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TERESINA
2020
GIZELI DA CONCEIÇÃO LIMA
TERESINA
2020
GIZELI DA CONCEIÇÃO LIMA
Aprovado em ____/____/______
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________________
Prof. Dr. José Petrúcio, de Farias Junior – UFPI
Presidente
______________________________________________________
Prof. Dra. Ana Lívia Bomfim Vieira- UEMA
Membro Externo
_______________________________________________________
Prof. Dra. Cláudia Cristina da Silva Fontineles – UFPI
Membro Interno
_______________________________________________________
Prof. Dr. Gleison da Costa Monteiro – UFPI
Membro Interno (Suplente)
TERESINA
2020
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por ser TUDO para mim. Agradeço por seu
amor, por sua ajuda, pelas vezes em que as provações me consumiram. O seu amor e
sabedoria me ajudaram a manter a calma, fazendo com que eu não perdesse a esperança
em um futuro melhor. Agradeço ao Espirito Santo por me guiar nos momentos de
indecisão me levando sempre pelo caminho que eu deveria andar e me protegendo de
todo o mal. Toda honra e glória seja dada a Deus por essa conquista.
Em segundo lugar, agradeço meu pai Joaquim Antônio de Lima e a minha mãe
Josefa Júlia de Araújo Lima pela vida, educação, amor e carinho com que fui criada e
por aceitarem de livre e espontânea vontade abrir mão de seus sonhos para que eu
tivesse a oportunidade de realizar os meus. Agradeço pelo apoio que me deram desde
quando eu passei no vestibular, por cada sacrifício que eu vi ambos fazerem para que eu
somente estudasse e fizesse o curso de História com qualidade. Também sou grata por
tudo que fizeram por mim ao longo da seleção para o mestrado e principalmente pelos
sacrifícios que tiveram de fazer para que não me faltasse nada quando vim morar aqui
em Teresina após ser aprovada no PPGHB. Agradeço pelas orações que vocês fizeram
por mim todas as vezes que eu tinha que tomar alguma decisão importante. Agradeço a
Deus por vocês existirem e pela honra que é ser filha de vocês dois. Essa conquista é
nossa, pois eu não conseguiria sem a dedicação, o apoio, o amor e a confiança que foi
depositado em mim.
Agradeço aos meus irmãos Gilson e Gilberto por toda a ajuda, pelo apoio e
compreensão que tiveram comigo ao longo desse percurso. Agradeço também as minhas
cunhadas Cíntia e Ana Lisnete pelo apoio incondicional. Aos meus sobrinhos
Cindyellen, Leandro, Rafael, Ana Beatriz e Alana por existirem em minha vida, assim
como as minhas afilhadas Luciane e Valentina. Amo todos vocês, meus pequenos, e
agradeço a Deus por cada um que ele me deu. E já que estou agradecendo aos irmãos,
compartilho a gratidão aos meus amigos-irmãos Gilciene, Remédios, Gildênia, Antônio
Santiago, Ari Mendes, Aylon e Erivaldo. Aos amigos que dividiram essa etapa do
mestrado comigo: Simoní, Lanna, Júlio Eduardo, Anderson Miúra, Kelyel, Jackson,
Joaquim, Thiago, Viviam, Kezia, Júlio Cezar, Thayse, Yasmin, Mariele, Daniela,
Elisnauro, Rafaela, Débora, Jardiane, Lincoln e João de Deus.
Aos meus amigos do Flat Nazareth Noleto: Márcio Carlomagno, Marli, Milena,
Rose, Raquel, Tom, Lívia, Maírton, Sunamita, Sanya, Wesley e Stefany por toda ajuda
prestada, pela torcida, pelas boas vibrações e pela demonstração de felicidade ao ver dar
certo cada etapa do mestrado.
Agradeço também a todos que fazem parte do grupo de oração Filhos de Abraão
do Shalom de Teresina: Denise, Neto, Luana, Raíssa, Melissa, Mariana, Niedja, Thalita,
Mércia, Mikaele, Gorethe e a todos os amigos em geral.
Aos meus avós paternos Antônio e Francisca, a minha avó Antônia (In
memoriam) e aos meus avós maternos João José e Júlia Helena de Araújo (In
memoriam) por todo amor, apoio e compreensão. A todos os meus queridos tios e
primos que foram sempre presentes na minha caminhada, em especial a Lusineide
(Lulu), Rosimar, tio Manoel e Marielsom por abraçarem a causa e me incentivarem
todas as vezes que precisei.
INTRODUÇÃO
se explica, a nosso ver, porque o currículo adotado nas escolas secundárias brasileiras
baseava-se em manuais didáticos das nações europeias, em especial da França. A
História do Brasil ainda começava a ser construída pelos membros do Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) com o propósito de produzir uma história
nacional validada pelo governo imperial.
De acordo com Guarinello (2018) nós fomos educados sob a ótica eurocêntrica
no que se refere ao estudo das sociedades antigas. Por esse motivo nos enxergamos
como ocidentais, obtendo mais familiaridade com Egito, Mesopotâmia, Grécia, Roma
com os povos de Israel. Os demais povos da antiguidade nos parecem distantes por não
fazerem parte cotidiano do nosso ensino brasileiro. Isso ocorre porque no século XIX,
período de criação da identidade nacional, houve em grande medida, um discurso que
forjava um ideal de pertencimento ao Ocidente deixando de lado as demais civilizações.
Por isso, julgamos oportuno dialogar com outros pesquisadores, que nos
auxiliaram a compreender de que modo a Antiguidade foi instrumentalizada por
escritores ligados ao IHGB para satisfazer interesses e objetivos políticos,
contemporâneos da escrita dos compêndios escolares. Esses pesquisadores são
elencados de acordo com cada seção aqui apresentada, onde é possível perceber sua
importância para o desenvolvimento dessa dissertação.
Segundo Hecko (2013, p. 144), a relação entre um passado distante, (re) significado
na vida prática das pessoas, permeia os elementos mais diversos do cotidiano, como a
literatura, a arte, a arquitetura, os jogos eletrônicos, o misticismo, desenhos animados, o
cinema, música, histórias em quadrinhos, museus, a propaganda, joias e a indústria da
estética.
1
Ver Hecko, 2013, p. 145-146.
23
No primeiro exemplo, ele se utiliza do mito para promover uma releitura sobre o
papel da mulher na sociedade grega, onde este tema pode ser problematizado diante das
atuais discussões de gênero ou feminismo. Aqui também a própria cultura grega e sua
mitologia são objetos em evidência, os quais permeiam a própria história da arte,
riquíssima em releituras. O autor nos diz que ainda poderiam ser declinadas outras
formas de usos, ampliando os horizontes. Não basta que trouxessem à memória uma
tradição que fala do legado de um passado grego onde aparecem formas de herança
cultural no âmbito da literatura, política, filosofia, direito, arquitetura e linguagem, mas
também aspectos da religião, que chamam atenção ainda hoje de todos que voltam seu
olhar para os gregos antigos.
No que se refere ao último exemplo, Hecko nos diz que a imagem de grandeza
do Império Romano, assim como de seus líderes, tem como finalidade demonstrar a
ideia do poder nessa sociedade, mostrando uma espécie de modelo de líder de estado a
ser seguido. Para o autor, há também outros itens sobre Roma Antiga que ecoam em
usos contemporâneos no âmbito do Direito, da literatura, da política, da sexualidade e
da linguagem. Eles trazem à tona um passado distante tornando-o, de certa forma,
presente e atuante na vida prática das pessoas, sendo de grande valia como objetos de
estudos e problematizador do ensino da História Antiga (HECKO, 2013, p. 148-149).
O melhor ponto de partida parece ser aquele que, na vida corrente, surge
como consciência histórica ou pensamento histórico (no âmbito do qual o que
chamamos ‘história’ constitui-se como ciência). Esse ponto de partida
2
Ver Hecko, 2013, p. 147-149.
24
Isso tudo nos permite refletir sobre o nosso objeto de pesquisa, que gira em torno
da análise dos conteúdos sobre a Grécia antiga nos compêndios de História Universal.
Esse conhecimento possibilita entender a configuração da História escolar que será
analisada em nossa pesquisa. Seguindo o pensamento de Rüsen (2013) , destacamos
também a importância da narrativa no referido processo de nossa pesquisa. O autor nos
diz que:
Para o autor, devemos dar sentido à nossa pesquisa através do nosso itinerário de
análise documental, considerando dois aspectos fundamentais: de um lado, o exame
crítico dos conteúdos dos discursos, os quais se apoiam em uma versão
instrumentalizada da História Antiga que atende, a nosso ver, a objetivos e interesses
particulares do momento da escrita; e, de outro, os artifícios retóricos a partir dos quais
elucidamos de que maneira os conteúdos de História Antiga se relacionam com os
projetos políticos de Nação que se forjavam no início do século XIX – a despeito das
27
Os problemas enfrentados por estudiosos que desejam se envolver mais com tais
recepções disfarçadas levam a importantes escolhas teóricas e metodológicas. Entender
a teoria da recepção é importante por nos permitir perceber que todas as vezes em que
os textos clássicos são lidos, eles são recebidos e reinterpretados de uma nova maneira,
ou seja, eles são lidos de maneira diferenciada por cada autor, tendo em vista suas
influências culturais e categorias de pensamento que se conectam ao espaço e tempo em
que o sujeito histórico está inserido.
Nesse sentido, reconhecemos que a releitura dos textos antigos por Justiniano
Jose da Rocha, Pedro Parley e Victor Duruy passam por ‘filtros de leitura’ que
delineiam a singularidade de seu olhar sobre o passado, tendo em vista as influências
político-culturais do presente deles. É por meio de seu campo de experiências que os
autores projetam suas reflexões sobre a Grécia Antiga e sua escolha sobre os conteúdos
a receberem destaque ou não.
Nesse caso, para fazer uma análise coerente acerca da escrita da História Antiga
nos compêndios de História Universal de Justiniano Jose Rocha (1860), Pedro Parley
(1869) e Victor Duruy (1865), sobretudo no que se refere ao conteúdo destinado à
Grécia Antiga, é importante reconhecermos essa singularidade advinda de cada autor ao
escrever sua obra, assim como também atentarmos para os tradutores dessas obras para
a língua pátria. Dessa forma podemos perceber os interesses por trás dos conteúdos
considerados de maior destaque por nossas fontes em detrimento de outros que são
negligenciados, como no caso o conteúdo referente à democracia ateniense.
31
3
O Groupement de recherche et d’études pour la civilisation européenne (agrupamento de pesquisa e
estudos para a civilização europeia) é também conhecido pela denominação midiática Novelle Droite. E,
é na visão de seus fundadores, uma sociedade de pensamento com vocação intelectual, que foi fundada
em 1969 e seus membros são ligados nacionalismo europeu.
4
A Front National é um partido político francês de extrema direita e de caráter protecionista, conservador
e nacionalista que foi fundado em 1972 com o intuito de unificar correntes nacionalistas da época.
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De acordo com o autor, os estudos sobre o presente, que tiveram como escopo o
mundo antigo, evidenciaram e evidenciam um caráter marcadamente discursivo a
respeito da Antiguidade, que, por vezes, foi inventada para atender aos interesses
daqueles que reivindicavam certa herança antiga, os seus beneficiários.
papel nos jogos políticos. Isso em parte pelo lugar privilegiado que os estudos do
mundo antigo ocupam nas sociedades ocidentais, de modo geral, mas, também, devido
às possibilidades de paralelos que a História da Antiguidade pôde e pode oferecer às
sociedades modernas, hoje.
Silva (2005) propõe uma reflexão acerca do papel do passado nos jogos de
estratégias e afirmações indentitárias, à medida que percebe os estudos sobre
antiguidade muito próxima das representações coletivas na contemporaneidade. Com
isso, o autor nos possibilita refletir sobre essa relação entre antiguidade e
contemporaneidade ao estabelecer algumas considerações teóricas acerca das relações
existentes entre a antiguidade e o mundo moderno, entre o passado e o presente na
escrita do Mundo Antigo.
Em sua obra o autor traz como exemplo o Império Romano, que muitas vezes é
trabalhado com o objetivo de construir um ideal de pertencimento a um determinado
território ou nação. Ao se referir ao Império Romano, o autor nos mostra que:
para questionar a ideia de neutralidade dos estudos do mundo Antigo, noção muitas
vezes reforçada pela distância temporal entre Modernidade e Antiguidade. Ao retirar os
estudos clássicos da “torre de observação” e de seu suposto isolamento, o autor nos
mostra como esse pretenso afastamento é uma atitude política, pois os estudos clássicos
nunca foram isentos dos momentos históricos nos quais foram produzidos, constituindo,
portanto, parte de discursos de dominação.
Ao refletirmos sobre essa questão, podemos dizer que este pensamento nos ajuda
em nosso estudo, pois nos permite compreender a exaltação de alguns conteúdos de
História Antiga e os critérios para a seleção destes conteúdos escolares que compunham
os compêndios de História Universal para a educação secundária no Brasil no período
oitocentista. A seleção do conhecimento referente à Antiguidade não é, como se nota,
um procedimento neutro e arbitrário. Pelo contrário, a memória histórica fabricada por
tais narrativas exercem um papel político significativo como instrumento legitimador da
ordem social vigente no interior da qual o passado é domesticado para satisfazer a
interesses e objetivos do presente. De acordo com o autor:
O autor nos faz refletir em que medida o passado clássico pode ser
‘domesticado’ por historiadores contemporâneos a fim de satisfazer interesses e
objetivos de grupos sociais no poder. O estudo destaca a importância das apropriações
do passado clássico na construção de um ideário de nação e de sociedade, onde os
discursos sobre o passado ou suas representações se tornam instrumentos de
fundamentação de práticas políticas por parte de grupos no poder. O estudo das relações
entre a Antiguidade e o mundo contemporâneo, entre o passado e o presente na escrita
da História do mundo antigo tem sido, desde então, objeto de inúmeros estudos, e tem
contribuído para o desenvolvimento de uma História Antiga que se pretende mais
problematizado.
Sendo assim, deve-se destacar o que nos diz Bonfá (2016), quando fala que
consecutivamente no tempo presente utilizamos de conceitos que remetem à
Antiguidade para batizar objetos novos, com o intuito de lhes dar grandeza por meio de
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Sul, entre outras. Por isso asseveramos que a construção da identidade cultural
ocidental, no interior da qual a elite brasileira pretendia figurar no século XIX, fora, em
grande medida, forjada por um discurso que, no âmbito literário, vincular-nos-ia à
chamada “herança clássica” (FARIAS JÚNIOR & LIMA, 2019).
Cabe destacar que, sob a ótica eurocêntrica, a História Antiga nos ocidentaliza,
isto é, insere-nos numa linha do tempo que nos torna, de certa forma, herdeiros da
Grécia, de Roma e do chamado Oriente Próximo, que se tornou um campo de
investigações arqueológicas no transcorrer do século XIX. É com base nesta divisão
tripartite da História Antiga, reproduzida ainda hoje em cursos de graduação e pós-
graduação, que nos tornaríamos sucessores da História Medieval, porquanto a História
do Brasil, particularmente sob a ótica de grande parte dos historiadores do século XIX,
torna-se um ramo da História europeia nos tempos modernos, uma vez que nosso
território foi colonizado pelos portugueses a partir do século XVI (GUARINELLO,
2003).
O homem não foi lançado neste mundo como os animaes que nelle nascem,
pastam, morrem, sem outras preocupações além das do presente, sem outros
cuidados que não os do obedecer aos instinetos materiaes que os pungem.
