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DIREITO CIVIL
1ª edição
Brasília
CP Iuris
2020
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SOBRE OS AUTORES
AURÉLIO BOURET. Advogado especialista em Direito Privado. Professor de Direito Civil da Escola
da Magistratura do Rio de Janeiro – EMERJ e de diversos cursos preparatórios para concurso
público.
PAULO CESAR BATISTA DOS SANTOS. Graduado pelo Centro Universitário de Brasília – UniCeub
(2001). Mestrando em Direito Constitucional Comparado pela Universidade de Samford,
Alabama, nos Estados Unidos (2015-2020). Especialista em Direito Notarial e Registral pela
Escola Paulista da Magistratura/SP (2018-2019). Pós-Graduado em Direito Constitucional pela
Escola Superior do Ministério Público Federal – DF (2002). Juiz de Direito do Tribunal de Justiça
da Bahia, de 2004 a 2007. Juiz de Direito do Tribunal de Justiça de São Paulo desde 2007. Juiz
Titular da 37ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo - SP, desde 2019. Juiz Assessor da
Corregedoria-Geral da Justiça do TJSP, no biênio 2018–2019. Juiz Instrutor no Supremo Tribunal
Federal desde setembro de 2019. Professor de cursos de pós-graduação. Coautor de obras na
área de Direitos Reais.
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SUMÁRIO
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1.4. Direito civil constitucional ................................................................................ 36
2.3. Da capacidade.................................................................................................. 38
5
2.7.5. Do nome ................................................................................................... 51
2.9. Do domicílio..................................................................................................... 61
6
2.11.2.3. Da coação ......................................................................................... 75
2.11.2.4. Do estado de perigo .......................................................................... 76
2.11.2.5. Da lesão ............................................................................................ 77
2.11.2.6. Da fraude contra credores ................................................................. 78
2.11.2.7. Da simulação..................................................................................... 79
7
1.3. Figuras híbridas ................................................................................................ 97
8
4.2.1. Perecimento/deterioração da coisa ......................................................... 105
9
9.2.1.1. Solvens ............................................................................................. 119
9.2.1.2. Accipiens........................................................................................... 119
9.3. Das formas especiais de pagamento e das formas de pagamento indireto ....... 123
10
11.2. Inadimplemento por ato culposo do devedor (artigo 389 do CC) .................... 135
Capítulo 4 — Direito dos Contratos: Teoria Geral dos Contratos .................................... 149
11
2.7.1.4. Duty to mitigate the loss ................................................................... 159
12
1.5.3. Venda de bens sob administração ............................................................ 173
1.6.1. Venda por amostra (por protótipo ou por modelo) ................................... 174
13
4.2.2. Doação contemplativa................................................................................. 183
14
7. Prestação de Serviço ................................................................................................ 192
15
11.1.1. Espécies de comissão ............................................................................. 203
16
16. Transação e compromisso ...................................................................................... 223
1.2. Demais diferenças entre os direitos reais e os direitos pessoais patrimoniais ... 235
17
2.4.1. Efeitos quanto aos frutos ......................................................................... 239
18
3.7.1. Ocupação e achado do tesouro e estudo da descoberta ............................ 253
3.7.1.1. Ocupação.......................................................................................... 253
3.7.1.2. Achado do tesouro ............................................................................ 253
3.7.1.3. Descoberta ....................................................................................... 253
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5.2.1. Administração do condomínio ................................................................. 262
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7.4.1. Classificação do usufruto ......................................................................... 272
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8.5.1. Conceito .................................................................................................. 285
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17. Responsabilidade civil do dono do prédio ou construção por sua ruína .................... 313
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3. Regime de bens ........................................................................................................ 342
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5.3. Filiação .......................................................................................................... 367
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7.1.4. Regras sobre a ordem preferencial quanto ao pagamento dos alimentos .. 394
7.1.7. A prisão civil como consequência pelo não pagamento dos alimentos ...... 396
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Questões ................................................................................................................. 417
1.7. Procedimento previsto no ncpc para o direito das sucessões ........................... 438
3.2. Sucessão dos descendentes (por cabeça ou direito próprio e por representação) e
concorrência do cônjuge e do companheiro .......................................................... 450
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3.3. Sucessão dos ascendentes e concorrência do cônjuge e do companheiro ......... 453
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5.1. Considerações gerais ...................................................................................... 477
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A vigência da lei ocorre a partir do momento em que ela passa a ter força coercitiva,
ou seja, a partir do instante em que todas as pessoas devem obedecê-la. Não se pode confundir
a vigência da lei com a sua existência. Pode ser que a lei exista, todavia, ainda não esteja em
vigor.
Assim, o primeiro passo é a existência da lei, uma vez que não tem como exigir a
obrigatoriedade da lei sem que ela exista. A lei passa a existir com sua promulgação. Após a sua
promulgação, é possível que ela entre em vigor nessa mesma data ou em data distinta, a
depender da vontade do legislador.
A regra é que a lei passe a vigorar em todo o território dentro do prazo de 45 dias
depois de oficialmente publicada. É o que dispõe o art. 1º da LINDB.
Denomina-se vacatio legis o prazo entre o início da existência da lei e o início de sua
vigência, caso exista esse intervalo. Trata-se de um período necessário para que a sociedade se
habitue tanto com a lei quanto com o regime jurídico que ela impõe. Nesse sentido, em atenção
ao princípio da obrigatoriedade da lei, ninguém pode alegar seu desconhecimento. Entende-se
que esse princípio não é absoluto, uma vez que há exceção, como o caso do erro de direito, em
que a parte negociante poderia revogá-lo, desde que não tenha o objetivo de descumprir a lei
(CC, art. 139, III).
Há uma corrente que entende que a vacatio legis é imprescindível em leis que tenham
relevante repercussão, não podendo ela entrar em vigor na data da publicação (art. 8ª caput da
LC 95/1998).
Por fim, ainda sobre a vacatio legis, é importante mencionar a forma de contagem.
Dispõe a Lei Complementar nº 95/1998, que trata sobre a elaboração, a redação, a alteração e
a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição
Federal, em seu art. 8º, §1º que “a contagem do prazo para entrada em vigor das leis que
estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia
do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral”. Isto é, inclui-se o
primeiro e o último dia, entrando a lei em vigor no dia subsequente à consumação integral do
prazo. Por isso, não se pode confundir com os prazos processuais do Código de Processo Civil,
no qual não se inclui a data da publicação na contagem.
