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PROF. FABIO DE MACEDO SOARES GUIMARAES (cnere px szcgio BE esrvnor GeooRinicos 0 & ©. FF) DivisdO REGIONAL DO BRASIL 1992 SERVICO GRAFICO DO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA & ESTATISTICA RIO DE JANEIRO DIVISAO REGIONAL DO BRASIL Prof. Fabio Macedo Soares Guimardes hefe da SecgKo de Estudos Geograficos do SG-EF, I — NECESSIDADE DA FIXAGAO DUMA DIVISAO UNICA © estudo dum grande territério, como 0 do Brasil, segundo os métodos da Geografia moderna, exige, como condicio de éxito, a sua divisio em unidades menores, as chamadas “regides naturais”. Desde que o pais ndo apresenta homo- geneidade de aspectos, ¢ forcoso estud-lo por partes, nos seus pormenores, para efetuar-se posteriormente a sintese final. Afim de realizar-se trabalho fecundo em resultados, é mister, porém, que tais partes ndo seiam escolhidas arbitraria- mente, mas sim que obedecam a disposicdo determinada pela natureza, ce modo que cada uma delas apresente uma certa unidade de conjunto, resultante da correlac&o entre os diversos fatos geograficos que nela se observem. & éste 0 problema fundamental da Geografia Regional e podemos mesmo afirmar, com Lucien Fesvrz: “no ha problema mais importante, em Geografia, do que 0 problema das divisdes”?* Ao estudioso do nosso pais a situacdo apresenta-se, porém, de modo a causar grande perplexidade, tal a disparidade das divisdes propostas pelos varios autores ou adotadas pelas Instituicées oficiais, Variam extraordinariamente, quer 0 nt- mero, quer os limites das regides admitidas por uns e outros. Quando um autor se refere, por exemplo, ao Nordeste do Brasil, fica-se frequentemente em duvida quanto ao trecho do territério nacional que éle quer considerar: para uns, tal regido abrange nove Estados, desde 0 Maranhao até a Baia, enquanto que para outros ela compreende apenas cinco, do Ceara a Alagoas. A primeira vista, tem-se a impressio de que tal disparidade, tal flutuacdo, sejam devidas principalmente A deficiéncia do conhecimento do territério, Nao € essa, porém, a verdadeira causa; pois grande jé ¢ 0 trabalho realizado em nosso pais por competentes geégrafos, quer nacionais, quer estrangeiros, desde mais dum século, e no entanto divisdes regionais diferentes surgem em miimero cada vez maior; além disso observa-se que é justamente quanto & parte mais bem conhecida do Brasil, a oriental, que maior 6 a yariedade de regiées consideradas. A éste caso bem se pode aplicar a afirmacio aparentemente paradoxal de Catt VaLLAUx: Plus vous découvrez et plus vous précisez de détails, moins Vensemble apparait.? que nao basta conhecer; € preciso também interpretar, explicar. Quanto mais se desenvolve a Geografia como descricdo, tanto mais se exige que se acentue 0 seu cardter explicativo; e tal carater, forea € confessa-lo, s6 recen- temente se vem impondo & Geografia brasileira, Parece-nos, assim, que os motivos da desordem atualmente observada na divisio regional estdo antes na variedade de critérios adotados e mesmo em certa falta de rigor cientifico quanto ao conceito de “regiéo natural”. Em vez de se basearem no conjunto dos caracteres de cada regido, muitos autores dio pre- feréncia a determinados aspectos isolados: «uns se baseiam sistematicamente no tipo de relévo, outros no clima, outros na vegetacio, outros nos fatos econdmicos ou ainda na simples posicio geografica. Se ésses diversos autores denominassem 1 Lucm Praver — La Terre et U'fvolution Humaine — 1938 — pg. 107. + Caumsx Vantavx — Les Solences Géographiques — 1929 — pag. 14. 4 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES sempre com clareza as suas divisdes, acrescentando ao térmo “regiées” os qualifi- cativos adequados (“orograficas”, “climaticas”, “boténicas” ou “econémicas”, con- forme 0 caso) desapareceria o perigo de confusio; acontece, porém, que geral- mente as denominam inadequadamente “regides naturais” ou entao simplesmente “regides”, sem tornarem explicito o critério que presidiu a divisio. Outra causa de disparidade esté na variedade do mimero de regides, uns restringindo-o, outros aumentando-o excessivamente. O problema alids ndo é facil € sua solucdo exige um grande senso de equilibrio da parte do gedgrafo. A coincidéncia entre os limites das regides e as divisas das unidades politicas ou 0 critério oposto, o da completa independéncia entre divisio regional e divisio politica, constitue ainda um terceiro motivo de disparidade. Tal fato é perfeita- mente explicdvel, pois no primeiro caso trata-se da solu¢do dum problema pré- tico: 0 estabelecimento duma divisio regional para fins administrativos, esta- tisticos ou mesmo didaticos; no segundo, trata-se dum problema teérico, relativo a Geografia como cléneia, Independentemente de fins utilitarios, e é entdo que devem ser consideradas, no rigor da expresso, as “regiées naturais”, as quais, de regra, nunca coincidem com as unidades politicas, isoladas ou agrupadas. Qualquer debate entre os que seguem um ou outro critério é, portanto, inteira- mente inttil, pois trata-se entdo da solucdo de dois problemas diferentes. £ evidente, porém, que o problema fundamental é 0 da determinagdo das “regides naturais”. Sua solugio depende do conhecimento exato do territério e também da competéncia dos geégrafos, aos quais cabe interpretar, explicar os fatos geograficos, descobrindo as conexdes que existem entre éles, as suas interre- lacdes, as consequéneias que deles decorrem, chegando assim a bem definir os diversos quadros naturais, que compéem cada pais. Pode-se, assim, afirmar que, uma vez perfeitamente conhecidos e interpretados os fatos geograficos, um dado territério sé podera admitir uma tnica divisio em regides naturais. Trata-se, evidentemente, dum ideal longinquo a atingir-se, e nunca se poderé dizer, em dado momento, que se chegou divisio definitiva. Novas observaces, novas inter- pretacdes mais corretas, permitirao sempre um progressivo aperfeicoamento da divisio regional deve ser sempre deixado aos gedgrafos 0 campo livre, em sua busea incessante da verdade. Nenhuma lei devera pretender fixar uma divisio dum pais em “regides naturais”, pois trata-se, ent&o, de assunto do dominio exclusivamente cientifico. JA o problema pratico é de ordem bastante diversa. Trata-se duma divisio regional para fins administrativos, para fins utllitarios, em suma. Nesse caso nao se pode fazer abstracdo das unidades politicas em que se divide um pais, pois tais unidades sdo os diferentes setores territoriais da administracdo publica. O problema pode neste caso definir-se em térmos bastante simples: de que modo se devem agrupar as diversas unidades politicas dum pais? Quantos agrupa- mentos se devem formar ? Quais as unidades que devem compor cada um désses agrupamentos ou regides ? # claro que tais agrupamentos se poderdo fazer das mais diversas maneiras. ‘Tudo consiste na determinacdo da modalidade mais adequada, e para isso deve-se ter primordialmente em vista quais as vantagens que se buseam, quando se retinem unidades politicas em regides. A primeira vantagem consiste numa visio sintética das realidades dum dado territério. Nao se podera ter uma idéia de conjunto dum grande pais como o Brasil, se todos os dados forem distribuidos pelas suas vinte e duas unidades poli- ticas, $6 se podera ter uma rapida compreensio das realidades brasileiras, se ésses dados forem agrupados em regides pouco numerosas. Em segundo lugar, as proprias necessidades administrativas exigem ésse agrupamento, Um breve estudo da situac&o das diversas unidades politicas revela imediatamente que varias delas apresentam idénticos problemas administrativos, diferentes, por sua vez, dos que se manifestam em outras. & cléssiea, no Brasil, a DIVISAO REGIONAL DO BRASIL > relativa identidade de problemas que apresentam os Estados nordestinos, sob ‘a imposi¢ao da situacdo climatica, problemas ésses completamente diferentes dos que ocorrem na Amazénia. £ dificil mesmo encontrar-se exemplo mais tipico de contraste entre duas regides. O exemplo mostra ainda claramente que tals seme- Ihangas e tais contrastes que os problemas apresentam, decorrem dos fatos geo- graficos, surgindo principalmente por imperativo do meio fisico. Trecho do rio Amazonas nas prozimidades da cidade de Faro (Para). Aspecto tinico da Amaz6nia, ‘com suas extensas plantcies, seus largos rios e sua densa jloresta equatorial Foto Rembrandt (Fototeca do S.G.E.F.) Do acima exposto, conclue-se que a divisio regional mais adequada, mesmo do ponto de vista pratico, é a que mais se aproximar das realidades geograficas; ou, em outras palavras, tais regides devem assemelhar-se 0 mais possivel As “regies naturais”. Cabe assim ao gedgrafo fornecer a base para a solucio do problema pratico, resolvendo previamente 0 tedrico, do ponto de vista cientifico, com o estabelecimento duma divisio em “regides naturais”. Com tal base, estara apto 0 administrador a encontrar a melhor solucdo pratica, modificando conveni- entemente, de acérdo com as necessidades administrativas, a divisio que Ihe é apresentada pelo geégrafo. # interessante observar-se que alguns estatisticos, compreendendo o grande valor das unidades regionais consideradas pela Geografia, adotaram um ponto de vista bastante radical. Assim é que Grorc von Mayr, um dos mais ilustres mestres da Estatistica, em sua obra Statistik und Geselischaftslehre (1895) , acon- selhava que os dados estatisticos nfo féssem referidos as unidades administra- tivas e sim diretamente as regides naturais, delimitadas pelas indicacées geo- Jogicas, hidrogrificas, orograficas, etc.. Era o sistema por éle chamado de “mé- todo geografico” em substituicéo ao “método administrativo”.’ Jé anteriormente, em 1891, K. T. von Ivama Srernzco escrevia na revista Statistiche Monatschrift que “a moderna anilise, em matéria estatistica, é cada vez mais geografica, Jeva em conta cada vez mais as pequenas unidades geograficas”.‘ Tal ponto * Jew Browns — La Géographie Humaine — 1934 — pig. 777 + Idem — pig. 773. 6 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES Aspecto tipico da regido semindrida do Nordeste, com sua vegetagdo zeréfila, (caatinga). Foto Firada nas prozimidades da cachoeira de Paulo AJonso, A comparaedo com a fotografia anterior ‘mostra 0 contraste entre a Amazonia super-imida eo Nordeste semi-drido. Foto Mario Baldi (Fototeca S.G-E.F.) de vista representa certamente um ideal remoto a atingir-se, pelo qual, diz Jean Brunuss, les statisticiens rejoignent de plus en plus les géographes;* mas, até o presente, todos os dados estatisticos sio referidos a circunsericées administrativas e dessa forma os limites de regides devem forcosamente coincidir com divisas de clreunsericées. Esta circunstncia é reconhecida pelos geégrafos.* Estabelecida uma boa divisio regional, do ponto de vista pratico, é absoluta- mente indispensavel que seja considerada tnica, isto 6, que seja adotada por todos os setores administrativos ou, pelo menos, pela maioria deles, sé se per- mitindo excecdes em certos casos muito especiais (como seja, por exemplo, 0 caso de divisdes relativas & defesa nacional). ‘Cuamtxs C. Cour — “Source Book for the Economic Geography of North America” — 1930 < pig. XXII —' “the divisions made, however, only approzimate the true geographic regions, Dectuse the statistics, on which ‘much of the present survey must be based, are available only by political divisions”. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL 1 A uniformidade se impée, indiscutivelmente, da maneira mais forte, quando se trata de divisio regional para fins estatisticos. A multiplicidade de divisdes tora impossivel a compara¢&o de dados estatisticos agrupados de modo diverso por uns e outros. E certo que, se os dados forem apresentados pelas unidades politicas (além de o serem pelas regives), seré sempre possivel ao estudioso reagrup-los num sistema uniforme, para obter as sinteses regionais. Tal rea- grupamento é, porém, sempre um trabalho penoso e importa em deploravel dis- perdicio de tempo, que se poderia perfeitamente evitar se todos adotassem uma inica divisio. Mais grave, porém, é 0 caso frequente em que os dados so apre- sentados apenas globalmente, pelas regides; qualquer comparacéo, qualquer sin- (ese, so ento irrealizaveis, tratando-se de sistemas diferentes de divisiio regional. Um grande passo no sentido da uniformizacao j4 foi dado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica. Pela resolucio n° 75, de 18 de Julho de 1938, que “fixa disposicdes normativas para a apresentacdo tabular da estatistica brasileira”, a Assembléia Geral do Conselho Nacional de Estatistica estabeleceu a maneira pela qual deve ser feita a regionalizacdo (alinea 5 do anexo no 3: Normas especiais para a elavoracdo de quadros para 0 Anudrio Estatistico do Brasil), permitindo contudo excegdes para o caso de inspetorias ou regises esta- belecidas por lei. Seria altamente desejavel que estas iiltimas fossem uniformi- zadas 0 mais possivel, mediante entendimento com as repartigdes interessadas. Outra divisio, bastante diferente da estabelecida pelo Instituto, foi, porém, adotada pelo Conselho Técnico de Economia e de base aos trabalhos da Conferéncia Nacional de Economia e Administracéo. Outra forma assaz diversa de agrupar as unidades politicas é adotada pelos com- péndios de Geografia, neste caso em virtude de razées de ordem didatica, pela necessidade de tais agrupamentos se aproximarem o mais possivel das resides naturais do pais. claro que qualquer estudioso da situacdo brasileira podera ainda apresentar os dados estatisticos agrupados da maneira que The parecer mais conveniente. A situacdo atual no que se refere & divisio regional brasileira di margem a frequentes confusdes. Apenas a titulo de expressivo exemplo, citamos uma notfcia dada em prestigioso érgao da imprensa, relativa 4 distribuiedo percentual de alguns aspectos da economia nacional, por zonas. A noticia estampa um mapa mostrando a divisio em zonas geo-econdmicas, adotada pelo Conselho Técnico de Economia e Financas e também um quadro estatistico com a distribuiedo per- centual acima citada. Acontece, porém, que tal quadro se refere & divisio em zonas adotada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica, sem que, no entanto tal fato venha referido na noticia, © leitor fica, certamente, perplexo ao verificar que a populacéo da regido central (que no mapa é composta de Golaz e Mato Grosso) representa 20,78 % da populacao total do Brasil. # que tal regido, segundo 0 Instituto, abrange ainda o populoso Estado de Minas Gerais. Este exemplo mostra como a diversidade de divisdes pode acarretar confusdes graves. No tocante & divisio regional, a situacio apresenta no nosso pais grandes analogias com a desordem que existia na divisdo territorial, antes do decreto-lei n° 311, justamente cognominado de “lel geogrdfica do Estado Novo” e uma das mais fecundas realizacdes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica. # urgente, por conseguinte, que seja adotada uma divisio regional unica para fins estatisticos, e que esta permaneca estavel por um largo periodo, abran- gendo diversos recenseamentos que se forem realizando, afim de que se possam comparar as situagdes do pais em diferentes épocas. Quanto aos fins administrativos propriamente ditos, é claro que tal unifor- midade ser mais dificil de conseguir-se, pois ha certos setores da administracio que necessitam de divisdes particulares, em virtude de requisitos especiais, como seja, por exemplo, a facilidade de comunicacées. Haveré contudo grande niimero de Servigos, que adotaram divisdes diversas sem nenhum imperativo forte, apenas a FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES por nfo ter havido entre éles nenhum entendimento prévio e que poderdo, sem inconvenientes, modificd-las no sentido da uniformizacio. Aqueles que ndo 0 puderem fazer, por motivos especials, deverdio, nesse caso dar As suas regides nomes (ou niimeros) diferentes dos que forem usados na divisio oficial tinica para fins estatisticos. Qualquer confusio oriunda do fato do mesmo nome indicar Aiferentes trechos do territério nacional, deverd ser sistematicamente evitada. # interessante notar-se que o Brasil ndo constitue caso particular no assunto de que tratamos. Podemos mesmo dizer que o problema da divisio regional esté na ordem do dia em muitos paises de adiantada organizacio. Sintoma disso 6 0 grande niimero de trabalhos referentes a éste tema, publicados recen- temente em livros e revistas técnicas estrangeiras, traduzindo um verdadeir movimento cultural denominado, de modo um tanto equivoco, de “regionalismo’ Como exemplo, podemos citar um excelente artigo, intitulado Regionalismo pratico na Inglaterra e no pais de Gales, em que E. W. Gruserr mostra como é grande a diversidade de divisdes regionais adotadas em seu pais. Em tal artigo, faz o autor um veemente apélo para que seja estabelecido “um esquema ideal e pratico para adocdo geral” mediante a cooperacdo de gedgrafos e adminis- tradores; salienta sobretudo a necessidade duma divisio tnica para fins esta- tisticos, assim descrevendo a situacéo na Inglaterra: “O presente estado de con- fus&io em que areas diferentes sao adotadas para diferentes classes de estatis- ticas e que, em alguns casos, mudam em recenseamentos subsequentes, deveria ser abolido”. Cita ainda a opinido dum escritor americano, Professor E. G. Mears, que “chamou a atencao para a dificuldade de interpretar e comparar as infor- magées estatisticas britanicas, devido a falta de uniformidade nas regides usadas” Situacdo andloga, referente a Portugal, é assim descrita pelo eminente gedgrafo lusitano Anistipes pe AMmonint Girio: “temos um aparatoso cortejo de Givisdes e sub-divisées de varios nomes, tamanhos, qualidades e quantidades — distritos judiciais, circulos eleitorais, regiées militares, sanitdrias, escolares, hidraulicas, de estradas, ete. — quando haveria téda a vantagem em uniformizar éste cadtico estado de coisas, fazendo-as coineidir tanto quanto possivel com as divisées elvis e administrativas”.