda de samba em Cachoeira, BA. Foto de 2000.

Vanice Ayres Leite. 2011. Nanquim colorido sobre papel. Galeria Jacques Ardies, Sã o Paulo

Forrozeira, de Vanice Ayres Leite, 2011. Nanquim colorido sobre papel, 55 cm × 60 cm.

J. Borges. 2002. Xilogravura. Acervo do artista


O forró, de J. Borges, 2002. Xilogravura, 24 cm × 30 cm.

O forró é o principal ritmo originá rio do Sertã o nordestino. Popular em todo o Brasil, sua
disseminaçã o se deu por meio da imigraçã o dos nordestinos para outras regiõ es do país. Como
patrimô nio imaterial da humanidade, o forró pode ser protegido a fim de que permaneça vivo
para as geraçõ es futuras.

A literatura de cordel e a xilogravura também sã o patrimô nios culturais brasileiros. O


artista José Francisco Borges, mais conhecido como J. Borges (1935-), é considerado um dos
maiores nomes da gravura popular brasileira e sua obra é conhecida mundialmente.

A arte de J. BORGES
O xilogravurista e cordelista J. Borges já confeccionou brinquedos artesanais e vendeu
literatura de cordel antes de resolver escrever seus pró prios cordéis, aos 20 e poucos anos.
Como não podia pagar um ilustrador, ele mesmo começou a empreitada. Com o tempo,
desenvolveu técnicas pró prias para criar, colorir e publicar xilogravuras e sua literatura.

Xilogravura: trata-se de um tipo de gravura feito de uma matriz de madeira. É uma linguagem artística usada
també m em livros de literatura de cordel, muito comum na regiã o Nordeste do Brasil.

Em 2006, J. Borges foi nomeado Patrimô nio Vivo de Pernambuco. Suas obras estã o
repletas de manifestaçõ es culturais populares, como a embolada, uma linguagem de tradiçã o
nordestina que une mú sica e poesia, podendo ser improvisada ou nã o, apresentada em feiras,
praças e ruas, na qual uma melodia simples embala um duelo rimado e ritmado.

J.Borges, anos 90. Xilogravura. Acervo do artista. Bezerros, PE

Cantadores de embolada, de J. Borges, c. 1990. Xilogravura, 48 cm × 66 cm.


Pá gina 294

Palavra do artista

“[...] A xilogravura nasceu em mim a partir da necessidade de ilustrar o cordel. O cordel


foi o meu início em tudo e eu devo muito a ele [...]. Hoje a gravura me alimenta mais, ganhei
mais visibilidade com ela, mas nã o desprezo o cordel [...] trabalhando dentro da minha linha e
do meu traço, com os temas da nossa regiã o, que é muito rica em cultura popular, e por isso eu
continuo fazendo os dois – cordel e gravuras.”

J. Borges

MAGALHÃ ES, Elton. Entrevista com J. Borges. O Cordel na Web, 21 abr. 2015. Disponível em:
<https://ocordelnaweb.wordpress.com/2015/04/21/entrevista-com-j-borges/>. Acesso em: 8 mar. 2016.

Marco Antô nio Sá/Pulsar

J. Borges entalhando uma matriz, em Bezerros (PE). Foto de 2012.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre o artista J. Borges e sua obra. Além de informaçõ es sobre a vida e as artes desse
mestre da gravura, você pode assistir a trechos de documentá rios e entrevistas em um blogue dedicado a ele e
à literatura de cordel no endereço: <http://tub.im/5qdx93> (acesso em: 10 mar. 2016).

Ofício da arte

Ilustrador(a)

O ilustrador é principalmente um prestador de serviços, mas pode também ser um


artista da ilustraçã o, no caso da ilustraçã o para literatura. No mercado de produçã o, tem como
objetivo planejar, criar, propor soluçõ es, expressar ideias ou situaçõ es que o cliente deseja ou
que estejam descritas em textos por meio de desenhos e imagens, que podem ter
características mais abstratas e de maior profundidade artística se forem para textos literá rios.
Deve estar a todo momento treinando, aperfeiçoando-se, buscando por novas técnicas,
praticando, inspirando-se, renovando-se, nutrindo-se esteticamente e enriquecendo sua
bagagem cultural. Atualmente, o uso de softwares e técnicas facilitou a criaçã o, mas nã o se
pode abrir mã o da criatividade e da sensibilidade do profissional, que também pode ser um
artista da ilustraçã o.

DICA
Para navegar

No Portal do Ilustrador, você encontra fó runs de ilustradores de todo o Brasil para troca de
experiências e discussão de dú vidas, além de conteú dos sobre o ofício e a arte da ilustraçã o. Navegue por:
<http://tub.im/4t8i77> (acesso em: 10 mar. 2016).
Pá gina 295

Giro de ideias: Bens imateriais


Você e os colegas conhecem algum grupo que se expressa em alguma dança ou mú sica
que fazem parte do patrimô nio cultural imaterial brasileiro, como a capoeira, o forró , o samba
de roda e outras? Que tal pesquisar e criar alguns projetos com o que vocês descobrirem?

• Vocês podem organizar, na escola ou na comunidade, festivais culturais em que


algumas dessas manifestaçõ es possam ser mostradas.

• Pesquisem em sua comunidade se as pessoas conhecem os bens imateriais.

• Observe que tratamento é dado aos bens imateriais pela comunidade.

• Organizem um blog com as informaçõ es e acontecimentos sobre bens imateriais.


Abram espaço para que outras pessoas possam enviar imagens, vídeos e relatos sobre esse
tipo de bem patrimonial.

Registre aqui o que você descobriu durante as pesquisas.

Coisas preciosas para guardar


Os artistas contemporâ neos usam muitos materiais e maneiras diversas para expressar
suas ideias sobre a vida cotidiana e seus desdobramentos. Vamos conhecer alguns exemplos
dessa diversidade artística a seguir.

Para conhecer histó rias, é preciso estar disponível e disposto a ouvi-las. Da mesma
forma, para que outras pessoas conheçam nossas histó rias, precisamos contá -las. À s vezes, nã o
é preciso fazer registros escritos apenas ouvir. A arte realizada por Ana Teixeira tem como
prerrogativa exatamente ouvir, somente ouvir.

A arte de ANA TEIXEIRA


A artista paulista e mestre em poéticas visuais Ana Teixeira (1957-) vai à s ruas das
cidades com duas cadeiras dobrá veis, lã e agulhas de tricô , se acomoda e espera por pessoas
que se sentem ao seu lado para contar suas histó rias de amor. Na açã o urbana Escuto histó rias
de amor, a artista cria um espaço para que os transeuntes compartilhem, no espaço pú blico,
histó rias íntimas e pessoais. A proposta dessa artista é promover uma intervençã o no
cotidiano das pessoas e provocar reflexõ es sobre as maneiras como vivemos e ocupamos as
cidades.
Ana Teixeira. 2006

A artista Ana Teixeira em suas “ações de rua”: Escuto histórias de amor, uma intervenção urbana realizada em vários
países. Foto de 2006.
Pá gina 296

Palavra do artista

“Sou uma artista visual e, tanto em minhas intervençõ es quanto em meus desenhos,
objetos e fotos, tenho me dedicado a uma extensa pesquisa sobre os seres humanos. Os
assuntos que me mobilizam sã o os que mobilizam a grande maioria das pessoas, como o amor,
a morte, o desejo, os sonhos e, ainda, as questõ es de gênero e identidade. Meu intuito é colocar
uma lupa sobre esses temas instigando as pessoas a vê-los a partir de outro lugar. Creio assim,
por meio do desassossego, produzir enfrentamentos provocando nã o o conhecimento, mas sim
o desconhecimento.