A lei que nasce e que tem data certa para entrar em vigor pode sofrer alteração em
seu texto antes da vigência ou depois da vigência. A LINDB trata das duas situações. Se, antes
de entrar a lei em vigor, ocorrer nova publicação de seu texto, destinada a correção, o prazo dos
dispositivos alterados começará a correr da nova publicação (LINDB, art. 1º, § 3º). Em outras
palavras, a vacatio se reinicia para esses dispositivos alterados, dando nova oportunidade de se
familiarizar com a lei. Agora, se as correções forem em texto de lei já em vigor consideram-se lei
nova (LINDB, art. 1º, § 4º).
Existe uma questão que pode gerar dúvidas em concurso por confundir a parte técnica
com o que comumente se fala ou se aplica. Alguns entendem que vigência e vigor são situações
distintas. Vigor é a força da lei, da norma. Vigência é a norma que já esteve em vigor, mas que
agora não tem mais aplicabilidade. Assim, no cenário em que vivemos, o CPC/73 não possui mais
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1Ao verificar uma questão que trata da diferença entre vigor e vigência, lembre-se dessa celeuma para responder.
2STJ:“A eventual tolerância ou a indiferença na repressão criminal, bem assim o pretenso desuso não se apresentam,
em nosso sistema jurídico-penal, como causa de atipia (Precedentes). II - A norma incriminadora não pode ser
neutralizada ou se considerada revogada em decorrência de, v.g., desvirtuada atuação policial (art. 2º, caput da LICC).
Recurso conhecido e provido”. (REsp 146.360/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em
19.10.1999, DJ 08.11.1999 p. 85].
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1.3. REPRISTINAÇÃO
Repristinação significa restaurar a vigência de uma lei pelo fato de a lei revogadora ter
perdido a sua vigência. É o que dispõe o art. 2º, §3º da LINDB: “salvo disposição em contrário, a
lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência”.
Desta forma, em regra, não há repristinação no ordenamento jurídico vigente.
Todavia, esse efeito pode acontecer quando o legislador fizer constar essa previsão na lei
revogadora. Desta forma, se ficar consignado na lei revogadora que um de seus efeitos é
ressuscitar a lei revogada, verifica-se o efeito repristinatório da lei.
Alguns doutrinadores fazem a distinção entre repristinação e efeito repristinatório. O
efeito repristinatório é estudado no campo do Direito Constitucional, mais especificadamente
em controle concentrado de constitucionalidade. Ex.: Lei “A” foi revogada pela Lei “B”.
Posteriormente, o STF declara a inconstitucionalidade da Lei “B”, restaurando-se os efeitos da
norma revogada, já que a norma revogadora será considerada como nunca tivesse existido. É o
que preleciona o artigo 27 da Lei nº 9.868/99. A decisão de inconstitucionalidade é declaratória
e possui efeitos retroativos, ex tunc, concretizando-se com a chamada modulação dos efeitos
da decisão.
Há uma classificação de normas no art. 2º, §2° da LINDB em que se entende por norma
especial aquela que possui um conteúdo especializado dentro de um ramo do direito (por
exemplo, Lei de Alimentos, Código de Defesa do Consumidor). Já a norma geral aborda o
conteúdo de um ramo do direito de maneira geral.
A norma geral não revoga a especial e a norma especial não revoga a geral. Tais normas
caminharão conjuntamente. A norma especial pode revogar a geral de duas formas: de forma
explícita, ou então, de forma implícita. A revogação expressa ou explicita ocorre quando há
previsão de que a norma especial está revogando a geral. A revogação implícita, por sua vez,
acontece no momento em que regula a mesma matéria que a geral, modificando o seu
conteúdo.
Pode ser que uma lei especial contenha uma parte específica e outra parte geral que
também está disposta em um Código, sem que haja, entre elas, contradição. Nesse caso, ambas
continuarão em vigor, coexistindo.
Pelo fato lógico de que o legislador não consegue prever todos os acontecimentos,
seja para o presente seja para o futuro, e da mesma forma que o juiz não pode ser furtar ao seu
mister de julgar alegando ausência de norma legal sobre o assunto, é que existe o instrumento
de integração das normas, permitindo-se que haja o preenchimento de lacunas (CPC, art. 140).
Dispõe o art. 4º da LINDB: “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. O juiz não pode deixar de decidir
uma questão alegando que não existe norma regulamentadora para aquele caso em concreto
(julgamento non liquet). Trata-se do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.
O fenômeno da subsunção se perfaz no encaixe perfeito da norma ao caso concreto.
Contudo, na ausência da subsunção o juiz deverá se valer da analogia, dos costumes e dos
princípios gerais do direito. Com isso, não deixa nenhum caso sem solução.
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1.5.1. ANALOGIA
1.5.2. COSTUMES
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1.6. DA EQUIDADE
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A regra é que a lei não retroage, abarcando apenas as situações jurídicas criadas a
partir da sua vigência. Trata-se de um princípio que visa dar estabilidade e segurança ao
ordenamento jurídico, preservando situações já consolidadas sob a lei antiga, em que o
interesse particular deve prevalecer. Denomina-se de regra do tempus regit actum. Todavia,
essas regras não são absolutas, podendo sofrer mitigações no âmbito do Direito Penal, por
exemplo.
Observa-se, por fim, o art. 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal que determina: “a
lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Nessa mesma
linha, temos o disposto no art. 6º da LINDB que prevê: “a lei em vigor terá efeito imediato e
geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.
O ato jurídico perfeito e acabado é aquele que já se consumou perante a lei vigente do
tempo em que se efetuou. Pense em um contrato de compra e venda de bem imóvel, sem
escritura lavrada porque o imóvel tem valor de 28 salários vigentes (CC, art. 108) e com registro
realizado. Posteriormente ao ato, vem uma lei que altera a obrigação de lavrar escritura para os
negócios que tenham como objeto imóvel acima de 20 salários. Essa lei não vai atingir aquele
contrato celebrado.
A coisa julgada é a decisão que não comporta mais recurso, tendo atingido o trânsito
em julgado. Assim, uma lei nova não pode alterar aquilo que já foi apreciado em definitivo pelo
Poder Judiciário.
Sobre a coisa julgada é importante constar que consta o enunciado 109 da Jornada de
Direito Civil que diz: “a restrição da coisa julgada, oriunda de demandas reputadas
improcedentes por insuficiência de provas, não deve prevalecer para inibir a busca da
identidade genética pelo investigando”.
É possível que existam leis que se contrariem, aparentemente. Quando isso acontece
há uma antinomia. Diz-se aparentemente porque, em tese, o ordenamento jurídico é perfeito e
não apresenta tais conflitos. Não é o que acontece.
