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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

DCAM
Nº 70079288635 (Nº CNJ: 0294075-13.2018.8.21.7000)
2018/CÍVEL

APELAÇÃO CÍVIL. DIREITO PRIVADO NÃO


ESPECIFICADO. ALIENAÇÃO DE CAMINHÃO.
CHASSI ADULTERADO. EVICÇÃO. DEVER DO
ALIENANTE EM RESSARCIR O ADQUIRENTE.
INDENIZAÇÃO NO MONTANTE DO EFETIVO
PREJUÍZO.
Em questão, pretensão à indenização, consistente em
ressarcimento em montante específico, por conta de
transação havida entre as partes, onde efetivada a compra e
venda de um caminhão que, posteriormente negociado, foi
apreendido por conta de alteração de chassi constatada.
Mercê desta circunstância, os autores indenizaram os então
compradores e, através desta demanda, buscam ressarcir-se
pelo valor que dispenderam inicialmente na compra do bem.
Para a resolução da lide, desnecessário demonstração do
momento e autoria da alteração do chassi. O fato é que o
caminhão foi vendido pelo réu aos apelantes já com o
chassi adulterado, desimportando se o demandado conhecia
tal circunstância. Definida a obrigação de ressarcir,
entretanto, há que considerar que o prejuízo dos
demandantes foi no montante da indenização que
suportaram em relação aos segundos compradores, Altair e
Edson, e não no equivalente ao que desembolsaram na
transação primeira, havendo de ser aquele o referencial a
ser observado. Sentença que vai reformada, portanto, para
julgar a ação parcialmente procedente.

APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

APELAÇÃO CÍVEL DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL

Nº 70079288635 (Nº CNJ: 0294075- COMARCA DE BENTO GONÇALVES


13.2018.8.21.7000)

SUZANA TEDESCO CEGANO APELANTE

NICASIO PALUSO APELANTE

ADELAR FRANCISCO FILIPI APELANTE

SERGIO LUIZ PANIZZI APELADO

ACÓRDÃO

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
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DCAM
Nº 70079288635 (Nº CNJ: 0294075-13.2018.8.21.7000)
2018/CÍVEL

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Sexta Câmara Cível


do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, deram parcial provimento ao recurso de
apelação.
Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores


DES. ERGIO ROQUE MENINE (PRESIDENTE) E DES.ª JUCELANA LURDES
PEREIRA DOS SANTOS.
Porto Alegre, 21 de fevereiro de 2019.

DES.ª DEBORAH COLETO ASSUMPÇÃO DE MORAES,


Relatora.

RELATÓRIO

DES.ª DEBORAH COLETO ASSUMPÇÃO DE MORAES (RELATORA)


Para evitar tautologia, adoto o relatório da sentença (fls. 133/136), que vai
transcrito:
Vistos, etc.
SUZANA TEDESCO CECAGNO, NICASIO PALUDO e ADELAR
FRANCISCO FILIPI ajuizaram a presente ação de evicção contra SERGIO
LUIZ PANIZZI. Narraram que, em sociedade de interesses, adquiriram em
26/11/1996, um caminhão Mercedes Benz/ L 1518, ano fab/mod 1989/1989,
placa JWN 3196, chassi 9BM384024KB838540, pelo valor de R$ 25.000,00
(vinte e cinco mil reais), registrado junto ao Detran em nome da primeira
demandante, pelo Renavam nº 14645373-5. Em 26/03/1998, o veículo foi
vendido para Altair Jose Baggio e Edson Baggio, em Dois Lajeados/RS. Em
inspeção, o Detran de Guaporé/RS, em 05/06/2000 constatou que o chassi
do caminhão estava adulterado, sendo recolhido o veículo e devolvido ao
proprietário. Por isso, anotaram que assumiram compromisso de ressarcir
o valor do veículo pago, conforme termo de responsabilidade para
indenização do veículo, em 08/12/2000. Anotaram que jamais foram citados
ou intimados de ação judicial ou processo administrativo que tivesse
relação com a apreensão do veículo. Referiram que, considerando a
situação, o demandado locupletou-se com a venda do referido veículo.

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Postularam o ressarcimento do valor pago quando da aquisição do veículo


apreendido pela polícia. Requereu a procedência do pedido para condenar
o demandado ao ressarcimento do valor efetivamente recebido. Juntou
documentos.
Recebida a inicial (fl. 26).
Citado, o demandado apresentou contestação (fls. 28 e ss). Alegou,
preliminarmente, denunciação à lide do Detran, ocorrência de prescrição e
inépcia da inicial. No mérito, confirmou a venda do veículo para os autores,
e que, após a tradição, foi promovida vistoria no veículo, com transferência
do nome e todas as práticas rotineiras quando da aquisição do veículo, sem
nada ter sido constatado. Posteriormente, alegou que os autores venderam
o veículo em 1998 e a vistoria foi após dois anos. Requereu o acolhimento
das preliminares e, no mérito, a improcedência do pedido. Juntou
procuração.
Houve réplica (fls. 35/46).
Indeferido o pedido de denunciação à lide. Instadas as partes sobre o
interesse na produção de provas (fl. 47), os autores requereram a juntada
de documentos e prova oral (fl. 49/55) e o demandado não se manifestou (fl.
55-v).
Deferido o prazo para juntada de documentos (fls. 56).
O autor juntou documentos, sendo dada cista ao demandado.
Deferido prazo para juntada de procedimento administrativo.
Convertido julgamento de mérito em diligências, sendo saneado o feito e
afastadas as preliminares de inépcia da inicial e da prescrição, sendo
determinado oficiamento ao Detran e DEIC.
Sobreveio resposta do Detran (fls. 101/105).
Vieram os autos conclusos para sentença.
É O RELATÓRIO.

