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Humanismo e Classicismo
DORÉ, Gustave. Demônios confrontando Dante e Virgílio. Ilustração para o livro A divina Comédia (Inferno), de Dante
Alighieri, publicado em 1885 – Biblioteca de Artes Decorativas (Paris, França). A ilustração reflete a confiança dos
humanistas. Dante e Virgílio enfrentam os demônios por meio da razão, que os ajuda a afastar as “trevas” do
pensamento vinculado à Idade Média.
Contexto
Projeto literário
O abandono da subordinação ao Clero e o resgate dos valores clássicos fazem com que
ganhe força um olhar mais racional sobre o mundo, buscando na Ciência uma explicação para
os fenômenos até então atribuídos a Deus. O contexto de produção é o mesmo do
Trovadorismo, mas em função do desenvolvimento intelectual vindo da ampliação cultural
promovida pela burguesia, os textos passam a ser escritos para ser lidos e não mais cantados,
como seguia a tradição oral das cantigas.
A partir do início da produção de livros na Europa, sobretudo com a invenção da gráfica,
por Johann Gutenberg, por volta de 1450, a Literatura ganha com obras que permitem ao
escritor se valer de novos recursos técnicos de escrita e linguagem, sem ficarem presos à
oralidade e à memória, como faziam até então. Para se ter uma ideia, surge na Alemanha em
1455, o primeiro livro impresso por Gutemberg, a Bíblia.
Os reis e nobres da Dinastia de Avis (1385-1580) tornaram Portugal mais poderoso e rico
com o início da expansão marítima em Portugal, que surge ao mesmo tempo em que se funda a
Torre do Tombo, em 1418, que foi um importante centro de registro e documentação da época.
Destaca-se a figura de Fernão Lopes, nomeado o cronista-mor da Torre do Tombo, em 1434,
sendo responsável por escrever e catalogar as Crônicas historiográficas.
Surge uma poesia desvinculada da música, chamada de Poesia Palaciana, com Garcia de
Resende e sua compilação de poetas no “Cancioneiro Geral”, de 1516. Destaca-se, também, a
figura de Gil Vicente na produção teatral, sendo um importante representante da cultura e
sociedade da época.
O teatro de Gil Vicente
O Auto da barca do inferno representa o juízo final católico de forma satírica e com forte
apelo moral. O cenário é uma espécie de porto, onde se encontram duas barcas: uma com
destino para o inferno, comandada pelo diabo, e a outra, com destino para o paraíso,
comandada por um anjo. Ambos os comandantes aguardam os mortos, que são as almas que
seguirão para o paraíso ou para o inferno. Os mortos começam a chegar e um fidalgo é o
primeiro. Ele representa a nobreza, e é condenado ao inferno por seus pecados, tirania e luxúria.
O diabo ordena ao fidalgo que embarque. Este, arrogante, julga-se merecedor do paraíso, pois
deixou muita gente rezando por ele. Recusado pelo anjo, encaminha-se, frustrado, para a barca
do inferno; mas tenta convencer o diabo a deixá-lo rever sua amada, pois esta “sente muito”
sua falta.
O diabo destrói seu argumento, afirmando que ela o estava enganando. Um agiota
chega a seguir e é condenado ao inferno por ganância e avareza. Tenta convencer o anjo a ir
para o céu pedindo ao diabo que o deixe voltar para pegar a riqueza que acumulou, mas é
impedido e acaba na barca do inferno. O terceiro indivíduo a chegar é o parvo (um tolo,
ingênuo). O diabo tenta convencê-lo a entrar na barca do inferno; quando o parvo descobre qual
é o destino dela, vai falar com o anjo. Este, agraciando-o por sua humildade, permite-lhe entrar
na barca do céu. A alma seguinte é a de um sapateiro, com todos os seus instrumentos de
trabalho. Durante sua vida enganou muitas pessoas, e tenta enganar também o diabo. Como
não consegue, recorre ao anjo, que o condena como alguém que roubou do povo. O frade é o
quinto a chegar cantarolando com sua amante. Sente-se ofendido quando o diabo o convida
a entrar na barca do inferno, pois, sendo representante religioso, crê que teria perdão. Foi,
porém, condenado ao inferno por falso moralismo religioso.
