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PSICOATIVAS ÍLICITAS
ISPUP – 2017
NA CIDADE DO PORTO
[Retrato do uso de substâncias ilícitas na cidade do
Porto]
Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto
2017
O relatório foi executado por: Paula Meireles, Diogo Costa, Ana Aguiar, Filipa Quinteiros,
André Tadeu, Rita Baptista e Henrique Barros
i
Agradecimentos
i
Índice
ii
6. Enquadramento legislativo .............................................................................................. 74
iii
Índice de figuras
Figura 1: Número de DALYs atribuíveis ao abuso de drogas em Portugal por sexo, 1990-2015. 4
Figura 2: Proporção de DALYs globais de todas as causas atribuíveis ao abuso de drogas em
Portugal, por sexo e por escalão etário 1990-2015. ...................................................................... 5
Figura 3: Freguesias servidas pelos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS) do Porto
Ocidental e Porto Oriental. ............................................................................................................ 6
Figura 4: Proporção de inscritos por 1000 com diagnóstico de abuso de drogas em ambos os sexos.
....................................................................................................................................................... 7
Figura 5: Proporção de inscritos por 1000 com diagnóstico de abuso de drogas por sexo. .......... 8
Figura 6: Fluxograma da revisão sistemática. ............................................................................. 12
Figura 7: Ilustração do método de captura-recaptura .................................................................. 13
Figura 8: Mapeamento dos locais onde decorreu a captura-recaptura. ....................................... 16
Figura 9: Procedimento seguido na condução da captura-recaptura. .......................................... 17
Figura 10: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida,
último ano e último mês por sexo, 15-64 anos, 2001 (n=14184), 2007 (n=12202) e 2012 (n=5355).
..................................................................................................................................................... 23
Figura 11: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita último ano por
sexo e por grupo etário, 2001 (n=14184), 2007 (n=12202) e 2012 (n=5355). ............................ 23
Figura 12: Prevalência (%) do consumo de canábis ao longo da vida, último ano e último mês por
sexo, 15-64 anos, 2001 (n=14184), 2007 (n=12202) e 2012 (n=5355)....................................... 24
Figura 13: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida,
último ano e último mês, região norte e média nacional, 15-64 anos. ........................................ 25
Figura 14: Resultados dos estudos com dados de prevalência do consumo de drogas ilícitas na
zona metropolitana do Porto. ...................................................................................................... 26
Figura 15: Fluxograma da recolha de dados pelo método captura-recaptura .............................. 34
Figura 16: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína injetada e fumada nos últimos 12
meses ........................................................................................................................................... 36
Figura 17: Diagrama de Venn para o consumo de heroína injetada e fumada nos últimos 12 meses.
..................................................................................................................................................... 37
Figura 18: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína e heroína, injetadas e fumadas
nos últimos 12 meses .................................................................................................................. 37
Figura 19: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína injetada e fumada na rua ....... 39
Figura 20: Diagrama de Venn para o consumo de heroína injetada e fumada na rua. ................ 39
iv
Figura 21: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína e heroína, injetadas e fumadas na
rua................................................................................................................................................ 40
Figura 22: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida
nos participantes da coorte EPITeen aos 17 e 21 anos por sexo. ................................................ 42
Figura 23: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida
nos participantes da coorte EPITeen aos 17 e aos 21 anos de idade em função do sexo e
escolaridade dos pais ................................................................................................................... 43
Figura 24: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida
nos participantes da coorte EPITeen aos 21 anos de idade em função do sexo e escolaridade. . 44
Figura 25: Distribuição dos inquiridos pelo grau de concordância com a implementação de uma
sala de consumo assistido na cidade do Porto e na sua zona de residência. ................................ 45
v
Índice de tabelas
Tabela 1: Principais características das fontes de dados usadas para descrever o contexto nacional
relativamente ao consumo substâncias psicoativas ilícitas ........................................................... 9
Tabela 2: Representação dos dados obtidos no método de captura-recaptura. ........................... 14
Tabela 3: Fases da implementação do método de captura-recaptura. ......................................... 15
Tabela 4: Pressupostos para aplicação do método captura-recaptura e medidas tomadas para evitar
a sua violação. ............................................................................................................................. 18
Tabela 5: Características dos estudos incluídos na revisão sistemática. ..................................... 27
Tabela 6: Prevalência de uso de drogas ilicitas reportadas pelos estudos incluidos na revisão
sistemática desagregadas por sexo e por período temporal a que se referem.............................. 28
Tabela 7: Consumos por tipo de droga para os últimos 12 meses e 30 dias. .............................. 28
Tabela 8: Categorias de análise de conteúdo das entrevistas. ..................................................... 29
Tabela 9: Indivíduos inquiridos durante a implementação da Captura-Recaptura e estimativa
(intervalo de confiança a 95%) do tamanho da população. ......................................................... 35
Tabela 10: Características sociodemográficas, de consumo de drogas ilícitas e de utilização de
serviços de saúde no último ano nos sujeitos contactados (n=576) ............................................ 35
Tabela 11: Estimativas do tamanho da população de utilizadores de drogas ilícitas residentes no
Porto ............................................................................................................................................ 38
Tabela 12: Drogas utilizadas na rua ou em espaço aberto (n=533)............................................. 38
Tabela 13: Utilização de cuidados de saúde durante o último ano reportada pelos inquiridos ... 40
Tabela 14: Opinião sobre sala de consumo assistido no Porto.................................................... 41
Tabela 15: Wisdom of the crowds – Resultados das questões: “Quantos utilizadores de drogas
acredita existirem neste local?” e “E de drogas injetáveis?” por zona. ....................................... 41
Tabela 16: Número e percentagem de adolescentes aos 17 e aos 21 anos, de acordo com o
consumo de substâncias ilícitas pelo menos uma vez na vida. ................................................... 43
Tabela 17: Distribuição dos inquiridos participantes na coorte EPIPorto por classe etária, pela sua
opinião acerca da localização da sala de consumo e por ter visto evidências de consumo de drogas
nas ruas do Porto nos últimos 12 meses. ..................................................................................... 44
vi
Abreviaturas
vii
Após deliberação da Assembleia Municipal do Porto, de 7 de julho de 2016, de produzir um
relatório sobre a situação da cidade em matéria de toxicodependência, o Instituto de Saúde Pública
da Universidade do Porto, na sequência do procedimento ADG/347/2016/DMC, foi contratado
para executar um retrato do uso de tabaco, álcool e substâncias ilícitas na cidade do Porto.
viii
Sumário Executivo
O presente relatório faz um retrato do uso de substâncias psicoativas ilícitas na cidade do Porto,
preenchendo lacunas de informação descritiva da realidade a nível local. Para isso recorreu-se à
revisão da informação publicada, à informação disponível no âmbito das coortes do Porto
(EPIPorto, EPITeen, Geração 21), a entrevistas em profundidade com utilizadores de substâncias
ilícitas e fez-se a estimativa do tamanho da população de utilizadores ativos de substâncias ilícitas
em locais de consumo a céu aberto.
Na coorte de adolescentes do Porto, 15% aos 17 anos e 41% aos 21 anos já tinham consumido
substâncias psicoativas ilícitas pelo menos uma vez, sendo a mais comum a canábis (86% aos 17
anos e 100% aos 21 anos, dos que alguma vez tinham consumido substâncias psicoativas ilícitas).
1
As entrevistas com os utilizadores de substâncias ilícitas permitiram descrever o acesso às
substâncias, as perceções sobre as condições de consumo e as opiniões sobre as salas de consumo
assistido. Os atuais locais de consumo a céu aberto foram os mais referidos para obter substâncias
ilícitas e as condições foram consistentemente descritas como degradantes. Os entrevistados
foram unânimes no reconhecimento das vantagens que uma infraestrutura de consumo assistido
poderia trazer, especificamente em termos de condições salutares de consumo, mesmo quando
não admitiram interesse em a frequentar.
No inquérito telefónico realizado a 482 adultos da cidade do Porto, participantes de uma coorte
obtida de forma aleatória, cerca de 70% concordaram com a implementação de uma sala de
consumo assistido no Porto, e destes 42% aceitariam que se localizasse junto da sua zona de
residência.
2
1. Introdução
O abuso de drogas é uma causa comum de problemas sociais e de saúde para os indivíduos, as
suas famílias e comunidades (2). Está definido como doença na Classificação Internacional de
Doenças – 10 (F10-F19 – Perturbações mentais e de comportamento devidas ao uso de substância
psicoativa) e caracteriza-se por um conjunto de fenómenos comportamentais, cognitivos e
fisiológicos desenvolvidos após o uso repetido de substâncias (3). Estes fenómenos incluem um
forte desejo de consumo, dificuldades no seu controlo, persistência no seu consumo apesar das
consequências negativas, uma priorização do consumo sobre outras atividades e obrigações,
aumento da tolerância e, por vezes, estados ou síndromes típicas de abstinência (3). A
dependência pode ser devida a uma substância específica, a uma classe de substâncias ou a uma
gama mais vasta de diferentes substâncias psicoativas (3).
As drogas podem ser naturais, semissintéticas ou sintéticas (1). As suas principais categorias são:
‒ Opiáceos: inclui os derivados naturais da papoila (Papaver somniferum), tais como o ópio, a
morfina e a codeína; as substâncias semissintéticas como a heroína; e os opióides, produtos
totalmente sintéticos como a metadona. Os opiáceos são depressores do sistema nervoso
central (SNC);
‒ Outros depressores SNC: inclui os barbitúricos, os depressores não barbitúricos e as
benzodiazepinas;
‒ Estimulantes do SNC: inclui os derivados naturais extraídos das folhas de coca (Erythroxylum
coca) tais como o cloridrato de cocaína e ‘crack’ cocaína e as substâncias sintéticas como as
anfetaminas e similares;
‒ Alucinogénios: inclui as substâncias naturais como a psilocibina (da Psilocybe mexicana
mushroom) e a mescalina (da peyote cactus), as substâncias semissintéticas como a
dietilamida do ácido lisérgico (LSD);
1
Ao longo do relatório serão usados os termos substâncias psicoativas ilícitas e drogas indiscriminadamente
e com o mesmo significado.
3
‒ Canábis: inclui os derivados naturais do cânhamo (Cannabis sativa) como a marijuana (as
folhas secas de Cannabis sativa), como o haxixe (resina da planta), ou como um óleo extraído
da resina. A canábis é um sedativo, mas também tem efeito alucinogénio.
Em termos de carga de doença o “abuso de drogas”2 foi responsável, em Portugal em 2015, por
cerca de 774 mortes (intervalo de confiança – IC 95% 608-950), o que corresponde a 0,74% das
mortes por todas as causas (IC 95% 0,58-0,91) (4) e por 34 300 anos de vida ajustados por
incapacidade3 (DALY – disability-adjusted life years (IC 95% 28 900-39 700), representando
1,2% (IC 95% 1,03-1,38) dos DALYs globais, aproximadamente o mesmo que em 2010, com
grandes diferenças por sexo e escalão etário (como demonstrado nas figuras 1 e 2) (4).
18000
16000
14000
12000
10000
DALYs
8000
6000
4000
2000
0
1990 1995 2000 2005 2010 2015
Feminino Masculino
Figura 1: Número de DALYs atribuíveis ao abuso de drogas em Portugal por sexo, 1990-2015. Fonte: Global Burden
of Disease Study 2015
2
A definição utilizada pelo consórcio GBD para abuso de drogas é: proporção da população dependente
de opióides, cannabis, cocaína ou anfetaminas; proporção da população que alguma vez injetou drogas.
3
Soma dos anos potenciais de vida perdidos (YLL – years of life lost) e anos de vida saudável perdidos
por doença e incapacidade (YLD – years lived with disability)
4
5,0
4,5
4,0
3,5
3,0
2,5
%
2,0
1,5
1,0
0,5
0,0
1990 1995 2000 2005 2010 2015 1990 1995 2000 2005 2010 2015
Feminino Masculino
15-49 50-69
Figura 2: Proporção de DALYs globais de todas as causas atribuíveis ao abuso de drogas em Portugal, por sexo e por
escalão etário 1990-2015. Fonte: Global Burden of Disease Study 2015
1.1Contexto local
Na organização local do Serviço Nacional de Saúde (SNS) o concelho do Porto é servido por dois
Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS) - o Porto Oriental (inclui as freguesias Bonfim,
Campanhã e Paranhos) e o Porto Ocidental (as restantes freguesias) - constituídos a partir de 2009,
de acordo com o estipulado no Decreto-Lei 28/2008 (figura 3).