Ente moral e intelleclual, herda elle todo o passado, procura assenhoreiar-se
pela conjectura de todo o porvir, aprende na sorte dos que o precederam,
procura modificar a condição dos que lhe suecederem. Nos poucos dias que
tem de passar neste valle de expiação, o homem como que vive tríplice vida,
a dos tempos que são, a dos que foram, a dos que hão de ser, e nessa tríplice
vida absorta a sua individualidade, desapparece elle homem; substitue-se-lhe
a humanidade. E' essa a nossa condição gloriosa; na familia, na nação, nos
impulsos do nosso coração, nas aspirações de nossa intelligencia, achamos
essa lei, aprendêmol-a, applicamol-a, e por isso a historia da humanidade tão
activamente desperta a nossa curiosidade, preoecupa a nossa attenção. Nesse
pó das gerações que foram, queremos saber dos seus erros, dos seus
soffrimenlos, de suas virtudes, de suas glorias; é patrimônio nosso a que não
renunciamos; se lhe renunciássemos, não seriamos homens (ROCHA, 1860,
p. 15).
humanidade. Notamos também que o autor, ao tratar da História Antiga, nos diz que ela,
“apesar de seus erros”, oferece guias para o conhecimento da história da humanidade.
Seus sofrimentos, suas virtudes e suas glórias são legados aos quais os homens não
devem renunciar.
De certa forma, a própria concepção de História Antiga traz consigo uma visão
europeia da História, apresentada pelo autor num modo de ver a História do ponto de
vista do olhar do europeu que influencia a escrita da história no Brasil. Isso traz uma
visão muito particular da História. O ponto de vista do europeu, nesse caso sobre a
História Antiga, é o que mais se destaca como natural e universal. Para Goody:
sobre a História Antiga, feito nos moldes tradicionalistas, como Histórias separadas
abordadas em sucessão, atuava de forma conjunta para a contemplação e compreensão
dos textos considerados ‘clássicos’ escritos em língua latina e grega. Nas palavras de
Guarinello7, participar dessa cultura ilustre, de difícil aprendizado, legitimava a
superioridade das elites na Europa e no Brasil. Além disso, a construção da memória do
“Ocidente”, comprometida com formação de uma suposta identidade ocidental, serviria
para explicar e justificar o domínio dos países capitalistas sobre os outros países.
A economia (ou sociedade antiga) deve ser entendida como parte de uma
grande cadeia de intercâmbio econômico e político centrada no Mediterrâneo
[...] essa economia não constituiu um tipo puro e distinto como muitos
historiadores europeus pensam; fatos históricos foram adaptados para caber
em um molde teleológico e eurocêntrico (GOODY, 2008, p. 37).
De acordo com Pedro Paulo A. Funari e Renata Senna Garraffoni, o século XIX
é considerado, por muitos pesquisadores, como um século de fundamental importância
no processo de criação de diferentes maneiras para representar a relação do homem com
o passado. Em seu escrito, Funari & Garrafoni (2004) citam como exemplo de análise a
difusão do romance, da pintura histórica e a criação de museus que se constituem como
elementos fundamentais na concepção das identidades nacionais. Além disso, nesse
processo, a História e a Arqueologia desempenharam um importante papel em um
7
Ver GUARINELLO, Norberto Luiz. A História Antiga. 2008 pág. 27.
39
Rocha, Pedro Parley e Victor Duruy sobre o mundo antigo e, de forma mais objetiva,
sobre a democracia ateniense, tomando como ponto de referência os direcionamentos
que os autores nos oferecem e os moldes de escrita que ganhavam cada vez mais espaço
no século XIX.
Buscando refletir sobre esses limites rígidos entre texto, recepção e comunidades
interpretativas, podemos dizer que o nosso estudo se insere no âmbito da investigação
sobre os usos do passado por meio de reflexões que perpassam a noção de textos-fonte
puro e “verdadeiro” através da tradução e adaptação referente ao conteúdo de Grécia
Antiga e, por meio da análise dos discursos presentes/ausentes sobre a democracia
ateniense nos compêndios de História Universal já citados anteriormente, sobre a
relação entre o passado e o presente, o que torna possível interrogar os efeitos e as
fortunas dessa tradição, os modos pelos quais foi recebida, apropriada e reproduzida,
possibilitando um outro olhar sobre os diferentes projetos letrados e políticos.
A disciplina escolar passou a ser entendida como uma ciência fundamental para
o desenvolvimento de qualquer nação e de seu corpo de cidadãos. Mas, essencialmente
voltada para a análise das ações coletivas, essa “ciência do passado” apresentava uma
conotação muito específica e particular, pois deveria evidenciar, num sentido
marcadamente positivista, o conjunto de “verdades” ou “leis” universais, imutáveis e
indiscutíveis presentes no desenvolvimento político, econômico e social de cada
civilização do passado. Essas “leis históricas”, consolidadas ao longo da trajetória
histórica de cada civilização, eram entendidas como marcas indeléveis de cada povo e
inquestionáveis fontes de ensinamentos que, geralmente, edificaram e deveriam
continuar edificando todo o mundo ocidental contemporâneo (TAVARES, 2012).
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Em outras palavras, havia a convicção de que o passado era regido por leis e
movimentos civilizatórios amplos, que acabariam por definir, ao longo dos séculos, as
particularidades do mundo ocidental. Dessa forma, segundo Tavares (2012), não
devemos perceber a produção do conhecimento histórico dessa conjuntura como um
mero registro do que aconteceu no passado, mas sim como uma disciplina (ou ciência)
que contraiu um elevado grau de instrumentalização, adaptada e subordinada aos
interesses e anseios de seus idealizadores, permeada pelas ressignificações do passado e,
muitas vezes, corroborada na crença de que os documentos e fontes textuais eram uma
mera transparência do passado, um meio de acesso direto aos acontecimentos e
personagens escolhidos e estudados. Nas palavras do autor:
Dentro desse léxico, a busca das “leis do passado” deveria indicar o caminho
para o “progresso” e para a “modernidade”, fundamentos e conceitos
formadores da pedagogia iluminista e do conceito de desenvolvimento social
positivista de “civilização”. Essa forma de se entender a função e o papel da
ciência/disciplina História acabou condicionando toda a produção histórica
do período, em especial a elaboração dos textos históricos didáticos, e
provocou a formação e propagação de uma “História da Civilização” nos
compêndios didáticos que tinha como objetivo principal a demonstração da
existência de processos históricos de longo prazo que resultaram, segundo
seus autores, nos estágios contemporâneos de “atraso” ou de “modernidade”
apresentados por certos países ocidentais (TAVARES, 2012, p. 49).
auxilia a compreender melhor o nosso objeto de investigação. Sobre essa questão a obra
de Cortez & Souza (2004) nos ajuda em nossa reflexão sobre o ensino brasileiro no
século XIX quando nos diz:
É possível perceber que a escola brasileira moderna deveria ser espelhada nas
civilizações que fossem consideradas desenvolvidas e detentoras de riqueza, de onde
tomamos como exemplo as civilizações europeias. O ensino secundário do país nos
oitocentos, que era predominantemente voltado para a elite, estava comprometido com a
formação de uma elite letrada cuja característica distintiva versava sobre uma formação
humanística inicialmente nos moldes do modelo francês, que concebia a Europa como
referência ao processo civilizacional.
Nesse caso, para nós, compreender qual o papel da história antiga e como ela era
ressignificada na construção desse ideário de nação e de sociedade, nos permite um
melhor entendimento sobre como eram construídos os compêndios escolares que
deveriam ser utilizados por alunos que em seguida se tornariam a massa pensante do
país, apta a galgar cargos públicos do Estado.
O mundo antigo era ressignificado por esses autores que traziam a singularidade
de seu olhar sobre as fontes antigas e a relação existente entre o passado e o que se
pretende deixar como memória sobre a antiguidade para o presente. Isso nos faz
perceber que a escrita sobre Grécia Antiga é marcada por discursos referentes a
45
Para aprimorar nossa discussão sobre a escrita da História Antiga no século XIX
e seus usos e interpretações pelos historiadores do período, em grande medida membros
do IHGB, precisamos trazer à tona pontos considerados importantes para entender como
a escrita da história Antiga no Brasil nos oitocentos era construída e legitimada por um
grupo de letrados pertencentes ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro que tinham
como função recriar um passado glorioso para a nação e buscar no mundo antigo o
escopo necessário para validar suas predileções.
Perceber como era concebida a escrita da história do Brasil nos oitocentos, nos
faz refletir sobre a construção dessa narrativa realizada por autores que traziam em seus
textos uma escrita que tinha como base de análise os modelos Positivistas e
Historicistas. O modelo positivista que nasceu na França, no século XIX, deriva do
pensamento Iluminista francês e tem como principal fundador Auguste Comte. É uma
corrente filosófica inspirada no ideal de progresso contínuo da humanidade.
Nesse sentido, para os historiadores dos oitocentos, que tinham como base de
seu pensamento os escritos dos historiadores europeus, tomar como base estes ideais
8
Ver PAYEN, Pascal. Conquête et influences culturelles. Écrire l'histoire de l'époque hellénistique au
XIXe siècle (Allemagne, Angleterre, France), Dialogues d'histoire ancienne 2008/1 (34/1), p. 105-131.
9
Nós antigos e modernos, pensamos a escrita da história sobre a conquista, sua natureza, seu tamanho,
seus meios, suas consequências como constituidores de um problema histórico sobre o qual o historiador,
como vemos em Heródoto, se compromete e fala na primeira pessoa. Essa tradição historiográfica,
iniciada na antiguidade, por Políbio, Tito-Livo, Arriano, não desaparece quando a história é construída e
pensada como ciência na Europa do século XIX. (PAYEN, 2008, p.106 - tradução livre).
48
Para o Wehling (1992), essa interação entre a prática e a pesquisa baseia-se cada
vez mais no suposto epistemológico que define o objeto histórico como o fenômeno e
não mais o fato; o método histórico como equação do problema e não mais a
formulação da lei; e o produto como sendo o conceito e não mais a descrição. Portanto,
compreender como eram produzidas as narrativas históricas ao longo do século XIX se
faz importante por nos ajudar a entender os discursos, a formação e as possíveis
intencionalidades da escrita da história nacional aos moldes do IHGB, o que nos
permite obter reflexões sobre o nosso próprio ato do fazer histográfico.
Nesse caso, ao buscarmos entender a escrita da história no século XIX, isso nos
dará luz para compreender como a democracia ateniense era abordada nos compêndios
escolares do ensino secundário adotados no Brasil, no período Imperial brasileiro, em
concomitância com as implicações para a construção de novas representações da
50
memória nacional para a formação de uma elite intelectual que se preparava, por
intermédio dos cursos secundários, para assumir cargos na burocracia do Estado,
investigando, assim, de que maneira os autores de manuais didáticos utilizados no
Brasil, reproduziam como verdade histórica, isto é, como restituição do passado clássico
como um produto da manipulação de acontecimentos históricos com a finalidade de
referendar determinados posicionamentos político-culturais que atendessem às
necessidades do regime Imperial. Isso promove então o que Wehling coloca como uma
interação entre a teoria e a prática de pesquisa.
Ainda de acordo com Oliveira (2010), não seria fortuito que, no Brasil
oitocentista, os homens de letras e de ciência compartilhassem os espaços institucionais
51
Realizava-se, nesse sentido, uma história oficial, patrocinada pelo poder político
e fiel a ele. Durante a fase imperial da história do Brasil, especialmente no que tange ao
II Reinado, a historiografia que começava a ser produzida era aquela vinculada,
portanto, ao IHGB, responsável por criar um passado histórico para o jovem país. “Não
deixar mais ao gênio especulador dos estrangeiros a tarefa de escrever nossa história
(...)” (JUNIOR, 2010, p. 38), eis nas palavras de Januário da Cunha Barbosa a meta
dessa instituição, que pretendia estabelecer uma cronologia contínua e única, como
parte da empresa que visava à própria fundação da nacionalidade.
Nesse sentido, é importante ter como fator em destaque as decisões políticas que
fizeram do segundo reinado ambiente propício para a implementação do órgão dedicado
à história e à memória nacional. No que se refere a geografia nacional assim como a
singularidade existente em cada território percebemos na narrativa do IHGB uma
predileção aos estados considerados mais desenvolvidos para as atividades econômicas.
Ao olharmos economia, as botânicas entre outros campos do conhecimento, que estão
presentes na construção da história do Brasil, encontraram um discurso que visa
demonstrar as riquezas das terras brasileiras a fim de valorizar o território e dar ao povo
uma visão de unidade e de pertencimento ao território nacional.
Nesse caso, o acesso a esse ensino atenderia aos interesses de uma classe social
que pregava o desenvolvimento da cultura letrada e a perpetuação de sua linhagem no
poder. Preparando os filhos das elites para um possível aprimoramento das relações
sociais, em que um grupo político estava sendo preparado para ocupar não somente as
vagas do IHGB, mas também os cargos públicos do Estado. Fato que nos leva a
perceber o que já foi mencionado anteriormente, que as relações existentes entre os
sócios fundadores do IHGB e os representantes do Governo Imperial eram mantidas, até
certo ponto, mediante interesses políticos, já que o fragmento a seguir nos mostra que:
Para isso, foram implementados modelos de projeto de nação que tinham como
finalidade elencar ao ensino da história nacional uma literatura que descrevesse a beleza
da fauna, flora e recursos naturais existentes em solo brasileiro. Dito de outro modo, era
preciso criar um ideário de valorização do território brasileiro afim de,
consequentemente, construir um ideário de pertencimento que passasse uma retórica da
nacionalidade operando no sentido de convencer os brasileiros de que compartilhavam
um passado em comum, com o qual podiam se identificar.
A escrita da história brasileira teria como base o modelo de escrita europeu, mas
seria construída a partir de um movimento muito próprio ao caso brasileiro onde não se
pretendia estabelecer uma oposição entre a antiga metrópole portuguesa e a nação
brasileira. No âmbito da escrita da história oitocentista, notamos que os historiadores
em geral esforçavam-se por apresentar a civilização brasileira como continuadora da
tarefa civilizadora iniciada pela coroa portuguesa. Para isso, o império brasileiro
mobilizaria de forma habilidosa o IHGB e alguns outros setores brasileiros que se
57
Podemos perceber que para esse novo projeto de governo era necessária, de
acordo com o interesse do governo Imperial, a criação de uma identidade nacional que
fosse ao encontro do interesse da elite brasileira. O que se pretendia fazer era uma
História do Brasil que exaltasse os grandes feitos pela coroa portuguesa no processo
“civilizacional” do país. Da mesma forma deveria ser criado um projeto de nação que
atendesse às demandas políticas que permeavam em torno desse período.
Esse trabalho muitas vezes era feito por historiadores que viajavam pelo
território nacional e relatavam os achados de suas viagens. Esses achados poderiam se
referir a fauna, flora, geografia e até mesmo aos povos que habitavam os diferentes
estados nacionais. A escrita da história brasileira feita através dos relatos dos viajantes
ganha um perfil aos moldes do IHGB de um modelo de fazer história que utiliza como
método de narrativa uma escrita da história feita de maneira mais geral, que detalha as
particularidades do território, mas que busca unificar esses territórios.
Isto é, o modelo de escrita da história feito através dos relatos dos viajantes e dos
membros do IHGB apresenta o território nacional de maneira mais abrangente com a
finalidade de produzir conhecimento sobre diversos campos do território, sem perder a
totalidade do conjunto, o que ocorrerá também com a escrita sobre a antiguidade.
espaços de poder e seus ocupantes tinham um determinado papel a cumprir. Este papel
era fortalecer o poder executivo, manter a estrutura política centralizada, compatibilizar
com a descentralização administrativa e a manutenção da unidade territorial, para
proporcionar dessa forma a manutenção da ordem social interna que era fundamentada
pelo sistema da grande propriedade e pelo sistema escravista como retratado na citação
anterior.
