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Volume 2
Juliana Duarte
2013
Para Luiggi, meu bolinho
Sumário
Capítulo 1_______________________________________________7
Capítulo 2______________________________________________53
Capítulo 3_____________________________________________138
Capítulo 4_____________________________________________185
A Gata Mascarada - Volume 2
Capítulo 1
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– Eu sei, meu esmalte é tudo! – riu Poliana – Mas o seu cabelo supera,
Lili. Tão perfeitinho. Já te disseram que você parece a Amélie Poulain?
– Eu também adoro o cabelo dela, dá vontade de arrancar e comer –
falei – e esse teu colarzinho de sorvete então! Menina, me deixa
experimentar teus óculos escuros! Tô com coceira no cu de tanta
vontade de prová-lo!
– Eu acho que meu sorvetinho cabe certinho no seu cu! – disse
Poliana, e nós três sorrimos como princesas – Falando nisso, vamos pra
night hoje, pra pegar gatinhoooos?
– Não posso, eu tenho namorado – informei, com muito orgulho – o
Alfredo ainda anda te perseguindo, Alice?
– O Alfredo é muito doce, Ofélia. Não fale dele dessa forma. Ele me
ligou algumas vezes, mas eu deixei claro que não podemos voltar.
– Quem é Alfredo? – perguntou Poliana, empolgada – É seu ex?
– Ele é meu ex também – contei – e ele não é tão doce quanto você
pensa, Alice. Ele foi meio estúpido comigo uma vez.
Poliana enlouqueceu quando soube que eu e Alice havíamos
namorado a mesma pessoa. Ela queria saber de todas as fofocas.
– Ele é quente na cama? Qual o tamanho do pau dele? – perguntou
Poliana – Se ele estiver sobrando, eu pego! Assim nós três
compartilharemos o mesmo ex! Delícia, né?
– Você quer namorá-lo já pensando em terminar? – perguntou Alice.
– Ele é só um nerd, Poly – alertei – daqueles que se escondem
embaixo da saia da mamãe. Ele gosta de engenharia. Ou seja, é um cara
entediante.
– Que pena – disse Poliana – pelo menos ele vai ter dinheiro. Vou
ver se consigo agarrar alguém da medicina ou do Direito por aqui.
– Eu tô namorando um pobre – comentei, monotonamente – e ele
vai continuar pobre, porque tá fazendo teologia.
– Por favor, não me diga que ele está pagando para fazer esse curso –
disse Poliana – porque nem se me pagassem eu estudaria essa merda. Ele
é pobre e faz teologia. O que esse cara tem de bom, então? O cacete dele
é grande?
– Mais ou menos – falei – pelo menos é maior que o do Alfredo. Se
bem que da última vez que transei com o Alf ele tinha uns 14 ou 15.
Alice, como tava o tamanho quando você comeu ele?
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– Você não estava com saudade de mim. Estava pensando nos quatro
dias que ficou sem almoçar. Em que você gastou o dinheiro do seu
estágio, afinal?
– É fácil para você colocar as coisas dessa forma. Seus pais te dão
tudo o que você precisa. Você teve um grande azar em me arranjar como
namorado. Além de ter que implorar para fazer sexo comigo, eu só te
dou gastos.
– Então você ouviu aquilo...
Eu baixei os olhos. Não sei porque falei daquela forma. Não me
importava que ele não tivesse dinheiro. Eu não ligava para tamanho de
pênis também, pois eu já tinha transado com caras que tinham paus dos
mais diferentes tamanhos e simplesmente concluí que o que mais
influenciava para meu prazer não era tamanho e sim o desempenho do
cara na cama. E se eu comesse um homem que eu amasse, só podia ser a
melhor foda do mundo.
Eu o peguei pela mão.
– Vamos almoçar.
Fomos para o restaurante universitário. Demian repetiu duas vezes.
Ele devia estar mesmo com fome. Eu fiquei com uma peninha danada
dele. E ele ficava tão bonitinho comendo!
– Mimi, como é que tá tua grana até o fim do mês?
– Falta uma semana para eu receber o dinheiro do meu estágio. Eu
sobrevivo até lá.
Eu tirei uma nota de cinquenta reais da carteira e passei para ele.
– Eu não aceito.
– Por mim!
– Nem pensar.
Ele era teimoso. E orgulhoso. Tive que guardar o dinheiro. Eu me
lembraria de convidá-lo para almoçar mais vezes na semana seguinte.
– Dorme lá em casa nesse fim de semana?
– Por quê? Você quer sexo? Ou quer fazer isso para alimentar o seu
namorado pobre?
– Eu quero ficar com você.
– Não estou com vontade de transar nesse fim de semana.
– Por que não?
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– Preciso ter um motivo? – ele perguntou – Você acha que estou com
algum problema quando não sinto vontade de transar com você o tempo
todo?
– Mimi, só de olhar para você minha vagina já fica lubrificada. Se eu
pudesse, eu trepava contigo a cada vez que te vejo. Por mim eu te jogaria
no chão agora e te possuiria. Você não me acha atraente o bastante?
– Você é linda.
– Então você precisa fazer um tratamento. Eu acho que você tem
resistência a liberar todo o seu desejo sexual por causa dos abusos que
sofreu na infância.
– Isso mesmo, Ofélia, grite para que a universidade inteira fique
sabendo.
Eu não havia me dado conta que estava falando tão alto.
– Bom, a Alice já sabe... – confessei.
– E logo aquela sua nova amiga escandalosa vai saber também. Você
conta isso para todo mundo, como se gostasse de me humilhar.
Joguei na cara dele os papéis com as anotações que fiz sobre a
sociedade secreta.
– A minha amiga escandalosa também vai ser membro.
– Eu só permito se eu for o líder. Quero ter o poder de expulsar essa
garota sem saber sua opinião a respeito.
– Tá bom, seja o líder, já que ama tanto assim o poder! Se você me
amasse mais do que ama seu precioso poder, iria me deixar ser a líder
por cavalheirismo. Foi isso que teu Deus te ensinou, a buscar o poder
antes do amor? Ele é onipotente, é por isso que você acha Jesus mais
atraente que eu?
– Por que você sempre precisa colocar Deus no meio?
– É a barba! Eu tenho certeza. Mas eu sei que a onipotência também
dá um charme a mais.
– A nossa Ordem se chamará Trono da Majestade Divina – ele
informou, ignorando-me.
– Não, eu não quero seu amante envolvido no nome da Ordem. Se
for assim, ela irá se chamar Adoradores do Majestoso Gregório.
De todos os meus ex-namorados, ex-ficantes e de todos os caras por
quem já me apaixonei, escutar o nome do Gregório era o que mais fazia
Demian ficar puto da vida.
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– Você acha que vou até a biblioteca consultar uma enciclopédia? Ah,
vai cagar, meu filho.
– O que foi que você disse?
– Nada, nada. Olha só, já decidi qual vai ser o nome da nossa
sociedade secreta!
– Que bom que você já decidiu algo que nem eu, que sou o líder, sei
ainda.
– Será: Arara–azul-de-lear. É uma ave baiana, viu? Bem brasileiro,
para termos muito orgulho. O seu Deus não é brasileiro. Prefiro Tupã.
– OK. A abreviatura será...
– Arale! A protagonista de Dr. Slump!
– Eu não sei o que é isso e nem quero saber. Será a OAAL.
– Gostei – falei – soa como “uau”! Que bonito, ela também é
conhecida como Arara Índigo!
– Vamos ficar aqui o dia inteiro falando sobre araras ou sobre as
atividades da Ordem?
– Mas como você é chato, hein, cara! Pra mim tanto faz o que vamos
fazer nesse cacete. Decida você. A parte mais divertida era bolar um
nome, agora já passou. Vou mandar fazer uns mantos com capuz em
tom azul escuro e com as iniciais do nome da Ordem costuradas na
manga. Enquanto isso, você decide as partes monótonas.
– As “partes monótonas” a que você se refere é o mais importante.
– Apenas me faça o favor de não preencher todas as nossas
atividades com leituras da Bíblia. Isso você já faz lá no cu.
– CCU – corrigiu Demian, me fitando de canto.
– Ai que bonitinho! Aqui tem uma foto de araras comendo! E araras
se beijando! Antes eu achava gatinhos os mais lindos, mas agora essas
araras estão me encantando!
– Elas não estão se beijando. Quer parar com essas besteiras e me
ajudar?
– Faça como o Gregório, monte umas apostilas estúpidas com
tópicos aleatórios e leia o que elas dizem enquanto dormimos.
– Que surpresa você chamar as atividades dele de estúpidas. Não era
você que estava louca para ler aquele grimório de nível avançado que ele
escreveu? Eu particularmente duvido que aquilo seja “avançado”.
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– Para que assim as pessoas valorizem quando surge alguém tão bom
como eu na vida delas, em vez de tirar sarro como você faz.
– Adoro as suas respostas tendenciosas.
– E hoje leia meus textos! Você é a vice-líder. Isso é o mínimo que se
espera.
Subitamente, Laura passou por onde estávamos e deu um forte
abraço em Demian.
Ela me pegou de surpresa, e a Demian também. Ele ficou confuso,
sem saber como reagir.
– Ei, Laura... me largue, sim?
Ele conhecia Laura há mais tempo do que eu. Ela era a garota
estranha que via seres mágicos nas cortinas e gostava de usar roupas
curtas para tentar seduzir o Fábio.
Mas ela apenas continuava a abraçá-lo com força. Eu já ia reclamar,
quando vi lágrimas nos olhos dela.
– O Fábio é um idiota! – ela exclamou.
– Bem, disso já sabíamos – comentou Demian – qual é a novidade
mesmo?
– Eu quero matar alguém! – gritou Laura, em meio às lágrimas.
– Ofélia, convide-a para dormir na sua casa.
– Para ela me matar? – perguntei.
– Fábio dispensou-a, machucou-a, mandou-lhe uma maldição ou
qualquer coisa do gênero – disse Demian – então acho melhor você
consolá-la com suas super técnicas femininas que aprendeu com suas
amigas patys.
– Fábio matou Lalipobino.
– Ofélia, Fábio matou o duende dos sentimentos nobres. É melhor
você lidar com isso.
Eu não estava entendendo nada, mas aceitei a sugestão de Demian e
convidei Laura para ir até minha casa naquela noite.
– Eu irei. Você é uma grande amiga, garota dos poderes sobrenaturais.
Vou arrumar minha mala e de noite apareço na sua casa. Depois te ligo
para combinarmos ou te envio uma mensagem astral...
E ela foi embora. Como só estávamos eu e Demian na sede,
aproximei-me e coloquei a mão no meio das pernas dele.
– Você teve uma ereção com ela. Seu filho da puta...!
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Eu senti simpatia por ela. Laura era uma garota esquisita e solitária.
Embora fosse bonita, os caras acabavam se afastando dela por causa dos
“amigos imaginários das cortinas”. Acho que ela pensou que numa
Ordem de ocultismo isso iria mudar. Mas pessoas são pessoas em
qualquer lugar.
No dia seguinte, recepcionei Poliana na sede improvisada da OAAL
na universidade, que era uma sala sem uso. Demian ainda não tinha
chegado.
– Menina, eu me assustei tanto quando teu menino chegou bem na
hora em que estávamos fofocando sobre ele! – comentou Poliana – Será
que ele escutou?
– Ele ouviu tudo – garanti – mas já estamos bem. Garota, esse teu
boné tá show! Tu foi pra night?
– Nem. Tive que ficar tomando conta da pentelha da minha sobrinha.
Ofi, qual é o babado dessa sociedade secreta? Tem vestido de baile?
– Tem mantos. Se quiser, pode me ajudar a preparar, me dando umas
dicas de moda.
Dessa vez Poliana se empolgou e começou a desenhar diferentes
modelos de mantos num caderno. Nem notamos quando dois novatos
entraram na sala.
– Com licença, vocês são da OAAL?
Quem perguntou isso foi um gordinho barbudo que parecia ser
muito bonzinho.
– Sim, eu sou a vice. Esse é nossa consultora de moda. O mestre tá
atrasado.
– Meu nome é Sérgio. Essa é Bibiane, minha irmã.
– Oizinho!
Os dois pareciam muito diferentes. Ele era calmo. Ela já parecia ser
mais agitada e feliz.
Permanecemos por longos minutos desenhando os mantos e pedindo
sugestões. Quando notei que Demian não chegaria tão cedo e que o
celular dele estava desligado, resolvi começar a reunião sozinha.
– Bem, o mestre me deixou uma apostila. Vou ler. Eu não sei direito
o que nossa Ordem faz, para ser sincera. Temos como símbolo a arara-
azul-de-lear. Aparentemente usaremos um manto índigo com detalhes
em amarelo, e um anel. Ele escreveu esse texto sobre simbologia.
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Passei um site para ele, no qual Demian tinha escrito uns textos. Eu
disse que os dois seriam muito bem-vindos no nosso próximo encontro.
Poliana já estava entusiasmada e suspeitei que eu não precisaria mais
me preocupar com a encomenda dos mantos e anéis. Eu só entraria com
a grana e ela cuidaria de tudo. Ela mesma se dispôs a financiar uma parte,
porque se fosse para ser membro daquele “grupo de sei lá quê”, segundo
ela, só valeria a pena se estivéssemos bem vestidos.
Quando a reunião acabou, liguei para Demian.
– Finalmente atendeu! Onde você se meteu? Perdeu a primeira
reunião da sua Ordem!
– Eu estava resolvendo umas coisas. Mas já estou com as malas
prontas pra passar o fim de semana na sua casa.
– Esquece. Te perdoo. Te amo. Tô indo aí.
E desliguei imediatamente. Eu nem sabia onde ele estava, mas fui até
o prédio da teologia. Demian estava lá me esperando encostado nas
malas, com um sorriso no rosto. Eu adorava quando ele tirava aquela
expressão ranzinza da cara e abria um sorrisinho!
– Que lindo, tá todo engomadinho!
– Eu não estou “engomadinho”. De onde você tira essas palavras
vergonhosas?
– Do meu rabo! Ai, brincadeira, coração. Tá tão feliz assim porque
viu a Fifi chegar? Deixa eu ver o que você carrega tanto nessa sua
mochila pesada.
– Você adora mexer na minha mochila.
– É sexy tocar nas coisas que você toca. Já que nem sempre você me
deixa pegar onde eu quero, assim me sinto mais próxima de você.
De repente, uma garota linda de cabelos castanhos e ondulados se
aproximou. Eu já ia elogiar a bela blusa de flores que ela usava quando
ela se dirigiu a Demian, com uma das vozes mais meigas que já escutei
nos lábios de alguém.
– Muito obrigada pelo seu caderno, Demian. Me ajudou muito. Quer
estudar junto comigo na segunda-feira outra vez?
– Claro, será um prazer. Quando você quiser.
Ele sorriu. Ela também.
A garota baixou os olhos e colocou uma mecha dos cabelos por trás
da orelha.
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Eu esgotei Demian até ele não aguentar mais nem falar. Ele enterrou
a cara no travesseiro e só queria dormir, de tão cansado que ficou.
– Mimiiiiii, não dorme! Quero brincar mais, eu querooo!
Fiquei dando cutucões nele. Ele apenas grunhia alguma coisa,
dizendo para que eu o deixasse descansar.
– Grrrr! Você só tem vigor pra rezar e se mortificar em nome de
Deus, né, seu fanático religioso! Espaço para a Ofélia não tem?
– Fanático religioso? Que absurdo. Eu pratico minha religião
normalmente como qualquer outra pessoa.
– Sei. Você só tem cinco Bíblias dentro da sua mochila, cada uma
num idioma diferente. Todas elas totalmente sublinhadas! Ah, se você
sublinhasse todo o corpo da Fifi com essa sua língua. Em vez de discutir
e falar tanta bobagem, podia usar a língua para algo que preste.
Mas ele não estava ouvindo mais. Tinha dormido.
No sábado acordamos só à tarde. Tentei lambê-lo em lugares
divertidos para ver se assim ele despertava.
– Ofélia! Meu corpo não é seu para que você faça o que bem
entender. Ou melhor, ele é seu enquanto estou acordado. É rude você
mexer em mim enquanto durmo.
– Tá bom, senhor certinho. E que tal mexer em mim de vez em
quando? Você raramente faz isso. Você é tão tímido assim? Não é
possível que não tenha vontade de me tocar!
