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Alfândega de Vitória 1906 | foto: Eutychio D’Oliver

Luiz Cláudio Ribeiro


Nicélio Barros

fotografias

David Protti

A Serventia da Casa
A Alfândega do Porto de Vitória
e os rumos do Espírito Santo

Vitória • 2008
Ficha técnica Secretário da Receita Federal do Brasil

Pesquisa Jorge Deher Rachid


Luiz Cláudio Ribeiro Superintendente da 7ª Região Fiscal
David Protti Cesar Augusto Barbiero
Nicélio Barros
auxiliares Alfândega da Receita Federal do Brasil
Diego Braga Barbosa do Porto de Vitória
Janayra Maris Teixeira José Henrique Mauri |Inspetor-chefe|
Tito Sousa da Silva
Alexandre Barreto de Souza |Inspetor-chefe substituto|
Renan Bolonha Sancio
Ruth Braga Bomfim |Assessoria de Comunicação|
Texto
Luiz Cláudio Ribeiro Mário Cesar de Lana Torres |Assessoria de Administração Aduaneira|
Nicélio Barros Elza do Carmo Domingos Soares |Secretária|
Imagens Luciano Zamilute Teixeira |Chefe do SEORT|
David Protti William Lara |Chefe do SEDAD|
Revisão de Texto Ezequias Moreira Cunha Filho |Chefe do SEVIG|
Lena Almeida Paulo Sérgio Andrião |Chefe do EFA I|
Tratamento de Imagem Raimundo da Silva |Chefe do EFA II|
Diego Braga Barbosa
João Alcidino da Silva |Chefe do EFA III|
Luis Felipe Protti
Mário Roberto Mariano Lessa |Chefe do SECAT|
Edição e Organização
David Protti Maria Noeli Gomes |Chefe do SATEC|
Luiz Cláudio Ribeiro Anna Paula Cabral Guerzet |Chefe da SAPEA|
Design Gráfico e Diagramação Anny Beth Morais Oliveira Caus Bernardo |Chefe da SAPOL|
Anaise Perrone
Carlos Henrique da Silva Xavier |Chefe do NUREP-ES|
Capa
Liége Lopes de Resende |Chefe do SETDOC|
David Protti

Comissão Organizadora das Comemorações de 15 anos da


Alfândega do Porto de Vitória
Alfândega da RFB do Porto de Vitória Anny Beth Morais Oliveira Caus Bernardo
Rua Governador José Sette, 176 Luciano Zamilute Teixeira
Centro - Vitória - ES
CEP 29.010-480 Nilda Vieira
historiadaalfandega@gmail.com Ruth Braga Bomfim

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP) (Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)


S491 A Serventia da casa : a Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo / Luiz Cláudio Ribeiro, organizador; Nicélio Barros;
David Protti, fotografia. - Vitória, ES : Sindiex, 2008.
190 p. : il. ; 30 cm

Bibliografia.

1. Alfândega - Espírito Santo (Estado) - História. 2. Administração alfândegaria - Espírito Santo (Estado) - História. 3. Portos
alfandegários - Espírito Santo (Estado) - História. 4. Vitória (ES) - Porto - História . I. Ribeiro, Luiz Cláudio. II. Barros,
Nicélio. III. Protti, David.

CDU: 336.41

Há uma efetiva gestão por resultados. Algo que se aproxima
muito da iniciativa privada. De cunho eminentemente
técnico, para que se devolva à sociedade e ao governo, duas
coisas: à sociedade, uma excelência nos serviços prestados; ao
governo, os recursos necessários para implantar suas políticas.
|César Barbiero|
Da comissão organizadora
De há muito que alguns aduaneiros capixabas alimentavam a idéia de produzir um livro que contasse a rica história de nossa
Alfândega, sobretudo dos atribulados últimos 15 anos de instalação da moderna Alfândega da Receita Federal do Porto de
Vitória, através da Portaria SRRF/7.ª RF n.º 241, de 02/06/1993. Pois, não resta dúvida que o incremento das trocas comerciais
internacionais, a interdependência econômica das nações, a revolução tecnológica e o surgimento dos blocos econômicos
afetaram as instituições alfandegárias em todo o mundo, acarretando ampla reavaliação de suas atividades e culminando na
criação da Organização Mundial das Aduanas – OMA, em 1994.
A idéia tomou forma com a Portaria ALF/VIT n.º 130, de 12/07/2007, que designou comissão específica para cuidar das
comemorações do nosso 15º aniversário. A edição do livro tornou-se, desde o início, o carro-chefe dos eventos. Para fazê-lo
buscamos parcerias com pesquisadores renomados e entidades representativas de categorias econômicas e profissionais, de
atividades afins. Nesse aspecto, foi decisiva a dedicação dos autores e o apoio incondicional do Sindicato do Comércio de
Importação e Exportação do Estado do Espírito Santo – SINDIEX, mediante a celebração de convênio de cooperação técnica,
em salutar parceria entre os interesses público e privado.
Parceria natural, uma vez que o SINDIEX, reunindo em seu corpo de associados as principais empresas de comércio exterior
do Espírito Santo, ora comemorando seus 16 anos de existência, reveste-se da condição de contemporâneo e testemunha
privilegiada de todas as ações da Alfândega que emergiu dessa nova ordem econômica. Especialmente num estado que elegeu
o comércio exterior, via concessão de incentivos fiscais/financeiros e oferta de naturais vantagens comparativas e rica estrutura
logística, como um dos motores do seu desenvolvimento.
Apresentamos nossos agradecimentos a todos que colaboraram e emprestaram, por variados meios, seu apreço à idéia de que
somente o conhecimento do passado permite a compreensão do presente e a construção do futuro. Muito Obrigado!

Luciano Zamilute Teixeira | Presidente da Comissão Organizadora

GRA - Gerência Regional de Arquivo Público Estadual (APE)/ Associação dos Permissionários de
Administração/Ministério da Fazenda Espírito Santo Regimes Aduaneiros/APRA-ES
no Espírito Santo Agostino Lazzaro Frederico Ferreira Lage
Cilmar Franceschetto
SINDIEX-ES Carla Caliman Sindamares e agentes marítimos
Severiano Alvarenga Imperial Gustavo Duarte Waldemar Rocha Junior
Márcia Bastos da Silva Murad Herbert Soares Fernando Pinto Almeida
Felipe Bonella Vieira Ivana de Araújo Moacyr Bonelli
Vera Lúcia Corteletti Delfino Jocimar Antonio Pereira Thelmo Nunes
Thiago Pascoal Rosa Klaus Bravim Donadel
Evelini Bastos Michel Caldeira de Souza Sindaees e despachantes
Rogério Piva Luís Kleber da Silva Brandão
Capitania dos Portos do Espírito Santo E toda a equipe do APE-ES. Anésio dos Santos Neto
Isac Alvarenga Vieira
SERPRO/Vitória Arquivo Geral/PMV Cândido Salles Bonfim
Luiz Carlos Zortea Rosângela Corrêa Dutra Ribeiro
Graciosa Rita Ceccon Antônio Carlos Barletta
Maria José Depollo Ferreira Biblioteca da CODESA Antônio Carlos Cordeiro dos Santos
Marly Roza Gagno Modolo Amilton Freixo de Brito Albanize M. de Oliveira Monteiro
Francisco José Caramuru Vieira Essuélio Ramos Valadão Cileide Zanotti
Claudio Rocha
GRPU/ES Biblioteca Central da UFES/Setor de Graciano Moretto Filho
Luciano Fávaro Bissi Coleções Especiais João Vítor Ramiro Avelar
José Renato Vieira Lopes Marta Martinez Pontes e Martins José Tatagiba
Tânia Maria Chaves Bastos Roberta Newman
Maristela dos Santos SINDESTIVA
Érika Etienne Granja Lins Cícero Benedito Gonzaga E a todos que colaboraram para a
Elizabeth Duarte Roselito Ribeiro realização desta obra.
Os 15 anos de uma Aduana
que nasceu com o Brasil

A vontade de conhecer mais profundamente a história da Aduana no Espírito Santo e publicá-la em livro
surgiu da então iminente comemoração dos 15 anos de reinstalação da Alfândega do Porto de Vitória. O
projeto da história do comércio exterior na visão da Receita Federal do Brasil, instituição responsável pelo
incremento desse comércio no Espírito Santo, foi apoiado pelo Sindicato do Comércio de Exportação e
Importação do Estado do Espírito Santo (Sindiex) e a idéia foi saudada pelos pesquisadores Luiz Cláudio
Ribeiro, David Protti e Nicélio Barros, que a ela deram conteúdo e forma.
Emerge assim para nosso deleite a obra A serventia da casa: a Alfândega do Porto de Vitória e os
rumos do Espírito Santo, fruto da idéia inicial, agregando-se ao escopo do livro a história da Aduana
do Espírito Santo desde as origens deste estado até, e especialmente, os últimos 15 anos.
Constata-se de seu compulsar que da mesma forma que a história do Brasil se confunde com a história da
Aduana brasileira, a história do estado do Espírito Santo também se confunde com a história da Aduana
capixaba, mesclando-se inclusive com a evolução da nossa economia.
Ao olharmos para o passado verificamos que a economia capixaba evoluiu em consonância com o
comércio exterior, inclusive suas crises ali foram ancoradas. Desde os primórdios da exportação de
madeira, especialmente pau-brasil, até os dias atuais - com pauta diversificada e multinacional, a costa
oceânica deste estado foi relevante porta de entrada e saída de mercadorias para o mundo.
Pretende-se com esta obra registrar os últimos 15 anos da reinstalação da Alfândega do Porto de Vitória,
ocorrida em junho de 1993. Tais registros, feitos com documentos de arquivos e com os relatos de nossas
memórias, serviram para pontilhar os caminhos de uma pesquisa que consolidará a realidade que vivemos
neste período mais recente da existência de nossa Instituição e para compartilhar essa experiência com
os que ainda virão.
É uma obra sobre a Aduana que chegou ao Espírito Santo com o primeiro donatário português. Através
dela fazemos a história da capitania do Espírito Santo, desde a sua fundação até a formação da sociedade
capixaba atual, em que uma nova Alfândega se apresenta. Com nossa história, esperamos ajudá-los a
conhecerem mais o Brasil!

José Henrique Mauri


Inspetor-chefe da Alfândega do Porto de Vitória
SUMÁRIO

15 | Prefácio

19 | A Alfândega do Espírito Santo na


administração portuguesa (1534-1808)

29 | A Alfândega do Espírito Santo após a vinda


da Família Real portuguesa

41 | A Alfândega do Espírito Santo no século


XX: um marco no coração de Vitória

67 | As atividades aduaneiras da Secretaria


da Receita Federal no Espírito Santo: a
DIVCAD-ES (1985-1992)

89 | A recriação da Alfândega da Receita


Federal do Brasil do Porto de Vitória e
sua participação na expansão do comércio
exterior capixaba (1993-2008)

163 | Desafios contemporâneos da Alfândega no


Espírito Santo

182 | Fontes e Referências Bibliográficas


Prefácio
A
história do mundo em que vivemos, que dedicaram – e ainda dedicam – suas vidas
segundo considerações de ordem ao controle de nossas fronteiras e à conquista de
natural e política, civil e religiosa, nossa soberania. Seu estudo serve para verificar
desde a origem das coisas até os mais os erros e acertos do passado para, seguindo seus
recentes progressos, traz à luz os sistemas passos e corrigindo equívocos, buscar o futuro
organizacionais dos povos, suas doutrinas com segurança. Além disso, pode-se divulgar os
religiosas e políticas, seus governos, feitos daqueles que, por suas ações, servem de
costumes, relações diversas, a influência estímulo e exemplo para as gerações futuras.
recíproca que exercem sobre as civilizações, A presente obra aborda, em suas páginas iniciais,
sua movimentação por sobre a Terra e os a evolução da organização da capitania do
acontecimentos, felizes ou infelizes, que Espírito Santo e de sua estrutura alfandegária nos
assinalaram suas existências mais ou menos anos que sucedem o descobrimento do Brasil,
agitadas, longevas ou interessantes, visando os locais onde foram registrados os primeiros
a extrair ensinamentos mais amplos sobre assentamentos, as dificuldades encontradas, o
a natureza íntima das coisas e também da longo processo que atravessa os primeiros séculos
aduana, que cuida do intercâmbio entre os de sua história, culminando com sua absorção
povos e que é o nosso mister, que muito nos político-administrativa pela Coroa dois séculos
interessa conhecer. depois. Descreve a criação das Provedorias da
Não se pode escrever história sem Fazenda Real, ocasião em que os provedores
monumentos, verdadeiros arquivos onde acumulavam o cargo de juiz de Alfândega, e
seus títulos se encontram. É preciso explorar evolui por um período em que as informações são
suas páginas veneráveis, compará-las e saber esparsas e muito pouco se registrou da história
encontrar seus segredos, que repousam capixaba. Tanto é assim, que deixa transparecer
esmaecidos pela ação dos séculos. E para que o declínio das atividades econômicas e,
abordar a história da Aduana brasileira, que por conseqüência as aduaneiras, ocasionou o
se confunde com a própria história do Brasil, fechamento da Alfândega na capitania por alguns
deve-se conhecer os monumentos que a períodos no século XVIII.
explicam e assegurar-se de que se está em Nas páginas seguintes dá prosseguimento à sua
condição de compreendê-los. trajetória, com a vinda da família real ao Brasil, a
A saga da Alfândega do Porto de Vitória é, criação do Erário Régio em 1808 e a extinção das
sem dúvida, um desses monumentos – não Provedorias da Fazenda Real em 1809, criando-
se pode ignorá-la e pretender palmilhar, em se em seu lugar a Junta da Administração e
toda a sua extensão, o caminho da Aduana Arrecadação da Real Fazenda. Na oportunidade,
brasileira. Sua memória vai além de simples a capitania do Espírito Santo reconquista sua
arquivos, reminiscências e lembranças. autonomia política, fato que permitiu que a
Ela guarda a trajetória, sua evolução Alfândega do Porto de Vitória fosse recriada
sociológica, e torna-se imprescindível para em 1820, acompanhando o crescente comércio
a compreensão da Aduana brasileira, que exterior desse período de abertura dos portos
tanto se orgulha dos homens e mulheres brasileiros .
Na seqüência, é abordado o longo período que
se estende a partir da recriação da Alfândega no
século XIX, a elevação de Vitória à categoria
de cidade, a busca pela construção de uma sede
adequada e definitiva para abrigar a repartição
aduaneira, sua inauguração em 1889, até o
momento em que essa repartição deixou
novamente de existir como organização autônoma
em 1967.
Após esse fato, registra-se pouco mais de duas
décadas de sua história em que os serviços
aduaneiros estiveram inseridos e diluídos na
estrutura da Delegacia da Receita Federal
em Vitória. Apesar de abordar os aspectos
históricos de décadas e não mais de séculos, esse
é um período muito rico em memórias. Várias
entrevistas foram realizadas e seus extratos
compilados nessa bela obra, com a finalidade
de familiarizar o leitor com o período da
história recente, que mostra a contínua luta dos
aduaneiros capixabas e sua persistência a fim de
robustecer a estrutura aduaneira no estado, o que
ocorreu com a recriação da Alfândega em 1993.
Portanto, caríssimos leitores, este não é apenas
mais um livro. É a expressão de uma vontade
que perdurou por séculos, de um sentimento
único, de uma paixão verdadeira, que brota dos
corações e mentes daqueles que ainda fazem a
história do Espírito Santo e que os autores, com
grande poder de síntese e perspicácia inigualáveis,
conseguiram juntar e retratar, registrando de
maneira indelével as diversas facetas da luta do
povo e dos aduaneiros dessa terra. De leitura
obrigatória para todos aqueles que se interessam
em conhecer a história da Aduana brasileira, e em
particular da Alfândega do Porto de Vitória, um
dos maiores portos brasileiros da atualidade, pois
ressalta magistralmente os feitos dessa instituição
que muito colaborou para o engrandecimento do
Brasil.

Cesar Augusto Barbiero


Superintendente Regional da Receita Federal do Brasil
na 7ª Região Fiscal
Prospecto da costa do Espírito Santo, de João Teixeira Albernaz (o Velho), de meados do século XVII – Mapoteca do Itamarati – RJ
A Alfândega
do Espírito Santo
na administração portuguesa
1534|1808

Nesse ano de 1507 a peste e a mortandade foram de tal ordem que o Almoxarife
e Oficiais da Alfândega, a mais importante instituição da época, resolveram ir
em romaria à aldeia galega do Ribatejo, depois chamada Montijo, para supli-
carem à Senhora da Atalaia, que “a peste que na cidade andava se apagasse e
lhes socorresse com algum mantimento para seu sustento”. (...) Passados poucos
dias, a peste começou a diminuir, morrendo cada vez menos gente, até que, nas
semanas seguintes, já não morria ninguém. Como, por outro lado, chegaram ao
Tejo alguns navios com trigo, suficiente para o abastecimento da cidade, os oficiais
da Alfândega, tomando estes factos como resultado da intervenção da Virgem,
comprometeram-se a formar uma confraria para, todos os anos, irem em procissão
à Senhora da Atalaia, como haviam feito nesse ano. (Licénio de Mascarenhas)

A
organização da capitania do Espírito Santo começou tão logo o rei de Por-
tugal, Dom João III, assinou em Évora a carta de doação a Vasco Fernandes
Coutinho, em primeiro de junho de 1534. A 2 de setembro começava a em-
preitada além-mar com a nomeação do escudeiro do rei, Sebastião Lopes,
para escrivão da feitoria, e de Antonio Espera, cavaleiro da Ordem de São
Tiago, para escrivão do almoxarifado da futura capitania, além da indicação
de um boticário e especialista em minerais, o espanhol Felipe Guilhem, para
juntar-se à expedição.1 Estabeleciam-se, assim, as bases para o cumprimento
A Serventia da Casa

dos direitos e deveres do donatário e dos colonos firmados na Carta de Foral


de 7 de outubro daquele ano.

1
NOVAES, Maria Stella de. História do Espírito Santo. Vitória: Fundo Editorial do Espírito Santo, s.d., p. 15.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 19
Em 23 de maio do ano seguinte a caravela Glória que à primeira vila foi dado o nome de vila da
que partira da praia do Restelo, no rio Tejo, com Vitória, em devoção a Nossa Senhora da Vitória.
um grupo de cerca de 60 pessoas, a maioria em E que este mesmo nome foi dado à vila da ilha
degredo – entre as quais “dois fidalgos degredados”: de Santo Antonio, elevada a sede da Capitania, em
Jorge de Menezes e Simão de Castelo-Branco2 - era 1551. Doravante, ainda segundo Novaes, a vila da
fundeada numa prainha próxima ao monte Moreno prainha do monte Moreno passou a chamar-se Vila
(ou João Moreno), local escolhido para a Vila de do Espírito Santo ou Vila Velha.
Nossa Senhora da Vitória, nome dado em devoção No processo de reconhecimento da extensão e da
à santa de culto dos guerreiros lusos. 3 feição das terras e das riquezas minerais da capitania,
Segundo Maria Stella de Novaes, baseando-se o capitão-donatário Vasco Fernandes Coutinho
em escritos de Gabriel Soares de Souza (1587), o e seus homens combateram em duas frentes.
donatário Internamente, as incursões ao interior do território
chegou a salvamento à sua capitania, em a desguarneciam a sede deixando-a suscetível aos
qual desembarcou e povoou a Vila de Nossa ataques dos nativos. Enquanto isso, as entradas para
Senhora da Vitória, a qual chamam de Vila reconhecimento do interior provocavam a ira dos
Velha, onde logo se fortificou, a qual em
breve se fez uma nobre vila para aquelas grupos indígenas que destruíam a vila, engenhos e
partes, de redor dessa vila, se fizeram logo plantações e matavam muitos brancos.
quatro engenhos de açúcar muito bem
Por isso, Coutinho aceitou a presença de Duarte de
providos e acabados, os quais começaram a
lavrar açúcar, como tiveram canas para isso Lemos à frente de um grupo que “ajudou sempre
que se na terra deram muito bem.4 a suster e fazer a guerra contra os infiéis e gentes
A mesma autora também apóia-se em escritos do da terra”.7 Em reconhecimento, Coutinho doou a
Frei Vicente do Salvador, em História do Brasil, ilha de Santo Antonio a Duarte de Lemos através
de 1627, que afirma que o donatário escolheu uma do Alvará de 15 de julho de 1537. Porém, ao passar
praia “(...) onde logo à entrada do rio, da banda a Lemos a escritura de confirmação da doação em
Sul, começou a edificar a vila da Vitória, que agora Lisboa, em 22 de agosto de 1540, Coutinho não
se chama Vila-Velha”.5 Essa autora, opondo-se ao pode assegurar a Lemos um direito que El-Rey re-
historiador José Teixeira de Oliveira que afirmou servara apenas aos capitães-donatários de
com base em Brás Rubim que “ao rio e à vila “fazer vila” na ilha, “que está limitada por termo da
logo iniciada foi dado o nome de Espírito Santo, povoação do Espírito Santo”; (...) “a redízima que
depois estendido a toda a capitania”,6 entende no alvará lhe tem concedida estava ao dito tempo
entre elles assentado que não fosse senão a redízi-
2
DAEMON, Bazilio Carvalho. Província do Espírito-Santo. Sua descoberta, ma da sua própria fazenda...”8
história chronológica, synopsis e estatística. Vitória: Typographia do Espírito-
Santense, p. 7. Disponível em http://www.ape.es.gov.br [capturado em 14 de
Em 1539 Coutinho voltava a Portugal em busca
A Serventia da Casa

abril de 2008].
3
NOVAES, Maria Stella, op. cit., p. 5 de mais pessoas e de negócios para sua capitania e
4
Idem, p. 16.
5
Ibidem, p, 15.
6
RUBIM, Brás da Costa. Memórias Históricas e Documentadas da Província do Espí-
rito Santo. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), Rio de
7
OLIVEIRA, José Teixeira de. História do estado do Espírito Santo. 2. ed. Vitória:
Janeiro, n. XXV, p. 171 e segs. apud OLIVEIRA, José Teixeira de. História do estado Fundação Cultural do Espírito Santo, 1975, p. 41.
do Espírito Santo. 2. ed. Vitória: Fundação Cultural do Espírito Santo, 1975, p. 35. 8
OLIVEIRA, José Teixeira de, op. cit., p. 42.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 20
lá permaneceu, supostamente, entre 1540 e 1548.
Nesse período, a capitania foi governada por Jor-
ge de Menezes, que morreu na função, e depois
por Rui Fernandes que foi oficialmente investido
das funções de provedor e juiz da Alfândega após
o Regimento datado de 17 de dezembro de 1548.
Esse Regimento criou a Provedoria da Fazenda
Real, órgão da administração fazendária superior e
o cargo de provedor-mor do Brasil; para as capita-
nias hereditárias o Regimento instituiu os cargos de
provedores que eram acumulados com os de juiz
da Alfândega9.
Segundo informa José Eduardo Pimentel de
Godoy, em pesquisa de 2007, a Provedoria da
Fazenda Real era encarregada da administração
civil e da intendência militar, acumulando funções Mapa - parte americana do planisfério feito em Arques – França. Revela
cenas da vida indígena. Pierre Descelliers
como a construção de obras públicas e de navios, a
organização e o financiamento de expedições bélicas
ou exploratórias do interior, a manutenção dos
serviços essenciais e o pagamento dos funcionários
civis e militares, a administração do porto, a
fiscalização dos agentes de finanças, o julgamento de
processos fiscais, a fiscalização e a arrecadação dos
impostos, a repressão ao contrabando e o combate
dos piratas. O autor resume, dizendo ser a “espinha
dorsal da administração fazendária no Brasil
Colonial até 1770, embora não desempenhasse
funções meramente tributárias ou fazendárias”.10
Sobre Rui Fernandes sabe-se, apenas, que era criado
de Vasco Fernandes Coutinho. Segundo Serafim
Derenzi,11 Rui Fernandes e o “fidalgo Fernandes Mapa do Brasil – 1631. Autor: João Teixeira Albernaz, O Velho
Fonte: ADONIAS, Isa. Imagens da formação territorial brasileira. São Paulo:
Velez”, “fâmulo”, eram os principais serviçais de Fundação Emílio Odebrecht, 1993. A Serventia da Casa

9
SALGADO, Graça (Coord.) et al. Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil
Colonial. 2. ed. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional/Nova Fronteira, 1985, p. 85.
GODOY, José E. P. de. Órgãos da administração fiscal e tributária do Estado
10

do Espírito Santo. Brasília: MF/SRF, 2007, p. 4. (Projeto Memória da Receita).


Mimeografado.
DERENZI, Luiz Serafim. Biografia de uma ilha. 2. ed. Vitória: PMV/Secretaria
11

Municipal de Cultura e Turismo, 1995, p. 21.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 21
Estrangeiros, entre outros impostos aduaneiros
cobrados a título de donativos ou subsídios. Na
entrada, as mercadorias vindas de Portugal que
tivessem pago lá a Dízima de Saída eram isentas
de cobrança de impostos, assim como o eram as
mercadorias exportadas diretamente para Portugal.
Além disso, os donatários também cuidavam de
arrecadar o quinto dos metais e dízima do pescado
e das colheitas. Uma estrutura aduaneira mais
completa, por sua vez, deveria contar, além do
provedor da Fazenda Real/juiz de Alfândega, com
escrivão, juiz de balança, feitor, meirinho e alguns
guardas.13
“Villa Velha” - 1775. Fonte: REIS, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades
do Brasil colonial. [CD-ROM]. São Paulo: FUPAM/Imprensa Oficial-SP, 2000. Em Portugal, após ser informado que em sua
Imagem ES_09b. A Alfândega é o segundo prédio da esq. para dir. na
enseada de Vila Velha. ausência os ataques dos índios Tupiniquim e
Goitacás tinham vitimado Jorge de Menezes, morto
a flechadas, assim como seu substituto Simão
Castelo Branco e grande parte da população branca,
Coutinho e “acompanharam inclusive o donatário
Coutinho retornou e dedicou–se à recuperação
em sua viagem a Lisboa, servindo de testemunhas na
econômica e à organização militar de sua capitania.
escritura de doação de Coutinho a Duarte Lemos.”12
Para tanto, aproveitou o apoio que lhe oferecera o
Assim, presume-se que ao retornar a Lisboa na
governador-geral Tomé de Souza em nome do rei
intenção de negociar partidas de produtos da
e o interesse dos padres jesuítas em construir um
Capitania do Espírito Santo e vice-versa, Coutinho
colégio na capitania para, entre fins de 1549/início
tenha tomado as primeiras providências para a
de 1550, obter autorização para transferir a sede da
organização da estrutura de controle e cobrança
capitania para junto de um porto abrigado na ilha de
de impostos alfandegários, cuidando para isso de
Santo Antonio, o que ocorreu entre 1550 e 1552.
nomear um de seus homens de confiança, para
ocupar-se das rendas e da autoridade da Coroa. Sobre esse aspecto, a conformação da bacia de flu-
tuação dos atracadouros servidos por abundante
Àquela época, de acordo com a Carta de Doação
mata donde se retiravam madeiras e a disponibi-
e o Foral, os donatários estavam obrigados, tão
lidade de água potável e terras férteis tornavam a
logo organizassem a produção e o comércio
graciosa baía da ilha naturalmente favorecida para
das vilas que fundassem, a cobrar em espécie a
ocupação e defesa, fatores que possibilitavam o
Dízima das Mercadorias Exportadas para Fora do
crescimento populacional que interessava ao Esta-
A Serventia da Casa

Reino, a Dízima das Mercadorias Importadas por


do português. Somado a isso, o canal existente no

12 Disponível em http://www.receita.fazenda.gov.br/memoria e; GODOY, José


E. P. de,op. cit.,2007, 28 p. 13
Idem. Ibidem.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 22
confronto entre o Penedo e montes vizinhos (hoje e Contos, e Alfândega e assolador dos panos16 e a de
Atalaia e Péla-Macaco, no continente) e os contra- Álvaro Afonso, encarregado dos ofícios de Alcaide do
fortes da ilha de Santo Antonio eram naturalmente Mar, e Guardador dos Navios existentes na baía do
dotados para atracação e movimentação de cargas Espírito Santo. Assim, ao que parece, vários cargos
e pessoas e local propício para o estabelecimento submetiam-se diretamente ao rei de Portugal e ao
do controle aduaneiro. Governo-geral, passando ao largo das escolhas do
Dessa forma, a presença das mais destacadas capitão-donatário.
autoridades representantes da Coroa portuguesa na A abertura de um armazém alfandegado e
Capitania do Espírito Santo, como o provedor-mor as nomeações para as funções aduaneiras da
da Fazenda de El-Rey, Antonio Cardoso de Barros, capitania do Espírito Santo estabeleceram o
o capitão-mor do mar, Pero de Góis e Pedro Borges, marco fundamental das rotas de comércio direto
ouvidor-geral, enviados pelo governador-geral entre Vitória, Portugal e Angola17 inaugurando
Tomé de Souza, foi realmente proveitosa para o uma movimentação comercial que possibilitou a
estabelecimento dos serviços do Estado português transferência da sede da capitania e da Alfândega,18
no Espírito Santo, a começar com a nomeação de tendo sido nomeado Bernardo (ou Bernaldo)
Francisco de Vacas para provedor da Fazenda Real Sanches de la Pimenta para provedor Real da
e juiz de Alfândega, em 26 de fevereiro de 1550.14 Fazenda da Capitania e Juiz de Alfândega de
Da mesma época foi a abertura de “um armazém Vitória, em 19 de dezembro de 1552.
alfandegado” na vila do Espírito Santo. É Basílio Seguindo a informação do pesquisador José
Carvalho Daemon, em A Província do Espírito Santo, Eduardo Pimentel de Godoy, no ano de 1552 Tomé
obra de 1879, que informa que em 1550 Salema assumiu o cargo de juiz da Alfândega de
É aberto nesta então capitania o commercio Vitória. A partir dessa informação, pode-se inferir
direto com Portugal e Angola, por instâncias
que, talvez pela primeira vez, e ainda talvez porque
feitas d`aqui e talvez promovido pelo
donatário quando lá esteve, o facto é, que sucedia a alguém que ficou apenas alguns dias na
nesse anno foi estabelecido uma espécie de função, o cargo foi desmembrado do de provedor
armazém Alfandegado na vila do Espírito da Fazenda Real da Capitania, que permaneceu
Santo [...]. Esta espécie de Alfândega, pelas
com Bernardo Sanches de la Pimenta. Do mesmo
investigações que fizemos, e como adiante
se verá, no século XVII parece-nos ter sido conjunto de nomeações de Tomé Salema foi
estabelecida em local que existe a casa de também Manoel Ramalho nomeado escrivão da
propriedade do Sr. Firmino de Almeida e Alfândega em 11 de dezembro de 1552.
Silva, a beira mar, e onde há indícios que isso
attestão.15 Em 4 de outubro de 1555, Brás de Pires, morador
da vila de Vitória, foi designado feitor e almoxarife
Do mesmo conjunto de nomeações de funcionários
da “alfândega da dita vila”19 e Bernardo de la
reais na capitania do Espírito Santo está a de
A Serventia da Casa

Henrique de Carvalho, para Porteiro da Fazenda


16
OLIVEIRA, José Teixeira de, op. cit., p. 65.
17
DAEMON, Bazilio Carvalho, op. cit., p. 66 e; OLIVEIRA, José Teixeira de, op.
cit., p. 66-67.
14
GODOY, José E. P. de,op. cit., 2007, p. 1. 18
GODOY, José E. P. de,op. cit.,2007, p. 1.
15
DAEMON, Bazilio Carvalho, op. cit., p. 62. 19
NOVAES, Maria Stella de, op. cit., p. 28 e; GODOY, José E. P. de,op. cit., 2007, p. 1.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 23
Paisagem da prainha de Vila Velha com depósito da Alfândega ao fundo, já modificado para estabelecimento comercial – tela de Homero Massena – óleo s/
tela. 1953. Acervo: Codesa

Pimenta permaneceu como provedor até o retorno do Espírito Santo durante o período colonial,
de Vasco Coutinho ao Espírito Santo, em 1555. Em finalizando com Alberto Antonio Pereira que
1558, Pimenta seria morto na batalha do Cricaré assumiu em 1808.21
durante a guerra movida contra os indígenas do Porém, é pouco ainda o que foi pesquisado sobre
norte capixaba que também vitimou Fernão de Sá, o funcionamento da Alfândega de Vitória nas
filho do governador-geral do Brasil, Mem de Sá.20 últimas décadas do século XVI e nos dois séculos
Pesquisas realizadas por Godoy na documentação seguintes. No período de 1580-1640 Portugal foi
do Ministério da Fazenda apontam para uma governado pela Espanha e isso deve ter alterado
extensa lista de 28 nomes de Provedores da Fazenda o comércio e o tráfego interatlântico do Espírito
Real/Juízes da Alfândega que, a começar por Salvador Santo com a Coroa luso-ibérica e com as demais
capitanias do Brasil. Talvez a medida mais dura
A Serventia da Casa

Pereira que teria ocupado o cargo entre 1556 e


1562, podem ter gerido os negócios aduaneiros tenha sido o ato do rei Felipe II de Espanha (Felipe
I de Portugal), de 1591, que proibiu o ingresso em

20
Cf. OLIVEIRA, José Teixeira de, op. cit., p. 85, nota 45. 21
GODOY, José E. P. de,op. cit., 2007, p. 1-2.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 24
águas brasileiras de qualquer embarcação que não
fosse portuguesa ou espanhola; só revogada em
1808 pelo príncipe regente português.22
Desde então, o que se conhece da historiografia
capixaba sobre esse assunto são informações
esparsas como a nomeação em 1673 de Manuel de
Moraes na condição de proprietário do ofício de
provedor da Fazenda Real da Capitania do Espírito
Santo, e a de seu filho, Francisco Monteiro de
Moraes que ocupou o mesmo cargo a partir de
1691 e, nesta função, organizou bandeiras ao sertão
em busca de ouro.23
Sabe-se, contudo, que ao final do século XVII e
no começo do seguinte, a Coroa deu início à farta
distribuição das terras para a fixação de colonos
Ilustração da baía de Vitória, com as vilas de Vitória (Espíritu Santo) e vila
que a explorassem. Segundo Gabriel Bittencourt, Velha – ca. 1624. Fonte: REIS, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades
do Brasil colonial. [CD-ROM]. São Paulo: FUPAM/Imprensa Oficial-SP, 2000.
as primeiras décadas do século XVIII Imagem ES_01b.

(...) Foi um período de grande dinâmica


para a ocupação da Capitania, por meio do
desbravamento do solo virgem capixaba, permitido durante décadas um certo afrouxamento
com a conseqüente profusão na distribuição de sua conduta, ao afirmar que em 1720 o Conselho
de sesmarias.24
Ultramarino pedia informações sobre a “casa de
Pode-se, dessa forma, inferir que a nova ênfase à alfândega” capixaba.
ocupação aumentaria o interesse sobre o controle
Em resposta de 10 de junho de 1722, o novo
da Alfândega. Primeiro, porque a preocupação de
capitão-mor/governador do Espírito Santo,
Portugal estava mais voltada a evitar uma profusão
Antônio de Oliveira Madail, expôs a necessidade de
de mineradores avulsos no Espírito Santo e para isso
uma Alfândega na capitania e ofereceu os préstimos
não só proibiu nela a mineração como comprou de
de “Luis Salgado para construí-la às suas custas”
volta a capitania dos herdeiros de Francisco Gil em
e, em troca, o novo governante requeria para seu
abril de 1718 (por 40.000 cruzados) e subordinou-a
protegido a nomeação para o ofício de provedor (e
ao governo da Bahia.25 Godoy apresenta um
juiz de Alfândega), todavia não é conhecido se o rei
indício que dá margem a entender que Portugal
atendeu à demanda.26
tentava retomar o controle das Alfândegas após ter
Sabe-se através de Godoy que naquele início do
A Serventia da Casa

século XVIII Portugal, ao iniciar a fase de extração


GODOY, José E. P. de. Dicionário de história tributária do Brasil. Brasília:
22

ESAF, 2002, p. 20. de ouro nos antigos sertões das cabeceiras do rio
23
GODOY, José E. P. de,op. cit., 2002, p. 43.
24
BITTENCOURT, Gabriel. História Geral e Econômica do Espírito Santo. Do en-
genho colonial ao complexo fabril-portuário. Vitória: Multiplicidade, 2006. p.75.
25
BITTENCOURT, Gabriel, op. cit., p. 132. 26
GODOY, José E. P. de,op. cit., 2007, p. 2 introdutória.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 25
Doce - área de hinterlândia do Espírito Santo Real, não mais gozava da atenção direta da Coroa
onde se constituía a zona de mineração de ouro de na medida em que seu ofício era entregue a
Vila Rica - instituiu o grande imposto aduaneiro particulares.
chamado Dízima da Alfândega. Nesse mesmo Ao final do processo, visto que a ênfase ao controle
período, as reformas portuguesas instituíram que aduaneiro português voltava-se exclusivamente para
o direito de cobrar a Dízima da Alfândega seria a mineração do ouro nos antigos sertões capixabas e
concedido a particulares, em leilão. para o embarque somente no porto de Paraty, iniciou-
Ocorre ainda que, ao longo daquele século, a se uma fase de declínio das atividades econômicas
Alfândega do Rio de Janeiro, maior beneficiária de exportação e importação no Espírito Santo,
da cobrança daquele imposto por receber pelo permanecendo ativa a economia interna. Enquanto
porto de Paraty toda a exportação do metal para isso, as Aduanas que conseguiram permanecer
a Europa, foi se emancipando da Provedoria da ativas ganharam estrutura interna complexa com as
Fazenda Real. Nas palavras de Roberto Simonsen, chamadas “mesas”: Mesa Grande, Mesa de Abertura,
um dos primeiros estudiosos desta matéria, Mesa da Balança, Mesa da Descarga, Mesa da
O porto do Rio de Janeiro concentrou, Estiva, Mesa da Entrada e Mesa da Saída.28 Estando
na primeira metade do século XVIII, os assim estruturadas as Aduanas, as Provedorias da
maiores ativos na exportação brasileira, pelos Fazenda Real foram sendo extintas – a do Rio de
consideráveis valores de ouro e diamantes
por ali remetidos. Janeiro em 1770 – e em seu lugar foi criada a Junta
da Real Fazenda, e as Aduanas acabaram de fato
Dado o afluxo da população para as regiões
mineradoras, tornou-se, também, o Rio o independentes de sua estrutura.
grande porto importador, pois através dele Mas o declínio da mineração do ouro e,
é que as maiores regiões mineradoras se
supriam de artigos estrangeiros. conseqüentemente, da arrecadação da Alfândega
nos portos do Rio de Janeiro, geraria uma crise
Em 1749, ao passo que a exportação do
Rio de Janeiro atingia a £1.750.000 [libra econômica para Portugal. Tal crise fez com que
esterlina], a de Pernambuco alcançava apenas o Marquês de Pombal (1750-1777), ao introduzir
£300.000 e os portos do Pará e Maranhão, medidas de centralização política para a recuperação
£30.000.27
econômica, buscasse alternativas para incrementar
Assim, a explicação mais plausível para o ocorrido os negócios monopolistas mercantis e agrícolas do
com a Alfândega de Vitória foi que, na prática, reino e alterasse a própria estrutura produtiva da
acompanhando a regra geral para os demais portos capitania capixaba confiscando as propriedades
brasileiros, ela tenha sido entregue a arrematadores jesuíticas, as mais produtivas da região, e indicando
que não lograram obtenção de ganhos substanciais a abertura de novas áreas de expansão colonial.
na coleta do imposto aduaneiro, já que a mineração
Graça Salgado enfatiza que o segundo período de
na capitania estava proibida e a sua Alfândega,
A Serventia da Casa

governo de Pombal, entre 1750-1760, ocorreu num


tendendo à autonomia da Provedoria da Fazenda
cenário de declínio da mineração e do comércio

SIMONSEN, Roberto. História Econômica do Brasil. 8. ed. São Paulo: Nacio-


27

nal, 1978, p. 381. 28


GODOY, José E. P. de,op. cit., 2007, p. 1 introdutória.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 26
com o ultramar. Por isso, foi adotada pelo Estado grossos de algodão que serviam para a confecção do
português uma política de incentivo à produção vestuário dos escravos e para enfardar e empacotar
manufatureira interna. Segundo a autora fazendas e mercadorias.
(...) Estabeleceu-se o protecionismo alfande- Dessa maneira, no que se relaciona com o
gário, preservando o mercado nacional para
rebatimento do processo histórico português com
os produtos lusos. Além disso, incentivou-se
a exportação dos manufaturados, possibili- a evolução socioeconômica da capitania do Espírito
tada por uma conjuntura internacional de Santo, somente pesquisa aprofundada em fontes
guerras (...) permitindo aos portugueses vol- primárias poderão revelar mais detalhadamente o
tarem a ter influência nos mercados orien-
funcionamento da Alfândega no Espírito Santo,
tais. Tal fato proporcionou a Portugal, nessa
fase, uma balança comercial favorável.29 sua localização física, seus quadros funcionais
e sobre quais impostos arrecadava, uma vez que
Ao final do século XVIII, já sob o reinado de D.
permanecia, possivelmente, sob domínio político
Maria I, a própria indústria de tecidos existente no
e fazendário da capitania da Bahia desde 1718 e só
Brasil representava concorrência com os tecidos
viria a ser novamente objeto do interesse do Estado
comercializados por Portugal. Diante disso, a
português após a vinda da Família Real para o Brasil,
rainha, em 1785, proibiu a produção industrial têxtil
em 1808, quando a capitania capixaba reconquistou
brasileira, com exceção da produção de tecidos
sua autonomia política e administrativa.

