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EAD

Conceitos e Práticas
Sociais Relacionados
à Educação Física
2
Prof.ª Ms. Fernanda Moreto Impolcetto
Prof. Ms. Edson Renato Nardi

1. OBJETIVOS
• Estudar, conhecer e compreender conceitos básicos im-
portantes para a área da Educação Física e Motricidade
Humana.
• Estudar o processo histórico de formação e desenvolvi-
mento destes conceitos na área.
• Reconhecer as diferenças entre algumas práticas sociais
relacionadas à Educação Física.

2. CONTEÚDOS
• Trabalho, tempo livre, lazer e recreação.
• Brincadeira.
90 © História e Teoria da Educação Física

• Jogo.
• Esporte.
• Dança.

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Utilize a linha do tempo indicada no Esquema de Con-
ceitos-chave para o estudo de todas as unidades deste
Caderno de Referência de Conteúdo. Isto poderá facilitar
sua aprendizagem e seu desempenho.
2) Estude os conteúdos apresentados neste CRC conferin-
do as referências apresentadas com as explicações da-
das. Volte à unidade anterior para entender e recordar
os conceitos propostos. Consulte sempre o Glossário de
Conceitos quando surgirem termos que ainda não te-
nham sido completamente assimilados.
3) Leia os livros da bibliografia indicada para ampliar seus
horizontes teóricos. Coteje com o material didático e
discuta a unidade com seus colegas de curso e seu tutor.
4) No decorrer desta unidade, conheceremos o autor
Johann Huizinga. O título do livro desse autor já indica a
importância do jogo na vida do ser humano, pois Homo
Ludens significa "homem que joga, que brinca". Sugeri-
mos que leia essa obra para enriquecer ainda mais seus
conhecimentos.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Na primeira unidade estudamos o processo da formação e
desenvolvimento das atividades físicas ao longo das diferentes fa-
ses da história da humanidade. Nesta unidade estudaremos con-
ceitos básicos fundamentais para a Educação Física e prática so-
ciais relacionadas a área. O conteúdo está voltado basicamente
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para a caracterização destes conceitos a partir da visão de autores


e obras importantes na área.
Ao final desta unidade esperamos que você seja capaz de
reconhecer as principais diferenças entre os conceitos estudados,
tanto do ponto de vista histórico quanto estrutural e que isso o
auxilie na pratica profissional.
Bons estudos!

5. TRABALHO, TEMPO LIVRE, RECREAÇÃO E LAZER

Trabalho e tempo livre


Para entender os conceitos das práticas sociais de recreação
e lazer, é necessário ter clareza quanto à influência que o trabalho
e o tempo livre exercem sobre tais práticas.
Na história do trabalho, verificamos que esse termo (traba-
lho) sempre esteve ligado a uma perspectiva negativa. De acordo
com Aranha e Martins (1993), na Bíblia, por exemplo, Adão e Eva
vivem felizes até que o pecado provoca sua expulsão do Paraíso e
a condenação ao trabalho, como o "suor do rosto". Além disso, a
Eva coube, também, o "trabalho" do parto.
No vocabulário latino, a palavra "trabalho" deriva do subs-
tantivo tripalium, que designa um aparelho de tortura romano,
utilizado na Idade Média, formado por três paus, ao quais eram
amarrados os condenados à morte. Daí, decorre a associação do
trabalho à tortura, ao sofrimento, à pena.
Na Grécia Antiga, o trabalho manual era desvalorizado em
razão de ser feito por escravos, ao passo que os membros da eli-
te, como os filósofos, se dedicavam ao "ócio digno", que, para os
gregos, significava a disponibilidade de gozar do tempo livre e de
cultivar o corpo e o espírito.

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Na Idade Média, Santo Tomás de Aquino procurou reabilitar


o trabalho manual dizendo que todos os trabalhos se equivalem,
apesar de sua construção teórica valorizar a atividade contempla-
tiva (ARANHA; MARTINS, 1993).
Somente na Idade Moderna é que a visão sobre o trabalho
começou a mudar. O interesse pelo trabalho aumentou-se com a
ascensão da burguesia, essa classe social derivada de grupos de
antigos servos acostumados ao trabalho manual que compraram
sua liberdade e passaram a se dedicar ao comércio.
A burguesia nascente, que procurava novos mercados, es-
timulou as navegações e, consequentemente, a descoberta do
"Novo Mundo". Com o aprimoramento do relógio e da bússola e
o aperfeiçoamento da tinta e do papel, surgiram, também, novas
formas de agir e de pensar, que geraram revoluções no comércio
e na ciência.
Enquanto, na Antiguidade e na Idade Média, o saber con-
templativo era privilegiado em detrimento da prática, no Renasci-
mento e na Idade Moderna, ocorre a valorização da técnica, da ex-
perimentação e do conhecimento alcançado por meio da prática.
De acordo com Aranha e Martins (1993), na passagem do feu-
dalismo para o capitalismo, ocorrem profundas transformações na
vida social e econômica da sociedade européia. O capital acumula-
do torna possível a compra de matérias-primas e de máquinas, e as
pessoas passam a vender sua força de trabalho em troca de salário.
O processo de industrialização teve origem na Inglaterra, na
metade do século 18, expandindo-se, rapidamente, pela Europa
e por outros países do mundo, especialmente no século 19. Esse
processo trouxe inúmeras mudanças para o modo de vida da po-
pulação, que, antes, se concentrava no campo e, basicamente, de-
pendia do cultivo de alimentos e da criação de animais para viver.
Com o aumento da produção, os trabalhadores passaram a
ser submetidos a uma nova ordem – a da divisão do trabalho com
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ritmo e hora preestabelecidos, o que gerou o nascimento de uma


nova classe social, denominada "proletariado".

Figura 1 O trabalho no campo.

Figura 2 O trabalho na indústria.

A Figura 2, imagem do filme "Tempos Modernos", interpretado por


Charlie Chaplin, representa a mudança de hábito que ocorreu de-
vido o processo de industrialização.

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Nas indústrias, a rotina dos trabalhadores foi totalmente


alterada em benefício da produção. O aumento da demanda de
produtos industrializados elevou muito a carga horária dos traba-
lhadores. Alguns chegavam a trabalhar por mais de 60 horas sema-
nalmente, seis dias na semana.
A luta dos trabalhadores pelo direito ao tempo livre e descan-
so começou a ser travada na Europa no final do século 19. Tinha o
objetivo de fixar por lei a jornada de trabalho, limitando-a a oito
horas diárias. O que permitiria aos trabalhadores, pelo menos teo-
ricamente, dividir o dia em três períodos iguais, de modo que po-
deriam ser destinadas oito horas ao trabalho, restando ainda oito
horas para o sono e a mesma quantidade para descanso e/ou lazer.
No Brasil essa reivindicação dos trabalhadores teve inicio a
partir de 1903, pelos primeiros sindicatos do país. De acordo com
Carta e Pereira (1984), o aumento das reivindicações trabalhistas
gerou uma grande greve em 1906, iniciada pelos empregados das
ferrovias de São Paulo, que exigiam aumento dos salários, jornada
de trabalho de oito horas e a regulamentação do trabalho das mu-
lheres e dos menores.
Mas essa luta demorou a apresentar resultados. Em 1912
trabalhava-se de doze a treze horas diariamente nas indústrias têx-
teis paulistas. Em 1920 a média da jornada de trabalho no Estado
de São Paulo era de dez horas diárias, seis dias na semana. Em
1932 finalmente os trabalhadores do comércio e das indústrias
conquistaram a jornada de oito horas, fixada pela Constituição
brasileira (CARTA; PEREIRA, 1984).
Na prática, porém, foi preciso lutar pela aplicação da lei.
Mais de cinquenta anos depois categorias inteiras de trabalha-
dores ainda permaneciam à margem da Constituição. Mesmo os
trabalhadores formalmente incorporados ao mercado de trabalho
eram vítimas de manobras que lhes roubavam o tempo livre, como
as horas extras, por exemplo.
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Em 1925 foi instituído por lei o direito às férias remuneradas,


mas apenas de quinze dias por ano. Somente em 1943 o período
de férias foi ampliado para trinta dias. A partir de 1977 os trabalha-
dores poderiam receber em dinheiro dez dias das férias, gozando
assim de vinte dias.
No entanto, muitos trabalhadores eram praticamente obri-
gados a "vender" dez dias de suas férias e cumprir horas extras,
perdendo também o direito ao descanso, situação que acontece
até hoje.
Além de fatores como os citados é preciso considerar ainda,
que o horário de descanso dos trabalhadores muitas vezes é desper-
diçado com transporte e outras práticas cotidianas, com alimenta-
ção, higiene pessoal, tarefas domésticas, entre outras coisas.
Uma pesquisa realizada no ano de 1982 pela Revista Veja,
segundo nos dizem Carta e Pereira (1984), indicava que nas re-
giões onde o transporte era mais fácil, acabam restando menos de
quatro horas para descanso e lazer. Já para quem morava longe do
trabalho, o tempo para descanso e lazer era extremamente pre-
judicado, restando cerca de uma hora e vinte minutos para estas
atividades.
Imaginamos que atualmente essa situação tenha piorado
devido ao aumento da população e consequentemente dos meios
de transporte que circulam nas cidades.
O rápido crescimento das cidades, em decorrência do de-
senvolvimento do país, fez com que grande parte da população
migrasse do campo para formar os grandes centros. Quando os
trabalhadores viviam no campo, o tempo livre era maior em decor-
rência do próprio estilo de vida e trabalho e havia mais opções de
lazer coletivo, como os bailes e festas religiosas.
Nas cidades as formas de distração e lazer passaram a de-
pender de locais coletivos, como parques ou clubes, mas que ge-
ralmente estavam fora do alcance da maior parte da população.

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Apesar das políticas públicas que existem atualmente no


sentido de proporcionar espaços de lazer para a população, mui-
tas pessoas continuam sem acesso a esses locais. Sendo assim, o
tempo livre acaba sendo prejudicado pela falta de opções de lazer
coletivo e de segurança.
Em decorrência disso, as opções individuais de lazer acabam
sendo basicamente descansar em casa, assistir televisão ou usar
a internet, atividades que podem ser consideradas como simples
"recuperação das forças" necessárias para o trabalho.

Lazer e recreação
Para iniciar nossos estudos sobre o lazer e a recreação, pri-
meiro, é preciso ter claro que todos os assuntos ligados a esses
termos são bastante polêmicos. Muitos autores utilizam os termos
"recreação" e "lazer" como sinônimos, ou seja, para designar as
mesmas atividades. No entanto, para alguns deles, há diferenças
claras entre esses conceitos, e, além disso, a questão da ocorrên-
cia histórica do lazer também é bastante discutida.
De acordo com Marcellino (2006), alguns autores conside-
ram que, se os homens sempre trabalharam, também paravam de
trabalhar, havendo, assim, um tempo de não-trabalho, o qual era
ocupado por atividades de lazer. Para outros autores, porém, o la-
zer é fruto da sociedade moderno-urbano-industrial.
Ainda para Marcellino (2006), na verdade, não há um caráter
de rejeição entre as duas correntes, mas, sim, enfoques diferentes,
pois uma aborda a "necessidade de lazer", sempre presente na
história da humanidade, e a outra se detém nas características que
essa necessidade assume na sociedade moderna.
No caso da sociedade brasileira, é a partir do momento que
marca a transição do estágio tradicional para o moderno que se
verifica a ruptura entre a vida e o lazer. Temos, assim, dois estágios
que representam estilos de vida diferentes.
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Na sociedade tradicional, de estilo de vida rural, não havia


uma separação rígida entre as várias esferas da vida humana. Os
locais de trabalho ficavam próximos quando não eram na própria
moradia, a produção era basicamente ligada ao núcleo familiar,
obedecendo-se, assim, ao ciclo natural do tempo. O binômio tra-
balho/lazer não era caracterizado.
Já na sociedade moderna, de estilo de vida urbano, a indus-
trialização acentuou a divisão do trabalho, tornando este cada vez
mais especializado e fragmentado, obedecendo ao ritmo da má-
quina e a um tempo mecânico. Caracteriza-se, portanto, o binômio
trabalho/lazer.
Marcellino (2006) ressalta que, mesmo que esses dois mo-
delos ainda hoje convivam em diferentes regiões do país, os valo-
res veiculados pela indústria cultural, especialmente pelos meios
de comunicação em massa, são os da sociedade moderna-urba-
no-industrial, o que faz que as questões relativas ao lazer sejam
entendidas com base nesses valores hegemônicos.
Partindo dessa segunda ocorrência histórica, Joffre Dumaze-
dier (1975), autor reconhecido pelos estudos desenvolvidos sobre
o lazer, indica que os conceitos de recreação e lazer nasceram nos
Estados Unidos, mas em épocas diferentes.
O conceito de recreação surgiu e se desenvolveu no final do
século 19 à partir do movimento de urbanização norte americano.
Com o fluxo da população do campo para as cidades, as áreas ru-
rais foram transformadas em Parques Nacionais para a preserva-
ção da terra, vegetação e recursos naturais.
Para que as pessoas pudessem circular nos parques sem des-
truí-los e ainda para que pudessem se divertir é que nasce o con-
ceito de recreação: com o propósito de proporcionar distração aos
visitantes e preservar a natureza.
No entanto, com o crescimento da industrialização, este con-
ceito passou a ser insuficiente para designar as necessidades dos

