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Federação Brasileira das Associações

de Ginecologia e Obstetrícia

Manual de Orientação
Ginecologia Oncológica

2010
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Manual de Orientação

Ginecologia Oncológica

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de Ginecologia e Obstetrícia

Comissões Nacionais Especializadas


Ginecologia e Obstetrícia

Ginecologia Oncológica

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Ginecologia Oncológica

Manual de Orientação

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DIRETORIA
TRIÊNIO 2009 - 2011

Presidente
Nilson Roberto de Melo

Secretario Executivo Vice-Presidente Região Norte


Francisco Eduardo Prota Pedro Celeste Noleto e Silva
Secretaria Executiva Adjunta Vice-Presidente Região Nordeste
Vera Lúcia Mota da Fonseca Francisco Edson de Lucena Feitosa
Tesoureiro Vice-Presidente Região Centro-Oeste
Ricardo José Oliveira e Silva Hitomi Miura Nakagava
Tesoureira Adjunta Vice-Presidente Região Sudeste
Mariângela Badalotti Claudia Navarro Carvalho Duarte Lemos
Vice-Presidente Região Sul
Almir Antônio Urbanetz

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Ginecologia Oncológica

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Comissões Nacionais Especializadas


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Ginecologia Oncológica
Presidente: Etelvino de Souza Trindade (DF)
Vice-Presidente: Jurandyr Moreira de Andrade (SP)
Secretario: Sophie Françoise Mauricette Derchain (SP)

MEMBROS COLABORADORES

Agnaldo Lopes da silva Filho (MG) Áurea Akemi Abe Cairo (SP)
Celso Luiz Borrelli (SP) Fernando Anschau (RS)
Francisco Alberto Régio de Oliveira (CE) José Carlos Campos Torres (SP)
Gustavo Py Gomes da Silveira (RS) Luis Felipe Trincas Assad Sallum (SP)
Jesus Paula Carvalho (SP) Paula Ribeiro de Miranda Maldonado (RJ)
Luciano Brasil Rangel (SC) Ricardo Caponero (SP)
Luiz Carlos Zeferino (SP) Yara
Manoel Afonso Guimarães Gonçalves (RS)
Petrus Augusto Dornelas Câmara (PE)
Ronaldo Carauta de Souza (RJ)
Sérgio Mancini Nicolau (SP)
Walquíria Quida Salles Pereira Primo (DF)

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Presidência

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Vila Clementino - São Paulo / SP - CEP: 04037-003
Tel: (11) 5573.4919 Fax: (11) 5082.1473
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Ginecologia Oncológica
ÍNDICE

Apresetação 7
Câncer de Vulva 9
Câncer de Vagina 29
Câncer do Colo do Útero 37
Câncer do Endométrio 51
Sarcoma do Corpo do Útero 69
Câncer da Tuba Uterina 83
Câncer do Ovário 91
Doença Trofoblástica Gestacional 101
Cuidados Paliativos 117

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APRESENTAÇÃO

A Comissão Nacional Especializada de Ginecologia Oncológica da Federação


Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstétrica (FEBRASGO), com o enfoque
de prestação de serviço, elaborou e vem colocar, à disposição dos ginecologistas e
obstetras e, especialmente, àqueles que se dedicam à ginecologia oncológica o Manual
de Orientação em Ginecologia Oncológica.

O trabalho foi elaborado por todos os membros da Comissão e contém os procedimentos


para diagnóstico e as terapêuticas adotadas nos serviços de ginecologia oncológica das
Faculdades de Medicina e nas Instituições onde os autores ensinam e trabalham.

A finalidade e objetivo principal deste Manual é levar ao ginecologista oncológico e


também a todos os interessados uma orientação prática sobre os principais procedimentos
utilizados para diagnóstico, estadiamento e tratamento dos vários tipos de cânceres que
afetam o aparelho genital feminino.

Como a ciência evolui continuamente, existem áreas de conhecimento em câncer


que apresentam controvérsias, e outras em que novas tecnologias para diagnóstico e
tratamento estão em pesquisa, algumas já iniciando aplicações práticas. As controvérsias
não resolvidas na literatura e as novas tecnologias, quando citadas neste Manual, devem
ser entendidas na real dimensão do que são e não como guias definitivos de utilização
ou de condutas.

O Manual procura estabelecer para nosso país, onde existem imensas diferenças de
recursos humanos e estruturais, o limite do mínimo indispensável para a boa prática
médica e a excelência do cuidado com a paciente sem chegar à redundância e ao
supérfluo. Dessa forma a paciente estará bem atendida e não serão agregados ônus
desnecessários.

A padronização de procedimentos apresentada no Manual refere-se ao mínimo que


deve ser oferecido na assistência. As alternativas nos procedimentos, quando válidas,
são apresentadas e a opção deverá levar em conta a competência e experiência do
médico e o interesse da paciente. Porém não se deve esquecer que a individualização
deve sempre ser encorajada, pois é nela que se atinge a excelência do cuidado. É no
bom cuidado à paciente que o médico e o serviço onde ele trabalha se diferenciam.

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CÂNCER DE VULVA

Introdução
O câncer de vulva é neoplasia rara, corresponde a menos de 1% das neoplasias
malignas da mulher e é responsável por 3 a 5% das neoplasias malignas do trato genital
feminino.

A incidência estimada é de 1 a 2 casos por 100.000 mulheres/ano 1,2,3 com maior


frequência entre mulheres com idade superior a 70 anos quando a taxa aumenta para 20
casos por 100.000 mulheres/anos4.

O tipo histológico mais frequente é o carcinoma epidermóide, responsável por


aproximadamente 85% de todos os casos de câncer, seguido pelo melanoma5.

As taxas de incidência por tipo histológico estão relacionadas no quadro 1.

Quadro 1. Incidência de câncer da vulva por tipo histológico.

Epidermóide 86,2%
Melanoma 4,8%
Sarcoma 2,2%
Carcinoma Basocelular 1,4%
Glândula de Bartholin
Escamoso 0,4%
Adenocarcinoma 0,6% 1,2 %

Adenocarcinoma 0,6%
Indiferenciado 3,9%

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O principal fator prognóstico é o status linfonodal, que influencia significativamente a


sobrevida das pacientes 6.

O tratamento realizado em fases iniciais tem melhores resultados tanto estético-


funcionais quanto em termos de sobrevida global, além de permitir elevado índice de
cura. No entanto, por questões culturais das pacientes e pelo desconhecimento dos
profissionais, o diagnóstico ocorre na maioria das vezes em fase avançada da doença,
quando o prognóstico se torna pior e o tratamento mutilante.

Vias carcinogenéticas
As evidências epidemiológicas sugerem dois caminhos etiológicos na carcinogênese
vulvar.

O primeiro tipo é frequente em mulheres com idade acima de 70 anos, é associado


com a desordem epitelial não neoplásica (DENV), exemplificada na inflamação
crônica ou líquen, e tem como lesão precursora a neoplasia intraepitelial vulvar (NIV)
diferenciada.

O segundo tipo é visto mais frequentemente em mulheres mais jovens, está associado à
infecção pelo papilomavírus humano (HPV) e apresenta como lesão precursora a NIV
associada ao HPV, também denominada de NIV usual7.

Fatores de risco

- Infecção pelo HPV;


- Tabagismo;
- Idade;
- Multiplicidade de parceiros sexuais;
- Diabetes mellitus;
- Obesidade e
- Hipertensão arterial sistêmica.

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Diagnóstico

A biópsia da vulva deve ser indicada e realizada para qualquer lesão vulvar suspeita,
sintomática ou assintomática, tais como: lesões confluentes; massas verrucosas; úlceras
persistentes; áreas pruriginosas; alterações de cor, relevo e superfície 3(A).

A obtenção do tecido para a biópsia deve ser realizada com anestesia local, envolvendo
pele sadia e estroma subjacente com formato em cunha. Não se deve retirar a lesão por
completo, para não prejudicar o planejamento do tratamento definitivo 8 (D).

Nas lesões invasoras o prurido vulvar costuma ser o principal sintoma; pode também
ocorrer queixa de “caroço” na virilha e sangramento, nos casos com doença em estádios
avançados.

A localização mais comum da neoplasia é no grande lábio com taxa de incidência de


50%, seguido pelo pequeno lábio com incidência entre 15% a 20%, clitóris e glândula
de Bartholin 3 (A).

Classificação das alterações vulvares e lesões pré-


malignas
Este assunto é exposto no Manual de Patologia do Trato Genital Inferior.

Estadiamento

O câncer de vulva pode disseminar a partir do sítio inicial por meio da invasão local de
tecido adjacente ao tumor primário, embolização para linfonodos regionais, usualmente
inguinais superficiais e profundos e eventualmente pélvicos, e, muito raramente, por
via hematogênica, atingindo pulmões, fígado e ossos3.

A mais importante via de disseminação é a linfática, sendo, portanto, fundamental a


avaliação dos linfonodos regionais nos casos de tumores invasores 9,10.

O estadiamento é iniciado pelo exame físico geral, palpação das cadeias linfáticas
inguinais e supraclaviculares, exame vaginal e toque retal, eventualmente efetuado
sobanalgesia.

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A colheita da citologia cervical oncótica, colposcopia, exames hematológicos e raios-X


do tórax são realizados na rotina. Na suspeita de invasão vesical ou retal indica-se a
cistoscopia e retosigmoidoscopia com biópsia.

A realização de tomografia computadorizada (TC), ressonância nuclear magnética


(RNM) e urografia excretora podem ser indicadas para avaliar a possibilidade da
doença metastática em linfonodos pélvicos ou para planejamento 11,12 (C).

O comprometimento dos linfonodos inguinofemorais ocorre em cerca de 20% a 30%


dos casos, quando se considera todos os estádios do carcinoma de vulva 13 (D).

A avaliação clínica de metástase linfonodal não é confiável. Por isso, alguns autores
estudaram a possibilidade de detectar invasão linfonodal por meio de biópsia aspirativa
com agulha fina. Em uma revisão de casos, parte retrospectiva e parte prospectiva,
avaliando mulheres com idade média de 74 anos, portadoras de carcinoma de vulva,
distribuídos nos estádios Ib – 20%, II – 25%, III – 43 e IV – 11%, submetidas à biópsia
aspirativa por agulha fina guiada por ultrassonografia dos linfonodos considerados
suspeitos por apresentarem configuração irregular ou ecogenicidade alterada, foram
encontrados valores de sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo iguais a
80%, 100% e 100% respectivamente 14 (B).

Recentemente o sistema de estadiamento do câncer da vulva foi alterado de clínico para


cirúrgico, incorporando assim o status anatomopatológico dos linfonodos inguinais.

O estadiamento proposto pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia


(FIGO) adota como critérios o tamanho do tumor (T), invasão das estruturas perineais,
comprometimento linfonodal (N) e metástases à distância (M) ou TNM 15. O
estadiamento TNM para câncer de vulva mudou a partir de 2009, estando disponível
na sétima edição da Classificação TNM da UICC.

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Estadiamento da FIGO / TNM.

TNM:
T: Tumor primário:
TX Tumor primário não pode ser avaliado.
TO Não há evidência de tumor primário.
Tis Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasivo).
T1 Tumor confinado à vulva, ou à vulva e períneo.
T1a Tumor confinado à vulva, ou à vulva e períneo, com 2 cm ou menos na
sua maior dimensão e com invasão estromal até 1 mm*.
T1b Tumor confinado à vulva, ou à vulva e períneo, com 2 cm ou menos na
sua maior dimensão e com invasão estromal maior que 1 mm.
T2 Tumor invade a uretra inferior e/ou vagina inferior e/ou ânus.
T3 Tumor invade a uretra superior e/ou vagina média e/ou bexiga e/ou
mucosa retal e/ou osso (fixo ao osso pélvico).
N: Linfonodos regionais:
NX Linfonodos regionais não podem ser avaliados.
N0 Ausência de metástase em linfonodo regional.
N1 Metástase em linfonodo regional.
N1a Metástase em 1 ou 2 linfonodos, menor que 5 mm.
N1b Metástase em qualquer número de linfonodos, sendo 1 com 5 mm ou
mais.
N2 Metástase em linfonodo regional.
N2a Metástase em 2 ou mais linfonodos, menores que 5 mm.
N2b Metástase em 2 ou mais linfonodos com 5 mm ou mais.
N2c Metástase em qualquer número de linfonodos, havendo ruptura de
cápsula de um ou mais deles.
N3 Metástase em linfonodo, fixo ou ulcerado.
M: Metástase à distância:
M0 Ausência de metástase à distância.
M1 Metástase à distância.

* A profundidade da invasão é definida como a medida do tumor, desde a junção


epitélio-estroma da papila dérmica adjacente mais superficial até o ponto mais profundo
da invasão.

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Estadiamento cirúrgico do câncer da vulva.

Estádio: Achados patológicos pós-operatórios:


0 Carcinoma in situ (Carcinoma pré-invasivo).
TisN0M0
I Tumor confinado a vulva e/ou períneo, maior diâmetro
T1N0M0 menor que 2 cm e linfonodos inguinais negativos.
Ia Invasão estromal inferior a 1 mm inclusive.
T1aN0M0
Ib Invasão estromal superior a 1 mm.
T1bN0M0
II Tumor confinado a vulva e/ou períneo, com maior
T2N0M0 diâmetro superior a 2 cm e linfonodos inguinais
negativos.
III Tumor de qualquer tamanho infiltrando a porção inferior
IIIa da uretra e/ou vagina ou ânus e/ou metástase linfonodal
T1/T2N1a/N1bM0 regional unilateral.
IIIb
T1/T2N2a/N2bM0
IIIc
T1/T2N3M0
IV
IVa Tumor invade a porção superior da uretra, mucosa
T1/T2N3M0 vesical, mucosa retal, osso pélvico e/ou linfonodos
T3qqNM0 regionais bilaterais.

IVb Metástases à distância.


qqTqqNM1

Bases do tratamento

O tratamento de eleição para o câncer de vulva é cirúrgico, porém, não existe um


tratamento cirúrgico padronizado.

O objetivo será a realização de um tratamento o mais conservador possível, levando em


consideração o tamanho da lesão e o status linfonodal 16 (B).

Além disso, deve-se considerar, no caso de indicação cirúrgica, o estado geral da

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paciente e o estadiamento clínico.

Para pacientes com lesões iniciais deve-se recomendar tratamento conservador, devido
ao impacto psicossocial e às comorbidades cirúrgicas que ocorrem na cirurgia radical
17
(B).

Nos estádios III e IV, o tratamento cirúrgico deverá ser complementado com radioterapia
18
(B).

Em decorrência do câncer da vulva ser doença rara e acometer principalmente mulheres


idosas, não existem estudos suficientes que ratifiquem a indicação de tratamento
quimioterápico adjuvante padrão em doença avançada. O grupo de oncologia
ginecológica (GOG) está investigando a viabilidade de associar quimioterapia e/ou
radioterapia neoadjuvante no câncer avançado.

As abordagens cirúrgicas possíveis são:

1. Ressecção ampla da lesão – Consiste na exerese do tumor com margem de segurança


de 2 cm, tanto lateralmente como em profundidade. Caso haja necessidade de incisão
com margens exíguas ou se houver achado de comprometimento de margens tumorais,
completa-se a cirurgia em segundo tempo.

2. Vulvectomia simples – Ressecção dos grandes e pequenos lábios, porção interna


da região vestibular, região clitoridiana e retirada do coxim gorduroso até o nível da
aponeurose adjacente.

3. Vulvectomia radical – Ressecção da vulva, desde a região anterior pubiana, sulcos


genitofemurais até posteriormente o períneo, contornando o ânus. A forma da incisão é
a letra “W”. Medialmente a incisão envolve o vestíbulo vaginal, preservando o meato
urinário se ele não estiver comprometido, e ressecção dos músculos bulboesponjosos
e clitoridiano. A cirurgia é completada pela linfadenectomia inguinal superficial e
profunda bilateralmente.

Linfadenectomia inguinal
A abordagem padrão para a avaliação histológica linfonodal em mulheres com câncer
da vulva é a linfadenectomia inguinofemoral 19 (B).

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A linfadenectomia inguinal superficial objetiva a remoção dos linfonodos acima da fáscia


cribriforme, que estão associados às veias, safena maior e epigástrica superficial.

A linfadenectomia inguinal profunda consiste no esvaziamento total dos linfonodos


situados no chamado triângulo dos adutores da coxa a partir da fascia cribiforme até a
borda medial e lateral do músculo sartori e gênitofemoral, respectivamente.

A dissecção delimita um triângulo cujo vértice é o cruzamento desse músculo no terço


médio da coxa e a base é a arcada crural. Profundamente, disseca-se até o feixe vásculo-
nervoso com exposição e dissecção dos vasos femorais.

O músculo sartori pode ser seccionado na porção tendinosa e reimplantado na arcada


inguinal visando proteger o feixe vásculo-nervoso em eventuais deiscências de pele.
Esse procedimento é recomendado em pacientes obesas com risco de flebite profunda
e trombose.

Linfonodo sentinela (LNS)


O conceito de linfonodo sentinela é o do primeiro linfonodo locorregional a ser invadido
pelo tumor maligno.

No caso de neoplasia maligna da vulva sua detecção visaria determinar a necessidade


ou não da dissecção inguinofemoral. Duas técnicas foram sugeridas para a identificação
do linfonodo sentinela na vulva: pelo uso do azul patente, aplicado na periferia da lesão
e pela linfocintilografia com radiotraçador.

A abordagem padrão para a avaliação linfonodal com a linfadenectomia inguinofemoral,


apesar de se encontrar relacionada à significativa morbidade, demonstrou ser uma boa
conduta com resultados bons em termos de recorrência inguinal: as taxas de recorrência
variam entre 1% até 10% 20,21 (B).

Entretanto, somente um pequeno número de pacientes se beneficiará da realização da


linfadenectomia inguinofemoral, uma vez que apenas 25 a 35% apresentarão metástases
linfonodais 22 (B). Ou seja, mais de 75% das pacientes estará sendo submetida
desnecessariamente a linfadenectomia, procedimento correlacionado a significativa
morbidade como linfedema de membros inferiores, infecção e erisipela 23 (B).

Por isso, técnicas não invasivas ou minimamente invasivas são desejáveis com o

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intuito de diagnosticar a possibilidade de metástases para linfonodos e de permitir


planejamento terapêutico menos agressivo.

Na última década muitos estudos foram realizados para pesquisar a segurança da


introdução, no arsenal terapêutico do câncer da vulva, da dissecção do linfonodo
sentinela, mas ainda não há dados suficientes na literatura para sua aplicação como
rotina na abordagem terapêutica.

Tratamento

1. NIV

O tratamento da Neoplasia Intraepitelial Vulvar – NIV – é exposto no Manual de


Patologia do Trato Genital Inferior.

2. Estádio I:

a) Estádio Ia – Exerese ampla da lesão sem linfadenectomia;

b) Estádio Ib – Opções:

- Exerese ampla da lesão mais estudo do linfonodo sentinela;


- Vulvectomia simples mais linfadenectomia inguinal superficial;
- Vulvectomia simples mais linfadenectomia unilateral;
- Vulvectomia radical.

Cirurgia:

Lesão com invasão estromal menor de 1 mm, sem invasão angiolinfática, realizar
exerese ampla da lesão sem linfadenectomia. A prevalência de linfonodos positivos
neste estágio é menor que 1%. Os riscos de recidiva aumentam na medida em que a
margem de segurança diminui. O mínimo de margem recomendável é 8 mm 5,8 (D) 16,17
(B).

Em lesão não central, com invasão estromal maior de 1,0 mm e menor de 5 mm, sem
invasão angiolinfática realizar exerese ampla da lesão com linfadenectomia unilateral
5,8
(D) 16,17,24 (B).

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Em lesão central, com invasão estromal maior de 1 mm e menor de 5 mm, sem invasão
angiolinfática realizar vulvectomia simples.

Em lesão central com invasão angiolinfática realizar vulvectomia radical5 (D).

Radioterapia:

A radioterapia inguinal pode ser considerada uma alternativa viável em pacientes com
contraindicação cirúrgica para linfadenectomia inguinal em linfonodos clinicamente
negativos 24 (B).

A dose de radioterapia para doença subclínica é de 45 Gy a 50 Gy com frações diárias


de 1,8 Gy a 2,0 Gy.

Linfonodo sentinela

São necessários estudos multicêntricos, randomizados e controlados para definir o


papel do linfonodo sentinela no câncer de vulva 8 (D) 25 (B).

3. Estádio II:

Opções:

- Vulvectomia radical;
- Radioterapia adjuvante;
- Radioterapia exclusiva;
- Radioterapia associada à quimioterapia.

Cirurgia:

A vulvectomia radical é o tratamento padrão. A sobrevida em cinco anos, levando em


conta o tamanho da lesão inicial e com margem livre no mínimo de 1 cm atinge 80%
a 90% 16,26 (B).

Na última década os esforços têm sido dirigidos para uma abordagem cirúrgica mais
conservadora, principalmente em mulheres que apresentam carcinoma de vulva
acometendo apenas um lado, nos estádios I e II 27,28 (B), sendo a proposta de tratamento
a hemivulvectomia radical associada à linfadenectomia inguinal superficial ipsilateral
com incisões separadas.

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Um estudo retrospectivo mostrou que mulheres com idade média de 67 anos,


portadoras de carcinoma de vulva lateral, sendo T1 50% e T2 também 50% e as lesões
presentes nos grandes lábios em 55% das vezes e nos pequenos lábios em 32%, sem
envolvimento da linha média, submetidas à vulvectomia radical com linfadenectomia
inguinal superficial e profunda ou à hemivulvectomia radical com linfadenectomia
inguinal ipsilateral não houve diferença estatística entre o tipo da cirurgia primária e a
frequência das recorrências. O RRA foi 0,005 com IC de 95% (0,121 a 0,131) 29 (B).

As pacientes que realizaram hemivulvectomia ispsilateral com avaliação de linfonodo


superficial por congelação positivo, realizaram também a linfadenectomia inguinal
profunda.

Com relação às complicações no pós-operatório, observou-se que foram mais frequentes


com a vulvectomia que com a hemivulvectomia.

Respectivamente, o linfedema ocorreu em 26%, versus 7,5%, deiscências foram 23%


versus 7,5% e linfocistos tiveram taxas de 6,7% versus 3,2% 29 (B).

Radioterapia:

Radioterapia adjuvante vulvar está indicada em casos de margens exíguas, menores


que 8 mm, ou comprometidas, ou quando houver invasão angiolinfática e invasão
estromal maior de 5 mm 30 (B).

Radioterapia inguinal pode ser considerada alternativa viável em pacientes com


contraindicações cirúrgicas para linfadenectomia inguinal, sendo os linfonodos
clinicamente negativos 23 (B).

Radioterapia exclusiva ou associada à quimioterapia com dose total em doença


macroscópica de 65 Gy a 70 Gy será indicada para as pacientes incapazes de tolerar a
cirurgia radical ou julgadas inadequadas para cirurgia por causa do local ou extensão
da doença 31 (B).

Nessas situações clínicas, as drenagens linfáticas intrapélvicas serão incluídas nos


campos de tratamento juntamente com a vulva e regiões inguinais.

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4. Estádio III:
Opções:

- Vulvectomia radical;
- Radioterapia adjuvante;
- Radioterapia e/ou quimioterapia neoadjuvante.

Cirurgia:

A vulvectomia radical é o tratamento padrão. O status linfonodal é considerado o


principal fator independente de prognóstico. A sobrevida em cinco anos com menos de
três linfonodos unilaterais comprometidos é de 70%; quando há mais de três linfonodos
comprometidos a sobrevida diminui para 30%6 (A).

Radioterapia:

Em estudo randomizado do Grupo de Oncologia Ginecológica, pacientes submetidas à


vulvectomia radical com dois ou mais linfonodos inguinais comprometidos obtiveram
sobrevida maior quando se associou radioterapia inguinal e pélvica adjuvante,
comparadas com a linfadenectomia pélvica somente 32 (B).

Assim, se houver dois ou mais linfonodos inguinais comprometidos deve ser indicada
a radioterapia adjuvante inguinal e pélvica com dose de 45 Gy a 50 Gy.

Radioterapia adjuvante na dose de 45 Gy a 50 Gy na vulva será indicada no caso


das lesões primárias serem grandes, haver margens exíguas, invasão angiolinfática ou
invasão estromal maior que 5 mm 26 (B).

Radioterapia neoadjuvante na dose de 45 Gy a 50 Gy poderá ser indicada em casos


selecionados para diminuir extensão cirúrgica ou melhorar a operabilidade 18 (B).
Nestes casos, também se pode associar a quimioterapia – radioquimioterapia 26 (B).

Para pacientes julgadas inadequadas para a cirurgia ou incapazes de tolerar vulvectomia


radical a indicação será a radioterapia radical com doses de 65 Gy a 70 Gy em doença
macroscópica e 45 Gy a 50 Gy em doença subclínica, associada à quimioterapia com
5-fluorouracil mais cisplatina, conforme citado para o estádio IV 33 (B).

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5. Estádio IV:
Estádio IVa – Opções:
- Vulvectomia radical e exenteração pélvica anterior e/ou posterior;
- Radioterapia e/ou quimioterapia;

Estádio IVb – Opções:


- Vulvectomia higiênica;
- Radioterapia e/ou quimioterapia.

Cirurgia:

O tratamento padrão para o carcinoma avançado de vulva tem sido a ressecção em


bloco do tumor primário com os linfonodos regionais. A magnitude da cirurgia será
dependente da extensão da doença a partir do sítio primário, envolvimento de órgãos
adjacentes e comprometimento dos linfonodos 34 (B).

Quando a doença envolve o reto, ânus, septo retovaginal, uretra proximal ou bexiga,
a ressecção cirúrgica adequada é possível a partir da combinação da vulvectomia
radical à exenteração pélvica. Porém, essa cirurgia está associada a elevadas taxas de
morbimortalidade e a sobrevida em cinco anos gira em torno de 50% 35,36 (C).

Radioterapia e/ou quimioterapia:

A radioterapia adjuvante na dose de 45 Gy a 50 Gy na vulva estará indicada nas lesões


primárias grandes, margens estreitas, invasão angiolinfática e invasão estromal maior
que 5 mm 26 (B).

Radioterapia adjuvante inguinal e pélvica é indicada quando dois ou mais linfonodos


inguinais estiverem comprometidos 32 (B).

Também será indicada a radioterapia neoadjuvante na dose de 45 Gy a 50 Gy em casos


selecionados para diminuir a extensão cirúrgica ou melhorar a operabilidade. Nesses
casos, pode-se associar quimioterapia com cisplatina na dose de 50mg/m2 no D1, mais
Fluorouracil na dose de 1.000 mg/m2, em infusão continua por quatro dias iniciando
nos dias D1 e D22 da radioterapia 26,33 (B).

