O documento descreve a história do mito grego de Narciso, que se apaixonou por sua própria imagem refletida na água e morreu de amor por si mesmo. Também discute a ideia de que a alma humana só encontra equilíbrio quando alcança "o cimo da consciência", onde pensamentos puros e atividades elevadas permitem que o mundo se torne transparente e significativo.
O documento descreve a história do mito grego de Narciso, que se apaixonou por sua própria imagem refletida na água e morreu de amor por si mesmo. Também discute a ideia de que a alma humana só encontra equilíbrio quando alcança "o cimo da consciência", onde pensamentos puros e atividades elevadas permitem que o mundo se torne transparente e significativo.
O documento descreve a história do mito grego de Narciso, que se apaixonou por sua própria imagem refletida na água e morreu de amor por si mesmo. Também discute a ideia de que a alma humana só encontra equilíbrio quando alcança "o cimo da consciência", onde pensamentos puros e atividades elevadas permitem que o mundo se torne transparente e significativo.
Apresentação – Contemplação de Narciso; por Alfredo Bosi
No começo, era o mito. Há diferentes versões da história de narciso, que a mitologia grega nos legou. Mas em todas o núcleo é sempre o mesmo: Narciso era um formoso adolescente, filho dos amores de um deus-rio, Cêfiso, e uma ninfa. Quando nasceu, os pais interrogaram o vidente Tirésias sobre o destino de Narciso, e a resposta foi enigmática: O menino conheceria a velhice se não visse a si mesmo... Chegando à juventude, sua rara beleza despertava paixões ardentes nos que o contemplavam, mas era com frio desdém que ele reagia ao amor de mortais e imortais. Como tantas, a ninfa Eco se apaixonou por Narciso e precisou amargar a mesma decepção: encerrou-se em solitária caverna onde foi definhando até que de sua pessoa não restasse mais do que uma voz que gemia. Então, as jovens desprezadas pediram vingança aos céus: Nêmesis, a justa, as ouviu. Em uma tarde de calor esbraseante, Narciso, fatigado de longas horas de caça, abeirou-se de um riacho para dessedentar- se. No espelho das águas viu sua figura e por ela se apaixonou perdidamente. Nada o demoveria do enleio que o enfeitiçara: quedou-se a contemplar a própria imagem até que a morte o levou para as regiões trevosas banhadas pelo Estige. Junto a essas águas sombrias Narciso não cessa de perseguir sua amada figura. No lugar onde morreu, brotou uma flor a que os homens deram o nome de narciso: bordas cor de sangue tinham suas pétalas amarelas. Narciso foi condenado a fitar para sempre o que não tem substância, o que é puro reflexo tremulando na água, fugidio, impalpável, inacessível, mas nem por isso menos presente e sedutor aos olhos de quem o ama. Duplo sem corpo como o eco a que foi reduzida a pobre ninfa; som que só se produz quando outra voz, viva voz, o emite. Vazios ambos, reflexo e eco, mas forte o bastante para arrastar a um destino nefasto até mesmo os filhos dos deuses. 11. O cimo da alma É impossível dar um sentido à vida, e mesmo aceitar viver, se não se descobriu alguma vez o elevado cimo da consciência onde o pensamento e a vontade buscam se estabelecer, de onde jamais se deveria deixá-los descer, cuja lembrança nos volta ao espírito carregada ao mesmo tempo de saudade e de esperança, e que continua ainda a nos sustentar quando não temos a força de o escalar. Não pode pretender fazer sua morada lá quem não tiver adotado como regra inflexível rechaçar todas as solicitações medíocres, as conversas inúteis e ociosas, os pensamentos do amor-próprio sempre associados a alguma preocupação que nos pesa, a algum interesse que nos distrai. E mesmo assim essa regra não basta: poderíamos segui-la com fidelidade e permanecer, no entanto, num estado de indiferença e secura. O cimo da consciência é uma extremidade brilhante que somente nossa atividade mais pura é capaz de atingir: o menor grão de poeira basta para diminuí-lo e obscurecê-lo; nossa alma não obtêm nesse cimo nenhuma sustentação e logo torna a cair; no entanto, é lá que ela encontra o único equilíbrio que lhe convém, e que é ao mesmo tempo o mais perfeito e o mais instável. E é então, por uma espécie de paradoxo, que a capacidade de nossa consciência se vê exatamente preenchida. Todos os poderes da alma se exercem e se conciliam: mesmo a contrariedade deles, que era um empecilho, aumenta ainda mais a força e a desenvoltura de todos os seus movimentos. A suprema tensão interior coincide com o supremo repouso que nos comunica a própria presença das coisas e dá às mais humildes um extraordinário relevo e uma luz sobrenatural. A intenção é tão simples e correta que o mundo lhe é dócil e parece receber uma significação que a realiza. O que há de dentro do mundo é para nós transparente, enquanto o que há dentro do eu coincide com essa claridade: e a alma está tão acima dos estados que ela sente que estes não são mais capazes de perturbá-la. É no presente, portanto, que se acha situado o cimo da nossa consciência. Mas não sabemos nos manter nele: escusamo-nos dizendo que ele não poderia fornecer um material bastante grande ao nosso pensamento e à nossa ação, e por isso o abandonamos sempre. Queremos esquecer que ele pede um esforço demasiado grande à nossa coragem, e assim nos desviamos para dar à nossa atividade enfraquecida um objeto mais frágil e mais acessível, capaz de distraí-la e que é buscado no passado ou no futuro, isto é, na lembrança ou no sonho. O presente é um cimo de onde avistamos a infinidade do mundo como um oceano sem margens, onde não há porto que possamos alcançar um dia, nem caminho rumo a uma misteriosa distância, que nos escaparia sempre. A infinidade é a negação do fim e, portanto, também do caminho. Ela mesma é o fim e o caminho. Pois a consciência só obtém o equilíbrio e a segurança quando alimenta seu olhar com o infinito, em vez de fazer dele um perpétuo mais além.