A Serventia da Casa

“Villa da Victoria” - 1775 . Fonte: REIS, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades
do Brasil colonial. [CD-ROM]. São Paulo: FUPAM/Imprensa Oficial-SP, 2000.
29
SALGADO, Graça (Coord.), op. cit., p. 20. Imagem ES_08Ac. Avançando para o mar vê-se o Forte do Carmo, na baía de Vitória

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 27
Peça de artilharia. Forte São João – Vitória. David Protti – 2008. Acervo: ALF/VIT
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 28
A Alfândega
do Espírito Santo após a vinda
da Família Real portuguesa

Que sejam admissíveis nas Alfândegas do Brasil todos e


quaisquer Gêneros, Fazendas, e Mercadorias transportadas,
ou em Navios Estrangeiros das Potências, que se conservam
em Paz, e Harmonia com a Minha Real Coroa, ou em Na-
vios dos Meus Vassalos [...]. Que não só os Meus Vassalos,
mas também os [...] Estrangeiros possam exportar para os
Portos, que bem lhes parecer a benefício do Comércio, e
Agricultura, que tanto Desejo promover [...]. (Carta Régia
do Príncipe Regente D. João - 28 de janeiro de 1808)

D e modo geral, os pesquisadores do tema “Aduana no Brasil” reconhecem


que as raízes da administração aduaneira brasileira remontam à própria
organização pública portuguesa e, portanto, precedem à independência do
Brasil. Segundo esses pesquisadores, as primeiras iniciativas governamentais
de regulamentação dos direitos e de organização da Aduana, nos moldes de
administração pública nacional, com organicidade própria e autonomia com
relação à sua origem portuguesa, datam da Carta Régia e do Alvará Régio
expedidos pelo príncipe Regente, respectivamente em 28 de janeiro e 28 de
junho de 1808.30
A Serventia da Casa

30
BORJA, José Luiz Falcão. Administração aduaneira no Brasil: área da Secretaria da Receita Federal. 1978. Dissertação
(Mestrado em Administração) – Programa de Pós-Graduação em Administração Pública, Fundação Universidade de
Brasília; LOPES FILHO, Osíris de Azevedo. Regimes aduaneiros especiais. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1983;
GODOY, José E. P. de. Catálogo das repartições fazendárias do Brasil. Disponível em http://www.receita.fazenda.gov.
br/Memoria/administracao/reparticoes/default.asp e; GREGGIO, Antonio Carlos Portinari. O futuro da aduana brasileira.
São Paulo: Boletim do ICEX, s. n., 1990.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 29
Vitória - 1767. “Prospeto da Vila da Vitoria”. .Autor: José Antônio Caldas.. Fonte: REIS, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades do Brasil colonial. [CD-ROM].
São Paulo: FUPAM/Imprensa Oficial-SP, 2000. Imagem ES_03b

Em relação à vinda da Corte para o Brasil, a serviu para dar autonomia à capitania do Espírito
imposição de bloqueio continental na Europa Santo em relação à da Bahia, em matéria fazendária,
culminando com o avanço do exército francês antecipando a autonomia política do Espírito
sobre Portugal delineou o ápice da prolongada Santo ocorrida no ano seguinte.31A terceira medida
crise que afetava a indústria e o comércio do país mais importante adotada pelo príncipe regente
e o lançara mais ainda à órbita do trono inglês. foi uma medida aduaneira, depois desdobrada no
Por isso, a Inglaterra teve papel preponderante no Tratado de Comércio e Navegação, assinado em
convencimento do regente português para que a 1810, em que o regente permitia a adoção de tarifas
corte cruzasse o Atlântico e viesse instalar-se no Rio diferenciadas para as mercadorias inglesas (15%)
de Janeiro. Lá chegando, o monarca não esperou entrarem no Brasil, enquanto as mercadorias de
para tomar as medidas que incrementariam a vida Portugal passavam a pagar 16% ad valorem, e as
econômica do Brasil. demais nações amigas pagavam 24%.
A primeira delas foi a recriação do Erário Régio, Com a abertura dos portos, a Coroa normalizava o
em 26 de julho de 1808, instituição encarregada funcionamento alfandegário nos portos do Brasil
da administração financeira e tributária de todo o depois de mais de 200 anos. Por fim, o regente criou
reino - que em 1824 foi transformada em Ministério também a Real Junta do Commércio, Agricultura,
da Fazenda do novo governo da Independência. Fábricas e Navegação, uma estrutura voltada para
A Serventia da Casa

Outra medida importante foi a extinção da


Provedoria da Fazenda Real, por Carta Régia de 29 Cf. o documento “Memórias para servir à história até o anno de 1817, e breve
31

notícia estatística da Capitania do Espírito Santo, porção integrante do Reino


de maio de 1809, criando a Junta da Administração do Brasil,” escrita supostamente por RUBIM, Francisco Alberto ou por seu filho
Brás Rubin e publicada em Lisboa em 1840. Acervo do Arquivo Público do Esta-
e Arrecadação da Real Fazenda. Essa mudança do do Espírito Santo (Biblioteca Digital). Disponível em http://www.ape.es.gov.
br/pdf/alberto_rubim [capturado em 12 de fevereiro de 2008].

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 30
Vitória - 1805. “Perspectiva da Villa da Victoria”. autor: Joaquim Pantaleão Pereira da Silva. Fonte: REIS, Nestor Goulart. Imagens de vilas e cidades do Brasil
colonial. [CD-ROM]. São Paulo: FUPAM/Imprensa Oficial-SP, 2000. Imagem ES_10b

o comércio marítimo para a introdução de novos caminhos entre o mar e a antiga zona de mineração.
produtos e inovações técnicas que começaram a vir Assim, muitas fazendas de plantio de cafezais se
para o Brasil em decorrência da abertura comercial formaram e sua produção, além das de outras
que promovera.32 províncias brasileiras, passou a ser exportada pelo
A vinda da Família Real para o Rio de Janeiro e porto do Rio de Janeiro, fazendo vicejar novamente
de todos os altos funcionários da administração as relações de troca com o exterior.
portuguesa, além de artistas e intelectuais, impactou Recorrendo ainda à primorosa análise de
a cidade com um súbito crescimento populacional. Simonsen:
Logo a administração central passou a atrair O Rio representava como que um oásis nas
negociantes e pessoas interessadas no comércio grandes zonas sulinas, amarguradas por
e nas terras das cercanias da Corte, a fim de que extrema pobreza. O eixo econômico do
Brasil deslocara-se de novo para as regiões do
abastecessem com produtos e serviços à demanda Nordeste. As despesas do corpo administrativo
ali crescente. Essas oportunidades de negócios da colônia e a concentração de recursos para
atendiam prontamente àqueles empreendedores fazer face às ameaças dos espanhóis ao Sul
que, prejudicados pela decadência da mineração, contribuíam, também, para o progresso do
Rio. A vinda de D. João VI veio trazer novos e
estabeleceram-se nas terras mais férteis ao redor decisivos elementos de estímulo ao progresso
da cidade e nas regiões servidas pelos antigos à capital brasileira (...).33
A Serventia da Casa

No caso do Espírito Santo, novos dados indicam,


32
Para melhor entendimento da Real Junta de Commércio, Navegação, Indús- contudo, que desde o início do século XIX ocorreram
tria e Agricultura ler: RIBEIRO, Luiz Cláudio Moisés. Ofício criador: invento
e patente de máquina de beneficiar café no Brasil (1870-1910). 1995. 278 p.
Dissertação (Mestrado em História) - Programa de Pós-Graduação em História
Econômica, Universidade de São Paulo, p. 19-20. 33
SIMONSEN, Roberto, op. cit., p. 381.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 31
ficou sediada no forte do Carmo. Essa retomada
das atividades da Alfândega em Vitória é um sinal
do impulso comercial pretendido pela Coroa num
quadro de recuperação das atividades econômicas
do Brasil após o declínio da mineração de ouro.
Entretanto, por medida de concentração fiscal
pós-Independência, as atividades de desembaraço
aduaneiro foram concentradas na Corte a partir de
7 de novembro de 1822, por decisão do Conselho
da Fazenda. Segundo Ignácio Vasconcellos:
Seu Regimento quanto a Officiaes he o da
Alfândega do Seará, e quanto a direitos e
emolumentos ao da Corte. O Escrivão da
Junta serve de Juiz, e de Empregados os
Movimentação portuária no cais da Rua do Commercio – ca. 1900. Acervo: BC/Ufes
Officiaes da Contadoria, sem ordenado, nem
gratificações, e o trabalho se faz nos dias que
não são santos, ou feriados.35
A decisão do Conselho da Fazenda não inviabilizou,
mudanças substanciais na recuperação econômica.
todavia, o movimento de comércio do Espírito
A partir da criação da Junta da Administração e
Santo com o exterior; o porto de Vitória já recebia
Arrecadação da Real Fazenda, em 1809, ainda
mercadorias desembaraçadas e transbordadas
que haja carência de novas fontes, a análise mais
no porto do Rio de Janeiro. Aliás, o movimento
consistente demonstra que a Alfândega saiu das
comercial na praça de Vitória, nesses anos, já era
mãos de contratadores particulares nomeados pelo
considerável haja vista a existência de 35 lojas de
governo da Bahia e passou a ser administrada pelo
“fazendas secas” (artigos em geral), 45 lojas de
governo local. Embora o cargo de Juiz de Alfândega
“molhados” e várias tavernas, para uma população
houvesse sido suprimido, a administração aduaneira
de 12.704 habitantes.36 O embarque e desembarque
continuou a ser feita pela Contadoria da Junta
das mercadorias era feito, principalmente, pelo cais
através dos seus quadros funcionais: contador,
Grande, junto ao próprio forte do Carmo, sede da
segundo e terceiro escriturários e dois amanuenses,
Alfândega. De acordo com Francisco Rubim, a
com sede no antigo colégio dos jesuítas onde
baía de Vitória era considerada muito propícia para
funcionava o governo.34
o comércio marítimo, tanto local como de longa
Pouco depois, o governo do Reino Unido, com distância, a qual:
sede no Rio de Janeiro, recriou a Alfândega do (...) cercando a mesma ilha, faz barra em
Espírito Santo em 10 de janeiro de 1820, que distancia de 1 légua no grande Oceano,
A Serventia da Casa

e admitte n’ella galeras, e bergantins,


offerecendo em toda esta distancia, que
34
Cf. o documento “Memória statistica da Provincia do Espirito Santo escrita
no anno de 1828” de Ignácio Accioli Vasconcellos. Acervo do Arquivo Público
do Estado do Espírito Santo (Biblioteca Digital). Disponível em http://www.ape.
es.gov.br/pdf/Memoria%20Statistica%20Ignacio%20Acciolli%201828.pdf [captura-
35
Cf. o documento “Memória statistica...
do em 12 de fevereiro de 2008]. 36
Cf. o documento “Memória statistica...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 32
está povoada de ilhas capazes para grandes
fortalezas, excellente ancoradouro para
muitas embarcações, abrigado de todos os
ventos à excepção somente do Este que raras
vezes apparece. Em toda a Villa se aporta em
canoas, e escaleres com a maior facilidade;
porém seus principaes desembarque são o
Caes Novo das Colunas, que fica abaixo da
casa do governo, o do Azambuja, o Caes-
Grande, onde até atracão sumacas, o do
Santíssimo, o do Batalha, e o dos extinctos
Jesuítas, vulgamente chamado Porto-dos-
Padres.37
O forte do Carmo era uma bela fortificação Colégio do Carmo – 1860 – Vitória. Autor: Victor Frond.
Acervo: Biblioteca Nacional – RJ/Arquivo Público do Estado do Espírito Santo
erigida pelo engenheiro Nicolao de Abreu que,
em 1726, foi mandado da Bahia pelo então vice-
rei do Estado do Brasil, Conde de Sabugosa, para do mesmo Convento, tendo pelo tempo
tal incumbência. Hoje só restam imagens desse adiante todo aquelle Convento tornado-se
velho forte avançando com suas ameias sobre o quartel, depois do abandono d’aquella casa
religiosa.39
canal da baía de Vitória. Em seu local atualmente
está o prédio-sede dos Correios, no Centro da Outro sinal de revitalização política e econômica
capital. Não foram encontrados registros de sua da província do Espírito Santo foi a elevação de
demolição, entretanto a ausência de referência a Vitória à categoria de cidade, em 17 de março
esse forte na Memória Statistica de Ignácio Accioli de 182340, o que conferia a ela maior autonomia.
de Vasconcellos, escrita em 1828, sugere que àquela De acordo com os apontamentos de Auguste
época ele já não existia. de Saint-Hilaire, a principal indústria que dera
sustentabilidade à economia até cerca de 1850 era
Assim, para desempenhar suas competências de
composta de 60 engenhos de açúcar que produziam
fiscalização, controle de mercadorias e policiamento
uma média anual de 6.075 toneladas e 66 destilarias
marítimo, a Alfândega de Vitória mudou, entre 1822
de aguardente, conforme dados do ano de 1820.41
e 1828, para o Convento do Carmo, à época “(...)
Para o consumo interno e exportação do excedente,
já transformado em quartel da tropa de linha”.38
a agora província capixaba produzia mandioca,
Daemon assim relatou:
arroz, feijão, milho, legumes, gado, pescado, farinha
A nova Alfândega foi installada nesta capital
de mandioca e madeira, além de intensa atividade
no lugar onde existira um antigo fortim, a que
servia então de aquartellamento a parte da de marcenaria e construção.42
tropa de linha, que foi alojada no Convento
do Carmo em o local concedido pelos frades
A Serventia da Casa

39
DAEMON, Basílio Carvalho, op. cit., p. 249.
Carmelitanos, que era na parte inferior 40
De acordo com: MUNIZ, Maria Izabel Perini. Palestra proferida no Instituto
Histórico e Geográfico do Espírito Santo (IHGES) em 15 de setembro de 1993 e
publicada em: Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, n.
43, p. 31-8, 1993/1994. Disponível em http://www.vitoria.es.gov.br/secretarias/
cultura/ihges/izabel.htm [capturado em 21 de janeiro de 2008].
37
Cf. o documento “Memórias para servir à história até o anno de 1817... 41
Cf. BITTENCOURT, Gabriel, op. cit., p.145.
38
DERENZI, Luiz Serafim, op. cit., p. 116. 42
Idem, p.145.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 33
Casa do diretor da colônia de Santa Isabel – 1860. Victor Frond. Acervo: Biblioteca Nacional – RJ/Arquivo Público do Estado do Espírito Santo

Para se ter uma idéia da movimentação portuária contos, sessenta e seis réis e quatrocentos e noventa
local, a Alfândega de Vitória registrou no ano e seis mil-réis) referentes a mercadorias como as
financeiro de 1848-1849 um movimento de acima citadas, além de vidros, roupas prontas,
110:495$275 (cento e dez contos, quatrocentos e vinhos, papéis, livros, tintas, chapéus e ferragens,
noventa e cinco réis e duzentos e setenta e cinco provenientes de portos estrangeiros.44
mil-réis) em mercadorias como carnes, queijos,
A despeito do crescimento comercial verificado
manteigas, ceras, arroz, café, mate, alho, cebola,
nessas décadas no Espírito Santo, ainda não haviam
açúcar, calçados, sabão, chocolates, doces, telhas,
instalações adequadas e definitivas para a Alfânde-
tijolos, azeites, aguardente, louças, tecidos e
ga, que deixou o convento do Carmo para funcio-
produtos metálicos, de diversas procedências do
nar na antiga rua do Ouvidor – alterada para rua
Brasil.43 No mesmo ano financeiro, a província
Duque de Caxias em 1872 – onde permaneceu até
importou 163:066$496 (cento e sessenta e três
a construção da sede própria no antigo cais Gran-
A Serventia da Casa

43
IMPÉRIO DO BRASIL/MINISTÉRIO DA FAZENDA. Mappas geral e parciaes 44
IMPÉRIO DO BRASIL/MINISTÉRIOP DA FAZENDA. Mappas geral e parciaes
das mercadorias nacionaes importadas e despachadas para consumo nas das mercadorias estrangeiras importadas por cabotagem com cartas de guias
Alfândegas do Império do Brasil no anno financeiro de 1848-1849. Rio de Ja- nas Alfândegas do Império do Brasil no anno financeiro de 1848-1849. Rio de
neiro: Imprensa Nacional, 1849, p. 46-49. Disponível em http://www.memoria. Janeiro: Imprensa Nacional, 1849, p. 75-77. Disponível em http://www.memoria.
nemesis.org.br/lst_sum.php?s=00001005&p=0 nemesis.org.br/lst_sum.php?s=00001005&p=0

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 34
de (atual praça 8 de setembro). Presume-se que no
mesmo terreno tenha sido erguida a bela sede do
New London and Brazilian Bank, ou Banco Inglês.
A respeito dessa mudança, fala Elmo Elton:
Sabe-se, também, ter funcionado a Alfândega,
provisoriamente, na Rua Duque de Caxias,
antes da construção da sua sede própria,
com entrada dando para frente para a Praça
8 de Setembro, edifício já demolido, para dar
lugar a um outro, mais amplo e de instalações
modernas.45
A carência de instalações adequadas para a Alfân-
dega e sua guarda repercutia no governo central
do Império naquele momento em que o país bus-
Cais junto à Alfândega de Vitória – ca. 1906. Eutychio D’Oliver. Acervo: BC/Ufes
cava recompor suas receitas combalidas após a In-
dependência. Tanto que, em 1841, o ministro da
Fazenda, Martim Francisco Ribeiro de Andrada já
“autorizava saques para a conclusão das obras da Essa foi a primeira tarifa aduaneira com critério de
alfândega” de Vitória.46 Tal registro indica que ha- pagamento público, com alíquota variando de 2%
via uma obra de construção ou reforma da sede da a 60%, de acordo com a natureza e tipo de bem
Alfândega em andamento, fosse ela sobre as ruínas importado. Em 1874, ela foi substituída pela Tari-
do antigo forte do Carmo ou em outro local. fa proposta pelo ministro Visconde do Rio Bran-
co, mais liberal e menos arrecadatória. A Direção
Essa informação é da maior importância pois des-
Geral das Alfândegas participava dessas tarifas sob
de o Decreto nº 376, de 1844, o Brasil optara pela
o ponto de vista técnico e operativo.48 As fontes
tarifa proposta pelo ministro e secretário de Esta-
existentes indicam a necessidade de cuidadosa aná-
do dos Negócios da Fazenda Manuel Alves Bran-
lise das transformações ocorridas na legislação e
co. Através dessa tarifa o governo introduzia “(...)
na estrutura das atividades aduaneiras do Espírito
uma política de protecionismo alfandegário para o
Santo colonial até a formação do Estado nacional
país, em substituição ao livre-cambismo, sob pro-
brasileiro no século XIX, inclusive o Novo Regu-
testos do Império inglês, nosso maior fornecedor
lamento das Alfândegas do Império, de 1832, re-
de produtos industrializados”.47 A tarifa Alves
formado em 1836, 1860 e 1876.49 Essa legislação
Branco, entre outras providências, fora um esboço
substituiu o foral da Alfândega de Lisboa – que
ainda tímido de uma política de proteção à indús-
modelou a Aduana brasileira em todo o período
tria nacional que precisaria de uma Alfândega bem
colonial – e criou as mesas de rendas e coletorias
estruturada.
A Serventia da Casa

onde não houvesse porto e, em 1834, extinguiu o

45
ELTON, E. Logradouros antigos de Vitória. 2. ed. Vitória: Instituto Jones dos
Santos Neves, 1987. p. 177. 48
AMED, Fernando José & NEGREIROS, Plínio Labriola de Campos. História dos
46
GODOY, José E. P. de,op. cit., 2007, p. 2 introdutória. tributos no Brasil. São Paulo: Nobel/Sinafresp, 2000, p. 216-219.
47
NOVAES, Maria Stella de, op. cit., p. 281. 49
GODOY, op. cit, 2002, p. 13.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 35
Cargueiro recebendo café no cais da Alfândega – porto de Vitória – ca. 1900. Acervo: Arquivo Público do Estado do Espírito Santo

cargo de juiz de Alfândega e criou o de inspetor das tropas brasileiras no Paraguai.50 Mas foi em
de Alfândega, que ainda vigora. Dados levantados 1881 que o presidente da província, Dr. Marcelino
por Godoy indicam continuidade na ocupação dos de Assis Tostes, representou “ao Governo Imperial
cargos de Inspetores da Alfândega de Vitória no pe- sobre a construção de um prédio condigno para
ríodo que vai de 1838 até o final do Império no a Alfândega”51 e a obra foi finalmente inaugurada
Brasil, reforçando a existência de uma Alfândega em 9 de dezembro de 188952 sob a inspetoria de
mais fortalecida, embora hoje existam poucas fon- Cândido Vieira da Costa (1887-1894).53
tes comprobatórias disponíveis. A nova sede fora construída em um pavimento em
A questão da construção de sede própria da área de 1.400 metros quadrados em estilo colonial
Alfândega de Vitória estava sempre na ordem do para abrigar a Alfândega e a Guardamoria do porto
dia. Ela ressurge novamente em 1875 com o prefeito de Vitória. Sabe-se que suas fundações foram feitas
A Serventia da Casa

Alpheo Adolpho Monjardim de Andrade Almeida


(1869-1878), quando o governo adquiriu um antigo 50
DERENZI, Luiz Serafim, op. cit., p. 116.
armazém que pertencera ao Dr. Florêncio Francisco 51
NOVAES, Maria Stella de, op. cit., p. 281.
52
Idem, p. 319.
Gonçalves, inspetor de saúde pública e ex-médico A relação dos nomes de inspetores foi compilada por: GODOY, José E. P.
53

de,op. cit., 2007, p. 1-2.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 36
com estacas em madeira fincadas sobre solo lodoso,
o suficiente para suportar seu peso. Suas amplas
instalações abrigavam as salas de expediente,
armazéns, alojamentos de guardas-mores, arquivos
e desde 1900 foi endereço da Delegacia Fiscal
do Tesouro Nacional (DFTN) do Ministério da
Fazenda. Enfim, tanto para a navegação quanto
para o comércio terrestre e o trânsito das pessoas,
a Alfândega era a grande referência do centro da
cidade.
O local escolhido, um pouco mais ao sul do antigo
forte do Carmo, conhecido por cais Grande entre
os séculos XVIII e XIX, era servido pela rua da Armazém comercial no interior do Espírito Santo – ca. 1900
Fonte: Indicador Ilustrado do governo Jerônimo Monteiro - 1912.
Alfândega, uma via bem próxima ao mar em toda a Acervo: Arquivo Público do Estado do Espírito Santo

sua extensão desde o cais do Imperador, em frente


ao Colégio São Tiago (atual palácio Anchieta), até
Todavia, a partir de 1911, por vontade do prefeito
a rua Pereira Pinto. O nome dado a essa antiga via
Cirilo Tovar, a área foi renomeada para praça Oito
deve estar relacionada à localização da Alfândega
de Setembro para rememorar a fundação da antiga
quando estava ali abrigada no antigo forte do
vila colonial.55
Carmo ou em outro prédio em período anterior.
Assim, na alvorada do século passado, todo o
Elmo Elton registra que em 1872 a rua da Alfândega
movimento comercial e financeiro e mesmo a
teve o nome mudado para rua do Conde D’Eu e
diversão de Vitória concentravam-se na rua da
assim permaneceu até a proclamação da República.
Alfândega. Ali funcionavam o Banco do Brasil, o
Segundo aquele autor, a partir desta data (1889),
New London and Brazilian Bank (Banco Inglês),
a rua retomou o nome original.54 Depois da
os Correios e Telégrafos, a Casa Pan Americano
inauguração da nova sede aduaneira, o cais Grande
e várias firmas importadoras cujos fundos
passou a ser chamado cais da Alfândega por força
voltavam-se ao mar de onde saveiros e alvarengas
do uso popular. Também a área aberta e plana
descarregavam as cargas dos navios ancorados ao
que confrontava diretamente os edifícios e o mar
largo; até mesmo o Cine-Central, primeiro cinema
recebeu o nome de largo da Alfândega.
da capital, lá se instalou até fins dos anos 1920
Após a República e a inauguração do novo prédio, utilizando-se de um antigo armazém de café.
a rua foi oficialmente batizada rua da Alfândega e o
Contudo, seguindo o padrão urbanístico da capital
antigo largo, em homenagem aos feitos do grande
da República, sucessivos governos fizeram inter-
A Serventia da Casa

inventor-aviador e sporstman brasileiro em Paris,


venções que pouco a pouco alteraram o velho estilo
em 1906, foi nomeado praça Santos Dumont.
colonial de Vitória e a rua da Alfândega foi retifica-

54
ELTON, Elmo, op. cit., p. 148. 55
Idem, p. 43.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 37
Baía de Vitória com prédio da Alfândega ao centro à beira mar – ca. 1900. Acervo: Biblioteca Estadual/ES

da, pavimentada e seu percurso ampliado, primeiro da Alfândega, sob a ótica das necessidades federais
até a praça Costa Pereira; depois até a esplanada de então, já era insuficiente e parte da edificação
capixaba. De rua passou a avenida com o nome do seria demolida para construção de um novo prédio
ex-governador Jerônimo Monteiro (1908-1912). de dois pavimentos.
Modernizada a avenida que a ela dava acesso, além É que, após a promulgação da Lei nº 23, de 30 de
do natural acesso pelo mar, o governo federal outubro de 1891, a maioria dos órgãos regionais e
cuidou de fazer um espaço mais amplo para abrigar locais de administração fiscal foi extinta, bem como
a Alfândega e a Guardamoria do Porto de Vitória, as vinte tesourarias da Fazenda e as coletorias. Na
além de outras repartições federais. Segundo Godoy, maioria dos estados restaram apenas as Alfândegas
no mês de junho de 1921 foi aberto um crédito e as mesas de rendas para representarem o
de 300:000$000 (trezentos contos de réis) para a Ministério da Fazenda. Reconhecido o erro, em
A Serventia da Casa

construção dos edifícios destinados à Alfândega de 17 de dezembro de 1892, o Decreto nº 1.166


Vitória e à Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional recriava as delegacias fiscais do Thesouro Nacional
no Espírito Santo. Ou seja, cerca de 30 anos depois (DFTN) nos estados não-litorâneos, isto é, que não
de sua construção, o espaço útil do antigo prédio situavam Alfândegas para assumir as atribuições

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 38
das antigas tesourarias.56
Aos poucos, foram sendo criadas as delegacias
fiscais nos demais estados que consolidaram com
o passar dos anos um conjunto de competências
legais cumulativas de administração fiscal,
patrimônio da União, pessoal, material, obras,
orçamento e finanças, entre outras atribuições.57
No Espírito Santo, a DFTN foi instalada a partir
de 1900, assumindo Alpídio João da Boa Morte
como seu primeiro delegado. Entretanto, Serafim
Derenzi aponta que vinte anos depois a cidade
convivia com “(...) as repartições do fisco federal
mal acomodadas”,58isto é, dividindo o espaço da
Alfândega de Vitória e de sua Guardamoria. Filial da loja comercial de Jerônimo Vervloet, Negociantes – Importadores e
Exportadores – Cachoeira de Santa Leopoldina
Fonte: Indicador Ilustrado do governo Jerônimo Monteiro - 1912.
Arquivo Público do Estado do Espírito Santo

A A Serventia da Casa

Inauguração da Praça Oito de Setembro – Vitória - ca. 1910. Acervo: BC/Ufes


56
GODOY, José E. P. de,op. cit., 2002, p. 60-61.
57
Idem. Ibidem.
58
DERENZI, Luiz Serafim, op. cit., p.156.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 39
Rua da Alfândega – Vitória – 1906. Acervo: BC/Ufes
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 40
Alfândega
do Espírito Santo no século XX:
um marco no coração de Vitória

– Façamos um parêntese e vamos ver a baleia.


– A baleia?!...
– Sim, foi a 1.º de outubro de 1918. Entrou, na baía de Vitória, uma baleia, acompanhada de um
baleote. O povo correu para todos os pontos onde pudesse apreciar o espetáculo do repuxo no mar.
Foi um dia festivo. As crianças gazearam as aulas, os funcionários públicos foram para as janelas
das repartições. Todos queriam ver a baleia. E os comentários cresceram: - O menor é filho ou filha?
– Como se chama um filhote de baleia? – Baleínha?
Os dicionários saíram das estantes: - Não, baleato ou baleote.
Comentou-se o amor materno, característico das baleias, e alguém imaginou prender o baleote, a fim
de que o grande cetáceo não deixasse as águas capixabas. E não faltaram ‘versos’!
No dia seguinte, o dia 1.º de outubro foi feriado, em homenagem ao aniversário da “visita” da baleia
ao Porto de Vitória. (Maria Stella Novaes)

C
oube a Oscar Jugurtha Couto, delegado fiscal do Thesouro Nacional em
Vitória entre 1917 e 1923, juntamente com Claudiano Cláudio Carneiro da
Cunha59, inspetor da Alfândega entre 1917 e 1924, promoverem as iniciativas
necessárias à construção de novas instalações para suas instituições de modo
a estruturá-las para a complexidade tanto do controle e da arrecadação
aduaneira como da fiscalização e arrecadação sobre as rendas internas. A Serventia da Casa

59
Devido à passagem de dois membros da mesma família, Claudiano Cláudio Carneiro da Cunha e Heliomar Carneiro
da Cunha pela inspetoria da Alfândega de Vitória, e de Alice Lissú Carneiro da Cunha, funcionária da Alfândega de
Vitória entre as décadas de 1930 e 1960, a pesquisa também entrevistou Alice Leonarda de Abiahy Madeira Abad (Lissú
Carneiro da Cunha, sobrenome de solteira) para melhor entendimento das raízes aduaneiras dessa família. A respeito,
consultar: ABAD, Alice Leonarda de Abiahy Madeira. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e David
Protti, Vitória-ES, 4 de dezembro de 2007. Acervo da Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 41
pelas casas comerciais da praça de Vitória que
ocorreu nos anos seguintes, principalmente após a
passagem da crise de 1929.
Considerando informações do uso compartilhado
do espaço da nova sede, o prédio comportava no
segundo andar a Delegacia Fiscal do Thesouro
Nacional. Já no pavimento térreo, ocupando
cerca de 1.022 m2, ficavam a Alfândega e suas
dependências. O restante da área neste pavimento
era ocupado pelos dois órgãos, além de servir
como sala de armas, alojamento dos marinheiros,
alojamento dos guardas e pelo gabinete e expediente
da Guardamoria.60
Segundo Pantaleão Santos, a Guardamoria
Rua do Commercio – Vitória – ca. 1910. Acervo: BC/Ufes
É uma seção da Alfândega, subordinada
ao Inspetor, tendo como chefe imediato o
Guarda-Mor – chefe do serviço externo.
O local escolhido para sede conjunta da Alfândega (...) Ao Guarda-Mor compete a inspeção e
de Vitória e da Delegacia Fiscal do Thesouro fiscalização dos serviços de desembarque
e embarque das mercadorias importadas,
Nacional foi a antiga sede da Alfândega, onde o exportadas e em trânsito; visita, revista ou
governo federal construiria um prédio em estilo busca das embarcações procedentes de
neoclássico de dois andares sobre as bases do portos estrangeiros.61
prédio já existente utilizando uma área de 550 As décadas de 1930 e 1940 foram de muita profusão
metros quadrados da porção voltada para a praça na vida social e nos negócios do comércio em
8 de setembro. Vitória. A cidade passou a conviver com os bondes
Pela importância que representava para o Espírito da Companhia Central Brasileira de Força Elétrica
Santo, a propaganda oficial do governo de Nestor (CCBFE) que a ligavam de norte a sul e com as
Gomes fez publicar a imagem da obra no Álbum lanchas e bondes da mesma companhia que faziam
do Estado do Espírito Santo, de 1922. Inaugurado o percurso para Vila Velha.
provavelmente em 1923 o novo prédio pôde Naquele tempo a cidade também ganhou um cais
oferecer a infra-estrutura necessária ao crescimento para receber os pousos semanais do hidroavião
das atividades comerciais e portuárias das décadas
seguintes, marcadas pela importação de máquinas, 60
Cf. Planta do prédio – Próprio Nacional – situado à Praça 8 de setembro, esqui-
equipamentos e materiais para a construção do
A Serventia da Casa

na com a Rua Jeronimo Monteiro, onde funcionam as seguintes repartições do Mi-


nistério da Fazenda nesta capital: Delegacia Fiscal e suas dependências, Delegação
porto de Vitória, das obras da Estrada de Ferro do Tribunal de Contas, Sub-Contadoria Seccional, Instituto de Previdência, Caixa
Econômica e Imposto de Consumo.Ministério da Fazenda. Diretoria do Domínio
Vitória-Minas, do cais de Paul da CVRD, além de da União. Serviço Regional no Estado do Espírito Santo.Vitória, 9 de setembro de
1940. Integrante do processo DDU/ES 600/42 e processo 5.699/43. Consulta na
GRPU/Vitória-ES em fev./2008.
toda a movimentação de mercadorias importadas 61
SANTOS, J. Pantaleão. Alfândegas. Legislação e Prática de Serviço (Fiscais
aduaneiros). Rio de Janeiro: Irmãos Di Giorgio, 1950, p. 41.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 42
da Cia. Condor no bairro de Santo Antonio. No
governo do prefeito Asdrúbal Soares (1930-1933),
as ruas da cidade alta receberam novo posteamento
de ferro com lâmpadas elétricas iluminadas com a
energia gerada na convertedora da CCBFE, na rua
7 de setembro. As memórias de Elmo Elton são
ricas ao detalhar os cenários de Vitória antiga:
Desde o governo profícuo de Florentino
Avidos, Vitória passou a ser conhecida,
mesmo fora do Estado, como cidade
presépio (...). E Vitória parecia mesmo um
presépio que ainda mais belo se tornava à
noite, com a iluminação feérica e colorida
dos logradouros (...). Autêntica maravilha da
natureza, jóia de arte como cidade pequena
mas administrativamente moderna, Vitória
encantava seus moradores, seduzia os turistas Rua do Commercio – 1912. Acervo: BC/Ufes
que chegassem de qualquer país, mesmo do
estrangeiro. Tripulantes moços de navios
europeus, cativados pela hospitalidade dos
ilhéus e pelos atrativos da cidade, desertavam,
vez por outra, de seus barcos e, embora
clandestinamente, aqui se ficavam por muito
tempo (...).62
Essa Vitória iria também conhecer uma nova
modelagem de sua baía, adaptada para ser um
porto condizente com o movimento comercial
e de passageiros que transitavam pelo Atlântico
brasileiro, desde o sul até o nordeste. No Espírito
Santo, Benevente, Guarapari, Vitória, Santa Cruz,
Regência e São Mateus eram as paradas obrigatórias
dos vapores. Já as partidas e chegadas do estrangeiro
se davam por Vitória.
Casa Pan-Americano.\Fonte: COELHO, José. Estado do Espírito Santo: obra
O porto de Vitória começou a configurar-se como de propaganda geral do estado do Espírito Santo. Rio de Janeiro: Officinas da
“Pap. Vênus” Henrique Velho,1923/4 (?). Acervo: BC/Ufes
hoje se apresenta, no final do século XIX, quando
o cais do Imperador, situado na frente do palácio
Anchieta, sede do governo estadual, mostrou-se
A Serventia da Casa

impróprio para embarque e desembarque de cargas


volumosas ou de peso elevado, como as de café e de

62
ELTON, Elmo, op. cit., p. 17.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 43
Prédio da Alfândega em obras na Praça Oito de
Setembro – 1922
Fonte: COELHO, José. Estado do Espírito Santo:
obra de propaganda geral do estado do Espírito
Santo. Rio de Janeiro: Officinas da “Pap. Vênus”
Henrique Velho,1923/4 (?). Acervo: BC/Ufes
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 44 Sede da Alfândega na Praça Oito de Setembro


década de 1930. Acervo: J. Tatagiba
maquinário, que necessitavam que o navio ficasse
atracado nas docas e permitisse a aproximação
das linhas férreas e operação por guindastes.
Em janeiro de 1875 o ministro dos Negócios da
Agricultura, Commércio e Obras Públicas, José
Fernandes da Costa Pereira, nomeou o engenheiro
austríaco Andreas Lebin Cernadack “(...) para
proceder nesta província aos estudos necessários
para desobstrucção da barra da Victoria”.63 O
engenheiro Cernadack, neste trabalho pioneiro
de adaptação da baía de Vitória à modernização
portuária, foi auxiliado pelo também engenheiro
Cezar de Rainville. Porém, ao viajarem para o O(bras do porto de Vitória próximo à Rua do Commercio – ca.1926
Rio de Janeiro no vapor Diligente, da Companhia Acervo: Codesa

Espírito Santo e Campos, para apresentarem a


carta topográfica e descritiva da baía e da barra
de Vitória e demais levantamentos ao governo
imperial, o navio naufragou na altura de Maricá, e
os estudos se perderam para sempre.64
Em 1906 foi finalmente concedida à Companhia
do Porto de Vitória a construção de 1.130 metros
de cais na parte sua da ilha de Vitória, sendo
os trabalhos de aterro e construção das docas
contratados com a empresa C. H. Walker & Co. Ltd.
No entanto, a interrupção das obras por mais de 10
anos gerou a retomada da concessão pelo governo
federal que a repassou ao governo estadual. Em
1925 a construção do cais foi reiniciada e durou
até fins de 1940.65 Entretanto, os planejadores das
obras portuárias parecem não ter atentado para o
fato de que os aterros requeridos para a construção Baía de Vitória, junto à Alfândega e Praça Oito de Setembro com o morro do
Penedo ao fundo – ca. 1926. Acervo: José Tatagiba
do cais de atracação e acesso à capatazia e armazéns
acabariam por isolar o antigo prédio aduaneiro e os
A Serventia da Casa

63
DAEMON, Basílio Carvalho, op. cit., p. 425.
64
Idem, p. 425.
65
Disponível em http://www.portodevitoria.com.br [capturado em 24 de março
de 2008]. A respeito da construção do porto de Vitória, ler: ARAÚJO FILHO, José
Ribeiro. O porto de Vitória. 1995. 300 p. Tese (Concurso para provimento da
cadeira de Geografia do Brasil) – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Univer-
sidade de São Paulo e; SIQUEIRA, Maria da Penha Smarzaro, op. cit., 1991.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 45
armazéns comerciais do contato com o mar.
Em vista da nova configuração do Centro da
cidade, o inspetor-substituto da Alfândega, Luis
Borges, oficiou ao interventor federal, João Punaro
Bley, nos seguintes termos:
Necessitando, esta Inspetoria, de iniciar o
expediente relativo à construção de edifício
destinado a instalações mais adequadas
da Alfândega e Guarda-Moria, uma vez
que a dita repartição e dependência, a par
com o prosseguimento das obras do Cais
do Porto de Vitória, vão se afastando,
gradativamente dos pontos que exigem
Obras de construção do porto de Vitória – 1927. Acervo: Codesa
fiscalização mais intensa, dificultando, assim,
os serviços, já reconhecidamente exaustivos
dos funcionários que integram o quadro da
Polícia Marítima desta Aduana (...).66
Prosseguindo, Borges apresenta uma solução
animadora para preservar as funções precípuas da
instituição que dirigia no Espírito Santo:
(...) Solicito os bons ofícios de V. Excia.
para a cessão de lote de terreno acrescido
sito à Avenida Getúlio Vargas, em frente
ao armazen n°5, anéxo, à área pretendida
pelo Departamento Nacional dos Portos
e Navegação, cujo espaço, considerado
excedente das necessidades do referido porto,
oferece, como já tive ocasião de observar, as
possibilidades desejadas permitindo-me a
realização do empreendimento visado.67
E o inspetor menciona os problemas que a
Alfândega vinha enfrentando na divisão do espaço
Baía de Vitória com ponte Florentino Ávidos, ligando Vila Velha à ilha do do seu prédio com outras instituições federais:
Príncipe – ca. 1935. Acervo: Codesa
(...) Além dos motivos expóstos, acrescento,
ainda, como elementos esclarecedores, os
inúmeros obstáculos encontrados nesta
Inspetoria, quanto à distribuição das diversas
dependências a seu cargo, em prédio que
A Serventia da Casa

ressente de reformas, vindo, a medida

66
Ofício do inspetor da Alfândega de Vitória de 5 de maio de 1941. Processo
10783.012607/92-81. Arquivo/ES/GRPU/SPU.
67
Processo 10783.012607/92-81. Arquivo/ES/GRPU/SPU.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 46
Avenida Capixaba após demolição do antigo casario para sua retificação. Ao fundo o morro do forte São João – ca. 1930. Acervo: David Protti

pleiteada, abranger, com relativa economia temporário, em 1930, e depois para a Caixa
para a União, todos os melhoramentos que Econômica Federal. Mas em abril de 1933 André
tenho em vista.68
Carloni apresentava-lhe um projeto-proposta “para
Os documentos demonstram que a Alfândega adaptação de uma parte do prédio pertencente a
enfrentava problemas locacionais em decorrência Alfândega destinado a Installação da Administração
da perda de seu espaço institucional para a Delegacia do Domínio da União no Estado do Espírito
Fiscal e a mudança para uma nova sede exclusiva Santo”, que recebeu o “de accordo” do engenheiro
com cais de atracação era uma forma de resolver Bernardino de Campos.
o problema sem maior enfrentamento. Contudo,
Ao saber da tramitação dessa proposta, o inspetor
o próprio delegado Fiscal, Heliomar Carneiro da
da Alfândega, Clóvis de Vasconcellos, oficiou, em
Cunha, interessava-se por ocupar os espaços da
junho de 1934, ao delegado Fiscal esclarecendo
A Serventia da Casa

sede aduaneira cedendo-os para outros serviços.


que
Primeiro, para o Domínio da União, em caráter
Tendo esta Alfândega cedido, a título
provisório, por solicitação dessa Delegacia
Fiscal, uma de suas dependências para néla
68
Processo 10783.012607/92-81. Arquivo/ES/GRPU/SPU.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 47
funcionar a Administração do Domínio da
União neste Estado, e havendo, presentemente,
grande necessidade da referida dependência,
para melhor distribuição dos respectivos
funcionários, que estão acomodados em
uma única pequena sala, sem nenhum
conforto, venho, com o presente, solicitar
os vossos bons ofícios no sentido de que a
Administração em apreço tenha acomodação
em outro local, desocupando, assim, a
dependência em que se acha instalada nesta
aduana.69
Na verdade, além de abrigar as atividades aduaneiras
(a secretaria e o gabinete da inspetoria, a seção de
expediente, a Guardamoria e a administração das
capatazias) a sede da Alfândega naquela época
Obras de aterro da área do armazém 5 do porto de Vitória e da futura também abrigava a portaria, tesouraria, a seção do
Avenida Getúlio Vargas – ca. 1930. Acervo: Codesa
Imposto sobre a Renda, a sub-Contadoria Seccional,
a inspetoria Fiscal do Imposto de Consumo e a
inspetoria de Fiscalização Bancária. Ainda assim, o
delegado Fiscal optou pela realização de obras pelo
Domínio da União e despachou “(...) o processo
referente ao orçamento para a adaptação do prédio
anexo à Guardamoria da Alfândega desta Capital,
para a instalação definitiva da Administração do
Domínio da União, neste Estado.”70
Com a decisão, o Domínio da União procurou
definir o seu espaço nas futuras instalações. Como
as três salas da parte da administração das capatazias
voltada para a avenida Jerônimo Monteiro eram
ocupadas pelos despachantes aduaneiros João Luis
de Albuquerque Tovar, Aylton Tovar e Radagásio
Tovar, na primeira sala; Reginaldo Pessoa, na
sala seguinte, e Almir Silva,71 última sala “(...) em
Orla da baía de Vitória junto à Esplanada Capixaba; desapareceu com o aterro
da Avenida Beira-Mar – dec. 1940. Autor: Mazzei. Acervo: Codesa funcção dos respectivos cargos, visto competir
a esta aduana dar-lhes acomodações e, por esse
A Serventia da Casa