* No artigo ha pouco citado, lembra E. W. Grzserr o exemplo dado pela Franca que, desde 1920, estabeleceu um tnico sistema regional para fins estatisticos e também, mais recentemente, pela Alemanha que, em 1936, fixou uma divisio em regides econdmicas. Tratando embora duma divisio de ordem pratica, ressalva © autor que a desejada uniformidade deve ser baseada na realidade geografica (e néo numa escolha arbitraria) e logo no inicio do seu artigo refere-se ao tra- balho apresentado & Royal Geographical Society pelo Professor Fawcert, inti. tulado Natural divisions of England (1917). Como ja fizemos notar, a divisio pratica ideal é a que se aproxime o mais possivel da diviséo em “regides naturais”. Mesmo, porém, que tal aproximacio ideal no seja possivel, por motivos de ordem administrativa e econdmica, o que € sobretudo essencial 6 que haja uniformidade, prineipalmente para fins esta- tistics, # indispensdvel que, quando houver referéncia a uma regio (por exem- plo, ao Nordeste), nfo haja diividas quanto aos Estados que nela estdo incluidos. Seria desejavel que chegassemos & situagdo dos Estados Unidos que ha muito j4 adotaram uma tinica divisio pratica, estabelecida pelo U. 8. Census Bureau, em nove regides, Quando um autor americano se refere, por exemplo, a New England, nfo ha dtivida que éle queira indicar 0 conjunto dos Estados de Maine, New Hampshire, Vermont, Massachusetts, Rhode Island e Connecticut, e fato anélogo acontece com as outras regides. ° 8, W. Guam — “Practical Regionalism in England and Wales” — (The Geographical Journal, érgio da Royal Geographical Society, Londres — Julno de 1930). 1 Amisrives vz Aqonmm Ginko — “Esbé¢o duma Carta Regional de Portugal” — 1993 — pag. XVI. DIVISKO REGIONAL DO BRASIL ° © essencial — nao é de mais repetir — é que se fixe uma tinica divisdo re- gional pratica, para que nao continue a dominar a presente situacéio, que redunda em grande desperdicio de esforcos da parte de todos os que procuram cooperar no melhor conhecimento da Terra e do Homem brasileiros. Conforme ja salientamos, cabe antes ao gedgrafo estabelecer a divisio em “regides naturals”, base para a solueao do problema pratico. Il — CONCEITO DE REGIAO NATURAL a) — Defini¢do — Método a seguir na caracterizagdo Os gedgrafos ha muito j4 fixaram o conceito de regio natural, de modo relativamente simples. Deriva de dois dos grandes principios que servem de base & Geografia moderna: o principio da extensdo, que serve de base a0 estudo da Gistribuicdo dos fendmenos pela superficie terrestre, respondendo as perguntas “onde” e “até onde”, aliado ao principio da conezdo, do qual resulta o estudo das interrelacées existentes entre os fendmenos que ocorrem no mesmo local. Uma regifio natural s6 pode, pois, ser determinada, apés a andlise da distribuicdo dos fatos geograficos e das influéncias reeiprocas que ésses fatos exercem entre si numa dada extensao. Ela é definida assim, por um conjunto de earacteres (nunca por um tinico isoladamente) correlacionados entre si, pois tal correlacdo é que confere a cada regido natural a sua unidade caracteristica. £ preciso previamente distinguir-se regido elementar e regido natural, con- forme propés 0 geégrafo GrusrPre Riccuterr." As primeiras, também denomi- nadas “provincias” por outros autores, correspondem a divisao de um territéric baseada no estudo duma s6 categoria especial de fendmenos (geologicos, oro- graficos, climéticos, botdnicos, ete.) ; as segundas, que Ricontzr denomina “re- gides geograficas complexas”, correspondem As areas nas quais se superpéem diversas regides elementares. & claro que tal coincidéncia nunca se da exata- mente; na superposicéo de mapas de regides elementares, as diversas linhas limi- trofes via de regra no coineidem, antes se entrecruzam, de modo a termos sempre certas 4reas marginais imprecisas, que séo zonas de transicdo. & esta a grande dificuldade na delimitagdo das regides naturais. Em étimo artigo sdbre “o conceito da regido natural”, da autoria do com- petente gedgrafo Padre Geratno Pavwets, encontra-se a seguinte definicdo, muito simples e concisa: regido natural é um territério que constitue uma unidade por sua prépria natureza fisica tomada dum modo integral.’ As iiltimas palavras da defini¢ao indicam que se deve considerar um con- Junto de fenémenos e nfo um iinico isoladamente. £ a consideracio désse con- Junto que exige grande capacidade de selecio e de interpretacio da parte do gedgrafo; pois evidentemente nao se trata aqui de todos os fenémenos ocorrentes, tomados indistintamente, mas sim daqueles que sio realmente significativos Trata-se de por em destaque aqueles fenémenos que se apresentam como “nota caracteristica”, no dizer expressivo do Pe. Geranpo Pauwets, aqueles que dio “um cunho particular respectiva regiio”.” © mesmo salienta CaMmiie VALLAUX, em sua obra magistral Les Sciences Géographiques, recomendando que se discri- minem os fatos principais, em térno dos quais se agrupam todos os outros: “Em Areas mais ou menos extensas, os fatos da superficie se agrupam logicamente aos nossos olhos segundo determinadas escalas de valores, cuja fixag&o cabe a um agente particular ou a um grupo de agentes, que parecem governar e * Detaxno ox Canvauno — “Metodologia do Bnsino Geogréfico” — 1925 — pags. 81 ¢ 82. + Pe. Graauvo Pauwns — 0 conceito da regido natural ¢ uma tentativa de estadelecer a9 regides naturats do Brasil” (“Revista do Inst. Hist. ¢ Geogr. do RG. Sul” — 1926, T'9 1 T= mestres — Dag. 14). w Pe. Gmatoo Pauwmis — Obra citada — pig. 15. 10 FABIO “MACEDO SOARES GUIMARAES orientar todo o mecanismo de superficie”. # assim, conclue VaLLaux, pelo esta- belecimento duma hierrarquia entre ésses agentes, “que se constituem os agru- pamentos regionais”."* No caso da Amazénia, por exemplo, os elementos fundamentais so 0 clima e 0 relévo, tudo convergindo para a formacdo dessa maravilhosa floresta, a Hiléia, que dé a regido a “nota caracteristica”. Dum modo geral, os elementos fundamentais sao a situacdo geografica, a geologia, o relévo, o clima e a vege- {tac&io. Esté claro que uns elementos condicionam os outros, havendo entre éles uma certa hierarquia segundo a ordem acima indicada; a vegetacio assume, em geral, grande importancia na caracterizacao regional, como uma sintese dos outros fatores. Tais elementos fundamentais ndo atuam, porém, em tédas as regides com a mesma énfase; as notas caracteristicas variam de territério a territério. Na regio Alpina, por exemplo, o fato dominante é 0 relévo; J4 no Saara o relévo passa para segundo plano, e é o clima, com sua aridez, que dé a nota caracte- ristica. No planalto meridional do Brasil, as condicdes geolgicas exercem uma influéneia capital na vegetacio; mas na Amazénia, “a floresta deve quase tudo ao clima, as condiedes do solo mal influem sobre ela”.* Aspecto do planaito meridional, nas prozimidades de Santo Anténio da Alegria (Sdo Paulo) Nota-se @ ocorréncta de matas € campos. NO planaito meridional as condigdes geoldgieas exercem grande influéncia na vegetacdo, aparecendo florestas Dujantes as manchas de terra 702d Foto E.N.F.A, (Fototeca S.G.E.F.) Tais consideracées muito facilitam o problema da caracterizac&o regional, que se tornaria insoliivel caso se considerassem todos os fenémenos, indistin- tamente. Na definig&io que acima foi dada, devemos ressaltar ainda um elemento de grande importancia: a unidade que uma regiao natural apresenta. Convém notar previamente que “unidade nag quer dizer uniformidade”, segundo bem esclarece 8 CaNMLLE VaLLAUK — “Les Sciences Géographiquies” — 1929 — pigs. 162 e 103. "© Prene Derrontaines — “L'Homme et a Forét” — 1933 — pag. 13. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL n Aspecto da serra de Botueatti, em Itattnga (Sao Paulo). No planatto meridional do Brasit a sucesso das camadas sedimentares @ mareada jrequentemente por escarpas ("cucstas”), A “euesta” de Botucatu assinala a passagem dos arenitos permianos para os arenitos triassices, ‘capeados por derrames basalto-diabasices. Foto E.N.F.S, (Fototeca 8.G.E.F.) 0 Prof. A. CHoitey, diretor da revista L'Information Géographique." Uma regiao montanhosa, por exemplo, apresenta vales, planaltos, cristas, sucedendo-se uns aos outros, nao havendo portant uniformidade; 0 conjunto, porém, apresenta certa unidade geral, que pode ser caracterizada em poucas palavras, No exemplo estudado pelo Prof. Cuoutey, na Bacia Parisiense, nao ha também uniformidade: ha planicies, ha planaltos, ha colinas esparsas, ha escarpas (cuestas); mas a disposi¢ao dos elementos do relévo, segundo degraus dum vasto anfiteatro, ja revela uma certa ordem. A unidade geral é dada, neste caso, pela estrutura geologica, pela estratigrafia, que revela uma série de terrenos sedimentares de diferentes idades, dispostos como coroas circulares concéntricas, os mais antigos recobertos apenas em parte pelos mais recentes, aqueles aparecendo na periferia € estes mais para o centro. O conjunto ¢ definido esquematicamente, de modo Pitoresco, pelo Prof. CHoutey, como uma pilha de pratos cujos didmetros vao diminuindo rapidamente dos inferiores para os superiores. Disposi¢do estrutural andloga é apresentada pelo planalto meridional do Brasil (Sio Paulo, Parand, Santa Catarina e norte do Rio Grande do Sul). Estes exemplos estéo de acordo com as afirmacses de Lucten Gattors, ao explicar a nocdo de regiéo natural, quando diz que “as causas que agem sdbre a superficie do globo nao se distribuem ao acaso”... e que “as observacées geoldgicas provam que, se é grande a variedade na constituicdo do solo, tudo isso entretanto nao desordem, e que o modo por que se depositaram os sedimentos e se produziram os movimentos da crosta terrestre revela uma certa regularidade de processos”."* Tudo 0 que acima desenvolvemos, a respeito da caracterizacdo duma regiao natural, mostra que nao basta conhecer um dado territério em todos os seus por- menores. Por mais que se acumulem as observacdes dos fendmenos que nele se distribuem, somente por ésse fato nao se chegard a distinguir as regides que 0 1 A Coury — “Régions naturelles et régions humaines” (“L'Information Géographi — saa ROE Sc Rezto 9 (L'Injormation Géographique” a Luci Gauiors — “Régions naturelles et noms de pays” — 1908 (citado por Drvaavo ve Canvatto — “Metodologia do Ensino Geoprayics" “1925 "pags. 79 e 80). 2 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES constituem; é ainda necessario interpretar ésses fenémenos, descobrir as corre- lagées entre éles, afim de apreender-se a unidade geral, a caracteristica de cada regio natural. £ o que nos ensina o grande mestre Viva pe La BracHE: “Consi- derados isoladamente, os tracos de que se compée a fisionomia dum pais teem © valor de um fato; mas éles sé adquirem o valor de nocdo cientifica quando so eolocados no’ encadeamento de que fazem parte e somente éste 6 capaz de hes dar sua plena significacdo... A caracteristica duma regio é assim uma cousa complexa, que resulta do conjunto dum grande numero de tracos e da maneira como éles se combinam e se modificam uns aos outros”. b) —O ntimero e a extenséo das regiées A distingéio entre “unidade” e “uniformidade” tem escapado a muitos ge6- grafos. A preocupacao em delimitar regides uniformes é que tem levado muitos a aumentar desmedidamente o ntimero de regiées com dimensdes cada vez mais reduzidas. Tal tentativa é absolutamente vi, pols nfo hé em parte alguma regides uniformes, por menores que se considerem: ha sempre “diferenciacdo”, fato magistralmente estudado por Cammur Vatiaux, em sua obra Géographie Sociale — Le Sot et PBtat. Mostra o grande mestre da ciéncia geografica, como ha zonas de diferenciacio atenuada e outras de diferenciacdo intensa, em que os fend- menos apresentam uma grande variedade em pequenas areas.” A simples obser- vacdo duma carta de temperaturas mostra como ha regiGes, como seja o norte do Brasil, em que as isotermas sao largamente espacadas, ao passo que noutras, como no Brasil meridional, elas se aproximam, se apertam umas as outras, O mesmo se observara, em outras regiées, quanto as isoietas ou quanto as curvas hipsométricas. A extenséo duma regido de diferenciacdo atenuada é necessariamente muito maior do que a de outra do segundo tipo. Nao deve haver, assim, numa divisio regional, a preocupacio de equivaléncia de areas. A diferenciacao intensa que apresentam certos territérios nao impede, porém, que haja em cada um deles certa unidade caracteristica, pela qual suas diversas partes se completam for- mando um todo. Tal diferenciacio nao autoriza o retalhamento excessivo, em pequenas sub-divisdes, 0 que, no dizer de Detcano pe CaRvatio, aniquila todo o valor pratico da “regiéo natural”. © critério das grandes regiées ainda mais se impée no caso de paises de grande extensio territorial; as necessidades do estudo assim o exigem. & 0 que preceitua Jean Baunaes: “Do. ponto de vista da representacdo e da cartografia verdadeiramente geograficas. quanto maior € 0 espago que s¢ considera, menos a vista de conjunto pode e deve ser minuciosa. Mais extensa é a zona que se con- sidera, mais extensas seréo também as regides naturais que constituiréo, em rela¢o ao conjunto, unidades geograficas”." Tal critério tem sido confirmado pelas divisdes efetivamente feitas em diversos paises. Conforme testemunha Dex- Gano DE Carvatno, “nos Estados Unidos as divisées fisieas adotadas nfo siio mais numerosas do que as escolhidas para a Franca, apesar da grande diferenca territorial”.” © estudo dum pais extenso como o Brasil recomenda a divisio em “Grandes Regides Naturais”, vastos blocos em pequeno nimero, cada um formando um “e "Vanat oz 1a Buacur — “Atlas Géneral” — 1694 — (Preficio). ™ Canattz Vaitaux — “Géographie Sociale — Le Sol et état” — 1911 — peg. 174 — “Un observateur qui pourrait considérer es régions habitées du globe,... serait frappe de voir d’tm= menses pays ‘monotones on les différences de toute sorte, d'un Hey a un autre, se nuancent, Festompent ct sattenuent au Doint de disguraitre, Tansis quien d'autres pays les differences Saccentuent et s'opposent vigoureusement 4 médiocre distance, ou parfous méme oivent cote % die dans "un chacs apparent de terrains ee ciimals tars ef de formes, socules ou politiques fourmillantes” A Juan Baununs — “Za Géographie Humaine” — 1934 — pig. 776. 8 Dexcapo x Canvatuto ~~ Obra elt. — pag. 83. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL, 13 grande todo, definido por algumas caracteristicas gerais, distintas das dos outros. Cada uma delas deve ser, contudo, subdividida em partes menores, “Regides” propriamente ditas, e estas, por sua vez, em “Sub-regies”, para um estudo cada vez mais pormenorizado. Tal critério é ainda aconselhado por CamrLte VALLAUX, que recomenda a consideracao de grandes regides naturais, “compreendendo cada uma delas uma parte importante da superficie terrestre, onde se faca sentir duma determinada maneira a ac&o de causas muito gerais”™, tais como os fatos fundamentais a que j4 nos referimos (situacdo geografica, geologia, relévo, etc.). & éste também o pensamento de Lucien Fesvaz, que aconselha que se tomem por base as grandes zonas climato-botanicas.” ©) — O problema da delimitacéo Outro problema fundamental, e dos mais delicados, no assunto de que ora tratamos, é 0 da delimitacao. Divergem os gedgrafos quanto & conveniéneia da delimitacdo linear, prefe- rindo uns admitir zonas de transi¢&o, segundo faixas mais ou menos largas. Argumentam éles que a natureza nao apresenta fronteiras, que nela nao ha mudangas repentinas, mas que as reas, em que se distribuem os diversos fend- menos, se superpdem parcialmente, num entrecruzamento bastante complexo. E assim é, na verdade; tal é a realidade no dominio dos fatos que se observam na natureza. No entanto, o gedgrafo € forcado a delimitar, a estabelecer fronteiras Uneares. Tal contradicio facilmente se explica. A delimitacao se impée (embora a natureza ndo a autorize) devido & nossa organizacio mental, & nossa maneira de compreender as coisas. H4 no espirito humano um certo carater geomeétrico, que s6 nos permite bem compreender os fatos dando-lhes contornos nitidos. Andlise bastante clara do assunto é feita por Cams VALLAUx. Vejamos alguns dos seus aforismos a éste respeito, em sua obra ja citada Les Sciences Gedgra- phigques: “..... as coisas formam na realidade um todo sem solugo de continuidade; elas ndo admitem outras demarcacdes nem cortes, sendo as divisdes imaginadas por nés para aliviar um pouco nosso espirito e para impedi-lo de se perder no inumerdvel” (pag. 58). “HA no espirito e no dlho humano uma geometria e uma estrutura parti- culares, que n&o nos permitem perceber cousa alguma sendo com linhas e com contornos definidos; quando estas linhas e estes contornos nao existem, nds os supomos” (pag. 70). “Nés representamos todas as coisas como constituidas por um conjunto de linhas e de figuras, ao passo que na natureza as linhas precisas nfo existem...” (pag. 71). Tais citagées, pela sua grande clareza, explicam suficientemente a aparente contradicio, A exigéncia da delimitagao nao esté na natureza, mas sim em nés mesmos. Nestas consideracdes se baseia a cartografia, Imaginemos uma carta ue, em vez de delimitacées lineares, indicasse a diferenciago por céres suave- mente eshatidas em transigdes insensiveis, sem nenhum cont6rno nitido. ‘Tal carta seria certamente initil para os fins que ela deve ter. Nao negamos a existéncia de zonas de transicdo, conforme ja nos referimos a0 tratar da superposicéo das “regides elementares” (véde pag. 85). Marear, Porém, tais zonas na carta, indicar onde elas comecam e onde terminam, serla # Canes Vauaux — “Les Sciences Géographiques” — 1929 — fg, 167 ze LOCEN Fryar — “La terre et Mévolution Humaine” — 1998 — me partie: nacre TE EER, aba dere et Vevolution Humaine” — 1998 — Deusidme partie: “Cadres 4 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES recair de qualquer forma no problema da delimitacéio; em vez de termos uma linha limite, teriamos duas; nada mais fariamos do que criar, entre duas regides determinadas, uma terceira, e recairiamos no problema da transig¢&o entre essa terceira regido e as suas vizinhas. Mais vale, portanto, tragar claramente, nas cartas, linhas de demarcacao, lembrando a0 mesmo tempo que tais limites séo apenas esquematicos, para satisfazer as nossas necessidades de compreensio, e que no teem existéncia real na natureza, que sé admite “zonas de contacto” em vez de fronteiras lineares. # portanto estranhavel constatar-se que certos gedgrafos preferem nao esta- belecer limites nitidos entre regides. O gedgrafo inglés H. J. FLevre, por exemplo, afirma que “e idéia duma zona de contacto ¢ muito mais fecunda que a duma fronteira linear”. Estamos de acérdo em que tal nocdo seja “mais real”, mas nao “mais fecunda”, Dado o carter subjetivo das linhas de limites, 6 claro que havera sempre imprecisio no ato’ de tracd-las. ainda Vattavx que fornece uma base para a solugdo do problema, distinguindo, na diferenciacéo, dois graus: o “contraste” e a “diversidade”. No primeiro caso, em que ha mudanca prusca de aspectos, 0 @rro que se pode cometer na delimitagdo é muito pequeno. £ 0 que acontece quando, numa pequena distancia horizontal, ocorre uma grande diferenca de nivel, tal como se dé, por exemplo, na Serra do Mar, na passagem do planalto para a baixada litoranea. Ja 0 caso da diferenciacdo por “diversidade”, isto é, em que “as transicées se fazem passo a passo”, a ponto de sé serem percebidas por um observador depois de percorridas grandes distincias, oferece grandes dificuldades para a demarcac&o, Tal fato ocorre no Brasil, quanto & diferenciacdo climatica, quando se percorre o planalto de norte a sul, conforme bem observa Pe. Pauwezs: “Pols © fato de o relévo ser essencialmente o mesmo do norte ao sul do pais, traz consigo a consequéncia de as mudangas do clima em geral se operarem quase insensi- velmente, valendo isso sobretudo do paralelo 15 para o sul’. £ esta sem divida a razo principal do fato de haver certo acérdo entre os gedgrafos apenas quanto & caracterizagao das duas regides setentrionais brasileira: a Amazonia e o Nor- deste; quanto a divisio da parte restante do pais, ha muito maiores divergéncias, quer quanto & delimitacéo quer mesmo quanto ao numero. Cabe ao gederafo enfrentar 0 problema, nao fugindo a dificuldade e nfo deixando de fazer a necessaria delimitacdo. Para isso tera sempre em vista 0 exame do conjunto dos fenémenos fundamentais, a que j4 mos referimos, baseando-se naqueles que apresentem” maiores diferenciacdes por contraste, para a localizacdo cyiteriosa das linhas divisorias. © problema da delimitacdo é as vézes resolvido de modo demasiado simplista, fazendo-se coincidir regides naturais com bacias fluviais. Esta foi a congepcdo de Pumrre Buacue, geégrafo francés do século XVIII, e que até hoje ainda encontra adeptos retardados, apesar de estar hé muito posta de lado, como errénea, Tal concepgéio ligava-se & idéia, ainda muito vulgarizada, de que em todo divisor de aguas devia haver uma serra. B 0 que se observa em muitos mapas que representam as bacias fluviais cercadas por serras, “estas lagartas montanhosas que atravessavam nas cartas os pantanos de Parrrer,ou corriam alegremente dum extremo da Europa ao outro”, no dizer pitoresco de Lucren Fepyne.” DeLcapo Dz CarvaLto faz também yma eritica cerrada a esta concepedo errénea: “Os mapas do fim do século XIX esto, em grande parte, caracterizados elas extensas minhocas ou lacraias que representam a orografia e fecham % HL, J. Puwons — “Régions humaines” (“Anngjes de Géographie” — 1917 — tomo XXVI — pig. 170). ‘@ Pe, Pacwits — Artigo eitado — pig. 28. * Lucan Fasvas — Obra oltada — pég. 67. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL » hermeticamente as desejadas bacias fluviais. Os mapas do Brasil sofreram cruel- mente déste processo de representacdo inexata e ficticia”. © Brasil oferece um expressive desmentido as idéias de Buacus. Sabemos como é frequentemente dificil demarcar-se no terreno um divisor de aguas, sobretudo na Regifio Central; em vez de serra, temos ai muitas vézes um cha- padio, no qual rios pertencentes a bacias opostas correm proximos e as vézes mesmo se ligam. Tal regiao deixa dé ser admitida por alguns gedgrafos muito presos a0 papel dos divisores de aguas, pois a parte norte de Mato Grosso e Golaz é por éles considerada pertencente ao Brasil setentrional ou amazénico e a parte sul ao Brasil meridional ou platino. A linha limite de regides naturais esta mais frequentemente localizada na zona em que termina a planicie e comeca a montanha, na “raiz da serra”; assim 6, por exemplo, que o imite sul da regiao setentrional deve ser considerado na linha das cachoeiras que interrompem a navegagao dos afluentes da margem direita do Amazonas (ai comecam os pri- meiros degraus do planalto central) e nao no divisor das aguas que vertem para © Prata. As bacias fliviais pertencem & categoria das “regides plementares” de RiccHteRi e no & das “regides complexas” ou “regides naturais”. d) — Regides naturais e regides humanas Questo fundamental no estabelecimento duma divisio regional, refere-se & Geografia Humana. 6 neste ponto que o conceito de regio natural ainda nao se acha fixado de modo unanime entre os gedgrafos. A questio pode ser colocada nos seguintes térmos; na caracterizacio duma regiéo natural devem ser consi- derados apenas os fatos da Geogratia Fisica ou também os da Geografia Humana? deve-se atender As tradigées historicas, aos habitos de vida, aos fatores eco- némicos ? 7 ‘Tendo-se em vista o qualificativo “natural”, parece simples a resposta: s6 os fatos da natureza devem importar, abstraindo-se da acéo humana. Haveria nisso, porém, unt certo simplismo, pois os térmos usados nas ciéncias assumem comumente significados proprios, diferentes dos que tinham na Iinguagem cor- rente. Nao: se pode substituir a definicdo de térmos cientificos por uma simples consulta aos. dicionarios de lingua vernacula ou por pesquisa etimoldgica. Mesmo que de inicio os dois significados coincidam, ha posteriormente mudangas grandes de conceito. No caso de que tratamos, o que importa é verificarmos qual o sentido que € dado ao térmo pelos grandes mestres da Geografia moderna. Em sua obra elassica Regions naturelles et noms de pays, Lucien Gautors mostrou que “somente as condicées fisicas podem servir de quadro e de base solida a um estudo geografico completo” (comentario feito por Jean BrunnEs em La Géographie Humaine, pag. 744). Sao suas expressdes: “Uma regido natural 6 coisa completamente diferente do que se é forcado a chamar, 4 falta de térmo mais apropriado, uma regiao econémica. # ainda coisa completamente diferente duma unidade politica”. “A nocio de regiao natural é simplesmente a expressio dum fato, pouco a pouco posto em evidéncia pelas observacées que veem sendo feitas de um século para ca: observagces meteoroldgicas..., observacdes bota- nicas...., observacées geoldgicas...”.* Jean Browns, o mestre da Geografia Humana, reafirma também de modo bastante claro o papel fundamental da Geografia Fisica. Distingue primeiro as regides geograficas, das regides histéricas, que “é preciso sobretudo distinguir e &s vézes mesmo opor”. As primeiras, consideradas legitimamente como unidades naturais, definem-se por um certo ntimero de caracteres comuns que apresentam as suas partes, conforme se pode observar pela figuracéo esquematica das cartas % Detain ve Canvauo — Obra citada — pég. 75. * Leema Gusom — “Régtons naturelles et noms de pays". (Citado por Juan Browmss — Obra cltadn — pag.,744). vor 16 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES e principalmente das cartas geolégicas; as segundas, “faconnés en unités poli- tiques par les vouloirs humains”, sao heterogéneas, compostas de varias unidades naturais ou de partes dessas unidades, pois nas sociedades humanas a solida- riedade politica apéia-se na disparidade dos trechos que compéem o seu territério, partes que se completam mutuamente (Concorda assim com VaLLAUx que mostra, como a solidez dos Estados se baseia justamente na diferenciagao territorial) .~ Comentando os estudos regionais feitos em Franca, Jean BRuNHES expée 0 seu pensamento de modo ainda mais claro: “Mas estes estudos regionais foram algumas vézes falseados e tornaram-se complicados porque tem-se querido super- por, duma maneira demasiado rigorosa, regides de ordem historica e humana a regides de ordem fisica. Um método sadio exige que se comece por distinguir muito nitidamente a ordem da geografia fisica e a ordem da geografia humana, afim de chegar-se duma maneira mais segura ao estudo de suas conexées e de suas repercussdes — o que é, na verdade, o fim e 0 coroamento de todo o estudo geografico. Na ordem da geografia fisica, os territérios se decompdem em regides naturais que teem em geral uma certa homogeneidade e que repousam em caracteres semelhantes ou andlogos: geolégicos, topograficos ou climaticos, Ha outras regides, que sdo o que se poderia chamar as “regides historicas” e que séo em geral compostas de regides diferentes ou mesmo disparatadas; sio estes conjuntos, o mais das vézes heterogéneos, que foram reunidos, pelas vontades hhumanas, em unidades tradicionais”.” Tal citacéio contém conceitos luminosos que mostram claramente a distingéo que se deve fazer entre regides naturais e regiées humanas e, ao mesmo tempo, tragam o método que se deve seguir no estudo da Geografia Humana. Idéntico é o pensamento de CamItLe VALLAUX, expresso em sua obra, ja tantas vézes citada, Les Sciences Géographiques. No capitulo “As ordens de grandeza e os agrupamentos regionals” faz éle uma andlise minuciosa do problema que ora consideramos. A questéo é langada de modo claro: “Primeiramente, os quadros regionais sio os mesmos para a Geografia Fisica e para a Geografia Humana ? Em outros térmos, as regiées naturais sio ao mesmo tempo, duma maneira necessdria e inevitavel, regides humanas ?” (pag. 165). — A resposta surge adi- ante de modo altamente preciso: “é medida que nossos estudos analisam cada vez mais os fatos, a dissonancia mais se acusa entre as “regides naturais”, tais como as define a Geografia Fisica, e as “regides” que reconhece de sua parte a Geografia Humana. O quadro da “Regiao” nao é capaz de unificar os dois com- partimentos da ciéncia. Antes éle os separa” (pag. 166). A argumentacéo de VaLLaux baseia-se principalmente no fato capital: “o determinismo geografico absoluto nfo é admissivel” (se o fésse, haveria ent&éo coincidéncia entre os dois tipos de regiao). Nao é possivel negar, certamente, a dependéncia do homem em rela¢io ao meio fisico; mas tal dependéncia torna-se cada vez menos estreita, com o progresso da civilizacéo, nao sé pelo dominio cada vez maior das forcas naturais pelas maravilhas da técnica, como também pela interpenetragéo crescente dos diferentes grupos humanos, em virtude da circulagéo cada vez mais ativa. Ha, assim, em relagao aos fatos da Geografia Humana, uma tendéncia geral uniformizadora, niveladora. O mesmo afirmara Vinat pe La Buacne: “O europeu moderno, sobretudo, é o artesio infatigavel duma obra que tende a uniformizar, sendo o planeta, ao menos cada uma das zonas do planeta”.* — £ claro que se trata apenas duma tendéncia, pois tal uni- formizagéo nunca se realizara totalmente; sempre havera regides humanas dis- tintas. Mais tais regides seréo sempre grandemente instaveis, 0 que contrasta com a estabilidade das regides naturais. Por essas trés raz6es principais — liber- ® Canis VALLAUK — “Géopraphie Sociale” — Le Sol et VEtat — 1911. # Jean Brunues — Obra cltada — pg. 747 © 750, 2 Eg ba Dosen ka Géggraphe politique @aprés tes dors de 3, Pu Maren. ("An- nales de Géographie”, VII, 1898 — pég. a “ : DIVISAO REGIONAL DO BRASIL ” tacéio progressiva do determinismo geografico, tendéncia a uniformizacdo geral e perpétua instabilidade — ndo podem as “regides humanas” coincidir com as “regides naturais”. Salienta ainda Vattavx que sé se podem reconhecer relacdes reais entre os dois tipos de regides, quando se consideram “Grandes Regides", compreendendo vastos trechos da superficie terrestre (conforme ja nos referimos & pag. 89), como sejam a floresta equatorial, as zonas desérticas, as mediterraneas, as tem- peradas e as polares. Sao os grandes quadros climato-botanicos a que também se refere Lucien Frsvar, “Na influéncia déstes grandes quadros regionais sdbre a vida dos homens, os efeitos necessarios que se salientam sao fatos de limitacdo e de inibico...”, pondera Vattaux. Tais efeitos teem profundas repercussées nos géneros de vida e na propria psicologia dos grupos humanos. classica, com efeito, a distingo entre a mentalidade do homem do deserto e do homem da floresta equatorial. Essas consideracées reforgam os argumentos que desenvol- vemos anteriormente a favor da limitacéo do nimero de sub-divisdes e da preferéncia pela fixacio de “Grandes Regiées Naturais”. Assim apresenta claramente VatLax as suas conclusées: “A Geografia Fisica deve pois esforcar-se, 0 mais possivel, em cimentar a ‘poeira” regional e em definir as grandes Regides com caracteres fixos e solida~ mente soldados uns aos outros. “A Geografia Humana 6 cada vez mais preservada da sub-divisio excessiva pelo proprio decorrer dos fatos, que apaga gradualmente as diferencas entre as pequenas regiGes, e que nos impde a consideracdo de agrupamentos regionais aumentados, cada vez maiores, mas sobretudo instaveis e méveis. “Assim, o quadro regional ndo permite, de maneira alguma, unificar as duas geografias. A regiao natural e a regiao humana sao duas coisas muito diferentes” (pag. 174). A separacio nitida dos dois tipos de regiio impe-se ainda por motivos de metodologia, relacionada com a marcha a seguir no estudo da Geografia Humana e com a propria definicéo desta nova ciéncia. Preferimos ainda citar Canute Vattaux, mesmo um tanto longamente, pela extraordinaria precisio de conceitos com que expde o método que deve ser seguido: “A Geografia Humana, tem por objeto o estudo da deformacdo das paisagens naturais pela ago do homem; mas ela nfo deve tomar essa deformagao para ponto de partida. Os pontos de partida estao alhures: estdo primeiramente nas paisagens naturais, depois nos préprios grupos humanos. Descrever as paisagens humanas antes de saber com essas paisagens se constituiram, c'est mettre la charrue devant les boeufs”. “A primeira base sélida a estabelecer é pois a Geografia Fisica que a dé Sen papel consiste em reconstituir em téda parte as paisagens naturais, ai compreendida a aco do mundo vivo, tais como a