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CURSO DE LICENCIATURA EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS E

DIPLOMACIA

DIREITO CONSTITUCIONAL

REVISÃO CONSTITUCIONAL. FISCALIZAÇÃO DA


INCONSTITUCIONALIDADE E DA ILEGALIDADE

Docente:
Absalome Manjate

Maputo, Abril de 2020


REVISÃO DA CONSTITUIÇÃO

A doutrina tem pacificamente aceitado a existência de três institutos que correspondem


bem à protecção global da Constituição, a primeira a garantia acessória, não principal, a
segunda uma garantia extraordinária, não ordinária e a terceira uma garantia exclusiva,
não mista.

A revisão constitucional: é a possibilidade de rever a Constituição, por ela directamente


aceite, inscreve-se, em último termo, no desejo da sua perpetuação, desenhando-se os
limites que não podem ser galgados sob pena de subversão da Ordem Constitucional e de
já não haver revisão, mais sim a revolução ou a rotura constitucionais.

No plano funcional, a revisão constitucional também se particulariza em nome de três


funções que lhe são assinaladas: i. uma função de adequação do texto constitucional à
realidade constitucional; ii. uma função de aperfeiçoamento do texto constitucional, num
sentido já técnico e não tanto político e; iii. uma função de garantia da própria
continuidade da ordem constitucional.

O Estado de necessidade constitucional: a ocorrência de situações dramáticas de


pertubação da Ordem Constitucional obriga a tomar medidas muito drástica que
interrompem largas parcelas dessa mesma Ordem Constitucional, que se alinham numa
preocupação pela sua protecção última, não obstante o aparente paradoxo de que para
defender a Constituição é preciso suspendê-la e modificá-la substancialmente.

A fiscalização da constitucionalidade: a adopção de instrumentos funcionalmente aptos


à verificação das situações de violação da Constituição, levados a cabo no âmbito de
competências específicas que apenas têm esse fito, é o sinal mais forte de confirmação do
objectivo de defesa da Ordem Constitucional, o que vem acontecer com a fiscalização da
constitucionalidade.

A transição constitucional: é a criação de uma nova Ordem Constitucional,


materialmente diversa da anterior, mas utilizando os formalismos que esta previa para a
revisão constitucional, embora o resultado seja mais do que isso, ao implicar a instauração
de uma nova Ordem Constitucional.

A preocupação com a defesa da Constituição é outra face da Constitucionalidade, numa


perspectiva de protecção da Ordem Constitucional estabelecida.

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Garantia da Constituição e Revisão Constitucional

Podemos encontrar as garantias gerais e as garantias especiais.

Garantias Gerais – são as que irradiam para a toda constituição

Garantias Especiais – estas limitam-se aos segmentos mais específicos da Ordem


Constitucional, no contexto particular que se movem, da protecção que confere
nomeadamente:

a) A perda de direitos fundamentais – não obstante a titularidade universal dos


direitos fundamentais, a prática de actos graves contra a Ordem Constitucional
pode desembocar na perda de certos direitos políticos, numa decisão individual e
permanente.
b) A proibição dos partidos políticos inconstitucionais – a liberdade de associação
partidária, dentro das amplas fronteiras da democracia, encontra a barreira de um
conjunto de limites que o texto Constitucional levanta aos partidos políticos, no
plano da organização interna dos fins e dos símbolos art. 76 e 77 da Constituição
da República de Moçambique (CRM).
c) A proibição das associações totalitárias – a liberdade de associação em geral,
enfrenta limites inerentes aos objectivos professados, expressamente se dizendo
que “São proibidas as associações armadas do tipo militar ou paramilitar e as
que promovam a violência, o racismo, a xenofobia ou que prossigam fins
contrários à lei” n. 3 do art. 52.
d) O ilícito criminal político – a violação de bens constitucionalmente consagrados
é sancionado pela responsabilidade penal, desempenhando uma função de
garantia especial da Constituição, valendo essa punição duplamente para os
governantes – os crimes de responsabilidade – e para os governados – os crimes
contra o Estado.
e) O direito de resistência – a despeito do monopólio do uso da força pertencer à
autoridade pública ninguém pode ser bom juiz em causa própria, em certos casos
admite-se o direito de resistência perspectivado na defesa dos valores
constitucionais mais relevantes – art. 80 da CRM.
f) A objecção de consciência – no plano de convicções subjectivas, a consagração
da objecção de consciência permite filtrar certas violações da Constituição,
porquanto dá a faculdade ao titular do direito fundamental de não cumprir deveres

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que podem contender com valores constitucionais, mesmo perante a falência de
outros mecanismo de averiguação da inconstitucionalidade, dizendo que “É
garantida o direito à objecção de consciência, nos termos da lei” – n. 5 do art. 54
da CRM.

