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28/05/2019 hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade Confins Revue franco-brésilienne de géographie / Revista franco-brasilera de geografia 27 | 2016 ‘Némero 27 Nas trilhas de Paris, David Harvey e a capital da modernidade Sur les traces de Paris, David Harvey et la capitale de la modemité (On the tracks of Paris, David Harvey and the capital of modemity TapEu ALENCAR ARRAIS Resumos Portugués Francais English Paris, capital da modernidade pode ser lido como uma espécie de sintese da obra de David Harvey, ‘uma vez que retine duas caracteristicas marcantes de sua trajet6ria intelectual. A primeira relaciona se ao interesse pelos estudos urbanos, consagrando uma tradi¢ao que remonta ao livro A justica sociale a cidade (Harvey, 1980). A segunda é a preocupagdo em explicar as relagdes entre o capital e a produgio do espago. O capital, em Harvey, nunca é uma nogio abstrata. Fle se move e, a cada momento, transforma as formas e os conteidos do espago. Ao adjelivar Paris de “a capital da modernidade”, 0 gedgrafo torna a cidade icone desse period histérico, o que resulta na elaboragio de uma ampla cartografia dos conflites préprios da produgo do espago urbano. A partir das trilhas Geixadas pelo autor, investigamos a constituigao do sitio urbano de capital francesa para, ogo ap6s, analisar a maneira de ver a eidade de Honoré de Balzac (1799-1850) e a forma de intervir na cidade de Eugene Haussmann (1809-1892). Em seguida, discutiremos a pertinéneia do modo de abordagem a cidade proposta por David Harvey a partir daquilo que adjetivamos de “meméria politica da paisager’ Paris, capitale de la modernité peut @tre In comme une sorte de synthase des travaux de David Harvey car il réunit deux caractéristiques remarquables de sa trajectoire intellectuelle, La premiére a trait A Tintérét pour les études urbaines, en consacrant une tradition qui remonte & foeuvrelitéraire La justice sociale et Ia ville (Harvey, 1980). La deuxiéme, c'est la préoccupation dexpliquer les relations entre le capital et la production de espace. Le capital, en Harvey, n'est jamais une notion abstraite. I se déplace et, & chaque fois, ransforme les formes et les contenus de Tespace. Quand il {qualifie Paris comme “Ia eapitale de la modernité”, le géographe fait de la ville Viedne de cette période historique, résultant a Vélaboration d'une cartographie exhaustive des conflits propres de la production de lespace urbain. De les traces laissées par Tauteur, nous étudions la constitution de la zone urbaine de la capitale frangaise pour, peu de temps aprés, analyser la fagon de voir la ville de Honoré de Balzac (de 1799 81850) et comment intervenir dans la ville de Eugene Haussmann (1809 wn 28/05/2019 hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade -2891), Ensuite, nous parlerons de la pertinence de 'approche de Ia ville proposé par David Harvey a partir de ce qu'on qualifie comme mémoire politique du paysage. Paris, capital of modernity can be read as a kind of synthesis of the work of David Harvey as it ‘brings together two remarkable features of his intellectual trajectory. The first relates to the interest in urban studies, establishing a tradition dating back to the book Social justice and the city (Harvey, 1980). The second concern is based on explaining the relationship between the capital and the production of space. The capital, in Harvey, is not an abstract notion. It moves, and every time, ‘transforms the forms and the contents of the space. When he qualifies Paris as “the capital of modernity”, the geographer makes the city an ion of that historical period, resulting in the development of a comprehensive mapping ofits own confliets about the produetion of urban space. From the tracks left by the author, we investigate the constitution of the urban area of the French capital so that, shortly after, we may analyze the way to see the city of Honoré de Balzac (1799-1850) ‘and how to intervene in the city of Eugene Haussmann (1809 -1891), Then, we discuss the relevance of the city approach mode proposed by David Harvey from what we qualify as landseape political ‘memory. Entradas no indice Index de mots-clés : Paris, moderité, David Harvey Index by keywords : Paris, modernity, David Harvey Indice geografico : Paris Indice de palavras-chaves : Paris, modernidade, David Harvey Texto integral “isualizar a imagem Paris, capital da modernidade 6, certamente, um dos livros mais expressivos do gedgrafo David Harvey. Um livro que foge aos enquadramentos disciplinares, seja da geografia, de maneira especffica, para decifrar o proceso de producio do espaco no capitalismo sio reunidas, na narrativa ja das ciéncias humanas, de maneira geral. As pistas do autor, no sitio urbano de Paris. A cartografia dessas mudangas no capitalismo do século XIX, que reverberavam em Paris, 6 0 pano de fundo para o estudo da geografia urbana e da modernidade. Como o espaco, em David Harvey, nao é algo passivo, optamos por uma breve descriggo do sitio urbano da Paris medieval. A paisagem urbana herdada propriamente dita. Em seguida, discutimos as duas principais fontes que subsidiaram as uas primeiras partes do livro e encerramos com uma abordagem, por assim dizer, metodolégica, adjetivada de meméria politica da paisagem. O sitio politico O subsolo de Paris, se o olhar pudesse penetrar sua superficie, teria o aspecto de uma madrepérola colossal. Uma esponja nao tem mais buracos ¢ sinuosidades do que o torrie de terra de seis léguas de circunferéncia sobre a qual repousa a antiga grande cidade. Sem falar nas catacumbas, que sio subter canos de gis, sem contar o vasto sistema tubular de distribuicio de agua potavel, que vai a ;neos & parte, sem falar na inextrineével rede de ane 28/05/2019 2 hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade todos os chafarizes, s6 os esgotos formam sob as duas margens uma prodigiosa rede tenebrosa; labirinto que tem por fio seu declive. Vietor Hugo, Os miserdveis, 2014, p. 1308. © mapa Paris vers 1530: plan dit “d'Arnoullet" (Arnoullet, 1906) apresenta algo que se repete em muitos outros mapas que representam a cidade entre os séculos XVI e XVIII. A representagao cartografica nao deixa diividas da importancia do rio Sena na configuragao do sitio urbano da capital francesa. O exagero na escala da calha é proporcional & importincia