– Eu tenho vontade, mas preciso ser educado com uma dama.
– Ah, corta essa! Você vai ser educado me fodendo forte! A sua falta
de interesse e a sua frigidez são desrespeitos maiores do que se você
vivesse com a mão em mim!
– O que você quer que eu faça?
Peguei as mãos dele e coloquei-as nos meus seios.
– Tá, agora faz o que quiser – eu disse.
Ele mexeu as mãos, mas com cuidado excessivo. Eu achei tão fofo!
Tive que dar um beijinho nele.
– Fofinho!
– Fifi, eu tô com fome...
– Fofo, fofo, fofo! O mais fofo do mundo!! Fica aí que eu vou
cozinhar algo pro meu amor!
– O que você vai fazer?
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– É verdade, acho que posso contar nos dedos as vezes que você fez
oral em mim – observei.
Enquanto ele fazia, eu comecei a gemer e a miar.
– Ofélia, será que você pode gemer daquele jeito de novo?
– Hm? De qual jeito?
– Aquele miado com a voz aguda.
“Awwwn, como o Demian é meigo!” Era tão maravilhoso saber o
que ele gostava!
Com aquele pedido, eu me emocionei e miei até não poder mais. Foi
muito divertido!
– Calma, para! Senão você vai me finalizar cedo demais.
– Eu quero te finalizar mil vezes, de todos os jeitos.
Naquele dia eu adquiri várias cartas na manga. Agora eu já sabia o que
excitava o Demian. Eu poderia obter o que eu queria de um jeito bem
mais simples.
Depois daquela transa, mostrei a ele várias fantasias à venda na
internet. Pedi para que ele escolhesse uma.
– Qual você prefere? Colegial, enfermeira, empregada, coelhinha...
– Coelhinha – ele falou, sem pestanejar.
– Por causa da Playboy, né, seu tarado?
– Pare de me chamar assim, eu não sou tarado. Só estou tentando ser
porque você insiste muito...
– Ai, Demian, foi só uma brincadeirinha. Eu não falei por mal. Não é
pra se ofender quando te chamo de tarado. Eu quero que você seja! É
um elogio!
– Eu não gosto de ter desejo demais pra não perder o controle.
Assim como perco o controle às vezes quando fico furioso...
– Que bobagem. Uma vida sob controle não tem graça nenhuma.
De repente, Demian me deu um abraço forte e me beijou. Ele me
deu um beijo muito profundo e enterrou o caralho com vontade. Ele fez
isso sem se segurar.
Eu adorei! Ele fazia movimentos vigorosos. De onde ele tirou tanta
energia? Foi do miojo? Há, há...
Ele se empolgou mesmo. Fazia com cada vez mais intensidade. Eu
era pequenininha, mas eu não era frágil! Na cama eu era uma fera! Então
pra mim quanto mais forte, melhor.
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bolsas. E eles voltam pra casa sem nada, o jogo nem tinha nada a ver
com eles. Como vê, existem jogos para todos.
– Agora é você quem está sendo preconceituosa em separar jogos por
sexo. Por que, Ofélia? Você é religiosa?
– Ah, vai tomar no cu!
– No cu outra vez? Pois saiba que eu detesto futebol. Está satisfeita?
– Eu só vou ficar satisfeita quando você enfiar esse caralho duro no
meu rabo.
– Ah, agora você se entregou.
– Mas só se eu puder mexer no seu também.
– Nem pensar. Isso não vai acontecer.
– Por quê? Só porque sou mulher tenho direito de receber? Você é
preconceituoso, Mimi?
– A que ponto essa conversa chegou, hã... quer saber de uma coisa?
Eu vou preparar a próxima apostila.
– Ih, você tá é fugindo!
Nas semanas seguintes, Demian escreveu feito louco. Mal tínhamos
tempo para trepar.
Minha alegria só voltou em junho, quando ficou pertinho do Dia dos
Namorados!
– Vamos prometer um ao outro que no Dia dos Namorados iremos
realizar todas as nossas fantasias sexuais. Não vai sobrar nenhuma para a
imaginação. Eu quero ver você se masturbando na minha frente!
– Eu quero que você...
A partir daí, ele sussurrou no meu ouvido.
– Eu vou arrumar uma cruz bem grande. Eu quero que você
introduza na vagina. Eu sempre fantasiei como ficaria a parte maior da
estaca dentro do corpo feminino.
Quando Demian me confessou isso, eu abri a boca e não fechei mais.
Eu simplesmente fiquei olhando para ele sem acreditar no que tinha
ouvido.
– Eu terei que fazer muitas penitências depois disso, o Senhor que
me perdoe – completou Demian – mas é minha maior fantasia.
Eu comecei a rir. Não conseguia mais parar. Demian corou. Eu ri
ainda mais dele por isso.
– Ofélia... vai pro inferno.
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– Não foi Deus quem te fez sofrer, você sabe disso. Foi a ignorância
humana. Você é inteligente e gentil. E está me fazendo feliz por estar ao
meu lado, me dando prazer. Então te juro que o que quer que você
pense enquanto faz sexo não vai te mandar pro inferno. Porque quando
estou contigo eu fico no céu.
Demian me abraçou.
– Eu nunca esperaria escutar um sermão tão sábio vindo de uma
ateísta.
– E eu nunca esperaria encontrar um religioso tão tolerante e
inteligente.
– Temos muito que aprender um com o outro. Acho que foi por isso
que Deus nos colocou juntos.
– Não sei se foi por isso que ele nos colocou juntos ou se ele sequer
existe – observei – mas você existe e eu te amo, por mais esquisito que
você seja.
– Que se façam minhas as suas palavras.
– Até a primeira parte?
Mas ele não respondeu essa pergunta.
– Teremos outras coisas divertidas além do sexo para fazer no Dia
dos Namorados! – acrescentei – Podemos sair juntos num encontro.
Comer coisas gostosas.
Eu confesso que minhas concepções sobre o Demian se
transformaram drasticamente após aquelas revelações. Eu nunca o
imaginei nessa situação delicada. Ele lutava contra algo mais forte dentro
dele a cada instante.
Mas eu não queria fazê-lo se sentir mal. Por isso, preferi não tocar no
assunto. Ao mesmo tempo, eu me perguntava quais outros segredos ele
guardava. Demian parecia um poço de mistérios. E não eram aqueles
tipos de mistérios que te dá prazer de desvendar. É o tipo de coisa que te
faz sentir uma sensação horrível ao ser descoberta. A história dele era
assustadora, mas era melhor que ele não soubesse disso. Eu queria tirar
todo aquele peso das costas dele.
Perto daquilo, a tara do Alfredo com scatsex parecia quase simpática.
Acho que só me chocou mais por eu saber que Demian era muito
dedicado à religião, mas... merda, eu não podia deixar transparecer que
aquilo havia me impressionado.
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– Nosso encontro hoje foi uma mística. E não menos fantástico que
isso.
Ele segurou alguns gravetos e folhas na mão e largou-os no ar.
– Passará e se integrará à natureza. Já devo partir.
Conversar com ele era como parar no tempo. Por que teve que ser
tão breve?
Quando ele passou próximo a mim para ir embora... eu senti uma
sensação incrível. Não foi nada parecido com algo que eu já tivesse
sentido antes.
Lembro que da primeira vez que fitei Demian eu senti um enorme
medo dele. Ele possuía energias extremamente pesadas ao seu redor. Eu
tive certeza absoluta disso desde aquele instante. Somente ao conhecê-lo
melhor eu passava a entender o que significava tudo aquilo.
No caso daquela pessoa, eu também sentia um pouco de medo, mas
era um sentimento diferente. A energia dele não era densa. Era profunda.
A energia de alguém que já havia tocado muitas dimensões do
mensurável e do imensurável.
– Senhor... você é um Deus?
Aquela pergunta simplesmente aflorou dos meus lábios, como se
fosse natural.
– Não, ainda bem. A senhorita é uma Deusa?
– Eu sou a Deusa do Desejo. Porque meu desejo não tem fim.
– É uma grande honra conhecer uma Deusa – ele disse isso
sinceramente – é uma responsabilidade que eu não desejo carregar. Eu
sou um dragão.
– Você me contou seu segredo! – exclamei, impressionada.
– Você confiou em mim para contar o seu, então foi natural que eu
revelasse.
Que conversa deliciosa!
Ele fez uma leve reverência.
– Deusa do Desejo, esse dragão deverá voar de volta à sua dimensão
original. Irei recordar-me desse encontro.
Dessa vez ele foi embora de verdade.
Sentei-me na grama outra vez. O que havia sido aquilo? Uma
conversa exótica como aquela precisa de duas pessoas igualmente
excêntricas para mantê-la.
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união. Será algo que iremos construir juntos. A força do grupo é algo
que precisamos entender. Você pode ser um gênio, mas de nada
adiantará ser um gênio louco e solitário. Você morrerá, suas ideias não
inspirarão ninguém e você terá uma existência infeliz. Nós não somos
indivíduos isolados. Nós somos eternos. Somos imortais! E agora eu
revelo o segredo da imortalidade: é continuar a existir através das ideias
dos outros, que se inspiraram nos seus pensamentos. É ser parte de um
grupo como esse, que dá nascimento às ideias e as eterniza, numa ação
consistente de respiração, palavras e vivência. Em nome da vivência
completa, longa vida à OAAL!
– Longa vida à OAAL! – exclamamos juntos.
Aquele discurso foi inspirador. Estávamos todos empolgados para
criar.
– Olhem ao seu redor! – clamou Demian – Quem arquitetou esse
prédio? Quem construiu essas cadeiras? Quem montou esses livros?
Quem costurou nossas roupas? Quem fundou essa universidade?
Somente através da contribuição de todas essas pessoas e de muitas
outras mais, de nossos pais, professores e mestres, que podemos estar
aqui hoje. E com esse grupo iremos compreender que precisamos uns
dos outros mais do que nunca. O sentido da vida reside em nosso
relacionamento com os outros seres. Tente buscar outros sentidos e
inspirações. Ainda assim, você precisará do oxigênio das plantas para
respirar; consumir vegetais e animais para permanecer vivo. Você não
vive sem os outros. É somente com essa união que a existência se
completa.
– Bravo! – exclamei.
E bati palmas. Os demais bateram palmas também. O Demian já se
achava o máximo naturalmente, mas aquele discurso foi demais. Dessa
vez ele merecia a ovação. Ele até ficou meio sem jeito com os aplausos,
dando um leve sorriso.
– Obrigado por estarem aqui comigo, de verdade – disse Demian –
vocês me fazem sentir muito especial por desejarem ouvir o que tenho a
dizer. E terei o maior prazer de ouvir as ideias de vocês também, para
que possamos trabalhar juntos.
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Nem esperei uma resposta e fui preparar. Voltei com uma panela
cheia de calda de chocolate e fui jogando em cima dele.
– Ai, tá quente isso, cuidado! – ele reclamou.
Lambi ele todinho! Ele também me lambeu.
– Chocomimi! Hmmmm! Que delícia!
Nós mudamos a ordem das coisas. Transamos de manhã, porque
estávamos com muita vontade. Tomamos um banho e depois saímos
juntos para um lindo e romântico encontro!
De tarde fomos na sorveteria. E tudo terminou à noite com um lindo
jantar à luz de velas que preparei. É, ocultistas sempre têm muitas velas
sobrando. O jantar não foi grande coisa, mas era comestível. Talvez
estivesse muito doce ou salgado. Ou doce e salgado ao mesmo tempo.
Nem lembro se peguei o vidro de sal ou açúcar.
Mas Demian foi forte e aguentou comer minha gororoba! E ainda
elogiou! Que amor, né?
– Ofélia, você cozinhou isso ou você foi no banheiro e depois
colocou no meu prato?
OK, ele não elogiou.
– Primeiro eu fui no banheiro, depois eu cozinhei – informei.
– Pelo menos matou os germes.
– Eu vou ligar pra pedir uma pizza, tá bom? – decidi, emburrada.
– Ufa, ainda bem. Pensei que ia ter que comer tudo isso para agradá-
la.
– A sobremesa tá boa – garanti – eu sei fazer sobremesas. Eu acho...
Enquanto a pizza não chegava, passei um batom vermelho com
cheirinho de morango para encher o Demian de beijos. E... acho que
fizemos sexo outra vez. Ali mesmo, em cima da mesa. Ops.
Um dia memorável, cheio de carinho, ternura e muito, muito fogo!
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para me devolver o que eu havia dito antes – enquanto você tem voz de
menininha, corpo de menina, cérebro de menina. Apesar de gostar de
sexo, você o faz de forma totalmente infantil.
– E eu pensando que você odiava a Sarrelot.
– Isso não significa que eu não a ache uma diva.
– Ei, sai da frente. Você tá barrando a porta.
Quem disse isso para Demian foi Poliana, que havia acabado de
chegar para a reunião.
– Peça com gentileza que eu saio – disse Demian.
– Eu não – disse Poliana – se não sair, vou embora. Eu nem queria
assistir à sua reunião chata mesmo. Só venho aqui pra ficar fofocando
com a Fifi no meio do seu falatório interminável. E pra olhar pra sua
bunda quando você fica de costas escrevendo no quadro.
Eu desatei a rir. Nós duas rimos juntas.
– Não vai me defender? – perguntou Demian – Antigamente você
rolava no chão e socava garotas que me desrespeitassem ou dessem em
cima de mim.
– Não estou dando em cima – corrigiu Poliana – só estou te zoando.
Você nem tem bunda.
E nós duas continuamos rindo. Demian nos ignorou, entrou na sala
com Bernardo e fechou a porta, proibindo-nos de participar da reunião
daquele dia.
“Achei que eu era a vice. Bem, tanto faz”.
Eu iria sair da sala mesmo assim. Demian só me expulsou para dizer
depois que foi ele que me proibiu, e não eu que saí por vontade própria...
que mané.
Mas o que mais me irritou naquilo tudo foi o sorriso de deboche na
cara de Bernardo. Se ele pensava que iria tomar meu gostosão de mim,
estava muito enganado.
Ele adorava quando discutíamos. Bernardo queria que terminássemos.
Apesar das piadas que fazia, eu sabia que ele desejava Demian de
verdade. E, embora imaginar os dois se pegando fosse um pensamento
sensual, eu não queria perder o Mimi!
Por isso, eu odiava Bernardo. E eu sentia mais ciúmes por causa dele
do que eu provavelmente sentiria por causa de uma garota. Eu não
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magia poderosa. Acho que nem mesmo um homem já teve aquele efeito
sobre mim antes. Nem o mais ardente sexo selvagem.
“Vamos lá, sua covarde. Você tem cartão de crédito. É só parcelar”.
Mas outra voz me dizia:
“Mesmo que eu parcele em mil vezes, minha mãe vai me matar”.
Mas o símbolo... me chamava.
“Compre. E seja uma rainha” eu ouvia a bolsa me sussurrar.
Até que eu entrei em transe.
Eu estava numa sala belamente arrumada, lendo confortavelmente
um livro. Até que o agradável aroma de perfumes preenche minhas
narinas.
Desvio os olhos do livro. Há um mar de riquezas diante de mim:
bolsas, perfumes e joias. Os mais caros. Os mais preciosos. Tento
alcançá-los. Até que uma mão segura na minha.
O Demian dos meus devaneios me fita ternamente:
– Fifi... por que isso é tão importante para você?
Eu largo a mão dele. E corro na direção daquele mundo de
maravilhas. Sinto o aroma dos perfumes. Provo as joias. Seguro as bolsas,
encantada.
Demian baixa os olhos:
– Eu gosto de você, mesmo sem bolsas. Eu gostava. Mas você já fez
sua escolha.
– Espere! – eu disse a ele, mas sem largar a bolsa – Por que não
posso ter você e a bolsa?
– Você pode ter a mim e a bolsa, Ofélia – ele disse – mas você não
pode ter a mim e a seu orgulho ao mesmo tempo.
E ele desapareceu.
Eu fiquei divina, cheia de acessórios. Mas por que eu me sentia vazia?
– Mimi, você é orgulhoso também – falei, para mim mesma – isso é
tão injusto. Eu não posso ter meus hobbies sem ser condenada por
você? Por que você se acha melhor que os outros por ter Deus?