Estes temas que ocasionalmente receberão novas roupagens fazendo com que a
historiografia lance novos olhares sobre a história nacional que influenciará na
construção de uma nova forma de concepção de história do Brasil, trará influência sobre
os pensadores do instituto levando-os a produzir uma nova forma de escrita da história
nacional que ganhará destaque no IHGB e servirá de modelo para os próximos
historiadores do Instituto que produzirão narrativas que darão continuidade a essa nova
forma de concepção da história nacional, ao passo que elevarão as figuras que antes
eram marginalizadas da escrita da história nacional a serem pertencentes agora a esse
ideal de “povo brasileiro” através dos processos de miscigenação. Nas palavras de Jose
Carlos Reis (1998) Capistrano:
Atribuirá a este povo a condição de sujeito de sua própria história, que não
deveria vir mais nem de cima e nem de fora, mas dele próprio. O futuro do
Brasil torna-se tarefa do povo brasileiro e, para melhor vislumbrá-lo,
Capistrano recupera o passado desse povo em suas lutas e vitórias.
Capistrano foi o pioneiro na procura das identidades do povo brasileiro,
contra o português e o Estado Imperial e as elites luso-brasileiras (REIS,
1998, p. 69).
Como podemos perceber no fragmento acima, para Jose Carlos Reis foi com
Capistrano de Abreu que se iniciou uma nova fase na construção da narrativa histórica
brasileira, uma vez que esse autor buscava elevar o povo brasileiro à condição de sujeito
agente na história.
Na obra de Evandro dos Santos (2018) Mattos também abre caminho para nos
fazer refletir sobre o papel da História enquanto ramo de conhecimento humano, o autor
nos possibilita entender o papel determinado pela história quando nos diz que:
Esse modelo de escrita presente na obra de Pedro Parley, deveria ser seguido
para que o país pudesse (ou pelo menos aparentemente) alcançar a tão sonhada
modernidade há algum tempo vivenciada pelas nações europeias. Na educação pública
Brasileira, essa influência dos postulados culturais e políticos franceses e ingleses se faz
sentir com força e intensidade exemplar no período imperial, fato que podemos
constatar principalmente quando se trata do ensino secundário.
Como podemos perceber, o IHGB foi fundado por uma elite vinculada à
monarquia. Os membros, homens letrados, no sentido lato do termo, eram em sua
maioria administradores, burocratas, coronéis, generais, marechais, cônegos, poetas que,
juntos, formavam a elite letrada imperial empenhada na formulação e constituição de
um saber histórico e geográfico sobre o Brasil.
O IHGB era, portanto, a sede dessa elite letrada imperial que procurava dirigir o
país nos domínios intelectual, político e administrativo, revelando assim as suas
pretensões em manter correspondência com instituições semelhantes, nacionais ou
internacionais.
organização do tempo escolar além das preocupações dos gestores públicos com a
escrita da história universal no ensino secundário.
Para Antonio Carlos Ferreira Pinheiro & Cláudia Engler Cury (2004) os gestores
públicos, portanto, tinham um duplo desafio no século dezenove: configurar o Estado
que fora criado a partir de 1822 e inventar um ideal de nação para o território brasileiro.
Na busca por resolver esses desafios a normatização que engendrou a instrução pública
nas províncias foi simultaneamente o processo de instauração da ordem pelo estado
monárquico sobre as localidades. Talvez por isso, a preocupação em criar instituições
educacionais que atendessem aos anseios da formação daqueles que desejassem fazer
seus estudos superiores.
Para isso, os homens públicos e homens das letras, consideravam a escola como
um lugar social privilegiado. A partir da publicação do Ato Adicional de 12 de agosto
1834, ficou determinado que às Províncias caberiam os encargos relativos à instrução
primária e secundária, fato que levou a uma descentralização, que acarretou prejuízos
para a educação popular.
O ingresso nos cursos superiores era a meta visada por todos os jovens que
buscavam os estudos secundários, e o estudo parcelado dos preparatórios exigidos para
a matrícula nas Academias. Criado o Colégio e instituída a organização dos conteúdos
em oito séries, ficou marcante nos programas da instituição o predomínio dos estudos
humanistas clássicos.
setor instrucional bem como atenderiam às demandas dos cargos públicos para a
composição dos quadros administrativos do Estado. Ambos os seguimentos
profissionais também exerciam a atividade de professor, tanto no nível primário quanto
no secundário. Essas questões serão discutidas a seguir quanto tratamos da escrita da
história escolar e das reformas para constituição dessa modalidade de ensino.
65
Para nós entender esses conceitos chave é de grande valia pois nos possibilitam
perceber que as criações das nacionalidades trazem consigo relações de poder que
permitem ao vencedor determinar o que será deixado como modelo para as gerações
vindouras.
De acordo com Junior (2010) uma das principais características que marcou a
história ocidental no século XIX, em termos políticos, foi a questão das nacionalidades.
Para o autor a independência e a fundação do Império implicaram em uma tentativa de
acentuação da ruptura entre a civilização brasileira e a metrópole sem que, no entanto,
isto implicasse na negação de sua matriz europeia. Ao contrário, tratava-se de enfatizar
a qualidade de nossa civilização, por um lado, diante dos padrões europeus e, por outro,
pela demonstração de superioridade em relação aos países vizinhos do subcontinente.
No entanto, quanto ao surgimento das nações, sabemos hoje, que este decorre de
vários elementos. Se, por um lado, exige uma base cultural comum, em geral oferecida
por sociedades com certa semelhança étnica ou religiosa, por outro, depende igualmente
de um esforço de identificação, divulgação e introjeção dessas características
partilhadas, de modo a gerar um sentimento de comunhão entre as pessoas (JUNIOR,
2010, p. 34-35).
educação de homens eruditos que pudessem estar preparados para suas atividades nos
círculos sociais e culturais (MELO, 2015).
Partindo dessa premissa, podemos assim dizer que esse estudo se justifica pela
necessidade de compreendermos os interesses presentes nos discursos nacionalistas
sobre o ideal de civilização a ser preterido para a sociedade brasileira nos oitocentos,
uma vez que esse ideário de Brasil seria construído e fixado na memória nacional
através do ensino e da perpetuação da superioridade da cultura europeia trazida, a nosso
ver, como modelo de civilidade para o território nacional.
No interior desse espaço marcado por uma teia de relações pessoais, outro
aspecto comum se sobressaía: o papel central do Estado e sua vinculação ao círculo
ilustrado imperial. Ao analisar o perfil dos sócios fundadores, notamos que, entre eles,
22 ocupavam posições de destaque na hierarquia interna do Estado. Vários são os casos
que exemplificam tal constatação, a começar pelo primeiro presidente do IHGB, José
Feliciano Fernandes Pinheiro (Visconde de São Leopoldo), que acumulava os cargos de
conselheiro e senador do Estado, ou o cônego Januário da Cunha Barbosa, primeiro
secretário do instituto e um dos responsáveis por sua idealização.
Como esses, outros casos poderiam ser elencados entre os membros do Supremo
Tribunal, procuradores, desembargadores e chefes da Secretaria dos Negócios do
71
Império. Faziam parte dessa lista do Instituto nada menos que dez conselheiros de
estado, seis destes ainda senadores. As marcas de um saber oficial vão estar, portanto,
bastante presentes, a despeito da definição formal do IHGB enquanto “entidade
científico-cultural” (JUNIOR, 2010, p. 37-38).
Nesse processo de criação de saber oficial para o país percebemos que a forma
de se ler e escrever a História do Brasil passa por uma perspectiva europocêntrica, com
Antiguidade Grega, Império Romano, Idade Média e Época Moderno constituindo-se
como passado para a nação brasileira. Isso implica dizer que o passado brasileiro se
tornou europeu, sendo sinônimo de uma população branca e civilizada. Nele não há
lugar para dar destaque a índios e negros. Salvo onde esses dois grupos são tidos como
“não civilizados”, tendo serventia apenas como criados e escravos (CHEVITARESE &
SOUSA, 2008).
mostra que dizer "o que somos" significa também dizer "o que não somos" (2007, p.
81).
A identidade está sempre ligada a uma forte separação entre "nós" e "eles". Essa
demarcação de fronteiras, essa separação e distinção, supõem e, ao mesmo tempo,
afirmam e reafirmam relações de poder. Nas palavras do autor:
Na disputa pela identidade está envolvida uma disputa mais ampla por outros
recursos simbólicos e materiais da sociedade. A afirmação da identidade e a
enunciação da diferença traduzem o desejo dos diferentes grupos sociais,
assimetricamente situados, de garantir o acesso privilegiado aos bens sociais.
A identidade e a diferença estão, pois, em estreita conexão com relações de
poder. O poder de definir a identidade e de marcar a diferença não pode ser
separado das relações mais amplas de poder. A identidade e a diferença não
são, nunca, inocentes (SILVA, 2007, p. 81).
projeto de nação próprio ao caso brasileiro foi sem dúvida um motivo de preocupação
entre os historiadores do século XIX.
Nesse caso, ao tratar do modelo padrão de indivíduo civilizado que estava sendo
pensado para o Brasil, notamos que essa obra se refere não apenas a questão da etiqueta,
mas também diz respeito à moral, à ética, ao valor interno dos indivíduos e aos aspectos
externos que se revelam nas suas relações com os outros.
fundamental da obra de Elias, qual seja, o de apresentar que determinados costumes não
podem ser naturalizados. É preciso compreender que as relações sociais são elaboradas
para e pelos homens, e visam atender às demandas do momento histórico em que estão
vivendo. Nas palavras do autor:
De acordo com a autora a história das boas maneiras está diretamente ligada as
regras de comportamento social. Para ela, essa história envolve não somente a questão
da etiqueta, mas também diz respeito à moral, à ética, ao valor interno dos indivíduos e
aos aspectos externos que se revelam nas suas relações com os outros. Isto é, as regras
78
O conceito de civilização absolveu muito do sentido que lhe era dado na corte no
que se refere a padrão, moral, costumes, tato social, consideração ao próximo, dentre
outros. Nas mãos da classe média em ascensão é aplicada a ideia sobre o que é
necessário para tornar civilizada uma sociedade. O processo de civilização do Estado,
da Constituição, da educação, tudo deveria eliminar o que era considerado bárbaro e
irracional.
educação dos chamados povos civilizados na busca por eliminar os povos que fossem
considerados bárbaros por não seguirem modelo o padrão proposto.
Nesse molde europeu o passado com resquícios bárbaros deve ser esquecido,
dando espaço a uma sociedade mais civilizada. Por isso, na Europa, mesmo nas
sociedades democráticas que se consolidavam, ainda era tão importante refinar as
maneiras e os comportamentos. Refinar as maneiras, controlar gestos, dominar as
pulsões são atitudes diretamente ligadas aos desejos da diferenciação e da distinção
social ainda nas sociedades chamadas igualitárias.
De acordo com a autora as regras de boas maneiras têm como principal função
tornar o homem distinto, elas se referem a um determinado lugar na sociedade. Os
ideais “civilizatórios” serviram de embasamento para o pensamento reformista que
inspirava as grandes metrópoles ao longo do século XIX. A ideologia do mundo
ocidental nesse período estava impregnada de uma crença sincera no progresso um mito
baseado no significado de aperfeiçoamento, principalmente para os elementos das elites
que se beneficiavam diretamente dos efeitos da modernização.
Para isso a sociedade civilizada deveria esquecer os resquícios dos outros povos
considerados como bárbaros. Refinando as maneiras de agir, controlando gestos e
dominando as atitudes diretamente ligadas aos desejos da diferenciação e da distinção
social ainda nas sociedades chamadas igualitárias.
A crença nesse mito atingiu, nessa época, todos sem exceção. Mesmo
políticos radicais, utópicos ou científicos, estavam convencidos de que o
80
Podemos perceber, através do fragmento anterior, que essa nova forma de pensar
que permeava a sociedade do século XIX, que dá destaque a construção de um ideal de
coletividade consciente de seu valor e civilizada, teve suas bases no movimento
Iluminista do século XVIII que trouxe uma ideia de progresso ligada ao
desenvolvimento das sociedades, das ciências, da economia, do progresso.
A autora nos diz que a partir da expansão desses novos modelos civilizatórios
europeus, os manuais de civilidade sofrem o desafio de cumprir sua missão de preservar
a importância dos velhos gestos e ao mesmo tempo se preparar para as novas condições
sociais, políticas e econômicas, principalmente diante de um tempo pós-Revolução
Francesa.
81
Ou seja, é possível perceber, nas palavras da autora, que no final do século XIX
e início do XX, em pleno processo de urbanização e modernização brasileira, a
82
Nesse processo era construído o ideal de Brasil aos moldes da Europa, que
buscava elencar a imagem do colonizador europeu, a um modelo a ser seguido que
influenciaria a sociedade e que estava sendo pensado para o país no período oitocentista.
Deixando de lado os diferentes povos que habitavam o Brasil no período em questão.
Essas escolhas ocasionalmente não deram conta de promover a identificação do povo
brasileiro em sua imagem em quanto povo, sendo necessária a promoção de debates que
versavam sobre novas roupagens para configuração da identidade nacional do país.
Podemos dizer que o estudo da memória coletiva deve ser percebido além de
uma conquista, devemos identificá-lo como um instrumento de poder sobre o qual o
historiador constrói através da oralidade, da escrita, da construção de monumentos e de
documentos considerados “fontes oficiais” o ideal de história de uma determinada
sociedade que deve ser elencado ao conhecimento a ser memorizado, recordado e
perpetuado através do ensino dessa tradição para as futuras gerações.
documento não é inócuo pois ele resulta do esforço das sociedades históricas para impor
ao futuro voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si próprias. No
limite, não existe um documento-verdade, mas sim vestígios deixados intencionalmente
ou não para as novas gerações.
Essas relações de poder é que decidiriam o que deveria ser abordado ou não pela
historiografia no IHGB e simultaneamente nos compêndios utilizados pelo ensino
secundário do país. Atrelados a essas escolhas eram selecionados quais conteúdos
seriam e como seriam abordados, deixando como memória coletiva o discurso do
vencedor e como memória silenciada, os discursos que não iam ao encontro dos
interesses do poder público vigente. Nesse sentido, os esquecimentos e os silêncios da
história são reveladores desses mecanismos de manipulação da memória coletiva.
Assim como também a memória coletiva que deveria ser fixada para garantir os
interesses do governo Imperial brasileiro.
Essa analise nos levou a perceber que a escrita sobre o passado brasileiro é
construída a partir de escolhas que trazem a visão de um passado Ocidental, construído
pela ótica da sociedade europeia, moderna e civilizada, com a qual a monarquia
imperial se sente identificada. Isso consequentemente traz uma visão excludente sobre
determinados territórios existentes na antiguidade, o que resulta em uma escrita da
história do Brasil marcada pela visão do colonizador que apresenta o indivíduo
“civilizado” na concepção Ocidental inferiorizando outras culturas da antiguidade que
dialogavam com esses povos e, por serem negligenciadas, não fazem parte da grade de
ensino do país nos oitocentos como, por exemplo, os povos vindos da Índia, China e
oriundos de determinadas regiões de matizes africanas e do Oriente.
86
Esse recorte é datado de 1854 a 1878 sua escolha se deu por se tratar de um
período de duas importantes reformas no ensino brasileiro sendo elas a reforma de
Couto Ferraz (1854) e Reforma de Leôncio de Carvalho (1878) e tem como justificativa
a necessidade de compreendermos as implicações político-culturais que afetam a escrita
da história escolar no século XIX durante o período dessas duas reformas, bem como o
papel dos estudos clássicos na formação de jovens durante o Segundo Reinado.
A Reforma de Couto Ferraz foi tomada como referência para as reflexões por
três motivos: primeiro por se tratar de um esforço governamental pela
uniformização do ensino secundário em escala nacional, a partir da
organização curricular implantada no Imperial Colégio Pedro II, ou seja, o
currículo de tal unidade escolar passou a ser, em tese, uma espécie de núcleo
irradiador de propostas curriculares às escolas secundárias provinciais;
segundo, pelo controle e vigilância sobre instituições escolares, professores e
produções didáticas, estabelecidos por meio da criação de órgãos e cargos
públicos com tais atribuições; terceiro, por promover o ensino religioso,
segundo a moral cristã, tanto no nível elementar, quanto secundário, o que
estabelece uma relação direta com a escrita da história escolar (FARIAS
JÍNIOR & LIMA, 2019, p. 82).
intitulada O ensino secundário no Império Brasileiro, pelo fato dessa autora tratar em
particular do ensino secundário e nos mostrar que, no caso do ensino secundário, a
equiparação dos liceus provinciais em relação ao Colégio Pedro II passou ser apontada
como um meio indireto de uniformizar os estudos preparatórios ao ensino superior em
todo o país sem ferir os direitos constitucionais das assembleias legislativas das
províncias.