Nas pacientes que têm contraindicação para platina, substituí-la por mitomicina 10mg/
m2.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Para pacientes inoperáveis por serem julgadas inadequadas para a cirurgia ou incapazes
de tolerar vulvectomia radical realizar radioterapia exclusiva associada à quimioterapia
com cisplatina e fluorouracil em infusão continua por quatro dias iniciando nos dias D1
e D22 da radioterapia 26,33 (B).

Nos últimos anos, o conceito de modalidade terapêutica combinada – quimioterapia/


radioterapia/cirurgia – empregada em uma variedade de tumores tem sido explorado
no câncer da vulva. Em estudo multicêntrico prospectivo, mulheres com idade média
de 50 anos, portadoras de carcinoma de vulva localmente avançado, sem possibilidade
de ressecção através da vulvectomia radical foram submetidas a esquema terapêutico
composto por quimioirradioterapia seguida da excisão cirúrgica do tumor primário
residual associado à linfadenectomia inguinofemoral bilateral. Todas as pacientes
com tumores primários T3 e T4 independente do comprometimento linfonodal foram
selecionadas para o estudo, A radioterapia foi administrada somente ao tumor vulvar
primário em dois cursos separados na dose de 2.380 cGy com dose total de 4.760 cGy.
Nas pacientes com diagnóstico clínico de N2/N3 tiveram a inclusão dos linfonodos
inguinofemorais e pélvicos no campo radioterápico. Concomitante à radioterapia, foi
administrada a quimioterapia que consistiu no uso da cisplatina na dose de 50 mg/
m2 e 5-fluorouracil na dose de 1.000 mg/m2. O resultado foi que 48% das pacientes
deixaram de apresentar tumor visível ao exame físico e apenas 2,8% permaneceram
com doença inoperável 37 (B).

Outro estudo avaliou a taxa de operabilidade de pacientes portadoras de carcinoma


primário de vulva N2/N3 inicialmente inoperáveis. A observação foi que após o
emprego de quimioirradioterapia com 4.760 cGy para o tumor primário e os linfonodos,
associada a cisplatina, na dose de 50 mg/m2, mais 5-fluorouracil, na dose de 1.000 mg/
m2, foi possível operar 90% das pacientes e que no período de 78 meses 31% das
pacientes não apresentaram recorrência 38 (B).

Entretanto, deve-se deixar claro que o emprego da quimioirradiação neoadjuvante


em pacientes portadoras de carcinoma de vulva com possibilidade de ressecção não
oferece vantagens, quando comparada à cirurgia imediata e também tem elevada taxa
de complicações 39 (A).

Em estudo realizado com pacientes portadoras de carcinoma vulvar localmente


avançado, sendo 72% no estádio II e 22% no estádio IVa, que foram submetidas à
terapia primária com radioterapia isolada na dose variável entre 20 Gy e 45 Gy ou
quimioterapia combinando mitomicina-C, na dose de 10 mg/m2 com 5-fluorouracil, na
dose de 1.000 mg/m2 associada a radioterapia na dose média de 45 Gy, observou-se que

22
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

a resposta clínica completa foi atingida com a radioterapia isolada em 41% das pacientes
comparada com 71% de resposta clínica completa na associação quimioirradiação no
período analisado de 46 meses, sendo o RRA de 0,297 com IC 95% (0,069 a 0,663) 40
(B).

As recorrências observadas no período foram mais frequentes nas pacientes tratadas


com radioterapia isolada que com a quimioirradiação, respectivamente 60% versus
20%, sendo o RRA 0,4 com IC de 95% (0,896 a 0,096) 40 (B).

6. Doença recorrente ou refratária:

Opções:

- Excisão radical local e/ou radioterapia;


- Vulvectomia radical e exenteração pélvica;
- Radioterapia mais quimioterapia associados ou não à cirurgia;
- Radioterapia paliativa.

A região vulvar é o principal sítio de recorrência para o câncer de vulva, mas as


recorrências inguinais costumam ser mais precoces e têm pior prognóstico comparado
ao sítio vulva 41 (B).

O tratamento será individualizado, dependente da performance e status da paciente e


do local e volume da doença.

Não existe quimioterapia padrão ou outro tratamento padrão para doença metastática
33
(B).

A excisão radical local aumenta a sobrevida em 56% se os linfonodos regionais não


estiverem acometidos42 (B).

A radioterapia associada ou não a quimioterapia pode levar às remissões em algumas


pacientes, com baixa taxa de nova recidiva 33 (B).

Em situações especiais, a braquiterapia pode ser uma alternativa terapêutica. Quando a


recidiva ocorrer após dois anos, a radioterapia associada à cirurgia pode resultar numa
sobrevida de cinco anos maior que 50%19 (B).

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Condições especiais
1. Melanoma vulvar – É a segunda neoplasia vulvar mais comum com incidência de
4,8%. A maioria das lesões envolve o clitóris ou o pequeno lábio Toda lesão pigmentada
na vulva deve ser biopsiada. Para o estadiamento usar o sistema de Clark ou Breslow
modificado. Como nos melanomas cutâneos, há uma tendência para resseção mais
conservadora nos melanomas vulvares. O tratamento é a exerese ampla das lesões
primárias com margem de pelo menos 1 cm. A linfadenectomia inguinal é controversa,
embora seja recomendada pelo Intergroup Surgical Melanoma Program3 (A) 43 (B).

2. Câncer da glândula de Bartholin – Pode ser escamoso, com taxa de incidência


de 0,4% ou adenocarcinoma, com taxa de incidência de 0,6%. Frequentemente o
diagnóstico é feito após ressecção da glândula. O tratamento padrão é a vulvectomia
radical. Porém, a ressecção ampla da lesão e linfadenectomia inguinal unilateral pode
ser efetiva nas lesões precoces. Como estas lesões costumam estarem profundas na
fossa isquiorretal, as margens poderão estar exíguas ou comprometidas. Nesses casos
indica-se radioterapia adjuvante vulvar. Também nos casos de lesões volumosas estará
indicada a radioterapia vulvar e se os linfonodos inguinais estiverem comprometidos
é necessária a radioterapia inguinal adjuvante. Para as lesões císticas adenóides o
tratamento de escolha é a exerese ampla com radioterapia adjuvante local se as margens
estiverem comprometidas ou se houver invasão perineural 3 (C), 43 (A).

Seguimento
Na literatura, não existem evidências de que o seguimento rotineiro de pacientes
assintomáticas com exames de imagem é melhor do que solicitá-los apenas para a
paciente sintomática com orientação dada pelo sintoma.

As pacientes deverão fazer exame clínico ginecológico com colposcopia e inspeção


armada ou não da vulva, trimestralmente por dois anos, e semestralmente até cinco
anos.

Após o seguimento diferenciado, todas as pacientes deverão realizar anualmente os


exames clínico ginecológicos e outros exames de imagem poderão ser solicitados de
acordo com sintomas e/ou exame físico alterado.

A citologia cervical oncológica deve ser anual.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Algoritmo terapêutico do câncer de vulva.


Estádio: Quadro clínico: Tratamento:
Ia Invasão estromal Sem invasão angiolinfática, exérese ampla da
T1aN0M0 inferior a 1 mm lesão sem linfadenectomia.
inclusive. Lesões centrais ou com invasão angiolinfática
realizar vulvectomia radical.
Radioterapia inguinal pode ser considerada em
linfonodos clinicamente negativos: 45 Gy a 50 Gy
com frações diárias de 1,8 Gy a 2,0 Gy.
Ib Invasão estromal Sem invasão angiolinfática, em lesões não
T1bN0M0 superior a 1 mm. centrais, com invasão estromal <5 mm realizar
exerese ampla da lesão com linfadenectomia
unilateral.
Sem invasão angiolinfática, em lesões centrais,
com invasão estromal <5 mm realizar vulvectomia
simples.
Lesões centrais ou com invasão angiolinfática
realizar vulvectomia radical.
Radioterapia inguinal pode ser considerada em
linfonodos clinicamente negativos na dose de 45
Gy a 50 Gy com frações diárias de 1,8
Gy a 2,0 Gy.
II Tumor confinado a Vulvectomia radical.
T2N0M0 vulva e/ou períneo, Radioterapia adjuvante vulvar se margens exíguas
com maior diâmetro (<8 mm) ou comprometidas, invasão angiolinfática
superior a 2 cm e e invasão estromal maior de 5 mm.
linfonodos inguinais Radioterapia inguinal pode ser considerada em
negativos. linfonodos clinicamente negativos (45 Gy a 50 Gy
com frações diárias de 1,8 Gy a 2,0 Gy).
Radioterapia exclusiva ou associada à
quimioterapia* com dose total em doença
macroscópica de 65 Gy a 70 Gy.
III Tumor de qualquer Vulvectomia radical.
IIIa tamanho infiltrando a Radioterapia adjuvante (45 Gy a 50 Gy) em vulva
T1/T2N1a/N1bM0 porção inferior da se lesões primárias grandes, margens exíguas,
IIIb uretra e/ou vagina ou invasão angiolinfática e invasão estromal maior
T1/T2N2a/N2bM0 ânus e/ou metástase que 5 mm.
IIIc linfonodal regional Radioterapia adjuvante inguinal e pélvica (45 Gy a
T1/T2N3M0 unilateral. 50 Gy) se houver 2 ou mais linfonodos inguinais
comprometidos.
Radioterapia neoadjuvante (45 Gy a 50 Gy) +/-
quimioterapia* neoadjuvante.
Radioterapia radical exclusiva com doses de 65 Gy
a 70 Gy em doença macroscópica e 45 Gy a 50 Gy
em doença subclínica associada à quimioterapia*.
IVa Tumor invade a Vulvectomia radical e exenteração pélvica (anterior
T1/T2N3M0 porção superior da e/ou posterior).
T3qqNM0 uretra, mucosa Vulvectomia higiênica.
vesical, mucosa retal, Radioterapia adjuvante (45 Gy a 50 Gy) em vulva
osso pélvico e/ou se lesões primárias grandes, margens exíguas,
linfonodos regionais invasão angiolinfática e invasão estromal maior
bilaterais. que 5 mm.
Radioterapia adjuvante inguinal e pélvica(45 Gy a
50 Gy) se 2 ou mais linfonodos inguinais
comprometidos.
Radioterapia neoadjuvante (45 Gy a 50 Gy) +
Quimioterapia.
Radioterapia exclusiva associada à quimioterapia.*

*Radioquimioterapia - Cisplatina 50mg/m2 D1 + Fluorouracil 1.000mg/m2 em infusão


continua por 4 dias nos dias D1 e D22 da radioterapia.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

CÂNCER DE VAGINA

Introdução
O carcinoma primário de vagina é um tumor raro; corresponde 1% a 2% dos tumores
malignos ginecológicos e ocupa o quinto lugar em incidência entre as neoplasias
malignas do trato genital feminino.

O conceito de tumor primário de vagina é o tumor que origina na vagina e não acomete
a vulva nem o colo do útero.

Cerca de 70 a 80% das pacientes com essa doença têm mais de 60 anos de idade.
A exceção são os tumores associados ao uso de dieteilestilbestrol (DES) por mulher
gestante, que expõe o feto feminino intraútero, e esse feto, quando adolescente ou
mulher adulta jovem, entre os 17 e 21 anos de idade pode desenvolver o adenocarcinoma
de células claras da vagina.

As lesões metastáticas são duas a três vezes mais frequentes que o carcinoma primário
e são provenientes do colo do útero, endométrio, ovário, vulva, reto, uretra, bexiga e
do coriocarcinoma1.

O carcinoma de células escamosas representa 85% dos casos. Na disseminação, a


invasão inicial é na parede da vagina e posteriormente atinge os tecidos paravaginais
e paramétrios.

As metástases à distância mais comuns ocorrem comumente no fígado e pulmões.

Fatores de risco
Os mais importantes são a infecção pelo papiloma vírus humano (HPV) e irradiação
prévia.

Cerca de 80% dos casos surgem em mulheres previamente tratadas por câncer de colo
do útero e os 20% restantes após histerectomia por lesões benignas 2,3.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Outros fatores de risco são tabagismo, promiscuidade sexual, baixo status imunológico
e irritação vaginal crônica.

Diagnóstico
A história clínica deve investigar passado de câncer, principalmente do colo do útero,
radioterapia e cirurgia pélvica.

Os sinais e sintomas do carcinoma vaginal são semelhantes aos do câncer do colo do


útero: corrimento vaginal e sangramento após relação sexual ou após a menopausa.

No exame ginecológico, durante a inspeção, deve ser feita a rotação do espéculo para
que todas as paredes vaginais sejam bem observadas.

O diagnóstico será consolidado pela sequência da coleta colpocitológica, colposcopia


e biópsia. Os toques vaginal e retal são importantes para avaliar paracolpos e
paramétrios.

Na maioria dos casos o diagnóstico é tardio porque o câncer da vagina é assintomático


nos estádios iniciais, acrescido da pouca frequência de consultas ginecológicas das
pacientes na faixa etária de maior incidência para essa neoplasia maligna.

Classificação das alterações vaginais pré-malignas


– NIVA

Este assunto é exposto no Manual de Patologia do Trato Genital Inferior.

Estadiamento

Como o estadiamento do carcinoma vaginal é clínico e não cirúrgico deve ser solicitada
a cistoscopia, a urografia excretora, a retossigmoidoscopia e radiografia do tórax, com
o propósito de avaliar a extensão da doença.

30
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

A ressonância nuclear magnética substitui a cistoscopia, a urografia excretora e a


retossigmoidoscopia e poderá ser usada quando disponível no serviço. A classificação
TNM é a da sétima edição da UICC, de 2009 e não houve alteração para o câncer
vaginal.

Estadiamento da FIGO / TNM.

TNM:
T: Tamanho do tumor primário:
TX Tumor primário não pode ser avaliado.
T0 Não há evidência de tumor primário.
Tis Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasivo).
T1 Tumor confinado à vagina.
T2 Tumor invade os tecidos paravaginais, mas não se estende à parede
pélvica.
T3 Tumor estende à parede pélvica.
T4 Tumor invade a mucosa vesical ou retal, e/ou estende além da pelve
verdadeira.*
N: Linfonodos regionais:
NX Os linfonodos regionais não podem ser avaliados.
N0 Ausência de metástases em linfonodo regional.
N1 Metástase em linfonodo regional.
M Metástase à distância:
M0 Ausência de metástase à distância.
M1 Metástases à distância.
* A presença de edema bolhoso não é evidência suficiente para classificar um tumor
como T4.

31
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Estadiamento do câncer da vagina.

Estádio: Descrição:
O Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasivo).
TisN0M0
I Tumor confinado a parede vaginal.
T1N0M0
II Tumor invade o tecido perivaginal (paracolpos, paramétrios),
T2NOMO mas não se estende à parede pélvica.
III Tumor estende à parede pélvica, ou está localizado nos 2/3
T1/T2/T3N0M0 superiores da vagina com metástases para os linfonodos
pélvicos, ou está localizado no 1/3 inferior da vagina com
metástases unilateral para os linfonodos inguinais.

IV Carcinoma estendendo-se além da pelve verdadeira ou


comprometendo a mucosa vesical e/ou retal.
IVa Tumor invade uretra superior, mucosa da bexiga, mucosa do
T4qqNM0 reto; osso pélvico e/ou linfonodos regionais bilaterais.
Comprometimento dos órgãos adjacentes.
IVb Qualquer metástase à distância.
qqTqqNM1

Bases do tratamento

A escolha do tratamento deve ser baseada no estadiamento, na localização do tumor e


nas condições clinicas da paciente e pode ser cirúrgico, quimioterápico, radioterápico
ou a associação de tratamentos 4.

Estudo realizado por Kucera et al analisou 190 pacientes com câncer de vagina, em
todos os estádios; todas foram tratadas com radioterapia exclusiva; a sobrevida em
cinco anos foi de 41% 5 .

Outro estudo com 41 pacientes, usando pacientes em todos os estádios, mostrou


sobrevida estimada em cinco anos de 40,6% 6.

A localização do tumor é de fundamental importância na estratégia da abordagem


cirúrgica. Para os tumores pequenos do terço superior da vagina a cirurgia indicada

32
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

é Wertheim-Meigs com colpectomia parcial. No terço inferior indica-se vulvectomia


radical e colpectomia parcial. No terço médio ou na presença de lesões extensas que
atinja outro terço da vagina, a melhor opção terapêutica é a radioterapia exclusiva, pois
a cirurgia muito estendida apresenta morbidade elevada1.

Em estudo com seis pacientes, a associação de cisplatina e radioterapia para o tratamento


do câncer primário de vagina demonstrou sobrevida de cinco anos em 66% dos casos,
considerando todos os estádios: três – 50% no estádio clínico II, duas – 33% no estádio
III e uma – 17% no estádio IVa 7.

Tratamento
1. NIVA - O tratamento da Neoplasia Intraepitelial Vaginal é exposto no Manual de
Patologia do Trato Genital Inferior.

2. Estádio I – Cirurgia Werthein-Meigs com colpectomia do terço superior da vagina


para o tumor localizado no terço superior; vulvectomia radical com colpectomia do
terço inferior da vagina para o tumor localizado no terço inferior; radioterapia exclusiva
para o tumor localizado terço médio da vagina.

2. Estádio II a IV – Radioterapia e quimioterapia.

Seguimento
Na literatura, não existem evidências de que o seguimento rotineiro de pacientes
assintomáticas com exames de imagem é melhor do que solicitá-los apenas para a
paciente sintomática com orientação dada pelo sintoma.

As pacientes deverão fazer exame clínico ginecológico com colposcopia trimestralmente


por dois anos, e semestralmente até cinco anos.

Após o seguimento diferenciado, todas as pacientes deverão realizar anualmente os


exames clínico ginecológicos e outros exames de imagem poderão ser solicitados de
acordo com sintomas e/ou exame físico alterado.

A citologia cervical oncológica deve ser anual.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Condições especiais
1. Melanoma vaginal – Corresponde a menos de 5% de todos os cânceres da vagina
e geralmente acomete o seu terço distal. A lesão é pigmentada escura. Toda lesão
pigmentada na vagina deve ser biopsiada. Para o estadiamento usar o sistema de
Clark ou Breslow modificado. A tendência atual é a resseção mais conservadora nos
melanomas, o que poderá ser aplicado quando compromete a vagina. O tratamento é a
exerese ampla das lesões primárias com margem de pelo menos 1 cm. A opção será a
abordagem de acordo com a base do tratamento cirúrgico para o carcinoma vaginal do
terço inferior vaginal.

2. Sarcoma botrióide – Em lactentes e crianças até cinco anos é encontrada essa


neoplasia, embora rara. É um rabdomiossarcoma embrionário, que pode ser tratado
com cirurgia conservadora e quimioterapia, com bons resultados se o diagnóstico for
precoce.

Prognóstico
O estádio clínico é o mais importante indicador prognóstico. A sobrevida é menor nas
pacientes acima de 60 anos de idade, sintomáticas no momento do diagnóstico, com
lesões localizadas no terço médio e inferior da vagina e com tumores indiferenciados.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Algoritmo terapêutico do câncer de vagina.

Estádio: Quadro clínico: Tratamento:


I Tumor confinado à parede Cirurgia Werthein-Meigs com
T1N0M0 vaginal. colpectomia do terço superior da
vagina para o tumor localizado
no terço superior;
Vulvectomia radical com
colpectomia do terço inferior da
vagina para o tumor localizado
no terço inferior;
Radioterapia exclusiva para o
tumor localizado terço médio da
vagina.
II Tumor invade o tecido Radioterapia e quimioterapia.
T2NOMO perivaginal (paracolpos,
paramétrios), mas não se
estende à parede pélvica.
III Tumor estende à parede
T1/T2/T3N0M0 pélvica, ou está localizado nos
2/3 superiores da vagina com
metástases para os linfonodos
pélvicos, ou está localizado
no1/3 inferior da vagina com
metástases unilateral para os
linfonodos inguinais.
IVa Tumor invade uretra superior,
T4qqNM0 mucosa da bexiga, mucosa do
reto; osso pélvico e/ou
linfonodos regionais bilaterais.
Comprometimento dos órgãos
adjacentes.
IVb Qualquer metástase à
qqTqqNM1 distância.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Referências Bibliográficas
1 - DiSaia PPJ, Creasman WTT. Clinical gynecologic oncology. 7ª ed. Mosby-elsevier; 2007. p. 265-79.
2 - Mazur MT, Hsueh S, Gersell DJ. Metastasis to the female tract. Analysis of 325 cases. Cancer. 1984;
53(9): 1978-84.
3 - Brinton LA, Nasca PC, Mallin K, Schairer C, Rosenthal J, Rothenberg R, Yordan E, Richart RM. Case
control study of in situ and invasive carcinoma of the vagina. Gynecol Oncol. 1990; 38(1): 49-54.
4 - Sinha B, Stehman F, Schilder J, Clark L, Cardenes H. Indiana University experience in the management
of vaginal cancer. Int J Gynecol Cancer. 2009; 19(4): 686-93.
5 - Kucera H, Mock U, Knocke TH, Kucera E, Potter R. Radiotherapy alone for invasive vaginal cancer:
outcome with intracavitary high dose rate brachytherapy versus conventional low dose rate brachytherapy.
Acta obstet Gynecol Scand 2001; 80(4):355-60.
6 - Hegemann S, Schafer U, Lelle R, Willich N, Micke O. Long-term results of radiotherapy in primary
carcinoma of the vagina. Strahlenther Onkol; 2009; 185(3): 184-9.
7 - Samanta R, Lau BEC, Le T, Tam T. Primary vaginal cancer treated with concurrent chemoradiation
using Cisplatinum. Int J Radiat Oncol Biol Phys. 2007; 69(3): 746-50.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

CÂNCER DO COLO DO ÚTERO

Introdução 
O câncer do colo uterino é, em nosso país, o tumor maligno mais frequente no sistema
genital feminino, diferente do que ocorre em países mais adiantados, onde prevalece
o câncer de endométrio. É, também, o segundo câncer mais frequente na mulher, em
todas as localizações, exceto pele. No Brasil, somente nas regiões sudeste e sul situam-
se em terceiro lugar, após mama e colon1.

A sua prevalência pode ser reduzida através da realização de diagnóstico oportuno e


tratamento correto de suas lesões precursoras, que são as neoplasias intraepiteliais,
especialmente as de alto grau. O rastreamento pela citopatologia tem mostrado essa
possibilidade, pois reduz a incidência e a mortalidade do câncer cervical2.

As estimativas de incidência e de mortalidade segundo o Instituto nacional do Câncer


(INCA) são de 500 mil casos novos, em 2010, no mundo, com 230 mil mortes
(18/100.000 mulheres) e, no Brasil serão 18.430 casos novos neste ano de 20101.

Nos países desenvolvidos a sobrevida média de cinco anos para as pacientes tratadas
é de 51% a 66%, enquanto que nos países em desenvolvimento a sobrevida média em
cinco anos é de 41%1. 

Fatores de risco
O código de alto risco para carcinoma epidermóide do colo do útero engloba os
seguintes itens:

- Infecção pelo Papiloma Vírus Humano (HPV), especialmente pelos tipos considerados
de risco maior;

- Tabagismo, com risco relativo entre de 3,4 a 7;

- Lesões determinadas pelo Herpes Vírus Simples (HVS) tipo II;

- Parceiro sexual de alto risco ou múltiplos parceiros;

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

- Início precoce das relações sexuais, abaixo dos 14 anos de idade;

- Gestação precoce, antes dos 20 anos de idade;

- Uso prolongado de anticoncepcionais orais, mais de 10 anos;

- Imunodepressão e imunossupressão e

- Radiações ionizantes 3.
 

Diagnóstico
Os meios utilizados para detectar o câncer do colo do útero em estádio pré-clínico e as
alterações pré-malignas que têm história natural correlata a essa doença são:

- Exame especular da vagina e colo do útero;

- Exame citopatológico, que é utilizado mais no rastreamento;

- Teste com ácido acético;

- Teste com iodo (teste de Schiller);

- Colposcopia, que no Brasil, é de uso bastante corrente e pouco restritivo, principalmente


se comparado com os Estados Unidos;

- Microcolposcopia, que é pouco utilizado e de uso limitado a casos muito especiais de


dificuldade diagnóstica;

- Biópsia dirigida colposcopicamente;

- Biópsia cônica por conização a frio ou cirurgia de alta frequência;

- Toque vaginal e

- Toque retal.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

O carcinoma epidermóide de colo uterino é  prevenível com a adoção de exames


periódicos e coleta de material para citopatologia. A citologia anual assegura uma
proteção superior a 90%, pelo diagnóstico e tratamento das alterações epiteliais,
especialmente as de alto grau – neoplasia intraepitelial cervical (NIC) de graus II e
III.

A apresentação clínica do câncer de colo pode ser de três tipos:

1. Tumor exofítico ou vegetante – é a forma clínica mais frequente e apresenta-


se sangrante e com odor fétido. O crescimento pode ocorrer para o canal cervical,
ocasionando o aumento do volume do colo, denominado barrel shaped pelos
anglossaxônicos.

2. Tumor ulcerativo – frequentemente está associado com infecção e apresentando


secreção purulenta.

3. Tumor infiltrativo – determina aumento do volume cervical, com pequena ou


nenhuma área de tumor visível. O colo do útero se apresenta endurecido, chamado
stone-hard cervix. Na evolução pode apresentar sangramento e fluxo purulento.

O tumor de colo uterino pode infiltrar em direção à  vagina, nos casos avançados,
chegando até o seu terço inferior, e/ou em direção à cavidade uterina, para os paramétrios
anteriores, laterais ou posteriores, para a bexiga e reto.

O processo maligno é mais loco-regional que sistêmico. Somente em tumores muito


adiantados haverá metástases em pulmão ou outros órgãos, sendo característica a
metástase em linfonodo supraclavicular esquerdo.

A drenagem linfática natural se faz em direção aos linfonodos pélvicos – parametriais,


das fossas obturadoras, das cadeias linfáticas ilíacas internas e externas, linfonodos
sacrais, das ilíacas comuns e das lomboaórticas. Um estudo sobre a distribuição de
metástases em câncer do colo uterino mostrou que a positividade dos linfonodos
lombo-aórticos esteve associada à positividade dos ilíacos comuns e sacrais4.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Aspectos histológicos
Os cânceres de colo uterinos são espinocelulares em cerca de 80% dos casos. O
adenocarcinoma tem taxa de incidência em cerca de 15% dos casos e os de menor
frequência são os tumores adenoescamosos, neuroendócrinos e outros muito raros.

Na avaliação histológica interessam o tamanho, o tipo de tumor, seu grau de diferenciação


e a presença ou ausência de invasão do espaço linfovascular. 