Não houve resposta. Não havia ninguém lá. Eu fiquei enfurecida e
bradei:
– Eu estou decidida: do couro de Deus farei uma bolsa. Você a
desejará mais que tudo, Demian. Mas você não a terá. Porque eu a
carregarei sempre comigo. E você só terá Deus se tiver a mim!
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Eu estava feliz por ela sim. E aliviada por ter me livrado de pagar
caro naquela bolsa que eu queria, já que arrumei uma desculpa genuína
para não fazê-lo. Eu quase comprei, só para mostrar pra Poli que eu
podia.
Eu achava muito hipócrita da minha parte dar discursos moralistas
sobre o couro. Quem sabe eu até tivesse coisas de couro em casa e nem
soubesse. E, mesmo se eu soubesse, talvez eu não me importasse...
Aquilo mexeu um pouco com a minha cabeça. Mas eu odiava
moralismos.
“Foda-se, não sei nada sobre a indústria do couro pra ficar dando
discursos idiotas”.
Eu não era boazinha e não queria fingir ser. Acabei comprando uma
bolsa mais barata de couro sintético na Fellipe Krein. Foi quatrocentos
reais e devo dizer que fiquei muito satisfeita com minha compra.
– É simpática – disse Poli, com um sorrisinho de zombaria.
“Ela deve estar pensando que tenho um gosto horrível” concluí.
Sinceramente, Poliana estava insuportável ultimamente. O pai dela
havia sido promovido recentemente. E ela já estava torrando toda a
grana.
– Vamos passar as férias em Bariloche – contou ela, toda orgulhosa –
minha mãe disse que posso convidar uma amiga. Ainda estou pensando
quem vai ser.
Ela só tinha dito isso para que nós a paparicássemos muito ao longo
dos próximos meses. Eu normalmente teria feito isso. Mas algo no tom
dela me afastou.
– Ei, que tal pregarmos uma peça no Demian amanhã? – propôs
Poliana.
– Que tipo de peça? – perguntei, desconfiada.
– Primeiro você chega toda queridinha na reunião de amanhã,
pedindo desculpas por tudo. Diga que o ama.
– Hm?
Poliana queria que eu fizesse as pazes com ele? Aquilo estava soando
cada vez mais suspeito.
– E depois você o agarra pra valer!
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– Oh, bem, essa é uma longa história – expliquei – ele jogou minha
bolsa e minhas roupas pela janela, só pra me sacanear. Então tentei pegar
emprestado as roupas daquele puto, para que eu não precisasse descer
pelada. Afinal, eu sou uma dama...
– É claro que você é. Muito delicada e cortês, como sempre.
Ele me deu tapinhas na cabeça, como se eu fosse um cachorro.
– Agora eu quero isso – apontei para o pau dele, com o dedinho na
boca, como se eu fosse uma criança querendo um pirulito.
– Podemos conversar antes?
– Nem pensar! Foda primeiro. Conversa depois. E que seja uma
conversa bem curta, porque eu tô zangada – esclareci – mas se o meu
gostosão me der bastante prazer e enfiar o cacete bem fundo na minha
buceta, vou ficar beeem mansinha.
– Por que você está lambuzada de mel?
“Bah, os homens não entendem nada” pensei, desapontada. E depois
de todo o sofrimento que passei para a surpresa!
Ele me fez um sexo oral simplesmente divino. Isso compensou por
tudo! E a forma com que ele agarrou meus peitos e mordiscou os meus
mamilos... que delícia!
E eu fiz O Senhor Boquete, porque eu amo chupar um pau. Afinal,
quem não gosta? Tem coisa melhor? Nem picolé é assim tão delirante.
Depois de comer o meu gatão, eu só queria ficar deitada agarradinha
nele, como um bicho-preguiça.
– Eu preciso te falar uma coisa, Ofélia – ele me disse, afagando meus
cabelos.
– Uhhmm? – perguntei, meio curiosa e meio com soninho.
– Eu não te contei o quanto as discussões e acontecimentos dos
últimos dias me afetaram – explicou Demian – principalmente aquela sua
brincadeira... ainda está me perturbando de uma forma desconfortável.
– Mas você vai superar, certo?
– Não sei. Talvez somente Deus possa me dar uma luz e me ensinar
como posso aprender a lidar com meus próprios sentimentos,
inseguranças e dores. Mas para isso eu precisaria de dedicação completa.
Eu não vou te culpar. Quero parar de culpar os outros por tudo que
acontece. Preciso aprender a ser uma pessoa que resolve sozinho os
próprios problemas.
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– Fiz... brincadeira, não fiz – dei um sorrisinho, quando ele olhou feio
pra mim.
– Olha... leia a Bíblia – ele me recomendou.
– Para que, se você já a decorou de tanto ler?
– Apenas leia. É diferente quando você recebe da fonte.
– Preciso ler toda?
– Sim.
– Até as Crônicas?
– Isso.
– Puta que pariu – falei – eu desisto dessa porra!
Mas juro que eu me esforcei. Quase como uma prova de amor ao
Mimi. Eu alternava minhas leituras da Bíblia com vídeos de sacanagem
na internet. E eu me esforcei muito nesse processo. Por meia hora. Até
que desisti, pois os vídeos estavam muito picantes e me distraíam.
– Hmm... que pau apetitoso esse. Um pau moreninho...
“Mas... o do Mimi é diferente. E é o meu favorito”.
Chorei ao me lembrar disso. Ele estava num retiro. Eu não podia
mais matar a saudade que sentia dele, como eu queria. E quando eu
queria.
Quando o fim de semana terminou, ele me revelou a decisão final:
– Vou retornar ao seminário. Me desculpe.
Eu chorei um monte. Foi tudo muito dramático. Mas não havia mais
nada a ser feito. Tive minha chance de reconquistá-lo. E desperdicei.
Eu queria dizer a ele que, se um dia ele resolvesse abandonar o
seminário, eu estaria lá esperando. Mas isso não era verdade. Eu podia
aguardar certo tempo até arranjar um novo namorado, mas eu precisava
foder. Fiquei dois dias sem foder esperando pela resposta dele, e eu já
estava com fogo dos pés à cabeça. Os vídeos já não ajudavam em nada.
Segunda-feira chegou. Demian estava lá com Deus. E eu estava
sozinha.
Eu não estava mais conversando com Poliana, é óbvio. Se eu a visse
novamente no campus, iria bater nela. Ela andava meio sumida.
Estranho, pois fazíamos algumas disciplinas juntas. Ela teria largado a
faculdade?
E Alice... eu não a via mais. Não estávamos brigadas. Apenas
distantes.
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– Tô.
– Eu também! – eu disse isso com alegria – Que coincidência.
– Hm.
– Quer foder?
– Sim.
“Vivaaaaa!” Mas que fácil! Foi só ligar pro ex. Para um dos nomes da
minha extensa lista de ex-namorados...
Eu o convidei para ir até a minha casa. E dessa vez ele não ficou de
frescura. Assim que ele chegou no meu quarto, nos beijamos e nos
despimos.
Aos meus 18, meu romantismo pré-adolescente já havia ido embora
há muito tempo. Se é que ele existiu um dia.
Aquela foda foi gostosa. Mas não tão boa quanto uma foda com o
Demian. Deve ser porque eu e o Otávio ainda não estávamos em
sintonia. Ou o Otávio, mesmo não sendo virgem, ainda era inexperiente
demais e não sabia bons truques para satisfazer as mulheres, sempre tão
misteriosas e exigentes no sexo.
Se bem que... eu era uma exceção. Eu não era misteriosa e exigente.
Tendo um pau, eu já ficava satisfeita.
“Mas eu não sinto o coração do Mimi batendo junto com o meu. É o
coração de um desconhecido”.
Otávio parecia quase um cadáver transando. Depois da foda, ele não
disse nada. Pensando bem, ele também não disse nada antes.
– Otávio? – perguntei, pra me certificar – Tá tudo bem contigo?
– Não.
Eu tinha me esquecido de perguntar como ele estava no telefonema.
Perguntei se ele já tinha se livrado da virgindade e se queria me comer,
mas... me esqueci da pergunta mais básica.
– Eu me sinto meio depressivo ultimamente – ele confessou – deve
ser porque só fico trancado em casa no computador, sem ver ninguém.
“Mais um depressivo. Droga! Isso é moda, agora?” eu estava braba.
Eu queria estar com um cara alegre e alto-astral, que me fizesse rir. E
não com um morto-vivo gemendo pelos cantos.
“Já sei, eu preciso de um cachorro! Cachorros são alegres” pensei
“Mas eu já tenho minha gatinha, a Babu...”
– Ofélia, está me ouvindo?
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Ele colocou a mão no meu ombro. E entrou na sala, sem dizer mais
uma palavra.
Senti, muito de leve, o cheiro dele quando Gregório passou. Isso fez
meu coração acelerar. Até numa hora dessas, em que eu estava triste, eu
ainda pensava com a buceta.
E durante a reunião inteira, não ouvi uma palavra da palestra de
Gregório. A sala estava cheia, com os novos membros, mas nem reparei
neles. Eu só conseguia olhar para o corpo do mestre.
A voz dele era perdidamente sensual. A forma com que ele falava das
coisas com extrema convicção.
Os braços. As mãos. Eu queria aquele homem para mim.
“Ângela, sua sortuda”.
Eu queria que Eugênia ainda estivesse comigo. Para que eu, Demian
e ela nos sentássemos juntos como nos velhos tempos. Naquele mesmo
lugar.
Mas eu fui a única que restou de nós três. Aliás, havia poucos
membros das antigas. Eu era vista como veterana na Flolan pelos
novatos, e era respeitada, mesmo com minha idade.
Aquilo tudo era divertido no começo. Estar na sala exclusiva. Ser
veterana. Mas depois perdeu um pouco a graça.
Às vezes você deseja muito uma coisa. Até daria sua vida por ela. Mas
depois que a obtém, a magia termina.
“Mas a magia só termina se você desejar” pensei “Porque pode haver
uma magia nova a cada dia, mesmo nesse velho mundo”.
Quando eu descobri que conseguia mexer com poderes sobrenaturais,
fiquei encantada. Depois se tornou meio chato, comum. Como qualquer
outra coisa comum do mundo. Meus poderes só impressionavam
algumas pessoas que não sabiam que as coisas do espírito não são
superiores às do corpo.
Era muito árduo desenvolver minhas capacidades psíquicas além do
nível que elas se encontravam. Num mundo em que mente, corpo e alma
são equivalentes, eu preferia simplesmente abraçar as diversões do
mundo. O sexo, especialmente. Eu poderia extrair poder mágico disso,
embora na maioria das vezes eu apenas fodesse normalmente, sem forçar
minha mente além do necessário.
“Eu só quero ser feliz. Do meu jeito”.
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monótono e eles iam querer voar. Se voassem, iam desejar outra coisa
ainda mais absurda.
– Talvez as pessoas queiram poderes para se exibir – concluiu Celeste
– por ter uma coisa que os outros não têm. É como comprar bolsas de
grife só pelo prazer de mostrar que tem grana.
– Ah, verdade, he, he.
Tirei a bolsa do meu colo e escondi-a na cadeira ao lado da minha.
– Mas, se pensar com cuidado, também existe esse apelo em ser
membro de uma Ordem de magia altamente restrita – observei – é para
ser exclusivo. Porque lá você é VIP! E você se sente especial.
– O que será que precisamos fazer na vida para nos sentirmos
especiais? – perguntou Celeste, pensativa – Eu acho que é ter um super
namorado que ame a gente mais que o mundo! E que seja o mundo para
nós. Você não acha?
– Totalmente! Você tem um gatinho?
Ela mostrou a aliança.
– Tô noiva! Mas não sou mais virgem há muito tempo, há, há.
– Menina, eu não sei mais o que é virgindade desde a sétima série!
E eu tive uma grande ideia.
– Eu vou fundar uma Ordem na minha universidade. Quer entrar?
– Mas eu não estudo na sua universidade.
– Se matricula num curso da extensão, sei lá.
Eu queria arrastar o máximo de membros possível. Mas eu ainda
precisava decidir o nome da Ordem.
No início da tarde, levei a Celeste para a universidade. Apresentei-a
para Fernanda.
– Então já somos três – observou Fernanda, contente.
– Todas lindas e inteligentes! – acrescentei.
– Ora, mas todas as mulheres são lindas e inteligentes – disse Celeste.
– Verdade, verdade – tive que concordar – e não é que os homens
também? Quero homens bem gostosos na minha Ordem! Mas se todos
são gostosos, então basta ser homem que vou ficar feliz.
– E por que não fazemos uma Ordem só de garotas? – propôs
Celeste.
Parei para pensar.
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Fiquei tão feliz por ter conseguido mais uma menina linda como
membro! Yolanda tinha a pele morena clara, extremamente deliciosa.
Olhos e cabelos profundamente negros.
“É tão negro que é quase azul!” notei, fascinada.
Eu tinha vontade de apertá-la.
– Agora só precisamos de um escritor – concluí.
– Acho que escrevo bem – disse Celeste – ganhei um prêmio na
segunda série com uma história sobre uma girafa triste.
– Que extraordinário! Por que a girafa era triste?
– Porque ela não tinha um “girafo”.
– Nossa, que profundo, Celeste – falei, achando tudo super
romântico.
Enquanto isso, Yolanda nos fitava com uma expressão meio
assustada de “Por alguma razão, eu sei que elas não estão brincando”.
Anotei as funções de cada uma no meu bloquinho e passei as tarefas:
– Yô, quero os brasões pra amanhã. Posso te chamar de Yô, né?
– Claro, meu nome e meu corpo são seus. Sirva-se deles como
desejar.
Ela já sabia que tinha vendido a alma para o Diabo. Um cor-de-rosa e
com plumas.
– Cel, um grimório pra semana que vem – mandei.
– Sobre o quê?
– Não interessa! Pode ter cinco páginas e ser sobre qualquer coisa –
instruí – mas precisamos ter um grimório.
– Por quê? – perguntou Yolanda, já antevendo uma resposta ilógica.
– Porque... meu mestre já escreveu uns dez grimórios e eu acho isso
muito foda. Escreva qualquer bobagem e diga que é secreto. Todos vão
ficar loucos pra ler. Mas só quem for de último grau terá acesso a ele.
– E como se faz para chegar no último grau? – perguntou Yolanda,
monotonamente.
– Tem que transar comigo – respondi – ou me dar uma bolsa.
– Eu não quero transar com você – Yolanda me fitou de canto –
tenho um namorado.
– Era brincadeira, tolinha – eu ri.
– E o resto era zoeira também?
– Não.
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– Droga...
– Fernanda, você vai comprar o bule de chá, as xícaras e uma bela
toalha florida – instruí – quero chá de limão. Leite desnatado. Açúcar
mascavo... pronto, isso é tudo. Eu compro o spray.
– Não temos que mandar fazer os mantos?
– Merda, esqueci. Quando o brasão estiver pronto, vamos costurá-lo
em vestidos. E também teremos bolsinhas com o emblema da Ordem.
– E quem vai pagar por tudo isso? – perguntou Yolanda.
– Nós vamos fazer uma vaquinha – respondi – ou podemos tirar
fotos de todas nós de minissaia e vendê-las em troca de contribuição
para a nossa nobre sociedade.
– Isso não estava no contrato, meu.
– Eu estou trollando você – informei.
– Porra, me pegou de novo. Você é boa.
Mas eu estava tão empolgada com os meus projetos, que me sentia
disposta a investir meu próprio dinheiro para fazer acontecer.
Naquela mesma noite preparei um site para a MAS. Passei o link para
a Yolanda por e-mail, mandando que ela arrumasse o layout e
adicionasse o símbolo da Ordem. E a tarefa de Celeste seria escrever
alguns textos de introdução.
Na madrugada, marcamos a primeira reunião online da Ordem.
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Embora o site fosse aberto, havia uma seção restrita apenas para
membros, acessada somente por senha.
Encarreguei Yolanda das pichações da MAS. Assim ela faria
pichações mais elegantes, extremamente artísticas, muito melhores do
que teriam sido as minhas, que nem sabia como apertar um spray.
Não demorou muito para que nossas atividades despertassem a
curiosidade dos alunos. Não porque eles estivessem interessados em
ocultismo. E sim porque eles queriam saber o que as quatro damas
elegantes faziam durante aquele chá particularmente exótico.
Se alguém nos perguntava qualquer coisa, dizíamos:
– Não podemos revelar.