69
Idem.
70
Idem.
71
Ofício da Alfândega de Vitória de 23 de junho de 1936. Processo
10783.012607/92-81. Arquivo/ES/GRPU/SPU.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 48
Aterro e obras da construção do armazém 5
do porto de Vitória isolam a Alfândega e sua
Guardamoria do mar – ca. 1935. Acervo: Codesa

Embarque de minério de ferro no vapor finlandês “Modesta” – ca. 1940. Autor: Mazzei. Acervo: Codesa

A Serventia da Casa

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 49
motivo, nenhum aluguel pagam”, os despachantes
foram desalojados para que fossem “(...) ampliadas
secções e adaptação de apparelhos sanitários,
archivo, camara escura e deposito de instrumentos”
do Domínio da União.72 Porém, não é sabido se as
benfeitorias foram, de fato, executadas.
Contudo, a construção do porto de Vitória, realizada
em área de solos lodosos, úmidos e instáveis acabou
Cais de minério de Paul – Vila Velha – ca. 1945. Acervo: BC/Ufes por desestabilizar a antiga estrutura do prédio das
repartições federais onde funcionavam a Alfândega,
a Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional e a Delegacia
do Serviço do Patrimônio da União (Domínio
da União). Comunicação de 17 de dezembro de
1941 enviada pelo então delegado fiscal interino
Heliomar Carneiro da Cunha a Quintino Barbosa
Figueiredo, chefe regional do Domínio da União,
relatava que o prédio “apresenta várias fendas, que
aumentam à proporção que vão intensificando as
importantes obras que se vêm realizando nas suas
proximidades”.73
Deve-se aqui atentar que tais problemas foram
revelados no mesmo ano em que o inspetor da
Alfândega havia solicitado outra área para as
atividades aduaneiras. Em face da demanda ao
interventor Punaro Bley, o Domínio da União,
através do parecer do seu engenheiro Madeira da
Vista da janela do edifício Glória para a construção do porto de Vitória. A área Silva, já se havia manifestado pela demolição do
dos barracões foi requerida para a nova sede da Alfândega – ca. 1940
Autor: Mazzei. Acervo: Codesa prédio e utilização do terreno para a construção
de outro prédio para as repartições federais. Os
termos daquele parecer técnico foram:
(...) Sem pretender fazer objeção a essa idéia,
peço vênia para lembrar a V.S. o seguinte:
É bem verdade que o prédio em que hoje
está a Alfândega já não comporta mais o
A Serventia da Casa

72
Ofício da Directoria do Domínio da União de 01 de março de 1937. Processo
10783.012607/92-81. Arquivo/ES/GRPU/SPU.
73
Ofício protocolado na Chefia Regional do Domínio da União no Estado do
Espírito Santo sob n. 226, Livro 8, fls. 37, em 20 de janeiro de 1942. Arquivo/ES/
GRPU/SPU.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 50
desenvolvimento atual daquela repartição
e correlatas, tendo-se necessariamente de
proceder a uma reforma completa do mesmo,
uma vez que o novo alinhamento projetado
para as Ruas Getúlio Vargas e Jeronymo
Monteiro vae alcançá-lo em duas faces.
E logo conclui:
(...) Parece-me mais lógico, que a construção
de um único edifício ocupando toda a área
atual e reunindo todas as reparticões federaes
na capital do Estado, seria uma solução mais
compatível com a realidade, além de atender
a uma finalidade econômica, uma vez que
os alugueis pagos pelas demais repartições
federaes iria amortisando o capital empatado,
isso sem querer abordar a parte estética e sem
duvida de grande proveito para a cidade”74
Alfândega e Guardamoria entre obras de construção da Avenida Getúlio
Pouco depois, o novo delegado fiscal, Adherbal Vargas e remodelação da Praça Oito de Setembro – ca. 1940. Autor: Mazzei.
Acervo: Codesa
Fontes Cardoso, reiterou a informação de seu
antecessor e requereu imediata vistoria no prédio
alegando a “defesa dos superiores interesses da
Fazenda Nacional”.75 As avarias foram finalmente
analisadas pelo engenheiro Duarte Fonseca de
Aquino que assim relatou:
Para a construção do novo cais, foram feitos
grandes aterros nos fundos deste edifício,
no local onde hoje passa a Avenida Getúlio
Vargas e, em conseqüência, grandes movi-
mentos de terra foram procedidos, havendo
assim uma modificação no estado de adensa-
mento do solo.76
Prossegue ainda o engenheiro a respeito da sede da
Armazém 5 e prédio de escritórios do porto de Vitória e Avenida Getúlio
Alfândega, construída menos de vinte anos antes: Vargas sobre área de aterro – ca. 1940. Acervo: Codesa

(...) é um antigo aterro sobre mangues,


estaqueado a madeira, e que vinha resistindo
perfeitamente, durante anos, às solicitações
provocadas pela construção. Com este
A Serventia da Casa

74
Processo 10783.012607/92-81. Arquivo/ES/GRPU/SPU.
75
Ofício protocolado na Chefia Regional do Domínio da União no Estado do
Espírito Santo sob n. 475, Livro 8, fls. 42, em 02 de abril de 1942. Arquivo/ES/
GRPU/SPU.
76
O documento cita o processo instaurado n. 21.734/42. Há, contudo, referên-
cias ao número de processo 475/42, fl. 5-6. Arquivo/ES/GRPU/SPU.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 51
movimento de terras, entretanto, houve um
pequeno cedimento paralelamente ao cais, o
que fez com que o edifício viesse a apresentar
pequenas fendas em planos verticais paralelos
a esta direção.77
Logo depois, nova Comissão de Vistoria, desta vez
composta pelo mesmo engenheiro Duarte Aquino,
do Domínio da União, José Tarquínio da Silva, do
Serviço de Fiscalização e Exploração do Porto e por
Aécio Palmeiro Lopes, da Fiscalização do Porto de
Vitória, apontou as inúmeras avarias constatadas e
presumiu “(...) que tenha havido uma fuga desse
lôdo por ocasião da dragagem efetuada na faixa do
cais construído há cerca de 50 metros do edifício
(...)”, além da ameaça à vida dos que trabalhavam
Desfile da Força Expedicionária Brasileira na Praça Oito de Setembro, nas repartições. Tendo em vista a magnitude dos
“coração da cidade” – década de 1940. Acervo: Arquivo Geral/PMV
custos para sustar o estrago, a Comissão afirmou
que “(...) se trata de um edifício antigo de grossas
paredes de alvenaria de pedra, de dois pavimentos,
de pisos e forros de madeiras (...)”,78 mas havia
outros motivos:
O prédio que já não se enquadra nos novos
alinhamentos do plano de remodelação
da cidade, não satisfaz às necessidades das
repartições nele instaladas, parecendo, por
isso, mais aconselhável a sua demolição,
para no mesmo local ser levantado novo
prédio com instalações adequadas às suas
finalidades.79
Acatadas as recomendações da Comissão de
Vistoria, o engenheiro Gastão de Castro Cunha,
da Divisão de Engenharia e Obras da Diretoria
do Domínio da União do Tesouro Nacional do
Congresso Eucarístico em Vitória, no “coração da cidade” - 1945. Ministério da Fazenda escreveu parecer conclusivo
Acervo: BC Ufes

77
Idem. Ibidem.
A Serventia da Casa

78
Termo da Vistoria procedida no Edifício da Delegacia Fiscal e Alfândega de
Vitória. 25 de abril de 1942. Minstério da Viação e Obras Públicas/Departamento
Nacional de Portos e Navegação/Fiscalização do Porto de Vitória. Proc. 475/42, fls
8-10. Arquivo/ES/GRPU/SPU.
79
Termo da Vistoria procedida no Edifício da Delegacia Fiscal e Alfândega de
Vitória. 25 de abril de 1942. Minstério da Viação e Obras Públicas/Departamento
Nacional de Portos e Navegação/Fiscalização do Porto de Vitória. Proc. 475/42, fls
8-10. Arquivo/ES/GRPU/SPU.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 52
Guarda-mór da Alfândega de Vitória, Nélson Siqueira Rangel (ao centro, de terno) e guarda da Alfândega, Alexandrino Santos (à direita, com uniforme da
Guardamoria), no porto de Vitória – década de 1950. Acervo: Anésio dos Santos Neto

em janeiro de 1943 em que recomendava a distintas da Alfândega e da Delegacia Fiscal:


construção de um novo edifício para os órgãos Assim, terá que fornecer o programa minucioso
federais: das necessidades atuais dos seus serviços
(com previsão de desenvolvimento futuro);
(...) julgamos que se deva cuidar de construir
planta precisa do terreno de que se disporá
um novo prédio para aquelas repartições,
em conseqüência dos novos arruamentos;
pois o local se presta admiravelmente para
estudo com relação à conveniência de se
este fim, segundo estamos informados.80
construir dois prédios, um para a Delegacia
Talvez movido pela possibilidade de ocorrerem Fiscal e outro para a Alfândega, ou um único,
desabamentos, o parecer recomendava a embora independentes internamente; as
áreas necessárias e o número de funcionários
transferência imediata das repartições federais
que deve ser prevista em cada secção, com
para outro local e solicitava o envio àquela Divisão esquema de localização mais conveniente
das informações essenciais para a elaboração de para a Alfândega, sua Guardamoria, seus
A Serventia da Casa

um novo projeto de acordo com as características armazéns, e da Delegacia Fiscal. Informará


também aquele órgão se a Alfândega deve
ter oficinas, onde devem ser localizadas, se
80
Processo 5.699/43. Vistoria no edifício-sede da Delegacia Fiscal no Espírito no mesmo prédio ou em ponto próximo à
Santo e da Alfândega de Vitória. Arquivo/ES/GRPU/SPU.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 53
Aterro da orla de Vitória para a construção da Avenida Beira-Mar e da Esplanada Capixaba – década de 1950. Autor: Mazzei. Acervo: GRPU/SPU/ES
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 54
Alfândega, etc...81
Tais iniciativas correspondiam ao pensamento
da Escola de Administração Científica, que à
época patrocinava uma grande mudança na
administração pública, principalmente a reforma
de 1934 que privilegiava as funções administrativas
do Ministério da Fazenda em detrimento das
funções arrecadatório-fiscais e propunha critérios
de racionalização e eficiência, separando finanças
e administração.
A partir dessa reforma, a Aduana passara a
denominar-se Diretoria de Rendas Aduaneiras e
todos os tributos e serviços fiscais não aduaneiros
como, por exemplo, os referentes ao Imposto de Ministro do Trabalho, João Goulart (Jango), assina ato de ampliação da base
territorial do Sindicato dos Estivadores para todo o estado do Espírito Santo
Consumo, passaram a ser tratados por outro órgão, – década de 1950. Acervo: Sindestiva-ES

a Diretoria de Rendas Internas.


Conforme observa Eros Nogueira, o ministro da
A ênfase do governo Vargas à tributação interna,
Fazenda Oswaldo Aranha, em sua Exposição de
claramente definida na reforma administrativa de
motivos do Decreto n. 24.026, de 26 de março
1934 de Osvaldo Aranha, auferia maior prestígio
de 1934, tecia as seguintes considerações sobre a
à Delegacia Fiscal do Thesouro Nacional ante as
Aduana:
atividades aduaneiras. Na questão do embate da
É possível que a diretoria de rendas aduaneiras
Alfândega por uma sede autônoma, as demais
venha a exigir, mais tarde, sua transformação
em departamento autônomo à parte da repartições federais contavam com a oportuna
organização do Tesouro, tal como se dá construção do porto e com o interesse das
nos países mais adiantados. Essa amplitude autoridades estaduais e municipais em demolir
pareceu cedo ao projeto, e por isso preferiu-
o antigo prédio aduaneiro, cuja parte original
se a uniformidade de direção, em harmonia
com o que se fez em outras diretorias. É o remontava ao tempo do Império e a outra à
embrião da Inspetoria Geral das Alfândegas Primeira República, e restava destoante das feições
que o projeto lançou; o primeiro passo para urbanísticas da fase varguista. Contudo, aqueles
seu maior desdobramento. Os próprios
órgãos federais ainda conviveriam no mesmo
serviços e o tempo indicarão o momento
em que sua autonomia se completará edifício por cerca de vinte e nove anos sem que ele
totalmente.82 desabasse...
A escolha sobre o local a edificar, entretanto, ganhou
A Serventia da Casa

81
Processo 5.699/43. Vistoria no edifício-sede da Delegacia Fiscal no Espírito
Santo e da Alfândega de Vitória. Arquivo/ES/GRPU/SPU. decisão diversa da pretendida; na continuidade
ARANHA, Osvaldo. Exposição de motivos – Decreto n. 24.026/34 apud
da dragagem e aterro da orla da baía de Vitória
82

NOGUEIRA, Eloy Eros da Silva. Identidade organizacional: estudo de caso do


Sistema Aduaneiro Brasileiro. 2000. 304 p. Dissertação (Mestrado em Adminis-
tração) – Programa de Pós-Graduação em Administração, Universidade Federal para a construção das avenidas Princesa Isabel e
do Paraná, p. 117.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 55
Aterro da região de Bento Ferreira e ilha de Santa Maria para construção da Avenida Beira-Mar e bairros da orla de Vitória – década de 1950
Autor: Mazzei. Acervo: Codesa

Mascarenhas de Moraes (Beira-Mar), a Delegacia âmbito da Seção de Fiscalização da Delegacia da


Fiscal do Thesouro Nacional optou por construir Receita Federal do Ministério da Fazenda, através
o novo prédio não na praça 8 de setembro mas em de duas supervisões distintas, a de importação e a
nova área aterrada pelo governo estadual de Jones de exportação. O ex-aduaneiro José Alfredo Cabral
dos Santos Neves. assim explicou essas transformações:
A construção do novo prédio do Ministério da Fa- Aí a Alfândega foi transformada em Recei-
ta... desapareceu a Alfândega, acabaram com
zenda, porém, só deslancharia no final dos anos 50,
a Alfândega, criaram a Delegacia da Recei-
mas sofreria interrupções por cerca de outros doze ta Federal e os serviços todos da Alfândega
anos, vindo a receber as instituições federais por eram executados pela Seção da Fiscalização
A Serventia da Casa

volta de 1969/1970. Nessa época a Alfândega já ti- da Delegacia da Receita de Vitória.83


nha sido extinta ao mesmo tempo em que foi cria-
da a Secretaria da Receita Federal, no ano de 1968. 83
CABRAL, José Alfredo. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio
Barros e Davi Protti, Vitória-ES, 12 de dezembro de 2007. Acervo Alfândega/
O que restou das atividades aduaneiras ficou no Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 56
E esclarece que a Fiscalização atuava tanto na to em tanto tempo saía
tributação interna quanto externa: um grupo de agentes
fiscais da inspetoria,
fiscalização era todo o serviço de fiscaliza- iam lá, era Ipatinga o
ção aduaneira, de rendas internas e comércio nome da cidade. Iam
exterior. Seção de Fiscalização, ela agregou até Ipatinga onde
todos os serviços relacionados à fiscalização estava sendo cons-
de todo o Ministério da Fazenda.84 truída a Usiminas
Os antigos aduaneiros incorporados à Receita onde estavam
sendo deposita-
Federal continuaram prestando serviços relevantes
das essas mer-
no desembaraço dos equipamentos industriais cadorias, ainda sob o
importados que chegavam por Vitória para o parque controle aduaneiro, sob o contro-
siderúrgico de Minas Gerais e do Espírito Santo. le aduaneiro, mas sob a fiscalização de um
José Alfredo Cabral – 2007
fiscal que era revezado toda semana, mudava Autor: David Protti
José Alfredo Cabral, ingresso no início de 1964,
um fiscal então na época que existia uma sé- Acervo: ALF/VIT
fala do funcionamento dos serviços aduaneiros rie de despachos a serem examinados, saiam
nessa época: daqui então da inspetoria para liberar essas
mercadorias lá em Ipatinga.85
Quando eu entrei era Ivo Wanderley, o
inspetor da Alfândega de Vitória. E a
função da Inspetoria era todos os serviços
relacionados com a Alfândega de conferência
de importação, conferência de exportação e
atividades internas e administrativas e tal. E da
Guardamoria, era parte de fiscalização, eram
plantões fiscais de prevenções a infrações
e visitas a entrada de navios estrangeiros,
busca e apreensão em navios estrangeiros
e nacionais, que mais?, e outros serviços
extras como: a Usiminas que foi construída
em Minas, né, Usiminas, toda a importação
feita pela, do material para a construção
da Usiminas foi feito através do porto
de Vitória. Mas as mercadorias não eram
liberadas, examinadas, fiscalizadas e liberadas
no porto de Vitória. Elas chegavam, eram
transferidas em trânsito para o setor criado
lá, na Usiminas e depositadas lá, e lá e depois
lá que elas eram fiscalizadas e liberadas. Trabalhadores da Alfândega de Vitória inspecionam carga recebida, entre
eles o marinheiro Benedito (E), Hernande Vieira (mais abaixo, vendo-se sua
E prossegue com suas memórias: cabeça) e o fiscal Ailton Bonelle (o segundo da direita para a esquerda). ca.
1960. Acervo: Anésio dos Santos Neto.
E nós da Guardamoria éramos designados,
A Serventia da Casa

um fiscal por semana, para fiscalizar e man-


ter um plantão fiscal nesse depósito das mer-
cadorias antes delas serem liberadas. De tan-

84
CABRAL, José Alfredo. Entrevista concedida... 85
CABRAL, José Alfredo. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 57
Cartão postal do centro de Vitória onde se vê abaixo, à direita, a Praça Oito de Setembro e o prédio da Alfândega – década de 1950 . Acervo: BC/Ufes

Daí em diante, abrigada no edifício do Ministério era a supervisão de grupos, então tinha:
da Fazenda, a Alfândega – a secular instituição ca- supervisor A, supervisor (...) de grupo A,
pixaba e uma das instituições coloniais portuguesas de grupo B, supervisor de parte de IPI,
mais arraigadas no Brasil – viu-se diluída entre as porque não misturava, não conseguia... E
diferentes seções da Delegacia da Receita Federal, aí começou. E começou a acontecer o quê?
de acordo com as novas orientações mantidas pela Começou também a trabalhar depois, juntos,
Secretaria da Receita Federal, órgão que então ab- os delegados começaram a fazer o quê?
sorveu suas atividades. Nas palavras de Geraldo Botar fiscal aduaneiro com fiscal de Imposto
Buteri, um funcionário que migrou da Delegacia de Renda prá tentar, o camarada aprender,
Regional do Imposto de Renda para a Seção de Tri- ver como é que era. E começou, os fiscais
butação de Rendas Externas: aduaneiros com os fiscais de Imposto de
(...) como houve a fusão, apesar de estarem Renda, na área secundária do aduaneiro,
todos juntos, existiam grupos separados, porque não faziam. Não tinham tempo. E
de supervisão. O setor, por exemplo, de aos pouquinhos foi indo, foi indo, com pouca
A Serventia da Casa

aduaneiro, tinha um supervisor; ele é que gente, mas foi levando, e foi interagindo de
manipulava com (...) o pessoal. Só que tal maneira que foi crescendo.86
a orientação era única, tá entendendo?
Começou a ser uma só. Mas, a supervisão BUTERI, Geraldo. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e
86

David Protti, Vitória-ES, 19 de fevereiro de 2008. Acervo Alfândega/Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 58
Perspectiva do projeto do edifício-sede das repartições federais em Vitória - 1957. Acervo GRPU/SPU/ES

Dentro da nova estrutura fiscal federal e da política automóveis, por exemplo.87


econômica brasileira, pouca expressão tinham as Com a criação da Carteira de Exportação e Im-
atividades aduaneiras. Outro aspecto que marca a portação (CACEX), setor do Banco do Brasil, em
desmontagem da estrutura da antiga Alfândega, para 1953, esta passa a incumbir-se da emissão das guias
além da sede própria, foi a extinção da Guardamoria, de Importação e de Exportação e a exercer um
a polícia marítima que dava sustentação à atividade controle sobre os preços das operações internacio-
de combate ao contrabando e descaminho. Na nova nais e sobre os regimes econômicos aduaneiros. Já
estrutura, algumas competências foram assumidas o Conselho de Política Aduaneira ficava responsá-
pela Polícia Federal – criada em 1965 –, enquanto as vel por regular o sistema tarifário aduaneiro. Todas
atividades de controle administrativo do comércio estas funções antes imputadas à Diretoria de Ren-
exterior foram incorporadas pela Carteira do das Aduaneiras.
Comércio Exterior (Cacex) do Banco do Brasil S/A,
Em agosto de 1957 operou-se uma importante
que se encarregava da documentação e das guias
reforma no sistema cambial e tributário do país,
de importação e exportação e das transferências de
através da Lei nº 3.244, de 14 de agosto de 1957. O
numerário para o exterior. Nesse período, o Brasil
objetivo era, em primeiro lugar, simplificar o siste-
figurava entre as nações mais protecionistas e de
ma de taxas múltiplas e introduzir um sistema de
comércio mais fechado do mundo, focado que
proteção específica por produtos da mesma cate-
estava em reservar o mercado consumidor interno
goria. Em segundo lugar, como as receitas líquidas
às empresas nacionais e subsidiárias estrangeiras
das operações cambiais, apropriadas pelo Tesouro
autorizadas a produzir no interior do país.
através do Fundo de Ágios e Bonificações geren-
Sob o lema exportar é o que importa, o governo brasileiro ciado pelo Banco do Brasil, tinham vinculações de
priorizou a realização de superávits na balança uso determinadas por lei, o que eliminava sua fle-
A Serventia da Casa

comercial. Para isso, utilizou tarifas extremamente


elevadas para reduzir as importações, quando não,
87
A este respeito, consultar: LOUREIRO, Ronaldo. Entrevista concedida a Luiz
de simples medidas de proibição, especialmente de Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e David Protti, Vitória-ES, 10 de dezembro de
2007 e; IMPERIAL, Severiano Alvarenga. Entrevista concedida a Luiz Cláudio
bens de consumo de elevado valor agregado como Ribeiro, Nicélio Barros e David Protti, Vitória-ES, 14 de dezembro de 2007.
Acervo Alfândega-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 59
valorem, variando de zero a 150% para cada grupo de
produtos similares. Para a exportação foi mantido
o regime de quatro categorias, com bonificações
distintas para cada uma.88
Para operar o novo sistema, foi criado o Conse-
lho de Política Aduaneira (CPA) com o objetivo de
enquadrar os produtos em uma das categorias de
importação e estabelecer as alíquotas que seriam
pagas em um intervalo que variava de 30% abaixo
a 30% acima das tarifas máxima e mínima fixadas
para o grupo de produtos no qual o produto espe-
cífico estivesse classificado.89
Movimentação de carga em armazém do porto de Vitória – ca. 1970 Esse sistema, que esteve em vigor até 1961, sofreu
Acervo: Codesa
substanciais modificações ao longo desses anos. As
mais importantes referiam-se à passagem gradual
xibilidade como fonte de recurso para o setor pú- das exportações para o mercado livre. Com efei-
blico, seria necessário reajustar as tarifas, a fim de to, a Instrução nº 167, de janeiro de 1959, liberou
aumentar os recursos sem vinculação à disposição as exportações de manufaturados para o mercado
do Tesouro. livre; a Instrução nº 192, de dezembro de 1959,
Do ponto de vista do comércio exterior, a reforma transferiu todas as exportações para esse mercado,
resultou no aparecimento de três categorias. exceto as de café, cacau, óleo mineral cru e ma-
Através da categoria Geral eram importados mona em bagas; finalmente, a Instrução nº 181, de
matérias-primas, equipamentos e bens genéricos abril de 1959, liberou os fretes. Paralelamente a es-
que não contassem com suficiente suprimento sas liberalizações, outras modalidades de controle
interno. Pela categoria Especial eram importados foram introduzidas conforme se vê na análise da
os bens de consumo restrito e os bens cujo década de 1960. De um ponto de vista mais amplo,
suprimento fosse atendido pelo mercado interno. a reforma de 1957 implicou num aprofundamen-
Mantinha-se o regime de leilões de divisas para to do processo de substituição de importações, na
essas duas categorias, recebendo a categoria Geral, medida em que se alcançava estágio mais avançado
evidentemente, a maior parcela de cambiais. A na industrialização.
terceira categoria, não sujeita a leilão, a categoria Em 1962, o Ministério da Fazenda celebrou com
Preferencial, foi criada para a importação de bens a Fundação Getúlio Vargas um convênio com o
com tratamento privilegiado – papel, trigo, petróleo,
A Serventia da Casa

fertilizantes e equipamentos de investimentos


88
BRASIL. Lei n. 3.244, de 14 de agosto de 1957. Ver Capítulo II – Da Alíquota
prioritários. A taxa paga era pelo menos igual ao e Anexo, com 95 páginas sobre as alíquotas de importação. É importante
ressaltar que esta Lei, parte da chamada “reforma de 1957”, integrava o
câmbio de custo, isto é, a taxa cambial média paga escopo do principal projeto de governo estabelecido pelo presidente Juscelino
Kubitschek, o “Plano de Metas”.
aos exportadores. Foram estabelecidas tarifas ad 89
BRASIL. Lei n. 3.244, de 14 de agosto de 1957. Ver Capítulo VII – Do Conselho
de Política Aduaneira.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 60
Edifício do Ministério da Fazenda – Vitória-ES - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

objetivo de obter assistência técnica especializada outros. Com respeito à área aduaneira, a Comissão
em sua reestruturação. Foi constituída, então, uma desenvolveu seus estudos em três campos: a
Comissão de Reforma do Ministério da Fazenda, reforma da tarifa, a reforma da administração e
composta por consultores e representantes das atualização da legislação aduaneira.
áreas interessadas e abrangidas pelo seu propósito. Efetivamente, as diretrizes básicas da reforma
Essa Comissão funcionou de 1962 a 1967 e seu tributária de meados da década de 1960 foram
trabalho estabeleceu as bases para modificações consubstanciadas, em caráter preliminar, na
fundamentais nesse Ministério e em matérias a Emenda Constitucional nº 18, de outubro de 1965.
ele vinculadas, como por exemplo: a reforma do Foi, entretanto, a Lei nº 5.172, de 25 de novembro
sistema tributário nacional, o modelo de pacto de 1966, criadora do Código Tributário Nacional
A Serventia da Casa

federativo tributário, arrecadação de tributos pela (CTN), que explicitou de forma cristalina seus
rede bancária, sistema nacional de processamento contornos jurídicos, estabelecendo pautas a serem
de dados, estrutura permanente de educação e obedecidas pelas três esferas governamentais em
treinamento na administração fazendária, entre

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 61
Obras de construção do porto de Tubarão – Vitória-ES – década de 1960. Acervo: Codesa

matéria de tributos. Seus principais objetivos podem tributárias do país, explicitadas na criação do novo
ser assim sumarizados: a) aumentar a captação CTN, o governo federal editou o Decreto-Lei 37,
de recursos financeiros para os cofres públicos, de 18 de novembro de 1966, transformando a
visando a garantir ao Estado condições quer para Diretoria das Rendas Aduaneiras em Departamento
desempenhar novas funções que incorporara ao de Rendas Aduaneiras (extinto em 1968), através
longo do processo, quer para eliminar o déficit do Artigo 142. No entanto, o Artigo 145 do
público, identificado como uma das principais mesmo Decreto apontava: “Fica o Poder Executivo
fontes da inflação e; b) transformar o sistema autorizado a instalar Alfândegas, Postos Aduaneiros
tributário numa poderosa e eficaz ferramenta capaz e outras repartições nos locais onde essa medida
de impulsionar, promover e orientar o processo de se impuser, bem como a extinguir as repartições
acumulação.90 aduaneiras cuja manutenção não mais se justifique”
Em seguida, em convergência com a política de (grifos nossos). A realidade dos fatos deu-se com a
A Serventia da Casa

racionalização e centralização das arrecadações extinção, entre 1966 e 1968, do termo Alfândega,
ficando a legislação aduaneira à mercê da recém-
criada Secretaria da Receita Federal, conforme
OLIVEIRA, Fabrício Augusto de. A reforma tributária de 1966 e a acumulação
demonstrado abaixo.
90

de capital no Brasil. 2. ed. Belo Horizonte: Oficina de Livros, 1991, p. 48-49.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 62
Os impostos sobre o comércio exterior – setor
externo da economia – que englobam tanto o
imposto sobre as importações como sobre as
exportações, passaram, com a reforma, a integrar
definitivamente o quadro instrumental da política
econômica em seu esforço voltado para a organização
da economia. O imposto de exportações, que até
o advento da Emenda nº 18 era de competência
dos estados, enquanto cabia à União o imposto de
Trabalhadores portuários embarcam carga em porão de navio no porto de
importações, foi definitivamente transferido para Vitória – década de 1970. Acervo: Codesa

esta esfera.
A nova orientação da política econômica inspirada
nas exigências da estrutura produtiva que se
instalara - de um novo modelo de crescimento que
residisse na intensificação das exportações quer para
a obtenção das divisas exigidas para a realização
das importações, especialmente de bens de capital
e de insumos básicos, quer para a abertura de
novos mercados para os produtos manufaturados
cujos setores se encontravam com capacidade
ociosa - foi decisiva para sacramentar a reforma
tributária. Diante dos objetivos do novo modelo, a
transferência do imposto de exportação da esfera
estadual para a União, e a sua transformação,
juntamente com o imposto de importação, em um
instrumento regulador do comércio exterior, mais
que se justificavam.
Assim, uma nova estrutura foi proposta para
conduzir a administração tributária no Brasil.
Através do Decreto n. 63.659, de 20 de novembro
de 1968, a Secretaria da Receita Federal foi criada
e instalada em substituição à anterior Direção
Geral da Fazenda Nacional, incluindo as funções
desempenhadas pelas extintas Diretorias de Rendas
A Serventia da Casa

Aduaneiras, de Rendas Internas, de Imposto de


Renda e de Arrecadação, conforme a redação dada
Enrocamento para aterro na Praia do Suá, Praia Comprida e Praia de Santa
ao Artigo 6º do decreto citado. Helena – Vitória-ES – dec. 1960/1970. Acervo: Codesa

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 63
Bairro São Pedro surgido em área de “lixão” em manguezais da ilha de Vitória – década de 1980. Autor: David Protti. Acervo: David Protti

O ato que criou a Secretaria da Receita Federal em sua competência, a nova organização apoiar-se-ia
1968 e esvaziou o órgão encarregado pela Aduana, em quatro grandes áreas de administração fiscal,
definiu sua estrutura no Artigo 4º em quatro estruturadas em forma de sistemas funcionais.
sistemas básicos: sistema de fiscalização, sistema
Das unidades operacionais locais, situadas nos
de arrecadação, sistema de tributação e sistema
aeroportos, portos, fronteiras e entrepostos, as
de informações econômico-fiscais. Esse critério
principais foram absorvidas pelo novo organograma
não comportava condições para manter um
da Receita Federal, enquanto as menores foram
departamento ou setor especializado por tributo –
sumariamente extintas. Segundo Eros Nogueira, os
IPI, IR e outros – ou por natureza – aduaneiro ou
serviços aduaneiros foram formalmente localizados
tributos internos.
em setores sem recursos e vazios de prioridade
Os responsáveis pela implantação da Secretaria da nessa nova estrutura organizacional.91 As palavras
Receita Federal afirmavam que ela constituía grande do ex-coordenador-geral da Coana, Otacílio
evolução do modelo administrativo e organizacional Cartaxo, exprimem bem aquele momento:
anterior. Argumentavam que, enquanto a extinta A Aduana brasileira foi segregada ao
Direção Nacional da Fazenda Nacional baseava- Serviço de Valor Aduaneiro, na Divisão de
Programação Tributária, na Coordenação
A Serventia da Casa

se numa estrutura de departamentos estanques


do Sistema de Tributação, e ao Serviço
e plurifuncionais, exercendo cada um deles
de Combate ao Contrabando, na Divisão
atividades idênticas (tributação, fiscalização,
administração geral) relativamente aos tributos de
91
NOGUEIRA, Eloy Eros da Silva, op. cit., p. 119.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 64
de Programação de Fiscalização, na manutenção dessas atividades, especialmente do
Coordenação do Programa de Fiscalização, seu padrão de operação e atendimento, diante da
ficando dessa forma, expressa sua função
ausência de recrutamento, treinamento e gestão
marginal dentro da nova estrutura.92
voltada ao âmbito aduaneiro, deve ser atribuída
Apesar das Alfândegas terem deixado de existir àqueles servidores, remanescentes ou não do período
formalmente como organização autônoma do pré-extinção da Aduana que voluntariamente se
Poder Público em 1967, as atividades aduaneiras engajaram nesse esforço. Por mais de quinze anos
continuaram sendo desenvolvidas, em todo o Brasil, essas atividades foram desenvolvidas sem qualquer
nas unidades locais da Secretaria da Receita Federal, coordenação nacional ou direção geral aduaneira.
especializadas ou não. Segundo depoimentos, a

A Serventia da Casa

Porto de Tubarão – déc. 1960/70. Acervo: Codesa

92
CARTAXO, Otacílio Dantas. Modernização da Aduana brasileira. In: SEMI-
NÁRIO ADUANEIRO INTERNACIONAL, 1, 1996, Fortaleza. Anais... Fortaleza:
Unafisco Sindical, 1996, p. 186.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 65
Embarque de minério de ferro no porto de Tubarão – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 66
As Atividades Aduaneiras
da Secretaria da Receita Federal no
Espírito Santo: a DIVCAD-ES
1985|1992

Mas não ignoramos que o tempo histórico se acelera, e que a


contagem desse tempo se faz contra nós. |Celso Furtado|

P
ode-se inferir que a política cambial e a política de comércio exterior
implementadas entre 1967 e 1973 foram claramente bem-sucedidas
no sentido de aumentar as exportações do país e a sua capacidade de
importar, contribuindo direta e indiretamente para o crescimento da
indústria e do produto interno como um todo. Os objetivos, em matéria
de comércio exterior, foram em grande medida alcançados observando-
se inclusive certa diversificação dos parceiros comerciais e uma maior
abertura do Brasil para o exterior. No caso das importações, porém,
essa diversificação não ocorreu, ficando a pauta centrada em matérias-
primas, insumos e equipamentos. Tal situação, entretanto, reverter-se-ia
após 1974, inclusive com a crescente participação do petróleo no total
A Serventia da Casa

das importações.93

93
CORRÊA DO LAGO, Luiz Aranha. A retomada do crescimento e as distorções do ‘Milagre’. In: ABREU, Marcelo
de Paiva (Org.). A ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana – 1889-1989. 11. ed. Rio de
Janeiro: Campus, 1990, p. 292-293.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 67
Praça Costa Pereira, Vitória-ES – ca. 1980. Autor: David Protti. Acervo: David Protti

Ao longo desses anos, vários fatores concorreram retorno à estratégia de substituição de importações,94
para que se criasse um segmento dedicado sobretudo durante o governo Ernesto Geisel
às atividades aduaneiras dentro da estrutura (1974-1979), como forma encontrada pelo governo
organizacional da Secretaria da Receita Federal. brasileiro de tentar superar o estrangulamento das
Pode-se destacar, entre eles, a situação conjuntural contas externas em decorrência da combinação de
do comércio exterior logo após o choque do um surto de crescimento acelerado com a crise do
petróleo, em 1974. Ocorreu crescimento próximo petróleo. A rigidez no processo de importações
a zero das economias industrializadas, além de acabava por diminuir o papel do setor aduaneiro e
crescentes déficits na balança comercial brasileira. sua importância na estrutura da SRF. No decorrer
A estratégia do governo procurou apoiar-se nos
controles tarifários e aduaneiros, em geral, para, 94
Segundo Paulo Sandroni, a política de substituição de importações implica
em “um processo interno de desenvolvimento estimulado por desequilíbrio
em médio prazo, estimular as exportações e impor externo e que resulta na dinamização, crescimento e diversificação do setor
industrial. Portanto, é mais que a produção local de bens tradicionalmente
A Serventia da Casa

controles seletivos às importações e, assim, reduzir importados. Sob essa ótica, considera-se que o desenvolvimento industrial
brasileiro neste século [XX] ocorreu sob o estímulo das restrições externas: a
os déficits. depressão de 1929-32 e a Segunda Guerra Mundial. Depois, entre 1956 e 1961,
a substituição de importações é aprofundada dando lugar a um crescimento
econômico maior que nos períodos anteriores”. Ver: SANDRONI, Paulo. Novo
Durante a década de 1970, não faltaram críticas ao dicionário de economia. 6. ed. São Paulo: Best Seller/Círculo do Livro, 1994, p.
340. Consultar também o texto elucidativo de: TAVARES, Maria da Conceição
Tavares. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro: ensaios
sobre economia brasileira. São Paulo: Zahar, 1972.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 68
Cais Comercial do Porto de Vitória. Em segundo plano, o edifício verde da Embratel, no mesmo local da antiga Alfândega, na Praça Oito de Setembro – 2007
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

daquela década várias mudanças na legislação No caso capixaba, o crescimento urbano da


aduaneira fizeram com que diminuísse ainda mais a capital e a desordenada mudança de padrão e
atuação da Aduana, combalida desde o Decreto-lei estilo arquitetônico que a cidade sofreu fez do
37/66.95 Os órgãos de implementação da política edifício da Alfândega, incrustado em plena praça
eram, então, o Conselho de Desenvolvimento 8 de setembro, parecer uma jóia rara entre os
Industrial, o Banco Nacional de Desenvolvimento espigões que despontavam nas ruas coloniais da
Econômico, o Conselho de Política Aduaneira, a ilha-capital. Como as previsões de desabamento
Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil não se cumpriram e o antigo prédio da Alfândega
e o Conselho Interministerial de Preços. permaneceu de pé e semi-ocupado – sintoma do
enfraquecimento do setor aduaneiro nacional – no
início da década de 1970 o Serviço do Patrimônio
95
Entre 1972 e 1975, foram em número de sete os Decretos-lei que procuraram
dificultar as importações brasileiras e, conseqüentemente, relegaram um papel
da União (SPU) decidiu pela partição da área para
A Serventia da Casa

secundário ao setor aduaneiro da SRF: DL 1.224/72, de 31 de outubro de 1972 (in-


centivo às exportações); DL 1.248/72, de 29 de novembro de 1972 (incentivo às
ceder em aforamento 1.000 m2 onde seria erguida a
exportações); DL 1.295/73, de 21 de dezembro de 1973 (revisão das alíquotas de
importação); DL 1.299/73, de 28 de dezembro de 1973 (acresce as alíquotas de Estação Terminal de Vitória, da Empresa Brasileira
importação); DL 1.334/74, de 25 de junho de 1974 (altera, para cima, alíquotas
do Imposto de Importação); DL 1.366/74, de 29 de novembro de 1974 (estabe- de Telecomunicações S/A (Embratel), obra
lece nova redação e alíquotas para a Tarifa Aduaneira Brasileira); DL 1.455/76,
de 7 de abril de 1976 (estabelece novas regras para a entrada de mercadorias
estrangeiras no país).