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trabalhadores, de compensar a tensão do trabalho e a necessida-


de de relaxamento.
Surge então o conceito de lazer, que é considerado mais am-
plo que o de recreação, pois inclui a função recreativa e vai além,
pela necessidade de desenvolvimento cultural, descanso e diver-
são.
Dumazedier (1975) indica que existem basicamente quatro
grandes definições de lazer.
A primeira, considerada como a definição mais ampla, con-
sidera como lazer todas as atividades da vida cotidiana, as quais o
indivíduo realiza livremente e com prazer. Neste caso o lazer é um
estilo de vida, onde trabalhar, exercer as obrigações familiares, os
engajamentos sócio-políticos e as atividades religiosas são realiza-
dos com prazer e liberdade.
A segunda definição considera o lazer como o tempo fora do
trabalho, mas inclui as obrigações familiares as atividades sócio-
-políticas e religiosas como atividades de lazer.
Na terceira definição, não são consideradas como atividade
de lazer o trabalho e as obrigações familiares e as atividades sócio-
-políticas e religiosas continuam como atividades de lazer.
Já a quarta definição, defendida por Dumazedier (1975) não
considera como lazer as atividades de trabalho, obrigações fami-
liares e nem as atividades sócio-políticas ou religiosas. Nesta con-
cepção de lazer, estas atividades têm outro tipo de significado para
a sociedade, diferente, por exemplo, do significado da prática de
uma atividade física, da leitura de um livro, de assistir um filme no
cinema, pescar com os amigos etc., nas quais o grau de liberdade
do sujeito envolvido na ação é maior do que nas atividades indica-
das anteriormente. Para exemplificar pensemos no caso do traba-
lho, não é difícil encontrar pessoas que realmente sentem prazer e
satisfação na atividade profissional que exercem, no entanto, será
que esta pessoa tem liberdade para decidir se vai trabalhar hoje ou
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não? Ou a que horas ela vai para o local de trabalho? Para a maio-
ria da população este grau de liberdade não existe, a opção em
deixar de ir ao trabalho pode acarretar sérias consequências, dife-
rente da liberdade que se tem para fazer outras atividades como
uma caminhada ou encontrar os amigos para uma conversa.
De acordo com esta quarta definição, a recreação é uma fun-
ção do lazer, responsável pela diversão durante a atividade reali-
zada, além das funções de descanso e desenvolvimento, que tam-
bém são a ele atribuídas.
Dumazedier (1975) apresenta ainda quatro conceituações
de tempo que tem relação com o lazer:
1) Tempo ocioso: corresponde a ausências de trabalho e é
escolhido pelo indivíduo.
2) Tempo desocupado: é o tempo da pessoa desemprega-
da, geralmente em virtude da situação econômica do
meio social em que vive, que não dá conta de manter
todos os cidadãos empregados.
3) Tempo liberado: tempo resultante do trabalho produti-
vo, quando o processo de produção é maior e o tempo
dedicado a ele é menor.
4) Tempo livre: resulta do tempo liberado.
Concluímos que para Dumazedier (1975) o lazer acontece
justamente no tempo livre, ou seja, no tempo liberado em virtude
do trabalho cumprido e pressupõe ainda a ausência das obriga-
ções domésticas, sócio-políticas e religiosas.
Vale a pena ressaltar que optamos por apresentar as defini-
ções de lazer de um autor reconhecido na área pelos estudos que
desenvolveu. No entanto, não significa que todos concordem e que
estas sejam verdades absolutas. Você pode adotar outro tipo de
concepção em relação a este conceito concordando parcialmente
com as ideias aqui apresentadas ou não. No entanto, para efeito
de formação profissional é necessário que estes conhecimentos
sejam compreendidos, pois são reconhecidamente relevantes.

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100 © História e Teoria da Educação Física

A seguir teremos contato com a concepção de outro autor,


que aponta algumas características comuns para as atividades de
lazer.

Atividades de lazer
Consideremos as seguintes situações: uma caminhada a pé
no parque, um jogo de futebol com os amigos, assistir uma pales-
tra sobre um tema de interesse pessoal, cuidar do animal de esti-
mação, lavar o carro, ir a um ginásio assistir um jogo de basquete,
viajar no final se semana.
Quais características estas atividades tem em comum que
permitem classificá-las como atividades de lazer?
Para Camargo (1986) qualquer atividade de lazer possui as
seguintes características: escolha pessoal, gratuidade, prazer e li-
beração.
Na verdade, em relação a primeira característica já podemos
questionar: as atividades de lazer são totalmente voluntárias? Pois
sabemos que mesmo indiretamente existe influência da mídia,
além de pressão cultural, social e das possibilidades econômicas.
Ir a um bar tomar chope com os amigos pode ser sugestão de um
comercial de tevê ou pressão dos próprios amigos. Assistir a uma
exposição badalada pode ser uma imposição, clara ou velada, de
cultura do meio social em que se vive. Ou falta de dinheiro para
alugar um iate (CAMARGO, 1986, p. 10).

Deste modo, o que existe é um grau de liberdade maior nas


escolhas das atividades de lazer se comparadas às que se faz, por
exemplo, no trabalho, no cotidiano familiar, na vida sócio-política
e religiosa.
Um trabalhador decide com maior liberdade como ocupar
seu tempo depois do trabalho, pode optar, por exemplo, em ir
para casa assistir televisão ou sair com os amigos, mas a rotina
diária na empresa geralmente é determinada por outras pessoas.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 101

O mesmo acontece em relação às atividades sócio-políticas


e religiosas, pois é tarefa difícil tentar convencer o partido polí-
tico a mudar as estratégias de ação ou o padre ou pastor sobre
alterações no culto religioso. Assim, nestas atividades o grau de
liberdade é menor, pois as questões básicas geralmente já estão
determinadas por superiores.
No caso das obrigações domésticas acontece a mesma coisa.
Uma pessoa pode ter prazer em cuidar da casa, fazer comida e
lavar as roupas, mas ela tem escolha se pode ou não fazer isso e
quando?
Sendo assim, por livre escolha no lazer, podemos entender
a existência de um tempo valioso no qual se pode exercitar com
mais criatividade as alternativas de ação ou participação.
A segunda característica do lazer indica que ele é gratuito e/
ou desinteressado. Camargo (1986), no entanto, aponta que o la-
zer nunca é inteiramente gratuito, pois toda ação obedece a algum
tipo de interesse, mesmo que disfarçado.
As atividades de lazer apenas podem ser consideradas mais
desinteressadas, por exemplo, que um ato da rotina profissional,
no qual o indivíduo tem o objetivo explicito da remuneração. O
lazer é um momento onde se pode exercitar mais o fazer por fazer,
sem a intenção de um ganho financeiro ou a necessidade de se
pagar um preço fixo.
O prazer é indicado como a terceira característica das ativi-
dades de lazer. Na verdade, é mais coerente afirmar que em toda
escolha de lazer, existe o princípio da busca pelo prazer. Nas pala-
vras do autor:
Que prazer existe em pular e gemer sob as ordens de um instru-
tor inspirado por técnicas de crueldade inimagináveis? Onde está o
prazer do indivíduo entediado ao final de uma noite de farra, diante
de um copo vazio? E o que dizer dos torcedores do time derrota-
do, tristes e de bandeira enroladas à saída do estádio? (CAMARGO,
1986, p. 12).

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102 © História e Teoria da Educação Física

Assim sendo, ainda que a atividade possua característica de


esforço existe o princípio da busca pelo prazer e a finalidade será o
relaxamento, a sensação agradável ou mesmo o tédio.
A última característica do lazer e talvez a mais óbvia é a li-
beração, ou seja, a atividade desempenhada que sempre busca
compensar ou substituir algum esforço que a vida cotidiana im-
põe, como liberação de fadiga e reposição das energias.

Classificação das atividades de lazer


Estudaremos agora a classificação das atividades de lazer
elaboradas por Dumazedier (1975) e Camargo (1986). Na classi-
ficação do primeiro autor existem cinco categorias de atividades
de lazer: físicas, manuais, intelectuais, artísticas e sociais. Camargo
(1986) utiliza estas mesmas categorias e acrescenta uma a qual
denomina de atividades turísticas de lazer. Vejamos:
1) Atividades físicas de lazer: são praticadas com o objetivo
principal de exercitar-se fisicamente e secundariamente
existe o interesse estético e associativo. São atividades
realizadas de modo formal ou informal, em espaços pla-
nejados (como academias) ou não (nas ruas, na praia).
Caminhada, ginástica, prática de esportes, dança e ou-
tras atividades físicas fazem parte desta categoria.
2) Atividade manuais de lazer: estão ligadas ao prazer de
manipular, explorar e transformar objetos ou elementos
da natureza, como por exemplo, a manipulação de ma-
teriais naturais, cuidar do jardim, fazer tricô ou crochê,
lavar o automóvel, desmontar e montar objetos etc.
3) Atividades artísticas de lazer: estão relacionadas ao in-
teresse artístico, a busca do imaginário, do sonho, en-
cantamento etc. Assistir ou praticar teatro, ir ao cinema,
as artes plásticas, a pintura, ir a festas, são exemplos de
atividades artísticas de lazer.
4) Atividades intelectuais de lazer: referem-se às atividades
praticadas em busca de conhecimento, informação e apren-
dizagem, como leitura de livros, publicações especializadas,
jornais, revistas, assistir televisão, entre outras coisas.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 103

5) Atividades associativas de lazer: em qualquer atividade


de lazer pode existir um forte conteúdo de sociabilidade,
mas as atividades associativas de lazer estão relaciona-
das à satisfação do interesse cultural centrado no conta-
to com as pessoas, como brincar com os filhos em casa,
passear com a família e amigos e frequentar associações
e movimentos culturais.
6) Atividades turísticas de lazer: são praticadas com inte-
resse pela mudança de paisagem, ritmo e estilo de vida.
Por exemplo, ir à praia, ao campo, lugares históricos,
ranchos de pescaria, sítios etc.
Camargo (1986) indica que em todas estas áreas do lazer,
são possíveis três tipos de atitudes: praticar, assistir ou estudar o
assunto. Geralmente o que se observa é a combinação de pelo
menos duas destas atitudes, como ir ao museu para assistir a ex-
posição e adquirir conhecimento sobre o assunto.
Mas atividades como pescar, jogar futebol e praticar jardi-
nagem, por exemplo, podem ser consideradas como atividades de
lazer em qualquer situação e para todas as pessoas? Mesmo para
o jogador profissional, o pescador e o jardineiro que dependem
destas práticas como meio de vida?
Neste sentido, Marcelino (1994) indica que, na verdade, o
entendimento do lazer não pode ser estabelecido apenas a partir
do conteúdo da ação, pois ele não se constitui como condição su-
ficiente para a conceituação do lazer.
Mesmo porque, uma atividade que pode ser muito atraente
para determinada pessoa pode não ser a outra, representando até
mesmo desconforto ou tédio.
Sendo assim, as circunstâncias que cercam o desenvolvi-
mento das atividades são básicas para a concretização das mes-
mas e dois aspectos podem ser destacados como fundamentais
para conceituar as atividades de lazer: o tempo e a atitude, que
devem ser combinados para a uma conceituação adequada.

