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ALISON GABRIEL MOREIRA GUERREIRO
ANDERSON FABIANO PEREIRA
AUGUSTO DE PAULA SOUZA
DHANDARA EMMANUELY MESSIAS
GABRIELA DE ANDRADE NUNES
GABRIELE MELO LEONARDI DOS SANTOS
ISABELA NIZER
LARISSA FERREIRA DE FRANÇA
LUCAS JOSÉ NEVES
Curitiba, 2018
Lista de Figuras
FIGURA 1 - A NEOVIDA CONTEMPORÂNEA COMO ELA É - FONTE: ACERVO PRÓPRIO, 2019. 25
FIGURA 10 - "PALETAS" 64
Lista de abreviaturas e siglas
CCCEP Corpo Cênico do Colégio Estadual do Paraná
CIA Companhia
Sumário
2.1 PANORAMA: UMA ANÁLISE GERAL DOS GRUPOS DE TEATRO EM CURITIBA 31
2.2 ATORES 32
2.3 REGRAS 35
Capítulo 1 – Apresentação do Circuito
Trata-se de uma categoria que descreve o exercício de uma prática ou a oferta de determinado
serviço em estabelecimentos, equipamentos e espaços que não mantêm
entre si uma relação de contiguidade espacial, sendo reconhecido em seu
conjunto pelos usuários habituais: por exemplo, o circuito gay, o circuito
dos cinemas de arte, o circuito neoesotérico, dos salões de dança e shows
black, do povo-de-santo, dos clubbers, dos evangélicos gospel e tantos
outros (MAGNANI, 2012 p. 97).
Circuito está também relacionado ao espaço – não somente como local ou
cenário, mas como parte de um compartilhamento de certas práticas e de
atribuição de sentido entre um grupo e uma localidade. Nesses espaços,
determinadas pessoas se permitem criar relações, permitem-se falar, agir e
expressar suas similaridades de maneira mais profunda, ou seja, o circuito é um
espaço de sociabilidade.
No entanto, um circuito não está delimitado fisicamente por um ou mais
estabelecimentos ou espaços; pode mudar geograficamente, de maneira dinâmica,
a depender das pessoas, sazonalidade, entre outras variáveis. Mesmo não havendo
proximidade, as pessoas se reconhecem dentro do circuito de maneira orgânica. Ou
seja, o circuito acaba não sendo um território demarcado em um mapa ou a área
de uma construção; cada um abrange inúmeros lugares diferentes e separados
fisicamente.
O circuito que será estudado neste trabalho é o dos Grupos ou Companhias
de Teatro em Curitiba. A cidade abriga diversas atividades relacionadas ao
universo teatral, como escolas, montagens de espetáculos e ainda entre os
1
meses de março e abril é palco do tradicional Festival de Teatro de Curitiba . O
evento conta com a participação de artistas de todo o país e com espetáculos
dos mais variados gêneros, porém os elementos mais importantes para a sua
realização são justamente os grupos de teatro curitibanos.
A edição de 2019 trouxe cerca de 400 espetáculos de treze estados
brasileiros e cinco países diferentes, totalizando mais de 1700 apresentações
que mobilizaram 2500 artistas, para um público estimado de 200 mil pessoas,
sendo 40 mil turistas. As apresentações ocorreram em 80 espaços diferentes,
como teatros, praças, parques ruas etc. Em decorrência do festival, foram
criados aproximadamente 1700 postos de trabalho, sendo 700 diretos e 1000
indiretos (ROSA, 2019a). O festival é dividido em vários segmentos, dentre eles
a Mostra Oficial e o Fringe.
O Fringe é um festival alternativo de teatro, presente em diversos lugares
2
do mundo, que ocorre sempre de forma paralela aos festivais oficiais . O Fringe
1
Criado em 1992, o Festival de Teatro de Curitiba tem como fonte de inspiração o Festival Internacional de Edimburgo, que é considerado
o maior e mais antigo festival teatral do mundo. Em 2019, o Festival de Teatro de Curitiba completou a sua 28º edição em 2019, e de
acordo com seu diretor, Leandro Knopfholz, é o maior evento nacional dedicado às artes cênicas, levando em conta “a oferta de
espetáculos, a quantidade de público, o número de artistas que movimenta e a duração” (MOSER, 2018).
2
Surgiu de forma espontânea no ano de 1947, na cidade de Edimburgo, na Escócia, criado por companhias que não estavam na
programação do Festival Internacional de Edimburgo (CIA AMADEUS, 2010)
Curitiba nasceu no ano de 1998, na sétima edição do Festival de Teatro de
Curitiba, como um espaço aberto e sem curadoria. Qualquer grupo ou
companhia que tenha interesse pode participar, desde que 80% dos seus
integrantes possuam o DRT, que é o registro profissional da categoria (FESTIVAL
3
DE CURITIBA, 2019a) .
Na edição de 2019, centenas de peças estiveram na programação do
Fringe: espetáculos de diversas linguagens e gêneros, realizados em vários
locais de Curitiba. Sua divulgação sempre está presente no guia oficial da
programação do Festival de Teatro de Curitiba e atualmente ele é considerado
uma de suas frentes.
O teatro de rua também está presente no Fringe. Nessa modalidade, os
atores encenam o espetáculo em espaço aberto. Segundo o produtor Fábio de
Souza, essa prática reforça a ideia de democratização e acessibilidade da arte,
pois atinge um público variado, “aqueles que não tem o costume de ir ao
teatro, estão na correria o dia todo, passam aqui, esquecem a rotina, e se
divertem um pouquinho, nem que seja por 20 minutos” (ROSA, 2019b). Segundo
o produtor, as pessoas que estão passando e se deparam com o teatro de rua se
interessam e pedem informações sobre os locais de outras apresentações.
Curitiba também é sede, desde o ano de 2016, do Festival de Teatro
Estudantil. O evento é realizado pela Cia Teatral Jully Grisbach, com o apoio
do Centro Cultural Teatro Guaíra, através do Teatro Zé Maria. Em sua terceira
edição, contou com a participação de 14 instituições de ensino, entre públicas
e privadas, de Curitiba, Região Metropolitana e de fora do estado (BEM PARANÁ,
2018). O grande objetivo do festival é incentivar e promover as aulas de teatro
em instituições de ensino, além de promover o debate no âmbito educacional
sobre a importância das artes cênicas para a juventude (FESTIVAL DE TEATRO
ESTUDANTIL, 2019).
3
A ideia desse festival é proporcionar espaço para grupos que não estão na Mostra Oficial, além de democratizar a arte, levando-a para
mais perto do público e com bilheteria acessível. São apresentadas peças gratuitas, com modelo “pague quanto vale” e com valores de no
máximo R$ 60,00.
Não foram localizados dados estatísticos que apontassem um número
preciso de grupos de teatro existentes em Curitiba, porém através do
levantamento de dados realizado na internet, verificamos que há uma grande
variedade de grupos, de diferentes gêneros, estéticas e propostas.
De acordo com a doutora em Artes Cênicas pela USP, Verônica Gonçalves
Veloso, um grupo de teatro não é apenas um “amontoado” de gente, é um
coletivo com um interesse em comum. O termo “grupo” ganhou destaque em
meados da década de 1960, e é entendido como uma união de longo prazo, em
que a vivência dos seus membros não está ligada apenas à execução de um ou
dois projetos (VELOSO, 2008).
Por outro lado, coletivo de teatro está mais ligado à ideia de uma união
menos estável, focada em projetos específicos, e por isso, não possui a vivência
de grupo. Segundo Veloso, “o coletivo sobrevive o tempo que dura a
empreitada, tem hora de começar e de acabar”. Veloso compara grupo a um
casamento, e coletivo a um namoro (VELOSO, 2008)
O Estábulo de Luxo é um grupo profissional, criado em 2011 pelos
artistas Danielle Campos e Ricardo Nolasco, filiado à Selvática Ações Artísticas
(MACHADO, 2014). É um dos vários grupos que ocupam o Espaço Cultural Casa
Selvática, localizado na rua Nunes Machado, 950, no bairro do Rebouças. O
grupo discute temas como gênero, identidade, desconstrução da padronização
dos corpos, e busca o desenvolvimento de uma linguagem particular, por meio
de experimentações. Tem como referências artísticas as vanguardas do início
do séc. XX, a antropofagia, a literatura e dramaturgia clássica, o teatro de
revista. O grupo tem uma pesquisa contínua sobre o formato cabaré. Os
espetáculos “Momo – Para Gilda com Ardor” e “Cabaret Macchina”, foram
destaques, e integraram a Mostra Oficial do Festival de Teatro de Curitiba, nas
edições de 2017 e 2018 (SELVÁTICA, 2019).
