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e) Regimento do Santo Oficio da Inqúsição dos Reinos de Portugal

ordenado por mandado do ilustríssimo e reverendíssimo seúor Bispo,


Dom Francisco de Casto,Inqúsidor-Geral do Conselho de Estado de
SuaMajestade
-1il0
Em Lisboa, nos Estados, por Ìúanoel da Silva.
1640
O Regimento de 1640 vigorou por 134 anos.
O título vem dento de um deseúo feito por Agostiúo Suarez Floriano,
representando um portal de templo, ladeado de colunas ornamentais. Ao alto,
no vértice do frontão, abrem-se as annas da Inquisição, ladeadas pordois anjos
alados. No final, uma viúeta biangular com leüas IHS, emblemadas da
Companhia de Jesus.
O Regimento contém folha com a provisão do bispo Inquisidor-Geral e
mais duas com o Indice dos livros e títulos que contéur. No final, constam o
Edital da Fé e o Monitório Geral, além da Forma do juramento que se há de
fazer nas visitas do Santo OfIcio, e as Fórmulas de conciliação e abjuração em
forma. Por fim um minucioso índice de assuntos.
Com parecer do Conselho Geral, o Regimento foi aprovado e confirmado
pelo Inquisidor-Geral, invocando, para isso, a autoridade apostólica de que
estava revestido. Não há confirmagão régia.

REGTMENTO DO SANTO OFÍCrO DA rNQr,nSrçÃO


DOS REINOS DE PORTUGAL

ts,
LIVRO I
bc Dos ministros e oficiais do Santo Aficio,
t,t e das coisas que nele lai de hover

rÍrut oI
Do número, qwlidades e obrigações dos ministros
e ofrciais da Inquisição

lo. Em todas as Cidades deste Reino, onde residir o S. Ofício, haverá fês
Inquisidores, quatro Deputados com ordenado e sem ele, os mais que nos
parecer, um Promotor, quaüo Notários, dois Procuradores de pÍesos, e os
Revedores que forem necesúrios, um Meiriúo, um Alcaide e quaúo Guardas

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Sônia Aparecida de Siqueira

no cáÍcere secreto, um Porüeiro, três Solicitadores, um Despenseiro, três ho-


mens doMeirinho, doisMédicos, um Cirurgião, um Barbeiro, um Capelão, um
Alcaide e um Guarda no ciárcere da penitenciánia.Haverâmais em cada um dos
lugares marítimos um Visitador das navios de estrangeiros, com Escrivão de
seu caÍgo, um Guarda e um Intérprete; e em cada uma das Cidades, vilas e
lugares mais notáveis, um Comissário com seu Escrivão, e os Familiares que
forem necessiírios.
2o. Os minishos e oficiais do S. Ofício serão naturais do Reino, Cristãos
velhos de sangue limpo, sem a raça de Mouro, Judeu, ou gente novamente
convertida a nossa santa Fé, e sem fama em contriário; que não tenham incorrido
em alguma infâmia pública de feito ou de direito, nem forem presos, ou
penitenciados pela Inquisição, nem sejam descendentes de pessoas, que tiverem
algum dos defeitos sobreditos, serão de boa vida e costumes, capazes para se
lhe encarregar qualquer negócio de importância e de segredo; e as mesmas
qualidades concorrerão na pessoa, que o Ordiniírio nomear para assistir em seu
nome ao despacho dos processos das pessoas de sua jurisdigão. Os oficiais
leigos, convém a saber, Meirinho, Alcaide, e todos os mais saberão ler e
escrever; e, se forem casados, terão a mesma limpeza suas mulheres e os filhos
que por qualquer via tiverem.
3o. E porque convém, que entre os ministros e os oficiais do S. Oficio não
haja parentesco; ordenamos, que um Inquisidor com outro, ou Inquisidor com
Deputados, e Promotor, e os Deputados entre si, ou com o mesmo Promotor,
que houverem de servir em uma mesma Inquisição, não sejam parentes dentro
do segundo grau de consangüinidade; e os mais ministos e oficiais, até quato;
e estes graus serão contados confonne a direito Canônico.
40. Para constar das qualidades sobreditas, que hão de ter os ministros e os
oficiais do S. Ofício, se farão informações, por despacho nosso, ou do Conse-
lho-Geral, nos lugares onde eles e seus pais, e anos foram naturais e moradores:
porém, antes de dar início a elas, mandaÍão os Inquisidores fazerem diligências
nos Repertórios, para que conste se há no S. Oficio culpas contra os pretenden-
tes; e a mesma diligência procurarão que se faça nas mais Inquisições, e
achando-se alguma culpa, sobrestarão nas informações e nos darão conta da
qualidade del4 e não a havendo, se passarão disso certidões, que mandarão
juntar às diligências. E por enquanto convém que estas se façam com grande
inteftez.a,principalmente as dos Inquisidores, Deputados, Promotor e Notários:
ordenamos, que os inquisidores por si façam as informagões para estes minis-
tros sendo no lugar, em que assiste o S. Ofício, e as de fora cometerão a um
Deputado, e a todas as mais farão os Comissririos, ou pessoas, que os Inquisi-
dores ordenarem; salvo as que se houverem de fazer nos lugares em que assiste
a Inquisição: porque nessas se guardará a ordem, que se dá no Título III, deste
livro, $14.

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5o. Tanto que foram feitas as informações das pessoas, que houverem de
entrar no servigo do S. Oficio, os inquisidores as enviarão ao Conselho-Geral,
para nele as verem e sendo aprovadas, lhes mandaremos passar carta do caÍgo,
ou oÍïcio, em que forem providas, a qual irá assinada por nós, e lhe será entregue
pelo Secretário do Conselho; e com ela, antes de começaÌem a servir, se
apresentarão na mesa da Inquisição e aí tomarão juramento de segredo, e de
bem, e fielmente, cumprirem com as obrigações dos seus ofícios, de que fanâ
termo um Notário, que os providos assinarão com os inquisidores no livro das
criações, onde também se registraní a provisão; e este juramento não se tomará
por procurador, sem especial licença nossa.

6". Os ministros e oficiais do S. OÍlcio guardarão inteiramente tudo aquilo,


a que são obrigados, conforme ao que neste regimento dispõem, e o mais que
por nós for encarregado, e além disso os Deputados, e o Promotor, Noüírios e
Oficiais, farão o que os Inquisidores lhes ordenarem, cada um na conformidade
de seu Regimento. E para que uns e ouhos tenham sempre presentes as coisas
que devem cumprir e observar, ordenamos, que os inquisidores, Deputados e
Promotor tenham o Regimento em sua casq e aos mais oficiais mandarão os
Inquisidores dar o traslado do título que a cada um deles lhe pertence, para que
teúam dele notíci4 e possam melhor cumprir com as obrigações de seus
oficios.
7. E por enquanto o segredo é uma das coisas de maior importância ao S.
Oficio, mandamos que todos o guardem com particular cuidado, não só nas
matérias de que poderia resultar prejuízo, se fossem descobertas, mas ainda
naquelas, que lhes parecem de menos consideração, porque no S. OÍicio não
há coisa em que o segredo não seja necessiírio.

8o. Procederão em tudo de maneira que dêem de si bom exemplo, tratar-


se-ão com a modéstia e decência conveniente a seu estado, não farão agravo,
ou vexação a pessoa alguma com o poder de seus offcios, ou com pretexto de
privilégios de que gozam, não consentirão que a façam seus familiares, ou
criados. Falarão com tal advertência na gente de nação, que nunca deles se possa
cuidar, que o ódio, que todos devem ter ao delito, se estende também às pessoas,
antes, se compadecerão quanto é justo da fraqueza daqueles que cometerem
culpas contra nossa S. Fé. Não terão trato, ou comunicagão partioular com
pessoas de suspeita, que teúam, ou possam ter negócios no S. Ofïcio, nem
delas se servirão dadivas, ou presentes, ainda que sejam de pouca valia, nem a
título de compra tomarão mercadorias, ou medicamentos a pessoa alguma por
menos preço do ordinário, nem pedirão emprestado à gente de nação, pelos
inconvenientes que podem resultar do contnário; e procurarão quanto for
possível não contrair dívidas, que possam causaÍ queixas, ou diminuir a
autoridade, que a suas pessoas, e ofïcios é devida.

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9o. Nenhum ministro ou oficial do S. Oficio aceitará comissão alguma, sem


primeiro o fazer saber, nem se poderá ausentar da Inquisição em que servir,
sem especial licença nossa; porém os Inquisidores do lugar em que não
estivermos presentes, poderão dar licença aos Deputados declarada no $ 49 do
Título III deste livro. Os ofìciais leigos não casarão sem primeiro dar conta
disso em mesa, e os Inquisidores guardarão o que neste caso dispõem o $ 51
do Título III deste livro.
10. Os ministros, e oÍiciais contínuos, que assistem na mesa do despacho,
no secreto, e na sala do S. Oficio, procurarão, com toda a pontualidade, ouviÍ
missa, que se há de dizer no Oratório da Inquisição meia hora antes de se entrar
em despacho, para que por meio deste divino Sacrifício cumpram todos melhor
com a obrigação de seus ofícios.
1 l. Todos os dias que não forem feridos pela tábua, que há de estar por nós

assinada no secreto, haverá na Inquisição despacho três horas pela manhã" e


três à tarde, exceto nos sábados à tarde, em que o despacho durará duas horas
somente. Do 1o outubro até a Páscoa de Ressurreição, será das oito até as onze,
e das duas até as cinco, e depois da Páscoa até o derradeiro de setembro, será
das sete até, as dez, e das três até as seis, e os ministros, e oficiais contínuos do
S. Oficio assistirão na Inquisição por este tempo conforme ao que no título de
cada um está disposto.
12. Haverâ em cada ano o mantimento, e ordenado, que lhes assinarmos
por nossas provisões, o qual lhes será pago por folha aos quartéis, e as provisões
se registrarão no livro que para isso há de haver; e vencerão mais cada dia
quando forem por ordem do S. Oficio fazer alguma diligência fora da Cidade
em que assiste o Tribunal, os Inquisidores quatro cruzados; os Deputados, e
promotor três; os notários dois; o Meirinho seis tostões; os solicitadores cinco;
os homens de Meirinho dois tostões.

TÍTULO il
Das casas do despacho, audiências, secreto,
oratório, e cárceres,
e das coisas que lhes pertencem

1o. Haverá em cada uma das Inquisições uma casa para a mesa do despacho,
a qual estarã em lugar tão resguardado, que de fora dele se não possa coisa
alguma do que aí se tratar, e estarão nesta casa as cadeiras de espaldar, e rasas,
que parecem necessárias, e um banco para os presos se assentarem, e estará
armada no inverno com panos de raz e guarnições no verão. Sobre um estado
de altura de quatro dedos haverá uma mesa coberta com seu pano de damasco
carmesim, e por cima couro negro, e será capaz de ter menos cinco cadeiras de
cada parte, e nesta mesa haverá três gavetas com chaves diferentes, em que cada
um dos Inquisidores possa recolher os seus papéis, mas não meterão nelas os

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cadernos, porque estes se hão de recolher sempre no secreto, como se dispõem


no $ 16 do Título III deste livro. Nesta mesa estará um missal para dar o
juramento, uma tábua com a oração do Espírito Santo, os Regimentos do S.
Ofício, e Fisco, o Coletório das Bulas Apostólicas, e privilégios da Inquisição,
tinteiros de prata bastante para os ministros que na mesma assistem, e uma
companhi4 e na parede que fica defronte do lugar, em que os presos se
costumam sentar, estará uma imagem de Cristo SeúorNosso de vulto, ornada
com a decência que convém.
2o. E por enquanto na casa do despacho se não pode dar explicação a todos
os negócios, que pertencem ao S. Ofïcio, ordenamos, que haja mais três casas
da saleta para dentro, em que os Inquisidores fagam audiência aos pÍesos, e as
mais diligências do S. Oficio, e em cada uma delas haverá um bofete coberto
com um pano de damasco, e por cima couro negro, missal, campainha, tinteiros
para o Inquisidor, e Notrírio que lhe há de assistir, cadeiras de espaldar, e rasÍÌs,
quantas paÍecerem necessárias, e um banco para os presos.

3o. Haverá mais uma casa de secreto, em que estarão todos os processos,
repertórios, livros e papéis de segredo, e asjanelas, que tiver pela parüe de fora
terão grades de ferro fortes, e estreitas de maneira que não se possa entrar por
elas, e terá uma só porta para a casa do despacho bem segura, e com fechadura
de três chaves de guardas diferentes, das quais se dará ao Promotor, e as outras
aos dois Notários mais antigos, e sendo algum deles impedido, se entreganá a
sua chave a um dos outros Noüários, qual os Inquisidores ordenarem.

4". Não se abrirá porta do secreto, senão em presença de um Inquisidor, e


quando o Promotor ou algum dos Noüários, que tiverem as chaves dela, não
puderem vir à mesa, mandarão a chave a tempo que não fagafalta, por pessoa
de confiança, à qual advertirão, que a não entregue ao Porteiro, nem ainda ao
Notrârio, sem primeiro estar na mesa algum dos Inquisidores. Nessa casa
entrarão somente o Promotor, e Notiários, e neúuma outra pessoa, salvo se tiver
especial licença nossa; e encomendamos muito aos Inquisidores, que entrem
nela as menos vezes que for possível, para que não aconteça, com sua presenga
que se divirtam os NoL'ários das coisas, em que se ocupam.

5o. No secreto haveráas estantes que paÍecerem necessárias, em que estarão


todos os processos, assim correntes, como fundos, com tal distinção, e ordem,
que com facilidade se possam achar, e os correntes estarão em parte, onde
fiquem mais à mão, e quando se tirar algum processo, acabado o negócio, logo
se tornará a seu lugar. E assim mais há de haver um selo das aÍmas do S. Ofício,
e com ele serão selados todos os papéis, que houverem de ir para fora da Cidade,
em que assiste o Tribunal, e não os que nela houverem de ficar, o qual não será
tirado do secreto, sem ordem dos Inquisidores.

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6o. No mesmo secreto estârão duas mesas, uma para o Promotor, e outra
paÍa os Noüârios, com tinteiros, tesouras, eanivetes, área, penas, tinta, linhas,
agulhas, obreia e papel em abundância, para que por falta de alguma destas
coisas não se retarde o ministério, e bem assim arcas ancoradas para levar ao
Auto da Fé os processos despachados, um caixão de gavetas, em que o
tesoureiro possa recolher os papéis, que por razáo de seu ofïcio lhe tocarem, e
cada um dos Inquisidores terá sua gaveta, em que se possa recolher os papéis
de segredo, que em particular se lhe encarregarem. Item haverá uma úbua por
nós assinada dos dias feriados, que na Inquisição se hão de guardar, e uma arca
com três chaves, em que se recolha todo o diúeiro, que por qualquer via tocar
ao S. Offcio.
7o. Os livros, que pertencem ao secreto, são os seguintes, um Repertório
geral, em que se lancem todas as pessoas, que no S. Ofïcio estiverem delatas,
salvo as que pertencerem aos três Repertórios particulares, de que abaixo se
dirá; um índice deste mesmo Repertório em livro separado, em que se poúam
os nomes das pessoas, que nele estiverem reportadas; três Repertórios particu-
lares, com seus índices no princípio; um em que se lancem os culpados, e
confessos no pecado nefando; oufo em que se lance os solicitantes culpados,
e confessos; e o terceiro dos delatos sem nome, os liwos que vão formando das
denunciações, e confissões, que se tomam na mesa do S. Oficio; os livros que
se compõem das petições que se dão em favor de partes; um livro em que se
escrevam os decretos de prisão, quando não houver tempo para se trasladarem
as culpas de seus originais; outro de marca maior, em que se lancem pelas letras
do ABC todas as pessoas, que no S. Oficio, forem despachadas; livro em que
se lancem as listas dos Autos da Fé, conforme à ordem com que neles se lerão
as sentenças; outro das listas dos Autos, que das outras Inquisições se enviarem;
um liwo de regisho de todas as diligências que se mandaram fazr.r do S. Ofïcio.
Todos estes livros estarão sempre no secreto, donde não sairão nem ainda parta
a mesa do despacho (salvo os de decreto de prisão) sem especial licença nossa"
e os Repertórios dos culpados no pecado nefando, e dos confessores solicitan-
tes, estarão sempre fechados, e a chave terá o Promotor.
8o. Além dos livros acima declarados haverá na Inquisição um livro, que
se há de formar das comissões, que os Prelados dão às pessoas, que assinarem
em seu lugar no despacho de seus súbditos: outro das criações, ejuramentos
dos ministros, e oficiais do S. Ofïcio; livro de registro das provisões de seus
ordenados; livro de todas as terras que pertencem ao distrito, com os nomes dos
Comissrírios, Escrivães, e familiares, que nelas se criaram; quatro liwos de
receita, e despes4 que pertence ao Tesoureiro, e se hão de fazer em cada ano
na forma que em seu título se dirá: haverá mais livro das fianças; livro da entrada
dos presos no cárcere, em que se tomará por lembrança o fato, diúeiro, e peças
de ouro, e prata que trouxeram, para que põe ele conste se farão lançados em

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receita ao Tesoureiro; outro livro, em que se lance em receita ao Alcaide o fato


que ficou dos relaxados, reconciliados, e defuntos; outro em que se lancem em
receita ao porteiro todos os móveis, que houver nas casas do despacho, audiên-
cias, e oratório, e outro em que se lhe carreguem os livros defesos, que vierem
ao S. Oficio. Todos estes livros, e os do parágrafo precedente, serão numerados,
e rubricados por um Inquisidor, e no fim de cada um deles fará encerramento,
com declaração das falhas que contém, e estarão na casa do secreto, e não serão
tirados da Inquisição sem expressa ordem nossa. Outros não será tirado do
secreto papel algum nem dele se dará cópi4 ou certidão, ainda que não seja de
segredo, para fora da Inquisição, sem despacho do Concelho, salvo nos casos
declarados no Título III deste livro, $ 49.
90. Por enquanto, para resolugão das dúvidas, que na mesa se oferecem,
são necessiários alguns livros de direito: ordenamos que em cada uma das
Inquisições, na parte que for mais conveniente haja Bíblia, os textos de direito
Canônico, e Civil, as ordena@es do reino com seu Repertório, o Diretório
inquisitório, e Simãchas de Católicos.
10. Haverá mais em cada uma das Inquisições, um Oratório tão capaz, que
possarn os Inquisidores, e ministros do S. Oficio, ouvir missa dentro dele, e terá
umajanela para a sala, pela qual a possam os oficiais também ouvir. Nele haverá
um retábulo, e ao Altar o Crucifxo, que há de ir na procissão os dias em que
se celebrar o Auto da Fé. Para ornato deste Oratório haverá vestimentas, e
frontais de todas as cores, dois cálices, quaho castiçais, e umas galhetas de
prata, corporais, guardas, santiúos, toalhas, aluas, e amictos em abundância,
uma alcatifa, e uma esteiÍa paÍa que o servigo se faça com a decência, e limpeza
que convém; e os ornamentos serão de duas ordens, uma paÍa o uso dos
Inquisidores, e outros dos Notários, com caixões bastante , em que estejam
fechados. Todos os dias de despacho, antes de se entrar nele, dirá missa neste
Oratório um dos Notiârios, como se dispõem no Título VII $ 3'deste liwo.
ll.Terão mais as Inquisigões cárceres secretos, seguros, bem fechados e
dispostos de maneira que haja neles corredores separados; uns que servirão para
homens, e outros paÍa mulheres, e se atalhe a comunicação enhe os presos, para
maior observância do segredo, pelo grande prejuízo que do contrário seguiria
ao S. Oficio. Cada um dos cárceres terá portas fortes e seguras, uma que se
comunique com a casa do Alcaide, outra com a mesa do despacho, e audiências,
e outra para o pátio da inquisição, por onde enhem os presos e mais pessoas
que forem necessárias, e as portas estarão sempre fechadas, e haverá em todas
campainha, pela qual o Alcaide possa ser chamado. Haverá neste cárcere uma
casa com porta pÍìra a despens4 por onde entrem os mantimentos, e mais coisas
necessárias para os presos; e outra casa mais no lugar que parecer conveniente,
com os instrumentos necessários para nela se dar tormento aos presos, que a
ele forem condenados, e junto aos mesmos cárceres haverá duas ou três casas

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em que se possÍrm recolher as pessoas, que por assento da mesa forem mandadas
por em custódiq em quanto se faz alguma diligênci4 para se ver se devem ser
presas nos cárceres secretos.
l2.Haverâmais ouüo cárcere, em que sejam instruídas, e sacrarnentadas,
as pessoas penitenciadas pelo S. Ofício, e em que possam estar, até os Inquisi-
dores lhe assinarem lugar onde vão cumprir as penitenciÍN; no qual estará um
Oratório, em que se diga a missa, e administrem os Sacramentos aos peniten-
ciados, e será de maneira que possam ir, e estar nele os homens divididos das
mulheres quando se lhe frzer a instrução; e neste cárcere se poderão pôr em
custódia, ou prender, as pessoas que não tiverem culpas para serem presas no
cárcere secreto, e os privilegiados delinqüentes, de que cs Inquisidores são
juízes.

TÍTULo ilI
Dos inquisidores
1o. De tanta importânciq e t2io graves são as causÍrÍi de que se conhece no
Tribunal do S. Oficio, que as pessoas que elegermos para Inquisidores, não
somente devem ter as qualidades que requerem, conforme a direito Canônico,
e Breves Apostólicos, e a mais de que estrí dito no Título I $ 2o mas além disso
é necessário que sejam licenciados por exames privado em alguma das facul-
dades de Teologi4 Cânones, ou Leis, e que tenham ao menos trinta anos de
idade, pessoas nobres, Clérigos de Ordens sacras, e que primeiro hajam servido
no cargo de Deputado e nele teúam dado mostras de prudência, letras, e
virtude, assim para saberem resolver, e decidir as causas que hão dejulgar,
como também para nelas se haverem com grande inteirez4 e igualdade: livres
de toda a paixão, e respeitos, que costumam perturbar o ânimo dos juízes; de
maneira que nem o favor e piedade, cheguem a ofender a justiç4 nem o rigor
exceda os termos de temperança; e sobretudo serão pessoas de tal procedimen-
to, e de tanta autoridade, que com ela possam bem compreender ao muito que
deles confiamos. E para cumprirem melhor com a obrigação de seus caÍgos, e
descarregarem nossa consciência" e asu4 terão sempre presentes nossas ordens,
especialmente o que se dispõe nesse regimento, e farão guardar inteiramente
tudo o que nele se contém.
2o. Posto que entre os Inquisidores haja a mesma jurisdição, e a todos se
deva igual pré-eminênciq contudo arazio de bom governo esüá pedindo que
algumas coisas particularmente se concedam, e encÍüïeguem ao Inquisidor
mais antigo. Portanto, ordenamos, que ele entre, e saia sempre à mão direita
dos mais Inquisidores, e ministros, e se assente na primeira cadeira que estiver
na casa do despacho com o rosto para a porta. Na mesa tocará a campaiúa" e
dilrlâ a oraçáo do Espírito Santo todos os dias, em que houver despacho, pela

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manhã, e à tarde antes de se entrar em negócio: fará as audiências na casa de


despacho, salvo quando a matéria pedir outra audiência mais secreta: repartirá
entre si, e os mais Inquisidores os processos, informações, e mais diligências,
que se houverem de fazer do S. Ofïcio, e será de maneira que o trabalho seja
igual a todos; proporá na mesa as causasi que se houverem de propor; fará os
assentos das resoluções que se tomarem e as pnáticas aos presos, salvo nos
processos, e mais coisas que estiverem cometidas aos outros Inquisidores,
porque nestas farão eles as propostas, e práticas, e escreverão os despachos e
assentos que se tomarem em mesa.

3o. Todos os despachos, ordens, e papéis que forem do Conselho geral para
a mesa, e assim mais os papéis, cartas, e diligências que vierem de for4 e
tocarem ao S. Ofïcio, se entregarão em mesa ao Inquisidor mais antigo, o que
com a brevidade possível, os que verii e os comunicaní aos mais Inquisidores,
paÍa que todos resolvam na matéria, o que parecer conveniente, e se faça o que
pela maior parte dos votos se assentar.

4'. O Inquisidor mais antigo dará à execução nossas ordens, os despachos


do Conselho, e os assentos que na mesa se tomarem, e mandará fazer as mais
diligências, que se determinar que convém para boa expedição do S. Oficio. E
para que lhe seja presente sempre tudo, o que deve fazer nestas matérias,
proveram cada semana o livro do registro, e terão um caderno de lembrança,
em que assente o que há de executar paÍa que obrando conforme for pedido a
necessidade, e ordem dos negócios, se possa dar expedição a todos com
brevidade.

5o. Terem cuidado de advertir, e ordenar que na mesa do S. Ofício estejam


os ministros.muito compostoso guardando sempre respeito, e autoridade que
entre si devem ter pelos caÍgos que exercitam; nos negócios que se propuseÍem
em mesa, ordenará que vote cada um em seu lugar, não consentindo que os
demais com práticas o perturbem, ou lhe interrompam seu voto, e depois de
todos terem votado, examinará o que fica vencido, e não consentirá que
enquanto um votar falem os outros, e sendo dadaa hora" os inquisidores que
acharem fora de casa do despacho, se recolherão a ela para juntos saírem;
porque convém muito ao bom governo, que se não exceda nas horas que se há
de estar na mes4 salvo se a importância de negócio começado pedir outra cois4
como se dirá no $ 20 deste título, e os cadernos e mais papéis que forem de
segredo fará recolher ao secreto, e, fechado ele, sairá o Tribunal.