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O aspecto da atitude está relacionado basicamente a satis-


fação provocada pela atividade no indivíduo, ou seja, pelo tipo de
relação estabelecida entre a pessoa e a experiência vivida. Jogar
futebol nos finais de semana com os amigos possui o mesmo sig-
nificado de treinar todos os dias, com horário estabelecido, para
conseguir a vitória contra outra equipe no final de semana pelo
campeonato estadual? Vai depender da atitude e satisfação da
pessoa em relação à atividade, mas treinar todos os dias da sema-
na em virtude de um contrato assinado com determinada equipe
imprime um caráter de obrigatoriedade, que certamente não exis-
te numa "pelada" com os amigos.
Já o aspecto tempo indica que somente as atividades desen-
volvidas no tempo liberado do trabalho, ou no tempo livre, são
consideradas como lazer, excluindo ainda, as obrigações familia-
res, sócio-políticas e religiosas. Questão já abordada anteriormen-
te na definição de lazer indicada por Dumazedier (1975).

Atividade de lazer: prática X consumo


Uma questão muito discutida na área do lazer diz respeito a
prática e ao consumo destas atividades. Sem dúvida, as condições
sociais e econômicas favorecem muito mais o consumismo que a
prática efetiva das diversas atividades de lazer.
Mas a apologia que se faz à necessidade da prática, geral-
mente vem acompanhada da crítica ao consumo passivo. No en-
tanto, considerando as atividades de lazer, o que podemos enten-
der por passividade e atividade?
Assistir televisão, por exemplo, pode ser considerada como
uma forma de lazer passivo? Então fazer uma caminhada é exercer
um lazer ativo em comparação a assistir um filme no cinema?
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Figura 3 Assistir televisão - lazer ativo ou passivo?

Marcelino (1994) indica que a atividade ou passividade em re-


lação ao lazer, também depende da atitude que o indivíduo assume.
Deste modo, tanto a prática como o consumo poderão ser ativos ou
passivos, dependendo dos níveis de participação que a pessoa en-
volvida assume, os quais Dumazedier (1975) classifica em elementar
ou conformista, médio ou crítico e superior ou inventivo.
No caso de assistir televisão, por exemplo, o indivíduo tem a
possibilidade de escolher outro canal, outro programa e até mes-
mo desligar a televisão. Para Camargo (1986) o lazer passivo não
existe, pois mesmo quando uma pessoa está deitada numa rede
descansando, existe atividade mental. O autor indica ainda, que
um dos grandes problemas na verdade, está relacionado ao ex-
cesso de consumo das obras de outras pessoas e pouca produção
própria.
Sem dúvida a indústria cultural ganha cada vez mais espaço
devido às dificuldades econômicas da maior parte da população,
fator que contribui para o aumento do consumo, principalmente
dos programas da televisão aberta.
E aqui temos duas questões importantes: se por um lado a
necessidade do estímulo para o consumo rápido faz com que o ní-
vel da maioria dos programas veiculados seja básico ou até mesmo

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106 © História e Teoria da Educação Física

baixo, por outro, os meios de comunicação em massa são grandes


responsáveis pela divulgação das atividades de lazer para grande
parte da população (MARCELINO, 1994).

O contexto histórico do lazer e da recreação no Brasil


Já estudamos como os conceitos de recreação e lazer foram
concebidos por Dumazedier (1975), que a eles atribui origem nos
Estados Unidos, a partir do movimento de urbanização e de indus-
trialização desse país.
Estudaremos, agora, o contexto histórico do surgimento das
práticas sociais de recreação e lazer no Brasil.
De acordo com Werneck (2003), dicionários etimológicos de
latim-português apresentam vários termos de mesma raiz que po-
dem ter originado a palavra "recreation" no inglês e "recreação"
no português, como, por exemplo, recreator (o que restabelece,
que é reparador, renovador, restaurador) e recreo (reproduzir, re-
parar, restabelecer, restaurar, renovar, recrear, deleitar, alegrar, di-
vertir, distrair).
No entanto, a palavra "recreação" não era utilizada no vo-
cabulário corrente da língua portuguesa do século 19. Mas, nes-
se contexto, já eram empregados os termos "jogo" e "recreio" ou
mesmo "jogos de recreio", relacionados ao brincar e ao prazer,
destacando-se os efeitos de recuperação, restabelecimento e re-
generação que sua vivência proporcionava, especialmente para as
crianças.
Esses jogos passaram a integrar os sistemas de ensino e outras
instituições não-formais de educação, sendo vistos como atividades
revestidas de grande potencial pedagógico. Werneck (2003) indica
que os "jogos de recreio" faziam parte dos programas de "ginástica"
dos alunos e das alunas de seis a 13 anos da Escola Normal do Brasil,
criada em 1835. Em meados do século 20, outros estados brasileiros
passaram a incluir jogos, danças e brincadeiras infantis em seus cur-
rículos como conteúdo da ginástica nas escolas.
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Foi nesse momento que os jogos e as brincadeiras, dentre


outras práticas que possibilitavam o recreio e o divertimento das
crianças, passaram a ganhar uma preocupação pedagógica nas ins-
tituições formais de ensino. Portanto, foi essa dimensão educativa
que constituiu as bases do que convencionalmente se denomina
"recreação" em nosso país, ultrapassando, assim, o sentido etimo-
lógico do termo, relacionado, apenas, ao restabelecimento, à dis-
tração ou à diversão.
Entretanto, considerando o entendimento de recreação cor-
rente na educação física brasileira, verificamos uma concepção
bem diferente, ao menos no contexto escolar, baseada na confor-
mação cultural e na prática irrefletida.
Werneck (2003) indica que artigos publicados na década de
1920 não são muito diferentes dos atualmente publicados nessa
temática. Ainda hoje, a ênfase incide sobre a sistemática operacio-
nal de jogos e brincadeiras, o que dificulta a ação-reflexão-ação,
bem como a apropriação sensível, criativa, contextualizada e crí-
tica das diversas práticas culturais que podem ser trabalhadas na
Educação Física escolar.
A análise de artigos publicados na década de 1920 e em da-
tas posteriores aponta que a história da "recreação" se confunde
com a própria história da Educação Infantil no âmbito escolar. Os
jogos representavam, na época, uma nova forma de educar e de
exercitar o corpo das crianças. Assim, a recreação no contexto es-
colar estabeleceu grandes vínculos com a Educação Física desde as
primeiras décadas do século 20.
Nos sistemas formais de ensino, os saberes privilegiados nas
ações pedagógicas relacionadas à recreação foram os chamados
"jogos motores", as atividades rítmicas e as dramatizações, dentre
outros conteúdos que eram desenvolvidos por professores especia-
listas ou pelas próprias professoras regentes do ensino primário.
De acordo com Werneck (2003), por ser considerados alta-
mente educativos, esses conteúdos acabaram constituindo a es-

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108 © História e Teoria da Educação Física

sência dos programas de Educação Física Infantil com o objetivo de


promover determinadas habilidades, como: destreza, concentra-
ção, sociabilização, espírito de equipe e respeito às regras.
Essas questões nos levam a pensar que os significados de
"Educação Física Infantil", "recreação" e "jogos" acabaram se mis-
turando nos programas elaborados para as crianças do ensino for-
mal, o que indica o porquê de a recreação ser, por muitas pessoas,
tratada como se fosse um dos conteúdos que integram os progra-
mas de Educação Física do ensino primário, ou seja, convencio-
nou-se chamar "recreação" os jogos e outras vivências culturais
desenvolvidos no contexto escolar, especialmente nas aulas de
Educação Física para crianças (WERNECK, 2003).
Já a origem etimológica da palavra "lazer" é do latim licere/licet,
que significa "ser lícito, ser permitido, poder, ter o direito" (WERNECK,
2003, p. 32). Sua existência foi documentada em várias obras da Anti-
guidade, e o termo foi criado pelos romanos como um direito conce-
dido aos escravos para a realização de atividades voluntárias.
Como visto anteriormente, alguns autores que procuraram
analisar o lazer nas sociedades antigas indicam seu entendimen-
to como "não-trabalho", como ócio na condição de privilégio das
classes nobres ao longo da história da humanidade. Mas essa visão
não é consensual, pois muitos pesquisadores consideram que a
origem do lazer se situa nas modernas sociedades urbano-indus-
triais, como Dumazedier (1975).
Foi no final do século 19 que o lazer passou a ser compreen-
dido como um tempo subtraído do trabalho, um tempo excedente,
liberado, próprio para fugir da rotina, para compensar frustrações,
descansar ou divertir. Por essa razão, o aspecto "tempo" é visto
como determinante para a ocorrência do lazer na modernidade,
instigando a classe proletária a lutar pela conquista do direito à
limitação da jornada de trabalho, dentre outras garantias sociais.
Segundo Dumazedier (1979 apud WERNECK, 2003, p. 39), a
inevitável redução da jornada de trabalho provocou a esperança
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 109

e, também, a inquietude dos reformadores sociais, preocupados


com o seguinte dilema: "O tempo liberado será utilizado para o
florescimento ou para a degradação da personalidade?".
Tal inquietação enfatizou a necessidade de se organizar os
lazeres como uma condição fundamental para a diminuição do
tempo de trabalho. No entanto, essa necessidade foi articulada
pelos segmentos hegemônicos (as elites econômicas), e não pelos
próprios trabalhadores que realizavam suas reivindicações.
Werneck (2003) indica que, ao invés de se entregar ao ócio,
ao alcoolismo, aos jogos de azar e a outros vícios, os trabalhadores
deviam ocupar o tempo liberado do trabalho com atividades saudá-
veis, educativas e socialmente úteis, fazendo um "bom uso" dele.
Desse modo, sendo o lazer concebido pelos segmentos he-
gemônicos como uma fração de tempo subtraída do trabalho, ele
deveria ser preenchido com propostas capazes de, ao mesmo tem-
po, recrear, relaxar e educar os operários, que, por sua vez, recu-
perariam as energias despendidas no trabalho.
As primeiras propostas institucionais fundamentadas na recrea-
ção foram justamente difundidas nessa época e em várias cidades,
com o propósito de educar, especialmente, as crianças e os jovens.
Com o êxito alcançado pelos órgãos públicos, o trabalho de re-
creação desenvolvido foi concebido como uma alternativa que, gra-
ças ao seu potencial educativo, deveria ser estendida aos trabalha-
dores adultos. Foi nesse momento que ocorreu, em muitos países,
uma aproximação entre o lazer, concebido como um tempo ocioso, e
a recreação, que poderia promover a organização desse tempo com
atividades recreativas "saudáveis e educativas" (WERNECK, 2003).
Com isso, a Educação Física tornou-se um elemento indispen-
sável das propostas de recreação organizadas para os trabalhadores
assalariados, auxiliando na recuperação da força de trabalho.
Nessa época, as contribuições que a prática de esportes e a
ginástica proporcionavam à saúde já eram conhecidas, como, por