A autora nos diz que no dia 25 de agosto de 1851, Dias de Carvalho, em emenda
ao projeto de reforma de Couto Ferraz que tinha como pretensão reformar o ensino
primário e secundário na corte, buscava promover a criação de um Liceu de externos na
capital do Império e com esse intuito propôs, novamente, o reconhecimento de diplomas
conferidos pelos Liceus provinciais que se equiparassem ao Colégio de Pedro II e ao
internato.
Tomando como referência citação anterior, podemos perceber que mesmo diante
de dificuldades financeiras existiam, dentre as classes políticas, o desejo de criar um
modelo de ensino que fosse destinado a preparação de indivíduos para governar
determinados cargos públicos. Nesse sentido, apresenta-se uma conexão favorável a
reforma proposta por Couto Ferraz e a intenção de alterar e montar um ordenamento
jurídico-político vigente no campo educacional e, ainda, de instaurar uma política mais
centralizadora no campo do ensino.
Com base nisso, é possível identificar que a representação de ensino como força
civilizatória neste regulamento se edifica a partir das relações entre modelos de inspeção
escolar, enquanto mecanismo de controle, conformação e garantia de aplicabilidade dos
anseios de progresso a ser derramado pela nação. Exatamente por isso, o equipamento
privado de ensino, cuja expansão significativa no dezenove era notada pelas
autoridades, teve suas práticas, ações, profissionais, métodos e modelos de ensino,
inscrito nos termos normalizadores desta regulamentação ao lado do sistema público de
ensino como podemos perceber ao longo da obra da autora.
De acordo com Kênia Hilda Moreira (2010) a partir de 1854, quando os exames
preparatórios para o ensino superior passam a ser elaborados de acordo com os
programas do Colégio Pedro II, as demais instituições, colégios provinciais e/ou
particulares, procuraram adequar seus currículos e programas aos do Colégio Pedro II.
Convém salientar que no século XIX, a escrita da História, em geral comprometida com
a construção da história das nações europeias, numa perspectiva genealógica, aludia às
experiências político-culturais das sociedades antigas gregas e romanas como ponto de
partida para compreender o processo civilizacional e o padrão cultural que impulsionou
o Ocidente.
Podemos perceber através da citação anterior, que para suprir a carência dos
livros didáticos no Brasil no início do século XIX, os autores de livros didáticos de
História, vinculados ao Colégio Pedro II e ao IHGB, considerados, nas palavras da
autora, como “homens sábios, capazes de adaptar obras estrangeiras ao público do
ensino secundário, e especialmente, capazes de auxiliar na tarefa de formar alunos
patriotas”, produziram textos sobre os quais eram feitas traduções, adaptações e/ou
compilações de autores estrangeiros.
No que diz respeito à Reforma Couto Ferraz de 1854, também escolhida como
recorte temporal da pesquisa, podemos dizer que através dessa reforma o ensino de
História passou estar presente nas últimas seis séries, sendo os manuais e compêndios
didáticos considerados indispensáveis para o início e desenvolvimento dos estudos no
recém reformulado Ensino Secundário. Dessa forma, o ensino de História na escola
secundária brasileira também foi oficializado com a implantação do Colégio Pedro II,
especificamente com a confecção do seu primeiro plano de estudos em 1838, com
grande destaque para os estudos de História Antiga e da História Romana.
De acordo com Glaydson Jose da silva (2008) a origem, como forma primeira de
identidade e de representação, apresenta sua mais importante característica, a teleologia.
Quando os iluministas do século XVIII e os cientistas historiadores, a partir do século
XIX, perguntam-se pela origem do que eram ou do que era a sua civilização europeia,
imediatamente veem-se impulsionados para o mundo greco-romano, e compreendem a
pureza máxima do que era a origem primeira do uso da razão, o modelo para sua
redenção. Definir uma origem torna-se a definir um modelo ético, um modelo político,
uma raça, uma nação, uma missão e um destino, e, também, o valor dos que não
pertencem a essas definições.
De acordo com Evandro dos Santos (2018) a escrita sobre o mundo antigo nos
mostra que essa influência da história na construção de uma sociedade virtuosa e ideal,
aos moldes da religião judaico-cristã ganhava destaque no ensino das elites brasileiras.
Permitindo assim que aspectos do presente dialogassem constantemente com as
informações e opiniões sobre o passado.
Dessa forma podemos dizer que o conteúdo referente ao estudo sobre a história
da humanidade presente no currículo das disciplinas de história do ensino secundário
trazia de forma clara o pensamento dos autores da época sobre o que seria o ideal de
civilização moderna e avançada a ser preferido para a nação.
Essa visão religiosa sobre o mundo antigo se faz presente na escrita da história
antiga pelos membros do IHGB em território nacional e é bastante difundida nos
95
compêndios escolares que fazem parte do ensino secundário brasileiro. Podemos ver
essa difusão de pensamento também no compêndio de Justiniano Jose da Rocha (1860)
quando autor diz que:
Uma sútil precisão impõe-se aqui. Se a história faz os grandes homens, então
os historiadores que fazem a história (que a "purificam") são os verdadeiros
mestres do jogo. Fazedores da história, eles controlam os destinos dos
grandes homens, ou, dito de outro modo, os vivos controlam os mortos e os
mortos servem aos vivos. Eis uma variação da religião historiadora adotada
96
Nesse sentido, o Historiador imprime sua visão de mundo na escolha dos heróis
e civilizações a serem destacados e também marginalizados na escrita ou
tradução/adaptação de seus compêndios. O que nos permite enxergar de forma mais
clara que a seleção de conteúdos para fazer parte da escrita da história oitocentista feita
pelo IHGB seja sobre o âmbito da história dita nacional ou sobre a história da
antiguidade é intencional e tem a função de legitimar o interesse dessa elite letrada.
L’histoire des manuels et celle des disciplines scolaires sont deux choses
distinctes. Cependant, si certains aspects de l’histoire des manuels scolaires
(ceux qui envisagent cet objet comme un produit commercial, textuel et
imprimé, ou qui concernent sa régulation) n’ont qu’un rapport indirect ou
lointain avec l’histoire des disciplines, l’histoire des manuels scolaires ne
prend tout son sens qu’en s’inscrivant dans le cadre plus large de l’histoire
des disciplines, en particulier si l’on se réfère aux niveaux secondaire et
supérieur de l’enseignement. D’um autre côté, comme l’a fait remarquer
Dominique Julia, l’histoire d’une discipline ne peut certes pas se réduire à
l’analyse de ses contenus à travers les manuels utilisés pour son
enseignement, mais ne peut non plus se passer de cette analyse et de celle du
matériel pédagogique mis en oeuvre. Ces deux remarques préalables ont une
importance particulière compte tenu du nombre de travaux qui abordent
l’histoire des disciplines scolaires à travers leurs manuels (par exemple, ceux
qui ont été produits dans la mouvance du projet MANES, ou les études sur
l’enseignement de l’histoire analysées par R. Valls), alors qu’il conviendrait
d’insérer ces travaux dans le cadre de l’histoire des disciplines et qu’il serait
certainement préférable, au lieu de continuer à analyser les disciplines
10
Ver VIÑAO, Antonio. Les disciplines scolaires dans l’historiographie européenne. Angleterre, France,
Espagne, Histoire de l’éducation [En ligne], 125 | 2010, mis em lignele 01 janvier 2014.
99
A história dos livros didáticos e das disciplinas escolares são duas coisas que se
diferem. Contudo, de acordo ele, se por um lado, certos aspectos da história dos livros
didáticos que consideram esse objeto como um produto comercial, textual e impresso,
dizendo respeito a sua regulamentação tem apenas uma relação indireta ou distante com
a história das disciplinas. Por outro lado, a história dos livros didáticos mercê destaque
não apenas no contexto mais amplo da história do assunto, mas principalmente quando
se refere aos níveis de ensino secundário e superior. E, é sobre este assunto que tratamos
nesse momento.
Ao longo dos debates anteriores em nossa narrativa, nosso escrito teve como
principal finalidade propor uma reflexão sobre os usos do passado na construção do
saber escolar levando em consideração os estudos de história e historiografia no Brasil
entre os anos de 1850-1870 e sua contribuição para a criação de um ideário nacional em
território brasileiro.
Essa reflexão foi necessária para que pudéssemos dar início a nossa investigação
que tem como pretensão desenvolver uma análise sobre a escrita da história escolar no
século XIX. Propomos uma narrativa que versa sobre a tentativa de responder a algumas
questões, como por exemplo: o papel do livro didático como fonte de pesquisa histórica
11
A história dos livros didáticos e das disciplinas escolares são duas coisas distintas. No entanto, se por
um lado, certos aspectos da história dos livros didáticos (aqueles que consideram esse objeto como um
produto comercial, textual e impresso, ou que dizem respeito a sua regulamentação) tem apenas uma
relação indireta ou distante com a história das disciplinas, por outro, a história dos livros didáticos é
significativa não apenas no contexto mais amplo da história do assunto, mas principalmente quando se
refere aos níveis de ensino secundário e superior (VIÑAO, 2014, p.85- tradução livre).
100
No que diz respeito ao uso do livro didático como fonte histórica, recorremos à
obra História dos livros e das edições didáticas sobre o estado da arte do autor Alain
Choppin (2004) que nos mostra que os livros didáticos e seus conteúdos estão ganhando
cada vez mais espaço nas pesquisas ao longo do tempo. De acordo com o autor os livros
didáticos assumem conjuntamente ou não, quatro funções essenciais que podem variar
de acordo com o ambiente sociocultural, os níveis de ensino, à época, os métodos de
ensino e as formas de utilização, sendo elas: a função referencial, a função instrumental,
a função ideológica e cultural e a função documental.
Aos termos contato com as quatro funções existentes atribuídas ao livro didático
na obra de Choppin (2004) podemos refletir sobre as funções exercidas pelo livro
didático como ferramenta de legitimação de poder existente, em que o livro didático
seria utilizado como instrumento de modelo de civilização a ser seguido no que se refere
a escolha dos conteúdos escolares referente ao estudo de História Antiga. Esta obra
além de nos possibilitar compreender as dificuldades de se trabalhar o livro didático
como fonte pesquisa histórica, também nos remete a refletir sobre as funções que são
exercidas pelo livro didático em quanto difusor do conhecimento.
12
Ver: BITTENCOURT, Circe. Autores e editores de compêndios e livros de leitura (1810-1910).
Educação e Pesquisa, São Paulo, v.30, n.3, p. 475-491, set./dez. 2004.
101
que nos dão suporte teórico para aprofundar nosso trabalho uma vez que a autora, em
sua narrativa nos ajuda a dar luz a nossa investigação na medida em que trabalha a
história do livro didático no processo de constituição do ensino escolar brasileiro no
decorrer do século XIX e primeiros anos do século XX.
Em outras palavras, podemos perceber que o livro didático assim como sua
história somaram-se as inquietações referentes ao saber escolar; refletir sobre seu
pensamento é necessário uma vez que, em nossa pesquisa, trabalhamos os conteúdos
dos compêndios de História Universal. Para a autora, o saber escolar não resulta de um
conhecimento construído no espaço escolar por meio do diálogo entre professores,
alunos e livros didáticos; mas, ao contrário, era concebido como um saber proveniente
do meio acadêmico sintetizado em compêndios, cujos conteúdos deveriam ser
memorizados e reproduzidos em avaliações.
Para Bittencourt (2008, p. 16) o uso permanente do livro a partir das primeiras
escolas do século XIX, integrado ou não aos métodos determinados como tradicionais
de ensino, foi o ponto de partida para análise do livro como fonte histórica. Segundo ela
102
“livro didático foi se constituindo como um problema a ser desvendado de onde surgem
constantes indagações sobre à pratica escolar que temos vivenciado ao longo da
história”. O espaço escolar está intrinsecamente associado à construção do livro
didático, se considerar que a escola é, fundamentalmente uma instituição contraditória,
onde dominação e conflitos sobre a escolha do conteúdo a ser ensinado nas escolas
convivem no cotidiano de alunos e professores desde sua criação pelo Estado Nacional.
apoio para a produção desse tipo de literatura. Tivemos assim, na geração dos
iniciadores da produção didática, figuras próximas ao governo, escritores de obras
literárias, sobretudo os principais encarregados do “fazer científico” da época.
livro didático sempre dependeu do Estado, seja para aprovar ou para comprar as obras, o
que levou as editoras a elegerem autores vinculados ao poder educacional.
Podemos citar como exemplo dessas escolhas nossas fontes de pesquisa, sendo
elas: a obra de Pedro Parley, História Universal resumida para uso das escolas comuns
dos Estados Unidos da América do Norte que é traduzida para uso das escolas do
Império do Brasil pelo desembargador Lourenço José Ribeiro, editada pela Laemmert
por volta de 1857, adotada pela Escola Americana de São Paulo. O compêndio
produzido no Brasil escrito por Justiniano José da Rocha denominado de Compendio de
História Universal – História Antiga, publicado em 1860 e divulgado no 23º catálogo da
B. L. Garnier, em 1866, e também o Compendio de História da idade média, em terceira
edição em 1876, pela livraria Serafim José Alves.
Essa relação entre o lugar de escolha, produção e circulação dos livros didáticos
nos permite refletir sobre as relações de poder que envolviam o saber escolar no século
XIX. Consideramos que o livro didático é um documento que apresenta a maneira como
determinada época pensa o que e como ensinar, além de retratar temas e sujeitos de
maneira singular, o que fundamenta uma versão oficial da História. E é nesse sentido
que objetivamos problematizar as narrativas históricas escolares presentes nos manuais
de ensino de História do século XIX.
Nesse caso, podemos perceber que educação a escolar foi ao longo do século
XIX planejada e acompanhada pelo poder governamental, que passa então a usar de
vários mecanismos que tem como objetivo direcionar e controlar o saber a ser
disseminado. De acordo com Farias Júnior & Lima (2019) o IHGB ganha destaque não
apenas na construção de uma identidade nacional e no contar de sua história, mas
também no ensino dela, por isso sua análise da escrita histórica escolar pode nos
auxiliar a compreender de que modo a Antiguidade foi instrumentalizada por escritores
ligados ao IHGB para satisfazer a interesses e objetivos políticos, subjacentes à escrita
dos compêndios de História Universal.
Em linhas gerais, podemos dizer, a partir da análise dos autores, que, no pós-
independência, o principal objetivo da proposta de ensino secundário brasileiro
continuava a ser a formação das elites dirigentes e a questão predominante da narrativa
histórica em compêndios de História versava sobre a identidade nacional bem como
reflexões sobre a construção da nação brasileira. Dado o exposto, a valorização dos
estudos clássicos, pelo menos até meados da década de 1870 nas escolas secundárias do
Império do Brasil, torna-se a principal característica dos programas de ensino de
106
instrução pública, como pode ser percebido nos programas para o ensino de História no
período em questão, tal como diagnosticados por VECHIA, A e LORENZ, K. M. em
‘Programa de ensino da escola secundária brasileira: 1850- 1951’ (1998). Presentes nas
imagens I e II.
Além disso:
Sobre A obra de Pedro Parley, História Universal resumida para uso das escolas
comuns dos Estados Unidos da América do Norte a autora Circe Bittencourt nos diz que
essa obra foi traduzida para uso das escolas do Império do Brasil pelo desembargador
Lourenço José Ribeiro, editada pela Laemmert por volta de 1857. A obra foi adotada
pela Escola Americana de São Paulo. De acordo com Bittencourt (1993) havia bastante
liberdade no momento das traduções das obras para o português e “o tradutor
transformava o texto de acordo com seus interesses e ideologia”.