5
Figura 3: Freguesias servidas pelos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS) do Porto Ocidental e Porto Oriental.
A informação relativa ao “abuso de drogas” é obtida com base em casos diagnosticados com
“perturbação devida ao abuso de substâncias psicoativas que provocam dependência e que leva a
intoxicação aguda ou uso abusivo com prejuízo clinicamente grave para a saúde, ou dependência
ou a estado de privação ou distúrbios psicóticos” (5) entre utentes inscritos. No ACeS Porto
Oriental e Porto Ocidental para o ano de 2015 eram 1067 e 1607 os utentes com registo de abuso
de drogas, correspondendo a 9,2 e 9,5 por 1000 utentes inscritos, respetivamente, superior à média
da região Norte (5,3‰) (6). De facto, os ACeS do Porto foram os que apresentaram proporções
mais elevadas de “abuso de drogas” na região Norte (figura 4).
6
PROPORÇÃO DE INSCRITOS (/1000) COM DIAGNÓSTICO DE
ABUSO DE DROGAS, AMBOS OS SEXOS
Figura 4: Proporção de inscritos por 1000 com diagnóstico de abuso de drogas em ambos os sexos. Fonte: SIARS –
Sistema de Informação da Administração Regional de Saúde.
A proporção de homens inscritos com diagnóstico de “abuso de drogas” por 1000 utentes inscritos
era de 14,9 e 15,3 no Porto Oriental e Ocidental, respetivamente, acima dos 7,8 para a região
Norte em 2015; em ambos os ACeS a proporção de mulheres inscritas com diagnóstico de “abuso
de drogas” era de 4,6 por 1000 utentes, igualmente superior à da região Norte (2,9‰) (figura 5).
7
PROPORÇÃO DE INSCRITOS (/1000) COM PROPORÇÃO DE INSCRITOS (/1000) COM
DIAGNÓSTICO DE ABUSO DE DROGAS, SEXO DIAGNÓSTICO DE ABUSO DE DROGAS, SEXO
MASCULINO FEMININO
Porto Ocidental 15,3 Porto Ocidental 4,6
Porto Oriental 14,9 Porto Oriental 4,6
Espinho/Gaia 10,6 Gaia 3,9
Póvoa Varzim/Vila Conde 10,0 Espinho/Gaia 3,8
Braga 10,0 Gondomar 3,4
Gaia 10,0 Guimarães/Vizela/T.Basto 3,2
Gondomar 9,5 Braga 3,1
ULS Matosinhos 9,1 Póvoa Varzim/Vila Conde 3,1
Guimarães/Vizela/T.Basto 8,5 Vale do Sousa Sul 3,1
Maia/Valongo 7,6 Gerês/Cabreira 3,0
Feira/Arouca 7,3 ULS Matosinhos 3,0
Santo Tirso/Trofa 7,2 Alto Tâmega e Barroso 2,8
Vale do Sousa Sul 7,0 Barcelos/Esposende 2,7
Marão e Douro Norte 6,7 Feira/Arouca 2,7
Aveiro Norte 6,4 Santo Tirso/Trofa 2,7
Famalicão 6,2 Marão e Douro Norte 2,7
Douro Sul 6,2 ULS Nordeste 2,5
Alto Tâmega e Barroso 5,8 Maia/Valongo 2,5
Barcelos/Esposende 5,5 ULS Alto Minho 2,4
Vale do Sousa Norte 5,3 Douro Sul 2,2
Gerês/Cabreira 5,1 Aveiro Norte 2,2
Baixo Tâmega 4,3 Famalicão 2,2
2014 2014
ULS Nordeste 4,1 Vale do Sousa Norte 1,7
ULS Alto Minho 3,9 2015 Baixo Tâmega 1,7 2015
Região Norte 7,8 Região Norte 2,9
Figura 5: Proporção de inscritos por 1000 com diagnóstico de abuso de drogas por sexo. Fonte: SIARS – Sistema de
Informação da Administração Regional de Saúde
1.2 Objetivos
8
2. Métodos
Tabela 1: Principais características das fontes de dados usadas para descrever o contexto nacional relativamente ao
consumo substâncias psicoativas ilícitas.
População geral residente em Portugal Continental e Regiões Autónomas dos 15 aos 64 anos
População
(2001 e 2007) e dos 15 aos 74 anos (2012)
Nível de
Nomenclatura de Unidades Territoriais II (NUT II) - Norte, Centro, Lisboa, Alentejo, Algarve,
desagregação
Região Autónoma da Madeira e Região Autónoma dos Açores
geográfica
Sistema polietápico, estratificado por conglomerados em que as unidades primárias
correspondem aos concelhos e as unidades secundárias às secções estatísticas determinadas de
Processo de
forma aleatória e proporcional. A seleção final dos indivíduos realizou-se por sorteio
amostragem
sistemático da eleição dos lares e com recurso a tabelas de números aleatórios para a seleção do
membro do lar a ser inquirido
2001: 14 184
Tamanho
2007: 12 202
amostral
2012: 5355
Recolha de
Inquéritos
dados
Prevalências de consumo (pelo menos 1 vez, no período temporal a que se referem): ao longo
da vida (PLV); nos 12 meses anteriores à recolha de dados (P12M); nos 30 dias anteriores à
Medidas
recolha de dados (P30D) apresentada de acordo com os grupos etários, dividindo-se em
apresentadas
população geral (15-64 anos), população jovem (15-34 anos) e população adulta (35-64 anos),
de acordo com o género e região do país
Estimativas para o consumo problemático/de alto risco de drogas (8)
População geral residente em Portugal Continental e Regiões Autónomas dos 15 aos 64 anos
População
(2001 e 2007) e dos 15 aos 74 anos (2012)
Método
Métodos indiretos de estimação – multiplicador e indicador multivariado
utilizado
Indicadores de consumo de alto risco, nomeadamente número de consumidores e respetivas
Medidas
taxas por mil habitantes de consumidores de opiáceos, cocaína e/ou
apresentadas
anfetaminas/metanfetaminas e consumidores de drogas por via endovenosa, ambas nos últimos
9
12 meses, para o ano 2012 e na população de 15-64 anos
A expressão de pesquisa incluiu os termos Medical Subject Headings (MeSH) dos principais
tópicos do objetivo e seus sinónimos. Para o tópico de ‘drogas ilícitas’ usou-se os sinónimos
"drogas de rua" e "drogas psicotrópicas", incluímos todas as substâncias sob controlo
internacional e seus sinónimos e acrescentamos algumas substâncias cujo uso pode ser lícito, mas
para as quais houve relatos de abuso. Para o tópico da região metropolitana do Porto incluímos
todas as cidades que fazem parte da área. Optamos por usar uma expressão de pesquisa mais
específica no RCAAP acrescentando à expressão os termos "prevalência" ou "frequência", de
forma a conseguirmos avaliar os resultados no período de tempo disponível e com base no facto
de que não esperamos encontrar trabalhos com dados de prevalência que não tenham as palavras
"prevalência" ou "frequência" no texto completo. Na base de dados do Indexrmp, a expressão de
pesquisa era mais sensível devido às características desta base que não permitia adicionar o tópico
de local à expressão de pesquisa. No entanto, não foi possível analisar os resultados desta base de
dados dado que esta plataforma não permitiu a exportação de todos os resultados e não obtivemos
resposta atempada dos seus administradores.
No total foram verificadas 1355 referências, de acordo com o fluxograma apresentado na figura
6. Os artigos com estudos observacionais com dados de prevalência de uso de drogas ilícitas
desagregados para a zona metropolitana do Porto eram elegíveis para inclusão nesta revisão
sistemática. Na primeira fase verificaram-se os títulos e os resumos e excluíram-se as referências
de acordo com os seguintes critérios:
10
4. Estudos sem dados de prevalência de consumo de drogas ilícitas;
5. Estudos sem dados de prevalência para a área metropolitana do Porto.
Na segunda fase verificaram-se os artigos completos das referências não excluídas usando os
mesmos critérios da primeira fase. Na terceira fase verificaram-se os artigos não excluídos pelos
critérios acima tendo em conta os dados disponíveis para extração e excluíram-se os seguintes:
6. Estudos com dados de prevalência para a área metropolitana do Porto mas não
desgregados de outras cidades;
7. Estudos com dados de amostras de utilizadores de drogas.
No final incluíram-se cinco referências – três artigos científicos e duas teses de mestrado.
11
Referências identificadas na Referências identificadas no
PubMed® RCAAP
(n= 1065) (n= 290)
0 duplicados
5 artigos incluídos
12
2.2Captura-recaptura
a. Aspetos metodológicos
O método de captura-recaptura (C-R) foi usado pela primeira vez em 1662 para estimar a
população de Londres e mais tarde em 1783 para estimar a população de França. Desde então tem
sido muito usado na área da biologia para contar e monitorizar populações de animais selvagens
e consiste em capturar, marcar e recapturar. Foi introduzido no campo da epidemiologia em 1968
por Janet Wittes (10) e desde o inicio dos anos 90 o método tem sido amplamente usado para
estimar o tamanho de populações humanas que, pelas suas características, estão menos acessíveis
aos investigadores e para os quais não é possível fazer uma enumeração completa e direta (11)
como por exemplo utilizadores de drogas, sem-abrigo ou trabalhadores sexuais (12).
Na epidemiologia têm sido usadas no geral duas abordagens ao método, ilustrado na figura 7: a
que não envolve contacto direto com membros da população que se pretende estudar mas a
verificação de dois ou mais registos – listas incompletas – onde se espera que os membros da
população possam estar e a identificação da presença de indivíduos em mais do que uma lista; e
outra abordagem, mais próxima da sua forma original, que envolve o contacto com os membros
da população na “captura” de duas ou mais amostras e na identificação de sobreposições.
4
UNAIDS – Joint United Nations Programme on HIV/AIDS
13
5. O tamanho da amostra em cada uma das rondas é suficientemente grande para a
obtenção de estimativas precisas.
Tabela 2: Representação dos dados obtidos no método de captura-recaptura. Fonte: adaptado de UNAIDS, 2010
Foram capturados na
segunda ronda?
Sim Não
C2=R+c N=R+b+c+x
Tem como pressuposto que a proporção de pessoas presentes nas duas amostras (R/C2) é uma
estimativa não enviesada da proporção de pessoas marcadas na população cujo tamanho é
desconhecido (C1/N) (13, 14). Assim podemos estimar o tamanho da população total.
R/C2=C1/N
ou N = C1C2/R
Onde:
R = Número de pessoas capturadas na primeira visita que foram depois recapturadas na segunda
visita
14
Desenho do trabalho de campo e instrumento de recolha de dados
O estudo foi desenhado adaptando a forma original do método de captura-recaptura para o estudo
da população de utilizadores de drogas ilícitas da cidade do Porto e desenvolveu-se em duas fases,
descritas na tabela 3:
Durante as entrevistas com cada um destes atores foi-lhes descrito o método planeado e pedido
que identificassem os locais de consumo na cidade do Porto, o número previsto de pessoas em
cada local e as respetivas horas de pico. Houve clara concordância relativamente aos principais
locais de consumo da cidade por parte dos atores locais contactados. Os bairros do Aleixo,
Pinheiro Torres/Pasteleira (PT+), Francos, Cerco e a Rua Escura, foram definidos como locais
onde deveria ser aplicada a captura-recaptura (figura 8).
15
Figura 8: Mapeamento dos locais onde decorreu a captura-recaptura.
Em relação à definição operacional da nossa população em estudo, com base nas informações
obtidas durante as entrevistas chegou-se à seguinte definição: pessoa que tenha usado drogas
ilícitas na cidade do Porto nos últimos 12 meses.
Com base neste mapeamento e informações obtidas pelos atores locais e na visita feita aos locais
acima mencionados, foram constituídas e treinadas equipas compostas por investigadores e por
educadores de pares da ONG CASO (que são, simultaneamente membros da comunidade) para
conduzirem o método nos locais identificados. A formação com a duração de cinco horas focou-
se na introdução ao método, nos aspetos práticos da sua aplicação e na discussão do instrumento
de recolha de dados. Nesse dia ficaram também definidas as datas para o “trabalho de campo”,
isto é, para deslocação das equipas aos locais identificados para implementação do método de
captura-recaptura. Estes dias foram a 4 e 7 de janeiro de 2017.