A Comparsaria Cênica é um grupo de circo-teatro curitibano formado por
atores profissionais e amadores, atualmente sediado na rua Camões, no bairro
Alto da XV. Tem como objetivo levar bem-estar e qualidade de vida por meio
do teatro e pelo uso da linguagem circo-teatral. Quem dirige os comparsas
(como são chamados seus integrantes) é o professor e diretor Helio de Aquino.
O início de suas atividades foi em 2013, no bairro Bom Retiro. No ano seguinte,
o grupo se mudou para uma casa no bairro Vista Alegre. Na nova sede,
montaram espetáculos em que convidava o público a acompanhá-los pelos
diversos cômodos da residência, com o objetivo de aproximar o espectador da
4
narrativa da peça (COMPARSARIA CÊNICA, 2019) .
4
O grupo oferece também o Teatro-escola, que é a montagem adaptada do seu repertório em espaços escolares e peças de cunho
pedagógico, com temas relacionados à infância e adolescência. Há também o projeto “Clownparsas”, que são intervenções com palhaços
em eventos de empresas e confraternizações. Outra atividade é o “Playback” , que consiste na improvisação e criação de cenas a partir de
histórias contadas pela plateia. Esse projeto visa à reflexão de situações e problemas que podem ocorrer em uma organização, e para isso
contam com a assessoria de um profissional da psicologia. Além disso, ministram oficinas e cursos de circo-teatro, os quais disponibilizam
O Grupo Lanteri possui mais de 40 anos de existência. Foi fundado em
1978, na Paróquia São Paulo Apóstolo, no bairro São João em Curitiba. O grupo
é responsável pela montagem da já tradicional encenação “Paixão de Cristo”,
que ocorre todos os anos na páscoa. O grupo também encena diversas outras
peças com temáticas religiosas, de viés católico. As apresentações sempre são
abertas ao público e são realizadas, em grande parte, em locais de grande
circulação – como terminais, ruas da cidadania e praças. Define-se como um
grupo de “teatro feito pelo povo e para o povo”. Conta com atores profissionais
e amadores. Os seus integrantes são voluntários, e apesar das temáticas
católicas, aceita pessoas de todas as religiões (GRUPO LANTERI, 2019).
Em Curitiba, existem ainda grupos teatrais que são organizados por
instituições de ensino. Além de envolver os estudantes das escolas,
universidades e faculdades responsáveis, esses grupos, em sua maioria, incluem
também a comunidade.
O TUT foi fundado em 1972. Ao longo dos anos, o grupo teve vários nomes
diferentes, sempre acompanhando as alterações da própria instituição, a qual
faz parte. Até o ano de 1978, se chamava TETEF ( Teatro da Escola Técnica
Federal), posteriormente passou a se chamar TECEFET ( Teatro do CEFET), e
apenas em 2005, adotou o atual nome, quando se firmou como um grupo de
teatro universitário (UTFPR, 2018). Sediado no Campus Curitiba, na Av. Sete de
Setembro, 3165, Rebouças, o grupo abre seleções de elenco para toda a
comunidade, com prioridades para estudantes e servidores da UTFPR, em forma
inscrições pelo site que mantém com notícias e informações sobre o grupo. No Festival de Teatro de Curitiba de 2019, o grupo participou
do Fringe, apresentando onze espetáculos em parceria com outros grupos de circo-teatro (COMPARSARIA CÊNICA, 2019).
de extensão universitária. Realiza as suas principais atividades durante a
semana, nas segundas e quartas-feiras das 18h30 às 22h (EVEN3, 2019).
Localizado na Av. João Gualberto, 250, Alto da Glória o GRUTA realiza
suas atividades nas sextas-feiras das 13h50 às 17h30 e nas terças e
quartas-feiras das 18h35 às 21h15. Não é exclusivo para estudantes: a
comunidade também pode fazer parte, sendo necessário realizar a inscrição,
ter no mínimo 15 anos e estar cursando o segundo ano do ensino médio (CEP,
2017).
A Companhia PalavrAção foi fundada no ano de 1995 e tem como
principal objetivo a formação e preparação do ator. Os ensaios da Companhia
ocorrem de segunda a quinta das 19h às 22h, na Rua XV de Novembro, 695,
Centro. Para integrar a equipe, é necessário passar por um processo seletivo
(COMPANHIA DE TEATRO DA UFPR, 2019).
O artigo “Teatro de grupo contra o deserto do mercado” de Iná Camargo
Costa (2007) reflete sobre os motivos pelos quais os teatros de grupo no Brasil
perderam força nas últimas décadas em comparação com seu início, já que, desde
que o país adotou a linha neoliberal, a arte passou a ser mero produto comercial.
Na década de 90, surgiu o movimento “Arte contra a Barbárie”, formado por grupos
teatrais e personagens atuantes da arte em São Paulo, a fim de contestar a
instauração da Lei Rouanet (estavam inconformados com os critérios de seleção
para a obtenção de recursos) e propor outras críticas, como ao baixo orçamento
destinado ao Ministério da Cultura, além de lutar por políticas públicas para a
cultura (COSTA, 2007).
No artigo “Investigando a recepção em um projeto de teatro na
comunidade”, Beatriz Ângela Vieira Cabral e Dan Olsen analisaram o projeto de
pesquisa “Teatro em Trânsito – formas interativas de teatro em comunidade”. Os
autores avaliaram a recepção do espetáculo por três grupos distintos de
participantes: atores com experiência anterior (alunos e professores de teatro),
atores sem experiência anterior (participantes da comunidade) e espectadores.
(CABRAL; OLSEN, 2005).
Com os resultados da pesquisa, notou-se que os estudantes de teatro e os
atores com e sem experiência concordaram com o aspecto que causou mais
impacto na montagem: a dramaturgia, considerando as situações inesperadas como
característica mais importante da narrativa. Os espectadores também acharam que
o maior impacto foi causado pela dramaturgia, mas apontaram como primeira
opção a variável “possibilidade de interpretações distintas” – contrariando a
expectativa inicial de que haveria uma distinção significativa entre a recepção por
parte dos alunos de teatro e por parte dos espectadores. (CABRAL; OLSEN, 2005).
No artigo “Teatro, corpo, experiência e sentido: análise de protocolos
teatrais verbo-visuais”, Jean Carlos Gonçalves (2015) apresenta uma nova
abordagem educacional para teatro de maneira que desse voz para os alunos, para
que pudessem expressar as experiências vivenciadas nas aulas, preparar-se para a
experiência cênica e exercer sua criatividade. Essa nova proposta envolveu a
metodologia de “protocolos”, entendida como espécie de registro de
aula/depoimento. Gonçalves reconheceu que o trabalho com os protocolos se
mostrou útil para instigar o diálogo entre professor e alunos sobre as experiências
cênicas vivenciadas e todos os alunos-autores concordaram que a corporeidade é
um dos aspectos mais importantes durante a aula de teatro e durante a execução
da peça. O contato com o próprio corpo e com os demais corpos facilita e
possibilita a interação entre os atores e entre o ator e o público, sendo o teatro um
ato vivo (GONÇALVES, 2015).