Nesse caso, perceber essa ligação entre os autores escolhidos para o nosso
estudo, o ICPII e o IHGB nos levam a refletir sobre a possibilidade desses autores e
tradutores de obras destinadas ao ensino no Brasil, produzirem uma escrita da história
de fosse ao encontro dos interesses dos grupos aos quais eles pertenciam. A relação
existente entre os autores e as editoras e os projetos políticos a serem desenvolvidos
para a sociedade brasileira nos oitocentos também deve ser levada em conta ao
produzirmos uma análise mais minuciosa sobre as fontes escolhidas para o
desenvolvimento de nossa pesquisa.
14
GONÇALVES, Ana Teresa Marques Gonçalves e SILVA, Gilvan Ventura da silva: O ensino da
história antiga nos livros didáticos brasileiros: balanços e perspectivas IN: CHEVITARESE, André
L.; CORNELLI, Gabrielle; SILVA, Maria Aparecida Oliveira. (Org.). A tradição clássica e o Brasil.
Brasília: Fortium, 2008. Pág. 21-34.
113
Em outras palavras, a Grécia não apresentava uma identidade una, o que faz com
que os estudos sobre os conteúdos dessa civilização sejam iniciados a partir do
desenvolvimento humano surgido nas ilhas do mar Egeu (cidades), com ênfase à realeza
cretense. Em seguida a narrativa didática nos compêndios didáticos se desloca para o
território continental (a Península Balcânica ou Hélade), tratando de forma abreviada a
civilização micênica e o chamado ‘período homérico’, para se deter nas cidades-estado,
consideradas independentes do ponto de vista político, mas interdependentes do ponto
de vista econômico e cultural.
escritos de Gonçalves & Silva (2008) que quando se trata dos conteúdos que são
definidos primordialmente como o estudo das sociedades antigas, isto é, conteúdos que
tratam das sociedades que no passado, se organizavam em civilizações tomando como
ponto de referência a compreensão de civilização ocidental europeia, a história antiga
era ensinada sob a forma de uma sucessão temporal que caminhava do Leste para o
Oeste de Roma, iniciando pelo Antigo Oriente próximo Egito e Mesopotâmia, Grécia e
Roma.
A narrativa proposta nos capítulos anteriores foi necessária para que pudéssemos
compreender alguns pontos sobre a escrita da história escolar no século XIX, uma vez
que chama bastante atenção o papel exercido pelo livro (compêndio) didático enquanto
difusor de conhecimento e instrumento utilizado para legitimar aquilo que deveria ser
ou não apreendido por aqueles a quem esse conhecimento era destinado durante esse
período.
15
Nome dado a cidades-estado autogovernadas do mundo grego. Cada pólis tinha suas próprias leis de
cidadania, cunhagem, costumes, festivais, ritos e etc. Atenas, Corinto, Tebas e Esparta eram todas póleis
separadas e autônomas. Facilmente formavam aliança entre si, mas tendiam a entrar em conflito sobre as
melhores formas de constituição (JONES, 1997).
118
Nesse sistema de governo, Sólon elaborou uma constituição que estipulava que
todas as decisões referentes à vida dos atenienses deveriam ser tomadas com a
participação do povo. Contudo, é necessário ressaltar que o “povo” era constituído
apenas pelos cidadãos atenienses, o que excluía a maior parte da população -
considerados os não-cidadãos.
Quando a constituição feita por Sólon entrou em vigor fora possibilitado aos
cidadãos atenienses o direito de eleger seus governantes e também que deliberassem em
praça pública, local chamado Ágora18, sobre os principais assuntos que diziam respeito
às assembleias. Ao longo das assembleias que eram tomadas decisões e também eram
eleitos como seus representantes aqueles que atingissem o maior número de votos, já
que os cidadãos eram considerados iguais pela constituição ateniense.
16
Estadista e poeta ateniense que, na década de 590 a. C dividiu o corpo de cidadãos segundo a riqueza,
atribuindo diversas responsabilidades políticas a cada um deles e permitindo que os cidadãos das classes
mais baixas participassem dos tribunais. Fez outras leis que ainda eram observadas no século V, em
Atenas tornando-se uma figura altamente reverenciada (JONES, 1997).
17
Os eupátridas consistiam em um grupo social da Grécia Antiga detentores de altas posições,
constituindo a nobreza da região da Ática (correspondente a Atenas e regiões circunvizinhas). Em grego,
o termo significa algo como "aqueles bem-nascidos", ou "os de pais nobres" (JONES, 1997).
18
“Lugar de reunião”. Pode designar a praça do mercado e o centro cívico de qualquer cidade grega
(JONES, 1997).
119
19
Estadista ateniense que, em 507, reformou a Constituição de Atenas de um modo que levaria a
democracia plena do século V, sob Péricles (JONES, 1997).
20
Hípias foi um tirano da antiga Atenas que governou entre 527 a. C. e 510 a. C. Era o filho mais velho
de Pisístrato, responsável pela introdução da tirania em Atenas,
21
Estadista e general, incentivador da democracia e do imperialismo ateniense. Eleito estrategos todos os
anos desde 443 a. C até a sua morte. Foi idealizador da construção do Pantenon. Amigo íntimo de muitos
dos intelectuais da época (JONES, 1997).
120
No que se refere o papel do homem enquanto ser político, Aristóteles nos diz
que:
Considerando que o homem tem pôr fim a felicidade, cuja plenitude está no
pensamento puro, o homem só é ele mesmo na cidade. Esta é a sua condição de
“animal Cívico”, e não apenas num constrangimento de fato que ele teria que
sofrer. É uma situação bela, boa e desejável, apesar de sua “sequela” de
confusões e de deveres incessantes e variados. Consequentemente, a ciência
por excelência, no que se refere a vida humana, é a ciência da sociedade. “Não
só a mais beleza no governo do Estado, que no governo de si mesmo, mas...
tendo o homem sido feito para a vida social, a política é, relativamente a ética,
uma ciência mestra, ciência arquitetônica” (ARISTÓTELES, 2014, p. 6).
sociedade natural, com a diferença de não ser de todos os momentos nem de uma
frequentação contínua.
A sociedade que se formaria de várias aldeias era dada o nome de cidade, esta
como fora dito antes em nosso escrito, deveria ter a função de bastar-se em si mesma,
sendo organizada não apenas para conservar a existência do homem, mas também para
garantir-lhe o bem-estar. Segundo Aristóteles, o Estado ou a sociedade política deve
estabelecer relações com a cidade, uma vez que se bastar a si mesmo é uma meta a que
tende toda produção da natureza e é também o mais perfeito Estado. É, portanto,
evidente que toda cidade que está na natureza produz o homem que é naturalmente feito
para a sociedade política.
Finley (1963) nos traz indagações sobre a forma como a ideia de liberdade é
concebida na Grécia Antiga e a quem essa liberdade está destinada:
Para entendermos quem eram os cidadãos nesse período, que tinham o direito à
liberdade de fala e de participação nas assembleias e os critérios para se obter a
cidadania em Atenas Aristóteles, nos referimos:
fazendo constar, primeiramente, se é certo que os candidatos têm a idade prescrita pela
lei; em segundo lugar, se o candidato é livre de nascimento e pelos pais, tal como a lei
também prescreve. Então, se não o declaram livre, apela para o tribunal de juristas,
sendo que os representantes do povo indicam cinco entre eles para servirem como
acusadores; se perde, não tem direito algum a ser declarado cidadão e é vendido como
escravo, mas, se vence se torna beneficiário de todos os direitos entre os cidadãos, sem
que se lhe possa opor impedimento algum.
22
Palavra vem do termo grego composto pelos radicais isos, que significa o mesmo, e nomos, que quer
dizer lei - que por sua etimologia significa "de mesma lei". Isto é, isonomia é o princípio de que todas as
pessoas são regidas pelas mesmas regras, da condição de igualdade.
126
23
Palavra oriunda do grego isos, que significa o mesmo e agoreúo que dizer falar em público, em
assembleia.
24
“Assembleia” aberta a todos os atenienses (homens) maiores de 18 anos estes reuniam-se quatro vezes
por mês. Uma dessas seções era a Kuria (soberana) com uma agenda determinada. Podia ser convocada
em outras ocasiões. Era considerada o organismo soberano da cidade. Seus membros votavam sobre todas
as questões principais e elegiam os funcionários mais importantes. Sua agenda era preparada pela boulé,
mas a ekklesia podia rejeitar a proposta da boulé e exigir que sua vontade fosse cumprida (JONES, 1997).
25
Boulé ou conselho dos 500, órgão aberto aos conselheiros com mais de trinte anos. Reuniam-se todos
os dias (a não ser nos feriados) e tinha a função de preparar a agenda para a Ekklesia, presidi-la e
providenciar para que suas decisões fossem cumpridas. Também supervisionava os funcionários e as
finanças da cidade (JONES, 1997).
127
cidadãos atenienses eram concebidas para garantir que os cidadãos fossem de todos os
distritos da Ática e fossem igualmente representados.
No que tange o Areópago26, Jones (1997) afirma que este órgão era o “guardião
das leis”, o órgão responsável em última instância pelo código ateniense das leis e fazia
o exame da conduta dos funcionários após o término de seu tempo de serviço, ou após o
seu impedimento durante esse tempo. O conselho de Areópago recebeu este nome
devido ao rochedo de Aires localizado entre a acrópole27 e a Pnix28, onde se reuniam
desde os tempos passados - era considerado o órgão mais antigo da pólis ateniense. De
acordo com Aristóteles (1995), na Constituição de Atenas, o conselho dos areopagitas
tinha a prescrição de zelar pelas leis, porém geria a maioria as questões principais da
cidade, infligindo soberanamente penas corporais e pecuniárias a todos os desordeiros.
Pois, os arcontes eram eleitos por nobreza e riqueza, e com eles constituíram-se os
26
Areópago era o mais antigo conselho de Atenas, constituído, por exemplo: arcontes. Teve grande poder
no passado, mas, no século V, supervisionava as funções religiosas e tinha jurisdição nos julgamentos por
assassinatos (JONES, 1997).
27
“O alto da cidade”, em geral o local mais alto da cidade, onde se construíam os templos e as
fortificações para resistência final. Em Atenas ai foram construídos o templo de Atena, o Pantenon e o
templo de Erecteu, o Erecteion. O Pantenon serviu como tesouro de Atenas. (JONES, 1997, p. 368-369).
28
Lugar onde a Ekklesia se reunia (JONES, 1997).
128
Areopagitas. É por esse motivo que esse era o único cargo que prevalecia vitalício no
período.
No que se refere à participação nas assembleias, Starr (2005) nos mostra que
existiam alguns critérios para que os atenienses tivessem direito de se pronunciar como
oradores, dos quais podemos citar: o indivíduo deveria ser reconhecido como cidadão;
deveria ter conhecimento sobre o assunto discutido; e, pedir o dom da palavra, se lhe
fosse concedido o direito de se pronunciar, aí sim ele poderia falar a todos os demais
componentes da assembleia. O autor também nos mostra algumas regras que são
sintetizadas no discurso de Ésquines29:
29
Ésquines (Atenas, 389 a.C. — Samos, 314 a.C.) foi um orador ateniense. Pertencia a uma família de
poucas posses. Isso, no entanto, não o impediu de casar-se com uma mulher oriunda de uma família muito
mais rica. O interesse pela política sempre o acompanhou, mas foi somente em 348 a.C. que se lançou
como orador (STARR, 2005).
129
mãos e se os epistátes30 tivessem dúvidas acerca de quem tinha a maioria, podia chamar
seus colegas prutáneis31 para ajuda-los com a contagem. Ainda segundo o autor, através
da constituição outorgada em de 320 a.C, tal como é descrita por Aristóteles, a
assembleia passou a realizar quatro reuniões fixas em cada um dos dez meses civis. A
primeira das quatro reuniões era denominada de reunião soberana (Kuria), na qual
deveriam ser discutidos os assuntos de maior relevância para a pólis, como por
exemplo: os suprimentos de grãos, a defesa nacional e a continuação dos funcionários
em seus cargos.
30
Presidente dos prutáneis e da Ekklesia. Como havia cinquenta prutáneis que exerciam a função de 35
ou 36 dias, era grande a probabilidade que qualquer prutánies tornar-se epistátes (JONES, 1997).
31
Cinquenta membros da boulé que durante 35 ou 36 dias, permanecem no tholos dia e noite, à custa da
cidade, para atender todas as questões e decidir se boulé ou a ekklesia devia ou não ser convocada para
tratar delas (JONES, 1997).
130
estas camadas sociais não poderiam participar das assembleias por se tratar de
indivíduos que estavam destinados ao trabalho, e por isso, não teriam tempo para se
dedicar ao exercício da política, uma vez que estes estariam destinados a contribuir com
a pólis através de seu trabalho e apenas dessa forma deveriam contribuir para o
desenvolvimento da cidade.
São eleitos por votação por mãos levantadas todos os oficiais militares. Os
dez estrategos eram anteriormente eleitos um de cada tribo, mas atualmente o
são dentre todos [os atenienses]. Procede-se também a sua distribuição em
votação por mãos levantadas: um para os hoplitas, encarregado de comandar
os hoplitas em campanha externa; um para defesa do território, estando
encarregado dos combates quando de guerras travadas no território; dois para
o Pireu, sendo um para Muníquia e um para Acte, ficando encarregados da
guarda do Pireu; e um para as simorías, o qual está encarregado de arrolar os
trierarcos, de proceder ás suas trocas de fortuna e de encaminhar-lhes as
ajudicações. Os demais são expedidos de acordo com o momento. A cada
pritania eles são submetidos a uma votação de mãos levantadas, na qual é
considerado se eles estão exercendo bem o cargo; caso algum deles seja
destituído, é julgado no tribunal e, se for condenado, avaliam qual deve ser a
punição ou multa, mas, se absolvido, volta a exercer o cargo. Quando eles
estão no comando, são soberanos para prender qualquer indisciplinado, para
expulsa-lo e inflingir-lhe multa (ARISTÓTELES, 1995, p. 121).
Percebemos que entre as ditas pessoas, alguns jovens começam a passar pelo
círculo dos templos, dirigindo-se logo ao Pireu33, outros vão à guarnição de Municia e
outros ainda, a costa do Sul. A assembleia elege também quatro instrutores que lhes
32
Havia um total de nove arcontes. Eram escolhidos anualmente por sorteio e passavam a fazer parte do
Areópago ao final do mandado. No início eram as autoridades mais importantes da cidade. Após o século
VI passaram a ter funções sobretudo religiosas e judiciárias. O arconte rei presidia o Areópago e cuidava
dos casos de homicídio e impiedade; o arconte polemarco (originalmente o arconte da guerra) cuidava
dos resistentes não-atenienses e de Atenas; o arconte epônimo (assim chamado por emprestar seu nome ao
ano corrente) estava encarregado das disputas sobre propriedades familiares, heranças, dando atenção
especial aos órfãos e herdeiras. Quanto aos seis arcontes restantes (thesmothétai) eram dedicados à
administração da justiça, determinação das datas de julgamento etc (JONES, 1997).
33
Porta de Atenas (JONES, 1997).
131
Após isso, estando aptos para a vida pública da pólis, fazem o serviço de
patrulhamento, incluídos na guarnição durante dois anos, usando túnica militar e
ficando isentos de qualquer tributo durante todo o tempo de serviço, não podem ser
processados - medida esta que tem por fim evitar que tenham motivos para pedir
licenças, embora haja exceções em casos de litígio concernentes a tutela do Estado, ou
qualquer cerimonial de sacrifício relativo à família a que pertençam. Logo que
terminam os dois anos, passam a ocupar seu lugar na sociedade, entre os demais
cidadãos. Esses mecanismos de acesso ao poder político favorecem o rodízio de
cidadãos atenienses no poder, de tal forma que, ao menos uma vez, o ateniense terá
exercido uma função político-administrativa ou militar, o que contribui para que os
cidadãos em geral experimentem funções públicas que exigem certa responsabilidade
social.