do rio na morfologia urbana da capital. O mapa é uma sintese da Paris medieval: densa, com os grupos de muralhas desenhadas que operam uma separagio funcional entre a paisagem urbana e a paisagem rural. No exterior da muralha, reconhecemos Areas de cultivo, pantanos ¢ florestas, moinhos, castelos, fortificagdes € algumas igtejas. No intramuros, sempre em destaque, a fle de la Cité, além de outras duas ithas aluvionais, tendo em uma de suas extremidades a Catedral de Notre-Dame de Paris. Os meandros do Sena, historicamente, nao apenas desenharam a morfologia urbana de Paris, mas também favoreceram uma rede de protegao ¢ circulagao interna ¢ externa. As 15 Margens, construiram portos para circulagio de pessoas e mercadorias, cujo exemplo mais notavel 6 a Place de Gréve, atualmente Place Hotel de Ville, area que se constituiu em ponto de carga e descarga de mercadorias e concentragio de trabalhadores. Os diferentes cireulos de muralhas ¢ os meandros do Sena, portanto, formavam uma simbiose s6 completamente desfeita a partir do terceiro quartel do século XIX. Nao é por acaso que Paris seja menos conhecida pelos seus arrondissements e mais pela divisio entre margem esquerda e margem direita.! A historia da ocupacio do sftio urbano deve ser lida a partir do incremento populacional ‘que seguiv, até os primeiros quartéis do século XIX, 0 modelo tradicional de urbanizagao ‘medieval. Na proporgéio em que se expandia a populagao, novos muros foram construidos. Nada menos que cinco muros ¢/ou fortificagdes, desde a tradicional muralha galo-romana, foram construidos ao redor de Paris (Brés & Sanjuan, 2012). A descrigdo de Le Goff (1998, . 71) ajuda a compreender a morfologia dessa cidade: A cidade da Idade Média 6 um espago fechado. A muralha a define. Penetra-se nela por portas e nela se caminha por ruas infernais que, felizmente, desembocam em pragas paradisiacas. Fla 6 guarnecida por torres, torres das igrejas, das casas dos ricos e da muralna que a cerca, Concentrada em um pequeno espago, 0 controle do tempo e o controle da circulagio ceram as chaves desse modelo de urbanizagio, Mumford (1998) lembra que, mesmo nas ‘maiores cidades medievais, a area ocupada nao se expandia em faixa superior a oitocentos ‘metros a partir do centro. No caso de Paris, no entanto, mesmo no século XVII, essa drea ultrapassava um raio de um quildmetro a partir da fle de la Cité. A forma de ocupagao vertical resultou da utitizagio multifuncional do espago para habitago, produgio Desde muito cedo Paris conviveu com uma espécie de verticalizaglo. As residé verticais de trés, quatro, cinco ou mesmo seis pavimentos predominavam na paisagem da capital, Seu uso por diferentes fragbes de classes era outra caracterfstica. A cada andar, partindo do primeiro até o s6tao, o espago ndo apenas era mais denso, como também mais precéio e, portanto, habitado pelos inquilinos mais pobres. Nem mesmo as primeiras pontes do Sena escaparam da presenca de casebres. Issa Paris medieval, frequentemente, 6 retratada por autores como composta por trés partes: a cité, sitio da ocupagao primitiva e fungio portuaria, a université, area tradicional de estudantes, no Quartier Latin, e a ville, na margem direita do Sena (Benevolo, 2005). Fi Extensio da rea construlda e as muralhas de Paris, ant 2810572019 Nas trihas de Pars, David Harvey &a capital ds modemidade Fonte: Brés & Saniuan (2012) Mas o sitio urbano de Paris apresenta outras particularidades. A densa Paris, desde muito cedo, guardou segredos em seu subsolo. A construgio da cidade, cujos monumentos atestam a riqueza do trabalho de operdtios ¢ artesios, mas também a demanda por materiais de construglo, indica a importncia da extracio mineral ~ caleério, argila, areia ete. 0 Atlas souterrain de la ville de Paris (Fourcy et al., 1859) localiza as faixas de exploragao mineral, concentradas na margem esquerda do Sena. A exploragio das pedreiras subterréneas, em virtude dos perigos de desabamento, foi proibida em 1776, ‘mesmo perfodo em que foi criada a Administracao Geral das Galerias Subterrneas. Figur HE 100 ME 6.00 MEE 5000 ME 00 22000 EE 2s i fase a: ews = = = iD ne : 5 a 0 La ASL ASI LGB 1836 LEAL 1846 1866 1860 1872 187 ABO L90L 0 incremento demografico ao longo do século XIX foi extraordindrio (Figura 2). A partir do terveiro quartel do século XIX, a cidade se expande horizontalmente. Estatfsticas publicadas por Cochin (1864) sobre a populagio ¢ a indastria de Paris informam uma populagao de 1,7 milhGes de habitantes em 1864. Impressiona, no entanto, a informagio de Cochin (1864) sobre a existéncia de 55.000 maisons, o que resultow em uma densidade de 35 habitantes por maison no ano de 1864. As partes centrais de Paris, especialmente os arrondessenments 19, 2°, 4°, 3° ¢ 6°, eram as mais povoadas. A aproximadamente 1,8 quilémetro da margem direita do Sena, no sentido Norte, até a Praga da Repiblica, assim htps:journals.openeciion orgicontins!10942Iang=pt an 28/05/2019 Nas thas de Pais, David Harvey @ @ capital da moderidade como uma rea de aproximadamente 1,2 quildmetro a partir da Praga de la Concorde até o ‘Teatro da Opera, o que inclufa 0 quarteiro do mercado Les Halles, localizavam-se as reas mais densas. Na margem esquerda, os arrondessenments 5°, 6° ¢ 7° cobriam uma area linear as margens do Sena, seguindo até aproximadamente dois quilémetros no sentido sul, na dirego da Gare Montparmasse, localizada no 14° arrondessenment. £ suficiente, para comprovar a predomindncia da estrutura vertical das edificagdes, um olhar sobre as fotos de Charles Marville. Nelas, o predom{nio para edificagdes verticais de ‘quatro a seis andares ~ modelo da casa burguesa ou mesmo dos alojamentos ~ foi deserito pela literatura. Impressionam os registros do Cour de la Bidvre, afluente do Sena, que desdgua em sua margem esquerda. As fotos do 13° arrondessenment nao deixam vidas quanto & situago geral do saneamento, da circulagao e da habitago: ruas estreitas e irregulares, vielas, pouco sol, calgamento de pedra, esgoto a céu aberto, edificios sem rrecuo, cortigos, pensées, pequenas indtistrias de panificagio, curtumes ete., ¢, 6 claro, um turbilhao de gente a flanar pela cidade. Fonte: Marie (sem data). Ossponvel om: © século XIX, que anuncia a modernidade, herda essa estrutura urbana cuja densidade, fragmentacio espacial e a continua necessidade de recursos naturais esto entre suas