Classificação das alterações pré-malignas – NIC

Este assunto é exposto no Manual de Patologia do Trato Genital Inferior.

Estadiamento
A FIGO considera como exames auxiliares do exame clínico, para estadiamento, a
cistoscopia, retossigmoidoscopia e urografia excretora. Outros exames poderão ser
usados, como a ultrassonografia transvaginal ou transretal e a ressonância magnética,
para fins de planejamento terapêutico, embora não sejam partes do protocolo.

O estadiamento do câncer do colo uterino é clínico. Ele foi modificado pela FIGO em
janeiro de 2009, como exposto na Tabela 1, a seguir 5 . O estadiamento TNM é o da
sétima edição, de 2009 da UICC e não teve alteração.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Tabela 1 – Estadiamento cirúrgico do câncer do colo do útero.


Correspondência com a classificação TNM.

TNM:
T: Tumor primário:
TX Tumor primário não pode ser avaliado.
TO Não há evidência de tumor primário.
Tis Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasivo).
T1 Tumor limitado ao colo. A extensão ao corpo deve ser desprezada.
T1a Carcinoma invasivo, diagnosticado somente pela microscopia. Todas
as lesões visíveis macroscopicamente – mesmo com invasão
superficial – são T1b.
T1a1 Invasão estromal de até 3 mm e com 7 mm ou menos de extensão
horizontal.
T1a2 Invasão estromal com mais de 3 mm até 5 mm em profundidade e
com extensão horizontal de 7 mm ou menos.*
T1b Lesão clinicamente visível, limitada ao colo, ou lesão microscópica
maior que T1a2.
T1b1 Lesão clinicamente visível com 4 cm ou menos em sua maior
dimensão.
T1b2 Lesão clinicamente visível com mais de 4 cm em sua maior dimensão.
T2 Tumor que invade além do útero, mas não atinge a parede pélvica ou
o terço inferior da vagina.
T2a Sem invasão do paramétrio.
T2b Com invasão do paramétrio.
T3 Tumor que se estende à parede pélvica compromete o terço inferior da
vagina, ou causa hidronefrose ou exclusão renal.
T3a Tumor compromete o terço inferior da vagina, sem extensão à parede
pélvica.
T3b Tumor estende até a parede pélvica ou causa hidronefrose ou
exclusão renal.
T4 Tumor invade a mucosa da bexiga e/ou reto e/ou estende além da
pelve verdadeira.
T4a Tumor invade a mucosa vesical ou retal, ou estende além da pelve
verdadeira.**
N: Linfonodos regionais:
NX Linfonodo regional não pode ser avaliado.
N0 Ausência de metástase em linfonodo regional.
N1 Metástase em linfonodos regionais.
M Metástase à distância:
M0 Ausência de metástase à distância.
M1 Metástase à distância.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Estádio: Descrição:
0 Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasor)
TisN0M0
I Tumor estritamente confinado ao colo do útero. A extensão
T1 ao corpo é desconsiderada.
Ia Lesão invasora pré-clínica. Somente será diagnosticada
T1aN0M0 por microscopia. A lesão tem sempre menos de 5 mm de
invasão em profundidade e menos de 7 mm de extensão.
Ia1 Invasão máxima de 3 mm em profundidade e 7 mm de
T1a1N0M0 extensão.
Ia2 Invasão máxima de 5 mm em profundidade e 7 mm de
T1a2N0M0 extensão.***
Ib Lesão invasora clínica ou pré-clínica maior que no estádio
T1bN0M0 Ia.
Ib1 Tumor maior que o estádio Ia até 4 cm na maior extensão.
T1b1N0M0
Ib2 Tumor com mais de 4 cm na maior extensão.
T1b2N0M0
II Tumor ultrapassa os limites do colo uterino, podendo
T2 invadir a vagina sem atingir o seu terço inferior e/ou
acometendo um ou ambos os paramétrios, sem atingir a
parede pélvica e sem invadir os ureteres.
IIa Há comprometimento da vagina, mas não do paramério.
T2aN0M0
IIa1 Tumor igual ou menor que 4 cm na maior extensão e
T2a1N0M0 envolve menos que dois terços superiores da vagina.
IIa2 Tumor com mais de 4 cm na maior extensão e envolve
T2a2N0M0 menos que dois terços superiores da vagina.
IIb Há comprometimento do paramétrio.
T2bN0M0
III Tumor invade a vagina até o seu terço inferior ou invade os
T3 paramétrios até a parede pélvica. ****
IIIa Tumor invade a vagina em seu terço inferior, pode invadir
T3aN0M0 paramétrios, mas sem extensão á parede pélvica.
IIIb Tumor invade o paramétrio até a parede pélvica ou
T1/T2/T3aN1M0 hidronefrose ou rim não funcionante.
T3bqqN1M0
IV Tumor estende além da pelve verdadeira ou invade a
mucosa da bexiga e/ou do reto. *****
IVa Tumor invade a mucosa da bexiga e/ou do reto.
T4qqNM0
IVb Metástases à distância, além dos órgãos pélvicos.
qqTqqNM1

* A profundiade da invasão não deve ser maior do que 5 mm, medida a partir da base
do epitélio, superficial ou glandular, do qual se origina. A profundidade da invasão é

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

definida como a medida do tumor, desde a junção epitelial-estromal da papila dérmica


adjacente mais superficial até o ponto mais profundo da invasão. O envolvimento do
espaço vascular, venoso ou linfático, não altera a classificação.
** A presença de edema bolhoso não é suficiente para classificar o tumor como T4. A
lesão deve ser confirmada por biopsia.
*** A presença ou não de invasão do espaço linfovascular não altera o estadiamento.
**** São incluídos neste estágio todos os casos de hidronefrose ou de rins não
funcionantes, a menos que seja conhecido como resultado de outra causa.
***** A presença de edema bolhoso da mucosa da bexiga não permite incluir neste
estádio.

Tratamento
O tratamento da Neoplasia Intraepitelial Cervical – NIC – é exposto no Manual de
Patologia do Trato Genital Inferior.

1. Estádio Ia1 – Não havendo invasão do espaço linfovascular o tratamento preferencial


é a histerectomia simples, via abdominal ou via vaginal. Se houver interesse em
preservar a fertilidade o tratamento pode se limitar à conização, se as margens do
espécime retirado estiverem livres de lesão (B).

2. Estádio Ia2 e estádio Ia1 com invasão do espaço linfo-vascular – O tratamento


preferencial é a cirurgia radical que consiste na linfadenectomia pélvica, parametrectomia
e histerectomia total com retirada de manguito vaginal. No estádio Ia2 sem invasão do
espaço linfovascular tem havido a tendência de redução da radicalidade cirúrgica.

Se for desejada a conservação do potencial reprodutivo, pode ser indicada a


traquelectomia radical com linfadenectomia videolaparoscópica (B).

3. Estádio Ib1 e IIa1 – O tratamento poderá ser cirúrgico ou radioquimioterápico. A


morbidade pode ser elevada quando se associam os dois tipos de tratamento, devendo,
portanto, ser evitada a associação (A).

A cirurgia deve ser radical, podendo ser realizada por via abdominal (cirurgia de
Wertheim-Meigs) ou por via vaginal (cirurgia de Schauta-Amreich). Na utilização da
via vaginal a linfadenectomia poderá ser realizada por videolaparoscopia.

Os ovários são conservados em pacientes na menacma.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Ainda neste estádio, sendo desejada a preservação da fertilidade, pode ser indicada a
traquelectomia radical com linfadenectomia pélvica (B).

A pesquisa de linfonodo sentinela tem sido feita ainda em fase experimental, sem estar
integrada às normas assistenciais. 

A radioterapia externa mais braquiterapia, quando indicada, é associada à quimioterapia,


com melhora da sobrevida. Nessas indicações, a radioterapia parece especialmente
benéfica no adenocarcinoma e nos tumores adenoescamosos (A).

4. Estádio Ib2 e IIa2 – O tratamento preferencial é a radioquimioterapia concomitante


(A).

A cirurgia radical com linfadenectomia muito provavelmente necessitará da radioterapia


pós-operatória. Atualmente é uma opção terapêutica pouco usada atualmente(C).

A opção da quimioterapia neoadjuvante (três cursos) seguida de cirurgia radical e


posterior radioquimioterapia conta com adeptos (B).

5. Estádio IIb, III e IVa (câncer avançado) - O tratamento padrão é a radioterapia


externa com braquiterapia, associadas à quimioterapia (A).

No estádio IVa a exenteração pélvica pode ser indicada, principalmente na presença de


fístula vesical ou retal, desde que o tumor não atinja a parede pélvica (C). 

Prognóstico
O prognóstico do câncer de colo uterino tratado é  bom, especialmente nos estádios
muito iniciais.

A sobrevida de cinco anos, segundo o estadiamento FIGO é:

- Estádio Ia1 - 97,5%;


- Estádio Ia2 - 94,8%;
- Estádio Ib1 - 89,1%;
- Estádio Ib2 - 75,7%;
- Estádio IIa - 73,4%;
- Estádio IIb - 65,8%;

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

- Estádio IIIa - 39,7%;
- Estádio IIIb - 41,5%;
- Estádio IVa - 22,0% e
- Estádio IVb -   9,3%.

 
Recorrências
As recorrências locais, em casos tratados primariamente por cirurgia, têm indicação de
radioquimioterapia (B).

As exenterações pélvicas podem ser uma alternativa em presença de fístula ou em


pacientes tratadas primariamente com radioterapia exclusiva (dose tumor total),
associada ou não à quimioterapia (C).

A tendência e tratar as recorrências metastáticas com quimioterapia, sendo a Cisplatina


o agente mais efetivo (B).

Casos especiais
1. Câncer na gestação

O câncer de colo diagnosticado na gestação é tratado da mesma forma que fora da


gestação. No entanto, deve-se ter em conta que no início da gestação e antes da
viabilidade fetal, o tratamento, por interromper a gravidez, deve ser aprovado pela
paciente.

No Brasil, onde o aborto só é tolerado em condições especiais, o caso se enquadra


como alternativa para salvar a vida da mãe, e é legal.

Não havendo inconveniente para esperar a viabilidade fetal, atingida esta a paciente é
submetida à operação cesariana e, na sequência, a cirurgia ou radioterapia, dependendo
da indicação oncológica.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

2. Achado incidental de câncer em peça de histerectomia


simples por afecção benigna

A situação ocorre, embora seja condenável, às vezes por falha nos exames prévios, às
vezes por situação clínica que oculta o tumor e raramente por situações emergenciais.
Os exames disponíveis para avaliar lesões do colo uterino não deveriam deixar escapar
nenhum caso de câncer insuspeitado.

No caso de o tumor ser descoberto no exame histopatológico e for inicial, sem invasão
do espaço linfovascular, a paciente deve ser considerada como tratada e submetida a
revisões médicas periódicas.

Nos tumores mais avançados há a alternativa de radioterapia externa e braquiterapia,


com prévia transposição dos ovários por laparoscopia nas jovens, ou, ainda, a opção de
uma complexa parametrectomia, preferentemente por via vaginal, com linfadenectomia
videolaparoscópica.

O médico responsável por seus atos deve esclarecer toda situação clínica da paciente
antes de executar cirurgia sobre o útero. Não se explica e muito menos se justifica o
achado surpresa de câncer de colo ou de endométrio em peça de histerectomia indicada
por patologia benigna. Assim como não deve o médico não treinado para cirurgia do
câncer se apresentar para executá-la.

3. Câncer do colo restante (após histerectomia subtotal)

O câncer do colo restante pós histerectomia subtotal que, dizia o Professor João Gomes,
mais comumente é um câncer restante no colo, tem como tratamento preferencial a
traquelectomia radical com linfadenectomia videolaparoscópica.

A indicação de histerectomia subtotal precisa ser precedida de cuidadosa exploração do


colo uterino e após a cirurgia, em que foi preservado o colo do útero, a paciente deve
realizar revisões de rotina, com coleta de material para exame citopatológico do colo.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

4. Sarcomas de colo uterino e de vagina


A base terapêutica dos sarcomas é a cirurgia, com o máximo de margem de segurança,
o que é difícil nos tumores de vagina ou que a invadem, por sua intimidade com a
bexiga e o reto.
Esses tumores não respondem bem à radioterapia ou ao uso de drogas
quimioterápicas.

Seguimento

O controle pós-tratamento é feito por ginecologista com exame clínico ginecológico,


exame especular, coleta de material pra exame citopatológico, colposcopia e toque
vaginal e retal a cada três meses nos primeiros dois anos, passando a revisões semestrais
até completar cinco anos do tratamento.

A partir dos cinco anos as consultas de revisão, se tudo estiver bem, passam a anuais.

Os sinais de alerta sobre recidiva são o sangramento via vaginal, urinária ou retal,
a dor pélvica ou abdominal, o edema de membros inferiores, especialmente quando
unilateral, e a secreção vaginal anormal.

A avaliação de pesquisa metastática e exames de imagem são dispensáveis frente a


exame clínico e citológico negativos. 

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Algoritmo terapêutico do câncer do colo do útero.


Estádio: Quadro clínico: Tratamento:
Ia1 Invasão máxima de 3 mm Sem invasão do espaço linfovascular o
T1a1N0M0 em profundidade e 7 mm tratamento preferencial é a
de extensão. histerectomia simples, via abdominal ou
via vaginal.
Se houver interesse em preservar a
fertilidade o tratamento pode se limitar
à conização, se as margens do
espécime retirado estiverem livres de
lesão.
Ia1 Invasão máxima de 3 mm Tratamento preferencial é a cirurgia
T1a1N0M0 em profundidade e 7 mm radical.
Com invasão de extensão. Estádio Ia2 sem invasão do espaço
linfovascular linfovascular tem havido a tendência de
e redução da radicalidade cirúrgica.
Ia2 No desejo de preservação da fertilidade
T1a2N0M0 Invasão máxima de 5 mm pode ser indicada a traquelectomia
em profundidade e 7 mm radical com linfadenectomia
de extensão. videolaparoscópica.
Ib1 Tumor maior que o Tratamento pode ser cirúrgico ou
T1b1N0M0 estádio Ia até 4 cm na radioquimioterápico.
maior extensão. A morbidade pode ser elevada quando
e se associam os dois tipos de
tratamento. Evitar a associação.
IIa1 Tumor igual ou menor que Cirurgia: radical: Wertheim-Meigs ou
T2a1N0M0 4 cm na maior extensão e Schauta-Amreich mais linfadenectomia.
envolve menos que dois Conservar ovários na menacma.
terços superiores da No desejo de preservação da fertilidade
vagina. pode ser indicada a traquelectomia
radical com linfadenectomia pélvica.
Associação da QT com RT externa e
braquiterapia melhora a sobrevida.
A radioterapia, quando indicada, parece
especialmente benéfica no
adenocarcinoma e nos tumores
adenoescamosos.
Ib2 Tumor com mais de 4 cm Tratamento preferencial é a
T1b2N0M0 na maior extensão. radioquimioterapia concomitante.
e Cirurgia radical com linfadenectomia
provavelmente necessitará da
IIa2 Tumor com mais de 4 cm radioterapia pós-operatória. É pouco
T2a2N0M0 na maior extensão e usada atualmente.
envolve menos que dois Opção da QT neoadjuvante seguida de
terços superiores da cirurgia radical e posterior
vagina. radioquimioterapia conta com adeptos.
IIb Há comprometimento do O tratamento padrão é a radioterapia
T2bN0M0 paramétrio sem atingir a externa com braquiterapia, associadas
e parede pélvica. à quimioterapia.
IIIa Tumor invade a vagina No estádio IVa a exenteração pélvica
T3aN0M0 e até o seu terço inferior. pode ser indicada, principalmente na
IIIb Tumor invade os presença de fístula vesical ou retal,
T1/T2/T3aN1M0 paramétrios até a parede desde que o tumor não atinja a parede
T3bqqN1M0 e pélvica. pélvica.
IVa Tumor invade a mucosa
T4qqNM0 da bexiga e/ou do reto.
IVb Metástases à distância, Tratamento individualizado.
qqTqqNM1 além dos órgãos
pélvicos.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Referências Bibliográficas 
1 - Instituto Nacional do Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Estimativa 2010: Incidência de
Câncer no Brasil. Disponível online: www.inca.gov.br/estimativa/2010/index
2 - Pecorelli JL, Hacker NF, Ngan HYS (editors). Staging Classifications and Clinical Practice Guidelines
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3 - Silveira GPGS. Câncer de Colo Uterino e de Vagina. In: GPGS (editor): Ginecologia Baseada em
Evidências. 2ª edição. São Paulo, Editora Atheneu. 2008.
4 - Matsumoto K, Yoshikawa H, Yasugi T, ET al. Distinct lymphatic spread of endometrial carcinoma in
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5 - Pecorelli S, Zigliani L, Odicino F. Special Communication. Revised FIGO staging for carcinoma of the
cervix. Int J Gynecol Obstet. 2009; doi:10.1016/j.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

50
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

CÂNCER DO ENDOMÉTRIO

Introdução
O carcinoma endometrial compromete a cada ano duas mulheres em 100.000 abaixo
de 40 anos e 40 a 50 mulheres em 100.000 entre a sexta e oitava décadas da vida e
espera-se um aumento progressivo da sua incidência devido à obesidade e aumento da
longevidade principalmente na América do Norte e Europa Ocidental1.

No Brasil é a segunda neoplasia maligna pélvica mais frequente, com incidência de


5,7/100.000 mulheres e mortalidade estimada em 1,6/100.000 mulheres.

Tipos histológicos
O tipo histológico mais comum é o adenocarcinoma endometrióide, que corresponde
entre 75% a 80% dos casos, e tem como variante mais comum a diferenciação escamosa.
Esse tumor está relacionado ao hiperestrogenismo e a lesão precursora é a hiperplasia
atípica.

O adenocarcinoma serosopapilífero soma 10% dos casos e o de células claras 4%;


são menos comuns e assemelham aos do ovário e tuba uterina, podendo apresentar
disseminação peritoneal. Esses tumores estão associados à mutação genética p53,
ocorrem em mulheres mais velhas, frequentemente são diagnosticados em estádios
mais avançados e apresentam pior prognóstico.

Os demais tipos histológicos são ainda mais raros: mucinosos, escamosos e


indiferenciados.
Os adenocarcinomas são agrupados de acordo com o grau de diferenciação
histopatológica:

- G1 (bem diferenciado), apresentando 5% ou menos do padrão de crescimento não


escamoso;
- G2 (moderadamente diferenciado), apresentando 6% a 50% do padrão de crescimento
não escamoso; e,
- G3 (indiferenciado), apresentando mais de 50% do padrão de crescimento não
escamoso.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Quando a atipia nuclear estiver inapropriada para definir o grau arquitetural, o grau de
diferenciação é aumentado de G1 para G2 e de G2 para G3. O adenocarcinoma com
componente escamoso é graduado pelo componente glandular.

Fatores de risco
O fator de risco considerado pela maioria dos autores como mais importante é a
obesidade, mas constituem também fatores de risco o diabetes mellitus, todos estados
relacionados com ação estrogênica aumentada e/ou persistente por longo tempo como
menarca precoce, menopausa tardia, baixa taxa de natalidade ou nuliparidade, tumores
ovarianos produtores de hormônios, anovulação, uso de terapia estrogênica e, mais
recentemente uso de tamoxifeno.

Diagnóstico
O principal sintoma é o sangramento uterino anormal. Outros comemorativos
relacionados à doença são: sensação de peso em baixo ventre; dor pélvica; menorragia;
sangramento intermenstrual; e presença de piometra, hematometra e de células
glandulares atípicas no exame colpocitológico. Em fase mais tardia ocorre dor em baixo
ventre, secreção com odor fétido, alterações urinárias ou intestinais e emagrecimento.

As mulheres que apresentarem sangramento uterino na pós-menopausa, sangramento


uterino anormal na pré-menopausa ou com hematometra e piometra, principalmente
quando idosas, necessitam ser submetidas à avaliação da cavidade endometrial.

Essa avaliação pode ser realizada através de biópsia endometrial cega, ou com auxílio
da histeroscopia, ou pela obtenção de amostra do tecido endometrial pela curetagem
uterina.

A biópsia endometrial é um método de simples execução e deve ser valorizado


apenas quando o resultado histológico for positivo para malignidade. Resultados
falso-negativos não são raros. No caso do diagnóstico histológico da biópsia cega
ser hiperplasia atípica, é necessário avaliar toda a cavidade endometrial para afastar
carcinoma invasor.

A biópsia endometrial por aspiração (a mais usada é a Pipelle) tem sido muito utilizada

52
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

porque é ambulatorial e causa pouco desconforto para a paciente, mas tem limitações
devido à pequena área endometrial avaliada e a sensibilidade diagnóstica ser muito
variável.

A histeroscopia tem melhor desempenho que a curetagem no diagnóstico, pois possibilita


a visualização da cavidade uterina, possibilitando, por isso, menos resultados falso-
negativos.

A ultrassonografia transvaginal na pós-menopausa, levando-se em consideração um


ponto de corte acima de 5 mm de espessura endometrial, possui sensibilidade de 96%
na detecção de câncer endometrial2 (A). Se a espessura for menor que 4 mm., o valor
preditivo negativo (VPN) é 99,79% ou seja, raramente uma mulher com espessura
endometrial menor que 4 mm tem carcinoma do endométrio3,4 Mas, na presença de
espessamento endometrial, existem dificuldades na diferenciação entre patologia
benigna e maligna.

O exame citopatológico cervical não deve ser considerado como método diagnóstico
das neoplasias endometriais.

Não há indicação de rastreamento do carcinoma endometrial por qualquer método


em mulheres assintomáticas portadoras ou não de fatores de médio ou alto risco para
carcinoma endometrial. No entanto, mulheres na pós-menopausa com sobrepeso,
diabéticas, em uso de tamoxifeno ou hormônios esteroides sexuais, ou com qualquer
manifestação de hiperestrogenismo são de maior risco para câncer endometrial que
a população normal, na mesma faixa etária e a realização de ultrassonografia, de
preferência endovaginal, anualmente tem benefício na possibilidade de antecipação de
alterações do endométrio 5,6,7 (B).

Recomenda-se informar estas mulheres sobre os fatores de risco e os sintomas do


carcinoma endometrial tais como sangramento uterino anormal no menacme e qualquer
sangramento na pós-menopausa, e orientá-las a procurar orientação médica imediata 4
(B) 8 (A).

Uma única exceção para rastreamento é a realização de biópsia endometrial anual em


mulheres acima de 35 anos portadoras da mutação genética do câncer de cólon não
polipóide (HNPCC- Linch II), e/ou com antecedente familiar de portador da mutação
ou, na ausência de confirmação da mutação genética, tenham história familiar suspeita
dessa predisposição genética autossômica dominante9(D) 10(B).

53
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Hiperplasia endometrial
A hiperplasia e o adenocarcinoma do endométrio são duas doenças histologicamente
diferentes. Porém quando ocorre atipia celular a hiperplasia passa a ser considerada a
alteração precursora imediata do adenocarcinoma do endométrio e muitos autores a
consideram como uma verdadeira neoplasia intraepitelial.

A classificação das hiperplasias do endométrio mais aceita é: hiperplasia simples com


e sem atipia e hiperplasia complexa com e sem atipia.

O pico de incidência da hiperplasia sem atipia está em torno dos 50 anos e com atipia
aos 60 anos de idade.

O risco de evolução para o câncer é:

- Hiperplasia sem atipia – simples: 1%,


complexa: 3%;

- Hiperplasia com atipia – simples: 8%,


complexa: 29%.

Estadiamento
O início é pelo exame físico geral, palpação das cadeias linfáticas supraclaviculares e
inguinais, exame vaginal e toque retal, eventualmente efetuado sobanalgesia.

A coleta da colpocitologia cervical, exames hematológicos e raio-X do tórax


são rotineiros. Na suspeita de invasão vesical ou retal indica-se a cistoscopia e
retossigmoidoscopia com realização de biópsia9.

Se os paramétrios e a vagina não apresentarem invasão neoplásica, indica-se o


estadiamento cirúrgico de 1988, revisado em 2009, de acordo com a Federação
Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO). (quadro 1) 11. O estadiamento TNM
é a sétima edição da UICC, que não teve alterações. E, portanto não está adaptada à
alteração no estadiamento da FIGO.

Para mulheres a serem submetidas à radioterapia, como primeiro tratamento, pode-se

54
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

aplicar o estadiamento clínico da FIGO, de 1971, correlacionando-se com o atual.

A biópsia diagnóstica define o tipo e grau histológico do tumor (quadro 2), a


histerectomia total com anexectomia bilateral define a invasão miometrial, cervical
e anexial e o lavado peritoneal define a presença de células neoplásicas na cavidade
peritoneal.

Durante a cirurgia pode-se realizar o exame de congelação do útero e a biópsia do omento.


A avaliação dos linfonodos, para procura de metástase é feita pela linfadenectomia retro-
peritoneal pélvica e para-aórtica. A linfadenectomia retro-peritoneal pode aumentar a
morbidade perioperatória, pois muitas pacientes terão comorbidades clínicas como
obesidade, diabetes mellitus e outras. O treinamento da equipe cirúrgica e o bem senso
são necessários 12.

Quadro 1 – Estadiamento cirúrgico do carcinoma do endométrio.

Estádio: Achados patológicos pós-operatórios:


I* Tumor confinado ao corpo uterino.
Ia* Sem Invasão ou invasão miometrial menor de 50%.
Ib* Invasão miometrial igual ou maior de 50%.
II* Tumor invade o estroma do colo do útero, mas sem
estender além do útero.**
III* Tumor local e/ou regionalmente avançado.
IIIa* Tumor invadindo serosa e/ou anexos.***
IIIb* Tumor invadindo vagina e/ou paramétrios.***
IIIc* Metástases para linfonodos pélvicos e/ou para-aórticos.***
IIIc1* Linfonodos pélvicos positivos.
IIIc2* Linfonodos para-aórticos positivos com ou sem linfonodos
pélvicos positivos.
IV* Tumor invadindo bexiga e/ou mucosa retal e/ou
metástases à distância.
IVa* Tumor invadindo bexiga e/ou mucosa retal.
IVb* Metástases à distância, incluindo metástases intra-
abdominais e/ou linfonodos inguinais.

Estadiamento da FIGO – 1988, revisado 200911.


* G1, G2 e G3.
** O envolvimento glandular endocervical único deve ser considerado como estádio I
e não mais como estádio II.
***
A citologia positiva deve ser relatada separadamente sem mudar o estadiamento.

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Quadro 2: Exames a serem realizados para estadiamento do carcinoma


endometrial.