Dois dos artigos estudados destacam o teatro como “ação pedagógica”, em
“Avaliação em Teatro: Reflexões a Partir das Vozes do Aluno”, também de Jean
Carlos Gonçalves, é repensado o relacionamento entre professor e aluno de teatro
no contexto de avaliador e avaliado. Gonçalves afirma que o professor está
interligado com a criação dos alunos, agindo de maneira similar a um diretor
cênico, que está ao mesmo tempo avaliando e ensinando os atores. Gonçalves
conclui que “em teatro, a melhor forma de avaliação acontece em meio ao
diálogo” (GONÇALVES, 2014, p.90).
O estudo constatou que, entre os estudantes, houve menor incidência de
problemas na fala – como rouquidão, afonia e outros. Além disso, as estatísticas
desses dados mostraram maior incidência entre os profissionais de práticas
inadequadas em relação à saúde, uso da voz e condições ambientais, como o uso da
voz enquanto estavam gripados, com respiração inadequada e maior permanência
em locais fechados, com mofo, poluição ou pouca ventilação. Além disso, também
ensaiavam em locais com condições acústicas diferentes do local em que é
realizada a apresentação (OLIVEIRA; MARQUES; RIBEIRO; SILVÉRIO; TELES;
VILANOVA; 2016).
Já Edson Simões, no artigo “A Construção da Personagem no Teatro pelo
olhar da Psicologia Social”, afirma que o comportamento social é essencial para
que o ator execute seu trabalho, pois a partir da relação estabelecida entre o ator
e o outro é que o seu trabalho se concretiza. Simões conclui considerando que a
formação de um personagem, além da relação com o outro, dá-se também a partir
de relações sociais em que o ator, independentemente de seu personagem, está
inserido. Dessa maneira, ele reproduz a realidade em volta de si mesmo e de seu
personagem (SIMÕES, 2010).
Com o objetivo de melhorar o entendimento do conteúdo explorado, a partir
deste parágrafo, seguiremos apresentando somente referências encontradas pelo
grupo que abordam o objeto atual de nossa pesquisa: “grupos/companhias de
teatro em Curitiba”.
O artigo “Um novo cenário: conquistas e contradições do atual teatro de
grupo brasileiro” de Christina Streva apresenta características do teatro de grupo
no Brasil nas últimas décadas, além de informações sobre como é o cenário dos
grupos de teatro no Brasil. A autora afirmou que os grupos de teatros vêm
conquistando grande crescimento e fortalecimento nacional, já que, devido à “boa
fase” da economia a partir de 2000, os grupos foram obtendo conquistas em
relação ao Estado. Pode-se citar – novamente – como um grande exemplo o
movimento “Arte contra a Barbárie”, que resultou na Lei de Fomento ao Teatro
(Lei 13.279/02) (STREVA, 2014).
Segundo Streva, encontram-se no país diversos grupos de teatro estáveis e
consolidados, porém ainda é grande o número de grupos brasileiros que não
possuem condições de manter plenamente o grupo de teatro em atividade. Para
que houvesse uma continuidade dos grupos teatrais e para diminuir o número de
“desistentes”, foram adotadas estratégias, como: turnês, apresentações em
festivais, vendas de produtos relacionados à peça, além de tudo o que envolvesse a
parte administrativa de um grupo teatral (STREVA, 2014).
Já em “Reflexões sobre os vinte anos de experiência do grupo de teatro Tá
na Rua” de Amir Haddad (2001), é refletido a importância do teatro de
manifestação pública em oposição ao teatro formal de recinto fechado. Haddad
notou que, quando o grupo Tá na Rua partiu para a prática teatral pública, o teatro
havia conquistado uma nova linguagem, praticando uma interação mais direta com
a plateia – algo bastante incomum na época, quando lugar de teatro era no palco e
não nas ruas (HADDAD, 2001).
Essa forma de teatro popular foi a maneira de os grupos de teatro se
rebelarem contra o estabelecido. Assim, eles romperam seus laços com os
“procedimentos éticos da burguesia capitalista protestante” (2001, p. 157),
focando-se em dar às pessoas comuns a chance de participar da festa, permitindo
que a plateia se sentisse mais à vontade e sem medo de interferir no show. Pelo
fato de o teatro estar na rua, os indivíduos poderiam sair da rotina de trabalho e
esboçar seu lado criativo e lúdico, como um ser humano pleno e livre – e isto
reforça a cidadania. (HADDAD, 2001).
A respeito da participação dos grupos e companhias de teatro no cenário
curitibano e, pelo estudo da história, percebeu-se que o teatro se tornou uma
forma de resistência política, conforme aborda a dissertação “Arte e política: O
teatro como prática de liberdade – Curitiba (1950-1978)” de Reinaldo Cerqueira
Sousa. Conforme é relatado pelo autor, no período de regime militar, a arte e a
cultura se mantiveram firmes e constantes em volume e abundância: mesmo com a
proposta política de que a ordem e o progresso viriam por meio da força, da
violência e de variadas técnicas de torturas, o teatro era um divisor de águas para
a cultura, para a política e para os livres pensadores. Foi um espaço para a
compreensão da arte da cultura e da política, um lugar para os desabafos sociais e
de renovação das forças. Na década de 50, Curitiba teve seus espaços públicos e
teatros tomados pela população de artistas, músicos e eruditos. (SOUSA, 2010).
Em “Visões de Curitiba em Cena”, Costa relata que, quando inaugurado o
Auditório Bento Munhoz Neto – o Guairão – em 12 de dezembro de 1974, estava
presente o então presidente da República: Ernesto Geisel. Nesse período, foram
criados e produzidos textos e musicais com discursos ufanistas, em tentativa de
silenciar as vozes das Revistas (peças teatrais que aliavam a sátira política e social
ao cômico e modismos em uma composição capaz de reproduzir, sob uma ótica
crítica, o cotidiano da realidade social) que eram levadas aos palcos, e que até
então, eram críticas políticas em tons humorísticos (como, por exemplo, a peça
“Maria Bueno”, de Oraci Gemba, que trazia a narrativa da mulher que luta contra a
opressão e a favor da liberdade) (DA COSTA, 1998).
Nos textos e encenações dramatúrgicos teatrais, Curitiba não era tida só
como lugar de palco, mas também como cenário ou tema central. Foram criados
enredos de peças que tinham como intuito evidenciar a Curitiba hipócrita, sem
virtudes, mordaz ou a capital da perdição. Outras peças representavam uma
Curitiba ingênua, lírica, com belas paisagens, retratando pontos da cidade e
costumes tipicamente curitibanos. Essas batalhas idealistas por meio de palavras se
davam, na maior parte das vezes, graças a uma rivalidade que existia na época em
que foram escritas entre a capital e cidades interioranas (COSTA, 1998).
Sendo assim, após o levantamento de dados, conclui-se que, a respeito do
nosso objetivo de pesquisa em si (grupos/companhias de teatro em Curitiba): os
grupos de teatro são, na verdade, mais que um “amontoado” de gente e sim
pessoas que se juntam para expressarem seus desejos, angústias e críticas por meio
da arte, trazendo diversão, lazer e reflexão a todos envolvidos no espetáculo. No
entanto, ainda há diversos grupos que não têm a oportunidade de se estabilizar. A
prática teatral tornou-se mais democrática ao começar a ser realizada também em
espaços públicos, nas ruas, tornando essa arte de todos, influenciando e sendo
influenciada por todos.
Capítulo 02 – Panorama, atores e regras
Este capítulo tem como objetivo destacar alguns aspectos que compõem uma
pequena amostra do universo dos Grupos de Teatro em Curitiba, identificados pela
nossa equipe. Sua realização se deu a partir dos dados coletados durante a pesquisa
de campo ocorrida no mês de abril de 2019, período no qual a equipe visitou 9
grupos de teatro vinculados a escolas, clubes, igrejas (de caráter religioso) ou
independentes. Destacamos o fato de que todas as análises foram realizadas a
partir de um brevíssimo contato com os grupos, pois eles só puderam ser visitados
uma única vez.
Assistimos à apresentação da peça “A Neovida contemporânea como ela é” do
o
grupo G.A.T.A. (que surgiu a partir do processo de criação e produção da peça) n
dia 3 de abril, às 20h, no miniauditório da Universidade Tecnológica Federal do
Paraná. Ao final, participamos de um bate-papo com o diretor Diego Monteiro Von
Ancken, com o elenco e com a equipe de apoio a respeito do processo de criação.