O conselho dos 500 (Boulé) tinha como função básica determinar as questões
que seriam colocadas na agenda da Ekklesia como proposta para discussão
(proboúlema). Entretanto, a Ekklesia era livre para fazer quaisquer emendas às
propostas que tivesse objeções. E para melhor registrar suas decisões, os atenienses
escreviam em pedras seus decretos, para fornecer um registro público permanente a
consultado por qualquer cidadão que assim desejasse. A Ekklesia, além disso, poderia
exigir que qualquer plano fosse inserido na agenda para a próxima reunião. E em
nenhuma hipótese a boulé poderia determinar algo para a assembleia, uma vez que a
assembleia era soberana.
34
Unidade monetária dentro do seguinte sistema: óbolo dracma (seis óbolos), mina (cem dracmas) talento
(sessenta minas) (JONES, 1997).
132
35
Eudaimonia significa alcançar as melhores condições possíveis para um ser humano, em todos os seus
sentidos e não apenas a felicidade, mas também a virtude, a moralidade e uma vida significativa.
Aristóteles argumentou que era possível a Eudaimonia com muito trabalho, cultivando as próprias
virtudes e destacando-se em quaisquer tarefas que a natureza e as circunstâncias levam até o indivíduo
(ARISTÓTELES, 2014).
133
36
Cooperação de seis mil dikastai, escolhidos para servir no júri por um ano. Um jurado poderia ser
chamado de (h)eliastes ou dikastés (JONES, 1997).
37
Efialtes foi um político grego que liderou com Péricles o movimento democrático em Atenas. Segundo
Em 462 a.C. Efialtes foi responsável pela reforma do Areópago, controlado pela aristocracia, limitando o
seu poder para julgar apenas os casos de homicídio e os crimes religiosos. Esta medida foi impopular
entre os aristocratas e levou ao seu assassinato em 461 a.C. (STARR, 2005).
135
38
De acordo com Jones (1997) essa palavra é de origem desconhecida.
136
atimía era a sentença mais severa pronunciada pelos tribunais, depois da morte e do
exílio (JONES, 1997).
Podemos assim dizer que no que concerne à vida pública em Atenas, até mesmo
para os considerados cidadãos atenienses havia o direito de isonomia e isegoria.
Igualdade de direito no uso da palavra e de participação em assembleia só era garantido
através de um processo de investigação e votação que lhes garantisse sua participação
política na esfera pública durante esse período. Em sentido geral, eram os aristocratas
atenienses que conseguiam adentrar a esfera política e se manter no poder ao longo do
tempo.
David Held (2006) em sua obra Models of democracy, ao tratar sobre modelo
democrático e sobre a ideia desta forma de governo em Atenas, nos diz que essa
proposta de organização política tinha como objetivo retirar o poder das mãos de poucos
e alocar nas mãos do povo e, para isso, era necessário que todos os cidadãos pudessem e
devessem participar da criação e manutenção de uma vida comum. Assim, este modelo
baseia-se na ideia de que todos os cidadãos deveriam participar ativamente do dia-a-dia
das discussões e decisões políticas, tomando para si determinadas tarefas dentro desse
sistema. O autor diz que neste contexto são os próprios cidadãos que devem fazer o
Estado funcionar e essa tarefa é vista como uma afirmação da sua soberania perante a
‘coisa pública’. Em suas palavras “in Greece, decisions were made among citizens by
the force of the best argument and not by the imposition of brute force”39 (HELD, 2006,
p. 15, grifos nosso).
39
“Na Grécia, as decisões eram tomadas entre os cidadãos pela força do melhor argumento e não pela
imposição da força bruta” (HELD, 2006, p.15, tradução livre).
139
De acordo com Beatriz Boclin Matos dos Santos (2015) no século XIX ocorreu um
momento importante de reflexão e mudança a respeito do significado do conceito de
História. Nesse século, há uma passagem da concepção da História filosófica para a
História fundamentada no método científico. Até o século XVIII os estudos históricos
faziam parte do mundo dos filósofos iluministas e a História era concebida como uma
história filosófica, projetada de forma linear e teleológica. A autora se refere ao regime
moderno de historicidade, no qual a escrita preocupava-se com o sentido e o dever da
razão histórica. Já no século XIX a mudança principal está no novo regime de
historicidade. A mudança na escrita da História apontada pela autora é marcada pela
passagem da visão filosófica para a perspectiva “romântica” da História e ocorre no
mesmo momento em que a História estabelece-se como uma disciplina acadêmica
(SANTOS, 2015).
De acordo com o autor, além desses dois contextos que influenciaram a escrita
da história antiga no século XIX, houveram ainda duas outras noções que determinaram
e influenciam as formas da escrita referente a História Antiga: as noções de civilização e
de progresso, os livros da tradição clássica foram considerados produtos de civilizações
diferentes, cada qual com suas próprias características, Oriente Próximo, Grécia e Roma
foram assim colocados numa espécie de sucessão, num processo civilizatório que
culminaria na civilização ocidental europeia; ainda falamos a seu respeito em termos de
“civilizações” quando, na realidade, a ideia de civilização é extremamente ambígua,às
vezes é empregado como sinônimo de cultura em geral, às vezes refere-se apenas a uma
parte da produção cultural de uma sociedade, outras é usado para diferenciar povos
“primitivos” daqueles desenvolvidos (GUARINELLO, 2014).
Nesse caso, o objetivo desse escrito é desenvolver uma consciência mais clara do
que os autores do século XIX, aqui investigados, apresentam como o passado para os
seus leitores, estudantes ou público geral. Iremos refletir sobre a concepção desses
autores no que se refere a democracia ateniense, presente no estudo sobre a História
Antiga. Isso se justifica em primeiro lugar, porque ao investigarmos os autores do
141
século XIX percebemos que sua escrita baseia numa tradição intelectual que é muito
rica em termos humanos e em segundo lugar, porque como nos diz Guarinello “a
tradição que estudamos e transformamos em História é, ainda, nossa própria tradição.
Somos parte dela, mesmo no Brasil. A própria Ciência é herdeira direta da tradição
clássica” (2014, p. 75, grifos nosso). Devemos, nesse sentido, antes demais nada,
refletir sobre a singularidade presente em cada historiador para compreender suas
pretensões à universalidade em sua narrativa histórica por tratar-se de uma História
particular e específica sobre a democracia ateniense, marcada pela influência de outros
pensadores e, que é baseada em uma forma de escrita aos moldes europeus.
Em nosso escrito, tomamos como ponto de partida para refletir sobre a escrita da
história ateniense no século XIX, a obra de Fustel de Coulanges (2006) intitulada A
cidade Antiga. Seu texto está dividido em cinco livros: no primeiro, são avaliadas as
antigas crenças que uniam o universo indo-europeu em uma religião de culto aos
ancestrais; no segundo, há uma sistematização das famílias grega e romana, cuja
estrutura era a base para o funcionamento da religião doméstica (du foyer); no terceiro,
o tema central concerne a ampliação da cidade e de suas próprias instituições; já no
quarto, foi moldada uma narrativa de caráter diacrônico sobre as revoluções, isto é, trata
das mudanças sociais que consolidaram o governo da pólis e que fizeram surgir a
democracia em Atenas; por fim, no último livro, são sublinhadas as transformações no
mundo romano que conduziram ao surgimento do cristianismo, ponto de inflexão na
argumentação do autor no que se refere ao respeito à liberdade do indivíduo
(MOERBECK, 2019).
40
Fustel de Coulanges estudou na École Normale Supérieure (ENS), sob a influência de François Guizot.
Foi professor no Lycée d’Amiens e no Lycée Saint-Louis de Paris. Em 1862, apenas dois anos após
Charles Darwin publicar sua teoria da origem e evolução das espécies, iniciou a carreira universitária em
Estrasburgo, retornando a Paris em 1870, como maître de conférences da ENS. Em 1875, assumiu a
cátedra de história antiga da Sorbonne. Depois, coloca-se na direção da ENS, em 1880, e, em 1883,
retorna à Sorbonne (CÉZAR, 2010). Fustel integra um conjunto de historiadores que defendiam o status
da história como ciência (LORENZ, 2009). Para ele, a história científica dependia do distanciamento da
experiência do presente, o que muito tem a ver com as memórias do Terror na Revolução Francesa, que
permeavam sua geração (CARDOSO, 2005; FONTANA, 1998). A história deveria voltar-se à
142
observação, à busca da verdade por meio de seus métodos, especialmente baseados na leitura e no
acúmulo de documentação. Tratava-se de uma mudança profunda nas perspectivas historiográficas
oriundas do romantismo, o que Hartog chamou de um novo “regime de evidência”, que pretendia impedir
que o passado fosse apropriado no presente, como fizeram os artífices da Revolução Francesa na leitura
do igualitarismo espartano de Rousseau. Tratava-se de negar as experiências de J. Michelet e mesmo de
horizontes mais esotéricos, que falavam em divina providência na visão da história, como S. T. Coleridge
ou G. Bancroft. Fustel está no bojo de um movimento que consolidou o regime moderno de historicidade,
ao negar a possibilidade de uma história magistra vitae, isto é, que lançasse luz sobre o futuro por meio
das experiências e exemplos pretéritos (DOSSE, 2013; HARTOG, 2017; MOMIGLIANO, 2012;
MOERBECK, 2019).
143
Moses Finley (1988) em sua obra Democracia antiga e moderna aponta o fato de
que as elites modernas se enamoram da democracia, assim como alguns historiadores,
exatamente por ter sido retirada do jogo político a participação popular efetiva e livre.
Segundo suas palavras: “hoje, no mundo ocidental, todos se consideram democratas”
(FINLEY, 1988). Esse aspecto da obra representa uma mudança com relação à situação
predominante há cento e cinquenta anos. Quando os historiadores buscavam narrar a
história da Grécia a partir de uma história repassada de geração em geração através da
oralidade. Em parte, isso se tornou possível graças a uma drástica redução no elemento
de participação popular que havia na concepção original grega de democracia. A
disseminação de uma teoria justificando tal redução contribuiu muito, no campo
ideológico, para que ela ocorresse. A teoria elitista, como é usualmente chamada,
sustenta que a democracia só pode funcionar e sobreviver sob uma oligarquia de facto
de políticos e burocratas profissionais; que a participação popular deve ser restrita a
eleições eventuais; que, em outras palavras, a apatia política do povo é algo bom, um
indício de saúde da sociedade (FINLEY, 1988).
Dentro desse debate, a obra A cidade grega, de Gustave Glotz (1980), aborda a
Grécia antiga promovendo um maior destaque para as póleis grega e espartana. A
segunda parte da obra de Glotz é dedicada à cidade democrática. Notamos, desde o
início, uma escolha muito clara do modelo ateniense em oposição ao espartano, o
primeiro constituído como o futuro e o segundo como o passado. Ao tratar sobre as
reformas de Sólon, o autor nos diz que Sólon teria promovido uma ‘revolução
mitigada’, estabelecendo entre as suas medidas o ‘habeas corpus’ do cidadão ateniense.
Para ele, a reforma de Sólon marca o surgimento da democracia. As leis políticas de
Clístenes virão completar as leis civis de Sólon. A maneira como o autor aborda essa
temática passa a ideia de uma continuidade perfeita entre Sólon, Pisístrato e Clístenes
num movimento de “inevitabilidade democrática”, uma forma de teleologia. Depois o
autor aborda que as guerras médicas, o desenvolvimento contínuo do comércio e da
indústria e a abundância de riqueza mobiliária provocaram uma espécie de alargamento
contínuo da democracia, um deslocamento progressivo do centro de gravidade em
direção à massa dos produtores e dos marinheiros. Chega então à figura providencial de
Péricles: “Péricles, o sobrinho-neto de Clístenes, juntava a uma inteligência genial,
uma eloquência, uma autoridade, uma habilidade no manejo dos homens, que lhe
permitiram servir o povo dominando-o” (GLOTZ, 1980, p. 130-137, grifos nosso).
Para Glotz (1980, p. 111, grifos nosso) “a teoria da democracia ateniense é bem
simples; resume-se numa expressão: o povo é soberano (kúrios) quer funcione na
assembleia ou nos tribunais, tem a soberania absoluta de tudo que se refere a pólis”.
Percebemos que para o autor, a cidade grega é, igualmente, dos cidadãos em sentido
rigoroso: metecos e escravos não ocupam espaço, a não ser externo, pois em sua
145
concepção eles não fazem parte estrutural do sistema. A obra de Glotz é marcada pela
singularidade de seu olhar, uma vez que o autor apresenta suas convicções a respeito da
democracia como forma de governo quando diz que para chegar ao seu destino a
democracia ateniense se submeteu à ditadura moral do povo, o que a levou a seu
declínio.
O erro dos atenienses foi o de não se abrirem às outras cidades, como farão
mais tarde os romanos, enfim, da mesma forma que a França, vencida em
1815, deixou o Código de Napoleão aos seus vencedores, Atenas (...)”. Essa
missão civilizadora que justifica a dominação é obviamente para uso de um
país colonizador – como a França da época de Glotz. Quanto aos aspectos
relativos à lei, ele reconhece que havia certa confusão entre lei e decreto, mas
relativiza isso, lembrando que os modernos, que inventaram o decreto-lei,
não possuem muita legitimidade para criticar os antigos quanto a isso. Aliás,
Glotz é claramente um “antiquisant”, além de ser um historiador da
Antiguidade, ou seja, alguém para quem a comparação entre o mundo antigo
e o mundo moderno resulta, na maioria das vezes, em vantagem para o
mundo antigo e o maior mérito do sistema, segundo ele, era o de promover a
educação política permanente dos cidadãos, pois a política não era “a simples
obrigação de depositar um voto na urna em longos intervalos de tempo”
(GLOTZ, 1980 apud DABDAB TRABUCI, 2016, p. 38).
democrático serviria se deixasse aos ricos a sua riqueza e esses ajudariam a sustentar os
pobres, e os pobres decidiriam em última instância, pois na concepção de Aristóteles, os
pobres, a maioria, não estariam aptos para decidir.
Podemos começar afirmando, contra tal opinião, que havia uma consciência de
esferas distintas. Alguns textos fundadores afirmam e reafirmam suas
especificidades. Em Tucídides, Péricles estabelece a distinção muito
claramente, falando da liberdade dos atenienses na ordem política, e
prosseguindo com a menção dos assuntos de ordem privada (Tucídides, 2, 37).
Da mesma forma, Aristóteles, na Constituição de Atenas (15, 5), quando
retorna à tomada de poder por Pisístrato, afirma que esse último ordenou que
cada um se ocupasse de seus assuntos pessoais (idíon), pois ele próprio se
encarregaria dos assuntos da coletividade (koinôn). Não estamos ainda, no caso
de Pisístrato, na época da democracia, e isso não impede a consciência de duas
esferas claramente distintas. Isso vai se afirmar progressivamente como uma
prática habitual dos discursos. Lísias, por exemplo, divide uma de suas
argumentações em duas partes: ele começa falando da vida privada, e em
seguida passa à vida pública (Lísias, Em defesa de Mantithéos, 11). Passemos a
outro ponto frequente na crítica da liberdade dos Antigos feita pelos liberais
modernos: o indivíduo não estaria protegido pelas leis, ele estaria à mercê das
vontades imediatas da coletividade, tanto mais nocivas quanto sempre muito
voláteis. Ora, contrariamente a isso, podemos constatar nas fontes muitas
garantias, por exemplo, quando leis são citadas nos discursos dos oradores
(TRABUCI, 2016, p. 9).