Exame clínico: Exame físico geral:


Exame das drenagens linfáticas com palpação
dos linfonodos supraclaviculares e inguinais.
Exame ginecológico.
Exame reto-vaginal sem ou com analgesia.
Exames radiológicos RX do tórax.
Exames específicos Biópsia endometrial,
Histeroscopia com biópsia ou
Curetagem uterina,
Cistoscopia,*
Retossigmoidoscopia.*
Outros exames que não são Ultrassonografia,
considerados para Tomografia computadorizada,
estadiamento, mas podem Ressonância magnética,
ser realizados para Tomografia com emissão de pósitrons,
planejamento terapêutico Cintilografia óssea,
Laparoscopia,
Dosagem sérica do CA-125.

* exames a serem solicitados de acordo com sintomas e sinais clínicos.

Não há diferenças significativas comparando-se a acurácia diagnóstica da


ultrassonografia (USG), tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética
(RM) no estadiamento do carcinoma endometrial. O exame de RM com contraste pode
demonstrar invasão miometrial e também doença extrauterina. A RM e a tomografia
com emissão de positrons (PET/CT) fornecem resultados semelhantes no diagnóstico da
lesão primária, apresentando sensibilidade (91,5% vs. 89,4%), especificidade (33,3% vs.
50,5%), acurácia (84.9% vs. 84.9%), valor preditivo positivo - VPP (91.5% vs. 93.3%)
e valor preditivo negativo - VPN (33.3% vs. 37.5%) similares. O mesmo pode ser dito
quanto às metástases linfonodais, embora neste caso o PET/CT apresente alto VPN,
podendo, por isso, ser útil na avaliação de pacientes que apresentem contraindicações
para cirurgia. Mas, o exame não pode substituir o estadiamento cirúrgico. Na utilização
do exame lembrar que, enquanto o PET demonstra apenas a existência da lesão, o PET/
CT acrescenta a sua localização anatômica13.

Esses exames não devem ser utilizados na rotina do estadiamento e nem do seguimento
considerando-se a necessidade de estudos adicionais do método e ao seu alto custo.

56
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Fatores prognósticos

Os fatores de pior prognóstico são os tipos histológicos serosopapilíferos, células claras


e os tumores G3 (pouco diferenciados), que apresentam invasão miometrial profunda,
invasão cervical, invasão do espaço vascular, citologia peritoneal positiva e invasão
anexial.

Os tumores não endometrióides são responsáveis por mais de 50% das mortes e
recorrências entre os carcinomas endometriais 9, 11,14.

Quanto às metástases linfonodais, no estádio Ia G1 há menos de 5% de metástases


e no estádio Ib G2 e G3 há entre 5% e 9% de linfonodos pélvicos positivos e 4% de
para-aórticos. Porém quando se trata de tumor G3 com invasão miometrial profunda e/
ou doença extrauterina ocorre entre 20% até 60% de metástases linfonodais pélvicas e
10% a 30% de para-aórticas.

Desde 1988, quando a FIGO introduziu a linfadenectomia, a finalidade era determinar


o prognóstico da paciente. Mas, também desde essa época passaram a existir
questionamentos quanto à extensão da linfadenectomia, sua indicação e o risco-
benefício na sua realização. Apesar disso, nos Estados Unidos da América do Norte e
na Austrália a linfadenectomia vem sendo realizada em larga escala.

O estudo randomizado (ASTEC) do UK Medical Research Council mostrou não haver


diferença significativa na sobrevida livre de doença e na sobrevida total ao comparar
pacientes no estádio I submetidas à linfadenectomia pélvica ou apenas histerectomia
total com salpingo-ooforectomia bilateral sem linfadenectomia. As submetidas à
linfadenectomia apresentaram maior taxa de complicações pós-operatórias, porém se
detectou maior incidência de doença avançada, com estádio IIIc 15 (A). A invasão do
espaço vascular e o comprometimento dos linfonodos pélvicos são fatores de risco
independentes para metástase em linfonodos para-aórticos, ocorrendo entre 30% e
50% de positividade dos linfonodos para-aórticos nessas condições. A positividade não
escalonada é pouco frequente 15 (A).

O United States National Cancer Institute’s database (Surveillance, Epidemiology, and


End Results program) avaliou 39.306 pacientes em estudo retrospectivo comparando
12.333 pacientes submetidas à linfadenectomia e 27.063 sem linfadenectomia e
observou aumento da sobrevida nas mulheres com carcinomas endometriais de médio
e alto risco submetidas ao procedimento15 (A) 16 (A).

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Desde que o estadiamento da FIGO de 1988, atualizado em 2009, no qual a metástase


linfonodal foi categorizada em estádio IIIc, subdividido em IIIc1 para linfonodos
pélvicos e IIIc2 para linfonodos para-aórticos, sugere-se realizar a linfadenectomia
pélvica nas pacientes em estádios iniciais e a para-aórtica nas portadoras de tumores de
alto risco de metástases linfonodais, especialmente na presença de linfonodos pélvicos
positivos, desde que apresentem condições clínicas de operabilidade.

Tratamento
1. Hiperplasias sem atipias – O tratamento da hiperplasia do endométrio simples ou
complexa sem atipia é com progesterona ou progestágenos sintéticos, pois a resposta
é muito boa.

a) Na menacme: acetato de medroxiprogesterona – 10 mg/dia a partir do 15º


dia do ciclo por três ciclos; se persistir a alteração menstrual, aumentar a dose para 20
mg/dia; ou acetato de megestrol – 20 a 40 mg/dia; ou acetato de noretindrona – 10 mg/
dia/14 dias/mês durante seis meses ou administração de forma contínua; ou acetato de
ciproterona – 50 a 100 mg/dia.

b) Na perimenopausa: acetato de medroxiprogesterona – 20 mg/dia a partir do


15º dia do ciclo por três ciclos; avaliar o endométrio; se persistir ou houver recorrência
da hiperplasia, realizar histerectomia.

c) Na pós-menopausa: acetato de medroxiprogesterona ou histerectomia.

2. Hiperplasias com atipias – O tratamento da hiperplasia simples ou complexa com


atipia:

a) Em pacientes jovens podem-se fazer altas doses de progesterona e a avaliação


endometrial após três meses do tratamento inicial; se o endométrio se encontrar com
características benignas, convém induzir a ovulação e tentar a gravidez.

b) Nas pacientes na peri e pós-menopausa o tratamento mais apropriado é a


histerectomia total abdominal ou vaginal, exceto nas pacientes sem condições clínicas
para cirurgia.

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3. Outras condutas terapêuticas:

a) DIU com levonorgestrel ou endoceptivo – libera 20 mcg/24 horas e o


produto disponível tem duração prevista para cinco anos; pode ser usado na ausência
de atipia;

b) Endometrectomia histeroscópica – está indicada para a paciente com


sangramento uterino anormal resistente ao tratamento clínico, que não deseja fazer
histerectomia e na ausência de atipia endometrial.

O tratamento cirúrgico convencional do câncer de endométrio é a histerectomia


extrafascial com anexectomia bilateral associada ou não à linfadenectomia pélvica.

A sequência cirúrgica é: incisão longitudinal extensa ou transversa ampla tipo Maylard,


colheita de lavado para citologia oncótica peritoneal (CO), inventário da cavidade
abdominal com palpação dos linfonodos pélvicos e para-aórticos, histerectomia total
(HT), salpingo-oforectomia bilateral (SOB), e em alguns casos, biópsia do omento.

A biópsia seletiva dos linfonodos é controversa e a linfadenectomia completa está


indicada em mulheres abaixo dos 70 anos de idade, se não houver contraindicação
clínica ou técnica.

A presença de metástases contraindica cirurgias extensas e também a via vaginal e/


ou laparoscópica para evitar, neste caso, o risco de implantes nos portais. No caso de
haver linfonodos aumentados suspeitos, o exame de congelação positivo implica na
não realização de linfadenectomia.

Estudos randomizados que compararam a laparoscopia com a laparotomia em pacientes


com diferentes estádios da doença e tempo de seguimento variável demonstraram que
a segurança e eficácia dos métodos foram semelhantes e não apresentaram diferenças
significativas quanto à sobrevida livre de doença. Entretanto, apesar de não se observar
diferenças quanto às recidivas pélvicas nos dois grupos, alguns relataram mais recidivas
vaginais e na entrada dos trocateres.

As vantagens relatadas para a abordagem laparoscópica foram: menor incisão, melhor


visibilidade do campo operatório, menor perda sanguínea, menos dor pós-operatória,
maior rapidez na recuperação pós-operatória, menor tempo de internação e retorno
mais rápido às atividades habituais, sem as limitações cirúrgicas existentes para
pacientes obesos e idosos. O Gynecologic Oncology Group (GOG) está avaliando a

59
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

qualidade de vida, a sobrevida livre de doença e a sobrevida total no seguimento de


longo prazo de 2.616 pacientes, mas os resultados deste estudo randomizado ainda não
estão disponíveis 17, 18,19.

Até o momento a abordagem laparoscópica não é a cirurgia padronizada para o


carcinoma endometrial, sendo aconselhável aguardar os resultados de sobrevida dos
estudos comparativos em andamento. Na opção pela cirurgia laparoscópica ela deve
estar vinculada a protocolo de pesquisa e ser realizada por profissionais treinados em
cirurgias de alta complexidade.

A radioterapia (RT) adjuvante, no estádio I, diminui a recidiva locorregional e na


cúpula vaginal, que é a mais frequente, mas não tem impacto na sobrevida global 20(A).
Em estudo randomizado que estudou mulheres com ou sem braquiterapia em cúpula
vaginal nos estádios Ia ou Ib, G1 ou G2 a RT diminuiu a incidência das recidivas locais
e regionais, mas causou efeitos indesejáveis em 1% até 10% das pacientes, sendo 4%
complicações intestinais. Essas complicações foram maiores nas pacientes submetidas
à ressecção de linfonodos 21 (A) 22 (B).

Como aumenta a morbidade, a RT não deve ser indicada para pacientes no estádio I G1,
com invasão inicial do miométrio e menores de 60 anos de idade.

1. Estádio I e II oculto.

a) Estádio Ia G1 – Apenas cirurgia. Não há indicação de radioterapia adjuvante.

b) Estádio Ia G2 – Cirurgia e braquiterapia de alta taxa de dose na cúpula vaginal.

c) Estádios IaG3, IbG1, G2, G3, II oculto e tipos serosopapilífero e células claras –
Cirurgia e radioterapia: teleterapia na pelve e braquiterapia de cúpula vaginal.

2. Estádio II

a) Estádio II G1, G2, G3 – Cirurgia e radioterapia: teleterapia na pelve e braquiterapia


de alta taxa de dose na cúpula vaginal.

- Na cirurgia deverá ser realizada a biópsia do omento.


- A realização da ressonância magnética no pré-operatório pode auxiliar na avaliação
de ressecabilidade e para afastar invasão vesical.
- A radioterapia neoadjuvante intracavitária mais radioterapia externa poderá ser

60
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

indicada nos casos de invasão cervical extensa, seguida de cirurgia a ser realizada entre
quatro e seis semanas após o término da radioterapia. A cirurgia, neste caso será a
HT+SOB, CO e biópsias de linfonodos para-aórticos e do omento.

3. Estádio III

Estádio III – Cirurgia mais radioterapia ou radioterapia exclusiva,


Quimioterapia (QT) ou hormonioterapia (HT).

- A cirurgia será opção se todo o tumor for ressecável. No momento cirúrgico deve-se
biopsiar linfonodos aórticos e omento. Após a cirurgia realizar RT adjuvante.

a) Estádio IIIa – Extensão à serosa e/ou anexos: teleterapia na pelve e braquiterapia


na cúpula vaginal.

b) Estádio IIIb – Tumor invadindo vagina e/ou paramétrios: teleterapia na pelve e


braquiterapia em toda extensão da vagina.

c) Estádio IIIc – Metástases para linfonodos pélvicos e/ou para-aórticos: teleterapia na


pelve e região para-aórtica e braquiterapia na cúpula vaginal.

- RT exclusiva é opção se a doença for considerada irressecável: teleterapia na pelve e


braquiterapia com complementação se os paramétrios estiverem comprometidos.

- Quimioterapia ou hormonioterapia:
Quimioterapia – Doxorubicina (60mg/m2);
Doxorubicina + Cisplatina (50mg/m2);
Doxorubicina + Cisplatina (50mg/m2) + Paclitaxel (170mg/m2).
Hormonioterapia – Acetato de medroxiprogesterona;
Acetato de megestrol;
Tamoxifeno.
A QT e a HT são os principais tratamentos das metástases extrapélvicas.
O papel adjuvante da quimioterapia não está estabelecido.

- Tumores G1 e G2 com receptores hormonais positivos: HT com progestágenos


(acetato de medroxiprogesterona: 50 a 100mg/dia; ou acetato de megestrol: 160mg/
dia).

61
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Estudos randomizados não demonstraram benefícios no uso da hormonioterapia


adjuvante na sobrevida total(A).

- Tumores G3 ou tumores serosopapilífero e células claras estudos randomizados do


GOG demonstraram a atividade antiblástica da doxorubicina.

A cisplatina acrescentada à doxorubicina aumenta a taxa de resposta e o tempo livre de


doença, mas não a sobrevida total23(A).

Estudo randomizado comparando doxorubicina mais cisplatina com RT do abdômen


total demonstrou aumento da sobrevida total em pacientes no estádio III e IV com doença
residual pós-operatória menor que 2 cm e ausência de envolvimento de parênquima
de outros órgãos. A sobrevida total de cinco anos foi de 55% para a associação de
quimioterápicos versus 42% para radioterapia somente24(A).

A associação da doxorubicina, paclitaxel e cisplatina, mais estimulador de medula,


promoveram 57% de resposta quando comparado com 34% de resposta com cisplatina
e doxorubicina. O intervalo livre de doença foi de 8,3 meses versus 5,3 meses e a
sobrevida total somou 15,3 meses versus 12,3 meses. Entretanto ocorreram 39% de
neuropatia severa ou moderada25 (A).

4. Estádio IV e doença recorrente ou refratária.

a) Estágio IVa – Tumor invadindo bexiga e/ou mucosa retal: radioterapia exclusiva ou
quimioterapia ou hormonioterapia.

b) Estádio IVb - Metástases à distância incluindo metástases intra-abdominais e/ou


linfonodos inguinais: radioterapia paliativa ou quimioterapia ou hormonioterapia.

- O tratamento será individualizado, dependendo da performance da paciente, local e


volume da doença metastática e sintomas apresentados.

- A RT pode ser utilizada com objetivo sintomático para efeitos analgésico,


descompressivo e/ou hemostático.

- Nas metástases extrapelvicas: QT (ver Estádio III) ou hormonioterapia. Em


pacientes com tumores G1 e G2, os progestágenos demonstram resposta em 25% a
30% e aumento significativo na sobrevida, principalmente quando havia metástases
pulmonares. Tamoxifeno (20mg/dia) poderá ser indicado na falta de resposta com

62
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

progestágenos.

- A RT paliativa será indicada nas recidivas pélvica, linfonodal, cerebral ou óssea, e


pode ser curativa nas recidivas vaginais isoladas.

Condições especiais:
1. Diagnóstico após histerectomia – É mais frequente após cirurgias vaginais por
prolapso e o maior problema costuma ser a não remoção dos anexos. A conduta nesses
casos é reoperar para estadiamento cirúrgico e remoção dos anexos. O tratamento
adjuvante poderá ser indicado de acordo com o protocolo exposto.

2. Pacientes inoperáveis – As causas mais comuns da contraindicação cirúrgica é


a obesidade mórbida e a doença cardiopulmonar severa. A braquiterapia pode obter
sucesso no controle local e também poderá ser combinanada com a teleterapia quando
houver fatores de pior prognóstico ou recidiva. As pacientes portadoras de tumores G1
e G2, com receptores hormonais positivos e com contraindicação para a radioterapia,
podem ser candidatas ao uso de progestágenos em altas doses.

3. Mulheres jovens – Esses tumores são incomuns nessa faixa etária. Quando ocorrem
estão associados ao hiperestrogenismo, obesidade, síndrome dos ovários policísticos,
tumores produtores de estrógenos ou mutações genéticas. Como existe dificuldade
diagnóstica diferencial entre a hiperplasia atípica e o carcinoma endometrióide bem
diferenciado, o diagnóstico histológico deve ser muito cuidadoso.

No caso de pacientes nulíparas com menos de 35 anos de idade e desejosas de preservar


a fertilidade, a opção pelo tratamento não convencional que inclui a histerectomia total
e salpingo-ooforectomia bilateral, impõe-se discussão interdisciplinar com avaliação
psicológica, sendo indispensável o documento de consentimento pós-informado. O
tratamento não cirúrgico utilizando altas doses de progestágenos e gravidez posterior
tem sido descrito na literatura9(D).

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Quadro 3: Algoritmo terapêutico do carcinoma endometrial.


Estádio Quadro clinico Tratamento
Ia G1 Tumor limitado ao HT + SOB + CO, biópsia de
T1N0M0 endométrio e/ou invasão linfonodos aumentados de
miometrial <50%, bem volume.
diferenciado.
Ia G2 Invasão ”50% miométrio HT + SOB + CO, linfadenctomia,
Ia G1, G2 bem ou moderamente braquiterapia de cúpula vaginal.
diferenciado.
Ia G3 Tumor pouco HT + SOB + CO, linfadenectomia
Ib G1, G2, G3 diferenciado restrito ao pélvica e para-aórtica ou biópsia
corpo uterino, invasão dos linfonodos aumentados de
>50% miométrio sem volume e do epiplo, RT (tele +
invadir a serosa. braquiterapia ou apenas
braquiterapia).
I a, Ib Tumor serosopapilífero e HT + SOB + CO, linfadenectomia
Tumores não- células claras restritas ao pélvica e para-aórtica ou biópsia
endometrióides corpo uterino, sem invadir dos linfonodos aumentados de
a serosa. volume e do epiplo, RT (tele +
braquiterapia), QT.
II Tumor invade o colo sem HT + SOB + CO, linfadenectomia
doença extrauterina: pélvica e para-aórtica ou biópsia
envolve glândulas dos linfonodos aumentados de
endocervicais. volume e do epiplo, RT (tele +
braquiterapia).
III Tumor invade o colo sem HT ou Histerectomia radical +
doença extrauterina: SOB + CO, linfadenectomia
envolve estroma cervical. pélvica e para-aórtica ou biópsia
dos linfonodos aumentados e
epiplo ou HT + SOB + CO,
biópsia de linfonodos para-
aórticos, dos linfonodos
aumentados de volume, e do
epiplo.
RT (Tele + braqui).
Se RT pré-operatória: RT (tele +
braquiterapia) + HT + SOB + CO,
linfadenectomia ou biópsia de
infonodos para-aórticos
aumentados de volume e do
epiplo.
IIIa Envolvimento da serosa HT + SOB + CO, linfadenectomia,
do útero, anexos ou CO biópsia de linfonodos para-
positiva. aórticos aumentados de volume e
do epiplo.
RT (tele + braquiterapia), QT ou
HT.
IIIb Envolvimento da vagina. RT (tele + braquiterapia de toda
vagina), QT ou HT.
IIIc1 e IIIc2 Metástases para Se tumor ressecável: cirurgia e
linfonodos pélvicos e/ou RT.
para-aórticos e/ou Se tumor irresecável: RT
paramétrios. exclusiva, QT ou HT.
IVa, IVb Metástases para reto, RT, QT ou HT paliativas.
vagina ou à distância.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

HT: histerectomia total; SOB: salpingo-oforectomia bilateral; CO: citologia oncológica


do lavado peritoneal.
Braquiterapia de dose na cúpula vaginal: 5 frações de 700 cGy.
Teleterapia (tele): 4.500 cGy na pelve.
RT pré-operatória – braquiterapia intra-cavitária: 2X750 cGy e teleterapia: 4.500 cGy.
Braquiterapia em toda extensão da vagina: 4 X 500 cGy.
Estádio IIIc – Teleterapia: 4.500 cGy na pelve, 4.500 cGy/180 cGy para-aórtico+
braquiterapia: 4X400 cGy.
RT exclusiva: Teleterapia: 4.500 cGy na pelve, braquiterapia: 4X700 cGy e
complementação se paramétrios estiveram comprometidos: 1.440/180cGy.
Estádio IVa – Tele exclusiva: 5.040 cGy na pelve e “boost” 1.980 cGy/180 cGy.

Seguimento
Na literatura não existem evidências de que o seguimento rotineiro de pacientes
assintomáticas com exames de imagem é melhor do que solicitá-los apenas na paciente
sintomática com orientação pelo sintoma.

As pacientes deverão fazer:

1. Exame clínico ginecológico e toque retal de quatro em quatro meses durante dois
anos e semestralmente até completar cinco anos;

2. Raio-X de tórax e US abdominal e vaginal anual durante três anos;

3. Mamografia (MMG) e colpocitologia oncótica anual.

Após o seguimento diferenciado exposto, todas as pacientes deverão continuar a


realizar o exame clínico ginecológico anualmente, colheita de CO e MMG. Outros
exames de imagem serão solicitados de acordo com sintomas e/ou quando o exame
físico estiver alterado.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

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SARCOMA DO CORPO DO ÚTERO

Introdução
Os sarcomas do corpo do útero são formas raras de neoplasia, compreendendo cerca
de 4% de todas as neoplasias uterinas e menos de 1% de todas as neoplasias malignas
ginecológicas. A taxa de incidência é de 1,7/100 mil mulheres nos Estados Unidos a
cada ano. A doença afeta principalmente mulheres dos 40 aos 60 anos de idade1.

Os sarcomas apresentam características comuns como a agressividade, altas taxas de


recidiva local, metástases à distância e prognóstico desfavoráve.

A sobrevida total das pacientes em dois anos é menor que 50%, mesmo quando
diagnosticado em estádios iniciais. A raridade destes tumores, associada a sua
diversidade histológica, dificulta o seu manejo e a definição do melhor tratamento2.

Fatores de risco
Os fatores de risco reconhecidos para os sarcomas são semelhantes aos dos
adenocarcinomas: obesidade, idade e nuliparidade3. Outro fator documentado em
10% a 25% dos sarcomas uterinos é o antecedente de radioterapia pélvica, geralmente
realizada entre cinco a 25 anos antes do diagnóstico da doença4.

Mais recentemente, tem sido descrito risco aumentado da neoplasia relacionado ao


uso de tamoxifeno na pós-menopausa, com incidência de 17 para 100.000 mulheres/
ano3. Esses casos estão associados ao uso prolongado da medicação (maior que cinco
anos), sendo que na maioria das vezes o diagnóstico é feito em estágios mais avançados
apresentando consequentemente pior prognóstico 5.

Diagnóstico
Frequentemente os sarcomas uterinos são achados de histerectomia, geralmente
realizada por outros motivos, sem suspeita da existência da neoplasia previamente a
cirurgia. Entretanto, os sarcomas podem manifestar com sintomas inespecíficos, como

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sangramento intermitente, sangramentos anormais na pré ou pós-menopausa e dor


pélvica.

O intervalo entre a instalação dos sintomas e o diagnóstico da doença em estágios


iniciais varia de dois a cinco meses.

A apresentação clínica dos sarcomas do estroma endometrial pode ser bizarra e variável
como pólipos intracavitários, com ou sem invasão miometrial, presença de necrose e
formação de áreas císticas 6 (D).

O diagnóstico é histológico, na peça de histerectomia ou através de procedimentos


diagnósticos com biópsia endometrial. Essa biópsia pode ser realizada com Pipelle®,
pela retirada de lesão poliposa que exterioriza pelo canal cervical, curetagem uterina ou
biópsia dirigida através da histeroscopia.

Na maioria das vezes esses procedimentos são realizados após exame de ultrassonografia
pélvica e excepcionalmente após histerossonografia.

Tipos histológicos

1. Carcinossarcoma ou tumor mulleriano misto maligno (TMMM) homólogo ou


heterólogo – 50% dos casos;

2. Leiomiossarcoma (LMS) – 30% dos casos;

3. Sarcomas do estroma endometrial (SEE) – 15% dos casos:

- Sarcoma do estroma endometrial de baixo grau,


- Sarcoma endometrial de alto grau;

4. Adenossarcoma:

- Com elementos heterólogos,


- Com supercrescimento sarcomatoso;

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5. Sarcomas uterinos raros:

Rabdomiossarcoma, sarcoma alveolar de partes moles, angiossarcoma, lipossarcoma,


condrossarcoma, osteossarcoma.

Os carcinossarcomas são os tumores mais frequentes do grupo mesenquimal de


tumores malignos do corpo do útero, ocorrem principalmente na pós-menopausa e têm
fatores de risco similares aos do adenocarcinoma do endométrio. Na sua constituição
há elementos epiteliais e mesenquimatosos malignos. Macroscopicamente é observada
massa polipóide que preenche a cavidade endometrial, podendo às vezes ultrapassar o
orifício externo do colo.

O termo homólogo refere à presença de tecidos que existem normalmente no útero


(fibrossarcoma, leiomiosssarcoma, sarcoma do estroma endometrial).

Quando o tipo histológico é de tecidos não próprios do útero (rabdomiossarcoma,


lipossarcoma, condrossarcoma, osteosssarcoma) o tumor é referido como heterólogo e
tem sido correlacionado à maior agressividade.

Frequentemente os carcinossarcomas apresentam metástases por via linfática, aspecto


mais comum nos carcinomas do que nos sarcomas7. Para alguns autores os TMMM
deveriam ser classificados como carcinomas com metaplasia sarcomatosa, também
chamados de carcinomas sarcomatóides.

Esse conceito sobre a via de patogênese é importante, pois pode ter repercussões
no tratamento, sendo sugerido tratá-los como carcinomas endometriais, e não como
sarcomas 5 (A).

O leiomiossarcoma ocupa o segundo lugar em frequência e tem taxa de incidência


maior na faixa etária da 6ª década.

Sua aparência geralmente é de tumor grande e único com extensas áreas de necrose.
O mais aceito é que, na grande maioria dos casos, ele surja como leiomiossarcoma,
embora existam raros relatos de evolução a partir do leiomioma7.

Os critérios histológicos para diagnóstico incluem extensa necrose, atipia celular e alto
índice mitótico. É importante reconhecer as múltiplas variantes dos leiomiomas e os
tumores de músculo liso de potencial maligno incerto, que podem ser confundidos com
leiomiossarcomas e causar problemas no diagnóstico diferencial. São reconhecidos

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histologicamente três tipos de leiomiossarcoma: usual, epitelióide e mixóide.

Os sarcomas do estroma endometrial são neoplasias pouco comuns, subdivididas em


duas categorias: a) de baixo grau e b) indiferenciado (ou de alto grau). A maioria dos
casos é de sarcoma do estroma endometrial de baixo grau e ocorre principalmente na
5ª década da vida em pacientes na pré-menopausa. Seu aspecto é tipicamente de lesões
polipóides ou nódulos no miométrio que podem ser confundidos clinicamente com
leiomioma.