Na deslocação aos locais, as equipas procuraram abordar o maior número de pessoas, verificar se
faziam parte da população elegível em estudo, ou seja, se eram utilizadores de drogas ilícitas nos
últimos 12 meses. Uma vez identificadas estas pessoas foi-lhes dado um objeto do qual se possam
lembrar mais tarde, em específico, uma lanterna (correspondendo esta etapa à fase da captura).
Três dias depois, as mesmas equipas voltaram aos mesmos locais, durante o mesmo horário e
repetiram o procedimento de abordar o maior número de pessoas possível e verificar se eram
16
elegíveis para o estudo, isto é, se utilizaram drogas ilícitas durante o último ano e foi-lhes
perguntado se receberam o objeto anteriormente (recaptura). O procedimento está esquematizado
na figura 9.
Para cada pessoa contactada procurou-se obter informação acerca do seu sexo, idade, das
substâncias ilícitas utilizadas e via de consumo, do consumo na rua ou em espaço aberto, a opinião
acerca da existência e localização de uma sala de consumo assistido na cidade e da utilização de
cuidados de saúde durante os últimos 12 meses. São disponibilizados o questionário e “manual
do inquiridor” utilizados em anexo.
Neste trabalho, foram tomadas as seguintes medidas de forma a evitar a violação dos pressupostos
do método de captura-recaptura e que são recomendadas pela UNAIDS/WHO5 Working Group
on Global HIV/AIDS and STI Surveillance (tabela 4).
5
WHO – World Health Organization.
17
Tabela 4: Pressupostos para aplicação do método captura-recaptura e medidas tomadas para evitar a sua violação.
Adaptado de: UNAIDS, 2011
A população que pretendemos estudar Definição de um tempo curto (3 dias) entre visitas.
é fechada. Definição clara dos limites dos locais escolhidos.
Escolha de um objeto útil e único do qual é fácil lembrar.
As sobreposições entre as amostras são
Recolha de informação sociodemográfica e comportamental
possíveis de identificar de forma
suficiente que permite, no pior cenário, uma ligação probabilística
precisa.
entre recapturas.
Escolha de dois dias da semana diferentes.
As amostras são independentes.
Inclusão de uma pergunta que simula uma terceira ronda
Envolvimento da comunidade na definição operacional da população
Inclusão dos pares na equipa de investigação, que foram alocados ao
sítio que melhor conheciam
Todos os membros da população que Toda a equipa recebeu instruções claras para:
pretendemos estudar têm a mesma Contactarem com todos os membros da população que
probabilidade de serem selecionados encontrem;
para a amostra. Evitarem selecionar os que se conhecem, ou que parecem mais
simpáticos ou disponíveis;
Proceder de igual forma na segunda ronda (não ir de encontro
àqueles que se lembrassem de terem respondido na primeira).
Condução do método em todas as zonas identificadas como locais de
O tamanho da amostra em cada uma
venda e consumo de drogas durante a avaliação prévia e durante as
das rondas é suficientemente grande
horas de pico.
para a obtenção de estimativas
Procurou-se inquirir o máximo de membros da comunidade em cada
precisas.
uma das rondas.
Foram elaborados diagramas de Venn para melhor visualização do número de consumidores das
duas principais substâncias ilícitas identificadas e a respetiva via de administração, para o
consumo no último ano e para o consumo reportado ter acontecido na rua.
18
2.3Entrevistas com utilizadores de substâncias ilícitas
a. Aspetos metodológicos
Utilizou-se a técnica da entrevista semiestruturada para obter informações sobre valores, atitudes
e opiniões sobre a utilização de drogas ilícitas na cidade.
Optou-se pelo método biográfico (ou narrativa biográfica) pois permite que a pessoa relate parte
da sua história de vida de uma forma e com um objetivo particulares, guiada pelo seu
entendimento ou conceptualização de uma situação específica.
O guião da entrevista (em anexo) foi desenvolvido tendo em consideração os objetivos do projeto
e a bibliografia relevante, estando dividido em duas partes complementares: uma estruturada, com
perguntas fechadas ou de resposta curta, para caracterização sociodemográfica assim como
perguntas referentes ao consumo de substâncias ilícitas; outra semiestruturada perguntando sobre
os consumos, relações interpessoais, salas de consumo assistido e ainda sobre o acesso aos
cuidados de saúde. Os participantes foram encorajados a falar abertamente e a acrescentar toda a
informação que considerassem relevante.
Todas as entrevistas foram conduzidas pela mesma entrevistadora em salas privadas (exceto uma
realizada na rua) proporcionadas pelas organizações que trabalham no terreno ou no edifício do
ISPUP. As entrevistas foram conduzidas em português e gravadas após consentimento informado
assinado. As respostas à primeira parte da entrevista foram anotadas pela entrevistadora no
próprio guião da entrevista e posteriormente introduzidas em base de dados. Foram ainda tiradas
notas relevantes sobre facilidade de contacto e comunicação com os participantes, descrição do
ambiente onde se realizaram as entrevistas assim como aspetos não-verbais tais como interesse,
envolvimento emocional e capacidade de evocação e análise. As entrevistas demoraram em média
(desvio padrão) 22 (9,9) minutos.
19
c. Análise das entrevistas
A análise das entrevistas compreendeu duas partes: uma quantitativa e outra qualitativa. A
primeira descreve as características da amostra: idade, género, situação marital, educação,
profissão, acesso aos cuidados de saúde nos últimos 12 meses, tipo de drogas consumidas, idade
do primeiro consumo, número de anos de consumo, vias de consumo e locais de consumo. A
segunda apresenta uma análise de conteúdo (em anexo) (15), que se iniciou pela leitura das
entrevistas e das notas da entrevistadora a partir da qual emergiram as categorias e subcategorias
para a construção da árvore temática, de acordo com o protocolo desenvolvido por Braun et. al
(16). Os excertos das entrevistas foram relidos e codificados para as diferentes categorias e
subcategorias.
A coorte EPIPorto, de adultos residentes no Porto, a coorte EPITeen de adolescentes das escolas
do Porto e a coorte Geração 21 de crianças nascidas entre 2005 e 2006 nas maternidades que
servem o concelho, são amostras representativas mas fechadas da população local e forneceram
informação transversal e longitudinal sobre os consumos assim como as opiniões sobre a
implementação de uma sala de consumo assistido no Porto.
A coorte EPIPorto, corresponde à mais antiga estrutura de recolha de dados de base comunitária,
longitudinais, do país. Foram incluídos 2485 adultos residentes na cidade do Porto recrutados no
período 1999-2003, selecionados por aleatorização de dígitos telefónicos de números fixos da
cidade (17, 18). Estes homens e mulheres foram, ao longo tempo, periodicamente avaliados para
várias características da sua saúde e do seu estilo de vida. Especificamente, foram questionados
em duas reavaliações: entre maio de 2005 e setembro de 2009 e entre junho de 2013 e abril de
2015. Adicionalmente, entre os dias 26 de janeiro e 16 de fevereiro de 2017, três inquiridores
treinados contactaram participantes da coorte EPIPorto, numa aproximação sequencial, para
realização de um questionário por telefone. A lista de telefones ativos da coorte foi consultada e
percorrida, com uma tentativa de chamada para os números existentes. O questionário inquiria as
opiniões dos participantes nomeadamente quanto a vantagens e desvantagens da criação de uma
sala de consumo assistido, concordância com a sua criação no concelho do Porto e opinião sobre
a localização.
A coorte EPITeen foi recrutada em 2003 e incluiu 2942 adolescentes nascidos no ano de 1990
que frequentavam todas as escolas públicas e privadas da cidade do Porto, correspondendo à idade
20
de escolaridade obrigatória (19). Foram avaliados com 13, 17, 21 e 24 anos, sobre o seu consumo
tabágico e de álcool, e, aos 17 e 21 anos, foram também questionados acerca do consumo de
substâncias ilícitas.
A coorte Geração 21 foi constituída entre abril de 2005 e agosto de 2006, altura em que foram
recrutados 8647 recém-nascidos (as mães e, quando presentes, os pais) em 5 hospitais públicos
com maternidade, da área metropolitana do Porto (20, 21). As características dos pais, a história
clínica e reprodutiva, cuidados pré-natais, hábitos e comportamentos antes e durante a gravidez,
compreendendo álcool, tabaco e drogas ilícitas foram inquiridas no momento inicial.
Posteriormente foram avaliados todos os participantes aos 48 meses (avaliação que decorreu entre
abril de 2009 e agosto de 2011) e aos 84 meses (entre abril de 2012 e março de 2014).
21
3. Ética
O protocolo do estudo foi aprovado pela Comissão de Ética para a Saúde (CES) do Centro
Hospitalar de São João - Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (CHSJ-FMUP)
(parecer e documento de consentimento informado anexo).
As avaliações das coortes foram aprovadas pela Comissão de Ética para a Saúde do Centro
Hospitalar de São João - Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e pela Comissão
Nacional de Proteção de Dados e em todas as fases os Princípios Éticos para a Investigação
Médica em Seres Humanos expressos na Declaração de Helsínquia6 foram cumpridos. A
utilização dos dados para esta finalidade não obrigava a nenhum pedido específico de autorização.
Os utilizadores de drogas que aceitaram participar nas entrevistas foram informados dos objetivos
do trabalho, do método e do que se esperava da sua participação. Foi pedida autorização para
gravar as entrevistas e solicitado consentimento informado escrito (em anexo). Os ficheiros áudio
das entrevistas e os dados dos participantes (nome, contacto, atividade profissional, género e
idade) ficaram guardados em ficheiros separados das transcrições. Os áudios serão destruídos no
final do estudo e as transcrições serão mantidas em ficheiros seguros com palavra-passe pelo
período de 5 anos e não estarão disponíveis para nenhuma segunda parte.
6
Declaração de Helsínquia da Associação Médica Mundial. 2013. Disponível em:
http://www.wma.net/en/20activities/10ethics/10helsinki/
22
4. Resultados e interpretação
O III Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoativas na População Geral aponta para
uma prevalência de consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida em 2012
na população geral (15-64 anos) de 9,5% (IC 95% 8,6%-10,5%), situando-se entre os valores
observados em 2001 (7,8%) e 2007 (12,0%), com valores sempre superiores para o sexo
masculino (figura 10) e para o grupo etário mais jovem (figura 11) (7).
18,6%
14,8%
11,7%
PLV
P12M
6,5%
5,6%
5,4%
4,6%
4,5%
4,2%
4,1%
4,0%
P30D
2,7%
1,4%
1,3%
1,0%
0,8%
0,7%
0,5%
Figura 10: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida, último ano e
último mês por sexo, 15-64 anos, 2001 (n=14184), 2007 (n=12202) e 2012 (n=5355). Fonte: III Inquérito Nacional ao
Consumo de Substâncias Psicoativas na População Geral, Portugal 2012, CESNOVA, FCSH, UNL.
11,7%
10,1%
15-34 anos
7,5%
35-64 anos
2,9%
2,7%
2,6%
2,2%
2,0%
1,6%
0,5%
0,3%
0,2%
Figura 11: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita último ano por sexo e por grupo
etário, 2001 (n=14184), 2007 (n=12202) e 2012 (n=5355). Fonte: III Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias
Psicoativas na População Geral, Portugal 2012, CESNOVA, FCSH, UNL
23
Em comparação com os valores de 2007, em 2012 parece ter havido uma ligeira redução dos
consumos, depois de em 2007 ter havido um aumento em relação a 2001.
14,6%
11,5%
PLV
P12M
6,4%
5,4%
5,2%
P30D
4,6%
4,4%
4,1%
4,1%
3,9%
2,7%
1,3%
1,3%
0,9%
0,8%
0,7%
0,5%
Figura 12: Prevalência (%) do consumo de canábis ao longo da vida, último ano e último mês por sexo, 15-64 anos,
2001 (n=14184), 2007 (n=12202) e 2012 (n=5355). Fonte: III Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias
Psicoativas na População Geral, Portugal 2012, CESNOVA, FCSH, UNL
24
12,0%
10,0%
Região norte
9,5%
8,0%
7,8%
7,6%
Média nacional
3,7%
3,6%
3,4%
2,7%
2,7%
2,7%
2,5%
2,5%
1,9%
1,7%
1,5%
1,0%
2001 2007 2012 2001 2007 2012 2001 2007 2012
PLV P12M P30D
Figura 13: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida, último ano e
último mês, região norte e média nacional, 15-64 anos. Fonte: III Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias
Psicoativas na População Geral, Portugal
As estimativas de consumo problemático/de alto risco produzidas no ano de 2012 por mil
habitantes dos 15 aos 64 anos foram de 7,1‰ (IC 95% 6,3-7,9) para os consumidores recentes de
opiáceos, cocaína e/ou anfetaminas/metanfetaminas e de 2,2‰ (IC 95% 1,9-2,5) para os
consumidores recentes de drogas por via endovenosa (22). Em relação às estimativas dos anos
anteriores, as estimativas de 2012 parecem indicar um decréscimo do número estimado de
consumidores problemáticos de drogas para estas duas definições, no entanto esta comparação
deve ser interpretada com precaução, nomeadamente porque não existe uma correspondência
precisa nas definições de caso e métodos utilizados (23).