GARANTIAS GERAIS

Possuem uma superior eficácia, ao serem capazes de poteger todas as dimensões materiais
e organizatórias da Constituição, não se confinando a parcela mais estreitas da Ordem
Constitucional.

Na Constituição Moçambicana de 2004 (actualizada pela Lei n.º 1/2018, de 12 de Junho),


todo o Capítulo II do Título XV é dedicado ao problema da revisão da Constituição e da
leitura do art. 291 e seguintes conclui-se que a constituição é do tipo regido, pois exige
para a sua modificação um processo agravado em relação ao processo de formação das
leis ordinárias.

Esta escolha de um processo agravado de revisão, impedindo a livre modificação da lei


fundamental pelo legislador ordinário “ constituição flexível” considera-se uma garantia
da Constituição.

A rigidez constitucional é um limite absoluto ao poder de revisão, assegurando desta


forma a relativa estabilidade da Constituição.

Os Limites da Revisão da Constituição

(O que é um limite é o poder constituinte deve respeitar?)

Os Limites Formais

Os processos específicos de modificação da constituição baseiam-se essencialmente nas


várias formas de participação popular, na escolha do órgão a quem é atribuído o poder de
revisão, na exigência de um processo mais complexo do que a processo legislativo
normal, e no exercício temporal do poder de revisão.

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1. Limites quanto ao titular do poder de revisão
a) O órgão da revisão é o órgão legislativo ordinário

A revisão ou modificação da constituição é feita pelo mesmo órgão que desempenha


funções legislativas normais, mais segundo um processo particularmente agravado. O
agravamento pode traduzir-se na exigência de um parecer ou participação de outros
órgãos, na exigência de maioria qualificada para deliberação.

b) O órgão de revisão é o órgão legislativo, mas a revisão exige a participação


directa do povo.

A revisão constitucional continua a pertencer ao órgão legislativo, mas as modificações


constitucionais carecem de aprovação popular através de referendum, preventivo ou
sucessivo, facultativo ou obrigatório.

c) O órgão de revisão é um órgão especial

Neste esquema existem duas hipóteses consoante haja ou não ligação com o órgão
legislativo normal. Assim, o órgão especial pode ter como base o órgão legislativo normal
(ex:. o órgão de revisão é constituído pelas câmaras em reunião conjunta no caso
moçambicano pelas comissões especializadas da Assembleia da República) ou ser um
órgão especialmente eleito para o efeito.

2. Limites relativos às maiorias deliberativas

Quando reconhece ao órgão legislativo ordinário o poder de revisão, é normal a


Constituição sujeitar as deliberações deste órgão a maioria qualificada, demonstrativa de
uma adesão ou consenso mais inequívoco dos representantes quanto às alterações da
Constituição isto mesmo se passa com a Constituição moçambicana que exige maioria de
2/3 dos deputados no que respeita à revisão ordinária – n. 1 do art. 303.

As revisões extraordinárias efectuadas em qualquer momento, implicam naturalmente um


processo mais agravado e dai a exigência de uma maioria de ¾ dos deputados para
assumir poderes de revisão da Constituição – art. 301.

3. Limites Temporais

Os limites temporais costumam a ser justificados pela necessidade de assegurar uma certa
estabilidade às instituições constitucionais. A Constituição moçambicana fixou um
espaço temporal de 5 anos como lapso do tempo que deve mediar entre as revisões

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ordinárias da Constituição, aceitou a revisão extraordinária em qualquer momento desde
que se satisfaçam os restantes requisitos, exigidos (maioria qualificada de 3/4) – art. 301
da CRM.