O diagnóstico de sarcoma do estroma endometrial só pode ser feito quando a interface


tumor/miométrio é possível de ser avaliado histologicamente, evidenciando seu caráter
infiltrativo, o que muitas vezes é impossível em material de curetagem; o sarcoma do
estroma endometrial de baixo grau é constituído por células pequenas, monótonas, que
se assemelham às do estroma do endométrio da fase proliferativa, com padrão vascular
característico.

A invasão vascular e o padrão de infiltração de aspecto vermiforme são proeminentes


neste tumor. O número de mitoses é geralmente baixo, porém podem ocorrer índices
maiores (10 mitoses/ 10 campos de grande aumento) sem que isso altere o diagnóstico
de sarcoma do estroma endometrial de baixo grau. Quando a atipia celular é acentuada
e o índice mitótico é alto, o diagnóstico muda para sarcoma endometrial indiferenciado
ou de alto grau, tipo histológico muito menos frequente, com pior prognóstico, que
deve ser diferenciado de outras formas de neoplasia como carcinoma indiferenciado,
TMMM ou outros sarcomas 7.

Os adenossarcomas são neoplasias raras, têm baixo potencial maligno e 70% deles
ocorrem na pós-menopausa. Seu aspecto é polipóide com pequenos cistos no seu interior
e a maioria dos casos se apresenta no estádio I ao diagnóstico. Elementos heterólogos
são encontrados em 20% dos casos no componente sarcomatoso (rabdomioblastos,
cartilagem, etc).

Outros tipos de sarcomas descritos são formas raras e descritos como casos isolados.
Em pacientes jovens o rabdomiossarcoma embrionário é o tipo mais comum, podendo
se apresentar como lesão polipóide. Os demais tipos já relatados, também incomuns,
como angiossarcoma, lipossarcoma, variantes do rabdomiossarcoma, sarcoma alveolar
de partes moles, osteossarcoma e outros tipos geralmente ocorrem em pacientes idosas,
o comportamento tumoral é agressivo e devem ser diferenciados principalmente dos
TMMM com componentes heterólogos 7.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Estadiamento
Até o ano de 2009 o estadiamento dos sarcomas uterinos seguia a mesma classificação
utilizada para os adenocarcinomas do endométrio.

Nesse ano a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) estabeleceu


um novo sistema estadiamento para os sarcomas uterinos 8. Em decorrência dos estudos
mais recentes que determinaram, ao contrário do que vinha sendo realizado com um
estadiamento único para todos os tipos histológicos de sarcoma, a individualização
de cada tipo histológico como a forma mais correta para estadiamento 9 (B) 10 (B), a
FIGO desenvolveu um sistema de estadiamento para o leiomissarcoma (LMS) e para
o sarcoma do estroma endometrial (SEE), permanecendo o carcinossarcoma ainda
estadiado de acordo com o sistema da FIGO para o adenocarcinoma endometrial
(Tabela 1) 8.

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Tabela 1 – Estadiamento da FIGO 2009 e UICC para Sarcomas Uterinos.

Estádio Definição
Leiomiossarcoma e Sarcoma do estroma endometrial
I Tumor limitado ao útero.
Ia <5cm.
Ib >5cm.
II Tumor estende à pelve.
IIa Envolvimento de anexos.
IIb Tumor e estende para outros tecidos pélvicos.
III Tumor invade tecido abdominal (não faz apenas
protusão ao abdômen).
IIIa Sítio único.
IIIb Mais de um sítio.
IIIc Metástases para linfonodos pélvicos, para-aórticos ou
ambos.
IV
IVa Tumor invade bexiga, reto ou ambos.
IVb Metástases à distância.
Adenossarcoma
I Tumor limitado ao útero.
Ia Tumor limitado ao endométrio/endocérvice sem invasão
miometrial.
Ib Invasão de metade da espessura do miométrio ou
Ic menos.
Invasão de mais da metade da espessura do miométrio.
II Tumor estende à pelve.
IIa Envolvimento de anexos.
IIb Tumor se estende para tecidos pélvicos.
III Tumor invade tecido abdominal (não faz apenas
protusão ao abdômen).
IIIa Sítio único.
IIIb Mais de um sítio.
IIIc Metástases para linfonodos pélvicos, para-aórticos ou
ambos.
IV
IVa Tumor invade bexiga, reto ou ambos.
IVb Metástases à distância.
Carcinossarcomas
Estadiamento como o do adenocarcinoma de endométrio.

Uma vez definido o estádio clinicopatológico ele será definitivo e não deverá ser
modificado, mesmo se houver recidiva da doença ou surgimento de metástases.

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No caso de contraindicação clínica para realizar o estadiamento cirúrgico ou suspeita


de doença irressecável, pode-se lançar mão do estadiamento clínico. Para o tal deve
ser realizado o exame clínico com palpação sistemática das cadeias linfonodais
superficiais inguinais e supraclaviculares, exame ginecológico vaginal e toque retal. A
complementação será pela radiografia de tórax e ultrassonografia abdominal e vaginal.
Na presença de sintomas, podem ser solicitados enema baritado, urografia excretora
etc.

Outros exames podem ser realizados tais como biópsias na vagina e no colo do útero
quando há lesões suspeitas.

Na suspeita de doença avançada e/ou na presença de sintomas que sugerem a invasão


vesical ou retal, indica-se a cistoscopia e retossigmoidoscopia com biópsia.

A tomografia computadorizada e a ressonância magnética não fazem parte do


estadiamento, porém podem ser realizadas a critério clínico para um planejamento
cirúrgico mais adequado.

Tratamento
O tratamento dos sarcomas uterinos primários é cirúrgico, uma vez que apenas a excisão
cirúrgica completa garante a possibilidade curativa. A radioterapia, hormonioterapia e
quimioterapia, ou qualquer associação delas ainda são controversos.

A cirurgia recomendada e mais aceita é a histerectomia total com salpingo-ooforectomia


bilateral (SOB). Apesar de a histerectomia radical apresentar relatos de efetividade
maior, a histerectomia simples é suficiente na maioria das pacientes11(D) 12(D).

O papel da SOB, difere entre os tipos histológicos do sarcoma. Para o tratamento do


carcinossarcoma há recomendação para sua realização.

Nas pacientes pré-menopáusicas com leiomiossarcoma em estádio inicial e sem


envolvimento macroscópico dos ovários, a SOB pode ser omitida, segundo alguns
autores, que constataram que a preservação dos ovários não altera a sobrevida dessas
pacientes13 (A) 14 (A).

Em pacientes com sarcoma do estroma endometrial a SOB é mandatória, pois o


estrogênio pode atuar como agente trófico para o tumor, muito embora haja alguns

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

estudos que demonstraram que a preservação ovariana não altera a evolução de


pacientes no estádio inicial de da doença15(A) 16(B) 17(B).

A realização da linfadenectomia pélvica, para-aórticas ou ambas durante a cirurgia do


sarcoma também é controversa. A linfadenectomia é recomendada em pacientes com
carcinossarcoma, pois a incidência de metástases linfonodais tem sido relatada entre
20% a 38%. Entretanto, o papel da linfadenectomia no LMS e no SEE ainda é incerto
4
(D) 18 (C) 19 (B) 20 (A) 21.

Ainda não existe uma determinação em relação à extensão do estadiamento cirúrgico


nem em relação aos procedimentos cirúrgicos para o estadiamento do sarcoma uterino.
A utilidade de procedimentos para estadiamento, incluindo o lavado peritoneal, biópsia
peritoneal e omentectomia na ausência de doença grosseira extrauterina necessitam de
mais avaliações para definição de seus papeis no estadiamento.

A ressecção tumoral completa, em pacientes com doença extensa extrauterina tem sido
recomendada, pois tal procedimento impacta favoravelmente na sobrevida e é a melhor
opção, uma vez que as terapias adjuvantes são pouco eficazes 22 (A) 23 (B).

Tratamento adjuvante
O papel da radioterapia adjuvante em doença não metastática é controverso. Não há
estudos prospectivos randomizados definindo o papel da radioterapia nos sarcomas
uterinos, sendo a maioria dos dados disponíveis, retrospectivos.

Em um estudo não randomizado do Gynecologic Oncology Group (GOG), com


pacientes com carcinossarcoma nos estádios I e II, que receberam radioterapia pélvica
adjuvante, apresentaram diminuição significativa de recidivas locais, mas sem melhora
da sobrevida 24 (C).

A radioterapia pélvica e/ou braquiterapia com ou sem quimioterapia podem ser


consideradas no caso de leiomiossarcomas, carcinossarcomas e sarcomas indiferenciados
de alto grau (sarcoma do estroma de alto grau) nos estádios I e II 25 (D). Nos casos dos
sarcomas do estroma (sarcoma do estroma de baixo grau) nos estádios I e II não há
indicação de tratamento adjuvante 12 (D).

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Em pacientes com doença localmente avançada, a terapia adjuvante será determinada pelo
tipo histológico da doença. Nos casos de carcinossarcomas, sarcomas indiferenciados
e leiomiossarcomas, a quimioterapia adjuvante é mandatória, desde que não existam
contraindicações à realização da mesma. Diversos esquemas de quimioterapia são
propostos, porém a ifosfamida é o principal quimioterápico, apresentando 32,2%
resposta nos carcinossarcomas e 17,2% de resposta parcial nos leiomiossarcomas4(D).

O estudo que está sendo conduzido pelo GOG (GOG161), que compara resultados em
pacientes com carcinossarcoma localmente avançado, mostrou benefícios na associação
de ifosfamida com paclitaxel, porém apresenta maior toxicidade 26 (B).

Outro estudo fase III conduzido pelo GOG (GOG150), comparando radioterapia pélvica
e quimioterapia adjuvante (cisplatina mais ifosfamida) em pacientes com doença
localmente avançada, mostrou maior efetividade no grupo que recebeu quimioterapia
27
(A).

Nos sarcomas do estroma endometrial (sarcomas do estroma de baixo grau) a adjuvância


com hormonioterapia é uma opção visto que eles expressam receptores esteróides.
As opções disponíveis são os inibidores da aromatase, tamoxifen, progestágenos e
análogos do GnRH 1
(D). No entanto, deve-se lembrar de que estas pacientes,
portadores de sarcoma endometrial, apresentam contraindicação absoluta de terapia de
reposição hormonal.

Embora não haja terapia padrão para pacientes com doença metastática, diversos
esquemas de quimioterapia são propostos, e no caso do sarcoma do estroma endometrial
(sarcoma do estroma de baixo grau) pode-se propor a hormonioterapia 12 (D).

Esquemas para quimioterapia:

- Doxorrubicina: é o agente mais efetivo para leiomiossarcoma;


- Cisplatina, paclitaxel, docetaxel, epirrubicina, topotecan, dacarbazine: apresentam
atividade contra outros sarcomas de partes moles e podem ser considerados;
- Gencitabine/docetaxel;
- Regimes combinados: mesna, adriamicina, ifosfamida, dacarbazine.

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Hormonioterapia:
- Acetato de megestrol;
- Acetato de medroxiprogesterona;
- Tamoxifen;
- Análogos do GnRH;
- Inibidores da aromatase.

O manejo dos pacientes com sarcomas uterinos metastáticos é similar ao tratamento


dos sarcomas de partes moles, ou seja, ressecção de metástases isoladas, irradiação dos
locais de recidiva para melhor controle, hormonioterapia e quimioterapia paliativa para
doença avançada 5 (A).

Do mesmo modo que ocorre com a doença metastática não há tratamento padrão para
as recidivas. O tratamento das recidivas dependerá de uma série de fatores como, tipo
histológico, local e tratamentos prévios realizados. No caso de metástase isolada, deve-
se, sempre que possível, realizar a exerese com margem de segurança.

Prognóstico
Os principais fatores determinantes do prognóstico em pacientes com sarcoma uterino
são: tipo histológico, grau histológico e estádio da doença.

Os sarcomas de baixo grau, como o sarcoma do estroma endometrial, apresentam


história natural indolente e após ressecção cirúrgica permitem sobrevida global longa.

Por outro lado, os carcinossarcomas, os leiomiossarcomas e os sarcomas indiferenciados


de alto grau se comportam de uma maneira mais agressiva.

As pacientes que apresentam doença em estágios iniciais confinadas ao útero apresentam


sobrevida global de dois a cinco anos de 50%, com altas taxas de recorrência 5 (A).
A sobrevida média para pacientes com carcinossarcoma metastático é menor que um
ano. Pacientes com leiomiossarcoma e com doença extrauterina, sem condições de
ressecção raramente apresentam sobrevida longa, a menos que a neoplasia seja de
muito baixo grau 5 (A).

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Seguimento
Todas as pacientes devem ser submetidas a exame físico completo a cada três meses nos
dois primeiros anos após o tratamento, e após, a cada seis meses. Exames de imagem de
tórax, abdome e pelve devem ser realizados a cada três meses nos dois primeiros anos
e após, anualmente.

As pacientes devem ser orientadas quanto aos sinais e sintomas de provável


recidiva, como por exemplo, aumento de volume abdominal, sintomas obstrutivos
gastrointestinais, sangramento vaginal ou retal, entre outros, orientando as mesmas a
procurar atendimento médico 12.

Algoritmo terapêutico para sarcomas uterinos.

Estádios: Quadro clínico: Tratamento:


Ia Qualquer Histerectomia total com SOB.
Leiomissarcoma na pré-menopausa pode-
se preservar os ovários (conduta de
exceção).
Carcinossarcomas: Acrescentar
linfadenectomia.
Ib e II Qualquer HTA mais SOB mais ressecção tumoral
completa.
Leiomiossarcoma e carcinossarcoma: RT
complementar pós-operatória.
II e III Qualquer Adjuvância com QT.
(localmente
avançado)
IV Qualquer Ressecção radical do tumor central,
invasões regionais e metástases, se
possível.
Esquemas de QT individualizadas.
Sarcoma do estroma endometrial pode ter
resposta com HT.

RT – Radioterapia; QT – Quimioterapia; HT – Hormonioterapia.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

CÂNCER DA TUBA UTERINA

Introdução
O adenocarcinoma de tuba uterina é o câncer mais raro do trato genital, com frequência
menor que 1% dentre todas as neoplasias ginecológicas1.

A maioria dos casos descritos é encontro casual durante laparotomia realizada para
abordagem de massa pélvica.

A salpingite crônica tem sido implicada como possível fator causal para o carcinoma
tubário.

Esta neoplasia maligna está muito correlacionada com o carcinoma ovariano, havendo
estudos que demonstraram a associação do câncer tubário nas pacientes em programas
de rastreamento para mulheres de alto risco para câncer genital, relacionadas com
alterações gênicas2.

A incidência é maior na quinta e sexta décadas da vida da mulher.

Fatores de risco
O conhecimento sobre carcinoma tubário é precário. Pouco é sabido sobre riscos,
mas são aventados os processos inflamatórios crônicos, a endometriose, alto status
socioeconômico, além da infertilidade e nuliparidade3.

Diagnóstico
Mais da metade das pacientes apresenta massa pélvica ou abdominal, antes da
cirurgia.

Muitas pacientes podem apresentar sangramento ou descarga vaginal e dor em baixo


abdômen, sendo o sangramento o sinal mais frequente. Muitos autores consideram
que a tríade sangramento, corrimento vaginal e dor seria patognomônico do carcinoma

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tubário, porém essa associação de sinais e sintomas é infrequente1.

Entre 11% e 23% dos casos a colpocitologia é sugestiva de adenocarcinoma1. Como as


doenças ovariana e endometrial, são muito mais frequentes, esse dado não ajuda muito
para suspeita diagnóstica.

A ultrassonografia abdominal ou transvaginal foi relatada como muito acurada na


diferenciação da massa e de suas localização 4 (D) 5 (D).

A associação da ultrassonografia com a dosagem do CA-125 parece melhorar a


performance do diagnóstico.

Outros métodos de imagem foram utilizados para diagnóstico, mostrados em relatos


de casos, como a tomografia computadorizada (TC), ressonância magnética (RM)
e tomografia com emissão de positrons (PET-CT). Este último exame tem melhor
utilização e resultados na recorrência e detecção de metástase.


Carcinoma in situ
Esta alteração pré-maligna tem sido relatada e constitui achado de exame histopatológico
de tubas uterinas retiradas em cirurgia por algum outro motivo.

Estadiamento
A FIGO realizou o estadiamento do carcinoma de tuba uterino similar ao de ovário. O
estadiamento TNM está na sétima edição da UICC, de 2009, e não teve alterações. A
correspondência entre os dois estadiamentos está na tabela 1 que segue.

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Tabela 1 – Estadiamento cirúrgico do câncer de tuba uterina.


Correspondência com a classificação TNM.

TNM:
T: Tumor primário:
TX Tumor primário não pode ser avaliado.
TO Não há evidência de tumor primário.
Tis Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasivo).
T1 Tumor confinado a tuba uterina.
T1a Tumor limitado a uma tuba, sem penetrar a superfície serosa.
T1b Tumor limitado a ambas as tubas, sem penetrar a superfície serosa.
T1c Tumor limitado a uma ou a ambas as tubas, com extensão para
serosa tubária ou invasão desta, ou com células malignas em líquido
T1b ascítico ou em lavados peritoneais.
T2 Tumor que envolve uma ou ambas as tubas, com extensão pélvica.
T2a Extensão e/ou metástase para o útero e/ou ovário(s).
T2b Extensão a outras estruturas pélvicas.
T2c Extensão pélvica (2a ou 2b) com células malignas em líquido ascítico
ou em lavados peritoneais.
T3 Tumor envolve uma ou ambas as tubas, com implantes peritoneais
fora da pélvis e/ou linfonodos regionais positivos.
T3a Metástase peritoneal microscópica fora da pelve.
T3b Metástase peritoneal macroscópica fora da pelve com 2 cm ou menos
em sua maior dimensão.
T3c Metástase peritoneal com mais de 2 cm em sua maior dimensão e/ou
linfonodo regional positivo.
N: Linfonodos regionais:
NX Linfonodo regional não pode ser avaliado.
N0 Ausência de metástase em linfonodo regional.
N1 Metástase em linfonodos regionais.
M Metástase à distância:
M0 Ausência de metástase à distância.
M1 Metástase à distância.

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Estádio: Descrição:
0 Carcinoma in situ (carcinoma pré-invasor)
TisN0M0
I Tumor limitado à tuba uterina.
T1N0M0
Ia Tumor limitado a uma tuba uterina, com extensão para a
T1aN0M0 submucosa ou muscular, mas não penetra na superfície
serosa. Sem ascite.
Ib Tumor limitado a ambas as tubas uterinas, com extensão
T1bN0M0 para a submucosa ou muscular, mas não penetra na
superfície serosa. Sem ascite.
Ic Tumor no estádio Ia ou Ib, mas com extensão para a
T1cN0M0 serosa ou com ascite contendo células malignas, ou com
lavado peritoneal positivo para células malignas.
II Tumor envolve uma ou ambas as tubas uterinas, com
T2N0M0 extensão pélvica.
IIa Extensão ou metástase para o útero ou ovário.
T2aN0M0
IIb Extensão a outros tecidos pélvicos.
T2bN0M0
IIc Tumor no estádio IIa ou IIb com ascite contendo células
T2cN0M0 malignas, ou com lavado peritoneal positivo para células
malignas.
III Tumor envolve uma ou ambas as tubas uterinas, com
T3N0M0 implantes peritoneais fora da pelve ou linfonodos
retroperitoneias ou inguinais positivos.
Metástase na superfície hepática é estádio III.
Tumor parece limitado à pelve verdadeira, mas há
comprovação histológica de extensão maligna ao intestino
delgado ou omento.
IIIa Tumor macroscopicamente limitado à pelve verdadeira,
T3aN0M0 com linfonodos negativos, mas com comprovação
histológica de implantes microscópicos na superfície
peritoneal.
IIIb Tumor envolvendo uma ou ambas as tubas uterinas, com
T3bN0M0 histologia confirmando implantes em superfície peritoneal,
nenhum excedendo 2 cm de diâmetro e linfonodos
negativos.
IIIc Implantes peritoneais maiores que 2 cm de diâmetro ou
T3cN0M0 linfonodos retroperitoneais ou inguinais positivos.
qqTN1M0
IV Tumor envolvendo uma ou ambas as tubas uterinas com
qqTqqNM1 metástase à distância.
Se houver derrame pleural é necessário comprovação de
células malignas para incluir no estádio IV.
Metástase no parênquima hepático é estádio IV.

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Tratamento
Como o diagnóstico raramente é feito preoperatoriamente, o cirurgião deverá estar
preparado para realizar a terapêutica definitiva no momento da laparotomia.

O carcinoma in situ é achado de estudo da tuba retirada por algum outro motivo. A
paciente é considerada tratada.

O tratamento é igual ao do câncer epitelial ovariano e consta da histerectomia total


(HT) com salpingo-ooforectomia bilateral (SOB) e realização do estadiamento
cirúrgico com linfadenectomia e obtenção de lavado peritoneal para estudo citológico
e omentectomia infracólica.

A cirurgia conservadora para pacientes jovens que desejam preservar a fertilidade e


aparentam ter a doença em uma só tuba uterina não está bem estabelecida. No caso
da opção cirúrgica ter sido conservadora a cirurgia deverá ser complementada após a
paciente ter seus filhos.

Mesmo que a doença pareça ser unilateral a neoplasia poderá ser bilateral.

No caso de doença avançada, a cirurgia citorredutora deverá ser realizada.

A complementação do tratamento com quimioterapia aplica-se nos mesmos moldes


da indicação para os tumores epiteliais ovarianos, em combinação de drogas com
platina.

Prognóstico
A portadora do carcinoma de tuba uterina tem prognóstico similar ao das pacientes que
têm carcinoma do ovário.

A sobrevida tem sido menor que a das pacientes tratadas por câncer de ovário. Em
estudo de base de dados a sobrevida de cinco anos foi:

- Estádio I – 95%;
- Estádio II – 75%;
- Estádio III – 69% e

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- Estádio IV – 45%. Porém, somente 39% das pacientes são tratadas em estádios I e
II6.

Algoritmo terapêutico do câncer de tuba uterina.

Estádio: Quadro clínico: Tratamento:


Ia Tumor limitado a uma tuba uterina, Lavado peritoneal mais
T1aN0M0 com extensão para a submucosa salpingo-ooforectomia nilateral
ou muscular, mas não penetra na para pacientes jovens que
superfície serosa. Sem ascite. desejam manter fertilidade.
Demais casos: HT mais SOB
mais cirurgia estadiadora
(lavado peritoneal,
linfadenectomia, omentectomia
infracólica).
Ib Tumor limitado a ambas as tubas HT mais SOB mais cirurgia
T1bN0M0 uterinas, com extensão para a estadiadora (lavado peritoneal,
submucosa ou muscular, mas não linfadenectomia, omentectomia
penetra na superfície serosa. Sem infracólica).
e ascite. QT adjuvante.
Tumor no estádio Ia ou Ib, mas com
extensão para a serosa ou com
Ic ascite contendo células malignas,
ou com lavado peritoneal positivo
para células malignas.
II Extensão ou metástase para o Cirurgia citorredutora mais QT
T2aN0M0 útero ou ovário. adjuvante.
T2bN0M0 Extensão a outros tecidos pélvicos.
T2cN0M0 Tumor no estádio IIa ou IIb com
ascite contendo células malignas,
ou com lavado peritoneal positivo
para células malignas.
III Tumor envolve uma ou ambas as
tubas uterinas, com implantes
peritoneais fora da pelve ou
linfonodos retroperitoneias ou
inguinais positivos.
Metástase na superfície hepática é
estádio III.
Tumor parece limitado à pelve
verdadeira, as há comprovação
histológica de extensão maligna ao
intestino delgado ou omento.
IV Tumor envolvendo uma ou ambas
as tubas uterinas com metástase à
distância.
Se houver derrame pleural é
necessário comprovação de células
malignas para incluir no estádio IV.
Metástase no parênquima hepático
é estádio IV.

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CÂNCER DE OVÁRIO

Introdução
O câncer de ovário é o mais letal dos tumores ginecológicos. Estima-se 3.837
novos casos em 2009, enquanto o número de mortes foi de 2.583 em 2007, ou seja,
aproximadamente 67% dos casos resultam em mortes pela doença1. É provável que
o total de casos seja maior, pois um considerável número de pacientes tem a morte
atribuída às complicações da doença avançada e o diagnóstico da causa primária não
é sempre relatado.

O câncer de ovário pode ser classificado em três grupos de tumores com incidência,
fatores de risco e quadros clínicos distintos:

1. Os tumores epiteliais, que representam cerca de 90% dos casos, ocorrem em dois
terços das vezes em mulheres acima dos 50 anos, têm evolução rápida e o diagnóstico
é tardio, na quase totalidade dos casos;

2. Os tumores da célula germinativa representam cerca de 5%, são mais comuns em


mulheres jovens, e apresentam altas taxas de cura quando tratados convenientemente.

3. Os tumores de cordões sexuais e estroma com cerca de 5% dos casos. Neste grupo o
mais frequente é o tumor da célula da granulosa, que tem como principal característica
o comportamento incerto quanto ao prognóstico e recidivas tardias. Tem taxas de cura
ao redor de 90%.

Rastreamento, fatores de risco e etiopatogenia.


Apesar de diferentes tentativas e de estudos em andamento, não existem, até o momento,
métodos de rastreamento eficientes para câncer de ovário, que tenham demonstrado
impacto na mortalidade pela doença e que possam ser recomendados para utilização
em mulheres assintomáticas.

Um pequeno número de mulheres tem predisposição familiar para a doença. Mutação


nos genes BRCA1 e BRCA2 conferem risco de até 60% para câncer de ovário a partir
dos 35 anos de idade. As mesmas mutações genéticas também elevam o risco para

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câncer de mama. Estas mutações são mais frequentes em algumas etnias como as judias
Ashkenazi. Na população brasileira a frequência é pequena.

Mais recentemente diferentes estudos têm demonstrado que pelo menos uma parte dos
carcinomas serosos de alto grau atribuídos aos ovários, provavelmente são originários
das tubas uterinas. O acometimento dos ovários e do peritônio se faz secundariamente
2
. Os tumores relacionados às mutações do BRCA1 e BRCA2 são os que apresentam
os maiores indícios de origem tubárica 3.

Diagnóstico nos casos avançados.


O carcinoma do ovário apresenta-se em estágios avançados em 75% dos casos. O
diagnóstico deve ser suspeitado em toda mulher com ascite, emagrecimento, massa
pélvica, ou carcinomatose peritoneal.