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110 © História e Teoria da Educação Física

exemplo, aumentar a capacidade funcional do operário e contri-


buir para a formação de hábitos morais e para a educação higiêni-
ca da população, dentre outros benefícios.
Werneck (2003) destaca que era preciso conduzir o traba-
lhador que produzia e desenvolvia os bens públicos a algo que pu-
desse distraí-lo e que o fizesse esquecer, mesmo que por alguns
instantes, de sua rotina de trabalho. Desse modo, seria mais fácil
promover a paz e a harmonia social, pressupostos básicos para a
manutenção da situação almejada pelos patrões e pelo governo.
Apesar dos interesses implícitos em tais propostas, convêm
ressaltar que elas também geraram benefícios para os trabalhado-
res, pois, com os projetos, foram criadas condições, como infraes-
trutura física e material adequado, além da ação de profissionais
qualificados, proporcionando às classes populares o acesso a uma
variedade de conteúdos culturais, cujas vivências, até então, eram
reservadas apenas às classes privilegiadas.
Mesmo reconhecendo o valor dessas propostas institucio-
nais, de acordo com Werneck (2003), elas nos indicam que o lazer
foi – e ainda é – utilizado com finalidades políticas e ideológicas.
Nesse sentido, o lazer pode constituir-se uma estratégia de mani-
pulação e de controle social, que faz parte de projetos excludentes
e alienantes que precisam ser discutidos, refletidos e enfrentados,
inclusive na formação do profissional da Educação Física, cujas
ações estão relacionadas à área do lazer e da recreação.
Com base no que foi estudado sobre as origens da recreação
e do lazer no Brasil, podemos concluir que, assim como Dumaze-
dier (1975) faz uma distinção entre esses termos e a eles atribui
uma ascendência norte-americana, também aqui, no Brasil, essas
práticas sociais, apesar de estabelecerem inúmeras relações, pos-
suem uma construção histórica, social, política, cultural e educa-
cional completamente diferente.
Enquanto a recreação foi moldada com as contribuições da
Pedagogia e da Educação Física, o lazer foi impulsionado pela sis-
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 111

tematização de reflexões sociológicas, como o tempo produzido


em função de conquistas dos trabalhadores, por exemplo. E é jus-
tamente na organização do tempo de lazer que as duas práticas
se encontraram, quando a recreação passou a ser utilizada para
promover a organização racional do tempo dos trabalhadores e
concebida como um eficiente meio de educação.
De acordo com Werneck (2003), é preciso considerar que
os sentidos de um termo podem ser transformados ao longo do
tempo. Em relação à recreação, diversos conteúdos, mesmo sendo
vistos como instrumentos de educação, muitas vezes, foram de-
senvolvidos, apenas, com base no enfoque técnico-operacional,
desvinculados de reflexões sistematizadas capazes de conceber
o patrimônio cultural das atividades de recreação como vivências
socialmente e culturalmente construídas em nosso contexto.
Entendemos que esse aspecto precisa ser superado com ur-
gência, por meio de aprofundamentos teóricos e práticos sobre
as práticas da cultura corporal, para conseguirmos avançar em
relação ao que tradicionalmente se entende por "recreação", de
modo que aconteça uma substituição da simples reprodução pela
produção cultural.
Em relação ao lazer, Werneck (2003) aponta para a neces-
sidade de aprofundar os conhecimentos, de modo que eles pos-
sam contribuir para uma formação mais ampla dos profissionais
da Educação Física com base em conhecimentos políticos, sociais
e pedagógicos mais sólidos, necessários para enfrentar muitas das
contradições presentes em nossa sociedade.
Há, também, a necessidade de discutir de modo mais apro-
fundado as concepções de lazer como direito social e como produ-
to comercializado na sociedade.
O direito ao lazer vem sendo cada vez mais confundido com
o consumo de bens e de serviços ofertados pela indústria cultural
e restritos a uma minoria, como, por exemplo, parques temáticos,
clubes particulares, pacotes turísticos, hotéis etc.

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112 © História e Teoria da Educação Física

Os cidadãos que se dedicam à produção dos bens na socieda-


de deveriam ter, também, o direito de usufruir da riqueza que ajuda-
ram a construir. É nesse contexto que o lazer não pode ser encarado
como uma fração isolada da vida, mas como parte integrante de um
projeto de sociedade comprometido com as inclusões social, cultu-
ral, política, educacional, dentre outras (WERNECK, 2003).

6. BRINCADEIRA E JOGO
Existem diversos autores que conceituam as práticas de brin-
cadeira e jogo, e por isso, é possível encontrar muitas definições,
mas poucos consensos.
Deste modo optamos pelas definições da Sociologia do
Esporte (HELAL, 1990) por acreditarmos que elas indicam as ca-
racterísticas mais marcantes destas práticas, ainda que não seja
possível esgotar as suas possibilidades. O mais importante é que
você entenda o que é uma brincadeira ou jogo, seja capaz de citar
exemplos destas atividades e identificá-las nos diversos ambientes
em que ocorrem ou podem ser desenvolvidas.
A Sociologia do Esporte faz uma clara distinção entre brin-
cadeira, jogo e esporte, atividades que de certo modo se asseme-
lham e inter-relacionam. A brincadeira é caracterizada como uma
atividade:
1) Espontânea.
2) Voluntária.
3) Que não possui regras fixas.
4) Busca prazer e diversão.
5) Completa em si mesma.
Já o jogo:
1) Possui regras fixas.
2) É menos espontâneo.
3) Busca prazer e diversão.
4) É completo em si mesmo.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 113

Verifica-se que a principal diferença entre brincadeira e jogo


são as regras. No jogo constatamos a existência de uma sistemati-
zação de regras fixas, ausentes na brincadeira.
Em relação às semelhanças, tanto o jogo quanto a brincadei-
ra são realizados com finalidade de busca por prazer e diversão.
Além disso, são atividades completas em si mesmas, ou seja, não
dependem do resultado de outra atividade para acontecer, assim
como não são necessárias para que outras aconteçam. A brinca-
deira e jogo esgotam-se em si mesmos, não geram preocupação
com resultados ou recompensas extrínsecas como prêmios, di-
nheiro ou fama.
A partir da compreensão das principais diferenças entre a
brincadeira e o jogo, aprofundaremos agora os nossos estudos nas
características do jogo.

Características do jogo
Além da conceituação da Sociologia do Esporte vista ante-
riormente, estudaremos as características do jogo de acordo com
outros autores. Dois deles, Huizinga e Caillois, apesar de não se-
rem da área da Educação Física, realizaram estudos sobre o jogo
que são utilizados em diversas áreas.
Johann Huizinga (1980) na obra Homo Ludens apresenta um
inventário das características do jogo, por ele selecionadas.
O autor aponta como primeira característica do jogo o fato
de ser uma atividade voluntária e livre, que se sujeita a ordens,
deixa de ser jogo, pois perde a liberdade. De acordo com Huizinga
(1980), para o indivíduo adulto e responsável, o jogo é uma ativi-
dade que poderia ser facilmente dispensada, por ser algo supér-
fluo. Porém, o prazer por ele provocado é que o transforma numa
necessidade. Por não possuir um caráter de obrigatoriedade nem
imposição por necessidade física ou dever moral, é possível que
seja adiado ou suspenso em qualquer momento, sendo sempre
praticado nos momentos livres ou nas "horas de ócio".

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114 © História e Teoria da Educação Física

A segunda característica está relacionada o fato de o jogo pro-


mover uma evasão da vida real, pois não pertence à vida "corrente",
trata-se de uma transferência para uma esfera temporária de ativi-
dade com orientação própria, como um "faz de conta". Cabe salien-
tar que esta característica exprime certo sentido de inferioridade do
jogo em relação à realidade (basta comparar o jogo ao trabalho, por
exemplo, qual é considerado mais sério pela sociedade?) o que não
impede, todavia, que ele se processe com uma grande dose de se-
riedade. Observamos isto quando vemos o quanto um simples jogo
é capaz de absorver inteiramente um jogador.
Huizinga (1980) aponta como uma das características for-
mais do jogo o fato dele ser desinteressado. Por situar-se como
uma atividade temporária, com finalidade autônoma, o jogador,
ao praticá-lo, tem em vista uma satisfação que consiste na pró-
pria realização do jogo, o que o faz apresentar-se como se fosse
um momento de intervalo da vida cotidiana. Com essa qualidade
de distensão regularmente verificada, ele assume a condição de
parte integrante da vida e, na medida em que exerce a função de
ornamentá-la e ampliá-la, torna-se uma necessidade tanto para o
indivíduo, quanto para a sociedade, devido ao sentido que carrega
enquanto função cultural.
Por distinguir-se da vida cotidiana, tanto por sua duração
quanto pelo lugar que ocupa, a terceira de suas características
principais é o isolamento, a limitação. Pois é praticado dentro de
certos limites de tempo e espaço e possui um caminho e sentido
próprios. Diretamente ligada a esta, aparece outra característica
interessante do jogo: ser um fenômeno cultural, que é transmitido
pelas gerações e torna-se tradição.
Segundo o autor a limitação no espaço é mais explícita que
a limitação no tempo, pois todo jogo acontece em um campo pre-
viamente delimitado, seja de maneira material ou imaginária, deli-
berada ou espontânea. Desta forma, a quadra, a arena, a mesa de
jogo, o campo de tênis etc. possuem todos a forma e a função de
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 115

espaços de jogo, isto é, lugares sagrados, proibidos, isolados, cujo


interior é regido por determinadas regras. Tais elementos propor-
cionam ao jogo uma ordem específica e absoluta e lhe atribuem
mais uma característica: a criação da ordem.
Introduz na confusão da vida e na imperfeição do mundo uma per-
feição temporária e limitada, exige uma ordem suprema e absoluta:
a menor desobediência a esta "estraga o jogo", privando-o de seu
caráter próprio e de todo e qualquer valor (HUIZINGA, 1980, p. 13).

Para o autor, o jogo encontra-se diretamente ligado ao do-


mínio da estética e lança como que um feitiço sobre as pessoas,
fascinando e cativando. O elemento de tensão desempenha um
importante papel no jogo, pois seus participantes empenham-se
em levá-lo até o desfecho, o sentimento de incerteza e acaso por
ele provocado faz com que o jogador tenha o desejo de que al-
guma coisa aconteça. Ele pretende sair vencedor a custa de seu
próprio esforço.
Este elemento de tensão predomina nos jogos solitários
de destreza e aplicação, como o tiro ao alvo, os quebra-cabeças,
os jogos de armas entre outros. Quanto mais estiver presente o
elemento competitivo, mais apaixonante se tornará o jogo, pois
quanto maior for o nível de dificuldade maior será a tensão e a
satisfação do jogador ao obter o resultado desejado. Os níveis de
tensão chegam ao extremo nos jogos de azar e nas competições
esportivas e lhe conferem certo valor ético na medida em que são
colocadas à prova as qualidades do jogador, que apesar de objeti-
var sempre ser o vencedor, deve obedecer às regras do jogo.
As regras, por sua vez, são apontadas como um fator muito
importante para a conceituação do jogo. Considerando que todo
jogo possui regras e que são estas que determinam o que vale ou
não no contexto do jogo, Huizinga (1980, p. 14) classifica-as como
absolutas e não passíveis de discussão, pois a desobediência às re-
gras implica na ruína do mundo dos jogos: "O jogo acaba: O apito
do árbitro quebra a feitiço e a vida 'real' recomeça".

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116 © História e Teoria da Educação Física

No entanto, esta característica indicada por Huizinga parece


estar mais relacionada ao esporte moderno do que ao jogo, pois,
diferentemente do primeiro, no segundo existe a possibilidade das
regras serem modificadas e/ou adaptadas por seus praticantes já
que não se trata de uma atividade com caráter profissional como o
esporte. Inclusive nas aulas de Educação Física este fato é frequente,
os jogos podem ser adaptados, por exemplo, em função do espaço
e materiais disponíveis, por um simples acordo entre os alunos ou
mesmo pelo professor que almeja atingir algum objetivo pedagógi-
co como aumentar a motivação, incluir todos os alunos etc.
Outro fator interessante motivado pelo jogo ocorre a respei-
to das comunidades de jogadores, que geralmente tendem a tor-
nar-se permanentes, mesmo depois de acabado o jogo. Daí deriva
a existência dos clubes e associações dos jogos e esportes mais
variados.
Por fim, Huizinga (1980) aponta que o caráter mais especial e
excepcional do jogo é ilustrado pelo ar de mistério que frequente-
mente o envolve. No mundo do jogo, as leis e convenções da vida
cotidiana perdem a validade, nele somos diferentes e fazemos coi-
sas diferentes, o que os outros fazem "lá fora" não tem importân-
cia. Este afastamento temporário do mundo "real" é inteiramente
manifesto no mundo infantil e pode ser percebido também nos
grandes jogos rituais dos povos primitivos.
Resumindo, as principais características do jogo para Huizin-
ga (1980) são:
1) Atividade voluntária, livre.
2) Promove evasão da vida real.
3) É desinteressado.
4) Possui isolamento, limitação no tempo e espaço.
5) Cria ordem.
6) Gera tensão.
7) Possui regras fixas.
8) Promove a formação de grupos sociais.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 117

Outro grande autor reconhecido por escrever sobre os jogos,


Roger Caillois (1979), discutiu em um de seus trabalhos a classifi-
cação dos jogos realizada por Huizinga na obra Homo ludens.
Caillois (1979) reconhece como mérito impreterível deste
autor o fato de ter analisado magistralmente as características es-
senciais do jogo e assinalado a importância de seu papel na história
evolutiva da civilização. Ao mesmo tempo considera que a maioria
das teses apresentadas nesta obra oferece pontos de discussão e
estímulos para investigações e reflexões importantes.
Assim, aponta que na definição de jogo apresentada por Hui-
zinga, na parte referente ao jogo como ação desprovida de todo
interesse material, este autor teria excluído totalmente as apostas
e jogos de azar, que independente de seu caráter positivo ou nega-
tivo, ocupam um lugar importante na vida econômica e cotidiana
dos povos mais diversos.
A partir de três características apresentadas por Huizinga,
Caillois (1979) concorda que o jogo é sem dúvida uma atividade
livre, pois não se pode obrigar que um jogador participe de um
jogo; delimitada, dentro dos limites de espaço e tempo pré-fixa-
dos; regida por regras, pois é submetida a convenções que estabe-
lecem a lei que será respeitada.
Caillois (1990) toma três propriedades como fundamental-
mente importantes e comuns a todos os jogos e propõe uma clas-
sificação que se guia pelo referencial de que nos diferentes jogos
predomina o papel da competição, da sorte ou da interpretação.
De acordo com o autor, por motivos práticos, Huizinga teria se ocu-
pado somente de uma destas categorias, qual seja, a primeira. Ele,
por sua vez, distingue as categorias: agôn, alea, mimicri e acres-
centa mais uma denominada por ilinx.
A categoria agôn agrupa todos os jogos que se apresentam
em forma de competição, com um combate no qual se estabelece
artificialmente a igualdade das oportunidades, com a finalidade de

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118 © História e Teoria da Educação Física

assegurar que os competidores se enfrentem em condições ideais.


