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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE FILOSOFIA LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS

OTAVIO VIEIRA DO ROSÁRIO FILHO


N° USP: 8972980

ISABEL DE ALMEIDA KUHL


Nº USP: 4583777

JOÃO PEDRO FRUTUOSO CAVALHEIRO


Nº USP: 9822390

“UM TEXTO É COMO UM ESFORÇO DE EXISTIR”


Perspectiva e Modo Narrativo em ​Os Papéis do Inglês​, de Ruy Duarte
de Carvalho

PROFESSORA DOUTORA TANIA MACÊDO


LITERATURAS AFRICANAS DE LÍNGUA PORTUGUESA I

SÃO PAULO
​2017
“UM TEXTO É COMO UM ESFORÇO DE EXISTIR”
Perspectiva e Modo Narrativo em ​Os Papéis do Inglês,​ de Ruy Duarte de Carvalho

Literaturas Africanas de Língua Portuguesa I

Trabalho final, apresentado à


Universidade de São Paulo, como
parte das exigências para a avaliação
da disciplina de Literaturas Africanas
de Língua Portuguesa I.

São Paulo, Junho de 2017.

Disciplina ministrada pelo


Professora Doutora Tania Macêdo

1
Introdução
A opção pelo gênero romance dá um dos muitos tons da progressão da narrativa e,
para isso, o narrador faz questão de pautar as motivações da sua enunciação. É importante
notar o modo com que, por coincidência e consequência, os acontecimentos descritos se
encadeiam e culminam no momento de narrar a história.
E é no tecer aparentemente contraditório dessa obra que a profundidade de Ruy Duarte
de Carvalho enquanto autor se demonstra. A dimensão ensaística do livro, de preocupação
formal e desenvolvimento de ideias; a sua dimensão ficcional, de criação e recontar de
acontecimentos envolvendo o próprio narrador e o Inglês das histórias; a dimensão
autobiográfica, de larga analogia entre o narrador e à figura do autor com a inserção de seu
pai na narrativa e com a busca pessoal pelos “papéis”; e a dimensão etnográfica do livro, de
relato de viagem de pesquisa sobre os povos ao sul de Angola, em que esse pesquisador se
autocoloca; todas essas dimensões se combinam na trama para evidenciar a capacidade do
romance, enquanto forma, de espaço para a criatividade, a reflexão, a subjetividade e de
constituição de uma realidade interna que se reporta à realidade externa.

Ruy, acima de tudo, engrandece o espectro que o romance é capaz de cobrir,


principalmente quanto à sua verossimilhança, pois pouco importa se “o branco que tinha
comprado ao avô do Paulino os papéis de um ‘estrangeiro’ que tudo me estimulava a
identificar como o Inglês do Galvão, não podia muito bem ter sido o meu finado pai”1. A essa

1
CARVALHO, Ruy Duarte de. ​Os Papéis do Inglês​ ou O Ganguela do Coice. São Paulo: Companhia das
Letras, 2009. p. 31.
2
possibilidade de articulação de discursos heterogêneos e conflitantes na forma literária, Ruy
quer dar correspondência na forma social. Unindo ensaio, ficção, etnografia e autobiografia
por seus pontos de contraste e diferença, o autor de ​Os Papéis do Inglês quer demonstrar a
chance de convergência entre os discursos de um tempo no qual as vozes que lutaram para ter
lugar político agora brigam entre si, em crise permanente.
Assim, sem “colocar panos quentes” nos conflitos que percebe em sua realidade, Ruy
Duarte realiza, na obra, uma defesa da produção do conhecimento (literário e científico) em
novos moldes, já vazada na forma, sob uma existência que a coloca em vias de extinção. É um
autor que busca na ​mescla a resolução de problemas literários, pois vê nela a possibilidade de
resolução de problemas científicos e, sobretudo, sociais.