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 69
Detalhamento do projeto de construção de portos em Vila Velha-ES, sobre foto de Bonino – 1967. Acervo: Codesa

prevista no Plano Nacional de Telecomunicações;96


os outros cerca de 500 m2 foram cedidos à Caixa
Econômica Federal.97 Nos imponentes edifícios
ali construídos nada mais restou da imagem da
excelência dos serviços aduaneiros prestados ao
Espírito Santo, marca apagada do coração da cidade.
Aliás, parece ter havido uma intensa disputa pelo
terreno entre diversos órgãos da Administração
federal (Ministério do Trabalho, Embratel e Caixa
Econômica Federal), o governo do Estado que lá
chegou a implantar um balcão de atendimento do
A Serventia da Casa

Obras de construção do Porto de Capuaba – Vila Velha-ES – década de 1970 96


A cessão do imóvel foi oficializada através do Decreto Federal 73.449, de 14 de
Acervo: Codesa janeiro de 1974, assinado pelo presidente Médici. Para obter mais informações
sobre a tramitação, consultar processos 12.605/92, 12.607/92, 12.608/92 , apensa-
dos no processo 10783.012.580/92-27 no Arquivo/ES/GRPU/SPU- Vitória-ES.
97
Processo 10783.012.580/92-27. Arquivo/ES/GRPU/SPU- Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 70
contribuinte mantido pelo Banco do Estado do
Espírito Santo S/A (Banestes) e pela Delegacia
da Receita Federal e um setor da Secretaria de
Segurança Pública no início dos anos 1970. Até
mesmo a Associação dos Ex-Combatentes do Brasil
no Espírito Santo pretendeu obter a cessão gratuita
do imóvel para ali constituir sua sede social.98
Entretanto, a única proposta de uso diferenciado
foi a da Prefeitura Municipal de Vitória, apoiada
no laudo de vistoria do imóvel feita por comissão
especializada, que reivindicou o terreno da Alfândega
de Vitória para transformá-lo em praça pública com
áreas verdes pretendendo aumentar a ventilação e
embelezar o centro da capital.99
No entanto, como se ampliava a partir de meados
da década de 1980 o quantum das importações e
diversificava-se a pauta de exportações, a gravidade
dos problemas da área aduaneira começou a
merecer destaque, revelando a falta de estrutura
Inauguração do Porto de Praia Mole, da Cia. Siderúrgica de Tubarão, pelo
organizacional para gerir essa área e atender à presidente João Figueiredo – início da década de 1980. Acervo: Codesa
realidade econômica e às demandas dos operadores
do comércio internacional. Em 1985 a área
aduaneira ganhou um novo status com a criação
da Divisão de Controle Aduaneiro (DIVCAD), Geral do Sistema de Controle Aduaneiro (Coana),
ainda lotada no âmbito das delegacias estaduais da atualmente Coordenação-Geral de Administração
Receita Federal. Aduaneira, mantida a mesma sigla.
De qualquer modo, o setor aduaneiro deixou Instalada ainda em 1985 no estado do Espírito
de atuar nas supervisões de Exportação e de Santo, a DIVCAD local teve como seu primeiro
Importação para ter um espaço maior de atuação. chefe Ronaldo Loureiro, que havia ingressado
As DIVCADs funcionavam por regiões, com na Receita Federal como fiscal em 1978 e, após
chefias próprias e passaram a estabelecer um uma experiência de pouco mais de 2 anos como
contato mais direto com as decisões da Receita inspetor da Alfândega no Aeroporto Internacional
Federal, diretamente em Brasília, sobretudo a de Belém veio para a Divisão de Fiscalização da
partir de 1988, com a criação da Coordenação-
A Serventia da Casa

DRF em Vitória. Segundo suas palavras, a Divisão

98
Processo 10783.012.580/92-27. Arquivo/ES/GRPU/SPU- Vitória-ES.
99
A comissão da PMV foi constituída em 21 de dezembro de 1971. Cf. processo
10783.012.580/92-27. Arquivo/ES/GRPU/SPU- Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 71
A partir da necessidade revelada naquela conjuntura,
foi criado o sistema aduaneiro (núcleo especializado
com status estratégico nacional e núcleos operacionais
especializados, num conjunto que estabelece uma
coordenação-geral e uma unicidade), de modo a
fornecer especificidade a essas atividades, no seu
conjunto. Essa comissão teve uma missão geradora
e, graças a seu desempenho, logo em seguida
foi elaborada, em 1985, uma nova versão do
Regulamento Aduaneiro, consolidando a legislação
principal e todas as outras esparsas. Conforme
demonstrado, em 1988 foi criada a Coana, sendo
seu primeiro coordenador, Antônio Carlos
Obras do Porto de Praia Mole – ca. 1980. Acervo: Codesa Portinari Greggio. A Coana, entretanto, tinha seus
espaços constitucionais e operacionais limitados
pela competência concorrente dos outros sistemas
de Controle Aduaneiro internos da SRF (sistema de arrecadação, sistema
(...) Foi criada depois de um trabalho de de fiscalização, sistema de tributação e sistemas de
velhos aduaneiros que procuravam valorizar informações e tecnologia).
a atividade aduaneira e, por outro lado, até
valorizar o Brasil como um país que tinha O ano de 1988 foi marcante para o reaparecimento
uma Alfândega. O Brasil era um dos poucos e consolidação do setor aduaneiro no Brasil. O
países do mundo que não tinha uma alfândega. Congresso Constituinte, instalado desde o início
Então, cadê a Alfândega? As pessoas vinham
ao Brasil e não existia Alfândega!100 de 1987 debatia, entre tantos assuntos, o papel
da administração fazendária no país e procurava
Essa conjuntura de crescimento do comércio
rever a racionalidade dada ao fisco nacional durante
exterior brasileiro demandou uma atuação mais
os governos militares (1964-1985). O crescimento
efetiva da Secretaria da Receita Federal no âmbito
das atividades ligadas ao comércio exterior e
aduaneiro, justificando as iniciativas que permitiram
a necessidade de se construir novas parcerias
a revisão de sua estrutura e a acomodação de
comerciais trouxeram à tona um intenso debate
segmentos especializados na atuação aduaneira em
acerca da autoridade aduaneira.
todos os níveis hierárquicos. Assim, a administração
da SRF, à época, sensibilizada pela situação, formou Nesse sentido, o funcionamento da Aduana, em
uma comissão para analisar os problemas e propor especial seu papel de repressão ao ilícito comercial,
e implementar soluções. dividiu as opiniões dos constituintes. De um lado
a SRF, reivindicando para si uma tarefa que vinha
A Serventia da Casa

desempenhando desde sua criação em 1968, ainda


100
LOUREIRO, Ronaldo. Entrevista concedida... Somente em 9 de novembro
que privilegiasse o setor de impostos internos. Por
de 1988 é que Loureiro foi nomeado para exercer o cargo (DAS 101.1) chefe da
Divisão de Controle Aduaneiro da DRF em Vitória, através da Portaria SRF n°
outro lado, entra em cena o Departamento de Polícia
1.066, de 09/11/1988.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 72
Vista do complexo siderúrgico-portuário de Tubarão – década de 1980. Autor: David Protti. Acervo: David Protti

Federal (DPF), dirigido pelo delegado Romeu eu chego lá, realmente, todos os setores
Tuma, buscando para si o controle das atividades da Alfândega, seja pátio, a bancada de
policiais ligadas ao contrabando e descaminho no passageiros (...) entupido de agentes da Polícia
Federal, todos com aquelas jaquetas e tal, e
comércio exterior. Estabeleceu-se uma polêmica eu interpelei naquele momento o delegado
que extrapolou o Congresso, chegando à imprensa que estava no comando da operação e ele
nacional e a episódios que deixaram, frente a frente, disse que estava lá para assumir o comando
autoridades da SRF e da Polícia Federal. da repressão, ali no Aeroporto. E eu não
podia imaginar uma situação dessas já que
Paulo Cortez, à época inspetor da Receita Federal não tinha sido destituído da função.101
no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, O que estava em disputa naquele momento era o
em depoimento recente, relata acontecimentos controle de um setor estratégico para a economia
de 1987-1988 que se tornaram determinantes nacional e em franco desenvolvimento desde
para a nova fase que o setor aduaneiro brasileiro meados da década de 1980: o comércio internacional
experimentava: brasileiro. E o embate prosseguia conforme aponta
(...) foi uma surpresa, num sábado de Cortez:
A Serventia da Casa

madrugada, me telefonaram lá do Aeroporto


dizendo que o Aeroporto tinha sido invadido No decorrer do dia, mais ou menos 9 horas
por aproximadamente 300 agentes da Polícia da manhã, me telefonam do armazém do
Federal. (...) não imaginava o porquê e fui
imediatamente para o Aeroporto. Quando Paulo Cortez. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e Da-
101

vid Protti, Rio de Janeiro-RJ, 25 de janeiro de 2008. Acervo Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 73
Baía de Vitória – ca. 1990 . Autor: David Protti. Acervo: David Protti

Aeroporto (...) e me alegam que a Polícia Esse foi um momento crucial dos episódios. A
Federal tinha feito um “bivac”, montado reação do pessoal aduaneiro foi, de forma simbólica,
com metralhadora, impedindo a entrada
de qualquer pessoa no armazém da Receita a defesa de um setor tão importante para o país e
Federal, seja o pessoal da Infraero ou da que, em período recente sofrera tantos desgastes:
Receita. Me dirigi para lá; quando eu chego a Aduana nacional. Após um clima de tensão,
lá, encontro meus funcionários, talvez em em que os desdobramentos poderiam ser muito
número de 50 ou mais, todos eles parados na
entrada, com o portão fechado e a Polícia não negativos, os agentes da Polícia Federal retiraram-
permitindo a abertura. (...) eu disse: “o quê se do armazém da SRF com a promessa de que
que é isso?” “Não ninguém pode... Ordem voltariam. Nesse ínterim, o inspetor da SRF no
nossa: ninguém pode entrar” [resposta do
A Serventia da Casa

Porto do Rio de Janeiro, Serafim Cipriano Pereira,


agente da PF].102
a partir de determinação do superintendente da
7ª Região Fiscal, José Vicente Garcia Martins,
deslocou todos os funcionários aduaneiros para
102
Paulo Cortez. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 74
o Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro, em
número de aproximadamente trezentos.
Nessa altura dos acontecimentos, o ministro da
Fazenda Maílson da Nóbrega, extremamente
preocupado com os acontecimentos no Aeroporto
do Rio de Janeiro, pediu ao superintendente da
7ª Região Fiscal, José Vicente Martins, e a Paulo
Cortez, que conversassem com o diretor da Polícia
Federal, Romeu Tuma, um entusiasta da idéia de
que a PF deveria assumir o controle da Aduana
brasileira.
Porém, a gota d’água ainda estava por vir. Prossegue
Cortez: Pintura em muro do Porto de Vitória - 1989. Autor: David Protti
Acervo: David Protti
Nesse meio tempo [após a conversa com
Tuma], a Polícia Federal viu que não tinha
como prosperar a ação lá dentro, cercou
o Aeroporto, todo em volta, para fazer
fiscalização de bagagens de passageiros em
plena via pública; inclusive, eles fizeram
uma coisa que foi um absurdo sem nome
e que a imprensa explorou. Pararam alguns
carros e um desses carros (...) Era uma
senhora, (...) perto de 70 anos, com a netinha
de 10 anos; estavam voltando da Disney e
jogaram (...) puseram a bagagem da senhora,
toda no chão, abriram e, por infelicidade
deles, tinham alguns repórteres próximos e
fizeram um flagrante em que, deve ter sido
por mera coincidência, não deve ter sido Café. Autor: David Protti. Acervo: David Protti

com a intenção, mas o repórter, talvez, tenha


feito com essa intenção, tiraram fotografia
dos agentes, pelo menos a impressão que
saiu no jornal é que ele estava com o fuzil
apontado para a cabeça da velha. Isso saiu
estampado na primeira página d’O Globo.
Foi um escândalo.103
Estava prá se encerrar, após esse episódio grotesco
nos arredores do Galeão, mais uma disputa que o
A Serventia da Casa

pessoal aduaneiro teve que enfrentar em seus mais

103
Paulo Cortez. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 75
Embarque de minério de ferro no Porto de Tubarão – 2007. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

de 450 anos de presença no país. Uma disputa séria, fazendo trabalho no Congresso; mostraram
que, ao seu final, apontou a importância da Aduana aos deputados: “Os senhores acham, que
essa é maneira correta em que sua mãe, a
e de seus quadros, dirigentes e funcionários, em sua
sua esposa, o cidadão, seja recebido numa
missão de proteção ao contribuinte e ao comércio Alfândega, (...) com fuzil na cabeça? Esse é
exterior brasileiro. Nas palavras testemunhais de o tratamento que deve ser dado?”104 (grifos
Paulo Cortez: nossos).

Agora, a explicação de toda essa operação: A repercussão não tardou no Congresso Nacional
como lhe disse, era época da Constituinte. que decidiu, efetivamente, que a autoridade em
Havia uma proposta para que a área da
termos de entrada e saída de mercadorias do país
Receita Federal e da área aduaneira passasse
para o controle da Polícia Federal. Eles fosse a Aduana; e no escopo de atividades aduaneiras
assumiriam essa parte toda, de repressão e a Alfândega nacional deveria ser preservada e
controle das Alfândegas. Com as Alfândegas aquilatada. Vejamos os desdobramentos na feitura
ficaria só o recolhimento dos impostos.
da Constituição, segundo Cortez:
A Serventia da Casa

Muito bem. Essa proposta estava já com


um apoio muito grande na Constituinte, Prá você ter uma idéia, nós tivemos na
só que, em função dessa operação, dessa votação dessa proposta, a rejeição (...)
fotografia principalmente, que foi enviada
para nossos colegas que estavam também 104
Paulo Cortez. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 76
com mais de 400 votos, só 8 favoráveis à da Aduana brasileira não daria conta das mudanças
transferência para a Polícia Federal. Isso foi econômicas que estavam ocorrendo no Brasil e no
a explicação da coisa. E a operação terminou
mundo; que seria preciso adaptar o setor aduaneiro
quando o Dr. Maílson da Nóbrega (...)
falou diretamente com o Dr. José Vicente para lidar com tais mudanças. Abrir o mercado
[Superintendente da 7ª RF] no Palácio do significava para o Brasil, entre tantas decisões,
Planalto; falou com o presidente José Sarney equipar o setor aduaneiro para no mínimo dois
e ele determinou ao ministro da Justiça que
objetivos centrais: a) facilitação do comércio
encerrasse imediatamente aquela operação.
Então, de um dia para o outro, sumiu tudo internacional, o que requer uma Alfândega que
aquilo lá.105 otimize o tempo de liberação de mercadorias e
A decisão histórica em um momento histórico deu reduza os custos possíveis e; b) permitir que as trocas
forças ao que pode ser chamado de vontade latente comerciais ocorram num ambiente seguro e que o
dos antigos agentes aduaneiros em retomar o termo país não fique vulnerável a ameaças advindas do
Alfândega, desaparecido a partir da criação da exterior na forma de produtos contaminados, por
SRF, em 1968. As conjunturas econômica e política exemplo. Isso requer uma Alfândega que reprima,
mundiais ao final dos anos 1980, apontando para um com severidade, o contrabando e descaminho,
crescimento vertiginoso das trocas internacionais práticas comuns no comércio internacional.
de mercadorias, a entrada de novos atores nesse Na esfera nacional, Ronaldo Loureiro cita nomes
cenário (China, tigres asiáticos, países do leste de velhos aduaneiros que, entre outros, lutaram pela
europeu), além do início de uma abertura política conscientização da importância da instituição
e econômica em quase toda a América Latina, aduaneira dentro da Receita Federal, frisando a
expunha ao governo brasileiro a necessidade de atuação de José Anícola Benedetti, Osíris Lopes
repensar a organização aduaneira do país. Filho e José Luís Falcão Borja. Para Loureiro, os
A abertura econômica constituiu para o Brasil, isto funcionários antigos que lidaram diretamente com
é, para o Estado, suas instituições e empresas, um o comércio exterior receberam com extrema reserva
parâmetro de relações diplomáticas e comerciais a falta de uma estrutura aduaneira especializada
que vão além dos problemas logísticos e tarifários, dentro da Secretaria da Receita Federal. Sendo
tais como: leis econômicas bem definidas, controle assim, haviam trabalhado em primeiro lugar pela
fitossanitário da produção, segurança marítima existência das supervisões de Importação e de
e, sobretudo, um setor aduaneiro eficiente, ágil Exportação dentro da Divisão de Fiscalização
e conhecedor das leis aduaneiras dos parceiros entre 1969 e 1985 e, não satisfeitos, trabalharam
comerciais do Brasil. Tudo isso exige também ainda mais em âmbito federal e até mesmo junto às
tarifas e nomenclaturas de mercadorias atentas à entidades sindicais por mais um passo a ser dado
dinâmica imposta pelo comércio internacional. com a criação das DIVCADs.
No Espírito Santo, por exemplo, insatisfeitos com
A Serventia da Casa

Dessa forma, estava claro para o governo federal e


para os empresários do setor que a estrutura rígida a estrutura precária da DIVCAD no estado, que
mal dava conta da fiscalização da crescente mo-
105
Paulo Cortez. Entrevista concedida...
vimentação de comércio exterior nos portos ca-

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 77
Cais Comercial do Porto de Vitória – década de 1980. Autor: David Protti. Acervo: David Protti

pixabas, seus agentes elaboraram um projeto de Para suprir as necessidades de uma inspetoria, o
criação da Inspetoria do Porto de Vitória, que foi projeto propunha a criação de uma estrutura complexa
apresentado ao então delegado da Receita Federal, composta pelos setores de: Visita, Vigilância e
José do Nascimento Dias, em agosto de 1989. En- Repressão; Revisão de Despacho Aduaneiro; de
tre as alegações para a demanda de uma estrutura Perdimento e Controle de Mercadoria Apreendida
aduaneira autônoma foram citadas a deficiência e; de Automação do Despacho Aduaneiro.107
de espaço físico e de pessoal, a existência de 10 Da mesma forma, o projeto previa a criação das
terminais marítimos, 1 terminal de carga aérea, 2 seções de Tributação, de Apoio Administrativo, de
entrepostos aduaneiros e 1 local para encomendas Arrecadação, de Informações Econômico-Fiscais,
postais internacionais, que dificultavam o controle de Despacho Aduaneiro de Importação e, por
de desvios de mercadorias e a entrada do contra- último, da Seção de Exportação, cada qual com
A Serventia da Casa

bando e do tráfico de entorpecentes.106 seus setores correspondentes. Por fim, na mesma


estrutura prevista para a realidade portuária do

106
Comunicação Interna DIVCAD/DRF/ES n. 150/89, de 04 de agosto de 1989,
encaminha o Projeto para criação da Inspetoria da Receita Federal –Classe
107
Projeto para criação da Inspetoria da Receita Federal –Classe Especial – do
Especial – do Porto de Vitória. Acervo Ronaldo Loureiro. Porto de Vitória. Acervo Ronaldo Loureiro.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 78
Espírito Santo, havia o Posto Aduaneiro de Ubu por exemplo, nós não tínhamos, às vezes,
(município de Anchieta) e o Posto Aduaneiro de gente lá em Ubu ou Portocel, para liberar
mercadorias de fornecimento de bordo.
Portocel (município de Aracruz).108
O que nós criamos aqui? Criamos aí uma
Loureiro explica que, apesar da DIVCAD estar obrigação, nós conferíamos a mercadoria
subordinada à estrutura da Delegacia da Receita aqui, era fechada num baú e obrigávamos que
a guarda portuária lá, em Ubú ou Portocel,
Federal, o delegado Dias preferia autorizá- verificasse se o lacre do baú estava realmente
lo a resolver todos os casos específicos da (...) mantinham aquele lacre; ele anotava a
atividade aduaneira, com a condição dele depois existência do lacre, colocava um documento
relatar os procedimentos adotados para fins de e nos remetia.110
acompanhamento, sem maiores interferências. O O que se depreende da análise das mudanças ocor-
aduaneiro, porém, explica que no início o reduzido ridas na DRF de Vitória, para além das aspirações
número de fiscais e de pessoal de apoio era a maior dos aduaneiros de carreira pela retomada da Alfân-
dificuldade para a DIVCAD. Apesar do volume de dega, é que elas refletem mudanças ocorridas den-
importações ser pequeno quando comparado com tro do próprio governo que vai aos poucos sentin-
o de exportações e com o potencial que havia para a do a necessidade de abrandar a rígida legislação de
entrada de mercadorias no país, existia acúmulo de comércio exterior que o país herdara do regime de
trabalho que era feito em finais de semana e feriados exceção. Outra vez Loureiro explica como o Espí-
para não sobrecarregar a equipe nos dias úteis. rito Santo era prejudicado pela legislação restritiva
Os relatórios persistentemente enviados a Brasília e pela inadequada estrutura para o recebimento de
começaram a fazer efeito à medida que a arrecadação cargas gerais importadas:
aumentava e os ilícitos eram combatidos no Espírito (...) Existiam, na época, restrições a
determinadas importações de mercadorias,
Santo e a Divisão recebeu veículos, sistema de
e automóveis era uma delas. Então, o porto
comunicação e outros equipamentos que fizeram aqui, era um porto muito mais especializado
o trabalho de fiscalização e controle, realizado por em exportação do que importação. (...)
amostragem, apresentar resultados satisfatórios, Então... e aí, é o caso dos automóveis que
eram realizados em outros locais, Vitória não
como por exemplo, as apreensões de drogas.109
era permitida, e também não tínhamos uma
E explica: estrutura necessária, suficiente para atender
uma demanda, um aumento das atividades.
Mas, nós tínhamos uma dificuldade muito
Veja só que nós tínhamos aqui, na época,
grande, então o que se fazia na época, se fazia
chamado Cobec, um armazém alfandegado, e
muitas vezes, se trabalhava por amostragem,
aqui se colocava mercadorias entrepostadas,
prá poder atender a demanda, nós tínhamos
no regime de entreposto aduaneiro.111
no mês mais de cento e cinqüenta navios
(...), fora as atividades de importação e de E prossegue:
exportação. Então, (...) era uma atividade Mas depois o governo (...) acabou com a Co-
grande aqui e a nossa estrutura era insuficiente.
A Serventia da Casa

bec (...). E de repente Vitória ficou sem um


Então, as primeiras providências foram, local que não fosse a zona primária para re-

108
Projeto para criação da Inspetoria da Receita Federal – Classe Especial – do
Porto de Vitória. Acervo Ronaldo Loureiro. 110
Ronaldo LOUREIRO. Entrevista concedida...
109
Ronaldo LOUREIRO. Entrevista concedida... 111
Ronaldo LOUREIRO. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 79
Porto de Vitória – década de 1990. Autor: David Protti. Acervo: David Protti

alizar armazenagem de mercadorias, e sem- empresas de comércio exterior tivessem sedes no


pre era uma estrutura pública, uma estrutura Espírito Santo. Através do Fundap, as empresas
precária, ninguém queria trazer mercadoria
cadastradas credenciavam-se a um financiamento
prá Vitória porque a demora era aqui muito
grande (...). Então era melhor você desemba- do Banco de Desenvolvimento do Estado do
raçar a mercadoria em Santos, Rio de Janei- Espírito Santo (Bandes) calculado sobre um
ro, em outros locais.112 percentual do ICMS que tivessem recolhido sobre
No Espírito Santo, por um bom tempo a utilização as operações de importação e exportação. Contudo,
do potencial portuário e a dinamização do comércio como a legislação do Fundap não obrigava que as
exterior se traduziram numa preocupação do mercadorias entrassem pelos portos do Espírito
governo do Estado que, em 1970, criou o Fundo Santo para que as empresas fizessem jus ao
A Serventia da Casa

de Desenvolvimento das Atividades Portuárias financiamento, a maior parte das mercadorias


(Fundap), um mecanismo financeiro para que importadas chegava por outros estados e pouco
demandavam dos portos capixabas e da estrutura
112
Ronaldo LOUREIRO. Entrevista concedida...
aduaneira de Vitória.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 80
Porém, a recém-criada DIVCAD foi crescendo
e adotando métodos de trabalho condizentes
com os de uma inspetoria de Alfândega e com
arrecadação equivalente, e passou a atrair a atenção
dos dirigentes da 7a Região Fiscal (Espírito Santo e
Rio de Janeiro) para o montante arrecadado.
Por exemplo: nós não fazíamos revisão de
Declaração de Importação. Começamos (...)
a explorar essa área aí; colocamos alguns fis-
cais para fazer essa atividade de revisão de
declarações, e conseguimos créditos tribu-
tários substanciais; conseguimos fazer con-
ferências finais de Manifesto [de carga] que
não se fazia; também créditos substanciais.
E Vitória começou a aparecer no contexto,
como uma repartição que arrecadava tam-
bém.113
E prossegue:
(...) E aí nós conseguimos naquela época já,
superar o Rio de Janeiro em arrecadação, em
razão dessas revisões. Então, começamos a
chamar a atenção prá aqui: - Olha, Vitória
é importante, né? E aí (...) conseguimos tra-
zer essas pessoas aqui a Vitória, prá ver da Rua da Alfândega (antiga Travessa do Ouvidor), Centro de Vitória – 1990
Autor: David Protti. Acervo: David Protti
necessidade, procuramos também, de certa
forma, sensibilizar algumas autoridades no
sentido, aí, de que havia necessidade de uma Fundap. Logo os jornais da cidade noticiavam as
ajuda maior da Alfândega. A Alfândega era primeiras importações nas lojas da Grande Vitória:
muita esquecida naquela época.114
Embora de maneira tímida, as roupas
Assim, no contexto da abertura comercial brasileira importadas começam a chegar às vitrines
promovida pelos governos Sarney (1985-1989) capixabas, atraindo muitos consumidores.
e Collor de Mello (1990-1992), que derrubaram (...) A multinacional C&A foi a primeira loja
de departamentos em Vitória a incluir roupas
gradativamente as restrições existentes e promoveram importadas no seu estoque e é praticamente
as primeiras liberações de importação de bens de a única no momento a comercializar tais
consumo em geral, a DIVCAD-ES foi impondo- mercadorias.115
se como uma estrutura aduaneira que logrou êxito Da mesma forma:
em acompanhar o ritmo de crescimento da entrada O mercado capixaba começou a abrir suas
de bens importados pelos portos do Espírito Santo,
A Serventia da Casa

portas para a comercialização de aparelhos


em grande parte devido às vantagens do sistema de som importados. E com aceitação mui-

113
Ronaldo LOUREIRO. Entrevista concedida... “Roupa de frio importada atrai consumidor capixaba”. A Gazeta, Vitória, 17
115

114
Ronaldo LOUREIRO. Entrevista concedida... de junho de 1991, p. 9.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 81
to boa pelo consumidor. (...) As mercadorias
foram rapidamente esgotadas e a previsão é
de que, dentro de 1 semana, um novo esto-
que de aparelhos de som importados chegue
às lojas de Vitória. (...) A Young foi a primei-
ra loja de departamentos da Grande Vitória
a receber o produto e é praticamente a única
no momento a comercializá-lo (...). 116
Em seguida falariam das primeiras remessas de
automóveis para o mercado brasileiro através do
porto de Capuaba:
A partir da segunda-feira, o mercado capixaba
vai receber quatro modelos de veículos da
marca japonesa Suzuki. São automóveis Ronaldo Loureiro – 2007
utilitários, esportivos e de luxo (...). O Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT
diretor da Vena Veículos, Apolo Jorge Rizk,
informou que a princípio a concessionária irá
receber nove unidades dos modelos Carry-
Van, Samurai, Vitara e Swift. Mas ele estima A ainda:
que o mercado capixaba comporta a saída de
vinte veículos mensalmente.117 (...) Na próxima sexta-feira, vai ficar
oficializada a primeira importação de
automóveis de luxo pelos portos capixabas.
São 50 carros Alfa Romeo, modelo 164,
que estão vindo da Itália e vão passar pelo
Espírito Santo em direção a Betim (MG),
onde se localiza a sede da montadora Fiat.
(...) Segundo o gerente, o Espírito Santo
exportou em diversas ocasiões automóveis
Fiat para a Europa. Agora, acontece o
inverso, a partir da importação dos Alfas
Romeo europeus. (...).118
Em meio a todos os desafios encontrados para
convencer a Receita Federal da necessidade de uma
Alfândega no Espírito Santo, a chegada a Vitória de
um aduaneiro de carreira com maior trânsito pelo
Departamento da Receita Federal fez a diferença.
Tratava-se de Paulo de Jesus Mattos Cortez, que
Estocagem de carga no Cais Comercial do Porto de Vitória – década de 1980
Acervo: Codesa
deixou o cargo de inspetor da Receita Federal do
A Serventia da Casa

Aeroporto Internacional do Galeão para ser o


delegado da Receita Federal no Espírito Santo. No
“Aparelhos de som importados atraem consumidores”. A Gazeta, Vitória, 22
116

de junho de 1991, p. 13.


“Carros japonês chegam ao Espírito Santo”. A Gazeta, Vitória, 17 de agosto
117 118
“Fiat importa carros de luxo pelo Espírito Santo”. A Gazeta, Vitória, 28 de
de 1991, p. 10. agosto de 1991, p. 12.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 82
Vista aérea do Terminal Público de Vila Velha (TVV) – década de 1990. Acervo: Hiper Export S/A

início de 1992, Cortez encontrou a DIVCAD-ES financeira oferecida pelo governo do Estado,
dividindo salas com a Delegacia da RF e com o o Fundap, que proporcionava realmente,
a facilitação de exportações de comércio
Tribunal de Contas da União (TCU).
exterior pelo Espírito Santo. E não via, por
Cortez aceitara o convite do então superintendente parte lá do Espírito Santo, o desenvolvimento
da 7a Região Fiscal, Paulo Jobim Filho, para dessa vocação. (...) Por ocasião da criação
da Receita Federal, a Alfândega do Espírito
transferir-se para o Espírito Santo e, com a Santo tinha sido extinta.119
experiência acumulada na área aduaneira, logo
Na verdade, o próprio Jobim Filho delegara a
percebeu o descompasso existente entre a estrutura
tarefa a Cortez de ultimar a criação da Alfândega
portuária e empresarial e os serviços aduaneiros
de Vitória. Em seu depoimento, Cortez relata o
oferecidos pela Receita Federal no estado:
debate do tema numa reunião de trabalho com o
Após ter dado início a essa tarefa que ele tinha
A Serventia da Casa

me pedido, (...) eu comecei a ver que havia secretário-adjunto da Receita Federal, o aduaneiro
uma perspectiva muito grande de comércio Tarcísio Dinoá de Medeiros, que afirmara:
exterior no Espírito Santo. Nós tínhamos
n portos, nós tínhamos (...) uma vantagem 119
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 83
da DIVCAD para treinar seu pessoal no processo
aduaneiro, o que lhe foi prontamente oferecido.121
Meses após, a imprensa local estampava
com estardalhaço: “Carro japonês chega por
Capuaba”.122
Portanto, é possível notar que o esforço
continuado dos antigos aduaneiros foi essencial para
incutir no empresariado e nos políticos capixabas
o entendimento de que só faz sentido falar da
vocação para o comércio exterior do Espírito Santo
dispondo de uma Alfândega organizada e em
Paulo Cortez – 2008 funcionamento. Nesse caso, a disposição para fazer
Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT coro às demandas do estado à Receita Federal,
bem como servir-se de uma vasta rede de contatos
nas áreas fiscais e aduaneiras para disseminar a
Eu concordo inteiramente com você, potencialidade do complexo portuário do Espírito
inclusive, é um momento histórico. – Porque Santo e a urgência da recriação da Alfândega em
ele, como todos os aduaneiros daquele Vitória foram qualidades oportunamente reunidas
tempo, eram extremamente revoltados da
medida que foi adotada com a criação da em Paulo Cortez, talvez por isso mesmo, escolhido
Receita Federal de extinção dessas alfândegas pelo superintendente da 7ª Região Fiscal, Paulo
tradicionais. Nós achávamos um absurdo elas Jobim Filho, para o cargo.
terem sido extintas, inclusive a Alfândega do
Espírito Santo. E Medeiros afirma: - Esse é E essa capacidade de articulação dos interesses
um momento histórico de nós resgatarmos por uma futura Alfândega capixaba pesou quando,
essa injustiça!, e me determinou que fizesse em função de uma guerra fiscal entre os estados
um trabalho para subsidiar uma eventual
da Federação, os governos de São Paulo e Rio de
criação da Alfândega de Vitória.120 (grifos
nossos). Janeiro moveram-se contra o Espírito Santo para
reconquistar o monopólio de seus portos para a
Assim, Cortez passou a organizar palestras para
importação de automóveis. Cortez explica melhor
os colegas aduaneiros e para os empresários do
os fatos e a atuação da DIVCAD e da DRF do
setor de comércio exterior, levando inclusive o
Espírito Santo:
superintendente regional a contribuir nos eventos.
Primeiro, quando houve esse início de
Logo, segundo ele, o empresário capixaba Otacílio
importação, de comércio, de volume de
Coser mostrou-se interessado em importar importação por Vitória, aquilo começou a
automóveis. Algum tempo depois, o empresário incomodar – entre aspas – outros estados
A Serventia da Casa

retornou já com uma negociação em andamento da Federação, principalmente São Paulo,


para importar veículos Honda e requereu o apoio
121
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...
122
“Carro japonês chega por Capuaba”. A Gazeta, Vitória, 15 de julho de 1992,
120
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida... p. 7.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 84
porque ele via a possibilidade de um desvio
do recolhimento de impostos, de ICM
principalmente, evidentemente, para o
Espírito Santo.123
E complementa:
Nessa ocasião, com o dinamismo das
importações por Vitória, foi criada uma
situação meio esdrúxula, porque, por um
lado, a gente tinha apoio, no sentido de
desenvolver essas atividades, por outro
lado, nós começamos a sentir, talvez uma
criação de alguns obstáculos. Um deles foi Importação de veículos pelo Porto de Capuaba – ca. 1995
que saiu um ato da Coordenação Aduaneira, Acervo: Codesa

suspendendo qualquer importação de


veículos (...) sem ser pelo estado do Rio de
Janeiro ou estado de São Paulo. Pelo Rio de
Janeiro, poderiam desembaraçar veículos: o
Aeroporto Internacional e o Porto do Rio
de Janeiro; em São Paulo: o Aeroporto de
Cumbica, Viracopos e o Porto de Santos.124

A Serventia da Casa

Manifestação pública pró-impeachment do presidente do Brasil, Fernando


Collor de Mello, na Praça Oito de Setembro – 1992
123
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...
Autor/acervo: David Protti
124
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 85
Avenida Beira-Mar e centro de Vitória-ES – 2006 . Autor/acervo: David Protti

Cortez refere-se à súbita edição da Instrução E Cortez comenta seus protestos em Brasília:
Normativa nº 60, de 07 de maio de 1992, do Nós procuramos, naquela ocasião, o Dr. Renato Pa-
Departamento da Receita Federal, que restringia a lomba e dissemos a ele que nós não víamos lógica
entrada de veículos aos portos de Santos (SP), Rio de naquele procedimento. Porque nós éramos adua-
Janeiro (RJ), Manaus (AM), Rio Grande (RS), Belém neiros seja no Rio de Janeiro, Santos ou lá em Vitó-
(PA) e Recife (PE) e a proibia nos demais portos do ria. Estruturas maiores ou menores... Mas também
país. Na época de sua edição o secretário estadual éramos competentes. E ele alegou que não, que ele
do Desenvolvimento Econômico, Paulo Augusto pretendia com essa medida concentrar a importa-
Vivacqua, afirmou que “o estado foi objeto de ção nesses dois Estados, que eram, realmente, onde
uma discriminação duríssima” já que pelo porto de tinha a melhor mão-de-obra, mais qualificada, mais
Vitória eram desembarcados os automóveis da Fiat,
A Serventia da Casa

adequada e que era uma (...) decisão, já, de governo


à época a maior importadora de veículos do país.125 e que já estava decidido.126

125
“Portos do Espírito Santo estão proibidos de importar carros”. A Gazeta,
Vitória, 13 de maio de 1992, p. 7.
126
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 86
Esgotados seus esforços para reverter a decisão do posição de incentivo às importações pelo estado e
governo, o delegado da Receita Federal do Espírito incremento do setor aduaneiro capixaba. O episó-
Santo solicitou reunião com os então senadores dio seguinte foi marcante nesse sentido. Segundo
Élcio Álvares, José Inácio Ferreira e Gerson Camata Paulo Cortez
e expôs a situação. Na mesma semana os senadores Nessa ocasião, até explorando um pouco o
manifestaram o descontentamento do Espírito problema, eu aí, convoquei a imprensa, fa-
Santo ao ministro Marcílio Marques Moreira, que lei ao Dr. Jobim, (ele) foi ao Espírito Santo
naquela ocasião e fizemos uma solenidade;
pediu prazo para resolver o assunto. Finalmente, tinha uns dez ou quinze carros a serem de-
após um período de espera, o ministro determinou sembaraçados e o próprio Dr. Jobim foi ao
a revogação daquela instrução normativa, o que foi cais, lá de Capuaba e tirou uma série de fo-
feito através de uma resolução assinada em 21 de tografias, desembaraçando aqueles veículos
(...).127
maio de 1992 pelo então diretor interino da Receita
Federal, Tarcísio Dinoá de Medeiros. Tais acontecimentos reforçavam a idéia latente de
que o Espírito Santo precisava, com urgência, de
As reações contrárias, apesar de intensas, não
um setor aduaneiro dinâmico e estruturado, face ao
fizeram mudar a posição do superintendente da 7a
incremento do comércio internacional pelos por-
Região Fiscal nem a do delegado da RF no Espírito
tos do estado e pelo aeroporto de sua capital.
Santo. Pelo contrário, animou-os ainda mais na

A Serventia da Casa

Movimentação de carga em área portuária. 2008. David Protti. ALF/VIT

127
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 87
Fiscalização da ALF/VIT no Cais Comercial do Porto de Vitória – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 88
A recriação da

Alfândega da
Receita Federal
do Brasil do Porto de Vitória e sua
participação na expansão do comércio
exterior capixaba
1993|2008

A vida
é paradoxo
efêmero e eterno embaraço
a teia do tempo
enredando
o ritmo do passo.

O
|Adilson Vilaça|

s esforços desenvolvidos pelos aduaneiros capixabas foram exitosos


em demonstrar ao Brasil que o complexo portuário capixaba represen-
tava 6% da arrecadação da 7a Região Fiscal, uma das mais expressivas
do país, e com viés de crescimento. Com tantos atores de porte unidos,
o cenário para a recriação da Alfândega de Vitória foi se formando.
A abertura econômica a pleno vapor, as importações pelos portos do
Espírito Santo ampliando-se a cada mês; tudo isso somado às vontades
A Serventia da Casa

dos aduaneiros e de empresários locais formava uma força política pró-


ativa pela criação da Aduana.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 89
que prestava serviços como inspetora-substituta
no Aeroporto do Galeão. Cortez assim justificou
a escolha:
(...) nos fixamos na Dra. Edna Brandão
Monteiro, que eu já conhecia de longa data,
porque ela tinha sido a minha substituta
quando eu fui inspetor no Aeroporto do Rio
de Janeiro, o Galeão. (...) Dr. Jobim: “Não, ela
é excelente também. Eu conheço bastante,
ela tem feito trabalhos aqui prá mim, aqui na
área aduaneira prá mim. Não, é ótima escolha.
Vamos indicar ao Dr. Tarcisio”. Telefonei;
ele telefonou ao Dr. Tarcisio, Dr. Tarcisio
mandou que ele mandasse logo o expediente
e afirmou nessa ocasião: “Excelente escolha,
Edna Brandão Monteiro – 2008 porque eu a conheço de longa data também.
Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT Eu conheço o trabalho dela, então, está ótima
a indicação”.130
Uma semana depois, nova portaria do diretor da
A primeira medida concreta veio com a publicação
Receita Federal, Luiz Fernando Gusmão Wellisch,
da Portaria MEFP nº 606, de 3 de setembro de 1992,
nomeava a auditora Edna Brandão Monteiro para
aprovando uma reestruturação da antiga Secretaria
“inspetor da Receita Federal no Porto de Vitória-
da Receita Federal, tornando-a Departamento da
ES”.131 E Cortez conclui:
Receita Federal, uma atitude questionada por muitos
Voltei prá Vitória. (...) Não falei nada; fi-
aduaneiros. Porém, essa Portaria determinava o quei quieto, mas, naquele mesmo dia 08, o
prazo de um ano para a instalação da Alfândega do Dr. Tarcísio me telefona dizendo que tinha
Porto de Vitória, vinculando-a à 7a Região Fiscal encaminhado ao Diário Oficial a nomeação
como uma alfândega de classe A, (conforme Art. da Dra. Edna, como inspetora. Também não
falei nada. Esperei; (...). Procurei o Diário
2, cap. II, ítem 3.5), após 23 anos de sua extinção.128 Oficial (...), aí... realmente tava a nomeação
Paulo Cortez assim expressou o sentimento que dela.132
tomou conta de toda a equipe aduaneira quando
À Edna Monteiro fora confiada a tarefa de estru-
da efetivação da medida:
turar a futura Alfândega capixaba dotando-a do
Foi aquela explosão de alegria, de satisfação. Serviço de Tributação (Sesit), Serviço de Controle
Criou-se, finalmente, a Alfândega de Vitória.
E, ficamos na expectativa; aí começou aquele Aduaneiro (Seana), Seção de Arrecadação (Sasar),
burburinho: “quem vai ser o inspetor...?”129 Seção de Programação e Logística (Sapol) e do
Serviço de Tecnologia e de Sistema de Informação
A escolha do superintendente da 7a RF, Paulo
(Setel), todos previstos no Regimento Interno da
A Serventia da Casa

Jobim Filho, recaiu sobre uma experiente aduaneira

130
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...
128
BRASIL. Portaria MEFP 606, de 03 de setembro de 1992. Aprova o Regimento BRASIL. Portaria DRF n° 1.109, de 08 de setembro de 1992. DOU de
131

Interno do Departamento da Receita Federal. Diário Oficial da União de 10/09/1992, seção II, p. 5671.
03/09/1992. 132
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...
129
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 90
Vista do Porto de Barra do Riacho – década de 1990. Acervo: Codesa

DRF. Em suas próprias palavras: regimento é assim: (...) depois de todas as


(...) E lá eu fui prá Vitória, prá começar atribuições de cada uma das repartições que
um trabalho meio (...) desgastante, porque, compunham a Secretaria da Receita, vinha
assim: a repartição era numa sala, e essa uma folha com o organograma de todas as
sala, dividida em mesas, estavam todos os repartições, dizendo o quê que eles teriam:
funcionários que pertenciam à DIVCAD, seções, divisões, supervisões (e aí...) e da-
(que era...) que foi a essência da Alfândega vam o nome de todas elas. Então, eu tive
do Porto de Vitória. Só que, lá nós não que fazer um trabalho, dia-a-dia, de acordo
tínhamos todos os controles, porque a gente com esse regimento. Por exemplo: seção de
era subordinada à Delegacia e na Delegacia, arrecadação, iniciar o processo de seção de
por exemplo, é que se fazia: assinava ponto, arrecadação; seção de fiscalização, iniciar o
fazia isso, fazia aquilo... Tudo na Delegacia. A processo de seção de fiscalização e aí, assim
gente só praticava o trabalho, lá, daquilo que por diante... Tributação, a mesma coisa. En-
chegava prá nós como assunto aduaneiro. tão, nós fomos criando mesa a mesa e com
poucos funcionários...133
E mais:
A Serventia da Casa

A posse de Edna Brandão foi comemorada pelo


Então, eu tive o grande trabalho em come-
çar, mesa por mesa, a fazer um controle de
acordo com o que dispunha o Regimento MONTEIRO, Edna Brandão. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro,
133

Nicélio Barros e David Protti, Rio de Janeiro-RJ, 25 de janeiro de 2008. Acervo


Interno da Secretaria da Receita. Que no da Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 91
empresariado do comércio exterior e pela Federa- Ao final do primeiro trimestre de 1993 os números
ção das Indústrias que sediou a solenidade em 23 eram ainda mais animadores: o balanço do
de setembro de 1992. Sua primeira meta, traçada comércio exterior atingira 743,85 mil toneladas
no ato da posse, foi aumentar a arrecadação capi- contra 596,64 mil toneladas no mesmo período
xaba de 6 para 10% do total da arrecadação men- de 1992, incremento de 24,7%.135 Todas essas
sal da 7a Região Fiscal, envolvendo os estados de mudanças refletiam uma ampliação radical da
Rio de Janeiro e Espírito Santo. De fato, apenas abertura comercial do governo de Itamar Franco,
no primeiro mês de trabalho da nova inspetora da sob a direção econômica do ministro Marcílio
Alfândega do Porto de Vitória, o movimento de Marques Moreira. Em um só ato o governo
exportação pelos portos por ela controlados cres- diminuiu as alíquotas de entrada de caminhões e
cera 10,78%134 em relação a outubro de 1991, uma automóveis no país em 10%, de cervejas em 10%,
clara demonstração dos promissores números do vinhos e wiskies em 25%, de bicicletas em 15%
comércio mundial no Espírito Santo. e de produtos industrializados como tratores,
locomotivas e vagões em 10% em média.136
A Serventia da Casa

Embarque de ferro gusa no Terminal Privativo Marítimo em Paul – Vila Velha – 2008 . Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

135
“Balanço da movimentação”. A Gazeta, Vitória, 11 de abril de 1993, p. 13.
“Portos movimentam Cr$4,3 trilhões”. A Gazeta, Vitória, 09 de dezembro de
134
“Governo facilita importação de 13 mil produtos”. A Gazeta, Vitória, 1 de
136

1992, p. 9. outubro de 1992, p. 18.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 92
Embarque de minério de ferro no Terminal Privativo de Ponta do UBU. Autor: Patrick Grosner. Acervo: Samarco

O maior desafio da nova inspetora naquele mo- grupo de dezessete auditores fiscais do Tesouro
mento era atender ao crescente movimento de im- e oito técnicos do Tesouro Nacional fosse
portação/exportação com a pequena estrutura que transferido para o Espírito Santo e engrossasse as
a Alfândega dispunha para as atividades aduanei- equipes aduaneiras. Dessa forma, a prioridade entre
ras em portos tão dispersos pela costa como os do as providências a tomar para manter o crescimento
complexo capixaba. da arrecadação alfandegária e acompanhar os
Veja só como era pouco e como era difícil esse serviços aduaneiros foi buscar uma nova sede que
trabalho, porque nós tínhamos Capuaba, Por- permitisse um melhor atendimento aos operadores
tocel, Ubu... Olha! Um monte de porto prá do comércio exterior e demandasse melhores
você fiscalizar e vistoriar e por onde saíam as
exportações de trigo, de milho, de mil coisas. serviços internos. Para tanto, foi alugado um
Então, era muito difícil com o pouco número conjunto de salas no quinto andar do edifício Trade
de funcionários que a gente tinha.137 Center, na avenida Jerônimo Monteiro, n° 1000,
para onde a Alfândega foi transferida em junho de
A Serventia da Casa

Utilizando o crescimento da arrecadação como


seu maior argumento, Brandão conseguiu que um 1993. O local foi escolhido depois de analisadas
várias outras opções, tarefa que foi delegada ao
então inspetor-substituto, Ronaldo Loureiro.
137
MONTEIRO, Edna Brandão. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 93
Embarque de café no Cais Comercial do Porto de Vitória – 2008. Autor e acervo: David Protti
Todavia, desde que assumiu a inspetoria, Edna retomar judicialmente e dispusera
Monteiro mostrara-se determinada em conse- para ser oferecido em permuta por
guir uma sede própria para o órgão. Sem perda local mais adequado às atividades
de tempo, em 29 de novembro de 1992, a inspe- aduaneiras. Ao final, nenhuma
tora despachou ofício à Delegacia do Serviço do das opções analisadas foi aceita
Patrimônio da União (SPU) no Espírito Santo so- e a opção de sede recaiu sobre
licitando cessão de área mínima de 2.000 m² nas o aluguel de um conjunto de
imediações do Porto de Vitória, para construção salas enquanto a instituição
da sede. No mesmo dia, novo ofício foi enviado ao se consolidava para adquirir
SPU/DPU/ES reivindicando o “terreno situado à imóvel próprio.139
av. Marechal Mascarenhas de Morais, esquina com A fórmula adotada pela
av. Paulino Müller e rua José Carlos de Souza, para administração superior de
futura construção do prédio que servirá de sede nomear uma inspetora experiente e com bons Valter Sanches Junior - 2008
própria à Alfândega do Porto de Vitória”.138 relacionamentos na Receita Federal juntamente Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT
Enquanto aguardava por uma solução para a com um inspetor-substituto conhecedor das
ocupação de um imóvel próprio da União, a equipe comunidades portuária e comercial capixabas
aduaneira buscava novas alternativas. A primeira revelou-se adequada para as responsabilidades que
que surgiu foi um prédio antes pertencente à Cia. a nova Alfândega enfrentava no processo de sua
Vale do Rio Doce S/A, localizado em São Torquato, consolidação. Mas eram necessários reforços para
município de Vila Velha. Era um imóvel servido enfrentar os primeiros tempos e a inspetora solicitou
por acesso ao mar que foi considerado inadequado apoio a um grupo de trabalho formado por Walter
pelo Departamento da Receita Federal para atender Sanches Júnior, Ângela Orofino Souto e Paulo
à Alfândega; posteriormente, foi cedido para sediar Cezar Alves Rocha, todos pertencentes à Divisão de
a Polícia Federal. Outro local analisado foi a ilha Controle Aduaneiro (Diana) da Superintendência
da Fumaça, de excelente situação geográfica junto da 7a Região Fiscal, no Rio de Janeiro.
ao canal da baía de Vitória e a todo o tráfego Assim, composta de uma equipe ampliada para 48
portuário e com acesso pela avenida Beira-mar, em fiscais e 63 técnicos que participaram inclusive de
Vitória. Esta opção, porém, foi descartada porque cursos de capacitação para a atividade alfandegária,
se tratava de espólio familiar pendente de definição pôde a Alfândega do Porto de Vitória dar conta da
judicial. imensa tarefa que lhe fora confiada. Segundo um
A terceira alternativa era um terreno baldio entre a dos integrantes do grupo de trabalho, Walter San-
rua Aleixo Neto e as avenidas Rio Branco e Nossa ches Junior, a sistemática do trabalho era
Senhora da Penha, em frente ao Clube Centenário, Logo depois que foi instalada a Alfândega,
no bairro Praia do Canto, na capital, que a Pro- doutora Edna Brandão (...) no segundo
A Serventia da Casa

curadoria da Fazenda Nacional havia conseguido semestre de 93, convidou o grupo, que era
esse grupo de trabalhos especiais ligado à

138
Ofício GAB/DRF/VTA/ES/N° 695/92 de 29/10/1992 e; Ofício GAB/DRF/VTA/ES/N°
696/92 de 29/10/1992. Arquivo/ES/GRPU/SPU- Vitória-ES. 139
LOUREIRO, Ronaldo. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 95
Estoque de aço para exportação no porto de Praia Mole – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

Coordenação [Coana], mas a gente prestava grupo fez? No primeiro momento nós
muita atividade aqui para a própria região, assessorávamos a inspetora, tirávamos dúvida
a pedido do superintendente. Pediu que o dos colegas mais novos, e revisávamos todas
grupo, que na verdade eram três auditores as declarações de importação. Que o volume
– eu, a Ângela Orofino (...) e o Paulo César estava aumentando muito no Espírito Santo...
Rocha, que está aposentado – desse um Os problemas também vão aumentando.
apoio à unidade, que era uma unidade nova, A idéia não era punir os importadores, era
estava recebendo funcionários novos, sem orientar que eles passassem a fazer certo.140
muita experiência... E nós combinamos
que íamos nos revesar, que toda semana E não foi sem tardar porque em seguida, em janeiro
tentando o máximo de dias possível, teria de 1993, a Receita Federal colocava em operação no
sempre alguém do grupo em Vitória. Então país o SISCOMEX (Sistema Integrado de Comércio
no período de setembro [de 1993] à abril de
A Serventia da Casa

Exterior), primeiramente atinente às exportações.