O acesso ao evento e à conversa foi fácil, pois a programação fazia parte do
Festival de Teatro de Curitiba 2019 e nas dependências de nossa própria
universidade. O elenco era pequeno. O grupo é independente
.
Fomos assistir à apresentação da peça “A Mulher Monstro” do Grupo S.E.M
ue ocorreu de modo improvisado nas ruínas do São Francisco às 20h
Cia de Teatro q
do dia 04 de abril. O grupo, formado em Recife, esteve na capital paranaense para
apresentar-se no Festival de Teatro de Curitiba. O contato foi feito por meio do
ator e fundador do grupo José Neto, tendo sido um acesso fácil; fomos bem
recebidos. Na apresentação, o grupo era pequeno, com apenas 4 pessoas. O grupo
é independente.
Figura 2 - S.E.M Mulher Monstro - Fonte: Acervo Próprio, 2019.
Ensaio e Espetáculo do Grupo de Teatro Amador do Colégio Estadual do Paraná
– GRUTA
Acompanhamos o ensaio do musical “Now It Goes” do GRUTA no Colégio
Estadual do Paraná (CEP), no dia 11 de abril às 19h45, e assistimos à apresentação
no Teatro Guairinha, dias 21 às 16h30 e 20h00 e 22 de abril às 20h30. O espetáculo
era inspirado em musicais da Broadway, com texto inédito, canto, dança e
atuação. Nosso principal contato foi com o diretor Lau Bark, que recepcionou-nos
calorosamente desde a troca de mensagens até nos dias de ensaio e apresentação.
Deste modo, o grupo é vinculado a uma escola, ao CEP.
Figura 3 - GRUTA - Fonte: Acervo Próprio, 2019.
Assistimos à apresentação da peça “Sherazade” do grupo de teatro amador
do Clube Curitibano na sede Concórdia no dia 30 de março, às 20h30. Em cartaz
durante o Fringe do Festival de Teatro de Curitiba, o espetáculo foi inspirado nas
histórias de “As Mil e Uma Noites”. O grupo de teatro adulto do Clube Curitibano
recebe os associados do clube na sede Concórdia para montagem, pré-produção e
ensaios de peças teatrais. A equipe da apresentação era composta por 11 atores,
sendo que um deles era o diretor. Além dos atores, havia três músicos e a equipe
técnica. O grupo é, portanto, vinculado a um clube. Por ter sido anterior ao
trabalho de campo em si, a análise feita foi muito mais da perspectiva de um
espectador do que de um pesquisador e não foi feito contato direto com nenhum
dos integrantes do GTCC.
a Cia
Acompanhamos o ensaio-geral do musical de Páscoa “Eu Encontrei” d
de Teatro da Igreja Batista do Bacacheri (Cia de Teatro IBB ou “Cena”), que faz
parte do evento anual da igreja conhecido como “Pazcoa Cidade”. A peça era
ambientada na Alemanha Nazista no período da Segunda Guerra Mundial. O ensaio
foi no dia 16 de abril, na própria igreja e teve início às 20h. O contato foi
estabelecido por meio da ex-professora de Ed. Física de uma integrante do nosso
grupo: Simone Daldin, que fazia parte do elenco e foi com quem mais conversamos
devido à correria do ensaio. O acesso foi fácil, mas não foi possível conversar com o
diretor ou com o elenco sem atrapalhar o andamento.
Visitamos um ensaio da peça “A Paixão de Cristo” do Grupo Lanteri no CEEP
– Colégio Estadual de Ensino Profissional, no bairro Boqueirão de Curitiba. Ela é
encenada todos os anos e conta a história da morte e ressurreição de Cristo, mas,
apesar disso, há novidades a cada vez em que é apresentada. Neste ano, a
inovação foi que a história foi contada pelo apóstolo João – considerado, nas
escrituras cristãs, o discípulo mais próximo de Jesus. A encenação do Grupo Lanteri
é considerada a segunda maior ao ar livre do Brasil (CULTURA 930, 2019). O ensaio
ocorreu dia 06 de abril e teve início às 19h45. Conversamos com Aparecido Massi, o
fundador do grupo, e com alguns dos integrantes, que foram todos bem receptivos.
O grupo apresenta caráter religioso.
Figura 6 - Lanteri - Fonte: Acervo Próprio, 2019.
O Grupo Arte e Vida tem como foco principal a realização de peças em datas
comemorativas cristãs. Assistimos ao ensaio e à apresentação do espetáculo
“Paixão de Cristo” e ambos aconteceram na Rua da Cidadania do Bairro Novo. O
ensaio foi dia 6 de abril às 16h e a apresentação às 20h do dia 19 de abril. No dia 6,
havia algo próximo de 200 pessoas compondo toda a equipe. O contato foi fácil,
com a coordenadora geral Claudia Barreto, com o coordenador adjunto Gilberto
Silva e com o idealizador e líder vereador Marcos Vieira. O espetáculo, que teve
duração de aproximadamente 3 horas, foi assistido por cerca de 8 mil pessoas na
Rua da Cidadania, local onde a peça é encenada, tradicionalmente, há 20 anos. O
grupo apresenta caráter religioso.
Figura 7 - Arte e vida - Fonte: Acervo Próprio, 2019.
Com a finalidade de garantir uma melhor compreensão a respeito do circuito
pesquisado, traçaremos um panorama geral dos grupos de Teatro em Curitiba
visitados.
À grosso modo, os grupos independentes (G.A.T.A., Grupo S.E.M. Cia de
Comparsaria Cênica), com exceção da Comparsaria, apresentaram-se
Teatro e
trabalhando em situações provisórias e utilizando espaços e elementos cedidos. Os
S.E.M. Cia de Teatro f oram
atos das peças teatrais dos grupos G.A.T.A. e
apresentados em um único cenário durante todo o decorrer da encenação – cenário
com mesas espalhadas pelo palco e cenário com uma jaula, respectivamente. No
caso do G.A.T.A., a apresentação aconteceu num espaço cedido pelo professor
Ismael Scheffler do Teatro da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (TUT), e
no do Grupo S.E.M. Cia de Teatro, a apresentação teve de ser realocada para um
local público. O espaço que a Comparsaria Cênica utiliza é alugado (um local atrás
de um café no Alto da XV) e arrecadam dinheiro por meio de programações, como
oficinas, e também por meio do incentivo público.
Os grupos vinculados a escolas e a clubes se resumem ao GRUTA e ao GTCC,
e ambos utilizavam espaços próprios. Normalmente, o primeiro utiliza uma sala
própria e o auditório do Colégio Estadual do Paraná para seus ensaios e
apresentações, mas esses espaços estavam em reforma. Portanto, o grupo estava
utilizando uma sala compartilhada com outras áreas (de desenho e de pintura) e
que possui condições precárias, improvisadas e inadequadas à prática teatral. O
GRUTA é sustentado por meio do colégio, mas também através de patrocínios,
contando com um amplo apoio da comunidade teatral. Já o GTCC é um grupo que
utiliza as diferentes sedes do Clube Curitibano para apresentar-se e se mantém
pelo dinheiro do clube.
2.2 ATORES
Diretores
De um modo geral, os diretores (e, às vezes, os produtores) dos grupos
independentes analisados participavam das peças também como atores. No caso
do grupo S.E.M. Cia de Teatro, a peça “A Mulher Monstro” era um monólogo sendo
interpretado pelo próprio diretor José Barbosa. A respeito da Comparsaria Cênica,
o produtor Hamilton Maia também é ator e participa de todas as peças da
companhia. Entre os grupos pesquisados, apenas o diretor do grupo G.A.T.A. (Diego
Monteiro Von Ancken) não fez parte do elenco da peça assistida “A NeoVida
contemporânea como ela é”.