✹✹✹

Ao tomar contato com o livro de Ruy Duarte de Carvalho, ​Os Papéis do Inglês,​
percebemos que nos aproximamos de um objeto ​literário complexo e com fino acabamento.
Trata-se de uma leitura que exige uma sensibilidade participativa, pois a obra apresenta uma
progressão criativa que conta, estruturalmente, com a presença de um destinatário que
performará a construção autoral que mimetiza a própria faina ficcional. Esse autor já
problematiza a questão do relato que, baseado em interesses políticos espúrios, sempre se
volta mais à narrativa do colonizador:
A narração daquela estória que prometi contar-te, a do suicídio de um Inglês no
interior mais fundo de Angola e nesta África concreta de que tu, e todo mundo, tão
pouco realizam no exacto fim deste século XX fora de um imaginário nutrido e
viciado por testemunhos e especulações que afinal se ocupam mais do passado
europeu que do africano — e pelas versões mediatizadas, e de plena má-fé, às vezes,
da aberração do presente —, poderia, a ser levada avante, começar aqui e agora.2

Contudo, há uma complexificação nesta maneira de contar, há uma atualização que se


mostra um empreendimento audacioso, mas que não se encerra em uma ação beletrística ou
científica cerrada: com rigor estilístico, o texto de Ruy transita entre a narrativa, o ensaio e o
diário de bordo. Assim, se privilegia a visão de um homem comprometido com a
formalização e compreensão de uma história, de um povo e de um modo narrativo ​sui generis
com “a capacidade de misturar gêneros, mesclando procedimentos, misturando concepções,

2
CARVALHO, Ruy Duarte de. ​op. cit​. 2009. p. 12.
3
formulando aproximações, reinventando o seu modo de ver o mundo e a dicção que o mundo
e seu olhar exigem”3.
No cruzamento entre antropologia e ficção, o narrador de Ruy busca resolver a
impossibilidade de reconstrução da experiência vivida por meio do dialogismo e da
auto-colocação. Ele se insere na história a ser contada, a despeito da ciência completamente
objetiva, e se ancora em um interlocutor, a despeito do romance enquanto escrita solitária,
ultrapassando a dicção típica a cada uma destas formas de discurso para atingir novo grau de
conhecimento. A abordagem ensaística-destinada, de difícil leitura para o leitor acostumado à
simples fabulação, mostra-se fecunda por objetivar a perspectiva humana diante de problemas
de ordem artística e científica em uma sociedade cindida. Contudo, mais que uma formulação
estética com novidades, o livro de Ruy se coloca como ponto ideal para se observar a
realidade sob nova perspectiva. A arte da escrita e a ciência da observação etnográfica jogam
luzes por sobre a necessidade de se produzir ciência e literatura com a liberdade que os
impasses, as limitações humanas requerem, para uma tentativa multifocal de compreensão, à
guisa de uma câmera em movimento4. O que também nos remete às considerações de Theodor
W. Adorno por sobre o ensaio enquanto forma:
O ensaio não segue as regras do jogo e da ciência e da teoria organizadas, segundo
as quais, como diz a formulação de Spinoza, a ordem das coisas seria o mesmo que
a ordem das ideias. Como a ordem dos conceitos, uma ordem sem lacunas, não
equivale ao que existe, o ensaio não almeja uma construção fechada, dedutiva ou
indutiva.5

Cabe agora voltarmo-nos para o ficcionista que se insere explicitamente na narrativa,


este que será o homem que se apropriará das versões anteriores para construir a sua história e
a história do inglês Archibald Perkings, em meio às suas deambulações pelo sul de Angola. A
crônica de Henrique Galvão, o relato de um médico, suas pesquisas e a sua inventividade
resultarão neste relato que se constrói diante do leitor e é mimetizado na instabilidade da
caracterização dos personagens e nas muitas versões que o narrador empreende.