6o. Quando o Inquisidor mais antigo estiver ausente, ou impedido de


maneira que não possa vir à mesa, faú seu ofïcio o inquisidor que se lhe segue,
e em falta de ambos, o terceiro; e se o mais antigo estiver na terra desimpedido,
e não vier à mesa na hora que é ordenada, os outros Inquisidores esperarão por

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ele até um quarto de hora sem entrar em negócio, mas, passado o quarto, se
começará o despacho com o mais antigo Inquisidor dos que estiverem na mesa.
7o. Acontecendo que o Inquisidor mais antigo não proponha em mesa
aquelas coisas que convém serem propostas, ou não execute o que está mandado
executar, ou não procure que se façam as diligências mandadas fazer, o
Inquisidor segundo o advertirá em mesa, e não dando o mais antigo causajusta
em que funde a dilagão, e tal que na mesma mesa se aprove por mais votos,
logo lhe será nela ordenado, que execute as ditas coisas no tempo em que a
mesa limitar, e se dentro dele as não der à execugão, em tal cÍlso o segundo
Inquisidor as fará executar, sem ser necessário para isso ordem nossa ou do
Conselho. E se quando o segundo Inquisidor frzer a advertência referida, não
estiverem na Inquisição mais que dois Inquisidores, e não concordarem, entre
si, será chamado o Deputado de que na mesa se tiver maior satisfação para votar
na mateira, porque nela se há de seguir o que se vencer por dois votos
conformes. E pelo muito que convém, que os negócios do S. Ofïcio se não
dilatem, os Inquisidores terão particular cuidado na observância desta ordem,
e havendo no compartimento dela algum descuido, o Inquisidor mais moderno
nos dará conta em segredo para caso proverÍnos como for mais serviço de Deus,
e do S. Oficio, e lhe estraúaÍemos muito qualquer descuido que nisto tiver.
8o. Por ser de grande importância paÍaa,autoridade do S. Oficio que seus
Inquisidores sejam muito respeitados, e é certo que todos lhe guardarão respei-
to, segundo for seu procedimento; portanto ordenamos que além de guardarem
o que estiâ disposto no $ 8o do Tít.I deste livro, tratem de viver com grande
honestidade, e com muita modéstia, não usando do poder de seu ofïcio, mais
que nos casos, e nas coisas para que lhe foi concedido, e se dispõem neste
Regimento. Terão grande tento em ver com que pessoas hão de comunicar, e
não visitarão senão aquelas, que forem muito graves, e de bons costumes na
vida; não irão a acompanhamentos, nem a outros autos públicos, para que não
aconteça estar neles com menos decência da que é devida a suas pessoas, e a
seus cargos; nem servirão em confrarias; salvo na de S. Pedro Mártir; não
escreverão cartas, nem mandarão recados em nome da mes4 porque a expe-
riência tem mostrado que mais se arrisca neles a autoridade do S. Ofïcio, do
que recebem de proveito os oficiais, e pessoas, que os pedem.
9o. Na Inquisição se haverão com tal moderação em tudo, e com tanta
gravidade, que possam aos oufros ministros aprender deles o modo com que se
devem tratar; escusarão porfias nas matérias, que não tocam ao S. Oficio, e nas
coisas, que em serviço dele houverem defaze4 serão conformes quanto lhe for
possível; e acontecendo entre eles alguma inquietagão ou diferença, aterão em
segredo, e nos darão conta para mandarmos prover no caso como for justiça.
I 0. Por enquanto, os Inquisidores não só devem guardar segredo inviolável
nas coisasn que pertencem ao S. Oficio, mas convém que hajam regras, pelas

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Regimento do Santo O/icio 1640
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quais os mais ministos, e oficiais da Inquisição saibam a pontualidade, com


que se hão de haver a mateira: mandamos, que eles não comuniquem a ministro
algum inferior, ou oficial, nem ao mesmo ordinário coisa alguma de segredo,
ainda quando eles lha perguntarem; salvo aquelas, em que houverem de votar,
ou for precisamente necessiírio para expedição de seus oficios. E por este
mesmo respeito não consentirão que os Deputados quando saírem da mesa vão
falando nos negócios, que nela se tratarão; e tendo notícia que o segredo se não
guardq ainda que seja em mateira muito leve, no-lo farão a saber com brevi-
dade, para mandarmos prover no caso, como mais convier ao serviço do S.
OÍicio.
11. Todos os anos no primeiro Domingo da quaresma, mandarão os
Inquisidores publicar em todos os Conventos, e Paróquias de seu distrito, o
edital de Fé formado na maneira, que vai escrito no fim deste Regimento,
ordenando a todos os Priores, Abades, e mais Piirocos, que o publiquem em
suas igrejas, e passem certidão nas costas dele de como assim o publicaram, e
a remetam ao S. Ofïcio.

12. Procederão contratodas as pessoas Eclesiásticas, seculares, e regulares,


de qualquer estado, e condigão que sejam, que forem culpadas, suspeitas, ou
infamadas no crime de judaísmo, ou em qualquer outra heresia; contra os que
tendo confessado suas culpas, revogam a confissão, que delas tiúam feito;
contra os que se jactam de não haver cometido as culpas, que confessaram;
contra os esquemáticos; contra os fautores, receptores, e defensores dos here-
ges; contra os que comunicam com os hereges, ou infiéis, e lhe levam armas, e
mantimentos, e sem causa vão à suas terras, e se deixam andar nelas; contra os
que comem carne em dias proibidos; contra os que sem ter autoridade para hatar
as matérias de fe, se intrometem a disputar delas; contra o blasfemos, e que
proferem proposições heréticas. Contra os que fazem irreverência, ao desacato
ou santíssimo Sacramento, imagens de Cristo Seúor nosso, de nossa Seúor4
ou dos Santos; ou lhes negÍrm a veneração, que se lhes deve, ou recebem o
santíssimo Sacramento, não estando em jejum; contra os que usam de arte
máryica; contra os feiticeiros, sacrílegos, adivinhadores, astrólogos judiciários,
que prognosticam absolutamente de futuro; e contra os que invocam o diabo, e
tem pacto com ele. Contra os que casam segunda vez, sendo o primeiro marido,
ou mulher vivos; ou maliciosamente são causa dos tais casamentos com efeito
se fizerem; contra os Clérigos de ordens sacras, e Religiosos professos, que se
casarem na forma do sagrado Concil. Trid: contra os que sendo casados se
ordenarem de Ordens sacras; contra os Católicos, que se casam com herege, ou
infiel; contra os que dizem miss4 ou confessam não sendo Sacerdotes; contra
os confessores solicitantes; contra os que tem, e lêem livros defesos; contra os
que dão culto, ou veneração, como a Santos, a pessoas, que não estão canoni-
zadas, ou beatificadas; e contra os que escreverem livros de seus milagres, e

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Sônia Aparecida de Siqueira

revelações, como se diz no Liwo 3, Tít.20, $ 3o Contra os impendentes do


ministério do S. Ofïcio; confa os que usurpam sua jurisdição, e se fingem
ministros da Inquisição; contra os que não cumprem as penitências que lhes
impõem o S. Oficio, ou quebram seu cárcere, ou fogem dele; contra os que
juru- falso na mesa do S. Ofício, ou para este efeito induzem, ou coÍrompem
testemunhas; contra os culpados no crime de sodomia; confa os ausentes, e
defuntos, que morreram antes, ou depois de estarem presos nos ciírceres do S.
Ofício, ou neles se mataram ou endoideceram; contra os que cometem qualquer
outro crime, que o edital de Fé declara, ou que por disposição de direito, ou
concessão da Sé Apostólicapertence ao S. Oficio, ou ao diante pertencer; e em
todos estes crimes procederão conforme a direito, e ao que está determinado
por bulas, e breves dos Sumos Pontífices, e pelo mais que vai disposto neste
Regimento.
13. Os Inquisidores não ouviram pessoa alguma senão em mesa, sobre
negócio, que tocar ao S. Oficio, antes quando lhe vier falar nele, lhe dirão que
recotra ao tribunal, onde será ouvida de tudo o que tem para diz.er. Não irão
fora da mesa, e muito menos fora da Cidade, onde assiste a Inquisição, fazer
algum negócio, por mais gÍave que sej4 sem primeiro nos darem conta; e sendo
necessiírio inquirir alguma pessoa de qualquer estado, e condição que seja"
tomar com ela informação, ou fazer alguma outra diligência" a mandarão
chamar ao S. Oficio, onde seú perguntada em mes4 ou em alguma das casas
da audiência, segundo lhe parecer mais conveniente. Porém se forem Bispos,
ou mulheres, que vivam em mosteiro, ou em clausurq ou de grande qualidade,
ou casadas com homens fidalgos, coúecidos por nobres, ordenarão que um
Deputado com um Notiário vão a suas casas fazer a diligência; e isso mesmo se
gmrdarã quando quaisquer outras pessoas de grande qualidade estiverem
doentes de maneira que não possam vir ao S. Oficio; mas, se forem de qualidade
ordinrária" bastará que o negócio se cometa a dois Notrários. E quando alguma
mulher tiver talrazío,ou tão justo impedimento, que não possa vir ao S. Oficio;
se for notoriamente nobre, a mandarão ouvir por um Deputado com um Notiário
em alguma Igreja ou em outro lugar conveniente, ou por dois Notários, sendo
de qualidade ordinária. E se o caso for tal, e tiver tais circunstâncias, que pareça
necessário, por não arriscar, ou por outra causa semelhante fazer-se o negócio
por pessoa, que não seja minisno do S. Oficio, os Inquisidores o cometerão a
duas pessoas Eclesiásticas, que bem o possam fazer.

I 4. Dentro do Tribunal do S. Oficio não cometerão negócio aos Deputados,


nem a oufto algum ministro, quando lhe possam dar por si expedição; mas
estando impedidos, poderão cometer algumas coisas aos Deputados, que tive-
rem ordem nossa para assistir na mesa de ordinrírio, contanto que não seja
processar, tomar confissões denunciações, ou perguntar as referidas; porque

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Regimento do Santo Olício 1640
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estas diligências lhe não poderão cometer; salvo quando para isso tiverem
especial licença nossa, a qual nos pedirão quando paÍecer necessária para o
despacho dos negócios do S. Ofïcio.
I I 5. Cada um dos Inquisidores terá caderno dos presos do cárcere, e no título
I de cada preso se declarará sua qualidade, terra de que for natural, e morador, a
idade oficio, e estado, que tiver, o dia em que foi preso, as testemuúas, que
contra ele depuseram, o dia, em que testemunharam, o tempo, em que dizem
que foi a culpa cometida, a substância dela, os cúmplices, e cerimônias, que
tiverem. Terão outro si declarado as sessões judiciais de seus processos, e nos
confidentes acrescentaram a substância da confissão, o dia em que afrzeram,
o tempo, em que cometeram a culpa, até quando lhe durou a crença de seus
eros, o Autor deles, os cúmplices, e cerimônias; paÍa que deste modo estejam
sempre presentes no merecimento das causÍrs dos presos, e no estado, em que
estão.

16. Terão também outro caderno, em que porão por títulos diferentes, as
sessões, que se hão de fazer aos presos, convém a saber, título dos que estão
para sessão de genealogia, título dos que estão para sessão In genere,e assim
irão continuando portítulos os mais termos dos processos, e no fim farão título
particular das comissões, e diligências, que se hão de fazer em virtude dos
despachos, que tem dado, e todos estes títulos estarão com grande distinção, e
em cada um deles se porá o nome do preso, que está para se lhe fazer algum
dos ditos termos, ou sessões, e tanto que lhe forem feitas se riscará o nome do
preso, e se passará ao título do termo que seguir; para que por este modo saibam
com facilidade as sessões, que tem parafazer, e despachos, que hão de dar, e
acabada a audiência, todos estes cadernos se recolherão ao secreto.
17. Neúum dos Inquisidores se ausentará do S. Ofïcio, sem especial
licença nossa, e virão à Inquisição todos os dias, que não forem feriados, e nela
assistirão três horas pela maúã e três à tarde na forma, que está disposto no
Tít. I deste livro, $11. Procurarão quanto for possível, estar na mesa na hora
ordenada, e tendo algum deles causajusta, que o empeça vir a ela, o fará saber
aos mais Inquisidores logo no princípio da audiência; para que se não retarde
por seu respeito o despacho; e depois de estarem junto, antes de entrar em
negócio, dirá o Inquisidor mais antigo a oração do Espírito Santo, para que
mediante a favor divino se acerte no que tanto convém ao serviço de Deus nosso
Senhor; e logo conferiram entre si, o que cada um deles na audiência precedente
tiver feito, lançando nos cadernos as sessões, que fizeram aos presos, e despa-
chos, que deram em seus processos, pÍlra que os hagam sempre ajustados.
18. Depois chamarão o Alcaide à mesa, e perguntar-lhe-ão pelo estado do
cárcere, para ver se há nele coisa, a que se deva acudir; e logo assentarão, que
diligências convém que se façam, emrazáo do que ultimamente processÍram,

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Sônia Aparecída de Siqueira

e pedem os negócios de presente, e o que cada um deles naquela audiência há


de fazer; advertindo, que preceda sempre a tudo, o tomar as confissões, e
denunciações, e ouvir o presos, que pedirem audiência,parao que se dividirão,
sendo necessário, a fazer o que na mesa se assentar; e se algum preso tiver
conhecimento com algum dos Inquisidores, e por esta causa se entender, que
terá pejo de confessar diante dele, em tal caso, correrá outro Inquisidor com seu
processo.

19. Na pronunciação das culpas, e despacho das contraditas, votarão


sempre todos os inquisidores; e nos mais despachos, que derem em mateira,
que conteúa considerável prejuízo; e quando votarem estarão na mesajuntos,
e nunca em negócio algum mandarão seus votos por escrito, ou por recado de
uma casa para outra; e estando algum deles ausente, ou impedido de maneir4
que não venha ao S. Oficio; poderão os dois que ficam dar os tais despachos;
e não concordando, chamarão um Deputado; e quando se achar na mesa um só
Inquisidor, e for precisamente necessiírio dar alguns dos despachos sobreditos,
chamará um Deputado, e se discordarem, chamará outro, e em todos estes casos
os Deputados, que chamarem serão os de que na mesa se teúa mais satisfação.

20. Em todas as audiências procurarão os Inquisidores, quanto forpossível,


acabar as sessões, e mais negócios, que nelas começarem, e quando por fala
de tempo, as não possam acaba4 ordenarão ao Notário, que conclua dizendo,
que por ser dada a hora, se não foi por diante com a sessão; mas inviolavelmente
antes dos presos, e partes assinarem, se lhe lerá tudo o que naquela audiência
se escreveu. E quando o negócio for tal, que conveúa precisamente ao bem do
S. Oficio, que se acabe, posto que seja dada a hora, se continuará com ele, até
de todo se acabar, e sendo denunciação, será logo ratificada. Mas porque não
convém que o Tribunal todo se deteúa; ordenamos, que neste caso, se feche o
secreto, e que o Inquisidor com o Notário fiquem só fazendo a diligência" e feita
ela, fechará os papéis na gaveta" que tem na mesa do despacho; e se algum dos
Deputados frzer o negócio referido, um dos Inquisidores lhe dará a chave da
sua gaveta para o mesmo efeito, e o Porteiro estará esperando para fechar o
Tribunal.

21. Por enquanto pelas ratificações se alcança notícia dos principais


segredos do S. Ofício, e não convém que se fiem senão de pessoas por nós
aprovadas; os Inquisidores nos nomearão para assistir a elas por honestas, e
religiosas pessoas, até das eclesiásticas, seculares, ou regulares, para que as que
nós aprovarmos sejam chamadas, e não outras, e quando faltar alguma destas,
no-lo farão saber, nomeando outras em seu lugar, para que não haja falta no
serviço do S. Oficio; e aos Notários não admitirão por honestas, e religiosas
pessoas; salvo quando a confissão, ou denunciação, por razÁo de mateira, ou
pela qualidade das pessoas, for de tanta importância, e pedir tal segredo, que

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Regimento do Santo Oficio 1640
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pareça aos Inquisidores, que não convém dar notícia dela a quem não for
ministro da inquisição.
22. Quando os presos vierem paÍa os cárceres, os Inquisidores terão
particular cuidado e advertência no lugar, e casa, em que os mandam pôr, e na
companhia, que lhe dão; porque qualquer eÌro nesta mateira, pode ser de grande
prejuízo no S. Ofício; pelo que mandaram que toda a pessoa que vier presa de
novo, esteja só em uma casa, ao menos três, ou quatro dias; se houver causa tão
forçosa, que obrigue a outa coisa, ou for mulher moga; porque a esta se dará
logo companhia, de outra mulher, com que esteja, e nunca porão em uma mesma
casa, nem ainda no mesmo corredor, pessoas, que tiverem parentesco entre si,
e (quando for possível) ordenarão o cfucere de modo, que no mesmo corredor
não fiquem pessoas coúecidas, ou de uma mesma terra" nem aquelas, que
tiverem cometido o mesmo crime, ou presos novos com antigos.

23. Não mudarão os presos de uma casa para outra, particularmente aos
que começarem a confessar suas culpas, sem justa causa, e terão grande tento,
quando pedirem que os mudem porrazío de brigas que tiveram, de saber se são
verdadeiras; porque a experiência tem mostrado, que eles as costumam muitas
vezes fingir para este efeito; e para os poderem mudar com a notícia, e cautela
que convém, quando for precisamente necessário, tomarão informação do
Alcaide, e terão a planta das casas do ciárcere, e em cada casa os nomes dos
presos, que nela estiverem, e de que casa tiúam vindo, e as terras donde são,
e além dissolverão os seus processos, para saberem com que compaúia no
discurso de sua prisão. E porque assinar casa aos presos, ou dar-lhes companhia,
ou mudá-los de uma casa paÍa outra; é coisa que pede mesa por assento dos
mais votos, votando todos os três Inquisidores: e estando algum deles impedido
de maneira, que não venha ao S. Oficio, se os dois não concordarem, votará o
Promotor.

24. Os Inquisidores não falarão com os presos, sem estar presente algum
Notrírio, nem consentirão em tempo algum que minisho, ou oficial do S. Oficio,
ou alguma outra pessoa entre no cárcere secreto, nem fale com eles; salvo nos
casos em que por este Regimento se ordena o contrário, e também entiío estanâ
um Notrário presente. Não tratarão com os presos, nem diante deles mateir4
que não ftzer a bem de sua causa, ou for precisamente necessária; falarão a
todos por vós, e mandarão que se assentem no banco, que para esse efeito há
\1 de estar nas casas de despacho, e audiência; mas no modo de os tratar, terão
respeito à qualidade de suas pessoas. Quando os ouvirem, ou lhes falarem, será
com gravidade, e modéstia; não fazendo, nem dizendo cois4 de quejustamente
possam ter escândalo, ou queix4 antes se compadecerão de sua miséria,
procurando reduzir todos ao camiúo da salvação. Mandarão que sejam provi-
dos de tudo o que lhe for necessário, e a seu tempo, e principalmente os doentes,

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Sônia Aparecida de Siqueira

e com todos se haverão de maneira, que conheçam que no S. Ofïcio é igual a


piedade, e ajustiça.
25. Todos os meses do ano visitarão os cárceres secretos, ficando sempre
um dos Inquisidores na mesa do despacho, e parecendo que há razÁo para a
visita se dilate, a proporão em mesa, e se fará o que pelos mais votos se venceÍ.
Quando visitarem, mandaÍão sair do cárcere o Alcaide, para que os presos
possam com mais liberdade dizer as queixas que tiverem dele; levarão consigo
o Meiriúo, um Solicitador e um Notrírio. Perguntarão a cada um dos presos
em particular, se o Alcaide, ou guardas lhe fazem algum agravo, se os tratam
bem, se lhe dão o que lhe manda dar o S. Oficio, se lhe acodem quando têm
necessidades, maiormente aos doentes, se são bons os mantimentos, e se lhes
deram o preço deles, e lhos dão ao tempo que convém e de que coisas têm
necessidade.

26. Acaba a visita, se dela resultar culpa contra o Alcaide, guardas, ou


despenseiro, que mereça algum castigo, os Inquisidores guardarão a ordem que
se dá no $ 47 deste título e logo tratarão em mesa do provimento da visita, pelas
lembranças que o Notário houver tomado no cademo, que em seu título se lhe
orden4 ao que assistiná o Alcaide, para poder informar se òs presos têm
necessidade da coisas, que pediram, e conforme a sua informação, e ao que
viram, lhe mandaram acudir com o que for necessário, e de tudo aquilo com
que a mesa os mandar prover, fará um dos Notrários rol, que-os Inquisidores
assinarão e mandarão entregar ao tesoureiro, püã por ele fazer entega ao
Alcaide, como se ordena no Título 8, $ I l.
27. Sendo necessiário entrar no ciírcere alguma pessoa em razÃo de alguma
cur4 ou mesiúa dos doentes, os inquisidores lhe darão na mesa juramento do
segredo, advertindo-lhe que não falem, nem tratem com os presos, senão
naquelas coisas para que são chamadas, sob pena de serem castigadas grave-
mente, e ordenaram ao Alcaide que as acompaúe, e se ache presente enquanto
estiverem com os presos; e entrando no ciírcere algum oficialparafazer.algumas
obras, tomarájuramento na mesma forma, e lhe dirão os Inquisidores; que não
fale com os presos, sob pena de que terâ grave castigo, mas bastará que os
guardas lhe assistam; e o serviço, e trabalho que tiverem as tais pessoas na cura
dos doentes, e também nas obras dos cárceres lhe será pago conforme aos preços
da terra.

28. A todo o preso que estiver em perigo de morte darão os Inquisidores


confessor; e às pessoas que estiverem presas por culpas, que provadas não
concluem heresia, se dará confessor todos os anos na quaresma, e também
estando presentes, se o pedirem. Fora destes casos não darão os Inquisidores
confessor aos presos, posto que eles o peçam porque assim convém regular-
mente ao serviço de Deus, e bem de nossa santa Fé; e quando em algum caso

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Regimento do Santo OJício 1640
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particular além dos sobreditos lhes parecer que será conveniente dar-se confes-
sor aos presos, darão conta ao Conselho, para nele se tomar a resolução que
mais conveúa.
29.Paraconfessar os presos, escolheram os Inquisidores pessoas de limpo
sangue, douta, prudente virtuosa, e de muita confiança, e antes de entrar no
cárcere lhe darão juramento de segredo, e sob cargo dele lhe mandaram, que
não tate com o preso mateira alguma que não tocar a sua consciência, e que
manifeste na mesa fudo o que ele disser fora da confissão, e enquanto o
confessor estiver com o preso, não estará presente outra pessoa, por razão do
segredo da confissão; e os Notrírios não serão chamados para estas confissões,
salvo em caso de tal necessidade, que haja grande perigo na tardanga. E porque
pode acontecer ao doente tal perigo, que não sofra dilação, nem dar-se conta
aos Inquisidores para nomeaÍem confessor, nem se ache Notiário que o confesse,
os Inquisidores terão nomeado ao Alcaide quatro pessoas conhecidas, das quais
ele possa chamar uma no caso, em que concorïerem as circunstâncias sobredi-
tas.

30. Ordenamos aos Inquisidores que mandem dar aos presos o sacramento
da Eucaristia nos casos seguintes. Primeiro, aos relapsos e sodomitas na forma
que se dispõem no Livro 2, Título 15, $ 5o. Segundo, aos confidentes, que
tiverem satisfeito à informação da justiga, e estiverem recebidos no artigo da
morte por viático; e nestes dois casos precederá a absolvição da excomuúão
só no foro interior. Terceiro, se dará cada ano na quaresma às pessoas presas
por culpas que provadas não concluem heresia, e no artigo da morte por viático.
Os presos sãos irão comungar no Oratório da Inquisição, e aos doentes que não
puderem vir a ele, se levará o Sacramento a seu cárcere, onde lho irá adminisüar
um dos Notários; e os inquisidores terão particular cuidado que se administre
com decência, e autoridade que convém.

31. Os Inquisidores terão boa correspondência nos negócios que tocarem


a outras inquisições, procurando com toda a diligência dar fácil expedição às
causas que lhes forem pedidas; e quando houver nelas dilação, o farão saber
aos Inquisidores por carta sua, declarando-lhe araz.ão que há para se dilatarem;
e esta mesma correspondência guardaram com as Inquisições de Castelq
advertindo, porém, que se delas lhe mandarem pedir culpas de pessoas que
estejarn delatadas em algumas das Inquisições deste Reino, lhas não remetam
sem primeiro darem conta ao Conselho, e não havendo culpas, mandarão passar
certidão, que lhe enviarão com a resposta da mesa.