Aquela era a chave para que a galera ficasse ainda mais intrigada. E
quanto mais pichações e folhetos com frases e símbolos misteriosos se
espalhavam pela universidade, mais eles queriam saber do que se tratava.
Aos poucos, eles faziam a associação: o brasão de nossos vestidos e as
cores eram os mesmos dos cartazes afixados nos quadros de aviso.
– Monte um quebra-cabeça – fiz essa proposta para Celeste – uma
charada. Espalhe por aí, até que as peças sejam montadas. Mas terá que
ser algo difícil.
Aquele foi o estopim para que fosse iniciada a “Guerra do Mistério”,
como seria chamada mais tarde. Nós escondemos várias pistas nos
lugares mais inusitados, incluindo banheiros. Havia trechos escritos com
um alfabeto mágico, que alguns já estavam tentando desvendar,
conforme a organização das frases.
– Ofi... nós saímos no jornal da universidade – mostrou Fernanda,
espantada.
Eu também me surpreendi. Alguém havia tirado uma foto nossa, sem
autorização. Havia fotos dos cartazes também. E uma matéria.
O que realmente planejam as damas mascaradas? Há quem diga que elas são
apenas estudantes comuns que, por alguma razão inusitada, resolveram preparar uma
cerimônia do chá no meio da universidade, trajadas em vestidos no estilo da Era
Vitoriana. Seriam um grupo de teatro? Os estudantes de cênicas querem pregar uma
peça bem tramada?
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Os especialistas dizem que não. „Elas não são de cênicas. Nunca as vi no centro
acadêmico. E conheci as calouras desse semestre, que, por sinal, são muito gostosas‟
diz Ramiro S. Gonzalez, 7º semestre de artes cênicas. „Deve ser uma irmandade‟
propôs Laura M. Nogueira, 2º semestre de história. „Eu acho que são apenas idiotas
querendo aparecer‟, concluiu Ana C. Silva.
Sejam um grupo de teatro, uma irmandade, ou apenas idiotas, parece que todos
estão entusiasmados com as charadas. Os boatos mais excêntricos dizem que aquele
que primeiro resolver o mistério receberá uma vaga na tal irmandade. Ou, pelo menos,
será informado em primeira mão a respeito do grande segredo que guardam as
belíssimas senhoritas.
„Belas nada. Devem ser feias, por isso escondem o rosto‟ concluiu sabiamente
Helena B. Rodriguez, que afirma não estar com inveja, mas apenas dizer a verdade
sobre os fatos, de forma imparcial”.
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Eu criei algo bem feliz, com cores vivas e brilhantes. Isso parecia
aumentar ainda mais o mistério. Se apenas usássemos mantos negros
com capuzes, tudo teria ficado subitamente claro. Com simbolismos
mais aleatórios, ninguém sabia ao certo o que pensar. Éramos uma
sociedade secreta? Ou meninas levadas? Talvez os dois?
Beleza. Fama. Poder. De repente, aquilo tudo estava chegando a mim
muito rápido, de uma forma que eu jamais teria sido capaz de prever.
É inegável que a forma com que nos vestíamos fazia com que as
pessoas nos fitassem com cada vez mais interesse. A nossa beleza era
buscada. E o segredo por trás das máscaras.
Cada vez mais pessoas liam o nosso site, porque todos estavam
ávidos por mais informações. Eu era a única que escrevia matérias por lá,
deixando claro que os desenhos eram da “Borboleta Mascarada”.
Os nossos codinomes eram de acordo com as máscaras que
usávamos. Fernanda era o “Dragão Mascarado”. E Celeste era a “Coelha
Mascarada”.
Quanto a mim, fiquei particularmente famosa como a escritora do
site. Eles sabiam que eu era a líder. Então, quando nós quatro estávamos
juntas, eles sabiam bem para qual máscara apontar. A garota que estaria
debaixo dela seria o maior segredo de todos.
Há quem cogite que tudo se parece muito com um ARG. Mas a maioria
realmente deseja que essa seja uma sociedade secreta real. Os membros já foram vistos
com grimórios e tarôs e parecem realizar rituais genuínos, com espadas e outros objetos
suspeitos.
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„Se elas realmente estudam magia e possuem poderes sobrenaturais, por que
apenas tomam chá?‟ pergunta Carlos B. Carvalho. Ainda há muitas perguntas sem
resposta. Mas a maior delas talvez seja: quem é a garota por trás de tudo e o que ela
planeja?”
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Eu não ia ligar pro primeiro, que era um pé no saco. Dois deles nem
moravam mais na minha cidade. E Alfredo... eu tinha ouvido falar que
ele arranjou uma namorada nova. Era melhor eu não perturbá-lo.
Por isso, fui ao bar mesmo.
E adivinha quem eu encontrei lá?
Gregório.
Inicialmente ele não me reconheceu. Isso porque eu estava usando
uma maquiagem carregada. Eu parecia até outra pessoa.
Eu me maquiava ocasionalmente, mas costumava ser algo leve para o
dia. E eu não usava muito preto. Naquela noite eu usava um vestido
muito decotado, curto e brilhoso, além de salto fino. Fiz isso para deixar
bem claro que eu queria transar e eu esperava que os caras de lá
entendessem o recado. Provavelmente não entenderiam, então o álcool
me ajudaria a passar o recado corretamente e claramente.
Mas com Gregório lá seria complicado. Ele não era exatamente
fofoqueiro, mas imaginei que bastava uma pessoa conhecida para que
membros da Flolan ficassem sabendo exatamente com quantos caras
dormi numa só noite.
Optei por não cumprimentá-lo. Eu fingiria não tê-lo visto. Ele não
precisava me reconhecer.
Só que ele olhou na minha direção. Precisou observar por um tempo
até pronunciar meu nome.
– Ofélia?
– Ah, oi! Nem tinha te visto – menti – onde está a Ângela?
– Ela não vem.
– Está esperando amigos?
– Eu vim sozinho – respondeu Gregório.
– Por quê? – deixei escapar – Você tem um monte de contatos e
conhecidos.
– Eu precisava de um pouco de privacidade.
– OK... – eu disse – foi bom te ver. Tchau.
E eu fui até o balcão pegar uma bebida.
Comecei a observar os caras de lá. Um dos garçons tinha uma bela
bunda. O que seria preciso fazer para levá-lo para a cama?
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Por acaso, olhei na direção da mesa do Gregório. Notei que ele estava
com a cabeça baixa, apoiada nos braços. Fiquei preocupada. Será que ele
estava bem?
“Algo aconteceu” só podia ser.
Fui até a mesa.
– Tudo bem?
Ele levantou a cabeça.
– Sim – ele respondeu – só bebi demais.
– Eu preciso te perguntar uma coisa – decidi – posso me sentar?
Ele não respondeu. Sentei-me mesmo assim.
“Ele disse que queria privacidade, Ofélia...”, mas eu era teimosa.
– A reunião de hoje foi cancelada – lembrei – por quê?
– Você faltou praticamente o mês inteiro – respondeu Gregório –
por que está preocupada com apenas um dia?
– Você não parece bem. Não sabia que tinha o costume de vir
sozinho em bares como esse.
– Eu tenho. Há várias coisas a meu respeito que você não sabe.
– Você transava com um monte de garotas diferentes no colegial – eu
disse – e daí? Eu também fazia isso. Não é nada de mais.
– Não era a isso que eu me referia – observou ele, meio surpreso e
levemente aborrecido – onde ouviu isso?
– Ah, hã... por aí – eu disse, vagamente.
Gregório tomou mais um gole da bebida.
– Basta um pouquinho de fama que sua vida privada não é mais tão
privada – disse Gregório – não acredite em tudo que lê na internet.
“Eu não li na internet. Foi o Demian que me disse”. O Gregório
estava sendo meio arrogante. Seria por causa da bebedeira? Acho que eu
nunca o havia visto bêbado daquele jeito.
“Pergunte sobre o grimório de último grau” tive essa ideia repentina.
Era a ocasião ideal para arrancar informações dele.
Mas, para a minha surpresa, ele falou de mim.
– Você sabe o que quero dizer – ele prosseguiu – já que passou por
isso também.
– Eu exponho minha vida na internet por vontade própria – eu ri –
não é como se fosse um segredo. Eu não tenho segredos. Falo sobre a
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– Não foi isso que eu quis dizer – ele explicou – não me importo de
ser esquecido. Para mim será o bastante ter trocado experiências com os
outros. E ficarei feliz o suficiente sabendo que as pessoas ao meu redor
continuam dando o melhor de si para viver. Uma vida sempre faz
diferença. Não importa se é esquecida ou lembrada. Um corpo que pisou
nessa terra já fez história apenas por existir. Mesmo que por um breve
instante.
– E quando você tiver um filho com a Ângela, se tornará imortal não
somente em espírito, mas também em carne – acrescentei, sonhadora,
imaginando uma miniatura fofinha do Gregório.
– Eu não terei um filho com ela.
– Por que não? – perguntei, intrigada – Não quer ter filhos? Eles dão
muitos gastos, não é mesmo? Talvez você devesse ter um cachorro ou
um gato, pelo menos.
– Eu terminei com a Ângela.
Num primeiro momento, eu não disse uma só palavra. Eu estava
chocada demais.
– Quando...? – perguntei, ainda assustada.
– Hoje de manhã.
– Foi sério? Talvez amanhã vocês voltem.
– Não voltaremos – ele respondeu, determinado.
Concluí que seria indiscreto perguntar o motivo de eles terminarem.
Pelo jeito Gregório não havia aceitado isso bem. Por isso tinha
cancelado a reunião. E estava se acabando de beber.
Contei os copos vazios na mesa.
“Cacete”.
– Hoje é meu aniversário – falei, só para desconversar.
Péssima hora para informar, sei disso. Mas Gregório não parecia
muito a fim de falar de Ângela, de qualquer forma.
– Parabéns – ele comentou, meio desinteressado, mas sem soar mal
educado – quantos anos?
– Dezenove.
– Já? Quando eu te conheci, você tinha só quinze.
– Sou uma mulher adulta agora – informei, orgulhosa.
Gregório deu um sorriso de canto e bebeu mais um gole.
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– Bom dia – eu sorri – quer que eu prepare seu café da manhã? Sei
colocar a cafeteira na tomada. Também sei pôr um queijo e um presunto
dentro de duas fatias de pão...
Mas ele ainda me fitava com assombro. Ele cobriu a boca com a mão.
– Meu Deus...!
Eu achava cada vez mais engraçadas as manifestações de surpresa de
Gregório. Eu estava me segurando para não cair na risada.
– Eu não me lembro de nada! – exclamou ele, nervoso – O que
aconteceu? Por que você está aqui?
– Você quer que eu comece a contar desde que começamos a nos
agarrar ou desde a parte em que nos encontramos no bar? – perguntei.
– Eu me lembro vagamente de ter ido para um bar – ele colocou a
mão na cabeça – essa é a primeira vez, desde minha adolescência, que
tenho um lapso de memória tão gigantesco.
Um lapso? Aquilo era amnésia e das grandes. Ele tinha enchido a cara
tanto assim? Caramba... mas nossas conversas pareceram tão normais!
– Você me disse que terminou com a Ângela – contei – então estava
no bar para afogar as mágoas.
– Imaginei que fosse isso. E por que você estava lá?
– Coincidência – eu disse, simplesmente; e não era bem uma mentira
– conversamos um pouco e você se ofereceu para me dar uma carona
para casa.
– Sério? De carro? Depois de beber tanto? – Gregório estava
impressionado com a própria falta de responsabilidade – E você
concordou?
– Eu não quis ser indelicada de recusar. Só que você bateu o carro no
caminho.
– Eu bati o carro?! – perguntou Gregório, como se fosse o fim do
mundo.
– Eu levei um corte na testa e você ficou assustado porque sangrou –
expliquei – você insistiu mil vezes para que eu fosse ao hospital. Eu disse
que não precisava.
– Nossa! Ofélia, eu sinto muito. Eu fui um completo idiota
irresponsável ao dirigir nesse estado. E com você junto no carro! Isso
que é pior. Eu jamais iria me perdoar se algo terrível tivesse acontecido
por minha causa.
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Ela estava de negro como da última vez. Mas nessa ocasião ela usava
cartola, para combinar com o chá.
– Quer uma máscara, Sarrelot? – ofereci a ela uma máscara negra.
– Sim, Gata, por favor – respondeu ela, aceitando minha oferta.
E permanecemos mais uma hora mergulhadas no fantástico mundo
das fofocas femininas.
– Eu não acreditei quando te vi entrar no fã-clube que criei –
confessei – sinto-me honrada.
– Eu não perderia essa oportunidade de zoar o Gregório – disse
Sancha, com um grande sorriso – é uma pena que ele e Ângela
terminaram. Mas ele tem que superar. Às vezes ele é sério demais.
– Eu sei exatamente o que você quer dizer. Ei, Sancha, você sabe
desenhar?
– Estou aprendendo. Eu faço artes em outra universidade.
– Você definitivamente devia se transferir pra cá – observou Yolanda
– assim eu serei liberada de meus deveres.
– Seja sincera, você está gostando de ficar conosco – observei.
– Só um pouquinho...
Não era só eu que era famosa. As outras três gatinhas também
estavam ganhando notoriedade. Era quase como se fôssemos um grupo
musical e os nossos admiradores tivessem um “membro preferido”.
– Eu amo a Borboleta Mascarada, com aqueles cabelos longos, olhos
de jabuticaba e pele bronzeada. Os símbolos que ela cria para o site da
MAS são admiráveis.
– Eu prefiro a Coelha, com seu sorriso metálico. Ela que escreveu
aqueles trechos do grimório que vazaram, sabia?
– Isso não é nada. O Dragão e a Gata são as mais poderosas na
prática. Você já sentiu como o ar fica pesado ao redor delas?
E quando eu ouvi isso, eu estava praticamente do lado do cara no
R.U. Ele era um panaca mesmo. Sem máscara, eu era apenas um ser
comum. Até porque usávamos penteados diferentes durante o chá. Não
que fosse muito difícil nos reconhecer. Bastaria que alguém nos seguisse.
Mas desde aquele vídeo do fogo, alguns passaram a ter medo de chegar
perto de nós.
E, enquanto eu me divertia despreocupadamente, eu não sabia o que
me aguardava...
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Capítulo 3
– Não.
– Por favor, Mimi...
– Eu já disse que não!
– Mas é só um beijinho!
– Por que ainda estamos conversando sobre esse assunto? Eu disse
que não vou fazer. E ponto final.
Eu fiz cara feia. Aquilo era algo antigo. Já fazia muito tempo que eu
vinha tentando convencer o Demian a beijar a Valentina. Se ele topasse,
eu receberia um dos famosos grimórios secretos de AMV em primeira
mão!
Mas não... ele continuava com essa frescura de que eu tinha sido a
única garota que ele já havia beijado e não queria perder isso, e blá, blá,
blá. Sendo que eu já havia beijado Deus e o mundo.
– Sabia que eu já transei com mais de cem caras diferentes?
– Você contou? – perguntou Demian, meio impressionado.
– Sim – brinquei – foram mais de cem só nesses últimos meses que
estivemos separados. Um deles tinha até dois paus!
Demian notou que eu estava mentindo. Fitou-me com aquele seu
olhar de desaprovação. Eu acariciei os cabelos dele.
– Mesmo que eu encontre um cara com dez paus, sempre vou gostar
mais do seu – falei, com carinho – você só tem um, mas faz um ótimo
serviço.
– E um não é o bastante? Você queria que eu tivesse quantos?
– Pelo menos dois. Eu queria saber como é a sensação de ter dois
paus entrando na minha buceta ao mesmo tempo. Seria legal também se
eu tivesse duas vaginas. Ou quatro peitos.
– Agora sua tara não é mais tamanho? É número?
Eu mostrei a ele meu laptop.
– Estou escrevendo uma história – eu expliquei – é sobre um alien
que veio pra Terra com a missão de foder todo mundo. Ele tem 144
cacetes.
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– Ofélia... por que não escreve uma história normal para uma garota
da sua idade? Sobre uma menina que se apaixona por um menino. Eu
ficaria feliz de ler uma história assim escrita por você.
– Só escrevo isso se tiver sexo selvagem no meio. Os dois vão se
apaixonar na primeira página. Nas outras 99 páginas restantes só vão
ficar trepando sem parar.