3
​CHAVES, Rita; MACÊDO, Tania; VECCHIA, Rejane. ​A kinda e a misanga:​ encontros brasileiros com a
literatura angolana. São Paulo: Editorial Nzila, 2007. p. 339.
4
CHAVES, Rita; CAN, Nazir Ahmed. ​De passagens e Paisagens: geografia e alteridades em Ruy Duarte de
Carvalho​. In: Viagens, Deslocamentos, Diferença. Abril: Revista do Núcleo de Estudos de Literatura
Portuguesa e Africana da UFF, Niterói, v. 8, n. 16, p.15-28, jul. 2016.
5
ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. In: ​Notas de Literatura I​. São Paulo: Editora 34, 2008.
(Espírito Crítico).
4
O ​start ​narrativo é a destinação: ​“O que há-de ser preciso para escrever, em primeiro
lugar, senão achar que vale pena porque tem um destinatário?”6. O narrador escreve pois
alguém o lerá e isso se formaliza entre e-mails e curtos trechos acimados por datas que vão do
dia 23.12.99 à 01.01.00. O exíguo espaço de tempo é tempo o suficiente para que o autor vá
do texto histórico colonial, ​Em Terra de Pretos de Henrique Galvão, às últimas considerações
autorais por sobre os festejos locais sob perspectiva antropológica. E talvez seja do travo das
ciências sociais que nasça a invenção da profissão do inglês e sua desdita. Archibald Perkings
é um antropólogo que chega em terras angolanas com uma comitiva de intelectuais britânicos
e ali faz carreira observando a expropriação de riquezas, em uma das versões, e contra elas se
insurge. Noutra versão, essa tomada por problemas existenciais, presente no ​Intermezzo, e
tratada com franco caráter cinematográfico7, Perkings é assaltado por reminiscências da
infância e surta durante o ato sexual. Aqui é a singularidade do prazer e o paroxismo carnais
que dão a tônica de uma ficção muito bem realizada.
Ora, assim o personagem em todas as suas versões é participante de acontecimentos
trágicos. Não pertencendo aos acontecimentos do seio familiar e diferindo dos desbravadores
coloniais em certa medida, nos é apresentado como um romântico tocador de violino que gera
um idílico espaço no acampamento em que vive. São esses dados do entrecho que permitem
ao texto uma aproximação com o puro caráter literário e essa desolação que dá o tom
romanesco diverso do que seria uma constituição documentária.
Presente em uma terra que não é sua e mesmo em terras inglesas diverge de sua
família. Assim, Archibald é marcado pelo não pertencimento, disso resulta uma nevralgia, um
páthos p​ róprio que pode ser lido com o auxílio das classificações de Northrop Frye ​em vias de
sugestão para compreensão do enredo. Em sua ​Anatomia da Crítica,​ o crítico canadense
propõe que nas ficções há o modo ficcional trágico, “em que o herói acaba isolado de sua
sociedade”8 e assim se performa pateticamente a
“exclusão de um indivíduo em um próprio plano de grupo social ao qual ele está tentando
pertencer. Por isso a tradição central do ​páthos é​ o estudo da mente isolada, a história de
alguém como nós mesmos está cindido por um conflito entre o mundo interno e o externo,
entre a realidade imaginativa e o tipo de realidade que é estabelecida por um consenso
social”9

6
​CARVALHO, Ruy Duarte de. ​op. cit.​ p. 24.
7
​ “À própria história, a do Galvão, acabaria por bastar a meia dúzia de minutos que levo a contá-la quando a
resumo a alguém, mesmo se lhe acrescento, como afinal sempre vem a acontecer, o comentário de que ela detém
um potencial dramático digno de uma peça literária acabada, a sério, ou de um filme”.​ C ​ ARVALHO. Ruy
Duarte de. ​op. cit.​ p. 15.
8
​FRYE, Northrop. ​Anatomia da Crítica​. Trad. Marcus de Martini. São Paulo: É Realizações, 2014. p. 148.
9
CARVALHO, Ruy Duarte de. ​op. cit​.​ ​p.153
5
Como dito, a proposição analítica de Frye é tomada como sugestão de leitura, talvez
mais pertinente ainda para a classificação estrita de tipos e ​thopos mais convencionais. Não é
o caso de ​Os Papéis do Inglês​. Apesar de nos elucidar o ​estado de coisas da narrativa, urge a
necessidade de se atualizar a análise e considerar as complexas investidas do romancista que
se insere como herói também. O ficcionista-personagem trava relação com a história de
Galvão e a reformula segundo as regras de sua composição; ao compor viabiliza a sua visão
de mundo e interpreta (com a liberdade do ensaio) os acontecimentos de seu país e coloca em
xeque a versão do colonizador. Ademais, politicamente se posta como intelectual de ideias e
se preocupa com o ​registo ​que deve ser tomado na vida local que estuda.
Sim, o narrador se coloca como um estudioso e experimentador do espaço mesmo se
mostrando profundo conhecedor do mesmo. Com isso, notabiliza-se a distância necessária
para que a apreensão, dos modos e problemas de vida, seja perspectivada holisticamente. Isso
é indicado e sintetizado na abertura do capítulo ​25.12.99.​ O estudo do lugar e de seus
habitantes, confunde-se com a própria experiência da atividade literária, uma vez que a noção
formal é tida, pelo autor e pelo narrador, como referencial e inventiva, o que marca a sua
singularidade “para exprimir a sua forma de estar nesse contexto o autor revela o seu
empenho na elaboração de um instrumental que, embora tributário da chamada cultura
ocidental, assume um compromisso de fundo no tratamento de questões que o próprio
ocidente tem dificuldade em perceber”10.
Tal distância, tomada pelo cientista social, o faz próximo do herói por ele ficcionado e
com isso se objetiva certo grau empático. Narrador e personagem se constituem diante do
leitor-destinatário e os problemas locais ambientam essa construção ficcional e,
dialeticamente, n​ os são mostrados enquanto dispositivos do próprio texto como
“​coisas que só se revelam
a quem não é do lugar”​. Decerto que a questão colonial e suas narrativas viciadas, estas
tomadas no texto de Galvão, e as questões “pós-coloniais”, como a debilidade material e a
instabilidade política, nos são apresentadas como as coisas a serem reveladas, por meio da
própria escrita. As contradições do governo revolucionário serão sensivelmente tocadas nos
diálogos que o narrador travará com seu primo Kaluter; sendo expostos problemas de caráter