1995, nós ficamos revisando as declarações
de importação em Vitória [de veículos]. Em
outubro de 1995 retornamos as atividades
SANCHES JR., Walter. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio
em Vitória, até final de 1997. O que esse
140

Barros e David Protti, Rio de Janeiro-RJ, 25 de janeiro de 2008. Acervo da


Alfândega/Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 96
O SISCOMEX era um sistema já utilizado com
sucesso em vários países e trazido para o Brasil com
financiamento do Banco Mundial. Através desse
sistema, a Receita procurava simplificar e padronizar
as operações, desburocratizar os processos, ampliar
o atendimento do público exportador que interagia
através da rede mundial de computadores, além de
harmonizar as ações da Secretaria de Comércio
Exterior (Secex), da própria Receita Federal e do
Banco Central no registro, acompanhamento e
controle das operações de exportação nas áreas
administrativa, fiscal e cambial, respectivamente.
Iniciava-se aí uma parceria com o Serviço Fede-
Agentes marítimos na sede do Sindamares. Da direita para a esquerda:
ral de Processamento de Dados (Serpro), respon- Thelmo Nunes, Moacyr Bonelli, Waldemar Rocha Junior e Fernando Pinto
Almeida – 2008 . Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
sável pelo desenvolvimento e monitoramento do
SISCOMEX, que aperfeiçoa-se permanentemente.
Após um período de 6 meses em teste, o salto de
qualidade desse sistema no Espírito Santo foi dado
com a inauguração da nova sede da Alfândega, nas
salas do Trade Center, em 24 de junho de 1993,
coincidindo com a criação do Comitê Gestor do
SISCOMEX, e a disponibilização de um terminal
de computador para os usuários do sistema, à épo-
ca uma novidade encantadora em termos de co-
modidade e respeito ao usuário. De acordo com
declarações de Liége Lopes de Resende, chefe da
Divisão de Exportação
Do próprio escritório o exportador integra-
do ao sistema pode fazer sua RE [Registro
de Exportação], a qualquer hora, e exportar
o seu produto. No mês de abril, registramos
980 exportações e em maio o número subiu
para 1498. Esses números vêm aumentando
ou dobrando – em alguns casos – em relação
ao mês anterior.141
A Serventia da Casa

Ainda nos primeiros meses de existência da Alfân-


dega do Porto de Vitória foi também homologada a
Despachantes aduaneiros no Cais Comercial do Porto de Vitória. Da direita
para a esquerda: Luís Kleber da Silva Brandão, Marcos de Menezes Tovar,
Roberto Simões de Almeida e Cândido Salles Bonfim – 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT 141
“Siscomex agiliza exportações”. A Gazeta, Vitória, 22 de junho de 1993, p. 9.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 97
Lei dos Portos (Lei 8.630, de 25 sociação Nacional das Empresas Permissionárias
de fevereiro de 1993) versando de Portos Secos (ANPS).
sobre temas da ordem-do-dia Entre os trabalhadores ampliou-se o papel do Sin-
no Espírito Santo: em primeiro dtrages (Sindicato dos Trabalhadores com Vínculo
lugar, a redefinição do concei- Empregatício e Trabalhadores Avulsos nos Arma-
to de porto organizado, abrindo zéns Gerais, Comércio de Café em Geral, e Impor-
a possibilidade da operação tação e Exportação no Estado do Espírito Santo)
dos terminais públicos ser que passou a operar em zona secundária a partir da
repassada a empresas pri- Lei dos Portos. Em relação a essa categoria a mu-
vadas por tempo determi- dança foi radical. Antes acostumados a lidar apenas
nado. Depois, a instituição com embarque de café, esses trabalhadores tiveram
das figuras da Instalação Portuária que se adaptar ao manuseio das cargas gerais; no
Wéverton de Oliveira – 2008 de Uso Privativo e Instalação Portuária de Uso Público entanto, o número de postos de trabalho, fixos ou
Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT permitindo que portos privados movimentassem avulsos cresceu sobremaneira com a criação das
cargas gerais próprias ou de terceiros. EADIs, conforme explica o presidente do sindica-
Tais medidas adotadas no âmbito nacional, a des- to da categoria (Sindtrages), hoje com 12 mil asso-
peito de muita controvérsia no campo sindical, agi- ciados, Weverton de Oliveira:
lizaram o movimento portuário no estado fazendo No início, quando começou (...) a falar que
aumentar em muito o trabalho aduaneiro.142 Final- iam ter as EADIs, chamados portos secos,
mente, havia sintonia entre o serviço aduaneiro e nós ficamos analisando o quê que seria isso.
E vimos que vários grupos se interessaram
o setor de comércio exterior, em plena expansão. em formar aqui (...) no Espírito Santo ficou
Essa nova configuração do cenário de comércio a Silotec; ficou a Terca, que é a Cotia, que era
exterior coadunava-se com o surgimento e a con- do Grupo Guimarães, que era também forte
solidação de entidades representativas dos seto- no ramo de café e (...) a Coimex também,
que era fortíssima no ramo de café. Por isso
res intervenientes no comércio exterior capixaba, que a gente fala: quando surgiu a criação das
como o Sindamares (Sindicato das Agências de EADIs, até a gente entender que as EADIs
Navegação Marítima do Estado do Espírito Santo, iriam trabalhar com carga geral, exportação
em 28 de setembro de 1989), o Sindaees (Sindicato em geral, receber vários tipos de mercado-
rias, que nós, trabalhadores, tínhamos que
dos Despachantes Aduaneiros do Estado do Espí- estar preparados prá estar recebendo esse
rito Santo, em 28 de fevereiro de 1991), e o Sindiex tipo de mercadoria... Isso tudo passou pela
(Sindicato do Comércio de Importação e Exporta- nossa cabeça e tivemos que preparar nos-
ção do Estado do Espírito Santo, em 18 de maio de sos associados, que tem mercadoria que nós
nunca tínhamos visto na vida.143
1992). Em 1995, foi criada a Associação dos Per-
missionários de Regimes Aduaneiros do Espírito E aponta algumas novidades em termos de mer-
A Serventia da Casa

Santo (APRA-ES), entidade regional filiada à As- cadorias:

142
BRASIL. Lei 8.630, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre o regime jurídico
da exploração dos portos organizados e das instalações portuárias e dá outras 143
OLIVEIRA, Weverton de. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro e David
providências. DOU de 25/02/1993. Protti, Vitória-ES, 14 de dezembro de 2007. Acervo Alfândega/Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 98
Vou dar um exemplo: relógios. Tem relógio modificação nenhuma,
que chega importado aí, que a gente nunca porque nós já exportáva-
viu na vida, a gente só via na vitrine. (...) Uís- mos tudo que podíamos
ques, tipos de uísques, tipo de computador, (...), não só nosso aqui
que hoje está tão moderno, mas no início era como mercadoria que
uma novidade chegar os computadores que descia de Minas e outras
chegavam. Veículos importados. São veícu- coisas mais. Na impor-
los que a gente jamais pensava em ver um tação é que as coisas
de perto e (...) por fazer o desembarque aqui cresceram, porque, se
em Vitória, passar pela Alfândega, ir para as antes existiam aí 30,
EADIs, a gente passou a ver esses produ- 40 empresas ope-
tos, conhecer outros produtos (...) saber de rando, por exemplo,
outros (...). [Antes] a gente estava focado só na importação, no
no café.144 Fundap, nós passa-
mos a ter 200! E aí
A pauta de importação do Espírito Santo, nesse veio muito mais negócio prá
período, diversificava-se para produtos tais como cá, para o Espírito Santo, (...) foi-se trazendo Severiano Alvarenga Imperial
– 2008
veículos, máquinas e equipamentos, carvão, malte, negócio. E depois veio o período dos car- Acervo: Sindiex-ES

trigo, entre outros produtos já tradicionalmente ros (...). Começou-se a fazer a importação de
veículos aqui (...). Nessa mesma época, foi
importados. No caso dos automóveis, o grande vo- criada a Alfândega..., recriada a Alfândega
lume importado demandava tanto adaptações dos do Porto de Vitória (...).146
portos e pátios de desembarque, como também a
Já Edna Monteiro registrou o deslumbramento da
criação de novas áreas alfandegadas previstas na le-
população ante o boom de automóveis desconheci-
gislação. Os resultados da abertura comercial não
dos que passaram a desfilar pelas principais ruas
se fizeram esperar: se no ano de 1992 tinham sido
da cidade:
importados 150 automóveis pelo Espírito Santo,
Então, o Espírito Santo foi tomado, assim,
em 1993 foram importados 9.088, desempenho daquela coisa! Aquele!... Era como se fosse
que levou o porto de Vitória ao primeiro lugar nes- uma tropa de cegonheiras passando pelo
sa modalidade, superando o de Santos.145 meio da cidade. Isso acarretou um proble-
ma com a Prefeitura. Dr. Paulo Hartung, na
Segundo afirmava a imprensa, o que atraía os im- época, falou comigo que não podiam essas
portadores a operarem por Vitória era a redução cegonheiras ficarem transportando, porque
de impostos e de custos aduaneiros em até 30% elas atrapalhavam todo o trânsito. Porque
o povo parava prá olhar e era aquela coisa,
dos praticados em Santos. Com essas vantagens,
aquele monte de veículos; coisa que nunca
o Espírito Santo também acenava para atrair os tinha acontecido lá.147
desembarques da Fiat feitos pelo porto do Rio de
Saltava aos olhos a forma como a abertura comer-
Janeiro. Para o representante das empresas de co-
cial do país afetara o cotidiano de Vitória e cida-
mércio exterior, Severiano Imperial
des vizinhas, com um movimento cada vez mais
A Serventia da Casa

(...) prá nós aqui, do Espírito Santo, por


intenso de navios entrando e saindo dos portos, de
exemplo, na área de exportação não houve

144
OLIVEIRA, Weverton de. Entrevista concedida... 146
IMPERIAL, Severiano Alvarenga. Entrevista concedida...
145
“Na dianteira”. A Gazeta, Vitória, 23 de setembro de 1993, p. 8. 147
MONTEIRO, Edna Brandão. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 99
Desembarque de automóveis em Peiú – 2008 . Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

caminhões carregados de contêineres e de automó- Espírito Santo.148 Além de fomentar o surgimento


veis atravessando a cidade. Para os setores empre- de novas empresas fundapeanas no Espírito Santo, o
sarial e governamental o movimento representava Fundap estimulou a criação de terminais especiali-
o êxito do mecanismo Fundap que atraía cada vez zados em processamento e desembaraço de cargas
mais empresas especializadas em importação e ex- nos municípios da Serra e de Cariacica.
portação interessadas no diferimento e no finan- Contudo, a atratividade do Espírito Santo também
ciamento de parcela do ICMS recolhido sobre as trouxe empresários interessados apenas em burlar
operações pelos portos capixabas. o fisco. Após um ano de sua instalação, a Alfânde-
Apesar de ter sido criado em 1970, o desempenho ga do Porto de Vitória, seguindo uma rotina dos
do Fundap não havia provocado maiores sobres- tempos da DIVCAD, ampliava o combate aos cri-
saltos nos resultados do produto interno bruto ca-
pixaba até então. Porém, após a abertura comercial 148
Para melhor entender o mecanismo Fundap, consultar: IMPERIAL, Severiano
Alvarenga.. Entrevista concedida...; SINDIEX. O comércio externo no desen-
A Serventia da Casa

dos anos 90, o Fundap tornara-se efetivamente um volvimento capixaba: a contribuição do sistema Fundap – 1971-2001. Vitória:
Sindiex, 2002, p. 31-52; FRECHIANI, Luis Cláudio. O desenvolvimento econômico
instrumento de forte atração para que as empresas do Espírito Santo e o Fundo para o Desenvolvimento das Atividades Portuárias
(FUNDAP). 2003. 112 p. Dissertação (mestrado em Economia) – Programa de
trouxessem as mercadorias para serem embarcadas Pós-Graduação, Universidade Federal do Espírito Santo e; FELISBERTO, Cláudia
Rosana Machado. Políticas de desenvolvimento local no Espírito Santo: uma
análise dos incentivos fiscais e financeiros. 1999. 210 p. Dissertação (mestrado
e nacionalizadas através de portos localizados no em Economia) – Programa de Pós-Graduação em Economia, Universidade
Federal do Espírito Santo.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 100
Embarque de fertilizantes em Peiú – 2008 . Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

mes de sonegação e de descaminho no estado. O Não faltam relatos de como os terrenos públicos e
primeiro grande ilícito apurado nessa nova fase do privados disponíveis das cidades eram solicitados
órgão foi aquele no qual quatro empresas reali- para alfandegamento, para a estocagem e realiza-
zavam operações triangulares com veículos BMW ção de pequenos serviços nos automóveis trazidos
entre Alemanha, Estados Unidos e Espírito Santo. para o país. Severiano Imperial informa como se
Tais operações eram caracterizadas por prática de deu o processo:
subfaturamento das mercadorias.149 (...) nós tínhamos aqui no Espírito Santo
dois entrepostos aduaneiros. Um que era da
Conforme apontado acima por Edna Monteiro,
Coimex, que funcionava aqui em cima, na
o trânsito intenso das mercadorias importadas Serra. Logo na subida ali da Serra, em Cara-
pelo porto de Vitória pelas áreas urbanas refletia pina, e um outro que funcionava em Cariaci-
a pouca disponibilidade de áreas de estocagem nos ca. Lá perto do Terminal de Cariacica, hoje
(...). Aí começaram a chegar veículos e nós
portos e, de acordo com a nova lei portuária, a ne-
não tínhamos mais espaço prá colocar veícu-
A Serventia da Casa

cessidade da criação de zonas secundárias de alfan- los aqui. Aí, foi quando a Alfândega nos deu
degamento que se impunham de maneira urgente. uma mão que não tem tamanho, que nós co-
meçamos a alugar espaços que existiam em
“Fisco acha fraude em importação”. A Gazeta, Vitória, 21 de setembro de
149 Vitória. Alugávamos o terreno, limpávamos,
1993, p. 11. murávamos, cercávamos e enchíamos de ve-

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 101
Veículos importados aguardam liberação em área alfandegada na Praça do Papa – Vitória-ES – 1993/94. Acervo: Codesa

ículos. E fomos enchendo de veículo cá, bo- lução daquela situação emergente para concluir a
tando veículo lá. Para o lado de Laranjeiras, nacionalização dos veículos. Perguntado sobre a
ali, quem ia ali prá cima, tudo quanto é terre-
responsabilidade dos importadores e fiéis-deposi-
no que tinha por ali, um na esquina que era
do grupo Águia Branca, nós abrimos aquilo tários sobre aquelas cargas para as quais não havia
dali; chegou uma remessa de dois mil carros, suficiente espaço nos portos e nos recintos alfan-
nós colocamos dois mil carros ali. Em 48 ho- degados que existiam, respondeu:
ras nós passamos máquina naquilo e aplaina-
mos, e ajeitamos, e iluminamos, pusemos lá (...) Então ela foi autorizando [a Alfândega
uns postes com luz porque era exigência da do Porto de Vitória], entendeu? Porque os
Alfândega e botava lá, vigilância, né? E um dois entrepostos já estavam lotados, ela foi
fiel, porque todo (...) depósito tem que ter criando áreas aí. Nós chegamos a ter vinte
um fiel.150 e poucas áreas espalhadas dentro de Vitória.
Por fim, culminou com um carregamento
E o representante das empresas de comércio ex- que estava prá chegar e que não tinha mais
terior complementa seu comentário sobre o papel onde colocar. Só se fechasse o campo [de fu-
A Serventia da Casa

tebol] da Desportiva e outros lugares aí prá


desempenhado pela autoridade aduaneira na reso-
botar carga. Foi quando nós conseguimos
[uma área] com o prefeito, na época, Pau-
150
IMPERIAL, Severiano Alvarenga. Entrevista concedida... Os entrepostos lo Hartung (...) e a outra parte da área era
citados na entrevista foram instalados a partir da Concorrência RF n. 05/92 de
25/05/1992. Eram áreas para mercadorias importadas sem cobertura cambial. da Marinha do Brasil - ali na praça do Papa,

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 102
hoje chamada praça do Papa e onde está a de expedientes para que o superintendente da 7a
Capitania dos Portos (...). Nós conseguimos, Região Fiscal, Paulo Jobim Filho, autorizasse os
nós fomos à Prefeitura e (...) conseguimos
primeiros atos de configuração daquelas estações.
que a Prefeitura nos cedesse uma parte e fo-
mos conversar com o capitão dos Portos da Pouco depois, durante o governo Itamar Franco,
época e conseguimos também uma autoriza- o novo secretário da Receita Federal, Osíris Lopes
ção e a Alfândega, então, autorizou que nós Filho, que assumiu a 19 de maio de 1993, determi-
colocássemos carro ali e mais uma vez, em
nou ao então superintendente da 7a Região Fiscal,
48 horas, nós aplainamos aquilo dali, com-
pactamos, cercamos e pusemos iluminação e Serafim Cipriano Pereira, que desse prosseguimen-
enchemos aquilo de carro. Quem morou em to ao pleito capixaba. De acordo com o depoimen-
Vitória, na época, viu aquilo dali entupido de to de Edna Monteiro:
carro...151
(...) eu devo dizer que, quando eu vi que isso
A nova posição de Vitória no cenário de comércio tava crescendo; já o nosso Secretário da Re-
exterior brasileiro, como não poderia deixar de ser, ceita era o Dr. Osíris de Azevedo Lopes Fi-
lho, e eu entrei em contato com ele numa
implicou em adaptações legais e estruturais para
das reuniões ministeriais a que eu participei,
contemplar as situações inusitadas criadas a partir eu conversei com ele a respeito disso e ele,
do montante expressivo e crescente de veículos e prontamente, liberou lá, junto ao superin-
cargas diversas que concorriam para as áreas primá- tendente, que fizesse uma licitação prá três
EADIs, (...) ou porto seco, como se fala no
rias, devendo em seguida serem enviados para ou-
comum. Aí, nós conseguimos essas três EA-
tras áreas para fins de nacionalização. Mas como os DIs.152
entrepostos aduaneiros, além de não comportarem
O superintendente, por sua vez, aproveitando-se
todo o volume de mercadorias que eram desem-
da vivência de Paulo Cortez no Espírito Santo e
barcadas, não podiam receber cargas com cober-
tendo-o feito retornar ao Rio de Janeiro para as-
turas cambiais regulares por força de lei, o modelo
sessorá-lo, incumbiu-o do estudo da matéria. Nas
buscado pela Alfândega de Vitória foi, em conso-
palavras do próprio Cortez
nância com a Lei de Portos recém-aprovada e com
Quando eu vim prá cá, provavelmente
o Inciso I do Artigo 7o do Regulamento Aduaneiro
foram transmitidos ao Dr. Serafim todos
(Decreto 91.030, de 05 de março de 1985), licitar esses pleitos, (...) e aí o Serafim me chama e
recintos alfandegados situados em zonas secundá- diz: “Olha Cortez, você é o pai lá do pedido
rias, operados por empresas privadas, que ficaram (...). Estuda esse assunto aqui. Aqui na
Superintendência”. E constituiu um grupo
conhecidos por estações aduaneiras de interior –
de trabalho presidido por mim e que era
EADIs, depois nomeados portos secos. composto por alguns colegas: o Dr. Edgar
Na tentativa de encontrar resolução definitiva para Aragão, um auditor; o José Esteves, também
era um auditor da Receita; tinha o Ronaldo
o acúmulo de carga nos terrenos baldios da cidade, Loureiro, de Vitória; dois TTNs, que eram
o então delegado da Receita Federal, Paulo Cor- o Ernani Soares Maia (...) e o Paulo Rômulo
A Serventia da Casa

tez, somou esforços com a inspetora da Alfândega Pereira.153


do Porto de Vitória, Edna Monteiro, na realização

152
MONTEIRO, Edna Brandão. Entrevista concedida...
151
IMPERIAL, Severiano Alvarenga. Entrevista concedida... 153
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 103
E prossegue:
(...) Prá constituir um grupo. Então, tudo
bem. Vamos reunir... “Como que a gente
faz um negócio desses?”. Ninguém tinha a
mínima noção do que era, de como fazer
uma EADI. Sabíamos que tinha que se fazer
por licitação. Naquele tempo... Naquele
momento, tinha um agravante: tinha acabado
de sair a nova lei de licitações, que ninguém
sabia ainda como trabalhar com ela. Aí, tudo
bem... fomos... pegamos editais de compra
de material, de licitação, de n coisas, fomos
estudar e prá ver... fazer uma adaptação...
e como fazer um edital de uma estação
aduaneira.154
Contêineres no TVV – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT Finalmente, após meses de estudos, consultas e de-
bates, em 4 de fevereiro de 1994 o superintendente
Serafim Cipriano Pereira designou uma comissão
de licitação também presidida por Paulo Cortez
para colocar a licitação em prática. Para constituir
as EADIs, a comissão, por sua vez, publicou o Edi-
tal de Licitação da Concorrência SRF/SRRF/7a
RF/No 1/94 cujo objeto era “deferir a permissão,
a título precário, para instalar e administrar três Es-
tações Aduaneiras Interiores, na Região de Vitó-
ria-ES”. Depois de estipulada a área geográfica da
Grande Vitória, a criação das futuras EADIs ficou
restrita aos municípios de Serra, Cariacica e Vila
Velha, já que o próprio município-capital não dis-
punha de áreas suficientes que contemplassem as
exigências do edital.
Área alfandegada em obras para se transformar em porto seco recebe
automóveis importados - 1995. Acervo: APRA-ES
Feita a licitação, apresentaram-se 10 empresas de
todo o Brasil, algumas de grande porte como a
Construtora Andrade Gutierrez. Adotado o crité-
rio de pontuação, considerou-se os seguintes pon-
tos: I - capacidade operacional; II – a localização
A Serventia da Casa

geográfica da EADI Vitória; III – sistemas de con-


troles operacionais; e IV – a capacidade adminis-

154
CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 104
Navio zarpa do Porto de Tubarão. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

trativa. Ao fim do processo, conforme relata seu para desenvolver essa estação aduaneira. Só
presidente, foram contempladas que é um negócio tão interessante, porque
o estado do Espírito Santo foi pioneiro
(...) a Coimex, lá do Espírito Santo; a Silo- na criação de estações aduaneiras. Não
tec, que era lá de São Paulo, e uma empresa existia nenhuma no Brasil. Foram as três
(...) chamada Guimarães Café que não tinha primeiras criadas no Brasil. Depois é que
nenhuma tradição até, nessa área de impor- a história explodiu.155 (grifos nossos).
tação. Ela trabalhava exclusivamente em (...)
exportação de café, mas era uma empresa De fato, estabelecia-se o pioneirismo do Espíri-
que cumpriu tudo direitinho, tudo arruma- to Santo nos ajustes da estrutura logística de co-
dinho à sua proposta, então, apesar de ter
mércio exterior aos desígnios da nova legislação.
sido uma zebra, ela ganhou, porque eram
três... Foram determinadas que seriam três,
A Serventia da Casa

as estações aduaneiras em Vitória. A zebra 155


CORTEZ, Paulo. Entrevista concedida... As empresas que se apresentaram
ganhou. Só que ela não tinha, na verdade – para a licitação foram: Andrade Gutierrez Empreendimentos Ltda, Coimex
Armazéns Gerais S/A, Guicafé Armazéns Gerais Ltda, Cia. de Transportes e
sei-o eu; a gente sabe, [de] fazer sozinha essa Armazéns Gerais Silotec, Tervix Terminais Interportuários Ltda, Hiper Export
Transitária de Cargas e Operadora Portuária Ltda, Tracomal Terraplenagem e
continuidade desse projeto, tanto que se as- Construções Machado Ltda, Tora Transportes Industriais Ltda, Armazéns Gerais
sociaram, posteriormente, creio que à Cotia, Murundu S/A. Cf. Ata da Continuação da Reunião de Abertura dos Envelopes de
Habilitação. Acervo Ronaldo Loureiro.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 105
Processamento de mercadorias importadas – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

E o estado saía na frente na perspectiva de reunir no hemisfério sul e no mercado mundial como um
grupos empresariais de expressão econômica local todo.
com grandes conglomeradas do país. Da experiên-
Voltando às EADIs – rebatizadas de porto seco
cia exitosa das EADIs requeridas pela Alfândega
pelo Regime Aduaneiro instituído pelo Decreto
do Porto de Vitória para solucionar a necessidade
n° 4.543, de 27 de dezembro de 2002, após terem
de nacionalização de veículos que o país importava
sido cumpridas todas as exigências para vencer a
no início da década passada, existem hoje 62 por-
licitação e terem sido igualmente comprovadas a
tos secos implantados em 14 estados da Federação,
realização de obras e adaptações necessárias ao
além de outros 5 licitados e 9 em processamento
seu funcionamento regular, os contratos foram as-
de licitações. Portanto, é forçoso registrar a marca
sinados entre a 7a RF e as empresas vencedoras,
empreendedora dos operadores do comércio inter-
em fins de 1994. Estas, em conjunto, realizaram
A Serventia da Casa

nacional capixaba que, valendo-se da atípica estru-


investimentos da ordem de US$41 milhões e cons-
tura logístico-portuária do estado, impulsionaram
truíram cerca de 1.370.000 m2 de recintos alfande-
a construção da estrutura aduaneira que ajudou o
gados no município de Cariacica ao longo de um
Brasil a buscar uma participação mais expressiva
ano. Ao final do processo, o então secretário da

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 106
Automóveis importados em porto seco – 1995. Autor: Walter Monteiro. Acervo: APRA-ES

Receita Federal, Everardo Maciel, publicou os atos Trazendo de suas memórias as imagens das EADIs
declaratórios para aqueles recintos, oficializando em funcionamento, Edna Monteiro emocionou-se:
seu pleno funcionamento ao abrigo das normas - “E quando a gente via aquele... De cima, a gente
aduaneiras vigentes e sob a jurisdição da Alfândega via aquele pátio das EADIs... completamente lota-
do Porto de Vitória.156 do de veículos. Era muito bonito!”157
O ano de 1995 encontraria outro cenário para o
comércio exterior no Espírito Santo: a Alfândega
A Serventia da Casa

156
A respeito da implantação das EADIs, ler: MARINHA MERCANTE DIRECT. São
Paulo: Transnacional Editora, n. 5, junho 1996. Mensal. p. 7.; os atos declarató-
rios referidos são: BRASIL. Ato Declaratório SRF 26, de 25 de setembro de 1995. do Porto de Vitória estava constituída dentro dos
Referente a contrato celebrado entre a SRF e a Coimex Armazéns Gerais S/A.
DOU de 27 de setembro de 1995.; Ato Declaratório SRF 38, de 23 de novembro padrões do Regulamento Aduaneiro, as estações
de 1995. Referente a contrato celebrado entre a SRF e a Guicafé Armazéns
Gerais S/A. DOU de 27 de novembro de 1995.; Ato Declaratório SRF 40, de 07 de
dezembro de 1995. Referente a contrato celebrado entre a SRF e a Companhia
de Transportes e Armazéns Gerais-SILOTEC. DOU de 08 de dezembro de 1995. 157
MONTEIRO, Edna Brandão. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 107
aduaneiras de interior regularizadas e o movimen-
to de embarque e desembarque de mercadorias
nos portos aumentava a cada dia gerando receitas
nunca antes obtidas, apesar do grande volume de
exportação que o estado praticava havia décadas.
Resolvido o problema do espaço adequado para a
nacionalização dos automóveis, a entrada em fun-
cionamento daqueles recintos permitira uma aco-
modação dessas mercadorias capaz de desafogar
os portos e entrepostos aduaneiros e permitir que
mais contratos de importação fossem fechados,
conferindo a 1995 características de um ano ímpar
nas estatísticas mercantis do estado.
Movimentação portuária – TVV – 2008. Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT Liderado pelos veículos, o boom das importações
pelo estado originou, pela primeira vez, valores
maiores do que o das exportações. Entre janeiro
e dezembro, o Espírito Santo importou em valor
FOB U$S 3.718.668 e exportou em valor FOB
U$S 2.748.708. Para se ter uma idéia, a arrecada-
ção da Alfândega do Porto de Vitória durante 1995
totalizou R$ 1,72 bilhão e teve um crescimento de
278,24% em comparação ao total arrecadado em
1994, que somou R$ 456,42 milhões. A maior ar-
recadação de impostos foi no mês de junho, com
R$ 385,92 milhões. Ou seja, em apenas um mês do
ano de 1995, a Alfândega arrecadou pouco mais de
84% do valor de todo o ano de 1994.158
O decréscimo na arrecadação, verificado a partir de
julho, foi em decorrência da elevação da alíquota do
Imposto de Importação (II) de 32% para 70% em
Canal de acesso aos portos de Vitória e de Vila Velha – 2008. março de 1995. A partir daí, as empresas importa-
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
doras não renovaram os pedidos, porque os preços
dos veículos aumentaram, as vendas caíram e os es-
toques ficaram abarrotados. No segundo semestre
A Serventia da Casa

de 1995, outubro foi o mês de maior arrecadação,

158
SINDIEX, op. cit., p.28.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 108
Movimentação portuária – TVV – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

com R$126,76 milhões, resultado da nacionaliza- todo o país.160 Em abril, a Alfândega de Vitória foi
ção dos veículos desembarcados depois do aumen- sobressaltada com matérias publicadas em jornais
to da alíquota do Imposto de Importação.159 de circulação nacional que denunciavam ter havi-
do fraude no desembaraço aduaneiro dos veículos
importados através do porto de Vila Velha (Capu-
O súbito crescimento da arrecadação deu margem
aba), focando a alteração das alíquotas do Imposto
a que os estados e grupos econômicos mais bem
de Importação de 32% para 70% anunciada su-
situados nos grandes centros como São Paulo,
bitamente na noite de 29 de março de 1995, com
Rio de Janeiro, Minas Gerais e Santa Catarina se
vigência para o dia seguinte.
articulassem para tentar impedir a importação de
veículos pelos portos do Espírito Santo. Dizia-se, Segundo foi noticiado, as empresas importadoras
à época, que era o “ciúme” que fazia levantar as vo-
A Serventia da Casa

zes críticas dos “grupos paulistas” ao Fundap por 160


A referência aos “grupos paulistas” é do então deputado federal pelo Espí-
rito Santo, Roberto Valadão. Consultar: CÂMARA DOS DEPUTADOS/GABINETE
DO DEPUTADO ROBERTO VALADÃO. Discurso pronunciado pelo Deputado
Roberto Valadão (PMDB-ES) na sessão de 26 de maio de 1995, p. 3. No discurso
de 26 de maio de 1995, o senador Gérson Camata usou o termo “ciúme” em
159
“Nacionalização é até o fim do mês”. A Gazeta, Vitória, 11 de junho de 1995, seu discurso. Consultar: SENADO FEDERAL/SECRATARIA LEGISLATIVA/SUB-
p. 16. e; “Alfândega arrecada R$126,7 milhões”. A Gazeta, Vitória, 16 de novem- SECRETARIA DE TAQUIGRAFIA. Discurso pronunciado pelo Senador Gérson
bro de 1995, p. 10. Camata (PMDB-ES) na sessão de 5 de junho de 1995, p. 2.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 109
o secretário da Receita Federal, Everardo Maciel,
anunciou uma investigação especial de 15 dias “em
todas as empresas que operam no país com im-
portação de veículos”.162 Apesar da abrangência
nacional, o foco da investigação recaiu sobre o
grande número de veículos importados pelas tra-
dings do Espírito Santo e sobre a velocidade que
eram nacionalizados pela Alfândega do Porto de
Vitória naqueles primeiros meses de 1995. Para se
ter uma idéia mais precisa da velocidade do traba-
lho que ela oferecia, em janeiro desse ano foram
nacionalizados 26 mil veículos, 36 mil em fevereiro
Fiscalização em porto seco – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
e 28 mil em março. Para o mês de abril seguinte,
estava prevista a entrada de mais 56 mil veículos
Cotia Trading e Coimex teriam recebido informa- no Espírito Santo.
ção privilegiada sobre as mudanças das tarifas e
De acordo com o auditor fiscal da Alfândega do
falsificado documentos com datas retroativas para
Porto de Vitória, José Alfredo Cabral, que trabalha-
que 4.427 veículos das marcas Volkswagen e Che-
va com a liberação desses veículos, era a organização
vrolet/General Motors fossem nacionalizados so-
dada à conferência que permitia a celeridade da vis-
bre a alíquota menor. Indignada com a repercussão
toria dos veículos, que se dava da seguinte maneira:
e para resguardar a imagem da instituição e favo-
recer possível averiguação das notícias, a inspetora (...) A gente ia fiscalizar um lote de mil carros,
quando você chegava lá pra fiscalizar, o lote
Edna Monteiro colocou seu cargo à disposição do de mil carros, a declaração tava na sua mão
superintendente da 7a Região Fiscal da SRF e foi com o número do, do chassi do automóvel;
exonerada em 13 de abril de 1995.161 ao lado, a cor, chassi e cor. E o modelo. E
lá no pátio onde estavam os automóveis.
A publicação das denúncias de fraude foi o esto- Eles estavam localizados exatamente nessa
pim para que o grande volume de veículos impor- seqüência que estava nos anexos da declaração
tados pelos portos capixabas viesse a ser alvo de de forma que, o, o Despachante Aduaneiro e...
já o capot aberto, o despachante aduaneiro ia
análises da Receita Federal, o que era plenamente
de automóvel em automóvel e dizia , dizia o
justificável pelo que representava em termos de número do chassi e a cor... conferia o numero
inovação na pauta do comércio exterior do país do chassi, conferia a cor . Pelo número do chassi
e pelo desconforto dos estados tradicionalmente você já sabia que modelo é, não é mesmo?!
Pelo declarado da coisa. Então: chassi e cor,
importadores diante da súbita posição de liderança
não sei se tinha mais alguma coisa. Mas ele ia
que o Espírito Santo passou a ocupar no ranking cantando, olhando e cantando e a gente ia só
A Serventia da Casa

da arrecadação de importação do país. Por isso, conferindo, conferindo. De forma que você
fazia rapidamente a fiscalização do automóvel
“Inspetora denuncia campanha contra o ES”. A Gazeta, Vitória, 14 de abril
161

de 1995, p. 8. A exoneração ocorreu através da Portaria de 13 de abril de 1995


do secretário da Receita Federal. DOU de 17 de abril de 1995. n. 73, Seção 2, p. 162
“Inspetora denuncia campanha contra o ES”. A Gazeta, Vitória, 14 de abril de
2749. 1995, p. 8

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 110
Movimentação de carga em contêiner em porto seco – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

(...), eles tinham uma seqüência no anexo na cretário de Assuntos Administrativos da Secretaria
declaração e eles tinham igual seqüência na Executiva do Ministério da Fazenda, Carlos Messias
localização dos automóveis. Então, por isso a
Barbosa, publicadas em A Gazeta no domingo de
gente conseguia fazer duas mil, três mil, liberar
dois mil, três mil automóveis por dia. 11 de junho de 1995. 164 Porém, durante as análises,
foi levantada a hipótese de ter havido irregularida-
E conclui:
des no procedimento da remuneração do pessoal
(...) Aí existiam tipos de portos... tipos
da Alfândega que acompanhava o transporte das
de portos secos, né? Ou mesmo no pátio
de Capuaba onde... ou no pátio de Paul cargas de veículos importados até os recintos al-
ou nos pátios [portos] secos onde foram fandegados. De acordo com a legislação aduaneira,
autorizados o depósito de automóveis ainda toda carga que deixava os portos deveria estar aco-
não liberados, e controlados pela Aduana,
bertada através de um documento da Alfândega
com gente lá. Aí, quando nós íamos, estava
toda essa organização prá fiscalizar.163 chamado Despacho de Trânsito Aduaneiro (DTA).
Expedido o DTA, um fiscal ou técnico alfandegá-
A investigação concluiu não ter havido qualquer
rio deveria acompanhar aquela carga até o porto seco
fraude no processamento das declarações de im-
A Serventia da Casa

devendo, para isso, receber diárias dos importado-


portações de veículos desembaraçados com alí-
res, já que o serviço era prestado em qualquer hora
quota de 32%, conforme informou o então subse-