Apesar das diferenças de tamanho das amostras, quatro (24-27) dos cinco estudos avaliaram a
prevalência do uso de substâncias ilícitas entre os adolescentes, e o restante avaliou a população
sem-abrigo (28). O uso de drogas ilícitas foi avaliado por questionário autoaplicado exceto num
estudo que utilizou entrevista (28). Quatro estudos apresentaram dados referentes ao uso ilícito
de drogas ao longo da vida (24-27) e um para o ano anterior (28).
A prevalência pontual de uso de drogas ilícitas em adolescentes variou desde 4,9% até 14,6%,
com intervalos de confiança sobreponíveis em três dos estudos como mostra a figura 14 (os
25
intervalos de confiança não estavam disponíveis nos artigos, e foram calculados por nós). As
estimativas não são diretamente comparáveis dado que a composição etária das amostras é
diferente. O estudo sobre a população sem-abrigo apresentou uma prevalência de uso de drogas
ilícitas nos últimos 12 meses de 24,0%.
Azevedo A, 1999
12-19 anos
Guerra M, 2004
13-18 anos
Neto C, 2012
17 anos
Pinto A, 2016
11-17 anos
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 %
Figura 14: Resultados dos estudos com dados de prevalência do consumo de drogas ilícitas na zona metropolitana do
Porto.
Os dados por sexo só estavam disponíveis em três estudos (25-27), dois deles apresentaram maior
prevalência entre os homens (26, 27) o que está de acordo com os relatórios nacionais (23), um
dos estudos encontrou uma maior prevalência entre as mulheres (25), tal pode ser explicado pelo
ao alto risco de viés de seleção que resultou numa maior proporção de mulheres na amostra final
neste estudo. Os dados referentes ao uso de drogas ilícitas nos 12 meses anteriores ou nos 30 dias
anteriores foram apresentados por três estudos, no entanto foram referentes a substâncias
diferentes. A tabela 6 apresenta uma descrição detalhada dos dados reportados sobre a prevalência
dos cinco estudos.
26
Tabela 5: Características dos estudos incluídos na revisão sistemática.
Período de
Desenho do Local da recolha de Tamanho Instrumento de
Estudo População em estudo recolha de Medida resultante
estudo dados amostral recolha de dados
dados
27
Tabela 6: Prevalência de uso de drogas ilicitas reportadas pelos estudos incluidos na revisão sistemática
desagregadas por sexo e por período temporal a que se referem.
A tabela 7 apresenta os consumos por tipo de droga – cocaína, heroína e haxixe - nos últimos 12
meses e, para os entrevistados que reportaram consumo esse período, nos últimos 30 dias também.
Os 11 (73,3%) participantes que consumiram cocaína nos últimos 12 meses fizeram-no também
nos últimos 30 dias (à data da entrevista). Dos 14 consumidores de heroína, 8 (57,1%) tinha,
consumido nos últimos 30 dias. Por fim, 12 já tinham consumido haxixe dos quais 10 (83,3%)
nos últimos 30 dias.
28
Haxixe
Sim 10 (83,3%) 10 (100%)
Não 2 (16,7%)
Média de idade para primeiro consumo de haxixe (n=12) 15,9 anos
Treze (86,7%) participantes eram homens e duas (13,3%) mulheres. No que concerne à freguesia
onde vivem, 13 (86,7%) viviam em freguesias pertencentes ao concelho do Porto e os restantes
dois em freguesias pertencentes ao concelho Vila Nova de Gaia. Relativamente ao nível mais alto
de escolaridade reportado pelos participantes, o 1º ciclo do ensino básico (4º ano) e o 2º ciclo do
ensino básico (9º ano) foram os mais reportados, por quatro (26,7%) e cinco (33,3%) pessoas,
respetivamente.
Foi ainda perguntado aos participantes se tinham recorrido a algum serviço de saúde nos últimos
12 meses sendo que apenas um participante referiu que não tinha ido a nenhum serviço de saúde
nesse período. O serviço de saúde que mais vezes foi reportado pelos participantes foram as
equipas de rua (n= 10) sendo que o centro de saúde foi apenas reportado por três participantes.
No que diz respeito à análise de conteúdo das entrevistas, as categorias e subcategorias que
emergiram podem ser consultadas na tabela 8. Para efeitos do presente trabalho foram apenas
consideradas as categorias “contextos dos consumos” e “salas de consumo assistido”.
Análise de Conteúdo
Categorias
Definição das categorias
Categoria Subcategorias
29
Contexto dos consumos
Acesso à droga
Numa das perguntas que foi feita aos participantes, pretendeu-se saber de que forma é que estes
tinham acesso à droga. Das 15 pessoas, 6 referiram que iam a bairros comprar a droga enunciando
em alguns casos os nomes dos bairros, outros participantes referiram que iam/vão ao local da
droga. Os restantes participantes referiram que tinham acesso à droga quando tinham dinheiro,
tendo levado a questão para o campo monetário e não geográfico do acesso à droga.
Ah compra-se nos bairros, em qualquer bairro (…) qualquer ponto de qualquer bairro
(…) ou nas campinas (…) nas campinas agora nem tanto, que agora já acabou porque
eles pararam mas, (…) em qualquer ponto ou no Aleixo ou qualquer ponto, no Tarrafal,
em qualquer lado. [Joaquim, 53 anos- consumidor]
Nos bairros, (…) ia a qualquer bairro, por exemplo não havia neste bairro, ia a outro
bairro, não havia naquele, ia a outro (…). [Jéssica, 43 anos- ex-consumidora]
Condições de consumo
Relativamente às condições dos locais de consumo, nomeadamente os locais abertos tais como
rua, edifícios abandonados, tendas, pontes ou carros, foi perguntado aos participantes o que
pensam sobre as condições onde consomem e/ou já consumiram. No geral as respostas foram
consensuais fazendo referência a condições degradantes, aos locais estarem sujos de sangue,
seringas e material para consumo. Houve dois participantes que referiram não consumir na rua e
um outro participante que referiu que as condições eram boas para si uma vez que só fuma.
Ui era horrorosas era só seringas no chão, era só porcaria pelo chão (…) filtros era
desagradável mesmo. [Jéssica, 43 anos- ex-consumidora]
Não são muito boas, não é, às vezes a gente tá em sítios onde o pessoal vai consumir
que aquilo é uma porcaria, é seringas no chão (…) há aí sítios que a gente é preciso ter
um bocado de cuidado para chegar lá. [Felisberto, 45 anos- consumidor]
Tshi na rua é um desperdício tá vento a maior parte voa (…) desaparece, há perigo de
os outros utilizadores tão sempre a pedir depois volta e meia também podem roubar,
acontece muitas vezes com facas ou qualquer coisa. Não há as mínimas condições as
pessoas passam e vêem (…). [Roberto, 41 anos- consumidor]
Para mim está bom, é a droga, não é preciso grandes condições, uns a injetar outros a
fumar, em qualquer sítio se fuma. [Diogo, 42 anos- consumidor]
30
Salas de consumo assistido
Uma vez que se tratavam de ex-consumidores e consumidores ativos de drogas, foi-lhes ainda
perguntada a sua opinião sobre as salas de consumo assistido. As respostas foram todas
afirmativas no sentido de todas serem dirigidas para o campo do achar bem, acharem positivo e
vantajoso tanto para os consumidores como para a própria comunidade e turistas que visitam a
cidade do Porto. É importante ainda referir que muitas das respostas também apontam para o
campo da melhoria de saúde dos próprios consumidores e das condições da sala, uma vez que a
percebem como um local higiénico.
Eu (…) pelo que eu conheço acerca disso, ouvi comentários sobre a Holanda (…) eu
claro que acho bem (…) pela higiene, (…) pelo diminuir os riscos de doenças, por tudo,
por tudo, acho bem. [Bernardo, 38 anos- consumidor]
Acho bem! Acho bem que elas existam para ajudar os jovens a tentar sair da droga e a
verem aquilo que consomem e (…) é sempre um sítio mais asseado para se consumir.
Pelo menos estão acompanhados pelos enfermeiros, acho que é bom para eles. [André,
42 anos- ex-consumidor]
No que diz respeito ao interesse em frequentar uma sala de consumo caso existisse na cidade do
Porto a maioria dos consumidores ativos refere interesse em frequentar ou pelo menos em
experimentar a sala para saber como esta se encontraria montada, organizada e que tipo de
serviços ofereceria para além do espaço próprio para consumo. Como de esperar, todas as pessoas
que disseram que já não consumiam drogas diariamente referiram que não estariam interessadas
em frequentar exatamente pelo facto de já não consumirem drogas diariamente.
31
Eu até era capaz de lá ir (…) e era capaz de consumir a primeira vez. Agora não quer
dizer que fosse ahh cliente assídua (…) até porque (…) nesta altura eu não sou
consumidora diária e mais do que uma vez por dia porque isto é tudo muito bonito de
eu estar a dizer que não ia lá mais não sei quê não sei que mais porque eu tenho a
minha vida mais ou menos estruturada porque se eu tivesse a viver na rua né, e a
dormir em vãos de escadas como eu já como eu já dormi claro que a sala de chuto era
uma bênção para mim! [Cláudia, 50 anos- consumidora]
Tava! Pelo menos… tava quer dizer se consumisse, se tivesse a consumir tava, sem
problemas. Por causa das condições exatamente e (…) para (…) ver também qual era a
experiência (…) para a gente também tirar uma ideia. [Felisberto, 45 anos-
consumidor]
“(…) não frequentemente, volta e meia eu acho que sim. Isso a droga já mora comigo
no ADN, embora eu reduza mesmo volta e meia dá-me um vaipe e eu tenho que ir.
Prontos não é uma coisa que ia frequentemente, quando fumas não estás a fazer nada,
estou a gastar dinheiro porquê, tomo meta não me diz nada (…) era (…) uma grande
ideia, não um cliente habitual mas (…) volta e meia ia lá. [Cláudio, 51 anos-
consumidor]
Na resposta a esta pergunta, notou-se que a primeira afirmação referida por quatro participantes
foi a de não saberem onde se poderia localizar fazendo em seguida um pensamento sobre a
localização. Dois participantes referem que a localização poderia ser a da organização onde
ocorreu a entrevista completando com o facto de serem locais com espaço para albergar uma sala
deste tipo. Percebeu-se ainda que cinco pessoas referiram que a sala poderia e deveria ser criada
perto dos locais de venda e consumo de droga e outras duas pessoas acrescentaram dizendo que
as salas deveriam ser móveis, não do ponto de vista de uma unidade móvel tipo carrinha, mas no
sentido de serem pré-fabricados que pudessem ser montados e alocados aos locais mais críticos
de consumo de drogas na cidade.
(…) tinha que ser nos locais de consumo. Mas ahhh apontaria aqui pó centro do Porto
ahh sim, centro do Porto e Aleixo. Aleixo é um bairro que à partida vai ser demolido,
32
não é? Poderia ser aí uma sala de consumo mas, ahhh um pré-fabricado que fosse
móvel. (…) não é móvel, ou seja há casas pré-fabricadas que pousa-se lá depois
quando não houver necessidade naquele local vai lá um camião, pega na casa e coloca
noutro local (…). [Rodrigo, 41 anos- consumidor]
Nos centros nos locais onde se vende. Nos locais onde se vende. [Cláudia, 50 anos]
Eu acho (…) que quanto mais perto dos sítios críticos (…) melhor. O sítio onde se
vende a droga, porque normalmente uma pessoa quer comprar e consumir logo. E nem
espera para chegar a casa, nem chegar a um sítio não, tem que ser logo (…). Então
essas salas se fossem mais perto melhor. [Cláudio, 51 anos- consumidor]
33
d. Captura-recaptura
321 Capturas
255 Capturas +
137 Recapturas
576 Indivíduos
O número contactos estabelecidos por zonas da cidade do Porto estão descritos na tabela 9. O
maior número de questionários foi realizado no Aleixo: um total de 307 questionários,
correspondendo a 108 contactos no primeiro dia e 199 no segundo dia, dos quais se contam 61
recapturas. O menor número foi obtido em Francos.