10
CHAVES, Rita. ​op. cit​. 2007. p​. ​337.
6
burocrático e mesmo étnico. Tudo sendo explicitado sob formidável crivo estético, da mistura
de gêneros que já procuramos exprimir e foram sintetizadas com apuro pelo próprio Ruy:
(...) “mantendo-me todavia activo de uma forma que pretendo criativa, tanto no domínio da
expressão literária quanto como nos desempenhos profissional e cívico, talvez então essa
maneira de convocar tudo para a partir daí ensaiar a minha própria expressão passe também
pela consciência muito pessoal​, ​todavia, de que o entendimento se faz não apenas no
conhecimento dito científico, mas de uma inteligibilidade mais forte que aquela que as
contradições da lógica formal delimitam… e que de qualquer maneira seria uma presunção,
uma debilidade do pensamento científico ocidental, pensar que o mundo pudesse ser uma
máquina determinista perfeita em que tudo tivesse regulado como uma máquina de relógio,
ou mesmo melhor.”11

A narrativa é marcada por referências teóricas específicas que inserem o narrador no


contexto da academia britânica e na linhagem dos narradores ocidentais: “O ano anterior a
esse, o de 1922, foi retirado pela história como o ​annus mirabilis do funcionalismo, com a
publicação dos estudos do próprio Radcliff-Brown e de Malinovinsky”.12 Tal inserção permite
a realização de uma crítica mais bem fundamentada à academia e suas formas de produção de
conhecimento, ponderação que vem a se revelar como presente no todo da obra.
Da mesma forma que Perkings já havia se mostrado anos atrás, o narrador mostra-se
insatisfeito com a academia. Critica o meio acadêmico inglês, com o embasamento de sua
experiência e, ao mesmo tempo, reconhece sua forma de produzir conhecimento como
estrangeira a Angola. O embate com o contexto académico parece apontar para um parecer
negativo mais amplo, que engloba a tradição científica de produção e divulgação de
conhecimento:
E ainda: que em relação a todas as ciências, eu andava também era a
experimentar uma imensa fadiga. Mesmo tendo em conta um qualquer
mundo académico onde viesse a poder inscrever-me, de alguma forma, o tipo
de conhecimento em que andava ali a chafurdar, teses já as tinha feito todas,
por um lado, e no meio académico que era afinal o meu, o de Angola, não
havia, institucionalmente até, espaço para o meu trabalho.13

Considerando que epistemologia ocidental, tipicamente cartesiana, reforça a


dessubjetivação do objeto analisado14 como forma ideal de produção do conhecimento, o
narrador de Ruy se insere dialeticamente entre os pólos da extrema objetivação e do excesso