A maioria dos 4 diretores dos grupos de teatro religiosos tiveram a grande
tarefa de dirigir elencos compostos por mais de cem pessoas. Nem todos os atores
eram personagens principais, mas todos os integrantes do elenco precisavam ser
instruídos pelo diretor – o que atribuiu a esse cargo muita responsabilidade. Nestes
casos, os diretores não participaram do elenco. A respeito dos diretores de cada
grupo teatral, o diretor da Cia de Teatro IBB (ou “Cena”) era Rodrigo Lara e o do
musical “Ressurreto 2019” apresentado pelo grupo A Tua Ação era Samuel Barros.
Na peça “A Paixão de Cristo” do Grupo Lanteri, a direção artística geral foi
realizada pelo fundador Aparecido Izabel Massi, que, na fundação do grupo, era
seminarista e gostava de trabalhar com projetos voltados para jovens adolescentes
de sua comunidade – e o Lanteri nasceu a partir desse sentimento. Massi continua
na liderança do grupo e na direção artística dos espetáculos até hoje.
Atores
A maior parte dos elencos estudados era composto por atores amadores. No
caso dos grupos independentes, havia uma mescla entre atores profissionais e
UT
amadores. Uma parte do elenco do grupo G.A.T.A. iniciou a carreira teatral no T
(Teatro da Universidade Tecnológica Federal do Paraná) e outra através do curso
técnico de teatro subsequente ofertado no Colégio Estadual do Paraná (CEP). O
grupo englobava também pessoas das mais variadas formações: advocacia,
medicina, engenharia civil, educação física, economia etc. O grupo Comparsaria
Cênica é formado por, aproximadamente, dez integrantes fixos, entre eles atores
profissionais e amadores. O conjunto das pessoas que fazem parte do grupo é
denominado “Os Comparsas”. O diretor Hélio de Aquino também é professor
graduado em Artes Cênicas pela FAP (Faculdade de Artes do Paraná) e
pós-graduado em Ensino da Arte pelo ITECNE (Instituto Tecnológico Educacional de
Curitiba). Uma das figuras mais marcantes do grupo é o palhaço “Borracha”,
interpretado pelo ator Felipe Baluta. O Borracha aparece em todas as peças
interpretando diversos personagens e é considerado a estrela do grupo.
Os grupos religiosos apresentaram elencos enormes, com mais de cem
pessoas, e das mais variadas faixas etárias (tendo como única exceção o grupo A
Tua Ação, com um elenco de 16 pessoas): desde crianças e pré-adolescentes até
adultos e idosos. Em especial, no caso da Cia de Teatro IBB (ou “Cena”), o coral
era inteiramente completo por pessoas entre 50 e 85 anos e os personagens
principais foram interpretados por pré-adolescentes e por adultos.
Equipe de Apoio
A equipe de apoio dos grupos vinculados a escolas ou clubes era diversa e
mais profissionalizada. A subdivisão para o espetáculo “Now It Goes!” do GRUTA
era: publicidade e assessoria técnica, fotografia, operação, gravação e mixagem de
som, adereços e figurino, iluminação e cenografia, preparação musical e vocal,
direção musical e coreografia. Além dos atores do GTCC, havia quatro músicos e a
equipe técnica. Essa equipe de apoio era subvividida em: maquiagem, composições
musicais, iluminação, figurino etc.
A respeito dos grupos religiosos, as equipes de apoio eram mais visíveis, com
forte presença nos ensaios e com responsabilidades bem divididas. Na Cia de
Teatro I BB, a equipe de produção envolvia os responsáveis pela gravação, pela
projeção das letras de música, pelo som, luz e pela tradução em Libras. No grupo A
Tua Ação, havia a equipe de multimídia, de sonoplastia, de efeitos especiais,
tradutores de libras etc. A equipe de apoio do Grupo Lanteri é organizada em
núcleos: o de atuação, que é liderado por uma pessoa; maquiagem, que se divide
em subnúcleos de envelhecimento, penteados e geral; produção, que se divide em
subnúcleos de cenários, adereços e esculturas; figurino; sonoplastia; e
comunicação. No caso do grupo Arte e Vida, a equipe se organizava através de
orientações passadas por membros mais antigos. Oficialmente, o grupo é
coordenado por um coordenador geral, oito coordenadores de texto, seis de
maquiagem e figurino, cinquenta pessoas responsáveis pela iluminação,
manutenção de som e equipamentos, além de vinte pessoas dando apoio de palco.
2.3 REGRAS
Interação
Autoridade/Hierarquia
De modo geral todos os grupos, sendo eles os independentes (G.A.T.A.,
Grupo S.E.M. Cia de Teatro e Comparsaria Cênica) , grupos vinculados a escolas e
a clubes (GRUTA e GTCC) ou os religiosos (Cia de Teatro IBB, Grupo A Tua Ação,
Arte e Vida) demonstraram que possuíam sim uma hierarquia, e
Grupo Lanteri e
ela era caracterizada pela presença dos diretores de cada grupo. Porém, em todos
os grupos era perceptível que os ensaio/espetáculos eram constituídos pela união
das ideias e opiniões de todos que participavam do grupo.
O diretor do grupo G.A.T.A (Diego Monteiro) contou, durante a roda de
conversa que participamos após a apresentação, que a construção da peça “A
NeoVida contemporânea como ela é” foi realizada em parceria com os atores
(principalmente atrizes, pois o tema abordava as diversas lutas que a mulher
enfrentou e ainda enfrenta na sociedade ao longo dos anos). Ele contou que muitas
cenas foram baseadas em experiências vividas pelas atrizes e que essa troca de
informações, assim como a criação e inserção de falas e ações, fez com que a peça
se tornasse mais condizente com a realidade. Isso demonstrou que, apesar de haver
uma “autoridade” do diretor sobre as tomadas de decisão, o processo de criação da
peça era bem democrático e aberto para contribuições.
A relação marcante entre os integrantes do grupo S.E.M Cia de Teatro era de
trabalharem juntos para a melhoria e o aperfeiçoamento da peça, por isso, os
integrantes tinham liberdade para contribuir dentro de sua função – o que
demonstrava a confiança que o diretor José Barbosa tinha nos integrantes. Porém,
sempre que era necessário realizar alguma mudança, eles pediam a opinião do
diretor. Isso evidenciou que, mesmo com a liberdade que os integrantes do grupo
tinham, havia uma hierarquia, pois as decisões do diretor (e também ator) José
Barbosa predominavam, tornando-o essencial na produção da peça.
Quanto ao grupo GRUTA, a hierarquia estava presente em relação às
decisões a respeito do funcionamento da peça (como músicas selecionadas e falas)
e durante o ensaio, que era comandado e controlado pelo diretor, produtor e pelas
professoras de canto e de jazz. Tanto os atores quanto o diretor e as professoras
atuavam no musical, o que tornou a hierarquia praticamente não perceptível. No
entanto, a professora de jazz era tão próxima dos atores (em suas conversas e
práticas) que uma pessoa de fora não perceberia a relação professor-aluno; parecia
ser algo “de igual para igual”.
Os grupos religiosos Cia de Teatro IBB e A Tua Ação eram integrados por
pessoas que frequentam, respectivamente, a Igreja Batista do Bacacheri e Primeira
Igreja Batista de Curitiba e isso faz com que os membros da equipe possuam uma
relação forte de amizade dentro e fora dos palcos. Porém, durante o ensaio do
grupo Cia de Teatro IBB, essa intimidade que existia entre os integrantes do grupo
destacou, em determinado momento, a hierarquia existente na equipe, pois o
maestro usou a ironia para chamar a atenção de algumas pessoas, mostrando sua
superioridade em relação às outras que estavam ali. Ele disse: “vamos fingir que eu
sou o maestro e vocês olham para mim?” e em seguida o ensaio fluiu de uma
melhor maneira, pois os integrantes do musical passaram a prestar mais atenção no
andamento do ensaio.
Afetividade/Amizade
A relação interpessoal dos grupos visitados se destacava pela cumplicidade
entre os integrantes. Dentre os grupos independentes, o G.A.T.A destacou-se, pois
a relação entre os integrantes durante a roda de conversa aparentou ser de grande
respeito: todos os integrantes tiveram a oportunidade de responder às perguntas a
partir de seus pontos de vista, contando sempre com o respeito e apoio dos
companheiros de equipe.