Brísida Vaz, feiticeira e alcoviteira, é recebida pelo diabo, que lhe diz que seu o maior
bem são “seiscentos virgos postiços”. Virgo é hímen, representa a virgindade. Compreendemos
que essa mulher prostituiu muitas meninas virgens, e “postiço” nos faz acreditar que enganara
seiscentos homens, dizendo que tais meninas eram virgens. Brísida Vaz tenta convencer o anjo
a levá-la na barca do céu inutilmente. Ela é condenada por prostituição e feitiçaria. A seguir, é a
vez do judeu, que chega acompanhado por um bode. Encaminha-se direto ao diabo, pedindo
para embarcar, mas até o diabo recusa-se a levá-lo. Ele tenta subornar o diabo, porém este, com
a desculpa de não transportar bodes, o aconselha a procurar outra barca.
O judeu fala, então, com o anjo, porém não consegue aproximar-se dele: é impedido,
acusado de não aceitar o cristianismo. Por fim, o diabo aceita levar o judeu e seu bode, mas não
dentro de sua barca, e, sim, rebocados. Durante o reinado de Dom Manuel, de 1495- 1521,
muitos judeus foram expulsos de Portugal, e os que ficaram tiveram que se converter ao
cristianismo, sendo perseguidos e chamados de “cristãos novos”. Ou seja, Gil Vicente segue,
nessa obra, o espírito da época. O corregedor e o procurador, representantes do judiciário,
chegam, a seguir, trazendo livros e processos.
Quando convidados pelo diabo a embarcarem, começam a tecer suas defesas e
encaminham-se ao anjo. Na barca do céu, o anjo os impede de entrar: são condenados à barca
do inferno por manipularem a justiça em benefício próprio. Ambos farão companhia à Brísida
Vaz, revelando certa familiaridade com a cafetina – o que nos faz crer ter havido trocas de
serviços entre eles. O próximo a chegar é o enforcado, que acredita ter perdão para seus
pecados, pois em vida foi julgado e enforcado. Mas também é condenado a ir para o inferno por
corrupção. Por fim, chegam à barca quatro cavaleiros que lutaram e morreram defendendo o
cristianismo. Estes são recebidos pelo anjo e perdoados imediatamente.
O bem e o mal
Todos os personagens que têm como destino o inferno chegam trazendo consigo objetos
terrenos, representando seu apego à vida; por isso, tentam voltar. Os personagens a quem se
oferece o céu são cristãos e puros. O mundo aqui ironizado é maniqueísta: o bem e o mal, o
bom e o ruim são metades de um mundo moral simplificado. O Auto da barca do inferno faz
parte de uma trilogia (Autos da barca da glória, do inferno e do purgatório). Escrito em versos
de sete sílabas poéticas, possui apenas um ato, dividido em várias cenas. A linguagem entre os
personagens é coloquial – e é através das falas que podemos classificar a condição social de
cada um dos personagens.
Leia um trecho:
[Vêm Quatro Cavaleiros cantando, os quais trazem cada um a Cruz de Cristo, pela qual Senhor e
acrescentamento de Sua santa fé católica morreram em poder dos mouros. Absoltos a culpa e
pena per privilégio que os que assi morrem têm dos mistérios da Paixão d’Aquele por Quem
padecem, outorgados por todos os Presidentes Sumos Pontífices da Madre Santa Igreja. E a
cantiga que assi cantavam, quanto a palavra dela, é a seguinte:
Cavaleiros: À barca, à barca segura, barca bem guarnecida, à barca, à barca da vida! Senhores
que trabalhais pela vida transitória, memória, por Deus, memória deste temeroso cais! À barca,
à barca, mortais, Barca bem guarnecida, à barca, à barca da vida! Vigiai-vos, pecadores, que,
depois da sepultura, neste rio está a ventura de prazeres ou dolores! À barca, à barca, senhores,
barca mui nobrecida, à barca, à barca da vida!
[E passando per diante da proa do batel dos danados assi cantando, com suas espadas e
escudos, disse o Arrais da perdição desta maneira:
Diabo: Cavaleiros, vós passais e não perguntais
onde vais?
1o CAVALEIRO: Vós, Satanás, presumis? Atentai
com quem falais!
2o CAVALEIRO: Vós que nos demandais? Sequer
conhece-nos bem: morremos nas Partes d’Além, e não
queirais saber mais.
DIABO: Entrai cá! Que cousa é essa? Eu não
posso entender isto!
CAVALEIROS: Quem morre por Jesus Cristo não
vai em tal barca como essa!