Demian pegou meu laptop.
– Me dá isso aqui. Você não sabe escrever. Eu vou começar agora
uma história que relatará o amor de Jesus pela humanidade.
– NÃO, POR FAVOR!!!
Tentei pegar o laptop de volta. Mas Demian não deixou. Ele viu
outra página aberta.
– Espere, o que é isso? Eu ainda não tinha lido esse seu perfil. Aqui
diz que você tem 47 quilos. Mas você tem 48.
– Não faz mal diminuir um quilinho... – eu reclamei – não conta pra
ninguém, hein?
– Prometo que não deixarei ninguém saber desse seu grande segredo
– brincou Demian – aliás, deve ser seu único segredo, já que você expõe
todo o resto da sua vida na internet.
– Isso não é verdade. Não relato todas as nossas relações sexuais na
internet. Só algumas.
– Você conta algumas?! – perguntou Demian, irritado.
– Mas eu só falo delas em fóruns, para tirar dúvidas sobre sexo –
expliquei.
– Que dúvidas?
– Não, não olha!
Eu fiquei zangada. Demian verificou o meu histórico. Achou o site e
leu:
– “Ontem eu finalmente trepei com um negão gostoso, que eu já
desejava há quatro anos. Mas na segunda vez que ele enfiou, senti muita
dor. Isso nunca tinha acontecido antes, desde minha primeira vez. Seria
porque o caralho dele era grande demais? Ou seria por eu não estar
lubrificada o suficiente?”
Demian parou de ler.
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“Há esse monstro dentro de mim. Essa aberração. Devora meus intestinos dia e
noite. Hei de mastigar o bastardo carniceiro. Enquanto vive, dedico esses escritos a ele.
Quando morto, não os dedicarei a ninguém”.
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– Acho que não. Se eles são uma sociedade secreta séria, vão falar
sobre os assuntos da sociedade, não?
– Você quer dizer que a sua sociedade não é séria? – desafiou-me
Demian – Nem mesmo eu tenho o poder de impedir as conversas
paralelas na OAAL. A minha Ordem é mista e tem um número
relativamente equilibrado de homens e mulheres. É uma boa Ordem. Já
na sua, eu mal cheguei na sua mesa de chá naquele dia e você e suas
amiguinhas já fizeram piadas e começaram a rir da minha cara. Não foi
assim?
– Foi – tive que admitir.
– E isso aconteceu porque sou homem e fui discriminado na sua
Ordem cor-de-rosa – prosseguiu ele – e pela mestra da Ordem, ainda
por cima. Se você chegar na Coroa & Reino, vai ter que aguentar piadas
machistas. Eu te garanto isso. Mesmo que eles se esforcem para serem
gentis com você, vão acabar soltando umas e outras. E sabe como eu
posso te garantir isso?
– Hã... como? – perguntei, sem muito interesse.
– Porque eu vivo num ambiente de homens. Desde sempre. Fui
educado no seminário. Quase todos os meus colegas na teologia são
homens. Você normalmente pensaria que seminaristas e padres se
portam de forma mais adequada, mas nem sempre isso acontece. Meus
colegas são fanáticos por futebol. Quanto a isso, nem reclamo, embora
eu mesmo não goste. Mas eles também ficam falando de mulheres, falam
de putaria, dão exemplos escrotos, inclusive os padres.
– Mimiiiii!
– Sim?
– Tu não entendeu. Eu só vou entrar pra Coroa & Reino e depois me
mandar. Não ligo se eles forem escrotos ou não. Só quero coletar
informações.
Eu não me importava de entrar por alguns dias no clubinho machista
dos macho men falando de putaria, já que eu liderava o clubinho
feminista das mulheres fogosas, que provavelmente falavam muito mais
putaria que os caras.
Resolvi me aproximar do grupinho vestido de vermelho numa tarde.
Realmente, quase todos eram homens.
– Oi pessoal. Como faz pra entrar pro grupo de vocês?
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– Meh.
– Eu dei todo esse discurso, e isso é tudo o que tem a dizer?
– Odeio quando você tá certo. É isso o que “meh” significa.
– Eu não quero estar certo. Só quero te ver segura. Agora, apenas
esqueça essa disputa boba entre sociedades. Que cada um cuide da sua.
Não tem porque brigar.
– Para a Coroa & Reino é muito fácil não brigar, já que eles estão
levando a melhor. Os seus membros estão indo para lá e muitos
perderam o interesse na MAS porque só têm olhos para a C&R. Que
bosta.
– Em vez de tentar atingi-los diretamente, que tal melhorar a sua
Ordem? – sugeriu Demian.
– Você pode melhorar a sua, criando uns rituais legais de iniciação.
Mas eu não sei mais o que fazer na minha!
– Abra inscrições para novos membros.
De fato, era o momento ideal. E eu fiz isso. Divulguei no blog da
Ordem e em muitos outros lugares. Logo, apareceram interessados. E o
melhor de tudo: eu soube que alguns membros saíram da C&R para
tentar o teste de admissão da MAS! Eu me sentia vitoriosa.
Quem não gostou muito foi o líder da Coroa & Reino. Ele logo
contra-atacou: ofereceu um brinde a todos os novos membros que
ingressassem na C&R a partir dali. Quem passasse no teste de admissão
receberia um saquinho com uma surpresa dentro.
– Era só o que faltava! O infeliz está chamando as crianças com balas.
E está funcionando! – reclamei, indignada.
– Pensei que você não ligasse para o número de membros – observou
Demian.
– Eu não ligo. Só quero ganhar dele.
– Eu não quero me envolver nisso. Só fiquei aborrecido no começo
porque os membros que já estavam na minha Ordem saíram em bando
para a C&R. Mas como agora as sociedades daqui estão tão famosas, tem
mais gente interessada em ser membro ultimamente, então há um
equilíbrio entre os que entram e saem.
– Então você liga para o número de membros!
– Eu quero pelo menos ter algumas pessoas para debater! Sozinho,
como vou manter uma Ordem?
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Quando Demian soube que li um livro escrito por Camilo, ele não
gostou.
– Eu já escrevi um monte de livros. Dezenas! – disse Demian – Você
nunca leu. Nenhum. Sempre disse que tinha preguiça.
– Ah, mas você escreve de forma muito chata. Eu durmo quando
tento ler.
– Aposto que você só leu o livro dele porque foi publicado – disse
Demian – hoje em dia qualquer um pode pagar para publicar um livro
numa editora pequena. Não é só porque o livro existe em papel que ele é
melhor. A qualquer momento posso ir numa gráfica e mandar
encadernar os meus. Se eu tivesse grana pra isso...
Mas Demian ficou curiosíssimo para saber que livro misterioso era
esse que até eu tinha aguentado ler até o fim. Ele me pediu emprestado.
E ficou ainda mais alterado quando terminou a leitura.
– Preciso conversar com esse cara – disse Demian.
– Você gostou? – perguntei, admirada.
– Não. Odiei. Discordo de 100% do que foi dito. Quero dar a ele
bons argumentos para refutar cada frase.
Aquilo seria divertido. O momento teve plateia. O pessoal da MAS e
da OAAL foi assistir.
– Então você é o autor? Muito bem – começou Demian, folheando o
livro – Vamos começar com a primeira frase. Irei dar-lhe argumentos
convincentes para que você desista dela.
– Não se preocupe – disse Camilo – eu não concordo mais com nada
do que eu disse nesse livro. Está repleto de falsos silogismos e paradoxos.
Não precisa apontá-los. Conheço cada um deles.
Demian ficou sem fala. Devolveu o livro para Camilo.
– Talvez tenha uma ou duas frases que valem a pena – comentou
Demian.
– Obrigado – sorriu Camilo – fico feliz de saber que sua leitura não
foi em vão.
Demian desistiu de discutir com ele. Foi embora de lá.
– Odeio pessoas assim – Demian me disse – mas o Senhor as vê com
bons olhos.
– Você se refere à gentileza dele?
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– Não sei. Tem algo nele que me faz perder a vontade de discutir. Eu
sinto que ele não compraria nenhuma das minhas brigas, por mais que eu
tentasse. Não tem graça debater assim.
“Camilo você é foda. Fez Demian desistir da discussão”. Mas
Demian tinha razão. Camilo provavelmente acharia maravilhoso todos
os pontos que Demian levantasse e concordaria com eles. Então o
objetivo da discussão se perderia.
Fui ao laboratório de informática checar a internet. Levei um susto
quando li no blog da Coroa & Reino um monte de ofensas gratuitas à
nossa “Ordem rosa cheia de fru-frus”.
Eu rebati. Escrevi no blog da MAS críticas gratuitas à C&R.
“Que autoridade tem a líder da MAS para proclamar-se uma
entendida na filosofia oculta?” escreveu Felipe, também conhecido como
o Rei Vermelho.
Acabei revelando que eu era membro da Flolan. Pouco tempo depois,
a procura por informações da Flolan cresceu assustadoramente.
Houve uma grande confusão. Alguns diziam que a Flolan só podia
ser uma Ordem ruim, por ter gerado uma líder tão superficial. E outros
estavam doidinhos pra ter mais informações sobre a Ordem da Flor e da
Lança, porque queriam conhecer o “mestre da mestra da MAS”.
E quando souberam que a Sancha nos fazia algumas visitas, aquilo se
tornou um alvoroço. A ODE era famosa nessa época. E sabe o que eu
fiz para provocá-los ainda mais? Divulguei a primeira página do grimório
secreto da AMV no meu blog.
Aquilo foi o bastante para emputecer os satanistas fanáticos da OCB.
Alguns me ameaçaram de morte. Valentina me contatou, completamente
puta.
– Se algum membro da Ordo Coma Berenices descobrir que você
teve acesso aos grimórios por mim, eu evoco um príncipe infernal para
comer sua buceta!! – gritou Valentina, pelo telefone.
– Pode mandar, meu bem – respondi – Vou adorar ser comida por
um capeta com chifres bem grandes e um cacete pulsante e vermelho!
Queridaaaa!
E bati o telefone na cara dela. Demian estava ao meu lado.
– Nhawn – miei – quer pudim?
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Mas Gregório ficou tão alterado com a bagunça que fiz, incluindo
minha gravidez e a briga das Ordens, que chamou até o Alan para visitar
a sede. Estavam todos insanos na internet, espalhando boatos loucos. Eu
não sabia se Alan tinha a solução mágica que resolveria todos os
problemas, mas não duvidei que ele daria bons conselhos. Ninguém
duvidava.
O que eu não esperava era que ele fosse trazer um diabinho junto
com ele.
Maximiliano era filho de Alan. O pirralhinho tinha só doze anos e me
pediu em casamento! Como ele se atrevia?
Tive que rir da cara dele. Não sei como aguentei escutar o discurso
dele por tanto tempo. Fiz cara feia. Eu me irritei. Mandei-o longe.
– Espere, Ofélia...!
Dei-lhe o dedo e saí de lá.
Era só o que faltava. Além de todos os problemas que eu já tinha.
– “Eu não sou mais virgem. Sou superior a você” – relatei a Demian
as frases escrotas do pivetinho – Dá pra acreditar que ele soltou essa?
– Deixe-o para lá – sugeriu Demian – crianças são assim mesmo.
– E não foi você que chegou na Flolan com 18, dizendo que era
melhor que todos?
– Eu não! – defendeu-se Demian – Eu provava a validade dos meus
argumentos nos debates. Eu não chegava do nada proclamando coisas
assim, como um idiota.
– Sei – falei, duvidando – mas você realmente melhorou nos últimos
anos.
– É óbvio. Minha religião ressalta a importância da humildade.
Imagina se não ressaltasse... Ignorei-o. Aquele dia na Flolan havia
sido apenas uma ocasião irritante. O filho do Alan voltaria para sua
cidade e fingiríamos que aquela cena patética não havia ocorrido.
Fui para a aula no dia seguinte. Afinal, eu ainda precisava fazer as
disciplinas da pedagogia além de cuidar dos deveres da minha Ordem.
Usei uma roupa toda chiquezinha: vestido cinza com meia-calça
rasgada, porque eu tinha estilo. Além de óculos escuros, baby. Combinei
de sair pro shopping com minhas colegas depois daquela aula, já que era
sexta-feira.
Saímos da aula rindo.
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E todas demos gritinhos. Eu não tinha ido de short, mas usava uma
calça jeans negra bem coladinha. Uma blusa branca e sapatos baixos. Eu
requebrei bastante, balançando a bunda ao ritmo da música. Remexia o
corpo inteiro, suspirando e me esfregando no carro com as outras
meninas.
Foi então que eu o vi. Max nem se deu ao trabalho de se esconder.
Estava sentado num banco muito perto de nós, com o celular na mão.
Devia estar gravando ou fotografando.
Eu fiquei possessa. Parei de dançar no mesmo instante. Avisei para as
meninas que eu já voltava.
Quando Max viu que eu olhei na direção dele, saiu correndo. Mas eu
o persegui. Segurei-o pelo braço e tirei o celular da mão dele.
– Apague isso! – mandei – Mas que história é essa? Você está me
perseguindo?!
– Beatles – ele leu na minha camiseta.
– Você gosta? – perguntei, desconfiada.
– Sim.
– Qual a sua música preferida deles? – desafiei-o.
– Imagine all the people – respondeu Max, prontamente.
“Ele não sabe de nada”. Além de mencionar uma música conhecida,
tinha dito o nome errado.
– É “Imagine” – corrigi – e essa é uma música da carreira solo do
John Lennon.
– Entendo.
Ele tinha conseguido o que queria. Distraiu-me com aquela conversa
e apaziguou minha raiva. Ele era bom nisso, pois assim que eu o vi me
filmando senti vontade de bater nele.
– Mas você gosta mais do David Bowie do que dos Beatles –
observou Max – sua música favorita do Bowie é “Station to Station”.
– Como diabos você sabe disso?
– Eu sei tudo sobre você, Ofélia. Os seus fetiches sexuais são até
bem comuns. Você é completamente tarada por sexo oral.
Particularmente, você ama fazer um boquete. É uma das coisas que mais
te excita no sexo: ver o cara gemendo quando você o chupa. Mas você
também curte sexo ao ar livre e em lugares inusitados, embora seu
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namorado seja fresco demais para satisfazer suas fantasias. E sabe quais
são as minhas fantasias?
– Eu não quero saber disso!
– Eu tenho a fantasia de fazer sexo com mulheres menstruadas. E...
grávidas. É sério. Não estou dizendo isso apenas pela sua situação. É a
mais pura verdade. Você poderá conferir que postei sobre isso em
fóruns há mais de dois anos.
– Está me ameaçando? Olha só como estou com medo de você –
fingi tremer as mãos, para zombar dele – cretino.
– Posso sentir a sua barriga? Não está muito grande ainda, mas já
aparece um pouquinho...
– Não vai sentir nada! Agora escute aqui: se eu te ver mais uma vez
aqui na universidade, eu vou ligar pro seu pai. E ele vai vir te buscar,
ouviu bem?
– Olha só como estou com medo da sua ameaça – ele também fingiu
tremer as mãos, da mesma forma que eu fiz.
Tentou recuperar seu celular, mas eu não permiti.
– Tanto faz – ele disse – assim fica até mais fácil de eu rastreá-la.
E ele saiu.
Liguei o celular dele. Apaguei as fotos que ele tirou da minha dança.
Mas meu queixo caiu quando eu vi mais de cem fotos minhas naquele
celular. Fotos da internet. Algumas que eu nem lembrava mais que
existiam. Nem sabia que ainda estavam rodando na rede.
Eu apaguei todas elas. Pensei em contar aquele absurdo para o
Demian. Mas resolvi não preocupá-lo com essa besteira. Ele apenas ia
caçoar de mim por eu estar me irritando com o pirralhinho. Eu devia
apenas ignorá-lo. Fingir que ele não existia. Por que eu ainda dava papo
pra ele? Eu era retardada?
No começo, pensei em respeitá-lo um pouco apenas por ele ser o
filho do Alan. Mas aquilo já não me interessava mais. Alan precisava dar
limites para o filho. As coisas não podiam continuar daquela forma, ou
depois que Max enjoasse de me perseguir, começaria a fazer a mesma
coisa com outra menina. Seria ainda mais problemático, pois pelo menos
eu sabia me defender. Uma garota da idade dele seria ingênua e ficaria
confusa com as investidas dele.