Quanto aos grupos religiosos, na Cia de Teatro IBB os integrantes possuíam
grande amizade proveniente da vivência fora dos palcos nos cultos da Igreja Batista
do Bacacheri. Durante o ensaio, eles chamavam uns aos outros de “irmãos”. O
diretor Rodrigo Lara, que também era o maestro responsável pelo comando do
ensaio, conhecia todas as centenas de pessoas que estavam ali presentes e as
chamava pelo nome. As pessoas no ensaio aparentavam estar bem confortáveis,
muitas vezes fazendo piadas internas e ajudando uns aos outros. No grupo Lanteri,
muitos membros se conhecem há muitos anos e mantém, entre si, um vínculo forte
de amizade. Há membros que participam do grupo há mais de 30 anos, levando
seus filhos e até netos para participarem também. Durante o ensaio, era fácil
perceber o clima de cumplicidade entre os membros do grupo. A familiaridade foi
um aspecto positivo para que a interação teatral fosse mais profunda e real.
Dificuldades
Dentre os grupos de teatro analisados, as maiores dificuldades apresentadas
foram: a falta de verba para a montagem e apresentação dos espetáculos e peças,
o que limitava as ações dos grupos e fazia com que eles passassem a depender de
empréstimos (de roupas, cenários e lugares para ensaio e apresentações), e da
ajuda de amigos e dos próprios integrantes do grupo para a confecção de figurinos,
cenários e maquiagens dos espetáculos; falta de tempo para ensaios, pois por
serem, em sua maioria, compostos por voluntários, os grupos de teatro acabam
ficando em segundo plano na rotina dos atores, que só podem ensaiar em horários
limitados, além disso, ocorre que muitas vezes os horários de disponibilidade dos
integrantes para os ensaios não coincidem, o que dificulta a sua organização; a
grande rotatividade de atores, que muitas vezes desistem meses antes da estréia
ou apresentam-se por apenas uma temporada e depois se desligam do grupo; e
falta de espaço para o ensaio e para a quantidade de pessoas envolvidas na
produção do espetáculo (atores e equipes de produção criando cenários e
figurinos). Isso faz com que os grupos ensaiem em locais inadequados (pequenos)
para a prática teatral ou emprestem locais maiores.
Em sua maioria, os grupos de teatro estudados apresentaram grande
interação e abertura para o público. Como destaque, pode-se citar os grupos:
G.A.T.A, GRUTA e Arte e Vida.
Capítulo 03 – Análise da cultura organizacional do G.R.U.T.A.
O tópico inicial desta seção tem a intenção de apresentar uma breve
contextualização do que se entende, dentro dos estudos de Comunicação
Organizacional, por Cultura Organizacional, Memória Organizacional e por Formas
da Gestão do Trabalho, a fim de embasar teoricamente os demais conteúdos
desenvolvidos no capítulo. Após a realização da pesquisa de campo e, tendo em
vista a recepção e tempo de vida organizacional, o grupo decidiu focar os estudos
de modo mais específico no Grupo de Teatro Amador do Colégio Estadual do
Paraná (GRUTA). Nesse sentido, esforçamo-nos inicialmente pela construção de
uma explicação clara a respeito desses termos que fazem parte do universo da
Comunicação Organizacional.
(...) o ser humano é o resultado cultural do meio em que foi socializado. Ele é o herdeiro de um
longo processo acumulativo que reflete todo conhecimento e experiências
adquiridas pelas numerosas gerações que o antecederam (DIAS, 2013,
p.42).
A respeito disso, Bronislaw Malinowski (1970) foi quem introduziu a ideia de
existirem “subculturas” dentro de culturas, como, por exemplo: as culturas
regionais, em comparação com as nacionais, conferem subculturas.
É possível pensar uma organização como uma entidade que possui “vida”
própria, afinal, ela é constituída por pessoas. Através da celebração e valorização
de experiências passadas e marcos históricos próprios, uma organização é capaz de
formar uma identidade institucional, por meio da relação com seus variados
públicos.
Segundo a autora Lucia Santa Cruz (2014), ao se analisar os materiais
disponíveis que tratam sobre a temática de memória nos estudos de Comunicação
Organizacional, é perceptível que existe uma tendência à instrumentalização do
tema, como uma estratégia de comunicação. Essa chave conceitual, de memória
como estratégia, é apenas uma dentre as cinco existentes, sendo elas: memória
como cultura organizacional, como auxiliar na formação da identidade
organizacional; memória como gestão do conhecimento; memória como trajetória
institucional; e memória como saber coletivo. É fundamental reforçar o fato de que
memória organizacional não se trata de um sinônimo para os instrumentos e
ferramentas de memória.
O GRUTA oferece aulas de teatro amador desde às crianças, aos
adolescentes e até aos adultos, permitindo-os que subam no palco e realizem sua
primeira peça. O grupo se divide em subgrupos focados em idades diferentes,
sendo eles:
Apesar de fazer parte do Colégio Estadual do Paraná, não há a necessidade
de ser estudante do CEP para se participar do GRUTA. As aulas ocorrem de segunda
à sexta nos horários mais variados, dependendo do grupo e da peça sendo ensaiada.
O GRUTA (Grupo de Teatro Amador do Colégio Estadual do Paraná) foi
fundado em 1966, porém, sua história inicia-se no ano de 1952, quando o professor
Norberto Teixeira criou o CCCEP (Corpo Cênico do Colégio Estadual do Paraná).
Sete anos depois, Silvio Jair Kormann criou o Teatro Experimental do Colégio
Estadual do Paraná, e em 1963 foi formado outro grupo: o TGCEP (Teatro Grego do
Colégio Estadual do Paraná), pela professora Maria Lambros Comninos (COLÉGIO
ESTADUAL DO PARANÁ, 2010).
A pedido de alunos e de ex-alunos do TGCEP, o professor e então diretor
geral Ernani Straub convocou o ator Telmo Faria (primeiro ator profissional do
5
O gruta é o único grupo que possui atores não amadores em conjunto com os amadores. Além disso, devido
às especificidades de shows musicais, eles pretendem criar um novo grupo chamado Gruta Musical.
Paraná) para tomar a criação e direção artística do GRUTA em 1966. Logo em
seguida, Telmo convidou o dentista e amante da arte Aluízio Cherobim para
participar do grupo e essa parceria, que tinha como intuito levar à cena uma
dramaturgia eclética, gerou “O Julgamento de Joana”, de Eddy Franciosi e “A
Moratória”, de Jorge Andrade (COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ, 2010).
Na década de 80, Aluízio e Luciana Cherobim criaram o Curso Técnico de
Teatro e Ator e, a partir desse momento, o teatro no CEP passou a ser
profissionalizante, sendo possível habilitar-se de duas maneiras diferentes: como
ator ou como técnico de teatro. O curso foi coordenado pelos professores Armando
Maranhão, Luís Afonso Burigo e Guaraci Martins. Mas, no início dos anos 2000,
formou-se a última turma; nela, formaram-se a atriz Marjorie Estiano e o ator
Leonardo Miggiorin (COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ, 2010).
Grande parte da história do teatro paranaense passou pelas salas do Colégio
Estadual do Paraná, mas também outras histórias por ali passaram. Do curso de
formação de atores da instituição, formaram-se profissionais dos palcos (como o
iluminador Beto Bruel, a atriz Odelair Rodrigues, Luís Melo e Ranieri González) e
também aqueles que se consagraram na televisão, como Ary Fontoura (COLÉGIO
ESTADUAL DO PARANÁ, 2010).
Depois de quase uma década sem os cursos técnicos, somente com as
produções do grupo amador, em 2009 os cursos técnicos retornaram por meio da
diretora Maria Madselva que, com a ajuda da professora Raquel Júlio Mastey, deu
início ao ingresso dos novos cursos técnicos em teatro no CEP. Desde então, o grupo
vem formando atores, atrizes e plateia regularmente. O Teatro Experimental e a
Pesquisa Teatral são ramificações do ensino do teatro amador presentes até hoje
no ensino do CEP (COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ, 2010).