Escuto histórias de amor é uma das minhas açõ es e foi realizada em nove países:
Brasil, Canadá , Alemanha, França, Itália, Espanha, Portugal, Chile e Dinamarca. Eu ouço as
histó rias, mas nã o as registro sonoramente. Os filmes exibem apenas as imagens e os sons das
ruas das cidades de diferentes países.

A matéria-prima de meu trabalho sã o as perguntas, indagaçõ es que produzem outras


indagaçõ es. Nã o pretendo em nenhum momento respondê-las, apenas plantá -las no mundo
silenciosa e rasteiramente, como quem planta raízes e nã o á rvores. As á rvores sã o para serem
apreciadas, as raízes, precisamos enfrentá -las.”

Depoimento de Ana Teixeira sobre sua arte. Ana Teixeira. Disponível em: www.anateixeira.com. Acesso em: 20 abr.
2016.

Ana Teixeira. 2010

Escuto histórias de amor, intervenção urbana de Ana Teixeira. Foto de 2010.

DICA
Para navegar

A artista Ana Teixeira estudou arte na Escola de Comunicaçõ es e Artes da Universidade de Sã o Paulo
(ECA-USP) e desenvolve vá rios trabalhos artísticos e de pesquisa. Você pode conhecer e apreciar mais imagens
e textos criados por essa artista navegando pelo site: <http://tub.im/9fd8ri> (acesso em: 26 fev. 2016).

Para navegar
Conheça o site Museu da Pessoa, um museu virtual colaborativo de relatos de vida em que qualquer
pessoa pode contar suas pró prias histó rias ou explorar o acervo de textos, imagens, vídeos e áudios que
registram e preservam as narrativas de histó rias de diversas á reas da atividade humana. Navegue pelo site:
<http://tub.im/i5ikyx> (acesso em: 10 mar. 2016).
Pá gina 297

Giro de ideias: O patrimô nio da minha cidade

"[...]
Você já foi à Bahia, nêga?
Nã o?
[...]
Nas sacadas dos sobrados
Da velha Sã o Salvador
[…]
Tudo, tudo na Bahia
Faz a gente querer bem"

CAYMMI, Dorival. Você já foi à Bahia? In: Setenta anos – Caymmi. Rio de Janeiro: Funart/Polygram/Philips, 1984.
LP. Faixa 3. Disponível em: <http://www.dorivalcaymmi.com.br/sitebiografico/>. Acesso em: 4 mar. 2016.

Dorival Caymmi (1914-2008), nascido em Salvador, Bahia, foi cantor, compositor,


violonista, pintor e ator. Compô s principalmente mú sicas que retratam os costumes e as
tradiçõ es do povo baiano e as influências afrodescendentes. Uma paixã o pelas coisas do seu
lugar fez esse mú sico brasileiro criar versos e sons que falam de bens materiais, como as
cidades e praias da Bahia, e imateriais, como o modo de fazer os quitutes das baianas do
acarajé.

E com você? Como é o seu lugar? Que tipo de relaçã o você tem com a regiã o em que
vive?

Converse com os colegas sobre como vocês veem o lugar em que moram. O que há na
cidade e nos arredores? Existem bens materiais e imateriais que fazem parte do Instituto do
Patrimô nio Histó rico e Artístico Nacional (Iphan)? A turma pode sair pela cidade e fotografar
esses bens para fazer um catá logo do Patrimô nio Cultural local. É possível que vocês se
surpreendam ao descobrir os bens culturais que existem em sua cidade. Depois de conhecer
sua regiã o, que tal fazer um poema ou letra de mú sica sobre seus bens materiais e imateriais?
Pesquise, passeie, conheça e divirta-se!
Fabio Colombini

Sueli Bispo, uma “baiana do acarajé”, e seu tabuleiro contendo acarajé, cocada, peixe frito, bolinho de estudante, vatapá,
camarão, caruru (quiabo), passarinha (baço de boi), tomate e óleo de dendê, em foto de 2009.

Rodney Suguita/Folhapress

O cantor e compositor Dorival Caymmi apresentando-se em São Paulo, em 1996.

DICA
Para ouvir

Para melhor conhecer a obra de Dorival Caymmi e como ele retrata a cultura e o povo das regiõ es em
que viveu, visite o site do artista: <http://tub.im/v9ajj3> (acesso em: 4 mar. 2016).
Pá gina 298

Conexõ es Arte e Literatura


1. Como nasceram os livros
A xilogravura é uma das mais antigas formas de gravar e reproduzir imagens da histó ria. Por
meio dessa técnica, foi possível criar livros em série e obras de arte. Um dos exemplares mais
antigos de xilogravura conservado é conhecido como a Liçã o dos ensinamentos de Buda ou Sutra
do Diamante, de 868 d. C., encontrado na China. Observe a imagem abaixo. Acredita-se que a técnica
da xilogravura seja originá ria desse país e muito mais antiga do que o livro. Há indícios de que
anteriormente era usada para gravar imagens em tecidos, produzindo estampas; depois, passou-se
a usar a técnica em papéis.

O nome xilogravura significa “arte de gravar em madeira”. Essa linguagem artística existe até
nossos dias. Para fazer uma xilogravura, desenhava-se em uma placa de madeira, usando uma
ferramenta chamada goiva para fazer sulcos, isto é, retirar parte da madeira para produzir um
desenho em baixo-relevo. É preciso passar tinta sobre essa placa de madeira com a ajuda de um
rolo. No lugar onde foram feitos os sulcos, a tinta nã o penetra, e assim o desenho se forma com
maior nitidez e riqueza de detalhes. Para finalizar esse processo, uma folha de papel é colocada sob
a placa de madeira, que é manualmente pressionada. Assim, a imagem é transferida da matriz
(placa de madeira) para o papel, em processo de impressã o que pode ser repetido vá rias vezes.
Imagens e letras podiam ser impressas dessa maneira, porém as letras deveriam ficar sempre ao
contrá rio, para que saíssem no sentido correto na impressã o.

Com o tempo, adaptando a técnica da xilogravura, considerou-se mais prá tico fazer uma
matriz para cada letra e, assim, nasceram os tipos mó veis. Depois, foram inventadas prensas de
impressã o. No Sacro Império Romano-Germâ nico, por volta de 1439, a produçã o de livros usando
metal como matriz foi desenvolvida por Gutenberg, e tanto textos como imagens começaram a ser
produzidos com a técnica de gravura em metal.

Tipos móveis: sã o matrizes em madeira ou metal em que as letras sã o gravadas individualmente. Essa té cnica era
utilizada para formar as palavras e os textos que eram impressos.

Essa técnica desenvolveu-se também como linguagem artística e tornou-se muito popular a
partir do século XV. Artistas como Albrecht Dü rer criaram tanto em xilogravura como em gravura
em metal. Mais tarde, no século XVIII, o alemã o Alois Senefelder (1771-1834) criou outro tipo de
gravura, a litogravura, que utiliza gravaçõ es em pedra por meio de processos químicos.