A antinomia pode ser aparente e real. A antinomia real ocorre quando duas leis são
exatamente conflitantes entre si. No caso desse conflito o sistema jurídico não traz uma solução,
devendo ser tal conflito resolvido pelo Poder Judiciário. O Código de Processo Civil, no art. 8º,
prevê que “ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do
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cumprirá sentença estrangeira no Brasil sem o devido exequatur, que é a permissão dada pelo
Superior Tribunal de Justiça, por meio de homologação, para que esta decisão produza seus
efeitos. É a homologação de sentença estrangeira.
Ainda sobre a sentença estrangeira, dispõe o art. 15 da LINDB que será executada no
Brasil a sentença proferida no estrangeiro, que reúna os seguintes requisitos: a) haver sido
proferida por juiz competente; b) terem sido as partes citadas ou haver legalmente se verificado
a revelia; c) ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a
execução no lugar em que foi proferida; d) estar traduzida por intérprete autorizado; e) ter sido
homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (corrigindo de ofício o erro da LINDB, pois lá ainda
consta a homologação pelo STF, modificação que ocorreu pela EC 45/2004).
Por fim, a sentença estrangeira poderá ser executada perante a Justiça Federal, de
primeira instância – art. 109, inciso X da CF. Quanto aos títulos executivos extrajudiciais
estrangeiros, estes não precisam ser homologados para serem executados no Brasil.
A LINDB ainda tratou da vigência da lei no espaço no que concerne às questões de
estado da pessoa. Com isso, A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre
o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família (LINDB, art.
7º).
No que tange ao casamento e ao regime de bens, realizando-se o casamento no Brasil,
será aplicada a lei brasileira quanto aos impedimentos dirimentes e às formalidades da
celebração. O casamento de estrangeiros poderá celebrar-se perante autoridades diplomáticas
ou consulares do país de ambos os nubentes.
Por fim, no que concerne ao direito sucessório, deve-se obediência à lei do país em
que domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos
bens (LINDB, art. 10). A sucessão de bens de estrangeiros, situados no País, será regulada pela
lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou de quem os represente,
sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do de cujus (LINDB, art. 10, § 1º). Por fim,
a lei do domicílio do herdeiro ou legatário regula a capacidade para suceder (LINDB, art. 10, §
2º).
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1.1. SOCIALIDADE
O Código Civil de 2002 visa atingir um maior número de pessoas, deixando de lado a
aplicação estrita ao indivíduo, passando a respeitar direitos sociais, e assim, exigir uma função
social, como a função social da propriedade (art. 5º, XXII e XXIII e art. 1.228, § 1º do Código Civil),
do contrato (art. 421), da posse e da empresa. A atividade, ainda que privada, deve considerar
em seu contexto a sociedade e não apenas os sujeitos do negócio. Exemplo que podemos citar:
a diminuição dos prazos para a usucapião, quando a pessoa ali exerce posse e trabalho; o
contrato nulo, quando ofende direito dos trabalhadores. Tanto é que a LINDB, no art. 5º, diz que
“na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum”.
Nelson Rosenvald e Cristiano Chaves defendem que esse princípio encontra-se
atrelado ao direito subjetivo. O direito subjetivo consiste no direito do indivíduo de agir
amparado pelo ordenamento jurídico com o objetivo de satisfazer um interesse legítimo. Para
esses doutrinadores, o direito subjetivo corresponde a uma função social. O sujeito ao agir
sempre age no interesse próprio, mas esse interesse individual não pode contrariar um direito
social, sob pena de perder força.
1.2. ETICIDADE
O Código Civil de 1916, de Beviláquia, não possuía preceitos éticos. O atual Código Civil
mudou isso, tanto que a atuação ética, proba, honesta é valor quase que supremo no Código
Civil de 2002. Prestigia-se a boa-fé objetiva. Abandona o formalismo do direito romano. Em
vários dispositivos do Código Civil, pode-se notar a presença do princípio da eticidade, a exemplo
dos art. 113 (negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa fé e os usos); art. 187
(abuso do direito que excede os fins econômicos e sociais) e, o principal, art. 422 que valoriza a
boa fé na conclusão e execução dos contratos.
A violação positiva do contrato é um reflexo da boa-fé objetiva na relação civil. Assim
a parte contratual que cumpre a obrigação pactuada, todavia, o faz com ofensa a boa-fé
objetiva, eleva a sua conduta contratual a um inadimplemento.
3 Esses três princípios foram tema de dissertação do concurso 180º de ingresso na carreira de Juiz Substituto do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
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E mais, a boa-fé não existe apenas no Direito Civil, estando presente no Direito
Processual Civil (art. 80, CPC), já que se exige a ética na condução dos processos, assim como
não alterar a verdade e evitar recursos procrastinatórios, sob pena de litigância de má-fé.
1.3. OPERABILIDADE
Entende-se que os ramos jurídicos diversos não podem se excluir quando da análise
de um caso concreto. Isso quer dizer que se mostra perfeitamente possível a complementação
entre os ramos jurídicos distintos, aplicando-se no caso concreto, sem exclusão mútua. Caso
mais comum é a aplicação harmônica entre o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil.
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2. DAS PESSOAS
Pessoa é todo aquele que titulariza direitos. Para a via processual, pode ser aquele que
ocupa tanto o polo ativo quanto o polo passivo de uma relação jurídica.
É comum ao se falar em pessoa logo imaginar a pessoa como ser humano. Todavia, no
direito civil a pessoa pode ser natural, ou física, ou então, jurídica ou coletiva.
Dispõe o art. 1º do Código Civil que “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na
ordem civil”. Ao nascer com vida, a pessoa adquire a personalidade jurídica, que nada mais é do
que a aptidão genérica para se titularizar direitos e deveres.
Diante disso, a pessoa adquire a personalidade jurídica ao nascer com vida, ou seja, ao
respirar. É o disposto no art. 2º, primeira parte, do Código Civil. Para tanto, existia o exame
denominado de docimasia hidrostática de Galeno. Esse método consistia em colocar o pulmão
do recém-nascido em recipiente com água. Se o pulmão boiasse, é porque entrou ar; com isso,
adquiriu personalidade jurídica. Se o pulmão afundasse, é porque não entrou ar, o que indica a
ausência de aquisição de personalidade jurídica. A relevância disso é auferida no direito das
sucessões, já que interfere na ordem da vocação hereditária.
Por fim, a personalidade jurídica coincide com a capacidade de direito, capacidade que
todos têm.
2.2. DO NASCITURO
4 STJ - REsp 1060515 / DF – Rel. Min. Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador Convocado do TJ/AP] – julgado
em 04/05/2010.
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espermatozoide do homem. Assim, ela acontece entre 11 e 21 dias após o primeiro dia da
menstruação.