4. Limites quanto à legitimidade do órgão com poder de revisão

A fim de evitar-se que o legislador ordinário tenha a Constituição à sua completa


disposição, estabelecem-se requisitos tendentes a impedir que as maiorias parlamentares
no poder assumam poderes de revisão para moldar a Constituição de acordo com os seus
interesses: i. as constituições exigem por vezes a renovação dos componentes do órgão
legislativo através de eleições. Neste caso devem entender-se os prazos fixados na
Constituição moçambicana; ii. a este prazo está associada a ideia de renovação do órgão
legislativo; iii. desde logo ao estabelecer que só na II Legislatura a Assembleia da
República (AR) teria poderes de revisão, a Constituição quis evitar que logo na I
Legislatura ao sabor das forças políticas, se alterasse o compromisso constitucional
alcançado por vezes com grandes dificuldades; iv. Ao estatuir que a Constituição só pode
ser revista cinco anos depois da entrada em vigor da última lei de revisão – art. 301 da
CRM. (o legislador constituinte pretendeu que fosse a nova Assembleia eleita a assumir
poderes de revisão).

5. Limites circunstanciais

Os limites circunstanciais proibem a revisão constitucional na vigência dos estados de


sitio e de emergência. Não é difícil compreender o porque desta limitação: colocando-se
o Estado numa situação de anormalidade, com ameaças externas ou internas às
instituições, não seria prudente desenvolver um procedimento de revisão constitucional,
potencialmente muito permeável a essas pressões, assim se inquinando a expressão fiel
democrática da vontade dos representantes do povo.

É uma medida cautelar, visando resguardar o poder de revisão constitucional de


manipulação que são sempre mais frequentes – embora não sejam inevitáveis – nestes
períodos de conturbação institucional.

A história ensina que certas circunstâncias excepcionais (estado de guerra, estado de sítio,
estado de emergência) podem constituir ocasiões favoráveis à imposição de alterações
constitucionais, limitando a liberdade de deliberação do órgão representativo. Dai a razão

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do art. 302 CRM, com a epigrafe “limites circunstanciais”, proibir a revisão da
Constituição em situação de anormalidade constitucional.

II. OS LIMITES MATERIAIS

Os limites materiais da revisão constitucional são os mais óbvios que se colocam na


expressão do poder de rever a Constituição, são eles o certificado comprovativo das
limitações que necessariamente inerem ao conceito de revisão constitucional.

Os limites materiais significam que a CRM não admite uma revisão ilimitada ou para
todas as matérias, o que na prática, poderia trazer o fácil resultado de uma nova
Constituição, em vez de simples revisão da Constituição existente, apresentando-se assim
como irrevisível um largo conjunto de doze matérias constantes das als, a) a l) do n. 1 do
art. 300 da CRM, consideradas como participando da essência do Direito Constitucional
Moçambicano vigente, matérias que estarão sempre excluídas do respectivo âmbito
regulativo.

Em termos procedimentais, a alteração destes limites envolvem a realização, obrigatória


e prévia, de um referendo constitucional, de natureza vinculativa. “As matérias constantes
do número anterior são obrigatoriamente sujeitas a referendo” n. 2 art. 300 da CRM.

A Constituição Moçambicana é híper-rígida embora admitindo a sua revisão, que sucede


em termos limitados, com respeito por um formalismo e por um conteúdo que se perpetua
para além das revisões constitucionais.

1. Limites superiores e limites inferiores

Distinguem-se pela necessidade de saber-se a) se uma lei de revisão poderá inserir na


Constituição qualquer matéria, b) se poderá ser objecto de revisão todas as normas da
constituição.

Limite inferior – assinala-se a inexistência de alguma reserva de matéria


constitucional obrigatoriamente plasmada sob forma constitucional pelo legislador
constituinte. A inexistência de uma reserva de matéria constitucional valerá também
em sede do poder de revisão.

Limites superiores – existem efectivamente limites ao poder de revisão, pois


algumas normas da Constituição não podem ser objecto de revisão. A determinação

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das normas constitucionais que por constituírem o cerne da Constituição não podem
ser objecto de revisão, conduz-nos aos desenvolvimentos seguintes:

2. Limites expressos e limites tácitos

Limites expressos ou textuais - são limites previstos no próprio texto constitucional. As


constituições seleccionam um leque de matérias, consideradas como cerne material da
ordem constitucional, tiram essas matérias à disponibilidade do poder de revisão.
Exemplo característico é muito significativo é o n. 1 do art. 300 da CRM.

Outras vezes, as constituições, não contêm quaisquer preceitos limitativos do poder de


revisão, mas entende-se que há limites não articulados ou tácitos, vinculativos do poder
de revisão. Esses limites podem ainda desdobrar-se em limites textuais implícitos
deduzidos do próprio texto constitucional, e limites tácitos imanentes numa ordem de
valores pré-positiva, vinculativa da ordem constitucional concreta.