“Receita nega fraude na importação de carro pelo ES”. A Gazeta, Vitória, 11


164

163
CABRAL, José Alfredo. Entrevista concedida... de junho de 1995, p. 16.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 111
Caminhão-cegonha transportando automóveis importados pelos portos de Vila Velha – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

do dia ou da noite e no interesse exclusivo destes. tora. Sabe-se, contudo, que tal procedimento fora
No caso dos veículos, para atender ao crescente adotado para administrar uma situação de extrema
número importado, mesmo técnicos de nível mé- urgência frente ao boom de importações que chega-
dio que atendiam outras áreas da Receita Federal, vam ao Espírito Santo.165
como o Serpro, foram autorizados a acompanhar o Comprovada a inexistência de atos ilícitos ou le-
trânsito aduaneiro. sivos ao erário público, ficou evidenciada a mo-
Para verificar o procedimento com os DTAs, foi tivação política – talvez por interesse nos cargos
criada uma outra comissão de inquérito que igual- diretores da Alfândega local – das denúncias que
mente não constatou qualquer ato ilícito; entretan- só repercutiram porque foram feitas num ambiente
to, em sua interpretação da legislação, a comissão de troca recente dos escalões da SRF; mas ao longo
concluiu – diferentemente do entendimento da Al- de mais de um ano de apuração entre 1994 e 1995
fândega do Porto de Vitória àquele momento - que tudo foi esclarecido. Apesar disso, internamente, as
tais diárias não deveriam ter sido pagas diretamente denúncias infundadas produziram efeitos demasia-
aos servidores, mas recolhidas primeiramente aos do profundos para serem reparados. O primeiro
cofres federais para serem, posteriormente, a eles deles foi a substituição da inspetora Edna Brandão
A Serventia da Casa

repassadas. Ao final, a comissão isentou de qual-


quer responsabilidade os técnicos de nível médio Cf. “Conclusão da Comissão Processante” composta por José Moacir Fer-
165

reira Leão (presidente), José Márcio Caixeta e Paulo Renato Trindade Valério,
expedida em 12 de dezembro de 1996. A respeito da profusão de notícias e en-
e definiu o pagamento das diárias direto pelo im- trevistas publicas na imprensa de Vitória/ES, consultar: “Receita apura fraude
no porto”, A Tribuna, Vitória, 14 de abril de 1995, p. 16 e; “Receita nega fraude
portador a eles como um desvio de conduta da inspe- na importação de carro pelo ES”. A Gazeta, Vitória, 11 de junho de 1995, p. 16.
Acervo Edna Brandão Monteiro.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 112
Monteiro sem ter sido convo- Além de concentrar sua passagem pela inspetoria
cada a justificar os atos ad- da Alfândega nas apurações em curso, João Carlos
ministrativos que praticara. Santacruz Lima deteve-se sobre dois outros pontos
Também o chefe do Serviço importantes: o funcionamento efetivo das EADIs
de Controle Aduaneiro e e a procura de uma sede própria para a Instituição.
substituto eventual da ins- Os dois pontos estão interligados, uma vez que
petora, Geraldo Buteri, foi expressam a dimensão e a importância, cada vez
dispensado do cargo em maior, do comércio exterior capixaba e da Alfân-
função das denúncias e a dega do Porto de Vitória.
ele não mais retornou.166 Como estava ciente de que havia recebido uma Al-
Geraldo Buteri – 2008
Autor: David Protti Para “responder pelo expediente fândega mergulhada numa crise e sem deter a ex-
Acervo: ALF/VIT
da Alfândega no Porto de Vitória- periência necessária nos trâmites aduaneiros, San-
ES” foi designado João Carlos de Santacruz Lima tacruz Lima decidiu convocar três aduaneiros que
em 13 de abril de 1995.167 Economista de formação trabalhavam no Rio de Janeiro para assessorá-lo:
e auditor da Receita Federal, Santacruz Lima inicia-
ra sua carreira no Ministério da Fazenda no Rio de
Janeiro e fora ativo membro da organização do mo-
vimento sindical de sua categoria. Posteriormente,
transferiu-se para a Delegacia da Receita Federal, em
Vitória, e deu continuidade à militância na represen-
tação dos seus pares. Apesar de não possuir vínculo
profissional com a área aduaneira, Santacruz Lima
fora indicado ao secretário Everardo Maciel pelo
então coordenador-geral da COPEI/SRF (Coorde-
nação de Pesquisa e Investigação da Secretaria da
Receita Federal), Deomar Vasconcellos de Moraes,
para que, com a indicação de uma pessoa alheia ao
ambiente das disputas pelos cargos de comando da
Alfândega do Porto de Vitória, facilitasse as investi-
gações em curso e, ao mesmo tempo, desse prosse-
guimento ao trabalho de organização da Instituição
contando, inclusive, com o aval das entidades sindi-
Fiscalização aduaneira na abertura de contêiner – 2008
cais: “(...) Eu vim por causa desse caos”.168 Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
A Serventia da Casa

166 Portaria de 13 de abril de 1995 do secretário da Receita Federal. DOU de 17


de abril de 1995. n. 73, Seção 2, p. 2.749.
Portaria de 13 de abril de 1995 do secretário da Receita Federal. DOU de 17 de
167

abril de 1995. n. 73, Seção 2, p. 2.749. Essa portaria definiu a função gratificada
como DAS-101.1.
168
SANTACRUZ LIMA, João Carlos. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro,
Nicélio Barros e David Protti, Vitória-ES, 5 de dezembro de 2007. Acervo da
Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 113
grande entendido e o João [Luiz Fregonazzi]
era meu substituto aqui.169
O problema da alocação do número crescente de
veículos importados tornava a implantação das
EADIs uma questão definida pela 7a Região Fiscal
como de emergência, a única solução possível no
curto prazo para a Alfândega retirar os veículos es-
palhados pelas ruas e praças da cidade; um desafio
difícil de cumprir, uma vez que o trânsito aduanei-
ro estava sob investigação. Como as licitações já
estavam feitas desde fins de 1994, era necessário
ultimar os preparativos para a inauguração das EA-
DIs – o que ocorreu entre agosto e outubro de
1995 - e assim, ser possível a publicação dos atos
João Carlos de Santacruz Lima – 2008
Autor: David Protti
declaratórios de alfandegamento daqueles recintos
Acervo: ALF/VIT para que os automóveis e outras cargas fossem di-
retamente para eles.
A cidade inundada de carros, nós tínhamos
Eu aprendi aduana estudando de madruga-
que colocar isso nos trilhos legais. Nós tínha-
da. Eu trabalhava o dia inteiro, estudava de
mos que, vamos dizer, dar legalidade a essas
madrugada e, tive o apoio de pessoas, cole-
aduanas, transformar isso em verdadeiras áre-
gas da receita, que o secretário me permitiu
as alfandegadas, tirar esses carros todos que
trazer três fiscais excelentes que eu escolhi a
estavam na rua e botar em algum lugar. Nas
dedo; vieram do Rio de Janeiro. Um deles, o
EADIs. Tinham que inaugurar as EADIs. Fi-
Sá Freire, só prá você ter uma idéia, o [Sylvio
zemos um cronograma de trabalho.170
José de Barros de] Sá Freire foi inspetor do
Galeão, quer dizer, a experiência. Sá Freire Outra tarefa igualmente importante era encontrar
era... foi meu mestre! Um sujeito que sabe um local adequado que pudesse abrigar a sede pró-
tudo que é tributo, tinha mais idade que eu
(...). A [Maria] Isabel Augusta [Figueiredo pria da Alfândega. Desde que perdera sua antiga
Mota Almeida] que é uma grande amiga- sede na praça 8 de setembro e desaparecera como
irmã, que foi a presidente do Sindicato Na- instituição pública, as atividades aduaneiras eram
cional, olha só, era presidente do Sindicato carentes de acomodações físicas para sua expan-
Nacional, e o [Paulo Eduardo] Perisée [de
Oliveira], que era um colega que (...) também são. Com o crescimento da movimentação portuá-
do Sindicato Nacional. (...). Eu trouxe um ria no Espírito Santo, a Alfândega já era a segunda
pessoal que entendia e de confiança e aqui, no país em arrecadação, o que tornava mais nítida a
eu tive o apoio do delegado, José Luís de necessidade de espaço para atendimento do públi-
Deus Amado, que foi imprescindível o apoio
A Serventia da Casa

dele. Conhecia isso aqui, pelo menos a par- co, controle aduaneiro, investigações e apreensão
te de administração, que ele não mexia com
aduana, e o Alberto Louback, que era um
homem daqui, que era o chefe da Tributação, 169
SANTACRUZ LIMA, João Carlos. Entrevista concedida...
170
SANTACRUZ LIMA, João Carlos. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 114
Automóveis importados aguardam liberação em érea alfandegada. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

de mercadorias, rede segura para transmissão de


dados sigilosos etc.
Então eu, quando eu virei inspetor (...), já era
na sala, ainda, na velha Alfândega, dentro do
prédio do C&A [edifício Trade Center, centro
de Vitória]. Um prédio comercial. Olha só...
Um prédio comercial... nenhuma segurança!
Prá levar mercadoria apreendida! (...) Bom,
como eu tinha autoridade do Secretário... Eu
ligava pro Secretário e... no governo é assim,
né? Se você está movendo alguma coisa no
momento, que interessa ao governo central,
aí você tem recurso, tem gratificação pra
trazer pessoal. Eu desloquei gente de fora
pra vir trabalhar comigo, como eu falei.
Trouxe gente de uma região pra outra com Máquinas pesadas importadas pelos portos de Vila Velha. 2007. Autor: David
rapidez – coisa que não é normal – e recebi Protti. Acervo: ALF/VIT
recurso pra comprar o prédio, que o Luciano
Zamilute [chefe do Setor de Importação] me
ajudou a comprar. O Luciano andou muito
comigo, percorrendo prédios aí pra gente
poder comprar. Naquela época (...), a gente
A Serventia da Casa

que saía pra comprar; e nós compramos esse


prédio do Banestes (...). Uma Associação dos
Funcionários e dos Empregados do Banestes
e eles estavam vendendo porque (...) estavam

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 115
Sede atual da Alfândega do Porto de Vitória, no centro de Vitória. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
querendo fazer umas aplicações em outras nete do inspetor. Ter toda uma memória da
coisas e (...) venderam prá gente.171 antiga Alfândega, que ela tinha tentado pre-
servar (...). E está escrito até: Alfândega do
Como foi dito, 1995 foi o Espírito Santo.172
ano em que foram atingi-
E complementa:
dos todos os recordes de
movimentação de cargas (...) Maria Isabel disse assim: ‘Ângela, eu
quero um auditório. Quero que os nossos
e de arrecadação portuá- funcionários tenham um auditório.’ ‘Ah, faz
ria. Considerando esses um auditoriozinho aqui na garagem.’ Eu falei
aspectos, além do pesso- assim: ‘não, a gente vai fazer um auditório
al da casa, a Alfândega prá gente usar muito esse auditório. A gente
vai ter que botar ele num... Vamos fazer um
de Vitória convidou a auditório bom... que a gente tenha tradução
auditora fiscal Ângela simultânea...’ Então, a gente deu prioridade
Christina Pinto Coelho à, vamos dizer assim, ao estudo, aos cursos,
Orofino Souto, arqui- tinha salas de aula, a preservar um pouco da
Ângela Christina Orofino Souto – 2008
memória que a gente tinha; e ter condições,
Autor: David Protti teta de formação, para que todo fiscal tivesse condição, de um com-
Acervo: ALF/VIT
colaborar no projeto putador próprio. Então, tinha uma linha que
de adaptação do edifício-sede e ela assim descreve ele pudesse ter à mesa dele um computador.
o trabalho realizado: Então, toda parte (...) de tecnologia, da infor-
mação no caso dos computadores, e a parte
E, tivemos a oportunidade (...) de ajudá-los de energia a gente deu prioridade.173
na instalação da Alfândega onde está hoje.
Na época Maria Isabel Augusta [Figueiredo
Mota] Almeida, que era assessora do inspe-
tor, pediu se a gente poderia ajudá-los. Nós
procuramos fazer um trabalho junto aos co-
legas que trabalhavam lá. Procurei com ela,
com o dinheiro que se tinha prá fazer a Al-
fândega, dar prioridade à parte de infraestru-
tura, prá eles terem condições de trabalho,
de terem toda parte de sistemas muito bem
instalados. Tanto que a gente não fez nada
no embelezamento, assim, do prédio. Nós
demos prioridade à parte de energia do pré-
dio. Praticamente nós gastamos metade do
dinheiro que a gente tinha prá que o prédio
tivesse energia prá suportar todos os com-
putadores. Toda parte de segurança, (de...)
documental, de... E também tentamos colo- Fiscalização aduaneira de veículo importado em porto seco – 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
car alguns dos móveis que a Dra. Edna tinha
A Serventia da Casa

conseguido, da antiga Alfândega de Vitória,


(...) preservamos no último andar, no gabi-
172
SOUTO, Ângela Christina Pinto Coelho Orofino. Entrevista concedida a Luiz
Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e David Protti, Rio de Janeiro-RJ, 25 de janeiro
de 2008. Acervo da Alfândega/Vitória-ES.
171
SANTACRUZ LIMA, João Carlos. Entrevista concedida... 173
SOUTO, Ângela Christina Pinto Coelho Orofino. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 117
Loibman, obteve a convocação de outra comissão
de inquérito, que finalmente concluiu por não res-
ponsabilizar aqueles profissionais, como já foi de-
monstrado.
Mas sua atitude havia desagradado ao secretário da
Receita Federal e o apoio incondicional que deti-
nha anteriormente dele se desfez. Findo o proces-
so, apesar do apoio que recebeu do novo superin-
tendente da 7a Região Fiscal, Paulo Aviz de Sousa
Freitas, para permanecer no cargo, Santacruz Lima
decidiu que sua missão havia sido cumprida a con-
tento e, sentindo-se abatido, escolheu entre os jo-
vens quadros da Alfândega do Porto de Vitória o
Expediente interno na ALF/VIT (Cemicro) – 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT seu substituto:
Eu falei: “Não. Quer saber a verdade: eu
estou cansado, a minha saúde não está boa...”
Finalmente, em 12 de janeiro de 1998, a Alfânde- – nesse período rapaz, meu nível de estresse
era altíssimo. Eu sentava nessa varanda;
ga do Porto de Vitória transferiu-se para sua sede
quando eu via os navios de automóvel
própria na rua governador José Sette, nº 176, no passando aqui no sábado (...). Foi um período
centro da capital; um prédio de 8 andares sendo da minha vida, duro, porque (...) cada navio
quatro para garagens e outros quatro para acomo- que chegava, três mil automóveis. Era
terrível: inquérito, injustiça. A justiça sendo
dação das salas do serviço aduaneiro.
praticada, claro, nessa tentativa da Receita,
Mas João Carlos Santacruz Lima não permaneceria Dr. Everardo Maciel, de praticar justiça, de
muito tempo à frente da Alfândega. Cerca de dois reorganizar – e que fez, reorganizou. (...)
Então, essas injustiças é que eu não pude...
meses após sua designação para responsável pelo expe- Eu convivia com as pessoas, eu não aceitei
diente da Alfândega do Porto de Vitória, o secretá- isso e aí eu fui embora.175
rio da Receita Federal, Everardo Maciel, publicou
Experiente fiscal da Receita Federal e um dos
nova portaria nomeando-o, formalmente, inspetor
fundadores do Sindifisco – precursor do atual
da Alfândega do Porto de Vitória.174 E um ano após
Unafisco Sindical – João Carlos Santacruz Lima deu
acompanhar os trabalhos da comissão processante,
uma contribuição importantíssima à Alfândega do
a decisão desta de punir 17 técnicos de nível médio
Porto de Vitória. Ao final de sua gestão, a Alfândega
com o aval do secretário da Receita Federal, por
estava reconhecida por todos aqueles intervenientes
problemas relacionados com o pagamento de diá-
no comércio exterior capixaba. Foi nela que se
rias, pareceu muito rígida ao inspetor. Dirigindo-se
A Serventia da Casa

preparou a base técnica, se assim é possível chamar,


ao secretário-adjunto de Everardo Maciel, Zenaldo
formada por jovens auditores que ingressaram na

Portaria SRF n. 768/95, de 01 de junho de 1995. DOU de 05 de junho de 1995.


174

Seção 2, p. 4083. 175


SANTACRUZ LIMA, João Carlos. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 118
Receita Federal entre fins dos anos 1980 e início dos
anos 1990. E saiu dentre esses jovens a indicação, pelo
superintendente da 7ª Região Fiscal, Paulo Avis de Sousa
Freitas, do futuro inspetor da Alfândega. O terceiro, e
primeiro capixaba, desde sua recriação em 1992: João
Luiz Fregonazzi.
Em 15 de agosto de 1996 saiu publicada a Portaria
SRF n. 1.496, nomeando ao cargo de inspetor da Al-
fândega do Porto de Vitória, João Luiz Fregonazzi.
Engenheiro eletricista e bacharel em Direito, ambos
os cursos feitos na Universidade Federal do Espíri-
to Santo (Ufes), Fregonazzi iniciou sua carreira no
serviço público como técnico do Tesouro Nacional
em 1986. Em 1991, através de concurso público, foi
nomeado auditor da Receita Federal. Trabalhou então
em Vitória, Uruguaiana (RS) e Brasília. Em 1993 vol- João Luiz Fregonazzi – 2008
Autor: David Protti
tou ao Espírito Santo para compor o GOE (Grupo Acervo: ALF/VIT

de Operações Especiais) encarregado de verificar in-


dícios de enriquecimentos ilícitos e outros crimes fis-
cais. Em 1994 passou em definitivo para a Alfândega.
Na gestão de João Carlos Santacruz Lima, Fregonazzi
foi chefe do Setor de Tributação.176
O GOE, criado pelo então secretário da Receita Fede-
ral, Osíris Lopes Filho, e supervisionado no Espírito

Portaria SRF n. 1.496, de 14 de agosto de 1996. DOU de 15 de agosto de 1996.


176

Seção 2, p. 5939. Barra da baía de Vitória – 2008. Autor/Acervo: David Protti

A Serventia da Casa

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 119
Rochas ornamentais para exportação – 2008 . Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

Santo pelo auditor Luciano Zamilute Teixeira, fez nítida de irregularidade fiscal.177
parte de um programa de combate à sonegação e A primeira grande tarefa do novo inspetor foi com
atuou em todo o litoral brasileiro. Seu objetivo era a qualificação do corpo técnico. Ou seja, a Alfân-
investigar ilícitos através de sinais externos de ri- dega passava por um momento em que vários au-
queza. Em Vitória, o GOE concentrou a audito- ditores experientes estavam se aposentando e, por
ria no Iate Clube do Espírito Santo e investigou outro lado, havia novos quadros sem suficiente
as declarações de Imposto de Renda de proprie- preparo técnico para gerenciar os vários setores
tários das 133 embarcações atracadas e em reparo, da Instituição. Portanto, era preciso formar uma
à época. Foram investigados os nomes, endereços nova equipe de gestores. Essa reestruturação foi a
e números de registros dos proprietários de iates, marca inicial da gestão de Fregonazzi.178 Estava em
veleiros, lanchas, jet-skis e hobbie-cats. A vistoria dos curso naquele momento a efetiva consolidação da
instrumentos importados existentes nas embarca-
ções também foi rigorosa. Inicialmente, 35 embar-
A Serventia da Casa

177
A atuação do GOE, que durou ao menos 1 mês no Espírito Santo, teve ampla
cações foram retidas pelo GOE, algumas defini- repercussão na imprensa local. Em especial, ver: “Receita apreende 35 barcos no
Iate Clube”, A Gazeta, Vitória, 12 de agosto de 1993, p. 1 e 9; “Investigadas decla-
rações do IR”, A Gazeta, Vitória, 13 de agosto de 1993, p. 10 e; “Donos de iates
tivamente apreendidas por apresentarem situação começam a apresentar documentação”, A Tribuna, Vitória, 13 de agosto de 1993.
178
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio
Barros e David Protti, Vitória-ES, 14 de dezembro de 2007. Acervo da Alfândega/
Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 120
Alfândega, não somente para sua atuação nas áreas
de competência do órgão, mas sobretudo, para sua
posição de entidade formuladora de iniciativas jun-
to aos órgãos anuentes e aos setores intervenientes
no comércio exterior capixaba. Uma iniciativa que
se reflete no presente em grande audiência e res-
peitabilidade conquistada pela Alfândega, não so-
mente no Espírito Santo, mas em todo o país.
A preocupação com a capacitação técnica da equi-
pe justificava-se, entre outros motivos citados aci-
ma, por uma outra mudança importante que vinha
acontecendo a partir de 1996: a diminuição, mês a
mês, das importações de veículos pelos portos de
Rochas ornamentais em placas para exportação – 2008
Vitória, ao mesmo tempo em que crescia a mo- Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

vimentação de contêineres e de cargas gerais. Era


preciso o aprimoramento dos serviços aduaneiros
e da atuação da fiscalização pela Alfândega. Para (...) houve uma mudança desse perfil de im-
tanto, o treinamento adequado à nova realidade portação. Nós passamos de uma importação
impunha-se aos portos do estado. João Luiz Fre- de veículos que respondia a 85% da arreca-
dação da Alfândega e isso veio se reduzin-
gonazzi assim define aquele momento:
do em 96, 97 e 98 até que hoje não chega a
Houve a capacitação local e também a ca- 10% da arrecadação da Alfândega. A menos
pacitação em outras unidades regionais e até de 10%. Foi decrescendo, enquanto que os
nos órgãos centrais. E também uma mudança outros tipos de cargas gerais foram crescen-
de enfoque (...) antigamente os cursos eram do muito. Isso era uma necessidade, ia acon-
engavetados – logo no início da Alfândega. tecer, porque as importações de veículos
Ninguém saía para fazer um curso, (...) para foram diluídas pelo país e foram reduzidas,
prestar serviço e, por razão óbvia: tinha pou- com a criação das fábricas nacionais.
ca gente. Mas nós, mesmo com pouca gente,
com poucos recursos humanos, passamos a Continuando:
investir, permitir que o nosso pessoal saísse, Só que, conferir, fazer um exame documental,
assumisse atribuições (...) tanto na Superin- tratamento tributário dado a um tipo de carga
tendência quanto nos órgãos centrais e isso, muito específico, é simples, não é? Conferir
na verdade, trouxe um cabedal de informa- um veículo, verificar a alíquota, o tratamen-
ções e de experiências que nós ainda não tí- to tributário, regime de tributação é simples.
nhamos, o que proporcionou um crescimen- Quando você substitui um veículo por um
to ainda maior desse corpo técnico.179 contêiner, a coisa complica muito. É muito
mais fácil você executar um controle em cima
E prossegue, pontuando as mudanças no perfil das
A Serventia da Casa

de um veículo – você em cinco minutos faz,


importações capixabas entre 1996 e 1998: do que de um contêiner, que você tem que
conferir, separar, desovar. Então, na verdade,
mudou muito e aumentou muito a demanda e
179
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 121
Transporte de minério de ferro pela EFVM – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
a quantidade de serviço, tanto é que o corpo
técnico quadruplicou (...).180
De fato, todo o setor ligado ao comércio exterior
passava por mudanças naquele ano de 1996. Em
primeiro lugar, e conforme previsto na Lei 8.630, de
25 de fevereiro de 1993, os portos públicos do Es-
pírito Santo, localizados nos municípios de Vitória
e Vila Velha, passariam ao arrendamento à iniciati-
va privada, - processo que se completou em 1998
– visando a novos investimentos e modernização
logística. Em segundo lugar, estava em discussão Essa conjuntura impunha à Alfândega um fôle-
no Congresso Nacional, tendo sido aprovada em go crescente em suas atribuições e diálogo com
13 de setembro de 1996, a Lei Complementar n. os setores intervenientes no comércio exterior
87181 – a chamada Lei Kandir – que, conforme dito, tais como empresas internacionais de navegação
isentou as mercadorias destinadas à exportação do e seus agentes, as tradings, os despachantes e os
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Servi- transportadores. Era preciso evitar as dificuldades
ços (ICMS), causando em um primeiro momento do início da década quando a abertura econômica
graves perdas aos estados exportadores, caso do pegou despreparada a Aduana brasileira, causando
Espírito Santo, além de provocar uma rediscussão transtornos de toda sorte. Agora, não! O acompa-
do mecanismo Fundap para as contas estaduais. nhamento das mudanças legais, o preparo técnico

Silos de soja – porto de Tubarão - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
A Serventia da Casa

180
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...
181
BRASIL. Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996. Dispõe sobre o
imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circula-
ção de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual
e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se
iniciem no exterior. DOU, 13 de setembro de 1996. Disponível em http://www6.
senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=144274 [capturado em 26
de março de 2008].

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 123
Embarque de aço em lâminas no porto de Praia Mole – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

e a otimização das práticas aduaneiras tornavam-se Terminal de Vila Velha (TVV), quando trabalhado-
prementes para um bom funcionamento da Alfân- res portuários avulsos, insatisfeitos com o rumo de
dega, e as atitudes iniciais da gestão de João Luiz negociações com a Companhia Vale do Rio Doce
Fregonazzi procuraram esses caminhos. S/A, ocuparam o porto, em sinal de protesto:
As dificuldades iniciais, entretanto, foram desafia- Eu acho que nós enfrentamos problemas
muito grandes, muito graves. Em 98, (...)
doras. Como bem relata o próprio Fregonazzi:
[ocorreu] a quebradeira da estiva nos por-
Então houve um crescimento muito grande tos. Fecharam os portos, quebraram tudo. A
e uma Alfândega em formação; uma legis- Alfândega de Vitória enfrentou aquela situa-
lação mudando, a cada momento mudando; ção praticamente sozinha. Uma situação de
crises nacionais, uma atrás da outra, não é? desgoverno do Governo estadual, os órgãos
Inclusive o crime organizado no Espírito federais não tinham estrutura para adminis-
Santo, ameaças que sempre existiram, então trar a situação e a Alfândega administrou a
na verdade a gente enfrentava uma, duas cri- situação sozinha. Nós requisitamos a força
ses todo ano, crises graves, não é?182 policial, na época a Polícia Militar, o Bata-
A Serventia da Casa

lhão de Choque, e nós conseguimos retomar


E recorda os graves acontecimentos ocorridos no
o controle aduaneiro e o fluxo de mercado-
rias e pessoas nos portos, o que permitiu a
continuidade do serviço. Foi um momento
182
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 124
de crises, houve ameaças (...).183
Os três primeiros anos da gestão de Fregonazzi foram
um período de afirmação, presença e consolidação
da Alfândega no cenário e cotidiano não somente
nas áreas de comércio exterior e portuária, mas na
sociedade e no imaginário capixabas. A relevância
do papel aduaneiro foi se fortalecendo à medida
que a prática dos serviços alfandegários passava
por muitas mudanças. Segundo Fregonazzi:
(...) nós pegamos toda a alteração da legisla-
ção aduaneira que ocorreu e tinha que ocor-
rer, por causa do incremento do comércio
internacional, tanto exportação quanto im-
portação. Foi um momento de mudança total, Desova de mercadorias importadas – 2008
mudança da legislação, mudança da forma, Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

inclusive da forma de trabalhar com o Sis-


comex, com os grandes sistemas aduaneiros.
(...) Com a mudança de enfoque, agora não os seus documentos de exportação sem a
era mais só despacho aduaneiro, agora tinha comunicação com o sistema. Não conseguem
que, também, haver uma fiscalização de zona trabalhar sem a comunicação com o sistema.
secundária, vigilância e repressão. Então, Já no importação, não. Algumas atividades
tudo isso foi ocorrendo na nossa gestão. A podem ser efetuadas sem a conexão. Podem
criação de serviços de fiscalização aduaneira, ser atividades off line. A conexão com o
o serviço de operações portuárias.184 sistema é necessária apenas prá registro,
ou prá recuperação, transmissão de alguma
Das mudanças citadas, a implantação do SISCO- informação. Mas como o Importação
MEX Importação, em 1997, foi uma inovação trabalha dentro de um ambiente windows,
radical no acompanhamento e controle de merca- também é um sistema bem mais amigável,
dorias e significou uma otimização do tempo de mais moderno.185 (grifos nossos).
liberação das importações, além de permitir maior
controle e segurança nas movimentações mercan- O depoimento de Paulo Flores é interessante
tis. O responsável pela consultoria do SISCOMEX na medida em que aponta para o controle da
documentação relativa ao despacho aduaneiro.
Importação entre 1997 e 2007, Paulo Antonio Li-
Além de que, o SISCOMEX unifica informações
cks Flores, relata as mudanças advindas com a im- importantes para o trânsito aduaneiro. Ou seja:
plantação desse módulo: O SISCOMEX, ele por ser um sistema
Tem uma plataforma também mais informatizado, essas vantagens são
moderna. O Exportação é um sistema que decorrentes do próprio uso da informática.
é totalmente dependente da comunicação. Então, o que houve com o SISCOMEX? A
A Serventia da Casa

Os exportadores não conseguem registrar gente teve a substituição de uma sistemática

FLORES, Paulo Antonio Licks. Entrevista concedida a Nicélio Barros, David


185
183
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... Protti e Francisco José Caramurú Vieira, Vitória-ES, 17 de dezembro de 2007.
184
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... Acervo da Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 125
baseada no papel, baseadas em documentos trâmite do desembaraço de mercadorias. No ramo
(...) substituição desse papel por documentos desde 1964, o despachante Marcos de Menezes
eletrônicos, por formulários eletrônicos. E
Tovar explica como as mudanças no sistema de
(...) bom, a utilização desses documentos
eletrônicos permite um controle muito melhor informação repercutiram em suas atividades:
por parte da Aduana, falando especificamente Antigamente, a tramita-
aqui da Aduana, e isso certamente é vantajoso ção dos processos era
pro país: que a Aduana atue de uma maneira muito mais problemá-
mais eficiente. A utilização, entre as vantagens tica.Você levava qua-
dos documentos eletrônicos, a gente tem a se 20 dias prá liberar
minimização de erros. Documento papel, o uma importação. Por
usuário do papel está muito mais sujeito a quê? Era de mesa em
erro. O papel não corrige erro. O formulário mesa. (...) tinha que
eletrônico não. Alguns erros são corrigidos examinar a merca-
pelo próprio computador.186 doria, a classifica-
ção (...) eu tinha
E enfatiza a facilitação trazida para aqueles que
máquina, eu mais
atuam no comércio exterior: uns dois rapazes
Então o importador, ou o exportador, ele ficávamos baten-
acaba não cometendo erro porque ele está do maquina até
utilizando uma ferramenta computacional. uma hora, duas
Paulo Licks Flores – 2008
A fraude é minimizada com a utilização horas da manhã Autor: David Protti
de documentos eletrônicos. É muito mais prá poder estar Acervo: ALF/VIT

difícil falsificar um documento eletrônico. com o serviço no


Documento eletrônico ele não é emitido dia seguinte. Hoje o SISCOMEX faz em cin-
em vias. Não existem várias vias, como co minutos, faz tudo. Automático. Está tudo
existia na documentação de importação e de no sistema. Débito automático. Multas, nós
exportação um tempo atrás. Se eu não me pagamos com débito automático. Tem tudo,
engano as guias de Importação elas eram tem o código direitinho, é só entrar lá e pa-
emitidas em oito vias. As declarações de gar.188
Importação, acredito que em cinco vias. E
Roberto Almeida, outro dos mais antigos
cada via tinha um destino. Uma dessas vias
poderia ser alterada prá um determinado fim. despachantes aduaneiros capixabas, ratifica as
Cada via tinha seu encaminhamento. Hoje, palavras de Tovar. Para ele, o SISCOMEX
não. Documento eletrônico ele existe em um Foi uma grande facilidade. Facilitou muito.
lugar só, ele é um só. Mas pode ser acessado Facilitou muito porque antigamente a gente
por esses intervenientes, esses operadores, ia (...) era negócio de papel, pega aqui, vai ali,
em qualquer lugar, em qualquer ponto do e não sei o que, (...) era difícil naquela época;
território nacional, ponto conectado ao nós vivíamos uma luta mesmo! Agora, [com]
sistema.187 esse sistema, qualquer coisa é no fax que
Para profissionais como os despachantes você resolve, entendeu? Mas, hoje em dia
tem que apresentar as originais para poder
aduaneiros, por exemplo, a implantação, sobretudo
A Serventia da Casa

do módulo Importação do sistema, veio facilitar o

188
TOVAR, Marcos de Menezes. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro,
186
FLORES, Paulo Antonio Licks. Entrevista concedida... Nicélio Barros e David Protti, Vitória-ES, 12 de dezembro de 2007. Acervo da
187
FLORES, Paulo Antonio Licks. Entrevista concedida... Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 127
Movimentação de mercadoria no Terminal de Cargas do Aeroporto de Vitória – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

fazer direito a liberação da carga!189 houver uma necessidade. Foi assim no tempo
do Fregonazzi... passar a mão no telefone:
Para além das mudanças no sistema de informação,
“Fregonazzi precisamos conversar. Já são seis
na legislação e na estruturação do corpo técnico, horas da tarde mas você me espera porque
a Alfândega construiu uma relação de respeito e daqui a pouco eu tô aí” e sair de lá nove horas
diálogo com os intervenientes do comércio exte- da noite; ou ele me telefonar e: “Imperial,
reúne o seu pessoal que eu estou indo
rior no estado. O presidente do Sindiex, Severiano
pr’aí, porque nós precisamos conversar”. Já
Imperial, é emblemático ao apontar a sistemática aconteceu disso também: “reúne a diretoria
adotada na relação com Alfândega: porque nós precisamos conversar,” e ele vir
aqui e conversar, entendeu? (...) “Reúne aí
Desde o nosso início, sempre foi um
os empresários de tal seguimento que nós
relacionamento muito bom, (...) uma
precisamos conversar e é daqui a duas horas,”
parceria, (...) uma parceria franca e aberta, de
e eu reunia, chamava o pessoal, ligava. Eu
chegar e botar o problema na mesa: “Vamos
digo: “O pessoal de São Paulo tem que dar
tentar resolver? Vamos procurar resolver”.
A Serventia da Casa

mais tempo, porque tem que pegar avião,” e


Sem problema nenhum de ser recebido, se
chamar, e trazer e conversar. Quer dizer, é
uma parceria.190
189
ALMEIDA, Roberto. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio
Barros e David Protti, Vitória-ES, 12 de dezembro de 2007. Acervo da Alfândega/
Vitória-ES. 190
IMPERIAL, Severiano Alvarenga. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 128
O agente marítimo Thelmo Nunes, há mais de padronização no cumprimento das
quarenta anos no ramo, entende que as mudanças normas e elementos que orientam
na Alfândega tornaram-na uma instituição pró-ativa e os procedimentos operacionais
preocupada em explicar as mudanças da legislação nos portos. Seu objetivo final
para sua categoria, de forma a agilizar as operações é otimizar o desempenho das
portuárias. Segundo ele atividades portuárias e reduzir o
Eu digo que o progresso marítimo operacio- chamado custo Brasil.192
nal foi geral. Tudo veio a facilitar. A Alfânde-
ga, sem duvida, nós temos aí o SISCOMEX, Marcos de Menezes Tovar – 2008
o relacionamento com o pessoal [auditores], Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT
os inspetores que também tem sido (...) bata-
lhadores no sentido da burocratização legal.
De forma que eu acho que a Alfândega, a
O PROHAGE-ES, hoje
Anvisa, a Polícia Federal todo mundo pro-
grediu e conseguiu formar um bloco para referência nacional entre seus congêneres, teve
desenvolvimento da autoridade portuária.191 sucessivas coordenações da Alfândega de Vitória
– na pessoa do auditor fiscal Luciano Zamilute
Tal intercâmbio resultou na criação, em 1997, de
Teixeira –, da Anvisa por seu representante Elísio
um importante instrumento de debates e análises
Nunes Ribeiro, e do Ministério da Agricultura,
entre instituições e órgãos ligados ao setor
Pecuária e Abastecimento através de seu
portuário, denominado de PROHAGE (Programa
representante Antonio Carlos Barletta. Nesses dez
de Harmonização das Atividades dos Agentes de
anos o Programa alcançou algumas conquistas
Autoridade nos Portos), composta pelo Ministério
que não devem ser menosprezadas, tais como:
da Fazenda (RFB/Alfândega), Ministério da
o acordo que agilizou o embarque de granéis,
Saúde (Anvisa), Ministério da Defesa (CMM/
especialmente o minério de ferro e commodities
Capitania dos Portos), Ministério da Justiça (Polícia
Federal), Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (VigiAgro), Secretaria Especial de
Portos (Codesa), Ministério do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior (Inmetro/Ipem).
O PROHAGE foi criado no âmbito de atuação
do antigo Grupo Executivo para Modernização
dos Portos (Gempo), como consta da Portaria
Interministerial nº 11, de 25 de novembro de 1997,
publicada no Diário Oficial da União de 27 de
novembro de 1997. Seus objetivos principais são
A Serventia da Casa

o fomento à integração e harmonização, além da

Armazenagem de tecidos importados em porto seco – 2008


Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
NUNES, Thelmo. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e
191

David Protti, Vitória-ES, 12 de dezembro de 2007. Acervo da Alfândega/Vitória-


ES. 192
Cf. PROHAGE. Informativo PROHAGE, Vitória, ano 1, n. 1, dez. 2007, p. 2.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 129
Movimentação portuária em Praia Mole – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

agrícolas, na exportação; a agilização da inspeção Nesse sentido, o Programa tem servido como
e análises laboratoriais de bebidas importadas, uma instância efetiva para críticas, sugestões e
mediante convênio com o Instituto de Tecnologia contribuições das entidades representativas dos
da Ufes (Itufes)193; a dispensa da duplicidade de diversos segmentos, e para reduzir os processos
pesagem de produtos siderúrgicos; a redução do burocráticos repetitivos e, ainda, para uma
tempo ocioso de estadia de navios nos terminais convivência amistosa entre as instituições federais
privativos; o incentivo à instalação e adequado que atuam nos portos. As palavras do auditor da
aparelhamento dos órgãos de fiscalização no receita federal (ARF) e primeiro coordenador
interior dos portos; a mediação de conflitos entre do PROHAGE-ES, Luciano Zamilute Teixeira,
autoridades, administradores e usuários dos portos expressam bem a idéia fomentadora do foro:
e a proposição de revisão e atualização das normas Pela característica da atividade de comércio
vigentes no ambiente portuário.194 exterior, onde você tem três órgãos de
controle: a Receita no controle fiscal, o Banco
A Serventia da Casa

193
Convênio celebrado entre o Sindicato do Comércio de Exportação e Impor-
Central no cambial e o MDIC [Ministério
tação do Estado do Espírito Santo (Sindiex) e a Fundação Ceciliano Abel de do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Almeida (FCAA), para a implementação do “Laboratório de Análises de Bebidas
de Origem Vegetal” do Instituto de Tecnologia da Ufes (Itufes), assinado em Exterior] no controle administrativo (...) são os
30 de dezembro de 2003 pelos representantes do Sindiex, Severiano Alvarenga
Imperial, e da FCAA, Roberto Sarcinelli Barbosa. O Laboratório de Análises de três principais órgãos. Você tem mais (...) 16 a
Bebidas foi inaugurado em 15 de fevereiro de 2006. Acervo Sindiex-ES. 18 órgãos anuentes, que atuam no controle. É a
194
Cf. INFORMATIVO PROHAGE, op. cit., p. 2.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 130
característica da atividade de comércio exterior. treinamento mostraram-se de
Os principais são, realmente, a Alfândega, na grande importância
parte operacional, digamos assim; o Banco
Central e o MDIC mais na parte documental. Tivemos treinamen-
Parte operacional em si envolve Alfândega, to com a Alfândega, o
Anvisa, a Agricultura [Ministério] e a Polícia pessoal da Alfândega
Federal, eu diria que são os mais atuantes, deu treinamento para o
e a Autoridade Portuária: o porto público, nosso pessoal, e isso vai
seus arrendatários. Esses são os principais. continuando porque vai
Realmente precisa haver uma relação, eu não se modernizando, você
diria de subordinação, mas uma relação de vai necessitando de ter
coordenação entre esses órgãos prá evitar o pessoas mais especiali-
que eu citei antes: o retrabalho, a duplicidade zadas nas agências (...)
de exigências, o excesso de burocracia (...) novas leis estão sendo
porque isso tudo redunda em custos. Aqui no levadas ao conheci- Roberto Simões de Almeida – 2008
Estado tem um fórum muito bom (...) que é o mento dos sindicatos, Autor: David Protti

PROHAGE, que se reúne uma vez por mês, isso é uma constante Acervo: ALF/VIT

com representantes de todos esses órgãos na nossa vida.196


intervenientes e anuentes e o objetivo é esse:
O diálogo permanente com os intervenientes no
atender às demandas, as legítimas e legais, dos
usuários. O PROHAGE, nesse aspecto, aqui comércio exterior foi uma das marcas dessa nova
no estado, tem tido um sucesso muito grande fase da Alfândega do Porto de Vitória. Paralelo
desde 1997.195
a essas iniciativas, estava em curso uma mudança
Outro intercâmbio importante entre no foco do comércio
Alfândega – a partir da gestão de internacional capixaba, tanto
Fregonazzi – e setores intervenientes nas exportações quanto
no comércio exterior foram os nas importações. Em 24 de
cursos de treinamento oferecidos no setembro de 2000, o jornal
sentido de adaptá-los às mudanças A Gazeta trazia a seguinte
na legislação aduaneira e, com isso, manchete em seu Caderno de
dirimir dúvidas, buscar críticas e Economia: “Acaba o ciclo do
agilizar os trâmites burocráticos carro importado”. Os números
da movimentação portuária. Os davam conta de que entre janeiro
resultados mostraram-se profícuos e setembro daquele ano, 24.760
e serviram para encurtar, cada unidades de veículos haviam
Thelmo Nunes – 2008
vez mais, a distância entre os Autor: David Protti sido importadas pelos portos
Acervo: ALF/VIT
atores que atuam no cenário do capixabas. Uma queda de 90,8%
comércio internacional no Espírito Santo. Para em relação ao ano de 1995, o auge das importações
A Serventia da Casa

o agente marítimo Moacyr Bonelli, os cursos de dessa mercadoria, quanto entraram pelo estado um