principais caracteristicas. Paris, centro da produco da Franca. Paris, espelho da Europa aris, em constante reconstrugdo por Republicanos e Monarquistas, tem um prego a pagar. Imagine-se, por exemplo, a demanda por lenha nos rigorosos invernos para se aquecer e cozinhar. Pai Goriot, personagem de Balzac, em seu progressivo declinio econdmico, nao apenas solicita passar para o segundo andar da pensio Vauquer, medida para economizar dividendos para sua mesquinha prole, como também deixa de acender a lareira em seus aposentos durante o inverno, Vietor Hugo, em Os miserdveis, descreve de maneira majestosa 0 que chamou de “intestino de Paris”. £ pelas visceras da cidade que Jean Valjean salva Marius, depois do insucesso da barricada na Rue de la Chanvrerie, Vietor Hugo ensina como 0 sitio urbano formado por terra, lama, ladeiras, vielas, esgotos subterraneos pode servir para propésitos politicos. © forcado Jean Valjean conhece, como poucos, essa Paris do século XIX que oscila, a cada barricada, entre o desejo pela Repiiblica e a nostalgia da Monarquia. Os personagens da modernidade A pesquisa de David Harvey (2015) é rica em personagens que auxiliam o gedgrafo a decifrar os segredos de Paris. Os financistas Péreires, o fotdgrafo Charles Marville, escritores como Emile Zola, Victor Hugo, Gustave Flaubert e Charles Baudelaire so alguns exemplos. Nao sio apenas memérias dos costumes que os personagens, agora fontes, nos oferecem. Sao memérias de uma paisagem em transigéo, Memérias do momento e do espago de constituigao da modernidade. Entre tantos personagens, se destaca a figura de Honoré Daumier (1808-1879). 0 ilustrador franeés ocupou-se em htps:journals.openeciion orgicontins!10942Iang=pt snr 28/05/2019 8 Nas thas de Pais, David Harvey @ @ capital da moderidade demonstrat, em imagens satfricas, 0 universo politico parisiense, sempre com um écido tratamento para a monarquia, tanto quanto para a burguesia.? Segundo Hussey (2011, p. 292), “Daumier era engragado mordaz, e, niio menos que Balzac, resumia a 6poca em seus desenhos”. Nao obstante David Harvey (2015) utilize Daumier como fcone visual, 6 em Honoré de Balzac (1799-1850) e Eugéne Haussmann (1809-1891) que o gedgrafo reconhece que as contradi¢des e rupturas da modernidade so reveladas de forma mais explicita. Trata-se de sintese de uma época de continuidades e rupturas que so reveladas na pena do primeiro e no “eompasso” do segundo. Esse aspecto da Paris moral prova que a Paris fisica 1ndo poderia ser diferente do que 6. Honoré de Balzac, A menina dos olhos de ouro, p. 361 Nao é dificil compreender as razdes pelas quais David Harvey (2015) elegeu Balzac ‘como um dos principais intérpretes da modernidade. Segundo Harvey (2015, p. 44): Sustentarei que a suprema realizagao de Balzac foi dissecar e representar as forgas sociais onipresentes no Utero da sociedade burguesa. Ao desmisifcar a cidade e os mmitos da modemnidade com a qual ela fo! permeada, ele abriu novas perspectivas nao somente sobre o que a cidade era, mas também sobre o que ela poderia ser. © plano da obra de Balzac, descrito como A comédia humana, & composto, considerando a iiltima tradugio para o portugués, por dezessete volumes, dos quais onze sfo dedicados as cenas da vida privada, da vida provinciana e da vida parisiense.t No “Prefacio” de A comédia humana, Balzac deixa claro seu objetivo: “[..] fazer o inventério dos vicios ¢ virtudes” da sociedade francesa (Balzac, 2013, p. 108). Mas quais caracteristicas dessa fértil obra ajudam a compreender a capital da modernidade? A paisagem de Paris pode ser decifrada a partir de uma logiea de comunicagao dos personagens balzaquianos com os fragmentos da cidade. F, possivel identificar tanto uma fisionomia dos tipos urbanos quanto uma fisionomia das paisagens urbanas na obra de Balzac. A imagem gréfica da casa burguesa, das pensGes, das ruas, dos bairros, assim como da provincia, conduz.o leitor, a todo o momento, a imaginar a totalidade da vida social em Paris. As ruas possuem qualidades humanas, tanto quanto revelam os vicios da sociedade burguesa, Benjamin (2006, p. 51) escreveu que Balzac “foi o primeiro a falar das rufnas da burguesia”. Balzac parece ser fascinado por uma espécie de topogratia social, motivo pelo ‘qual parte significativa do seu enredo seja construida na emergente cena piiblica burguesa. Essa é, de fato, uma das principais caracterfsticas da cidade burguesa que tornow imperiosa a apropriagio do espago piblico como forma de se fazer ver e de se fazer ouvir por meio do consumo de mercadorias e de lugares. Os eédigos e os rituais dessa sociedade criaram um tipo especifico de civilidade. Civilidade, como nos ensinou Senet (1998), implica forjar lagos sociais, mesmo quando considerando os outros como estranhos, fato comum nas grandes aglomeragdes urbanas do século XIX. As ruas, os sales, os cruzamentos, 0s cafés so locais privilegiados nos enredos de Balzac. Nas primeiras paginas de Ferragus ou 0 chefe dos devoradores encontramos extraordinérios exemplos dessa topografia: “A Rue Traversiére Saint-Honoré nao 6, acaso, uma rua de inffimia? Ha nela pequenas casas de duas aberturas onde se encontram a cada andar erimes, vicios € misérias” (Balzac, 2013b, p. 41). “Nenhum bairro de Paris é mais horrfvel nem, digamos, mais desconhecido” (Balzac, 2002, p. 30-31) que o bairro da pensao Vauquer, situada entre 0 Quartier Latin € 0 Faubourg Saint-Marceau, escreveu em O pai Goriot. A detalhada descrigio da pensio apenas perde para a descricio da fisionomia dos pensionistas. Como espago social, 0 enredo se desenvolve a partir de encontros. A pensdo é a materializagdo de uma Paris por onde gravitam as aspiragdes de ascendéncia social de varios tipos humanos: velhos, vidvas, solteironas, jovens, condenados ete. O proprio Eugine de Rastignae, estudante de direito, 6 um migrante provinciano. O que ¢ interessante nessa novela, tanto quando em htps:journals.openeciion orgicontins!10942Iang=pt en7 28/05/2019 hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas thas de Pais, David Harvey @ @ capital da moderidade Ferragus e também em A menina dos olhos de ouro € a incurséo didria que os personagens fazem pela cidade. H4 uma visio clara da fragmentagio espacial e social da cidade, o que coaduna com a visio de Hussey (2011), para quem o universo de Balzac em Paris gravita entre o Faubourg Saint-Marceau, regio pobre