natureza as fez, se nao tivesse existido um sé homem sdbre a terra, A Geografia Humana parte dai: ela define quantitativamente, e, se possivel qualitativamente, os grupos humanos; ela os coloca novamente nos seus quadros; estuda como e porque éles arranjam e modi- ficam as coisas, chega assim & paisagem deformada, & paisagem humana, super- posta ou substituida @ paisagem natural”. ‘Tais linhas, de clareza cristalina, colocam a questao nos térmos devidos: antes de tudo, as regides naturais, estaveis, baseadas na Geografia Fisica; poste- riormente, as regides humanas, “instaveis e méveis”; 0 estudo da passagem das primeiras para as segundas é todo o objeto da Geografia Humana. £ éste também o pensamento de Pierre DEFFONTAINES, quando diz que “esta diferenga” (entre a paisagem natural e a paisagem modificada pelo homem) “representa o principal dominio da Geografia Humana”, a qual “traca a grandiosa > Cammix Vauaux — Obra cltada — pigs, 200 © 201 18 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES epopéia do trabalho dos homens na paisagem terrestre”.” Divide assim 0 eminente mestre em duas partes a nova ciéneia: a primeira, que éle denomina “geografia dinamica”, ciéncia das adaptacdes e domesticacées, estuda justamente como se da a passagem da paisagem natural para a paisgem humana e “narra as batalhas dos homens contra os diversos elementos” (“O homem e o deserto”, “O homem ea montanha”, “O homem e a floresta...”); a segunda, “geografia estatica”, testemunha os resultados adquiridos, “os diferentes aspectos da paisagem humana da terra” (“Geografia urbana”, “Geografia do habitat e do povoamento”...). Compreende-se, pois, que ¢ a propria Geografia Humana que exige o estudo prévio das regides naturais, base 4 que devem ser referidos todos os fendmenos geograficos. Os dois tipos de regides nao se confundem, segundo se conclue dos depoimentos de Gatiors, BRUNHES, VALLAUX e DEFFONTAINES, Muitos outros grandes mestres de Geografia estdo longe, todavia, de adotar opiniao téo radical como a de VaLLaux. Prerre Denis, por exemplo em sua Amérique du Sud, basela a sua divisio em regiées naturais, nos fatos da Geo- gratia Fisica e também na historia da colonizagao do continente.” © proprio Jean Bruwues, que, conforme as citagées feitas, distingue tao cla- ramente os dois tipos de regido, afirma entretanto em outro trecho de sua Géographie Humaine: “# preciso portanto procurar nas grandes unidades poli- tieas o principio de algumas sub-divisdes reais. H entao que a regido natural apareceu como sendo tanto a consequéncia de fatos de humanidade quanto de fatos geoldgicos ou climaticos, & um resultado e no um dado. Nao é uma con- dicdo original, 6 uma combinacio”." # evidente que & “regido natural” a que JEAN Brunwes se refere neste trecho, cabe antes a denominacdio de “regido humana”, pois trata-se duma divisdo feita atendendo a agio do Homem sobre a ‘Terra; corresponde & nocao de paisagem humanizada ou paisagem deformada endo a de paisagem natural. No caso, trata-se menos duma contradicfio do que duma simples questo de significado atribuido ao térmo “natural”. Fato andlogo se di com o grande mestre Prerre Drrrontarnes. Admitindo embora o melo fisico, e antes de tudo a geologia, como base da divisio regional, considera também essencial atender-se aos fatos humanos. Concluindo o seu magnifico estudo sobre a divisio regional de Séo Paulo, usa das seguintes ex- pressdes: “Os rapidos progressos econdmicos do Estado de Sao Paulo darao lugar certamente ao nascimento de novas regides naturals, de novas paisagens; assiste- -se a um lento e progressivo nascimento de variedades regionais"." Ora, conforme vimos anteriormente, ha perfeito acérdo entre Pierre Drrrontames, JEAN BRU- NHES, LUCIEN GALLOIS e CaMILLe VALLAUX, no que se refere ao assunto. A aparente contradicéo, como no caso do Jean Brunues, resulta apenas da aplicacao do térmo “natural” em vez de “humana”. Conforme se pode observar, numa leitura atenta do seu trabalho sdbre a divisio regional de Sao Paulo, faz Derrontarves ai um estudo, nao de regides “naturais”, mas sim das grandes paisagens ja modifi- cadas pelo homem, dos diversos pays que resultam da atividade dos seus habi- tantes, dos seus paysans. Trata-se, portanto, de regides humanas. Em suas memoraveis aulas na antiga Universidade do Distrito Federal, mostrava alids o grande professor a nio coincidéncia entre os dois tipos de quadros geograficos Lembrava éle que, feita a carta da distribuicgio em Franca dos dois principais tipos de telhados — os fortemente inclinados afim de atender & queda da neve, € os quase planos, tipicos da regia mediterranea — verificou-se néo haver con- cordancia com a distribuigdo climatica, como seria de esperar-se: as duas zonas correspondiam antes as duas regiGes histdricas, de langue d’oil e de langue d’oc; ‘= Pimmz Dirrowristes — Preféclo & obra de Groxors Har — “Géographie et Colonisation” — 1933 —"Dags. 12 2 16. © Poomt Dewis — “Amérique du Sud” (colegio “Géographie Universelle” de Vipat oe 1a Buscume e L. Gatuors) — 1927 — pag. 75. ‘3 Juan Baoxues — Obra citada — pig. 745. = Passe Derrowraints — “Pays et paysages de U'ftat de Saint Paul (Annales de Géoprophie — 1936 — pag. 174). peysags c 7 DIVISKO REGIONAL DO BRASIL 0 © fato humano estudado decorria assim sobretudo da tradicdo cultural: germanica ‘ou romana. O exemple é tipice para mostrar que nao ha dependéncia rigida entre a distribuicio dos fatos humanos e a dos fatos naturais. Em timo artigo sObre “As regiées naturais da Baia”, o Professor Sizvzo Fr6is Asrev, um dos nossos mais competentes gedgrafos, leva em conta, além das condicées naturais, também a atividade do homem. ‘Vemos, assim, que no ha acérdo unanime quanto a clara distinedo entre ‘regi6es naturais” e “regides humanas". ‘Nao se trata, no entanto, de nenhum dissidio irreconcilidvel. Ao nosso ver, uma regido natural deve ser caracterizada por fendmenos atinentes & Geografia Fisica. Os fatos humanos podem, contudo, servir secun- darlamente como elementos de caracterizacéio, apés prévia selecio désses fatos. Em 6timo artigo sobre “Regiéo natural”, contido na Enciclopédia Universal Ilustrada Europeu-Americana (tomo 50, pag. 183), encontram-se os seguintes conceitos: “ste critério (0 exame das modalidades de vida) pode conduzir segu- ramente a diferenciacdo de regides naturais, sempre que se saiba discernir claramente 0 normal e permanente, do contingente e transitério; as influéncias diretas do meio, dos sedimentos tradicionais e histéricos; 0 que obedece a neces- sidade, e o que impés a moda e o dominio estrangeiros; 0 que procede da regifio, do que trouxeram os contactos com o exterior”. Esse ponto de vista consiste portanto em selecionar, dentre os fatos hu- manos, aqueles que esto submetidos ao determinismo geografico, de outros que resultam do livre arbitrio humano. Se nao ha determinismo absoluto, exclusivo, 6 porém indiscutivel que nao se pode negar de todo a sua existéncia. Segundo o pensamento de Vipat pe La BLacHE “explicar os fatos particulares é mostrar sua dependéncia em relacio as leis gerais, dependéncia que pode ser complexa quando as causas que agem s4o numerosas e variadas, que pode mesmo escapar a todo determinismo, mas que se exerce sempre por algum lado, pols 0 homem néo pode libertar-se inteiramente da tirania das forcas naturais”.* # claro que os fatos que derivam da atividade humana devem ser usados com muito cuidado na caracterizagao das regides naturais, pois é extremamente dificil separar-se 0 que deriva do determinismo geografico e o que resulta do livre-arbitrio humano. Objetar-se-A que tais fatos selecionados que traduzem “a tirania das foreas naturais”, em nada modificaro a caracterizacdo ja feita diretamente pelo estudo do meio fisico; e assim se di na realidade. Tais elementos entrarao apenas como confirmagio dos resultados j4 obtidos pela Geografia Fisica, contribuindo certa- mente para resolver dividas que ainda permanecam quanto A delimitacio, e sobretudo quanto & “unidade” que caracteriza uma regido natural. Tal unidade caracteristica reflete-se fortemente nas modalidades de vida das populacées. e) — Base para a diviséo pratica Na diviséo para fins utilitarios um problema precisa ser ainda considerado. Deve-se tomar por base as “regides naturais” ou as “regiées humanas” ? © problema é delicado e deve ser resolvido, levando-se em conta as vantagens e as desvantagens que uma ou outra divisdo oferece, conforme os fins que se teem em vista. As “regides humanas” teem a vantagem de levarem em conta fatores fisicos e humanos (pois estes dependem, em parte, daqueles) sendo assim uma sintese, © coroamento dos estudos geograficos. Dado tal carater de sintese, preferem alguns autores denomina-las “regides geograficas”, como o faz por exemplo ™ 1, Gautots — “Paul Vidal de la Blache pig. 163). (necrolégio) (Annales de Géographie — 1918 ~ 0 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES Grrio” ou simplesmente “regides”, como o fazem frequentemente os mestres da Geografia Humana (o que 6, contudo, inconveniente, é denomina-las de “regides naturais”, pela confuséo que isso acarreta). Por éste fato, o de levarem em conta téda a realidade geogrifica, constituem elas uma base muito adequada para a diviséo de ordem pratica, quando se quer realizar o estudo dum pajs, tal como éle é num dado momento, comparando-se as suas partes entre si Teem contudo a grande desvantagem de serem “instaveis e méveis”, como bem afirma Canmuz Vattaux, Tal circunstinela é reconhecida por todos os ge6- grafos. Grrio, por exemplo, assim se expressa a respeito: “E, desde que nessa combinacdo entram elementos que, como especialmente sucede com a atividade humana, esto de continuo sujeitos & lel da evolucdo, facilmente se compreende que as divisdes regionais sio relativas e que mudam segundo as geracoes...”." ‘Tratando de regides econédmicas, pondera Mc Carriy: “Assim os limites da regiio niio devem ser permanentes. Eles variam com as mudangas sociais e econémi- cas”. Isso € especialmente verdadeiro em relacéo ao Brasil, em que os ciclos eco- némicos se sucedem com grande rapidez. Uma boa divisio pratica para fins estatisticos deve ter uma certa estabilidade, afim de que se possa apreciar a evolugao dum pais, através do tempo. Tal estabilidade nao pode ser obtida se tomarmos por base “regiées humanas”. Se artificialmente fixarmos as regides déste tipo, dentro de certo lapso de tempo elas j4 nao mais corresponderao & realidade. As regides naturais apresentam justamente a vantagem da estabilidade. (Esté claro que tal estabilidade relativa aos pequenos periodos que interessam & evolugao humana, e ndo aos “tempos geolégicos”). Por ésse motivo elas consti- tuem uma étima base para uma divisio pratica permanente, que permita a com- paragdo de dados estatisticos em diferentes épocas. Acresce ainda que as regides humanas, particularmente as “econémicas”, na sua instabilidade, ora se distan- ciam, ora se aproximam das regiées naturais. O préprio progresso do comeéreio universal faz com que haja uma tendéncia & producio especializada. Muitas regiées que, antes, em economia fechada, eram obrigadas a produzir tudo © que Ihes era necessério, com 0 progresso do intercambio podem dedicar- -se aos produtos que melhor correspondam as suas condigées naturais, “‘se- guir a sua vocacao”, no dizer expressive do Professor Derronraines. £ 0 que afirma também Pumipre Ansos, estudando o nomadismo pastoral: “Os progressos da civilizacio sé teem feito servir ao modo de economia deter- minado pelas condigées naturais”.* Esta claro que tal tendéncia é cons- tantemente perturbada, por outro lado, pela vontade humana, como seja, por exemplo, com a moderna autarquia econémica. Como quer que seja, podemos afirmar que as condigées naturais sao o fator bisico,™ e que os fatos econémicos ora se afastam, ora se aproximam dessas condicoes. ‘Tratando-se duma diviséo pratica para fins didaticos, é imprecindivel que seja baseada nas “regides naturais”, pois no ensino da Geografia o estudo do meio fisico ¢ fundamental, assume uma importancia primordial. Somente uma divisio em “regides naturais” podera servir, de modo adequado, ao estudo da Geografia Fisica. % Anisrsons pr Amon Griko — Obra cltada — pig. 23: “Regido geografica (e 6 neste sen- tido atnda mais Into que a expresso rogido natural se toma geraimente nos livros de geografia) téda a fracdo ‘territorial em que o homem intervém como elemento integrante da gente modifieador da. superficie: ‘® Amsrmes ox Amount Gisio — Obra cltada — pigs. 23 © 24, = Hao Huu Mc Cary “The Geographie Bass of Amertoan Economic Life” — 1940 — vig. XV. © Luci Fievas — Obra cit. — pig. 429. = Hao Hou. Mc Canty — Obra cltada — pig. 25: “The stores and forces of nature are the basic factors tn the economic development of a geographic area, ‘These stores and. forces are considered collectively as the natural environment”. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL a Quanto as desvantagens, é dbvio dizer-se que constituem 0 “reverso da me- dalha” das vantagens acima apontadas; justamente por serem estaveis, nio podem as “regides naturais” corresponder a cada momento & realidade geografica tomada no seu conjunto, essencialmente mutavel na parte que resulta da ativi- dade humana. f) — Conelusées gerais Do exposto neste capitulo, podemos apresentar resumidamente as seguintes conclusées: 1) Uma regido natural deve ser caracterizada por um conjunto de fend- menos — e no por um tnico isoladamente — correlacionados entre si, pois tal correlacao é que confere 4 regido a sua unidade. Nem todos os fendmenos precisam ser considerados, mas sim aqueles que sao realmente significativos, em torno dos quais todos os outros se agrupam, e que dio & regio um cunho particular. Tais elementos fundamentals, nfo so os mesmos de uma regio para outra. 2) As regides devem ser pouco numerosas e tanto maiores quanto mais extenso € 0 pais que se considera. Tais “Grandes Regides” podem ser divididas em “Regides” menores e estas em “Sub-regides”, para um estudo cada vez mais pormenorizado 3) As regides devem ser nitidamente delimitadas nas cartas, por limites Iineares, evitando-se a representacdo de zonas de transi¢éo por tintas esbatidas. Tais zonas, no caso de deverem ser consideradas, pela impor- tancia que tiverem, devem ser encaradas como regides distintas, tais como outras quaisquer. Quando a diferenciagdo se dé por gradagées insensiveis (diferenciacao por diversidade), a delimitacio deve ser baseada naqueles fenémenos, embora secundarios, que apresentem algum contraste. 4) Uma regido natural deve ser caracte:izada por fendmenos do dominio da Geografia Fisica. Dentre os fatos humanos, podem ser utilizados aqueles que resultem do Imperativo do meio fisico, a titulo de confirmagao, e para solucionar os problemas que ainda se apresentem quanto aos limites. 5) As regiées naturais constituem a melhor base para uma divisdo regional pratica, sobretudo para fins estatisticos e especialmente para uma divisio permanente que permita a comparacéio dos dados em diferentes épocas. As regides humanas, particularmente as econémicas, pela sua instabili- dade, nao fornecem base conveniente para tal comparacéo no tempo; constituem, porém, uma boa divisio para estudo dum pais numa dada época, quando mais importar a comparacio no espaco, de umas partes com as outras, No caso duma divi:io para fins didaticos deve sempre ser considerada como basica a divisio em regides naturais. III — DIVISOES REGIONAIS DO BRASIL PROPOSTAS POR DIVERSOS AUTORES a) — Considerag6es gerais Na primeira parte do presente trabalho, referimo-nos & grande variedade de divis6es regionais propostas por diversos autores ou adotadas pelas instituicdes oficiais em nosso pais. Salientamos, entéo, que a principal causa dessa variedade consistia em serem diferentes os critérios seguindos por uns ¢ outros: se alguns pretenderam realmente apresentar divisées em “regides naturais”, muitos outros se basearam apenas em determinados aspectos isolados, considerando regides orogrificas, climiticas, botnicas ou econémicas (“regiées elementares”, segundo @ expressio de Riccumesr) embora com frequéncia as denominassem indevida- 2 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES mente “regiGes naturais” ou, vagamente, “regiées". Outra causa estaria nos diferentes graus de sub-divisio, variando assim o nimero das regides propostas. ‘Terceiro motivo envolveria o problema da delimitacio, dai decorrendo dois grupos de divisées: as referentes & Geografia como cléncia, divisées tedricas, e por con- seguinte abstraindo das divisas das unida+es politicas, e as divisdes praticas, para fins administrativos, estatisticos ou mesmo didaticos, nas quais as regides englobam uma ou mais unidades politicas por inteiro. Questdo também importante, examinada na segunda parte déste trabalho, refere-se 20s dois tipos de regides: “naturais”, baseadas na Geografia Fisica, e “humanas”, decorrentes da Geografia Humana e, em especial, dos tatos econd- micos. Nao é, portanto, de admirar-se haver tao grande numero de divisdes regionais até hoje propostas para o nosso pais e seria tentativa va pretender-se examina-las tédas Passaremos assim em revista, apenas em linhas muito gerais, as divisdes mais importantes, as quais revelam as tendéncias dominantes quanto & solucdo de tao importante problema. b) — As idéias de Manzius sObre a divisdo regtonat Embora nfo seja de cardter geografico propriamente, a divisio proposta em 1843 por Cari FRIEDRICH PHILIFP VON MARqIUS assume grande importancia, no tanto pelas regides consideradas em si mesmas, mas pelas idéias defendidas pelo seu autor, que dao & mesma um cardter de verdadeiro marco na histéria dos estudos regionais em nosso pais. Em meméria apresentada ao Instituto Histérico e Geografico Brasileiro, intitulada “Como se deve escrever a Histéria do Brasil” — meméria premiada com medalha de ouro pelo mesmo Instituto — aconselhava © ilustre sbio e grande amigo do nosso pais que o estudo da Historia do Brasil nio fésse feito por provincias isoladamente, mas sim por grupos regionais. Embora tratando de assuntos histéricos, Martius apresentava argumentos de ordem geografica afirmando que “deviam ser tratadas conjuntamente aquelas porgdes do pais que, por analogia da sua natureza fisica, pertencem umas as outras”.