Os limites são limites do poder de revisão como poder constituído não são limites para
sempre, vinculativo de toda e qualquer manifestação do próprio poder constituinte. Em
sentido absoluto, nunca a geração fundadora pode vincular eternamente as gerações
futuras.

Os limites materiais devem encontrar um mínimo de recepção no texto constitucional, ou


seja, devem ser limites textuais implícitos.

3. Limites Absolutos e Limites Relativos

Limites absolutos de revisão são todos os limites da Constituição que não podem ser
superados pelo exercício de um poder de revisão.

Limites relativos – aqueles limites que se destinam a condicionar o exercício do poder de


revisão, mas não impedir a modificabilidade das normas constitucionais, desde que
cumpridas as condições agravadas estabelecidas por esses limites.

III. REVISÃO EXPRESSA E REVISÃO TÁCITA

1. Regra geral nenhuma revisão é feita sem alteração do texto.

A revisão da Constituição tem que ser feita de modo expresso. Quer se trate de supressão
de normas, quer se trate de uma substituição de texto constitucional, quer de aditamento,

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todas estas alterações são inseridas no lugar próprio da Constituição, publicando-se
conjuntamente a Constituição no seu novo texto, e a lei da revisão – ex vi arts. 303 e 304
da CRM.

Portanto, no ordenamento jurídico moçambicano nenhuma modificação ou revisão


constitucional deve ser feita sem alteração do texto constitucional.

IV. REVISÃO TOTAL E REVISÃO PARCIAL

A revisão pode consistir na renovação de certas disposições através da supressão,


substituição ou aditamento de normas. Trata-se sempre de alterações parciais da
Constituição.

Revisão total – que consistiria na substituição do texto da constitucional por um outro


completamente novo. É o que se chama revisão total em sentido formal.

Revisão total em sentido material - para exprimir a ideia de alteração de normas


constitucionais caracterizadoras de um Estado, a revisão total é camuflada, porque
consiste numa revisão parcial incidente sobre o cerne político da Constituição.

A possibilidade de uma revisão total está expressamente prevista em algumas


constituições (ex.: Suíça e Estados Unidos da América). Em ordenamentoa
constitucionais que não esta expresso deve-se entender que a revisão total é um limite da
revisão parcial dando lugar às transições revolucionárias.

V. REVISÃO E DESENVOLVIMENTO CONSTITUCIONAL

A Constituição pressupõe a ideia de um sistema jurídico dotado de um núcleo constitutivo


de identidade. A identidade da Constituição não significa a continuidade ou permanência
do sempre igual (pois num mundo sempre dinâmico a abertura à evolução é um elemento
estabilizador da própria identidade).

Desenvolvimento constitucional significa conjunto de formas de evolução da


Constituição (nova compreensão por ex:. dos direitos fundamentais, das normas de
procedimentos e de processo, nova dimensão dos meios de comunicação social e novas
normações no seio da sociedade civil).

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VI. REVISÃO E REVISIONISMO

No campo da Ciência Política e do Direito Constitucional distingue-se, por vezes, entre a


revisão e o revisionismo ou entre revisão em sentido processual e revisão em sentido
ideológico.

Na acepção processual a palavra revisão significa a modificação de um ou vários pontos


específicos de uma Constituição.

No sentido ideológico a revisão identifica-se com o revisionismo entendido como


movimento político-social que reivindica a revisão global da Constituição para operar
uma mudança de regime. Neste caso, o programa de revisão não é uma simples proposta
de emenda, mas um programa de oposição ao regime.

1. Revisão Constitucional e Inconstitucionalidade

Sistemáticamente a garantia da Constituição está na posição que ela exerce de cume da


Ordem Jurídica, tal acarretando uma relação de desconformidade por parte de todos os
restantes actos jurídico-públicos que à mesma desobedeçam, devendo-lhe estrito
acatamento.

Esta relação de desconformidade que se designa por inconstitucionalidade, o mesmo é


dizer, a verificação de uma discrepância entre a Constituição e o acto jurídico-público
que com ela é desconforme, tal pressupondo, com base num raciocínio comparativo

A revisão está constitucionalmente sujeita a limites formais, circunstanciais e materiais.


A não observância pela lei de revisão dos limites estabelecidos na constituição coloca-
nos perante o problema da desconformidade constitucional das leis de revisão problema
não diferente da inconstitucionalidade das leis ordinárias dado que o poder de revisão e
um poder constituído e não uma novação do poder constituinte.