Percebemos que, aos poucos, a teoria concepcionista ganhou mais espaço nos
Tribunais, inclusive na própria legislação brasileira, a exemplo da lei de alimentos gravídicos (Lei
nº 11.804/08) e de recentes decisões do STJ que admitiram o dano moral ao nascituro ou pela
morte de nascituro (AgRg no REsp 1341790/RS e REsp 931556 /RS) e até mesmo pagamento de
DPVAT a beneficiária que teve a gestação interrompida por acidente de trânsito (REsp
1.415.727-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 4/9/2014 – informativo de
jurisprudência nº 0547).
Para encerrarmos a questão do nascituro, ainda precisamos fazer alguns
apontamentos.
Nascituro é diferente do natimorto. O natimorto é o ser que nasce morto. Sobre o
natimorto, a nova roupagem que recebeu o Código Civil trouxe a ele alguns direitos que não
eram reconhecidos na vigência do Código Civil de 1916. Assim, a proteção que se confere ao
nascituro alcança o natimorto no que concerne aos direitos da personalidade, tais como: nome,
imagem e sepultura (isso com base na dignidade da pessoa humana e na eficácia horizontal dos
direitos fundamentais). É o que dispõe o Enunciado nº 1, da 1ª Jornada de Direito Civil.
Também não se pode confundir nascituro com o concepturo. O concepturo o ente que
nem concebido foi. Trata-se da prole eventual que, nos termos do direito sucessório (CC, art.
1.799, I), pode ser herdeiro testamentário.
Com o advento da Lei nº 11.105/2005, conhecida como lei da biossegurança, é preciso
tecer algumas considerações sobre o embrião. Essa lei tutela os direitos do embrião, reforçando
a adoção da teoria concepcionista.
O art. 5º da lei diz que é permitida a utilização de células-tronco embrionárias para fins
de pesquisa e terapia, obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não
utilizados no respectivo procedimento, desde que sejam embriões inviáveis; ou seja, embriões
congelados há 3 anos ou mais, na data da publicação da lei, ou que, já congelados na data da
publicação dessa lei, depois de completarem 3 anos, contados a partir da data de congelamento.
Ainda, para fins de utilização de embrião com o fito de pesquisa e uso terapêutico, a
lei autoriza tal utilização, desde que, em qualquer caso, seja indispensável o consentimento dos
genitores.
A utilização de células-tronco embrionárias é excepcional, pois a regra é a não
utilização. O STF considerou constitucional essa lei.
É importante expor que o descarte dos embriões não utilizados se dá pelo
encaminhamento às pesquisas de células-tronco. Isto é, não terá o embrião direitos da
personalidade. A existência dos direitos da personalidade é condicionada à concepção
intrauterina.
2.3. DA CAPACIDADE
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Capacidade de fato ou de exercício nem toda pessoa a tem. Ela traduz a aptidão para
a prática dos atos da vida civil. O absolutamente incapaz não a tem.
Quando um sujeito reúne as duas capacidades (de direito e de fato), ele atinge a
capacidade civil plena.
A capacidade plena não se confunde com a legitimação. Legitimação é a capacidade
especial para um determinado ato ou negócio jurídico. Ex.: necessidade de outorga conjugal
para vender o imóvel, sob pena de anulabilidade do contrato. Esta legitimação é conferida ao
cônjuge. Veja, o cônjuge varão é plenamente capaz, no entanto, não pode vender o bem imóvel
sem a outorga do outro, sob pena de faltar legitimação para o ato.
Em contraposição à capacidade, temos a incapacidade, que nada mais é do que a
ausência de capacidade de fato.
2.4. DA INCAPACIDADE
Os relativamente incapazes estão no rol do art. 4º do Código Civil, que assim vem
redigido:
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III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua
vontade;
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial.
O critério adotado pelo Legislador, nesse caso, é um critério misto, pois adota tanto o
critério biológico (objetivo) quanto o critério psicológico (subjetivo). Veja que no inciso I adota-
se o critério biológico. Nos demais o critério é o psicológico.
O surdo-mudo pode ser considerado um relativamente incapaz ou não. A pessoa surda
é capaz. No entanto, na hipótese dessa pessoa não conseguir manifestar sua própria vontade, é
que ela poderá ser considerada relativamente incapaz, nos moldes do art. 4º, inciso III, do
Código Civil.
No Código Civil de 1916, o ausente era considerado um relativamente incapaz. No
Código Civil de 2002, a ausência não se relaciona com a incapacidade, possuindo um rito próprio
para que se tenha a declaração de ausência e, com isso, dê procedência aos bens deixados pelo
ausente.
Em 2016 foi editada uma lei que trouxe o conceito do que é a primeira infância da
pessoa. A Lei nº 13.257/2016 regula alguns pontos interessantes sobre a questão da primeira
infância, que é tida nos 72 primeiros meses (6 anos) de vida da criança. Diante da lei, busca-se
o estabelecimento de políticas públicas para melhor desenvolvimento da criança nesses
primeiros meses de vida. Dispõe o art. 2º da referida lei que “considera-se primeira infância o
período que abrange os primeiros 6 (seis) anos completos ou 72 (setenta e dois) meses de vida
da criança”.
O pródigo é a pessoa que dissipa seus bens desvairadamente. Sobre o pródigo, importa
fazer uma ressalva sobre a modificação da visão do direito privado ao logo dos anos. Certa vez,
em uma prova de ingresso no concurso da Magistratura do Estado de São Paulo, o
Desembargador Examinador perguntou ao candidato: analise a interdição do pródigo na visão
do Código atual (2002) no cotejo com o Código anterior (1916).
O que justifica a interdição do pródigo é a proteção do mínimo vital para a sua
sobrevivência. Não somente, a proteção do patrimônio mínimo, corolário do princípio da
dignidade humana. Assim, verifica-se o cunho social da intervenção (princípio da socialidade).
No Código Civil de 1916, a finalidade era estritamente patrimonialista, sem se preocupar com a
pessoa do pródigo. Simplesmente preservar o patrimônio para os herdeiros. Essa modificação
de visão é que deu outra roupagem ao direito civil moderno.
Por fim, sobre os índios, é preciso apenas fazer uma pequena observação, no mesmo
sentido que foi feita em relação ao surdo mudo.
No Código Civil de 1916, os índios eram denominados de “silvícolas” e considerados
relativamente incapazes, simplesmente por serem índios. Com o novo modelo de código, o
Código Civil de 2002 passou a prever que a capacidade dos índios é regida por legislação
específica (CC, art. 4º, parágrafo único).