localizada na margem esquerda, 0 Faubourg Saint-Honoré, area de negociantes e de comércio, e 0 Faubourg Saint-Germain, da velha aristocracia. ‘A ambigéo pela mobilidede social implica, de igual maneira, ampliar a mobilidade espacial, inclusive no momento da morte ou mesmo nos momentos de lazer, traduzidos, por exemplo, no veraneio no campo. A descrigdo dos tipos humanos em A menina dos olhos de ouro coloca em evidéncia essa perspectiva de anilise. (© operario que morre velho aos trnta anos, com estémago curlide pelas doses progressivas do alcool, tlvez seja, no dizer de certos filésofos bem instalados, mais feliz que 0 armarinheiro, Um morre de uma vez s6 e 0 outra no varejo. (Balzac, 2013c, p. 341-342) Por seu turno, em que consistem os desejos do burgués? (© sabre da Guarda Nacional, um cozido invariével, um lugar decente no Pere- Lachaise, e, para a velhice, um pouco de ouro, legtimamente ganho, A segunda- feira dele & 0 domingo, Seu repouso & o passeio ao campo, num carro de aluguel. Passeio durante 0 qual mulher ¢ ofilho engolem alegremente a poeira ou se assam 20 sol, (Balzac, 20136, p. 343). Ainda encontramos uma deserigao da realidade urbana burguesa: Oar das casas em que vive a maior parte dos burgueses é infecto, a atmosfera das ruas cospe miasmas crué's nas pecas interiores das lojas onde o ar se rarefaz; mas, além dessa pestléncia, os quarenta mil prégios dessa grande cidade mergulham ‘sous alicerces em imundicies que o poder piblico nao quis ainda seriamente cercar de muralhas que impegam a lama mais fétida de filrar-se através do solo, de lenvenenar os poros ¢ de fazer perdurar subterraneamente em Lutécia seu nome célebre, Metade de Paris jaz entre exalagdes pulridas dos patios das ruas e dos esgolos, (Balzac, 2013c, p. 349). A ironia, a ilusdo da vida do pequeno-burgués, como sugerem intimeras ilustragdes de Honoré Daumier, ganha vida na eserita de Balzac. Ao que parece, os burgueses ainda procuravam se adaptar aos elementos da modernidade, e 0 romancista reconhece nisso ‘um apelo pela vaidade. A moral burguesa 6 resumida na ambigio desmedida que frequenta a maior parte dos primeiros volumes de A comédia humana. Renda, soldo, pensio vitalicia esto entre as principais preocupagées do universo balzaquiano. Seus personagens, talvez porque angustiados com a turbulenta historia politica francesa, se preocupam demasiadamente com o futuro financeiro. Aquela transitoriedade, tipica da modernidade e evidenciada por Berman (1986), justifica o temor diante do futuro. E Paris pressiona os personagens balzaquianos cotidianamente. Mas a ilusdo de frequentar sales, de passear nas carruagens lustrosas, de pagar por umn corte alinhado nos alfaiates, de um bom chapéu, do consumo de artigos da titima moda adquiridos na Champs-Elysées, de um Camarote na Opera oprime homens ¢ mulheres. Em Paris tudo é mascara, Essa Paris encontra-se em constante transformagio. A representagao da cidade como centro de realizagbes e mesmo centro da perversio de uma sociabilidade primitiva, como 1nos ensinou Willians (1998), parece ser compartilhada por Balzac. A oposicao entre cidade campo, provincia e metrépole, indica a percepeao hegeménica de Paris: lugar de consumo, de desmedidas ambigdes, do desfrute de homens e mulheres que cultuam a aparéneia. Paris, diante da provincia estagnada, marcada pelo imobilismo e pela monotonia.s O jovem estudante provineiano Eugene de Rastignac, a duras penas, pereebeu como se movimentar nessa capital. O movimento no é apenas horizontal, mas, sobretudo, vertical, marcado pela ascendéncia social. “Suas ilusdes de infancia, suas ideias provincianas haviam desaparecido” (Rénai, 2012, p. 54). Paris, centro do mundo, eeleiro m7 2a)05/2018 Nas thas de Pais, David Harvey @ @ capital da moderidade de realizagées téenicas, abrigo de Exposicdes Universais que no tém outro motivo sendo celebrar 0 mundo da mercadoria. Todos querem conhecer Paris. Querem consumir Paris. Essa visio de Paris como centro de realizagées e de liberdade dos valores provincianos 6 compartilhada por Emma, em Madame Bovary, personagem de Gustave Flaubert. A jovem desposada pelo provinciano Charles sonha com os fascinios de Paris a ponto de, a partir de um mapa, subir os bulevares ¢ desejar 0 mundo do consumo reservado aos burgueses (Flaubert, 2011). 2% Mas essa Paris, aos olhos de Balzac, como desereveu Rénoi (2012), ndo tem nada de idflico, £ mais “Cidade-Chama” do que “Cidade-Luz”. ‘A Paris de Balzac, para dizer a verdade, pouco tem de idilico. © seu brilno lembra 0 da chama que atraiinsetos notumos para queimé-los. Se os insotos pudessem roflet Se olnassem um instante sequer 0 chao, cheio de asas quelmadas, de ccorpas carbonizades de seus semelhantes! Eles, porém, s6 sabem olhar para a luz, 86 t8m uma vontade, chegarem-se a ela o mais possivel, aquecerem-se a ela (Rénal, 2012, p.142), 2% Também a versio do anonimato da grande cidade 6, frequentemente, encontrada: “Deixe os parisienses com os seus pequenos casos” (Balzac, 2013b, p. 46, grifo do autor), advertiu o pedreiro, diante de um Augusto de Maulicour obcecado por descobrir os segredos da jovem senhora. Esse é 0 carter da modernidade presente em uma grande cidade como Paris. Nao se trata, apenas, da possibilidade de flanar em Paris, verbo bastante utilizado na literatura francesa do século XIX. Flanar é apropriar-se visualmente das cenas piblicas, dos cafés, dos restaurantes, das galerias. £ estar preparado para refugiar-se diante das chuvas, imagem cléssica que sempre acompanhou o cotidiano dos parisienses. © pedestre em Paris é entéo obrigado a deter-se imediatamente, a refugiar-se numa Ioja, ou num café, se é bastante rico para pagar a forcada hospitalidade, ou, conforme a urgéncia, sob uma porta, aslo da gente pobre mal vestida. (Balzac, 2013b, p. 64). 24 A fisionomia espacial de Paris muda a todo o momento. Em Ferragus, o bisbilhoteiro se vé diante da “febre de construgées” (Balzac, 2013b, p.73) que atormenta toda cidade. O movimento da cidade, indicado pelo fervilhao da construgio civil, revela o aspecto espacial da modernidade parisiense, que é, justamente, remover aquele recente passado que Balzac 3 monumento do General Foy, 1829 htps:journals.openeciion orgicontins!10942Iang=pt anr 2810572019 2 a 2 2» hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas thas de Pais, David Harvey &a capital ds modemidade Fonte: Bilthéque Nationale de France (8) ‘A-cena que se segue ao enterro do pai Goriot é uma das mais lembradas na obra de Balzac. Ao olhar da pequena colina na diregao dos meandros do Sena, o entio estudante de direito Eugéne de Rastignac, agora nao mais debutante diante da cruel burguesia, desabafa: “Agora, é entre nés dois!”