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Recursos Minerais

no Brasil
problemas e desafios
Tecnologia
mineral: pesquisa,
desenvolvimento
e inovação
Panorama na mineração brasileira

Fernando A. Freitas Lins


Centro de Tecnologia Mineral - CETEM

RESUMO

Apresenta-se um panorama dos investimentos dos últimos anos em P&DI na mineração brasileira.
Mostra-se que é flagrante a falta de correspondência entre a importância do setor mineral para o
Brasil, por sua contribuição para o PIB e ao comércio exterior, e o orçamento e o número de cientistas
e técnicos das instituições de P&D dedicadas a cada um dos setores usados para comparação (agri-
cultura, petróleo, e energia elétrica). São analisados a evolução da Pintec (2000-2011) e o aumento
das atividades de pesquisa e inovação em razão da renúncia fiscal da Lei do Bem (2006-2012) com
respeito à mineração.

Palavras-chave Tecnologia Mineral. Investimentos em PD&I. Mineração Brasileira.


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INTRODUÇÃO com tecnologia rudimentar ou com processos de alta


tecnologia. Evidentemente, tal raciocínio confunde
O Brasil apresenta potencial para expandir e se consoli- o leigo ao comparar um produto tradicional como a
dar como uma liderança mundial na produção mineral. commodity mineral com um produto moderno como
O aproveitamento econômico dos depósitos minerais um tablet, que é um produto de alta tecnologia.
depende, dentre outros, do desenvolvimento de tec- Para alcançar um nível internacional de desen-
nologias específicas para cada caso, que permitam a volvimento de tecnologias, investir em P&D é um
concentração dos minerais de minério bem como a pré-requisito fundamental: investimento público e
extração dos seus elementos químicos de modo sus- do setor produtivo, pois a inovação tecnológica se
tentável, para serem usados na indústria. As grandes concretiza na indústria.
empresas que atuam no país certamente adotam, ou
adotarão no futuro, as melhores tecnologias disponí-
veis, que são importadas, no entanto, em sua maioria. PANORAMA DA TECNOLOGIA MINERAL
Mas o Brasil também apresenta potencial para se NO BRASIL
tornar um líder global no desenvolvimento de tec-
nologias a longo prazo e de se estabelecer como um O Brasil investe adequadamente em P&D no setor
exportador de tecnologia mineral. Nesse sentido, é mineral? A Tabela 1 apresenta o investimento público
oportuno ter em conta a diferença entre tecnologia de federal em P&D no setor mineral e faz a comparação
processo e de produto. A primeira diz respeito ao modo com outros setores econômicos que também apresen-
de fabricação, que pode ser rudimentar (por exemplo, tam como base os recursos naturais. Qualquer que seja
um garimpo de ouro) ou fazer uso da tecnologia mais o critério de análise, é flagrante a falta de correspon-
sofisticada disponível para a produção de ouro, com dência entre a importância do setor mineral para o
minas operadas com tecnologias de informação e Brasil, por sua contribuição para o PIB e ao comércio
comunicação (TICs) embarcadas nos equipamentos e exterior, e o orçamento e o número de cientistas e
nos controles dos sistemas de operação, eventualmente técnicos das instituições de P&D dedicadas a cada um
operação com controle remoto. Em ambos os casos, o dos setores em consideração.
produto final comercializável é ouro, obtido através de Dá para inferir, por exemplo, sem muito esforço,
processos distintos e com diferentes graus de pureza porquê alcançamos competência na produção de pe-
nos exemplos apontados. Parece óbvia essa explicação, tróleo em águas profundas, a caminho do Pré-sal, ou
mas tem sido comum analistas desinformados classi- porquê a moderna agricultura é sempre citada como
ficarem a mineração como uma atividade industrial orgulho nacional. A lacuna do P&D em mineração
de “baixa tecnologia”, sem a devida explicação de que necessita de uma reforma urgente ou o país perma-
os produtos da mineração, como também em geral necerá refém dos avanços tecnológicos desenvolvidos
os produtos da agricultura, podem ser produzidos no exterior.
246 Recursos Minerais no Brasil: problemas e desafios

Tabela 1 Recursos em P&D de setores econômicos baseados em recursos naturais.