A carcinomatose peritoneal costuma ser precedida, em alguns meses, de sintomas vagos


como meteorismo, sensação de aumento do abdome e de plenitude vesical 4, 5.

O diagnóstico de suspeita faz-se pela ultrassonografia que mostra massas pélvicas e


abdominais, ascite e espessamento do omento. Se houver drenagem de ascite, o estudo
citológico do líquido demonstra células neoplásicas. O diagnóstico de certeza depende
do exame anatomopatológico de material obtido no momento da cirurgia. Nos casos
avançados, onde se pretende instituir quimioterapia neoadjuvante, é recomendável fazer
o diagnóstico anatomopatológico por biópsia por agulha guiada por ultrassonografia.

O marcador tumoral CA 125 costuma estar muito elevado nos casos avançados de
carcinoma seroso (acima de 1000 U/ml), porém se estiver baixo ou negativo não
exclui câncer de ovário. Algumas outras doenças ginecológicas como a endometriose,
leiomiomas e processos inflamatórios pélvicos podem elevar moderadamente o
marcador CA 125.

Para avaliar a extensão da doença nos casos avançados, o melhor método de imagem é
a tomografia computadorizada de abdome e pelve, que mostra com clareza a quantidade
de doença, a distribuição na cavidade abdomino-pélvica, o estado de áreas críticas para
a cirurgia e pode predizer a operabilidade.

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Diagnóstico nos tumores iniciais


Os tumores iniciais são os que mais frequentemente são diagnosticados por
ginecologistas e obstetras em exames de rotinas, e não necessariamente em centros
especializados. O diagnóstico correto nos casos iniciais condiciona grande impacto
na sobrevida destas pacientes. Tumores iniciais precisam ser diferenciados de massas
anexiais de origem não neoplásicas.

Estima-se que uma em cada três mulheres terá uma massa anexial ao longo da sua vida.
Na maioria das vezes decorrente de situações funcionais ou benignas. A incidência de
câncer de ovário na população geral situa-se em torno de uma em cada 70 mulheres.
Diferenciar o câncer das demais massas anexiais benignas é uma tarefa de fundamental
importância.

Critérios para o diagnóstico diferencial de massas


anexiais
Os principais passos e decisões na avaliação de massas anexiais são:

1. Idade da paciente. Massas anexiais são comuns no menacme, mas não devem estar
presentes em mulheres pré-púberes e na pós-menopausadas; nos extremos da vida,
devem ser sempre investigadas.

2. Cistos simples. Massas totalmente císticas, de paredes finas, sem septos ou vegetações,
com conteúdo líquido ou hemático são benignas e comuns no menacme. Cistos simples
de até 10 cm de diâmetro podem ser acompanhados clinicamente.

3. Massas complexas. Denominam-se massas complexas quando estão presentes


septos, espessamento das paredes do cisto, vegetações no seu interior ou componentes
sólidos. As massas com componentes císticos e sólidos são as que mais se associam
com malignidade.

4. Ascite. Massas anexiais e ascite são altamente suspeitas de malignidade.

5. Ultrassonografia com Doppler. O exame pouco contribui para o diagnóstico


diferencial de massas anexiais benignas e malignas.

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6. Conteúdo hemático. O conteúdo hemático é comum nos cistos de corpo lúteo e


nos endometriomas. A ultrassonografia pode sugerir conteúdo hemático. A ressonância
magnética é o melhor método para este fim.

7. Marcadores tumorais. O CA 125 costuma estar elevado nos tumores avançados.


Nos tumores restritos ao ovário, pode estar normal em até 25% dos casos. A principal
utilidade do CA 125 é no seguimento das pacientes com câncer de ovário. Outro
marcador o CEA (antigeno carcinoembriônico) pode estar elevado em tumores
mucinosos, tumores colorretais, e em pacientes fumantes. Nas pacientes muito jovens
com massa anexial, os marcadores de tumores de célula germinativa podem estar
elevados como o Beta-HCG e a alfafetoproteina. Nos tumores da célula da granulosa,
o marcador ideal é a inibina beta.

8. Tumores mucinosos. Tumores volumosos com conteúdo espesso e pouca ascite são
frequentemente tumores mucinosos. Os tumores mucinosos podem ser primários ou
secundários do estômago, apêndice cecal ou cólon. A tomografia computadorizada é
importante no diagnóstico diferencial. Em mulheres jovens, a endoscopia digestiva e a
colonoscopia são procedimentos valiosos.

Tratamento das massas anexiais.


1. Massas anexiais sugestivas de benignidade.

Conduta expectante e acompanhamento clínico e ultrassonográfico em intervalos


curtos (40 dias). Se inalteradas continua-se o seguimento e após um ano de evolução
inalterada pode-se manter o seguimento com intervalos maiores (anual). A maioria
das massas anexiais funcionais regridem espontaneamente com ou sem tratamentos
medicamentosos. Quando houver progressão no tamanho ou na complexidade das
massas anexiais inicialmente tidas como benignas, deve-se proceder a exerese para
diagnóstico.

2. Massas anexiais complexas.

Devem ser retiradas para diagnóstico anatomopatológico. A via de acesso pode ser
laparoscópica ou laparotômica. Se a escolha for pela via laparotômica a incisão
deve ser vertical. Tanto a via laparoscópica como a laparotômica deve contemplar o
completo inventário da pelve e cavidade abdominal. A exerese da massa deve ser feita
de forma a evitar o rompimento e disseminação de células neoplásicas e o diagnóstico

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anatomopatológico do espécimen realizado por exame de congelação. O tratamento


cirúrgico definitivo e padronizado deve-se seguir ao diagnóstico de congelação.
O estadiamento cirúrgico completo é de fundamental importância nos tumores
supostamente iniciais para documentar a verdadeira extensão da doença, pois em cerca
de um terço dos casos existe doença extrapélvica e isto tem implicações no tratamento
e no prognóstico. O diagnóstico intraoperatório de certeza nem sempre é possível,
principalmente nos tumores mucinosos e nos tumores de células germinativas. Em
pacientes jovens, quando a manutenção da fertilidade for importante, é mais prudente
aguardar o diagnóstico definitivo em parafina antes de estabelecer a conduta cirúrgica.
Os tumores mucinosos podem ser do tipo mulleriano ou intestinal. Quando for do tipo
intestinal, a retirada do apêndice cecal é oportuna, pois um considerável número destes
tumores é secundário do apêndice.

Tratamento do carcinoma de ovário


O tratamento ideal do carcinoma de ovário é a cirurgia citorredutora seguida de
quimioterapia. Os tempos obrigatórios da cirurgia citorredutora são: anexectomia
bilateral, histerectomia total, omentectomia, biópsia de todas as superfícies peritoneais
suspeitas, avaliação da cavidade abominopélvica desde a cúpula diafragmática até a
pelve, linfadenectomia pélvica e para-aórtica. Um dos principais fatores prognósticos
é a quantidade de doença residual. O ideal é que não reste qualquer doença residual.
É possível predizer no pré-operatório se esta meta será alcançada. A tomografia é o
método de escolha para avaliar a quantidade de tumor em áreas críticas como o hilo
hepático, a raiz das artérias mesentéricas e o retroperitônio. Na impossibilidade de
citorredução completa, a citorredução com doença residual de até 1,0 cm no maior
diâmetro também é aceitável (citorredução subótima). Porém naqueles casos em que
apesar da citorredução ainda restar doença maior que 1,0 cm, a cirurgia inicial não terá
sido a melhor escolha.

Nesses casos avançados, o tratamento deve iniciar-se pela quimioterapia neoadjuvante


baseada em platina, com ou sem taxane, e a cirurgia deve ser postergada para o intervalo
entre o terceiro e quarto ciclo, ou então no final do sexto ciclo de tratamento.

O seguimento destas pacientes deve ser monitorado por tomografia e marcador tumoral
a cada três meses.

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Estadiamento do câncer de ovário


O estadiamento do câncer de ovário é cirúrgico6. Realizado por laparotomia com incisão
vertical na linha média, com completo inventário da cavidade abdomino-pélvica.
Procede-se a coleta de líquido ascítico ou lavado peritoneal para estudo citológico,
histerectomia total, anexectomia bilateral, omentectomia, linfadenectomia pélvica e
para-aórtica e biópsias peritoneais múltiplas.

Tabela 1: Estadiamento do câncer de ovário

ESTADIAMENTO – FIGO 2009 – CÂNCER DE OVÁRIO


I Tumor limitado aos ovários.
Ia Tumor limitado a um ovário; citologia negativa. Cápsula íntegra. Sem
tumor na superfície.
Ib Tumor em ambos os ovários. Citologia negativa. Cápsula íntegra. Sem
tumor na superfície.
Ic Tumor estádio IA ou IB, com tumor na superfície de um ou ambos os
ovários, ou cápsula rota, ou citologia positiva.
II Tumor em um ou ambos os ovários e extensão para a pelve.
IIa Extensão e ou metástase para útero e ou tubas.
IIb Extensão para outros tecidos pélvicos.
IIc Tumor estádio IIa ou IIb, porém com tumor na superfície de um ou
Ambos os ovários, ou com cápsula(s) rotas, ou com citologia positiva.
III Tumor envolvendo um ou ambos os ovários com implantes peritoneais
fora da pelve e/ou linfonodos retroperitoneais ou inguinais positivos.
Metástase em superfície hepática é igual a estádio III. Tumor limitado à
pelve, porém com extensão em intestino delgado ou omento.
IIIA Tumor limitado à pelve, linfonodos negativos, porém com implantes
microscópicos na superfície do peritônio abdominal, ou extensão para
intestino delgado ou mesentério.
IIIB Tumor em um ou ambos os ovários com metástases em superfície de
peritônio abdominal inferior a 2 cm de diâmetro e linfonodos negativos.
IIIC Metástases peritoneais fora da pelve >2 cm em diâmetro e/ou linfonodos
retroperitoneais ou inguinais positivos.
IV Tumor envolve um ou ambos os ovários com metástases à distância.
Derrame pleural com citologia positiva. Invasão de parênquima hepático.

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Tratamento dos tumores de células germinativas


No grupo dos tumores de células germinativas os principais tipos são: disgerminoma,
tumor de seio endodérmico ou saco vitelíneo, carcinoma embrionário, poliembrioma,
coriocarcinoma não gestacional, teratoma imaturo e tumores mistos. São tumores
comuns em mulheres jovens e adolescentes. Em mulheres com menos de 20 anos,
representam 58% dos casos de tumores malignos de ovário7. PEstes tumores costumam
apresentar crescimento rápido e atingem grandes volumes. Aproximadamente 60% a
70% dos casos é estádio I ou II e o envolvimento bilateral dos ovários é incomum,
exceto nos disgerminomas. O envolvimento linfonodal é mais frequente que nos
carcinomas.

A avaliação inicial de pacientes com suspeita de tumor de células germinativas consiste


na ultrassonografia e tomografia computadorizada, raio X de tórax e nos marcadores
tumorais CA 125, CEA, beta-HCG e alfafetoproteina.

Para fins de tratamento, costuma-se subdividir os tumores de células germinativas em


disgerminoma (o tipo mais comum) e não disgerminomas. Pacientes com tumor de seio
endodérmico e com alfafetoproteina > 1000 U/ml têm maior probabilidade de recidivas.
A quantidade de doença residual após a cirurgia inicial e a extensão da cirurgia inicial
não afetam a sobrevida8. O tratamento cirúrgico dos tumores de células germinativas
deve contemplar a preservação da fertilidade no grupo de pacientes jovens. É feito
por incisão mediana vertical, salpingo-ooforectomia unilateral, inspeção e biópsias
de áreas suspeitas, coleta de líquido para estudo citológico. Se o ovário contralateral
tiver aparência normal, não devem ser feitas biópsias ou ressecções em cunha para
não perturbar a fertilidade. A biópsia está indicada quando houver achados anormais à
inspeção. Em pacientes jovens e com ovário único, a simples cistectomia, seguida de
tratamento sistêmico deve ser considerada9.

A citorredução continua sendo um importante fator prognóstico. Pacientes com


citorredução completa têm menos probabilidade de recidivas do que as incompletamente
citorreduzidas. Para a maioria das pacientes, entretanto, a anexectomia unilateral com
preservação do útero e ovário contralateral é o tratamento cirúrgico padrão10.

Antes da introdução da quimioterapia combinada, o prognóstico das pacientes com


tumores de células germinativas que se estendiam além dos ovários era muito ruim.
Atualmente a maioria dessas pacientes é curada.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

O tratamento padrão para os tumores de células germinativas não disgerminoma, é


o esquema BEP (bleomicina, etoposide e platina), recomendado para a maioria das
pacientes, com exceção do teratoma imaturo grau I e estádio I.

Na maioria das vezes, os disgerminomas são restritos a um ovário (estádio IA). Nestes
casos a quimioterapia pode ser omitida. Nos tumores avançados o tratamento com o
esquema BEP é o padrão. Antes do advento da poliquimioterapia, a radioterapia era
bastante indicada no tratamento dos disgerminomas com respostas excelentes, porém
com perda da fertilidade. Atualmente, entretanto, o resultado da quimioterapia supera
o da radioterapia.

As complicações potenciais da quimioterapia nos tumores de células germinativas


são: segunda neoplasia e comprometimento da fertilidade. Cerca de 76% das pacientes
conseguiram gravidezes e neonatos normais após tratamento quimioterápico para
tumores de células germinativas11. Estas pacientes apresentam risco mais elevado para
desenvolver segunda neoplasia, principalmente leucemia não linfoblástica aguda.

Prognóstico
O câncer de ovário representa cerca de 5% dos tumores malignos ginecológicos,
entretanto é o que tem a maior mortalidade. Aproximadamente 75% dos casos são
diagnosticados em estádios avançados. A sobrevida de cinco anos nos estádios
iniciais aproxima-se dos 90% e cai drasticamente para cerca de 25% nos estádios
avançados12.

Seguimento
Considerando que a grande maioria das pacientes com carcinoma de ovário terá
recidiva ou persistência da doença apesar dos tratamentos cirúrgicos e quimioterápicos,
o seguimento destas pacientes não tem como ser padronizado. O seguimento inclui
exame físico regular; tomografia computadorizada do abdome, pelve e tórax; e dosagem
do CA 125 sérico.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Referências Bibliográficas
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for pelvic serous cancer. Clin Med Res. 2007; 5: 35-44.
4 - Andersen MR, Goff BA, Lowe KA et al. Combining a symptoms index with CA 125 to improve
detection of ovarian cancer. Cancer. 2008; 113: 484-9.
5 - Goff BA, Mandel LS, Drescher CW et al. Development of an ovarian cancer symptom index:
possibilities for earlier detection. Cancer. 2007; 109: 221-7.
6 - Petru E, Luck HJ, Stuart G et al. Gynecologic Cancer Intergroup (GCIG) proposals for changes of the
current FIGO staging system. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2009; 143: 69-74.
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Oncol. 2004; 93: 381-4.
10 - Gershenson DM. Management of early ovarian cancer: germ cell and sex cord-stromal tumors.
Gynecol Oncol. 1994; 55: S62-72.
11 - Pektasides D, Rustin GJ, Newlands ES et al. Fertility after chemotherapy for ovarian germ cell
tumours. Br J Obstet Gynaecol. 1987; 94: 477-9.
12 - Colombo N, Van Gorp T, Parma G et al. Ovarian cancer. Crit Rev Oncol Hematol. 2006; 60: 159-79.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

100
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

DOENÇA TROFOBLÁSTICA GESTACIONAL

Introdução
A mola hidatiforme (MH). Está incluída num grupo mais amplo conhecido genericamente
como DTGs e que compreende, além da MH, as formas com comportamento maligno
como a neoplasia trofoblástica gestacional, o coriocarcinoma e o tumor trofoblástico
de leito placentário, entre outras menos frequentes. São reconhecidos dois tipos de
MH: completa (MHC) e parcial ou incompleta (MHP). Entre elas, há diferenças quanto
aos aspectos morfológicos (macroscópicos), histopatologia e cariótipo 3. Quanto
à histopatologia As Doenças Trofoblásticas Gestacionais (DTGs) compreendem
um amplo espectro de condições que se originam dos tecidos de revestimento das
vilosidades coriais (trofoblasto), apresentam crescimento anárquico do ponto de
vista histopatológico e são suscetíveis a exibir alterações degenerativas no estroma1.
Caracteristicamente, apresentam a fração beta das gonadotrofinas coriônicas humanas
(β-hCG) como marcador biológico 2.

A incidência da Doença Trofoblástica Gestacional varia amplamente quando se


compara as incidências nos países ocidentais com os do oriente3. Apenas um estudo
brasileiro sobre o tema indica, com base em atendimento hospitalar de um único centro,
a proporção de uma MH para 215 gestações 4.

A idade materna avançada é o fator de risco mais bem estabelecido para a DTG, sendo
que mulheres com idade superior a 40 anos apresentam chances cinco a dez vezes
maiores de desenvolverem mola completa, o que não se evidencia na mola parcial 5.
História pregressa de abortamento espontâneo e de infertilidade relaciona-se com risco
aumentado para ambas as gestações molares: completa e incompleta. Embora a maioria
das gestações molares seja esporádica, existe uma afecção com padrão de herança
autossômica recessiva, a Síndrome Familiar Recorrente da Mola Hidatiforme 6.

Na doença trofoblástica gestacional maligna ou neoplasia trofoblástica gestacional


(NTG), os mecanismos regulatórios normais que controlam o crescimento do tecido
trofoblástico são perdidos. Como resultado, as células trofoblásticas proliferam e
podem invadir o miométrio, e por causa do rico suprimento vascular, frequentemente,
resultam em êmbolos e metástases hematogênicas 1, 6,7. 

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Mola hidatiforme
A mola hidatiforma (MH) é uma complicação da gravidez com potencial evolução para
doença de comportamento maligno, sendo a Doença Trofoblástica Gestacional, a mais
frequente 8.
 

Classificação
As gestações molares são classificadas em parcial ou completa com base em
características clínicas, macroscópicas, histológicas e citogenéticas (quadro 1).
O diagnóstico diferencial entre mola parcial e mola completa é importante para o
prognóstico e pode definir condutas diferentes 6, 9-11. 

Quadro 1 - Características da mola hidatiforme completa e parcial11

Característica Mola completa Mola parcial ou incompleta


Clínica Aborto espontâneo, útero > que o Missed ou abortamento
esperado para IG, espontâneo. Também pode ter
“útero em Sanfona”, eliminação de útero > que o esperado para IG,
vesículas (raro), hiperêmese e pré- hiperêmese e pré-eclâmpsia
eclâmpsia precoce (ȕ-hCG). precoce.
Cariótipo Diplóide - 46 XX em 90% Cariótipo triplóide em 2/3 dos
Espermatozóide com 23 casos (69 XXY ou 69 XYY) -
cromossomos duplica o pronúcleo fertilização de óvulo normal por
em um “óvulo vazio”. 46 XY (10%): dois espermatozóides (dispermia).
dois espermatozóides fertilizam
um “óvulo vazio”.
Histologia Proliferação trofoblástica difusa. Proliferação trofoblástica difusa
Edema em todas as vilosidades. focal. Geralmente sem atipia
Atipia.
Feto ou partes Ausente Presente
fetais
Risco de NTG 20% 5%
persistente
Risco de 3-4% Rara
coriocarcinoma

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

A mola hidatiforme completa caracteriza-se pela degeneração hidrópica das vilosidades


coriônicas, hiperplasia difusa e marcada atipia no sítio de implantação trofoblástico.
Não ocorre a formação de feto ou de tecidos embrionários6. Em relação à avaliação
citogenética, a maioria das molas completas apresenta cariótipo diplóide, principalmente
46XX, com todos os conjuntos cromossômicos derivados da parte paterna. Geralmente
resulta da fertilização de um oócito anucleado por um espermatozóide haplóide que
duplica a carga genética ou por dois espermatozóides (dispermia) 6,9-11.

A mola hidatiforme parcial caracteriza-se por apresentar dois tipos de grupamentos


celulares distintos: um normal que pode conter partes ou tecidos embrionários e outra
anormal com proliferação trofoblástica. Edema, hiperplasia focal e atipia leve no
sítio de implantação são identificados. A avaliação citogenética revela predomínio de
anomalias cromossômicas, principalmente triploidias, resultado da fertilização de um
oócito normal por dois espermatozóides. No feto, estigmas das triploidias podem estar
presentes, incluindo anomalias congênitas múltiplas e restrição de crescimento 6, 9-11. 

Diagnóstico
O diagnóstico da mola hidatiforme pode ser suspeitado pelo quadro clínico e
confirmado pela propedêutica complementar, mas pode ser um achado ocasional do
exame anátomo-patológico de materiais colhidos após curetagem em pacientes com
diagnóstico equivocado de aborto espontâneo ou gestação anembrionada 6.

As gestações molares, principalmente as completas, são  na atualidade mais


comumente diagnosticadas no primeiro trimestre pela associação do exame ecográfico
12
e testes altamente sensíveis de hCG 2. A apresentação clínica clássica da mola
hidatiforme completa tem se tornado bastante incomum devido ao diagnóstico cada
vez mais precoce5.  Nos dois tipos de gestação molar, as manifestações clínicas são
essencialmente semelhantes, diferindo na intensidade dos sinais e sintomas, com a
mola parcial exibindo-os de forma atenuada e na ultra-sonografia pode se observar
tecidos embrionários ou feto.

Os sinais e sintomas mais frequentes são 6, 9-11:

- Ausência de batimentos cardíacos fetais;


- Sangramento vaginal quase contínuo, geralmente sem cólicas. Inicia-se, em geral,
entre a 4ª e a 16ª semanas de amenorréia. A eliminação de vesículas é rara, mas sela o
diagnóstico.

103
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

- Volume uterino maior que o esperado para a idade gestacional em cerca de um terço
dos casos (o aumento pode ser intermitente devido ao acúmulo e posterior eliminação
de sangue na cavidade uterina).
- Hipertireoidismo com suas manifestações clínicas (muito raro atualmente).
- Hiperêmese - um dos sintomas mais frequentes
- Hipertensão induzida pela gravidez - quando de ocorrência precoce (antes da 20ª
semana) associada a sangramento genital é sinal clássico da prenhez molar. Também é
pouco observada.
- Cistos teca-luteínicos – evidenciados na propedêutica ecográfica, podem ser uni ou
bilaterais e resultam da estimulação do hCG sobre a teca dos ovários 

A detecção de gonadotrofina coriônica sérica ou urinária, geralmente em valores muito


elevados para o tempo de amenorréia, associada à ausência de batimentos cardiofetais,
à sintomatologia própria e às imagens características proporcionadas pela ecografia
sugerem o diagnóstico2, 6,9-11.

À ecografia, a distinção entre mola completa e tecidos trofoblásticos degenerados torna-


se, por vezes, muito difícil. Na sua expressão típica, a mola hidatiforme caracteriza-se
pelo útero com volume maior que o esperado para a idade gestacional, exibindo na
cavidade numerosos ecos amorfos aos quais, de entremeio, misturam-se formações
arredondadas, anecóicas, de tamanhos variados, indicativas de vesículas. Na mola
parcial são relatados os seguintes achados: placenta extensamente espessada, espaços
císticos no seu interior, cavidade amniótica vazia, sem conter ecos fetais ou concepto
vivo 6,12.

A confirmação diagnóstica só pode ser feita com exame anátomo-patológico e é etapa


fundamental para avaliação da estratégia de tratamento, não devendo, portanto, ser
omitida 5, 6,9,10.

Manejo da mola hidatiforme


Uma vez estabelecido o diagnóstico de gestação molar, a paciente deve ser cuidadosamente
avaliada em busca de evidências de anemia, pré-eclâmpsia, hipertireoidismo e distúrbios
hidroeletrolíticos. Para pacientes com suspeita de mola hidatiforme prévia à aspiração
uterina, recomenda-se: hemograma completo, coagulograma, avaliação das funções
renal e hepática, tipagem sanguínea, dosagem de β-hCG quantitativo no sangue e
radiografia de tórax prévia à evacuação uterina 13. Uma radiografia de tórax basal após
evacuação molar deveria ser considerada 13.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Quando existe suspeita de mola hidatiforme o uso de drogas uterotônicas deve ser
evitado uma vez que contrações uterinas antes do esvaziamento aumentam o risco de
evolução para doença persistente e de embolização trofoblástica para vasos pulmonares.
Para o esvaziamento, é recomendada a aspiração, devendo ser evitada a curetagem no
início do procedimento, pois é elevado o risco de perfuração uterina 17. Além disso,
no caso de molas de grande volume, o tempo longo da curetagem aumenta a perda
sanguínea 8. O uso de ocitocina intravenosa, quando necessário, só deve ser instituído
após o término da aspiração e pode ser continuado no pós-peratório 17. Pacientes Rh-
negativas devem receber imunoglobulina anti-Rh após a aspiração 13.

O material retirado deve ser encaminhado para avaliação histopatológica e confirmação


da suspeita diagnóstica. Ocitocina intravenosa pode ser empregada após o esvaziamento,
assim como a massagem uterina em úteros maiores que 14 semanas, para estimular a
contração miometrial 6, 9,10.

Complicações pulmonares são observadas com certa frequência em pacientes com


considerável aumento de volume uterino durante a evacuação uterina. Embora a
síndrome de embolização trofoblástica tenha sido enfatizada, como causa do desconforto
respiratório, existem outras causa potenciais. Síndrome de desconforto respiratório
pode ser causada por falha cardíaca congestiva consequente à anemia, hipertireoidismo,
pré-eclâmpsia ou excesso de volume infundido. Geralmente, o tratamento se baseia
em suporte clínico e as complicações resultantes da mola se restabelecem após o
esvaziamento uterino 13.

Após esvaziamento uterino, cerca de 18% a 28% das pacientes com mola completa
desenvolvem NTG persistente, enquanto na mola parcial esse risco é de apenas 2% a
4%. Os seguintes fatores são relatados como preditores para persistência de NTG pós-
molar 6: Nível de hCG sérico maior que 100.000UI/l; Presença de cistos teca-luteínicos;
Aumento significativo do volume uterino, com os sinais de marcada proliferação
trofoblástica.

Idealmente, as dosagens de β-hCG deveriam ser obtidas 48 horas após o esvaziamento


molar e a cada uma a duas semanas enquanto estiverem elevadas até negativar por três
determinações consecutivas, quando então, a avaliação torna-se mensal por mais seis
meses6,13,15. A ocorrência de estabilização dos níveis ou elevação sugere doença com a
necessidade de quimioterapia6, 15.