Litogravura: o nome litografia vem de lithos, que em grego significa pedra, e graphein, que é escrever ou desenhar.
Assim, litogravura é o desenho na pedra. A pedra litográ fica é o suporte (matriz) em que o artista desenha com lá pis oleoso
(ou pastas gordurosas). Depois de feito o desenho na pedra, em geral em calcá rio, ela é tratada com materiais químicos e
água. Ao final do processo, a imagem é gravada em papel por meio de uma prensa litográ fica (especialmente construída para
este processo).

Vá rias formas de criar imagens impressas foram desenvolvidas, como a serigrafia e a


impressã o a laser, mas a xilogravura e outras maneiras antigas de criar gravuras ainda sã o
linguagens visuais escolhidas por artistas da nossa era como Gilvan Samico (1928-2013) e os
autores de literatura de cordel.
World History Archive/Ann Rona/Keystone

Sutra do Diamante (Lição dos ensinamentos de Buda), de Wang Chieh. Xilogravura sobre pergaminho, 868.
Pá gina 299

2. A diversidade cultural e as linguagens artísticas


Derlon de Almeida (1985-), artista pernambucano, é conhecido por misturar imagens que
parecem ter saído de livros de cordel à arte das ruas. Ele usa colagens e pinturas em cores
contrastantes, principalmente em branco e preto e faz uso da técnica do lambe-lambe para
divulgar a sua arte.

Lambe-lambe: té cnica do lambe-lambe é uma das linguagens visuais denominadas urbanas e consiste em colar
imagens feitas em papel sobre paredes, muros e outros suportes. Hoje, alguns artistas usam também adesivos produzidos de
modo industrial em grandes formatos.

As imagens que inspiraram Derlon Almeida foram criadas por outros artistas na linguagem
da gravura. Dentre elas, é possível citar xilogravuras como as do também pernambucano J. Borges
(1935-), que cria imagens e textos em cordel para contar as histó rias do Nordeste brasileiro.

Derlon Allmeida. 2011. Acervo do artista

Obra de Derlon Almeida, 2011, no Recife, PE.

As xilogravuras nascidas para ilustrar os cordéis mostram a estética que revela a cultura dos
contos de tradiçã o oral, que têm seus personagens imortalizados nas imagens criadas pela
imaginaçã o do artista. Trata-se da linguagem visual na xilogravura e de uma poética nordestina,
expressa tanto na obra de Derlon Almeida, nas ruas das cidades, e que depois invadiu galerias de
arte e museus, como nas pá ginas dos livros ilustrados pela arte de J. Borges.

Em sua cidade, que obras estampam os muros? Fotografe-as e compartilhe com os colegas.
J. Borges. 2003. Xilogravura. Coleção particular

O forró dos bichos, de J. Borges, 2003. Xilogravura, 53 cm × 35 cm.

DICA
Para navegar

Conheça mais sobre Gilvan Samico e outros artistas gravuristas que usam a linguagem e técnica da
xilogravura visitando o site Arte Popular no Brasil: <http://tub.im/5iudcb> (acesso em: 10 mar. 2016).
Pá gina 300

Conexõ es Arte e Língua Portuguesa


1. Leitura dramá tica
"[...]
CHICÓ
— [...] Foi no dia em que meu
pirarucu morreu.
JOÃ O GRILO
— Seu pirarucu?

CHICÓ
— Meu, é um modo de dizer,
porque, para falar a verdade,
acho que eu é que era dele.
Nunca lhe contei isso nã o?
JOÃ O GRILO
— Nã o, já ouvi falar de homem
que tem peixe, mas de peixe que
tem homem, é a primeira vez.
[...]"

SUASSUNA, Ariano. Auto da Compadecida. 11. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1975. p. 57.

Para montar uma peça teatral, o diretor, os atores e toda a equipe de uma companhia de
teatro estudam os textos para compreender suas mensagens e construir os personagens. Esse tipo
de exercício, além de ajudar a decorar as falas, também auxilia na construçã o dos personagens. Sã o
horas de estudos e treino para o desenvolvimento da capacidade de interpretar o texto que poderá
entreter, emocionar, divertir o pú blico.

Vimos que há textos escritos especialmente para teatro, e outros que foram adaptados para o
palco. O pernambucano Nelson Rodrigues (1912-1980) e o paraibano Ariano Suassuna (1927-
2014) sã o exemplos de autores dramaturgos brasileiros que escreveram textos especialmente para
o teatro. Esses autores também já tiveram seus textos adaptados para a linguagem do cinema e da
televisã o. Você conhece algum texto desses autores?

Escolha um dos dois autores, pesquise e traga um trecho de texto para um jogo com sua
turma em sala de aula. Veja quantos personagens aparecem no trecho do texto selecionado e
proponha que cada colega leia a parte de um personagem. Essa leitura deve ser dramatizada,
procurando construir a voz e alguns gestos desses personagens. Esse tipo de exercício teatral se
chama leitura dramá tica. A proposta é estudar o texto antes mesmo de montar a peça, para sentir o
clima de cada cena, o jeito de ser de cada personagem e a potência expressiva de cada trecho do
texto.

Desenhe como você imagina que seja o personagem que você escolheu para fazer a fala que
está no texto. Pense nas características físicas, na voz, na expressã o do rosto e no figurino.
Pá gina 301

2. Palavras para guardar


A arte da dramaturgia também é um patrimô nio cultural. Há textos que sã o verdadeiros
clá ssicos do Patrimô nio Cultural da Humanidade (PCH), como Medeia (431 a.C.), do grego
Eurípides (480 a.C.-406 a.C.), poeta e escritor de peças trá gicas que viveu na Grécia antiga.

A dramaturgia pode ser composta por vá rios estilos de obras literá rias. Alguns textos já sã o
escritos diretamente para o teatro e, além dos diá logos, apresentam detalhamento de açõ es dos
atores como é o caso do Auto da Compadecida (que posteriormente foi adaptado para o cinema
dando origem ao filme de mesmo nome). Há textos que, inclusive, dã o indicaçõ es de como podem
ser os figurinos, o cená rio, a luz em cena e outros aspectos importantes para que os atores e
diretores de teatro criem os espetá culos. Outros textos sã o adaptados, por exemplo, textos
narrativos, em que um autor conta a histó ria dos personagens, e ao lê-lo vamos imaginando as
cenas e os diá logos. Há muitos autores que fazem adaptaçõ es de textos da literatura dos mais
variados gêneros para o formato de texto dramá tico.

Que tal, agora, fazermos o papel de autores?

Vamos experimentar adaptar um texto de sua preferência em um texto dramá tico? Escolha
um texto com estrutura narrativa, desses que contam a histó ria de um ou mais personagens, e
adapte um pequeno trecho, criando os diá logos, as cenas, como devem ser os personagens e outros
detalhes. Depois, convide os colegas para fazer a interpretaçã o do texto adaptado por você.

Filme de Guel Arraes. O Auto da Compadecida. Brasil. 2000

Capa do DVD do filme O auto da Compadecida, adaptação para o cinema da peça de Ariano Suassuna. Direção de Guel
Arraes. Brasil: Globo Filmes/Sony Pictures, 2000.
Pá gina 302

Conexõ es Arte e Geografia


Na boca do povo!
O Brasil, como sabemos, apresenta uma diversidade cultural muito rica e marcante. Histó rias
que estã o na boca do povo, nos contos de tradiçã o oral, nos causos e lendas, sã o exemplos de bens
imateriais. A pessoa que pesquisa sobre esses assuntos é chamada de folclorista.

