Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
e o esporte na escola:
cotidiano, saberes
e formação
Silvia Christina Madrid Finck
A Educação Física
e o esporte na escola:
cotidiano, saberes
e formação
Av. Vicente Machado, 317 ∙ 14º andar
Centro ∙ cep 80420-010 ∙ Curitiba ∙ PR ∙ Brasil
Fone: (41) 2103-7306
www.editoraibpex.com.br
editora@editoraibpex.com.br
isbn 978-85-7838-668-9
10-02584 cdd-372.8607
1ª edição, 2010
percepções, contradições e
possibilidades • 23
emancipatória • 51
fundamental • 53
Apresentação
Esta obra é reflexo de uma caminhada profissional idealizada e
concretizada através da docência, de leituras, de vivências, de
observações e de reflexões acadêmicas. Atualmente, tal percurso
culmina no doutorado, cujo objeto de estudo é a análise do co-
tidiano pedagógico do professor de Educação Física que atua na
escola.
O exercício profissional na área de Educação Física, no contexto
escolar e universitário, oportunizou a aquisição de um universo de
experiências que, em parte, estão presentes nesta obra. Aqui são
consideradas e discutidas questões em função de preocupações
que estão voltadas para o âmbito pedagógico e de formação de
professores que permeiam a Educação Física e o esporte.
Refletir, discutir e pesquisar sobre a educação é bastante com-
plexo. Adentrar a escola com o intuito de entender, considerar e
traduzir o que lá acontece não é menos intrincado.
O professor ocupa, nesse cenário, um papel de destaque, como
o protagonista, o sujeito da pesquisa, o pesquisador. Considerar
a abrangência da profissão docente é fundamental quando di-
recionamos nosso olhar para o cotidiano pedagógico, a fim de
compreendermos a complexidade do processo educacional na
busca de possíveis respostas que são provisórias e inacabadas
quando a temática é educação.
O objetivo deste livro é contribuir com reflexões, discussões e
perspectivas de possíveis intervenções na área da Educação Física,
considerando o cotidiano pedagógico do professor realizado na
escola. A partir da sua complexidade foram organizadas temáticas
que tratam da Educação Física e do esporte no contexto escolar.
10
A Educação Física no
espaço da escola
Abordaremos neste capítulo aspectos da Educação Física na escola
que incluem um recorte histórico de sua introdução no contexto
escolar. Paralelamente, evidenciamos questões que nos levam a
visualizar esta disciplina nos dias de hoje, inclusive com relação
ao âmbito legal. Na sequência, apontamos algumas das princi-
pais abordagens pedagógicas que têm uma concepção crítica da
Educação Física escolar, bem como destacamos suas contribuições
para o desenvolvimento dessa disciplina no espaço da escola.
* Entre outros estudos, merecem destaque os que você encontra em: Betti, 1992; Bracht, 1988;
Molina Neto, 1993; Moreira, 1992, 1995; Soares, 1992.
24
* O Ministério da Educação (mec), por intermédio do Conselho Nacional de Educação (cne), criou
a resolução cne/cp n° 01/2002, que institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
Professores da Educação Básica, em nível superior, Curso de Licenciatura, de graduação plena. Para
ver essa resolução na íntegra, acesse: <http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/rcp01_02.pdf>.
31
* Exercendo um controle social através da relação com as famílias, encontraremos nos discursos
dos médicos um enfoque disciplinador, normativo e moral. Os médicos, nessa época, entendem
que por meio da ginástica é possível recuperar e formar cidadãos com saúde física e mental,
regenerar a raça, as virtudes e a moral. Evidentemente que o modelo utilizado foi o da raça branca
(Bracht, 1999; Coletivo de Autores, 1992).
34
* São elas: a psicomotricidade (Le Boulch, 1987), a desenvolvimentista (Gallahue, 1982; Tani et al.,
1988; Manoel, 1994), a educação de corpo inteiro (Freire, 1989), a do desenvolvimento humano
(Krebs, 1995, 1996), a da promoção pela saúde (Guedes; Guedes, 1996; Nahas, 1996).
36
nos pcn (1998) que foi elaborada e sugerida por um grupo de edu-
cadores, em forma de projeto, para nortear o trabalho pedagógico
desenvolvido nas escolas nacionalmente e em todas as áreas
do conhecimento, entre elas, a Educação Física. Essa proposta
teve como inspiração o modelo educacional espanhol e também
agrega algumas das principais ideias das abordagens citadas
anteriormente, apontando encaminhamentos metodológicos di-
ferenciados no trato do conhecimento da Educação Física escolar,
relacionando-o a temas emergenciais que devem ser tratados
pedagogicamente no contexto da escola. Assim, acreditamos ser
importante destacar e analisar os principais aspectos tratados
neste documento.