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Era raro Demian falar palavrão. Então ele devia estar puto de
verdade.
Ele nem levantou as calças. Apenas deu alguns passos e segurou o
garoto pela blusa.
– O que você quer aqui, seu bostinha?
– Seu pau é maior que o meu – observou Max, olhando.
– Isso é óbvio!
– Mas não é tão grande assim. Logo o meu vai atingir esse tamanho
também. E depois vai ficar muito maior.
Eu revirei os olhos. “Homens...”
Demian apenas jogou-o no chão.
– Que Deus tenha piedade da sua estupidez. O Senhor diz que é das
crianças o reino dos céus. Que Ele me dê sabedoria para compreender
esse difícil enigma.
– Por que você fala com as pessoas partindo do pressuposto de que
Deus existe, Demian Dantas Carvalho? Segundo a filosofia ocidental,
não é possível provar por argumentos lógicos nem a existência e nem a
inexistência de um Deus. E, convenhamos: o argumento ontológico de
Santo Anselmo é bastante fraco e se baseia numa falsa premissa.
Demian não foi capaz de pronunciar uma palavra nos segundos
seguintes.
– Como você sabe meu nome inteiro, infeliz?
– Porque você se envolveu com Ofélia Alvarenga Castelo. Se isso não
tivesse acontecido, eu garanto que sequer saberia da sua existência e ela
não faria a menor falta.
Demian puxou as calças e abotoou-as.
– Então você deve saber que sou da teologia e já estudei todos os
argumentos clássicos sobre a existência e a inexistência de Deus da
perspectiva filosófica. Porém, o curso de teologia não se baseia somente
na lógica, mas também na fé. Por isso, ele difere do curso de Ciência da
Religião, que possui foco estritamente acadêmico. Aqui na teologia nós
assistimos missas na igreja da universidade. Você sabia disso?
– Não.
– Oh! Eis que existe algo que o pequeno gênio não sabe – zombou
Demian – essa é a razão pela qual a maioria dos meus colegas são
seminaristas e não leigos. Mas se deseja continuar essa discussão mesmo
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Ele fazia questão que eu visse que ele estava batendo uma pra mim. Ele
se orgulhava disso. Mordia os lábios, apertava os olhos e suspirava.
Eu já havia sido muito tolerante. Essa eu não ia deixar passar de graça.
Levantei-me. Fui até onde ele estava. Segurei-o pela blusa, colocando-
o de pé. Dei um tapa na cara dele.
– Moleque pervertido – rosnei – por que não vai bater uma pra sua
coleguinha sem peitos?
Mas quando eu dei o tapa, lágrimas rolaram dos olhos dele.
– Eu te amo – ele disse, baixinho.
E caiu no choro.
Confesso que senti um pouco de pena. Era só uma pobre criança
confusa, que estava recém começando a descobrir o que era amor. E que
estava sofrendo muito por amar. Eu estava sendo cruel demais
humilhando-o daquela forma? Mas ele não pediu por isso?
Sentei-me ao lado dele. Resolvi conversar com ele seriamente. Dizer
algo que eu já devia ter deixado claro desde a primeira vez que nos vimos.
– Max, não posso corresponder aos seus sentimentos. Eu tenho
namorado. Eu o amo. Por favor, entenda isso. Não vou deixar de amá-lo.
E mesmo se eu deixasse, se algo ruim acontecesse que fizesse com que
eu e Demian nos separássemos, eu não iria namorá-lo.
– Você não me quer só porque tenho doze anos – disse Max,
enxugando as lágrimas – você namoraria qualquer cara, contanto que
tivesse um pau. Você já escreveu isso num dos seus blogs.
– Eu não curto caras mais novos que eu. Não sei explicar o motivo.
Só não sinto tesão. E fim da história.
– Alfredo Oliveira Aguiar era quase dois anos mais novo que você.
Você entrou no colégio com um ano a mais que o de costume e por isso
sempre deve ter transado com caras com um ano a menos.
– Um ano é diferente de sete anos! – exclamei.
– Na idade em que estamos agora pode fazer diferença. Mas quando
eu tiver vinte e você vinte e sete, por que faria?
– Eu não quero saber de nada disso! – gritei, me irritando outra vez –
Eu só não gosto de você! Você é um pirralhinho metido e teimoso. Me
deixa em paz!
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Ele estava prestes a cair no choro de novo. Porra. Será que eu teria
que lidar com isso quando tivesse meu filho? Eu suspeitava que iria me
estressar enormemente. Era melhor já ir treinando.
– Vamos fazer o seguinte, Max: se eu tiver uma filha menina, ela será
a sua esposa. Assim, ela terá um namorado maduro com 13 anos a mais
que ela. Que tal?
Eu só falei isso para calar a boca dele.
– Eu só quero você.
Quando ele disse isso, eu suspirei, sem paciência de continuar aquela
conversa. Era melhor eu ir embora logo. Talvez só palmadas
resolvessem mesmo. Eu ia deixar o trabalho sujo para o Alan e para a
Dalila.
Mas eu baixei a minha guarda nesse momento. Max me abraçou. Ele
enterrou o rosto no meio dos meus peitos!!
Eu dei-lhe um tapa na cabeça. Comecei a lhe dar tapas até que ele me
soltasse. E mesmo depois que ele me soltou, continuei batendo nele.
Max chorava, mas eu não parava.
– Filho da mãe, safado, vai à merda!!
Ainda bem que não tinha ninguém perto. Capaz de me xingarem ao
verem que eu estava espancando uma criança. Provavelmente seria assim
que eles veriam.
Até que eu parei de bater nele. Eu estava exausta. Meu braço já estava
doendo com os movimentos repetidos.
Max não estava mais chorando. Ele me fitava com uma expressão
séria. Seria raiva?
Eu iria embora. E assim que saísse de lá ligaria para Alan e para
Gregório. Se eu não conseguisse, tentaria contatar Dalila, Fábio, ou
qualquer pessoa que pudesse me colocar em contato urgentemente com
aqueles capazes de resolver aquela situação infeliz de uma vez por todas.
Porém, quando comecei a descer a escada precisei me apoiar no
corrimão. Eu estava passando mal. E não era somente o cansaço por ter
batido em Max.
Eu estava suando. Senti um calorão. E fiquei tonta.
Caí da escada. Saí rolando em alguns degraus até embaixo. Felizmente,
havia poucos degraus. Mas foi o suficiente para que eu me machucasse.
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Capítulo 4
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– Vai mudar de ideia quando vê-lo. Vou te contar uma coisa. Ontem
eu comi uma colega minha. E fantasiei que estava te comendo.
Ele me fitou intensamente quando disso isso. Seriamente. Eu ignorei-
o.
– Pensei que tínhamos combinado que você só apareceria na minha
universidade uma vez por semana, apenas na ocasião dos chás.
– Essa combinação só estará valendo a partir de amanhã, já que
conversamos sobre isso somente uma hora atrás. Aconteceu de eu ainda
estar nos arredores. Eu teria te mostrado o grimório antes, mas como
você bateu em mim mudei de ideia. Pensei em guardá-lo para quando eu
precisasse persuadi-la.
– Você só me persuadiria a algo se sequestrasse o Mimi.
– Obrigado pela excelente ideia. Com licença.
E Max se retirou.
Ele era retardado ou o quê? Demian não seria feito de refém nem por
um cara com o dobro do tamanho dele. Meu amorzinho era super forte.
Não perderia para um pirralho que até eu espancava facilmente.
Aliás, eu mesma estava indo procurá-lo. Ele não me visitou no
hospital. Fui buscá-lo no prédio da teologia, mas ninguém sabia onde ele
estava.
Fui até a Casa do Estudante. Finalmente o localizei. Ele estava no
quarto. Entrei sem bater, pois eu tinha a chave. Eu o flagrei se
masturbando com uma Playboy.
Demian deixou a revista cair quando entrei. Escondeu-a
imediatamente.
– Uau! – exclamei, deliciada – Já está se divertindo tão cedo? Por que
não me chamou?
– Ah... hã...
– Quero ver o que estava olhando!
– Não! Para!
Eu peguei a revista, mas Demian puxou-a de mim desesperadamente.
– Calma! – falei – O que é tão secreto assim? Não somos namorados?
– Sim, mas eu quero ter minha privacidade.
– Eu nem sabia que você ainda brincava com essas Playboys. Então é
por isso que às vezes você fica tão apático no sexo? Não é justo! Tem
que sobrar um pouco pra Fifi também.
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– Sabia que meus pais são ocultistas? – disse Max – Tanto meu pai
quanto minha mãe me criaram nesse meio. Aprendi muitas coisas desde
pequeno. Por isso sou tão sábio.
– É curioso você mencionar isso, pois ocorreu o mesmo comigo –
comentou Camilo.
Aquilo era novidade pra mim. Eu fiquei bastante surpresa. Parecia
que finalmente Max havia encontrado um adversário “à sua altura”, pelo
menos aos olhos dele. Max vivia se achando superior a todos por causa
dessa história de que foi educado no ocultismo desde que nasceu. Pois
Camilo também. E ele era bem mais velho que ele.
“E agora, Max?” pensei, triunfante. Ele já não poderia se gabar por
causa disso.
Camilo venceu Max no debate facilmente. Demian também
conseguia fazer aquilo, mas Camilo era capaz de algo que ninguém
conseguia: vencer o debate sem se irritar. Ele dava boas respostas e
mantinha a calma.
– Se sabe tanto sobre religiões, fale-me um pouco sobre o
Movimento Rastafari, da Jamaica – desafiou Max.
– Você acha que vou mencionar o Bob Marley? – brincou Camilo –
Bem, eu poderia. Na verdade eu tenho um amigo jamaicano com quem
converso na internet. O Rasta surgiu como exaltação das raízes da
cultura negra. Há muitos cristãos na Jamaica, mas o cristianismo, como
uma religião de brancos, possui muitos elementos da cultura branca
ocidental. O que o Rasta fez foi adicionar diversas características da
cultura africana no cristianismo. Isso é muito interessante. Afinal, por
que os negros teriam interesse em cultuar um Deus branco?
Eu realmente adorava escutar Camilo falar. As palavras me aqueciam.
– Como pode ter certeza? – perguntou Max, só para contrariá-lo – e
se alguns negros não se importarem em cultuar um Deus branco?
Mas por que Max tinha que estar ali do lado pra estragar tudo? Como
não conseguiu arruinar o discurso de Camilo com suas perguntas e
observações cretinas, ele resolveu se enfiar embaixo da mesa. Quando
voltou, mostrou o celular para Camilo.
– Essa é uma foto da calcinha da Fernanda – disse Max – você é
louco por ela, certo? Aposto que queria ver isso. Aí está. Satisfiz o seu
desejo.
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Fernanda ficou vermelha. Ela era educada demais para se zangar com
Max ou bater nele. Mas esse ato de Max fez com que Camilo se zangasse
pela primeira vez. E a irritação dele não foi pouca.
Camilo bateu o celular de Max na mesa, com toda a força. E fez isso
mais de uma vez, até destruir o aparelho completamente.
– Agora, escute aqui – disse Camilo, sério como nunca o vi antes – eu
aturei quieto todas as suas provocações desde que essa reunião começou.
E estava disposto a aturar educadamente em todas as reuniões da Ordem
enquanto Ofélia concordasse com sua presença. Mas isso enquanto a
coisa ficasse somente entre você e eu. No momento em que você
envolveu Fernanda nisso, eu te garanto: você escolheu a pessoa errada
para comprar briga. E eu não vou aguardar que faça a segunda gracinha.
Se eu fosse o líder, te expulsaria agora mesmo.
– Acontece que você não é – retrucou Max – sequer é o vice. A
Ofélia é minha namorada. Ela não vai permitir que eu saia.
– Sou sua namorada somente na sua imaginação – eu disse – e que
namorado seria esse que tira foto de calcinhas das outras garotas?
– Ofélia, que tal aceitar minha sugestão e expulsá-lo agora? –
perguntou Camilo.
– Sugestão aceita – concordei – Max, suma daqui.
Max ficou chocado.
– Por quê? Saiba que só criei toda essa discussão para te mostrar os
meus vastos conhecimentos de ocultismo!
– Eu já entendi que você sabe a porra do ocultismo! – exclamei – Seu
cérebro é uma enciclopédia ambulante, parabéns. Mas parece que você
aprendeu tudo, menos o mais importante: respeitar as pessoas, aceitar
opiniões diferentes das suas e ceder quando estiver errado!
– E o que isso tem a ver com ocultismo? – desafiou-me Max – Isso
tem a ver com ética ou no máximo etiqueta. Se fosse assim, os satanistas
extremos não seriam ocultistas. Ou você foi contaminada pela visão
RHP de Demian e pensa que um ocultista é mais poderoso ou mais
sábio se for bonzinho e gentil? No LHP você pode defender a sua
posição independente da opinião de Deus ou da visão vigente. No
budismo Theravada você atinge a iluminação quando quebra tanto o
karma bom quanto o ruim.
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Ah, então era assim? Eu rolava no chão com Valentina e Demian não
queria fazer nem o esforço de ligar para o Gregório?
– Eu também não tô a fim de falar com o Gregório – explicou
Demian – já que saí da Ordem e tudo mais. Fica chato.
– “Fica chato” – imitei – Como se você se importasse.
– Fale com ele na próxima reunião da Flolan!
– Eu faltei a última. Tava com medo da namorada do Gregório.
– Ah, bom. E aí, como fica? Vai deixar assim?
Que merda.
Max até já tinha sumido de lá, antes que tivéssemos outra ideia para
mandá-lo embora.
Chamei Demian para meu apartamento. Ele tinha um trabalho para
entregar na segunda, então ficou deitado na minha cama fazendo o
trabalho no laptop. Como eu não conseguia desgrudar dele, deitei-me
nas costas do Mimi e fiquei lendo um livro do Paulo Freire de barriga
pra cima.
Na hora da janta nós até comemos no mesmo prato e tomamos suco
no mesmo copo. Ali, deitados na cama.
– Há, há, a gente tá quase se tornando um só! – comentei, com alegria
– Não quero sair de perto do meu Mimi nunca mais!
– Sobre isso, tem uma coisa que tô pra te dizer já faz um bom
tempo...
– O quê? – perguntei, meio apreensiva.
– Lembra que antes de virarem padres os seminaristas viajam para o
Vaticano? Quando concluem o curso de teologia.
– Sei, você já me disse. O que tem isso?
– Então, apesar de eu não ser mais seminarista surgiu uma
oportunidade pra mim esse ano. Uma galera da teologia do meu semestre
tá combinando de ir. Vai sair muito barato. Em suma, eu não vou pagar
nada. Meus gastos serão mínimos. Porque a Igreja, ou, eu deveria dizer,
os padres...
– Vou tentar adivinhar. Os padres continuam puxando teu saco. Vão
te pagar tudo.
– Por alguma razão, eles gostam muito de mim – explicou Demian –
eles dizem que meu hebraico é tão bom que talvez eu até consiga uma
bolsa pra estudar em Tel Aviv no futuro.
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– Não sei se vou querer ter outros. Não quando sei que o pai não
deseja ficar ao lado deles.
– Não faça drama, Ofélia. Tente entender a minha situação. Isso é
importante pro meu futuro. E o meu futuro também significa o nosso
futuro. Se eu tiver um bom currículo tenho mais chances de obter um
bom emprego. Se eu ganhar bem, posso dar um futuro melhor pro
nosso filho. Pro filho que nem sei se é meu... então não finja que é a
vítima por aqui.
– Mas...
– “Mas” nada. Você sempre teve seus pais para te pagarem tudo. Se
você quiser, pode largar seu curso a qualquer momento e escolher outro,
em qualquer universidade particular da cidade. Eu adoro o meu curso,
mas se eu não gostasse não poderia simplesmente largar. Eu estaria no
olho da rua. Só não me ferrei completamente ainda porque os padres me
ajudam. O máximo que a universidade me fornece é um quarto e uma
refeição por dia. Você me ajuda também, admito, mas não quero
depender do dinheiro dos seus pais. O dinheiro nem mesmo é seu.
Eu escutava quieta. Eu realmente não tinha mais argumentos. Ele
estava certo.