. O que a cena mais uma vez revela é uma imagem topografica de Paris tao earacteristiea nas obras de Balzac. A perspectiva de vista da cidade a partir do cemitério Pére-Lachaise é reveladora das hierarquias sociais que o jovem ansiava por vencer. Sem diivida, como relatou Balzac em A casa Nucingen (Balzac, 20134), Rastignae venceu. “Agora, é entre nds dois!” também poderia, perfeitamente, constituir-se em epfgrafe inicial das memérias do Bardo de Haussmann, que assume, em 1853, a tarefa de domar a morfologia espacial da velha Paris, -Bugene Haussmann (1809-1891) Nao se deslocam 350,000 pessoas @ os estabelecimentos industrais ou comerciais ‘explorados por muitas delas sem ocasionar uma mudanga geral, da qual as rmassas, ndo podendo avaliar a indispensavel necessidade, se cansam rapidamente, principalmente quando isto se prolonga durante uma série de 17 anos! Eugene Hausman, Mémoires du Baron Haussmann, 1890, p, 458, Engels (1979) talvez tenha sido um dos primeiros autores a compreender a natureza das transformagées efetuadas por Eugéne Haussmann, quando este assume, sob a tutela de Napoledo IIL, a prefeitura de Paris, em 1853.5 Sua andlise se desenvolve a partir de trés premissas. A primeira é que a burguesia resolve a questo da habitagdo a partir do deslocamento espacial. A segunda é que esse tipo de estratégia, além fragmentar as lasses, capitaliza os segmentos da burguesia. A tereeira premissa 6 que, por detras do embelezamento e alargamento das ruas, residiria uma estratégia para conter as barricadas. Engels (1979, p. 48) nao circunsereve sua anélise apenas a Paris, encontrando evidéncias desse processo em Londres, Manchester, Liverpool, Berlim e Viena. “Este método tem um nome: Haussmann”. ‘Mas em que consistiram as alteragGes urbanas efetivadas, entre 1853 ¢ 1870, por Eugéne Haussmann? Jones (2013) argumenta que a reconstrugao de Paris entre 1853 ¢ 1870 aconteceu “de dentro para fora". O que isso significa? Em primeiro lugar que as transformagées na ordem urbana nao atenderam, apenas, as demandas internas da cidade. A cidade moderna onr 28/05/2019 hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade uma cidade aberta ao mundo. Nao é por aeaso que Hobsbawm (1988) localize a era do capital entre 1848 e 1875. A era do capital é a era de Londres. I a era de Paris. Na escala regional, era imperioso favorecer a fluidez. Reforgar a centralidade de Paris. As ferrovias haviam, definitivamente, ultrapassado as muralhas. Nao é por acaso que Haussmann tenha reformado as principais estagdes ferrovidrias, integrando-as aos grandes bulevares, ceujos exemplos mais notaveis so a Gare de I’Est e a Gare de Montparnasse, Em segundo lugar, era preciso garantir as condigdes para a produgdo da circulagdo das mercadorias, 0 que implicou, especialmente, eriar as condigdes técnicas para circulagdo e consumo do capital. A técnica, traduzida na utilizagdo do ferro e na iluminagio dos bulevares, ajudou a adequar o tempo e o espago ao novo regime de consumo. A formula de Harvey (2011), que nos ensina que a circulagdo de capital implica movimento espacial, se encaixa perfeitamente no quadro parisiense dos tiltimos quarteis do século XIX. Mas como fazer isso? Entre as condigdes materiais, particulares do momento histérico, o conjunto de obras ajudaria, para usar a expresso de Harvey (2015), a absorver os excedentes de trabalho € capital. Harvey (2015) assinala que, em 1860, nada menos que um quinto da populacdo estava empregado na construcao civil. Estatisticas de 1864 publicadas por Cochin (1864) destacam os setores da construgdo ¢ de alimentos como aqueles com maior ntimero de empregados. Esse € 0 grande campo de batalha, 0 canteiro de obras, tao importante ‘quanto conter as barrieadas. O desemprego, condigio estrutural da velha Paris, traduido nna fome e nas péssimas condigdes de habitagio, era o principal combustivel das barricadas. E 0 método para tal empresa foi a demoligao, seguido da reconstrugio. AS palavras encontradas com mais frequéncia no terceiro volume das Mémoires du Baron Haussmann so: decreto, utilidade pablica, expropriagio, prolongamento, alargamento, abertura e demoligao. publicagao de varios decretos, como indicados em suas memérias (Haussmann, 1890b), instituindo areas de utilidade publica para fins de desapropriaco, funcionou como um verniz para esconder 0 processo autoritério que colocou abaixo milhares de residéneias de operérios. Esse momento do desenvolvimento urbano foi adjetivado por Benevolo (2005) de “cidade pés-liberal”, cuja maior caracteristica ¢ a celebragio do pacto entre a administragio piblica e 0 mercado imobiliario. O objetivo da administragdo, para recorrer a Harvey (2015), 6 reduzir as “barreiras espaciais”. Benjamin (2006, p. 49), nas Passagens, assim interpreta esse fato: A eficiéncia de Haussmann insere-se no imperialismo napolednico. Este favorece 0 capital financeiro, Paris vive o auge da especulagdo, A atividade especulativa nas bolsas supera as formas do jogo de azar herdadas da sociedade feudal 2 0 1861 is, balanco das demoligdes, construgdes ¢ reconstrugdes entre Localizagao | Casas demolidas | Construgses e reconsirugées Paris antiga (1852-1860) 4349 9617 Paris amplada (1860-1670) 15.73 34.160 ‘Antes da zona suburbana 3.084) 27.890 ‘Apés anexagao da zona suburbena | 4.682 30.820 Total 27.448 102.487 Fonte: Organizado a part do segundo volume das Mémoires du Baron Haussmann (1890) A escala da remogio, mesmo considerando as possiveis imprecisdes nas informagdes, & assustadora, Mais de 350.000 pessoas, a julgar pela ocupagio média domiciliar, por assim dizer, “trocaram” de lugar. Um deslocamento espacial. Observa-se, por exemplo, a relagao entre construgdes e reconstrugdes na Paris antiga, comparando-as ao subvirbio, como indicado na Figura 5. H4, claramente, um deslocamento de habitagoes e alguns tipos de s0n7 28/05/2019 Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade indGstrias para as faixas suburbanas, motivo pelo qual outro anel foi incorporado, via decreto, ao sitio de Paris, formando os vinte arrondissements atuais. Haussmann