Salientamos as propostas críticas, pois as mesmas são ampla-
mente divulgadas e discutidas no meio acadêmico e profissional.
Assim, consideramos o cotidiano escolar da Educação Física e do
esporte à luz das referidas propostas, verificando em que propor-
ções dão embasamento teórico científico ao trabalho pedagógico
que o professor efetiva no seu dia a dia. Evidenciamos também
que é numa concepção crítica que se preconiza o desenvolvimento
da Educação Física escolar.
Em relação à formação de professores, consideramos importante
o entendimento que o acadêmico do Curso de Licenciatura em
Educação Física deve ter ao fazer a leitura do cotidiano pedagó-
gico, ao identificar e relacionar o que é realizado nas aulas que
observa na escola, através do Estágio Curricular Supervisionado
(ecs), com as concepções presentes nas Abordagens Pedagógicas
críticas, pois as mesmas são desenvolvidas e discutidas no de-
senvolvimento da disciplina de Prática de Ensino.
Acreditamos que as referidas Abordagens apontam perspec-
tivas para o ensino de forma crítica, reflexiva e comprometida,
que pode contribuir para a formação integral dos alunos, a fim de
que possam vir a usufruir do conhecimento vivenciado na escola,
37
** Os temas denominados transversais aparecem nos pcn e devem ser tematizados por todas as
disciplinas na escola. Tal abordagem é justificada pela necessidade de se considerar, no contexto
da escola, os temas que envolvem problemas sociais e tratá-los. A abordagem e a discussão dos
mesmos irão contribuir na formação integral do aluno, a fim de que possa exercer sua cidadania
de forma plena. Como temas, são sugeridos: ética, saúde, meio ambiente, pluralidade cultural,
orientação sexual, trabalho e consumo.
54
* De acordo com Coll et al. (2000), os conteúdos são apresentados segundo sua categoria conceitual
(fatos, princípios, e conceitos) e denotam o aprender a saber procedimental (habilidades e
competências produtivas), que é ligado ao aprender a fazer – pesquisar, redigir, construir, jogar,
correr, sacar etc. – e atidudinal (normas, valores e atitudes), relacionados ao aprender a ser e
conviver, o que permite a identificação mais precisa das interações educativas, transformando-se
nas expectativas de aprendizagem.
55
* Também conhecido como Relatório Jacques Delors, foi iniciado em março de 1993 e concluído em
setembro de 1996. Elaborado pela Comissão Internacional sobre a Educação para o século xxi,
foi coordenado por Delors para a Unesco. À sua elaboração procedeu um exercício de reflexão,
identificando tendências e auscultando necessidades no cenário de incertezas e hesitações que se
apresenta. No Relatório são defendidas teses da educação básica à universidade, as quais devem
estar voltadas essencialmente para o desenvolvimento humano.
59
A Educação Física e o
esporte como prática
pedagógica
Neste capítulo, destacamos, inicialmente, o documento elaborado
pela Unesco que trata de questões relacionadas à Educação Física
2
e ao esporte no contexto escolar. Em seguida, focalizamos o es-
porte na escola, destacando seus aspectos educativos tanto no
contexto das aulas de Educação Física – em que o objetivo maior
deve ser o desenvolvimento do conhecimento para todos –, como
no de treinamento esportivo – em que o principal objetivo é a
participação dos alunos em competições escolares. Na sequência,
evidenciamos posicionamentos de estudiosos sobre o esporte,
tanto favoráveis como desfavoráveis, bem como a participação e
a influência da mídia (televisão) na divulgação do esporte e na-
quela exercida sob os alunos e a sociedade. Apontamos também
algumas contradições, semelhanças e diferenças entre o esporte
divulgado pelos meios de comunicação e o esporte da escola e
finalizamos com a abordagem do esporte como conteúdo peda-
gógico da Educação Física escolar.
72
* Todo o texto deste item é uma tradução do documento da Unesco, cuja versão está em espanhol e
pode ser consultada no seguinte link: <http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001284/128496s.pdf>.
73
* Entre outros estudos, destacam-se os de Coletivo de Autores (1992); Betti (1991); Bracht (1992);
Moreira (1992,1995) e Finck (1995).
85
é educativo por si só, pois o educador é quem vai fazer com que
ele seja um objeto e um meio de educação. Ainda, evidencia que
a prática do esporte na escola não pode ter como objetivo princi-
pal formar atletas, sendo que esse pode ser, segundo o autor, um
efeito secundário que não deve ser recusado. Porém, o objetivo
maior do esporte deve continuar sendo a expansão a todos de
suas inúmeras possibilidades de atividades formativas.