Desta maneira o triunfo do vencedor possui um valor preciso e in-
discutível e ele se torna o melhor dentro de sua categoria. Fazem
parte desta categoria as competições esportivas como o futebol,
tênis, pólo, esgrima, boxe, os concursos de tiro, golfe, atletismo,
assim como os jogos de dama e xadrez, entre outros.
Segundo Caillois (1990) a força motriz do jogo é, para todos
os competidores, o desejo de se sobressair e ser reconhecido por
seu domínio em determinado campo. Por isso, a prática do agôn
requer concentração, um treinamento adequado, esforços cons-
tantes e a vontade de triunfar. Nele o competidor depende única e
exclusivamente de seus próprios recursos.
A segunda categoria, denominada por alea, é utilizada para de-
signar todos aqueles jogos que são baseados em uma desigualdade
entre os jogadores, que se encontra fora do campo de influência e
controle dos mesmos. Trata-se aqui não somente de vencer o adver-
sário, mas também o destino, pois este é o único que determina a
vitória e a derrota, ou seja, estão inclusos aqui os jogos de azar (ou
sorte) como os dados, as roletas, cara ou coroa, a loteria, entre outros.
Nestas disputas, o jogador desempenha um papel totalmen-
te passivo, não utiliza sua destreza, força muscular ou inteligência.
Ao contrário de agôn, alea nega o trabalho, a paciência, a aptidão,
exclui o domínio de uma especialidade e o treinamento, significan-
do o fracasso ou o êxito total.
Na concepção do autor, agôn e alea representam atitudes
contrárias e de certo modo simétricas, pois ambas são regidas por
uma mesma lei, a criação artificial de condições de absoluta igual-
dade para os jogadores, das quais se vêem privados na realida-
de. O jogo representa, deste modo, um intento de substituir as
diferenças da vida cotidiana por situações perfeitas que permitem
distinguir claramente os papéis que correspondem à sorte e ao
esforço. Implicam também nas mesmas possibilidades aos partici-
pantes de por à prova sua valentia e de conquistar a vitória.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 119

A terceira categoria dos jogos, apontada por Caillois (1990)


como mimicry, compreende os jogos com caráter de ilusão e fic-
ção. Encontram-se neles uma série das mais variadas formas de
expressão, cujo objetivo comum consiste no sujeito crer que é ou-
tro e fazer com que os outros creiam que ele é uma personalidade
diferente. O jogador despoja-se de si temporariamente, simula e
deixa sua personalidade para colocar-se no papel de outro.
O primeiro exemplo destes jogos pode ser notado na infân-
cia, período no qual as crianças começam a utilizar o faz-de-conta
para representar um soldado, por exemplo, brincar de casinha, de
aviador etc. A esta categoria pertencem também todas as modali-
dades de passatempo e diversões que utilizam máscaras ou disfar-
ces, nas quais a diversão consiste justamente em incorporar estes
elementos, além das representações de teatro e as interpretações
dramáticas.
Para o autor a mimicry não exclui totalmente o agôn, pois no
instante em que um ator representa um papel, por exemplo, trata
inconscientemente ou até mesmo conscientemente de trabalhar
e interpretar da melhor maneira possível. Seu jogo consiste em
representar um papel, mas também obter reconhecimento nesta
sua competição fatigante e eterna contra seus rivais.
Desta maneira, a mimicry engloba a maioria das caracterís-
ticas do jogo: liberdade, suspensão do real, limites de tempo e es-
paço. O que não aparece aqui é a imposição de regras definidas
e imperativas, apesar do ator estar atrelado ao seu texto, o que
não pode ser comparado com o cumprimento de regras fixas que
determinam a estrutura de um jogo.
Por fim, Caillois (1990) apresenta uma última categoria de
jogos, que no seu parecer, não tem uma ligação efetiva com as
anteriormente mencionadas e que poderia ser considerada como
a única inovação neste campo: os jogos que traduzem um desejo
de embriaguez e vertigem, denominados como ilinx.

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120 © História e Teoria da Educação Física

São os jogos que envolvem muita velocidade, quedas, im-


pactos, movimentos circulares com aceleração, subidas e descidas
abruptas entre outros. Esta quarta classificação teria derivado da
necessidade dos homens em experimentar temporariamente o
transtorno, o desequilíbrio e a estabilidade do corpo, de perder a
percepção e retornar à consciência.
Para concluir nossos estudos sobre o jogo nesta obra, anali-
saremos agora a concepção de jogo que João Bastita Freire (2002),
autor da área da Educação Física, apresenta no livro O jogo: entre
o riso e o choro.
Nesta obra, Freire (2002) expõe uma visão bem diferenciada
das definições de jogo dos autores que foram apresentados ante-
riormente. Para ele, por mais que existam diferenças entre os tipos
de jogos (por exemplo, uma brincadeira de casinha e um jogo de
futebol), sabemos sempre identificar se uma atividade pertence a
esta categoria, apesar da heterogeneidade dos elementos estuda-
dos sob esta denominação.
Para Freire (2002) é difícil constituir atualmente uma inves-
tigação que consiga eliminar a dúvida do que realmente pertence
ou não aos domínios do jogo, a menos que fosse possível reduzir
as manifestações do jogo àquilo que possuem de mais comum. Ou
então, pelo contrário, organizar um inventário de todas as mani-
festações já percebidas de jogo nas atividades humanas, caminho
que considera extremamente exaustivo. Aponta ainda uma tercei-
ra saída, a de considerar o jogo como uma totalidade e desta ma-
neira procurar avaliá-lo e compreendê-lo, via que considera como
a que melhor pode caracterizar o jogo e a qual defende em seu
livro.
Seguindo suas considerações, o autor aponta que alguns
estudiosos do jogo seguiram um caminho bastante tortuoso para
identificar as características e localizar o jogo em seu ambiente tí-
pico. Apesar de tortuoso, este seria o caminho do qual a ciência se
utiliza, de maneira geral, em seus procedimentos de investigação.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 121

Basicamente, Freire (2002) afirma que as características que


tanto Huizinga, quanto Caillois distinguem no jogo, de um modo ou
de outro, podem ser verificadas também em outros contextos. Ele
não acredita que o caminho seguido por estes pesquisadores seja
produtivo, pois se os pontos indicados por eles em suas pesquisas
sobre o jogo são inegáveis, a cada instante em que se observasse
o fenômeno lúdico, outros pontos seriam acrescentados e isso não
teria fim. Portanto, o jogo acabaria sendo um recipiente de todas
as coisas e todas as coisas seriam reduzidas ao jogo.
Por exemplo, uma característica do jogo, compartilhada por
muitos autores, inclusive Caillois, é a de que o jogo se opõe ao ca-
ráter sério da vida. De acordo com Freire (2002), estes pesquisado-
res têm lá suas razões, mas ao observar um sobrinho que acabara
de ganhar uma lanchinha a motor, ele acredita que pode contra-
riar estas opiniões. Olhando o menino que está tão intrigado com
o funcionamento do motor, percebe que nada o distrai. Ele repete
o movimento de levar o barco de um lado para outro, centenas de
vezes numa bacia com água e o autor conclui que poucos de nós
poderiam levar tão a sério seu trabalho quanto o menino que o fez
com seu jogo naquele momento.
Huizinga, assim como Caillois, atribui ao jogo o caráter de
atividade voluntária, livre e regida por regras. Afirma ainda que a
atividade lúdica absorve inteiramente o jogador. Para Freire, tais
características podem ser perfeitamente presenciadas em diversas
situações de trabalho e dizer que o jogo é limitado no tempo e no
espaço, que cria ordem e gera alegria, em nada o distingue de ou-
tras atividades humanas.
Freire (2002) atenta para o fato de que o que importa não é
tanto o que tais autores disseram à respeito do jogo, mas o méto-
do do qual se utilizaram para compreender o fenômeno. Para ele
os pesquisadores poderiam prosseguir indefinidamente nos seus
inventários, pois cada vez mais encontrariam novas características,
portanto, tal método não pode dar conta de investigar o fenômeno

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122 © História e Teoria da Educação Física

do jogo a ponto de esgotar suas possibilidades de compreensão.


Na concepção do autor, agir de modo a fragmentar o jogo em par-
tes, analisando cada uma separadamente para depois juntá-las no
final, produz uma ilusão em vez de uma compreensão:
O problema do jogo é complexo e deve, portanto, ser pesquisa-
do do ponto de vista dessa complexidade. O simplismo da analise
que constatei nos trabalhos de alguns autores tolhe a visão para o
fenômeno. Eles caíram na armadilha positivista que por tantos sé-
culos vem turvando a compreensão para a real complexidade dos
fenômenos da natureza e da cultura humana (FREIRE, 2002, p. 52).

Deste modo, Freire (2002) conclui que seria sem efeito a ta-
refa de tentar compreender o jogo afirmando cada um de seus
componentes: o jogo é voluntário, é livre, limitado em tempo e
espaço etc. Da mesma maneira seria, se fosse negado por partes:
o jogo não é trabalho, não é sério e assim por diante. Em qualquer
uma dessas direções estaríamos reduzindo o jogo às suas particu-
laridades, deixando de considerar, portanto, sua essência real, ou
seja, uma unidade complexa. Nas palavras do próprio autor:
Resta, portanto, buscar o significado do jogo, não mais na carac-
terização infindável de partes que o compõem, mas sim na iden-
tificação dos contextos em que ocorre. Seguramente há um nicho
ecológico que acolhe o jogo e lhe permite manifestar-se, o único ao
qual ele se adapta. É nesse ambiente que temos que penetrar para
tentar compreender o fenômeno do jogo (FREIRE, 2002, p. 58).

Consideramos que as definições de jogo dos autores apre-


sentados identificam as diferentes concepções que coexistem a
respeito desse fenômeno e por isso foram escolhidas entre outras,
não menos importantes, para compor esta obra.
Freire foi abordado por ser uma referencia nacional que dis-
cute o jogo de maneira diferente dos demais autores. Sua definição
é importante no sentido de ampliar possibilidades, pois considera
o jogo como uma totalidade. Tudo pode ser ou não jogo, depende
do contexto em que ocorre.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 123

Já Huizinga e Caillois apresentam definições que se tornaram


muito importantes para a área da Educação Física e as característi-
cas por eles atribuídas ao jogo certamente nos indicam elementos
preciosos para a caracterização deste fenômeno e não precisam
ser necessariamente descartadas.
Depois de verificar a visão de Freire, você mudou sua con-
cepção sobre o que é jogo? Este fenômeno é realmente algo maior,
que engloba outras atividades humanas, como a brincadeira e o
esporte?
Nossa pretensão não é causar confusão e sim apontar várias
possibilidades para a caracterização do jogo enquanto pratica so-
cial humana. É importante para sua formação profissional saber
que existem concepções diferentes sobre determinados fenôme-
nos. Qual é a sua?