Setor Econômico Participação do Setor no Instituições Setoriais de P&D
PIB Saldo Comercial Instituição Orçamento Empregados
Petróleo&Gás - US$ 5,7 Bi CENPES/MME R$ 2,0 Bi 4.000
4,7%
Energia Elétrica n.d. CEPEL/MME R$ 230 Mi 600

Mineral 3,9% US$ 27 Bi CETEM/MCTI R$ 30 Mi 350

Agropecuário 6,0% US 79 Bi EMBRAPA/MAPA R$ 2,1 Bi 9.800

(Fonte: Elaborada pelo autor, a partir de informações de MCTI; MME; EMPRAPA; IBGE, 2012).

Notas: (1) PIB do setor energético inclui a produção de P&G, refino de petróleo e a geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; (2) PIB do
setor mineral inclui a mineração, metalurgia extrativa e a produção de não-metálicos; (3) Comércio exterior de P&G inclui petróleo, derivados de petró-
leo, gás natural e GNL; (4) Comércio exterior do setor mineral inclui minérios, metais/ligas e produtos não-metálicos; e (5) CENPES e CETEM incluem
empregados terceirizados.

A Tabela 2 reforça a análise em andamento quando leira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) que
mostra a assimetria de recursos destinados ao setor possibilita que um projeto de P,D&I seja realizado em
mineral e aos demais setores usados para comparação, uma instituição de ciência e tecnologia e tenha um
por meio dos investimentos obrigatórios e dos fundos custo para a empresa contratante de um terço apenas
setoriais específicos. do custo total.
Tabela 2 Investimentos obrigatórios de P&D e recursos de fundos setoriais de setores econômicos baseados em recursos naturais.
Setor Econômico Investimentos Obrigatórios e Fundos Setoriais
ANP ANEEL DNPM FNDCT (MCTI) Total
Petróleo&Gás R$ 1,2 Bi R$ 1,4 Bi R$ 2,6 Bi

Energia Elétrica R$ 150 Mi RS 280 Mi R$ 430 Mi

Mineral ZERO R$ 36 Mi R$ 36 Mi

Agropecuário R$ 130 Mi R$ 130 Mi

(Fonte: Elaborada pelo autor, a partir de informações de MCTI, 2012).


Obs: Investimentos obrigatórios são aqueles mínimos estipulados por ANP e ANEEL para as empresas/concessionárias reguladas por estas Agências.
Não existe essa obrigação para as empresas de mineração.

Entrementes, ao setor privado nacional cabe tam- O superciclo de quase 10 anos de grande valorização
bém estimular, em seu próprio benefício, nossas uni- das commodities minerais exauriu-se. Nessas condições
versidades e centros de pesquisa a se dedicarem à atuais menos favoráveis, é fundamental perseguir o
busca de soluções tecnológicas. A competitividade aumento da produtividade e a diminuição dos custos
de uma empresa ou de um setor industrial específico por meio da inovação tecnológica, assegurando com-
guarda relação com a competitividade do país e esta petitividade às empresas brasileiras e, ainda, sob as
passa, entre outros fatores, pelo estabelecimento de condicionantes da sustentabilidade ambiental.
um sistema de C,T&I. Os investimentos privados em P&D na mineração
Houve avanços e iniciativas importantes neste brasileira podem ser apreciados na Tabela 3, na qual são
século para a promoção de um ambiente favorável a apresentados os dados do PINTEC e da Lei do Bem (de
atividades de inovação,a exemplo de: criação dos fun- renúncia fiscal). É importante ressaltar que na PINTEC
dos setoriais, inclusive um voltado para a mineração; a indústria extrativa pode ser considerada uma proxy
Lei da Inovação; Lei do Bem; os institutos nacionais razoável da extrativa mineral, ou seja, da mineração,
de ciência e tecnologia (INCTs); o Programa Ciência uma vez que os dados da extração de petróleo e gás são
sem Fronteira; o Programa Inova Empresa (para o adicionados à atividade econômica de maior receita
setor mineral deverá ser lançado um edital no início da empresa, no caso a atividade de refino de petróleo,
de 2016, o InovaMin); e a criação da Empresa Brasi- seguindo-se a metodologia internacional.
Capítulo III Tecnologia Mineral 247

Tabela 3 Informações da PINTEC e do uso da Lei do Bem na Mineração.

