Atividade | Crítica do filme Um Tiro na Noite (1981) Docente: Julio Bezerra Discente: Gabriel Monteiro
Como admirador sem embaraço do Cinema, naturalmente reconheço e
aprecio as cafonices mais bregas que apenas esta linguagem é capaz de proporcionar. No entanto, é bem verdade que o empilhamento desenfreado de técnicas e elementos fílmicos que Brian de Palma é conhecido por praticar com certeza me afastou de sua filmografia e resumiu minha experiência aos seus títulos mais conhecidos. Por isso, antes de permitir que o jovem John Travolta de Um Tiro na Noite adentrasse a sala de casa, precisei realizar o esforço de despir-me de todos preconceitos que cultivava em relação às peripécias estilísticas do Sr. de Palma — que aqui beberica da fonte de onde Antonioni tirou Blow-Up (1966) para estruturar seu próprio enredo. Jack Terry trabalha como engenheiro de som em uma pequena produtora de filmes. Certa noite, durante uma despretensiosa captação à beira do rio, ele testemunha um acidente de carro e imediatamente se lança para dentro d'água, salvando Sally sem grandes prejuízos. Enquanto isso, ao fundo surge um homem misterioso, que sai de baixo da ponte portando uma câmera e anuncia que a partir dali, tudo é suspeito e é preciso estar atento. Já no hospital, ao perceber um alvoroço de repórteres no saguão, Jack descobre que o homem que estava com Sally no carro já sem vida é ninguém menos que o governador do estado, futuro candidato à presidência. Não demora para que assessores do político comecem a pressioná-lo para que não se envolva de nenhuma forma na história. Mas, esse profissional do som é um rapaz incorruptível e que preza pela verdade: seu aguçado ouvido pôde identificar um ruído, momentos antes do carro se desgovernar, que só poderia ser emitido por uma arma de fogo. Algo precisa ser descoberto. Quando as imagens do cinegrafista que também estivera no local do acidente vêm à tona, Jack as usa para montar um filme do suposto crime. Nesta sequência, a câmera acompanha de perto cada detalhe do processo; a montagem (do longa) se vale da repetição das imagens deste meticuloso procedimento como forma de partilharmos do entusiasmo e paranoia do personagem. Também abre terreno para fomentar uma reflexão acerca da relação entre a manipulação dos fatos e a realidade como ela é — ou deveria ser. Os sentimentos de angústia e tensão se instalam por definitivo na feição dos personagens, cujas faces estão sempre próximas às lentes. Os corpos inquietos se movimentam vigorosamente pelos cenários, ainda que encerrados por quadros dentro do quadro, presos em reflexos de espelhos e atravessados por linhas duramente retas. Jack acreditava ter o necessário para que a coisa certa fosse feita, mas estava inserido em um contexto onde as decisões já haviam sido tomadas.