O folclorista Luís da Câ mara Cascudo (1898-1986) dizia que gostava de pesquisar sobre a
cultura oral brasileira para saber das histó rias que contavam sobre as coisas das localidades rurais
e das cidades Brasil afora. Nascido em Natal, Rio Grande do Norte, também era historiador,
antropó logo, jornalista e advogado, profissõ es que estimularam seu interesse pelo folclore.

Câ mara Cascudo sempre teve interesse em conhecer mais sobre os contos que falavam da
vida de pessoas humildes, dos sá bios, dos moços e velhos. Queria descobrir os mistérios das
assombraçõ es, os segredos do mar, do céu, das estrelas, de um mundo imaginá rio que anda por aí,
na cabeça e na boca do povo, nos contos populares. De pesquisa em pesquisa, de lugar em lugar, foi
mapeando os contos de tradiçã o oral e estudando suas origens, de lugares geográ ficos e contextos
culturais. Sua pesquisa constitui uma geografia cultural, mostrando a origem das histó rias e como
elas se adaptaram em cada lugar. Sã o muitos e diversos os contos recolhidos. Tem conto que explica
a origem das coisas, que conta sobre reinos, príncipes e princesas, contos para dar exemplos ou de
encantamento, de assombraçã o e até contos para enganar a morte. Será que é fá cil enganar a
morte?

No conto de tradiçã o oral O compadre da morte, recolhido pelo folclorista Luís da Câ mara
Cascudo, um homem se tornou compadre da morte e, durante sua vida, sempre encontrou maneira
de enganar sua comadre morte, que nã o podia levá -lo sem seu desejo. A cada encontro, a morte ia
embora, zangada pela sabedoria do homem em enganá -la. Contudo, ela ficava à espreita, esperando
um momento propício para levá -lo. Um dia, o homem estava distraído e veja a seguir o que
aconteceu.

"Anos e anos depois, o médico, velhinho e engelhado, ia passeando nas suas grandes
propriedades quando reparou que os animais tinham furado a cerca e estragado o jardim,
cheio de flores. O homem, bem contrariado disse: — Só queria morrer para nã o ver uma
miséria destas!... Nã o fechou a boca e a Morte bateu em cima, carregando-o. A gente pode
enganar a Morte duas vezes, mas na terceira é enganado por ela."

CASCUDO, Luís da Câ mara. Contos tradicionais do Brasil. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999. p. 342.

Esse conto, da Regiã o Norte do Brasil, já foi adaptado para o teatro pelo grupo Trancos e
Barrancos, de Poços de Caldas, Minas Gerais, em 2010. Observe uma cena dessa peça na
imagem acima.

Você conhece algum conto de tradiçã o oral que gostaria de contar para a turma?
Cena do espetá culo O compadre da morte. 2010-2011. Direção: Luiz Munhoz. Foto: Acervo do ator e diretor Luiz Munhoz

Cena da peça O compadre da morte, do grupo Trancos e Barrancos, durante temporada 2010-2011.
Pá gina 303

Projeto experimental
Xilogravura
Vamos fazer uma xilogravura?

1. Escolha um material para gravar seu desenho. Uma placa de madeira ou uma superfície
plana de gesso podem servir como matriz.

2. Usando uma folha de papel carbono, passe o seu desenho para a superfície da matriz.

3. Se você escolher como matriz um pedaço de madeira, o melhor é usar goivas, que sã o
ferramentas de corte para fazer marcas ou retirar partes da madeira. Se escolher trabalhar com
outros materiais, como um placa de isopor com textura lisa ou uma placa de gesso, você pode usar
lápis, tampas de canetas, palitos de madeira, dentre outros materiais.

4. Com a matriz gravada, passe tinta (pode ser guache) sobre essa superfície.

5. Pressione uma folha de papel de seda sobre ela e veja como sua gravura aparece. Faça
quantas có pias quiser. Vale lembrar que as primeiras có pias sã o as mais valiosas no que diz
respeito a uma tiragem profissional.

Outra ideia é usar as técnicas do artista Derlon Almeida.

Desenhe o que quiser em uma folha de jornal e depois pinte seu desenho usando nanquim ou
guache preto, explorando as á reas claras e escuras.

Em seguida, passe cola branca no verso da sua pintura e escolha um local para “adesivar” sua
arte (de preferência uma parede).

Depois, passe cola por cima da imagem para fixá -la bem no local escolhido. Essa técnica é
parecida com a colocaçã o de cartazes em postes e paredes.

Projeto experimental

1. Patrimô nios culturais materiais e intervençõ es


urbanas
Dê um giro pela sua cidade e fotografe os patrimô nios culturais materiais. Museus, prédios
histó ricos, praças, monumentos... Qual o estado desses bens?

Imprima as imagens que você registrou e faça interferências com textos sobre o que você
sente ao ver o estado em que se encontram os bens materiais de sua cidade. Estã o bem
conservados? Apresentam degradaçã o do tempo? Foram vítimas de vandalismo? O que você tem a
dizer sobre isso?
Você pode, também, organizar uma exposiçã o com essas imagens e textos na escola. Deixe
um livro de comentá rios disponível para que outras pessoas expressem opiniõ es sobre sua
pesquisa visual e criaçã o poética. Chame a turma toda para participar desse projeto.
Pá gina 304

2. Criando sons pelo Brasil


1. Na roda de capoeira – som e movimento

O berimbau é um instrumento de origem africana. No Brasil, geralmente é utilizado nas


rodas de capoeira.

Fernando Favoretto/Criar Imagem

Berimbau, caxixi e vareta, instrumentos utilizados nas rodas de capoeira.

Vamos construir um berimbau? Acompanhe as etapas a seguir.

Materiais necessá rios: ripa de madeira ou um bambu fino, medindo de 1,50 m a 1,70 m de
comprimento (com maleabilidade suficiente para envergar e formar um arco); arame; cabaça;
pedra ou moeda; vareta; caxixi (para ajudar a marcar o ritmo); ferramentas para furar e cortar
(faca, caxixi alicate).

Passo a passo:

• Amarre um arame em uma extremidade da ripa de madeira ou bambu.


• Coloque a ponta com o arame amarrado no chã o e envergue a ripa de madeira ou bambu e
amarre o arame na outra ponta.

• Em uma das pontas, amarre uma cabaça com a base cortada para servir de caixa de
ressonância.

• Para tocar, utilize uma vareta de madeira e uma pedra lisa ou moeda, que é colocada na
corda para mudar a nota musical.

Depois de criar seu instrumento, chame o pessoal para roda, toquem o berimbau, dancem e
joguem capoeira.

2. O ofício da viola de cocho

Eu hei de morrer cantando


por que eu chorando eu nasci [...]

Trecho da toada de cururu Onde eu nasci, de autoria do mestre Caetano Ribeiro, artesã o e tocador da viola de
cocho de Cuiabá , Mato Grosso.

Marcos André/Opção Brasil

Viola de cocho desenhada. Corumbá, MS. Foto de 2008.