11
CARVALHO, Ruy Duarte de. ​Falas & Vozes, fronteiras e paisagens… -escrita, literatura e
entendimentos. ​Setepalcos. Coimbra: Cena Lusófona, 2006. p.13-14
12
​CARVALHO, Ruy Duarte de. ​op. cit.​ 2009. p. 51.
13
​CARVALHO, Ruy Duarte de. ​op cit. 2​ 009. p. 154-155.
14
​cf. ​ EWALD, Felipe. ​Arte e Conhecimento em Os Papéis do Inglês, de Ruy Duarte de Carvalho​. In: O
Colonial e o Pós-Colonial: reflexões críticas. Abril: Revista do Núcleo de Estudos de Literatura Portuguesa e
Africana da UFF, Niterói, v. 4, n. 7, p.65-78, nov. 2011.
7
de subjetivação, valorando a própria posição (autocolocação) e a relação com o outro
(alteridade) na ​construção do conhecimento. Desta forma, o saber se torna fruto de uma troca,
de uma vivência, e não da observação violenta e unilateral característica da estrutura colonial.
Há a proposição de um novo olhar para outras culturas, livre de preconceitos e da ideia
estigmatizada de que os povos africanos são “atrasados” e devem ser “descobertos”. Segundo
a concepção de que no encontro entre dois povos um é estrangeiro ao outro, o narrador chega
a falar em um “nós”, responsabilizando as duas partes por uma transfiguração intelectual a se
realizar. No excerto é possível observar tal crítica aos imperativos da colonização que
norteiam as relações com povos lidos como estrangeiros e atrasados, e a identificação deste
“nós” que, travando um contato, então positivo, podem gerar frutos para os dois lados:
Ninguém fala hoje de darwinismo, é certo. Mas o iluminismo e
evolucionismo estão implícitos em toda a produção ideológica e intelectual
que vigora e ainda sempre omnipresentes e dominantes, cientes ja de seus
maiores pecados do passado, na aferição da qualidade dos homens segundo
escalas físicas, primeiro, e depois segundo uma hierarquização das culturas,
mais a fundamentar o mesmo espírito de império, ainda quando disfarçados
de um igualmente abjecto paternalismo que confere a uns o direito de
decidir, benemétria e providencialmente, pelos outros em nome dos outros,
os ignorantes e os atrasados, os coitados. E esses uns e outros somos todos
nós, uns para os outros e por aí fora e sempre em função do ganho do outro.15

Buscando localizar-se como divergente aos modos tradicionais acadêmicos e suas


formas de produção e fora do oportunismo econômico da lógica colonial, o sujeito tem uma
consciência enfática de que representa um estrangeiro em Angola. Ao mesmo tempo em que
revela seu conflito em uma forma de escrita também indefinível, o narrador identifica uma
semente de transição nesta forma de ​criação do pensamento, insuficiente, e reforça a
necessidade de uma mudança baseada na alteridade, no aprender com o outro sem ​aprendê-lo.16
Assim, é possível entender que o intuito da obra não é simplesmente dar voz aos oprimidos,
estabelecer uma identificação com ele e, através disto, tentar traduzi-lo.

15
CARVALHO, Ruy Duarte de. ​op. cit​. 2009. p. 151.
16
CHAVES, Rita; CAN, Nazir Ahmed. ​op. cit.​ 2016.
8
Referências Bibliográficas

ADORNO, Theodor W. ​Notas de Literatura I​. São Paulo: Editora 34, 2008. (Espírito
Crítico).

CARVALHO, Ruy Duarte de. ​Falas & Vozes, fronteiras e paisagens… -escrita, literatura
e entendimentos. ​Setepalcos. Coimbra: Cena Lusófona, 2006.

CARVALHO, Ruy Duarte de. ​Os Papéis do Inglês ou O Ganguela do Coice. São Paulo:
Companhia das Letras, 2009.

CHAVES, Rita; MACÊDO, Tania; VECCHIA, Rejane. ​A kinda e a misanga: encontros


brasileiros com a literatura angolana. São Paulo: Editorial Nzila, 2007.

CHAVES, Rita; CAN, Nazir Ahmed. ​De passagens e Paisagens: geografia e alteridades em
Ruy Duarte de Carvalho​. In: Viagens, Deslocamentos, Diferença. Abril: Revista do Núcleo
de Estudos de Literatura Portuguesa e Africana da UFF, Niterói, v. 8, n. 16, p.15-28, jul.
2016.

EWALD, Felipe. ​Arte e Conhecimento em Os Papéis do Inglês, de Ruy Duarte de


Carvalho​. In: O Colonial e o Pós-Colonial: reflexões críticas. Abril: Revista do Núcleo de
Estudos de Literatura Portuguesa e Africana da UFF, Niterói, v. 4, n. 7, p.65-78, nov. 2011.

FRYE, Northrop. ​Anatomia da Crítica​. Trad. Marcus de Martini. São Paulo: É Realizações,
2014.

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