7. ESPORTE
Os conceitos de jogo e esporte se confundem na concepção
de muitos autores, não havendo muitas vezes, consenso quanto à
diferença existente entre os termos. No entanto, para a Sociologia
do Esporte (HELAL, 1990), jogo e esporte são conceitos diferentes
com características específicas.
O esporte moderno, ou seja, as modalidades esportivas que
conhecemos atualmente e que tiveram suas regras organizadas e
institucionalizadas pelos ingleses no século 19, incorpora elemen-
tos do jogo e vai além, pois possui outras características que não
são encontradas no jogo. De acordo com Helal (1990) o esporte
está subordinado a uma organização mais ampla e burocrática,
que extrapola os interesses e controle dos participantes ativos da
ação e, além disso, trata-se de atividades de envolvem competição
e incluem uma medida importante de habilidade física.
Em relação à primeira e segunda características não há muito
o que discordar, pois as disputas esportivas possuem caráter compe-

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124 © História e Teoria da Educação Física

titivo e são regidas por instancias superiores que determinam como


e onde elas devem acontecer, ou seja, uma partida de futebol entre
duas equipes paulistas pelo campeonato estadual não acontecerá
simplesmente a partir da disposição dos jogadores, ou então, no ho-
rário que a torcida escolher. O esporte é subordinado à organização
de órgãos especializados como as Federações e Confederações, que
tomam as decisões sobre a organização dos eventos esportivos.
Já a segunda característica apontada pela Sociologia do Es-
porte exclui, por exemplo, os jogos de xadrez, as corridas de cava-
los e as provas de automobilismo, da categoria esporte, quando
considera a necessidade de disputa física. Justifica que no caso do
xadrez é fácil verificar a falta de competição física. Já em relação as
corridas de cavalo e de carros, questiona se os embates principais
seriam entre os atletas ou entre os animais e os carros.
No entanto, o próprio Helal (1990) reconhece que o modelo
elaborado pela Sociologia do Esporte deve ser considerado como
um modelo ideal e por isso, diferente das situações reais, pois
pretende servir como instrumento para analisar e compreender
a realidade, sendo assim, é um recorte arbitrário, que privilegia
determinados aspectos em detrimento de outros, com o objetivo
de facilitar uma análise objetiva.
Outros autores destacam ainda a universalização das regras
(em qualquer país do mundo o vôlei, por exemplo, é praticado
com regras conhecidas internacionalmente) o rendimento e a bus-
ca pelo recorde como características estruturais do esporte (BETTI,
1991; BRACHT, 1989).
Mas a Sociologia do Esporte indica ainda a secularização e a ra-
cionalização, como características do esporte, responsáveis por distin-
guir o esporte moderno do esporte praticado em outras épocas.

Secularização e racionalização
Entende-se por secularização o processo pelo qual realidades
pertencentes ao domínio religioso ou sagrado, passam a pertencer
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 125

ao domínio profano ou leigo. Os Jogos Olímpicos da Antiguidade,


por exemplo, eram festivais sagrados, que foram criados em ho-
menagem a Zeus. Já o esporte moderno, nasceu na Inglaterra após
a Revolução Industrial, sem nenhum vínculo religioso.
Entretanto a sociologia do esporte verificou que o esporte
moderno, desde seu surgimento, vem alternando períodos em
que predominam aspectos secularizados com períodos predomi-
nantemente sagrados.
O período que marca seu surgimento, por exemplo, é con-
siderado como predominantemente secular. Já estudamos que os
ingleses são considerados os inventores do esporte moderno, pelo
fato de terem sido os primeiros a estabelecer e oficializar as regras
das modalidades esportivas.
Naquela época a Igreja colocava restrições à prática dos es-
portes, por julgarem que tal prática desviava a atenção das ques-
tões espirituais e também por que eram praticadas aos finais de
semana, momento em que as pessoas deveriam ir à Igreja.
Neste sentido o esporte era visto como uma atividade se-
cular, oposta às atividades religiosas. No entanto, a secularização
nunca era total, pelo fato de que sempre havia a possibilidade da
criação de áreas e imagens sagradas dentro do esporte, como por
exemplo, o fato de os atletas serem vistos como mitos e heróis
do esporte, fundamentos importantes para o desenvolvimento de
manifestações sagradas (HELAL, 1990).
Além de atividade predominantemente secular, o esporte
era ao mesmo tempo uma atividade praticada pela elite. O fute-
bol na Inglaterra, por exemplo, era praticado nas escolas de elite
e atividade recreativa da aristocracia até a década de 1880 aproxi-
madamente.
Somente com a diminuição da jornada de trabalho da classe
operária, é que o povo começa a se interessar cada vez mais pelo
futebol, porém, para praticá-lo com mais frequência os trabalha-

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126 © História e Teoria da Educação Física

dores precisavam de dinheiro e com isso o profissionalismo come-


çou a surgir nesta modalidade. Devido a rápida difusão, na década
seguinte o futebol já era um esporte profissional na Inglaterra e
rapidamente passou a ser praticado pela massa.
Mas o futebol é apenas um exemplo que ilustra como o es-
porte, que se tornou uma atividade organizada e financiada, teve
um rápido desenvolvimento pelos países em processo de indus-
trialização, especialmente os que mantinham relações comerciais
com a Inglaterra.
Apesar de surgir como um evento predominantemente se-
cular, o esporte foi pouco a pouco se transformando num fenôme-
no de dimensões quase que religiosas. Inicia-se então o período
predominantemente sagrado.
Com a profissionalização o esporte tornava-se cada vez mais
próximo do sagrado, o que segundo Helal (1990) representa um
paradoxo, pois quanto mais se aproximava da profissionalização e,
portanto, do domínio racional e técnico (profano), a tendência à
sacralização aumentava.
Fato que pode ser exemplificado pelo caso do futebol brasi-
leiro, que chega ao país e assim como na Inglaterra, torna-se uma
atividade da elite. Somente com o processo de profissionalização
é que o futebol se transforma num esporte das massas, que pouco
a pouco passou a ser sacralizado, especialmente por causa do fa-
natismo dos torcedores, como explicita Helal:
Com certeza, o leitor já deve ter escutado diversas vezes alguém
pronunciar frases do tipo "o futebol é que nem uma religião"; ou
"o templo sagrado do futebol brasileiro" (referência feita ao estádio
Mario Filho, mais conhecido como Maracanã); ou "o manto sagra-
do" (referência feita a camisa da seleção ou mesmo à do time favo-
rito de um torcedor); ou "os monstros sagrados do futebol brasilei-
ro" (referência feita aos grandes craques); ou ainda, "os deuses do
futebol" (HELAL, 1990, p. 39).

Além destes, outros exemplos podem ser citados, como os


jogadores realizarem o sinal da cruz antes de entrar no local da
disputa, os torcedores que ajoelham e ascendem velas pela vitória
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 127

do seu time, as reverências feitas aos grandes jogadores, conside-


rados como ídolos. São situações que configuram a sacralização do
esporte, nas quais os torcedores associam os jogadores e outras
coisas relacionadas ao universo esportivo com questões sagradas
ou do campo da religião.
No final de década de 1980 o esporte começou a passar por
um novo processo de secularização. Os "rituais" das torcidas e jo-
gadores continuaram os mesmos, mas outros elementos foram
incorporados a este cenário: placas de publicidade, estampa dos
patrocinadores nos uniformes, horário do jogo modificado para
atender aos interesses da televisão, o ídolo da equipe sendo nego-
ciado com um time do exterior etc.
Este período é denominado por Helal (1990) como o novo
período predominantemente secular, pois apesar das atitudes da
torcida em relação às equipes continuarem as mesmas, a profis-
sionalização, que anteriormente fora responsável pela sacralização
do esporte, agora é a culpada junto com a comercialização, por
destruir os elementos que eram considerados sagrados.
Pensemos, por exemplo, na relação dos jogadores de futebol
com suas equipes na década de 1970, a maior parte deles passava
toda a carreira jogando por apenas um time, ou no máximo atuava
em dois ou três. Hoje em dia, o mesmo jogador que numa tempo-
rada jura amor a equipe que defende, na próxima está beijando
a camisa da equipe adversária que o contratou, pois, o esporte
agora é regido pela lógica do mercado capitalista e não mais pelo
"amor à camisa".
Existem ainda outros exemplos, como os uniformes das equi-
pes, que numa analogia exagerada podem ser comparadas a "fo-
lhas de jornal", devido a quantidade de patrocinadores impressos.
São elementos como estes que resultam num sentimento de
desencanto pelo esporte e o colocam na situação de elemento secu-
larizado. É preciso considerar, no entanto, que esta secularização mais
recente tomou conta do esporte moderno em quase todo o mundo

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128 © História e Teoria da Educação Física

industrializado e é a este período que a sociologia se refere com maior


frequência ao discutir a secularização do esporte moderno.
Mas mesmo que haja um sentimento de desencanto por
parte dos torcedores, verificamos que o esporte ainda desperta
uma tendência à sacralização, basta verificar o que acontece numa
final de campeonato, por exemplo. Fato que indica à persistência
de uma tendência a sacralização.
Na verdade, estas duas tendências (secularização e secula-
rização) além de se revezarem, predominando ora uma, ora outra
durante o processo de desenvolvimento do esporte, também se
misturam, pois mesmo que predomine os elementos de seculari-
zação, sempre haverá espaços para a sacralização e vice-versa.
A segunda característica do esporte moderno é denominada
de racionalização. Racionalizar significa tornar racional o que antes
estava fora dos domínios da razão. A racionalização elimina consi-
derações pessoais, afetivas ou emocionais sobre a ação determi-
nada, buscando uma adaptação dos meios aos fins pretendidos
de modo consciente, exato e eficaz, deste modo, a ação passa a
ser regida por regras definidas e calculáveis, que não permitem a
utilização de pensamentos místicos ou o surgimento de atitudes
imprevisíveis (HELAL, 1990).
Na área esportiva a racionalização desenvolve-se por meio
da quantificação das ações dos competidores, na especialização
dos atletas e na elaboração de estratégias e táticas de jogo cada
vez mais formais e calculistas, que objetivam alcançar sempre o
melhor desempenho dos atletas e das equipes nas competições.
Uma das características mais peculiares do esporte moder-
no está relacionada ao processo de transformar as atividades atlé-
ticas em algo que possa ser medido, como o número de passes
corretos, a quantidade de arremessos convertidos, o número de
chutes a gol, velocidade que os corredores atingiram, o número
de braçadas do primeiro colocado da prova etc. A quantificação
presta-se a medir, comparar, controlar e fazer previsões.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 129

Os dados estatísticos também fazem parte da quantificação


do esporte moderno. Eles são utilizados pelas equipes para ofere-
cer à comissão técnica e aos atletas informações sobre desempe-
nho, são divulgados durante e depois das transmissões dos even-
tos esportivos, são publicados nas reportagens jornalísticas etc.
O desenvolvimento tecnológico contribui cada vez ainda
mais com o processo de quantificação, por meio de instrumentos
como o cronômetro, os placares eletrônicos e os computadores
portáteis.
De acordo com Helal (1990) esse impulso à quantificação so-
mado ao desejo de alcançar a vitória e ser o melhor, resultou na
criação e no conceito de recorde, que pode ser considerado como
uma abstração que permite a competição tanto entre aqueles que
estão no mesmo campo, como com outros que estão distantes no
tempo e no espaço, além da competição do atleta com ele próprio.
Para exemplificar temos o caso recente do nadador Michael
Phelps que quebrou o recorde que Mark Spitz havia estabelecido
em 1972 nos Jogos Olímpicos de Munique, no qual conquistou sete
medalhas de ouro quebrando o recorde mundial de todas as provas
que disputou. Michael Phelps, conquistou oito vitórias e quebrou
sete recordes mundiais nos Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008,
ou seja, trinta e seis anos depois do recorde estabelecido por Spitz.
Outro elemento da racionalização do esporte moderno é a
especialização, situação em que ocorre a concentração do atleta
no desenvolvimento de uma habilidade específica em detrimento
do desenvolvimento de muitas habilidades.
É o caso, por exemplo, do jogador denominado "líbero" no
voleibol. A função do líbero foi criada no final de década de 1990,
acompanhando outras modificações nas regras desta modalidade
esportiva, com a finalidade de manter a bola em jogo por mais
tempo, pois o líbero é um jogador especializado na defesa, que
não pode sacar, bloquear ou atacar e só participa do rodízio nas
três posições do fundo da quadra.