A viola de cocho é um instrumento encontrado na regiã o do Mato Grosso e Mato Grosso do


Sul. Ela recebe esse nome porque é confeccionada de maneira semelhante a um cocho (objeto
utilizado para alimentar o gado). É feita de um tronco de madeira inteiro que é esculpido no
formato de uma viola, no qual sã o fixados o tampo, o cavalete, as cravelhas, os trastes (ou trastos) e
as cordas. É utilizado para acompanhar diversas danças e cantorias da regiã o, como o cururu e o
siriri. O cururu é dançado pelos homens, em roda, e a cantoria pode ser realizada em forma de
desafio ou louvaçã o. Já o siriri é dançado principalmente pelas mulheres ou casais. Os assuntos mais
tratados nas letras sã o as mulheres, além de pá ssaros e outros animais.

Esse é um ofício ensinado de geraçã o para geraçã o. Por exemplo, a viola de cocho na vida do
mato-grossense Alcides Ribeiro (1965-), artesã o especializado na construçã o desse instrumento, foi
passada por seu pai, Caetano Ribeiro (1925-2012), mestre nesse ofício. Observe as imagens da
pá gina seguinte. O mestre que ensinou o trabalho a seu
Pá gina 305

filho também aprendeu com seu pai, e este, por sua vez, recebeu os segredos da construçã o
da viola de cocho no seio da sua família. Sã o quatro geraçõ es de construtores e mú sicos que têm em
comum a paixã o pela viola de cocho e a mú sica de tradiçã o cuiabana.

Mestre Caetano Ribeiro e seu filho Alcides, com as violas de cocho produzidas por eles. Foto de 2011.

Fotos: Acervo de família

Artesão e mestre Alcides Ribeiro construindo uma viola de cocho. Foto de 2011.

O som da viola que embala a dança de Sã o Gonçalo, do rasqueado, além dos ritmos do cururu
e siriri, é forjado nos quintais, na troca de afetos, entre um conselho e outro dado de pai para filho,
conversas que animam a vida em família na regiã o de Cuiabá . É o ofício de fazer viola, mú sica e
histó ria. Coisas que fazem parte do nosso patrimô nio cultural imaterial.

A confecçã o da viola de cocho também foi tombada como patrimô nio cultural, por se tratar
de uma forma ú nica de construçã o. Para construí-la, acompanhe as etapas indicadas no link da Dica
para navegar a seguir.

DICA
Para navegar

O Instituto do Patrimô nio Histó rico e Artístico Nacional (IPHAN) disponibilizou um livro ilustrado que
documenta toda a histó ria da viola de cocho, sua cultura, as artes e os povos envolvidos, e ensina, passo a
passo, como confeccioná -la. Traz também partituras de cançõ es típicas para tocar com a viola de cocho. Para
conhecer essa arte, visite: <http://tub.im/7odbe6> (acesso em: 7 mar. 2016).

Para navegar

Conheça mais sobre as geraçõ es de uma família de artesã os e mú sicos especialistas em viola de cocho
no blog criado por Alcides Ribeiro: <http://tub.im/64fygy> (acesso em: 7 mar. 2016).
Pá gina 306

O BEM INDÍGENA

As culturas e as artes dos povos indígenas brasileiros fazem parte do Patrimô nio Cultural do
Brasil. Esses direitos foram conquistados com muita luta de grupos indígenas, organizaçõ es e
profissionais que estudam e defendem a valorizaçã o desses povos.

Indígenas das etnias guarani Kaiowá s, kadiweus e Terrenas em protesto em frente 'a
Assembleia Legislativa, Campo Grande, MS. Foto de 2015.

Bens materiais

A nossa histó ria cultural e artística começa muito antes dos primeiros europeus chegarem ao
Brasil. Povos ceramistas deixaram objetos em ricas padronagens presentes na cerâ mica marajoara
e formas de figuras enigmá ticas na cerâ mica de Santarem. Por sua relevâ ncia histó rica, cultural e
artística, essas peças sã o guardadas e preservadas sob as leis de proteçã o de patrimô nios materiais.
Objetos procedentes das culturas indígenas brasileiras, como instrumentos musicais, vestimentas,
arte plumá ria e outras peças histó ricas e culturais, catalogados em acervos de museus ou sítios
arqueoló gicos, sã o considerados PATRIMÔ NIOS MATERIAIS.

Acervo de museus

Fachada do Memorial dos Povos Indígenas, no Eixo Monumental, em Brasília, com grafismos
tradicionais de aldeias do Parque Nacional do Xingu

Urna mortuá ria de cerâ mica, utilizada pelos guaranis pra enterrar seus mortos. 36 cm × 26,5
cm. Foto de 2010.
Arte plumaria da etnia brasileira Bororó .

Vaso de gargalo (1000 a 1400), da cultura Santarém. Cerâ mica, 18,9 cm × 31 cm. Com
aplicaçõ es de detalhes zoomorfos (com formas de animais).

Sítios arqueoló gicos

Sítios arqueoló gicos sã o os lugares onde os arqueó logos encontram artefatos antigos, peças
que comprovam a existência de seres e povos do passado e documentam culturas. Na regiã o da
Amazô nia, por exemplo, além de pinturas, encontramos gravuras marcadas em rochas no meio da
mata e nas margens dos rios. Essas produçõ es, também chamadas de petró glifos, sã o vestígios dos
povos indígenas que viveram no Brasil por volta de 3 mil a.C.

Lugares sagrados

Lugares sagrados para as comunidades indígenas podem ser considerados patrimô nios
culturais por sua importâ ncia (material e imaterial) nas tradiçõ es religiosas, artísticas e culturais
desses povos.

Na regiã o do Alto Xingu, no Mato Grosso, povos indígenas como os Sagihengu e os


Kamukuwaká realizam o Kwarup, uma das maiores festas ritualísticas da cultura indígena
brasileira A regiã o desses dois povos é considerada Patrimô nio Cultural brasileiro.
Tribo indígena Kalapalo com flautas Atanga-Kwarup, Parque Indígena do Xingú , MT. Foto de
2011.
Pá gina 307

A Lei

No Brasil, o ARTIGO 216 da CONSTITUIÇÃ O FEDERAL (1988) conceitua patrimô nio

cultural assim:

"Art.216. Constituem patrimô nio cultural brasileiro os bens de natureza tomados material e
imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à açã o,
ã memó ria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I- as formas de expressã o;

II - os modos de criar, fazer e viver;

III - as criaçõ es científicas, artísticas e tecnoló gicas;

IV - as obras, objetos, documentos, edificaçõ es e demais espaços destinados à s manifestaçõ es


artístico-culturais 1

V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histó rico, paisagístico, artístico, arqueoló gico,
paleontoló gico, ecoló gico e científico. [...]"

BENS IMATERIAIS

As diversas maneiras de fazer objetos, de se enfeitar, de cantar, de dançar, de falar dos povos
indígenas podem ser consideradas BENS IMATERIAIS.

LÍNGUA E MÚ SICA

Tupi or nottupi, thatis the question (Tupi ou nã o tupi, eis a questã o). A famosa frase de
Oswald de Andrade em seu Manifesto antropofá gico de 1928 exprime o questionamento sobre
nossas origens culturais. A língua de um povo é um bem imensurá vel. A família linguística tupi-
guarani faz parte do vocabulá rio de vá rias etnias indígenas brasileiras. Diversas línguasjá foram
catalogadas no Inventá rio Nacional da Diversidade Linguística (INDL) e registradas como
Patrimô nio Imaterial brasileiro. Uma das formas de preservar a língua é por meio da mú sica. Os
cantos do povo Guarani, por exemplo, sã o relembrados pelas novas geraçõ es em gravaçõ es usando
as mais recentes tecnologias.