Estimativas de pessoas que usam drogas (PUDs) e utilizadores de drogas injetadas (UDIs) por
local e total da cidade
34
847 indivíduos (IC a 95%: 766 a 929). No Aleixo a estimativa foi de 352 indivíduos, na Sé foi de
176, Cerco foi de 82, Pinheiro Torres e Pasteleira foi de 137 e em Francos foi de 101.
A maioria (54,9%) eram residentes de uma freguesia do concelho do Porto, 34,0% de um concelho
vizinho e 11,0% de concelhos mais distantes.
Tabela 10: Características sociodemográficas, de consumo de drogas ilícitas e de utilização de serviços de saúde no
último ano nos sujeitos contactados (n=576)
Características n (%)
Idade [média (desvio-padrão)] 44,1 (8,57)
Sem informação 2
Género
Homem 486 (84,8)
Mulher 87 (15,2)
Sem informação 3
Concelho de residência
35
Porto 316 (54,9)
Sem informação 1
Drogas utilizadas no último ano e via de administração
(categorias não mutuamente exclusivas)
Crack/cocaína fumada 489 (84,9)
Ecstasy 12 (2,0)
LSD 6 (1,1)
Anfetaminas 9 (1,6)
Cerca de 84,9% declarou ter fumado crack/cocaína e 20,7% declarou injetar crack/cocaína. 51,7%
declararam ter fumado heroína e 18,6% injetado heroína. De relevo, 33,7% dos inquiridos
reportaram ter tomado metadona ou buprenorfina durante o último ano. Os diagramas de Venn
apresentados nas figuras 16 e 17, representam o número de utilizadores de crack/cocaína e de
heroína por via de consumo. Para o crack/cocaína 78% de todos os sujeitos que declararam
consumir esta substância fumam apenas, 11% injetam apenas e cerca de 11% administram-na
quer injetada quer fumada
Crack/cocaína Crack/cocaína
injetada últimos 12 meses fumada últimos 12 meses
58 61 428
(10,6%) (11,2%) (78,2%)
Figura 16: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína injetada e fumada nos últimos 12 meses
Relativamente à heroína, cerca de 71% dos sujeitos reportam apenas fumar esta substância, 18%
injetam-na apenas e 12% referem administrá-la pelas duas vias.
36
Heroína Heroína
injetada últimos 12 meses fumada últimos 12 meses
65 42 256
(17,9%) (11,6%) (70,5%)
Figura 17: Diagrama de Venn para o consumo de heroína injetada e fumada nos últimos 12 meses.
No diagrama de Venn representado na figura 18, representa-se o cruzamento das duas drogas
consumidas pelas duas vias. Quarenta indivíduos reportaram consumir heroína e cocaína por via
injetada e fumada. A maior proporção verificou-se para os indivíduos que reportaram fumar
crack/cocaína e heroína (41%) seguidos dos que reportaram fumar apenas crack/cocaína (33%).
Figura 18: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína e heroína, injetadas e fumadas nos últimos 12
meses
37
Dado que nem todas as pessoas contactadas reportaram residir numa freguesia do município do
Porto, estimou-se o tamanho da população usando a informação apenas para os residentes (tabela
11).
Tabela 11: Estimativas do tamanho da população de utilizadores de drogas ilícitas residentes no Porto
Estimativa do tamanho da população (IC 95%) 847 (766-929) 783 (702-865) 205 (180-231)
Estimativa do tamanho da população por 1000
6,54 (5,91-7,17) 6,05 (5,42-6,68) 1,58 (1,39-1,78)
habitantes (15-64) (IC 95%)
% de residentes no município do Porto 54,9% 55,6% 62,3%
Estimativa do tamanho da população (IC 95%) 450 (398-502) 434 (382-487) 118 (99-136)
Estimativa do tamanho da população por 1000
3,47 (3,07-3,88) 3,35 (2,95-3,76) 0,91 (0,76-1,05)
habitantes (15-64) (IC 95%)
As pessoas contactadas foram igualmente questionadas sobre se alguma vez tinham consumido
na rua ou em espaço aberto (considerando espaço aberto não só a rua, mas também edifícios
abandonados, tendas, pontes, dentro de carros, por exemplo), e que drogas consumiram e por que
via (tabela 12). No total, 533 (92,5%) dos 576 inquiridos referiram ter consumido na rua, tendo
487 (91,4%) referido que este consumo na rua aconteceu na última semana (tabela 12).
De referir também, que cerca de 66% dos inquiridos referiram vir ao local onde foram
questionados sete dias por semana.
38
Crack/cocaína Crack/cocaína
injetada na rua fumada na rua
64 58 382
(12,7%) (11,5%) (75,8%)
Figura 19: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína injetada e fumada na rua
Para o consumo de heroína na rua, 65,6% usaram-na apenas pela via fumada, 21,7% apenas pela
via injetada e 12,7% pelas duas vias.
Heroína Heroína
injetada na rua fumada na rua
75 44 227
(21,7%) (12,7%) (65,6%)
Figura 20: Diagrama de Venn para o consumo de heroína injetada e fumada na rua.
O cruzamento do consumo das duas substâncias pelas duas vias de administração (figura 21)
permite verificar que 7% dos indivíduos responderam usar as duas substâncias pelas duas vias, na
rua. Também aqui é mais frequente o padrão de consumo fumado, tanto de crack/cocaína apenas
(32%) como de crack/cocaína e heroína (38%).
39
Figura 21: Diagrama de Venn para o consumo de crack/cocaína e heroína, injetadas e fumadas na rua.
Sobre a utilização de cuidados de saúde durante o último ano, 81,3% dos inquiridos declararam
ter visitado pelo menos um serviço, sendo que 33,3% disseram ter visitado o centro de saúde,
24,0% foram a uma consulta num hospital, 17,4% a uma urgência hospitalar e 3,8% declararam
ter estado internados por algum período. Cerca de 38,7% reportou ter utilizado outro tipo de
serviço, dos quais se destacam os Centros de Atendimento a Toxicodependentes (CAT), referidos
por 155 dos 576 indivíduos (tabela 13).
Tabela 13: Utilização de cuidados de saúde durante o último ano reportada pelos inquiridos
40
Opinião sobre sala de consumo assistido
Relativamente à questão “Acha que devia haver uma sala de consumo assistido no Porto?”, 97,7%
dos indivíduos inquiridos responderam afirmativamente e 89,1% referiram que a utilizariam,
6,2% disseram que não utilizariam e cerca de 4,7% responderam “talvez” (tabela 14). Os
indivíduos contactados foram também questionados quanto ao local onde acham que se deveria
localizar uma sala de consumo assistido. A resposta mais frequente (72,2%) foi de que tal sala se
deveria localizar próximo ou nos bairros de venda e consumo, ou muito perto destes. Cerca de
11,3% dos indivíduos referiram o centro da cidade como melhor localização e 6,3% referiram ser
fora do centro ou nos arredores da cidade (tabela 14).
Considerando as estimativas dadas para o número de pessoas que utilizam drogas no local onde
foram questionados e para o número de pessoas que injetam drogas nesses locais, os valores
médios obtidos a partir das respostas dos inquiridos são apresentados na tabela 15.
Tabela 15: Wisdom of the crowds – Resultados das questões: “Quantos utilizadores de drogas acredita existirem
neste local?” e “E de drogas injetáveis?” por zona.
Média (desvio-padrão) de
Número Média (desvio-padrão) de pessoas Número
Zona pessoas que usam drogas
respostas que utilizam drogas respostas
injetáveis
41
Aleixo 223 3175 (13757,2) 209 1049 (1810,8)
Rua Escura 100 625 (1536,6) 90 237 (770,6)
Cerco 67 528 (935,2) 65 242 (523,0)
Pinheiro
Torres,
73 882 (1434,2) 68 329 (464,3)
Pasteleira e
Viaduto
Francos 64 1583 (6341,1) 59 331 (573,4)
As coortes Geração 21 e EPITteen fornecem dados acerca do consumo de substâncias ilícitas nos
respetivos grupos populacionais seguidos.
Na coorte de adolescentes, foram questionados em 2007 e em 2011, portanto aos 17 e aos 21 anos,
acerca do consumo de substâncias ilícitas. Verificou-se aos 17 anos que 14,6% dos adolescentes
já tinha consumido substâncias ilícitas pelo menos uma vez na vida. Aos 21 anos 41,2%
declararam alguma vez ter consumido alguma substância ilícita, sendo que em ambas as idades
de avaliação a proporção de rapazes é ligeiramente superior à proporção de raparigas que já tinha
consumido pelo menos uma vez (figura 22).
49,5%
Feminino
34,4% Masculino
16,4%
12,8%
17 anos 21 anos
Figura 22: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida nos participantes
da coorte EPITeen aos 17 e 21 anos por sexo.
A droga ilícita mais consumida, tanto aos 17 como aos 21 anos, foi a canábis. Aos 21 anos, o
consumo predominante de canábis (40,7%) é seguido pelo consumo de cocaína (2,9%) e LSD
(2,7%). A frequência reportada de cada droga ilícita aos 17 e aos 21 anos está apresentada na
tabela 16.
42
Tabela 16: Número e percentagem de adolescentes aos 17 e aos 21 anos, de acordo com o consumo de substâncias
ilícitas pelo menos uma vez na vida.
17 anos 21 anos
Alguma vez Alguma vez
Total da amostra Total da amostra
Droga ilícita consumiu drogas consumiu drogas
(n=2422) (n=1544)
ilícitas (n=356) ilícitas (n=626)
n (%) n (%) n (%) n (%)
Canábis 305 (12,5) 305 (85,7) 625 (40,7) 625 (99,8)
Ecstasy 19 (0,8) 19 (5,3) 28 (1,8) 28 (4,5)
Anfetaminas 14 (0,6) 14 (3,9) 37 (2,4) 37 (5,9)
Cocaína 15 (0,6) 15 (4,2) 44 (2,9) 44 (7,1)
Heroína 22 (0,9) 22 (6,2) 4 (0,3) 4 (0,6)
LSD 10 (0,4) 10 (2,8) 41 (2,7) 41 (6,6)
Os jovens adultos cujos pais são mais escolarizados apresentam uma maior prevalência de alguma
vez ter consumido algum tipo de drogas ilícitas, tanto aos 17 (figura 23) como aos 21 anos (figura
24) e o mesmo se observa de acordo com a escolaridade dos próprios aos 21 anos de idade, exceto
nas raparigas com escolaridade entre 10 e 12 anos que apresentaram uma proporção ligeiramente
menor de alguma vez ter consumido substâncias ilícitas.
59,5%
54,0%
45,9%
42,5%
38,3%
28,5%
28,0%
19,9%
18,7%
Feminino
17,0%
16,6%
14,8%
14,2%
12,8%
10,8%
9,4%
Masculino
Figura 23: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida nos participantes
da coorte EPITeen aos 17 e aos 21 anos de idade em função do sexo e escolaridade dos pais
43
Feminino
52,6%
42,9% 45,0% Masculino
37,8%
29,8%
25,5%
≤9 10-12 >12
Escolaridade do participante (anos)
Figura 24: Prevalência (%) do consumo de qualquer substância psicoativa ilícita ao longo da vida nos participantes
da coorte EPITeen aos 21 anos de idade em função do sexo e escolaridade.
Na coorte Geração 21, as mães e os pais foram questionados acerca de alguma vez terem utilizado
drogas apenas no momento da primeira avaliação. Assim, 260 mães (3,1%) e 529 pais (14,0%)
referiram alguma vez terem consumido drogas ilícitas. Em média, as mães referiram ter iniciado
esse consumo de drogas aos 18,0 anos (desvio-padrão: 3,68 anos) e os pais aos 17,5 anos de idade
(desvio-padrão: 3,42 anos). No entanto, apenas um pequeno número referiu consumir drogas no
momento da entrevista (isto é, em 2005-2006), destacando-se a cannabis, com 24 mães e 45 pais
a declararem o seu consumo.
Foi possível contactar 535 participantes da coorte EPIPorto, destes 482 (90,1%) concordaram em
responder ao questionário.
Foram contactadas 322 (66,8%) mulheres e 160 (33,2%) homens, mais de dois terços tinha mais
de 65 anos de idade. A distribuição dos inquiridos participantes por classe etária, pela sua opinião
acerca da localização da sala de consumo e por ter visto evidência de consumo de drogas nas ruas
do Porto nos últimos 12 meses está presente na tabela 17.