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130 © História e Teoria da Educação Física

Pelo exemplo pode-se identificar como nesta posição o joga-


dor precisa se especializar em uma única função, ao invés de diver-
sificar no treinamento o aprimoramento de diversas habilidades.
É preciso considerar, no entanto, que a especialização sem-
pre existiu no esporte. Desde a Grécia Antiga os atletas já se espe-
cializavam nas modalidades com as quais possuíam mais afinida-
de. Porém, no esporte moderno a especialização conta com um
grande incentivo da ciência, como o auxílio da biomecânica, da
fisiologia, da teoria do treinamento etc. que por meio de pesquisas
fornecem informações que são utilizadas na formação e nos trei-
namentos dos atletas.
Por fim, as estratégias e táticas formais e calculistas comple-
tam a racionalização do esporte e buscam elaborar sistemas de
jogo ou esquemas táticos que privilegiam a disciplina tática dos
jogadores em campo.
Elementos como força, disposição e disciplina tática são en-
fatizados como instrumentos mais eficazes para se vencer uma
competição. Os esquemas táticos geralmente são elaborados pe-
las comissões técnicas considerando-se tanto as capacidades físi-
cas e habilidades dos jogadores que compõem as equipes, quanto
as dos adversários.
É muito comum nos dias atuais a utilização de vídeos para
análise do desempenho das equipes adversárias. As estratégias,
as jogadas e a movimentação dos jogadores são estudadas exaus-
tivamente para que possa utilizar uma tática de jogo que facilite a
busca pela vitória.
Helal (1990) indica que o crescente processo de racionaliza-
ção do esporte incitou no Brasil a discussão sobre o fato de que
a objetividade pode implicar na destruição da criatividade dentro
do esporte, pois a rigidez dos sistemas de jogo acaba restringindo
a liberdade dos jogadores em criar soluções alternativas que não
estejam previstas taticamente.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 131

Entretanto, o próprio autor justifica que apesar da raciona-


lização o atleta ainda pode encontrar espaço para exercitar sua
criatividade. No futebol, por exemplo, apesar do rigor com que al-
gumas equipes são organizadas taticamente, sempre existe a pos-
sibilidade e até mesmo o estímulo para que o jogador num lance
individual ou mesmo coletivo, utilize a criatividade para fazer um
drible ou uma jogada improvisada. Deste modo, a racionalização
não consegue destruir a criatividade dentro do esporte.
A partir do que foi estudado sobre a definição elaborada
pela Sociologia do Esporte (HELAL, 1990), podemos verificar que
o esporte moderno vive momentos de secularização e sacraliza-
ção, assim como procura incorporar elementos de criatividade à
racionalização. Apesar da secularização e da racionalização possuí-
rem a tendência de destruir o componente lúdico do esporte, este
continua resistindo, assimilando e incorporando os fenômenos de
modo a garantir espaços para o desenvolvimento dos elementos
sagrados e do potencial criativo dos atletas.
Fica evidente que a Sociologia do Esporte (HELAL, 1990) tra-
ta, apenas, do esporte de alto rendimento. No entanto, de acor-
do com Tubino (2001), esse fenômeno pode ser classificado com
base em três dimensões sociais, ou seja, uma visão do esporte
para além do rendimento, que expressa o modo como ele pode
ser praticado pelas pessoas na sociedade: o esporte-educação, o
esporte-participação e o esporte-performance.
O esporte-educação, próprio do contexto escolar, tem por
objetivo a produção de cultura por meio do movimento e da ex-
pressão dos alunos como um meio de manifestação social e para
o exercício crítico da cidadania. Além disso, diferentemente do es-
porte de rendimento, privilegia a inclusão e deve procurar evitar a
competitividade exagerada (DARIDO; RANGEL, 2005).
Entretanto, cabe ressaltar que um dos maiores equívocos a
respeito da compreensão do esporte-educação se refere ao enten-
dimento de que ele é uma ramificação do esporte de rendimento.

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132 © História e Teoria da Educação Física

Nessa visão, o esporte escolar acaba sendo praticado como réplica


do esporte de alto nível, deixando de ter um sentido educativo.
Ao trabalhar o esporte-educação, o professor pode, nos
treinos, procurar proporcionar aos alunos um grande número de
vivências das mais variadas modalidades esportivas e ensinar os
conceitos e os fatos que permeiam cada uma das modalidades, de
modo que consigam compreender, por exemplo, o contexto histó-
rico do surgimento e do desenvolvimento de cada modalidade e
as suas regras, a influência que a mídia exerce sobre os esportes,
os atletas e a torcida, como também as questões polêmicas, como
doping, violência, corrupção etc., de modo que os alunos exerci-
tem a reflexão e o senso crítico. Há, ainda, as questões inerentes
ao próprio treino, como o excesso de competitividade, a exclusão
de atletas menos habilidosos, as diferenças de gênero etc., ques-
tões essas que, quando refletidas, podem contribuir para a demo-
cratização da prática esportiva e para a formação de cidadãos mais
conscientes sobre o papel e a função do esporte na sociedade.
Ao esporte-participação, que tem por objetivo promover o
bem-estar social de seus praticantes, estão relacionadas as ativi-
dades praticadas nos momentos de lazer ou nas horas livres, nor-
teadas, especialmente, pelo princípio do prazer.
As finalidades dessa dimensão social do esporte são a diver-
são, a descontração e a interação social, dentre outras que podem
ser praticadas por pessoas das mais variadas faixas etárias. Suas vi-
vências ocorrem, geralmente, em espaços específicos para o lazer,
como clubes, praias, praças e centros de convivência, por exemplo,
ou em outros locais que possibilitem a prática de atividades não
comprometidas com um tempo estabelecido e livres das obriga-
ções cotidianas, oferecendo liberdade aos praticantes.
O esporte-performance ou de rendimento, que já fora estu-
dado anteriormente, possui regras universais e pré-estabelecidas
por instituições que organizam as competições (federações, confe-
derações, comitês) e que são responsáveis pelo cumprimento das
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 133

regras e dos códigos de ética. É caracterizado pela competição,


pela busca da vitória e pela superação de recordes. Além disso,
é praticado por uma parcela muito pequena da população – os
atletas, principais responsáveis pelos espetáculos esportivos, foco
constante da mídia (especialmente a televisiva).
Alguns aspectos positivos podem ser indicados para justifi-
car a importância social do esporte de rendimento, como a pro-
moção de intercâmbios internacionais, a criação de profissões es-
pecializadas no esporte, o aumento de mão de obra especializada
para a produção dos artigos esportivos, a geração de turismo e,
até mesmo, a influência que exerce na população, contribuindo
para o aumento do número de praticantes de exercícios físicos.
No entanto, é justamente sobre o esporte de rendimento
que as maiores críticas são feitas, especialmente pelos autores
que combatem o capitalismo indicando que essa dimensão social
do esporte reflete a divisão de classes de tal sistema por causa do
seu vínculo com as empresas privadas e da utilização de grandes
atletas como instrumentos de reprodução da violência nos espe-
táculos esportivos.
Convém ressaltar que entendemos que as dimensões sociais
do esporte denominadas "esporte-educação" e "esporte-parti-
cipação" são, na verdade, categorias que se transformaram par-
tindo do esporte de rendimento, ou seja, o esporte-educação é
a transformação do esporte de rendimento no ambiente escolar
para atender às necessidades de formação e de educação nas au-
las de Educação Física, e o esporte-participação é a apropriação
que as pessoas fazem do esporte-performance, transformando-o
em vivências para o tempo de lazer, para a manutenção da saúde,
para diversão etc.
Depois de estudados os conceitos de brincadeira, jogo e es-
porte, você consegue responder qual deles é o mais abrangente?
Ou seja, qual destas práticas sociais pode ser considerada como a
que dá origem às outras duas?

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134 © História e Teoria da Educação Física

Sem dúvida tanto o jogo quanto o esporte são desdobra-


mentos da brincadeira e possuem elementos desta. A brincadeira
é considerada como a mais lúdica das atividades e a perda do pra-
zer e da autonomia acontecem quanto mais nos aproximamos do
universo do esporte. No entanto, estas perdas sempre são acom-
panhadas de algumas vantagens, pois como já estudamos ante-
riormente, as regras fixas e o espírito de competição tendem a es-
timular a criatividade e a improvisação dos atletas (HELAL, 1990).

Características estruturais do esporte


Verificamos anteriormente que o esporte moderno se ca-
racteriza pela convivência de dois lados antagônicos: um formado
pelos fenômenos da modernidade (racionalização e secularização)
que transformam o esporte em evento padronizado e profano; ou-
tro formado por uma força contrária que resiste a esse processo,
conservando o esporte como um domínio sagrado, encantador,
fascinante, lúdico e sujeito a improvisações.
De acordo com Helal (1990) o significado mais profundo e
estrutural do esporte não se encontra nas características de se-
cularização e racionalização, mas sim na sua força de resistência,
pois as características da secularização e da racionalização são fe-
nômenos que se originam fora do universo do esporte e são a ele
incorporados pela modernidade, justamente por isso eles caracte-
rizam um lado do esporte moderno, que o diferencia do esporte
de outras épocas.
A persistência e permanência da força interna e contrária a
estes fenômenos caracterizam o lado mais genuíno do esporte,
que absorve os elementos da modernidade, incorporando-os ao
universo do sagrado e do lúdico. Por exemplo, a introdução dos
efeitos especiais nos espetáculos esportivos (luzes, placares ele-
trônicos, fogos de artifício), que acabam descaracterizando sua an-
tiga aura romântica, mas criam um novo clima de encantamento
nos espectadores.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 135

Diante disso, Helal (1990) aponta outras características con-


sideradas como estruturais do esporte: o fato de serem conside-
rados como um momento especial, o caráter recreativo que existe
nas disputas esportivas e a incerteza do resultado.
Sem dúvida os eventos esportivos representam para muitas
pessoas um momento especial, destacado da vida cotidiana, como
se fosse uma pausa na "vida real". Este sentido é incentivado pe-
las diversas sociedades, que elegem o esporte para expressar seus
sentimentos mais profundos. Mas estas representações são dife-
rentes em cada sociedade. Basta observamos o estilo de jogo das
equipes, o envolvimento dos torcedores, o significado atribuído à
vitória ou derrota, que variam de uma cultura para outra.

A característica de "evasão da vida real" também foi atribuída por


Huizinga ao jogo. Fato que indica as semelhanças entre estes fe-
nômenos.