Dessa forma, é importante e fundamental que o esporte seja
tratado pedagogicamente de forma mais abrangente nas suas
outras dimensões, entre elas, a histórica, a antropológica, a cul-
tural, a social, entre outras.
O pedagogo (Belbenoit, 1976, p. 143) destaca algumas ideias
relacionando esporte, educação e escola:
• O esporte é a forma mais rica e adaptada ao nosso tempo, um
tipo de “experiência base”, carnalmente vivida, que permite
construir, pela prática e pela reflexão, uma ética de saúde
global, essa expressão prova como o homem dividido de hoje
aspira recuperar sua unidade.
• O esporte é atividade de cultura, na medida em que a noção
formal de equilíbrio entre corpo e espírito é substituída pela
de convergência de todas as tentativas educativas (pois elas
tendem para um objetivo único, e põem em movimento a
totalidade dos poderes humanos), e na medida em que a
saúde psicossomática e o desenvolvimento mental forem
considerados inseparáveis da motricidade; o esporte é cul-
tura porque há cultura onde se encontra, ao mesmo tempo,
há possibilidade de desenvolvimento pessoal e participação
numa prática social significativa.
• O esporte é um instrumento de cultura e de libertação do
homem moderno na medida em que desempenha a função
biológica (filogenética) de preservação da saúde (no sentido
lato do termo) e a função sociocultural de comunicação,
participação e expressão.
86
* Esse termo refere-se à denominação do trabalho realizado pelo professor de Educação Física
nas escolas públicas estaduais do estado do Paraná com o esporte com relação ao treinamento
esportivo visando à participação dos alunos em competições escolares.
87
Sabemos que o esporte não é conteúdo único para ser tratado nas
aulas de Educação Física, bem como seus objetivos não podem ser
direcionados ao rendimento, e sim, para a integração e inclusão dos
alunos no desenvolvimento das atividades esportivas, pois todos
têm direito a ter acesso à vivência e ao conhecimento do esporte.
Em relação aos encaminhamentos metodológicos utilizados para
o desenvolvimento do esporte, observamos que muitos professores
deixaram não só o rendimento e a técnica de lado, mas também
outros aspectos em relação ao seu conhecimento, pois há, muitas
vezes, falta de comprometimento educacional com o seu ensino.
Não há uma sistematização, organização e sequência dos conteú-
dos abordados nas aulas. Assim, não temos equipes esportivas
na escola, pois percebemos que o número de atletas é cada vez
menor, e os alunos também sabem muito pouco sobre o esporte. O
professor que priorizava o ensino de técnicas não sabe mais como
desenvolver o esporte nas aulas de Educação Física, geralmente
aqueles que tiveram uma formação de cunho tecnicista.
Podemos constatar que os professores graduados mais recen-
temente têm uma concepção semelhante ou limitam o ensino em
relação ao esporte abordando suas técnicas e táticas, ou então dão
um enfoque apenas recreativo, tratando o conhecimento deste
fenômeno sociocultural de forma reduzida e fragmentada.
Shigunov (1997) contribui evidenciando alguns pontos conclu-
sivos de uma pesquisa efetivada com professores da rede pública
da cidade de Maringá, no estado do Paraná. O estudo revela que a
prática pedagógica docente está atrelada a um modelo de formação
89
Educação Física
escolar: cotidiano
pedagógico e
formação de
professores
3
Neste capítulo evidenciamos algumas contradições presentes
no cotidiano da Educação Física escolar e os respectivos fatos
que colaboram para o seu delineamento. Em seguida, destaca-
mos alguns estudos sobre o cotidiano na área da educação e da
educação física em que o enfoque dos pesquisadores é bastante
diferenciado. Abordamos também a importância do cotidiano ser
considerado campo de análise e reflexão da prática pedagógica
e do saber docente, visando a perspectivas de melhoria tanto
do processo de ensino-aprendizagem da Educação Física e do
esporte na escola, como em relação às questões que envolvem a
formação de professores.
* Esse termo é utilizado tanto pela maioria dos profissionais da área, pela mídia e também
popularmente, e refere-se àquele que organiza, planeja e estabelece atividades físicas e ou
esportivas de forma personalizada com o objetivo de atender às necessidades específicas de
cada pessoa.
136
* Esses autores seguem a linha marxista. Destacamos alguns de seus estudos: heller, A.
O cotidiano e a história. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989. lefebvre, H. La vida cotidiana en el mundo
moderno. 2. ed. Madrid: Alianza Editorial s/a, 1972; kosik, K. Dialética do concreto. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1976.