ambicionava o controle total do espaco, s6 assim poderia criar novos bairros e sacralizar sua politica de deslocamento e fragmentagio do espago urbano. Esse descolamento se justifica, fundamentalmente, pela reformulagdo do sistema vidrio, como mostra a Figura 6. Figura 6 - Principals inclusées no sistema vidrio na gest4o Haussmann, entre 1854 e 1870 S fuse rae to “4, ron 8 ssoso0 Sc Fonseca Fonte: Figura redesenhada ereformulada, com inclusbes de pontos marcantes, a pat de base extrada de Iitps:reggiewang. wordpress.com 52 ritmo frenético da transformagio do espaco é um dos pontos singulares da reforma de Paris. Haussmann nfo inventa o mercado imobilidrio, apenas instrumentaliza as condigées para a maximizaco de sua exploracdo, o que jé era um feito enorme, dado que a cidade ainda respirava ares medievais. Da mesma forma, seria ingenuidade supor que Haussmann inventou a segregacao residencial. O que muda, ¢ isso é considerdvel, é, por uum lado, a escala e, por outro lado, 0 protagonismo do Estado a partir de um regime de exeegao de leis de uso e regulagio do solo urbano. O solo, mais do que munca, passa a ter valor, e seu controle transformou-se em insumo indispensével para a modernizagao. Em dezessete anos 0 solo de Paris foi impermeabilizado e 0 subsolo cortado por redes de Agua, esgoto e gis. Entre um ponto X e um ponto Y, ao tragar um bulevar, nada haveria para impedir a modernizagio. O mapa que mais chama a atengZo refere-se ao sistema visrio, interligando, por exemplo, a Place |’Btoile, o Les Halle, o Hotel de Ville, o Louvre e a Sorbone. Haussmann (1890b) escreve que a largura média das ruas passou de doze metros para vinte e quatro metros e de treze metros para dezoito metros na érea suburbana. Entre as mudangas no sistema viério, interpretada a partir da Figura 6, destacamos: + Bulevar Sébastopol, no sentido Norte-Sul. Na margem direita, estende-se até as proximidades da Gare de I’Est, conformando uma das avenidas mais extensas de Paris + A reformulagio da rua Rivoli, no sentido Leste-Oeste, na margem direita, interligando a ja famosa ¢ também reformulada avenida Champs-Elysées, centro de consumo e, agora, preparado para receber as grandes lojas de departamento. sistema radial concéntrico que lembra uma estrela a partir da Place I’Ftoile. As antigas estradas foram realinhadas, tornando 0 Arco do Triunfo o ponto de convergéncia de doze avenidas. 38 Esse conjunto de alteragdes na estrutura viéria demandou a padronizagio das fachadas € 0 alinhamento das quadras. A perspectiva do embelezamento é clara, motivo pelo qual Hall (2009) citou Haussmann como um dos precursores do movimento City Beaufitul. A expansao e o alargamento dos bulevares reduziram o deslocamento no interior da cidade, hips:tjouralsopenedton orglconins/109422Iang=pt ane 28/05/2019 Nas tas de Pai, David Harvey ea capt da mosemidade facilitando, ao mesmo tempo, o consumo, afinal as galerias registravam declinio progressivo. Ainda nas proximidades da Rue de Rivoli, no 4° arrondissement, o mereado Les Halles foi “modernizado”. A vitalidade desse mercado, local em que Emile Zola desenvolve o enredo de O ventre de Paris, cemplar da natureza das transformagies promovidas por Haussmann. O mercado é o ponto de convergéncia da produgéo regional (legumes, frutas, peixes, canes, flores etc.) que alimenta Paris. Floréncio, personagem central da novela de Zola, estranha a transformagio do mercado, agora, com sua grande abéboda e suas estruturas de ferro, funcionalmente zoneadas em pavilhdes. O estranhamento é uma caracterfstica da modernidade. Autores como Benjamin (2006), Mumford (1961) ¢ Lefebvre (1969), seguindo a tradi¢do de Engels (2979), argumentam que o primeiro objetivo de Haussmann era conter as barricadas. f possivel, muito embora 0 testemunho de Haussmann nfo revele isso, que estejam corretos, afinal o Baro foi um disciplinado funcionario do II Império. No entanto, Enecessrio assinalar que, como indicam Jones (2013) ¢ Harvey (2015), muitas alteragdes em Paris j4 estavam em curso. Haussmann nfo partiu do zero. Nao hé como negar, entretanto, que sua ampla reconstrugéo de Paris foi funcional para o capital, em um sentido amplo, uma vez que eliminou as “barreiras espaciais’ para a produgdo, a circulagéo e © consumo segmentado. Capitalizou, via erédito, os agentes do mercado imobiliério, Como garantia o aparato legal, que permitiu, a um s6 tempo, aproveitar 0 cexcedente de mao de obra, abrir espago para novas lojas, embelezar a cidade e construir conjuntos de apartamentos confortaveis para determinadas fragGes da burguesia. Dessa leitura resulta a originalidade da pesquisa de David Harvey. Barricada e barreira espacial so sindnimas, A primeira, edificada com méveis velhos e colchdes, para recordar 0 cenrio da Iuta de Jean Valjan, foram pontuais no sitio urbano, dada a natureza da estratégia de guerrilha. A segunda, apoiada por maquinas, equipamentos modernos e todo aparato institucional, foi, aparentemente, mais eficiente que a primeira, porque construiu ‘uma imagem eficiente da modernidade e tentou apagar, dese modo, a meméria das barricadas. Mas a paisagem é também meméria politica. A memoria politica da paisagem A paisagem geogréfica da produce, da troca, da distribuigdo e do consumo capitalista nunca esti em equilfbrio, David Harvey, O novo imperialismo, p. 84, © método utilizado por David Harvey 6 o que garante o efeito da narrativa. Hé trés caracteristicas centrais nessa narrativa. A primeira é a discussio sobre a modernidade Harvey (2015) critica o poder de persuasio da ideia de ruptura radical da modernidade. A modernidade aparece como o fendmeno de amplitude geogrética que pode ser traduzido, para lembrar Berman (1998), em uma nova experiéncia do tempo e do espago. E essa experiéncia ocorre em um sitio privilegiado (Paris) e em um tempo especifico (século XIX, ‘com énfase nas transformagGes a partir de 1848). Considerando a questo urbana, Harvey (2015, p. 1) identifica as seguintes mutagoes: Antes havia pequenas lojas ao longo de ruas estreitas e tortuosas ou em galerias Depois vieram as imensas lojas de departamento que tomaram conta dos bulevares. Antes havia 0 utopismo e 0 romantismo, depois vieram 0 gerencialismo pratico @ 0 socialism cientifico ‘A segunda caracteristica resulta da valorizagdo da relagdo entre espago-tempo e meméria-paisagem. Essa perspectiva ¢ fundamental na compreensao da