Tabela 17: Distribuição dos inquiridos participantes na coorte EPIPorto por classe etária, pela sua opinião acerca
da localização da sala de consumo e por ter visto evidências de consumo de drogas nas ruas do Porto nos últimos 12
meses.
Classe etária n (%)
34 ou menos 4 (0,8)
35-44 30 (6,2)
45-54 63 (13,1)
44
55-64 76 (15,8)
65-74 182 (37,8)
75-84 104 (21,6)
85 ou mais 23 (4,8)
Opinião acerca da localização da sala de consumo (entre os que não discordam com a
implementação da sala no Porto n=414)
(categorias não mutuamente exclusivas)
Próximo dos locais de venda 82 (19,8)
Centro da cidade 36 (8,7)
Fora das zonas de residência 104 (25,1)
Próximo das estações de comboio ou metro 14 (3,4)
Próximo de hospitais 164 (39,6)
Outra/Não sabe 83 (20,0)
Evidência de consumo de drogas nas ruas do Porto nos últimos 12 meses
Viu alguém a consumir drogas nas ruas da cidade do Porto 144 (39,9)
Viu material usado para consumo (seringas, agulhas, colheres, etc.) no chão das ruas da cidade 96 (19,9)
30,1%
Cidade do Porto
21,6%
Zona de residência
16,8%
14,3%
11,8%
9,1%
5,0%
4,4%
Figura 25: Distribuição dos inquiridos pelo grau de concordância com a implementação de uma sala de consumo
assistido na cidade do Porto e na sua zona de residência.
45
5. Discussão e conclusão
O presente relatório teve como objetivo apresentar um retrato da situação do uso de substâncias
psicoativas ilícitas na cidade do Porto.
As estimativas de consumidores de drogas ilícitas por via injetada na cidade do Porto que
apresentamos (1,58 por 1000 habitantes 15-64) quando comparados com as estimativas
disponibilizadas pelo EMCDDA para os últimos anos nos vários países Europeus que fornecem
informação, mostram que a realidade portuense não é muito discordante: por exemplo, as
estimativas de utilizadores de droga por via injetada em Espanha foi de 0,3 por 1000 (idades 15-
64), na Grécia de 0,72 por 1000, na Hungria de 0,82 por 1000, na Suécia de 1,31, Bélgica de 3,48,
Luxemburgo de 5,68 e Letónia de 9,22 por 1000.
Também para o total do “problema de uso de droga”, portanto, os utilizadores de quaisquer drogas
ilícitas independentemente da via de consumo, o valor obtido de 6,54 utilizadores por 1000
habitantes (dos 15-64 anos) no Porto, situa-se entre os valores reportados pelo EMCDDA para a
realidade nacional de vários países Europeus. Por exemplo, França reporta 6,86 por 1000 nos anos
2013-14, a Finlândia 6,2 por 1000 em 2012, Lituânia e Luxemburgo ambos com 6,16 por 1000 e
República Checa com 6,73 por 1000 em 2014.
Apesar da semelhança das estimativas do tamanho desta população, deve frisar-se que as
estimativas do EMCDDA congregam dados nacionais dos países que as reportam, e utilizam
diferentes plataformas de recolha da informação para esta estimativa. Inclusivamente, os dados
do EMCDDA para Portugal respeitantes a 2012, que apontam para a existência de 2,2 utilizadores
46
de drogas injetáveis por 1000 habitantes (15-64 anos) foram calculados com base nos registos
existentes das instituições públicas de saúde que prestam tratamento a esta população e os registos
da justiça (22). Assim, a estimativa que apresentamos representa os utilizadores de drogas ilícitas
das ruas da cidade do Porto, algo que não havia sido feito anteriormente, o que impossibilita aferir
acerca da sobre- ou subestimação desta estimativa ou das outras conhecidas e obtidas sem uma
contagem “na rua”.
Neste relatório, reportamo-nos igualmente à opinião dos utilizadores de drogas sobre a utilização
de uma sala de consumo assistido. Esta informação foi recolhida sob três perspetivas que
englobam componentes qualitativa e quantitativas. Em específico, observamos grande
concordância nos utilizadores de drogas contactados nas ruas, porventura o grupo com maior
probabilidade de utilizar um equipamento deste tipo. As entrevistas em profundidade aos
utilizadores e ex-utilizadores de substâncias ilícitas corroboram as opiniões positivas à criação de
salas de consumo, e o reconhecimento das vantagens para a saúde.
Finalmente, os participantes da coorte EPIPorto, mais de dois terços com 65 anos ou mais no
momento da entrevista por telefone, residentes no concelho, contactados entre os dias 26 de
janeiro e 16 de fevereiro de 2017, mostraram igualmente um parecer favorável ao estabelecimento
de uma sala de consumo assistido. A principal diferença nas opiniões da população geral e dos
utilizadores contactados na rua, refere-se à localização desta: enquanto para os primeiros, cerca
de 40% acha que se deveriam localizar próximo de hospitais e 22% fora de zonas de residências,
os segundos consideraram em maioria que uma sala deste tipo deve ficar próxima do local de
venda e/ou consumo, referindo-se aos bairros onde se encontravam e foram inquiridos.
47
6. Bibliografia
48
13. UNAIDS/WHO Working Group on Global HIV/AIDS and STI Surveillance. Guidelines
on Estimating the Size of Populations Most at Risk to HIV. 2010.
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Alto Risco de Drogas – Portugal Continental/2012. Serviço de Intervenção nos Comportamentos
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Serviços de Monitorização e Informação / Divisão de Estatística e Investigação. Relatório Anual
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saude publica. 2012 ;28(8):1517-29.
50
Anexos
51
1. Questionário usado na captura-recaptura
1ª ronda
52
2ª ronda
53
2. Guião das entrevistas semi-estruturadas
54
55
56
3. Parecer da Comissão de Ética
57
58
59
4. Declaração de consentimento informado
60
5. Categorias de análise qualitativa
Análise de conteúdo
Categorias Entrevista (história de vida) Definição da categoria
Nome da Subcategorias
categoria
Contextos Acesso à droga Joaquim (53 anos, consumidor): “Ah compra-se nos bairros, em qualquer bairro (…) qualquer Nesta categoria pretende-se
dos ponto de qualquer bairro (…) ou nas campinas (…) nas campinas agora nem tanto, que agora já descrever de que forma os
consumos participantes têm acesso à droga
acabou porque eles pararam mas, (…) em qualquer ponto ou no Aleixo ou qualquer ponto, no
Tarrafal, em qualquer lado.” – tal como locais,
disponibilidade e facilidade de
acesso – mas também as
José (41 anos, ex-consumidor): “Como é que eu tinha? Vendia e tinha acesso, davam-me pa
condições dos locais onde
vender e eu tinha. Ia buscar sim, mas não lhe vou tar a dizer onde é que eu ia (…) em bairros consomem e/ou consumiram
sim (referiu que era nos bairros após ser perguntado).”
Jéssica (43 anos, ex-consumidora): “Nos bairros, (…) ia a qualquer bairro, por exemplo num
havia neste bairro, ia a outro bairro, num havia naquele, ia a outro (…).”
Manuel (37 anos, consumidor): “Droga qualquer pessoa tem vai pó bairro pó Viso ou vai ao
Aleixo ou vai ao Paredão, apanha o autocarro (…) que vai ao Aleixo e sai mesmo lá perto. Basta
ter 5 euros para uma base, qualquer um tem acesso, desde que não seja polícia, qualquer um tem
acesso (…)”
Rui (28 anos, consumidor): “Acesso à droga, quando tenho dinheiro, pego, arranjo um
dinheirinho vou busca-la, (…) ou consumo logo na hora ou levo e consumo sozinho num sitio
escondido.”
Miguel (44 anos, consumidor): “Eu passo por ela quando vou trabalhar (…) se formos a ver aqui
isto está tudo minado senhora, isto está tudo minado (…) é o país todo (…). E pronto, agora tou
61
aqui no Porto há 4 anos e (…) perante (…) o que vi lá (refere-se a Lisboa) e perante o que vejo
aqui a droga tá em todo o lado (…).”
Cláudio (51 anos, consumidor): “É (…) fácil é (…) ir ao sítio dela (…).”
Bernardo (38 anos, consumidor): “Eu tenho (…) é assim eu não sou daqui mas tenho os
conhecimentos de como usei já ainda aqui no Porto antes de parar sei onde é que me posso dirigir
(…) quando acontece estas coisas pronto já sei aonde é que hei-de ir.”
André (42 anos, ex-consumidor): “Aqui no Porto? Ahh andando a pedir pelas ruas (…).”
Felisberto (45 anos, consumidor): “É fácil (riso) quase em qualquer lado, aqui no Porto, eu já
tive em muito cidade, aqui no Porto é a cidade que vende a droga mais barata em Portugal.”
Rodrigo (41 anos, consumidor): “Ahh isso é muito facilmente num é, porque eu quer dizer vivi
num bairro onde (…) muitas pessoas da minha geração vendiam, com a qual eu brinquei, amigos
de infância e que traficam e portanto conheço-os (…). E pronto é fácil tenho extremamente
facilidade em aceder às drogas, mas seja em qualquer bairro porque, porque andei nisto num é
tenho esses skills, é como se costuma dizer em inglês...de uma pessoa chegar a um bairro
qualquer, ao ver o ambiente e perceber logo se há drogas ou não. Mas é muito fácil encontrar
drogas”
Henrique (39 anos, ex-consumidor): “Era na rua (…) onde eu parava conhecia os traficantes
quase todos, lá em Itália, portanto tanto em Itália como aqui em Portugal (…) era no Casal
Ventoso, que tive lá acampado também ahh portanto era muito fácil ter acesso às drogas.”
Roberto (41 anos, consumidor): “Vou comprar ao bairro, num é… aos bairros prontos num é”
62
Cláudia (50 anos, consumidora): “Ele (referência ao companheiro) deixou de ter (referência a
ter droga em casa) depois dessa fase quando eu (…) fui para a clinica passado pouco tempo ele
deixou de ter droga em casa portanto ahh depois já não era só um a consumir, eram dois (…) as
coisas descarrilaram (…) ainda tínhamos artigo, tínhamos flores, tínhamos carteiras, tínhamos
camisolas (…) a droga destrói tudo porque depois nós não vamos trabalhar todos os dias porque
a droga faz-nos tar na cama (…), a gente acorda consome depois não pensamos da mesma
maneira e as coisas pah, desaparecem vão desaparecendo e quando não tínhamos nada a gente
teve que se desenrascar…”
Condições de Joaquim (53 anos, consumidor): “acho que (…) é chato (…) mas, consumia-se conseguia-se
consumo consumir e chegarmos ao que queríamos (…) ficar bem da cabeça (…) com a cabeça no ar e não
pensar em mais nada (…)”
José (41 anos, ex-consumidor): “Hmm más más… passava muita gente, não tinha condições,
uma badalhoquice (…)”
Jéssica (43 anos, ex-consumidora): “Ui era horrorosas era só seringas no chão, era só porcaria
pelo chão (…) filtros era desagradável mesmo.”
Manuel (37 anos, consumidor): “Normais. Há vento, num se consome direito… há gente a
consumir (…)”
Rui (28 anos, consumidor): “São más, são más porque não tem higiene nenhuma quer dizer é de
qualquer um, eu chego ali e qualquer um me empresta material para eu consumir (…)”
Miguel (44 anos, consumidor): “Ah nada disso…” (não consome na rua)
Cláudio (51 anos, consumidor): “É péssimo! É porque é assim toda a gente (…) está na via
pública e prontos mete-se dentro de tudo (…) barracos dentro de tudo que haja uma porcaria do
63
caraças…uma porcaria até com máquinas no chão, seringas já usadas (…). Refugiamo-nos assim
quem se droga procura a solidão (…) e quer tar ali escondido (…) são locais péssimos (…).”
Bernardo (38 anos, consumidor): “Más são más, sempre muito sujo (…) é tudo, aonde uma
pessoa vai consumir é onde tão outros consumidores (…) tudo muito sujo”
Diogo (42 anos, consumidor): “Para mim está bom, é a droga, não é preciso grandes condições,
uns a injetar outros a fumar, em qualquer sítio se fuma.”
Felisberto (45 anos, consumidor): “Não são muito boas, não é, às vezes a gente tá em sítios onde
o pessoal vai consumir que aquilo é uma porcaria é seringas no chão é… agora por acaso já não
há assim muitos sítios já acabaram muito com isso mas ainda há alguns, há ai sítios que a gente
é preciso ter um bocado de cuidado para chegar lá.”