O dispositivo que encerra a sentença vem vazado nos seguintes termos:


Pelo exposto, julgo improcedente o pedido formulado por SUZANA
TEDESCO CECAGNO, NICASIO PALUDO E ADELAR FRANCISCO
FILIPI nos autos da ação de evicção movida em face de SÉRGIO LUIZ
PANIZZI, nos termos da fundamentação.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios, os quais arbitro em 10% do valor atualizado na causa, nos
termos do artigo 85, §2º, do CPC.

Inconformados, os autores interpuseram recurso de apelação (fls. 138/151),


aduzindo que, para fins de indenização pela evicção, não se questiona culpa ou dolo do
vendedor, mas apenas a condição do recorrido como alienante e a perda do bem pelo evicto,
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circunstâncias essas que restam cabalmente demonstradas nos autos. Outrossim, destacam
que também foi comprovado nos autos que a adulteração do chassi ocorreu antes da
transação entre eles havida, independente de não ser possível afirmar quando efetivamente
tal fato aconteceu. Assim, requerem a reforma da sentença, para que a ação seja julgada
procedente, sendo o réu condenado ao pagamento do valor que dispenderam para a compra
do bem, atualizado desde a data da venda, em 1996.
Contrarrazoando (fls. 155/165), o réu requer a manutenção da decisão,
alegando, resumidamente, que os autores não são os evictos, uma vez que alienaram
onerosamente o bem aos adquirentes Altair e Edson, de modo que a pretensão diz com o
direito de regresso e, em assim sendo, deve ser demonstrado o ato ilícito praticado por ele, o
que não ocorreu. Encerra pugnando pela manutenção da sentença.

Subiram os autos a este Egrégio Tribunal de Justiça e vieram conclusos para


julgamento após.

É o relatório.

VOTOS

DES.ª DEBORAH COLETO ASSUMPÇÃO DE MORAES (RELATORA)


Eminentes Colegas,

Conheço do recurso de apelação, pois preenchidos os pressupostos de


admissibilidade.

Do quanto importa contextualizar, em questão pretensão a indenização,


consistente em ressarcimento em montante específico, por conta de transação havida entre as
partes litigantes, onde efetivada a compra e venda de um caminhão que, posteriormente
negociado, foi apreendido pela autoridade policial por conta de alteração de chassi
constatada. Mercê desta circunstância, os autores indenizaram os então adquirentes e, através
desta demanda, buscam ressarcir-se pelo valor que dispenderam inicialmente na compra do
bem.
Esses os fatos a partir dos quais o Juiz a quo julgou improcedente a ação,
pois entendeu que os autores não demonstram a culpa do réu na adulteração do chassi.
Concessa máxima vênia do entendimento de origem, o quanto define não há
como subsistir.
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Pois bem, ainda que o feito conte com inúmeras diligências, algumas
absolutamente inócuas e vazias, por conta da inacreditável desorganização dos órgãos
policiais, a gerar perplexidade, certo é que o caminhão em questão contava com o mesmo
número de chassis quando foi adquirido pelos autores e quando foi periciado pelo DETRAN
de Guaporé, já em posse de terceiro que então o havia comprado. Isso se verifica pelo DUT
do veículo de fl. 09, quando houve a transferência do bem do réu para os autores e do DUT
de fl. 62, na alienação aos terceiros Altair e Edson. Em ambos consta o mesmo número de
chassi (9BM384024KB838540), que depois se constatou ser adulterado, consoante laudo de
fls. 102/105.

Portanto, pela ordem cronológica dos acontecimentos, é possível afirmar


que, no momento em que fora realizada a primeira transferência de propriedade do veículo,
em razão da compra do veículo pela parte demandante, a adulteração do chassis já se
incorporara ao bem.

Mais que tal aspecto não é preciso saber para definir a responsabilidade pela
circulação e negociação do caminhão, mostrando-se desnecessário que se demonstre em que
momento, e quem, operada a alteração do chassi. Fato é que o caminhão foi vendido pelo réu
aos autores já com o chassi adulterado, desimportando se esse possuía conhecimento ou não
sobre tal circunstância, porquanto, ainda que não tenham sido os autores a perder a
posse/propriedade do caminhão por ação de autoridade policial, o fundamento que serviu
para que estes indenizassem os terceiros adquirentes (Altair e Edson) é exatamente o mesmo:
o prejuízo deles pela aquisição de um veículo que já lhes fora transferido pelo requerido com
as irregularidades constatadas em outubro de 2000 (fls. 102/105)e que, em suma, determinou
a perda absoluta de domínio do bem e da correspondente fruição de uso.