Mesmo com essa tendência de se tornar um momento es-


pecial na sociedade, a penetração de domínios profanos como a
política, o comércio, o trabalho, as exigências da mídia (como mu-
dar o horário dos jogos em função da sua programação), acabam
fazendo com que o esporte se torne algo comum e não mais des-
tacado da vida diária. Entretanto, mais uma vez se verifica que a
penetração de elementos profanos no esporte faz com que sua
força contrária continue insistindo em enquadrá-lo em um mo-
mento especial.
Diferente do que acontece na vida cotidiana, na qual o con-
flito é indesejado pelas pessoas, no esporte além de desejado ele
é um objetivo a ser constantemente buscado e preservado.
A situação inicial de qualquer competição esportiva é sempre
de total igualdade entre os participantes. No início de uma compe-
tição ou campeonato, por exemplo, os competidores se encontram
numa classificação horizontal, em total condição de igualdade (nú-

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136 © História e Teoria da Educação Física

mero de pontos, condições para competir). Eles até cooperam entre


si no momento em que aceitam a regras da competição.
Ao término da competição, no entanto, haverá uma classifi-
cação vertical, hierárquica e desigual. O conflito surge como parte
integrante da competição esportiva e não como um problema que
precisa ser resolvido ou eliminado. Ao concordarem com as regras,
os jogadores tornam-se cientes do conflito que enfrentarão. A har-
monia inicial é necessária para o conflito, por isso não se pensa
em liquidar de vez um oponente, pois um só existe em função do
outro.
Outra característica estrutural do esporte é o seu caráter de
incerteza. A incerteza do resultado aliada ao conflito proporciona
ao esporte o desenvolvimento de um sentido que busca solucio-
nar simbolicamente muitos dos conflitos cotidianos.
Se na vida cotidiana a distinção entre vencedores e perde-
dores se dá quase que antecipadamente, por causa das condições
econômicas, sociais e culturais dos indivíduos e de suas relações
pessoais, no esporte a distinção entre vencedores e perdedores
não é algo pré-determinado ou definitivo.
Vence o que joga melhor de acordo com as regras estabele-
cidas, mas o vencedor de hoje, pode ser o perdedor de amanhã e
vice-versa. De acordo com Helal (1990) existe um conflito que o
discurso esportivo, simbolicamente, tenta resolver: as desigualda-
des e injustiças sociais existentes em na sociedade, que acontece
tanto para os atletas quanto para os torcedores.
Concluindo, o esporte é encarado como um momento espe-
cial da sociedade, conservando seu caráter de conflito e resultados
incertos. Tais características tendem a revelar questões profundas
de cada sociedade que, no entanto, tendem a ser diferentes de
uma sociedade para outra e podem variar no tempo também, já
que as questões são próprias e passíveis de transformações.
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 137

8. DANÇA
A dança é considerada como uma das formas mais antigas
de manifestação da expressão corporal, que surgiu e se desenvol-
vimento à medida que o ser humano sentiu necessidade de se co-
municar e expressar.
De acordo com Mendes (1985) a dança é basicamente movi-
mento e gestos com ritmo, que se desenvolvem no espaço e num
tempo determinados. Já o ritmo está relacionado a um período
de tempo dividido em determinados intervalos e pode ser exter-
no, como a música, ou interno, como os batimentos cardíacos. Por
meio de gestos e movimentos a dança traduz emoções, acompa-
nhada ou não de música, do canto ou de ritmos peculiares.
São do período Pré-histórico os primeiros registros de dan-
ças com o objetivo de representação para alcançar algo deseja-
do, como por exemplo, abater um animal. Além disso, a dança era
realizada com caráter lúdico e em cerimônias de adoração e culto
aos espíritos. A dança de caráter ritualístico era executada pelos
magos e sacerdotes.
Já estudamos na história das atividades físicas deste período, que
a sensação causada pelo exercício corporal realizado durante a dança
conduzia os homens a estados alterados de consciência e por isso, eles
acreditavam estar entrando em contato com o poder dos deuses.
Na Antiguidade as danças continuaram a ser praticadas basi-
camente como atividade ritualística, relacionada às cerimônias re-
ligiosas, rituais de iniciação etc. e atividade profana, ou seja, ligada
aos divertimentos públicos e populares.
Na Grécia a dança sempre integrou os rituais religiosos, pro-
piciados especialmente pela grande quantidade de deuses que
eram venerados. Depois passou a fazer parte das manifestações
de teatro (drama), além do papel que desempenhavam na educa-
ção e nos divertimentos.

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138 © História e Teoria da Educação Física

Em Roma a dança nunca recebeu o prestígio que os gregos


a concediam. A preferência do povo pelos espetáculos de arena
acabou fazendo com que a dança ficasse relegada às barracas das
feiras. Com o tempo, transformaram-se em acrobacias e tiveram
um grande desgaste.
No período da Idade Média, o que aconteceu com as ativida-
des físicas em geral, aconteceu também com as danças, especial-
mente as populares, que foram condenadas pela Igreja Católica
por causa de seu conteúdo pagão, ligado às antigas religiões.
Com a queda do império romano, o teatro e a dança pra-
ticamente desapareceram, sobrevivendo somente por meio dos
grupos de dançarinos e acrobatas, que viviam miseravelmente de
vilarejo em vilarejo, apresentando-se para o povo.
Mas com o passar do tempo, as danças populares que eram pra-
ticadas por estes grupos, começaram a ser imitadas pelos nobres nas
cortes como forma de divertimento, até transformarem-se em danças
da corte. Em decorrência disso, a nobreza acabou influenciando as
danças populares, fazendo com que se tornassem mais refinadas.
Ao longo da Idade Média, a dança permaneceu como ativi-
dade recreativa, não profissionalizada, praticada pela nobreza e as
camadas populares. Foi também o meio de vida dos artistas ambu-
lantes, que se exibiam nas feiras e praças públicas, sem lugar fixo e
de forma não organizada (MENDES, 1985).
No Renascimento, a dança que antes era praticada apenas
como atividade lúdica, começa a adquirir formas mais disciplina-
das. Os passos de dança passam a ser organizados e anotados,
com codificação e criação de movimentos utilizáveis por qualquer
pessoa em momentos diversos. Surge o balleto na Itália, atividade
que reunia ritmos e passos.
Este período histórico é responsável pela efetivação da dan-
ça em três linhas diferentes, as danças populares, as danças da
corte (ambas com caráter lúdico não-exibicionista) e os balletos
(que darão origem aos espetáculos de danças teatrais).
© U2 - Conceitos e Práticas Sociais Relacionados à Educação Física 139

Na França o balleto italiano transforma-se em ballet, que ini-


cialmente era praticado nas salas dos palácios e apreciado pelos
espectadores de cima de balcões, por isso possuía a característica
de ser uma dança horizontal, que formava figuras geométricas. No
século 17, os balés das cortes passam para os palcos dos teatros,
ocorre a introdução de dançarinos profissionais aos espetáculos
e a eliminação das figuras geométricas realizadas no chão o que
estimulou a extensão vertical dos movimentos.
No final do século 19 e início do século 20 surge um movi-
mento contra a formalização da dança. Passam a existir divergên-
cias entre a dança acadêmica tradicional, representada pelo balé e
a corrente moderna que surgia.
A dança moderna nasce como resposta ao balé clássico.
Abandona-se a ideia de que a dança é só o balé e surge a dança re-
presentando o sentimento, livre das técnicas acadêmicas, o corpo
passa a ser explorado como um todo, com inúmeras possibilidades
e combinações de formas e movimentos.
Atualmente devido à grande diversidade de danças existen-
tes, elas podem ser classificadas, de acordo com Gaspari (apud
DARIDO; RANGEL, 2005) em:
1) Danças étnicas: manifestações expressivas de determi-
nados povos, com seus atributos divinos e religiosos,
que transmitem características que podem identificar
determinado povo ou região. Como por exemplo, a ta-
rantela na Itália, a valsa em Viena, o tango na Argentina
e as danças latinas como rumba, mambo e chá-chá-chá.
2) Danças folclóricas: abordam as tradições e costumes
de determinados povos ou regiões de um mesmo país
e muitas vezes são desenvolvidas na coletividade, envol-
vidas por um sentimento de partilha e hereditariedade.
São exemplo de danças folclóricas a quadrilha, o maxixe,
o chote e várias outras danças populares de cada região.
3) Danças de salão ou sociais: das aldeias passaram a ser
realizadas nos salões da nobreza, como meio de diver-

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140 © História e Teoria da Educação Física

são - sarabandas, polkas, mazurkas, minuetos. Atual-


mente podemos citar as danças dos bailes e festas como
exemplo de danças de salão.
4) Dança teatral ou artística: é a dança de espetáculo, que
se desenvolveu principalmente na França a partir do sé-
culo 17. Privilegia a técnica, pois é toda sistematizada
por meio de códigos e terminologias que se tornaram
universais, como por exemplo, o balé clássico, a dança
moderna, o sapateado, o jazz etc.
De modo geral, verifica-se que em todas as épocas históri-
cas, a dança desempenhou para os povos uma representação de
suas manifestações, emoções, expressão e comunicação de carac-
terísticas culturais.

9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Procure responder, discutir e comentar as questões a seguir
que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, ou seja, os
conceitos e práticas sociais relacionados à Educação Física. Se você
encontrar dificuldade em respondê-las, procure revisar os conteú-
dos estudados para saná-las. Este é um momento ímpar para você
fazer uma revisão desta unidade. Lembre-se de que no ensino à
distância a construção do conhecimento se dá de forma coopera-
tiva e colaborativa, portanto, compartilhe com seus colegas suas
descobertas.
1) Quais são as principais diferenças entre recreação e lazer? Qual destes con-
ceitos é mais amplo e por quê?

2) Qual a relação da luta pelo direito ao descanso com o tempo de lazer?

3) Qual é a principal diferença entre brincadeira e jogo?

4) O que é esporte? Quais são as características do esporte moderno responsá-


veis por diferenciá-lo do esporte praticado em outras épocas?

5) Como os diferentes tipos de dança são classificados atualmente?


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10. CONSIDERAÇÕES
Com o estudo desta unidade alguns conceitos novos foram
estudados e outros aprofundados, como a brincadeira, o jogo e o
esporte. Cabe destacar que esses são conceitos importantes para
a área e por isso transformaram-se em objeto de estudo de di-
versos autores, por isso, apresentamos as concepções de apenas
alguns deles e sugerimos que a procura de outras fontes biblio-
gráficas para entender como esses fenômenos são conceituados e
caracterizados por outros pesquisadores.
O curso de graduação não é chamado de formação inicial
por acaso, é importante que tenhamos em mente que um profis-
sional de educação física precisa de constantes leituras e atualiza-
ções durante toda a carreira profissional.

11. E-REFERÊNCIAS
Lista de figuras
Figura 1 O trabalho no campo. Disponível em: <http://www.champagnat.org/images/
comic/024.gif>. Acesso em: 16 maio 2012.
Figura 2 O trabalho na indústria. Disponível em; <http://raperalta.files.wordpress.
com/2009/01/tempos-modernos2.jpg>. Acesso em: 16 maio 2012.
Figura 3 Assistir televisão - lazer ativo ou passivo? Disponível em: <http://intra.vila.com.
br/sites_2002a/urbana/rafael%20tosta/minhas_imagens/menino%20em%20pe.jpg>.
Acesso em: 16 maio 2012.

12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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à filosofia. 2. ed. Editora Moderna, 1993.
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BRACHT, Valter. Esporte-estado-sociedade. Revista Brasileira de Ciências do Esporte,
Campinas, v. 10, n. 2, p. 69-73, jan. 1989.
CAILLOIS, Roger. Sobre la natureza de los juegos y su classificacion. In: LÜSCKIEN, G.;

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WEIS, K. Sociologia del deport. Valladolid: Miñon, 1979.


CAILLOIS, Roger. Os jogos e os homens, a máscara e a vertigem. Lisboa: Edicões Cotovia,
1990.
CAMARGO, Luiz Octávio de Lima. O que é lazer. São Paulo: Brasiliense, 1986.
CARTA, Mino; PEREIRA, Raimundo Rodrigues. Retrato do Brasil. São Paulo: Política, 1984.
DUMAZEDIER, Joffre. Questionamento teórico do lazer. Porto Alegre: PUC, 1975.
FREIRE, João Batista. O jogo: entre o riso e o choro. Campinas: Autores Associados, 2002.
GASPARI, Telma Cristiane. Dança. In: DARIDO, Suraya Cristina; RANGEL, Irene Conceição
Andrade (Orgs.). Educação física na escola: implicações para a prática pedagógica. Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
HELAL, Ronaldo. O que é sociologia do esporte. São Paulo: Brasiliense, 1990.
HUIZINGA, Johann. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 2. ed. São Paulo:
Perspectiva, 1980.
MARCELLINO, Nelson Carvalho. Tempo e Atitude, Ainda sobre tempo e atitude, O
conteúdo do lazer & Atividade e passividade. In: Capacitação de animadores sócio-
culturais. Campinas: Unicamp, FEF, DEL; Brasília: MED, SEED, PFDC, 1994.
______. Estudos do lazer: uma introdução. 4. ed. Campinas: Autores Associados, 2006.
MENDES, Miriam G. A dança. São Paulo: Ática, 1985.
WERNECK, Christiane Luce Gomes. Recreação e Lazer: apontamentos históricos no
contexto da educação física. In: WERNECK, Christiane Luce Gomes; ISAYAMA, Helder
Ferreira (Orgs.). Lazer, recreação e educação física. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

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