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A Lei nº 6.001/73 que trabalha o Estatuto do Índio estabelece, no art. 8º, que o índio
não inserido na sociedade, caso pratique algum ato, esse ato será nulo. Por outro lado, caso o
índio esteja inserido na sociedade, os atos serão válidos.
A FUNAI (Fundação Nacional do Índio) é o órgão público encarregado de proteção dos
direitos dos índios.
A Lei nº 13.146/2015 entrou no nosso sistema jurídico em julho de 2015, teve período
de vacatio legis de 180 dias, tendo em vista a grande repercussão no mundo jurídico. Sua criação
teve por finalidade dar maior proteção às pessoas com deficiência.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência revolucionou nosso sistema de incapacidade,
conferindo maiores oportunidades às pessoas com deficiência, inclusive, para atuarem no
mundo cível com maior de liberdade.
Em virtude disso, antes da entrada em vigor da Lei n° 13.146/2015, as pessoas que
tinham discernimento reduzido eram chamadas de relativamente incapaz, ao passo que,
aqueles que não tinham qualquer discernimento, eram denominados de absolutamente
incapaz.
Hodiernamente, a pessoa com deficiência, pela simples deficiência, não é considerada
incapaz, podendo atuar nos atos da vida civil e tomar decisões.
Portanto, a pessoa com deficiência possui capacidade civil plena.
É claro que, na prática, a pessoa com deficiência, ainda possui certa vulnerabilidade
necessitando de atenção especial. A lei não ficou indiferente a essa situação, criando uma
divisão de atos a serem praticados por eles.
Desta forma, entende-se que a pessoa com deficiência não precisa estar amparada por
curador quando estiver diante da prática de atos existenciais, uma vez que é capaz. Assim, para
alterar seu nome ou para casar não precisa do curador. O art. 6º da lei traz essa menção quando
elenca atos, de forma exemplificativa, que podem ser praticados sem que isso afete a plena
capacidade.
Contudo, quando o ato tiver cunho patrimonial, há a necessidade do curador para a
proteção da pessoa com deficiência. O art. 85 da lei deixa isso claro quando diz que: “a curatela
afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial”.
Nesse sentido, também foi editado um enunciado pela Jornada de Direito Civil
(Enunciado 138 da JDC), que diz: “a vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese do inciso
I do artigo 3°, é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles
concernentes, desde que demonstrem discernimento suficiente”.
Conclui-se, assim, que a curatela ainda persiste no nosso ordenamento jurídico. No
entanto, nos termos do art. 84, §3º, do Estatuto da Pessoa com Deficiência, a definição de
curatela de pessoa com deficiência constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às
necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível.
Outra questão relevante que foi introduzida pelo Estatuto é a tomada de decisão
apoiada.
A tomada de decisão apoiada encontra-se prevista no art. 1.783-A do Código Civil. É o
processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as
quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de
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decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para
que possa exercer sua capacidade.
A doutrina civilista afirma que essa decisão é, efetivamente, “apoiada”. Somente é
possível ter tomada de decisão apoiada se a pessoa a ser apoiada tiver o mínimo de
discernimento. A decisão não é substituída, ou seja, a decisão final será da pessoa que está
sendo apoiada.
Os limites do apoio estarão inseridos no termo, inclusive prazo de vigência do acordo,
conforme §1º do 1.783-A do Código Civil, in verbis:
5 Súmula 358 do STJ: O cancelamento de pensão alimentícia de filho que atingiu a maioridade está sujeito à decisão
judicial, mediante contraditório, ainda que nos próprios autos.
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2.5.1. DA EMANCIPAÇÃO
A emancipação é a antecipação dos efeitos da maioridade. Ela está prevista no art. 5º,
parágrafo único, do Código Civil, podendo ser voluntária, legal ou judicial.
A emancipação somente pode acontecer para os maiores de 16 anos de idade, mesmo
nas hipóteses de emancipação legal. No caso do casamento é preciso fazer apenas uma
observação. A regra é a de que o casamento só pode ser contraído por quem tenha a idade núbil.
Essa é atingida aos 16 anos de idade. Portanto, mesmo no caso de emancipação pelo casamento,
é necessário ter 16 anos de idade.
Por fim, é interessante, antes de ingressar nas formas de emancipação, falar sobre a
emancipação e a permissão para conduzir veículo automotor.
Embora o emancipado esteja, com a emancipação, apto a praticar os atos da vida civil,
podendo, inclusive, comprar um carro, não poderá conduzi-lo. Isso porque o Código de Trânsito
Brasileiro, no art. 140, I, diz que é requisito para adquirir a habilitação ser penalmente imputável,
ou seja, enquanto a maioridade penal for atingida apenas aos 18 anos de idade, somente com
essa idade a pessoa pode dirigir.
A emancipação judicial acontece em uma única hipótese, qual seja, quando concedida
a pedido do tutor. É necessária a oitiva do tutor e do Ministério Público.
6 Enunciado nº 03, da I Jornada CJF: Art. 5º: “a redução do limite etário para a definição da capacidade civil aos 18
anos não altera o disposto no art. 16, I, da Lei n. 8.213/91, que regula específica situação de dependência econômica
para fins previdenciários e outras situações similares de proteção, previstas em legislação especial”.
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Por fim, a emancipação legal acontece nas hipóteses trazidas pelo Código Civil, sendo
aquelas previstas no art. 5º, parágrafo único, II, III, IV e V do Código Civil, ou seja, pelo
casamento, pelo exercício de emprego público efetivo, pela colação de grau em curso de ensino
superior, e por fim, por ser titular de estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de
relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 anos completos tenha
economia própria.
Sobre a emancipação legal é preciso pontuar:
a) economia própria é um conceito vago, que será interpretado no caso concreto. É a
aplicação efetiva da teoria das janelas abertas;
b) não há homologação judicial na emancipação legal, basta a ocorrência dos fatos
previstos em lei;
c) em relação ao casamento como hipótese de emancipação legal, não se aplicará nos
casos de união estável. Isso porque, a união estável não possui o fato constitutivo, como se tem
no casamento. Havendo divórcio, o menor não retorna ao estado de incapaz, no entanto, se o
casamento for considerado nulo ou inválido, o menor voltará à condição de incapaz. Ademais,
em se tratando de casamento putativo (casamento nulo ou anulável contraído de boa-fé por um
ou ambos os nubentes) a pessoa permanece da condição de capaz;
d) a hipótese de emprego público efetivo, previsto no Código Civil, tornou-se um
dispositivo inócuo, pois atualmente é necessário ter 18 anos para esse tipo de emprego.