Já são cinco décadas em que o GRUTA desenvolve espetáculos baseados nos
trabalhos de atores, com cenários enxutos e textos de criação própria, tendo como
base a cultura popular paraense e impactos políticos e sociais. Além disso, é um
grupo que “descobriu” vários atores que, atualmente, são de extrema importância
no cenário nacional.
Valores Organizacionais
Os valores se constituem como um elemento comum e fundamental em
todas as definições e conceituações de cultura organizacional. Eles são aquelas
percepções compartilhadas a respeito do que é importante, desejável, aceito,
correto ou não. Pode-se citar como exemplo o respeito à natureza, a honestidade,
a postura de “tirar vantagem” etc. (DIAS, 2013).
Missão do GRUTA
“Missão” é a razão de ser de uma organização, é a fundamentação de seu
propósito (DIAS, 2013). Identificamos, portanto, que o GRUTA tem como propósito
colaborar e ensinar sobre a arte, ensinar a trabalhar em coletivo, formar plateia e
possibilitar a oportunidade de a comunidade possuir uma experiência estética do
fazer teatral. Tendo isso em vista, a organização tem como missão levar essa
proposta para a formação de alunos. Para o professor Lau Bark do GRUTA, é
importante:
(...) A formação de plateia, dar experiência estética do fazer teatral (tem gente que sempre quis
fazer teatro e nunca teve coragem), oportunidade de fazer teatro – já que
o curso é de graça, financiado pelo governo – experiência [...] de conhecer
a linguagem teatral. [..] É da nossa responsabilidade preparar o ator, dar
um pouco de prática para que ele suba no palco e apresente um
espetáculo.
Identificamos que o GRUTA também tem como missão fazer com que os
alunos se envolvam em todos os processos da arte através de sua participação em
toda a produção por trás do projeto. Assim, os alunos participam da produção dos
figurinos, dos processos didáticos, da maquiagem, dos sons e da montagem dos
espetáculos. Com isso, o grupo visa a incentivar o trabalho em conjunto entre os
estudantes, professores, produtores e diretores e que tudo isso seja usado na
formação humana dos alunos.
Visão da Organização
A visão organizacional define o que a organização deseja ser no futuro, ou
seja, o que ela vislumbra atingir. Assim, através da sua missão e de seus valores, a
visão orienta as ações de todos que compõem a organização, além de direcioná-los
para que a organização possa alcançar os objetivos que almeja (DIAS, 2013).
O GRUTA tem como visão a expansão da escolinha de teatro, passando a
abordar também outras esferas do teatro (como, por exemplo, o musical) e trazer
peças de autores pouco conhecidos para dentro do cenário de teatro curitibano. O
grupo busca, através de seus espetáculos e aulas, proporcionar aos alunos a
oportunidade de se desenvolverem como cidadãos, além de dar a eles a opção de
passar pela experiência teatral.
Ritos e Rituais
Os ritos são práticas recorrentes que representam os valores e têm relação
com os mitos e heróis e os rituais são eventos que geralmente marcam transições
de etapas, atividades coletivas e, por vezes, supérfluas (DIAS, 2013).
Conseguimos identificar alguns ritos e rituais no GRUTA. Um deles é a
“leitura de mesa”, que é quando os integrantes do grupo sentam, leem e
interpretam os textos para criar os personagens; essa leitura ocorre em todas as
audições para as peças. Outro exemplo é o “Café com Persona” que é uma
confraternização onde cada um traz um prato de comida e eles se reúnem para
comer e conversar sobre os personagens, a personalidade de cada um etc. Além
disso, os alunos vão juntos assistir a algumas peças teatrais quando recebem
convite.
Lemas
Os lemas são as curtas expressões que, de maneira sucinta e resumida,
contém uma ideia central na cultura da organização. Eles também expressam os
valores da organização (DIAS, 2013). O GRUTA possui como lema “Dar ao estudante
a experiência do fazer teatral e a formação de plateia” que, de certo modo, condiz
com os seus valores que são pautados em ensinar jovens inexperientes a ter uma
experiência no teatro e em valorizar a plateia para que as pessoas gostem cada vez
mais de frequentar o teatro. Por meio desse lema, seus integrantes tentam traduzir
que, através do GRUTA, as pessoas têm a oportunidade de conhecer diversos lados
de uma produção teatral – desde a escrita da peça até a atuação.
Jargões
No GRUTA, os jargões utilizados por seus membros são evidentes na fala.
Alguns jargões observados são os termos “SIR”, que é utilizado para identificar os
personagens da peça que tem sotaque caipira, e “rubrica”, que um texto entre
parênteses que não é lido/falado, mas encontra-se no roteiro como forma de
indicação do que o personagem deve fazer ou como deve agir. Esses jargões só são
entendidos por quem está familiarizado com as palavras técnicas do teatro e por
quem está em contato contínuo com a prática teatral.
Condutas
As condutas englobam os modos de agir, vestir, comer, descansar e reunir.
As condutas são naturalmente copiadas pelos novatos no processo de socialização e
podem, por vezes, manter esses comportamentos mesmo fora do ambiente de
trabalho (DIAS, 2013).
Algumas condutas observadas no GRUTA foram em relação à forma de os
integrantes se vestirem e se relacionarem. O que se destacou foi a maneira
informal como se encontram.
Personagens
Os personagens são símbolos sociais, pessoas que são referências, modelos
da boa personificação dos valores essenciais da organização. Servem de exemplo
para os demais. Exemplos de personagens podem ser os fundadores, os heróis
(exemplos de superação) e líderes formais ou informais (DIAS, 2013).
Um dos personagens do GRUTA é já citado Telmo Faria, considerado o
primeiro ator profissional do estado do Paraná. Faria criou e organizou o grupo,
levando para o Colégio Estadual do Paraná uma dramaturgia mais eclética e
acessível, fazendo com que ele seja até hoje uma figura marcante na organização
(COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ, 2010).
Armando Maranhão (1929-2007) e Luís Afonso Burigo (1942-2018) também são
considerados heróis: foram dois atores que faziam parte do GRUTA quando ele
ainda era vinculado à escola técnica. Até morrerem, ambos traziam e contavam
histórias das décadas de 50, 60 e 70 do grupo de teatro para os alunos.
Artefatos Materiais
Os “artefatos materiais” são os elementos tangíveis e simbólicos da cultura
organizacional que manifestam mensagens aos membros ou aos públicos. O
relógio-ponto, os prêmios, as decorações, as bandeiras; todos esses são exemplos
de artefatos materiais (DIAS, 2013).
Diante disso, identificamos um elemento bem evidente na organização: um
crânio chamado “Yorick”, cujo nome faz referência a Hamlet e, conforme as
explicações do diretor e professor Lau Bark, Yorick, dentro de sua peça original, foi
um bobo da corte que criou e cuidou de Hamlet dentro do castelo. Para o GRUTA,
ele significa “a essência humana, essência do que nós somos.”
No teatro, o grupo utiliza o Yorick em suas produções e, segundo o diretor,
“no final do ano [de 2019], em duas produções, ele vai estar em cena novamente
como um símbolo, representando nossa essência, como testemunha, [...] e o que
nós devemos procurar de novo, já que, neste começo de século XXI, a nossa
essência está bem perturbada”.
Como o GRUTA possui divisões internas, com equipes de diferentes faixas
etárias e níveis de experiência, a dinâmica de trabalho e de comunicação varia
muito. Lau relatou que, quando está reunido com o grupo formado por estudantes
do ensino médio (adolescentes com idade entre os 14 e 17 anos) acaba
desempenhando mais a função de professor do que de diretor, e nessa posição, a
comunicação é mais verticalizada. Nesses casos, ele precisa ser mais incisivo, dar
instruções mais precisa aos atores e interferir de forma direta para corrigir erros
básicos que um ator mais experiente não cometeria – como, por exemplo, má
postura corporal ou dificuldade de projeção vocal.