A maioria das gravidezes que se seguem às gestações molares é usualmente normal


(98%) 17, mas a gestação durante o seguimento inicial pode obscurecer o valor real do

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

hCG sérico e pode atrasar o diagnóstico de doença trofoblástica gestacional pós-molar


maligna 13. Assim, a contracepção segura durante o tempo de seguimento deve ser
enfatizada. Os métodos mais recomendados são contraceptivos hormonais, métodos
de barreira e contracepção cirúrgica. Os contraceptivos orais parecem não influenciar a
incidência de doença pós-molar ou alterar o padrão de regressão do hCG 6,13,17,18.

Após a completa remissão documentada da mola hidatiforme por seis meses 17, para
mulheres que desejam engravidar, a contracepção e a monitorização do hCG podem
ser descontinuadas. Pacientes que tiveram mola hidatiforme completa ou incompleta
tem um risco 10 vezes maior (1-2% de incidência) de uma segunda gestação molar em
gravidez subsequente. Assim, todas as gestações subsequentes deveriam ter avaliação
ecográfica precoce 13.

Como cerca de 80% dos casos terão regressão espontânea dos valores de hCG e
não apresentarão sequelas malignas da mola, após a aspiração molar, não se indica
a quimioterapia nesta fase. Entretanto, se os valores de hCG se elevam ou mantém
um plateau por várias semanas, avaliação imediata e tratamento da doença pós-molar
estão indicados (ver abaixo). O diagnóstico de sequela maligna é feito pela persistência
ou  elevação dos níves de gonadotrofian coriônica ou diagnóstico histológico de
coriocarcinoma. Independe da comprovação clínica ou radiológica de metástases.

Nova curetagem não está, em geral, recomendada porque frequentemente não leva à
remissão ou influencia no tratamento e pode levar a complicações 8,13, mas em certas
circunstâncias esta segunda intervenção pode ser benéfica19. Há riscos associados
a esta segunda intervenção, dos quais o mais importante é  a perfuração uterina e
hemorragia. Para a indicação do procedimento, alguns critérios devem ser verificados:
paciente com sintomas (sangramento) e manutenção dos níveis de gonadotrofina
coriônica; volume uterino aumentado ou achado ultrassonográfico de material molar
intracavitário, mas sem imagens sugestivas de mola invasora. A segunda curetagem
deve ser contraindicada se houver metástases, elevação persistente dos níveis de hCG
e diagnóstico de coriocarcinoma, situações em que o tratamento pela quimioterapia é 
prioritário.            

Doença Trofoblástica Gestacional Persistente


A doença trofoblástica gestacional maligna compreende a doença trofoblástica pós-
molar, a mola invasora e o coriocarcinoma13. O coriocarcinoma é um tumor epitelial
das células trofoblásticas, muito agresssivo, que pode estar associado a qualquer

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forma de gravidez prévia, normal ou anormal. Ocorre em 50% das vezes após mola
hidatiforme (principalmente a completa), 25% após aborto, 22% após gravidez normal
e 3% consequentes à gravidez ectópica5. A estratégia principal de tratamento é a
quimioterapia13.

A mola invasora é  o termo utilizado para descrever a doença confinada ao útero e


caracteriza-se pela presença de vilos coriônicos hidrópicos que penetram no miométrio
ou na sua vascularização. Assim não é rara a formação de êmbolos que podem ser
encontrados à distância. A mola invasora é complicação de cerca de 20% das molas
hidatiformes9, 10.

A International Federation of Gynecologists and Obstetricians (FIGO) padronizou


em 2002 os critérios para o uso das dosagens de hCG para o diagnóstico de doença
gestacional pós-molar13:

1. Plateau de hCG em quatro dosagens – variações de  + 10%, registrados por 3 semanas
ou mais (dias 1, 7, 14 e 21).

2. Níveis de hCG crescente (elevação superior a 10%) em três valores registrados por
2 semanas ou mais (dias, 1, 7  e 14).

3. Persistência de hCG detectável por mais de seis meses após evacuação molar.

Fluxograma de Manejo na DTG


O fluxograma abaixo resume as estratégias diagnósticas e terapêuticas recomendadas
nas DTGs: 
 

Estadiamento e classificação da NTG


Uma vez suspeitado ou estabelecido diagnóstico de NTG, avaliação imediata para
metástases e fatores de risco é  mandatória 13. A estratégia principal de tratamento
para doença persistente metastática ou não é a quimioterapia. O quadro 3 resume os
principais regimes de tratamento do coriocarcinoma baseado nos fatores prognósticos
da OMS 9,10.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Vários sistemas de estadiamento e avaliação prognóstica das NTGs foram desenvolvidos


nos últimos anos. Entretanto em 2001 o sistema de estadiamento anatômico para as
NTGs proposto pela Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia - FIGO, foi
universalmente reconhecido por permitir a comparação da acurácia dos tratamentos
entre os diferentes centros 5, 16.

Estadiamento FIGO:

Estádio I - Tumor confinado ao útero.

Estádio II – Metástase para pelve e vagina.

Estádio III – Metástases para pulmões.

Estádio IV – Metástase à distância (Sistema Nervoso Central, fígado).

A estes estadios deve ser acrescentado um índice obtido do quadro 2. O estadiamento


proposto pela FIGO divide os pacientes em  dois grupos (alto e baixo risco) 8. As
pacientes com escores inferiores a sete devem ser tratadas como de baixo risco e
receber monoquimioterapia. As que apresentem escores iguais ou superiores a sete
são consideradas de alto risco de resistência à monoquimioterapia e devem ser tratadas
com poliquimioterapia. O diagnóstico histológico de coriocarcinoma não modifica o
escore. No entanto, este diagnóstico histológico é indicação de quimioterapia.

Tratamento da Doença de Baixo risco:

Para pacientes de baixo risco, a escolha é a quimioterapia com droga única:


(monoquimioterapia - MQT) com metotrexato ou actinomicina-D. O metotrexato
(MTX), com ou sem ácido folínico de resgate, quase sempre é a principal escolha em
função de sua segurança e perfil de efeitos colaterais15. O MTX é contraindicado no
caso de função renal comprometida e para pacientes com ascite e cistos teca-luteínicos
grandes. Uma metanálise pela The Cochrane Library concluiu que o regime pulsado de
actinomicina D é superior ao uso semanal de metotrexato22. Em caso de toxicidade a uma
das drogas citadas, esta pode ser trocada por outra (metotrexate por actinomicina-D).
Há várias alternativas empregando-se o metotrexate e a actinomicina D. É  possível
obter cura para os casos com baixo risco em cerca de 80% das vezes. Os casos que
apresentam resistência podem ser curados com esquemas de poliquimioterapia.

108
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Alternativas:

a) Esquema de pulso com altas doses de metotrexate (MTX);

b) MTX em injeções intramusculares diárias na dose de 30 mg por dia 5 dias;

c) MTX (30mg/m2 ou 1mg/kg - IM) em dias alternados e ácido folínico (0.1mg/kg) via
endovenosa a cada 24h;

d) Actinomicina-D (ACT), empregada na dose de 10 a 12 microgramas por quilo de


peso, por via endovenosa por 5 dias;

e) Actinomicina-D (ACT): 1,25 miligramas/m2 EV a cada duas semanas.

As taxas de remissão primária de pacientes tratadas com os vários regimes de


quimioterapia para NTG são similares. A quimioterapia com metotrexato ou
actinomicina D deve ser continuada até os valores de hCG normalizarem. Os índices
hematológicos e as funções hepática e renal devem ser monitorizados pela toxicidade
potencial das drogas. A histerectomia deve ser considerada para NTG confinada ao
útero refratária à quimioterapia13.  

Tratamento da NTG de alto risco

Cerca de 10% a 20 % das pacientes classificadas como de baixo risco não serão
curadas com a monoquimioterapia. Se surgem metástases ou a quimioterapia com
agente único falha, a paciente deve ser tratada com regimes de poliquimioterapia É
preciso identificar precocemente estes casos para mudança no esquema de tratamento.
O critério empregado é a falta de redução nos níveis de gonadotrofinas após dois ciclos
ou persistência dos sintomas. Neste caso é necessário o reestadiamento e mudança do
tratamento.

Para estas pacientes, a terapia inicial inclui quimioterapia com múltiplas drogas. O
regime mais difundido é  o EMA/CO 15,21, que tem 80% a 95% de taxa de remissão
e até  84% de sobrevida livre de doença em cinco anos 15,22. Este regime é bastante
tóxico e os efeitos colaterais imediatos incluem alopécia, mucosite, mielossupressão e
neuropatia periférica induzida pela vincristina. Um pequeno risco de desenvolvimento
de tumor secundário está associado ao etoposídeo, podendo ser leucemia (RR 17),
câncer de cólon (RR 4,6) e câncer de mama (RR 5,8).

109
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

O ciclo menstrual geralmente normaliza em dois a seis meses, mas mulheres próximas
ao climatério podem não voltar a menstruar. Para pacientes de alto risco, resistentes ao
tratamento clínico inicial, outros regimes (ex: cisplatina e ectoposídeo, alternado com
EMA) podem ser empregados, assim como a histerectomia em casos selecionados 9,10,
15,16
. Revisão sistemática recentemente publicada pela The Cochrane Library avaliou a
eficácia dos vários regimes de quimioterapia combinados na NTG de alto risco, mas
não foi possível determinar o melhor regime devido às limitações metodológicas dos
trabalhos incluídos 24. 

Situações especiais

1. Mola hidatiforme com feto coexistente

A coexistência de feto e gestação molar é rara, ocorrendo em 1 para 22.000-100.000


gravidezes. Algumas gestações gemelares são diagnosticadas anteparto por exame
ecográfico através de imagem cístico-placentária distinta de uma unidade feto-
placentária. Entretanto, em alguns casos, o diagnóstico não é suspeitado até o parto,
quando a placenta anormal é dequitada 13. Muitas vezes, a gravidez precisa ser
interrompida pelas complicações associadas mesmo antes de atingida a vitalidade fetal
13
. Para pacientes em que existe suspeita de coexistência de mola hidatiforme e feto
não há consenso sobre o manejo. O exame ecográfico deveria ser repetido para excluir
hematoma, outras anormalidades placentárias ou mioma degenerado e para avaliação
morfológica do feto. Se a suspeita diagnóstica persiste e a gravidez é desejada, cariótipo
fetal deveria ser obtido, assim como radiografia de tórax e hCG seriado. Estas pacientes
apresentam alto risco de sangramento, trabalho de parto pretermo e hipertensão induzida
pela gestação e deveriam ser aconselhadas sobre o risco de doença pós-molar após
esvaziamento uterino e/ou parto. Se o cariótipo é normal, não existem malformações
maiores e não existe evidência de doença metastática, é razoável acompanhar a gravidez
a menos que complicações relacionadas à gravidez justifiquem interrupção. Após o
parto a placenta deve ser histologicamente avaliada e a paciente acompanhada de perto
com valores seriados de β-hCG, similar ao manejo da mola hidatiforme única 13. 

2. Diagnóstico clínico da doença trofoblástica gestacional maligna em pacientes


sem antecedentes de mola hidatiforme

A doença trofoblástica gestacional maligna é mais frequentemente diagnosticada pelo


aumento ou plateau de valores de hCG em pacientes em seguimento pós molar13.
O diagnóstico da NTG que não seguiu a gestação molar é em geral retardado e os

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

sintomas podem estar relacionados a metástases à distância. A forma mais frequente


de apresentação é o sangramento de repetição e, sucessivas curetagens não mostram
a presença de material trofoblástico. Outras vezes, em decorrência da perfuração do
miométrio por mola invasora, o quadro é de hemoperitôneo. No entanto, é preciso estar
atento para outras formas, como hemoptise, nódulos pulmonares, lesões expansivas no
sistema nervoso central, entre outras. Em todas estas situações, em mulheres em idade
fértil deve ser solicitada a dosagem sérica ou urinária da gonadotrofina coriônica15.

3. Quando deve se considerar quimioterapia profilática com o objetivo de reduzir o


risco de doença trofoblástica pós-molar após esvaziamento da cavidade uterina?

Dados obtidos de dois ensaios clínicos randomizados avaliaram o uso de quimioterapia


profilática após gestações molares e concluíram que o metotrexato ou a actinomicina
D administrados no momento do esvaziamento uterino pode reduzir o risco de doença
pós-molar persistente de 47% a 50% para 13,8% a 14% em pacientes com mola
completa de alto risco. Um estudo brasileiro com pacientes de alto risco avaliou o uso
da actinomicina D para profilaxia. Demonstrou-se redução da incidência de doença
persistente, dos custos e das complicações emocionais com o uso da quimioterapia
profilática 20. O Centro de Doença Trofoblástica de Harvard Medical School recomenda
que a quimioterapia profilática seja levada em consideração apenas para pacientes com
mola hidatiforme completa de alto risco cujo acompanhamento com hCG não seja
possível ou confiável 6,13. 

4. Testes falso-positivos para β-hCG? Quando suspeitar?

Algumas mulheres mantém níveis de hCG persistentemente elevados após tratamento


com quimioterapia ou cirurgia para NTG. Alguns destes resultados podem ser
considerados como falso-positivos (“β-hCG fantasma”). Em geral, os resultados
falsos-positivos de hCG têm valores pouco elevados, mas valores maiores que 300
mUI/ml são ocasionalmente registrados. Estes falso-positivos resultam de interferência
em ensaios imunológicos de anticorpos heterofílicos não específicos do plasma do
paciente. Caracteristicamente, nestes casos, o plateau de níveis relativamente baixos
não responde a tratamento com metotrexate. A avaliação deveria incluir dosagens
quantitativas de β-hCG por uma variedade de técnicas e ensaios em diferentes diluições
do plasma do paciente, combinado com hCG urinário. Os anticorpos heterofílicos não
são excretados na urina, assim o β-hCG urinário será negativo se tais anticorpos forem
a causa da elevação do hCG sérico. A importância em se excluir a possibilidade de
“β-hCG fantasma” é reduzir o estresse da paciente e da equipe, assim como evitar a
realização de histerectomia ou quimioterapia erroneamente indicadas nestas pacientes
13
.  
111
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

5. Qual é a recomendação para acompanhamento após quimioterapia na NTG?

O período de tempo seguro para seguimento pós-NTG ainda não está claro na literatura
e, por isso, os diversos serviços individualizam suas condutas. O risco de recidiva
geral é de cerca de 3% e ocorre, geralmente, durante o primeiro ano de seguimento.
Em relação à fertilidade, nenhum risco foi atribuído ao metotrexato ou EMA, sendo
que 86% das pacientes apresentam gravidezes bem sucedidas após o tratamento. As
pacientes devem ser aconselhadas a não engravidar por pelo menos doze meses após o
tratamento, não só para prevenir os potenciais efeitos teratogênicos dos medicamentos,
mas também para evitar fatores de confusão com recidiva de doença 15, 16. 

Tumor do sítio placentário


O tumor do sítio placentário é  uma neoplasia relativamente rara que se origina de
células do trofoblasto intermediário e que comumente se apresenta com níveis séricos
variáveis de hCG, o que pode dificultar o diagnóstico diferencial inicial entre neoplasia
trofoblástica gestacional ou doença trofoblástica gestacional quiescente. O marcador
empregado para o diagnóstico desta variante dos tumores placentários  é o hormônio
lactogenio placentário. O tumor do sítio placentário pode ocorrer após gestação normal,
aborto espontâneo, gestação ectópica ou mola hidatiforme. Existe um amplo espectro de
apresentações clínicas e de comportamento biológico que varia desde condição benigna
até doença altamente agressiva e fatal. O diagnóstico diferencial é importante, pois a
estratégia de tratamento deste tipo de tumor difere das outras DTGs 14. A pedra angular
do tratamento do tumor trofoblástico do sítio placentário é a cirurgia (histerectomia)
e, felizmente, a maioria das pacientes com doença confinada ao útero são curadas13, 14.
Os regimes de quimioterapia com EMA/CO (etoposídeo, metotrexato e actinomicina
D, alternados com ciclofosfamida e oncovin) devem ser considerados para os casos
refratários14. 

Sumário de recomendações para Mola Hidatiforme


e doença Trofoblástica Gestacional
1. As seguintes recomendações e conclusões são baseadas em estudos com
evidências científicas consistentes (Grau de recomendação A):

Em mulheres em idade reprodutiva com sangramento uterino anormal e sintomas que

112
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

podem ser causados por moléstias malignas, níveis de β-hCG devem ser avaliados para
facilitar o diagnóstico precoce e tratamento de DTG.

Em pacientes com gravidez molar, o método preferido para esvaziamento uterino é


a curetagem por aspiração. Após esvaziamento molar, todas as pacientes devem ser
monitorizadas com determinações seriadas de β-hCG para diagnosticar e tratar sequela
maligna prontamente.

Contraceptivos orais têm sido considerados seguros e efetivos durante a monitorização


pós-tratamento.

Mulheres com NTG de baixo risco devem ser tratadas com agente quimioterápico
único.

Mulheres com NTG de alto risco devem ser tratadas com quimioterapia combinada.
Estas incluem quimioterapia com metotrexato, actinomicina-D e clorambucil ou
ciclofosfamida associados ao etoposídeo com ou sem cisplatina. O melhor regime de
tratamento ainda não foi definido.

2. As seguintes recomendações e conclusões são baseadas em estudos com


evidências científicas limitadas e inconsistentes (Grau de recomendação B):

Testes falso-positivo devem ser se considerados falso-positivos suspeitos se o plateau


de hCG for relativamente baixo.

Determinações seriadas de β-hCG devem realizadas com ensaios com alta sensibilidade
capazes de detectar valores <5mUI/ml. Idealmente, níveis séricos de hCG devem ser
obtidos com 48 horas após esvaziamento uterino, a cada 1-2 semanas enquanto estiver
elevado, e então, a cada 1-2 meses por mais 6-12 meses.

Em pacientes selecionadas com DTG de alto risco, o uso de quimioterapia profilática


com actnomicina-D ou metotrexato no momento do esvaziamento uterino pode reduzir
o risco de doença molar persistente.

3. As seguintes recomendações e conclusões são baseadas primariamente em


consensos e opiniões de especialistas (Grau de recomendação C):

Sangramento anormal por mais de seis semanas seguindo qualquer gravidez deve ser
avaliado com teste de hCG para excluir nova gravidez ou DTG.

113
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Em pacientes com adequado seguimento, baixa morbidade e mortalidade é obtida com


monitorização seriada de hCG.

Complicações graves não são incomuns em mulheres com úteros de volumes maiores
que o correspondente a 16 semanas de gestação, assim elas deve ser conduzidas por
profissionais experientes em prevenção e manejo das complicações de NTG.

Pacientes para as quais a terapia inicial para NTG não metastática ou de baixo risco
falhou e aquelas com NTG de alto risco devem ser tratadas com equipe multidisciplinar
e em serviços com serviços com suporte adequado. 

Quadro 2 - Sistema de escore da Organização Mundial de Saúde para classificação das


pacientes com doença persistente (mola invasora ou doença metastática) 15.

FATORES / Escores 0 1 2 4

Idade (anos) - - 39 - + 39
Prenhez anterior meses Molar Aborto Termo -
Intervalo gravidez -4 4a6 7a +12
ȕ-hCG (UI/ml) - 103 103 a 104 104 a 105 + 105
Sistema ABO - O ou A B ou AB -
Diâmetro tumor - 3 cm 3 a 5 cm + 5 cm -
Sítios de metástases Pulmão Baço ou rim TGI e fígado Cérebro
Número de metástases - 1a3 4a8 +8
Quimioterapia Prévia - - Droga única 2 ou + drogas

114
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

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116
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

CUIDADOS PALIATIVOS

Introdução
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define cuidados paliativos como uma
abordagem que melhora a qualidade de vida de pacientes e de suas famílias, enfrentando
problemas associados com doenças que ameaçam a vida, através da prevenção e alívio
do sofrimento por meio da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento da
dor e outros problemas físicos, psicossociais e espirituais 1.

Ainda pela definição da OMS, os cuidados paliativos devem ser destinados a pacientes
que não respondem mais a tratamentos com intenção curativa 1.

No livro de Clinical Gynecologic Oncology, Monk define cuidados paliativos como


“os cuidados interdisciplinares com vistas a prevenir, aliviar ou reduzir os sintomas de
uma doença ou desordem, sem efetuar a cura” 2.

Portanto, o objetivo é a obtenção da melhor qualidade de vida possível para pacientes


e familiares.

O novo Código de Ética Médica do Conselho Federal de Medicina do Brasil - Resolução


Nº. 1.931, de 17 de setembro de 2009, em seus Princípios Fundamentais, capítulo I,
item XXII, diz: “Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a
realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará
aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados” 3.

Na paciente com câncer a progressão da doença para situações onde a possibilidade


de terapêutica de intenção curativa é mínima ou inexistente, leva o paciente e sua
família à situação de confrontar-se com a premência da morte e todas as questões
psicológicas, sócias e espirituais envolvidas com a finitude da vida. Esse é um dos
aspectos importantes a serem trabalhados em cuidados paliativos, além do controle
rigoroso de sintomas.

Por isso os cuidados paliativos utilizam uma abordagem multidisciplinar para atender
as necessidades dos pacientes, onde se inclui a oferta de um sistema de suporte para
ajudar as famílias a lidar com o processo de doença e luto.

117
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Mas, para que os resultados sejam satisfatórios é necessário que sejam conhecidos,
alem do paciente, a sua família, seus amigos e seus relacionamentos. Dessa forma serão
entendidas suas necessidades físicas, psíquicas e espirituais. O ideal é que a equipe
multidisciplinar possa dispor também de um religioso 4.

Ao contrário da opinião corrente, a oferta de cuidados paliativos não deve se restringir


às últimas semanas de vida. Muitos aspectos são aplicáveis precocemente no curso
da doença em conjunto com tratamentos que podem modificar o curso da mesma, tais
como a quimioterapia, radioterapia e cirurgia.

No início dos cuidados com a paciente os efeitos colaterais da terapêutica devem ser
prevenidos; na vigência da terapêutica os sintomas devem ser tratados; na progressão
da doença os novos sintomas que aparecerem serão abordados, levando em conta o
prognóstico e o desejo expresso pela paciente e sua família5.

Os cuidados paliativos começam quando ao invés de oferecer a certeza divina da cura,


oferecemos a dúvida inquietante da realidade.

Cuidados paliativos em ginecologia oncológica


Como em quase todas as neoplasias, as chances de cura dependem do diagnóstico
precoce e do tratamento efetivo. Quando opções terapêuticas potencialmente curativas
não são disponíveis ou efetivas, o objetivo clínico muda da cura para a paliação, muitas
vezes, desde o diagnóstico inicial.

Quando o paciente apresenta um quadro novo ele pode se dever à progressão do câncer,
às complicações dele advindas, aos efeitos colaterais da terapia ou ser um problema
não ligado à neoplasia maligna.

Nem todos os sintomas agudos devem ser investigados em detalhe, bem como muitos
nem serão tratados, mas sim contornados. Isso se torna mais consistente nos casos em
que não esperamos uma recuperação ou uma vida útil adequada para a paciente.

As várias neoplasias ginecológicas, embora originadas de órgãos anatomicamente


adjacentes, apresentam distintos padrões de progressão, com os sintomas dessa
progressão variando em relação à origem do tumor primário. Embora exista uma ampla
gama de neoplasias, dois padrões mais frequentes podem ser estabelecidos, o da doença
pélvica extensa e o da disseminação peritoneal.

118
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

1. Neoplasias com predomínio de doença pélvica

Quando as pacientes apresentam metástases à distância ou recorrência da doença


pélvica, a neoplasia já não é mais passível de cura e, nesse contexto, qualquer tratamento
administrado tem intenção paliativa. Como usual, o tratamento paliativo deve ter por
objetivo a prevenção ou o controle dos sintomas, de preferência, sem acrescentar
sintomas igualmente ruins ou piores.

As pacientes com neoplasias com predomínio de crescimento pélvico, como o carcinoma


do colo uterino, mais frequentemente apresentam os seguintes sintomas:

- Sangramento vaginal e corrimento fétido,


- Dor pélvica ou lombar,
- Fístulas urinárias ou intestinais,
- Edema das extremidades inferiores,
- Trombose venosa profunda,
- Dispnéia por anemia ou envolvimento pulmonar metastático,
- Uremia por obstrução ureteral bilateral.

1.1. Sangramento vaginal e corrimento fétido

As intervenções disponíveis para o controle do sangramento vaginal incluem o tampão


vaginal, radioterapia, embolização de artérias uterinas, ressecção cirúrgica paliativa,
ou ligadura arterial.

O tampão vaginal geralmente é uma medida temporária, utilizada em pacientes com


estado geral muito ruim, onde os outros métodos não são possíveis, ou enquanto se
viabilizam outras abordagens. A solução de Monsel (subsulfato férrico) é disponível
fora do país em formulações gelatinosas (AstrinGyn®, da CooperSurgical™), mas
precisa ser manipulado em solução a 15,5% (sulfato ferroso 1.045g; ácido sulfúrico
55ml; ácido nítrico, gota a gota, até mudança da coloração para a cor roxa; água
destilada para fazer 1.000ml de solução). O tampão de gases é embebido nessa solução
e aplicado na vagina.

Outra opção é aplicar uma pequena quantidade de formalina à superfície do tampão,


aumentando temporariamente o efeito dessa medida. [05] Uma solução um pouco mais
cara é a aplicação de curativos com alginato de cálcio, associados ou não ao carvão
ativado.

119
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

A atitude, usual em nosso meio, de colocar cubas com soluções fenólicas sob o leito
do doente parecem ter efeito puramente psicológico, não aliviando o desconforto das
pacientes.

Outras abordagens potencialmente úteis incluem o tratamento transvaginal com


ortovoltagem, teleradioterapia com frações de alta dose (hipofracionamento) ou
braquiterapia. O tipo e duração do tratamento dependem do grau de desempenho da
paciente e da dose de radioterapia eventualmente já empregada. Em pacientes com
bom desempenho, pode-se considerar a radiocirurgia estereotáxica para controlar o
sangramento6.

Sangramentos mais profusos ou hemorragias fulminantes podem requerer a


embolização das artérias uterinas, realizadas por radiologia vascular intervencionista.
Se a embolização dirigida radiologicamente não for disponível, laparotomia ou
laparoscopia podem ser necessárias para a ligadura das artérias uterinas, ou as divisões
anteriores das artérias hipogástricas. Estas medidas intervencionistas podem não ser
apropriadas quando a doença está amplamente disseminada ou quando existe uma
ameaça iminente à vida da paciente, mas pacientes cuidadosamente selecionadas
podem ser beneficiadas.

A anemia sintomática decorrente da perda sanguínea poderá ser paliada com transfusões
sanguíneas.

Os casos de anemia crônica, em especial os que dependem do próprio câncer, só serão


tratados se a paciente mantém atividade física e a anemia está sendo causa de limitação.
Nessa eventualidade a melhor abordagem é a aplicação de concentrado de hemácias,
que poderá ser indicada periodicamente.