137
* No texto intitulado “O saber social da prática docente”, Therrien (1993b) utiliza a expressão saber
de experiência, em vez de saber da experiência, para ressaltar a abrangência do saber construído pelo
professor em sua vida cotidiana e profissional.
146
* Entre os autores que tratam destas questões, citamos: Freire (1989,); Moreira (1992); Coletivo de
Autores (1992); Betti (1992a); Betti (1991); Bracht (1992); Taffarel (1985).
152
* Este seminário ocorre na uepg, sendo um dos locais em que a autora desenvolveu sua pesquisa
de doutorado.
158
Considerações finais
A escola deve ser um espaço democrático do saber e da convivência.
Por meio das diferentes áreas, os alunos devem adquirir conhe-
cimentos, competências, habilidades e experiências em todos os
aspectos cognitivos, motores, afetivos e sociais, a fim de atuarem
no mundo de forma compromissada, responsável e ética.
A Educação Física na escola, na abordagem dos conhecimentos
da cultura corporal de movimento, não pode limitar ou evidenciar
seu encaminhamento teórico-metodológico nos aspectos motores,
mas sim, os demais devem ser tratados pedagogicamente de forma
equivalente, sendo os cognitivos, os afetivos e os sociais.
Nas aulas de Educação Física devem ser possibilitadas situações
de ensino-aprendizagem nas quais os alunos se sintam capazes,
valorizados, possam interagir com seus pares de forma criativa e
cooperativa, sendo de fundamental importância sua participação
na construção dos saberes, visando à sua autonomia e construção
da cidadania.
Nossa caminhada percorrida até aqui amplia a responsabi-
lidade e o comprometimento com as questões que envolvem o
contexto escolar e de formação de professores. Nesse sentido, é
possível instituir com os professores das escolas encaminhamen-
tos metodológicos visando ao redimensionamento do ensino da
Educação Física, buscando o desenvolvimento de um trabalho
mais significativo, comprometido e contextualizado.
Por meio desses encaminhamentos, é de fundamental impor-
tância possibilitar ao acadêmico, futuro professor, confrontar a
teoria estudada/analisada e suas discussões com a realidade da
Educação Física e do esporte, que lhe é mais próxima. Os mesmos
166
Referências
andré, m. e. d. a. Etnografia da prática escolar. Campinas:
Papirus, 1995.
_____. Pesquisa no cotidiano da Escola e o repensar da didática.
Educação e Sociedade, São Paulo, n. 27, p. 84-92, 1987.
azevedo, f. Da Educação Física. São Paulo: Melhoramento,
1960.
barbieri, c. a. s. Esporte Educacional: uma possibilidade para
a restauração do humano no homem. Canoas: Ulbra, 2001.
belbenoit, g. O desporto na Escola. Lisboa: Estampa, 1976.
beltrami, d. m. A educação física Escolar contemporânea:
um estudo sobre o jogo como estratégia pedagógica e seus
fundamentos teóricos metodológicos. 1998. Tese (Doutorado
em educação) – Pontifícia Universidade de São Paulo, São
Paulo, 1998.
betti, i. c. r. Educação Física escolar: a percepção discente.
Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Santa Maria, v. 16,
n. 3, p. 158-167, 1995.
_____. O prazer nas aulas de Educação Física Escolar: a
perspectiva discente. 1992. Dissertação (Mestrado em
educação) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas,
1992a.
betti, i. c. r.; betti, m. Novas perspectivas na formação
profissional em Educação Física. Motriz, São Paulo, v. 2, n. 1,
p. 10-15, jun. 1996. Disponível em: <http://www.rc.unesp.br/
ib/efisica/motriz/02n1/V2n1_art02.pdf>. Acesso em: 18 nov.
2009.
168
Sobre a autora
Silvia Christina Madrid Finck é licenciada em Educação Física
pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), mestre em
Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep)
e doutora em Ciência da Atividade Física e do Esporte pela
Universidad de Léon (Unileon). No Paraná, foi professora e técnica
desportiva da educação básica na rede estadual de ensino, atu-
ando também, na mesma área, em Ponta Grossa. Atualmente é
professora adjunta do curso de Licenciatura em Educação Física,
do Programa de Pós-Graduação – Mestrado em Educação e líder
do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Física Escolar e
Formação de Professores (Gepefe/UEPG/CNPq) na UEPG. Tem
experiência na área de Educação com ênfase em Educação Física
escolar, esporte, metodologia e prática de ensino, estágio cur-
ricular, formação de professores, educação infantil e educação
a distância.
Este livro foi impresso pela
Gráfica Fulana em abril de 2010,
sobre papel offset 90g/m².