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Dispõe o art. 7º, incisos I e II, Código Civil, que pode ser declarada a morte presumida,
sem decretação de ausência, se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo
de vida, ou então, se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for
encontrado até dois anos após o término da guerra7. Na primeira hipótese temos os casos
recentes de tragédias envolvendo as companhias aéreas, como Air France; Air Malasia, barragem
de Brumadinho, dentre outros.
É importante constar que a declaração da morte presumida, nesses casos, somente
poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a
data provável do falecimento. Para que o juiz profira essa sentença é preciso que haja o
procedimento de justificação.
7 Para os amantes de filme, esse caso reflete exatamente o narrado no Rambo II, a missão, com o autor sylvester
stallone. Nesse filme o Rambo resgata prisioneiros da guerra do Vietnã.
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poderá ser requerida a abertura da sucessão definitiva. Isso porque a idade do ausente traz uma
presunção de que as chances de sobrevivência dessa pessoa são mínimas. Desta forma, as
medidas protetivas do seu patrimônio também poderão ser mitigadas.
2.6.3. DA COMORIÊNCIA
O Código Civil não exauriu todos os direitos da personalidade, podendo existir outros
esparsos pelo ordenamento jurídico. Os direitos autorais é um exemplo que pode ser
mencionado de um direito da personalidade não previsto no Código Civil.
Nesse sentido foi editado o enunciado 274 da Jornada de Direito Civil que diz:
O enunciado representa muito bem a Escola do Direito Civil Constitucional que procura
analisar o direito privado a partir da Constituição Federal e dos seus princípios fundamentais.
O artigo 11 do Código Civil menciona que “com exceção dos casos previstos em lei, os
direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício
sofrer limitação voluntária”.
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O referido artigo trabalha com mais uma das características dos direitos de
personalidade, o qual não consta no rol já mencionado. Desse modo, quando falamos em
intransmissível e irrenunciável, tem-se que os direitos de personalidade são indisponíveis.
Todavia, tais características não estão revistas de caráter absoluto. Significa que em algumas
situações pode-se dispor desses direitos de personalidade.
A parte destacável dos direitos da personalidade é aquela de cunho patrimonial,
realizada mediante um contrato, que tem que respeitar a sua função social. Essa parte disponível
tem um limite temporal e moral, ou seja, a disponibilidade não pode ser eterna e não pode
ofender a moral e os bons costumes, além de não atentar contra a dignidade humana. Aqui, não
tem como não lembrar do famoso caso de arremessos de anão na França8.
Além disso, o contrato que trata dessa parte destacável tem que respeitar a eficácia
interna da função social, ou seja, entre as partes do contrato é preciso que haja um respeito aos
interesses sociais.
A Jornada de Direito Civil da Justiça Federal editou três enunciados sobre o tema, sendo
o 49, 2310 e 36011.
O Código Civil prevê a proteção dos direitos da personalidade em seu art. 12. Os
direitos da personalidade são protegidos pelos princípios da prevenção e da proteção integral
dos danos. Pelo princípio da prevenção inibe-se, por meio da tutela inibitória o nascimento do
ilícito. É a busca e apreensão de uma revista que está prestes a publicar uma reportagem que
ofende a honra de uma pessoa. Todavia, quando o ilícito já produziu seus efeitos, a proteção é
por meio da tutela ressarcitória ou reparatória. Inclusive, permite-se que o juiz, de ofício, fixe
tutela específica para a proteção dos direitos da personalidade, como é o caso de astreintes.
Nesse sentido, o enunciado 140 da Jornada de Direito Civil traz que “a primeira parte do art. 12
do Código Civil refere-se às técnicas de tutela específica, aplicáveis de ofício, enunciadas no art.
461 do Código de Processo Civil, devendo ser interpretada com resultado extensivo”.
Por fim, mister se faz tecer considerações acerca da existência de conflito de direitos
da personalidade, como um possível conflito entre a honra e a informação; liberdade de
imprensa e privacidade; direito de crença e a vida, dentre outros. Diante desses conflitos, e
sabendo que um direito não se sobrepõe ao outro, é preciso socorrer-se ao método da
ponderação de princípios.
Os direitos fundamentais não possuem natureza, e assim, devem ser vistos diante do
caso concreto e dos argumentos fornecidos pelas partes envolvidas. Dessa forma, evidencia-se
a necessidade de se ponderar para se chegar a solução do conflito. A ponderação nada mais é
do que atuar com proporcionalidade diante do caso posto.
Na opinião do Ministro do STF Luís Roberto Barroso, a ponderação é uma “técnica de
decisão jurídica, aplicável a casos difíceis, em relação aos quais a subsunção se mostrou
insuficiente”. Assim, em breve resumo, a ponderação é o método de redução proporcional de
8 O arremesso de anões foi proibido na pequena cidade francesa de Morsang-sur-Orge em 1992, e o caso passou
pelas cortes administrativas de apelação por iniciativa do dublê Manuel Wackenheim – que ganhava a vida como
arremessado – até chegar ao Conselho de Estado, que em 1995 decidiu que uma autoridade municipal poderia proibir
a prática sob a alegação de que ela não respeitava a dignidade humana, sendo, portanto, contrária à ordem pública;
levando à sua proibição (https://pt.wikipedia.org].
9 O enunciado 4 CJF/STJ: O exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não
o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses
metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana
11 Enunciado 360 CJF/STJ da IV jornada: O princípio da função social dos contratos também pode ter eficácia interna
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Dispõe o art. 13, caput e parágrafo único, do Código Civil que, salvo por exigência
médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente
da integridade física, ou contrariar os bons costumes. O ato de disposição será admitido para
fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial.
O Código estabelece que essa disposição do corpo de forma permanente é vedada,
salvo se existir uma exigência médica nesse sentido. Caso não exista exigência médica, não há
de que se falar em disposição de parte do corpo vivo de forma permanente, salvo para fins de
transplante.
Nesse ponto, não há como não se falar em transgenitalização. Trata-se do
procedimento cirúrgico que possibilita a retirada de parte do corpo, especificadamente órgão
genital, para a pessoa se transformar no sexo e incorporar a personalidade que acredita possuir.
São denominados de wannabes (essa expressão decorre da língua inglesa, que significa “I want
to be”, e que traduzida para o português significa “eu quero ser”), ou seja, pessoas que possuem
um sexo, mas que querem possuir outro.
O transexualismo, no meio médico, é uma patologia, visto que a pessoa tem um desvio
psicológico permanente de sua sexualidade. Isto é, o sujeito rejeita o fenótipo. Não somente,
segundo o Conselho Federal de Medicina, teria o sujeito uma sujeição à automutilação ou
autoextermínio.