32. Havendo em alguma Inquisição denunciações contra pessoas que estiio


em distrito diferente, os Inquisidores as farão logo transladar, e remeter o
I translado delas à Inquisição a que tocar, e ordenarão que vá com elas certidão

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Sônia Aparecida de Siqueira

do crédito que tem as testemuúas, para que com mais certeza se proceda por
seus ditos.
33. Tendo os Inquisidores notícia que algumas pessoas de seu distrito
decretadas à prisão se ausentaram para outro, o farão logo saber a Inquisigão
em cujo distrito estiverem, enviando as culpas, e decreto, com todas as con-
frontações dos culpados, para que facilmente se possa vir em seu coúecimento,
e sejam presos; não estando decretadas, pronunciarão sobre elas, e com o
assento que na mesa se tomar, as enviarão na mesma forma. E não sendo
possível que as culpas se transladem, vê-las-ão pelos originais, e, parecendo
que são bastante para prisão, farão disso assento, e por caÍta avisarão dele aos
Inquisidores, e, dando a ocupação lugar, lhe mandarão o translado das culpas,
e do decreto. E se de uma Inquisição a oufa se pedirem culpas de pessoas no
seu distrito, sobre as quais ainda não tem pronunciado, os Inquisidores depre-
cados a mandarão remeter, sem pronunciar sobre elas, com as quais irá certidão
do credito das testemuúas, e não havendo culpas, mandarão certidão disso,
feita, e assinada por um Notário, e pelo Promotor.
34. Por enquanto convém muito para a expedição do S. Oficio que na
Inquisição esteja viva a lembrança das cartas, comissões, requisitorias, e mais
papéis que se mandam para forq e se remetem a outras Inquisições; ordenamos
que os Inquisidores não assinem papel algum tocante ao S. Oficio, sem primeiro
lhe constar por cota de Notiârio posta no mesmo papel, que fica lançado no livro
do registro, e a quantas folhas.
35. As cartas que os Inquisidores escreverem ao Conselho, as informações,
e consultas que a ele enviarem, e assim mais os despachos, e assentos dos
processos, farão sempre por sua própria mão; porém as cartas, que não forem
desta qualidade, poderão ser escritas por mão dos Notrários, e ditadas pelos
Inquisidores, e tratando-se de negócios de segredo, serão escritas em meia
laud4 advertindo às pessoas, a quem se escreverem, que respondam à margem
das mesmas cartas na outra meia lauda" pelos graves inconvenientes que se
podem seguir de ficarem as caÍtas em seu poder.
36. Parecendo aos Inquisidores que os processos estão em estado para se
poder entar em despacho geral, chamarão à mesa o Promotor, e nela lhe dirão
que faça uma lista de todos os presos do cárcere, e das pessoas que nesse tempo
se livrarem soltas na forma que em seu títuIo, $24, vai ordenado, a qual nos
enviarão com carta da mesa, para mandarmos ver, se convém, que se entre em
despacho.
37. No dia em que se celebrar o Auto da Fé estando nós presentes tanto
que os presos começarem a sair para o cadafalso, nos enviarão lista deles, e
estando ausentes, acabando os presos de sair da Inquisigão, despacharão com
ela, e com carta sua um próprio, para que, com a maior brevidade que for

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Regimento do Santo Ofrcio 1640
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45. Ordenarão que, ao preso que sair sem confiscação de bens, seja logo
entregue assim o diúeiro, que o Tesoureiro lhe ficar devendo do que tinha
recebido para seus alimentos, como também algumas pessoas, ou moedas de
ouro, ou prata" e quaisquer outras coisas, que lhe fossem achadas ao tempo que
entrou no cárcere, e tudo se lhe entregará na mesma espécie, em que foi achado;
e sendo caso que o preso fique devendo algum diúeiro, mandarão ao Tesou-
reiro que o cobre dele, e não sairá do cárcere de penitência, sem primeiro pagtr,
ou ao menos dar peúores, ou fiança segura a satisfazer em certo tempo, e
passado ele, o farão executar, e não lhe poderão prorrogar a espera, nem o tempo
de fianç4 sem ordem do Conselho.
46. Ordenarão que no açougue da Inquisição se dêem em primeiro lugar a
carne que for necessáriaparaos presos, e logo aos ministros, e oficiais da cas4
conforme à precedência, com que vão na folha, e disto mandarão advertir à
pesso4 que repartir a caÍne, e aos marchantes que não excedam ataï,4.ou preço
do açougue da Cidade, e se hajam em tudo de maneira, que não causem no povo
escândalo, ou prejuízo algum.
47. Quando algum Inquisidor souber de certo, que outro tem cometido
culpa digna de castigo, nos dará conta disso em segredo; e tendo os Inquisidores
notícia, que algum dos ministros, ou oficiais do S. OÍïcio, não cumprem bem
com sua obrigação, ou que com o poder de seu ofïcio, e pretexto dos privilégios,
de que goza, faz a alguma pessoa moléstiq ou vexação, ou que cometeu delito
tal, que mereça castigo, repreensão, ou advertência; sendo Deputado, <.,u Pro-
motor, nos dará conta para mandarmos prover no caso, como houvennos por
bem; e sendo algum dos Noüários, se for a culpa leve, o advertirão, ou lhe darão
a repreensão, que parecer, e dela mandarão fazer termo por ele assinado, quando
seja necessiírio; e sendo oficial contínuo, além de o repreender, o poderão
também multar até quantia de mil reis em um quartel, porém, sendo a culpa
grave, darão conta ao Conselho para nele se ordenar o que for conveniente;
salvo se os culpados forem homens do Meirinho, ou guardas do cárcere da
penitencirâria; porque a estes poderão castigar conforme suas culpas merece-
rem, até os privar de seus ofícios, assim como os podem prover? e admitir, sem
para isso preceder ordem, ou provisão nossa, na forma, que no título destes
oficiais estrí disposto. E vindo alguma pessoa fazer queixa" ou denunciar na
mesa de algum ministro ou oficial do S. Oficio, os Inquisidores lhatomatio,e,
se for necessário fazer sobre isso alguma diligência" a farão, ou a mandarão
fazer com a cautela, e segredo que convém e sendo feita, guardarão no proceder
a ordem sobredita. E se a queixa for de Inquisidor, Deputado, ou Promotor,
também a tomarão; mas não farão em rczáo del4 sem primeiro nos dar contas.
48. A todos os ministros, e oficiais do S. Oficio tratarão os Inquisidores
com a cortesia, que a cada um deles se dever, por razáo de sua qualidade, e
ofïcio; mas pelo respeito, que se deve ao Tribunal; ordenamos que na mesa

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996. 7t3


Sônia Aparecida de Siqueira

nunca falem ao meiriúo por mercê, e ao Alcaide, e mais oficiais falarão por
vós; e a neúum oficial ocuparão em seu serviço, nem mandarão fazer negócio,
que não tocaÍ ao S. Oficio, nem receberão deles úádivas, ou presentes.
49. Não darão licença a ministro, ou oficial algum para se poder ausentar
da Inquisição, estando nós presente; mas em nossa ausência a poderão dar,
havendo causajusta, porvinte dias em um ano, oujuntos, ou intercalados, com
tanto que não seja para ir à Corte, nem quatro léguas ao redor; poderão mandar
pílssar para fora da Inquisição certidões aos ministros, oficiais, e mais partes,
que as pedirem, nas causas dos privilegiados, que na mesa se terão, ou tratarão,
e dos ministros, e oficiais, que servem, ou serviram no S. Oficio.
50. Não chamarão, nem admitirão à mesa os Deputados, senão nos casos,
que expressamente declara o Regimento; salvo aqueles, que para isso tiverem
especial licença nossa, porque tendo-a, os poderão chamar, e cometer-lhe
alguns negócios, conforme ao que está disposto no gl4 deste título; não
mandarão Deputado, ou Promotor, fazer diligência (ainda daquelas que neste
Regimento se declaram) fora da cidade, em que assiste o S. Ofïcio, sem nos dar
primeiro conta.
5l. Quando algum oficial, ou familiar do S. Ofïcio frzer emmesa saber aos
Inquisidores, como trata de se casar, eles pedirão o nome da mulher e de seus
pais, e avós, e da terra donde são naturais, e moradores, e lhe dirão, que não
deve receber se até a mesa lhe ordenar o que convém fazer nesta matéria; e logo
lhe mandarão tirar informação da limpeza de sangue, na forma, que no título
primeiro deste livro, $ 4o se dispõem; e, sendo aprovada no Conselho, lhe dirão
que pode casar com ela livremente, e não sendo, lhe dirão que se casar não pode
ser oficial do S. Oficio. E casando alguns deles sem dar conta primeiro na mes4
os Inquisidores o suspenderão de seu oficio, até se fazer a sobredita informação;
e sendo aprovada no Conselho, lhe será levantada a suspensão; e sendo
reprovada, será privado do ofïcio que tiver.
52. Cometerão as diligências que se houverem de fazer nas terras, em que
não há Inquisição, aos Comissários, e familiares, que nelas residirem (salvo se
houver legítima causa para se cometerem a outrem); porque convém muito, que
os negócios, que pertencem ao S. Ofício, se façam por pessoas, que estejam por
ele qualificadas; e nos lugares onde não houver Comissiário, ou familiar,
cometerão o negócio as justiças Eclesiásticas da terra, e em sem defeito as
seculares; salvo se tiverem coúecimento de pessoa de maior satisfação, que o
possa bem fazer. Mas para que não haja falta de Comissários, e familiares, terão
cuidado de nos fazer lembrança, em que terras será necessário fazê-los de novo,
para que mandemos prover nisso, como nos paÍecer que convém.
53. Por quanto no Regimento dos Visitadores dos navios dos estrangeiros,
se ordena que nos lugares marítimos do Reino, onde houver Convento de S.

714 R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):69j-883,ju|./set. 1996.


Regimeno do Santo Wio - I 640

Domingos, seja o Prior dele Visitador dos ditos navios, e em sua ausência o
leitor dos casos; os Inquisidores, tanto que for eleito o Provincial da dita ordem,
o advertirão, que quando se fizer Prior, ou Leitor nos tais conventos, nos dêem
conta de quem são, porque pode suceder, que sejam pessoas, que não possam
servir o S. Ofício, e será necessário que mandemos prover de outras.
54. Se algum dos inquisidores, ministro, ou oficial do S. Ofïcio e, queixar
em mesa de lhe ser feito algum agravo, ou de se lhe não guardar o privilegio,
de que goza; os Inquisidores o ouvirão, e não sendo o caso reservado ao
Conselho, por razdo da pessoa, ou da matéria, farão inteiro comprimento da
justiça; e sendo reservado, darão conta ao conselho, para dele se lhes ordenar
o que devem fazer.

55. Coúecerão os Inquisidores das causas crimes, e civis dos ministros, e


oficiais Eclesiásticos, quanto por direito Canônico, e prática do S. Oficio se
permite; e em virtude dos aluarás, e provisões Reais passadas a favor do S.
OÍïcio, coúecerão outro se das causas crimes e civis e privilégios dos oficiais
contínuos, e criados dos ministros, e dos privilégios concedidos aos mesmos
Inquisidores, e mais ministros Eclesiásticos dalnquisição. Mas o conhecimento
das causas, que lhes pertencem em virtude do privilégio Real, seú na forma
declarada nas mesmas provisões, e aluarás, e conforme ao que dispõem a
Ordenação do Reino; porque neste caso se hão de haver como ministros Reais;
e se ao diante sua majestade conceder algum privilégio mais ao S. Oficio,
também coúecerão dele na forma sobredita.
56. Nas Inquisigões onde não residir o Conselho-geral, poderão os Inqui-
sidores mandar rever as conclusões, que em seu distrito, se houverem de
defender, por dois qualificadores do S. Oficio, ou por outras pessoas doutas; e
se ambos conformarem, em que nelas não há coisa alguma contra a fé, e bons
costumes, poderão dar licença para se imprimir, e defender; e quando algum
dos qualificadores duvidar em alguma proposição, mandarão as conclusões
com seu parecer ao Conselho-geral, paÍa se mandar resolver a dúvida; e o
mesmo farão, se depois de impressas antes de se defenderem se fizer na mesa
queixa, que tem alguma coisa contra a fé, ou bons costumes, e nesse caso
ordenarão ao Presidente das conclusões, que se não defendam sem nova ordem
do S. Oficio.
57. Os Inquisidores precederão no assento à pessoa que assiste em lugar
do Ordinário, ainda que seja Bispo titular; e esta tal pessoa precedera ao
Inquisidor aposentado, e Inquisidor aposentado aos Deputados e os Deputados
ao promotor. Os inquisidores de um mesmo distrito terão precedência entre si,
conforme sua antigüidade, a qual se há de entender do dia" em que se tomar
posse dos oficios. O Inquisidor no seu distrito, ainda que seja mais moderno,
precederá ao inquisidor mais antigo de outro distrito, quando em algum ato se

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Sônia Aparecida de Siqueira

juntarem salvo se nós ordenarmos o conllário. E concorrendo Inquisidores de


dishitos diferentes, se precederão por sua antigüidade; porém quando nós
mudarmos um Inquisidor para outra inquisição, terá aprecedência conforme a
antigüidade de seu cargo; salvo se for Inquisidor da Índia; porque este ainda
que seja mudado para o Reino, não precederá necessariamente nele pela
antigüidade de seu cargo, se não conforme ao que ordenarmos, e for mais
conveniente ao S. Ofïcio. Ente deputados precederá aquele que dantes foi
Inquisidor, e os mais se precederão conforme sua antigüidade, ainda que algum
deles seja Bispo titular, e o Deputado de distrito diferente, que de ordem nossa
assistir em outra Inquisição, ou for mudado para ela, terá sua precedênci4
conforme a antigüidade do oÍïcio, e sendo o Promotor Deputado, e exercitando
só ajurisdição de Deputado, terá precedênci4 conforme a antigüidade, que tiver
por Deputado; mas fazendo o oficio de Promotor, será precedido dos Deputa-
dos, ainda que sejam mais modernos. Os Deputados e Notiârios aposentados,
quando forem chamados ao tribunal, ou se acharem com ele em autos públicos,
terão o lugar, que lhe couber, conforme sua antigüidade. Conforme a estas
precedências ordenarão os Inquisidores, que se assentem os minisüos acima
declarados todas as vezes que assistirem na mesa da Inquisigão, no Auto da Fé,
e mais autos, que pertencem ao S. Ofício, e no votar se guardará a ordem, que
se dá no Livro 2, Título 13, $ 7o.
58. Tendo nós consideração ao respeito, que se deve aos Bispos, emrazão
da grande dignidade, que a Igreja Católica lhes deu; ordenamos, que quando o
Ordinrário da terra, em que assiste o Tribunal (sendo Bispo) vier à mesa, nos
casos em que o pode fazer conforme a este Regimento, os Inquisidores, e mais
ministros, que nela estiverem, a primeira vez o vão buscar à sala, e lhe dêem
cadeira no topo da mes4 onde tangerá a campaiúa, e votarâ no último lugar;
e daí por diante o esperarão à porta da saleta da banda de dentro; e quando ele
sair, o irão acompanhando até a última porta da sala; mas nunca diante dele
proporão, ou despacharão negócio, ou processo, que não pertença a pessoas de
sua jurisdição. E quando de sua comissão vier de fora outra pessoa para assistir
em seu lugar, precederá conforme a ordem acima declarada; e se algum
Inquisidor, ou Deputado tiver a mesma comissão, terá somente a precedência,
que lhe cabe por razão de seu cargo; e se o Ordinrário não for Bispo, e vier à
mesa do despacho, terá o lugar, que se dá a pessoa que vem assistir por comissão
dos Ordinrários, que são Bispos; porque este é o lugar, que se lhe deve por direito.

59. Os Inquisidores tratarão atodas as pessoas de for4 que forem chamadas


à mesa, ou vierem a ela descarregarem suas consciências, com a cortesia, que
for devida a sua qualidade, e aos graus, que tiverem. Darão cadeiras de espaldas
fora do estado, aos fidalgos, Desembargadores, Dignidades, Cônegos das Sés
catedrais, e colegiadas, Desembargadores dos Prelados, e Religiosos, Abades,
e Priores, Conegedores, Provedores, Juízes de fora, Ouvidores, doutores, e

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Regimento do Santo Ofrcio 1640
-

Licenciados, e às pessoas, que por sua naturez4 e oficio parecer aos mais votos,
que se lhe deve. E se alguma destas pessoas cometer algum excesso porque
mereça ser repreendida, ou advertida na mesa, os Inquisidores a não chamarão
a ela, sem primeiro nos dar conta com informação do caso, para lhe ordenarmos,
como nele se deve proceder; e a toda a outra pessoa, darão cadeira rasa.
rÍruro rv
Dos visitadores

1o. Umadas coisas, queháno S. Oficiomais importante ao serviço de Deus,


e proveito dos culpados no crime de heresi4 e suspeitos, ou infamados nele, é
a visita" que se manda fazer pelos dishitos. Portanto, se nos parecer que algum
deles, ou outro lugar participar tem necessidade de ser visitado, escolheremos
para isso um dos Inquisidores, ou Deputados, de que se deva bem fiar negócio
de tamanha importância, pessoa de conhecidas letras, e de tanta autoridade, que
com ela possa acrescentar a estimação de seu cargo.
t
I 2". O Visitador além das provisões, e ordens nossas, que há de levar, como
se dirá no livro 2, Título I, S 1o levará também cartas de sua Majestade para os
I Bispos, Julgadores e Oficiais da Câmara de todos os lugares, que houver de
visitar, lhe darem todo o favor, e ajuda que pedir para boa execução da visita"
e o virem receber fora dos lugares, em que há de entrar; e provisão assinada por
sua Majestade, para lhe darem os gasalhados mantimentos, e mais coisas
I necessárias, assim ele, como as pessoas, que o acompanharem, e as que há de
levar consigo, que serão um Notário, um Meiriúo com dois homens, e um
solicitador.
3o. Procurará quanto for possível, começar a visita nos Bispados, pelas
cidades onde o Bispo residir; e, antes de entrar nela, avisará com tempo por
carta as justiças, e oficiais daCàmara,do dia da enfada, enviando-lhe as cartas
de sua majestade, para que o veúam receber, e o possam com comodidade
aposentar.
4o. Antes de dar início à visita, irá visitar d Bispo e sua casa, se ele o houver
visitado, ou tiver tal impedimento, que o não possa visitar, e lhe dará a carta de
sua Majestade, e mostraú as provisões, e poderes, que levar; mas se o Bispo,
não tendo justo impedimento, o não vier visitar a sua casa mandar-lhe-á mostrar
as provisões pelo Notrário da visita. E sendo forçado começar a visita por lugar
onde o Bispo não reside, se estiver em distância de três, ou quatro léguas, lhe
mandará a carta de sua Majestade, e mostrar as provisões pelo Noüário; e sendo
o caminho mais comprido, lhas mandará pelo solicitador; e em quanto não tiver
resposta sua, parará com a visita; e se o Bispo estiver fora de seu Bispado,
mandará mostrar as provisões na forma, que fica dito, as pessoas, que em seu
nome governarem o Bispado; e em todo o caso ordenará o Visitador o dar conta

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Sônia Aparecida de Siqueira

ao Bispo, ou a quem por ele governar, de modo que por falta da resposta se não
retaÍde a visita.
5o. Quando o Bispado estiver em Sé vagante ou o Prelado da terra não for
Bispo, se ele, ou os Governadores do Bispado, vierem ver ao Visitador a sua
casa, nela lhe dirá como vai visitar aquela terra, ou Bispado, com ordem nossa,
por parte do S. Ofício, e lhe mostrará os poderes, as provisões, que também
leva; e em caso, que aí os não queiram ver, ou o não veúam visitá-los mandará
mostrar pelo Notrário da visita, ao Cabido ou casa do Prelado, ou dos Governa-
dores; e de tudo o sobredito fará auto o Notiírio no livro da visitq que o Visitador
assinará.

6o. Tendo o Visitador mostrado seus poderes aos ministros Eclesiásticos,


e dadas as cartas na forma sobredita se o juiz de fora ver, lhe dirri que tal dia,
e hora, ordene, que se ajustem os oficiais da Câmara, para nela lhe mandar
mostrar as provisões, que leva. E, se o não vier visitar, lhe mandará dizer pelo
solicitador a sua cas4 e no dia, que assentarem, ordenará ao Noüário da visit4 )
I
que lhas vá mostrar na Câmara; e se a terra tiver só Juízes ordinrários, mandá-
I
los-á chamar, e a alguns oficiais da Câmara a sua cas4 e nela lhes mostrará as I
provisões.

7o. Depois disto, no primeiro dia santo, que houver mandará publicar nas
igrejas do lugar, o dia em que se há de fazer a publicação da visita, com o sermão
da Fé, que sempre será domingo, ou dia santo; e que portanto encomenda muito
ao povo Cristão se ache presente; e mandará por autoridade Apostólica, que
nesse dia não haja outra provisão, nem pregação em alguma Igreja; aos e
Religiosos, Priores, Curas, e mais Clero da Cidade, vil4 ou lugar, acompanhem
a procissão, que se hâ de fazer, nomeando as lgrejas, de que há de sair, e onde
a visita se há de publicar, que serão as que lhe parecer convenientes; e avisará
as justiças da Câmara, para que na procissão o acompaúem, e ao saber da terra,
ou Alcaide-mor, paÍa que na publicação se achem presentes.

8o. No dia assinado para a publicação da visit4 se fará procissão solene,


com as maiores demonstrações de respeito, e autoridade, que for possível; irá
o Visitador dentre as relíquias, acompanhado de todas as justiças da terra, e
oficiais de câmara; e entrando na Sé, junto à porta principal, a virá esperar o
cabido, e acompaúarâ até a Capela mor, onde terá cadeira de espaldas sobre
uma alcaifq e aos pés uma almofada de veludo, em que se sentará o Visitador
de parte do evangelho no andar do altar, e somente na Sé onde o Bispo tiver
sua cadeira, frcarã a do Visitador da parte da Epístola; e se o lugar for tão
pequeno, que a procissão se não possa fazer com a solenidade, que convém; irá
o Visitador de sua casa com as justiças, e oficiais da Câmara, que o acompa-
nharão até algreja, em que se há de fazer apublicação.

718 R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(j92):693-883, jul./set. 1996.


Regimento do Santo OJício 1640
-

9o. Logo se começará a missa com toda a solenidade, com diácono, e


Subdiácono, e haverá sennão da Fé, para o qual terá o Visitador escolhido
pessoa de limpo sangue, de letras, e de conhecida virtude. O Pregador captará
benevolência ao Visitador, dizendo, muito ilustre seúor; e se estiver presente
o Bispo, a captaút primeiro ao Bispo, dizendo: Ilustríssimo senhor; e estando
presente o Seúor da terr4 a captará primeiro ao Visitador; mas se for de tanta
qualidade, e senhorio, que se possa presumlr, que ele se sentiria de lha captarem
primeiro; o Visitador pelo modo que lhe parecer conveniente lhe mandará
significar o dia antes, que naquele ato se há de captar primeiro benevolência a
ele Visitador; para que sendo assim avisado, teúa tempo para saber o como se
há de haver na matéria.
10. O Pregador ordenará o sermão, principalmente em louvor de nossa
santaFé, e do muito, que se deve ao Tribunal do SD. Oficio, declarando como
sua intenção é que os culpados no crime de heresia, e apostasia se animem a
vir confessar suas culpas, e pedir delas perdão, e misericórdiaparc serem por
este meio recebidos ao grêmio, e união da S. Madre Igreja; e como procuramais
a salvação das almas, que o castigo dos delinqüentes; e, além disto, ensinará o
zelo, e caridade, com que as pessoas devem denunciar os culpados nos crimes,
que o Edital da Fé declara; e dirájuntamente o castigo, que se há de dar aos que
acusaÍem alguma pessoa falsamente, ou encobrirem o que dela souberem, além
das graves penas, e censuras, que encorem por direito.
11. Acabado o sermão, se publicará o Edito da graça por um Clérigo, em
alt4 inteligível voz; e no mesmo Edito irá declarado por quanto tempo a graça
e
se concede, o qual o Visitador assinará" conforme a grandeza do lugar; mas
nunca passaÍá de trinta dias. Depois do Edito da graç4 se lerá a provisão de sua
Majestade, pela qual há por bem de remitir os bens aos que dentro do dito tempo
confessem suas culpas; e ultimamente se leú o monitório geral.
12. E logo estando o Visitador assentado na cadeira, se porá diante dele
uma mesa com uma Cruz, e um missal, em que dará juramento ao Seúor, ou
Alcaide mor da terra" aos ministros da justiça de sua majestade, Juízes, Verea-
dores, e mais oficiais da Câmara; e a cada um deles por si, estando de joelhos
ante a mes4 com as mãos sobre o missalo irá lendo o Notário o juramento, e o
que jurar repetindo e lerá o mesmo ao povo, estando todos de joelhos, e depois
de lido lhe perguntará se o juram assim; e de como se fez o dito juramento faú
tudo, que assinará o Visitador, e as pessoas principais, que o fizeram, e a forma
de juramento será a que no fim deste Regimento se declara. e tanto que o auto
..ê da publicação se acabar, mandaní o Visitador fixar na porüa principal da mesma
Igreja o Edito da graça, e o monitório geral, assinados por ele, e a cópia da
provisão de sua Majestade, concertada pelo Notário da visita, e estarão fixados
I enquanto durar o tempo da graç4 e acabando ele, o Visitador os mandará
recolher.

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Sônia Aparecida de Siqueira

13 . Quando for o comprimento de alguma das ordens referidas, ou em outra


qualquer matéria, se mover alguma dúvida, o Visitador nos dará conta para
mandarmos prover no caso como for mais conveniente ao bem do S. Oficio; e
enquanto durar a visita, nos irá avisando do que nela suceder, e de tudo o mais
que lhe parecer; e tomará conhecimento de todos os casos declarados nos $$
2o,4o e 5o do Tífulo I do Livro 2 e procederá, em cada um deles, na forma, que
ai se ordena. Acabada avisita, se recolherá àInquisição de onde forlnquisidor,
e dai nos dará conta por menos que tiver feito, e achado nela; e não sendo
Inquisidor, virá pessoalmente ante nós fazer o mesmo, para que possamos
ordenar o que mais convier ao serviço de Deus, e bem das almas.

TÍTULO V

Dos deputados

1o.Os Deputados do S. Ofïcio terão todas as qualidades, que no Títulol$


2o deste livro se declaram; e, além disso, serão pessoas nobres, Clérigos de
ordens sacras, de vinte e cinco anos de idade, licenciados por exame privado
em uma das faculdades de Teologia, Cânones, ou Leis, e de tão boas partes, e
tal procedimento, que ao diante possam servir nos cargos de Inquisidores.
2o.Guardarão inteiramente tudo o que se dispõem nos $$ 6o,'7o, 8o e 9o do
Título I deste livro, e virão à mesa do S. Ofício todas as vezes que forem
chamados pelos Inquisidores, e nela estarão o tempo que lhe a eles ordenarem;
e procurarão náo fazer falta, maiormente no tempo de despacho geral, por ser
esta sua principal obrigação, e porque se não dilate por seu respeito o despacho
dos processos; porém, não sendo chamados, não virão ao S. Ofïcio; salvo se
para isso tiverem especial licença nossa.
3o. No assento, e voto, terão as precedências, conforme ao que está disposto
nos $$ 57 do Título III deste livro, e no Livro 2 Título 13 $ 7". Na mesa estarão
sempre muito compostos, com a autoridade que se deve ao Tribunal; não
rezatáo nela, nem escreverão coisas particulares suas, nem terão práticas, que
não sejam muito decentes, nem diferença alguma entre si; estarão com atenção,
enquanto na mesa se fizer algum negócio, ou nela se voltar; e não interromperão
os que votarem, nem depois de estarvotado, terão alteração sobre os votos, que
têm dado; e, quando saírem, não irão falando nas matérias, que na mesa se
trataram.
4o. Do S. Oficio não levarão papel, que contenha algum segredo; mas
poderão, com licença dos Inquisidores, ver na mesa os processos correntes, e
antigos de mais dificuldade, para se inteirarem por eles da ordem, e estilo, que
se tem em processar, ejulgar as causas, paÍa que nas semelhantes saibam melhor
o que devem votar.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo OÍícío 1640
-

5o. Os que tiverem licença nossa poderão assistir na mesa, quando os


Inquisidores fizerem audiência aos presos, e ao despacho ordinário de seus
processos; estarão muito atentos advertindo com toda a aplicação no modo,
;I com que os presos são tratados, e na forma que se guarda nas matérias referidas,
i para que quando se lhes cometer alguma delas, as possam fazer como convém.
Quando os presos estiverern em audiência, não falarão diante deles de maneir4
que possam ser ouvidos; e tendo que advertir alguma coisa ao inquisidor a cerca
B do negócio, de que se trata, o poderão fazer por escrito; porém quando vierem
F à mesa para serem despachados em final, cada um dos Deputados lhe poderá
Ì fazer as perguntas, que entender serem necessárias para melhor se inteirar no
conhecimento de suas causas, e votar com maior segurança em seus processos.
60. Votarão em todas as sentenças definitivas, e nas interlocutórias, que
tiverem a mesma forg4 ou dano irreparáwel, e em quaisquer outras, de que se
tratar depois do processo que se propuser em mesa; na pronunciação das culpas,
que resultarem de proposições que a mesa tiver mandado qualificar, e nas que
o Ordinrârio remeter ao S. Oficio; e em todos estes casos, e nos mais, em que
votarem, terão voto decisivo; e assinarão todos os assentos, que na mesa se
tomarem nas matérias, em que o tiverem dado.
7o. No Tribunal, e fora dele, farão as diligências, que tocarem ao S. Oficio,
que a mesa lhe cometer, segundo o que está ordenado no Título III, $$ 13 e 14
deste livro; e nelas guardarão a mesma ordem, que os Inquisidores devem
guardar conforme a este regimento, e para esse efeito verão o que por ele está
disposto namatéria, que lhes for enca:regada.