195
TEIXEIRA, Luciano Zamilute. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Ni-
célio Barros e David Protti, Vitória-ES, 1 de abril de 2008. Acervo da Alfândega/ 196
BONELLI, Moacyr. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio Barros e
Vitória-ES. David Protti, Vitória-ES, 12 de dezembro de 2007. Acervo Alfândega de Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 131
montante de 269.220 unidades de veículos.197
No entanto, desde 1998, já se podia perceber a
reação das empresas importadoras ante a conjuntura
brasileira que apontava para a necessidade de
diversificar a pauta de importações. Finda aquela
fase em que os veículos foram a “locomotiva das
importações”, no dizer de Ronaldo Loureiro,
era preciso atrair novos clientes e cargas. Essa
situação, direta ou indiretamente, envolvia todos
os setores ligados às atividades do comércio
exterior no Espírito Santo. Da parte empresarial
era preciso oferecer uma logística portuária -
tempo de embarque/desembarque, armazenagem
e distribuição das mercadorias – que atraísse
Reunião do PROHAGE-ES – 2008. Autor: Eder Leppaus. Acervo: PROHAGE
os exportadores internacionais e importadores
nativos. Por outro lado, era preciso que a rotina
aduaneira também passasse por uma reciclagem
mescladas com a movimentação - entrada e saída – em seus procedimentos a fim de otimizar o tempo
de cargas gerais. de desembaraço e desova, itens primordiais para
João Luiz Fregonazzi.
Entre 1998 e 2000, por diversas vezes a imprensa
local trouxe matérias a respeito da diversificação Em um período relativamente curto, já era possível
e do aumento de cargas pelos portos do estado. observar a diversificação na pauta de mercadorias
Manchetes como “Coroa negocia primeira venda estocadas nos portos secos: cosméticos, bebidas,
para o Canadá”; “Cooperativa para exportar componentes eletrônicos, eletrodomésticos,
rochas”; “Moda made in Espírito Santo”; “Vitória material esportivo, bicicletas, bobinas de alumínio,
concentra importação de perfumes”; “Importações aparelhos de fax, remédios, entre outros, faziam
crescem há quatro meses no ES”; “Café capixaba parte da nova captação. No setor de exportados a
vai para a Itália”; “Codesa bate recorde de cargas pauta era composta, entre outros tradicionais, por
em 2000”,199 dão um significado da abrangência das produtos alimentícios, tecidos, peixes ornamentais
movimentações e do papel crucial das atividades e matérias-primas para remédios.198 Essa
aduaneiras na fiscalização de mercadorias tão diversificação, fundamental para o crescimento do
diversas, cada uma com nomenclatura diferente. complexo portuário do estado, reflete-se nos dias
Somente em 2000 foram movimentadas pela atuais, moldando as características do complexo
baseadas nas exportações e importações tradicionais
A Serventia da Casa

Codesa, 5,877 milhões de toneladas de cargas,

As matérias referidas estão, respectivamente, nas seguintes edições de A


199
197
“Acaba o ciclo do carro importado”. A Gazeta, Vitória, 24 de setembro de
Gazeta, Vitória: 05 de maio de 2000, p.7; 15 de julho de 2000, p. 5; 18 de agosto 2000, p. 8.
de 2000, Caderno Especial, p. 8; 24 de setembro de 2000, p. 12; 17 de outubro “Portos do ES movimentam 4 mil produtos”. A Gazeta, Vitória, 07 de junho
198

de 2000, p. 5; 08 de novembro de 2000, p. 8 e; 01 de janeiro de 2001, p. 8. de 1998, p. 13.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 132
Fiscalização da Anvisa no Aeroporto de Vitória – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

que alçaram o Espírito Santo aos lugares de 6° expectativa também da Alfândega.


exportador e 3° importador no ranking nacional.
Ainda no ano anterior, quando do alfandegamento
Aqui vale repetir a máxima do agente marítimo
provisório dado pela secretaria da Receita Federal,
Moacyr Bonelli: “onde tem carga vai ter navio”.200
o inspetor João Luiz Fregonazzi assim classificou o
Entre os anos de 1999 e de 2000, a Alfândega de ato: “foi uma concessão sem tamanho”,201 referindo
Vitória conseguiu uma outra grande conquista para que normalmente o alfandegamento seria o ato
aquele momento: o alfandegamento do terminal de final de um processo de internacionalização. Tais
cargas do Aeroporto de Vitória. Em 27 de janeiro episódios somente reforçam a responsabilidade
de 2000, o secretário da Receita Federal, Everardo da Alfândega de Vitória para com o crescimento
Maciel, através do Ato Declaratório SRF n. qualitativo do comércio internacional no estado.
006/00, tornou o aeroporto uma área alfandegada
Nos anos que se seguiram, a economia portuária
para o transporte internacional de cargas. Era
capixaba conheceu números animadores para
uma reivindicação de empresários já tradicionais
A Serventia da Casa

seu crescimento. Em 2002, a movimentação de


do comércio exterior capixaba, somados a novos
98 mil unidades de contêineres – 44% a mais do
exportadores da área de fruticultura e uma
201
“Aeroporto de Vitória é alfandegado pela Receita”. A Gazeta, Vitória, 12 de
200
BONELLI, Moacyr. Entrevista concedida... junho de 1999, p. 10.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 133
Comércio informal de relógios importados no centro de Vitória – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

que em 2001 – estabeleceu um novo recorde para cadação de tributos aduaneiros - composta basica-
o setor.202 E não parou por aí: dois anos depois, mente do Imposto de Importação (II), do Imposto
novos recordes. A movimentação de cargas foi sobre Produtos Industrializados (IPI), das multas e
35,6% maior do que em 2003. Em conseqüência, da cobrança do Programa de Integração Econômi-
a arrecadação de ICMS das empresas fundapeanas ca (PIS) e da Contribuição para o Financiamento
ultrapassou pela primeira vez em sua história a casa da Seguridade Social (Cofins) – no Espírito Santo,
do bilhão, com R$ 1,2 bilhão no ano. A Alfândega tornando o estado e a Alfândega segundos lugares
por sua vez viu sua receita crescer 77% em relação no ranking brasileiro. Em abril de 2005, de acordo
ao ano anterior.203 com dados divulgados pela Alfândega do Porto de
Vitória, no período de janeiro a abril, a arrecadação
Tal crescimento refletiu-se no incremento da arre-
A Serventia da Casa

do órgão, de R$ 1,040 bilhão, foi somente menor


do que a da Alfândega de Santos, que somou R$
PASSOS, Ângelo. “Recorde de contêineres em 2002”. A Gazeta, Vitória, 9 de
202
2,127 bilhões no período. Se considerado o con-
setembro de 2002, p. 8.
203
“Importações capixabas volta aos tempos áureos”. A Gazeta, Vitória, 19 de junto da 7ª Região Fiscal (RJ e ES), a Alfândega do
dezembro de 2004, p. 28.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 134
Porto de Vitória respondia, então, por quase 50% mais pobre entre os ricos. Por outro lado, em
da arrecadação da região, o que contabilizava um contra-senso, é o mais rico entre os pobres,
nós podemos dizer, entre os estados meno-
montante de R$ 2,337 bilhões entre janeiro e abril
res. Eu acho que é um Estado que tem um
de 2004.204 Durante o ano de 2005, enquanto a mé- futuro muito promissor, e com isso, virá essa
dia nacional de crescimento de cargas conteineri- maior representatividade política, que já está
zadas foi de 13,3%, se construindo.207
a média do Espírito Sem dúvida, esse é um dos desafios mais urgen-
Santo foi 25,9%, re- tes a serem enfrentados pelo estado, no sentido
fletindo os números de seu efetivo desenvolvimento. A equalização
acima.205 Vale rever desses campos – o econômico e o político – é
que em 1992, a Al- uma das metas que se deve alcançar pensando
fândega do Porto de no futuro não somente do complexo portu-
Vitória respondia por ário do Espírito Santo, mas da qualidade de
6% da arrecadação da vida da população capixaba.
7ª Região Fiscal.
O crescimento do comércio exterior, entre-
Levando em conta os tanto, a par de suas benéficas conseqüências,
acontecimentos ocor- atraiu outros maus empresários. E isso foi
ridos desde a abertura Luciano Zamilute Teixeira – 2008 um dos focos centrais da gestão de João Luiz Fre-
Autor: David Protti
econômica do final dos Acervo: ALF/VIT gonazzi. Durante seus 10,7 anos à frente da inspe-
anos 1980, os dados refletem a importância de toria da Alfândega, a equipe de Fregonazzi travou
todo o conjunto ligado ao comércio internacional uma luta incessante contra o ilícito, em especial ao
no estado e reforçam a tese de que o Espírito San- contrabando, descaminho e à interposição frau-
to, no cenário brasileiro, não congrega no campo dulenta. Em sintonia com a missão da Aduana
político o peso que detém no econômico.206 Con- brasileira de proteger e facilitar o comércio inter-
forme aponta Luciano Zamilute Teixeira, indican- nacional, desde o início da gestão os problemas
do o cerne da questão: foram enfrentados com firmeza. A filosofia era a
O que me parece é que o Espírito Santo, no de proteger o bom empresário que cumpre as leis e
cenário nacional, existe um descompasso en- recolhe os impostos com responsabilidade, abaste-
tre o seu peso econômico e o seu peso políti-
ce o mercado interno e realiza lucro, daquele que
co. Me parece que a sua importância econô-
mica se sobrepõe à sua importância política. burla as leis do país e pratica concorrência desleal e
Não há uma harmonia nesse caminhar, nes- desserviço à economia brasileira.
sas duas colunas. Mas, por que isso? Talvez
devamos pensar: o Espírito Santo está na re- Segundo o procurador-chefe da Procuradoria da
gião mais rica do país, a região Sudeste, e é o Fazenda Nacional no Espírito Santo (PFN/ES),
Dr. Renato Mendes Souza Santos, 208 um exemplo
A Serventia da Casa

204
“Porto de Vitória é o segundo em arrecadação aduaneira no país”. A Gazeta,
Vitória,18 de maio de 2005, p. 14.
205
“Cargas em contêineres crescem no ES acima da média nacional”. A Gazeta,
3 de outubro de 2005, p.16. 207
TEIXEIRA, Luciano Zamilute. Entrevista concedida...
206 Tal tese se encontra nos depoimentos de: LOUREIRO, Ronaldo. Entrevista 208
SANTOS, Renato Mendes Souza. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro
concedida... e; TEIXEIRA, Luciano Zamilute. Entrevista concedida... e Nicélio Barros, Vitória-ES, 25 de janeiro de 2008. Acervo Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 135
Processamento de brinquedos importados em área alfandegada – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

do mau empresário está naquele que procura empresa e não só da importação, não só da
burlar a legítima legislação do Fundap com o uso empresa, mas também dos sócios – quem
são os sócios. Era a operação “Caça-fantas-
indevido do mecanismo. O que vem a reforçar
mas”. Ali nós começamos a olhar o cadastro
sobremaneira a posição histórica da Alfândega do da empresa na Alfândega. Isso deu resulta-
Porto de Vitória em coibir uma prática considerada dos muito grandes, foram feitas muitas apre-
ilícita pelas autoridades fazendárias. Nesse sentido, ensões na época. Foi editada uma portaria,
que foi a portaria ALF/VIT n. 30/01, que
graças à análise de suas próprias deficiências,
depois acabou servindo de modelo prá ins-
a Alfândega procurou estruturar e equipar o trumentos normativos nacionais (...).209
serviço de inteligência da informação, vigilância e
E estabelece as diferenças entre o crescimento da
repressão.
sonegação fiscal e o grave problema do crime or-
De acordo com Fregonazzi: ganizado, atuante já há tanto tempo no Espírito
Nós trabalhamos em cima disso. Inclusive, Santo:
A Serventia da Casa

idéias nossas foram utilizadas pelo órgão


central. Como nós desenvolvíamos na época 209
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... A Portaria ALF/VIT n. 30/01,
uma operação, a “Caça-fantasmas”, procu- dispõe, entre outros, da seguinte resolução: Deverá ser iniciado o procedimen-
rando levar a fiscalização a uma análise da to administrativo de declaração de inaptidão, mediante representação fiscal,
das empresas enquadradas em uma das seguintes situações (seguem oito
pontos).

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 136
Na verdade, o crime organizado, ele aconte-
ceu independente do comércio exterior. Ele
aconteceu no Espírito Santo, ele cresceu no
Espírito Santo. (...) Houve um crescimen-
to do crime organizado depois de 88, com
aquela distribuição indiscriminada de recur-
sos com a Constituição de 88 (...) Os estados
e municípios passaram a ter muito mais re-
cursos, não é? Tanto para o bem quanto para
o mal. Infelizmente, para o estado, foi mais
para o mal do que para o bem. E o crime
organizado cresceu muito aqui no estado e,
lógico, isso refletiu na nossa atuação (...) Nós
tivemos situações de enfrentamento. Mas,
o crime organizado, (...) não veio a reboque
do comércio internacional, nem da atuação
aduaneira. Na verdade, houve um enfrenta-
mento.210
E complementa, ao ser questionado sobre as re-
lações entre o crime organizado e os ilícitos adu-
aneiros:
Olha, o contrabando e descaminho no esta-
do (...) em 97 ele cresceu, até que nós pudés-
Processamento de relógios importados em porto seco – 2008
semos tomar conta de novo da situação, criar Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
formas de controlar aquele monte de des-
pachos de Declarações de Importação [via]
canal verde [do SISCOMEX]. Nós começa- em Vitória ele ocorria mais na barra do Espí-
mos a estruturar a Alfândega, prá que pudes- rito Santo, na barra de Vitória, na baía do Es-
se cercar e impedir, mas não havia, assim, o pírito Santo, onde nós não tínhamos estrutu-
crime organizado ligado ao contrabando. O ra prá fiscalizar, que era navio ali na baía do
crime organizado, ele era mais ligado a jogo, Espírito Santo. Ali a gente não tinha como ir
à corrupção em órgão público e não à ativi- e ia sempre um barco, pequenos barcos, não
dade de comércio internacional.211 é? Eles iam lá e tiravam armas ou levavam
drogas ali. Isso aí a gente sabia que ocorria,
E é enfático ao analisar o tráfico de drogas nos mas nem nós, nem a Polícia Federal, à época,
portos capixabas: tínhamos estrutura prá combater esse tipo de
crime. Não tinha estrutura operacional prá
É lógico que tinha e (...) sempre houve o isso. Mas isso vinha ocorrendo com maior
tráfico de droga, mas o tráfico de droga era intensidade em outros portos, não é? Tanto
mais interno. Não entra droga pelo estado. é que o Espírito Santo nunca foi taxado de
Pode até ser que saia. E o tráfico de armas, rota do tráfico internacional. Isso era mais
até onde nós sabíamos, ele era mais intenso Rio e São Paulo mesmo; nem tráfico inter-
A Serventia da Casa

em Rio, São Paulo do que em Vitória, mas nacional de armas. Tráfico internacional de
armas era mais região de fronteira seca.212
210
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...
211
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... 212
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 137
Realmente houve um visível incremento da repres- contrabando (entrada
são à fraude: entre 1° de janeiro de 1998 e 31 de no país de mercadorias
dezembro de 2006, somente o jornal A Gazeta proibidas), descami-
trouxe trinta matérias acerca de apreensões e des- nho (entrada no país
mantelamentos de quadrilhas pela Alfândega de de mercadorias sem
Vitória. Entre os produtos apreendidos estavam documentação e sem
equipamentos de informática, televisores, bebidas pagamento de tribu-
variadas, pneus, computadores, celulares, cigarros, tos) e lavagem de
roupas de grife, gasolina, máquinas e acessórios dinheiro.
fotográficos, teclados eletrônicos, equipamentos A partir de 1999
de áudio e vídeo, máquinas caça-níqueis, peças a Alfândega de Vitória declarou Moacyr Bonelli – 2008
para motocicletas, notebooks, câmeras digitais, brin- guerra às empresas de bingos e às máquinas Autor: David Protti
Acervo: ALF/VIT
quedos, conexões tubulares para construção civil, caça-níqueis; após a realização de diversas opera-
componentes para automóveis utilitários, partes e ções, a maior delas culminou com a apreensão, a
peças de copiadoras, bombas e peças hidráulicas, partir de novembro de 2003, de 780 dessas máqui-
banners diversos, peças para conexão de notebooks à nas. O evento de sua destruição trouxe ao esta-
internet via celular, malas, maletas tipo executivo, do o secretário nacional da Receita Federal, Jorge
mochilas, itens de reposição e fios 100% poliéster Deher Rachid, em 12 de março de 2004. A opera-
texturizado.
E ainda: rum, azeite de oliva, produtos químicos
diversos, carros de competição, lâminas de aço,
uniformes camuflados de uso privativo do Exérci-
to, locomotivas, carros de luxo das marcas Toyota e
Lamborghini, produtos hospitalares (medicamen-
tos, aparelhos de raio X, de ultra-sonografia, mate-
rial cirúrgico e de CTI), equipamentos para barcos
de navegação, navegador, gerador para iate, peças
de vestuário, equipamentos de telecomunicações,
frutas, pilhas, baterias, produtos de perfumaria, re-
lógios, cabelo humano, chumbo eletrolítico, artesa-
nato chinês, lâmpadas, sucata de aço silício, entre
outros. Uma variedade assustadora!
Entre os principais atos ilícitos foram detectados: Processamento de bebidas importadas em área alfandegada - 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
sonegação fiscal, formação internacional de qua-
A Serventia da Casa

drilha, pirataria, interposição fraudulenta (quando


se comprova a existência de empresas laranjas),
falsas Declarações de Importação, subvaloração,

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 139
Importação via aérea pelo Aeroporto de Vitória – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

ção foi realizada no pátio do porto seco da Silotec, dega, e a Secretaria de Segurança Pública do Espí-
na rodovia do Contorno, município de Cariacica. rito Santo para que os componentes das máquinas,
O processo de perdimento das máquinas caça-ní- antes encaminhados para destruição, possam ser
queis ocorre porque tais mercadorias são proibidas usados em computadores que depois serão distri-
de serem importadas para o Brasil. Normalmente, buídos em escolas públicas estaduais. A partir da
são apreendidas em bares, lojas de jogo de bicho, criação do Núcleo de Repressão ao Contrabando
hotéis e mesmo em apartamentos que funcionam e Descaminho no Espírito Santo (NUREP-ES)
como cassinos. Ao serem apreendidas pela Polícia a Alfândega vem mantendo uma regularidade na
Civil e Polícia Militar e por fiscais da Secretaria Es- repressão à importação de máquinas caça-níqueis
tadual de Segurança Pública (SSP-ES), são encami- em todo o Espírito Santo e o incremento das apre-
nhadas juntamente com o auto de infração para a ensões e das ações de perdimento deverá levar o
Alfândega, que então faz a representação para que benefício a um número maior de escolas.
A Serventia da Casa

as máquinas sejam destruídas. Todo o cenário descrito levou à criação, em 2005,


Vale ressaltar que está em andamento uma parceria do NUREP-ES, ligado diretamente à Divisão de
entre a Receita Federal do Brasil, através da Alfân- Repressão ao Contrabando e Descaminho (Direp)

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 140
da Superintendência ou via marítima, no caso daqui. Ou seja, tudo
da 7ª Região Fiscal, no isso vinculado a centros de inteligência e de
ação (...) a partir do levantamento de infor-
Rio de Janeiro e com
mações, de um planejamento, de uma estra-
o apoio da gestão de tégia de ação, eu tenho os meios logísticos
João Luiz Fregona- necessários para agir e coibir. O que quere-
zzi.213 O superinten- mos com isso? Uma maior fluidez no comér-
cio internacional (...) aquele que está correto,
dente da 7ª Região
que faz sua operação correta, ele passe livre-
Fiscal, César Augus- mente. E aquele que está cometendo algum
to Barbiero, expõe ilícito sofre a opressão do Estado, digamos
o que motivou a assim, no sentido de intervir. E que tenha-
mos um índice de acerto próximo de 100%.
implantação do Núcleo:
Carlos Augusto da Silva Xavier – 2008 Ou seja, para não incomodar quem está cer-
Autor: David Protti (...) das três Alfândegas to, e somente agir (...) por dever de ofício,
Acervo: ALF/VIT
que temos [referindo-se contra quem está errado.215
ao conjunto da 7ª RF], a
que tem o maior movimento de importação
e exportação somados é a do porto do Espí-
rito Santo (...) Além disso, o que existia aqui
no Espírito Santo quando eu cheguei [à Su-
perintendência]? Já existia uma combativida-
de maior do que tinha nas outras Alfândegas,
no sentido de buscar o lícito e barrar o ilícito.
Então foi um campo fértil para que desen-
volvêssemos aqui um núcleo de repressão,
visto que na estrutura regimental em 2005
foram criadas as divisões de repressão ao
descaminho e contrabando.214
Houve, portanto, uma comunhão de interesses en-
tre as iniciativas de controle dos espaços de comér-
cio exterior – terrestre, aéreo e marítimo – por par-
te de Receita Federal e as ações desenvolvidas pela
Alfândega de Vitória. Segundo Barbiero a idéia de
criação do Núcleo
está inserida num projeto maior, o que eu
chamo de “interdição aduaneira”. Interditar
significa o quê? Significa efetivamente con- Operação do Nurep-ES no complexo portuário de Capuaba - 2007
Acervo: ALF/VIT
trolar tudo que acontece num determinado
espaço. Seja por via terrestre, por via aérea,
A Serventia da Casa

No âmbito da SRF e das Regiões Fiscais foram criadas, também em 2005, as


213

Divisões de Repressão ao Contrabando e ao Descaminho (Direp). A Direp/SRF,


sediada em Brasília, é chefiada pelo auditor da Receita Federal, Mauro de Brito.
214
BARBIERO, César Augusto. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Ni-
célio Barros e David Protti, Vitória-ES, 17 de janeiro de 2008. Acervo Alfândega/
Vitória-ES. 215
BARBIERO, César Augusto. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 141
Em 23 de junho de 2005, sob a coordenação do
NUREP, a Alfândega iniciou a Operação Blinda-
gem I, que consistia no fechamento de recintos al-
fandegados, terminais portuários e Aeroporto de
Vitória, para fiscalização de cargas importadas e
exportadas. A Operação Blindagem I, depois de
cinco dias, apreendeu mais de 1.100 toneladas de
mercadorias diversas no valor declarado de R$ 3
milhões e constatou várias irregularidades nas ope-
Helicóptero da 7ª RF/RFB que atende à ALF/VIT. Acervo: ALF/VIT rações de importação.216 A ação contou com a pre-
sença do superintendente da 7ª RF, César Augusto
Barbiero, um entusiasta do NUREP. Os empresá-
rios do setor de comércio exterior do estado, atra-
vés do Sindiex, também deram apoio incondicional
à Operação.217
Em março de 2006, foi desencadeada a Operação
Esfinge, coordenada pelo NUREP, Ministério Pú-
blico Federal e Polícia Federal. Vinte e duas pesso-
as foram presas, sendo 12 no Espírito Santo. Cons-
tatou-se a movimentação de R$ 141 milhões entre
sonegação de impostos e mercadorias importadas
apreendidas.218
Indicando uma melhora do aparelhamento logísti-
co do NUREP, seu supervisor, Carlos Henrique da
Silva Xavier aponta o que dispõe hoje o Núcleo:
Hoje a gente possui a lancha, que é uma lan-
cha Ferret de 45 pés, blindada, toda equipa-
da, com comunicação e navegação por satéli-
te, gps, sonda, radar; uma câmera de imagem
térmica que você enxerga perfeitamente com
ela à noite, com um alcance muito grande, e
toda imagem é filmada e gravada em meio
digital prá servir como prova. Ela tem inclu-
Apreensão de mercadoria importada pelo Nurep-ES – 2008 sive um sistema de perseguição de alvo. Você
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
está filmando determinado alvo, você aciona
A Serventia da Casa

216
“Pente-fino nos portos retém R$ 3 milhões em cargas”. A Gazeta, Vitória, 29
de junho de 2005, p. 17.
217
“Empresas de comércio exterior aprovam ‘Blindagem’”. A Gazeta, Vitória, 28
de junho de 2005, p. 18.
218
“Empresas de Beline e Xyco sonegaram R$ 141 milhões”. A Gazeta, Vitória, 11
de março de 2006, p. 19.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 142
Lancha “Denébola” da Alfândega de Vitória - 2007. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

aquele comando e ela passa a seguir sozinha


aquele alvo, independente da direção que a
lancha esteja se locomovendo. Nós temos
um caminhão scanner, que é onde nós faze-
mos a vistoria de caminhões. Nós temos o
programa de cães de faro aqui no Espírito
Santo, que é um programa pioneiro na Re-
ceita, que hoje nós temos três cães treinados
para o faro de entorpecentes.219
E reitera os objetivos do Núcleo:
O objetivo é termos também cães treinados
para armas, munições e prá moeda. A DI-
REP do Rio já construiu até quatro canis
que vão receber cães que nós vamos man-
A Serventia da Casa

dar. Quer dizer, os servidores vêm prá cá prá


Apreensão de máquinas caça-níqueis – 2003/04
treinar, e voltam prá lá com os cães. E a idéia Acervo: ALF/VIT

219
XAVIER, Carlos Henrique da Silva. Entrevista concedida a Nicélio Barros e
David Protti, Vitória-ES, 21 de janeiro de 2008. Acervo Alfândega/Vitória-ES.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 143
é que com a construção da e contribuintes, garantindo um relacionamento
sede do NUREP, que ainda que, desde então, vem colhendo frutos de melho-
não foi feita, seja criado um
res serviços e resultados. Na mesma data e local fo-
canil-escola, que aí a gente
receberia pessoal do Brasil ram inauguradas as novas instalações da Seção de
inteiro; o funcionário viria, Programação e Logística (Sapol-ALF/VIT), o que
seria treinado com o cão, e propiciou uma melhor administração do Edifício-
ele voltaria prá cada região
sede e aumentou a eficiência no atendimento do
com o cão, e ficaria sempre
sobre a supervisão dessa público e nos serviços internos da Alfândega.
unidade canil-escola aqui Em 26 de abril de 2004, foi inaugurado o NOA-
do Espírito Santo. Em
termos de logística, nós Cais Comercial, no Porto de Vitória, contando
temos as viaturas tam- com a presença do secretário da Receita Federal,
bém. Temos escritório Jorge Deher Rachid, e do superintendente da 7ª
móvel, que é uma coisa RF, Cesar Augusto Barbiero. Hoje é o maior Nú-
que a gente busca ter in-
dependência em relação cleo de Operações Aduaneiras da Alfândega de
às unidades. Ou seja, eu posso chegar num Vitória, comprovando a importância, prevista na
Cesar Augusto Barbiero - 2008
Autor: David Protti
porto, ou no aeroporto, se for necessário, legislação, da presença física e logística da Aduana
Acervo: ALF/VIT numa estação aduaneira ou mesmo na estra- em recintos alfandegados.
da, você tem toda logística ali. E nós estamos
trabalhando prá conseguir o acesso da rede Ao fim de um longo período à frente da Inspetoria
da Receita por celular, porque aí você fica da Alfândega do Porto de Vitória, João Luiz Frego-
totalmente independente. Você dentro do
nazzi deixou o posto em março de 2007, indo para
escritório móvel, você tem um notebook, você
entra com seu acesso, e você tem acesso a o Conselho Nacional de Contribuintes, em Brasília,
todo o sistema da Receita.220 na condição de Conselheiro Titular. Nas palavras
A gestão de Fregonazzi foi marcada pelo aumento de seu substituto, José Henrique Mauri, “Fregona-
da eficiência dos serviços da Alfândega prestados zzi (...) merece uma estátua por ter suportado tanto
ao comércio exterior capixaba. Em abril de 1997, tempo”.222 Com toda a razão! Além de ter liderado
foi inaugurado o NOA (Núcleo de Operações Adu- uma equipe que consolidou a Alfândega do Porto
aneiras) no Porto de Tubarão, um núcleo especia- de Vitória em todos os seus serviços e atuações,
lizado para agilizar a fiscalização aduaneira naquele deixou a Instituição entre as três maiores do Brasil
terminal de cargas e otimizar sua operação.221 em arrecadação e a maior da 7ª RF, superando a do
Porto do Rio de Janeiro.
Em 5 de dezembro de 2002, foi inaugurada no
Edifício-sede da Alfândega, a Central de Atendi- Nas palavras de Fregonazzi estão estampados os
mento ao Contribuinte (CAC), importante setor de motivos de uma gestão plena de realizações:
informações que facilitou o diálogo entre Aduana E essa equipe, ela conseguiu crescer, foi de-
A Serventia da Casa

senvolvido um corpo técnico de alto nível,


reconhecido tanto regionalmente quanto na-
220
XAVIER, Carlos Henrique da Silva. Entrevista concedida...
O NOA Tubarão/Praia Mole teve instalações e efetivos ampliados durante o
221 222
MAURI, José Henrique. Entrevista concedida a Luiz Cláudio Ribeiro, Nicélio
ano de 2002. Em 31 de julho de 2007,a ALF/VIT inaugurou uma nova sede para o Barros e David Protti, Vitória-ES, 14 de dezembro de 2007. Acervo Alfândega/
NOA, mais apropriada para os fins de fiscalização aduaneira. Vitória-ES.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 144
Veículo equipado com “scanner” em atuação em rodovia. 2007. Acervo: ALF/VIT

cionalmente, hoje. A Alfândega, hoje ela é clusive o auxílio na elaboração de normas,


respeitada, ela é a segunda Alfândega. Nós que acabaram se transformando em normas
fomos a Alfândega que esteve em primeiro de efeito nacional. Eu acho que esses foram
lugar em lançamento de ofício, em crédito os pontos positivos. E uma Alfândega que
tributário, em apreensão de mercadorias. sempre trabalhou com transparência, com
Nós sempre estivemos entre os primeiros lu- respeito ao contribuinte, ao administrado,
gares nos últimos dez anos.223 não é? O mesmo peso e a mesma medida prá
todo mundo. Recebendo a todos (...) e eu, o
E reafirma o trabalho que resultou na posição que que eu tenho visto – quer dizer (...) hoje eu
a Alfândega de Vitória conquistou: estou mais distante – o que eu tenho visto é a
Então, uma Alfândega eficiente, respeitada, continuidade desse trabalho, não é? A gente
inclusive respeitada por outros órgãos (...) está vendo é isso e a continuidade desse cres-
então, eu acho que esse foi o ponto forte. A cimento, que é muito bom.224
criação de um corpo técnico competente, a Em 14 de março de 2007, através da Portaria SRF
valorização da instituição, o crescimento da
nº 267, foi publicada no Diário Oficial da União
A Serventia da Casa

instituição, o crescimento do comércio inter-


nacional no estado. Eu acho que esses são os a nomeação do auditor José Henrique Mauri para
pontos fortes da administração, não é? In-

223
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... 224
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 145
o cargo de inspetor-chefe e, acima de tudo, o tráfico de drogas e de
da Alfândega do Porto de armas.225
Vitória. Capixaba nascido Realçou ainda o papel relevante dos NOAs para o
em Marilândia, contabilista cumprimento de seus objetivos à frente da Alfân-
especializado em comércio dega do Porto de Vitória:
exterior, Mauri entrou para Precisamos, ainda, fortalecer e garantir me-
os quadros da Receita em lhores instalações para nossos Núcleos de
1990, servindo na DIV- Operações Aduaneiras (NOA), especial-
mente o de Capuaba, em Vila Velha (Atres
CAD, a antecessora da Al-
e Codesa) e o do aeroporto (Infraero), por-
fândega. Passou por todo tos secos (em conjunto com a APRA) e já
o processo de criação e precisamos pensar em novos núcleos em
instalação da Alfânde- Anchieta, Aracruz, Colatina e Cachoeiro,
preparando-nos para as projeções futuras
ga do Porto de Vitória,
para o comércio exterior do estado, que vem
sendo nomeado auditor através de con- crescendo em proporções maiores do que a
José Henrique Mauri - 2008
Autor: David Protti curso público no ano de 1997. Assistente média nacional. Afinal, o novo Aeroporto
Acervo: ALF/VIT
da Inspetoria anterior, Mauri foi o segundo Internacional de Vitória e o porto de Barra
do Riacho já são obras definidas e prioritá-
capixaba dessa fase atual da Instituição a assumi-
rias para o estado e para o próprio Brasil.226
la, conduzindo sua nomeação para dois pontos
importantes: a valorização do quadro técnico e a Nesse ponto, o inspetor-chefe toca na necessidade
posição de que santo de casa também faz milagre. de revisar a própria nomenclatura da Alfândega de
Vitória:
Em seu discurso de posse, ocorrida em 19 de mar-
Aliás, quem sabe, talvez já estejamos no mo-
ço de 2007, o novo inspetor-chefe destacou os se-
mento de pensar numa nova denominação
guintes objetivos de sua gestão que, segundo ele, para nossa Casa, adequando-a à nova realida-
terá duração de três anos: de de sua atuação com o nome de ALFÂN-
DEGA DO ESPÍRITO SANTO, tendo em
Diante de tanto desenvolvimento e de tantas
vista que a atual denominação provoca con-
demandas na área do controle alfandegário,
flito de entendimento de sua projeção em
precisamos, com urgência, a Alfândega jun-
todo o Estado, aos olhos de terceiros, inclu-
tamente com a DIREP, de uma nova sede.
sive das demais Unidades da SRF espalhados
Não se busca luxo ou ostentação. O nosso
pelo Brasil afora.227
objetivo é assegurar a todos desta Casa um
local com melhores condições de trabalho e, E conclui, articulando a questão da nova sede com
conseqüentemente, oferecer à nossa clientela
os propósitos da Alfândega:
um espaço mais apropriado. Mas, acima de
tudo, a nova sede é necessária para que pos- A efetividade destas medidas de controle,
samos garantir o pleno exercício das nossas que resultam em maior segurança para a
atribuições de controlar o comércio exterior sociedade como um todo, depende de uma
A Serventia da Casa

com segurança e agilidade, com o uso de


equipamentos como lanchas rápidas e heli- 225
MAURI, José Henrique. Discurso de posse como Inspetor da Alfândega da
cópteros, capazes de assegurar a fiscalização Receita Federal do Brasil no Porto de Vitória, em 19 de março de 2007, p. 11.
Acervo Alfândega/Vitória-ES.
de navios ainda em alto mar, coibindo prá- 226
MAURI, José Henrique. Discurso de posse... p. 10-11.
ticas como o descaminho e o contrabando, 227
MAURI, José Henrique. Discurso de posse..., p. 11.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 146
Estocagem de produtos importados em porto seco – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

sede bem apropriada e estrategicamente lo-


calizada.
Por isso reiteramos os nossos pedidos ao go-
verno do Estado e aos ilustres prefeitos de
Vitória e de Vila Velha, principalmente, para
que nos ajudem no alcance desta meta.228
Com efeito, Mauri assumiu a Inspetoria em uma
conjuntura que combina três desafios contempo-
râneos do comércio internacional capixaba: seu
crescimento contínuo e sustentado, o apagão logístico
e a demanda de infra-estrutura para petróleo e gás
natural no estado. Desembaraço de mercadorias importadas no Aeroporto de Vitória - 2008
Autor: David Protti. Acervo:ALF/VIT
Em primeiro lugar, os números apontavam, em
março de 2007, para novo recorde de movimenta-
A Serventia da Casa

ção nos portos do Espírito Santo. Somente o Porto


de Vitória movimentou entre janeiro e novembro

228
MAURI, José Henrique. Discurso de posse..., p. 11-12.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 147
Vista do Porto de Vitória e Avenida Beira Mar - 2008. David Protti

de 2006, 7.234.494,631 toneladas de cargas, um vo- ocupação com o futuro do comércio exterior no
lume 5,82% maior que o mesmo período de 2005. estado. Preocupada com a qualidade desse cresci-
Cresceram, principalmente, as movimentações de mento, a Alfândega, desde a gestão de Fregonazzi
ferro gusa, mármores, granitos, trigo, produtos si- vem procurando debater o que se pode chamar
derúrgicos, tubos flexíveis e a grande novidade nos de apagão logístico nesse setor tão importante para
portos capixabas, o álcool.229 o Espírito Santo. Várias autoridades e analistas do
Durante a realização da Feira de Logística, Trans- segmento já se pronunciaram sobre a possibilidade
porte e Comércio Exterior (Expoportos 2007), do apagão. Um dos primeiros foi o ex-inspetor João
em novembro último, o incremento do comércio Luiz Fregonazzi, que procurou sintetizar o assun-
marítimo capixaba ficou estampado nos stands das to:
empresas participantes. O Caderno Especial sobre Veja bem, no Espírito Santo o crescimento
das importações veio bem a reboque do
a feira, publicado em A Tribuna, de Vitória, trou-
Fundap, que permitiu uma equiparação de
xe algumas manchetes e matérias a respeito desse custo, porque nós temos... A carga pra vir pro
crescimento: “Uma evolução que projeta o Espírito Estado hoje ela leva mais tempo, ainda tem
Santo”; “Exportação e inserção internacional – se- um percurso a ser feito, não é? Transporte
até os grandes centros consumidores; isso o
gundo dados do Ministério do Desenvolvimento,
frete. Ou seja, a carga prá vir pro estado e
o complexo portuário capixaba ocupa o primeiro ir pro grande centro, ela é mais cara do que
lugar no volume de exportações no País”; “Posição se ela fosse prá Santos, por exemplo, não
estratégica atrai distribuidores”; “Mercado tem de- é? Como é que você compensa isso? Você
compensa isso com incentivo. Foi o que
manda por profissionais”.230
foi feito. Só que esse diferencial hoje, ele
Em segundo lugar e a par desse crescimento nos não é assim tão intenso quanto era porque
índices e investimentos no setor, surge uma pre- a gente tem outros estados com o mesmo
A Serventia da Casa

tipo de incentivo. O resultado disso é que o


crescimento hoje não é tão grande quanto
há cinco anos atrás que a gente vinha com
“Porto de Vitória bate recorde em 2006”. A Gazeta, Vitória, 5 de janeiro de
229

2007, p. 19. 30%; hoje a gente deve estar na faixa de 10%


Caderno Especial Expoportos 2007. A Tribuna, Vitória, 09 de outubro de
230
de crescimento e olhe lá, talvez menos que
2007, 20 p.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 148
Atendimento no NOA/Cais Comercial. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

isso. Bom, e mais, (...) você não tem uma Prá você conseguir ser de fato um player no
ferrovia eficiente prá esses grandes centros comércio internacional, numa situação onde
consumidores ou produtores. Você tem a variável incentivo fiscal não exista ou seja
rodovias em estado precário.231 bem diminuta, você precisa compensar com
logística.232
E continua na sua análise do problema:
Fregonazzi traça um quadro da situação do Espí-
(...) É complicado. Ferrovia é mais ainda rito Santo:
complicado (...) E somando a isso você tem
um porto que ele não recebe grandes navios, E o que a gente vê é que nos últimos 10 anos
ou seja, a carga passa antes por Santos, prá nós não tivemos um aporte de recursos, nem
vir prá cá, prá depois ir prá São Paulo e Rio grandes construções nessa área no Espírito
de Janeiro. Lógico que isso está ocorrendo Santo. Tanto em rodovia quanto em ferrovia,
porque existe um mecanismo que compensa quanto aeroporto, quanto porto. Nós não ti-
esse custo. A hora que esse mecanismo for vemos isso nos últimos 10 anos. E a gente
retirado, a tendência é esse volume de cargas vem falando isso nos últimos 10 anos, que
A Serventia da Casa

que a gente tem por aqui é diminuir, e dimi- há uma necessidade de se fazer isso, de se
nuir drasticamente. Essa é uma visão lógica. pensar nisso. Nós precisamos de um gran-
de porto. Aeroporto, finalmente está sain-

231
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... 232
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 149
José Henrique Mauri também expõe sua preocupa-
ção com o cenário futuro do comércio internacio-
nal no Espírito Santo:
Esse gargalo, ele não é de hoje. (...) O ápice
do gargalo ocorreu em 2002, depois em
2004, e estivemos próximos a um colapso aí.
Infelizmente isso é uma situação estrutural
que poderíamos ter vários culpados, mas eu
digo que a estrutura, hoje, ela está desenhada
para um porto conteineiro, no estado, que
não comporta grandes conteineiros. Então,
nós já temos aí um limitador. Esse único
porto que está aparelhado, ele não tem
condições de dar vazão ao fluxo de demanda,
de entrada e de saída de contêineres. É um
outro grande gargalo. Isso foi evoluindo em
função, se de inércia ou não, mas de um não
NOA instalado em porto seco - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
acompanhamento da infra-estrutura. Da
infra-estrutura, seja portuária, rodoportuária,
do, mas nós ainda não temos uma ferrovia. rodoferroviária, acompanhando o crescimento
Estão dizendo que vai sair. Ótimo. Nós não dessa estrutura.235
temos rodovias ainda. Estão dizendo que vai
sair – tudo tá na promessa. E o projeto do Vale aqui ressaltar que desde sua posse Mauri e sua
governo do Estado, de Barra do Riacho, é equipe têm se empenhado em debater a questão
um projeto que nasce morto. É um projeto nos foros competentes e pela imprensa, demons-
morto. Não serve prá carga geral. Teria que
trando que sua preocupação não é apenas com
ser pensada uma outra solução (...) As me-
lhores soluções: ou Samarco, ou Tubarão (...) a função arrecadatória da Alfândega, mas com o
Que é onde você tem águas profundas.233 cenário econômico e político na qual ela está en-
E aponta dados realmente preocupantes: volvida e presta serviços: o comércio internacional
capixaba. Para o atual chefe do Serviço de Orien-
Então hoje, nós estamos nos aproximando
cada vez mais de um impasse. Um impasse tação e Análise Tributária (Seort) da Alfândega e
logístico, não é? Porque um apagão logístico, ex-chefe dos setores de exportação e de importa-
se você for, vamos dizer, fazer uma análise ção da Instituição, Luciano Zamilute Teixeira, em
muito crítica e muito rigorosa, ele já existe. A
sintonia com Fregonazzi e Mauri, os problemas e
partir do momento que você vê exportador
nacional levando carga prá outros portos, é soluções residem na seguinte questão:
porque você está sofrendo já com a inefici- Parece que o grande problema do estado é
ência dos portos. Você vê carga de granito um porto (...) para carga geral com calado
capixaba, saindo (...) pelo Rio de Janeiro, até suficiente prá receber as embarcações de
por Santos. Você vê exportadores de café grande porte que hoje predominam no co-
A Serventia da Casa

indo pro Rio de Janeiro.234 mércio marítimo internacional. Parece que o


Porto de Vitória, pelas dificuldades naturais

233
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida...
234
FREGONAZZI, João Luiz. Entrevista concedida... 235
MAURI, José Henrique. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 150
Manobras de atracação na baía de Vitória – 2008. Autor/acervo: David Protti

de um porto de baía, uma baía natural, so- O terceiro desafio para a gestão atual é a prepara-
fre fortes restrições quanto ao seu calado, ao ção da Alfândega para o crescimento das atividades
seu balizamento, que impedem a entrada de
aduaneiras no tocante à exploração de petróleo e
navios de grande porte e que esses navios
menores que adentram o porto acabam one- gás no estado. Os terminais portuários que aten-
rando o custo do transporte. Levam menos dem à demanda desse setor vêm apresentando um
carga, o custo sobe, o custo proporcional de constante crescimento da movimentação de em-
cada contêiner. (...) Já ouvi que existem algu-
barcações.237 Aduaneira especialista no tema, Ânge-
mas tentativas. A solução é criar um porto
com calado maior, talvez no norte. Portocel, la Christina Orofino Souto, da Divisão de Controle
ampliar Portocel – existe projeto já; (...) Ubu Aduaneiro da 7ª Região Fiscal (DIANA), indica a
já se cogitou, também até houve [estudos] necessidade da Alfândega de Vitória se preparar
no complexo de Praia Mole. Repito o que
para o aumento dessa atividade:
eu ouço das autoridades no assunto: o maior
problema (...) hoje nessa área é um porto (...) eu acho que é mais uma oportunidade da
para operação de contêineres de carga geral, Alfândega do Porto de Vitória crescer: é a
A Serventia da Casa

de grande calado, que possibilite a chegada entrada da Alfândega na parte de importação


desses navios de grande porte.236 de insumos e materiais para atender à indús-

“Indústria do petróleo eleva em 11% o movimento de navios”. A


237

236
TEIXEIRA, Luciano Zamilute. Entrevista concedida... Gazeta,Vitória, 19 de março de 2007, p. 14.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 151
Tráfego pesado em trecho da Rodovia do Contorno de Vitória - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

tria energética de petróleo e gás que está co- tes e com os intervenientes no comércio exterior
meçando a se desenvolver muito no estado. capixaba:
(...) Então, eu acho que é uma oportunidade
(...) Vitória teve oportunidade em 92 com os (...) essa responsabilidade não é só dos go-
automóveis, está tendo outra oportunidade vernos, é de cada um de nós (...) É, principal-
agora de crescer. (...) Então, está na hora de mente, das empresas nacionais e multinacio-
entender que vocês têm muito potencial. E nais, que visam o lucro máximo a qualquer
esse potencial está brotando nessa área de custo. Felizmente, grande parte das empresas
energia.238 petrolíferas já despertou para essa realidade,
investindo vultosas quantias no controle de
Por outro lado, um dos maiores especialistas na- qualidade de seus equipamentos e mão-de-
cionais em regime aduaneiro especial ligado à ex- obra e em ações preventivas para evitar aci-
dentes que possam causar danos à natureza.
ploração de petróleo e gás (Repetro), o atual ins-
Mesmo assim, por vezes, somos surpreendi-
petor-substituto da Alfândega do Porto de Vitória, dos por desastres, como derramamento de
Alexandre Barreto de Souza, aponta para a respon- óleo, causando prejuízos inimagináveis à flo-
sabilidade ambiental envolvida no assunto que, de ra e à fauna.239
A Serventia da Casa

fato, deve ser uma das preocupações da Aduana Esses três pontos, aliados aos objetivos expostos
capixaba ao tratar do tema com os órgãos anuen-

SOUZA, Alexandre Barreto de. Repetro sem mistérios. São Paulo: Edições
239

238
SOUTO, Ângela Christina Pinto Coelho Orofino. Entrevista concedida... Aduaneiras/Lex Editora, 2005, p. 11-12.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 152
no discurso de posse do inspetor, formam o bojo
das ações futuras da Alfândega do Porto de Vitória,
enquanto interlocutora privilegiada do comércio
exterior capixaba e concentram, em conjunto com
as ações do NUREP-ES e instalação do SISCO-
MEX Carga, seu papel no futuro desse segmento
fundamental para a sociedade do Espírito Santo. O
NUREP-ES, por exemplo, somente durante o ano
de 2007 lavrou mais de 50 autos de infrações, en-
volvendo contrabando, descaminho e interposição
fraudulenta e chegou a somar um total anual de R$
42.068.001,82.240
Já em fevereiro de 2008, em um trabalho conjunto
Fiscalização de suprimentos de bordo. 2008
da Alfândega do Porto de Vitória, do NUREP-ES, Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

do Ministério Público do Estado do Espírito Santo


e da Delegacia da Receita Federal (DRF-ES), foi
desbaratada uma quadrilha que agia no Espírito
Santo, Bahia e Paraná, através da Operação Lixei-
ra.241 O objetivo dessa megaoperação foi investi-
gar graves ilícitos na importação e venda de pneu-
máticos usados no país. Conforme a legislação
aduaneira,242 a Alfândega, na sua alçada, só pode
liberar a importação desses produtos mediante de-
cisão judicial liminar em que o importador se com-
prometa a remoldá-los. As investigações mostraram
que os importadores não cumpriam o compromis-
so de remoldar os pneus e os revendiam no mercado
interno como pneus usados.
Os números da Operação Lixeira são alarmantes.
Em quatorze anos, de 1990 a 2004, mais de 34 mi-
lhões de pneus usados foram importados da Europa
Congestionamento de contêineres no TVV - 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
Dado do Setor de Mercadorias Apreendidas (SETMAP) da Alfândega da
240

Receita Federal do Brasil no Porto de Vitória, disponibilizado em 14 de abril de


2008.
A Serventia da Casa

241
“Operação Lixeira: em 14 anos empresas com filiais no Espírito Santo impor-
taram 34 milhões de pneus usados”, texto disponível no endereço eletrônico
http://www.gazetaonline.globo.com/noticias/minutoaminuto/local.php [captu-
rado em 21 de fevereiro de 2008].
242
Portaria Secex/MDIC nº 8, de 25 de setembro de 2000. Ver também o texto
elucidativo de: ANDRADE, Pedro Gustavo Gomes de. A guerra dos pneus: os
casos brasileiros no Mercosul e na OMC. Disponível em http://www.cedin.com.
br/revistaeletronica/artigos/.pdf [capturado em 27 de fevereiro de 2008].

