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Prefácio da nova edição em português da Ratio Studiorum

'Código Pedagógico dos Jesuítas. Ratio Studiorum da Companhia de Jesus (edição bilíngüe
latim/português)', de Maria Margarida Miranda (tradutora e organizadora). Lisboa, Editora Esfera
do Caos, 2010, 286 p

A Editora Esfera do Caos vem preencher uma carência do público de


língua portuguesa com esta primorosa edição bilingüe da Ratio Studiorum.
Atende a uma demanda antiga, pois, a única edição da Ratio em
português, publicada pela Editora Agir em 1952 no Rio de Janeiro, há
muito estava esgotada e carecia de revisão: O Método Pedagógico dos
Jesuítas. O Ratio Studiorum, com tradução, introdução, notas e
bibliografia elaboradas pelo eminente jesuíta brasileiro Pe. Leonel Franca.
Mas – poderiam perguntar alguns educadores iniciantes – tem valor
a publicação de um texto educativo do século XVI quando, em pleno
século XXI nos encontramos com diversos aportes pedagógicos mais
variados e entrelaçados com as ciências humanas?
A Ratio Studiorum adquiriu seu lugar insubstituível na história da
pedagogia, com uma vigência que durou cerca de 150 anos. Ela tem
presença assegurada nos currículos de formação na área da educação na
maioria das instituições educativas de nível superior.
E mais. A Ratio foi, como o próprio nome o diz, a ordenação ou
sistematização dos estudos, a primeira que se fez no mundo. O
documento não pretendeu ser um tratado pedagógico, rigorosamente
falando, porque os que se empenhariam em aplicá-la - os jesuítas - já
tinham assimilado na própria formação religiosa, os princípios pedagógicos
provenientes da experiência, da visão e dos escritos do fundador da
Companhia de Jesus, Santo Inácio de Loyola, notadamente os Exercícios
Espirituais. Por isso, a Ratio foi mais um manual de administração, de
funções, de procedimentos, de extrema validade que dava corpo ao
espírito de uma educação humanista e personalizadora.
A riqueza da Ratio pode ser de muita inspiração para o trabalho
educativo nos tempos atuais. Em primeiro lugar devido ao seu próprio
objetivo: dotar o espírito do trabalho educativo de um corpo que lhe
assegure identidade, consistência, articulação e continuidade. O conjunto
de normas e prescrições da Ratio visava a excelência educativa, por isso
era necessário prevenir-se da improvisação, do espontaneísmo, da
superficialidade. A Ratio ainda é proveitosa pelo ideal personalizador, que
leva o educador a considerar o aluno como merecedor do maior respeito e
ajuda para a plenificação de todas as suas potencialidades. Em terceiro
lugar, a riqueza da Ratio transparece ao considerar o trabalho educativo
fundamentalmente como construção pessoal do primeiro interessado, o
aluno, que o realiza, ajudado por mediações diversas, definidas,
adaptadas à sua capacidade e estágio de desenvolvimento. A Ratio indica
uma variedade de procedimentos didáticos que correspondem às diversas
facetas da formação integral. A Ratio ilumina, também, ao respaldar o
trabalho do professor, visto mais como estímulo da excelência à qual cada
aluno pode chegar, ao invés de um repasse de conteúdos a serem
assimilados. Finalmente, o detalhamento de quase 600 prescrições, em 30
conjuntos de regras da Ratio, inspira a instituição educativa a atuar de
acordo com regulamentos, compreendidos não como limite, mas como um
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referencial necessário para a sua avaliação e crescimento, que independe
do saber ou da vontade unilateral de quem a dirige.
A celebração do 4º. centenário - em 1999 - da publicação definitiva
da Ratio Studiorum, suscitou um sem número de eventos e publicações
nos diversos pontos do mundo. Ampliou-se, com isso, a bibliografia sobre
o tema, apoiando o trabalho de pesquisas educacionais. Tal profusão de
iniciativas comprova que a Ratio conserva uma riqueza que merece ser
descoberta, provocando a leitura das ‘entrelinhas’ do texto que, à primeira
vista, pode parecer meramente disciplinar e prescritivo.
Professores, pesquisadores e estudiosos de educação recebem
agora, da capacidade e do empenho da Profa. Dra. Margarida Miranda,
uma edição cuidadosa da Ratio. Professora associada da Universidade de
Coimbra (Portugal), a Dra. Margarida doutorou-se com o Prof. Américo
Costa Ramalho, eminente latinista, e tem o seu currículo enriquecido com
mais de 50 publicações. Devem-se-lhe a iniciativa do texto, a versão, a
introdução, notas e a ampla bibliografia ao final.
Colaborador e incentivador desta obra é o jesuíta Pe. José Manuel
Martins Lopes, Professor convidado da Faculdade de Filosofia do Centro
Regional de Braga da Universidade Católica Portuguesa e atual diretor
geral do Colégio da Imaculada Conceição, em Cernache - Coimbra
(Portugal), doutor em ciências da educação pela Universidade Pontifícia
Salesiana, de Roma, com livros e artigos publicados sobre o projeto
educativo dos jesuítas.
Se considerarmos a dificuldade do texto original da Ratio em latim, é
de enaltecer a bela tradução que agora temos em mãos. Na verdade,
trata-se de um texto fluido, agradável, elegante, de imediata
compreensão, que animará os leitores e pesquisadores a lê-lo na sua
integralidade. Os dois textos iniciais, o ‘Proêmio’ e ‘Ratio Studiorum: um
modelo pedagógico’, respectivamente da Dra. Margarida e do Pe. José
Manuel, oferecem-nos uma contextualização estimulante para a
abordagem proveitosa do texto.

Rio de Janeiro, abril de 2009.


Pe. Luiz Fernando Klein, S.J.
Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo

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