Por outro lado, isso muda quando o elenco é formado por atores com mais
experiência ou profissionais, como no ensaio que acompanhamos. A sua
interferência foi mínima: ele deu orientações gerais, mas os atores tiveram
liberdade na criação do personagem e na adaptação do texto. Lau ressaltou que,
quando algo está dando certo, mesmo que esteja diferente do que havia sido
proposto inicialmente, ele não interfere no desenvolvimento e apenas ao final
propõe suas mudanças e faz questionamentos, para poder dar rumo à peça.
Nessa dinâmica, é muito fácil verificar que o diretor é o responsável pela
tomada de decisões, mas que no desenvolvimento da atividade ela é pensada e
experimentada por cada integrante do grupo, tornando o fazer teatral uma
atividade colaborativa, em que todos podem dar sugestões.
Além da “leitura de mesa” e dos outros ensaios, o grupo promove uma
atividade chamada “Café com Persona” (também já comentada), em que os
integrantes se reúnem para tomar um café e apresentam a sua personagem ao
restante do elenco. Nessa atividade, o ator incorpora o seu papel e age de acordo
com os trejeitos, as manias e até mesmo cria uma história para seu personagem.
Através dessa experiência, os integrantes do grupo discutem e colaboram
mutuamente para o desenvolvimento das personas. Essa é mais uma característica
do trabalho colaborativo que o próprio fazer teatral proporciona, promovendo a
troca de experiências entre eles.
Capítulo 04 – Representação Visual
Durante a pesquisa de campo, foi possível observar que os grupos de teatro em
Curitiba possuem elementos visuais em comum que constituem uma estética
própria da atividade teatral. Além disso, os grupos compartilham certos valores,
sendo um dos mais visíveis a importância da plateia para o fazer teatral.
Cada um desses grupos foi analisado segundo dez categorias visuais: proporções;
cores; iluminação; formas; textura; composição; perspectiva; profusão ou
simplicidade; opacidade ou transparência; e elementos principais vs contexto
(figura vs fundo). O resultado dessa análise pode ser conferido detalhadamente no
anexo (inserir anexo), sendo apresentado abaixo o resultado dos aspectos em
comum entre os grupos de cada categoria:
PROPORÇÕES: concluímos que, na maioria dos cenários, as proporções são
parecidas, sendo locais apropriados para a prática teatral, que possibilitam
movimentos e uma boa exploração do palco. A exceção foi a sala do Colégio
Estadual do Paraná, que era inadequada, pois era um local pequeno e apertado
para a quantidade de pessoas. Houve grande variação dos locais em relação aos
públicos; em alguns, as pessoas eram pequenas em comparação ao pé direito do
local e em outros as pessoas davam a impressão de serem grandes diante do palco.
CORES: em sua maioria, os ensaios tinham a tendência de usar cores quentes
(como laranja, amarelo e vermelho) além de variações de branco, preto cinza e de
tons pasteis. As cores nos ensaios modificavam-se no decorrer da peça, o que
proporcionava uma grande diversidade na paleta de cores. No entanto, por conta
das sombras o preto era uma cor predonimante no pano de fundo, fazendo as
outras cores se destacarem em pontos específicos. Por isso a cor preta também foi
utilizada no fundo dos produtos visuais e as informações foram destacadas com o
uso de cores claras.
ILUMINAÇÃO: os ensaios, assim como as apresentações, usavam sombras muito
fortes em contraste com os focos de luz em locais específicos para demarcar a
passagem de uma cena para outra e o local no qual ela acontece no palco, por isso
os ambientes eram, em geral, escuros. Apenas o ensaio da Rua da Cidadania tinha
luz clara natural; do restante, os que eram bem iluminados, era por conta da
iluminação artificial com lâmpadas de luz branca e amarela. Em grande parte, as
luzes eram confusas, mas seguiam de acordo com o sentimento que a encenação
esperava transmitir. O contraste forte provocado pelo jogo de luz dura e sombra foi
outro elemento utilizado nos produtos visuais fazendo alusão à dinâmica de focos
de luz bem demarcados presente no teatro, destacando as informações
apresentadas por eles.
FORMAS: os locais dos ensaios possuíam tendência de explorar mais as formas
retas, sem grande destaque para as formas arredondadas, com paredes
convencionais. Somente no salão de culto da Igreja Batista do Bacacheri havia
pontos de curva. O mesmo ocorre com os locais de apresentação, que as vezes
apresentavam uma leve curvatura na forma das poltronas ou da ponta do palco. Por
causa desse fundo, até o mais leve movimento das formas humanas, opostas ao
caráter retilíneo dos locais por si só, se destacava.
COMPOSIÇÃO: a composição dos ensaios contava com poucos espaços vazios no
palco, com poucos elementos e várias pessoas, mas em uma distribuição bem
planejada – não transmitindo, assim, a impressão de caos. Essa forma de
organização na distribuição dos elementos também foi utilizada na apresentação
das informações contidas nos produtos visuais.
PERSPECTIVA: os palcos eram, na maioria, próximos ao público, porém, cada um
passava ao público uma perspectiva diferente. Por permitirem grande interação
entre atores e cenário, passavam uma impressão de profundidade e sensação de
cumplicidade. A maioria dos ensaios podia ser assistida por mais de uma
perspectiva, sendo a partir do olhar direto dos espectadores ou da maneira como as
pessoas que cuidavam das câmeras desejavam que a peça fosse assistida. Às vezes,
era mais fácil de enxergar de longe ou do centro, não sendo possível assistir pelos
lados – como no caso da peça “A Mulher Monstro”.
A partir dos estudos realizados sobre o Grupo de Teatro Amador do Colégio
Estadual do Paraná (GRUTA) – organização analisada no Capítulo C –, pudemos
perceber que a relação estabelecida entre o grupo e o circuito está,
principalmente, ligada aos seus integrantes. Muitos deles participam de outros
grupos que compõem o circuito em Curitiba, fazendo com que haja troca de
conhecimentos, amizade entre os atores, além de constituir uma ligação entre
eles. Mesmo de maneira involuntária, essas pessoas passam a compartilhar de uma
visão parecida sobre o que o circuito dos grupos de teatro significa e como ele
influencia em seus dia-a-dias.
Apesar de os grupos de teatro estarem inseridos em diferentes contextos
sociais (vinculados a escolas, a clubes, religiosos, circenses...), eles possuem
similaridades que os interligam formando um vínculo de técnicas, interesses e
experiências que ajudam a construir, constituir e caracterizar o circuito.
Uma dificuldade que encontramos em relação à consolidação do Circuito de
Grupos de Teatro em Curitiba é o engajamento do público, apesar de os grupos de
teatro fazerem peças acessíveis, o teatro não é algo bem difundido na sociedade
em geral. Para assistir a uma peça ou participar de um grupo, é preciso nutrir um
interesse profundo pelo fazer teatral e isso é algo que é difícil nos dias de hoje. Um
grande exemplo disso é que ao apresentarmos a proposta do presente trabalho para
o diretor/produtor/ator do GRUTA, Lau Bark, ele prontamente aceitou afirmando
que “o grupo estava mesmo precisando de todo e qualquer tipo de divulgação”.
A importância de compreender os circuitos se mostra clara em nossa
pesquisa com o GRUTA, que possui contato com seus membros e atores vindos de
contextos diferentes, sem a necessidade de serem atores profissionais; um amplo
circuito de teatro que é abraçado pela organização já há décadas, criando uma
cultura positiva e informal com seus públicos.
Neste projeto, observamos a reunião de indivíduos que compõem Grupos de
Teatro, seja em ensaios, festivais ou no palco, assim como notamos que vários
atores, professores e técnicos participam de diferentes shows ao mesmo tempo,
conectando-os com outros grupos. Portanto, concluímos que os Grupos de Teatro
em Curitiba são de fato um circuito e que, de acordo com Magnani (2012), a
definição de um circuito não é apenas a existência de algo em comum ou o uso de
uma localidade física, mas sim, a interação e integração entre os indivíduos que
compartilham de uma mesma prática.
Referências Bibliográficas
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REFERÊNCIAS ONLINE
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