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18 de outubro de 2018
O recende dia de Nossa Senhora Aparecida, foi muito intenso para mim. Enquanto
viajava pelas estradas da nossa diocese de Vacaria, na direção das comunidades, minha
mente, quase que independente de minha vontade, voltava toda hora ao fato de que nossa
querida padroeira já foi vítima, ao menos duas vezes, do fanatismo religioso. Em 1978,
um homem se dizendo enviado por Deus, destroçou a pequena imagem de Nossa Senhora
em mais de duzentos pedaços; há alguns anos atrás um pastor fanático desrespeitou
grosseiramente a representação de Nossa Senhora (sua imagem) com uma sequência de
chutes em um programa de televisão.
Outra experiência recente de fanatismo, dentro da própria Igreja Católica, fez com
que indivíduos instruídos por gurus das redes sociais, tenham agredido a CNBB como se
ela fossa composta por moleques imaturos que não sabem o que fazem. Se tudo isso não
bastasse, o grande Papa Francisco tem sido alvo de ataques ferrenhos contra a sua pessoa.
Em todos estes casos podemos detectar uma doença espiritual/psicológica que revela a
ausência de discernimento e de juízo equilibrado.
Esta mesma causa anticomunista, que possui seus méritos, serve para que a doença
espiritual (fanatismo) leve seus adeptos a pensar que o “Mal” está sempre fora da sua
igreja, que é sempre um perigo que vem de fora e que deve ser combatido. Tudo o que
aprendi sobre o Demônio até hoje, me faz lembrar que ele é tudo, menos ingênuo e burro.
Com isso quero dizer que a pessoa não fanatizada é capaz de perceber primeiro o pecado
que está dentro de si e da sua própria instituição. Esta tarefa é a mais difícil e mais
dolorosa, mas também é a mais equilibrada e madura, e é a única que pode curar o
problema na sua raiz. Proponho uma questão concreta para reflexão: o que faz mais mal
às famílias, às igrejas e à própria experiência de fé, a proximidade com um ateu ou a
existência de graves escândalos de ministros no interior das próprias igrejas?
O Papa Francisco, modelo de lucidez e equilíbrio para o nosso tempo, tem o foco
de suas principais preocupações noutro alvo. No seu documento do início do ministério
ele afirma: “Enquanto os lucros de poucos crescem exponencialmente, os da maioria
situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz. Tal desequilíbrio
provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a
especulação financeira. Por isso, negam o controle dos Estados, encarregados de velar
pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que
impõe de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras…” (EG 56). Com
estas palavras não me prece que o Papa entenda que o risco do comunismo seja o único,
e muito menos o maior perigo da atualidade.
Novamente é o Papa Francisco que convoca à lucidez e afirma no seu mais recente
documento sobre o chamado à santidade no mundo atual: “Mas é nocivo e ideológico
também o erro das pessoas que vivem suspeitando do compromisso social dos outros,
considerando algo superficial, mundano, secularizado, imanentista, comunista,
populista; ou então relativizam-no como se houvesse outras coisas mais importantes,
como se interessasse apenas uma determinada ética ou um arrazoado que eles
defendem. A defesa do inocente nascituro, por exemplo, deve ser clara, firme e
apaixonada, porque neste caso está em jogo a dignidade da pessoa humana, sempre
sagrada, e exige-o o amor por toda a pessoa, independentemente de seu
desenvolvimento. Mas igualmente é sagrada a vida dos pobres que já nasceram e se
debatem na miséria, no abandono, na exclusão, no tráfico de pessoas, na eutanásia
encoberta de doentes e idosos privados de cuidados, nas novas formas de escravatura e
em todas as formas de descarte. Não podemos nos propor um ideal de santidade que
ignore a injustiça deste mundo, onde alguns festejam, gastam folgadamente e reduzem
sua vida às novidades do consumo, ao mesmo tempo que outros se limitam a olhar de
fora enquanto a sua vida passa e termina miseravelmente” (GE 101). Entendo que
Francisco está nos pedindo para não permitir que uma questão tão importante como a
sacralidade da vida seja instrumentalizada, a ponto de os mesmos que defendem
ferrenhamente a vida do nascituro sejam os que pregam o ódio, a violência, a tortura, o
racismo, a homofobia etc.
Os pensamentos acima são frutos da inquietação de um pastor que se angustia muito
com os fenômenos do nosso tempo e que entende que não tem o direito de se calar.
Silenciar sobre estes temas que estão pautando o momento político brasileiro seria para
mim muito mais difícil de administrar, do que correr o risco do equívoco tanto no mérito
da minha manifestação quanto na interpretação dos que a lerem. Fico à disposição para
todo tipo de crítica e de discordância, contanto que não seja mera agressão. Vale lembrar
o que dizia Dom Helder Câmara: “se discordas de mim, tu me enriqueces”.
O que eu quero crer de verdade é que não cheguemos ao ponto de ter que pedir
socorro aos ateus, para que nos livrem do fanatismo de cristãos adoecidos que estão
prestes assumir o governo do nosso país.
O que exponho aqui não pretende ser toda a verdade, muito menos a única verdade.
É apenas minha palavra.
Fonte:
https://www.diocesevacaria.com.br/as-eleicoes-2018-e-o-fanatismo-religioso/