TITULO VI

Do promotor

1o. O Promotor do S. Ofïcio terá todas as qualidades, que para os Deputados


se requerem, conforme a este Regimento, e ao que se declara no Tífulo I, $ 2o
deste livro. E porque este cargo é de grande confiança, e dele pende o curso dos
negócios, sempre para ele escolheremos pessoa, de quem se possa confiar, que
dará f.âcil expedições as coisas, que por este regimento lhe encarregamos.
2o. Terá. o Promotor uma das três chaves do secreto, e procurará sempre
vir ao S. Oficio na hora ordenada, para que por seu respeito, se não retarde o
despacho ordinário; e quando não puder vir por algum justo impedimento,
guardará a ordem, que se dá no $ 4o do Título II deste livro. Em todos os dias,
i
que não forem feriados, assistirá no secreto da Inquisição, três horas pela
maúã" e três à tarde, e não sairá dele sem causa muito justa; nem irá à mesa
)
do despacho, senão quando tiver que requerer ou apresentar algum libelo, ou o
I chamarem os Inquisidores.
I
R IHGB, No de Janeiro, 157(392):69j-88j, jul./set. 1996. 721

I
_-.1
Sônia Aparecida de Siqueira

3o. No secreto porá os papéis, livros e processos, comtal ordem e distinção,


que se achem com facilidade quando forem necessários, e quando se tirarem
de seu lugar, terá o cuidado de os fazer tornar a ele, pelos inconvenientes, que
se seguem do contriáxio. Nas estantes do secreto fará por cada auto de por si
com um tífuIo, que conteúa o ano, em que se fez, e quantos é em ordem; e os í
processos de cada auto, estarão dispostos pelas letras do ABC e juntos todos os
que tocarem a uma só letr4 e sobre eles se porá a mesma letr4 em forma grande, I
paÍa que melhor se veja; e os processos das pessoas, que não foram despachadas I
em auto público, se colocarão na forma sobredita, com os do auto, em que I
houveram de sair, se a causa obrigara a isso.
4o. Por enquanto, é necessário que o promotor esteja muito presente no
estado das causas, que correm no S. Ofïcio, para que possa com mais brevidades
fazer os requerimentos necessários para bem dajustiça; ordenamos, que tenha
dois cadernos, um dos presos, que estiío no cárcere, e outro dos termos, sessões
e diligencias, que se devem fazer em seus processos, formados na maneira que
sedeclaranoTítulollldestelivro,$$ l5e l6e,alémdestescadernos,teráoutro
de lembrançq em que vá assentando as pessoas delatas, tanto que achar, que
tem prova bastante para requerer, que sejam presas; para que não aconteça, que
eom a multidão dos negócios se esqueça de algum deles.
5o. Das petições que se forem apresentando namesado S. Ofïcio, em favor
de pessoas que estão delatas, ou se tem de o ser, fará um caderno numerado, e
na margem de cada petição poná a via porque veio, o dia, em que foi dada em
mesq o nome da pessoa a quem pertence, declarando-se se fez em razão dela
alguma diligênciao e no princípio do caderno fará índice dos nomes das pessoas,
a que tocam as petições pelas leüas do ABC e, se tocarem a pessoas delatas,
fará lembrança delas no Repertório à margem do título das pessoas, a que
tocarem, para que se em algum tempo se proceder contra elas, se possa melhor
cumprir a ordem, que se dá no $ 18 deste título. Feito este cademo, o proporá
na mesa aos inquisidores, para o rubricarem, e fazerem termo de encerramento,
na forma que está disposto no Título II deste liwo, $ 8o vers. Todos: e crescendo
as petições, irá formando outro, numerando-os por primeiro, e segundo e assim
por diante, conforme as petições forem crescendo. Das diligências, que se
fizerem emrazÃo destas petições, irá fazendo maços, donde se tire cópias para
sejuntarem por apenso aos processos das pessoas, a que tocarem, se acontecer,
que contra elas se proceda; e com elas sejuntará também ao processo, a cópia
da petição por onde se fizeram; e quando na mesa se der alguma petição em
favor de pessoa, quejá está presa, logo se apensará a seu processo, declarando
na margem dela, quem a deu, e em que dia.
6o. Das denunciações e confissões dos apresentados, que no S. Ofïcio se
fizerem, formará três livros diferentes: o primeiro dos culpados no crime de
heresia; o segundo dos confessores solicitantes e o último dos delatos pelo

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Regimento do Santo Oftcio 1640
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pecado nefaÍìdo. Mas se a denunciação tocar a uma só pessoa" que já estiver
presa, logo a farájuntar a seu processo; e, feitos estes livros, os proporá aos
Inquisidores para numeraÍem, e rubricarem na forma, que se dispõem no $ 8o
do Título II deste livro, vers. Todos. E se as conftssões, e denunciações forem
crescendo, guardará a mesma ordem, que acima fica dada, quando as petições,
# que se dão em favor das partes crescerem de maneira, que obrigam a que se
multipliquem os cadernos.
7". Contaút o Promotor todas as denúncias, que no S. Ofïcio se tomarem,
na forma seguinte; a saber, em cima da denúncia porá quem denunciou, e contra
quem; e pela maÍgem irá pondo o juramento, que se deu ao denunciante, sua
idade, tempo, e lugar do delito, e substancia dele, circunstâncias que agravem
e revelem cúmplices, se os houver, e o que disser ao costume. Nas confissões
fará as mesmas contas, e além delas contará o ensino que ao réu se fez, e em
que tempo, e até quando lhe durou a crença dos erros, que confessa.

8o. Na mesma forma" contará as culpas, que se transladarem de seus


originais; e assim mais o nome da testemunh4 e se é parente do réu, e em que
grau, e se depôs em tormento ou tem algum defeito, e os cúmplices se tem
parentesco com o réu, e em que grau; e em todas as sessões e diligências, que
estiverem nos processos, contará tudo o que for essencial, e ftzer a bem das
partes, ou contra elas; e todas estas contas poná na margem defronte das coisas
que nelas se apontam, e serão breves; mas de maneira que facilmente se entenda
o que dentro se contém; porque deste modo se poderá achar sem trabalho, o que
se busca nos processos.

9o. Reportará o Promotor com toda a brevidade, no Repertório geral, todas


as pessoas que forem delatas no S. Ofïcio, ou nele confessarem suas culpas
(salvo se forem solicitantes, culpados no pecado nefando, ou delatos sem nome;
porque estes reportarão em Repertórios particulares como abaixo se dispõem)
e po,ní cada uma das pessoas em lugar separado, declarando seu nome, estado,
qualidade, e mais confrontos que parecerem necessários, para que com facili-
dade se possa vir em coúecimento de quem são; e por baixo porá as testemu-
nhas, e a culpa, que lhe derem, e na maÍgem aterra donde o delato é natural, e
morador; e em caso que seja confesso, ausente, defunto ou decretado à prisão
ou alguma das testemuúas tiver defeito tal, que lhe tire o crédito de todo ou
em parte o diminua, o dirá outro se nela, se em favor do delato se ofereceu
alguma petição no S. Ofício; e, em casio que a haj4 fará declaração do dia, em
que foi dad4 caderno, em que se pôs, e a quantas folhas.

10. Reportado tudo da maneira, que acima fica dito, logo lançará no índice
do Repertório pelas lefias do ABC o nome da pessoa delata ou confessa;
declarando o estado, o oficio que tiver, e o lugar donde é natural, e morador,
paÍa que deste modo possa com muita brevidade ir reportando as culpas, que a

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Sônía Aparecida de Siqueira

cada uma delas novamente acrescerem, e achar no Repertório as pessoas


delatas, ou confessas; e responder às listas, que das outras Inquisições se
enviarem. E pelo mesmo modo reportará os culpados no pecado nefando, em
um Repertório; e aos solicitantes em outro; e porá logo o nome da pessoa
reportada no índice, que há de estar no início do mesmo repertório; e estes dois
repertórios, com os livros das confissões e denúncias, donde eles saíram, terá
sempre debaixo de chave, donde não sairão, senão quando for precisamente
neçessário. Os delatos sem nome reportará na mesma forma no Repertório, que
para eles há de haver; e no índice do mesmo Repertório porá o nome da terra
donde o delato for natural e morador.
I 1. No livro de marca maior lançará o Promotor pelas letras ABC todas as
pessoÍls, que no S. Ofício forem despachadas, ou saírem na mesa, ou na sala,
ou em ato público da Fé; ou fossem soltas por razáo de doidice ou por algum
outro respeito, cada umapor si; declarando seu nome, oficio, estado, qualidade
e terra donde for natural e morador, com as mais circunstâncias, que parecerem
necessárias paÍa serem coúecidas, e nas mÍrgens, que para maior clareza serão
três em cada folha, porá em um ano, em que foi apessoa despachada, e em outra
o despacho, que lhe deram, e na terceira, o auto, a que seu processo sejuntou.
12.Langariâ no livro, que para esse efeito há de haver no S. Oficio, a lista
das pessoas, que nele foram despachadas, conforme a ordem, com que no auto
se lhe leram as sentenças; e do mesmo modo lançará em outro livro as listas
dos Autos da Fé, que das outras Inquisições se enviarem.
13. O Promotor requererá que todas as denúncias de que resultar alguma
culpa, que pertença ao S. Ofïcio, se ratifiquem, e se nelas houver testemunhas
referidas, que se perguntem, e que se faça qualquer ouha diligência quando seja
necessária para constar se as testemuúas bem e verdadeiramente depuseram.
E se a denúncia tocar a pessoas que residem em outro distrito, depois de
reportada, ordenará que se translade, e fará disso lembrança aos Inquisidores,
para que com carta da mesa se remeta à Inquisição a que pertencer; e no
repertório fará declaração do di4 mês e ano em que se remeteu e, vindo alguma
denúnciado Ordinário ouComissários, faráo requerimento porescrito, pedindo
nele que se pÍìsse comissão, para que se faça o que fica dito; e tanto que se fizer,
sejuntará ao despacho por que se mandou fazer.
14. Quando houver testemuúas de fama, ou de ouvida, requererá que se
perguntem; e das de fama formará artigos ôontra os réus, e se ajudará delas,
quando em direito se permitir, como abaixo se declara; porém as de ouvidafará
tirar somente para efeito de se poderem perguntar as referidas, e se fizerem as
mais diligências que cumprir a bem da justiça.
.15. Parecendo ao Promotor que há culpas bastante para se proceder contra
alguma pessoa, ordenará aos Notários que as ffansladem, e concertem com as

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Reginento do Santo OÍício 1640
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originais; e fará em mesa requerimento por escrito, em que as ofereç4 decla-


rando o nome, qualidade e terra donde mora o culpado, quantas testemuúas
tem, e a substância da culpa que lhe dão; e requererá contïa ela, conforme o que
entender que éjustiça; ejuntando o requerirnento com as culpas, ordenará a um
Notário, que lhe poúa a conclusão e posta ela, o apresentará pessoalmente na
mesa do S. Oficio.
16. E quando não houver tempo para se transladarem as culpas dos
originais, ou pela brevidade, com que se deve proceder contra os culpados, ou
por ruzáo de outros negócios, o Promotor fará requerimento no livro dos
decretos, de que se faz menção no Título II deste livro $ 7o oferecendo os
próprios originais, e o assento, que na mesa se tomar, se lançará no mesmo
livro; e tanto que os culpados forem presos, o Promotor ordenará a um dos
Noüários que passe certidão do decreto de prisão, para sejuntar ao processo; e
se a prisão se não poder executar pelos decretados serem ausentes, ou defuntos
) ou por algum outro respeito, requererá, que os mandados de prisão se recolham
no secreto, pelos inconvenientes, que se podem seguir, de ficarem em poder
ì
das pessoas, a que foram remetidos; e no repertório fará declaração, de como
i os culpados foram decretados, e são ausentes ou defuntos.
17. Requererá que se continuem as causas das pessoas, que faleceram no
cárcere, ou fugiram dele, e que se proceda contra os ausentes, e defuntos, que
não foram presos, se contra eles houver prova bastante para isso; assim mesmo
requererá que as penas das sentenças se executem, e a execução das finanças,
que se perdem, e que se cumpram as penitências dos culpados; e assim mais
fará em todas as matérias os requerimentos, que lhes parecerem convenientes
a bem da justiç4 e se os Inquisidores lhe não deferirem, e entender que a justiça
fica lesa ganhará a ordem, que se dá neste Título $ 23.
18. Antes de requerer, que se proceda contra alguma pessoa, proverá os
cadernos das petições oferecidas em bem das partes, e as margens do repertório,
em que a tal pessoa estiver reportada; e achando alguma coisa em seu favor, ou
sabendo por outra via" que a há no S. Ofïcio, o declarará em mes4 para que a
todos se faça inteira justiça, e igualmente se castiguem os culpados, e se
defendam aqueles que não o forem.
19. Acusará o promotor a todos os réus negativos, e aos confidentes, que
I
forem dilutos em parte substancial de sua culpa, ou em cerimônias notáveis, ou
I ao tempo, em que perseveram em seus erros; salvo quando se presumir,
conforme a direito, que a diminuição nestas coisas não procede de malícia, se
l.
não só esquecimento; assim mesmo acusará aos que confessarem o delito, e
negarem a intenção, e aos que houverem de ter alguma pena, posto que
plenariamente teúam confessado suas culpas; porém isto se não entenderá nos
I que confessam judaísmo, ou qualquer outra heresia, aos quais se não há de
I
[$
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Sônia Aparecída de Siqueira

impor alguma pena arbitrária, senão só as ordinárias de direito; nem nos


solicitantes, ou sodomitas apresentados, que não tiverem conha si prova
bastante para prisão. Mas nos casos em que não acusar os confidentes, dirá por
sua letra no processo antes que se faça concluso em final, que aceita a confissão
do réu por parte dajustiça, enquanto faz contra ele, e pedirá que por ela seja
condenado; e isto terá lugar, não só nos processos dos presos, mas também de
apresentados.
20. Quando de novo acontecer aos réus culpa de heresia diversa daquel4
porque estavam acusados, o promotor os acusará segunda vez por ela; como
será quando um réu estava acusado porjudaísmo, e lhe acrescer culpa da seita
de Mafamede, ou quando esüá acusado por Luterano, e lhe acrescer culpa de
outra seita. Acusará outra segunda vez os réus negativos, que estiverem
acusados por crentes, e observantes de uma seita, se depois lhe acrescer culpa
de fazerem cerimônias que pertencem à mesma seita; a saber, quando o réu está
acusado por se declararporjudeu, ou mouro, e depois lhe acrescer, que guardou
os sábados ao modo judaico, ou fez jejum do Ramedão, que os mouros fazem.
Acusará também segunda vez o réu negativo, que estiver acusado por fazer
cerimônias de alguma seita, se depois lhe acrescer outra cerimônia da mesma
seita; como agora, quando o réu foi acusado por fazerjejunsjudaicos, e depois
lhe acresceu culpa de guardar sábados na forma, que os guardam osjudeus;
porém quando a cerimônia, que de novo acrescer for a mesma espécie daquel4
porquejá foi acusado, como será quando o réu estava acusado porjejuns do
Thanis, e lhe acrescem mais jejuns do mesmo Thanis, o não acusará segunda
vez; salvo se tiverem tais circunstâncias, que agravem muito a culpa.
21. Por qualquer culpa que os réus cometerem no cárcere serão acusados,
ainda que já o fossem por culpa da mesma espécie; e neste caso formará o
Promotor o libelo com tal cautela, que não veúam os réus em coúecimento,
de que no S. Ofïcio se sabe, onde a culpa foi cometida; porém se os réus tiverem
confessado as culpas do cárcere, declarando como nele as cometeram, não serão
por elas acusados. Em todos os casos sobreditos, e nos mais, que a me.sa ordenar,
acusará o promotor aos réus; mas sempre precederá mandado dos Inquisidores
para isso; e quando eles o não derem, e ele entender, que por esse respeito fica
ilesa a justiça, guardará a ordem, que se dá no $23. deste mesmo título, e os
libelos formará conforme ao que se dispõem no Livro 2 Títulos VI e VII.
(.
22. Depois dos réus serem acusados, requererá o Promotor que se lhe faga
a publicação da prova dajustiça, se os processos estiverem em termos para isso; :
e quando os réus pedirem que se lhe declare o lugar do delito, e os Inquisidores
por seu despacho o mandarem declarar, o Promotor farátal declaragão, calando
:
aparte individual em que o delito foi cometido; como será quando o crime se
cometeu na Igreja de S. domingos de Lisboa, declarando que o lugar é Lisbo4
t
a

calando a Igreja, que é a parte, e assim nos mais casos semelhantes. E quando I
I
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I
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-

o lugar, em que os réus cometeram o delito for tão pequeno, ou tiver tais
circunstâncias, que se for declarado ao réu, virá ele em coúecimento de quem
são as testemuúas, o Promotor considerando a distância que vai desse lugar
à cidade, vil4 ou lugar mais notável, dirá que o réu cometeu a culpa em tal
distância da dita cidade, vila, ou lugar; convém a saber, quando o réu cometeu
o crime em uma quinta uma légua de Lisboa" dirá que o réu cometeu o crime
uma légua ao redor de Lisboa, e se as culpas forem cometidas no ciírcere; sendo
o réu morador na cidade, em que assiste o S. Oficio, ou havendo notícia certa,
que veio a ela no tempo, que a publicação da prova da justiça lhe dá a culp4
declarará o Promotor que o réu o cometeu na tal cidade; mas não sendo nela
morador, nem havendo notícia certa" que veio a ela no tal tempo, dirá que a
culpa se cometeu no Arcebispado, ou Bispado, em que reside o S. Oficio.
23. Parecendo ao Promotor que ajustiça é agravada nos despachos, ou
sentenças dos Inquisidores, poderá apelar para o Conselho-Geral, como se
dispõem no Livro 2 Título )Oil. E quando amesa lhe não deferira suaapelação,
ou a seus requerimentos, fará petição ao Conselho, em que relate o caso, e peça
se evoquem a ele os autos para se lhe deferir com justiça.
24. Estando os negócios e processos em termos paÍa se entrar em despacho
geral, o Promotor, de mandado dos Inquisidores, faú lista para o conselho de
todos os presos do cárcere, e das pessoas, que se livrarem soltas, declarando
nela os nomes, idade, e qualidades dos réus, donde são naturais e moradores, o
tempo em que foram presos, ou apresentados, a qualidade das culpas, a prova
I que contra ela há e os termos, em que estão seus processos; e antes de se dar
início ao despacho, procurará saber se nas outras Inquisições há culpas conüa
as pessoas, que se houverem de despachar, e para isso fará outra lista com as
t confrontações necessiírias para se vir em conhecimento de quem são; e a mesma
diligência procurará que se faça por certa da mesa todas as vezes que se houver
de despachar algum processo. Antes dos processos se proporem em mesa, fará
diligência no Repertório, para ver se estão nele transladadas todas as culpas,
que há contra o réu, e no fim delas fará declaração de sua letra, de como não
há contra o réu mais culpas do que ali estão transladadas.
25. Terá, grande cuidado de se formarem os processos de maneira que
quando se despacharem em final, lhe não falte coisa alguma; e no rosto de cada
um deles fará pôr o nome, qualidade, estado, oÍïcio, e pátria do réu, e o dia" mês
e ano em que foi preso; e se for solteiro ou mulher casada" o nome, o estado do
pai, ou marido, com a advertênciq que se declara no $ I l,Título XXII do Livro
\
2 e o mesmo cuidado terá de ver se os processos estêio formados, como se
dispõem no livro 2, Título V e os que houverem de ir ao Conselho, numerará
) tanto que estiverem conclusos em final, para que com mais clarczapossa fazer
I
os relatórios, e irá cada parte numerada por si, paÍa que possa continuar os
números, no que depois acrescer, sem riscar os que já tiver posto; mas não forem

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SôniaAparecidade Siqueira i

afetos ao Conselho, bastará que os numere depois de celebrado o Auto da Fé,


e nestes poderá continuar os números da segunda parte juntamente com os da
primeira.
26. De todos os processos, que são afetos ao Conselho farárelatório, o qual
dividiráemduaspartes;naprimeiradeclararáonome,idade,qualidade,oficio
e estado do réu, culpaporque foi preso, e se é negativo, ou confidente, e em que
tempo o prenderam, e com quantas testemunhas, e quantas lhe acresceram, e
quantas são por todas. Porá por número, com muita distinção, o nome das
testemunhas, o dia em que depõem, o tempo, em que declararam que foi o delito
cometido,oscúmplices,ecerimônias,quelhedão,equantastestemunhasnelas
concordam, o parentesco, se as testemunhas, ou cúmplices o tiverem com o réu. ì
Na segunda parte do relatório, porá as sessões termos do processo, com o dia"
mês e ano, em que se fizeram, e a quantas folhas vão; e no fim fará menção do
despacho final, e do dia em que foi dado, e a quantas folhas está; e esta mesma
ordem guardará quando o processo vier mais vezes ao Conselho, e lhe acres-
cerem termos e despachos de novo.

27. Estando concluído o despacho, ao tempo, que se tratar de pedir dia para
o Auto da Fé, fará de ordem dos Inquisidores outra lista para o Conselho, na ì
forma acima declarada" das pessoas despachadas, acrescentando somente o
despacho, que cada uma delas teve, e declarando as que foram a tormento; e
para o dia, em que o auto se celebrar, terá feito ouba lista das pessoas, que nele
houverem de sair, declarando em cada uma o nome, idade, qualidade, e terra
donde é natural, e moradora; a qualidade de sua culpa, e a pena, que por ela se 3

lhe dá; a qual lista se entregará aos inquisidores para eles no-la enviarem na
forma, que no Título III fica ordenado.
_l

28. Das pessoas, que achar delatas nas confissões, e denúncias, que
reportar, e pertencerem a distrito diferente, fará lista, declarando o dia em que .
depôs a testemunha, a qualidade da culpa, o tempo, e lugar, em que lha dá, se
diz ao costume, e se está ratificada; e esta lista entregará na mesa, donde será
enviada a Inquisição, a que tocar, com a brevidaãe possível, porque não
aconteça ausentarem-se os culpados, em tanto prejuízo de nossa Santa Fé, e de
suas almas. E quando de outra Inquisição se pedirem algumas culpas, o
promotor fará logo tansladar pelos Notrârios as que houver, e procurariár, que
com toda a brevidade se enviem à Inquisição, que as pediu; e no repertório faní
declaração do dia, mês e ano, em que se remeteram, e a que Inquisição; e não
as havendo, fará passar certidão por um Notário, a qual ele também assinaná; i
se satisfará à Inquisição, donde as culpas se pediram.

29. Procederá com os efeitos dos privilégios, de que no S. Oficio se


conhece, quando com eles se houver de correr por parte dajustiça, e contará

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todos os que na Inquisição se processarem, e diligências, que se mandaÍem


fazer, confonne ao novo Regimento, que há de haver nesta matéria.
30. Além de seu ordenado, pelos libelos, que fizer, haverá o seguinte. Nos
processos dos hereges convictos, pela prova dajustiça, ou por sua confissão,
novecentos réis; e o mesmo quando o delito for tal, que provado mereça pena
capital; nos que abjurarem de veemente, seiscentos réis; nos de leve, ou
despachados sem a abjuragão quatrocentos réis; e vindo contra a mesma pessoa
com diferentes libelos, levaná de cada um o salário por inteiro; mas sendo o
libelo cumulativo por artigos de novo, não levarámais que o salário de um só;
e de tudo o que nos libelos se montar, se lhe dará satisfação, quando se pagarem
as mais custas dos processos.