Rodrigo (41 anos, consumidor): “As condições de consumo na rua é completamente (…) sei lá,
não têm condições nenhumas, num há condições de higiene, num há condições até de…
segurança mesmo num há condições de sei lá (…) mas é isso de higiene e segurança, isso em
termos de saúde pública também num é, por causa das doenças infeciosas e nos locais de
consumo há muitos, há muita que consome e muito sangue e… no chão e tudo, é sempre mais
complicado.”
Henrique (39 anos, ex-consumidor): “Ui, degradantes. Posso dar um exemplo que eu ahh em
Lisboa no Casal Ventoso (…) quando eu tinha dinheiro ia há parte da trás da linha tava as tendas,
onde tavam lá acampadas e eu ia lá tirar as seringas dos braços das pessoas, aos betinhos num é,
que iam para lá armados em prontos machos mens, e eu ia lá roubava as seringas a eles e injetava
em mim só para tirar a ressaca. E pah os sítios onde eu ia consumir era muito um bocado sem
higiene, sem nada. Cheguei a consumir com seringas do chão!”
64
Roberto (41 anos, consumidor): “Tshi na rua é um desperdício tá vento a maior parte voa num
é, desaparece há perigo de os outros utilizadores tão sempre a pedir depois volta e meia também
podem roubar acontece muitas vezes com facas ou qualquer coisa. Num há as mínimas condições
as pessoas passam e vêm (…) “
Cláudia (50 anos. consumidora): “Não (referência a não consome na rua)! Eu acho que as
pessoas que consome na rua consomem porque oh pah num têm mais sitio para onde ir (…)
porque a droga é assim depende, as nossas atitudes na droga, na vida com a droga são
completamente diferentes quando a gente tem a vida estruturada. Portanto, nós somos todos
iguais na droga, todos já roubamos, todos já nos prostituímos, todos já enganamos todos…
ninguém é mais que ninguém, toda a gente fez as mesmas coisas e quando estamos do outro
lado, num é do lado de cá, porque nós nunca vimos para o lado de cá, quando estamos do outro
lado, um bocadinho afastados (…) conseguimos ver as coisas de outra maneira um bocadinho
melhores do que quando estamos lá no fundo e então aí resguardamo-nos um bocadinho, mas é
pouco tempo, se continuarmos a andar todos os dias vamos lá ter outra vez!”
Salas de Opinião sobre as Joaquim (53 anos, consumidor): “Acho bem. Que ao menos as pessoas (…) escusam de andar aí Nesta categoria pretende-se
consumo salas de consumo nos cantos e deixar seringas e as crianças até a injetarem-se no (…) vírus, quem tiver o HIV que descrever a opinião dos
assistido assistido participantes sobre as salas de
se injeta (…) que anda aí muita gente que se injeta (…) e portanto eu acho que achava bem que
fizessem essas salas.” consumo assistido, as suas
ideias, conhecimentos e
ideologias sobre estas salas
José (41 anos, ex-consumidor): “(…) eu acho bem eu acho eu acho que deveria de existir assim
assim como, aferir o interesse
alguma coisa, penso que sim (…) era bom para as pessoas, tanto para as pessoas que consomem manifestado em frequentar uma
que é bom ter higiene (…) e para as pessoas da rua não verem certas coisas (…). Eu acho que sala deste tipo caso ela existisse
deveria de haver alguma coisa assim.” e ainda a possível localização
para uma sala na cidade do
Jéssica (43 anos, ex-consumidora): “Ah eu acho que (…) devia de haver essas salas assim num Porto
havia tanta gente na rua, as pessoas a passarem e verem eles ali a drogarem-se (…) eu acho que
devia de haver essas salas que assim (…) o toxicodependente tava mais à vontade assim num
65
tava (…) tão (…) com aquele receio de passar a pessoa e ver e até mesmo as próprias pessoas
escusam de ver essas coisas. Ahh e eles têm a sua privacidade. Eu acho que devia de haver esses
essa sala de consumos.”
Rui (28 anos, consumidor): “Num sei, pode ser que venha a melhorar isto (…) que deiam mais
condições a pessoal que consome, que deia melhor vida, que deia estabilidade a quem consome
(…) para evitar (…) certos contactos com outros tipos de drogas.”
Miguel (44 anos, consumidor): “Ah (…) salas, eu num digo salas digo prontos lugares para (…)
em sítios fechados prontos uma coisa mais aberta mais prontos, não tou a dizer, que tenha espaço
ao fim ao cabo as pessoas não têm que se tar a enfiar dentro de um buraco pra para consumir
num é, agora um sítio específico, pah nos jardins ou prontos sítios… agora acho que tarem as
pessoas a consumirem num buraco prontos, mas isso não vai mudar nada, tar a fazer, dar, fazer
isso uma sala as pessoas vão acabar por “eu vou ali para quê? Eu vou masé eu vou para ali,
escuso de ir além” coiso e tal, isso só se só se legalizassem as drogas e houvessem pronto o avalo
do governo… que controlasse essa parte (…)”
Cláudio (51 anos, consumidor): “Eu (…) já ouvi falar dessas salas e falava-se na sala de chuto e
tudo mais…eu acho (…) que era uma boa ideia uma sala de chuto porque isto é assim
normalmente o consumidor (…) procura o refúgio para se meter para consumir para não tar na
via pública a Câmara sabe chega ali e destrói tudo, ou tapa portas, janelas para ninguém se meter
lá dentro (…) prefere que um gajo venha para via pública (…) uns a caldar outros a fumar e tudo
mais, que isso é aspeto, cheios de… dá mau aspeto mesmo…para quem passa (…). E sujeito a
haver agressões até (…). Há pessoas que não encaram bem essa situação (…) e acho que se
houvesse um refúgio com condições para as pessoas poderem caldar e fumar e tar à vontade acho
que era uma maravilha.”
66
Bernardo (38 anos, consumidor): “Eu (…) pelo que eu conheço acerca disso, ouvi comentários
sobre a Holanda ouvi comentários eu claro que acho bem (…) pela higiene, (…) pelo diminuir
os riscos de doenças, por tudo, por tudo, acho bem.”
Diogo (42 anos, consumidor): “Acho bem, acho bem, acho que devia de haver aqui no Porto
aliás, até nem digo que devia ser aqui nas cidades grandes não, tudo que fosse cidades eu acho
que devia de haver uma sala de chuto! Sim em todas as cidades eu acho que sim. Prevenia-se até
a doença da SIDA e tudo e por tudo eu penso que era bom essas casas. Podia ser como umas
rulotes ou uma coisa assim que dessa para as pessoas pronto terem onde trocar as seringas e
mesmo nós os canecos e essas coisas todas. Acho bem, havia de ser em todas as cidades.”
André (42 anos, ex-consumidor): “Acho bem! Acho bem que elas existam pa ajudar os jovens a
tentar sair da droga e a verem aquilo que consomem e (…) é sempre um sítio mais asseado pa
se consumir. Pelo menos estão acompanhados pelos enfermeiros, acho que é bom para eles.”
Felisberto (45 anos, consumidor): “Aqui em Portugal nunca tive em nenhuma, ainda não sei se
há… ainda não há mas já tive em Espanha e em Inglaterra e são boas. É uma sala pronto um sítio
onde a gente vai que a gente compra e leva a heroína ou a cocaína, o que quiser consumir chega
lá e faz o caldo e depois tá lá o enfermeiro e a gente pede para ele nos injetar. Ele sabe como
fazer aquilo como dar a injeção e é bom porque antigamente havia muita gente com hematomas
e chegaram mesmo a ficar sem membros, conheço amigos que ficaram sem braços e sem pernas
por causa (…) dos hematomas e das infeções e agora já não se vê tanto pelo menos eu não noto
mas também já não se vê muita gente também a injetar.”
Rodrigo (41 anos, consumidor): “As salas de consumo é uma boa medida em termos de saúde
pública, em termos de segurança em termos de de bem-estar pas pessoas que usam drogas e em
termos também de bem-estar com a comunidade evidentemente porque são os locais apropriados
onde as pessoas podem consumir com higiene há sempre lá há entrada, isso é em qualquer sala
de consumo, tem que ter lá uma banquinha pra fazer a sua higiene, lavar as mãos, levar os
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materiais limpos, acabam de consumir deixam as coisas lá não trazem nada para fora usado (…)
portanto depois vai ser para reciclar e claro que é um assunto positivo super importantes (…)
para as pessoas que usam drogas e para a comunidade local também.”
Henrique (39 anos, ex-consumidor): “Que penso…olha se existisse eu acho que num tinha sido
contaminado pelo VIH. Acho eu (…) e acho que é uma possibilidade se houvesse ia consumir
há sala de consumo assistido não é, e num tinha, não tinha aquela necessidade de pegar uma
seringa do chão ou roubar a seringa de um braço de um porque eu precisava de uma seringa (…)
mas eu acho que faz muita falta faz pah só pelo respeito e pela dignidade das pessoas que estão
a consumir e pela comunidade em geral num é, porque (…) como eu já fiz consumia há beira de
escolas com crianças a passar, pessoas idosas, todo o tipo de classes de pessoas alta, média (…)
mas eu tava-me a marimbar.”
Roberto (41 anos, consumidor): “Ahhh o que é que eu penso é assim eu acho que era ahhh um
passo em frente na verdade, é isso e a legalização (…) acredito mesmo que se legalizassem a
atual situação dos consumidores não era pronto, não era esta num tínhamos que consumir na rua
num é nas matas abandonadas num tínhamos que andar a esconder, num tínhamos (…) que fazer
a vida que fazemos agora ahh eu acho que é impossível pronto e as salas de consumo (…) já
estão previstas já desde 2001 ou seja, já num é uma questão legal (…) Ahh já há experiências
noutros países que também que (…) tem sido positivo e que dá para tirar pela experiência que é
bom para toda a gente, bom para os consumidores é bom para as pessoas é (…) uma questão de
saúde pública também num é, porque ahhh uma pessoa na rua (…) muitas vezes pronto tá a
pessoa a ressacar se houver uma seringa (…) o desespero é tanto que uma pessoa é capaz de ir
partilhar a seringa (…) pode apanhar hepatite, SIDA, pode apanhar ahhh a febre do limão, pode
apanhar muitas coisas pronto. E isso deixava de acontecer ou seja (…) a qualidade de vida dos
consumidores ia melhorar (…) e isso é um ponto positivo (…) uma sala (…) pa tentar dar mais
um bocado de dignidade aos consumidores pronto no fundo se tivermos uma sala protegidos,
com material esterilizado com tudo em condições é assim uma pessoa sente-se muito melhor
claro ahh a qualidade do consumo acho que melhora (…)”.
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Cláudia (50 anos, consumidora): “Acho que era ótimo, acho que era ótimo. Ahh pra já tirava as
pessoas da rua né, e daí também não sei se tirava tanto! Ahh por exemplo eu falo por mim eu
entre fumar numa sala de chuto ou fumar num carro, no meu carro, num é num carro qualquer é
no meu carro…no meu carro ahhh eu preferia fumar no meu carro do que numa sala de chuto.
(…) eu não tenho nada contra as pessoas que chutam, nada, num tenho nada contra só que a mim
oh pah mete-me impressão! (…) Então por isso é que eu digo que às tantas que num usava mas
eu também tenho a facilidade de ter casa num é, pronto ahh mesmo quando não tenho a facilidade
de ter casa, imagine que eu tava num quarto…ahh sei lá ou tava na rua a viver como já estive
ahh eu prefiro tirar 10 cêntimos ao dinheiro para comprar a droga, ou 20, e vou a uma casa de
banho de moedas.”
Interesse em Joaquim (53 anos, consumidor): “Na, eu para já (…) só se for esporadicamente, só se andar
frequentar assim desorientado (…). Eu agora não estou obcecado pela droga como estava aqui há tempos,
eu agora estou mais, quer-se dizer, eu larguei prontos, já não estou obcecado, só de volta e meia
quando ando assim com a cabeça mais (…) foleira, assim mais triste, (…) prontos, é que
consumo (…) mas achava bem pós outros, para quem consome, acho bem porque as pessoas
pelo menos pegam e deitam ali as seringas e lavam-se e tudo por aí fora e eu achava bem, era o
que havia de ter vindo há muito tempo. E pelo menos ter alguns técnicos lá para ver quem é que
tinha o HIV ou não tinha e (…) informar melhor as pessoas sobre o HIV (…) e portanto eu acho
bem essas casas e as pessoas andarem sobre (…) a alçada de alguém (…), a serem amparados”
José (41 anos, ex-consumidor): “Ahh não porque eu não consumo mas se não (…) claro que
sim!”