* Marrius pode ser assim considerado como um precursor da idéia da divisio regional para fins diddticos em nosso pais. # certo que as regides por éle consideradas eram de carater histérico; assim, por exemplo, as provincias de Sio Paulo (entdo ainda compreendendo o Paranda), Minas, Golaz e Mato Grosso formavam um grupo regional, pela sua formacao histériea; mas os argumentos por éle defendidos poderiam ser inteiramente aplicados ao ensino da Geografia. No entanto esta disciplina continuou ainda por muitos decénios a ser estudada pelas unidades politicas isoladamente, até que o aparecimento, em 1913, da Geografia do Brasil, do Professor DLcavo DE Cagvaixo, viesse impulsionar a campanha, poucos anos apés vitoriosa, em prol do estudo pelas “regides naturals”. ©) — Diviséo regional segundo Avpré Resoucas A divisio do Brasil em zonas agricolas, publicada em 1889, da autoria do grande engenheiro Anpré Resoucas “ constitue uma etapa importante na marcha dos estudos regionais em nosso pais. Conforme o seu nome indica, nao se trata propriamente duma divisio em “regides naturais”} trata-se alias duma divisio pratica, em que os Estados sio considerados por inteiro. O autor nao se preocupou, entretanto, exclusivamente com os aspectos econémicos, pois fez um amplo es- tudo geogrifico de cada uma das zonas. © “Revista Trimestral de Histéria e Geografia” (6rgko do Instituto Histérica e Geogréfico Brasiletro) — Tomo VI = pags. 407 0 409. ‘Le Brésil em 1869", publicado sod a diregho de M. F. J. de Santa-Ana Nert. DIVISAO REGIONAL DO BRASU: a Sao as seguintes as regides admitidas por Axpré Resougas (véde mapa anexo) : I — Zona Amazénica (Para e Amazonas); I— ” do Parnaiba (Maranhao e Piaui); — ” do Ceara (Ceara); IvV— ” do Paraiba do Norte (Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernam- buco e Alagoas) ; V — Zona do Sao Francisco (Sergipe e Baia); VI— ” do Paraiba do Sul (Espirito Santo, Rio de Janeiro e Séo Paulo) ; viT— ” do Parana (Parana e Santa Catarina); viIT— " do Uruguai (Rio Grande do Sul ; IX — ” Auro-ferrifera (Minas Gerais), e X— ” Central (Goiaz e Mato Grosso). O defeito capital desta divisdo consiste no ntimero excessivo de regiées. Néo se compreende bem, por exemplo, a razio de ser da separacio do Ceara, como zona A parte, desligada dos seus vizinhos da zona IV. Por outro lado, desde que Minas foi considerada regiao distinta, torna-se bastante estranha a zona VI; no texto, o autor a denomina “a grande zona do café”, considerando portanto a lavoura cafeeira a principal caracteristica regional; mas, neste caso, Minas no deveria ser excluida, por j4 ser, na época, grande produtora de café. a) — Diviséo regional segundo Euste Réc.us A distribuicdo feita por Euisée Récrus em 1893, em sua magnifica obra Es- tados Unidos do Brasil, representa ja um grande passo no sentido da consideracao de verdadeiras regides naturais. Isso mesmo éle torna claro no texto, ao dizer que “as regides naturais nao confundem de forma alguma seus limites com os das antigas provincia". Levado contudo, por necessidades didaticas, éle agrupa 0s Estados por inteiro, ao definir as regides; no texto, porém, prefere, de quando em quando, destacar alguns trechos que melhor seriam considerados como per- tencentes a regides vizinhas. Assim é que, por exemplo, prefere estudar 0 “sul de Minas”, juntamente com Sao Paulo, na regiao por éle chamada “vertente do Parana”. So as seguintes as regides segundo Exisée Rictus (véde mapa anexo): I — Amaz6nia (Amazonas e Pard); II — Vertente do Tocantins (Goiaz); TH — Costa Equatorial (Estados nordestinos, de Maranhao a Alagoas) ; IV — Bacia do Sao Francisco e Vertente Oriental dos Planaltos (Sergipe, Baia, Espirito Santo e Minas Gerais) ; V — Bacia do Paraiba (Rio de Janeiro e Distrito Federal) ; VI — Vertente do Parana e Contravertente Ocednica (Sao Paulo, Parana e Santa Catarina; ‘VII — Vertente do Uruguai e Litoral adjacente (Rio Grande do Sul); ‘VIII — Mato Grosso A divisio ressente-se ainda dum niimero excessivo de regides, embora menor do que a de Rzzoucas. O destaque de Goiaz é pouco defensivel; o mesmo se di com o Rio de Janeiro, considerado regiao a parte. Ha porém ja um certo agru- pamento mais lgico do que o de Resougas. A leitura da obra de Réctus di-nos contudo, a impressio de que éle se prende talvez demais as relagdes entre bacias fluviais e regides naturais. ~ a Wigaks, Récwos — “Estados Unidos do Brasil” (Traduglo do Banio ve Rune Gat 1900 — pig. 28). . a ‘Gavko "ABIO MACEDO SOARES GUIMARAES REGIOES DO BRASIL SEGUNDO VARIOS AUTORES ANDRE REBOUCAS 40 REGIOES) aa <6 REGIOES) DIVISAO REGIONAL DO BRASID 25 @) — Diviséo regional segundo Saw Att Em pequeno Compéndio de Geografia Elementar, apresentou o Professor Sar Atz, em 1905, em linhas muito gerais, uma divisio em cinco regides, com as denominagies hoje habituais entre nés: I — Brasil Setentrional ou Amazénia (Acre, Amazonas e Para); II — Brasil Norte-oriental (Estados litoraneos desde Maranhao até Alagoas) ; III — Brasil Oriental (Sergipe, Baia, Espirito Santo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Minas Gerais e Sao Paulo); IV — Brasil Meridional (Parana, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) ; V — Brasil Central ou Ocidental (Goiaz e Mato Grosso) ‘Trata-se, com vemos, de mais uma etapa no sentido de menor ntimero de agrupamentos, ao mesmo tempo mais extensos, As duas primeiras regiées cor- respondem exatamente as (I) e (IIL) de Réctvs. So elas, alids, as mais faceis de caracterizar-se (Amazonas e Nordeste). A divisio foi feita “atendendo As afinidades econémicas dos Estados entre sie com elas conciliando, tanto quanto possivel, as condi¢des geograficas”.” Tal importancia dada As afinidades econd- micas explicam a reuniio de Sio Paulo a Minas Gerais, na mesma regiao. Esta divisio foi adotada integralmente pelo Professor Temistoctes Sivro, em 1907, em seu Curso Elementar de Geografia. f) — Divisdo regional segundo Detaano pe CARVALHO © aparecimento, em 1913, da Geografia do Brasil, do Professor Detcapo bE CARVALHO, marcou uma nova etapa na evolugao do ensino da Geografia em nosso pais. Pela primeira vez surgia um livro didatico, em que a Geografia Re- gional do Brasil merecia realmente tal nome. Em vez do estudo feito até entao pelas unidades politicas isoladas, eram estas agrupadas, e dentro de cada quadro regional passava a ser estudada, quer a Geografia Fisica, quer a Geografia Hu- mana, A campanha vigorosamente defendida pelo Professor Drtcapo DE CARVALHO foi vitoriosa poucos anos apés e os novos programas do ensino secundério, ela- borados pelos Professores FERNANDO Rasa GABAGLIA e Honério Stivestes, consa- graram a nova orienta¢ao. A diviséo proposta pelo eminente professor acha-se assim, ha quase vinte anos, adotada no ensino da Geografia do Brasil, Detoapo pe Carvatto aceitou em parte a divisio de Sat Aur e deu-lhe a seguinte distribuledo (véde mapa anexo) I — Brasil Setentrional ou Amazdnico (Acre, Amazonas e Para); II — Brasil Norte-oriental (Maranhdo, Piaui, Cear4, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco e Alagoas) ; III — Brasil Oriental (Sergipe, Baia, Espirito Santo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e Minas Gerais) ; VI — Brasil Meridional (Sao Paulo, Parana, Santa Catarina e Rio Grande do Sul); V — Brasil Central (Goiaz e Mato Grosso) . M. Sum Aur — “Compéndio de Geografia Blementar” — 1905 — pig. 136. 26 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES Como vemos, a modificacéo importante, em relacdo a divisio de Sam Aut, fol a incluso de Sao Paulo na regiao meridional, desligando-o de Minas Gerais. As duas primeiras regides manteem-se inalteraveis; as outras derivam da divisio de Réci.us, compostas da seguinte forma: o Brasil Oriental coresponde As regies IV e V de Réctus; 0 Brasil Meridional, 4s VI e VII e o Brasil Central, as I e VIII do grande geégrafo francés. A divisio de Dstcapo pz CarvaLHo representa assim © resultado duma evolucio lenta, desde ANvri Resovcas, seguida por Erste ‘Récius e Sarp ALI. ‘Trata-se evidentemente duma divisio pratica, para fins didaticos e por isso as unidades politicas tiveram de ser consideradas por inteiro, conforme explica claramente o autor. Baseou-se, porém, numa divisio em “regides naturais”, sendo os Estados reunidos de modo a formarem grupos a elas semelhantes 0 mais possivel. £ 0 que mostra o autor quando lembra que o norte da Baia deveria pertencer ao Nordeste semi-arido, que parte do Maranhao é francamente ama- zonica, ete. Tendo em vista a caracterizagao de cada um dos grupos regionais, procurou esta Seccdo de Estudos, do Servico de Geografia e Estatistica Fisiogrifica, re- constituir as “regides naturais” que poderiam servir de base & divisio pratica de que ora tratamos (Ver Revista Brasileira de Geografia — Ano Il — N° 4 — Aspecto de campos cerrados em Mato Grosso (Brasil Central), vendo-se o rebordo dum chapaddo. ‘Observacse um capdo de mata num trecho mais baizo, javorecide por maior umidade. (Foto $.G.E.F.) pags. 640 e 641 e 0 mapa corespondente). As regiées entdo consideradas sio as mesmas cinco admitidas pelo Professor DeLcapo DE CanvatHo, “abstraindo-se po- rém das divisas dos Estados e estendendo-se cada uma até onde continua a apresentar os mesmos caracteristicos dominantes”. A AmazOnia, por exemplo, foi estendida ao noroeste de Mato Grosso e a0 oeste maranhense, zonas onde pre- domina a grande floresta equatorial; o limite sul corresponde em parte & linha das grandes cachoeiras que maream os primeiros degraus do planalto, O Brasil Central, por sua vez, regido dos grandes chapaddes e dos campos cerrados, abran- geria, além de Goiaz e Mato Grosso, 0 sul do Para e as partes de Baia e Minas a oeste do So Francisco. Critério andlogo fol seguido nas outras regides, conforme € explanado com detalhes no niimero da Revista acima indicado. Formam-se, assim, grandes blocos territoriais, facilmente caracterizaveis e bem distintos uns dos outros, Est claro que nao se trata ai de regides homogé- DIVISAO REGIONAL DO BRASIL a neas, uniformes e nem isso seria possivel, conforme expusemos na parte II (ca- pitulo b) déste trabalho. Tais blocos devem ser denominados “Grandes Regides Naturais”, cada um formando um grande todo caracterizado por uma certa unidade geral, tendo em vista aqueles fatos fundamentais “em torno dos quais se agrupam todos os outros”, segundo o pensamento de Vattavx. Cada um deles compreende forcosamente partes que se distinguem umas das outras, as “Re- gides” propriamente ditas, e estas, por sua vez, ainda podem comportar sub-di vis6es. Tais partes séo complementares, fortemente ligadas entre si, fato éste que repercute nitidamente nas modalidades de vida dos seus habitantes. Como exemplo, relative as consideragées acima, podemos citar o Nordeste, que comporta certamente sub-divisdes. A chamada “zona da Mata”, faixa lito- ranea que se estende do cabo Sio Roque para o Sul, encosta oriental da chapada que constitue a maior parte da regio, distingue-se certamente das zonas cha- madas “agreste e sertéio”. Destacd-la, seria porém quebrar a unidade déste grande “todo” regional que € o Nordeste, Trata-se de duas partes complementares, indis- soluvelmente ligadas. Tais lacos refletem-se claramente nos fatos da Geografia Humana, sobretudo nos fatos econdmicos. Conforme salientamos na parte IT (pagina 95), os fatos humanos podem servir como elemento de caracteri- zagio das “‘regides naturais” desde que se considerem apenas aqueles que resultem do determinismo geografico. As ligacdes entre os habitantes da “mata” e os do “agreste” e do “sertéo” nao sao artificiais, ndo resultam de nenhum capricho do livre arbitrio humano, mas foram determinadas pelas préprias condigdes naturais, Prerre Denis salienta mesmo que “de todos os exemplos de associacao entre regides pastorais e regides agricolas, téo numerosos na América do Sul, éste é 0 mais estével, 0 mais perfeitamente de acdrdo com as condigées geograficas”. Consideracées andlogas podem ser feitas a respeito das partes que compéem outras “grandes regides”. Dada a situagdo atual dos estudos geograficos no Brasil, dados os conheci- mentos ainda um tanto deficientes do nosso territério, é bem possivel que novas observacées venham trazer modificacdes importantes na divisio regional de que ora tratamos. Conforme afirmamos no inicio déste trabalho (pag. 80) “nunca se podera dizer, em dado momento, que se chegou a divisdo definitiva”. Mas na fase atual, parece-nos que as “regiGes naturais” que serviram de fundamento a divis&io do Professor Detoapo Dz CaRvatHo constituem a melhor base para os es- tudos geograficos em nosso pais. Ao nosso ver, dificilmente poderiio ser conveni- entemente estudados, em linhas gerais, os diferentes facies do relévo, as grandes provineias geolégicas e os tipos de clima do Brasil, mediante “regides naturais” muito diversas das que ora consideramos. A divisio do Professor Dztcano pr Car- vALHo satisfaz perfeitamente ao estudo da Geografia Fisica e explica também de modo adequado a diferenciacdo regional que se observa em muitos fatos hu- manos, naqueles mais fortemente ligados ao determinismo geografico, mais estaveis e normais. Baseada em “regides naturais” e, por conseguinte, sobretudo nos fatos da Geografia Fisica, nao pode, contudo, evidentemente, acompanhar a variacdo dos ciclos econémicos que tao rapidamente se sucedem no nosso pais conforme salientamos no capitulo e da segunda parte déste trabalho (pags 95 a 97). 8) — Divisdo regional segundo Pierre Deis © eminente gedgrafo francés que tio bem tem estudado 0 nosso pais, utilizou- -se na sua obra Amérique du Sud, (1927), ja citada, duma divisdo muito seme- Yhante & do Professor Dztcapo DE CARVALHO. ‘Suas regides (véde mapa anexo) — Amazonia, Nordeste, Planalto Meridional e Planalto Central — correspondem respectivamente ao Brasil Setentrional, a0 « Pumex Divas — Obra cltada — pag. 89. a FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES Norte-oriental, ao Meridional e ao Central do gedgrafo patricio. Apenas. quanto ao Brasil Oriental considera éle duas partes distintas: a primeira “Minas e 0 ‘So Francisco”, compreende a totalidade de Minas Gerais e a maior parte da Baia; a segunda, “Costa atlantica de Baia ao Rio", abrange o Rio de Janeiro, 0 Distrito Federal, o Espirito Santo e o sul da Baia (faixa florestal e litoranea) . Outra modificagao ¢ a inclusio do nordeste da Baia, compreendendo também © “recéncavo” com a cidade do Salvador, assim como de Sergipe, na regifio do Nordeste. # interessante notar-se que para quase todo o Brasil a divisio tem um carater pratico, nao retalhando nenhuma unidade politica; somente na Baia preocupou-se Dents em aproximar-se rigorosamente das “regides naturais”, desmembrando ésse Estado em trés partes. Quanto ao destaque da parte setentrional, incluindo-a na regido nordestina, nada ha a objetar-se. Tal critério coaduna-se perfeitamente com a realidade, conforme se pode constatar pela leitura do excelente trabalho do Professor Sitvio Fréis Aprev, sObre As regides naturais da Baia. No que se refere, porém, ao destaque da “Costa atlantica” como “grande regido” a parte, caberia aqui a mesma argumentac&o que desenvolvemos a respeito da zona da “mata” do nordeste. Tal faixa deve ser considerada como sub-diviséo da “Grande Regido Oriental”. Mesmo como sub-divisio, 0s seus limites ocidentais n&o coin- cidiriam com a linha diviséria entre Minas e os Estados do Rio e Espirito Santo; tal faixa deveria coerentemente incluir a chamada “zona da mata” de Minas Gerais. h) — Divisdéo regional segundo Betim Pars Lame © saudoso mestre da Geologia e da Geografia, estabeleceu em 1937, através de doutas ligdes, da sua cétedra de “Geografia Regional”, na antiga Universidade do Distrito Federal, uma interessante divisdo. Se considerarmos apenas a maneira de agrupar as unidades politicas (véde mapa anexo), observamos que difere da divisio do Professor Dexcapo pz CanvaHo somente pelo fato do Maranhio e 0 Piaui, duma parte, e Sergipe e a Baia, de outra, terem sido destacados, formando zonas intermediarias ou de transicao. © carater mais interessante, porém, do seu trabalho, consiste na caracteri- zagao, pelas estruturas geolgicas predominantes. Trata-se, pois, nao duma divi- sio em “regides naturais” propriamente, mas sim em “zonas estruturais”, assim discriminadas: I — Zona de sedimentagio: Acre, Amazonas e Para; 11— ” intermediaria: Maranhao e Piaui; TI — " estabilizada, por peneplanizag&o: Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco e Alagoas; 1V — Zona intermediaria: Sergipe e Baia; V— ” de reajustamento isostatico atual (Serras cristalinas): Minas, Espirito Santo, Rio de Janeiro e Distrito Federal; VI — Zona estabilizada (grandes derrames de rochas eruptivas): Séo Paulo, Parana, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; ‘VII — Zona de erosio (Planalto central): Goiaz e Mato Grosso. A divisio do Professor Bem Pats Leme constitue uma importante contri- buicio para a caracterizagdo regional. A regio meridional, por exemplo, de 8&0 Paulo ao Rio Grande do Sul, constitue uma unidade sob o ponto de vista estrutural, unidade essa que apresenta analogias, segundo opina Prerre Dents, “ “© REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA — Ano I — n° 1 — pégs. 63 © 74, Pram Dents — Obra cltada — pég. 172. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL. 2 com a “Bacia Parisiense” (talvez a regio mais bem caracterizada da Franga) Se noutras partes Bera Pars Leme preferiu considerar zonas intermediérias, de caracterizagio duvidosa, no sul restabelecia nitido contraste entre Minas e Sio Paulo, do ponto de vista da orogénese. i) — Divistéo regional segundo Moaci Siva Na série de artigos, intitulados Geografia dos transportes no Brasil, publi- cados nesta Revista, 0 engenheiro Moacrr M. F. Stzva, Consultor Técnico do Conselho Nacional de Geografia, propée mais uma divisio“ derivada da que é admitida pelo Professor Drtcapo Dz Canvano. Sugere que, das regides que com- poem esta ultima, sejam destacados Maranhao e Piaui, duma parte, Sergipe € Baja, de outra e finalmente Sio Paulo, para constituirem trés “‘zonas de transicao”. J& tivemos ocasiio de examinar os inconvenientes da representagdo de “gonas de transi¢o”, nas cartas, tendo concluido que, caso sejam de importancia, devem ser de preferéncia encaradas como regides distintas, do mesmo modo que outras quaisquer. Podemos, assim, considerar que a divisio proposta pelo Eng. Moacrr Suva consta de oito regiées (véde mapa anexo). Observa-se que as duas primeiras “zonas de transicéo” por éle admitidas sio também assim consi- deradas pelo Professor Berim Pats Leme, conforme vimos. Os quadros regionais adotados pelo Eng. Moacrr Suva teem a vantagem de conciliar muitas divisdes divergentes; com efeito, as trés partes por éle destacadas como “zonas de transi¢ao”, sio justamente as que mais teem variado de posicao, quanto s “grandes regides” a que devam pertencer. Conciliam sobretudo as dis- cordancias entre “regides naturais” e “regiées humanas”. SAo Paulo, por exemplo, quanto ao meio fisico deve ser incluido no “Brasil Meridional”; ja quanto aos fatores econémicos, tende a ser unido a Minas Gerais, Rio de Janeiro, Distrito Federal e Espirito Santo, na regiéo econdmica “Sul-oriental”. Seu destaque, como zona a parte, faria cessar a discordancia. A desvantagem desta divisio consiste, porém, no ntimero elevado de regives. Parece-nos que, no estado atual dos estudos geograficos brasileiros, cinco regides sejam suficientes. Ja nos referimos, na parte II (capitulo 0), as vantagens do niimero reduzido de regides razoavelmente extensas. Recapitulando as consideragées feltas a respeito dessas sete divisdes — desde Resovgas em 1889, até Moacrr Srzva, em 1939 — observamos em primeiro lugar que elas formam um grupo nico, em que umas séo meras variantes das outras; trata-se prineipalmente de uma questao de maior ou menor sub-divisio. Nota-se uma interessante evolucio, num periodo de meio século; nos primeiros vinte e cinco anos ha uma tendéncla a concentracio (Resougas, 10 regises; Récwus, 8; Sat ALI, 5; DELGApo DE CARVALHO, 5); na segunda metade do periodo, a tendéncia é para a sub-divisio (Denis, 6 regides; Bermm, 7; Moacin Stiva, 8) ‘Ao nosso ver, hé conveniéncia em refreiar-se um pouco esta ultima tendéncia e em realizarem-se os estudos sobre a Geografia do Brasil dentro de poucos quadros regionais, bastante amplos. Com o progresso désses estudos, com o melhor conhecimento do territério, talvez ainda surja um imperativo de novas sub-divisées, e é provavel que tal se dé em relagdo ao Brasil Central, ainda insu- ficientemente estudado. No momento atual, porém, devemos manter ainda poucos quadros, procurando, como diz VauLaux, “cimenter la poussiére régionale et définir les grandes Régions aux caractéres fixes et solidement soudés les uns les autres”. REVISTA BRASILEIRA DE GEOGRAFIA — Ano I — ns 2 — pég. 93. 30 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES PD — Divisdo regional segundo o Pe. Grrauno PavweLs Em valioso artigo, j4 citado, publicado em 1926, estabelece o Pe. PAUWELS uma divisio em “regides naturais”, no sentido rigoroso da expresso, baseada na Geografia Fisica e, por conseguinte, abstraindo das divisas das unidades politicas. Admite seis regides, as trés primeiras, consideradas mais importantes e as outras, secundarias: I — Amazonia II — Regifio das caatingas JI — Planalto meridional IV — Litoral V — Regio uruguaio-brasileira VI — Planicie do Alto Paraguai ou Gréo Chaco Brasileiro. Tal divisio obedece seguramente a um critério cientifico, tendo inegavel- mente grande mérito. Nao nos parece contudo servir de base conveniente para uma divisio de carater pratico. As duas primeiras regides correspondem ao Norte e ao Nordeste. A Amazonia corhpreende Acre, Amazonas, Para, oeste do Maranhio e as partes setentrionais de Golaz e de Mato Grosso. A nica observacao que temos a fazer é que parece ser insignificante a parte de Goiaz que de fato pertence & Amazénia tipica, com a sua Hiléia, A regiao das caatingas compreende o Ceara e parte dos Estados de Maranhio, Piaui, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Baia, Minas, “talvez” parte de Goiaz e de Mato Grosso “até o Tapajoz”, Como vemos, tal regiéo é estendida para o sul e para 0 centro, muito mais do que costuma ser. Temos a impress&o que foi dada importancia quase exclusiva 4 vegetacéio, e que os outros fatores — orograficos, geolégicos e climaticos — nao autorizam t&o grande extenséo. Somente dados mais seguros que os atuais poderio resolver a questo, pois nessa grande area ha partes das mais desconhecidas do Brasil, como seja © norte de Mato Grosso, a leste do Tapajoz. As duas tltimas regides, de dimensdes reduzidas, sio, como diz o autor, “prolongamentos de regides nao brasileiras para dentro dos nossos limites poli- ticos, a saber: a quinta, dos pampas platinos, e a sexta, do Grado Chaco Boreal da Bolivia”. Tais regides podem, certamente, ser admitidas, pois siio de fato di tintas das vizinhas. Pela sua exigua extensio, é duvidoso, porém, que merecam ser consideradas, numa divisdo primaria do nosso territério em “Grandes Regides”. Com o mesmo critério poderiamos também admitir uma regio auténoma no. extremo norte, a dos campos do Rio Branco. Parece-nos que tais partes secun- darias merecem antes ser estudadas dentro dos grandes blocos em que se divide primariamente o territério. Acresce que, sendo cada uma delas apenas uma parcela de superficie de Estado, tais regides deixariam de ser consideradas numa divisio pratica, na qual as unidades politicas néo devem ser desmembradas. A quarta regio — Litoral — compreende “as terras situadas entre o planalto brasileiro e 0 Atlintico, desde 0 cabo de So Roque, no Rio Grande do Norte, até © ponto onde, no Rio Grande do Sul, a Serra Geral inflete para oeste”. Trata-se duma longa faixa, em geral muito estreita, compreendendo o litoral propriamente dito e a grande fimbria florestal da encosta do planalto, a chamada “floresta da encosta oriental”, “floresta atlantica”, “mata costeira” ou “Dryades” segundo ‘Marrros. A propésito da “zona da mata”, no Nordeste (ver pag. 103) e da “costa atlantica”, de Prerre Denis (ver pag. 104), j4 tivemos ocasido de mostrar que, numa diviséo em “Grandes Regiées”, tal faixa néo deve ser desmembrada do seu hinterland, tao estreitas e naturais sio as ligagdes entre ela e o planalto, DIVISAO REGIONAL DO BRASIL By Caatinga no Estado do Piaui, vegetacdo zeréfila, tipica do Nordeste brasileiro. Foto Mério Baldi (Fototeca $.G.E.F.) Acresce ainda que esta longa zona pode perfeitamente ser sub-dividida. A costa propriamente dita compreende dois trechos distintos. O primeiro, o litoral oriental, do cabo de Séo Roque ao cabo Frio, é geralmente baixo, orlado frequen- temente por “barreiras” de formacao tercidria e contendo, em diferentes trechos, dunas, mangues ou lagoas; na parte mais ao norte é caracterizada pelos recifes que o acompanham; a encosta do planalto estd regularmente afastada do mar, permitindo a presenca duma “baixada” mais ou menos larga. O segundo, 0 litoral meridional, do cabo Frio para o sul, é caracterizado pela proximidade da Serra do Mar, que em muitos trechos é batida diretamente pelo oceano; é o tipo de costa “concordante”, em fungao do relévo. Quanto ao clima ha também divisées a fazerem-se. O trecho ao norte da Baia de Todos os Santos, caracteriza-se pela predominancia das chuvas de in- ‘yerno; no trecho oriental, até Santos, predominam as chuvas de verdo; no meri- dional, & medida que cresce a latitude, a pluviosidade € cada vez mais regular- 2 PABIO MACEDO SOARES GUIMARAES mente distribuida, A temperatura média anual baixa progressivamente desde 26° ao norte até 19° ao sul; a amplitude anual média cresce, por sua vez, desde 3° até 9°. Essas ligeiras observacées mostram que a zona litoranea comporta facilmente sub-divisdes. Preferimos decomp6-la em trés partes — nordeste, este e sul — estudadas, cada uma com o respectivo hinterland, nas trés “Grandes Regides”: Brasil Norte-oriental, Oriental e Meridional. Aspecto da campanha gaticha, nas prosimidades de Uruguaiana (Rio Grande do Sul). As cam- ‘pinas do extremo sul (reyido denominada “uruguaio-brasileira” pelo Pe. Pawoels) ‘Mdo\um protongamento dos pampas. platinos Foto Erie Hess (Fototeca S.G-B.F.) A terceira regiao — Planalto Meridional — contrasta com as trés ultimas, pela sua enorme extensao. “Abrange, parcial ou inteiramente, os Estados do Mato Grosso, Goiaz, Minas, Sio Paulo, Parana, Santa Catarina e Rio Grande do Sul”, com a Area aproximada de 2 300 000 km*, Como vemos, apesar do qualificativo de “Meridional” compreende grande parte das regides chamadas habitualmenté “Central” e “Oriental”. Na opinido do competente gedgrafo, autor da divisio que ora estudamos, no se verificam, neste vasto trecho do nosso territrio, “dife- rengas tao notdrias entre as suas diversas partes, que seja justificado estabelecer ai varias regides naturais”.“ Ao nosso ver, é éste o ponto mais discutivel da divisdo regional proposta pelo Pe. Pauwets. Se formos considerar apenas 0 relévo, teremos realmente de reconhecer um traco comum, por ser tal regido téda ela um imenso planalto. ‘Mas 0 estudo das condices geologicas, climaticas e mesmo botanicas, revela que ha distincdes importantes a faze1 ‘Um rapido exame da carta geologica do Brasil mostra claramente que a chamada “regido meridional” (Sao Paulo, Parana, Santa Catarina e Rio Grande do Sul) constitue uma provincia geolgica & parte. £ a regido dos grandes de- positos sedimentares que, apoiados a este no arqueano da Serra do Mar, dispoem- -se segundo faixas sucessivas de terrenos devonianos, permianos, tridssicos e cre- taceos, em sucessivos degraus que constituem a Serra Geral, numa estrutura com- parada por Prerre Denis 4 “Bacia Parisiense”, # a regio dos grandes derrames de trapes, rochas eruptivas do tipo diabasico, cuja decomposicéo produziu a famosa “terra roxa”, tio importante para a lavoura cafeeira. Esta claro que tal “pro- vineia” no. coincide exatamente com os Estados acima referidos, pois avanca sobre 0 Triangulo Mineiro e o sul de Goiaz e de Mato Grosso. O Brasil Oriental © Ver 0 capitulo “O Clima”, da autoria do Doutor Savomko SmnesmeNtcx, da publicago “Brazil — 1939-40", do Ministérlo das Relagoes Exterlores. © Pe. Genuine Pauweis — Artigo citado — pag. 29. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL 3 Aspecto da “floresta da encosta oriental” (a “dryades” de Martius) que cobria téda a faiza Woranea desde 0 cabo de Sao Roque até o norte do io Grande do Sul, em consequéncia da alta ‘pluptosidade que ocorre na encosta oriental do planaito. Trecho da Serra ‘aos. Macacos, em Tporanga (Sdo Paulo) Foto E.N.F.A. (Fototeca $.G.E.F.) Trecho do litoral meridional em que a Serra do Mar é diretamente batida pelo oceano. Foto da ‘ponta da Jureia, no municipio de Iguape (Sto Paulo). Foto E.N.F.A. (Fototeca 5.G.E.F.) 4 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES (regiao a leste do Séo Francisco) ai também se destaca como um grande escudo arqueano, granito-gndissico, com o seu tipico relévo em “mar de morros” (suces- sdo de “meias laranjas") ¢ em escarpas produzidas por grandes falhas, recoberto em parte pelos terrenos auro-ferriferos do algonquiano. Ainda quanto ao relévo, earacteriza-se por esta forte espinha dorsal que ¢ a Mantiqueira continuada pelo Espinhaco e pela Chapada Diamantina. O Brasil Central é mais dificil de carac- terizar-se quanto 4 geologia pela grande variedade de terrenos que ai se observam; ha grandes Areas de arqueano e algonquiano, assim como de terrenos sedimen- tares desde o siluriano até o tercidrio; é a regiao menos bem estudada e é bem possivel que um conhecimento mais acurado das suas condigdes permita o seu desmembramento em varias regises. Quanto ao clima, é facil também destacar-se 0 Brasil Meridional. Nao sé a altitude, mas também a latitude, permitem classificar 0 clima desta regiéio como temperado, tal como 0 fizeram HENRrque Mortze e Deteapo pp CarvaLHto e ainda, recentemente, Satomio SEREBRENICK, Se no Estado de So Paulo ainda ha algum carater tropical pela importancia das chuvas de verao, de Parana para o sul entramos francamente no regime das chuvas regularmente distribuidas. No Brasil Oriental, o efeito da altitude “corrigindo a latitude” permite enquadrar uma boa parte como dotada de clima temperado; o exame duma carta de tempera- turas mostra como as isotermas inferiores a 22° avancam em ponta, em direcio sudoeste-nordeste, para o centro do Estado de Minas; a carta das isotermas da temperatura sensivel ainda mais fortemente marcam tal fato, pois as curvas inferiores a 20° penetram até o norte da Baia. Nesta regido, quando se caminha do litoral para oeste, as temperaturas sensiveis vao baixando. No Brasil Central, regio além do Sao Francisco, as temperaturas sensiveis vao subindo 4 proporeao Aspecto do planalto meridional, em Itararé (Sto Paulo). Uma das fatzas de terrenos, sedimentares, ‘ue se sucedem no planaito, € constituida de arenitos devonianos, formando uma “ouesta” deede Farina até as nascentes do Iouassti, a qual no Parané recebe 0 nome de Serrinha (segundo ‘degrau do planaito). 0 rio Itararé entaina profundamente essa. faiza, Jormando um belo “canton” Foto E-W.P.A. (Fototeca S.G.E.P.) © Hexmgur Momzx — “Contribui¢do ao estudo do clima do Brasil” — 1922 — carta n° 2, DIVISAO REGIONAL DO BRASIL 35 Serra da Bocaina, no munictyio de Areias (Sdo Paulo). Asvecto tipico de relévo arqueano, em “mar de morros” (sucessdo de “melas laranjas”), Devido a grande altitude, predominam (08 campos limpos, navendo capées de matos nos. vates. Foto E.N.F.A. (Fototeca 8.G.E.F.) que se caminha para oeste. Esta ultima regiio tem ainda um carter bem mar- cado, pelo forte contraste entre as duas estacdes: a chuvosa e a séca, Quanto & vegetacdo, é na verdade dificil separarem-se as regides Central e Oriental, ambas caracterizadas pela predominancia dos campos cerrados. Mas © Brasil Meridional se distingue nitidamente pelos seus campos limpos, pelas grandes areas de florestas em pleno planalto, conforme as condicées geoldgicas, aqueles ocorrendo nos terrenos mais pobres e estas onde a decomposicio das diabases produziu a fértil terra roxa; caracteriza-se ainda por ser, em sua parte mais tipica, o habitat dessa bela Araucaria Brasiliensis. Tais sio as razées — expostas em tracos muito gerais, pois um estudo por- menorizado alongaria sobremodo éste trabalho — que, ao nosso ver, autorizam diviséo do imenso planalto brasileiro em trés partes distintas. Reconhecendo o valor da divisdo regional que hoje estudamos, titil sobretudo pela clareza em que é firmado o conceito de “regio natural”, somos contudo levados a dar preferéncia, pelos motivos que transparecem da critica acima feita, 4 divisio atualmente adotada no ensino secundario da Geografia, tal como foi proposta pelo Professor Drtcapo pe CarvaLHo, em cinco regides: Norte, Nordeste, Este, Sul e Centro. 