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A Técnica Psicanalítica Através do Brincar: Sua História e Significado

De autoria de Melanie Klein, o capítulo aborda sua técnica construída através do brincar com
crianças. Retrata que no início poucos psicanalistas tinham estudado aprofundadamente o
inconsciente e suas camadas mais profundas. Conta-nos o caso de Fritz, a criança apresentava
considerável problema em seu desenvolvimento intelectual, e Klein pediu para que a mãe
falasse com a criança na tentativa de aliviar a angústia que esta sentia. Isso não bastou e ao
analisar a criança percebeu que seu foco era as ansiedades e as defesas contra as mesmas. As
interpretações feitas iam trazendo mais tranquilidade à criança. Quando iniciou o brincar com
o menino reparou que suas fantasias e ansiedades podiam ser percebidas no que mostrava
através do momento lúdico. Compara, então, o brincar da criança à associação livre do adulto.

A seguir nos traz o caso de Rita, uma menina de dois anos e nove meses, diagnosticada com
neurose obsessiva, sofrendo de terrores noturnos e fobias de animais, e que também
apresentava ambivalência com a sua mãe. Por vezes se mostrava mais depressiva e seu brincar
era inibido e com grandes dificuldades de lidar com frustrações. O fato de ser bem pequena
fez com que desenvolvesse uma transferência negativa, pedindo para sair e se mostrando
ansiosa e quieta. Klein saiu para o pátio para brincar com a criança e a mesma passou a se
comportar de uma maneira mais amistosa, coisa que atribui ao fato de ter interpretado o que
aconteceu: a criança tinha medo do que ela faria com ela as sós no quarto, coisa que remetia
aos seus terrores noturnos. Esse caso fortaleceu sua teoria quanto ao que diz respeito de ser
necessário interpretar as fantasias inconscientes.

Percebeu detalhes importantes, como o fato de que a casa da criança não é bom lugar para a
análise acontecer e que é bom ter a caixa de brinquedos de cada criança (ilustrando a situação
adulto VS terapeuta em uma versão para a criança), afinal é com o tempo que ela pode
perceber o que era bom de se utilizar e o que não. Os brinquedos ideais na percepção da
autora são os pequenos e simples. Destacando o fato de que não é só com brinquedos que a
criança brinca, mas também se apropria de jogos.

A agressividade é frequentemente mostrada durante a sessão, seja no quebrar de um


brinquedo ou no modo como age quando interpreta um papel de autoridade. É importante
observar o modo como ela agirá depois de ter extravasado, afinal aqui é que emergem ou não
sentimentos, como culpa, mostrando muito do nível inconsciente dela mesma. Por exemplo,
pode acontecer de ela por o objeto danificado isoladamente, devido ao medo persecutório de
que o objeto atacado busque se vingar, esse medo pode ser tão forte que chega a camuflar
sentimentos como culpa e depressão, gerados concomitantemente ao ataque ao objeto.
Quando situações como essa acontecem no setting terapêutico se nota que na vida as
ansiedades diminuem e o objeto real pode passar a receber sentimentos de amor.

A criança não expressa só o inconsciente brincando, mas também repete muito do que
acontece em seu cotidiano, pode até deixar eventos importantes passarem, mas os fatos
secundários que trazem as remetem a algo que mexeu.

Fala um pouco sobre crianças que não conseguem brincar e traz o exemplo de Peter que não
conseguiu mais brincar após ter presenciado os pais mantendo relações sexuais. Na primeira
sessão e em várias outras quebrou diversos brinquedos e os atirou, simbolizando claramente o
desejo de destruição do pai. Ter presenciado isso causou no garoto sentimentos de ansiedade,
agressividade e ciúmes que demonstrou diretamente nos brinquedos do setting. Em casos
como o de Peter, ou casos semelhantes em que a criança não quer brincar, geralmente ela
chega a dar subsídios para o analista entender o porquê dela não conseguir brincar.

Comenta a seguir que até mesmo uma criança pequena possui certa capacidade de insight. O
analista deve fazer suas interpretações de maneira simples e compreensível. A capacidade de
insights de algumas crianças às vezes chega a ser maior que de adultos, fato curioso explicado
pelo fato do consciente e inconsciente estarem muito mais próximos nessa fase da vida.

Através de observações de crianças como Rita e muitas outras, Melanie chegou à conclusão de
que o superego se instaura na criança muito antes do que supunha Freud. O superego seria na
verdade o produto final de anos de desenvolvimento, mas durante a infância se mostra como
aquilo que a criança introjetou de seus pais. Deduziu, também, que o núcleo do superego é a
internalização de um seio bom que satisfaz e outro seio mau.

Outra conclusão tirada por Melanie Klein foi a de que a ansiedade em meninas pequenas se dá
ao fato de sentir a mãe como perseguidor primordial e nos meninos é o medo de castração.
Além disso, disse que impulsos e fantasias destrutivas podem ser ligados às fantasias sádico-
orais e que o superego primitivo subjaz à psicose.

Klein faz uma comparação astuta e diz que o brincar das crianças e a atribuição de coisas a
esses brinquedos em muito se assemelha à interpretação dos sonhos por Freud. Ambas, afinal,
entram em contato com o inconsciente.

Graças ao simbolismo do brincar pode concluir ainda que muito alívio é experimentado no
momento lúdico. Descobriu que no primeiro contato de amamentação o seio bom e o seio
mau já são estabelecidos, além disso concluiu que à saúde mental está em muito ligada às
relações com os objetos. A junção do seio bom e mau se dá por volta do primeiro ano e
representa a posição depressiva do ego, precedida da posição paranóide aonde predominam
ansiedades persecutórias e processos de cisão.

Conclui-se, portanto, mostrando o quanto as descobertas de Melanie Klein foram


fundamentais para uma visão mais ampla da psicanálise com crianças e adolescentes.

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