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pronominalização
Silas Gutierrez*
RESUMO: Este artigo aborda, brevemente, algumas reflexões sobre o uso do pronome
em revistas para adolescentes. Para isto, serão utilizados os estudos realizados por
Thompson (1998), Antunes (2002) e Ostermann (1994).
Palavras-Chave: pronomes - revistas - leitura
ABSTRACT: This article discusses briefly some thoughts on the use of the pronoun in
magazines for teenagers. For this, we used the studies by Thompson (1998), Antunes
(2002) and Ostermann (1994).
KEYWORDS: pronouns - magazines - reading
*
Coordenador / Professor do Curso de Letras da Faculdade Interação Americana e Mestre em Língua Portuguesa
PUC/SP – frenazo@ig.com.br
desconsiderando os exercícios de interpretação de texto propostos por alguns livros
didáticos que, em muitos casos, apenas reforçam e propagam a prática da leitura
passiva e superficial.
Escolhemos como corpus para este trabalho, a seção Amor de uma revista
feminina para adolescentes intitulada Todateen, por ser um veículo de informação
bastante difundido atualmente entre as meninas de classe média em todo o Brasil e
cujos textos selecionados atendem as necessidades de nossa pesquisa.
A Seção Amor traz dicas de como conquistar, seduzir, sentir prazer sexual e
reagir diante de situações amorosas. É vendida em bancas de jornais de todo o país, é
consumida apenas por adolescentes femininas e sua tiragem mensal é de 200 mil
exemplares
Por meio de uma leitura atenta observamos que a revista promove a crença que
para se conquistar um menino é necessário que todas as garotas aprendam regras. A
Todateen universaliza determinadas situações, para que a mesma seja útil não a uma
menina mas a todas. Isto é comprovado, em grande parte das orações, com o uso de
determinadas expressões como: muitas vezes, é comum, a maioria, todas as meninas,
todos os meninos, os homens não gostam, etc.
Vejamos os exemplos† :
1- Muita gente fica com várias pulgas atrás da orelha e deixa o ciúme aflorar só
de imaginar a pessoa com quem se relaciona andando sozinha por aí
independente.
(Gatinho Adesivo – revista nº 91)
Analisando o exemplo 1, podemos afirmar que por meio de uma leitura crítica,
percebemos que o uso do pronome indefinido muita expressando quantidade
universaliza e consequentemente naturaliza a condição de sentir ciúme. Quando a
revista universaliza uma condição por meio de um pronome ou advérbio disposto na
frase, ela, em realidade, está justificando as regras que posteriormente serão lançadas
e que deverão ser cumpridas.
2- Todo ano é a mesma coisa: quando chega no final do semestre, você começa
a sofrer, pois vai ficar as férias inteiras sem ver o gatinho no colégio.
(Férias! O gato viajou... revista nº 85)
†
Em todos os exemplos os grifos são nossos
Namorando, o uso do você explícito apareceu vinte e duas vezes e seu uso implícito
apareceu vinte vezes, em uma matéria de duas páginas. Um outro aspecto observado,
foi sua repetição na mesma frase, vejamos os exemplos:
3-Mas você precisa ter consciência de que agora ela não vai mais ficar grudada
em você.
(linha 15 – segunda coluna - pág. 70)
4-Já nas situações de alegria você pode achar que ela não precise mais de você.
5- Agora que você já sabe que o sentimento da sua amiga não vai mudar se
você também não mudar com ela, é hora de se preocupar com você.
(linha 3 – segunda coluna - pág. 71)
O uso dos pronomes, neste caso, é usado como uma estratégia de interação
entre sentido e poder. Aqui, podemos incluir a análise da unificação proposta por
Thompson (id).
A unificação é um dos modos pelos quais a ideologia pode operar unindo todos
os indivíduos em um mesmo plano, tentando, a partir disso, construir uma identidade
coletiva.
No caso, a revista faz uso não apenas do pronome você, mas de outros como:
ele, dele, ela, dela de forma muito peculiar. Ao analisarmos esses exemplos em nosso
corpus, percebemos que o uso desses pronomes leva a um padrão de comportamento,
excluindo, possivelmente, qualquer outra alternativa de expressão.
6- Não deixe que ele faça isso com você. Um mês é mais do que suficiente para
que decida se está ou não a fim de manter o namoro. Agora, durante um tempo, não
vale correr atrás dele e pressioná-lo para decidir antes da hora, ok?
(Ele Pediu um Tempo! - revista nº 85)
A língua não existe fora dos grupos sociais, desvinculada das situações de
interação. Desconsiderar esse aspecto é, na verdade, desresponsabilizar o sujeito da
linguagem da criação e manutenção daqueles esquemas ideológicos. Como se
pudesse existir independentemente da ação humana e das atuações verbais que se
empreendem socialmente. Como se, pela linguagem, nada se criasse, nada se
reafirmasse, apenas se emitissem palavras, que podem ser divididas em sílabas, em
morfemas, que têm funções sintáticas. Mas sem causar nenhum efeito, nenhum
impacto, sem deixar nenhum rastro, na mais radical neutralidade. Sem se poder,
portanto, enxergar nenhum responsável pelas coisas que são ditas, na forma em que
são ditas.
A autora segue afirmando que o ato da linguagem com o qual nos referimos às
entidades do mundo, da experiência e de todos os universos possíveis representa mais
que a simples “explicitação léxica” exigida pelo núcleo verbal da oração; ilustra mais
que a escolha da forma sintática de anunciar, de dizer. Representa, sim, um lugar de
onde se fala, numa posição de onde se descortinam aquelas unidades, enfim, o ângulo
de onde nós as vemos.
Concluímos com Thompson (id) que as estratégias de construções simbólicas
são instrumentos capazes de criar e sustentar relações de dominação. São
instrumentos simbólicos, por assim dizer, que facilitam a mobilização do sentido. Mas,
se as formas simbólicas, assim produzidas, são utilizadas para sustentar relações de
dominação ou para subvertê-las, se servem para promover indivíduos e grupos
poderosos ou para miná-los, é uma questão que apenas pode ser resolvida
examinando como essas formas simbólicas operam em circunstâncias sócio-históricas
particulares, como são usadas e entendidas pelas pessoas que as produzem e
recebem nos contextos socialmente estruturados da vida cotidiana.
REFERÊNCIAS