tiltima parte do livro Paris, capital da modernidade. Primeiro, a Comuna de Paris, fervendo na planfeie do Sena. Em seguida, 0 processo de construgéo da Basiliea de Saeré-Cocur, na colina de htps:journals.openeciion orgicontins!10942Iang=pt vanr 28/05/2019 Fa hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas thas de Pais, David Harvey @ @ capital da moderidade Montmartre, Sacré-Coeur, para além de local turistico ¢ de celebragéo dos ritos do catolicismo, 6 compreendida como uma espécie de tentativa de reconeiliagéo politica, afinal estima-se que mais de duas dezenas de milhares de communards tenham sido mortos. Sem a guilhotina medieval, optou-se pelo fuzilamento. Uma meméria politica da paisagem da cidade é construfda a partir de Sacré-Coeur. Harvey, de fato, para usar uma expresso conhecida, “parece saber onde os mortos esto enterrados”. Paris mais uma vez ardeu em fogo e brasa. O objetivo da Comuna nao era simples. Ndo se tratava mais de uma oposigdo entre Repiiblica e Monarquia que motivou as barricadas anteriores, Tratava-se, sim, de uma revolucao sem precedentes historicos que pressupds a institucionalizagao de novas formas de produzir e distribuir a riqueza social, além de novas formas de participacao politica. A proposta de autogestio das fabricas e oficinas, da abol trabalho noturno e da suspensio do pagamento de aluguéis, para fixar-se em alguns exemplos, objetivamente, desagradava tanto os segmentos simpatizantes da Monarquia quanto os segmentos burgueses associados & Repiiblica. A modernidade nfo poderia suportar essa experiéncia. A chamada Semana Sangrenta pés fim & primeira tentativa genuina de um governo popular ¢ operdrio, ¢ a paisagem de Paris, mais uma vez, testemunhou tudo isso, Marx, em seu estudo sobre a Comuna de Paris, bem traduziu 0 espfrito da Paris sitiada: Paris de M. Thiers néo era a verdadeira Paris da ‘vil mulido", mas uma Paris fantasma, a Paris dos francfilours, Paris masculina e feminina dos bulovares, a Paris rica, capitalista; a Paris dourada, a Paris ociosa, que agora corria em tropel para Versalhes, Saint-Denis, Rueil e Saint-Germain, com seus lacaios, seus escroques, sua boemia Iiterdria e suas meretrizes. A Paris para qual a guerra civil ndo era endo um divertido passatempo, a que acompannava as batalhas por meio de bindculos, contanto 0s tros de canhdo e jurando por sua prépria honra e a de suas prostitutas que aquele espetdculo era muito melhor do que os que representavam fem Porte-Saint-Martn, (Marx, 1999, p.110).. A terceira caracteristica resulta da preocupagio com a produgio do espago a partir das determinagses do capital. Em Harvey, o capital e o espago nao so nogies abstratas, Em tradigéo que remonta ao livro Os limites do capital (Harvey, 2013), 0 gedgrafo indica como 1s excedentes de capital se movem e organizam o espaco da cidade. A partir de sua agéo totalizante, o capital fragmenta a cidade. A cidade, ela propria, 6 vista como um artefato de consumo. Paris € 0 exemplo do movimento de constante expansio e acomodacio do capital. Todo movimento da construgio civil, movida por obras no solo € no subsolo, absorveu os excedentes de mao de obra e capital, o que reordenou, totalmente, as relagies espaciais na cidade. A ampliagdo das relagdes espaciais na cidade foi proporcional & climinago das barreiras espaciais do antigo modelo de urbanizagio. Decretos, desapropriagdes, remogdes, demoligdes, alargamentos de vias pablicas foram os métodos utilizados para climinar as barreiras espaciais para forjar um novo modelo de urbanizagio patrocinado pelo forte brago do Estado. Essas trés caracterfsticas permitem a compreensio histdrica e geogréfica da totalidade de Paris. Cada fragmento da paisagem urbana (Les Halles, Saneré-Couer, |’ Opera, Place | “Bitoile, Rue de Rivoli, Pére-Lachaise, Muro dos Confederados, Gare de I"Est etc.) € portador, para utilizar a expresso de Santos (1998), de rugosidades que permitem decifrar a totalidade da cidade. Cada evento (barricadas de 1830 e 1848, RestauracZo, TI Repiblica, 18 de Brumério, Exposigio Universal, Semana Sangrenta ete.) & portador de interesses que convergem, de algum modo, para cristalizar no sitio urbano o aspecto da transitoriedade ¢ do conflito. Cada personagem (escritores, pintores, banqueiros, pequenos burgueses, operérios, artesios, militares, comerciantes etc.), por viver nos fragmentos ¢ compartilhar os eventos politicos, desenvolve uma imaginagao politica sobre a capital da modernidade. 0 que Harvey oferece é uma trilha, um caminho, um método para que possamos reunir fragmentos, eventos e personagens em uma totalidade chamada cidade. A paisagem, em Harvey, néo é outra coisa sendo a acumulagio de tempos politicos, san7 2810572019 8 Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade ‘motivo pelo qual o geégrafo alerta a todos que as anélises unidimensionais do fendmeno ‘urbano no permitem uma leitura da totalidade da experiéneia urbana. Consideragées finais Em 1889 ocorreu, em Paris, mais uma Exposigéo Universal. Ao contriio das demais exposigées sediadas pela capital, essa tinha um motivo muito especial: celebrar os 100 anos da Revolugéo Francesa, Para tanto, inaugurou-se, no Campo de Marte, um ‘monumento que ficaria mais conhecido que a propria Revolugao Francesa: uma torre de ferro de mais de trezentos metros de altura. Esse evento nao mereceu a atenco de David Harvey. 0 monumento mais visitado de Paris transformou-se, sem divida, no maior icone da modernidade. Miniaturas desse souvenir parisiense, fabricado na China, so comercializadas na base da torre por migrantes africanos, Se Saneré-Cauer pretendeu uma espécie de reconciliagao com o pasado, a Torre Eiffel, celebrando a técnica e a Reptiblica, ‘mirou em um futuro de alegria e cosmopolitismo. Figura 7 - Panorama da Exposicao Universal de 1889 Fonte: Bibltheque Nationale de France (1888) Festiva. Tranquila. Colorida. A Figura 7, do final do século XIX, apresenta uma Paris totalmente adaptada ao mundo da mercadoria. Benjamin (2006, p. 43) estava certo a0 escrever que as “Exposigdes universais so lugares de peregrinagio ao fetiche da ‘mercadoria”. Mas nada na capital da modernidade pode ser tranquilo. A transitoriedade & ‘uma earacteristica fundante da modernidade. A Bela Epoque apenas prenunciou mais um século de tumultos cujo apice foi a ocupagao nazista. Menos de trés décadas apis Adolf Hitler regozijar-se diante