147
pessoais de cada um. De outro modo, que se predomina em nós o gosto pela
imaginação, pela emoção ou pela razão. Por fim, há ainda os que julgam os fenômenos
históricos conforme suas crenças políticas ou por juízos de grandezas
(BURCKHARDT, 1961).
estudo da história fizeram com que os estudos realizados nesse século adquirissem uma
universalidade desconhecida até então. Segundo o historiador:
We must be aware that, for Burckhardt, the problem of the advent of the poleis
was deeply rooted in violence. What Burckhardt began to stitch together is that
the development of Greek culture was directly linked to the development of the
poleis, so, it ends up being subordinated to the development of politics and a
State. A question that we should raise here is: was the formation of the State
troublesome in Antiquity, as well as the modern one? There is a strong
42
Jacob Burckhardt e sua Atenas ou como forjar um estado democrático autoritário.
151
temptation to easily link this fact with the German unification process, as far as
Basel’s bumpy ride during the creation of a united Switzerland. However, let
us put these conclusions aside for a while, and let Burckhardt’s thoughts guide
us. The interpretation of the author leads us to believe that the process of
synoecism had an enormous human cost - which involved struggles and
resettlements, which took the Greeks away from the lands they cultivated and
from the graves of their dead. The formation of the polis was ultimately, and
somehow paradoxically, the way found by the Greeks to fight against the
violence created by their form of territorial and institutional organization43
(BURCKHARDT, 1999, p. 45-6 apud MOERBECK 2018, p. 134).
No fragmento acima, o autor nos diz que devemos estar conscientes de que, na
visão Burckhardt, o problema do advento das póleis estava enraizado na violência. Para
ele, o que Burckhardt começou a costurar em sua obra, é que o desenvolvimento da
cultura grega estava diretamente ligado ao desenvolvimento das cidades-estado. Nesse
sentido, esse desenvolvimento acaba subordinado ao aprimoramento da política e do
Estado. Para o autor, a formação da pólis foi finalmente, e paradoxalmente, o caminho
encontrado pelos gregos para combater a violência criada por sua forma de organização
territorial e institucional.
43
Devemos estar cientes de que, para Burckhardt, o problema do advento das poleis era profundamente
enraizado na violência. O que Burckhardt começou a costurar é que o desenvolvimento da cultura grega
estava diretamente ligado ao desenvolvimento das poleis, então acaba sendo subordinado ao
desenvolvimento da política e de um Estado. Uma questão que devemos levantar aqui está: a formação do
Estado foi problemática na Antiguidade, assim como a moderna? Existe uma forte tentação de vincular
facilmente esse fato ao processo de unificação alemão, tanto quanto como o passeio esburacado de
Basileia durante a criação de uma Suíça unida. No entanto, vamos colocar estes tirar conclusões por um
tempo e deixar que os pensamentos de Burckhardt nos guiem. A interpretação de o autor nos leva a
acreditar que o processo de snoecismo teve um enorme custo humano - que envolvia lutas e
reassentamentos, o que levou os gregos para longe das terras que cultivadas e das sepulturas de seus
mortos. A formação da polis foi finalmente, e paradoxalmente, o caminho encontrado pelos gregos para
combater a violência criada por sua forma de organização territorial e institucional (BURCKHARDT,
1999, p. 45-6 apud MOERBECK, 2018, p. 134, tradução livre).
152
sua cidade natal do que a cidade para ele” (BURCKHARDT, 1999, p. 55-56 apud
MOERBECK, 2018, p. 135).
44
O pobre homem para se proteger de decisões iníquas, tinha que poder ser juiz e magistrado. E
considerando o enorme poder da pólis sobre a existência, os mais insignificantes tiveram que reivindicar
sua participação nele. Assim, todo o poder que antes era propriedade de reis, aristocratas, tiranos, agora
passam para as mãos do povo [e o povo] são os mais suspeitosamente ansiosos para reagir e comando, e é
importante ressaltar, naquele momento, que essas medidas foram usadas para defender [os pobres] do
influxo de indivíduos de inteligência indicada, o procedimento de eleição de um líder militar ou
ostracismo (BURCKHARDT, 1964, p. 282-3 apud MOERBECK, 2018, p. 137, tradução livre).
153
públicos em Atenas. Pois segundo ele, todo o poder que antes era propriedade de reis,
aristocratas, tiranos, agora passa para as mãos do povo; que o autor considera indigno,
por se tratar de indivíduos que “são os mais suspeitosamente ansiosos para reagir e
comandar” (BURCKHARDT, 1964, p. 282-3 apud MOERBECK, 2018, p. 137).
Moerbeck nos mostra que a crítica de Burckhardt a participação do povo e as
instituições democráticas atenienses é apenas o começo. Burckhardt considera o
theoryikon (pagamento de ingressos para o teatro), os banquetes e os sacrifícios
públicos como um dos pontos mais prejudiciais da democracia. A sobreposição de
funções no caso ateniense levou o Estado, nos argumentos de Burckhardt, a um
problema real, possivelmente causando um distúrbio significativo. Ele também afirma
que os funcionários no período democrático eram sazonais (devido a eleições e
cédulas). Portanto, não houve possíveis ganhos de força e organização nesse regime de
governo. Finalmente, Burckhardt se mostra desconfortável com uma posição relevante
do “povo” nos assuntos administrativos do sistema democrático ateniense
(MOERBECK, 2018).
The Plato - Aristotle - Polybios view of democracy as one of the three basic
types of constitution that is reflected in political philosophy and in political
thought from the recovery of Aristotle’s Politics about and to the rise of
history in its modem sense in the beginning of the 19th century During this
period of 600 years the standard description of ancient Greek democracy
includes the following elements:
1. Democracy is not described in its own right but only as one of the three
basic forms of government, monarchy, oligarchy and democracy.
2. The description is theoretical rather than historical. Democracy, that is
government by the majority of the people, is mentioned in passing only as a
possible form of government which nobody needs to take much notice of.
3. The view of democracy is mostly hostile, and when it is positive,
democracy is nevertheless regarded as impracticable.
4. It is commonly held that the best form of government is some kind of
mixed constitution, combining monarchic, aristocratic and democratic
elements.
5. In so far as democracy can be accepted it is one of the elements in a mixed
constitution not a pure constitution.
45
A tradição da democracia na Grécia antiga e sua importância para a democracia moderna.
155
46
Platão - Aristóteles – Políbio apresentam uma visão sobre a democracia como um dos três tipos básicos
de constituição que se refletem na filosofia política e no pensamento político a partir da recuperação da
obra de Aristóteles Política sobre e à ascensão da história em seu sentido moderno no início do século
XIX, durante este período de 600 anos a descrição padrão da democracia grega antiga inclui os seguintes
elementos:
1. A democracia não é descrita por si só, mas apenas como uma das as três formas básicas de governo,
monarquia, oligarquia e democracia.
2. A descrição é teórica e não histórica. Democracia, que é governo pela maioria das pessoas, é
mencionado de passagem apenas como uma forma possível de governo que ninguém precisa prestar
muita atenção.
3. A visão da democracia é principalmente hostil e, quando positiva, a democracia é, no entanto,
considerada impraticável.
4. Costuma-se afirmar que a melhor forma de governo é algum tipo de constituição mista, combinando
monárquica, aristocrática e elementos democráticos.
5. Na medida em que a democracia pode ser aceita, é um dos elementos em uma constituição mista, não
uma constituição pura.
6. As referências ocasionais às instituições atenienses são principalmente o famoso legislador Solon, que
se acreditava ser o pai de uma democracia mista moderada.
7. As fontes sobre as quais esse relato da democracia antiga é são baseados em Platão, Aristóteles e, às
vezes, Políbios. Até agora como a democracia ateniense é mencionada, a principal fonte é A vida de
Plutarco em Sólon, Péricles, Demóstenes e Phokion, bem como suas outras vidas de estadistas atenienses
(HANSEN, 2005, p. 9).
156
sobre o que deveria ser fixado pelo alunado brasileiro nos oitocentos, através da
memorização dos conteúdos dos compêndios de História Universal, deixavam marcas
de suas concepções de mundo e de seu olhar sobre essas civilizações.
No Brasil, o estudo sobre os povos antigos ocupou grande espaço nas grades
curriculares das escolas brasileiras ao longo dos oitocentos. Pierre Vidal Naquet (2002)
em sua obra Os gregos, os historiadores e a democracia, o grande desvio mostra que os
estudos de história antiga na França - grande influenciadora da configuração curricular
do ensino secundário brasileiro – incluíram o estudo das línguas latina, grega e hebraica.
Segundo o autor:
A antiguidade é essencialmente o mundo greco-romano, ao qual se anexam
Egito, Israel e Oriente Próximo. Trata-se da laicização, operada no
transcorrer do século XIX, da antiga história sagrada, centrada no povo
judeu. Nem a China nem a Índia estão ligadas a antiguidade. E é impossível
fazer estudos de história sem o conhecimento, no mínimo do latim
(NAQUET, 2012, p. 18).
Tomando como base o fragmento, ao longo do século XIX, podemos perceber que
além das disciplinas das línguas grega e latina, a cadeira da antiguidade é
essencialmente demarcada pelo estudo do mundo greco-romano, ao qual se anexam
Egito, Israel e Oriente Próximo. O conhecimento relacionado a antiguidade na França
dava aos conteúdos de Grécia e Roma uma maior ênfase. Para ele, “os estudos clássicos
eram caracterizados por uma divisão entre a disciplina filológica e literatura de um lado,
e do doutro lado à história e a filosofia antiga” (NAQUET, 2012, p. 18). Para o autor a
história antiga, sobretudo grega e romana, era considerada de grande influência pelo
lugar que ocupava naquilo que ele chamou de “quadripartição da história” (VIDAL-
NAQUET, 2002). No que se refere à democracia grega o autor ainda aponta:
A Grécia não está na nossa história, e para compreender esta última não
temos nenhuma necessidade de saber como funcionava a assembleia
ateniense, o que era a boulé (o conselho) e como era aplicado o ostracismo. O
que está na nossa história, ou pelo menos numa parte da nossa história, e que
não podemos extirpar, porque ela é o passado, é o diálogo com a Grécia e,
antes de tudo, com os textos gregos. A reelaboração da herança grega, ora
sob forma mítica ou ideológica, ora sob forma do trabalho crítico e científico,
é um dos dados da nossa história intelectual, que se exprime na criação,
incessantemente renovada, de novos modos de discurso, de novos conceitos,
de novos campos epistemológicos (VIDALNAQUET, 2002, p. 254-255).
157
O próprio termo, estado-cidade, pode levar a confusões, pois nada tem a ver
com o quê hoje entendemos como cidade, núcleo urbano de adensamento
populacional com diferentes e mutáveis funções. Uma estado-cidade é mais
que uma cidade, é, antes de tudo, uma forma de Estado. Uma definição única
e cabal é impossível. Mas uma definição mínima, como um tipo ideal, pode
nos servir de guia nas análises que se seguem sobre a questão da cidadania.
Para os fins de nosso estudo, entenderemos estado-cidade como uma forma
peculiar de organização de uma sociedade essencialmente camponesa. Uma
estado-cidade representa, ao menos num primeiro momento, um território
agrícola fechado, no sentido de que o acesso à terra, o principal meio de
produção, é restrito aos membros da comunidade que detém o controle sobre
esse território. Esse fechamento foi, quase certamente, produto de um
processo histórico, cujos detalhes nos escapam, mas que deve ter ocorrido, na
Grécia continental, entre os séculos IX e VIII a. C. e, em algumas regiões da
na Itália peninsular, entre os séculos VI e V a.C. É esse fechamento para o
exterior, ocasionado talvez por disputas guerreiras, talvez pelo esgotamento
das terras disponíveis para eventuais migrantes, que constitui a estado-cidade
como comunidade e que nos fornece um primeiro, e ainda embrionário,
conceito de cidadania. Ser cidadão é poder possuir terras no seio do território
ocupado pela comunidade (GUARINELLO, 2014, p. 99-100).
Dentro deste debate, Fabio Augusto Morales (2009) dá ênfase ao estudo das
categorias de pólis, traduzida como cidade ou cidade-estado, e nos mostra que o estudo
sobre a pólis tem sido uma constante na História da Grécia, enquanto disciplina
científica, desde a segunda metade do século XIX e em todo o século XX, a ponto de a
história grega ser associada quase que exclusivamente a uma história das poleis gregas.
Mas o que significa, na historiografia moderna, o termo pólis? Para o autor as respostas
são variadas: uma cidade de consumidores (com ou sem a separação campo-cidade),
uma comunidade sagrada, uma instituição estatal, uma experiência existencial, uma
sociedade liberal, uma vila escravista, uma união de aldeias etc. No entanto, existem
semelhanças entre os vários modelos de pólis elaborados pela historiografia dos séculos
XIX e XX: em primeiro lugar, o não questionamento da forma ‘História da Grécia’ ou
‘História Antiga’, ou ao menos uma ausência do enfrentamento teórico de suas
contradições; em segundo lugar, a identificação da póleis com a comunidade de
cidadãos, os polites, que são definidos de modo estático: homens, adultos, livres e filhos
de pais atenienses (MORALES, 2009).
De acordo com Ana Lívia Bonfim Vieira (2007) durante o Período Clássico,
Atenas viveu sob o sistema de governo criado e desenvolvido por ela, a saber, a
Democracia. Consideramos importante ressaltar que Atenas foi a única pólis
democrática da antiguidade grega de que se tem registro. Neste sistema, o ideal era o da
participação dos cidadãos na política e isso se dava com a participação ativa na
Assembleia, votando as leis e as decisões que entrariam em vigor. Um bom cidadão –
polites - ateniense era aquele que estava preocupado com os outros cidadãos, ou seja,
com a sua comunidade. Contudo, este ideal de unidade, de coesão social, entra em
desagregação no final do V século, entre outros fatores, por conta da Guerra do
Peloponeso. Segundo a autora:
Nesse viés, pode-se dizer que o compromisso desses homens não estava apenas
em propor elementos que viessem conduzir a um novo método de análise da história ou
destacar modelos de como deveria ser o perfil do novo historiador. Ao fazerem a crítica
do cientificismo, a preocupação estava em negar o modelo intelectual que conduzira o
pensamento do homem alemão e sua sociedade até aquele momento. Uma forma de
condução que precisava passar por mudanças, pois não atendia mais as necessidades
postas diante das transformações que estavam ocorrendo na sociedade e no mundo
durante o século XIX. E para que essas mudanças ocorressem da maneira desejada,
propôs-se a formação de um novo homem-cidadão, apoiado nos alicerces dos ideais de
unificação, do patriotismo e de orgulho do seu passado para que assim pudessem
escrever um novo capítulo na história.
Nesse momento, a instrução direcionada para a formação das elites, buscava inserir
a recente nação brasileira no caminho da civilização, e, por conseguinte, fazer do Brasil
162
seguir, como era descrito o conteúdo referente a Grécia Antiga; como eram nomeados
os capítulos e os subtítulos em cada uma das fontes que pretendemos analisar. A
finalidade desses quadros é apresentar a forma romântica como os historiadores
trabalhados em nossa investigação promovem sua escrita. Escrita esta que versa sobre a
geografia e o nome dos “grandes” personagens dessa civilização.
XXV. Alexandre.
Fonte:Elaboração da autora.
No trecho acima, podemos notar que Justiniano opta por mencionar os deuses
gregos através dos nomes equivalentes na mitologia romana, por exemplo, Júpiter
(Zeus), Diana (Ártemis) e Baco (Dionísio). Este recurso permeia a obra, percebemos
também que o panteão politeísta cultuado pelos gregos é, claramente, condenado por
Rocha (1860, p. 45): “Essa religião torpe e infame, por mais que a poesia a enfeite, mal
póde conceber-se que houvesse sido acreditada e acceita por um povo ilustrado”. Ainda
de acordo com o autor, a história arcaica da Grécia era obscura: “Nos tempos da
primeira organisação grega em monarchias mais ou menos regulares, acham-se alguns
factos que, brilhando pela sua importancia no meio das trevas conseguiram chegar, mais
ou menos imcompletos, ao conhecimento da posteridade” (ROCHA, 1860, p. 48).