TÍTULO VII
Dos notarios
1o. Os Noüârios do S. Ofïcio serão Clérigos de ordens sacras que saibam
bem escrever, de suficiência, e capacidade coúecida para poderem cumprir
com a obrigação de seu ofïcio; e podendo-se achar letrados, serão preferidos
aos mais; e todos terão as qualidades, de que estrá dito no Título I $ 2o deste
livro.
2o. Por quanto além de ser continua a assistência, que os Notrários faz,em
no S. Ofïcio, muitas vezes acontece de serem também necessiírios nos rlias em
que não há despacho; encomendamo-lhe muito, que tratem quanto for possível,
de viverjunto da Inquisição; dois deles, os que forem mais antigos, terão chaves
da porta da casa do secreto; e em falta de algum deles, a terá um dos outros,
qual os Inquisidores ordenarem; e quando tiverem justa causa para não vir ao
S. Ofïcio, enviarão a chave na forma, que se ordena no $ 4o do Título II deste
livro.
3o. Todos os dias, que não forem feriados, virão ao S. Ofício na forma
ordenada; e um delespelamanhã, meia-horaantes de se enfrarno Tribunal, dirá
missa no oratório da Inquisição; e paÍa com maior facilidade poderem cumprir
com esta obrigagão, que há de ser inviolável, a repartirão às semanas entre si,
e as missas poderão aplicar por quem lhe parecer; e pelo trabalho de as dizer
haverão por ano cinco mil réis cada um; e cometendo algum deles falta na
semana, que lhe cabe, alem de lho mandarmos estranhar, como é razão, serã
multado naquilo que lhe couber por cada missa.
4o. Assistirão no secreto três horas pela maúã, e três à tarde, e nelas não
sairão fora, sem para isso haver causa muito just4 ou os Inquisidores os
chamarem; e se ocuparão só naquelas coisas, que pertencem a seu oficio, sem
se divertirem em matérias e práticas escusas, que não servem mais, que de
impedir o curso dos negócios; e quando os Inquisidores os não ocuparem na

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Sônia Aparecida de Siqueira

mesa, saberão do Promotor as coisas, a que devem acudir, para que sejam
preferidas as demais.
5o. Escreverão em todas as causas, em que os Inquisidores são Juízes, assim
por breves Apostólicos, como por privilégio Real; e assistirão a todos os atos
judices, que com os presos, e mais pessoas se fizerem; Fansladarão as culpas,
e mais papéis, que forem necessiírios paÍa os processos, e farão neles todos os
termos, conclusões, e ratificações; farão os mandados, cartas de inquirições,
requisitórias, comissões, precatórios, e certidões, que se houverem de passar
para fora; cozniao os processos e fecharão as cartas, e farão os maços delas, e
dos mais papéis, que se remeterem, e selarão aqueles, que houverem de ter selo;
estarão presentes quando se houver de falar com algum preso, ou fazer com ele
alguma diligência, ainda que seja extrajudicial; salvo nos casos, em que o
Regimento outra coisa permitir, ou dispuser.
6o. Lançarão a receita" e a despesa nos livros do Tesoureiro, e farão os
conhecimentos em forma; como Escrivães de seu caÍgo, e formarão os livros,
que pertenceÍem a este ofïcio, como no título seguinte se declara; farão os
termos dojuramento, que se deraos minishos, e oficiais do S. Oficio, e copiarão
suas provisões nos livros das criações, e ordenados; e neúum papel dos
sobreditos escreverão por terceira pessoa, senão por sua própria mão.
7o. Nas audiências não falarão com Íìs partes coisa alguma e escreverão
pontualmente todas as palavras, que o Inquisidor disser à parte, e o que ela
responder, lançando assim as perguntas, como as respostas por extenso, não se
contentando com dizer, e sendo perguntado, respondeu. E quando acontecer,
que o Inquisidor se saia no meio da audiência para logo a vir continu ar, pararâ
no estado, em que estiver, sem se escrever mais palavra alguma; e parecendo-
lhe que é precisamente necessário adverti-lo de alguma coisa tocante ao
negócio, de que se trata, podê-lo-ão, fazer por escrito, com amodéstia, e cautela"
que convém ; e quando a sessão se não puder acabar na audiência em que
começou, declararão arazÃo, que houve para isso.
8o. Começarão os termos das audiências pelo dia, mês, ano e lugar em que
se Íizerem; e sendo no cárcere, dirão a razão, que houve para nele se fazerem;
se foi em audiência da tarde, ou da maúã, declarando por seu nome e pessoa,
que a elas assistir como juiz; e, sendo Deputado, dirão a ordem, ou comissão
porque assistiu; logo porão o nome da pessoa, que é ouvida; e se pediu
audiência, ou foi chamada, e se lhe foi dado juramento para diznr averdade, e
ter segredo. Quando se fizerem duas sessões no mesmo dia com uma pessoa,
não começará o termo da segunda, dizendo; e logo no mesmo dia; senão na
forma sobredita pelo dia, mês e ano; porem antes das partes se assinarem,
infalivelmente lhe será lido o que com elas se escreveu; e assim se declararáno
mesmo termo, com o que as partes responderem; e no fim concluirão, o que o

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Juiz, e a parte assinaraÍn, e ele Noüário o escreveu; e sendo preso, dirão que o
molestado em forma foi mandado a seu cárcere.
9o. Por enquanto, conforme a direito, e ao que se dispõem no $ 4o, Título
V do Livro 2 se deve dar Curador ao menor de vinte e cinco anos; na primeira
audiência, que com ele tiver, faú o Notário termo de curadoria separado da
sessão, o qual o Curador assinarár, eterâparticular cuidado de lembrar, que se
dê sempre Curador aos menores, antes de se fazer com eles auto algum judicial;
e que o curador venha estar presente quando lhe forem lidas as sessões, que
com ele se fizerem, € as assine, e no termo fará menção como assistiu, e assinou.
10. Quando os Noüírios transladarem testemunhos dos originais para os
processos, ou parte se enviarem a outra Inquisição; em cada testemuúa farão
um relatório muito distinto, em que se declare sua idade e qualidade, donde é
natural, o di4 mês e o ano em que foi presa, ou apresentad4 e porque culpas;
o estado em que estava seu processo quando começou a confessat, e quando
disse do réu; se variou no discurso da confissão, ou a revogou em todo, ou em
paÍte, com tudo o mais que parecer necessário, para que melhor conste do
crédito que se deve dar a seu depoimento. Depois deste relatório, hansladarão
o termo da audiência, em que disse do réu, e a comunicação, que teve com ele,
na forma em que estiver escrtta, sem acrescentar nem diminuir palavra algum4
e no fim dirão a razão que houve para se fiarem o réu, e a testemuú4 se ela a
tiver declarado, e o que disser ao costume; e se o testemunho for dado em
tormento, ou depois da sentença dele, transladarão toda a audiência do tormen-
to, com o que tocar ao réu; e assim mais a ratificação da banca" e tudo
concertarão com oufro Notiário, em presença do Promotor, declarando no termo
do concerto, que nesta forma foi concertado, e conferido.
ll. Quando algum processo estiver em termos de se lhe dar algum
despacho, um dos Notrírios lhe porá a conclusão, dizendo, que estando em tais
termos de mandado dos Inquisidores o fez concluso para se lhe haver de deferir;
e estando em termos de se despacharem final, dirá" que o fezconcluso em final.

12. Das causas, que conforme ao regimento, houverem de ir ao Conselho,


enviarão os próprios autos, e não o fraslado deles, com todos os apensos
necessários, e os mandados, cartas de inquisição, comissões, requisitos e
certidões, farão na forma do estilo, e prática do S. Oficio.
13. Do secreto não tirarão, nem copiarão papel algum para o darem a
ouhem, nem o levarão para sua casa, nem passarão certidão alguma para fora
do S. Ofício, sem expressa ordem do Conselho; salvo nos casos em que o
Regimento oufra coisa declarar; e quando de ordem do Conselho passaÍem
certidões, ou derem alguns papéis para fora, será ao pé do despacho, que se lhe
der.

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Sônia Aparecida de Siqueira

14. Todas as vezes que algum Religioso, ou outra pessoa Eclesiástic4


estiver com algum preso para o encaminhar no que lhe convém a sua salvação,
estará presente um dos Notários; e quando os Inquisidores forem visitar o
cárcere irá sempre com eles um Notário, e levará um cademo para tomar em
lembranga as coisas que os presos pedirem, e de que tem necessidade; e depois
dos Inquisidores por este caderno proverem a visita, o recolherá no secreto em
uma gaveta, para que a todo o tempo conste o que nela se ordenou.

15. Não passarão mandados, cartas de inquirição, comissões, requisitos ou


certidões, nem papel oufro algum para fora do S. OÍício sem despacho assinado
pelos Inquisidores (precedendo também despacho do conselho naqueles, em
que conforme ao Regimento é necessário) e todos os que em virtude de seus
despachos passarem, antes de os levarem a assinar ou entregarem às partes,
lançarão no livro do registro, declaÍando o di4 mês e ano em que se passaríÌm,
para que efeito, a quem foram dirigidos, e porque via; e nos próprios papéis
porão cota, que declare, como ficam registrados, e a quantas folhas, e quando
forem passados à instância de partes, que os hajam de pagar, irá declarado o
que neles se montar.

16. Quando os Inquisidores ordenarem aos Notários, que assistam a algu-


ma ratificação, o Notiário, que a escrever, declaraná nelaarazio que houver pa-
ra não serem chamadas as pessoas por nós aprovadas para este efeito, em
nenhum caso o Notário, que tiver escrito a confissão ou denúncia assistirá por
honesta pessoa na ratificagão dela.

17. O Noüário, a quem o Alcaide avisar (com tanto que não sej4 o que
naquele tempo servir de Tesoureiro) que entrou no S. Ofïcio algum preso, irá
logo fazer auto de entrega, no qual irá declarado o di4 mês e ano em que entrou
no cárcere, quem o trouxe, e tudo o que lhe foi achado; e assinado o auto pelo
Alcaide, o juntará ao processo do preso; carregarí em receita ao Alcaide no
livro, que fica ordenado no Título II $ 8" deste liwo, os ferros, fato e roupa, que
o preso trouxer para seu uso; e fará que o Alcaide assine logo o termo da receita,
e assistirá à busca, que se há de fazer ao pÍeso antes de o levarem para o ciárcere;
e tudo o que se lhe achar, que não for roupa de seu uso lançaÍá por lembrança
no livro, que está ordenando, e as pessoas de ouro, ou prata, diúeiro, escritos
ou letras dele, entregará ao tesoureiro, carregando-lhe tudo em receita no título
do mesmo preso.

18. Tanto que o Auto da Fé se celebrar, irá um dos Notários do cárcere, e


em presença do Alcaide faní inventrírio de todo o fato, e roupa, que ficou dos
relaxados, reconciliados e defuntos, em um livro, que para isso há de haver; e
tudo o que nele se inventariar, ficará entregue ao Alcaide, que assinará o mesmo
inventiírio, para constar que recebeu.

732 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (i92) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Oficio 1640
-

19. Os Notários levarão de cada selo que puserem nos papéis, que houve-
rem de selar, um vintém; e do que escreverem nos processos, levarão o que pelo
Promotor lhe for contado; e o pagamento se lhe fará quando se pagarem as mais
custas dos processos.

rÍruro un
Do tesoureiro e seu escrivão

1o. O Tesoureiro do S. Ofïcio será um dos Notrários, qual os inquisidores


ordenarem, e servirá um ano contínuo, que começará no primeiro de Janeiro, e
os outros Notários, serão Escrivães de seu cargo; mas ordinariamente servirá
aquele que estiver mais desocupado.
2o. Ordenará o Tesoureiro, quatro livros de receita e despesa, um das rendas
da Inquisição, outro dos presos que se sustentam de seus bens, outro dos presos,
t"
\ a quem sustenta o Fisco, outro das condenações pecunirârias, e comutações das
penitências; e em cada um deles porá na primeira folha o título, que lhe toca,
com declaração do ano em que deve servir; e serão todos numerados, e
rubricados por um Inquisidor, na forma, que se dispõem no $ 8o do Título II
deste livro.
i
3o. O escrivão do Tesoureiro lhe carregarâ no livro de rendas da casa na
segunda folha em receita por lembrança tudo o que deve cobrar naquele ano,
assim das rendas da Inquisição que se vão vencendo, como do que delas se
Ì dever dos anos atrasados, declarando em cada uma das adições os tempos, em
? que se vencem, e se costumam pagaÍ; e daí por diante em títulos separados irá
carregando como diúeiro vivo, todo o que o Tesoureiro for cobrando e no fim
do livro lançará as despesas com toda a clareza necessária, dizendo o di4 e mês,
em que se fazem; e naquelas que não forem ordinárias, dirá mais por cuja ordem
se fizeram, e que razão houve para isso; e tanto que a página for cheia o
tesoureiro apresentará o livro em mesa aos Inquisidores paraverem as despesas,
e lhas assinarem, constando, que são correntes na forma que no $ 4l Título III
deste livro estrá disposto.
4o. No livro dos presos, que se alimentam de seus bens, fará o escrivão
título particular de cada um, lançando em uma parte a receita, assim do dinheiro,
que o tesoureiro recebeu paÍa seus alimentos, como do que lhe foi achado
quando entrou no cárcere; e em outra a despesa; e no livro dos presos pobres
do princípio folhas bastante paraareceita, e logo continuará com a despesa na
forma que no livro dos ricos se tem direito; e nas despesas de uns e outros, que
não forem as ordinárias da parte do cárcere, declara com que ordem, e para que
efeito se frzeram; e as da pauta, acabado o mês, lançarâlogo nos livros para que
andem sempre ajustadas a receita com a despesa, e possa facilmente constaÍ,
quando é necessário pedir dinheiro para presos.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996. 733

i
Sônia Aparecida de Siqueira

5o. Quando na entrada do cárcere forem achados aos presos algumas letras,
ou escritos de diúeiro, o Tesoureiro tanto que lhe forem enfiegues, com ordem
da mesq os passará ao tesoureiro do Íïsco, cobrando dele coúecimento em
forma, para se descarregar, quando der sua conta; e isto haverá lugar naqueles
presos, em que houver seqüesfuo de bens; poÍque não o havendo, se entregarão
as letras, e escritos às pessoas, a quem os presos deixarem encarregados seus
bens.
6o. No livro das condenações fará dois títulos, um de receita por lembrança
onde carregará ao Tesoureiro todo o diúeiro, que há de cobrar de condenações,
pecuniárias, que fizerem os Inquisidores, ou se mandarem fazer,por despacho
do Conselho, e o diúeiro das dispensassões, e comutações, que se fizerem por
nossas provisões; declarando no termo da carga as pessoas, de quem se hão de
cobrar, e a provisão, ou despacho donde procederão; e no mesmo despacho, ou
provisão, porá à margem verba de como vai canegando no tal livro, e a quantas
folhas; e o outro do diúeiro vivo, no qual carregará tudo o que o Tesoureiro
for cobrando, remetendo-se na carga ao termo de receita por lembrança, à
margem do qual porá verba, de como se cobrou, e vai carregado a folhas tantas.
7o. A principal obrigação do tesoureiro há de ser procurar a cobrança de
tudo o que Oficio, e lembrar com tempo aos Inquisidores, o que
se dever ao S.
deve fazer para este efeito; e assim mesmo lhe lembrará com tempo, quando
na aÍca houver falta de dinheiro para os gastos necessários da casa, ou para
alimentos dos presos; e terá nestas matérias tal cuidado, que nunca por este
respeito se retardem os negócios.
8o. Tanto que o Tesoureiro cobrar algum dinheiro, o fará saber na mesa, e
logo diú ao escrivão, que lho caregue em receita no livro a que tocar; e na
carga iná declarado o dia, mês e ano em que o recebeu, a pessoa que o entregou,
e porque conta; e do que receber passará coúecimento em forma feito pelo
escrivão, e assinado por ambos, no qual o escrivão declarará o livro, e folha em
que o dinheiro fica carregado, e no mesmo livro à margem da carga porá verba
como passou coúecimento. E o Tesoureiro em nenhuma forma cobrará diúei-
ro, sem primeiro se lhe caffegar em receita nem passará escritos rasos do
receber; e fazendo o contrário, lhe será dado em culpa.
9o.Todo o diúeiro, que cobrar pertencente à inquisição colocará logo na
arca de três chaves, das quais há de ter uma, donde não sairá dinheiro algum,
se não com ordem da mesa, e em presença dos dois Inquisidores, que hão de
ter as outras chaves. No inicio de cada mês, tirará a quantidade de dinheiro, que
os Inquisidores ordenarem, assim para os gastos ordinários da casa, que terá
em seu poder, como também para alimentos dos presos, que entregará ao
despenseiro, do qual receberá conhecimento; e no fim do mês fará com ele conta
pela folha que o Alcaide tiver feito, e Íicando-lhe a dever algum dinheiro, lhe

734 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul./set. I 996.

L
Regimento do Santo OJício 1640
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dará satisfação pontualmente, e sendo o despenseiro devedor, logo cobrará dele


o que ficar devendo, para que deste modo andem as contas do despenseiro
ajustadas, de maneira, que nem ele teúa queixa, nem desculpa se faltar nos
provimentos: e o tesoureiro fará a saber na mesa, o que resultar das ditas contas:
terra particular cuidado de prover com tempo a casa do secreto de tudo o que
nela se há mister, conforme ao que fica dito no Título II, $ 6o.
10. Tanto que a folha se fizer, pagarâ seus ordenados a todos os ministros
e oficiais, com muita pontualidade; e assim mais o que nos mandarmos
despender por nossas provisões, ou despachos do conselho; dará satisfação com
toda a brevidade ao que se dever das diligências, que por ordem do S. Ofïcio,
se fizerem , ou sejam tocantes aos processos, ou às pessoas, que pretendem
I
I servir ao S. Oficio; e fará o pagamento na forma que se ordena no $ 43 do Título
I III deste livro.
I 1. Algum tempo antes do dia, em que se há de celebrar o Auto daFé,farár
rol de todas as coisas para ele necessárias, o qual mostrará em mesa, e sendo
nele aprovado, as fará comprar com tal cautela, que nunca daí possa resultar
noticia do auto; e darâ ordem ao dispensário para comprartudo aquilo, em que
os presos do cárcere forem providos na visita, conforme ao rol, que os Inquisi-
dores lhe mandarem dar, e o entregará pelo rol ao Alcaide, de quem cobrará
conhecimento, para que se lhe lance em despesa no livro dos presos, a que tocar.
12. Tanto que o Alcaide lhe entregar as receitas dos medicamentos, com
que o boticrário proveu os dotes do cárcere, se mostrará a um dos médicos da
casa, e saberá dele, se são os preçosjustos, e o que o medico assentar, pagarâ
logo o boticrário, e o farâ lançar em despesa no título do preso, e que pertencer,
depois da despesa ordinrária do mês.
13. Dará treze mil réis cada ano ao porteiro da mesa do despacho, quatro
para um moço, que há de varrer a casa da Inquisição, quatro para vinho, e
hóstias, e lavagem de roupa do Oratório, dois para a leúa do fogo, que se há
de fazer naeasa do despacho no inverno, quando os Inquisidores lho ordenarem,
e três pelo pano de mesa, que lhe havia de ficar; mas estes lhe não pagará no
ano, em que se fizer novo pano, porque então lhe ficará o velho, em lugar do
qual se lhe faz esta mercê; pagaút os portes das cartas, e papéis; que vierem
para o S. Oficio, e darâ paÍa o Oratório as velas, que forem necessiírias; e o
Tesoureiro da Inquisição de Lisboa dará mais ao porteiro do Conselho oito mil
réis em cada ano, outro para o moço que há de varrer as casas do Conselho, e
outros quatro pelo pano da mesa, os quais se lhe não darão também por ano,
em que fizer de novo.
14. Além das despesas sobreditas, poderá o Tesoureiro, com ordem dos
Inquisidores, despender em cada ano até a quantia de cinqüenta cruzados, nos
gastos extraordinrários da casa como são obras, e reparo das casas da Inquisição,

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(392):693-883, jul./set. 1996. 735


Sônia Aparecida de Siqueira

e dos três ministros, e reformação das coisas que servem no Oratório, casa do
despacho, secreto, e audiências, e excedendo as ditas coisas, que se ouvirem de
fazer em um ano, a quantia referida, as não farás sem provisão nossa, ou
despacho do Conselho; e neúum dos pagamentos, ou despesas referidas, fará
dinheiro das condenações, ou comutâçõesdas penitências, nem dele despenderá
coisa alguma sem expressa ordem nossa; e fazendo o contriáric, ou alguma outra
despesa, que o Regimento não ordene, lhe não será em conta.
15. Depois que o Auto da Fé se celebrar, o tesoureiro, com ordem dos
Inquisidores, fará conta com as possoaÍi, que nele saíram, e não foram conde-
nadas em pedimento de bens, do que recebeu paÍa seus alimentos, e do que
neles se gastou; e colocará na conta de cada um as visitas do médico, e cirurgião, I
conforme ao rol, que o Alcaide lhe der; e feita conta, se lhe ficar devendo algum
dinheiro, lhe dará logo satisfação; e tendo pessoas suas de ouro, ou prata" ou I
moedas de ouro, alguma outra coisa lhe fará logo entrega de tudo na mesma
espécie, e cobrará qurtação paÍa com ela se descarregar quando der sua conta;
e as ditas pessoas ficarem a dever algum diúeiro, também o cobrará logo delas,
e não pagando, requererá aos Inquisidores, que as mandem deter no carcere da
penitenciári a, ate pagarcm com efeito na forma, que lhe esüá ordenado no Título
rrr $ 4s.
16. Tanto que acabar o ano, dará sua conta ao Inquisidor, que para isso
nomeannos; e ficando a dever algum dinheiro, o entregará de contado ao
Tesoureiro, que lhe suceder, o qual o não tomará em receita sobre si, sem que
realmente o receba, e se coloque na arca das três chaves; e ficando o S. Ofïcio
a dever ao Tesoureiro algum dinheiro, não se lhe dará dele satisfação; por
quanto não é nossa vontade, que ele empreste de sua casa diúeiro ao S. Offcio,
nem é de presumir, que seja seu o que acrescer; e por este modo cessarão os
inconvenientes, que se podem seguir do contrário.
17. Porém acontecendo, que haja tal necessidade, que seja forçado buscar
o tesoureiro algum dinheiro emprestado para acudir ao S. Ofïcio, ele o faní
saber na mesa, para que o tome com ordem dos Inquisidores, e constando do
empréstimo, lhe mandem dar satisfação do primeiro dinheiro, que se cobrar; e
pelo trabalho do ofïcio, e quebra do diúeiro, haverá além de seu ordenado,
doze mil réis de mercê pelo ano, em que servir.
rÍruro x
Dos procuradores dos presos

1o. Os Procuradores dos presos serão pessoas de letras, prudência, e


confiança, graduados em Cânones, ou leis, e podendo ser, serão também
Eclesiásticos; terão todas as qualidades declaradas no Título I $ 20 guardarão
inteiramente o que se dispõem nos $$ 6', 7o e 8o do mesmo título. Quando vierem

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 693-883, jul.het. I 996


: Regirnento do Santo Uício 1640
-
tir*
q
ao S. Ofício procurar pelos presos, se guardaÍá a ordem, que se dá no Título
$tf MII $ 5o do Livro 2, e se o preso por razáo particular não quiser que advoguem
f em sua causa os procuradores ordinários, se faÍá o que dispõem o Regimento
no mesmo título, $ 20.
2o. Quando o Procurador na Inquisição estiver com algum preso ,parafratar
de sua caus4 será sempre em presença de Notário ou de algum oficial do S.
Oficio, que os Inquisidores ordenarem; não falará com o preso em matéria, que
não tocar a sua defesa; mas sobre ela lhe poderá perguntar tudo o que entender,
que é necessário para lhe formar artigos de defesa, ou contraditas, os quais
formará com grande clareza e distinção, não juntando matérias diferentes, antes
de cada uma fará artigo particular, de maneira que com facilidade se entenda o
que neles estiver articulado; e todos os artigos, que formar, ou sejam de defes4
ou contraditas, assinará com o réu, e quando ele lhe disser, que não tem defesa"
ou contraditas, com que vir, fani declaração disso por escrito, que assinada na
mesma forma enhegará na mesa; e qualquer resposta que o réu der, ao libelo;
ou publicação da prova dajustiç4 se escreverá, assinará por ele procurador ao
pé dos traslados do libelo, ou publicação, para em mesa se lhe definir como for
justiça.
3o. Poderá pedir, e requerer, que se lhe façam todas as declarações, que
entender, são necessárias para melhor poder defender os presos, e tudo o mais,
que convier para bem de suas câusas, e nisto terá particular cuidado; e se lhe
parecer necessiírio no fim da causa arasar em defesa do réu, o poderá fazer,
havendo primeiro licença dos Inquisidores.
4o. E por quanto a experiência tem mostrado, que muitas vezes os presos,
ou por ignorância ou por malíci4 querem alegar coisas impertinentes, que não
fazem a bem da justiça, e somente servem para embaragar, e dilatar seus
processos; o procurador não formará artigos em defesa do réu, de matérias, que
provadas o não relevem da culpa, nem lha diminuam, e com boas palavras lhe
dirá, que aqueles artigos lhe não são necessários, antes podem fazer algum
prejuízo em sua causa.
5o. No fim dos artigos de defesa, nomeará as testemunhas, que o réu tiver
paÍa provar, ao qual dirri que nomeie seis a cada artigo; e se não tiver tantas,
declarará, que põe essa razão as não nomeia; declarará outras, a qualidade delas,
se tem parentesco com o réu, e onde moram, com as mais circunstâncias, que
forem necessárias, para que se conheçam, e achem facilmente advertirá aos
réus, que, quanto mais qualificadas forem as testemuúas, tanto melhor prova
farão em sua causa; não lhe tomará pessoas de nação, salvo quando os artigos
forem de qualidade, que se não possam provar por outras. Nos artigos de
contraditas, não porá o Procurador as testemuúas porque a estes há o réu de
nomeÍìÍ diante dos Inquisidores.

R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (392) : 69j-883, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

6o. Quando formar aos presos de defesa cortada, porá em um artigo o


tempo, em que atestemunha diz, ejuntamente o ano, e mês em que vem a cair,
e em outro artigo cortará o mesmo tempo, com a informação, que o preso lhe
der; assim como se a testemunha disser, que em quinze de julho de seiscentos
e trinta em tal lugar cometeu o réu fulano de tal delito haverá ano e meio, dirá
o procurador no primeiro artigo, que provará, que a testemuúa di4 que em
quinze de julho cometeu o réu a culpa em tal lugar haverá ano e meio e feito
computado do dito tempo, vem a culpa a cair em quinze de janeiro de seiscentos
e vinte nove. No segundo artigo diú que provará, que em quinze de janeiro de
seiscentos e vinte e nove o réu em tal lugar, distante tantas léguas daquele, em
que a testemuúa lhe dá a culpa; pelo que, etc. E quando as testemuúas não
depuserem de dia certo, e usarem de alternativas de pouco mais, ou menos, terá
o procurador advertência, quando formar as cortadas, de tomar no segundo
artigo algum tempo, antes, e depois do em que as testemuúas derem a culp4
com que provavelmente se conclu4 que o réu a não tem cometido.
7o. Não levarão os procuradoÍes para fora do S. Oficio papel algum, que
toque aos presos, nem lembrança daqueles, em cujas causas advogam; e tudo
o que houverem de escrever, e requerer, farão em presença dos presos a que
tocaÍ, e assinarão sempre o que fizerem, e requererem; e posto que hão de ser
dois em cada Inquisigão, com tudo não terão entre si distribuição, antes assistirá
cada um só nos dias, e com os presos, que os Inquisidores ordenarem, e por
cada uma audiência, que gastarem, em assistir a seus requerimentos, lhe serão
contados dois tostões, os quais lhe serão pagos, ao tempo, em que se costumam
pagar as mais custas dos processos.

rÍruro x
Dos qualificadores

lo. Os Qualificadores, e Revedores do S. OÍicio serão pessoas eclesiásticas,


de letras, e virtude coúecida; terão todas as condições, e qualidades, que no
Título I $ 2o se declaram, e guardam inteiramente o que se dispõem nos $$ 6",
7o e 8o do mesmo título

2o. Sua principal obrigação é censurar, e qualificar proposições, rever os


livros, tratados, e papéis, que se houverem de imprimir, ou vierem de fora
impressos para o Reino, e rever outras as imagens, e pinturas de Cristo Seúor
nosso, de N. Senhora, e dos Santos, se são esculpidas e pintadas em forma
decente; mas para faznrem alguma destas coisas, precederá sempre despacho
do conselho, ou da mesa; e achando, ou tendo notícia, que em alguma das coisas
sobreditas se ofende a pureza de nossa santa Fé, ou bons costumes, logo o farão
saber ao S. Oficio, para nele se ordenar o que for mais conveniente.