da Torre Eifel e de uma Champs-ilysées deserta, as barricadas de 1968 reviveram uma tradicéo secular. A jovem Torre Biffel testemunhou tudo isso ¢ continua a oferecer uma visio de 360° de Paris. Podemos ver isso de varias formas. Uma & como o proprio turista, registrando, em seu smartfhone, a imagem obliqua da Catedral de Notre-Dame e dos espigées de La Défense, os meandros do Sena ¢ os bulevares ladeados por arvores. Um selfie, propriamente dito, com Paris de testemunha. Podemos, também, tentar remover as camadas da paisagem e perceber que aspectos da Paris medieval e da Paris moderna ainda sobrevivem nessa paisagem hibrida. Um sitio urbano denso em historia e geografia, eujas maiores testemunhas sto Honoré de Balzac, Charles Boudelaire, fimile Zola, Vietor Hugo, Honoré Daumier, Charles Merville, Eugéne Haussmann, htps:journals.openeciion orgicontins!10942Iang=pt sanr 28/05/2019 hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade operiiios e operdrias, cortesas, communards ete. Mas no ha melhor testemunha de toda essa histéria que o Sena, com sua calha magra, transportando, ao longo dos séculos, sedimentos, vinho, madeira, cereais, esgotos ¢ muitos corpos. 0 Sena meandra Paris. seu eterno fleur e testemunha ativa da constragio da meméria politica da capital da modernidade. Bibliografia Amoullet, Balthazar. Paris vers 1530: plan dit "d’Amnoullet", 1906. Dispontvel em: . 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Acesso em: 20 jun. 2035. 1sn7 28/05/2019 hitpslournals.openeciion org/confns!109422ange Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade Hobsbawm, E. A era do capital: 1848-1875, Rio de Janeiro: Paz e'Terra,1988. Hugo, V. Os miseraveis. Edigio Especial, Sio Paulo: Martin Claret, 2014, Hussey, A.A historia seereta de Paris, Barueri: Amarilys, 2011, Jones, C. Paris, biografia de uma cidade. 5, ed. Porto Alegre: L&PM, 2013. Le Goff, J. Por amor as cidades. Sio Paulo: Ed. Unesp,1998. Lefebvre, H.O direito a cidade. Sao Paulo: Documentos, 1969. ‘Marx, K.A guerra civil na Franca. Edigdo Ridendo Castigat Mores. Versio para e-bookbrasil. 1999, Disponivel em: . Acesso em: 20 ago. 2015, ‘Marx, K. 0 18 Brumétio de Luis Bonaparte. Sdo Paulo: Martin Claret, 2008. DOT: 10.9771/gmed.v8i1.17367 ‘Mumford, L.A cultura das cidades, Belo Horizonte: Hatiaia, 1961. ‘Mumford, L.A cidade na histéria, Rénai, P. Paulo. Balzac e a comédia humana. 4. €d. Sao Paulo: Globo, 2012. Santos, M. 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Acesso em: 20 jun. 2015, 43 Para mais esclarecimentos sobre as obras de Honoré de Balzac, bem como detalhes de sua biografia, consultar Balzac e a Comédia humana, de Paulo Rénai (2012) 40s habitantes da provincia, a julgar pelos relatos iniciais em O ventre de Paris, de Exaile Zola, desenvolver uma representagdo bastante negativa de Paris. A representagio da senhora Frangois, ‘camponesa vitiva, que se desloca de Nanterre todos os dias para comercializar seus produtos no Les Halles, é exemplar: “Nunca a senhora Frangois falava de Paris, que nao fosse com ironia e desdiém; ‘ratava-a como se fora uma cidade que ficasse muito longe, e que Ihe pareceria inteiramente ridicula ce desprezivel, em que cla 6 poria os pés & noite” (Zola, 1956, p. 21) 45 Carlos Luis Napoleto foi eleito pelo voto, inaugurando a II Repiiblica Francesa, em 1848. Em 1851, ‘mpedido de eandidatar-se em nova eleigio em virtude das normas constitucionais, protagoniza um golpe de Estado, transformando-se no Imperador Napoledo III. Eo fim da Il Repiblicae inicio do IL TImpério, que dura até 1870, quando se inicia a III Repiblica. A andlise das circunstancias politicas do golpe a partir dos pactos entre burguesia e campesinato em detrimento dos interesses do proletariado, além dos aspectos ligados ao culto da tradigao relacionados ao personalismo de Napoleio TIT foram objeto de estudo de K. Marx, em 0 18 Brumdrio de Luis Bonaparte (Mars, 2008), Indice das ilustragées Titulo Figura 1 - Extensdo da area construida © as muralhas de Paris, oe Fonte: Brés & Sanjuan (2072) URL. hitp:joumals.openedition org/confinsidocannexe/image/10942/img-1 png Ficheiro image/png, 13M || Titulo Figura 2 Evolupao da populagao de Paris Créditos Fonte: Dados organizados pelo autor a partir de Combeau (2011), URI hiipsjournals.openedition orgiconfins/docannexerimage/10942/img-2,9n9 s6n7 28/05/2019 Nas trihas de Paris, David Harvey &a capital ds modemidade Ficheiro image/png, 17k ‘Titulo Figura 3 - Margens do rio Biévre nas ruas Gobelins e Pont-aux-Biches, Paris PERMELE créctiton Forte: Mani som data Disponve em: URL, _hitpsoumals.openedition orgiconfinsidocannexelimage/10342/img-3.pn9 Ficheiro imageipng, 14M 1 Figura 4 - Vista do Pére-Lachaise. A esquerda, monumente do General Titulo Foy, 1829 Créditos Fonte: Biblothéque Nationale de France (B) URI hitipsjourais.openedition orgiconfinsidocannexerimage/10942/img-4,n9 Ficheiro image/png, 2,3M ul Figura 6 - Principals inlusBes no sistema vidio na gosto Haussmann, ‘Titul entre 1854 @ 1870. Fonte: Figura redesenhada e reformulada, com inclusées de pontos Créditos marcantes, a partir de base extraida de: https:/reggiewang.wordpress.com. URL, _hitpsjoumals.openedition orgiconfinsidocannexerimage/10942/img-5 Jpg Ficheiro imagejipea, 5,6 ‘Titulo Figura 7 - Panorama da Exposigéo Universal de 1889 Créditos Fonte: Biblothéque Nationale de France (1889) hitp:sjourals.openedition org/confins/docannexe/image/10942/img-6 jpg imagelpeg, 371% Para citar este artigo Reforéncia eletrénica ‘Tadeu Alencar Arrais, « Nas trihas de Paris, David Harvey e a capital da modemidade », Confins [Online], 27 |2016, posto ontine no dia 19 julho 2016, consultado 0 28 maio 2019. URL hitp:ljoumals.openediton orgiconfins/10942 ; DO! : *0.4000/confins. 10842 Autor Tadou Alencar Arrais UFG, Universidade Federal de Goids, tadeuarraisufg@gmail.com Direitos de autor @OS0) Confns = Rowe franco-bréslenne de géograhie est mis 8 dsposton selon es termes de la licence Creative Commons Attribution - Pas d'Utlisation Commerciale - Partage dans les MEmes Conditions 4.0 Intemational This site uses cookies and collects personal data. For further information, please read our Privacy Policy (updated on June 25, 2018). By continuing to browse this website, you accept the use of cookies. Close hitpsliournals.openeciion org/confns!109422Iange wir

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