DANÇAS E CANTOS

As danças e cantos indígenas sã o bens imateriais. Entre o povo indígena Enawene Nawe, por
exemplo, que vive no noroeste do Mato Grosso, a arte está sempre presente na forma de se enfeitar,
dançar e cantar na realizaçã o do ritual Yaokwa, considerado Patrimô nio Cultural Imaterial do
Brasil, segundo os registros feitos pelo Instituto do Patrimô nio Histó rico e Artístico Nacional
(Iphan).

CULTURA E IMAGINÁ RIO

Os povos indígenas brasileiros costumam fazer desenhos com base em suas visõ es de mundo
e de seu imaginá rio, como nas maluanas (maruana ou maruanan), que é uma roda de madeira
confeccionada para o teto das casas comunitá rias dos povos indígenas da regiã o do Amapá e do
Pará .

ARTE KUSIWA

Encontramos grafismos em padronagens na cultura de muitos povos indígenas. A arte


Kusiwa, uma tecnica de pintura corporal e arte grá fica da populaçao indígena Wajã pi da regiã o do
Amapá, faz parte do Patrimonio Cultural Imaterial brasileiro As padronagens geométricas das
pinturas corporais sã o inspiradas na natureza e em objetos utilizados pelos indígenas relacionadas
à s relaçõ es sociais à s crenças indígenas.

Em 2014, foi criada uma ediçao especial de selo dos Correios que reproduz uma imagem da
arte indígena Kusiwa Wajapi, Patrimonio Cultural Imaterial do Brasil, cedida pelo Conselho das
Aldeias Wajã pi Apina. Fonte: Correios Brasil.

RITXÒ RÒ S

O modo de fazer as bonecas karajá s, que na língua indígena deste povo sã o conhecidas como
Ritxö kè, é patrimô nio imaterial. Esse costume que marca a identidade ká rá já é feito com três
materialidades bá sicas: argila, cinza e á gua. A boneca é modelada, queimada e pintada nas cores
preta e vermelha, geralmente.

Os desenhos seguem padronagens que encontramos também em pinturas corporais dos


Karajá .
CESTARIA

Muito antes da chegada dos primeiros colonos às terras brasileiras, as culturas locais
indígenasjá existiam em toda a sua diversidade. As técnicas usadas até hoje na construçã o da arte
de cestarias, por exemplo, sã o passadas de geraçao para geraçã o. Alguns ofícios dos povos
indígenas brasileiros já sã o declarados patrimô nios imateriais, outros ainda estã o em estudos e
processos para registro e tombamento, que é feito pelo Instituto de Patrimô nio Histó rico e Artístico
Nacional (Iphan).

Urupêm ou urupema, um tipo de peneira de buriti com trançado típico da etnia Kaiabi.
Pá gina 308

FIQUE DE OLHO:
Enem e vestibulares
1. (Enem-MEC)

O que o projeto governamental tem em vista é poupar à Naçã o o prejuízo irrepará vel do
perecimento e da evasã o do que há de mais precioso no seu patrimô nio. Grande parte das
obras de arte até mais valiosas e dos bens de maior interesse histó rico, de que a coletividade
brasileira era depositá ria, têm desaparecido ou se arruinado irremediavelmente. As obras de
arte típicas e as relíquias da histó ria de cada país nã o constituem o seu patrimô nio privado, e
sim um patrimô nio comum de todos os povos.

ANDRADE, R. M. F. Defesa do patrimô nio artístico e histó rico. O Jornal, 30 out. 1936. In: ALVES FILHO, I. Brasil, 500
anos em documentos. Rio de Janeiro: Mauad, 1999 (adaptado).

A criaçã o no Brasil do Serviço do Patrimô nio Histó rico Artístico Nacional (SPHAN), em
1937, foi orientada por ideias como as descritas no texto, que visavam

a) submeter a memó ria e o patrimô nio nacional ao controle dos ó rgã os pú blicos, de
acordo com a tendência autoritá ria do Estado Novo.

b) transferir para a iniciativa privada a responsabilidade de preservaçã o do patrimô nio


nacional, por meio de leis de incentivo fiscal.

c) definir os fatos e personagens histó ricos a serem cultuados pela sociedade brasileira,
de acordo com o interesse pú blico.

d) resguardar da destruiçã o as obras representativas da cultura nacional, por meio de


políticas pú blicas preservacionistas.

e)determinar as responsabilidades pela destruiçã o do patrimô nio nacional, de acordo


com a legislaçã o brasileira.

As questõ es de nú mero 2 e 3 tomam por base duas passagens do livro A linguagem


harmô nica da Bossa Nova, do docente e pesquisador da Unesp, José Estevam Gava.

Momento Bossa Nova

Nos anos 1940, o samba-cançã o já era uma alternativa para o samba tradicional,
batucado, quadrado. Em sua gênese foram empregados recursos correntes na mú sica erudita
europeia e na mú sica popular norte-americana. Já era algo mais sofisticado, praticado por
compositores e arranjadores com maior preparo musical e sempre de ouvido aberto para as
soluçõ es propostas pela mú sica estrangeira. O jazz, por exemplo, mais tarde permitiria fusõ es
interessantes como o “samba-jazz” e o “samba moderno”, com arranjos grandiosos e com base
nos instrumentos de sopro. Mas, em termos de poesia e expressividade, o samba-cançã o tendia
a manter seu cará ter escuro, sombrio, com muitos elementos que lembravam a atmosfera
tensa e pessimista do tango argentino e do bolero, gêneros latinos por excelência.
O samba-cançã o esteve desde logo ambientado em Copacabana, lugar de vida noturna
intensa, boates enfumaçadas, mulheres adultas e fatais envoltas num clima de pecado e
Pá gina 309

traiçã o, enquanto a Bossa Nova ambientou-se mais para o Sul, em Ipanema, além de
tornar-se representativa de um pú blico mais jovem, amante do sol e da praia. Nesse ambiente
solar, a mulher passou a ser a garota da praia, a namorada. Deu-se um descanso à s imagens de
“amante proibida e vingativa, com uma navalha na liga. E as letras da Bossa Nova não tinham
nada de enfumaçado. Eram uma saga oceâ nica: a nado, numa prancha ou num barquinho, seus
compositores prestaram todas as homenagens possíveis ao mar e ao verã o. Esse mar e esse
verã o eram os de Ipanema” (Castro, 1999, p. 59).

A Bossa Nova levou aos extremos a tendência intimista de cantar sobre temas do
cotidiano, sem muita complicaçã o poética. Em vez da negatividade do samba-cançã o, explorou
ao má ximo a positividade expressiva e um otimismo sem precedentes. Esse foi o grande traço
distintivo entre a Bossa Nova e o samba-cançã o. O otimismo diante do amor trouxe consigo
imagens de paz e estabilidade possibilitadas por relacionamentos amorosos felizes e amores
correspondidos, sem as cores patoló gicas e dramá ticas que tanto marcavam os sambas-
cançõ es. Mesmo a dor, quando ocorria, era encarada como um está gio passageiro, deixando de
assumir o antigo cará ter terminal.