Com isso, entende-se que somente com autorização de um médico, após sessões com
psiquiatra, é que seria autorizada a realização da cirurgia de mudança de sexo.
Nesse caso, haveria a recomendação médica para cirurgia do transexual. Existem
movimentos científicos que pretendem considerar o transexualismo uma condição sexual.
Com a alteração do sexo surge uma questão jurídica a ser resolvida, qual seja, o registro
civil da pessoa, seja no aspecto do gênero seja no nome da pessoa. Com isso, inicialmente, o
Poder Judiciário vinha entendendo que a alteração do gênero e do nome, incluindo o prenome,
era medida a ser adotada para àqueles que procedessem a alteração do sexo.
Todavia, recentemente o STF possibilitou aos transgêneros a possibilidade de alteração
do registro civil sem a mudança de sexo. A decisão ocorreu no julgamento da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 4275, em março de 2018. Todos os ministros da Corte reconheceram
o direito, e a maioria entendeu que, para a alteração, não é necessária autorização judicial.
Assim, o STF não apenas reconheceu o direito de mudança do registro civil (gênero e nome) sem
cirurgia, mas também, sem necessidade de ordem judicial.
Com isso, foi a ação julgada procedente para dar à Lei dos Registros interpretação
conforme a Constituição Federal e pactos internacionais que tratam dos direitos fundamentais,
a fim de conceder aos transgêneros que desejarem o direito à alteração de nome e gênero no
assento de registro civil, independentemente da cirurgia.
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Dispõe o art. 15 do Código Civil que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se,
com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”.
Significa que no caso em que o paciente, ao ser previamente esclarecido do risco do
procedimento, tem o direito potestativo de se negar a realizar o procedimento cirúrgico, sem
que, com isso, atraia a responsabilidade civil do médico. Tanto é que o STJ entendeu que a
internação forçada do paciente, ainda que por decisão dos pais, é descabida, configurando
constrangimento ilegal13.
O caso ganha contornos diversos quando o paciente, diante de um caso grave, não tem
condições de manifestar sua vontade. Nessas hipóteses o médico tem o dever de realizar o
procedimento cirúrgico tentando salvar a vida da pessoa humana.
AVI Jornada de Direito Civil aprovou o Enunciado 533, dizendo que o paciente
plenamente capaz pode deliberar sobre todos os aspectos concernentes ao tratamento médico
12 O art. 14 do Código Civil, ao afirmar a validade da disposição gratuita do próprio corpo, com objetivo científico ou
altruístico, para depois da morte, determinou que a manifestação expressa do doador de órgãos em vida prevalece
sobre a vontade dos familiares, portanto, a aplicação do art. 4º da Lei n. 9.434/97 ficou restrita à hipótese de silêncio
do potencial doador.
13 STJ - HC 35301/RJ – Ministra Relatora Nancy Andrhi.
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que possa lhe causar algum risco de vida, seja imediato ou mediato, salvo as situações de
emergências no curso de procedimentos médico e cirúrgicos que não possam ser interrompidos.
Por último, a grande questão polêmica sobre esse dispositivo legal é o conflito que
pode surgir entre a crença religiosa e o direito à vida. Sabe-se que os seguidores da cresça
denominados de testemunha de Jeová, não aceitam, em hipótese nenhuma, a transfusão de
sangue. Assim, imagine a situação da testemunha de Jeová que, inconsciente, chega ao pronto
socorro, estando entre a vida e morte, precisando de transfusão de sangue. Nessa hipótese deve
ser aplicado o método da ponderação, critério utilizado para resolver conflitos entre princípios.
Nessa senda, conforme posição majoritária na jurisprudência, deve o médico salvar a vida, bem
maior protegido pela Constituição Federal.
Desta forma, o direito à liberdade de crença não é absoluto, ele pode ser limitado se
ofender outro direito fundamental garantido na Constituição, como o direito à vida.
O TJSP já julgou demanda em que a testemunha de Jeová ingressou com ação judicial
contra o médico que a salvou. Segundo o TJSP14 não há que se falar em exercício regular das
próprias funções, modalidade de exercício regular de direito (Código Civil, artigo 188, I).
Para finalizar, existe doutrina que diz que a Jornada de Direito Civil foi contra a posição
exposta acima, editando o Enunciado 403. Ao contrário, o enunciado reforma a posição expressa
no art. 15, ou seja, a pessoa consciente, alertada do risco do procedimento, tem o direito de
decidir em prol da cresça religiosa e se negar a realizar o procedimento de transfusão de sangue.
Segue a redação do enunciado:
2.7.5. DO NOME
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15 STJ - REsp 1.304.718-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 18/12/2014, DJe 5/2/2015 –
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Pela leitura do dispositivo legal podemos extrair que, nos casos de interesse da ordem
pública e de interesse da administração da justiça, o direito de imagem da pessoa pode ser
utilizado sem necessidade de autorização. Ordem pública e administração da justiça são
cláusulas gerais, ou seja, é o Juiz quem vai dizer, no caso concreto, se fica autorizada a divulgação
dessa imagem da pessoa sem a sua autorização.
Nos demais casos, a autorização de seu titular é imprescindível. Não havendo
autorização, é possível aplicar o princípio da prevenção, impedindo que novas publicações sejam
feitas, bem como o princípio da reparação integral do dano, de forma que, caso haja violação,
deverá reparar o dano.
Outra questão é que, pelo dispositivo legal, somente pode proibir a utilização da
imagem sem autorização, caso ela atinja a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se
destinarem a fins comerciais. Essa interpretação é equivocada do ponto de vista doutrinário e
jurisprudencial. Isso porque, atualmente, em razão da relevância da dignidade humana e dos
princípios fundamentais, a proibição pode ocorrer em qualquer caso quando não exigir
autorização. A natureza da utilização da imagem é que vai ser analisada para gerar ou não
indenização. Assim, se a utilização sem autorização atingir a honra, a boa fama ou a
respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais, nascerá o direito de indenizar. Se não
houver essa ofensa, apenas existe o direito de evitar a publicação ou de retirá-la de circulação.
Sobre o dever de indenizar, quando o uso da imagem atingir a honra, a boa fama ou a
respeitabilidade, cabe ao ofendido comprovar o prejuízo. É ônus do detentor do direito de
imagem. É claro que o Juiz tem sensibilidade para analisar se a utilização de imagem de alguém
ofende a honra, boa fama ou respeitabilidade, não sendo um ônus probatório árduo.
No entanto, em se tratando da publicação de imagem de pessoa não autorizada, com
fins econômicos ou comerciais, o prejuízo é presumido, gerando um dano in re ipsa. Nesse
sentido, a Súmula 403 do STJ diz que “independe de prova do prejuízo a indenização pela
publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.”