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Regimento do Santo Ofuio 1640
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3o. Terão o catálogo dos livros proibidos, e quando o Conselho, ou a mesa


lhe ordenar, que qualifiquem alguma proposição, ou Íevejam algum livro, ou
papel, o farão com a brevidade possível, remetendo-o serrado com seu parecer
ao Conselho, ou mesa, conforme se lhe houver encaregado; nunca dirão à parte
interessada" que o tem em seu poder; e achando nos livros, ou papéis, que se
houverem de imprimir alguma proposição, ou coisa, em que se deva repâraÍ,
farão sua censura em papel separado do despacho, e com ele o enviaram ao
conselho; e não achando coisa, em que reparem, dirão ao pé do despacho, que
não há no livro cois4 que encontre nossa santa Fé, ou bons costumes, e não se
dilataram em louvor das pessoas, que os compuseram.
4o. No discurso do ano, visitaram algumas vezes as tendas dos liweiros,
dando primeiro conta na mesa, e achando nelas livros, tratados, ou papéis
proibidos, escandalosos, ou que teúam alguma coisa contra nossa santa Fé, ou
bons costumes, dirão aos liweiros, que os teúam separados dos mais, e não
dispoúam deles, sem ordemdo S. Ofïcio; e logo o farão saberaoslnquisidores,
declarando arazÃo, que a isso os move, para ordenarem o que mais convier ao
serviço de Deus nosso seúor.
5o. Tendo recado da mesa" que faleceu alguma pesso4 que tivesse livrari4
irão logo ver os livros, e do que acharem neles, lhe darão conta, para se ordenar
na materia o que for conveniente; e das livrarias, que visitarem, não tirarão livro
algum, ainda que seja proibido, para lhe ficar em seu poder, nem dos livreiros
o aceitarão, posto que voluntariamente lho ofereçam, nem lho comprarão por
menos preço, do que valer na terra, pelo muito, que convém proceder-se nesta
matéria com pureza; e somente dos Autores dos livros, que vierem para se
imprimir, poderão aceitar um liwo, e pedi-lo em caso que não lho oferegam.
rÍrwox
Dos comissários e escrivães de seu cargo
lo. Os Comissários do S. Oficio, além das qualidades, de que se faz no
Título I $ 2'deste livro, serão pessoas Eclesiásticas, de prudência" e virtude
conhecida, e achando-se letrados, serão preferidos aos mais guardarão inteira-
mente o que se dispõem nos $$ 6o,7o e 8o do mesmo título
20. Farão pessoalmente as diligências, que lhes forem cometidas, e nunca
€:Ê

t,- as poderão cometer a outro, e terão grande cuidado em lhe dar expedição, e de
as fazer na formq que lhe for encarregado, para que por sua culpa não se
retardem os negócios. Procurarão, que as testemuúas, que perguntarem, dêem
sempre razÃo de seu dito, principalmente quando aos artigos de contraditas
depuserem de alguma razío de inimizade; e neste caso lhe farão declarar se o
réu e a pessoa recusada, depois das diferenças, ou mzío de inimizade, de que
depuserem tornarão a tratar-se como amigos.

R IHGB, No de Janeiro, I 57 (j92) : 69j-883, jul./set. I 996.


Sônia Aparecida de Siqueira

30. PerguntaÍão as testemuúas em sua cÍÌsa, não sendo mulheres de


qualidade; porque estas irão perguntar a uma Igreja; e as pessoas, que por
doença, ou velhice não saírem fora, irão perguntar a suas casas; e neste caso
farão declarar no termo da assentada, aÍazío, que houve para assim as irem
perguntar. Quando algumas pessoas puserem dúvida em virem testemunhas a
sua casa, avisarão por carta aos lnquisidores, e seguirão ordem, que lhes for
dada.
4o. Nas diligências, que lhes forem cometidas sobre a limpeza de sangue
de alguma pessoa, depois de perguntadas as testemuúas, darão seu paÍecer,
declarando muito em particular anoticia,que tiverem da qualidade das pessoas
de que se trata, e afé, e credito, que se pode dar às testemuúas, escrevendo
tudo por sua mão, sem o comunicar ao Escrivão.
5o. Para escrever nas diligências, chamarão pessoa, que nas comissões lhe
for nomeada por Escrivão, e não indo nomead4 o Escrivão de seu cargo; e não
tendo Escrivão, nem o achando nomeado nas comissões, escolherão uma pessoa
Eclesiástica, e mais suficiente, que se achar; e em caso que se não ache com as
qualidades, que se requer, tomarão um familiar. Se as testemuúas nomeadas
nas comissões forem mortas, ou ausentes, mandarão passar disso certidão pelo
mesmo Escrivão no fim da diligência, declarando onde os ausentes residem,
para que os Inquisidores façam o que mais convier.
6o. Se nas terras em que viverem acontecer alguma coisa, que encontre a
pureza de nossa santa Fé, ou por alguma outra via pertença ao S. Ofi cio, avisarão
por carta sua aos Inquisidores, para que prover na matéria com o remédio, que
convém ao serviço de Deus; e havendo temor dos culpados se ausentarem, ou
sendo o negócio de muita importância, mandarão o aviso por um próprio, a que
os Inquisidores mandarão pagar seu camiúo.
7o. Falecendo nas terras, em que vivem, alguma pessoa que teúa livraria,
mandarão fazer o rol dos liwos, e papéis de mão que nela houver, e notificar
aos herdeiros do defunto, que não dispoúam deles, sem aviso seu, e avisarão
à mesa do S. Ofïcio, com toda a brevidade, enviando o rol dos livros e papeis,
e seguirão a ordem, que dela lhe for dada.
8o. Quando os Inquisidores lhe cometerem alguma prisão, trabalharão põe
fazer com cautela e segredo, seguindo em tudo a ordem que lhe derem; e depois
de feita a prisão, entregarão os mandados às pessoas que houverem de trazer
os presos para darem na mesa; e se a prisão não tiver efeito, pelos culpados
serem mortos ou ausentes, tornarão a enviar os mandados à mesa do S. Oficio,
declarando arazÃo que houve para se não executar; e quando do S. Oficio se
lhe escrever em matéria de segredo, responderão à margem da cafta da mesa.
9o. Das diligências que lhes forem cometidas pelos Inquisidores, não
procurarão das partes satisfação do seu trabalho, nem delas aceitarão coisa

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alguma ainda que voluntariamente lha ofereçam, porque do S. Oficio, se lhe há


de dar inteira satisfação.
10. Quando alguns penitenciados se apresentarem diante deles com carta
dos Inquisidores, em que lhes assinam o lugar onde hão de cumprir sua
penitencias, lhes ordenarão que as cumpram na forma que lhes for mandado e
sendo eles nisso descuidados os advertirão de sua obrigação em presença do
Escrivão de seu caÍgo, e não se emendando, darão conta à mesa por carta su4
e seguirão sobre este particular, a ordem que por ela lhe for dada.
11. Indo fora dos lugares em que residirem vão fazer alguma diligência do
S. Oficio, vencerão por cada dia seis tostões e no fim da diligência mandarão
ao escrivão, que passe certidão dos dias que nela se gastaram.
12. Os Escrivães dos comissiários terão as qualidades declaradas no Título
I $ 20 deste livro; escreverão letra muito legível, e podendo ser, serão Eclesiás-
ticos, e guardarão inteiramente o que se dispõem nos $$ 6o,7" e 8o do mesmo
título. Sendo chamados pelo Comissário para fazer algum negócio tocante ao
S. Ofïcio, concordarão com toda a brevidade, e nele escreverão com grande
fidelidade e inteireza,tudo o que os Comissários perguntarem às testemunhas,
e o que elas responderem; sem acrescentar nem diminuir coisa alguma, não
somente e na substância, mas nem ainda nas palavras, e depois de escrito o
testemunho, antes das testemunhas assinarem, lho lerão todo, declarando no
termo, como lhe foi lido.
13. No fim das diligências que se fizerem fora do lugar em que residem,
declararão os dias, que nelas se gastaram, e levarão quatrocentos réis por cada
um, e pelas que fizerem nos lugares em que morarem, levarão somente o que
pelo Contador lhe for contado; e não procurarão das partes outra satisfação,
nem delas aceitarão coisa alguma. E mandando o Comissário vir de fora
algumas testemunhas, declararão também o tempo que gastou a pessoa, que as
for chamar, e sendo as testemunhas pobres, o que andaram põe este respeito
fora de suas casas.
TÍTULO XII
Do visitador das naus dos estrangeiros
l'. O Visitador das naus de Estrangeiros terá as qualidades que se declaram
no $ 2o do Título I deste livro; seú pessoa Eclesiástica, e de grande confiança
e guardará tudo o que se dispõem nos $$ 6o, 7o e 8o do mesmo título; terá o
Catálogo dos livros proibidos, para saber por ele, se enhe os livros, que estão
no Reino, vem alguns que sejam contra nossa santa Fé e bons costumes.
2o. O Escrivão de seu cargo será Eclesiástico e terá as mesmas qualidades;
e achando se pessoa, que teúa notícia bastante das línguas estrangeiras, será
preferido aos mais, com tanto que tenha as mesmas qualidades: terá um livro

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Sônia Aparecida de Siqueira

numerado e rubricado por um dos inquisidores do disnito, no qual se lançaÍão


os teÍmos da visita, que assinaÍá com o Visitador, e mais pessoits, a que tocar.
Não se achando para o oficio do Escrivão pessoa que teúa notícia das línguas
se escolherá para Intérprete um estrangêiro, em que concoÍïam as qualidades
necesúrias para ser familiar do S. Ofïcio, ao qual mandaremos passar carta de
familiar, e servirá de Interprete juntamente; e de guarda da visita servirão os
familiares da terra, entre os quais o Visitador repartirá o trabalho igualmente.
3o. O Visitador, e mais oficiais da visita" acudirão sua obrigagão pessoal-
mente, e faltando algum deles, ou estando ausente ou impedido por tempo
considerável, o Visitador dará aos Inquisidores do distrito, para lhe nomearem
a pessoa, que deva servir em seu lugar, e nunca poderá escolher as tais pessoas,
ainda que seja de serventia; salvo em algum caso repentino, em que não haja
lugar para avisar ao S. OÍïcio, e neste caso elegerá familiar, podendo ser.
4o. Quando chegar ao porto algum navio, o Visitador fratarâ logo de o
visitar com toda a brevidade, sem dar tempo, a que dele possa sair pessoa
algum4 ou se possam tirar os livros e imagens, que vierem dentro dele; e por
quanto sua Majestade por carta sua nos tem avisado, que convém a boa
expedição das coisas do contuabando, que a visita que seu ministros hão de fazer
nos navios estrangeiros, se faça juntamente com a visita do S. Oficio; ordena-
mos que o Visitador tanto que o navio for entrado, assente com os ministros
Reais, o dia, a hora, em que uns e outros possam juntamente fazer sua visit4 e
dar à execução o que lhes eskí ordenando.
5o. Quando o Visitador for fazer a visita, levarâ consigo todos os oficiais
acima nomeados e irão juntos em um barco particular, que se fretará para esse
feito, no qual levaráumabandeiracom as armas do S. Oficio; etanto que chegar
ao navio, farájuntar os Capitães, Mestres, Pilotos e mais oficiais, e lhe proporá
a causa de sua ida, declarando-lhe como é para saber, que pessoas vem no tal
navio, e arazão de sua vinda" e ver os liwos, e imagens, que trazem, porque
sendo proibidos, ou indecentes, não podem usá-los, na forma, que abaixo se
declara; e achando no navio pessgÍrs, que não professam a Religião católica
Roman4 lhes advertirá, que não podem comunicar nas matérias da Fé com os
naturais do Reino, nem fazer ato público, algum por observância de suas seitas,
nem em desprezo de nossa Fé; e que sendo compreendidos em qualquer destas
coisas, se procederá contra eles, conforme aos capítulos das pazes serão
castigados com rigor.
6o. Ordenará ao Escrivão, intérprete, e familiar, que desçam as cobertas do
navio e vejam todas as caixas, que vem nele e lhe tragam os liwos que acharem,
os quais verá um por um, e achando que são defesos, ou prejudiciais ou em
língua que o intérprete não saiba, os recolherii e fani consigo, mandando fazer
termo pelo Escrivão no livro da visita, em que declare quais, quantos e cujos

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são, e dirá às pessoas cujos forem, aÍazáo, que há para se recolherem, e como
lhos hão de tornar ao tempo de sua partida; e assim o guardará inteiramente, e
a mesma ordem guardará a respeito das imagens, se achar algumas indecentes.

7o. E vindo os livros, ou imagens para mercadores, ou para alguma outra


pessoa, o Visitador ordenará ao escrivão, que lance no livro da visita a maÍca
dos caixotes em que vierem e os nomes das pessoas, a quem vem dirigidos, às
quais mandará notificar, que não disponham, nem usem dos tais livros, ou
imagens, sem ordem do S. Ofício; e naten4 em que reside a Inquisição serão
os livros e imagens levados à sala, para ai serem examinados por um Revedor
e onde a não houver, pedirá o rol dos livros, que mandará à mesa do S. Ofïcio,
com informação das imagens, e seguirá em tudo a ordem, que lhe for dada, e
mandará fazer termo no livro da visita" para que do sobredito conste a todo o
tempo.

8o. Informar se há Visitador, se no navio vem alguma pessoa Eclesiástica,


secular ou Regular, e por que causa, e não sendo coúecida, ou sendo de
suspeit4 lhe mandará que teúa à Inquisição a dar razão de si; e estando ela
distante, que se apresente ao ordinário, ao qual, ou ao S. Ofïcio avisará da causa,
que o moveu para ordenar a tal pessoa; que se fosse apresentar.

9o. De todas as pessoas, que vierem nos navios, para ficarem de assento,
ou por algum tempo neste Reino, tomará os nomes no livro da visita, e se
informará das terras, em que determinam fazer sua morada; e sendo povos
grandes ou Cidades, do bairro, em que hão morar, e disso mandará fazertermo
no livro da visit4 e avisará aos Inquisidores para que o teúam entendido, e
façam o que mais convier ao serviço de Deus.

10. Depois de feitas as diligências sobreditas, fará notificar aos Capitães,


Mestres, e Pilotos dos navios, que não saiam do porto em que estão, sem
primeiro lho fazerem a saber, para que se lhe entregue o que lhe foi tomado na
visita; e terâ particular cuidado, que quando os navios partirem não levem
pessoas, que por temor do S. Oficio se ausentem do Reino; e trabalhará por
saber, se delas levam algumas fazendas, e constando-lhe que assim é, por
informação tomada extrajudicialmente, ou pelos livros das carregações dos
navios, que paÍa este feito procuraráver, os fará embargar, em quanto dá conta
ao S. Ofício.

11. Não poderá o Visitador, nem os mais oficiais, pedir aos capitães,
Mestres, ou pessoas, que vierem nos navios, coisa alguma, ainda que seja com
título de esmola; nem deles aceitarão, posto que voluntariamente lhe ofereçam;
não comerão com eles nem lhe comprarão alguma coisa no auto da visita, e se
depois lha comprarem, será pelo preço ordinário da terra, e não por menos.

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Sônia Aparecida de Siqueira

12. As despesas, que se fizerem em cumprir o que fica ordenado, serão por
conta do S. Ofício, e para se lhe dar satisfação enviará o Visitador aos
Inquisidores do distrito, certidão delas, passada pelo escrivão da visita.
13. Nos portos de mar, onde houver convento de S. Domingos, ordenamos
que o Prior, dele seja Visitador das naus, e em sua ausência o leitor dos casos,
contanto que tenham as qualidades que acima se declaram; e porque, conforme
ao costume da Província, a eleição das tais pessoas é trienal, o Prior ou Leitor
novamente eleitos não poderão servir o dito cargo, sem primeiro nos dar cont4
e terem ordem nossa.

rÍruro xn
Do meirinho
lo. O Meiriúo do S. Oficio será homem de boa pessoa de suficiência e
capacidade; terá as condições e qualidades que no Título I, $ 2o deste livro se
declaram, e guardará inteiramente tudo o que se dispõem nos $$ 6o, 7o, 8o e 9o
do mesmo título.
2'. Assistiú na sala da Inquisição todos os dias, que não forem feriados
nas horas que os Inquisidores estiverem na mesa, salvo se eles lhe ordenarem
outra cois4 aos quais acompaúará à entrada e saída do Tribunal, e até sua casa,
quando para ela forem, ou dela vierem a pé; irá outros com eles ao Auto público
da Fé, e mais partes, a que forem em forma de Tribunal. Na Inquisição
acompanhará os Deputados até a porta da saleta, quando entrarem, e quando
saírem até a escada, e a nenhuma outra pessoa acompanhará pela cidade,
levando vara.
3o. Todas as vezes que os Inquisidores lhe ordenarem estar com os
Advogados, enquanto estiverem na Inquisição procurando pelos presos, e
advertirá se falam com eles em matéria, que não toque a sua defesa, e bem de
suas causas; e notando alguma cois4 que possa prejudicar ao S. Ofïcio, logo o
fará saber na mesa.
4o. Não consentirá, que na sala do S. Ofïcio haja inquietação alguma, antes
fará que as pessoas, que nela estiverem estejam com a composição devida, e as
advertirá, quando for necessário, da cortesi4 que devem fazer aos ministros
quando entrarem, ou saírem; ordenará aos seus homens, que havendo no pátio,
ou escadas da Inquisição, jogo, ou alguma inquietação, o avisem para acudir a
tudo, como é obrigado; porém sendo a coisa de qualidade, que ele a não possa
remediar, dará conta na mes4 onde se lhe ordenará o que deve fazer.
5o. Sempre trará consigo os três homens, que o S. Ofïcio lhe dá para o
acompaúarem, aos quais ordenará, que enquanto estiver aberto o Tribunal, se
não saiam do pátio da Inquisição, para que os Inquisidores os achem, quando

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Regimento do Santo O/ício 1640
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forem necessáÍios, e não os ocupará em seu serviço por quanto para o servir lhe
dá o S. Ofïcio o salário de outro.
6o. Quando estiver vago algum dos seus homens, apresentará aos Inquisi-
dores pessoacapuz de o servir, e sendo por eles aprovada, e tendo tomado
juramento na mesa, o admitirá, sem ser necessário para isso provisão nossa; e
se algum dos ditos homens cometer falta,ou culpa digna de castigo, o fará saber
na mesq para nela se dar o remédio, que for mais conveniente, mas não os
castigará só por sua autoridade.
7o. Não fará prisão, nem alguma outra diligência, sem primeiro ter manda-
do assinado pelos Inquisidores; e tanto que o tiver, fará a diligência assim, e de
maneira" que lhe for encanegada, a qual não poderá cometer a outrem; mas
havendo alguma razio, para ele a não faznr pessoalmente, dará conta na mesa,
e seguirá o que se lhe ordenar; e se nas prisões, e mais diligências lhe for
necessiário ajudar-se de algum familiar, ou de outras pessoas, o poderá fazer,
contanto que delas se possam confiar sem prejuízo do S. Ofïcio; e quando não
puder executar o negócio, que lhe for encarregado, com toda a brevidade avisará
aos Inquisidores dando arazáo por que não teve efeito.
8o. Prendendo em sua casa alguma pesso4 com seqüestro de bens, todas
as pessoas, que com ela morarem na mesma cÍNq ou aí estiverem ao tempo da
prisão se não forem coúecidas, e sem suspeita, fará logo recolher em paÍte
desviada daquela, em que o preso estiver, pondo com elas algum familiar, ou
pessoa, de que tenha igual confiança para que não possam falar com o preso,
nem dar-lhe algum aviso; e não consentirá que falem com ele seus parentes, ou
criados, nem alguma outra pessoa; e sendo os presos mais de um, terá grande
resguardo, em que não se comuniquem entre si, mas far-lhe-á bom tratamento,
e não consentirá que se faça agravo na prisão, nem pelos caminhos, e estalagens,
especialmente às mulheres, as quais tratará com grande honestidade e decência.
9o. Tanto que executar a prisão, mandará recado ao Juiz do Fisco para que
vâfazer inventario dos bens do preso, e por sua fazendaem segurança; e não
I
havendo aí Juiz do fisco, avisará ao Corregedor, ou Juiz de fora, e em falta deles,
I
ao Juizda terra, e entretanto tomará as chaves da casa" e, vindo qualquer deles,
; lhe pediní cama para o preso e roupa paÍa seu uso e o dinheiro que no mandado
se ordenar para seus alimentos, e tudo isto virá em companhia do preso.
10. Chegando ao S. Ofício, faúr entrega do preso ao Alcaide, e ao Notário,
que assistir a ela, pedirri que lhe cÍuïegue o fato, e a roupa do preso, e ferros,
se os trouxer, e o diúeiro entregará ao Tesoureiro, e de ambos cobraú
conhecimentos em forma, um deles feito pelo Noüirio, que assistir à entrega, e
outro pelo escrivão do Tesoureiro, os quais fará juntar ao inventiârio do preso,
para que conste, que entregou no S. Oficio o que lhe deram. E quando não
touxer o que no mandado se ordena, trará certidão do inventrário, passada com

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autoridade do Juiz" em que declare arazÃo por que não cumpriu em parte, ou
em todo, o mandado dos Inquisidores. E tardando o Juiz" ou sendo necessiírio
por algum outro respeito, não esperar por ele, podeú encarregar a casa, chaves
e bens do preso a algum familiar do S. OÍicio, e não achando, a outra pessoa
de igual confi*ga assistindo porém com eles alguma pessoa mais da obrigação
do preso, para maior segurança de seus bens.
11. Depois de entregar o preso ao Alcaide, como acima fica dito, irá dar
conta a mesa de fudo o que na prisão lhe sucedeu, e entregará os mandados de
prisão ainda que não tivessem efeito, e quando a prisão se mandar fazer sem
seqüestro de bens, o Meiriúo dirá ao preso que os deixe encarregados à pessoa
que melhor lhe parecer; salvo os Inquisidores lhe ordenarem outra coisa.
12. Quando os Inquisidores lhe mandarem que leve alguma pessoa presa
à cadeia da cidade, onde reside o S. OÍicio, cobrará do carcereiro certidão da
entrega do preso, e a dará na mesa, para que conste aos inquisidores, como está
executando seu mandado.
13. No Auto da Fé assistirá junto ao Altar das abjurações, e ordenará pelo
rol, que se lhe der que os presos estejam prestes de maneira, que não haja dilação
em chegarem ao lugar, onde hão de ouvir suas sentenças, e ai os fará pôr, e estar
em forma, e com a compostura, que convém, e tirará os hábitos àqueles, a quem
sua sentença mandar, que no Auto se lhe tirem, os quais lhe ficarão; e dos
presos, que forem relaxados, fará entrega às justiças seculares.