Jéssica (43 anos, ex-consumidora): “Não não não não, não não não não não, nem pensar, não
não não”
Manuel (37 anos, consumidor): “Não! (…) porque eu (…) eu gosto de fazer as minhas coisas
separadas. Isso é bom é para seropositivos as pessoas que precisam de ajuda (…)”
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Rui (28 anos, consumidor): “Sim gostava de as conhecer se elas realmente vierem a existir eu
gostava de as conhecer (…) para ver (…). Pa que nós possamos ter condições de consumo antes
de estar a consumir em via pública para que toda a gente veja, não, temos o nosso cantinho,
temos o nosso sossego, e temos a nossa (…) chamada casa para poder consumir.”
Miguel (44 anos, consumidor): “Sim sim em questões de (…) as qualidades (…) das drogas
obviamente que se tiveres uma droga boa não tens que ir (…) consumir mais do que aquilo (…).
Se houvesse um rácio prontos ao fim ao cabo.”
Cláudio (51 anos, consumidor): “(…) não frequentemente, volta e meia eu acho que sim. Isso a
droga já mora comigo no ADN, embora eu reduza mesmo volta e meia dá-me um vaipe e eu
tenho que ir. Prontos num é uma coisa que ia frequentemente, quando fumas não estás a fazer
nada, estou a gastar dinheiro porquê, tomo meta não me diz nada (…) era (…) uma grande ideia,
não um cliente habitual mas (…) volta e meia ia lá.”
Bernardo (38 anos, consumidor): “Se, se tivesse (…) a ser consumidor ativo claro que sim,
claro.”
Diogo (42 anos, consumidor): “Claro, sim sim. Porque é o sitio para nós tarmos a consumir, em
vez de andarmos aí pela cidade pelo menos ali estávamos todos concentrados prontos,
escusávamos de andar a ouvir bocas a insultar-nos e tudo na rua, acho bem, acho bem.”
André (42 anos, ex-consumidor): “Neste momento não. Porque já não consumo.”
Felisberto (45 anos, consumidor): “Tava! Pelo menos… tava quer dizer se consumisse, se tivesse
a consumir tava, sem problemas. Por causa das condições exatamente e (…) para (…) ver
também qual era a experiência (…) para a gente também tirar uma ideia.”
Rodrigo (41 anos, consumidor): “Sim, claro que sim. Porque gostaria de experimentar, para ver
como é que funcionaria também e evidentemente, por exemplo se tivesse uma sala de consumo,
70
quando eu vou ao bairro, se tivesse uma sala de consumo em vez de consumir na rua, quando às
vezes consumo na rua, e às tantas poderia até consumir mais se fosse lá, porque é ali logo ao
lado e uma pessoa que consome drogas geralmente vai sempre com aquela ansiedade de querer
consumir e chega lá, consome logo, a maior parte das pessoas consomem é no carro ou nos
espaços abertos num é, mas provavelmente se houvessem as salas de consumo preferia ir lá
porque tava num sitio friendly (…). Tava lá à vontade e sabia muito bem que ali pelo menos não
poderia, não entrava lá a polícia para me chatear ou para me tirar o consumo, tava mais
sossegado, num tava com o stress pa saber (…) se vinha uma pedra de um vizinho. Portanto sim,
usaria a sala de consumo, claro que sim.”
Roberto (41 anos, consumidor): “Se eu consumisse na altura, sim claro é lógico (…)”
Cláudia (50 anos, consumidora): “Eu até era capaz de lá ir (…) e era capaz de consumir a
primeira vez. Agora num quer dizer que fosse ahh cliente assídua (…) até porque (…) nesta
altura eu num sou consumidora diária e mais do que uma vez por dia porque isto é tudo muito
bonito de eu tar a dizer que num ia lá mais num sei quê num sei que mais porque eu tenho a
minha vida mais ou menos estruturada porque se eu tivesse a viver na rua né, e a dormir em vãos
de escadas como eu já como eu já dormi claro que a sala de chuto era uma bênção para mim!
Para já num tava ao frio num é? Depois não estava sujeita a ser roubada é que as pessoas tem
que se por um bocado no papel dos outros e eu se calhar não ia porque eu tenho outras (…)”
Local para a sala Joaquim (53 anos, consumidor): “Sei lá (…) num sítio onde não houvesse assim (…) muito
de consumo contacto com pessoas de bairros (…) que é por causa das crianças normalmente (…) às vezes as
assistido
crianças entram por uma casa velha adentro e vem um individuo a consumir ou uma rapariga,
ou a fazer isto ou a fazer aquilo (…) portanto eu acho que devia de ter assim nuns sítios (…)
amplos, sei lá, (…) uns sítios, que não tivesse ninguém assim perto as pessoas (…)”
José (41 anos, ex-consumidor): “Num sei. Isso já num faço ideia. Tinha que ser cerca dos bairros
onde há mais consumo num sei.”
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Jéssica (43 anos, ex-consumidora): “Acho que assim num centro, num centro (…) como por
exemplo tipo um centro igual a este (reporta-se à organização onde está a ser concretizada a
entrevista) (…) num centro (…) de habitação fizessem umas salas de consumo.”
Manuel (37 anos, consumidor): “Podia-se fazer, aqui na (reporta-se à organização onde está a
ser concretizada a entrevista) tem espaço.”
Rui (28 anos, consumidor): “Pah num sei, tantos sítios, tantos locais de consumo que nós temos,
era fazer uma casa onde desse acesso há maior parte da zona de tráfico daqui da cidade do Porto
(…) sei lá, num faço a mínima assim, sei lá, o Porto é tão grande (…)”
Miguel (44 anos, consumidor): “Eh pah, isso aqui nem sei (…). Olha na Quinta da Bonjóia. É
para o lado de Campanhã. É uma quinta prontos, aquilo é um espaço grande, tem lá uma casa e
tem tudo, tem lá um espaço porreiro aquilo (…). Aquilo é da Câmara, é onde fazem as formações
(…). Acho que era um bom sítio aí”
Cláudio (51 anos, consumidor): “Eu acho (…) que quanto mais perto dos sítios críticos (…)
melhor. O sítio onde se vende a droga, porque normalmente uma pessoa quer comprar e
consumir logo. E nem espera para chegar a casa, nem chegar a um sítio não, tem que ser logo
(…). Então essas salas se fossem mais perto melhor.”
Bernardo (38 anos, consumidor): “Não conheço assim tão bem a cidade, não consigo dizer assim
(…) só se fosse assim associado à (reporta-se à organização onde está a ser concretizada a
entrevista) mas não sei sinceramente.”
Diogo (42 anos, consumidor): “deixe-me ver (…) talvez na rua escura ou no Aleixo.”
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Felisberto (45 anos, consumidor): “olhe (…) estou dividido. Se era aqui mais para a zona centro
ou assim ali um bocadinho pa fora de ali (…) no Aleixo. Se calhar ahh aqui no centro, aqui no
centro era melhor.”
Rodrigo (41 anos, consumidor): “(…) tinha que ser nos locais de consumo. Mas ahhh apontaria
aqui pó centro do Porto ahh sim, centro do Porto e Aleixo. Aleixo é um bairro que há partida vai
ser demolido num é poderia ser aí uma sala de consumo mas, ahhh um pré-fabricado que fosse
móvel. (…) num é móvel, ou seja há casas pré fabricadas que pousa-se lá depois quando não
houver necessidade naquele local vai lá um camião, pega na casa e coloca noutro local (…)”
Henrique (39 anos, ex-consumidor): “(…) Oh pah eu na minha opinião acho que devia ser uma
sala de consumo assistido móvel. Porque um exemplo se (…) montares uma aqui na baixa do
Porto, que não sou muito de acordo porque pah é uma zona turística (…) aqui na baixa do Porto
depois o pessoal que consome no Aleixo (…) quem comprar no Aleixo claro que não vem de lá
pra qui. Agora se montares uma sala de consumos no Aleixo o mesmo passa-se com as pessoas
daqui da Sé. Portanto eu acho que se fosse móvel, com horários tipo 3 horas aqui, 1 hora, 1 hora
ali (…) claro que não vai abranger a toda a gente que consome, num é, nunca vai abranger mas
podemos reduzir novas infeções reduzir pah muita coisa…e saber o que as pessoas precisam,
referenciá-las, fazer testes, aliás agora na sala de consumo… seguir as pessoas num é, aconselhar
as pessoas, fazer testes. Pah os cuidados básicos de saúde.”
Roberto (41 anos, consumidor): “Pronto eu já discuti isto várias vezes eu acho que devia ser aqui
ahhh na baixa, na rua escura, ali à beira, por vários motivos porque ali passam muitos turistas e
nós tivemos ali na rua escura e não sei se deu para assistir a isso ou não às vezes eles entram lá
dentro ou até lá da viela e tiram fotografias e passam lá e pronto (…).”
Cláudia (50 anos, consumidora): “Nos centros nos locais onde se vende. Nos locais onde se
vende.”
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6. Enquadramento legislativo
74
Diário da República I Série n.º 259/1976, de 5/11/1976
Decreto-Lei n.º 791/76, de 5 de novembro
Estrutura o Centro de Investigação e Controle da Droga, em substituição do Centro de
Investigação Judiciária da Droga.
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Cria em Lisboa o Centro das Taipas, unidade de saúde destinada ao tratamento, recuperação e
reinserção social de toxicodependentes.
76
O branqueamento de capitais e de outros bens provenientes de atividades criminosas,
nomeadamente os derivados de tráfico de estupefacientes, substâncias psicotrópicas e
precursores, passou a ser objeto de combate específico.
Revoga o Decreto-Lei n.°430/83, de 13 de Dezembro, e o Decreto-Lei n.º 209/91, de 8 de Junho.
77
Aprova o Programa de Ação para o Sistema Prisional – que inclui o tratamento e a reinserção
social de reclusos toxicodependentes através de um Plano Nacional de Saúde para os
Estabelecimentos Prisionais.
78
Lei Orgânica do Instituto Português da Droga e da Toxicodependência.
79
Aprova a estratégia nacional de luta contra a droga que se baseia nos seguintes aspetos
fundamentais: a cooperação internacional, o enquadramento legal, a prevenção, o tratamento, o
combate ao tráfico e branqueamento de capitais e a investigação científica.
80
Estabelece a organização, o processo e o regime de funcionamento da Comissão para a Dissuasão
da Toxicodependência, referida na Lei 30/2000.
As Comissões para a Dissuasão da Toxicodependência, para onde são encaminhadas (pelas forças
de segurança e tribunais) as pessoas que se encontram a consumir ou na posse de drogas, são
constituídas por um colégio de técnicos da área da saúde e da justiça e substituem os tribunais
criminais como resposta do Estado ao consumo de drogas. Procuram informar as pessoas e
dissuadi-las de consumir drogas. Têm, também, o poder de aplicar sanções administrativas e de
encaminhar pessoas para tratamento, sempre com o seu consentimento.
81
Diário da República I-A Série n.º 12/2003, de 2003-01-15
Lei n.º 3/2003, de 15 de janeiro
Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2001/8/CE (EUR-Lex), da Comissão, de 8
de Fevereiro, e procede à nona alteração do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, que revê a
legislação de combate à droga.
82
Diário da República I Série n.º 103/2007, de 29/5/2007
Decreto-Lei n.º 221/2007, de 29 de maio
Aprova a orgânica do Instituto da Droga e da Toxicodependência, I.P.
83
Fixa os requisitos a observar no estabelecimento das convenções entre o Estado, através do
Instituto da Droga e da Toxicodependência, I.P. (IDT, IP), e as unidades privadas de saúde, tendo
em vista o apoio ao tratamento de toxicodependentes e alcoólicos.
84
Diário da República I Série n.º 99/2012, de 22/5/2012
Portaria n.º 154/2012, de 22 de maio
Fixa a estrutura nuclear do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas
Dependências.
85
Despacho n.º 16938/2013, de 31 de dezembro
Fixa os requisitos a observar no estabelecimento das convenções entre o Estado, através do
Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) e as
Unidades Privadas de Saúde.
Revoga o Despacho 18683/2008, de 14 de Julho.
86
Diário da República II Série n.º 242/2015, de 11/12/2015
Despacho n.º 14728/2015, de 11 de dezembro
Subdelegação de competências do Secretário de Estado da Saúde no Diretor-Geral do Serviço de
Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD).
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