1) — Outras divisdes regiondis propostas ‘So intimeras as divisdes que poderiam ser ainda examinadas, Limitamo-nos contudo a indicar somente algumas em largos tracos. Em seu belo trabalho A conguista do Brasil (1926), considera Roy Nasi as seguintes “provincjas fisiograficas”: Antiplanos Guianeses, Planicle Amazénica, Planalto Central, Cordilheiras Maritimas, Planicies do Alto Paraguai e Planicies Litoraneas. Como indica o proprio autor, que evitou criteriosamente usar da expresso “regides naturais”, trata-se duma divisio relativa unicamente ao 36 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES relévo. Basta notar-se que nela no figura a regidio do Nordeste, uma das mais caracteristicas regides do pais. © Professor Honéaro Stivestae no seu capitulo Aspecto Fisico, da Geografia do Brasil publicada pela Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro (1922), divide © pais em quatro regides: Oriental, Intermediaria, Vertente Amazénica, Depres- so Platina. A Regido Oriental corresponde a vertente orlental do planalto, ¢ compreende as bacias dos rios que vertem diretamente para o Atlantico, ao sul do baixo Sao Francisco, abrangendo ainda todo o Estado do Rio Grande do Sul. A Regldo Intermediaria corresponde as bacias do Parana e do So Fran- cisco, A Vertente Amazénica inclue, nao s6 a bacia do mesmo nome, mas também (0 que é realmente estranhavel) a maior parte do Nordeste semi-Arido (a parte que nao pertence & bacia do Sao Francisco). A Depressdo Platina é 0 chamado “Pantanal Mato-Grossense” e corresponde & bacia do Paraguai. Como vemos, nio se trata duma divisio em “regides naturals” e sim em bacias fluviais. Em seu trabalho Aspectos gerais do Brasil di-nos Atserto RANGEL uma bela sintese geogrifica, em tracos fortes, da fisionomia do nosso pais. As quatro partes em que divide o Brasil — Tremedal do Norte, Setor do Nordeste, Cordi- iheira Maritima e Terras Centrais — nao sio precisamente delimitadas, nao tendo tido o autor a intenedo de escrever obra didatica. Pela leltura do texto, pro- curamos reconstituir a delimitacdo. O “Tremendal do Norte” corresponde ao Par4, Amazonas e Acre. O “Setor do Nordeste” inclue os Estados entre o Gurupi e 0 Real, do Maranhao ao Sergipe. A “Cordilheira Maritima” compreende os Estados litoraneos desde o Rio Grande do Sul até o Espirito Santo, e a parte da Baia a leste da chapada Diamantina, “As “Terras Centrais” ineluem Mato Grosso, Goiaz, Minas Gerais e a maior parte da Baia (vale do Sio Francisco e Chapada Dia- mantina). & dificil apreenderem-se as razdes em que se baseou o autor para essa distribuigdo, no tendo havido alias a preocupacéo de estabelecer uma divisio em “regides naturais”. Muito interessante é a divisio estabelecida pelo grande socidlogo brasileiro Sitvro Romero em treze regides,“\ nas quais estuda as condigdes econémicas ¢ sociais dominantes, Trata-se portanto duma divisio, no em regides naturais, mas em zonas sécio-econémicas. Sua delimitacdo é certamente dificil de fixar-se com precisio. (Na Geografia Elementar de Detcano pz CarvaLHo — 7.4 edi¢io — pag. 290 — encontra-se uma carta do Brasil com a indicacéo das zonas consi- deradas por Sizvio RomeRo). Outra divisdo ndo propriamente geografica é a de Lrower WreNeR, em oito regides, subordinada ao critério das comunicacées ferrovidrias (Véde mapa na Revista Brasileira de Geografia, ano, I, n.° 2, pag. 92 — artigo do Eng. Moacrr Suva, J4 citado). m) — Divisdo adotada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica ° Fixando normas especiais para a elaboracao do Anudrio Estatistico do Brasil, © Conselho Nacional de Estatistica, conforme j4 nos referimos (ver pag. 5), estabeleceu em 1938 0 modo pelo qual deve ser feita a regionalizacdo, adotando Para ésse fim a diviséo em uso no Ministério da Agricultura. So as seguintes as regi6es adotadas (véde mapa anexo): I — Norte: Acre, Amazonas, Paré, Maranhio e Piaui; II — Nordeste: Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco e Alagoas; ‘UI — Este: Sergipe, Baia e Espirito Santo; © Pe, Gruizo Pavwmas — Artigo citado — pigs. 21 9 25. DIVISAO REGIONAL DO BRASIL ” IV — Sul: Rio de Janeiro, Distrito Federal, Sio Paulo, Parand, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; V — Centro: Mato Grosso, Goiaz e Minas Gerais. Serra do Curral d’Et Ret, ao sul de Belo Horizonte (Minas Gerais). Constituida de terrenos ‘algonauianos, a serra forma wma esearpa abrupta no contacto com o arquedno, originada, ‘segundo varios autores, por uma faiha, (Fototeca $.G.E.F.) A araucaria brasiliensis constitue um dos elementos tipicos da paisagem do planalto meridional ‘Os'pinheirais ocupam matores dreas em Parand, Santa Catarina e norte do kio Grande do Sul. (Fototeca $.G.E.F.) % FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES N&o conhecemos as razées em que o Ministério da Agricultura se baseou Para estabelecer tal divisio, que, ao nosso ver, nao encontra base suficiente, quer na Geografia Fisica, quer na Geografia Humana. Parece ter dominado 0 critério da posicéo geografica Somente tal critério explicaria a colocacéo de Minas Gerais na regitio Cen- tral, ao lado de Golaz e Mato Grosso. & ste o ponto mais fraco da divisio de que ora tratamos. Conforme salientamos na critica as regides propostas pelo Pe. Pauwets (ver pag. 108 e 111), ha grande distinedo a fazer-se entre as regises central e oriental, de uma e outra parte do grande vale do Sao Francisco. A nio ser 0 Triangulo e 0 Noroeste do Estado, a maior parte de Minas Gerais pertence ao Brasil Oriental. O que é mais grave, quanto ao meio fisico, é a ruptura que 6 feita, da continuidade apresentada por aquele vale, eujo trecho médio, de Pira- pora a Juazeiro, constitue uma unidade geogrifica das mais bem caracterizadas; © mesmo se pode dizer quanto ao planalto, em que a Chapada Diamantina 6 a simples continuacio do Espinhaco. A Geografia Fisica impée a inclusto da maior parte de Minas e de Baia na mesma regio. Conforme também #4 justifi- camos (pags. 106 a 103) a zona litorinea deve ser estudada juntamente com o seu hinterland e assim Espirito Santo e Rio de Janeiro nao devem ser desligados de Minas Gerais. Se tomassemos por base a Geogra- fia Eeonémica, poderia ser justificada a separagao de Minas e Baia, mas nun- ca a ruptura déste bloco construido por Minas, Espirito Santo e Rio de Janeiro. As atuais condicées econdmicas justifi- cam mesmo, como veremos, a uniio de Sd Paulo a Minas. Outro ponto a discutir-se, se bem que menos grave, é a incluso de Piaui © Maranhio na regiio Norte. # certo que 0s dois Estados separados pelo Par- naiba constituem realmente a transi¢ao entre 0 Nordeste semi-arido e a Ama- z6nia super-imida, e por isso sio con- siderados como pertencentes ora a uma, ora a outra regido, segundo diferentes autores, Pelas condicées geol6gicas, cli- miticas e botanicas, 0 oeste mara~ nhense € tipicamente amazénico ¢ 0 sudeste piauiense € francamente nor- destino; a maior parte dos dois Esta- dos difere de uma e outra regido, por condigSespropriase€ a flora, com seus 22s gm. Monte Ale awnnde) of coeais” de babact, que di a nota ca- srande parte do Maronhdo‘e do Plat, scorrendo racteristica a essa parte. Desde que, — “™#% Poem em menor escald, no numa divisio pritica nfo podemos pensar em desmembrar unidades pol ticas, e sendo também inconveniente cairmos na sub-divisio excessiva, num gran- de mimero de regides, somos forcados a incluir tais Estados na regido vizinha & qual mais se assemelham. 0 Maranhio e o Piaui diferem das regides vizinhas, mas diferem muito menos do Nordeste do que da Amazénia. (Fototeca $.G.£.F.) # 0 relévo 0 fator mais importante que aproxima ésses Estados, da regio nordestina; em yez de baixas planicies, a maior parte deles é constituida de DIVISAO REGIONAL DO BRASIL 9 extensos planaltos, os “tabuleiros”, de aspecto muito semelhante as “chapadas” do Nordeste. No Piaui ha ainda uma grande area sujeita As sécas, e mesmo em zonas onde chove suficientemente ha rios que “cortam” devido as especiais con- digdes de permeabilidade dos arenitos permianos. Quanto a flora, é muito maior ‘a rea ocupada pela caatinga e pelo agreste, do que pela floresta equatorial, que 86 ocorre no oeste maranhense. A carnaubeira, tipica da regiao nordestina é lar- gamente ocorrente no Piaui, Quanto ao babacti, que nestes dois Estados encontra © seu habitat por exceléncia, nao contribue para ligé-los a nenhuma das duas regiées vizinhas, pois “cocais” ocorrem ainda com frequéncia no Brasil Central. Se atendermos as condicdes econémicas, ainda mais se acentuara a preferéncia pela inclusio do Maranhio e do Piaui na regiio do Nordeste, conforme ainda examinaremos. Parece-nos, pois, que a divisio adotada atualmente pelo Instituto, alids em carater provisorio, deve ser modificada, por nao ter fundamentos sélidos, quer na Geografia Fisica, quer na Geografia Humana. Carnaubal em Parnaiba (Piaui). A carnaubeira, wma das maiores riquesas naturais dos Estados ‘nordestinos, ocorre também em quase todo Piaut ¢ em parte do Maranhdo, Foto Rembrandt (Fototeca do S.G.E.F.) n) — Divisdo regional segundo o Conselho Técnico de Economia e Financas Afim de servir de base aos trabalhos da Conferéncia Nacional de Economia e Administracdo, organizou o Conselho Técnico de Economia e Financas, em 1939, uma divisio do Brasil em “zonas geo-econémicas”. Conforme seu nome claramente indica, no se trata de “regiées naturais” e sim duma diviséo baseada predomi- nantemente nos fatos econémicos. © Conselho merece aplausos por ter evitado a pratica abusiva, a que ja nos referimos (ver pag. 79), de qualificar de “naturais” regi6es que so definidas por critérios estranhos 4 Geografia Fisica, considerada dum modo integral. 0 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES ‘Sdo as seguintes as regides (ver mapa anexo) : I — Norte: Acre, Amazonas, Para, Maranhfo e Piaui; II — Nordeste: Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco, Ala- goas, Sergipe e Baia; TIT — Sudeste: Espirito Santo, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Minas Gerais e Sio Paulo; IV — Sul: Parana, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; V — Centro: Goiaz e Mato Grosso. As zonas geo-econémicas nao correspondem — e nem poderiam corresponder conforme vimos na parte II déste trabalho (capitulo d pags, 91 a 95) — as regiées naturais. A Geografia Fisica nao autoriza, por exemplo, a reuniio de S40 Paulo a Minas, antes o coloca na regiéo meridional, conforme mostramos na critica que fizemos & divisio proposta pelo Pe. Pauwets (ver pags. 108 a 111); néo autoriza também a ruptura da whidade Mind-Baia; mas as atuais condicées econémicas assim o prescrevem, © ‘nico ponto discutivel, ao nosso ver, 6 a incluso do Maranhao e Piaui, na regido setentrional. Quanto As condigées naturais, j4 criticamos tal inclusio ao tratarmos da divisaéo adotada pelo I.B.G.E.. Parece-nos, além disso, que a propria Geografia Econémica antes localiza ésses Estados na regio nordestina. Nao conhecemos as razdes que levaram o Conselho Técnico a assim compor @ regio Norte. Tudo indica que a forma extrativa de que se reveste a producio, foi o traco caracteristico considerado para justificar tal composic&o. De fato, nesses cinco Estados predomina a producio vegetal extrativa. Se examinarmos, porém, atentamente quais so os produtos de uns e outros, clara distinedo surge. Os produtos extrativos caracteristicos da Amaz6nia — Acre, Amazonas e Paré — ‘io bem diversos dos que predominam no Maranhio e Piaui, Naqueles preva- DIVISAO REGIONAL DO BRASIL a lecem a borracha, a castanha, as madeiras, insignificantes nos dois tltimos Estados; nestes, a producdo é sobretudo de babacti e carnatiba, quase inexistente naqueles. No Maranhio j4 a producéo agricola assume certa importancia com o arroz, a cana de aciicar, 0 algodao e a mandioca. O céco e a mamona, produtos essencialmente nordestinos, j4 comecam a tomar certo vulto na economia ma- ranhense e piauiense. A pecuaria j4 ai atinge certo desenvolvimento, sobretudo quanto ao gado caprino, no qual os Estados do Nordeste teem a primazia. Neste ramo da economia, o sertao piauiense e maranhense é uma continuacao dos sertées pernambucano e baiano. &, alids, conhecida a grande importancia que teve a pecuaria no desbravamento e povoamento do Piaui. Laranjais em Nova Iouasst (Estado do Rio). Foto Rembrandt (Fototeca do $.G.E.F.) Por essas breves consideracdes, somos de opiniao que Maranhio e Piaui teem problemas econémicos mais afins com os do Nordeste, do que com os da Amazénia. Quanto &s outras zonas econémicas estabelecidas pelo C.T.E.F., nao se pode deixar de reconhecer que teem fortes fundamentos nas condicdes econdmicas atuais. Uma diviséo em regides econémicas sera tanto mais bem fundamentada, quanto mais fortes forem os contrastes que se formem de regio a regido, ao ‘mesmo tempo que maiores semelhancas apresentem as partes que compéem cada uma delas. Tais contrastes aparecem mais fortemente na divisio que ora estu- damos, do que em qualquer outra no qual se agrupem de modo diferente as unidades politicas. © mais interessante désses agrupamentos é a chamada “zona do Sudeste”, regio de concentracio por exceléncia. Contando apenas com 11% da area do pais, concentra 45% da populac&o, com a elevada densidade de 21 habitantes Por quilémetro quadrado. Ai est&io 41% dos municfpios brasileiros. Economica- a PABIO MACEDO SOARES GUIMARAES Canavial em Cravinhos (S40 Paulo). Foto E.N.F.A. (Fototeca 8.G.B.F.) mente é também uma zona de concentrac&o. Representa 59% da producio vegetal do pais e 79 % da producdo industrial. Pode ser definida como a regiéo do café (94% do total brasileiro), do algodio (69%), da laranja (79%), da banana (70%), do arroz (64%), do milho (56%) e do agtcar (52%). Contém 57% da extensdo da rede ferrovidria e 47% das rodovias. © nordeste avulta por sua vez em relacdo a outros produtos, como sejam o cacau, (95%), 0 céco (99 %), a mamona (71 %)a farinha de mandioca (56%), tendo perdido a sua antiga posi¢ao em relac&o ao aciicar (44%) e ao algodio (28%). © sul mantém a primazia quanto aos produtos de clima temperado, como sejam: a quase totalidade do trigo, da aveia, da cevada e do centelo produzidos no pais (sao produtos que ainda pouco pesam na economia brasileira, mas que muito importam quanto caracterizacio regional pelas especiais condigSes na- turais de que dependem) , 90 % da alfafa, 78 % do vinho. & por exceléncia a regiio das madeiras exploradas industrialmente, do mate e fornece todo o carvio mineral produzido no Brasil. Organizando-se uma distribuicéo percentual em relacio a cada produto, pelas diversas regides, nenhuma outra divisio regional apresentaré tio grandes contrastes como a que ora examinamos rapidamente. Dentro de cada regio, 0s aspectos econémicos dos Estados componentes se assemelham mais entre si do que com os de quaisquer outros, com a tinica ressalva jé feita em relacio a0 Maranhio e ao Piaui. Felta a modificacdo que propomos, isto é, que estes dois Estados sejam inclui- dos na regio do Nordeste, cremos que esta seré a melhor divisio regional do Ponto de vista da atual situacio econémica. # interessante notar-se que, com a DIVISAO REGIONAL DO BRASIL 2 Trigal no norte do Parand. No Brasil 0 trigo é eultivado ne atwalidade quase que ezclusivamente ‘nos irés Estados mais ao. sul. (Fototeca §.G.E.F.) modificacio proposta, esta divisio quase coincidiria com a que foi apresentada, j@ h& muitos anos pelo Dr. Ezequiet CAnprvo pe Sousa Brrro,* em um ensaio ‘sobre Zonas naturais de produedo brasileira em suas relagGes botdnicas e dendro- légicas, publicado no Boletim do Ministério da Agricultura (ano II, n° 2). A tinica diferenca seria proveniente do destaque, que faz ésse autor, do Rio Grande do Sul, como zona a parte (ver mapa anexo). Cultura de alfaja no norte do Parand (Municipio de Bandetrantes). (Fototeca $.G.5.F.) = Moncm Suri, — Geogratia dos Transportes no Bras! ("Revista Brasileira de Geoorafia” — ‘Ano I — N.o 2 — pag. 91). ¢ = “4 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES IV — CONCLUSOES Do exame critico feito no capitulo precedente resultam as seguintes con- clusées: a) dentre as muitas divisdes regionais do Brasil até hoje propostas, a melhor diviséo baseada nas “regides naturais”, e portanto de