TÍruLo xIV
Do alcaide do cárcere secreto
lo. O Alcaide dos cárceres secretos será casado, homem de tanta confiança
e virtude como convém que sej4 pelo contínuo trato que tem com os presos;
será de tal idade, e disposição, que possa bem acudir às obrigações de seu oficio,
e, além disto, terá todas as qualidades, que se dispõem no Título I, $ 2o deste
livro, e guardaná inteiramente o que se ordena nos $$ 6o, 7o, 8o e 9o do mesmo
título.
2o. Assistiú de ordinário no cárcere, e principalmente nas horas do despa-
cho; e se achará sempre presente ao tempo, que o médico, cirurgião ou barbeiro
visitarem os doentes, ou outra pessoa de fora viet fazet nele alguma coisa
necessária; e tanto que lhe tocarem as campaiúas acudirá com diligência a
saber o que lhe querem.
3o. Terá no ciárcere um livro, em que lançará todos os presos, que nele
entrarem, declarando o dia, mês e ano da entrad4 e no mesmo livro lhe será
carregado por termo de um Noüírio que ele assinanár, o fato, roupa, e ferros, que
os presos trouxerem; terá um caderno, no qual com a distinção e clarcza
necessiíria estarão lançadas as casas dos cárceres, e as pessoas, que em cada

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Regimerúo do Santo OJïcio 1640
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uma delas estiverem; e quando os Inquisidores as mandarem mudaÍ de uma


casa para outr4 as irá riscando do lugar, onde estavam e passando-as ao outro
paÍa onde foram mudadas, declarando o dia, mês e ano, em que os Inquisidores
disporem o ciírcere lhes advertirá o que parecer necessário para se atalhar a
comunicação entre os presos.
4o. Terá a chave da porta do pátio da Inquisição, para recolher os presos a
quaisquer horas que vierem para os cárceres, e, não vivendo dentro do pátio o
porteiro, mandará todos os dias à noite fechar a porta por um guarda na hora
que o homem do meiriúo, que nele assistir, fizer sinal que será às nove no
verão, e às oito no inverno, e, pela manhã" a mandará abrir, quando for dia claro;
porém, se no pátio viver o porteiro, ficará esta obrigagão por sua conta" como
se dirá em seu título.
5o. Não confiará as chaves do ciârcere de pessoa algum4 e quando tiver tal
impedimento, que não possa pessoalmente acudir à obrigação de seu oficio,
dará conta aos Inquisidores, para eles ordenarem a quem as deve entregar, e as
portâs da casa, por onde se serve para o cárcere, terá sempre fachadas, e as
chaves delas traráconsigo, paÍaque a gente de suacasanão possavernem ouvir
o que no cárcere sefaz; e assim mesmo terá sempre fechadas as portas e grades
das casas dos ciírceres, em que estiverem os presos; e quando for necessiírio,
que se abram para as coisas ordinárias, será em pÍesença de um dos guardas;
salvo se for em algum caso repentino, em que seja precisamente necessário
acudir com toda a brevidade; e se for conveniente por razão da saúde do cárcere,
que as portas de alguns dos corredores estejam de dia aberüas por algum tempo,
dará conta na mesa, e fará o que nela se ordenar.
6o. Não receberá pessoa alguma que veúa presa para o cátcere, sem estar
presente um dos Notrírios; salvo se o preso chegar de noite, e atal hora" que
não possa o Notrário ser chamado; porque neste caso, tomará entrega dele, e o
porá em uma das casas do cárcere, mas logo na manhã do dia seguinte fará
chamar a um Notário (que não será o Tesoureiro) parafazer o auto da enfreg4
e lhe carregar o fato, e a roup4 que o preso trouxer para seu uso.
7o. Antes que o preso entre nos cárceres, o fará buscar em presença do
Notirio por dois guardas, sendo homem, e sendo mulher fara esta diligência a
mulher do Alcaide na casa por onde se serve para os cárceres, e todo o diúeiro,
pessoas de ouro, e ptatq armas, livros, ou papéis, que lhe forem achados, ou
qualquer outra coisa" que não seja de seu uso, se lhe tomará, e entregará ao
Notario para que faça o que em seu título está ordenado.
8o. Tanto que o Alcaide tomar entrega de algum preso, irá saber dos
Inqúsidores, em que carcere o há de por, e daquele, que lhe for assinado o não
mudaní sem expressa ordem sua; e sucedendo alguma coisa, que obrigue a se
mudarem os presos de umas casas para outras, dará conta na mesa, e fará o que

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Sônia Aparecida de Siqueira

nela lhe ordenarem. A todos os presos tratará com muita caridade, sem respeito
algum particular, procurando, que o necessário lhe não falte, e se lhes dê nos
tempos, e horas, que convém.
9o. No princípio de cada mês saberá deles o que querem paÍa seu manti-
mento, e se acomodaút ao que eles lhe pedirem, com tanto que não exceda a
ordinária, que lhe está assinada, nem seja em coisas, que mais pareçam pedidas
por apetite, que para mantimento; e tudo irá assentado em livro, do que tirará
uma cópia por maior, das coisas, que os presos tiverem pedido, que entreganá
ao despenseiro a tempo, que ele as possa comprar; e quando o despenseiro as
trouxer, verá se são boas, e compradas conforme ao preço ordinário datena;
porque, não sendo assim, lhas podeú enjeitar; e parecendo- lhe que é necessário
haver nisto alteração, dará conta na mesq declarando a razão, que para isso tem,
efarâo que nela se ordenar.
10. No fim do mês fará folha da despesa dos presos, declarando, nela, o
que cada um gastou em ordinrá.ria" extraordinári4 doenças e sangrias, se as tiver;
e juntas as receitas da botica, e entregará ao Tesoureiro, o mais tardar, até o
segundo dia do mês seguinte, para que, constando lhe do que se gastou no mês
atriís, possa fazer conta com o despenseiro; e das sangrias, que se fizerem no
cárcere, passaráescrito aoBarbeiro parahaverpagamento delas do despenseiro.
I 1. Dará mais aos presos tudo aquilo, em que forem providos da visita"
tanto que o receber do Tesoureiro, mas fora disso lhe não dará coisa alguma
ainda que seja própria dele Alcaide, ou os mesmos presos lhe dêem dinheiro
para se comprar. Em cada semana lhe fará dar roupa lavada, e ao menos não
passará de quinze dias, e a roupa, que houver de ir a lavar, mandará entregar
pelos guardas à lavanderia" a qual será pessoa coúecida e quando a touxer,
depois de feita conta do que nela se monta, lhe passará escrito ao despenseiro
para lho pagar e lançará esta despesa no rol das miudezas.
12. Quando algum preso adoecer não havendo perigo na tardança, o farâ
saber aos Inquisidores, para que ordenem que o médico o visite e lhe mandem
dar e fazer tudo o que for necessiário para bem de sua saúde, e, no discurso da
doença, terá particular cuidado, que os remédios que os médicos mandarem se
lhe apliquem, com toda a pontualidade nos tempos e horas que lhes forem
assinadas entendendo, que se nesta matéria cometer alguma falta lhe será muito
estraúada.
13 . Assentará com o médico a hora, em que há de visitar os doentes, e será
aquel4 em que o possa acompaúar, sem fazer falta quando os Inquisidores o
chamarem à mesa; e a mesma ordem guardará com o cirurgião, barbeiro e mais
pessoas que forem chamadas para os doentes, porque convém muito que ele
esteja presente, quando as pessoas estiverem com os presos; não consentiriá"
que falem com eles mais, que nas matérias paÍa que são chamados, nem que

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vejam, ou falem com outros presos; e algum dos oficiais, ou pessoas sobreditas
cometer falta, ou descuido em sua obrigação, logo o fará saber na mesa, para
nela advertirem de tudo o que for conveniente a seu oficio. Terá um livro, em
que assente as visitas, que o médico, e cirurgião fazemaos presos, e depois de
celebrado o Auto da Fé, tirará dele uma lembrança das visitas, que tiverem feito
às pessoas, que saíram sem confiscação de bens, a qual entregará ao Tesoureiro
para lhe fazer o pagamento.
14. Quando o médico julgar que a doença é perigos4 e que se deve dar
confessor ao doente, sendo em dia feriado, hâ dar conta ao Inquisidor mais
antigo em sua casa, e em seu defeito, ao segundo, para saber o confessor, que
há de chamar; mas havendo perigo natardança, chamará uma das pessoas, que
os Inquisidores para esse efeito lhe tiverem ordenado; e no tempo da quaresma
lembrará na mesa, que veja se há alguns presos, a quem se haja de dar confessor,
seguirá a ordem, que se lhe der.
15. Falecendo no cárcere algum preso, ou achando o Alcaide, que volun-
tariamente se matou, logo o fará saber na mesa; e sendo em dia feriado, ou fora
das horas do despacho ao Inquisidor mais antigo, e em falta dele a algum dos
outros; para que mande fazer a diligência, que convém nesta matéria; e o preso,
que morrer seráenterradono lugarordinário, com distinção, e sinalnasepultura"
para que a todo o tempo se possa saber onde esüÍo os ossos.
16. O Alcaide vigiará o cárcere por si, e pelos guardas, de maneira que não
possa nele haver coisa, de que não tenha notícia; e terá particular advertência
em ver se os presos comem as coisas que lhes dão, e quais deixam de comer, e
os guardas lhe disserem, dará conta na mesa com toda a brevidade.
17. Ordenará que haja sempre muita quietação no cárcere, e que os presos
não teúam brigas, ou diferenças entre si; nem joguem jogo algum, nem usem
de nomes diferentes dos que tiverem, nem tenham liwos, nem se comuniquem
de um cárcere para outro, batendo, falando ou escrevendo, e que falem em
manso naquele, em que estiverem; terá grande cuidado, que no comer da
cozinha não vá algum aviso, com que os presos possam ter notícia uns dos
outros; e se algum deles exceder em alguma destas coisas, o fará saber na mesa
paÍa que se lhe dê o remédio, e castigo, que convém; mas ele os não poderá
castigaÍ, nem lançar-lhes fenos por autoridade própria.
18. Acompaúará os presos quando vierem à mesa, e delas tornarem para
o cárcere, trazendo sempre um dos guardas, e não consentirá que vão falando
pelos corredores nem falará com eles, nem os persuadirá, que confessem suas
culpas, e quando acerca delas lhe quiserem comunicar alguma cois4 lhes diú
que daquela matéria só na mesa do S. Oficio hão de tratar; salvo se o preso for
menor, e ele seu curador, porque neste caso, diante do guarda, lhe poderá
advertir o que entender, que convém a sua alma, e a bem de seu despacho.

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Sônia Aparecida de Siqueira

19. Não comerá nem beberá com os presos, nem com eles terá comunicação
particular nem lhes falará estando só, nem ocupará aos que forem oficiais, em
obra sua, ainda que lha haja de pegar inteiramente. Aos letrados, não comuni-
cará negócio algum, nem de algum preso aceitará dádiva alguma" ainda que
seja de pouca importância, nem de amigos, ou parentes seus, ou de pessoas, que
por eles Íequererem, nem com elas terá trato, comunicação, ou amizade, nem
irá a sua casa.
20. O Alcaide não culpará os guardas em coisa alguma, que não tocar a seu
oficio, e os fará cumprir com sua obrigação pontualmente, e que acudam com
cuidado às necessidades, e provimento dos presos, tratando-os bem; não
consentirá que façam alguma das coisas, que no parágrafo precedente havemos
proibido ao mesmo Alcaide, e alcançando, ou presumindo, que cometerão nelas
culpa, o fará saber aos Inquisidores, com toda a brevidade, para que eles atempo
lhe acudam com o remédio, que convém.
21. Ordenará, que dos quaho guardas, dois fiquem de noite nos cárceres,
repartidos de maneira que possam ter notícia de tudo o que neles se fizer; e,
paÍa esse efeito, tená iluminado os cárceres nos lugares que lhe parecer, e a
despesa, que se fizer no azeite,lançafir no rol das miudezas e não consentirá,
que, em nenhum tempo, saiam do cárcere, sem causa muito justa; e quando
forem a comer, chamar o médico, cirurgião, ou barbeiro buscar as mesinhas à
botica, ou fazer alguma coisa necessária" lhes advertiná" que tornem com toda
a brevidade; e ordenará o serviço do cárcere de modo que sempre nele estejam
ao menos dois guardas.
22. Quando os presos saírem do ciircere paÍa o Auto da Fé,terí cuidado
de que vão compostos em seu traje, e as mulheres com toucado honesto, e não
lhes consentirão que levem toucas por cima dos hábitos penitenciais, com que
os possam encobrir, nos lenços sobre os rostos, a fim de não serem conhecidas;
e alguns dias antes, lembrará na mesa os presos, que tiverem necessidade de
vestido, para que possam ser providos, e saiam a público com decência.
23. Depois do Auto da Fé, mandarájuntar, e levar todo o fato, a roupa, que
ficou no cárcere,e tendo-ojunto, o fará saber na mesa, para que os Inquisidores
lho mandem carregar por um Noüírio no livro, que esüí ordenando, e ambos
assinarão o termo; e quando os Inquisidores depois dispuserem do dito fato, ou
de parte dele, pedirá a um Noüírio, que no mesmo livro lhe lance a descarg4
para que sempre conste que se despendeu, e com que ordem.
24. O Alcaide além de seu ordenado haverá dois tostões de carceragem de
cada preso; e quando algum for mudado de uma Inquisição para outra, em
ambas pagarãcarceragem por inteiro, o qual se pagará sempÍe ao Alcaide, que
servir no tempo da soltura dos presos, ainda que fosse outro quando entraram;
porém a carceragem dos defuntos se pagará ao Alcaide, que servia no tempo

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d
Ë
Regimento do Santo Ofcio 1640
-
I

em que eles falarem; e todas as carceragens se pagarão, quando se pagaÍem as


custas dos processos.

rÍrulo xv
Dos guardas

1o. Os guardas do cárcere secreto, além de terem as qualidades, que no


Título I, $ 2o deste livro se declaram; serão homens robustos, que bem possam
aturar o trabalho do Ofïcio; e de tanta confiança, e fidelidade, como convém,
que haja em quem há de tratar com os presos tão familiarmente, e não serão
admitidos, se forem da obrigação do Alcaide, ou tiverem algum trato vil;
guardarão inteiramente tudo que se dispõem nos $$ 6o,7o,8o e 9o do mesmo
título.
2". Teráo sempre os corredores do ciârcere muito limpos, e livres de
mau-cheiro, e imundices, para que se não prejudique à saúde dos presos; e todas
as semanas, ou ao menos cada quinze dias, com ordem do Alcaide, darão roupa
lavadaaos presos, a qual entregarão à lavanderia por rol, e por ele a receberão,
com tal cautel4 que nela náo vâ, nem venha algum aviso, nem a lavanderia
saiba, de que pessoas é; e terão particular cuidado, em que a roupa se não perca,
ou troque; e quando a lavanderia perder alguma peça, tirarão do diúeiro, que
na lavagem se montar, quanto baste para se comprar outra igual, que darão ao
preso em seu lugar.
3o. A todos os presos tratarão sempre com muita caridade, e sem respeito
algum particular, dando-lhe tudo o que a mesa mandar por ordem do Alcaide,
a tempo conveniente; mas fora disso não darão coisa algum4 ainda que seja
própria deles guardas, ou os presos lhe dêem dinheiro para ela. Não farão
agravo, ou moléstia aos presos, nem lhes darão ocasião, de que eles justamente
possam ter escândalo, ou queix4 e com toda a diligência, e cuidado lhe acudirão
ti a suas necessidades, e provimento, na forma que o Alcaide lhe mandar, e sem
sua licença não sairão do cárcere; mas, todas as vezes que o Alcaide lhes
ordenar, irão chamar o médico, cirurgião e o barbeiro, e buscar as mesiúas à
botic4 e fazer a outra diligênci4 que for conveniente para o cárcere, e presos;
no que se haverão de maneira que ao menos dois deles assistam sempre no
ciírcere; e quando saírem for4 terão cuidado de tornar com toda a brevidade; e
dois deles dormirão no cárcere, nos lugares, que o Alcaide lhes assinar.
40. Vigiarão o cárcere com tal cuidado, que possam bem notar todas as
coisas, que os presos ftzerem, e disserem; advertirão se estão quietos, ou têm
diferenças, e brigas entre si, ou jogam, ou lêem alguns livros, ou se usam de
nomes diferentes, ou se comunicam de um para outro ciírcere, batendo, falando
ou escrevendo; e se falam baixo naquele onde estão; e se nas coisas, que vêm
de fora, ou de comer, que das cozinhas se manda, vaio ou vem algum aviso, e

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Sônia Aparecida de Siqueira

se comem as rações ordiniárias, que lhes dão, ou se as deixam de comer, e em


que dias, e se abastem de comeralguns comeres, e de fudo o quenotarem, darão
conta ao Alcaide.
5o. Quando algum preso entrarno cárcere, sendo homem dois guardas, que
o Alcaide nomear, em presença de um Notrário, verão o que traz em sua pessoq
com tal advertência, que nunca o preso possa levar consigo para o cárcere,
armas, livros, papéis, dinheiro, peças de ouro ou prata" nem outra alguma coisa,
que não pertença a seu uso necessário.
6o. Todas as vezes que o Alcaide levar ou trouxer preso paÍa a mesa, iriá" e
virá sempre diante de um dos guardas; dar de uma casa para ouüa, e quando
forem as audiências, o guarda lhe chegará o banco para se assentarem, e quando
os Inquisidores mandarem dar tormento, ou algum outro castigo aos presos, os
guardas farão a execução.
.
7o. Não vivendo o portdiro no pátio da Inquisição, um dos guardas, qual o
Alcaide ordenar, terâ a seu cargo fechar a porta do pátio à noite, quando o
homem do Meiriúo fizer sinal na porta, que será de verão às nove, e às oito,
no inverno; e abrirâ a porta em sendo dia claro; e tanto que abrir, ou fechar,
entregará a chave ao Alcaide, e nunca em outro tempo aterâemseu poder, nem
algum deles aceitará as chaves dos ciírceres damão do Alcaide, em caso algum,
para os abrirem, ou fecharem; salvo se os Inquisidores lho mandarem expÍes-
samente, ou for a necessidade repentina, de maneira, que não possa haver outro
remédio.
8o. Os guardas não comerão, nem beberão com os presos, nem com eles
terão comunicação particular, nem falarão só, quando lhe levarem de comer,
sempre um andar; à vista do outro; não ocuparão os presos, que são oficiais,
em obra sua, ainda que hajam de pagar inteiramente seu trabalho, nem deles se
aproveitarão para algum serviço seu, nem aceitarão coisa, que lhe dêem, posto
que seja de pouca importânci4 nem de amigos, ou parentes seus, ou de pessoas,
que porelesrequererem em suas causas, nemterão com eleshato, comunicação,
ou amizade; nem irão a sua casa, nem trarão aos presos, nem deles levarão
recados a pessoa alguma" ainda que pareçaamateriamuitojusta, nem lhes darão
notícia, ou nova de coisa algum4 sob pena de serem castigados com grande
rigor, e se notarem, ou advertirem, que o Alcaide faz cois4 que possa prejudicar
ao segredo, e resguardo do S. Oficio, o farão saber em mesa, ou a um dos
Inquisidores, para que na maneira se dê o remédio, que convém.
rÍrwo xvr
Do porteiro
1o. O Porteiro da mesa do despacho terá as qualidades, de que se faz menção
no Título I, $ 2o deste liwo; será homem bem entendido, e diligente, e guardanâ

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Regimento do Santo OÍício 1640
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inteiramente tudo o que se dispõem nos $$ 6o, 7o, 8o e 9o do mesmo título; terá
as chaves da sala da Inquisição, e da casa do despacho, Oratório, e audiências;
e se viver dentro do pátio, terá também a chave dele, e cuidado de lhe fechar as
portas às nove horas da noite no verão, e às oito no inverno, e de as abrir, quando
for dia.
2o. Nos dias, que não forem feriados, virá pela manhã ao S. Oficio uma
hora antes de entrar em despacho, e à tarde meia-hora; para que possa mandar
vaÍreÍ as casas, limpar e prepaÍÍÌr as mesas, e provê-las de todo o necessário,
principalmente de boa tinta e penas; e para que não aconteça haver falta nestas
coisas, as pedirá sempre com tempo ao tesoureiro.
3o. Ajudará à missa, que se há de dizer no Oratório da Inquisição os dias,
que forem de despacho, e terâ um caderno, em que apontará os dias, em que
faltar o Notário, que a há de dizer, o qual apresentará na mesa, no fim de cada
quaúel; porém se as faltas forem muitas, antes disso darão conta aos Inquisi-
dores, para que provejam, como lhe parecer, terá grande cuidado do concerto,
e limpeza do Oratório.
4o. Não consentirá, que na casa do despacho entre pessoa alguma, que não
for ministro, ou oficial do S. Oficio, ainda que seja antes de se entrar no
Tribunal, ou depois de sair. E tanto que os Inquisidores entrarem em despacho,
para que possa facilmente acudir quando eles lhe tocarem a campaiúa, assistirá
na saleta, que fica entre a sala e a casa do despacho, e com toda a diligência
acudirá, e farâ o que os Inquisidores lhe mandarem; e depois de começada a
audiência" não consentirá, que entre pessoa de fora na saleta, nem que algum
outro oficial esteja nela devagar, advertindo-o, que saia para a sala; e se ele
insistir em querer estar aí, o fatí saber na mesa, para que os Inquisidores
ordenem, o que deve fazer acerca disso.
5o. Depois que os Inquisidores estiverem na mesq e mandarem fechar a
porta da casa do despacho, o porteiro não poderá abrir, salvo quando for
chamado; porém se for necessário dar algum recado, ou o Alcaide trouxer preso
para ela" fará sinal na porta, e não entrará sem primeiro se tocar a campaiúa;
e se na mesa estiver algum preso, fechará a porta por dentro, para que nunca
diante dele esteja aberta; e assim mesmo, quando o Alcaide houver de Írazer
preso para a mesa, ou levá-lo dela para o cárcere, terá muito cuidado de ter
fechada a porta, que vai da saleta para sala.
60. A todas as pessoas, que vierem requerer ao S. Oficio, tratará com muita
cortesia, e nunca lhes dará ocasião de escândalo, ou queixa; e se alguma delas
quiser falar na mesa, ou vier chamada à Inquisição, logo dará recado aos
Inquisidores; e se a não coúecer, por bom modo se informará dela, de sua
qualidade, e do que lhe responder dará conta na mesa, paÍa que se lhe dê o
assento que há de ter, conforme o Regimento; porém antes de entrar, com

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Sônia Aparecida de Siqueira

cortesia lhe pedirá" que deixe as aÍmas, e aiÍáLacompanhando, para lhe chegar
o assento, e ao sair lhas tornará a entregar; e se duvidar de as tirar, de nenhum
modo consentirá, que entre dentro com elas, antes o fani saber aos Inquisidores,
seguirá o que lhe ordenarem.
7o. As petições, e mais papéis que se lhe derem, apresentará na mesa com
toda a brevidade; e se neles se der algum despacho, que se haja de tornaÍ as
partes, não levará por isso coisa algum4 ainda que voluntariamente lhe ofere-
gam; e quando na mesa ficarem alguns papéis de uma audiência para outra,
estarão com todo o resguardo, e não os lerri nem consentirá que outra pessoa
os veja.
8o. Tanto que se acabarem as horas do despacho, o farâ saber na mesa, e
depois de saírem os minisfros, fechará as portas; porém quando na casa do
despacho ficar algum Inquisidor, ou Deputado continuando com negócio,
esperará até que sai4 ainda que a hora seja dada. Quando estiver impedido de
maneira" que não possa acudir a sua obrigação, o fará saber aos Inquisidores,
paÍa que lhe ordenem, a quem deve entregar as chaves, as quais não fiará de
pessoa alguma" sem expressa ordem sua.
9o. Nas coisas dos defuntos, e ausentes, que ocoÍïem a revelia, apregoatâ
as partes, quando lhe for mandado, e haveú pelos pregões, o que o Promotor
no processo lhe contar. E quando os Inquisidores lhe mandarem, que chame
algum ministro do secreto, ouque dele peçaalgum papel, ou leve algumrecado,
não entrará da porta para dentro, e dela dirá ao que vai, e ali tomará a respost4
que lhe derem.
10. Terá a seu cargo todos os móveis pertencentes às casas do despacho,
audiências, e oratório, os quais lhe serão carregados em receita por um Notiírio,
no livro, que estiá ordenado; e para melhor lembranga das coisas, de que se lhe
tem feito c?{rgç terá em seu poder o taslado do inventrârio delas; e quando
alguma se gastar, procurará que amargem dareceita o declare um dosNoüários,
para que por este modo fique descarregado.
11. Terá cuidado dos livros defesos, que vierem ao S. Oficio, os quais
estarão em seu poder na Inquisição, no lugar, que os Inquisidores ordenarem,
e lhe serão carregados em outro livro por um dos Solicitadores, que os
Inquisidores nomearem; e quando os Inquisidores dispuserem deles, pedirá ao
escrivão, que lhe fez a carg4 que à margem da receita o declare para sua
descarga.
12. Além de seu ordenado, terá em cada ano treze mil réis, a saber, quatro
para o moço, que há de varrer as casas, três pelo pano da mes4 que lhe havia
de ficartodos os anos; porem estes não terá no ano, que o pano se fizer de novo,
mas levará o pano velho; dois para leúa para o fogo da casa do despacho, que

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Regimento do Santo Ofcio I 640
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fará nos dias, que os Inquisidores ordenaÍem, e quatro para vinho, hóstias, e
lavagem da roupa do oratório: e terá outrossim os hábitos dos penitenciados,
que na mesa lhes mandarem tirar.

rÍrwo xvn
Dos solicitadores
1o. Os Solicitadores do S. Ofïcio, além das qualidades, de que se faz
menção no Título I, $ 2o deste liwo, serão pessoas diligentes, e que teúam
notícia de negócios; e guardarão inteiramente o que se dispõem nos $$ C,7o,
8o e 9o do mesmo títuIo.

2o. Procurarão ter coúecimento dos moradores do lugar em residem, para


poderem requerer, e chamar com brevidade as pessoas, que os Inquisidores lhe
ordenarem; e se as pessoas, que forem chamadas souberem, que tem algum
defeito, na qualidade, ou no crédito, logo o farão saber na mesa, para que os
Inquisidores vejam como se hão de haver com elas; e em quanto os presos
estiverem com seus procuradores, lhe assistirão todas as vezes que os Inquisi-
dores, lho mandarem, e advertirão se falam em matérias, que não façam abem
de suas causas, e notando alguma coisa, que possa prejudicar ao S. Oficio, o
farão logo saber na mesa.
3o. Acompanharão os Inquisidores, e Deputados na forma, que se ordena
ao Meirinho, no TítuloXIII, $ 2o deste livro, e assistirão na sala todos os dias,
que não forem feriados, enquanto os Inquisidores estiverem em mesa; e quando
lhes for mandado, que fagam algum negócio, ou diligência, que tocar ao S.
Ofïcio, o farão com toda a brevidade, mas procurarão, que seja em horas, que
não façam falta na sala; salvo os Inquisidores lhes ordenarem outra coisa, para
que deste modo acudam melhor a sua obrigação; e não estando o Meiriúo na
sala" o solicitador mais antigo fará em seu lugar o que dispõem no dito Título
)ilII, $ 4'.
4o. Quando tiverem notícia que algumas pessoas de nação se querem
ausentaÍ para fora deste Reino, ou lhes constar, que os penitenciados não
cumprem suas penitências, darão logoconta disso na mesq e de tudo o mais,
que lhe parecer, que convém saber-se no S. Ofïcio.
5o. Das citações, que fizerem, passarão certidões, a que se dará inteiro
crédito, e por elas, e pelas mais diligências, que lhes forem encarregadas,
levarão o que lhes for contado, e não pedirão as partes coisa algumq nem a
: aceitarão, posto que livremente lha dêem.
6o. Um dos Solicitadores, qual os Inquisidores ordenarem, servirá de
i Escrivão da receita dos livros defesos, que vierem ao S. Oficio, e os carregará
ao Porteiro no livro, que está ordenado, o qual os terá fechado na parte, que a
mesa lhe assinar; e quando os livros se tornarem a seus donos ou por ordem dos

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)
I
Sônia Aparecida de Siqueira

Inquisidoresse depuser deles, fará declaração disso à margem da receit4 para


descarga do Porteiro.

rÍruro xvm
Do dispenseiro
lo. O despenseiro será pessoa inteligente, e de boa condição, e terá o mais,
que se requer nos oÍiciais do S. Ofício, e guardará inteiramente o que se dispõem
nos $$ 6o,7o,8o e 9o do Título I, deste livro. Assistirá de ordinrário na casa da
despensa; e, indo fora dela, deixará dito a um dos guardas onde o poderão achar
quando for necessário.
2o . T erâ na despensa tudo o que for necessário para provimento dos presos,
e procurará que seja o melhor, que houver, e o dará, pelo preço ordinrário da
terra; e para que em tudo guarde fidelidade, que convém, será obrigado a ter na
despensa, pesos e medidas afiadas, e trazertodos os sábados escritos dos preços
da carne, e cada mês a estiba do peso do pão; não dará para o cárcere mais que
as coisas que o Alcaide lhe der em rol, ainda que os guardas lhas peçam; porém
as que o Alcaide lhe mandar trazer, entregará com toda a brevidade; do que
tivernadespensa, nãovenderácoisa alguma, parafora, nem aindaaos ministros,
e oficiais do S. Ofício: não consentiú, que nela entrem mais que as pessoas,
que trouxerem o necessário para os cárceres.
3o. Pagará todos os meses ao barbeiro, eà lavadeira, quando trouxer a roupa
lavad4 tudo o que constaÍ, que se lhe deve pelo rol, que o Alcaide lhe der;
comprará tudo o que o Tesoureiro lhe disser, que é necessrário para o S. Ofïcio,
e todos os meses fará conta eom ele pela folha da despesa dos presos, que o
Alcaide há de fazeq e pelos conhecimentos, que lhe houver dado, e o que ficar
devendo, paguâ logo com efeito.
4o. Tudo o que comprar, pagará com pontualidade; e na compra das coisas
se haverá de maneira, que não possa haver dele queixa alguma; e quando houver
carestia na terra, e for necessário tomar algumas coisas por justiça" dará conta
na mesa, para que nela se ordene o meio que mais suave parecer.