No corrimento fétido o uso de antibioticoterapia sistêmica tem por objetivo a prevenção


de bacteremias e sepse. Porém, a hipovascularização tumoral com presença de áreas
de necrose, fazem com que os antibióticos raramente consigam níveis terapêuticos nos
tecidos tumorais, sendo de pouca ajuda no controle local da infecção.

A higienização rigorosa produzirá diminuição do sinal e sintoma.

1.2. Dor pélvica ou lombar

A dor é frequentemente um sintoma incapacitante do carcinoma cervical avançado ou


recorrente. O envolvimento de nervos regionais, músculos e a infiltração da parede

120
FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

óssea podem causar dor, assim como o processo inflamatório associado à lesão tumoral.
Os analgésicos opióides são o componente fundamental para o tratamento da dor
associada ao câncer. Seu uso está muito bem estabelecido e didaticamente orientado
pela publicação da escada analgésica da Organização Mundial da Saúde 7.

É importante prevenir adequadamente os eventos adversos associados ao uso dos


opióides, tais como a constipação, prurido, náusea, tontura, sonolência e disforia. Uma
vez que a constipação é quase universal com o aumento das doses dos opióides, medidas
para estimular o funcionamento intestinal devem ser utilizadas simultaneamente 8.

Anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) e certas medicações antidepressivas


podem apresentar um efeito sinérgico favorável quando prescritas em conjunto com os
opióides, especialmente quando há um componente neuropático significativo na dor.

Quando a dor é diretamente atribuída a um foco específico da doença, como metástases


ósseas ou recorrência linfonodal para-aórtica, um curso breve de radioterapia pode
fornecer substancial redução da dor numa alta porcentagem de pacientes. No entanto,
o alívio adequado da dor pode não ser alcançado até uma a duas semanas após a
radioterapia paliativa, período no qual outras medidas analgésicas serão necessárias.

A estimulação neural transdérmica (TENS), massagens e meditação ou técnicas de


“biofeedback” são adjuntos úteis para terapia da dor.

A analgesia epidural pode ser particularmente útil em pacientes com dor regional
pélvica com a vantagem de não ocasionar os efeitos colaterais da terapia sistêmica.

A ansiedade e a depressão são comorbidades frequentes em pacientes com neoplasias


malignas de qualquer tipo. Embora não sejam respostas inadequadas em paciente
diagnosticada com doença potencialmente fatal, reconhecê-las e iniciar a intervenção,
o mais rápido possível, é crucial. A menos que estas condições sejam tratadas
adequadamente, as pacientes podem não apresentar boa adesão a outros tratamentos
importantes. Além disso, os esforços para o controle da dor ficarão particularmente
comprometidos.

Várias terapias eficazes estão disponíveis para ambas as condições. Além de ansiolíticos
e antidepressivos, o aconselhamento psicológico de apoio, aconselhamento espiritual,
e suporte familiar adequado podem ajudar a combater os sentimentos de depressão e
ansiedade.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

1.3. Fístulas

1.3.1. Fístulas urinárias

Nos carcinomas cervicais as fístulas vesicovaginais são mais frequentes do que


as ureterovaginais. A perda constante de urina é extremamente perturbadora para a
maioria das pacientes. Embora não necessariamente dolorosas, a drenagem fistulosa
pode exercer um impacto extremamente negativo na qualidade de vida.

Em decorrência do odor constante, as pacientes com fístula podem, muitas vezes, optar
por evitar encontros sociais e familiares, ficando reclusas em seu lar. A vida sexual, se
existente, fica extremamente comprometida.

A paliação de fístulas pode ser realizada cirurgicamente por derivação interna


ureterointestinal ou pela colocação de cateteres através da nefrostomia percutânea,
uni ou bilaterais, que descomprimem ou derivam os ureteres. A derivação interna é
mais cômoda, mas envolve um procedimento cirúrgico de maior monta. A nefrostomia
percutânea, que pode ser guiada por ultra-sonografia, é um procedimento mais simples,
mas envolve a colocação de um coletor externo, que também compromete a imagem
corporal e a qualidade de vida.

Embora a colocação de tubos na nefrostomia seja um procedimento mais simples do


que o desvio cirúrgico ureteral, não é necessariamente a melhor opção para pacientes
com uma expectativa de vida maior de quatro a seis meses. Outras desvantagens da
nefrostomia percutânea são a relativa facilidade com que esses cateteres podem ser
dobrados ou deslocados, o fto de poderem ser fonte de infecção e a necessidade de
troca no máximo a cada três meses.

O estado funcional da paciente, seus desejos e o risco operatório devem orientar a


escolha do melhor meio de tratamento paliativo.

1.3.2. Fístulas intestinais

Ocasionalmente, podem ocorrer fístulas retovaginais a partir de invasão do tumor


primário no reto adjacente. No entanto, são mais frequentemente resultado de necrose
produzida pela radiação ou recorrência e progressão do tumor. Uma colostomia de
desvio é o procedimento cirúrgico de escolha a menos que a paciente tenha uma vida útil
muito limitada. A colostomia terminal, com sepultamento do coto distal está associada
com menores complicações a longo prazo do que as colostomias em alça.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

O uso de absorventes externos (fraldas) para absorver a drenagem de urina ou fezes


é a opção mais simples de todas. No entanto, a experiência mostra que, a menos
que a paciente esteja confinada à cama por outros motivos, essa escolha é altamente
indesejável para a maioria das pacientes. Além do evidente efeito deletério sob o
estado psicológico, as fraldas podem se associar a dermatites amoniacais, aumentando
a chance para úlceras de pressão, e favorecendo o surgimento de infecções cutâneas
secundárias.

1.4. Edema das extremidades inferiores

O edema das extremidades inferiores pode ser componente de anasarca generalizada,


secundária à depleção protéica e desnutrição como podem ser consequência da obstrução
linfática ou venosa decorrente de um grande comprometimento tumoral nos linfonodos
pélvicos, causando seu aumento e compressão extrínseca sobre os vasos pélvicos.

O alívio sintomático do edema e desconforto da perna pode ser obtido pelo uso de meias
de compressão graduada, elevação das extremidades, e administração de diuréticos.

O uso de diuréticos deve ser feito com bastante parcimônia, pois são pouco efetivos
no edema discrásico e nos casos de compressão extrínseca dos vasos pélvicos. Nessas
circunstâncias os diuréticos podem produzir a sensação desagradável de boca seca,
hipotensão postural e, em casos mais graves, desidratação e distúrbios eletrolíticos.

Fisioterapeutas com adequada formação em cuidados paliativos e especializados


no tratamento do linfedema podem facilitar a drenagem lde líquidos com manobras
de massagem externa e posicionamento adequado de ataduras de compressão
(bandagem).

1.5. Trombose venosa profunda

A trombose venosa profunda (TVP) pode causar edema secundário. Para TVP em
desenvolvimento por qualquer outra razão, o tratamento anticoagulante é padrão de
conduta a menos que clinicamente contraindicado.

O uso inicial de heparina convencional ou de baixo peso molecular é geralmente


seguido de varfarina oral. A anticoagulação prolongada é geralmente necessária porque
muitas vezes ocorre recorrência da TVP em neoplasia avançada, que costuma cursar
com o estado de hiper-coagulabilidade.

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

A anticoagulação pode agravar a hemorragia de lesões sangrantes. Nessas circunstâncias,


os filtros de veia cava são, por vezes, preferíveis para prevenir embolia pulmonar.
Também podem ser usados quando a anticoagulação estiver contraindicada.

1.6. Dispnéia por anemia ou envolvimento pulmonar metastático

Na paciente com câncer em estágio avançado, a dispnéia tem muitas causas potenciais
que precisam ser consideradas e investigadas. As causas potenciais de dispnéia incluem
anemia, derrame pleural, infecção, insuficiência cardíaca, linfangite ou propagação
metastática do câncer.

As transfusões de sangue podem melhorar rapidamente a dispnéia decorrente de anemia.


O estímulo de células progenitoras hematopoiéticas com o uso de eritropoietina pode
fornecer o mesmo benefício no alívio do sintoma, mas de uma forma mais lenta.

A toracocentese com pleurodese pode melhorar os sintomas de um derrame pleural


neoplásico. A drenagem do líquido deverá ser seguida pela instilação pleural de
talco ou doxiciclina para promover a pleurodese. A esclerose da cavidade pleural por
toracotomia videoassistida (VATS) também pode ser considerada para atingir maior
eficácia com menor tempo de internação hospitalar. A vantagem dessa abordagem
consiste em poder desfazer eventuais lojas pleurais que tenham se formado.

A presença de pneumonia ou insuficiência cardíaca deve ser tratada como na paciente


sem neoplasia.

A linfangite neoplásica é um quadro grave que faz parte da chamada “crise visceral”.
Ela cursa com hipóxia e dispnéia severa. O uso de oxigênio não costuma causar alívio
dos sintomas, sendo necessário o uso de narcóticos para amenizar o sofrimento da
paciente. Na presença de linfangite, deve-se avaliar a a administração de tratamento
quimioterápico antineoplásico, com intenção paliativa.

Quando não há indicação para quimioterapia e não se obtém alívio sintomático


significativo com o uso de opióides, a sedação terminal é um recurso ético e lícito para
aliviar o sofrimento da paciente.

1.7. Uremia por obstrução ureteral bilateral

Progressiva ou recorrente, a neoplasia do colo uterino pode causar uremia secundária à


obstrução ureteral. Por sua vez, a uremia pode provocar náuseas, vômitos, sonolência,

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confusão mental e convulsões. A uremia não tratada será fatal após um curto período
de coma urêmico.

A morte pode ser adiada se a obstrução ureteral é aliviada por uma nefrostomia
percutânea ou cateteres ureterais (duplo “J”). Procedimentos dialíticos estão indicados
apenas em ocasiões raras e excepcionais.

Se houver outras complicações intercorrentes ou franca progressão da doença, que


se mostra refratária à intervenção médica ou cirúrgica, embora o alívio da obstrução
ureteral possa proporcionar melhora transitória na excreção do ácido úrico e outros
produtos residuais, isso só prolonga a dor e o sofrimento do paciente. Uma conversa
franca com o paciente, se possível, e o aconselhamento familiar é necessária para
identificar o ponto em que uma nova intervenção médica se torna inadequada neste
ajuste.

1.8. Outros sintomas

1.8.1. Náuseas e vômitos

As duas ocorrências podem ser resultados da obstrução mecânica do intestino ou de


alterações metabólicas, tais como uremia, infecção ou metástases do sistema nervoso
central.

Os vômitos decorrentes da obstrução do intestino delgado podem ser aliviados pela


ressecção segmentar e reanastomose ou pelo desvio do trânsito intestinal por ileostomia,
gastrostomia percutânea, ou sonda nasogástrica.

A obstrução do cólon geralmente ocorre no reto ou sigmóide. A realização de colostomia


em alça transversal, ou a colocação de um tubo de cecostomia, são modos rápidos e
relativamente fáceis de contornar esse problema.

As causas metabólicas de náuseas e vômitos podem ser aliviadas, sempre que possível,
pela correção do desequilíbrio metabólico. A hipercalcemia é uma manifestação
paraneoplásica rara do câncer ginecológico metastático, mas quando presente pode ser
a causa de náuseas e vômitos. Hidratação vigorosa, diuréticos, corticosteróides, cálcio
e bisfosfonatos devem ser considerados.

O alívio sintomático imediato das náuseas pode ser obtido com o uso de fenotiazinas,
anti-histamínicos, corticóides, ou antagonistas 5HT-3. Náuseas e vômitos causados por

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metástases do cérebro podem ser melhoradas através da utilização de radioterapia, se


possível, e esteróides.

1.8.2. Diarréia

Também pode acompanhar o câncer avançado ou recorrente. Quando a diarréia resulta


de toxicidade gastrointestinal aguda da radioterapia pélvica, o sintoma se resolve,
quase, sempre dentro de poucas semanas após a conclusão do tratamento. Agentes
que reduzem a diarréia incluem anticolinérgicos e derivados de opiáceos como a
loperamida, codeína, difenoxilato sódico com atropina, kaopectate, elixir paregórico
ou colestiramina.

Ocasionalmente a diarréia continua por um longo prazo, como efeito adverso, após
o sucesso do tratamento do câncer cervical. Nesse caso a diarréia pode ser resultante
da inflamação crônica da mucosa do íleo terminal (onde a reabsorção de ácidos
biliares pode ser prejudicada) pela radioterapia pélvica. Nesse caso o quadro ocorre
especialmente quando os pacientes experimentam exacerbação com a ingestão de
alimentos gordurosos. As modificações na dieta podem ser particularmente úteis nessas
situações, principalmente se correlacionadas com a adição de glutamina à dieta.

Em casos refratários de enterite actínica, com má absorção, em pacientes de bom


grau de desempenho e sobrevida prolongada, algumas pacientes podem necessitar de
ressecção ou desvio do intestino delgado.

2. Neoplasias com predomínio de doença peritoneal

A maioria dos casos será neoplasia maligna ovariana recorrente, que raramente é
curável, mas pode ocorrer também com neoplasia do corpo uterino e da tuba uterina,
que é raridade. A quimioterapia de segunda, terceira, quarta linha ou mais, muitas
vezes é administrada de forma paliativa, tanto para diminuir os sintomas e como para
prolongar a vida, mas com remotas chances de cura. Quando as opções quimioterápicas
estão esgotadas ou os efeitos adversos não valem o pequeno potencial de benefícios,
outros meios de amenizar os sintomas decorrentes da progressão da neoplasia do ovário
são necessários.

A doença peritoneal é causa direta de morbidade e mortalidade muito mais comuns do


que os sintomas relacionados à recorrência, especificamente no local do tumor primário
ou à distância em sítios extra-abdominais.

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As pacientes com neoplasias com predomínio de crescimento peritoneal, como o


carcinoma do ovário, mais frequentemente apresentam os seguintes sintomas:

- Obstrução intestinal,
- Ascite neoplásica volumosa,
- Anorexia e caquexia neoplásicas.

2.1. Obstrução intestinal

A obstrução intestinal é um resultado frequente durante a progressão da neoplasia de


ovário. A obstrução do retossigmóide é mais bem atenuada com uma colostomia em
alça do cólon transverso9.

Muitas vezes, uma pequena incisão no local do estoma é tudo o que é necessário para
identificar o cólon proximal dilatado e elevá-lo através da parede abdominal anterior.
O estoma começa a funcionar imediatamente, e os pacientes podem comer e voltar ao
seu estado funcional basal de forma bastante breve10.

A cecostomia com a colocação de sondas pode ser usada para aliviar o intestino grosso
na obstrução do cólon. No entanto, os sítios de cecostomia são propensos a obstrução
recorrente por fezes sólidas. Por isso, a colocação de sondas é mais adequada em
pacientes com expectativa de vida extremamente curta11.

A obstrução do intestino delgado é mais desafiadora. A presença de múltiplas áreas de


obstrução intestinal, mesmo que parciais e pequenas, normalmente não são passíveis
de correção cirúrgica. Implantes de tumor na superfície do intestino podem provocar
aderências no mesentério e impedir o peristaltismo, levando a um quadro de íleo
adinâmico.

Raramente a obstrução intestinal isolada ou em pontos limitados pode ser controlada


com ressecções intestinais segmentares. A taxa de complicações pós-operatórias é
proporcional ao número de anastomoses realizadas. Mais frequentemente, a paliação
da distensão abdominal é conseguida com a colocação de um tubo de gastrostomia
percutânea com drenagem por gravidade, ou com sonda nasogástrica em aspiração.

A conduta medicamentosa também pode ser benéfica para diminuir as secreções


gastrointestinais. Para isso se utiliza somatostatina combinada com eritromicina.

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2.2. Ascite neoplásica volumosa

A ascite pode ser o resultado da infiltração neoplásica generalizada, macroscópica e


microscópica, sobre o peritônio, impedindo a absorção do líquido peritoneal.

O quadro pode se tornar bastante incômodo quando a doença é progressiva e não


responde mais à quimioterapia antineoplásica. As pacientes se queixam de dor
abdominal difusa, saciedade precoce, vômitos, fadiga e sensação falta de ar.

Os diuréticos são de eficácia limitada. O alívio é obtido mais facilmente com a realização
de paracenteses repetidas. A colocação de um cateter semipermanente para drenagem,
livra a paciente do desconforto e do risco de punções repetidas. O impacto metabólico é
a depleção da albumina, que agrava a condição geral e o estado nutricional. No entanto,
a melhora imediata, mesmo que temporária no conforto do paciente geralmente tem
precedência sobre as alterações em longo prazo do estado nutricional do paciente que
tem uma doença incurável.

3. Outras situações

3.1. Anorexia e caquexia neoplásicas

A anorexia pode ocorrer como um dos componentes da obstrução intestinal ou da


ascite. Na anorexia sem obstrução intestinal associada, o tratamento com acetato de
megestrol ou esteróides pode estimular o apetite e levar a um aumento da sensação de
bem-estar.

Suporte nutricional parenteral pode ser adequado como medida de curto prazo, mas não
há evidências de que possa resolver a caquexia instalada. A necessidade da intervenção
médica constante, no domicílio (Home Care) ou sobinternação, tornam essa medida um
procedimento inadequado em longo prazo.

A inapetência que ocorre na doença avançada, geralmente é devida à alteração do


paladar, mas pode se dever à produção de proteínas que suprimem o apetite. Ambas
as causas levam o paciente a se desinteressar pelos alimentos. As pacientes costumam
apresentar elevação do umbral de percepção para sabores doces e diminuição para os
amargos. A queixa comum é que a comida não tem gosto e que a carne bovina tem
mau sabor. A conduta será acrescentar açúcar na dieta e recomendar o uso de carnes de
peixes e aves, além de queijos e ovos para suprir a necessidade de ingestão protéica.

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As dietas líquidas mais simples e em pequenas quantidades costumam ser mais bem
toleradas. Alimentos ricos em gorduras devem ser evitados. Antieméticos podem auxiliar.
Não há indicação para alimentação parenteral e nem para complexos programas de
apoio nutricional. Nos casos agudos em que a paciente fica impedida temporariamente
de se alimentar, pode ser considerada a alimentação por sonda gástrica.

A anorexia que advém da presença de metástase hepática, raramente ameaça a função


do órgão, porem dá efeitos sistêmicos devastadores e se acompanha de mal estar e
febre. Caso a metástase seja um nódulo único, não haja outros órgãos com metástases e
o quadro clínico permita, a sua exérese será benéfica. Neste caso deve ser considerado
o risco da hemorragia, que, se ocorrer leva à morte um quarto das pacientes.

3.2. Compressões do sistema nervoso central

Geralmente se devem à presença de tumor metastático no cérebro ou expansão


extrínseca, no caso da medula.

Quando é cerebral a radioterapia poderá ser indicada quando se espera sobrevivência


acima de 30 dias. Os corticóides são úteis no controle dos sintomas, com melhora
rápida (menos de 24 horas), que pode durar até 6 semanas.

Quando ocorre na medula espinhal o quadro é necessita cuidados de emergência. O


tratamento é impositivo exceto em moribundos, porque a paraplegia é psicologicamente
devastadora. A terapêutica será com corticóides em altas doses, seguido da
radioterapia.

3.3. Fadiga

A fadiga é entendida como a diminuição da energia, da capacidade mental e das


condições psicológicas da paciente com câncer, constituindo-se no quadro mais
prevalente menos compreendido nas pacientes portadoras de neoplasias malignas, com
taxa de ocorrência entre 60% a 96% dos casos12.

Embora não seja entendida há fatores potencialmente predisponentes que segundo


Portenoy são fisiológicos e psicossociais.

A fadiga na vigência de quimioterapia ocorre na quase totalidade das pacientes; ocorre


durante a radioterapia e também no câncer persistente e avançado.

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O quadro não é mesmo do apresentado pela população, no sentido de cansaço ou de


astenia. A fadiga na vigência de tratamento oncológico ou na paciente portadora de
câncer avançado é mais subjetiva e multidimensional12.

Segundo a proposta de Cella et al, os critérios para o diagnóstico são a presença 5 ou


mais critérios, a seguir relacionados, que ocorrem todos ou quase todos os dias em 2
semanas no mês anterior:

- fraqueza generalizada ou sensação de peso nos membros superiores ou inferiores,


- diminuição da concentração ou atenção,
- diminuição da motivação e interesse nas atividades usuais,
- insônia ou excesso de sono,
- sensação de que o cochilo não descansa,
- percepção da necessidade de esforço para sair da inatividade,
- reatividade emocional excessiva como tristeza, frustração e irritabilidade, quando
está fatigado,
- dificuldade de completar as tarefas diárias, atribuindo isso à fadiga,
- percepção dos problemas com a memória de curto tempo,
l-assidão persistente, durando muitas horas, após exercícios físicos anteriores.

3.4. Respiração agônica

Ela se deve ao acúmulo de secreções na árvore brônquica. O estado da paciente


angustia muito aos familiares, pois, em geral, a paciente encontra-se inconsciente ou
semiconsciente. A conduta envolve o esclarecimento da família, posição semisentada
da paciente, aplicação de anticolinérgico (escopolamina ou atropina) na tentativa
de diminuir secreção pulmonar e sedativos como o midazolan que é útil na crise
estertorosa.

3.5. Sedação terminal

Nem sempre se consegue aliviar adequadamente todos os sintomas e o sofrimento


humano. Nas situações em que o prolongamento da vida está associado a grande
sofrimento, sem perspectivas de dignidade, é lícito que se possa aliviar o sofrimento
através da sedação terminal.

De forma ideal esse procedimento deve ter sido discutido com o paciente durante o
curso de sua doença. Caso não se tenha discutido esses aspectos, e na impossibilidade de
fazê-lo, a opção da sedação terminal deve ser discutida com a família e adequadamente

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registrada no prontuário do paciente.

Não se trata de eutanásia. O objetivo primordial não é produzir a morte, e sim o alívio
de sintomas estressantes que não pode ser conseguido por meio de outras medidas
medicamentosas ou não medicamentosas. Nessa situação se aceita o denominado
“duplo-efeito”, ou seja, a administração de uma medicação para aliviar o sofrimento,
mesmo sabendo-se que paralelamente ela possa abreviar a vida.

A sedação terminal não deve ser feita com opióides. Embora os opióides possam
produzir sonolência e narcose, eles mantêm a atividade cerebral e seus efeitos
psicotomiméticos podem levar a paciente a uma situação de pesadelos e desconforto.
Idealmente a sedação é feita com psicotrópicos, sendo os mais utilizados a infusão
contínua de fenobarbital, ou a administração regular de haloperidol.

A filosofia dos cuidados paliativos além do alívio


dos sintomas
Os cuidados paliativos como foram visto, não devem ser destinados apenas a pacientes
em fase avançada da doença. O adequado controle de sintomas deve ser instituído
em todas as fases da doença para pacientes com diagnósticos onde possa haver uma
limitação da quantidade e da qualidade de vida.

O controle ativo dos sintomas é parte indispensável na manutenção da qualidade de


vida e do humanismo no cuidar, devendo ser o foco de atenção primária de todos os
profissionais envolvidos no cuidado de pacientes com doenças para as quais não há
uma possibilidade concreta de cura.

Evitar, aplacar ou eliminar os sintomas não se refere apenas ao sofrimento físico, mas
a todas as dimensões do sofrer, incluindo aspectos emocionais, sociais e espirituais.
Na visão holística do ser humano, o sofrimento não orgânico contribui de forma
marcante e significativa na manifestação do somático, devendo merecer o mesmo grau
de atenção.

Precedendo o surgimento de sintomas físicos expressivos, com desconforto e limitação


funcional, há a angústia. Sua gênese está no processo progressivo do diagnóstico de uma
doença grave, como a doença neoplásica, indo da suspeita às constatações. A percepção
adequada da realidade está imiscuída a processos fantasiosos que os pacientes criam.

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É construído um cenário onde a interpretação de sinais e sintomas adquirem os mais


diversos significados, com implicações nos mecanismos de enfrentamento e graus
variados de adequação.

A ajuda emocional é imprescindível. Para sua efetivação, o primeiro aspecto a


considerar é a comunicação para o paciente do seu real estado de saúde. A revelação do
diagnóstico é necessária, pois os estudos mostram que a maioria dos pacientes deduz
o que está acontecendo.

Para isso, o médico precisa entender e reconhecer suas próprias emoções e ansiedades em
relação àquela paciente. Isso inclui as sensações de culpa e de raiva pelo insucesso.

O segundo aspecto é entender que o paciente estará vivendo processos de negação,


ansiedade, identificação e racionalização.

O terceiro aspecto é a família que, muitas vezes, quer evitar que o paciente se inteire
do seu estado de saúde. Porém a conversa franca é necessária e deve contar com a
presença de um familiar.

A confiança é imprescindível e não suporta subterfúgios. Nem sempre a verdade deve


ser colocada em toda sua dimensão, mas enganar o paciente quebrará definitivamente o
elo de confiança. O limite da verdade é a manutenção da esperança4.

Nas doenças crônico-degenerativas de lenta evolução a angústia ocorre muito mais


pela qualidade do que pela quantidade de vida. A previsão de uma qualidade de vida
ruim, com perdas significativas em termos de autonomia ou integridade intelectual, faz
com que, muitas vezes, os pacientes aceitem mais facilmente uma limitação do tempo
de sobrevida em troca da manutenção da integridade física e psicológica.

Futilidade
O assunto é controverso. A realização de tratamentos que não trazem benefício nenhum
ao paciente deve ter um limite.

A maior dúvida que existe é relativa ao número de intervenções que seria razoável
fazer para um determinado paciente. Isso se torna patente no caso de câncer ovariano,
que tem várias linhas de quimioterapia. Quantas linhas devem ser tentadas para uma
determinada paciente na procura de eficácia?

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O JAMA publicou uma sequência de ações nessa consideração, que está transcrito a
seguir e pode ser o embasamento da conduta.

Deliberação sobre as avaliações já existentes


Não há acordo Há acordo

Transferir os cuidados Decisão conjunta usando os dados


dos resultados e o julgamento da
avaliação
Não há acordo Há acordo

Envolver consultoria Prosseguir os cuidados

Não há acordo Há acordo

Envolver o comitê de ética Prosseguir os cuidados

Não há acordo Há acordo

Transferir os cuidados Prosseguir os cuidados


dentro da instituição
Impossível Possível

Transferir para outra Prosseguir os cuidados


instituição
Impossível Possível

Cessar a intervenção Prosseguir os cuidados


fútil
Adaptado de futilidade médica e cuidados do fim de vida13

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FEBRASGO - Manual de Orientação Ginecologia Oncológica

Referências Bibliográficas
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2010

Federação Brasileira das Associações


de Ginecologia e Obstetrícia

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