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CONTATO INICIAL E CONFIGURAÇÃO

DO CAMPO CLÍNICO

Profª M.A. Talian Cordeiro


O contato inicial é bastante importante para o clínico, pois já
nesse momento o clínico pode perceber – em função do
lugar que é ou não convidado a ocupar – a presença das
funções do self ou o comprometimento de algumas delas.

Nesse primeiro momento o consulente está impregnado por


um discurso personalítico, incluindo ai até mesmo o que já
conhece por psicoterapia.
• Podemos a partir do discurso, perceber posturas sedutoras: “ouvi dizer que o
doutor é”... “Ou não acredito em psicorterapia”.

• Posturas desafiadoras: “o que o doutor sabe sobre isso”.

• Posturas exibicionistas: “já fiz seis anos de analise” ou “tenho algo terrível pra
te contar”.

• Autovitimização: “não sei se posso pagar o valor da sessão”.

• Dentre outros que carregam, em sua dimensão invisível, um “apelo” a nossa


participação.
• Ou, podemos ser surpreendidos pela total ausência de
apelos , como se o consulente não tivesse consulta a fazer,
como se não tivéssemos nada a lhe oferecer.

• Nossa presença para ele é tão contingente quanto o


quadro pendurado na parede.
• Ou nos deparamos com consulentes, usuários da rede
pública por exemplo, os quais não o bastante apelarem por
nossa intervenção, comportam-se como se não soubessem
fazê-lo, como se lhes faltassem aqueles expedientes
socialmente sancionados.
• Essas formas de apresentações visíveis, geram um “efeito
invisível” em nós. Somos convocados a ocupar um “lugar”
no campo pelo qual não deliberamos.
• Quanto mais cedo nos deixarmos conduzir a esse lugar,
mais rapidamente percebemos o tipo de ajustamento que
os consulentes estão tentando estabelecer.
• A percepção desse invisível “pede” uma postura “passiva” do
terapeuta.

• Nos consulentes em que testemunhamos buscas desesperadas por


dados que não estão disponíveis (ex: alguém com uma crise
hipoglicemica, por desnutrição, sendo encaminhando a um psicólogo
do posto de saúde), provavelmente estaremos envolvidos em
um ajustamento de inclusão. Aqui, somos cuidadores.

• Nesse caso o contato poderá não acontecer e nada poderá ser


assimilado.
• Podemos testemunhar também, consulentes (na função de ato)
tentando preencher ou articular excitamentos, que eles próprios não
conseguem sentir como seus, aqui somos “figurantes” ou
colaboradores.

• Ou a ação (função de ato) do consulente, nos implica como agentes


“co-adjuvantes”, como se a função de ato dependesse de nossa
participação, aqui provavelmente estaremos envolvidos em um
ajustamento neurótico.
CONTRATO CLÍNICO

• É a partir da denuncia de um inesperado (estranho,


outro) que o clínico poderá propor ao consulente, um
contrato terapêutico.

• Não interessa ao clínico (no caso dos ajustamentos


neuróticos) dar conta dos assuntos ou problemas
formulados pelos consulentes em termos de queixa.
• Mas no momento em que o consulente estabeleça na sessão um
ajustamento de evitação ou de criação em que ele próprio se
surpreenda, o clínico tem a ocasião ética de esclarecer, enfim, qual é o
objetivo da clínica gestáltica.

• Pontuar as “formas” de evitação, nas quais, por obra do próprio


consulente o clínico foi envolvido. A partir daí, deixará claro, que o
consulente estará pagando pela manifestação espontânea e a
autorização desse estranho, pois, foi sua inibição, que fez com que o
consulente se ajustasse da forma como vinha se ajustando.
• O clínico se “esforçará” para mostrar, que o que
acontece no campo não é a repetição de uma cena, mas
uma oportunidade que o consulente tem para aqui/agora,
criar algo novo.

• Deve pontuar também, que o tempo de sessão não diz


respeito ao relógio, e sim ao tempo de revelação de
uma Gestalt em que há a manifestação de uma inibição
reprimida. Isso pode levar segundos ou até meses.
• Assim que uma forma de ajustamanto evitativo é flagrada e
dela o participante se apercebe, o atendimento era
encerrado (Perls), isso pode levar minutos ou menos que
isso.

• O clínico contrata um teto cronológico com seus


consulentes, mas não significa que isso “deve” ser
cumprido.
• A continuidade da sessão não agregaria mais que um
falatório irrelevante, não raro devotado a solapar as
conquistas da sessão até aquele momento.

• Essa forma de entender o tempo também tem efeito sobre


os temas como assiduidade, atrasos, cancelamento.

• É dever ético do clínico, devolver esses efeitos aos


consulentes, para que isso também seja elaborado, mesmo
por meio de pagamento.
ALTA

• A necessidade das sessões, assim como a


compreensão do momento da alta, são fenômenos de
campo, sobre os quais o consulente deve deliberar.
Exceção para o período de férias, ou para a eventualidade
de o clínico não se sentir mais disponível para acompanhar
o consulente. Afora esses casos, cabe ao consulente,
portanto, aumentar, espaçar as sessões, ou decidir pelo fim
do processo terapêutico.
PAGAMENTO

• O consulente “deve” compreender que ele está


pagando por algo que tem a ver com ele e não com
o clínico (não está valorando o clínico), e sim as
“descobertas” sobre si, as formas pelas quais ele mesmo
produz seus ajustamentos, pela “curiosidade” que ele passa
a sentir por si mesmo.
VÍNCULO

• Nesse sentido, o que possibilita o vínculo terapêutico, não é mais


do que o encantamento do consulente por suas próprias Gestalten,
por seus próprios modos de interrupção do processo de contato.

• O consulente não faz vínculo com o clínico, mas faz vínculo consigo,
com isso que é outro para si. Acontece que esse outro só pode surgir
na relação de campo, onde as defesas do consulente contra isso que
ele mesmo deseja sejam desafiadas. É aqui que entra o clínico.

• E é por isso, que o consulente paga.


• O pagamento remunera o quanto de autonomia os
clínicos asseguram aos seus consulente, a falta de
cobrança ou a cobrança de um valor menor (em alguns
casos maior) demarca a resistência desses clínicos em
favorecer a “alforria” de seus acompanhados.
DIAGNOSE E INTERVENÇÃO CLÍNICA

• Diagnose e a terapia são o mesmo processo, pois é a


partir do lugar que somos (ou não) convidados a ocupar
no “apelo” do consulente que identificamos ajustamentos
aflitivos, psicóticos ou neuróticos, portanto ocupar ou não
aquele lugar é um ato clínico (um descentrar-se ante o que
faz derivar), toda identificação diagnóstica implica
intervenção terapêutica.

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