– Eu estava fazendo um estágio recentemente, mas terminou. Eu
preferia não ter que procurar um emprego agora pra não atrapalhar no
fim dos meus estudos e na preparação da minha monografia, mas não
vai ter jeito. Vou ter que começar a trabalhar a partir de novembro ou
dezembro. Nem vou ter férias de fim de ano. Ofélia, vê se acorda! Esse é
o mundo real. E você ainda vai trazer mais um ser humano pra essa
desgraça...
– Espere aí! Achei que o mundo que Deus criou era lindo – observei.
– É lindo sim. Mas às vezes eu fico frustrado quando paro pra pensar
em como você desperdiça suas oportunidades. Fica gastando grana em
bobagem e mesmo sendo tão esclarecida sobre métodos
anticoncepcionais ainda engravida. Ah, se eu estivesse no seu lugar...
– Eu não gasto em bobagem – falei – pra mim são coisas importantes.
Por exemplo, pra mim não tem a menor importância Deus, teologia ou o
Vaticano. Mas você coloca essas coisas até acima de mim! Nisso nós
somos diferentes: pra mim, você sempre será o mais importante. E nem
Deus e nem o Diabo podem me fazer mudar de ideia.
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uma família. Então a Ofélia pegadora e atirada não podia existir pra
sempre!
Mas não era só isso. Eu não ia com a cara de Felipe. Ele era meu
inimigo. Estávamos no meio de uma batalha mortal, mesmo que eu
andasse meio parada com meus ataques gratuitos pela internet nos
últimos tempos.
Será que foi aquilo que Moisés quis dizer com ter um inimigo
inteligente? Mas Felipe tinha uma personalidade meio instável. Putz, eu
também tinha! Embora eu criticasse tanto Max e outras pessoas ao meu
redor, eu nunca fui uma santa.
– Você é muito atrevida, sabia? – comentou Felipe – Para alguém do
seu tamanho.
– Eu tenho 19, idiota. A idade que tinha AMV quando morreu.
– Quem é AMV? A autora daquele grimório estúpido que você
postou? Ela nem é uma boa escritora.
– Não interessa, ela é AMV! – falei, me sentindo meio ridícula.
– Pois eu tenho 27 anos – informou Felipe – mas quando falei
tamanho não me referia à sua idade.
– Olha, se não tem nada de útil a discutir comigo, sai daqui. Está me
atrapalhando.
Voltei a estudar, abrindo o caderno. Porém, Felipe pegou no meu
braço. Eu levei um susto.
– O que você quer, droga? – perguntei, irritada.
– Quero que venha comigo. Vou te mostrar uma coisa.
Mais essa agora. Por que eu deveria ir com ele?
Fechei o caderno. Ainda aborrecida, segui-o.
– Quer largar o meu braço? – perguntei – Eu não vou sair correndo.
Ele me levou pra uma área meio isolada da universidade.
– Para onde está me levando? – perguntei, meio preocupada.
Mas ele não dizia nada. Estava me ignorando.
– Ei, ei!
Fiz com que ele me largasse.
– Diga logo o que quer. Ninguém vai escutar aqui.
– Eu só queria dizer que eu não estava bêbado ou drogado quando te
chutei – respondeu Felipe – eu fiz porque quis.
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Mas não íamos tirar sangue de verdade. Porém, com você desesperada
desse jeito, não consegui continuar. Se você passasse mal ou algo assim,
colocariam a culpa em mim.
– Eu tô grávida! – gritei, com raiva – Como se atreve...?
Enxuguei as lágrimas e limpei meu nariz no dorso da mão, que estava
escorrendo. Eu não me sentia com forças nem pra levantar. Ainda estava
tremendo um pouco.
Mesmo assim, eu consegui me erguer. Saí cambaleando de lá, sob as
risadas de zombaria dos membros da Coroa de merda.
Eu não conseguia parar de tremer! Que porra era aquela?
Cheguei novamente no campus central, embora caminhar ainda
estivesse difícil. Logo, eu tive que parar de andar, porque comecei a
sentir cólica.
Senti alguma coisa escorrendo na minha calcinha. Coloquei a mão lá
dentro e havia sangue.
Eu comecei a chorar. Acelerei o passo, tentando encontrar o caminho
para o hospital universitário, mas eu me sentia meio tonta.
Acho que desmaiei no meio do caminho. Quando abri os olhos de
novo, eu estava na grama e havia um monte de folhas secas no meu
rosto.
Tentei me levantar outra vez. Avistei pessoas. Eu precisava pedir
ajuda.
Acho que vi Amanda. Eu tinha quase certeza que era ela. Tentei gritar
o nome dela, mas minha voz não saiu.
Eu não me lembro bem o que aconteceu depois. Acho que alguém
me viu. Me carregaram. Quando abri os olhos, eu estava numa cama do
hospital universitário e Demian segurava minha mão.
– O bebê – foi a primeira coisa que eu disse.
– O bebê está bem – disse Demian, imediatamente – você sangrou
um pouco, mas não foi nada.
Finalmente pude respirar aliviada. Eu não sabia o que eu faria se
tivesse perdido o bebê. De repente eu me dava conta do quanto o amava.
De quanto o bebê era importante. Minha vida não teria sentido sem ele.
Eu chorei. Demian me abraçou.
– Mimi, eu tô com medo.
– Eu sei – ele disse – não se preocupe. Estou aqui.
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simples: uma lágrima. Ela falava por mim. Gritava por mim. Era como
um grito de socorro, um clamor por ajuda.
Eu não tinha feito o filho sozinha, então eu sentia que só estaria
completa se o pai dele estivesse perto de mim. Como eu não sabia se era
Gregório ou Demian, eu sentia um pouco desse sentimento de paz
quando estava perto dos dois.
– Se precisar de qualquer coisa, por favor, me ligue – insistiu
Gregório.
– Mas a sua namorada...
– Ela não atende meu celular. E ela compreende a situação.
– Sabe, Gregório. Tem uma coisa que eu queria te perguntar.
– E o que seria?
– Você foi amigo do Moisés no passado?
Gregório suspirou fundo antes de responder.
– Sancha conectou todos nós, de uma forma ou de outra – explicou
Gregório – eu até arriscaria dizer que ela é o centro de tudo isso.
É claro. Os clientes dela. Sancha sempre atendeu vários ocultistas.
Então eles acabavam conhecendo uns aos outros por ela. Eis o
misterioso mundo masculino. Acho que poucos deles aguentavam de
curiosidade quando ouviam falar numa prostituta satanista que era capaz
de provocar um prazer do demônio na cama.
– Você já foi pra cama com ela com outro cara no meio? – perguntei,
curiosa.
Gregório sorriu.
– Ofélia, sugiro que vá direto ao ponto. O que realmente quer me
perguntar?
– Pra falar a verdade, acho melhor deixarmos de lado Moisés hoje.
Eu queria falar sobre o Max.
– Eu já imaginava. Ele anda lhe perturbando?
– Demais!
– Ele está morando comigo no apartamento – explicou Gregório –
mas fica fora na maior parte do dia. Só volta para dormir.
– Isso não está certo – observei – Alan te deixou responsável por ele.
Max passou a vida inteira isolado com os pais no meio do nada. E ele
tem doze anos. Você tem ideia por onde ele tem andado?
– De manhã ele está no colégio. Já liguei para checar isso.
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– Isso é tão demais! – disse Milena – Será que você me aceita como
membro?
– Pensei que quisesse entrar pra Coroa – observei.
– Depois que eu soube da brincadeirinha sem graça que fizeram
contigo ontem, não quero mais. Eu acho que literalmente metade da
universidade está contra eles agora por causa disso.
Eu fiquei chateada que aquela história tivesse se espalhado.
Mas as pessoas não me procuraram pra rir da minha cara. Fui barrada
logo na porta da sala de aula. Havia vários alunos de outros cursos
querendo falar comigo. Inclusive, o pessoal de jornalismo responsável
pelo jornalzinho da universidade queria me entrevistar. Teve até alguém
que tirou foto! Eu estava virando uma estrela.
No primeiro dia foi divertido. Eu me senti uma diva. Embora a galera
já tivesse se acalmado um pouco alguns dias depois, eu continuei a ser
perturbada pelas semanas seguintes. Aquilo me aborrecia um pouco.
Eu não gostava das perguntas idiotas. Me perguntavam sobre minha
gravidez e sobre quem era o pai. Aquilo não era da conta deles!
Antes era só o blog da Ordem que recebia um monte de acessos.
Assim que descobriram meu nome real, o pessoal encontrou meus
outros blogs pessoais. Agora não era só o Max que sabia tudo sobre a
minha vida. Eu e essa minha mania de contar cada detalhe da minha vida
pessoal na internet... rapidinho descobriram quem era meu namorado, e
foram perturbar o líder da OAAL também.
Demian foi curto e grosso. Ficou bastante irritado com o pessoal
perturbando.
– Por favor, queremos uma foto de vocês dois se beijando para o
jornal! – pediu uma das jornalistas.
– Ninguém lê o jornal da universidade – respondeu Demian, de má
vontade – vocês só escrevem bobagens. Eu mesmo nunca li.
De repente, nós dois viramos um dos casais mais famosos da
universidade. Demian ficava aborrecido quando havia alguém espiando
quando saíamos juntos para tomar café num dos barzinhos do campus.
Agora já não era tão seguro assim trepar ao ar livre. Uma foto podia
acabar vazando na internet.
Aproveitei a minha popularidade para mandar fazer capas com
capuzes para a MAS também. Afinal, todos os membros da OAAL
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– Mas... Gregório jamais te contaria onde moro. Ele não faria isso
comigo. Você não mexeu nas minhas gavetas de roupa íntima, né?
– Não mexi em nada – garantiu Max.
– Não confio na sua palavra.
– Eu não sou mentiroso – disse Max, ofendido.
– Então diga logo o que quer e depois vai embora – mandei,
impaciente.
Sentei-me na minha cadeira e observei-o. Será que ele não estava mais
com tanta vontade de me aborrecer?
– Eu não fui na sua universidade por uma semana porque eu estava
em semana de provas no colégio. E depois disso Gregório teve uma
conversa comigo.
– E...?
– Eu queria pedir desculpas por tudo o que fiz até hoje. E digo isso
com sinceridade. Eu só fiz o que fiz porque queria que você olhasse pra
mim.
– Moisés não ficou puto contigo por causa do grimório?
– Ele ainda não sabe.
– Moisés não é idiota.
– Confie em mim. Nem Giovani percebeu o roubo. E se percebeu,
ele será o último a abrir a boca. Mas eu não vim até aqui falar disso. Eu
soube do que a Coroa fez com você. Antes eu admirava aqueles caras,
mas já vi que só são um bando de bundões. Nem eu jogaria tão baixo.
– Eu acho que você já jogou mais baixo que eles.
– Eu jamais te amarraria e te levaria pra o meio de um mato pra fazer
um ritual – comentou ele, como se fosse absurdo – isso é doente. Eu
nunca encostei um dedo em ti antes. E não venha me falar do abraço.
Foi só um abraço, como você dá em qualquer amigo seu.
– Até parece que você conseguiria me amarrar, criancinha. Eu te
mataria antes.
– Duvida? – ele desafiou-me – Quer que eu te mostre? Eu sou mais
alto que você, sabia?
– Qualquer um é mais alto que eu. Isso não é um mérito.
A chave estava na fechadura. Max girou a chave e trancou a porta do
meu quarto. Guardou a chave consigo.
– Está com medo?
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Nossas conversas rápidas pelo msn eram sempre felizes assim. Mas
infelizmente Mimi tinha pouquíssimo tempo para usar a internet, então
nossos papos eram ligeiros e raros.
Eu me sentia estranha. Sabia que podia ganhar o filho a qualquer
momento. E haveria várias surpresas na hora do parto.
A surpresa mais importante seria descobrir se era filho de Gregório
ou de Demian. Sinceramente, eu torcia para que fosse de Demian, mas
não ficaria triste se fosse do Gregório. As duas opções eram especiais.
Eu também não sabia se viria uma menina ou um menino. Acho que
eu preferia menina, pra encher de lacinhos. Mas se fosse menino eu
colocaria lacinhos também, he, he.
Depois que eu ganhasse aquele bebê, eu me sentiria aliviada. Se bem
que a loucura maior começaria depois que ele nascesse.
Eu ia ser mãe! A ficha tinha caído só naquele instante. Mamãe Ofélia.
Aquilo era tão incrível!
O novo semestre universitário já tinha começado. E lá estava eu indo
para os chás da MAS com meu barrigão de quase nove meses. Eu era a
estrela da universidade! Muita gente me apontava. Cara, que orgulho.
Meu barrigão era um sucesso.
Será que quando eu me tornasse professora primária eu conseguiria
lecionar num colégio da minha cidade e dar aulas pra meu próprio filho?
Aquele pensamento me divertiu.
Quanto aos encontros da Flolan, eu logo fiquei sabendo que haveria
outro ritual somente para membros de alto grau, do qual eu não poderia
participar. E a novidade mais quente era: Gregório e mais quatro
membros homens iam realizar um ritual secreto juntos. Completamente
nus!
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Eu ainda não sabia se era verdade, mas esse boato já estava rolando
há um bom tempo. Se fosse, eu queria espiar. Ora, se Demian não
estivesse viajando, eu o levaria para espiar comigo.
– Fábio, me passa todos os babados – pedi.
– Eu não sei de nada! – defendeu-se ele.
– Não vai participar?
– Não, não. Parece que não vai ter só gente da Flolan. É um ritual
totalmente privado. Se bobear, até o Alan vai estar lá. Ele não confirmou
ainda.
Eu estava com cada vez mais vontade de assistir aquilo. Por isso,
fucei em todos os cantos da internet em busca de informações, além de
encher o saco de uma penca de pessoas.
Para meu espanto, recebi um e-mail de Max. No e-mail só havia uma
data e local de encontro. Eu já sabia exatamente o que aquilo significava.
Ora, quando se tratava de obter informações secretas, Max era o melhor
nisso.
“Somente a presença de seniores, hã?” Soava o máximo.
No grande dia, eu me escondi num local estratégico e aguardei a
chegada do pessoal.
Lá estavam Gregório e Alan. Para minha decepção, eles estavam
vestidos. Algum engraçadinho deve ter inventado essa história de que
estariam todos pelados, só pra fazer com que as garotas criassem um
alvoroço. E eu já tinha uma boa ideia de quem havia sido o engraçadinho
que armou aquilo. Depois eu o xingaria por e-mail.
Infelizmente, Max me conhecia bem demais e sabia o que chamaria
minha atenção. Se bem que... cinco homens gostosos pelados, todos
quarentões ou quase isso. Que mulher não ficaria doidinha pra ver?
Para meu completo assombro, vi Moisés entre eles. Quando o vi lá,
tive certeza: Gregório e Moisés tinham feito parte da mesma Ordem na
juventude.
O outro cara... quem era? Eu tinha quase certeza de que já o vira
antes. Pensando bem, aquele lá não devia ter quarenta anos. Devia ter no
máximo uns trinta.
Eu finalmente o reconheci: era o atual vice da ODE. Roberto, o
abençoado marido de Sancha.
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O único que não identifiquei foi o último membro, que parecia ser o
mais velho. Era um cara negro e alto. Meio assustador.
O ritual que eles realizaram me deixou de cabelo em pé. Aquilo me
afetou. Eles recitavam conjuntamente alguma fórmula mágica, com as
mãos ao alto em volta do círculo; com suas vozes poderosas.
Parecia canto gregoriano, mas não podia ser. O que será que eles
estavam dizendo?
Concentrei-me. Prestei atenção. Até que tudo parou e restou apenas
o barulho do vento.
Tive uma visão. Era a Basílica de São Pedro. Havia canto gregoriano
soando em algum lugar. E Demian estava lá.
Algo brilhou. Tinha a voz de trovão e era como fogo.
Era como se uma parte de mim estivesse naquele lugar. Planando, lá
no teto. Eu estava ao lado da imponente figura de fogo e trovão que
observava com interesse os sacerdotes cantando lá embaixo.
Tive uma estranha intuição.
– Ei, você é Deus? – perguntei.
A figura, que era milhões de vezes mais imponente que um anjo, fez
que sim.
– Ah, tá de sacanagem – falei – deve ser só um anjo. Tipo, um
serafim. Desses importantes, secretários de Deus. Como Metatron.
E não é que minhas conversas idiotas que tive com Demian sobre
anjos serviram pra alguma coisa?