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 153
para o Brasil, sob a condição de serem remoldados.
Estima-se que somente o Estado do Espírito Santo
acumulou um prejuízo de R$ 15 milhões. A maio-
ria do material entrava no país a partir do porto de
Vitória, onde em 20 de fevereiro foram apreendi-
dos 30 mil pneus, computadores e documentos em
duas filiais de empresas com sede na Bahia e no Pa-
raná. Segundo a então procuradora-geral do MPE-
ES, Catarina Ceccin Gazele, “esta importação de
pneus usados como se fosse para recauchutagem
e vendidos no estado em que chegam da Europa
é tornar o nosso país uma lixeira européia”.243 Os Desembarque de bentonita no porto de Praia Mole - 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
acusados respondem pelos seguintes crimes: des-
respeito às decisões judiciais (liminares expedidas),
prejuízo à indústria nacional, prejuízo e danos à so-
ciedade (devido às diferentes condições climáticas
européias, o uso dos pneus sem remoldagem podem
causar danos nos asfaltos, veículos e acidentes),
crime ambiental e diversos crimes fiscais (emissão
de notas fiscais com dados inverídicos, remessas
ilegais de divisas ao exterior, subfaturamento nas
declarações de Importação e negociação das licen-
ças de importação adquiridas).
Em abril de 2008, a partir de esforços conjuntos
da Alfândega, do NUREP-ES e da Polícia Fede-
ral também foi desmantelada, através da Operação
Titanic, uma quadrilha de fraudadores que atuava
em pelo menos quatro estados da Federação adul-
terando as declarações de Importação de carros
de luxo desembarcados pelo terminal de Peiú, em
Vila Velha. Nessa Operação, vinte e uma pessoas
foram presas em três estados, acusadas de partici-
parem de um esquema de sonegação fiscal, tráfico
de influência, corrupção de servidores públicos,
A Serventia da Casa

243
“Operação Lixeira: em 14 anos empresas com filiais no Espírito Santo impor-
taram 34 milhões de pneus usados”, texto disponível no endereço eletrônico Desembarque de fertilizantes no Terminal de Peiú – 2008
http://www.gazetaonline.globo.com/noticias/minutoaminuto/local.php [captu-
rado em 21 de fevereiro de 2008].
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 155
descaminho, lavagem de bens e capitais, entre ou-
tros crimes, que resultou em prejuízo de cerca de
R$ 7 milhões aos cofres públicos, somente no ano
de 2007. De acordo com as investigações, os sone-
gadores importavam carros de luxo (Lamborghini,
Ferrari, Porsche etc.), motocicletas, produtos ele-
troeletrônicos e até aeronaves de países como os
Estados Unidos, Canadá e Alemanha com valores
subfaturados em cerca de 40% do real.244
Dessa maneira, vem se cumprindo a promessa de
José Henrique Mauri, que ao assumir declarou guerra
ao uso de laranjas nas atividades de importação e de
exportação pelo estado:
A principal [meta] é o combate à interposi-
ção, ou seja, o uso de laranjas nas operações
NOA instalado em porto seco - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
alfandegárias. Quando você oculta alguém,
está ocultando porque quer levar algum be-
nefício. Esse benefício que você quer levar
pode trazer um prejuízo econômico para o seus artigos 24, 30, 38, 39, 40 e 52.246
Estado, numa concorrência desleal. O em-
presariado tem que entender que não é esse o Seus objetivos, de controle e agilidade do comér-
caminho. E aí temos que atuar pesado (...)245 cio exterior brasileiro, podem ser assim sintetiza-
Além disso, está em fase de implantação o dos: controle das viagens das embarcações no país,
SISCOMEX Carga, um novo sistema da da primeira atracação até a última desatracação;
Receita Federal de controle da movimentação controle da carga aquaviária de importação (da
de embarcações, cargas e contêineres vazios manifestação até a entrega ao importador); de ex-
transportados na via marítima e entre portos portação (do embarque até a saída da embarcação
brasileiros, cujo acesso não demandará nenhuma do país); ou de passagem (da entrada até a saída
instalação de software específico, pois será acessado do país) e possibilitar a análise de carga através da
através da internet (web). Esse sistema viabilizará consulta dos dados informatizados ou, se for o
a substituição de documentos impressos por caso, da interrupção do fluxo de carga, mediante
documentos eletrônicos para fins de cumprimento bloqueios.247
de obrigações previstas na legislação aduaneira, As dificuldades, dessa forma, podem acontecer
principalmente no Regulamento Aduaneiro, nos quando menos se espera. E as autoridades alfan-
degárias devem estar preparadas para assimilá-las e
A Serventia da Casa

244
“Luxo, fraude e corrupção”, A Gazeta, Vitória, 8 de abril de 2008, p. 13-14;
“Aeronaves apreendidas em operação Titanic custavam R$ 8 milhões, mas
quadrilha declarava apenas R$ 3 milhões”, disponível no endereço eletrônico
http://www.gazetaonline.globo.com/apps/index.php [capturado em 8 de abril 246
O Regulamento Aduaneiro está consubstanciado através do Decreto nº
de 2008; “Presos acusados de corrupção”, A Tribuna, Vitória, 8 de abril de 4.543/02, de 26 de dezembro de 2002.
2008, p. 2-4. 247
MINISTÉRIO DA FAZENDA/RECEITA FEDERAL DO BRASIL. Siscomex Carga/
“Inspetor da Alfândega promete rigor na punição de empresários”.A
245
Sistema Mercante: manual dos importadores, exportadores e despachantes
Gazeta,Vitória, 8 de abril de 2007, p. 22. aduaneiros. Brasília: ESAF/RFB, 2008, p. 3.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 157
Carregamento de grãos no porto de Tubarão - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

dar resposta a contento, mesmo quando não forem nicos, motocicletas, cosméticos e alimentos, entre
os responsáveis diretos por elas. Em 6 de março outros) no mercado de vários estados brasileiros.
de 2008, um grande incêndio atingiu uma área de A Alfândega atuou prontamente, providenciando
vinte e quatro mil metros quadrados de três arma- a absorção de novas mercadorias para outros re-
zéns do porto seco Vitória I (Rodovia do Contorno, cintos, apesar dos transtornos, colaborando dessa
município de Cariacica) pertencente desde o final forma não somente com o comércio exterior do
de 2007 à empresa Tegma Gestão Logística – com estado, mas também com os consumidores e con-
participação acionária da empresa Coimex Logís- tribuintes brasileiros.
tica Integrada.248 Imediatamente, um problema se Nas palavras de José Henrique Mauri transparece
pôs: a possível dificuldade de entrada de algumas essa compreensão de que a Alfândega é um elo de
mercadorias importadas pelos portos capixabas união do comércio exterior no estado:
devido à paralisação temporária nas armazenagens
(...) A Alfândega, ela tem realmente um papel
do porto seco – o maior do país , causando o de-
A Serventia da Casa

importante no desenvolvimento do comércio


sabastecimento dessas mercadorias (microeletrô- exterior de uma determinada região. (...)
Todos os fatos que acontecem nos portos, (...)
248
“Incêndio destrói importados”, A Tribuna, Vitória, 7 de março de 2008, p. 2
[tudo] vem para ser resolvido na Alfândega,
e; “Fogo prejudica a oferta de importados”, A Tribuna, Vitória, 7 de março de porque a Alfândega está enxergando todos os
2008, p. 4.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 158
elos, desde o transportador chegando com a a definição com a municipalidade da capital de área
carga, até o importador querendo levar a carga onde será construída uma sede condizente com a
prá casa. Todos os intervenientes convergem
expansão das atividades aduaneiras no estado, e
prá Alfândega, buscando soluções ou sendo
intimados pela Alfândega prá esclarecer que abrigue a logística necessária ao crescimento
porque o fluxo não está acontecendo. Então, da Instituição. Em suma, a Alfândega da Receita
mesmo que não seja de competência da Federal do Brasil do Porto de Vitória caminha de
Alfândega, ela é provocada prá participar do
acordo com sua missão institucional de controlar o
processo.249
comércio exterior com segurança, eficiência e agi-
Portanto, desde a sua recriação, 15 anos atrás, a Al- lidade.
fândega pauta suas atuações pela credibilidade na
interlocução com os demais intervenientes do co-
mércio internacional, pela eficiência no atendimen-
to do empresariado, pela valorização do seu corpo
técnico e, ainda, pelo rigor no combate ao ilícito.
Por fim, a inspetoria tem mantido entendimentos
com o prefeito de Vitória, João Carlos Coser, para

249
MAURI, José Henrique. Entrevista concedida... Plataforma de petróleo na baía de Vitória. 2008. David Protti. ALF/VIT

A Serventia da Casa

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 159
A Serventia da Casa

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 160
A Serventia da Casa

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 161
Desafios
Contemporâneos
da Alfândega no Espírito Santo

A paz, o desenvolvimento e a proteção am-


biental são interdependentes e indivisíveis.

P
(Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento).

rover o Estado de recursos para garantir o bem-estar social; prestar serviços


de excelência à sociedade; prover segurança, confiança e facilitação para o co-
mércio internacional. São essas as premissas que formam a missão da Receita
Federal do Brasil. Sua visão de futuro consiste em ser uma organização modelo
de excelência em gestão, procurando ser referência nacional e internacional em
administração tributária e aduaneira. Para tanto tem como valores principais o
respeito ao cidadão, a integridade, a lealdade com a instituição, a legalidade e o
profissionalismo.250
Em 40 anos de existência, a Receita Federal do Brasil participou ativamente das
mudanças econômicas por que passou o país. E foram muitas desde o chamado
milagre econômico, no início da década de 1970, a moratória do início da década
seguinte, até a estabilização monetária proporcionada pelo Plano Real, em me-
A Serventia da Casa

ados dos anos 1990. Além disso, houve inúmeros planos econômicos, os famo-
sos pacotes e troca de moedas, a que a Receita Federal teve de se adaptar.

250
No endereço eletrônico http://www.receita.fazenda.gov.br/Instituicao/Instituicao.htm estão disponíveis todas as infor-
mações acerca da estrutura institucional, dos serviços prestados e da legislação da RFB.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 163
Atendimento público no NOA/Tubarão - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

Contudo, uma grande mudança qualitativa – entre Em depoimento para este trabalho, César Augusto
várias – por que passou a instituição está, sem dú- Barbiero, superintendente da 7ª Região Fiscal, que
vida, na valorização do seu quadro de servidores. compreende os estados do Espírito Santo e Rio de
É o que se pode chamar de valorização técnica. Ou Janeiro, demonstra bem esta busca de oferecer me-
seja, a partir dos anos 1990, a ingerência política lhores serviços da Receita Federal:
tão comum nas administrações públicas no Brasil (...) Há, já há muitos anos, quase duas déca-
foi diminuída, pois para “prover o Estado de recur- das, um direcionamento técnico para a Re-
sos para garantir o bem-estar social”, foi necessário ceita Federal. E uma blindagem política, a
não interferência política, seja na nomeação
auferir qualidade técnica à instituição RFB e valori- de cargos, seja na condução dos trabalhos.
zar os servidores de carreira que há tantos anos co- Há uma efetiva gestão por resultados. Algo
nhecem a sua estrutura, seu funcionamento e suas que se aproxima muito da iniciativa privada.
dificuldades e detêm o conhecimento amplo da sua De cunho eminentemente técnico, para que
se devolva à sociedade e ao governo, duas
complexa legislação. E mais importante, a Receita coisas: à sociedade, uma excelência no servi-
Federal do Brasil não está a serviço de ideologia ço prestado; ao governo, os recursos neces-
A Serventia da Casa

nem de siglas partidárias. Seu compromisso é com sários para implementar suas políticas.251
o país e com os cidadãos. Valorizar o servidor de
carreira é dar identidade e cultura organizacional à
251
BARBIERO César Augusto. Entrevista concedida...
Receita Federal do Brasil.

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 164
As palavras do superintendente exprimem este
pressuposto básico da oferta de serviços de boa
qualidade: o intercâmbio entre os atores envolvi-
dos no processo. Da presidência da República às
unidades locais da RFB (delegacias, inspetorias,
alfândegas e agências), passando pelo Ministério
da Fazenda, pelo gabinete do secretário, pelas co-
ordenações, superintendências e delegacias de Jul-
gamento, o discurso deve ser uníssono, com claro
entendimento dos objetivos do órgão: dinamizar a
administração tributária maximizando a utilização
de seus recursos humanos e materiais; apresentar
a administração tributária como representação úni-
Expediente interno e atendimento público da Alfândega de Vitória (Sapea) - 2008
ca frente ao contribuinte e agir com critérios cla- Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
ros e eficientes na tomada de decisões. Impõe-se,
dessa forma, uma política competente de descen-
tralização e autonomia dos órgãos locais de ponta
(lembrando que a RFB está presente em todo o
território nacional, o que compreende 8,5 milhões
de quilômetros quadrados). Daí a importância da
valorização do servidor de carreira na extensa es-
trutura da Instituição.
Cultura organizacional: aí reside a grande mudança
da RFB. Isso implica em diálogo permanente, não
somente no âmbito interno mas, sobretudo, com
outras esferas públicas de atuação conjunta e com
o cidadão brasileiro. Essa nova cultura está bem
explícita nas atitudes de seus dirigentes. A busca
de uma identidade, do reconhecimento do público
como um órgão facilitador e não punitivo é, sem
dúvida, a marca atual da Instituição. Fiscalização de mercadorias importadas no Aeroporto de Vitória - 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
O trabalho interativo permanente ocorre também
com outros órgãos que trabalham em parceria com
a Receita. A logística da informação é hoje um dos
A Serventia da Casa

pilares para o sucesso de serviços e ações execu-


tados pela RFB. O contrário, a retenção de infor-
mações, propicia o que o pensador francês Michel

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 165
Foucault chamou de “microfísica do poder”,252 ou
seja, favorece a um ou a outro, mas nunca a toda
a Instituição e, conseqüentemente, aos cidadãos
brasileiros. A busca de uma nova identidade or-
ganizacional define-se pela superação de práticas
enraizadas na gestão pública brasileira: a retenção
de informações; ambientes inseguros de trabalho,
desconfiança, perseguição e emprego de pessoas
sem competência para cargos de importância po-
lítica e econômica.
Falando da necessidade de somar esforços e rom-
per atitudes isolacionistas dos órgãos públicos,
Barbiero ressalta que
Expediente interno da Alfândega de Vitória (Serpro) - 2008 (...) O que está por trás disso é a sociedade
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
brasileira. Ou seja, para a sociedade não in-
teressa quem vai fazer. É o Estado que tem
que fazer. Mas o Estado tem vários entes.
Então, necessariamente esses entes têm que
agir em conjunto. E esse é o grande proble-
ma do Brasil. Nós somos um Estado mui-
to desorganizado e egóico dentro de nossas
estruturas. Normalmente olhamos para o
próprio umbigo. E não olhamos para a so-
ciedade.253
É essa a filosofia que vem marcando a atual fase
da 7ª Região Fiscal. Um envolvimento permanente
entre as 39 unidades descentralizadas que a com-
põem – inclusas aí as Alfândegas do Porto de Vitó-
ria, do Porto do Rio de Janeiro, do Porto de Itaguaí
e do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro –,
somando esforços para encurtar a distância com os
demais órgãos públicos que são parceiros no coti-
diano dos trabalhos. O superintendente comemora
Embarcação da Polícia Federal na baía de Vitória - 2008
Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
um aumento de 835% nas apreensões de ilícitos,
comparando 2007 a 2003, quando assumiu:
A Serventia da Casa

O que mudou? A equipe é praticamente a


mesma. (...) Nós temos mais equipamentos,

252
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1984, 174 p.
253
BARBIERO César Augusto. Entrevista concedida...

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 166
Cena cotidiana da Praia da Costa, Vila Velha. 2007. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

compramos veículos, compramos motos, tura em primeiro lugar.254


treinamos bastante, as equipes estão mais mo-
tivadas. E, principalmente, estamos trocando Ao referir-se à criação do NUREP-ES, César Bar-
mais informações. Ontem [16.01.2008] eu biero expressa essa preocupação em dotá-lo de
recebi a visita do superintendente da Polícia recursos para que o cidadão seja protegido. Mas
Rodoviária Federal. E ele dizia, vinha com adianta que isso não ocorre sem persistência na su-
esse mesmo discurso: ‘vamos nos ajudar, va-
mos trabalhar juntos, vamos lá’. E eu disse: peração de práticas obsoletas e sem investimento
‘vamos lá, estou querendo isso também’. (...) em equipamento de última geração e qualificação
É o Estado agindo para proteger o próprio dos profissionais:
Estado (...) a população. Os direitos desse
(...) Planejamento básico: equipar e treinar.
Estado. O bem histórico, a nossa fauna, a
Então, eu preciso fornecer ao servidor todo
nossa flora, as nossas relações, a nossa cul-
equipamento necessário prá que ele seja o
tura. Por isso eu digo assim: ‘o agente de Es-
melhor. Eu preciso treiná-lo prá que ele atin-
tado, ele é muito mais que um burocrata de
ja graus de excelência. Tendo uma equipe
plantão’. A fase da burocracia passou. Hoje
A Serventia da Casa

bem equipada, bem treinada e desenvolven-


o Estado é gerido para um fim específico:
do uma estratégia – que aí passa pela obten-
bem-estar social. Temos que chegar nisso.
Como? Grandes desafios. Mudança de cul-
254
BARBIERO César Augusto. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 167
ção da informação, o trato dessa informação,
para se tornar uma inteligência fiscal – aí eu
posso agir com precisão. Isso é filosofia mi-
litar. É filosofia militar aplicada à atividade
aduaneira. E não poderia ser diferente.255
Esse resultado positivo não é sucesso apenas da 7ª
RF. Em entrevista coletiva no dia 13 de fevereiro
de 2008, a secretária-adjunta da RFB, Clecy Lionço,
o coordenador-geral de administração aduaneira
(Coana), Francisco Labriola Neto e o coordenador
especial de Vigilância e Repressão, Mauro de Brito,
anunciaram dois grandes resultados em 2007, fru-
tos do trabalho conjunto desses setores da RFB:
Curso do Siscomex Carga. 2008. Foto: David Protti. Acervo: ALF/VIT em primeiro lugar, as apreensões da Receita atingi-
ram R$ 1,057 bilhão, valor 22% maior do que no
ano de 2006. Os principais produtos apreendidos
foram eletro-eletrônicos (R$ 79 milhões), cigarros
(R$ 77 milhões) e óculos (R$ 73 milhões).256 A meta
para 2008 é aumentar em 1000% as apreensões de
ilícitos em relação a 2003.
Em segundo lugar, o tempo bruto do despacho
aduaneiro diminuiu em 25% em 2007. O controle
feito pela Receita no despacho aduaneiro chegou
a cerca de 3,3 milhões de declarações de Impor-
tação e Exportação. Isso significa que o volume
de negócios ligados ao comércio exterior cresceu
em torno de 20% no ano passado. Esse número
representou um crescimento de 15% na quanti-
dade de declarações de Importação e de 4% nas
declarações de Exportação, num total de mais de
250 mil despachos aduaneiros em relação a 2006.
Curso do Siscomex Carga. 2008. Foto: David Protti. Acervo: ALF/VIT
A agilidade obtida em 2007 fez com que o tempo
gasto no despacho aduaneiro fosse reduzido para
2,5 dias nas operações de importação e 9 horas nas
A Serventia da Casa

de exportação. Cerca de 90% das declarações de

255
BARBIERO César Augusto. Entrevista concedida...
Disponível em http://www.aprovat.org.br/cache [capturado em 27 de março
256

de 2008].

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 168
Curso do Siscomex Carga para servidores da Alfândega. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

Importação foram desembaraçadas em menos de internacional implica maior agilidade nas liberações
um dia. No caso das exportações, 85% das cargas de cargas, porém, faz parte também do processo, a
foram liberadas em menos de 1 hora. Foram ha- vigilância, o respeito às leis vigentes, a sinergia nas
bilitadas 13.878 novas empresas para operar no ações e a garantia de que esse comércio cresça com
comércio exterior, contra 8.290 novas habilitações qualidade e segurança para a sociedade brasileira.
em 2006. O número total de empresas habilitadas Nesse sentido, pode-se dizer que existe hoje na
no SISCOMEX atingiu a marca de 48.455.257 RFB uma nova geração de dirigentes, imbuída do
Portanto, está bem definido que o comércio ex- princípio de prestação de serviços que assegurem
terior no Brasil é um conjunto de ações que vão proteção à sociedade e ao patrimônio do país. Ser-
desde a Receita Federal do Brasil, passando pela viços que passam não somente por ações compe-
Coana, superintendências e alfândegas, que privi- tentes, mas, sobretudo, pela ética, pelo respeito às
legiam não apenas a arrecadação, mas também a normas ambientais nacionais e internacionais e ao
A Serventia da Casa

segurança nessa área. O crescimento do comércio desenvolvimento sustentável do país.


No que respeita à aplicação dessas linhas de tra-
257 Disponível em http://www.aprovat.org.br/cache [capturado em 27 de balho na Alfândega no Espírito Santo, além do
março de 2008].

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 169
Desembarque de máquinas pesadas no terminal de Peiú - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

combate ao ilícito, o trabalho aduaneiro tem se


pautado na compreensão dos principais entraves
entre os fluxos do comércio exterior e a dinâmica
de informação e capacitação dos setores interve-
nientes para reduzir o tempo de desembaraço e,
conseqüentemente, aumentar a competitividade
do complexo portuário do estado. Assim, é possí-
vel constatar que a Alfândega do Porto de Vitória
atuou com objetividade e determinação para ser o
elemento articulador de uma concepção organiza-
cional que parte dos problemas do presente bus-
cando não apenas superá-los, mas antecipar-se em
produzir um planejamento voltado às perspectivas
Atuação do Nurep-ES no complexo de Capuaba - 2007 futuras. Nas palavras do inspetor-chefe Mauri é
Acervo: ALF/VIT
possível perceber esse entendimento:
(..,) a gente consegue enxergar o quanto
A Serventia da Casa

que por vezes o fluxo de importação está


atrapalhando o fluxo da exportação, ou
vice-versa. Então, esse é um papel muito
importante, que deve ser executado com muita
serenidade (...). Esse papel da Alfândega,

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 170
ele foi exercido com muita pertinência,
com muita qualificação por esta Alfândega,
fazendo com que as coisas caminhassem
com todas as dificuldades conhecidas, com
todos os gargalos (...). Então, veja o papel
importante aí que teve: dar velocidade ao
fluxo de mercadoria e esse não é um papel
da Receita Federal.258
E exalta a posição da Alfândega do Porto de Vi-
tória em formular debates para o setor, não se res-
tringindo apenas a seu papel fiscalizador:
A Alfândega daqui do Espírito Santo
foi muito além. Ela realmente provocou
inúmeras discussões, antecipou inúmeros
Unidade K-9 de treinamento de cães farejadores do Nurep-ES - 2006
fatos, participou para as autoridades, (...) Acervo: ALF/VIT
fatos que estavam acontecendo, que viriam
por acontecer, provocando soluções ou pelo
menos provocando discussão em cima do
assunto.259
E ressalta o esforço empreendido:
Muitos foram, realmente, canalizados e
resolvidos, outros continuaram pendentes.
A exemplo da questão da necessidade de
grandes conteineiros, a Alfândega defende
isso desde 2002. Não foi resolvido, mas já é
uma posição acenada. A gente tem condições
de conhecer o fluxo Brasil e saber que alguma
coisa aqui no estado está diferente do que
está no modal nacional. E a Alfândega,
realmente, participou desse processo do
Espírito Santo, desse desenvolvimento e
participou de forma ativa e não de forma
passiva. Não se limitou às suas atribuições
e sim, contribuiu para o estado do Espírito
Santo. Eu falo isso com tranqüilidade porque
eu não estou falando da minha atuação, eu
estou falando da atuação da Unidade e de Carros importados apreendidos na Operação Titanic no terminal de Peiú - 2008
Autor: David Protti
outros que aqui passaram.260 Acervo: ALF/VIT A Serventia da Casa

258
MAURI, José Henrique. Entrevista concedida...
259
MAURI, José Henrique. Entrevista concedida...
260
MAURI, José Henrique. Entrevista concedida...

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 171
As assertivas de Mauri apontam para um debate
acerca do futuro da Aduana capixaba e do comér-
cio exterior no estado, ou seja, a proposição de uma
agenda para o século XXI em que as aspirações
específicas da comunidade aduaneira e dos setores
de comércio exterior da economia capixaba coadu-
nem-se com as linhas mestres da Gestão Integrada da
Cadeia Logística Internacional das aduanas no mun-
do. Nesse sentido, a Alfândega do Porto de Vitória
referencia-se na Estrutura Normativa para a Segu-
rança e a Facilitação do Comércio Internacional da
Organização Mundial das Aduanas (WCO/OMA),
com sede em Bruxelas, definida para:
Liberação alfandegária de aeronave importada, no Aeroporto de Vitória.
2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT Estabelecer normas que garantam a seguran-
ça e a facilitação da cadeia logística em nível
global, a fim de promover certeza e previsi-
bilidade;
Implementar a gestão integrada de cadeias
logísticas para todos os meios de transporte;
Fortalecer o papel, as funções e as capacida-
des das aduanas para responder aos desafios
e aproveitar as oportunidades do século 21;
Fortalecer a cooperação entre as administra-
ções aduaneiras, a fim de melhorar a capaci-
dade de detecção de remessas de alto risco;
Fortalecer a cooperação entre as aduanas e
as empresas; e
Promover a circulação ininterrupta de mer-
cadorias através de cadeias logísticas interna-
cionais seguras.261
Portanto, para que o comércio exterior capixaba,
Atendimento em NOA /Capuaba. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT um dos mais antigos e tradicionais do país, garan-
ta a posição de destaque que hoje conquistou na
economia brasileira, alguns desafios se impõem. O
primeiro deles é associar os interesses de grandes
A Serventia da Casa

complexos empresariais exportadores e impor-


tadores da vasta região sudeste e centro-oeste do

261
Cf. http://www.wcoomd.org e; http://www.receita.fazenda.gov.br/Aduana/
OMA/Default.htm [capturado em 20/02/2008].

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 172
Brasil a uma rede emergente de pequenas e médias
empresas focadas em nichos específicos de consu-
mo em diversos países do mundo que esbarram,
porém, em dificuldades no processo logístico que
podem ser superadas pela atividade organizada dos
consolidadores de carga (NVOCC/armadores sem navio),
para ficar em apenas um dos agentes do setor.262
Ainda que a Alfândega da RFB do Porto de Vitó-
ria já tenha iniciado a capacitação desses consoli-
dadores no SISCOMEX Carga, é necessário ainda
aglutinar seus interesses aos das empresas a fim de
aproveitar o potencial de crescimento da região em
setores tradicionalmente vocacionados tais como Expediente interno da Alfândega de Vitória - 2008
os de bebidas, alimentos, confecções, artesanato, Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

metalurgia, piscicultura e pesca, movelaria, entre


outros. Tais entraves requerem soluções para os
gargalos portuários, acesso ao crédito, credencia-
mento de arranjos intersetoriais de produtores lo-
cais, entre outros.

A Serventia da Casa

Descarga de gases de navio na baía de Vitória - 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

262
NVOCC é a sigla em inglês para Non Vessel Operator Common Carrier.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 173
Ao mesmo tempo, as mobilizações dos governos
estaduais e federal por mudanças na legislação tri-
butária brasileira implicarão na extinção dos benefí-
cios do Sistema Fundap em prazo médio. Dados da
Secretaria de Estado da Fazenda do Espírito Santo
apontam que em 2013 o setor de comércio exte-
rior será afetado com perdas de até R$ 1,2 bilhão
para o Estado e municípios.263 Para além das per-
das tributárias, a mudança prevista implicará ainda
Pesquisa e controle ambiental - 2008
em redução de atratividade do complexo portuário Autor: David Protti. Acervo: David Protti
capixaba já que, em tese, as empresas fundapeanas
estariam propensas a se estabelecerem em outras
praças. Dessa forma, é urgente que o Espírito San-
to esteja dotado, em curto prazo, de um porto de
cargas gerais em águas profundas que represente
a atratividade desejada, bem como a agilidade dos
fluxos aduaneiros e de movimentação de carga –
sobretudo de contêineres, para superar a extinção
do Fundap e revigorar o complexo portuário e a
economia capixaba em sua capilaridade.
Trata-se de uma articulação de alta responsabilida-
de política e de compromisso com o Espírito San-
to que deve envolver a Receita Federal do Brasil
e diversos ministérios do governo da República,
os governos estaduais e municipais presentes no
Pesquisa e conservação de tartarugas-marinhas no Espírito Santo - 2005
complexo portuário capixaba, além da representa- Autor: David Protti. Acervo: David Protti
ção sindical, empresarial e de outros setores repre-
sentativos da sociedade. Sobretudo, a solução está
pendente de iniciativas da bancada federal do Es-
pírito Santo, legítima encarregada de fazer corres-
ponder no campo político o peso econômico que
o estado detém.
O terceiro desafio que se apresenta para o futuro
do comércio internacional brasileiro e capixaba é o
A Serventia da Casa

do controle e da qualidade ambiental relacionadas

263
“Teófilo prevê que, com reforma, Fundap chegará ao fim em 2013”. A Gaze-
ta, Vitória, 11 de março de 2008, p. 17.

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 175
Pintura mural em Vitória. 2007. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

com o cumprimento das regras internacional e das


legislações do Brasil e seus parceiros comerciais.
Essa é uma questão que envolve tanto a produção
local das mercadorias exportadas, que deve obede-
cer regras amplas de conservação do meio ambien-
te desde os licenciamentos ambientais até práticas
convencionadas para manejo da produção agrope-
cuária nas trocas comerciais e o respeito às comu-
nidades tradicionais previstas nas leis ambientais
do Brasil e congêneres do exterior.
Mantendo-se no cumprimento das diretrizes pre-
Morro São Benedito – Vitória – 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT
conizadas pela Organização Mundial das Aduanas
A Serventia da Casa

e incorporadas pela Receita Federal do Brasil, o


compromisso das autoridades aduaneiras relacio-
na-se ainda com a responsabilidade ambiental. A

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

 176
Alfândega da RFB do Porto de Vitória deve estar (como cólera, gripe aviária, vírus Ebola etc.)265 que
atenta aos rebatimentos do incremento assustador afetem as áreas urbanas e os elementos da fauna
da participação de dióxido de carbono (CO2) pro- e da flora brasileira. Além disso, as próprias inter-
veniente da queima de combustível sujo dos mo- venções no ambiente natural para a construção da
tores da frota de navios mercantes sobre o efeito infra-estrutura portuária e logística em geral devem
estufa (responsável pela emissão de 1,12 bilhão de ser objeto de cuidadoso exame - sob a ótica do con-
toneladas/ano, ou seja, cerca de 4,5% do total de trole ambiental - da Alfândega da RFB do Porto de
emissões globais desse gás no mundo) que poderá Vitória quando da definição das áreas alfandegadas
criar embaraços, em curto lapso de tempo, à nave- sob sua jurisdição.
gação comercial.264 Também o tráfico de entorpecentes e de arma-
Deve ainda oferecer contribuição no controle de mento ocupa considerável atenção das autoridades
vazamentos de cargas líquidas, no lançamento da aduaneiras. Tais práticas, vinculadas a um rentável
água de lastros de embarcações e na destinação do mercado ilegal operado pelo crime organizado inter-
lixo de bordo no meio ambiente e manter rigor nacional, têm provocado efeitos deletérios em co-
estrito ante os riscos de proliferação de doenças munidades carentes e favelas das principais cidades
capixabas e colocado a Grande Vitória entre as re-

264
Cf. estudo realizado pela ONU noticiado no jornal britânico The Guardian.
Disponível em http://www.cabonobrasil.com/simplenews.htm?id=384661. Sobre ocorrências de lançamento de água de lastro na baía de Vitória, ver:
265

[Capturado em 18 de fevereiro de 2008]. “O perigo que vem do mar”. A Gazeta, Vitória, 14 de julho de 2002, p. 23.

A Serventia da Casa

Desembarque de produtos importados pelo Aeroporto de Vitória. 2008. Autor: David Protti. Acervo: ALF/VIT

A Alfândega do Porto de Vitória e os rumos do Espírito Santo

 177
incremento das importações verificados nos últi-
mos 15 anos.
É justo reconhecer que o governo federal tem ace-
nado com obras do Programa de Aceleração do
Crescimento (PAC) que podem simbolizar uma luz
no fim do túnel se forem executadas com a rapidez
que o assunto requer e tiverem o prosseguimen-
to garantido nos orçamentos futuros da União.266
Contudo, é de suma importância que o setor de
comércio exterior e os governos estadual e munici-
pais saibam aproveitar as oportunidades advindas
Caminhões-cegonha carregam veículos em Peiú - 2008. Autor: David Protti.
Acervo: ALF/VIT
dos investimentos do PAC, da legislação concer-
nente às parcerias público-privadas, ao crescimen-
to de toda a economia brasileira e, especificamente
no Espírito Santo, da implantação do parque pro-
giões mais violentas do Brasil e do mundo. Nesse
dutivo de petróleo e gás, para induzir investimen-
caso, a eficiência repressiva está intimamente rela-
tos que são necessários para difundir na sociedade,
cionada à incorporação de tecnologias avançadas e
de maneira capilar, os benefícios do crescimento
qualificação e aumento dos quadros profissionais
econômico com desenvolvimento da qualidade de
já que muito desse tráfico é feito fora dos berços
vida da população capixaba.
portuários. Impõe-se, nesse caso e uma vez mais,
uma rediscussão do papel de polícia e uso de arma- Consciente de ter oferecido ao Espírito Santo e ao
mento pela autoridade alfandegária. Brasil dedicados serviços na garantia da soberania,
na defesa do território, na estruturação financeira,
Por fim, resta enfatizar a emergência de uma solu-
na expansão do comércio e da indústria e na pro-
ção orquestrada para o problema do apagão logístico
teção às práticas econômicas lícitas nos diferentes
no Espírito Santo. Estradas insuficientes e mal-con-
momentos dos seus 473 anos de história capixaba,
servadas; desarticulação entre modais rodoviários,
a Alfândega da RFB do Porto de Vitória apresen-
portuários e ferroviários; falta de investimentos em
ta-se para participar da organização de um projeto
obras e dragagem de canais de acesso e bacias de
viável e consistente de fortalecimento social e eco-
flutuação; atraso em licitações. Somam-se a isso os
nômico do estado do Espírito Santo.
problemas não superados provocados pela distância
entre os diversos órgãos anuentes, implicando em Ao contrário de tempos anteriores, em que a
burocracia excessiva associada a uma cultura orga- Instituição e o Espírito Santo estiveram relegados
nizacional deficiente de troca de informações e en- a um plano secundário nas tomadas de decisão
A Serventia da Casa

caminhamento de soluções de larga abrangência e


duração. Está formado o cenário do apagão logístico
266
Cf. BRASIL/PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA/SECRETARIA DE IMPRENSA.
que, no estado do Espírito Santo também associa- Entrevista exclusiva, concedida por escrito, pelo presidente da República, Luiz
Inácio Lula da Silva, ao jornal A Tribuna, Vitória, 28 de novembro de 2007, 4 p.
se ao crescimento das atividades produtivas e ao Disponível no endereço eletrônico http://www.info.planalto.gov.br/download/
Entrevistas/tribuna.doc [capturado em 22 de janeiro de 2008].

Luiz Cláudio Ribeiro | David Protti | Nicélio Barros

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do Brasil, o cenário que hoje se configura para a e sua imagem institucional no Espírito Santo. A
Alfândega é de um ambiente democrático com Alfândega não é apenas um órgão arrecadador ou
perspectivas de crescimento econômico no comércio fiscalizador de mercadorias. Sua responsabilidade
exterior e reflexos positivos para a sociedade local. estende-se com a superação de suas próprias
Contudo, impõe-se que tal crescimento seja pautado deficiências. Ao resgatar seu passado e abrir-se à
no respeito às leis, em princípios éticos e de justiça critica do presente a Alfândega empenha-se no
social, na sustentabilidade socioambiental. compromisso de ajustar-se permanentemente para
É assim que a Alfândega da RFB do Porto de Vitória participar do ideal de construir uma sociedade
deseja construir os pilares da atuação de seu pessoal democrática e segura para todos os brasileiros.

A Serventia da Casa

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imagens
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• Acervo Ronaldo Loureiro:
Imagens
Leis, portarias, comunicações internas, relatórios da DIVCAD-ES e
• Acervo Associação de Permissionários de Regimes Aduaneiros do imagens
Espírito Santo (APRA):
• Acervo Sindicato do Comércio de Exportação e Importação do
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Dados estatísticos e convênios.
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imagens
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PMV):
Carlos Henrique da Silva Xavier
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João Carlos Santacruz Lima
Livros, dissertações, obras raras e imagens João Luiz Fregonazzi
• Acervo Companhia Docas do Espírito Santo – Autoridade José Alfredo Cabral
Portuária (Codesa): José Henrique Mauri
Luciano Zamilute Teixeira
Imagens e Relatórios Marcos de Menezes Tovar
• Acervo David Protti Moacyr Bonelli
Paulo de Jesus Mattos Cortez
Imagens e Livros Paulo Antonio Licks Flores
• Acervo Edna Brandão Monteiro: Renato Mendes Souza Santos
Roberto de Almeida
Portarias, processos, jornais e revistas de Vitória Ronaldo Loureiro
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Walter Sanches Sanches Junior
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