Em plenos anos 1950, quando nas rá dios predominava o derramamento vocal e


sentimental, Tom Jobim já buscava um retraimento expressivo pautado por um discurso
poético/musical mais sereno, mais em tom de conversa do que de sú plica. Se os mais jovens
identificavam-se com essas coisas novas, os mais velhos e tradicionalistas viam-nas com
estranheza, sendo compreensível que as descrevessem como cançõ es bobas e ingênuas, nã o
obstante a sofisticaçã o harmô nica e rítmica.

(José Estevam Gava. A linguagem harmônica da Bossa Nova. Sã o Paulo: Editora Unesp, 2002.)

2. (Vunesp-SP) A partir do texto apresentado, aponte a alternativa que nã o caracteriza a


Bossa Nova.

a) Ambientada em Ipanema.

b) Bem recebida por um pú blico mais jovem.

c) Abordagem de temas do cotidiano.

d) A dor como o fato dominante da existência.

e) Maior sofisticaçã o harmô nica e rítmica.

3. (Vunesp-SP) Segundo o texto, o principal traço distintivo da Bossa Nova com relaçã o
ao samba-cançã o foi

a) a influência do jazz.

b) o afastamento do samba tradicional, batucado, quadrado.

c) a exploraçã o da positividade expressiva e um otimismo sem precedentes.

d) a influência do tango e do bolero sofrida pela Bossa Nova.


e) o cará ter mais inovador e as virtudes rítmicas do samba-cançã o.
Pá gina 310

EXPEDIÇÃO CULTURAL
Quais os percursos que nos levam aos monumentos da cidade?

Pegue o mapa de sua cidade e trace percursos que você e seus colegas podem percorrer
para encontrar os bens materiais e imateriais.

Em sua cidade sã o realizadas festas para a populaçã o? Que tal se informar na Secretaria
de Cultura quando vão acontecer e o que comemoram? Será uma boa oportunidade para você
marcar um encontro com a cultura de sua regiã o.

Aproveite sua expediçã o cultural e qualquer outro passeio que você faça. Fique atento a
tudo que está em seu caminho. Leve sempre seu diá rio de bordo consigo e guarde nele tudo
que pode constituir a sua bagagem cultural.

Que tal pesquisar em sua comunidade sobre as influências culturais locais?

Com os colegas, pensem nas misturas e sincretismos que vocês podem criar na
linguagem da arte explorando aspectos dados pelas tecnologias contemporâ neas e pelas
manifestaçõ es tradicionais. Escolham qualquer linguagem da arte, como compor mú sicas, criar
imagens nas artes visuais ou expressar-se corporalmente na dança e no teatro.

Que tal criar manifestos artísticos sobre o que pesquisaram e sobre os anseios artísticos
e sociais que descobriam nesses percursos?

Reú na-se com os colegas e os professores e organizem um festival de misturas culturais


na escola.
Rodrigo Lima/Nitro

O Instituto Inhotim, criado em meados da década de 1980, em Belo Horizonte (MG), agrega um dos mais relevantes acervos
de arte contemporânea do mundo e uma coleção botânica que reúne espécies raras, de todos os continentes. Os acervos são
mobilizados para o desenvolvimento de atividades educativas e sociais para públicos de diversas idades.
Pá gina 311

DIÁRIO DE BORDO
Neste capítulo, conversamos sobre patrimô nio e como formamos nossa bagagem
cultural. Coisas que vemos e sentimos, guardamos quando é significativo. Pensar sobre tudo
aquilo que faz parte de sua bagagem cultural pode ajudar a criar projetos e maneiras de
trabalhar suas produçõ es artísticas e a compreender as coisas que sã o nossas, que estã o por aí,
dentro de museus ou nas praças, nas ruas, na internet, até dentro de nossas gavetas. Sã o coisas
que compartilhamos com todos (os patrimô nios pú blicos materiais e imateriais) ou coisas que
guardamos só para nó s (a memó ria de nossas experiências ou os objetos pessoais
significativos). De qualquer forma, essas coisas nos pertencem e precisam ser guardadas,
cuidadas, preservadas. Elas nos alimentam, mas também precisamos alimentá -las. Fazem parte
da nossa “nutriçã o estética“.

Para guardar precisamos conhecer e cuidar. Cultivar afetos e sentimento de


pertencimento. A artista Ana Teixeira nos fala que podemos estar abertos a ouvir, ver, sentir...
Muitos artistas criam obras a partir de suas histó rias ou de histó rias dos outros. O que você
tem a dizer nas muitas linguagens da arte?

A cidade em que você mora pode estar repleta de bens patrimoniais e culturais. Você se
sente preparado para descobrir esse material e pesquisar sobre os bens? O que ficou de
significativo de nossa conversa sobre bens materiais e imateriais? Que conceito ficou mais
forte?

Conversamos sobre memó ria, guardados, valorizaçã o, tombamento, acessibilidade a


bens imateriais e a bens materiais, nossos patrimô nios culturais. Como você se relaciona com
sua memó ria? O que há guardado dentro de seus baú s, de suas caixas, de suas gavetas? Reflita
sobre esses assuntos e registre suas descobertas em seu diá rio de bordo.
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LISTA DE INSTITUIÇÕ ES PROMOTORAS DE


EXAMES
Enem-MEC - Exame Nacional do Ensino Médio

Udesc-SC - Universidade do Estado de Santa Catarina

UEL-PR - Universidade Estadual de Londrina

UERJ-RJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFG-GO - Universidade Federal de Goiá s

UFRGS-RS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Unicamp-SP - Universidade Estadual de Campinas

Vunesp-SP - Fundaçã o para o Vestibular da Universidade Estadual Paulista


CRÉ DITOS DAS IMAGENS DOS INFOGRÁ FICOS
Capítulo 1 – A arte sempre foi arte?

Crédito do Infográfico: Marla Cruz

Crédito das imagens: Vênus de Willendorf - Jorge Royan/Alamy/Latinstock; Reproduçã o de


Bisã o ferido - The Art Archive/Alamy/Glow Images; Flauta de osso de pássaro - Ascha
Schuermann/AFP/Getty Images; Má scara de pedra - Má scara de pedra. Período Neolítico. Museu
de Israel, Jerusalém. Foto: The Bridgeman Art Library/Keystone; Busto da rainha Nefertiti -
Michael Sohn/AFP/Otherimages; Foto do sarcó fago de Tutancâ mon - Robert
Harding/Robertharding/Getty Images; Discó bolo - c. 450 a.C. Má rmore. Museu Nacional Romano,
Roma. SuperStock/Getty Images; Afresco da poetisa Safo - Século I a.C. Afresco. Museu
Arqueoló gico Nacional de Nápoles. SuperStock/Glow Images; Cristo Pantocrator - Basílica de Santa
Sofia, Turquia. Karl F.Schö fmann/i/Keystone; Trovadores com instrumentos musicais medievais -
280. Ilustraçã o. Mosteiro e Sítio do Escorial. Fine Art/Heritage/Glow Images; O Buda de Leshan -
Pyty/Shutterstock/Glow Images; A lamentaçã o - Giotto di Bondone. Capela Arena, Itá lia. World
History Archive/Alamy/Glow Images; Mona Lisa - Leonardo da Vinci. c. 1503-6. Ó leo sobre
madeira. Museu do Louvre, Paris; Davi - Michelangelo Buonarroti. 1501-1504. Má rmore. Galleria
dell’Accademia,
Pá gina 320

Florence. Tupungato/Shutterstock/Glow Images; Moça com brinco de pérola - Johannes


Vermeer. 1665. Ó leo sobre tela. Museu Mauritshuis, Haia. Art Media/Heritage/Keystone; A
liberdade guiando o povo - Eugène Delacroix. 1830. Ó leo sobre tela. Museu do Louvre, Paris; O grito
- Album/Akg-Images/Latinstock; Câ mera mamute - Corbis/Latinstock; Isadora Duncan - Elvira
Studio. 1903. Fotografia em preto-e-branco. Biblioteca da Ó pera Garnier de Paris. Archives
Charmet/Bridgeman Art Library/Keystone; O Tã o – esperado – Foto: Ricardo Botelho/Brazil Photo
Press/AFP.