[Tornaram a prosseguir, cantando, seu caminho
direito à barca da Glória, e, tanto que chegam, diz o
Anjo:]
ANJO: Ó cavaleiros de Deus, a vós estou esperando,
que morrestes pelejando por Cristo, Senhor dos
Céus! Sois livres de todo mal, mártires da Santa Igreja,
que quem morre em tal peleja merece paz eternal.
[E assim embarcam.]
Classicismo
Cronologia do Classicismo
Comércio
O fascínio pela vida nos meios urbanos fez com que a sociedade buscasse cada vez mais
os prazeres que o dinheiro podia propiciar. O comércio entre as nações da Europa cresceu e a
burguesia mercantil não aceitava que a produção agrária estivesse voltada apenas para a
subsistência e desejava buscar o comércio exterior entre as nações.
Renascimento
O Renascimento foi uma decorrência natural do Humanismo. O seu significado nas artes
é reflexo de transformações radicais sucedidas no Oriente, ao se emancipar do velho sistema
feudal. A certeza de que o ser humano é uma força racional, capaz de dominar e de transformar
o Universo, levou o europeu a uma identificação com a cultura clássica, que valorizava a vida
terrena. O mundo, as pessoas e a vida passaram a ser
vistos sob o prisma da razão.
O palco
A Itália foi onde essa tendência renascentista apareceu com mais intensidade, sendo o
palco deste retorno ao mundo da Antiguidade Clássica, ou seja, fez renascer os ideais de
valorização dos gregos e latinos, desde meados do século XIII, dos esforços individuais, da
perfeição, da superioridade humana e da razão como parâmetro de observação e interpretação
da realidade.
Literatura
O poeta Dante Alighieri, autor da Divina comédia, introduziu o verso decassílabo –
chamado de “a medida nova”, em contraponto à redondilha, considerada como “medida
velha”. O poeta Francesco Petrarca, criador do soneto, influenciou vários poetas europeus,
entre o quais o inglês William Shakespeare e os portugueses Luís Vaz de Camões e Sá de
Miranda.
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Leia um soneto de Francesco Petrarca:
Sá de Miranda
Em Portugal, considera-se como marco inicial do Classicismo o ano de 1527, data em
que o poeta Sá de Miranda regressou da Itália, de onde trouxe as inovações literárias do
Renascimento italiano, introduzindo- -as em Portugal. O encerramento desse primeiro período
clássico ocorre em 1580, ano da morte de Camões e do domínio espanhol sobre Portugal.
Além do Classicismo, há dois outros períodos clássicos: o Barroco, momento em que Portugal é
dominado e governado pela Espanha, e o Arcadismo, que avança até a segunda década do
século XIX.
Características do Classicismo
O Classicismo queria recuperar a “classe” dos autores antigos a partir do cultivo dos
valores greco-latinos, inclusive da mitologia pagã, própria dos antigos. Isso levou os poetas
renascentistas a recorrer às entidades mitológicas para pedir inspiração, simbolizar emoções,
exemplificar comportamentos. Pastores, deuses, deusas e ninfas estão presentes nas obras de
arte e na literatura renascentista de forma natural, convivendo até mesmo com tradições
cristãs, herdadas da época medieval.
É hora de o ser humano se orgulhar de suas conquistas terrenas. O homem descobre
que a Terra é redonda e passa ter um olhar universalista sobre a realidade. O marco de seu
início se dá em 1527, quando o poeta Sá de Miranda retorna de sua incursão pela Itália
renascentista e introduz em Portugal novas formas de composição. Ele trouxe a postura
amorosa, o soneto e, principalmente, a forma fixa do verso decassílabo chamado de Medida
Nova, o Dolce Stil Nuovo (o doce estilo novo) criado pelo escritor italiano Francesco Petrarca.
Tendências fundamentais
▪ Criação e imitação
Retomado do princípio aristotélico da mimese, ou seja, da reprodução os comportamentos
humanos por intermédio da arte.
▪ Racionalismo
O desenvolvimento de um raciocínio completo sobre os temas abordados, inclusive o amor. Na
poesia, essa tentativa de conciliar razão e emoção se apresentou por meio de uma figura de
linguagem chamada “paradoxo”.
▪Humanismo e ideal de beleza
Recriação da natureza humana por meio de um ideal de beleza, proporção, harmonia e
simetria.
▪Universalismo
A busca por novos territórios, expansão marítima. O homem quer se colocar acima da natureza
e, automaticamente, acima de Deus. O planeta Terra passa a ser um espaço de dominação