2. Leis de Revisão e incompetência do órgão

Nos casos de falta de competência absoluta dos órgãos de que emanou a lei de revisão
(ex.: lei de revisão aprovada pelo Governo, por plebiscito ou referendo, sob proposta do
Governo ou do Presidente da República) é evidente que a lei esta viciada de inexistência,
pois só a AR é constitucionalmente competente para fazer leis de revisão. Dos casos de
carência absoluta de poderes de revisão, devem aproximar-se duas outras hipóteses:

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(1) Leis de revisão aprovadas pela AR, fora dos casos em que esta, nos termos
constitucionais, tem poderes de revisão (exs.: leis de revisão aprovada antes de
decorridos cinco anos – a não ser que se trate de revisão extraordinária nos termos
do art. 301 sobre anterior lei de revisão; a lei de revisão aprovada durante o estado
de sítio).
(2) As leis de revisão votadas pela AR no uso dos seus poderes de revisão, mas não
aprovadas pela maioria qualificada constitucionalmente exigida – art. 303 da
CRM.

3. Leis de revisão e ausência de causa ou intenção

As leis de revisão constitucional que não indiquem, taxativa e expressamente, as


alterações a introduzir no texto constitucional – n. 1 do art. 304 da CRM, não se pode
atribuir intenção de revisão. Nas questões de alteração formal da Constituição não pode
haver deduções implícitas ou tácitas da vontade do órgão de revisão: este tem de,
expressis verbis, demonstrar que quis substituir, suprimir ou aditar a Constituição – n.º 1
do art. 304 da CRM.

4. Nulidade das leis de revisão

Dada a existência de limites formais e materiais, as leis de revisão que não respeitarem
esses limites serão respectivamente inconstitucionais sob o ponto vista de formal e
material (leis de revisão que violam o processo estabelecido no n. 1 do art. 299 da CRM,
como seriam as leis aprovadas mediante proposta do Governo e as leis de revisão que
violam os limites materiais do art. 300 da CRM

A inconstitucionalidade material e formal das leis de revisão pode e deve ser apreciada
pelos tribunais (art. 213 da CRM) e pelo Conselho Constitucional (art. 244 da CRM), ou
seja, segundo o processo de fiscalização sucessiva, havendo algumas dúvidas quanto à
possibilidade de controlo preventivo.

A promulgação Presidencial da lei de revisão constitucional não pode ser recusada, não
havendo lugar – ao contrário do que normalmente sucede – o veto político. “O Presidente
da República não pode recusar a promulgação da lei de revisão” – n. 3 do art. 303 da
CRM.

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A publicação das alterações à Constituição tem a particularidade de ser acompanhada da
republicação codificada de todo o texto constitucional já revisto, o que se explica por uma
necessidade de segurança e dignidade no conhecimento da nova versão da lei fundamental
– ex vi n. 2 do art. 304 da CRM e o n. 2 do art. 149 do do Regimento da Assembleia da
República (RAR).

OS PROCESSOS DE FISCALIZAÇÃO DA INCONSTITUCIONALIDADE E DA


ILEGALIDADE

A. INDIVIDUALIZAÇÃO

Os tipos processuais de fiscalização e da inconstitucionalidade de normas jurídicas são:

a) Controlo abstracto por via de acção.


b) Controlo abstracto prévio ou fiscalização preventiva da inconstitucionalidade.
c) Controlo concreto por via de acção.
d) Controlo Misto.
e) Controlo abstracto por omissão.
f) Processo de verificação da contrariedade de uma norma legislativa com uma
convenção internacional.

Os órgãos de fiscalização da constitucionalidade são, por um lado o Conselho


Constitucional (CC) – tem competência exclusiva de fiscalização preventiva, fiscalização
sucessiva abstracta e de fiscalização da inconstitucionalidade por omissão e julga os
recursos das decisões de constitucionalidade dos outros tribunais.

Por outro lado, os demais tribunais – decidem das questões de constitucionalidade


levantadas em cada caso submetido ao seu julgamento, e as suas decisões em metérias de
inconstitucionalidade são sempre recorríveis para o CC.

A fiscalização da constitucionalidade não incide apenas sobre normas existentes e


vigentes. Pode também incidir sobre normas ainda não existentes, sobre normas que já
deixaram de estar em vigor (por revogação ou caducidade) e sobre normas de eficácia
suspensa.