Capítulo 2 – As mil e uma linguagens da arte

Crédito do Infográfico: Marla Cruz

Crédito das imagens: Pietá - Michelangelo. 1498-1499. Má rmore. Basílica de Sã o Pedro,


Vaticano. Shutterstock/Glow Images; A leitora - Jean-Honoré Fragonard. c.1770. Ó leo sobre tela.
Galeria Nacional de Arte, Washington DC; Agamemnon - James MacMillan/Wikimedia Commons;
Sarah Bernhardt - Ullsteinbild/Glow Images; Camille Claudel - William Elborne/Wikimedia
Commons; Pintura (alegoria) - Almeida Jú nior. 1892. Ó leo sobre tela. Acervo Documental
Fotográ fico da Pinacoteca do Estado de Sã o Paulo; O menestrel – Kate Elizabeth Bunce. ca. 1890.
Ó leo sobre tela. Coleçã o particular; Clark Gable e Mirna Loy - Filme de Jack Conway. Too hot to
handle. EUA. 1938. Everett Collection/Keystone; O minueto - Frederik Hendrik Kaemmerer. c.
1890. Ó leo sobre tela. Coleçã o particular. Hérois da Marvel - Anton_Ivanov/Shutterstock.com; Final
Fantasy – Hironobu Sakaguchi/KPA/Heritage Images/Glow Images; Marina Abramovic - Dario
Cantatore/Retna/Corbis/Latinstock; Video mapping - Michal Kamaryt/Age Fotostock/CTK
Photobank/Easypix.

Capítulo 3 – Tempos e “ismos” na arte

Crédito do Infográfico: Marla Cruz

Crédito das imagens: O violeiro - J. F. de Almeida Jú nior. 1899. Ó leo sobre tela. Pinacoteca
do Estado, Sã o Paulo; Recanto do morro de Santo Antô nio - Eliseo d’Angelo Visconti. 1920. Coleçã o
Particular; Tarde de domingo na ilha de Grande Jatte - Georges-Pierre Seurat. 1886. Instituto de
Arte de Chicago;De onde viemos? O que somos? Para onde vamos? - Paul Gauguin. 1897. Ó leo sobre
tela. Museu de Belas Artes de Boston. Tompkins Collection/The Bridgeman Art Library/Keystone;
Retrato de Madame Matisse - Henri Matisse. 1905. Ó leo sobre tela. Museu Nacional de Arte da
Dinamarca. Dennis Hallinan/Alamy/Glow Images; O grito - Album/Akg-Images/Latinstock; As
senhoritas de Avignon - Pablo Picasso. 1907. Museu de Arte Moderna, Nova York. Peter
Horree/Alamy/Glow Images; Formas ú nicas de continuidade no espaço - Umberto Boccioni. 1913.
Museu de Arte Contemporâ nea da USP, Sã o Paulo. Universal History Archive/UIG/Getty Images; El
pueblo a la universidad, la universidad al Pueblo - Patrick Escudero/Hemis/Corbis/Latinstock; Ar
de Paris - Marcel Duchamp. Séc. XX. Ready made: ampola de vidro. Museu de Arte Moderna, Paris.
Foto: RMN/Otherimages; The Anthropomorphic Cabinet - Salvador Dalí. 1979-1982. Bronze com
pá tina escura. Coleçã o particular. Foto: Araldo de Luca/Corbis/Latinstock; Composiçã o II em
vermelho, azul e amarelo - Piet Mondrian. 1921. Museu Municipal de Haia.

Capítulo 4 – A arte e a matéria

Crédito do Infográfico: Marla Cruz

Crédito das imagens: Queima de cerâ mica - Fabio Colombini; Flauta chinesa -
Thirteen/Shutterstock/Glow Images; Bianzhong - Peter Bischoff/Getty Images; Sino chinês de
bronze - The Art Archive/Alamy/Glow Images; Â nfora grega - P.Spiro/Alamy/Latinstock; Mú sico
Paulo Moura - Monalisa Lins/Estadã o Conteú do; Boneca de cerâ mica - Fabio Colombini; Portal de
Ishtar - Paolo Cordelli/Getty Images; Detalhe do Portal de Ishtar - Brais Seara/Getty Images; Fonte
- Marcel Duchamp. 1917/1964. Porcelana. Museu Nacional de Arte Moderna, Paris. Foto:
RMN/Otherimages; Vaso antropomorfo - 1000 a 1400 d.C. Cerâ mica. Museu Nacional do Rio de
Janeiro 400 a 1400 d.C. Cerâ mica. Museu Nacional do Rio de Janeiro. Foto: Rô mulo Fialdini/Tempo
Composto; Vaso da cultura marajoara - 400 a 1400 d.C. Cerâ mica. Museu Nacional do Rio de
Janeiro. Foto: Rô mulo Fialdini/Tempo Composto.

Capítulo 5 – O que tem na mala do teatro?

Crédito do Infográfico: Marla Cruz

Crédito das imagens: Cia. Teatral Crias da Casa - Marilane Pita; Teatro de Epidaurus - Ken
Welsh/Age Fotostock/Easypix; Arte grega - Dea/G. Nimatallah/De Agostini Editore/Easypix;
Má scara grega - Panagiotis Karapanagiotis/Alamy/Glow Images; Má scara grega - Ruggero
Vanni/Corbis/Latinstock;Marcel Marceau - Michel Boutefeu/Getty Images; Ariano Suassuna -
William Volcov/Brazil Photo Press/Folhapress; É dipo e a Esfinge - Stock Montage/Getty Images;
William Shakespeare - Everett - Art/Shutterstock.com; Teatro Kabuki - Kobbydagan/Deposit
Photos/Glow Images.

Capítulo 6 – O bem indígena

Crédito do Infográfico: Marla Cruz

Crédito das imagens: Indígenas protestando - Cassandra Cury/Pulsar; Pinturas indígenas


no Memorial dos Povos - Claudio Reis/CB/D.A Press; Urna mortuá ria - Gerson Gerloff/Pulsar;
Cerâ mica tapajoara - Fabio Colombini; Arte Plumá ria - Rubens Chaves/Pulsar; Tribo Indígena
Kalapalo - Fabio Colombini;Maruana, roda de madeira - Renato Soares/Imagens do Brasil; Selo -
Correios Brasil; Urupema, peneira de buriti - Renato Soares/Imagens do Brasil; Bonecas de
cerâ mica Karajá - Fabio Colombini.

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