acérdo sobretudo com os fatos da Geografia Fisica, é a que foi proposta pelo Professor Det- capo De CARVALHO e adotada nos programas do ensino secundario da Geo- erafia, tendo-se em vista o atual grau de conhecimento relative 20 nosso territério; b) dentre as divisées em regides econémicas, relativas portanto a fatos da Geografia Humana, a melhor é a que foi estabelecida pelo Conselho ‘Técnico de Economia e Financas (desde que os Estados do Maranhio e Piaui passem a ser incluidos na regio Nordeste), tendo-se em vista a atual situagao econémica do pais. Quanto a escolha entre essas duas divisdes, convém reportamo-nos as consi- deracées feitas no capitulo e (“Base para a divisdo pratica”) da parte II, e as conclusdes gerais expostas A pagina 97. Uma divisio baseada nas “regiées na- turais” tem a grande vantagem da estabilidade, permitindo um melhor estudo da evolugéo dum pais através do tempo, pela comparacéo dos dados estatisticos referentes a diversas épocas. Uma divisio baseada nas “regides humanas”, e, em particular, referente aos fatos econdmicos, permite um melhor estudo da situacdo dum pais, num dado momento, quando for dada maior importancia 4 comparacdo no espago, de umas partes com as outras. Notamos ainda que as regides humanas, em sua instabilidade, ora se dis- tanciam, ora se aproximam das regides naturais (ver pag. 96). E 0 que talvez ainda venha a ocorrer no Brasil, conforme alguns exemplos que podemos con- siderar. So Paulo, que pelas suas condigées naturais pertence ao Brasil Meridional, € contudo, pela sua atual situagdo econémica, incluido na zona econémica de Sudeste, juntamente com Minas, Rio de Janeiro e Espirito Santo. O laco mais forte que uniu ésses Estados foi sem diivida o café; ora os trés Wltimos nao teem condigées naturais tao favoraveis @ lavoura cafeeira, como Sio Paulo, com a sua magnifica “terra roxa”. Modernamente assistimos ao progresso dessa lavoura no norte do Parana que apresenta condicées tao favoraveis como as de Séo Paulo. & provavel assim que a produciio de café caia naqueles Estados e continue a cres- cer no Parana; nessas condigées Séo Paulo tendera, cada vez mais, a ter maiores afinidades econdmicas com éste Estado, ao passo que se afastaré daqueles. Se 0 Estado bandeirante incrementar a produgdo vegetal mais adaptada ao clima temperado, cada vez mais se integrara na regido natural a que pertence. Atualmente Bafa ¢ Minas apresentam poucas afinidades econémicas, pois as zonas mais présperas de um e outro Estado muito se diferenciam. A proporeao que ambos mais incrementarem 0 desenvolvimento do seu hinterland, sobretudo do vale do So Francisco, mais semelhantes se tornario do ponto de vista econémico. Como exemplo da instabilidade das regides econémicas, lembremos que, no século XVIII, durante o “ciclo do ouro”, Minas constituia juntamente com Golaz e Mato Grosso uma zona econémica. O “ciclo do café”, no século XIX, deslocou aquele Estado para a regio do Sudeste. E novos deslocamentos ainda poderao ocorrer. Tais consideracdes pesam a favor das “regiées naturais” como quadros fun- damentals para o estudo dum territério. Lembremos ainda a opinido radical de DIVISAO REGIONAL DO BRASIL “6 Gzonc von Mayr (ver pag. 81) um dos mais ilustres mestres da Estatistica, que aconselhava que os dados estatisticos féssem referidos as regides naturais. Acresce ainda que somente uma divisio déste tipo podera ser adotada para fins didaticos, pois de outro modo néo se podera fazer de maneira adequada o estudo da Geo- grafia Fisica. Se fésse adotada uma divisio baseada em regides humanas, para fins administrativos, sobretudo estatisticos, teriamos entdo duas divisdes oficiais no mesmo pais: uma usada no ensino, outra na administracio. Cajezal em Bandetrantes (norte do Parand). Grande parte do planalto paranense constituido de arenitos tridssicos, com vastos derrames de lavas basalto-diabdsloas cuja decomposiodo origina 4@ fértil terra roza, com dttmas condigdes para a cultura do cafeciro. Observe-se @ quase horizontalidade do planaito. (Fototeca $.G.E.F.) No caso particular da divisio atualmente adotada no ensino secundario, milita ainda uma circunstancia favoravel 4 sua adocio geral: quase toda uma geracao de brasileiros aprendeu a conhecer 0 territério patrio através de tal diviséo, que tem demonstrado corresponder perfeitamente as necessidades do ensino, e assim as regiées que ela considera j4 séo familiares & mocidade do Brasil. Ao geégrafo, somente cabe fornecer ao administrador uma base para a divisio prdtica, tinica para fins administrativos, sobretudo estatisticos. Se ao adminis- trador mais importar uma diviséo que corresponda a situacéo econémica mo- menténea do pais, ent&o é natural que escolha uma diviséo em zonas econémicas, embora tenha de alterd-la alguns decénios mais tarde. Se, porém, preferir uma divisio estével, permanente, que permita bem estudar a evoluc&o do pais, pela referéncia de todos os dados a quadros regionais fixos, indicados pela natureza, deverd nesse caso basear-se numa diviséo em “regides naturais”. © depoimento da Geografia é favordvel a esta tiltima solugdo. 6 FABIO MACEDO SOARES GUIMARAES ADENDO © presente trabalho constitue um parecer elaborado em obediéncia a uma determinacao do Diretorio Central do Conselho Nacional de Geografia, o qual resolvera atribuir ao Servieo de Geografia e Estatistica FisiogrAfica, érgao exe- cutivo central do Conselho, o eneargo de realizar um estudo sdbre 0 estabeleci- mento duma divisio regional do Brasil, que apresentasse condicées satisfatorias para adocao geral. Pelo Diretor désse Servico foi distribuida tal tarefa ao chefe da Seceio de Estudos Geograficos. Feitos os necessirios estudos a respeito da necessidade da fixacio duma di- visio Unica, sdbre 0 conceito de regiao natural e examinadas as divisdes regionais propostas por diversos autores, conclue o presente parecer pela preferéncia & divisio da autoria do professor Dexcapo pe CanvatHo, atualmente adotada pelo ensino secundario de Geografia, e que é a seguinte I — Brasil setentrional ou amazénico (Acre, Amazonas e Para); II — Brasil norte-oriental (Maranhio, Piaui, Ceara, R. G. do Norte, Paraiba, Pernambuco e Alagoas) ; > TIT — Brasil oriental (Sergipe, Baia, Espirito Santo, Rio de Janeiro, Dis- trito Federal e Minas Gerais) ; IV — Brasil meridional (Sa Paulo, Parana, Santa Catarina e R. G. do Sul) ; V — Brasil central (Goiaz e Mato Grosso). Aprovado pelo Diretério Central em reunifio de 3 de Fevereiro de 1941, serviu asse parecer de base a um projeto de resoluedo que fol apresentado & Assembléia Geral do Conselho Nacional de Geografia, reunida em Julho seguinte. Durante a discussio do projeto, foram apresentadas sugestes valiosas, de parte de emi- nentes gedgrafos brasileiros, como sejam os professores EVERARDO BACKHEUSER, Detcapo bp CARVALHO, FERNANDO Rasa GABAGLIA € outros. Os debates versaram especialmente sObre ‘a consideracdo de Maranhio e Piaui. duma parte e de Sergipe e Baia, de outra, como regides distintas. Pela resolugio n° 72, de 14 de Julho de 1941, aprovada unanimemente pela Assembléia, ficou mantida a divisao em cinco grandes regides, conforme o pro- jeto original, modificadas porém as suas denominagoes ¢ subdivididas as regioes Nordeste e Leste em duas partes cada uma. Tal subdivisdo teve em mira atender as caracteristicas peculiares aos Estados de Maranhao e Piaui e também aos de Sergipe e Baia. E a seguinte a resolucao: RESOLUGAO N° 72, DE 14 DE JULHO DE 1941 Fiza o quadro de divisdo regional do Brasil, para fins praticos, promove a sua adocdo pela Estatistica Brasileira e dé outras providéncias. ‘A Assembléia Geral do Conselho Nacional de Geografia, no uso das suas atribuicdes: Considerando que a divisio do Brasil em regides, tal como é presentemente adotada pela Estatistica Brasileira, necessita de revisio e atualizagio que as tornem mais consenténeas com as caracteristicas geograficas naturais, de con- formidade com os mais recentes conhecimentos do territorio nacional; ‘Considerando que 2 fixaedo de uma divisio regional deve ser fundada em culdadosos estudos geograficos em que se tomem na devida consideracio os fatores da Geografia Fisica ¢ da Geografia Humana, de maneira que se agrupem elementos territoriais homogéneos; ‘Considerando que a divisio regional do pais é tanto mais util quanto melhor refletir as condi¢des do meio ambiente; . Considerando, porém, que, para atender as conveniéncias praticas, ha neces- sidade de reduzir-se o ntimero das regiGes territoriais do pais, e, ao mesmo tempo, de ndo se desmembrar qualquer unidade federada; Considerando a vantagem inestimavel, pata 4 administracdo, de se genera- liar a maneira uniforme de se proceder ‘a pesquisas e a trabalhos geograficos de qualquer natureza; ‘Considerando o apélo formulado pela Junta Executiva Central do Conselho Nacional de Estatistica em sua Resolugdo n.° 108, de 21 de Marco de 1941, no sentido de ser apresentada uma proposta de divisdo regional que permita a solueao definitiva déste assunto sob o ponto de vista pratico; Considerando, enfim, que 0 IX Congresso Brasileiro de Geografia solicitou encarecidamente ao Conselho que promovesse, sob sua orientagao, estudos sobre DIVISAO REGIONAL DO BRASIL a a delimitagao cientifica das regides naturais do Brasil, dentre os quais avulta a pesquisa acérca da fisionomia do territério nacional, principalmente em re- lacdo & sua flora; Resolve: Art. © — Sao estabelecidas como normas gerais para a fixacio dum quadro de divisio regional do Brasil, destinada a utilizacses praticas, as seguintes: a) Agrupamento de unidades federadas realmente ligadas por ocorréncias geograficas dominantes e caracteristicas, e que apresentem aspectos comuns formadores de conjuntos peculiares; b) Indivisibilidade de qualquer unidade componente, de maneira que seja localizada na regido em que apareca preponderantemente; ¢) Fixagao de um niimero reduzido de regides para se efetuar a divisio. Art, 2° — Fica fixado, para fins praticos e uso dos érgdos do Conselho Nacional de Geografia, 0 seguinte quadro de: DIVISAO REGIONAL DO BRASIL 1.8 — Regido Norte, com o Territério do Acre e os Estados do Amazonas e Para 24 — Regido Nordeste, compreendendo duas partes: 0 Nordeste Ocidental, com os Estados do Maranhao e Piaul; e o Nordeste Oriental, com os Estados do Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco e Alagoas; 3. — Regido Leste, compreendendo duas partes: o Leste Setentrional, com os Estados de Sergipe e Baia; e o Leste Meridional, com os Estados de Minas Gerais, Espirito Santo, Rio de Janeiro e 0 Distrito Federal; 42 — Regiéio Sul, com os Estados de Sio Paulo, Parané, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; 58 — Regido Centro este, com os Estados de Goiaz e Mato Grosso Art, 3° — Ao Conselho Nacional de Estatistica devera ser esta enviada com a soliciiaedo de a examinar, afim de que seja também adotada na Estatistica Brasileira ‘Art, 4° — Adotado pelos Consethos dirigentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica o quadro da divisio regional, providenciara 0 Presidente désse Instituto a sua generalizacao em todo o pais, para o que promoverd a expedicio de atos do Poder Publico que se tornarem convenientes ou necessarios. Art. 5° — A Repartieao Central do Conselho realizara estudos a respeito da delimitacao das cinco grandes regides naturais do pais, determinando, para ésse fim, pesquisas e observacdes locais, quer diretamente, quer mediante os Diretérios Regionais e Municipais do Conselho, por meio de inquéritos adequados, nos quais a flora serd observada de maneira especial. Rio de Janeiro, 14 de Julho de 1941, Ano VI do Instituto A divisio regional aprovada foi ainda objeto de exame por parte da Assem- bléia Geral do Conselho Nacional de Estatistica, que determinou a sua adocao na Estatistica Brasileira, a partir de 1° de Janeiro de 1942, por melo da se- guinte resolugao: RESOLUCAO N.° 225, DE 26 DE JULHO DE 1941 Manifesta 0 aplauso do Conselho a nova Divisdo Regional do Brasil firada pelo Conselho Nacional de Geografia ¢ dé outras providéncias a respeito. A Assembléia Geral do Conselho Nacional de Estatistica, usando das suas atribuigoes, e, Considerando o que dispés a Resoluedo n° 108, da Junta Executiva Central, sobretudo na parte referente a conveniéncia, para os interésses da administ em geral, e da estatistica, em particular, da uniformizagao dos varios critérios ora prevalecentes quanto’A divisdo regional do Brasil; Considerando que a Assembléia Geral do Conselho Nacional de Geografia, tendo em vista 0 apélo formulado a ésse respeito pela Junta Executiva Central, fixou em sua Resolugao n° 72, de 14 de Julho de 1941, 0 quadro de divisao regional do Brasil, para fins praticos, encarecendo ainda a sua adocdo pelo sistema estatistico’do pais; Considerando que, por outro lado, a referida Assembléia estabeleceu, em sua Resolugdo n° 77, de 17 de Julho de’1941, as normas a que deverd obedecer a divisdo. regional ‘das diversas unidades federadas, segundo critérios uniformes e obedientemente a principios de sistematizagao e racionalidade; 8 PABIO MACEDO SOARES GUIMARAES Resolve: Art. 1° — Fica adotada na Estatistica Brasileira, para prevalecer a partir de 1° de Janeiro de 1942, 0 novo quadro de divisdo regional do pais, fixado pelo Conselho Nacional de Geografia na Resolucio n.° 72, de sua Assembléia Geral. Art. 2° — © Conselho Nacional de Estatistica aplaude as normas estabele- cidas na Resolugéo n° 77, da mesma Assembléia, para a diviséo regional das unidades federadas, segundo as particularidades geograficas dos seus diversos municipios, e recomenda expressamente aos varios rgaos regionais do sistema sob sua jurisdig¢aio que, solidariamente com os érgaos da ala geografica, promo- vam os estudos e providéncias necessarios & integral execucio do que dispoe a mesma Resolucdo n° 77. ___Art, 3.9 — ® anexado & presente Resolucéio, para melhor conhecimento dos érgaos integrantes do sistema estatistico do Instituto, o texto das Resolucdes ns. 72 e 77 da Assembléia Geral do Conselho Nacional de Geografia. Rio de Janeiro, 26 de Julho de 1941, Ano VI do Instituto. .. Apés 0 pronunciamento dos dois Conselhos, dirigiu-se a Presidéneia do Ins- tituto Brasileiro de Geografia e Estatistica ao Sr. Presidente da Republica, sub- metendo a consideracao de Sua Exceléncia uma proposta, no sentido de ser generalizado o uso, Delos Servicos Piblicos, da divisdo regional adotada pelo Instituto Levando em consideracio a proposta, o Sr. Presidente da Reptblica deter- minou que fossem ouvidos os érgdos interessados, entre os quais 0 Conselho ‘Técnico de Economia e Financas. Esse Conselho, que organizara em 1939 (con- forme se acha exposto no artigo ora publicado) uma diviséo do Brasil em “zonas geo-econémicas”, bem fundamentada quanto & atual situacio econémica do pais, resolveu, com grande desprendimento e elevado espirito de cooperacio, adotar 2 mesma ‘divisao regional que o Instituto, reconhecendo que uma dlvisao baseada em fatos da geografia fisica tem a vantagem de ser mais estdvel. Assim devidamente considerado o assunto, resolveu o Sr. Presidente da Re- piblica determinar que fosse adotada nos Servicos Publicos a divisio regional organizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica, mandando ex- pedir a circular n° I, de 31 de Janeiro Ultimo, da Secretaria da Presidéncia da Repiblica. # 0 seguinte o texto da circular, publicada no Didrio Oficial de 4 de Feve~ reiro déste anc Circular N.° 1/42 Senhor Ministro: © Excelentissimo Senhor Presidente da Repiiblica, tendo presente sugestio que Ihe apresentou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica, resolveu determinar que, para os trabalhos e estudos procedidos por ésse Ministério, nos quais nao se imponha uma peculiar divisdo do territorio nacional, se adote a organizada pelo referido Instituto, transcrita em seguida: I — Regido Norte; Territério do Acre e Estados do Amazonas e Para; I — Regidio Nordeste: dividida em duas partes: Nordeste Ocidental: Esta- dos do Maranhao e Piaui e Nordeste Oriental: Estados do Ceara, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco e Alagoas; TIL — Regido Leste: dividida em duas partes: Leste Setentrional. Estados de Sergipe e Baia e Leste Meridional: Estados de Minas Gerais, Espirito Santo, Rio de Janeiro e Distrito Federal; IV — Regido Sul: Estados de Sao Paulo, Parand, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; V — Regio Centro-Oeste: Estados de Goiaz e Mato Grosso. Aproveito o enséjo para apresentar a Vossa Exceléncia os meus protestos de elevada consideracdo e distinto apréco. Em 31 de Janeiro de 1942. — Alberto de Andrade Queiroz, Secretario da Presidéncia da Republica, interino. Expedida a todos os Ministérios. ‘Gonselno Nacional de Geograjia. Cartograma da divtsdo regional do Brasil para fins praticos, aprovada pelo

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