PINTEC 2000 2003 2005 2008 2011


N.E. / Taxa de Inovação (%)(1) 297 / 17,2 415 / 22,0 427 / 23,1 491 / 23,7 458 / 18,9

N.E. /Atividades Inovativas (R$ Mi)(2) 226 / 189 325 / 385 330/ 681 354 / 496 366 / 768

N.E. / P&D interno (R$ Mi) 69 / 29 76 / 28 18 / 78 100 / 74 23 / 437

Receita Líquida de Vendas (R$ Bi) 12,8 23,9 37,9 56,7 110

Intensidade Tecnológica (%)(3) 0,23 0,12 0,20 0,13 0,40

N.E. / P&D externo (R$ Mi) 39 / 6,7 65 / 5,6 14/ 12 18 / 13 14 / 25

LEI DO BEM 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012


N.E. / Renúncia Fiscal (R$ Mi) 2/2 1 / 0,1 1/1 4 / 0,6 7/9 13 / 12 18 / 32

(Fonte: Elaborada pelo autor, a partir de informações de PINTEC/IBGE e MCTI, 2012).


Obs.: N.E. é o número de empresas inovadoras conforme discriminado em cada linha.
Notas: (1) A taxa de inovação é definida como o percentual das empresas que declararam ter implementado inovações durante o triênio encerrado no
ano de referência, por exemplo, em 2000, no período 1998-2000, enquanto as demais linhas da tabela correspondem ao ano referido; (2) As atividades
inovativas incluem: aquisição de máquinas e equipamentos; aquisição de software; P&D interno; P&D contratado; treinamento; introdução de inovações
tecnológicas no mercado; e projeto industrial; (3) A intensidade tecnológica é medida pelo dispêndio interno em P&D com relação à receita líquida de
vendas, cujo total se aproxima, no caso da Mineração, do Valor da Produção Mineral.

Verifica-se na Tabela 3 que a taxa de inovação da empresas de mineração beneficiadas e a renúncia fiscal
mineração mostra uma evolução, com o aumento do por investimento em inovação. Nos primeiros quatro
número de empresas inovadoras. A queda da taxa em anos, possivelmente um período de aprendizado sobre
2011, para 18,9%, é menos afetada pelo decréscimo de esse incentivo fiscal, houve pouca adesão. Percebe-
empresas inovadoras e mais pelo aumento do número -se, todavia, a partir de 2010, o aumento significativo
de empresas consultadas do universo: 2.421, no período do interesse para utilizar a Lei do Bem. Com efeito,
2009-2011, e 2.076, em 2006-2008. As atividades inova- uma adesão crescente se manifesta, alcançando R$
tivas, uma série de elementos de despesas voltadas à 32 milhões de renúncia em 2012 (último ano dispo-
inovação, incluindo P&D, crescem significativamente nível), correspondendo a 18 empresas. Entre estas,
em valor no período, com destaque para 2011, alcan- encontram-se a Vale, Imerys, Samarco, CBMM e Usi-
çando R$ 768 milhões, enquanto se mantém no mesmo minas Mineração.
patamar o número de empresas. Em resumo, a análise dos números da Tabela 3
Com relação a P&D intra-muros, há uma oscilação mostra um incremento nas atividades inovativas, es-
muito grande no número de empresas, mas verifica-se pecialmente nos últimos anos. São boas notícias que
um aumento no dispêndio, especialmente, em 2011, apontam, potencialmente, para o aumento futuro da
de R$ 437 milhões. A intensidade tecnológica da mi- produtividade e da competitividade da mineração bra-
neração segue o mesmo padrão, alcançando 0,40% em sileira.Um desafio para os próximos anos é fazer desse
2011, mais do dobro da média dos anos anteriores. Já o esforço, público e privado, uma prática de inovação
número de empresas que contratam P&D é pequeno, mais eficiente, com melhores resultados.
apenas 14 em 2011, e baixo o dispêndio, embora cres- Finalizando, cabe uma atenção especial às micro
cente, atingindo R$ 25 milhões em 2011, quase o dobro e pequenas empresas (MPEs) de mineração, as quais
de 2008. O baixo dispêndio pode ser uma aparente con- constituem mais de 80% do universo de empresas e
tradição com o discurso recente das grandes empresas respondem por menos de 10% dos royalties (CFEM) ar-
de mineração, que têm afirmado uma preferência pela recadados. Propõe-se aqui que um percentual da CFEM
inovação aberta. Possivelmente, a próxima PINTEC devida à União pelas MPEs possa ser transformada em
deverá capturar essa disposição. crédito (vouchers) para utilização no pagamento de
O segundo documento consultado é o relatório serviços técnicos especializados a instituições/labora-
anual da utilização dos incentivos fiscais, do MCTI, com tórios credenciados. Seriam recursos descentralizados
base na Lei do Bem (de 2005), que analisa o período para a melhoria da eficiência técnica e ambiental de
2006-2012. A tabela mostra a evolução do número de processos e de produtos das MPEs.

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