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No controlo de normas ainda não existente, o processo de formação ainda não está
perfeito do que trata a fiscalização preventiva da constitucionalidade – ex vi art. 245 da
CRM.

A fiscalização de normas já revogadas é perfeitamente lógica, sempre que se trata de


julgar um facto passado à luz do direito vigente à data da sua ocorrência (crime) ou de
apreciar uma norma que apesar de revogada ainda seja susceptível de aplicar-se a casos
pendentes. A revogação tem normalmente efeitos para o futuro enquanto que a declaração
de inconstitucionalidade tem normalmente eficácia retroactiva.

Nos actos isentos de fiscalização da constitucionalidade aparecem os actos de natureza


política, como a promulgação, o veto, o decreto presidencial de demissão do Governo, o
decreto de dissolução da AR. Estes actos não podem ser judicialmente anulados por
inconstitucionalidade. As normas de natureza privada – regulamento das associações,
negócios jurídicos privados, códigos de conduta – são do foro do judicial.

A inconstitucionalidade de uma norma consiste na ofensa da disciplina constitucional por


qualquer um dos seus aspectos: incompetência, vícios de forma ou de procedimentos,
contradição entre o conteúdo da norma e o conteúdo normativo da Constituição. Em
suma, uma norma é inconstitucional sempre que viole qualquer dos aspectos
constitucional vinculados

Existem quatro formas de fiscalização, designadamente:

a) Fiscalização preventiva da inconstitucionalidae por acção;


b) Fiscalização sucessiva concreta da inconstitucionalidade por acção;
c) Fiscalização sucessiva abstracta da inconstitucionalidade por acção;
d) Fiscalização da inconstitucionalidade por omissão.

a) Controlo abstracto por via de acção

Também designado por processo em “via principal” em “via de acção” ou em “via


directa”.

Inconstitucionalidade por acção, como o nome indica, é a actuação dos poderes públicos
contrária à Constituição distinguindo-se assim da inconstitucionalidade por omissão.

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O controlo abstracto é independente da fiscalização concreta, mas existe a possibilidade
de trânsito de controlo concreto para o controlo abstracto a fim de se obter a generalização
das decisões proferidas em controlo concreto.

A inconstitucionalidade tem por objecto uma pretensão dirigida à declaração, com força
obrigatória geral, da inconstitucionalidade de normas jurídicas (art. 243, n.º 1 e art. 245
da CRM). É um processo de controlo de normas, destinado a, de forma abstracta, verificar
a conformidade formal, procedimental ou material, de normas jurídicas com a
Constituição.

b) Controlo abstracto prévio ou fiscalização preventiva da


inconstitucionalidade

É uma fiscalização anterior à própria introdução das normas na ordem jurídica tem por
objecto normas imperfeitas. É por natureza um controlo abstracto e, no caso de juízo de
inconstitucionalidade, o processo legislativo não pode ser levado a cabo e as normas do
diploma em causa não podem entrar na ordem jurídica.

Tem por objecto uma pretensão destinada a evitar que certos projectos de actos
normativos se transformem em actos perfeitos e definitivos mas inconstitucionais – ex vi
art. 245 da CRM.

c) Controlo concreto por via de acção

Também designado processo incidental de inconstitucionalidade ou processo de


fiscalização concreta tem por objecto a apreciação de uma questão de
inconstitucionalidade, levantada a título de incidente, nos feitos submetidos a julgamento
perante qualquer tribunal. Trata-se de uma fiscalização concreta, pois ela efectua-se
quando, num processo a decorrer em tribunal, se coloca a questão da
inconstitucionalidade de uma norma com pertinência na causa – ex vi arts. 213 e 246 da
CRM.

A competência para julgar a inconstitucionalidade é reconhecida a todos os tribunais que


podem apreciar, por impugnação das partes ou por iniciativa do juiz, a existência de
inconstitucionalidade das normas aplicáveis ao caso concreto submetido ao julgamento,
há sempre recurso para o CC, cabendo a esse tribunal decidir definitivamente a questão.
Mas a decisão continua a valer apenas para o caso que deu origem ao recurso.