Com isso, caem por terra as afirmações do demandado, no sentido de que


não restou demonstrado pelos autores que fora ele o adulterador do chassi, pois o quanto
importa foi comprovado: quando os apelantes adquiriram o caminhão do réu, as
irregularidades já existiam, de forma que ele responde pela evicção verificada no caso
concreto, como determina o art. 447 do Código Civil. Contudo, poderá buscar o respectivo
ressarcimento em face ao seu alienante, ou mesmo junto ao DETRAN, se entender que
houve falha nas vistorias anteriormente realizadas.

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Corroborando esse entendimento, colaciono precedentes do E. Tribunal de


Justiça deste Estado:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DENUNCIAÇÃO DA
LIDE. LEGITIMIDADE PASSIVA. EVICÇÃO. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA DOS ALIENANTES. 1.Denunciação da lide. Pedido que foi
indeferido na origem, na vigência do CPC/73. Não interposto o recurso
cabível. Preclusão. 2. Preliminar de ilegitimidade passiva afastada.
Transferência do veículo. Participação na cadeia sucessória. 3. Perda do
veículo. Penhora em reclamatória trabalhista. Busca e apreensão. O autor
ficou impedido de usufruir do automóvel. Respondem os réus, que
participaram da cadeia sucessória, pela evicção, mesmo que no documento
do veículo não houvesse qualquer restrição. A responsabilidade dos
alienantes é objetiva. Precedentes. Sentença confirmada. NEGARAM
PROVIMENTO AO RECURSO. (Apelação Cível Nº 70070511753, Décima
Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marlene Marlei
de Souza, Julgado em 10/10/2017)

RESPONSABILIDADE CIVIL. PEDIDO DE REVOGAÇÃO À


ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DESCABIMENTO. A forma de a
parte manifestar inconformidade quanto à concessão do benefício da
assistência judiciária é através de incidente de impugnação próprio.
Impossibilidade de a parte postular a revogação nas razões de Apelação.
Precedente. Apelo não conhecido, no ponto. AUTOMÓVEL. EVICÇÃO.
NUMERAÇÃO DO CHASSI ADULTERADA. REGISTROS DO VEÍCULO.
CADEIA DOMINIAL. RESPONSABILIDADE DOS ALIENANTES. AÇÃO
DE REGRESSO DO ADQUIRENTE DE BOA-FÉ. Caso em que a parte
autora foi condenada em ação indenizatória em função de fraude na
identificação do veículo o qual teria vendido a terceiro. Cadeia dominial,
data das transferências e das vistorias junto ao órgão de trânsito
demonstram ausência de agir ilícito da parte autora quanto à adulteração
dos registros do veículo. Demandado que é o primeiro na cadeia dominial
do veículo registrado no Detran deste Estado, somente em 1999 - com
fabricação anterior. Parte ré que não se desincumbiu da prova dos fatos
impeditivos , modificativos ou extintivos do direito do demandante, que age
regressivamente. Dever de restituição do prejuízo material configurado.
NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NA PARTE CONHECIDA.
DECISÃO UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70064320450, Décima Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana,
Julgado em 25/02/2016)

Definida a obrigação de reparação, entretanto, impossível desconhecer que


o prejuízo dos autores foi no montante da indenização que suportaram em relação aos
segundos compradores, Altair e Edson, e não no valor que desembolsaram para adquirir o
bem do réu. A primeira venda restou perfectibilizada, subsistindo a obrigação do demandado
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em ressarcir aquilo que os apelantes efetivamente tiveram subtraído, em razão do vício


constante no caminhão, que foi justamente a quantia paga aos adquirentes posteriores, estes
que tiveram o veículo apreendido pela adulteração do chassi.

Assim, a demanda merece ser julgada parcialmente procedente para que o


réu seja condenado a ressarcir os autores no montante de R$36.500,00 que estes dispenderam
em razão da perda do bem pelos segundos adquirentes, consoante termo de fl. 15. O valor
deverá ser atualizado pelo IGP-M desde a data do fato, correspondente ao dia em que os
autores repassaram a integralidade do valor aos terceiros Altair e Edson, isto é, dia
20/07/2007 (fl. 16); e juros de mora de 1% ao mês desde a citação.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso de apelação.


Em razão do resultado do julgamento, inverto os ônus sucumbenciais, e
considerando o decaimento mínimo dos autores, para condenar o réu ao pagamento das
custas processuais e dos honorários advocatícios em favor do procurador daqueles, que fixo
em 15% sobre o valor da condenação, por força do art. 85, §§8° e 11, CPC.

DES. ERGIO ROQUE MENINE (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).


DES.ª JUCELANA LURDES PEREIRA DOS SANTOS - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. ERGIO ROQUE MENINE - Presidente - Apelação Cível nº 70079288635, Comarca


de Bento Gonçalves: "À UNANIMIDADE, DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO
RECURSO DE APELAÇÃO."

Julgador(a) de 1º Grau: CARINA PAULA CHINI FALCAO

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