TITULO xIX
Dos homens do meirinho

lo. Os homens do Meiriúo serão mancebos bem dispostos, e tais, que com
diligencias possÍrm acudir à obrigação de seu oficio, e ao diante servir de
guardas, e serão admitidos na forma, que fica dito no TítuloXIII, $ 20 deste
livro: saberão ler, e escrever, e guardarão inteiramente o que dispõem nos $$
6o,7o,8o e 9o do Título I, deste livro. Na terra, em que assiste a Inquisigão,
acompanharão sempre ao Meirinho, salvo quando o S. Ofício os ocupaÍ em

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Regimeüo do Santo Ofrcio 1640
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outra coisa; e fora da terra não irão com ele, senão quando os Inquisidores lhe
mandarem.
2o. Nos dias, que não forem feriados, enquanto estiver aberto o hibunal
assistitão à porta do pátio da Inquisição, e não consentirão que nele, ou nas
escadas hajajogo, ou alguma outra inquietação; e havendo-4 darão conta ao
Meiriúo, e em sua ausência ao Solicitador mais antigo, que na sala estiver,
para que eles o remedem na forma, que em seus títulos fica dito.
3o. Farão com toda a brevidade as diligências que os Inquisidores lhe
mandarem fazer; e assim mais o que o Meiriúo lhe ordenar, contanto, que seja
em coisas, que pertençam ao S. Ofício mas será sempre de modo, que ao menos
um deles fique à porta da Inquisição, enquanto os Inquisidores estiverem em
despacho, salvo se os ocuparem em outra coisa; um deles, qual os Inquisidores
ordenarem, guardará a porta do pátio dalnquisição, quando for noite, e no verão
às nove horas, e pelo inverno às oito, fará sinal na porta, paÍa que o Alcaide a
mande fechar; não consentirá, que no pátio estejam pessoas de suspeita" e das
que entrarem, saberá o que buscam; e paru que possa dar fé de todas, terá o
pátio iluminado com uma lâmpada, e o azeite que para ela for necessário, lhe
pagarâ o Tesoureiro, e terâ por este trabalho a mercê, que parecer.
40. Darão nas audiências os pregões, que se mudarem dar nas causas dos
privilégios, e levarão por cada um, o que lhe for contado; e quando forem fora
da cidade fazer algumas diligências, levarão dois tostões por cidade; mas pelas
que fizerem na cidade, e seus arrabaldes, não levarão salário algum.

TÍTULo XX
Do médico, cirurgião e barbeiro

1o. O Médico, Cirurgião e Barbeiro do S. Oficio terão as qualidades, que


no Título I, $ 2" deste livro se declaram. Serão pessoas de muita confiança, e
os mais suficientes, que houver na terra; e gaúarão inteiramente tudo, o que
se dispõem nos $$ 6o, 7o, 8o e 9o do dito título.

2o. Todas as vezes que forem chamados para o cárcere, acudirão com
grande pontualidade, nas horas, que lhe forem assinadas, para que o Alcaide os
possa acompaúar nas visitas, que fizerem; advertindo, que sem ele estar
presente, não hão de visitar preso algum. Quando visitarem os presos, não terão
com eles mais práticas, que as que forem necessrárias por respeito de suas
enfermidades e acerca delas os ouvirão com paciência, e tratarão caridade, de
maneira que os presos vejam, o cuidado, que se tem de sua saúde. Todas as
mesinhas, e remédios, que forem necessários,lhes mandaríofazer, e aplicarno
tempo que convém, e quando algum deles tiver doença grave, logo no princípio
darão conta na mesa, e pelo discurso dela, do estado, em que o doente está,
\

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Sônia Aparecida de Siqueira

monnente se houver temor de morte para que se trate do remédio espiritual, e


se lhe dê confessor, e o mais, que convier paÌa sua salvação.
3o.O médico e cirurgião serão obrigados acurarcom cuidado, e assistência"
não só os presos mas também aos ministros e oficiais do S. Oficio, e as pessoas
de sua família; e em razão deste trabalho se lhes assistirá ordenado competente
por nossas provisões; e bem assim serão obrigados a assistir ao tormento, para
nele declararem porjuramento, se os réus são capazes de o sofrer, e em que
grau; e por este habalho, e assistência terão no fim do Auto a mercê, que paÍecer
conveniente; e quando curarem algum preso de doidice, se haverão na cura com
tal advertênci4 que possam bem testemuúar sobre sua capacidade, quando por
ela forem perguntados; e de todos os que falecerem no cárcere farão exame,
para poderem declarar na mesa a causa de sua morte.
4o. Os médicos, e cirurgiões, alem do ordenado, que hão de ter por nossas
provisões, como acima fica dito, haverão oitenta réis de cada visita, que fizerem
aos presos ricos, que não forem confiscados; e o pagamento lhes farâ o
Tesoureiro, quando as custas se pagarem; e dos presos pobres, e dos ricos
confiscados, não levarão coisa alguma. O Barbeiro pelas sangrias, e barbas, que
fizer no cátrcete,levará o que na terra se costuma dar, e lho pagrâ no fim de
cada mês, por escrito do Alcaide.

rÍruro xx
Dosfamiliares do Santo Ofrcio
lo. Os familiares do S. Ofïcio, serão pessoas de bom procedimento, e de
confiança, e capacidade coúecida: terão fazenda, de que possam viver abas-
tadamente, e as qualidades, que no Título I, $ 2o deste livro se declaram, e
guardarão inteiramente tudo o que se dispõem nos $ $ 6o, 7o e 8o do mesmo títuIo.
2o. Acudiram à mesa do S. Oficio com pontualidade todas as vezes que os
Inquisidores os chamarem a ela; e viverem fora das cidades, em que reside o
S. Ofício, irão aos comissários, e Visitadores das naus, sendo chamados por
eles, e farão o que lhes disserem; vindo à mesa algum familiar, ou seja com
negócio, ou chamado, esperará na sala até o mandarem entrar, e sem isso não
entrará na saleta, que eúí antes da casa do despacho; salvo se os Inquisidores
ordenarem oufua coisa.
3o. Na véspera, e dia de São Pedro Mártir, sendo possível, se acharão na
Inquisição de seu distrito para acompanharem o Tribunal, e assistirão na igrej4
em que se celebrar a festa do santo; no dia, em que se fizer o Auto da Fé, se
acharão ante manhã na Inquisição, para irem com os presos na procissão; e
somente nestes dias, e quando forem prender alguma pesso4 ou a trouxerem
presa paÍa os cárceres, levarão o habito de familiar do S. Oficio, que hão de ter.

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Regimento do Santo OJício 1640
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4o. Quando os Inquisidores, lhe encanegarem alguma prisão, guardarão a


ordem, que se dá no título teze, nos $$ 8o, 9o, 10 e I I deste liwo, na forma que
neles se dispõem; e, além disso, tanto que frzerema prisão (sendo fora do lugar,
em assiste o S. Ofïcio) levantarão var4 e com ela acompanharão os presos. Se
nos lugares, em que viverem, acontecer algum caso, que pareça que pertence à
nossa santa Fé; ou se os penitenciados não cumprirem suas penitências, com
toda a brevidade, e segredo darão pessoalmente conta na mesa do S. Ofício
sendo na terra, em que assiste o tribunal, e fora dela avisarão ao comissrírio; e
quando o não haj4 avisarão por carta aos Inquisidores, e nunca só por si obram
noutra forma em matéria, que tocar à Inquisição, pelos inconvenientes, que
podem suceder se fizerem o contriário.
5o. Haverão pelo tempo, que gastarem nas diligências do S. Ofïcio, a
quiúentos réis por dia, e não poderão levar consigo mais que um homem de
pé, ao qual se pagará conforme ao uso da terra, e sendo-lhe necessiário mais,
darão conta aos Inquisidores, para lhe ordenarem o que devem fazer.

rÍrwo xxr
Do alcaide, garda, e capelão do córcere de penitência

1o. O Alcaide do ciírcere da penitência" será casado, e homem, de quem se


possa confiar, que cumprirá inteiràmente com obrigações de seu ofïcio, e com
o mais , que se dispõem nos $$ 6o,7o,8o e 9o do título primeiro deste livro; e
alem disso terá todas as qualidades de que no mesmo título, $ 2o se faz menção.
Terá debaixo de chave os penitenciados, que saírem no Auto da Fé, que os
Inquisidores lhe mandarem entregar, para serem instruídos nos ministérios de
nossa santa Fé, aos quais não soltará nem deixará do cárcere, sem expressa
ordem sua.
2o.Tratarâatodos com caridade; e havendo algunsüio miseráveis, que não
teúam de que se possam sustentar, o fará saber na mesa, para que os Inquisi-
dores, os mandem prover do necessiário; procurará, que estejam quietos, e que
não teúam entre si diferenças, porem havendo-as de maneir4 que eles as não
possa remediar, virá dar conta na mes4 para se acudir como convém, e nunca
por sua autoridade castigará os presos quando cometerem culpas, que mereçam
castigo.
30. Não consentirá que os presos do ciírcere falem com pessoas de for4
com que não convém falar, nem que denfro dele comuniquem os homens com
as mulheres, nem que o guarda lhes leve, ou traga recados de pessoas de
suspeit4 e acompaúará com vara os peniúenciados, quando os Inquisidores os
mandarem a alguma Igreja assistir aos ofícios divinos; e terá cuidado, que
nenhum deles possa fugir, ou esconder-se.

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Sônia Aparecida de Siqueira

4o. Não comerá, nem beberá com os presos, nem com parentes seus, nem
com eles terá comunicação particular, nem aceitará coisa algum4 que lhe derem
pelo tempo, que estiverem no cárcere; levaná carceragem assim, e da maneira,
que a leva o Alcaide do ciárcere secreto, como se dispõem no Título XfV,
parágrafo 24. deste livro.
5o. Quando os Inquisidores mandarem recolher no cárcere da penitencia a
alguns presos do segredo, o Alcaide os terá em casas separadas com tal
resguardo, que não se possam comunicar uns com os outros, nem com pessoas
de fora; e não falanâ com eles, nem consentirá, que falem com.o guard4 e irá
sempre com ele, quando os prover do necessário; e mandando os Inquisidores
chamar à mesa algum dos ditos presos, o Alcaide o trará, levando diante do
guarda, do qual fiará as chaves do ciírcere.
6o. Procurará que os pÍesos sejam bem providos, e com os melhores
mantimentos da terra, os quais o Guarda comprará, e quando os trouxer terá
cuidado de os ver, para saber se são bons, e se vem neles algum aviso; e, estando
enfermos, dará conta aos Inquisidores, para que os mandem curar pelo médico
da casa, e prover de todo o necessiírio, e se guarde em tudo na doença a ordem,
que se dá no título do Alcaide dos ciírceres secretos.
7o. O guarda que houver de servir no cárcere da penitência, será provido
pelos lnquisidores, mas não lhe passarão provisão, ou carta do oficio; e somente
depois de ser aprovado em mes4 lhe darão juramento para bem, e fielmente
cumprir com sua obrigação, e com isso será admitido a servir, sem ser neces-
sária outra ordem, ou provisão nossa. Porém terá as qualidades, de que se faz
menção no Título I, $ 2o deste livro.
8o. Guardará inteiramente o que se dispõem no Título I, $$ 6o, 7o, 8o e 9o,
não terá comunicação alguma com os presos, ou penitenciados, mais que
aquela, que convier para os prover do necessário; e se os presos lhe mandarem
algum recado, o não levará, nem outrossim lhe trará de fora, antes avisará de
tudo ao Alcaide, para que ele veúa dar conta na mesa, parecendo-lhe necessá-
rio; tratará a todos com muita caridade, e fará pontualmente o que o Alcaide
lhe ordenar em todas as coisas, que tocarem ao cárcere, e às pessoas que nele
estiverem.
9o. Não comprará coisa alguma para os presos, e penitenciados, sem ordem
do Alcaide, e todas as que com ordem sua comprar, serão as melhores, que se
acharem na terra, e pelo preço ordinário; e estando nos cárceres presos de
segredo, não teú as chaves dele, ainda que o Alcaide lhas queira dar, nem com
eles falará se não presente o mesmo Alcaide, ao qual acompanhaná quando vier
com eles à mesa, e os tomar a seu cárcere. Não aceitará dos presos, e peniten-
ciados coisa alguma, ainda que lha dêem voluntariamente; nem outras de seus
parentes, ou amigos, nem com eles terão comunicação particular.

760 R IHGB, Rio de Janeiro, I 5 7 (j92) : 693-883, jul./set. I 996.


Regimento do Santo Oticio 1640
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10. O capelão do ciírcere da penitenciríria será pessoa de virtude, e exem-


plo; e podendo-se achar homem letrado em que concorïam as mais qualidades,
que conforme a este regimento Tífulo I, $ 2o deste livro, se requerem nas
pessoas, que hão de servir o S. Oficio, será preferido aos que o não forem.
Guardará, inteiramente, o que se dispõem nos $$ 6o, 7o, 8o e 9o do mesmo título.
I l. Dirá missa todos os dias, no Oratório do cárcere, enquanto nele
estiverem os penitenciados, ou quaisquer outros presos, a quem os Inquisidores
permitirem, que a ouçam; administrará o Sacramento da Eucaristia aos perii-
tenciados, constando-lhe primeiro por escrito da pesso4 a quem sua instnrção
for cometida, que estão bastantemente instruídos nos mistérios de nossa santa
Fé; mas para assim o fazer, precederá ordem expressa rlos Inquisidores, sern a
qual não admitirá penitenciado algum à sagrada comunhão; e aos que a der,
passanâ certidão, pela qual não haveÉ coisa alguma, e a entregará ao Alcaide,
paÍa que ele a dê em mesa; e confessará os presos, quando os Inquisidores lho
ordenarem. Assistirá na sala da Inquisição, quando lhe for mandado pelos
Inquisidores, e principalmente nos dias mais chegados ao Auto da Fé; levaná o
Crucifixo na procissão do Auto; e fará o mais que os Inquisidores lhe ordena-
rem. Quando tiver licença nossa para se poder ausentar por algum tempo,
deixará em seu lugar pesso4 que possa acudir a sua obrigação, contanto que
seja aprovada pelos Inquisidores.

REGIMENTO DO SANTO OFÍCIO


LTVRO II
Da ordem do judicial do Santo Oficio
rÍruro r
Davisita e de como o visitador se hó de haver no despacho
dos apresentados, e denunciados, enquanto ela durar
1o. Quando nos parecer, que convém ao serviço de Deus, mandar visitar o
distrito de algumadaslnquisições, ou algum outro particulardoReino, àpesso4
que escolhermos para negócio de tanta importância, mandaremos dar as ordens,
e instruções, que deva guardar, enquanto durar a visita; o qual antes de se partir
para o lugar, que há de visitar, tená cuidado de saber, que papéis há no S. Ofïcio
pertencentes a esse lugar, ou distrito; e todos levará consigo, com as mais
informações, que parecerem necessárias.
2o. Depois de haver chegado ao lugar da visita, e feita a publicação dela"
na form4 que fica dito no Livro I, Título ry, $ I I e nos seguintes. Se algumas
pessoas se vierem perante ele se apresentaÍ, e confessar culpas, de que resulte
leve suspeita na Fé, como são blasfêmias heréticas, proposições temeriárias,

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(392): 69 j-883, jul./set. 1996. 76t


I
Sônia Aparecida de Siqueira

malsoantes, e escandalosas, afinnar que a fornicação simples não é pecado,


bigami4 superstições e sortilégios, renegar no exterior em terra de Mouros com
medo dos tormentos, e solicitar na confissão, lhe será tomada sua confissão no
livro, que irá ordenado paÍa esse efeito, e tirada dele uma cópia por mão do
Noüário, e feita a sessão de genealogi4 e o exame, que lhe parecer necessário,
despachará os processos com o Ordinrário somente, ao qual requerer, que veúa
assistir ao despacho na mesa da visita por si, ou por outra pesso4 a quem
cometer suas vezes, com tanto, que teúa as qualidades declaradas neste
Regimento, e tomando o assento, se fará a sentença que o Notrário publicará na
mesa da visita perante o Visitador, e seus oficiais, aos apresentados, os quais
aí farão abjuração de leve, e lhes serão impostas penitências espirituais, sem
alguma pena pública" ou qualquer outra, para que se possa vir em conhecimento
da culpa; e de tudo se fará termo, que assinarão em seus processos. E não
concordando o Visitador, e ordinário nos votos, se enviará o processo ao
Conselho gerpl com o parecer de cada um deles, e com as razões, porque se
moverão, para do Conselho lhe ordenarem o que deve fazer.
3". O Visitador não despachmá os processos de pessoas suspeitas, que
confessarem blasfêmias heréticas, proposições malsoantes, temerárias, escan-
dalosas, ou tais, que seja necessário qualificar-se; os de confessores solicitantes
sendo poucos, ou que confessem mais de dois atos, ou algum completo, nem
dos sortilégios, qualificados, nem dos que renegÍìm em terra de Mouros,
havendo testemuúas, que possam alterar a presunção que conta eles resulta, e
nestes casos tomará somente as confissões, e as mandará copiar, e feitas as
sessões de genealogia e exame, na forma sobredit4 as enviará ao Conselho
geral com as culpas, se as houver, para nele se ordenar o que parecer conve-
niente; e o mesmo fanár, quando os apresentados confessarem culpas, de que
contra eles resulte veemente suspeita na Fé.

4o. Indo alguma pessoa denfro do tempo da visita apresentar-se, e confessar


culpas de judaísmo, ou quaisquer outras de heresia formal, se tomará sua
confissão no livro, e depois de assim tomad4 lhe fará o Visitador sessão de
genealogia, e crençq e as mais sessões de exame, que parecerem necessárias,
conforme ao estilo do S. OÍïcio; e todos os autos enviará ao Conselho geral,
como fica dito no parágrafo precedente; e aos apresentados mandará passar
certidão de como se apresentarão no tempo da graça, se a pedirem.

5o. Se alguma pessoa, que foi reconciliada pelo S. Ofïcio se apresentar e


confessar culpas de relapsia, lhe tomará sua confissão, e sem lhe fazer sessão
alguma, a remeterá ao Conselho geral; e se disser por terceira pessoa (não
declarando seu nome) que se quer apresentar e confessar suas culpas, contanto,
que lhe prometam misericórdia, lhe serárespondido, que enquanto não declarar
seu nome se não pode deferir seu requerimento; e as confissões dos que assim

R IHGB, Rio de Janeiro, I 57(392):693-883, jul./set. 1996.


Regimento do Santo Ofrcio 1640
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se apresentaÍem, serão ratificadas na forma que se dizno título 7 deste livro, $


14.
6o. As denunciações, e testemunhos das pessoas, que vierem denunciar, se
tomarão no livro, que para isso há de levar; e no fim delas serão logo ratificadas;
e havendo algumas pessoas referidas, se estiverem no mesmo lugar da visita,
ou poderem comodamente vir chamadas a ele, o Visitador as perguntará
pessoalmente; ficando tão desviadas, que com dificuldade poderão vir ao dito
lugar, se com tudo estiverem no distrito de sua visita" cometerá ao comissiário
do S. Oficio, que tal lugar houver, ou a outra pessoa de confiança, que as
pergunte; e estando fora de distrito de visita, as não mandará perguntar, até as
denunciações virem ao Conselho-geral, e ter ordem sua do que deve fazer;
porém isto se não entenderii se houver temor de fuga no culpado, ou perigo de
morte, ou ausências nas pessoas referidas, porque em cada um destes casos
mandará passar requisitória aos Inquisidores, em cujo distrito estiverem, para
serem perguntadas.

70. Enquanto durar o tempo da visita não mandarão prender pessoa alguma,
ainda que para o faznr ache bastante prov4 mas fará tasladar as culpas pelo
Notário de visita, que enviará ao Conselho geral, com informação do caso por
carta sua" e com seu parecer; e se as pessoas culpadas forem suspeitas de fuga"
faní disso sumário de testemuúas, que também virá ao Conselho com as
mesmas culpas; e entretanto ordenará, que as justiças seculares ou Eclesiásticas
da terr4 com alguma coisa corada e sem se entender, que é por ordem su4
reteúam na cadeia as ditas pessoas, onde estarão até haver ordem do Conselho;
se dentro do tempo da graça as pessoas assim retidas lhe pedirem audiência e
confessarem suas culpas ficarão gozando del4 porém alguma pessoa, que foi
presa por seu mandado (precedendo ordem do Conselho) pedir, que a ouga para
confessar suas culpas, tomar-lhe-á sua confissão, e sem proceder mais avante
em sua causa, remeterá com suas culpas, e confissão, a própria pessoa presa ao
S. OÍïcio.

8o. E porque nas visitas dos lugares ultramarinos, fica sendo o recurso ao
Conselho, mais dificultoso, e grande o prejuízo, que se podená seguir da dilagão
I
I da resposta: ordenamos, que na visita dos ditos lugares, possa o Visitador, alem
I dos casos declarados no $ 2, deste título, despachar com o ordinrário as pessoas,
que confessarem culpas de heresia formal, e fizerem inteira, e verdadeira
confissão, recebendo-os ao grêmio; e união da santa madre Igreja, na form4
que no fim deste Regimento irá declarado, e guardando o que se dispõem no
título seguinte, e no livro 3,Títulol. E parecendo que a confissão não é inteira"
e verdadeira, guardará o que atrás fica disposto no $ 4, deste título. Poderá outras
despachar com o Ordinrário os casos, de que somente resulta leve suspeita na
ì Fé, declarados no parágrafo 2, deste tífuIo, posto que os culpados se não hajam

RIHGB, Riode Janeiro, 157(392):693-883, jul./set. 1996.


Sônia Aparecida de Siqueira

apresentado, formando os processos confonne ao que se dispõem por este


Regimento.
9. Sendo o Visitador, e ordiniârio diferentes em seus votos, chamará por
terceiro a pessoa que ordenamos na instrução que há de levar: e se concordar
com algum deles se executará o que ficar vencido pelos dois votos; e em caso
que todos três sejam diferentes no parecer, se fará redução dos votos, conforme
ao que vai no Título 13, $ 10, deste liwo, e desta maneira havemos por escuso
o recurso ao Conselho geral, pela dilação, que nele pode haver, com a distancia
dos lugares.
rÍruro u
Dos apresentados, assim no tempo da graça, comofora dele, e da ordem,
que se deve guardar em se despacho

l. Toda a pessoa de qualquer qualidade, estado e condição, que sejq que


tendo cometido culpas de heresia formal contra nossa S. Fé Católica, e reco-
nhecendo seus erros, se apresentar, e os confessar voluntariamente na mesa do
S. Ofício, com mostras, e sinais de verdadeiro arrependimento, assim no tempo
de graça, como fora dele, será tratada benignamente, paÍa que mais se anime a
procurar o remédio de sua alma; e depois de lhe ser tomada sua confissão, se
lhe fará sessão de genealogia, e crença na forma, que se dispõem no Título 6,
$ 2 e Título 7 $ I l, deste liwo; e juntas as testemuúas dajustiça (se contra ela
as houver) se verá seu processo em mesa, com o Ordinrârio, e Deputados; e
parecendo, que faz inteira, e verdadeira confissão de suas culpas, e que assenta
bem na crença de seus erros, será admitida ao grêmio, e união da S. Madre
Igreja na forma que se dispõem no livro 3, Título 1.
2. F. não havendo contra tal pessoa testemunhas, entendendo-se porem que
as poderá ter, pela notícia, que há de haver pessoas, que sabem de suas culpas,
e podem ser examinadas, posto que a notícia delas procedesse de sua própria
confissão; não sendo as tais pessoas cúmplices, antes resultando de seus ditos
coisa, que encontre a confissão, ou a faça parecer verdadeir4 será recebida na
form4 que se diz no parágrafo precedente.
3. Porem se perecer, que há algum inconveniente em examinar, as tais
pessoas, ou que por algumas razões particulares convém não dilatar por esse
respeito o despacho da pessoa apresentada, visto se processo em mesa conÌ o
assento, que nele se tomaÍ, se enviará ao Çonselho.
4. E parecendo aos Inquisidores, que a tal pessoa não faz inteira, e
verdadeira confissão de suas culpas, depois da sessão de crença, lhe farão logo
outra, na qual somente a admoestem, que examine sua consciência, e trate de
a desencarregar inteiramente, a confessar toda a verdade; e não satisfazendo
nesta sessão, lhe farão ouh4 em que a advertirão das faltas de sua confissão, e

R IHGB, Rio de Janeiro, 157(392):693-883,ju|./set. 1996.

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