47
De acordo com Guimarães (1988) os membros do IHGB concederam ao estudo da geografia o segundo
corpo temático amplamente tratado na sua revista. Esse estudo geográfico diz respeito as publicações
relativas às viagens e explorações do território brasileiro, onde os autores abordam questões de fronteiras
e limites, as riquezas naturais do país e a questão indígena. Essa forma de narrativa tem como objetivo
definir com precisão os contornos físicos da Nação, integrando na imagem em elaboração aos elementos
continentalidade e riquezas inumeráveis capazes de viabilizarem num futuro não-definido a realização
plena de sua identidade. No século XIX, os estudos geográficos publicados no Brasil, foram influenciados
pela formação intelectual dos autores europeus. Nesse caso, acreditamos que ao tratar sobre a formação
territorial dos povos da Grécia antiga, o autor busca integrar esse estudo ao que está sendo pretendido
para o território nacional.
168
sugerem Platão e Aristóteles, o que faria com que o próprio povo logo se submetesse ao
poder de tiranos e pedagogos que conduziam as assembleias para satisfazer a interesses
políticos particulares. Podemos perceber marcas dessa influência também no fragmento
retirado da citação do autor que diz: “os Pisistratidas, e melhor do que eles Pericles fez
dessa condição da democracia um meio de absolutismo” (ALTOÉ, 2016, p. 36). Ou
seja, para o autor a democracia de Péricles destinava a participação política a uma
camada dos cidadãos, oriundos de boas famílias, que detinham o poder de fala nas
assembleias de modo quase absoluto.
Nos outros capítulos sobre a Grécia Antiga, o autor continua sua escrita narrando
as colônias, a expansão de seu território, atividades comerciais, as guerras, os grandes
reis e os principais filósofos, assim como as letras e a arte grega. Podemos perceber que
ao dar maior destaque a geografia, os heróis, os pensadores e a cultura grega Justiniano
José da Rocha expõe uma narrativa que vai de acordo com aquilo que é pensado pela
elite que compõe o IHGB: uma narrativa histórica atenta à delimitação do território,
como componente indispensável à constituição de uma nação, a seus heróis e
empreendimentos políticos-militares.
Quadro II: A escrita sobre o conteúdo de Grécia nos compêndios de História Universal Resumida de
Pedro Parley (1869)
COMPÊNDIO DE HISTÓRIA UNIVERSAL RESUMIDA
PEDRO PARLEY
(1869)
XLIX. A Grecia; onde está situada; Aspecto do paiz; seu clima.
LXIII. Continuação.
A obra de Pedro Parley, História Universal Resumida para uso das escolas
comuns dos Estados Unidos da América do Norte, é traduzida para uso das escolas do
Império do Brasil pelo desembargador Lourenço José Ribeiro e editada pela Laemmert
por volta de 1857. História geral é a denominação apresentada no Programa de ensino
de 1882. Todavia, Moreira (2010) apresenta como sinônimas: História geral, História
universal e História da civilização. A obra de Pedro Parley foi adotada pela Escola
Americana de São Paulo. De acordo com Bittencourt (1993, p. 177), havia bastante
171
A política de Roma era egoísta, o amor próprio a sua mola real. Os Romanos
tinhão como os Gregos, Persas, Egypcios e outras nações antigas algumas
noções de virtude e mostravão às vezes qualidades nobres e generosas. Mas
faltava-lhes, como a todas essas nações, a verdadeira moralidade, aquella
que Jesus Christo nos ensinou na simples máxima: “Faze aos outros o que
desejas que eles te fação! ” Como ellas, achava-se Roma privada daquela
verdadeira religião, da qual aprendeu o gênero humano, o que todo poder
fundado na injustiça há de ter mui curta duração. Por mais esplendido que o
fosse o império romano, estava longe de possuir uma verdadeira gloria. Seu
esplendor adquirido pelo roubo, seu grande renome podião ofuscar as vistas
de um gentio; mas para um christão tinhão e têm pouco valor; ele
considera essa magnificência como falsa e sem fundamento (PARLEY,
1869, p. 240, grifos nosso).
172
Para Farias Junior & Lima (2019), em linhas gerais, as narrativas sobre a Grécia
Antiga, se considerarmos o momento histórico em que foram escritas, partem do
pressuposto de que experiências do passado orientam e fundamentam a tomada de
decisão no presente. De acordo com os autores, é revelar a moralidade de um sistema de
valores culturalmente materializado na vida social e pessoal de determinados indivíduos
em um determinado tempo, através da demonstração de sua generalidade. Quer dizer,
que tem uma validade que se estende a uma gama de situações e leva consigo um
princípio geral válido para todos os momentos históricos (FARIAS JUNIOR & LIMA,
2019).
No que se refere aos conteúdos sobre a Grécia antiga, Pedro Parley (1869)
promove sua escrita destinando dezesseis capítulos para a abordagem dos conteúdos
referentes a essa civilização. Em seus capítulos o autor inicia sua narrativa a partir da
apresentação da geografia, do clima, do território e da formação das cidades-estados.
Em seguida apresenta a legislação grega, sua economia, grandes monumentos,
administração e suas grandes guerras. O autor também apresenta a religiosidade grega
assim como seus deuses e semideuses e os principais filósofos gregos, apresentando
inclusive o cotidiano dos gregos em um capitulo que inclui seu modo de vestir, de
comer, as armas utilizadas por eles e sua inclinação para a guerra. Essa forma de divisão
do conteúdo é demostrada no quadro II de nosso escrito.
O autor aborda a história da Grécia em pontos que, ora são abordados de forma
semelhante a Justiniano Jose da Rocha e Victor Duruy, ora se diferem, como poderemos
perceber ao longo desse escrito. Em relação ao conteúdo referente a democracia
ateniense, foi possível encontrar a menção à democracia apenas no trecho a seguir:
48
Lysandro, foi o general Espartano (morto em 395 a.C.), que desafiou os atenienses durante a Guerra do
Peloponeso, e tomou Atenas (405 a.C.). Alguns meses após a vitória da frota peloponesia sobre os
atenienses na batalha de Aigos- potamos ele mediou as negociações de paz entre os atenienses. Selada a
paz o regime democrático foi abolido e um grupo de trinta cidadãos ficou encarregado, com o apoio de
Lysandro, de reformar a constituição ateniense no sentido de um retorno à constituição ancestral o que na
pratica significava instaurar uma oligarquia. Nesse caso ele estabeleceu um sistema de governo autoritário
na região que ficou sob sua influência. Tendo indicado os quinhentos membros do conselho, os trinta
constituíram um governo que duraria oito meses, no final de 404 a. C até meados de 403 a. C, segundo o
autor da Constituição de Atenas (MORALES, 2009).
174
com o pensamento de Pedro Parley e também de Victor Duruy sobre essa forma de
governo. Como continuaremos a ver na análise a seguir.
Quadro III: A escrita sobre o conteúdo de Grécia nos compêndios de História Universal de Victor Duruy
(1865)
COMPÊNDIO DE HISTÓRIA UNIVERSAL
VICTOR DURUY
(1965)
V. Grecia; Geographia da Grecia antiga; Tempos heroicos; Colonias; Principaes Estados; Lycurgo;
Leis de Sólon; Psitrato e seus filhos.
VI. Guerras Medicas; O poder de Athenas e seus grandes homens; Péricles; Guerra do Peloponeso; Os
gregos na Ásia e no Egypto; Epaminondas e Pelopidas: o poder de Thebas.
VII. Phillippe da Macedônia e Demosthenes.
IX. A Grécia reduzida a província dos romanos; Phillippe III; ligas dos Etolios e dos Archêos; Arsio e
Phitollomeo.
censitários, por meio dos quais os cidadãos atenienses definiriam suas formas de
participação política. Ambos os autores apresentam em comum o fato de que, após
Sólon, a experiência democrática ateniense teria se degenerado ou resultado no
enfraquecimento das instituições políticas. Essa narrativa, a nosso ver, contribui para
pensar a democracia em contextos de crise, dissolução ou enfraquecimento do poder, o
que se opõe a situações de manutenção da unidade político-administrativa, tal como
pretendida pelo Império do Brasil (FARIAS JUNIOR & LIMA, 2019).
49
As constituições históricas de narrativa de sentido de Rüsen são: tradicional (cuja a identidade
desenvolve-se como um enraizamento das formas sociais tradicionais da subjetividade em atitudes,
motivações modelos de percepção e interpretação profundamente inseridos nas mentalidades); exemplar
(que é uma forma de narrativa histórica que se distingue do tipo de constituição tradicional de sentido por
um aumento do campo das experiências e por assim dizer, por um nível mais elevado da abstração na
relação normativa do saber histórico à pratica); crítico (que é uma forma de comunicação intercultural, na
qual o discurso histórico alterar-se radicalmente, quando novas representações substituem as antigas, ou
mesmo quando uma linguagem simbólica do histórico, inteiramente nova, varre a precedente) e por fim
genético (que propõe uma mudança no trabalho de interpretação histórica, adquirindo uma qualidade
positiva, onde a história torna-se portadora de sentido) (RÜSEN, 2007 apud FARIAS JUNIOR, 2016).
179
De acordo com Farias Junior & Lima (2019), ocorre na constituição de sentido
tradicional a perpetuação de princípios e valores por intermédio da imitação de
comportamentos e práticas culturais ligados a formas de vida já habituais. Os sujeitos
humanos passam a direcionar suas vidas para assegurar a permanência de modelos
culturais na tentativa de racionalizar seu vínculo com comunidades já instituídas. Esse
fato pode ser percebido na escrita da história universal nos compêndios investigados,
uma vez que os autores abordam como modelo a ser seguido pelos alunos o modelo
judaico-cristão como forma de garantir ao alunado as virtudes necessárias para o bom
funcionamento de uma sociedade.
pensadores através da análise dos escritos sobre a democracia ao longo do XIX feitos
em nosso tópico anterior. De acordo com Farias Junior & Lima:
narrativas sob a ótica exemplar de constituição de sentido pode ser percebida a partir do
momento em que verificamos se o autor admite que haja, perceptivelmente, uma regra
ou um princípio geral por trás de diferentes casos, por meio dos quais os acontecimentos
históricos podem ser mais bem compreendidos e as relações interpessoais, por extensão,
aprimoradas. A nosso ver, está claro que, para os leitores de tais manuais, há a
percepção de que a história ensina, a partir dos inúmeros acontecimentos do passado
que transmite regras gerais do agir ou, em outras palavras, regras ou princípios tomados
como válidos para toda mudança no tempo e para o agir humano que nela ocorre
(FARIAS JUNIOR & LIMA, 2019).
Além disso, devemos atentar ao fato de que nos compêndios de Justiniano Jose
da rocha (1860), Victor Duruy (1865) e Pedro Parley (1869) a escrita destes autores, no
que se refere à narrativa referente ao conteúdo de História Antiga, é repassada de forma
a perpetuar determinadas condutas aceitas culturalmente com o objetivo de civilizar os
estudantes brasileiros a partir dos modelos europeus. Ao tratar sobre esse modelo de
escrita percebemos que os autores, em seus respectivos compêndios, costumavam
reservar um espaço do conteúdo de História Antiga para as outras sociedades antigas
como, por exemplo: a persa, a fenícia e a hebraica, esta última em geral era mais
contemplada pelos autores devido à importância atribuída ao estudo da origem do
cristianismo para a compreensão adequada dos valores da sociedade em que viviam.
quem tem o poder sobre elas. Ressaltamos que as obras analisadas são essenciais para
compreendermos a tessitura da história da Antiguidade ensinada nas escolas brasileiras
do século XIX, sobretudo, no Imperial Colégio de Pedro II, a principal instituição do
ensino secundário do país no oitocentos. Estes compêndios apresentam um esquema
narrativo que reforça a visão de um equilíbrio social como condição da ordem e da
civilização, frente a ameaça da anarquia e do despotismo. A partir do enredo dessas
obras, é possível perceber significados e lições para os letrados e governantes brasileiros
que organizavam a educação secundária no Segundo Reinado (ALTOÉ, 2016).
Embora não se possa mais considerar a “História Antiga” como o início de uma
História Universal, as realizações humanas que se acumularam nesse pedaço do globo
são fundamentais para entendermos como o mundo contemporâneo se tornou possível.
As marcas de singularidade presentes em cada historiador, seu local de fala e o regime
de governo vigente devem ser levadas em conta, pois nelas podemos perceber através de
suas escolhas e silenciamentos o que era designado como preterido para o conhecimento
histórico.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para nós, os historiadores dos oitocentos tomam como base estes ideais, pois era
essa forma de análise que lhes permitia promover uma “correta” interpretação sobre os
fatos do passado corrigindo e interferindo na escrita sobre estes acontecimentos para
adequá-los ao projeto político pensado para o ideário de escrita da história nacional,
objetivado para o país no presente. Esse modo de pensar fundamentado por essas duas
correntes historiográficas levou os historiadores do IHGB a reproduzir uma forma de
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escrita da história que foi largamente difundida e serviu de base para legitimar as
traduções de obras estrangeiras sobre a antiguidade e para produção da escrita da
história nacional que serviam de modelo para as narrativas escolares presentes no ensino
secundário brasileiro ao longo desse período.
Partindo dessa premissa, podemos assim dizer que discussão desses conceitos
chaves teve como justificativa a necessidade de compreendermos os interesses presentes
nos discursos nacionalistas sobre o ideal de civilização a ser preterido para a sociedade
brasileira nos oitocentos, uma vez que esse ideário de Brasil seria construído e fixado na
memória nacional através do ensino e da perpetuação da superioridade da cultura
europeia trazida, a nosso ver, como modelo de civilidade para o território nacional.
Essa reflexão foi necessária para que pudéssemos desenvolver uma investigação
sobre a escrita da história escolar no século XIX. Onde nossa narrativa abordou, além da
escrita da história escolar do período, o papel do livro didático como principal difusor
do conhecimento. Ao longo de nossa narrativa tivemos como principal finalidade
propor uma reflexão sobre os usos do passado na construção do saber escolar, levando
em consideração os estudos de história e historiografia no Brasil entre os anos de 1850-
1870 e sua contribuição para a criação de um ideário nacional em território brasileiro.
Percebemos que nos oitocentos a visão sobre a história antiga continua presa à
versão produzida pela história europeia pelo simples fato de se tratar de uma realidade
geográfica e cultural que tem como escopo a influência dessa civilização, em grande
parte das correntes historiográficas do século XIX, que busca com insistência revelar as
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“origens das nações”, nos levando a refletir se até mesmo a própria nomenclatura
empregada ao denominar os estudos das sociedades antigas exprime de certa maneira o
olhar do europeu sobre essas civilizações. É possível perceber que no Brasil a História
como disciplina escolar, ao se tornar obrigatória na primeira metade do século XIX,
momento de afirmação do Estado Nacional, com a criação, em 1837, do Colégio Pedro
II, no Rio de Janeiro, encontra-se vinculada à construção das nações e a formação
educacional de seus membros.
Consideramos que as obras utilizadas ao longo de cada uma das três seções em
nossa narrativa, contribuíram para a produção empírica de nosso escrito e foram de
grande importância sobre as narrativas referentes à democracia ateniense presente no
conteúdo da Grécia Antiga nos compêndios de História Universal. Partimos do
pressuposto de que os autores dos manuais didáticos europeus, utilizados no Brasil,
como no caso de Justiniano José da Rocha (1860), Victor Duruy (1865) e Pedro Parley
(1869), que produziram os compêndios de História Universal, que foram utilizados no
ensino secundário em território nacional no período do Império Brasileiro, reproduziam
como verdade histórica: como restituição do passado clássico aquilo que é, a nosso ver,
retórico, ou seja, produto da manipulação de acontecimentos históricos com a finalidade
de referendar determinados posicionamentos político-culturais do presente. E por esse
motivo os conteúdos selecionados para compor o estudo sobre a Grécia Antiga pelos
alunos do ensino secundário brasileiro eram abordados de acordo com o que estava
sendo pensado como escrita da história para o território nacional.
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ANEXOS
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DECLARAÇÃO
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Maiane Aldlin Bittencourt