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d) Controlo Misto

Trata-se do processo de declaração de inconstitucionalidade com base no controlo


concreto de normas. Este processo conjuga duas dimensões: (1) dimensão abstracta, dado
que se trata da declaração da inconstitucionalidade com força obrigatória geral, tal como
sucede nos processos principais de inconstitucionalidade; (2) uma dimensão concreta,
porque a declaração de inconstitucionalidade tem como base a fiscalização concreta da
constitucionalidade de normas jurídicas – n. 1 art. 244 CRM.

e) Controlo abstracto por omissão

O processo de inconstitucionalidade por omissão destina-se a verificar a inexistência de


medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis certos preceitos constitucionais.
Trata-se, pois, de uma pretensão que assenta não na existência de normas jurídicas
inconstitucionais, mas na violação da lei constitucional pelo silêncio legislativo (violação
por omissão).

As decisões do CC sobre a existência da inconstitucionalidade por omissão tem como


efeito prático apenas a certificação da omissão e a participação da decisão, para
conhecimento, ao órgão legislativo competente.

f) Processo de verificação da contrariedade de uma norma legislativa com uma


convenção internacional

Aos processos precedentes deve acrescentar-se, hoje, o processo de verificação de


contrariedade de uma norma legislativa com uma convenção internacional.

No sistema de fiscalização da constitucionalidade estão abrangidas todas as normas,


qualquer que seja a sua natureza, a sua fonte, a sua forma, a sua hierarquia, desde que
tenham natureza jurídica e façam parte ou vigorem na ordem jurídica moçambicana.

No Direito Constitucional Moçambicano, objecto de fiscalização não são apenas os


chamados actos normativos primários1 que são as Leis e Tratados Internacionais, mas
também os actos normativos secundários ou terciários que são os regulamentos,
despachos normativos, etc.

1
O acto normativo primário tem a sua forma, materialidade e autonomia, inovando no ordenamento jurídico
(cria, modifica, extingue direitos e obrigações); Já o acto normativo secundário, a princípio, existe para
regulamentar o ato normativo primário (ex.: regulamentos administrativos de execução ou
complementares).

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B. PROCESSO DE FISCALIZAÇÃO DIFUSO, CONCRETO E
INCIDENTAL

A competência para fiscalizar a constitucionalidade das normas é reconhecida a todos os


tribunais, quer por impugnação das partes, quer ex officio pelo juiz, apreciam a
inconstitucionalidade das normas aplicáveis ao caso concreto submetido a decisão
judicial – ex vi art. 213 e 246 da CRM.

O processo de fiscalização concreta de normas jurídicas, designado também por processo


incidental ou acção judicial de inconstitucionalidade traduz a consagração do direito
e dever de fiscalização dos juízes relativamente às normas a aplicar a um caso concreto.

Uma norma em desconformidade material, formal ou procedimental com a Constituição


é nula, devendo o juiz, antes de decidir qualquer caso concreto de acordo com esta norma,
examinar (direito de exame, direito de fiscalizar) se ela viola as normas e princípios da
Constituição. Desta forma, os juízes têm acesso directo à Constituição aplicando ou
desaplicando normas cuja inconstitucionalidade foi impugnada.

A competência dos tribunais para exercerem a fiscalização judicial consta do já citado


art. 213 e seu regime básico esta fundamentalmente consagrado no art 246, ambos da
CRM. É este o regime geral de acesso ao CC, exigindo-se, portanto, que o problema da
constitucionalidade de uma norma surja no decurso de um processo jurisdicional (penal,
civil, administrativo, etc.). Das decisões do juiz quer de acolhimento quer de rejeição da
inconstitucionalidade cabe recurso por via incidental para o CC – n. 1 do art. 246 da CRM.

Considerando que das decisões dos juízes pode haver recursos de inconstitucionalidade
para o CC, diz-se também que a fiscalização concreta, incidental e difusa, é uma
introdução necessária dos recursos para o CC. Este poderá vir a revogar a decisão do juiz
incidente sobre questões de inconstitucionalidade.

Sujeitos que podem levantar a inconstitucionalidade

A questão da inconstitucionalidade pode ser levantada nos feitos submetidos a


julgamento: (1) a instância de parte; (2) ex officio pelo juiz; (3) pelo Ministério Público
(MP) quando este seja parte do processo. O reconhecimento às partes de legitimidade
processual activa para suscitarem o incidente de inconstitucionalidade justifica-se pelo
facto de o incidente ou excepção ser um meio idóneo de elas defenderem interesses
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subjectivos. A legitimidade processual activa do juiz ou do MP quando seja parte no
processo explica-se pela vinculação dos órgãos jurisdicionais aos princípios da
constitucionalidade e da unidade da ordem jurídica.

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