– Isto é, eu nunca pensei que um dia eu fosse encontrar um anjo de
verdade. Você é meu Sagrado Anjo Guardião? Ou é Deus mesmo?
Como é que te chamam mesmo? Javé?
Ele colocou um dedo nos lábios, indicando lá embaixo. Ele queria
que eu escutasse o canto.
– Tô escutando. Podemos conversar ao mesmo tempo, não? Eu
sempre quis conversar com o senhor, Deus, de tanto que o Mimi fala de
ti. Pra ser sincera, eu nunca acreditei de verdade que você existisse. Mas
aí está você. Que coisa, não?
Ele nada disse.
– Você é mesmo um homem? Ou é uma mulher? É negro ou branco?
Era difícil dizer. Parecia apenas uma figura humana, indefinida. E
brilhava tanto que estava mais para dourado do que negro ou branco.
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– Eu queria que você fosse cor-de-rosa. Pelo menos você criou flores
na cor rosa e me deixou feliz. Mas eu não gostei muito dessa história de
mandar meu namorado pro Vaticano bem quando vou ganhar o bebê!
Qual o significado disso, Deus? Quero dizer... eu não sei se sempre há
um significado no que você faz. Às vezes parece que não.
– Por que você quer um significado?
A voz que soou foi tão profunda que senti um aperto no coração.
Por uma razão estranha, me lembrou um pouco a voz de... Demian.
Talvez porque era ele que sempre estava me falando dessas coisas da
Bíblia.
– Não precisa ser um significado lógico – decidi – pode ser apenas
uma emoção que me faça feliz. Eu gosto de estar feliz, Deus. Mas só
consigo estar feliz quando Mimi está comigo. A propósito, você sabe se
ele vai me trazer o meu perfume?
– Sim, ele vai comprar amanhã. Mas vai comprar errado.
– Droga. Eu sabia! – exclamei, irritada – Será que dá tempo eu enviar
um e-mail hoje?
– Daria, mas ele não vai ler.
– Que tapado. E se eu telefonar?
– O celular dele está desligado.
– Mas que merda! Deus, pare de ferrar com minha vida, sim? Eu
realmente preciso desse perfume. Amanda vai dar uma festa arrasadora
em setembro e preciso estar bem cheirosa.
– Me desculpe, Ofélia. Mas você não poderá ir nessa festa.
– Por que não?
– Porque vai estar morta.
Eu senti um calafrio.
– Eu vou morrer...? – perguntei, assustada – Quando?
– No parto.
Quando escutei isso, comecei a chorar. Deus estendeu o braço e
secou as minhas lágrimas com suas mãos que eram como fogo.
– Foi por isso que apareceu pra mim agora? Porque vou morrer.
– Daqui a dois dias você vai ganhar seu bebê. Vai nascer saudável. E
será um ser humano muito feliz.
Saber disso me encheu de alegria. Mas junto dessa alegria havia dor.
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– Adeus, meu bolinho. Agora entendi porque Deus te fez vir pra cá.
Ele está te protegendo aqui. Assim, você não vai sofrer tanto quando eu
for embora.
Quando eu despertei, meu rosto estava banhado em lágrimas. Havia
cinco caras de capa ao meu redor.
– Ofélia, ainda bem que acordou – disse Gregório, aliviado – você
desmaiou do nada.
Eu havia interrompido o ritual deles. Eu só estragava tudo.
– Gregório – eu segurei na capa dele – eu vou morrer. Eu tive uma
visão. Em dois dias vou ganhar o bebê. E morrerei no parto. O próprio
Deus me disse.
– Deus? – perguntou Gregório, estranhando – Não sabia que você
acreditava.
– Eu não acredito. Mas eu vi Deus. Moisés, Deus existe?
– Nós já tivemos essa conversa uma vez – observou Moisés – minha
resposta se mantém a mesma: se Deus existe ou não é irrelevante. Mas se
existir, eu acharia particularmente divertido. Seria um adversário digno.
– Eu vou morrer – repeti – não preciso de um adversário agora e sim
de um amigo.
– Eu acho que você já tem um adversário, senhorita Ofélia –
observou Moisés – seu próprio medo. Você não precisa necessariamente
de um aliado para combatê-lo. Durante a sua vida, você carregou uma
espada. Fortificou-a. Que tal usá-la agora?
Como em todos os rituais que realizei ao longo da minha vida.
Finalmente eu estava pronta a combater meu adversário final.
– Eu posso vencer a morte? – perguntei, curiosa.
– Não para sempre – respondeu Moisés – mas você pode vencer o
medo da morte. Mais especificamente, você pode vencer o medo que
sente por ter medo da morte.
– Não entendi – confessei.
– O medo em si é algo natural e poderoso quando corretamente
direcionado.
– De fato – concordou Roberto – no dia da morte de AMV, ela
chorou. Mas ela não envergonhou-se disso. Abraçou sua condição e seu
medo com um sorriso no rosto. Com bravura.
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– Às vezes. Mas não faz isso por mal. Ele é Deus, no final das contas.
– Eu acho que a morte é uma boa solução – decidi – também gosto
de dormir após um dia cansativo. É bom que as coisas se renovem.
– Eu tenho um presente pra você.
Benjamin recolheu uma flor rosa no chão. Pegou dois galhos.
Enrolou-os habilmente no meu pulso e fez uma pulseira. Ficou meio feia,
mas firme.
– Esse é meu amuleto de proteção. Então, quando chegar a hora não
tenha medo.
– Obrigada – sorri.
– E, Ofélia...
– Sim?
– A morte não é tão morta quanto você pensa. A vida está cheia de
morte, por todos os lados. E a morte também está cheia de vida, para
onde quer que se olhe. Elas não estão separadas. O medo e a coragem
também são um só.
Quando Benjamin foi embora, sua capa voava no vento. Continuei
olhando naquela direção até que ele desaparecesse.
Esqueci-me de mencionar Max. Afinal, eu reconheci o nome de
Benjamin apenas por causa dele. E não é que Max fazia mesmo parte do
meu mundo, mesmo sendo um chato? Ao saber que eu iria morrer, de
repente não o odiei mais. Quase senti simpatia por ele. Do amor tolo que
ele sentia por mim. De seu desejo sexual imaturo.
Naquela noite, devorei os grimórios de AMV com firmeza e me senti
forte. Aqueles termos poderosos dos satanistas me enchiam de confiança.
Eu morreria com a mesma idade de Volans. Aquilo não era
simplesmente lindo?
Abracei Babushka.
– Babu, pode falar agora – eu disse pra minha gata – vou morrer
mesmo. Não adianta mais que eu sele meus poderes sobrenaturais. Vou
libertá-los outra vez, em potência máxima. Quem sabe assim eu possa ter
uma morte mais tranquila e mágica.
– Ufa, já estava cansada de ficar quieta – disse Babu.
– Quer leite?
– Integral, por favor. Detesto o desnatado.
Enchi o potinho dela.
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acontecer, certo? Eles acontecem porque são bonitos. Como o sol e a lua.
Eu acabei de criar essa razão. Se ela me traz alegria, não é o bastante?
– Então a razão é a alegria – concluiu Sancha.
– Será? – perguntei-me – mas a alegria não é uma razão e sim uma
emoção.
Camilo riu do nosso jogo de palavras. Não falou nada.
– Você sabe como resolver esse enigma! – adivinhei.
– Eu não vou dizer nada – disse Camilo – mas eu arriscaria supor que
a senhorita Lílian busca o empirismo sobrenatural e não a base filosófica.
Não precisa explicar o que são os poderes ou pra que servem. Ela só
quer saber como despertá-los.
– Mas isso não é meio perigoso? – observou Fernanda.
– Tão perigoso quanto nascer – concordou Camilo – sem saber
porque isso aconteceu e pra que serve a vida. A maioria só decide o que
fazer com ela, não? São pragmáticos.
– Mas se você não entende a vida, não vai entender a morte também
– disse Fernanda.
– Basta ser pragmático em relação à morte também – disse Camilo –
não precisa saber o que é a morte ou pra onde ela leva. Basta saber como
se portar em relação a ela. Como morrer.
– Poderes sobrenaturais ajudam na vida e na morte? – perguntou
Lílian.
– Honestamente, eles só me trouxeram problemas até agora – admiti
– mas nem por isso deixam de ser fascinantes. A vida também é um
problema. Causa morte. Então, acho que arrumar alguns problemas na
vida não é somente interessante, mas indispensável.
– Eu acho que você já arrumou problemas suficientes para umas sete
vidas, Ofélia – observou Sancha.
– Miau!
O pessoal riu quando miei. Olha só quem falava... Sancha era a maior
causadora de intriga.
– Bem, Lílian, se você quer ter poderes sobrenaturais, basta
potencializar capacidades que já existem em você – expliquei – não é
como se esses poderes fossem surgir do nada. Afinal, mesmo na magia
nada surge como um passe de mágica. As coisas estão conectadas de
alguma forma, mesmo que aos nossos olhos se pareça com um caos.
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diria que desenvolver poderes é como ser o sujeito que quebra as regras
do nosso mundo. Cara, nós somos ocultistas. E magos. Não estudamos
as regras da vida para segui-las à risca, mas para quebrá-las. Isso é magia.
– Dançar com a tempestade em vez de lutar contra ela – observou
Camilo.
– Eu diria que essa é uma ligeira trapaça – opinei – mas eu também
gosto de trapaças bem grandes. Como desafiar Deus. Vocês não acham
que Ele gosta de ser desafiado?
– Você acredita mesmo em Deus agora, Ofélia? – perguntou Sancha.
– Ele seria um bom parceiro pro pôquer – observei – mas eu não o
colocaria em meu altar. Sem ofensa. Talvez, se eu o pintasse de rosa,
quem sabe.
– Nos mostre algo – pediu Lílian – faça alguma magia! Use seus
poderes.
– Nah – eu disse – eu sou tímida.
Nesse momento, todos fizeram uma expressão de: “Uuuuuhhh até
parece”.
– Meus poderes não funcionam sempre – expliquei – eu preciso estar
alterada pra caralho. E eu digo: quem vier assistir meu parto, verá algo
especial. Além da minha buceta, é claro, que é... inesquecível.
Naquela noite confesso que enfrentei dificuldades para dormir. E tive
pesadelos. Foi bem incômodo.
“Ofélia, você está com medo. Isso não é extraordinário?”
Acordei e fui direto pro hospital. Eu já sabia que a qualquer
momento entraria em trabalho de parto.
– Como você sabe? – perguntou a médica.
Afinal, era um pouco antes do previsto.
– Deus me disse – respondi, simplesmente.
– Que Deus?
– O quê? Você não conhece Deus? – perguntei, sem acreditar – Ele já
é popular há uns bons milênios. E até os dias de hoje está em para-
choques de caminhões.
– Eu sou budista.
– Buda é aquele carinha dourado?
– Bem, existem muitas estátuas de ouro do Buda.
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“Cacete. Será que vi Buda e confundi com Deus? Mas o que ele
estaria fazendo no Vaticano? Se eu fosse ele e não quisesse ser
encontrado, acho que eu me esconderia ali. Afinal, no Vaticano estão
todos em busca de Deus, então ninguém repararia num Buda dourado
passeando pelo teto da basílica”.
Senti uma dor enorme e caí no chão.
– Merda...
Fui levada às pressas para um quarto. Assim que foi avisado,
Gregório apareceu no hospital.
– Quer que eu avise o Demian? – perguntou Gregório.
– Ainda não – respondi, repleta de dor – apenas diga que eu o amo.
Depois disso, comecei a ter alucinações. Ou visões. Ou... talvez Deus
tenha ido parar mesmo no teto do meu quarto.
– Ei, cara – sinalizei a ele com o polegar – não quero machucar o
bebê. Devo usar algum poder?
– Por que está me perguntando? – perguntou Deus.
– Eu pensei que você soubesse de tudo!
– Isso não significa que vou lhe dizer, certo?
– Então não me diga que sabe, pô! Assim só fico mais curiosa.
Os idiotas não paravam de me mandar fazer força. “Faz força, faz
força”. Dava vontade de responder: “Vou fazer força no teu rabo!”
Foi uma verdadeira tortura. Eu gritava com Deus. Devo tê-lo xingado
de todos os nomes. Minha passagem só de ida pro inferno já estava
garantida.
– Me mate!! – eu supliquei – Não quero mais essa dor!
Eu chorava. Suava. Não sei qual parte de tudo aquilo eu havia
realmente gritado ou falado comigo mesma.
E depois de eu sofrer tanto, descobriram que o bebê não sairia por
parto normal e teriam que fazer cesárea. Putz. Era daquele jeito mesmo
que iam me matar. Nesse vai e vem, tenta aqui, tenta ali, tenta pela
barriga, pela buceta, pelo cu... tinha que sair por algum lugar, certo?
Houve complicações. Até que descobriram que eu correria risco de
morrer.
– Por que, Deus?
– Porque você nasceu.
– E por que foi que eu nasci?
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– Ah, agora pode – eu disse – ligue e deixe que eu mesma falo com
ele.
Acho que Gregório estava com aquele sorrisão no rosto porque ficou
aliviado de não ser o pai. Há, há, há. Babaca.
Eu não conseguia conter minhas lágrimas. Quando falei com Demian
pelo telefone eu estava me acabando de chorar.
– Mimi! O bebê é seu!
Demian chorou do outro lado da linha.
– Você o teve tão cedo! Segunda-feira eu já vou poder voltar.
– Claro, volte o quanto antes. Você vai morrer quando ver essa
fofura.
– Só não o aperte demais para não matá-lo, OK? – sugeriu Demian –
Eu quero vê-lo vivo quando eu voltar. Aliás, é um menino?
– Não sei!
– Ofélia, o que você está fazendo aí? – perguntou Demian, rindo e
chorando ao mesmo tempo – Mas nem isso você sabe ainda?
Em vez de perguntar pras médicas, eu simplesmente abri a trouxinha
pra ver.
– É meniiiinaaaaaa! – exclamei, toda alegre – Vou enchê-la de
lacinhos e roupas cor-de-rosa. Awwnnn!
– Tá bom, Ofélia, divirta-se. Mas agora é melhor desligar ou vai sair
muito caro. É ligação internacional de um celular!
– Ah, mas é o celular do Gregório. Ele não vai se importar... e ainda
preciso de um nome!
– Você não me disse uma vez que queria dar a ela o nome de sua avó
se fosse uma menina? – perguntou Demian – ela tinha um nome ainda
mais esquisito que o seu.
– Bem lembrado. Vai ser esse mesmo o nome. Assim que você voltar,
quero esse pau bem fundo dentro de mim. Beijinhos no caralho, amor!
Quando desliguei, apertei meu bebê.
– Minha ursinha! – exclamei – É tão bonitinha, mas é tão feia! He, he,
he. Ho, ho, ho!
Todos estavam com medo de me deixar segurando o bebê por muito
tempo, de tanto que eu o apertava.
– Vá apertar sua gata quando voltar pra casa – sugeriu Iolanda.
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Foi só com onze anos que Úrsula teve sua primeira paixão.
– Mãe, quem é aquele ocultista super famoso de quem todos falam na
internet? – Úrsula perguntou-me um dia – Andam dizendo que ele até
inventou uma nova religião. O cara é um gênio.
– Quem?
– Ele tem 24 anos. Fundou uma religião com um monte de práticas
sexuais. Dizem que é a religião da “suruba filosófica” como meio de
chegar ao conhecimento arcano. Eles também usam substâncias
alucinógenas. Eles trepam no mato. Isso não é fantástico?
Vi a foto do maluco num site. Ele estava sem camisa no meio de um
mato, com um monte de pinturas em tinta vermelha pelo rosto e pelo
corpo. Usava apenas uma sunguinha tribal. Tinha uma expressão de
“estou podendo”.
– Tô caidinha por ele! – confessou Úrsula – Acho que vou viajar pra
Pernambuco e pedir sua mão em casamento. Ele já tem duas esposas e
quer mais uma. O líder é poligâmico. Isso não é sexy? Quem sabe eu até
consiga transar com as duas esposas dele também? São gatinhas. Sempre
achei que eu tinha tendências bissexuais.
Quando finalmente reconheci o desgraçado, não pude deixar de
praguejar.
– MAXIMILIANOOOOOOO!
FIM
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