Em relação às pessoas públicas, não se desconhece que tais cidadãos também são
detentores de direito de imagem. Todavia, o direito de imagem dessas pessoas sofre uma
mitigação em razão do interesse público e do direito de informação. Desta forma, o STJ
entendeu, em caso envolvendo a pessoa pública, que o seu direito de imagem não pode ser
proibido desde que haja compromisso ético com a informação verossímil, que se preserve os
direitos da personalidade, entre os quais se incluem os direitos à honra, à imagem, à privacidade
e à intimidade, e por fim, que se vede a veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar,
injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi). Entendeu que
a princípio, não configura ato ilícito as publicações que narrem fatos verídicos ou
verossímeis, embora eivados de opiniões severas, irônicas ou impiedosas, sobretudo
quando se trate de figuras públicas que exerçam atividades tipicamente estatais,
gerindo interesses da coletividade, e a notícia e a crítica referirem-se a fatos de
interesse geral relacionados à atividade pública desenvolvida pela pessoa
noticiada17.
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A intimidade e a vida privada da pessoa humana angariam proteção pelo Código Civil,
como se nota do art. 21 do Código Civil, in verbis: “a vida privada da pessoa natural é inviolável,
e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou
fazer cessar ato contrário a esta norma”.
Existe diferença entre vida privada e intimidade. A vida privada é um núcleo restrito da
vida social da pessoa que ela abre apenas para um grupo seleto de pessoas, enquanto a
intimidade é aquele momento íntimo da pessoa, ou seja, núcleo mais restrito ainda.
No que concerne a proteção, ambos possuem o mesmo peso, tendo a mesma
proteção. Na visão do ato ilícito, o que a faz diferenciar uma da outra é no quantum
indenizatório, sendo que a indenização é maior quando se viola a intimidade.
Mesmo o direito à vida privada e à intimidade não são revestidos de caráter absoluto.
Anderson Schreiber diz que é necessária a ponderação. Um exemplo claro de ponderação de
vida privada é a segurança, por exemplo. No caso do aeroporto, quando se coloca a bagagem no
raio-x, o agente da Infraero visualiza tudo. Todavia, nesse caso, o direito à segurança se sobrepõe
ao direito à privacidade.
Ainda dentro do tema da intimidade e da vida privada encontra-se o a questão da
biográfica. A biografia é um gênero literário em que o autor narra a história da vida de uma
pessoa ou de várias pessoas (conceito retirado da Wikipédia).
Sobre a biografia, surgiu uma discussão jurídica sobre a necessidade ou não de
autorização do personagem principal para que sua vida seja narrada.
O STF, por unanimidade, julgou procedente uma ADIN18, para dar interpretação
conforme a Constituição aos arts. 19 e 20 do Código Civil, sem redução de texto. O STF declarou
inexigível o consentimento da pessoa biografada. Ou seja, ela não tem que autorizar para que
sua vida seja contada. É igualmente desnecessária a autorização das pessoas que sejam
coadjuvantes na biografia, bem como aquelas que tenham morrido, mas que foram
mencionadas.
Além disso, o Supremo reafirmou que o direito à inviolabilidade, da privacidade,
intimidade, da honra e da imagem da pessoa, caso haja lesão aos seus direitos, deve-se haver a
reparação dos danos.
Outra questão polêmica é a publicidade do salário do servidor público. A publicação da
folha de pagamento de um determinado servidor público ofende a sua intimidade (ou vida
privada)? O TJDFT19 julgou um caso em que determinada imprensa escrita publicou uma
reportagem expondo o salário de um servidor da Câmara dos Deputados. Esse Analista ingressou
com ação dizendo que aquela publicidade ofendeu a sua intimidade, pois a partir de então
familiares passaram a pedir dinheiro emprestado, além de despertar a cobiça de vizinhos.
Nota-se que há forte corrente que entende que o salário do servidor público é pago
pela sociedade, tendo ela interesse e direito de conhecer quanto que o servidor recebe e se
estão observando os ditames legais. Assim, entende-se que a simples publicidade de salário, sem
exposição de descontos da vida pessoal, e sem falácias, não configura ato ilícito.
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O § único do artigo 20 do Código Civil, assim como o § único do artigo 12, reconhecem
direitos da personalidade do morto, havendo legitimidade dos lesados indiretos. A lesão a
direito da personalidade atinge tanto o morto quanto os seus parentes (dano em ricochete). É
uma das hipóteses excepcionais em que se admite a transmissão de direitos personalíssimos.
A única observação que deve ser lembrada, embora retórica, é a de que, não obstante
se tenha esquecido da pessoa do companheiro, em razão da interpretação pacífica que se faz
sobre o Código Civil, tem ele legitimidade, ao lado do cônjuge. Nesse sentido, existe o Enunciado
275 da IV Jornada de Direito Civil.
A pessoa jurídica, tida como ente fictício, tem alguns dos direitos da personalidade,
como ser observa do art. 52 do Código Civil, que assim se encontra redigido: “aplica-se às
pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”.
Quando falamos em dano moral a pessoa jurídica, a mesma se justifica na ofensa a
honra objetiva. A honra objetiva pode ser compreendida como o juízo que terceiros fazem acerca
dos atributos de alguém. A honra subjetiva, noutro giro, se revela no sentimento que a pessoa
tem dela mesma.
Realmente, a pessoa jurídica tem alguns dos direitos da personalidade, caso do nome,
da honra objetiva (repercussão social da honra) e da imagem. No entanto, não tem ela
sentimento próprio, uma vez que se trata de um ente fictício. Por isso, prevê a súmula 227 do
STJ que a pessoa jurídica pode sofrer dano moral (nunca em relação à honra subjetiva, pois a
Pessoa Jurídica não tem sentimento).
Por fim, é importante constar que a pessoa jurídica de direito público não tem direito
a indenização por danos morais relacionados à violação da honra ou imagem. É o que decidiu o
STJ20.
20
STJ - REsp 1.258.389/PB.
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Muito se discute sobre a teoria adotada pelo Código Civil no que concerne a criação
das pessoas jurídicas.
O Código Civil adotou a teoria da realidade técnica. Essa teoria é uma junção de outras
duas teorias, a teoria da ficção, idealizada por Savigny, e, ainda, a teoria da realidade orgânica,
criada por Otto Gierke.
Por essa teoria afirma-se que a pessoa jurídica teria existência real, não obstante a sua
personalidade ser conferida pelo direito. Uma vez personificada pelo direito, a pessoa jurídica
passa a ter a atuação social na condição de sujeito de direito. Não se olvida que a personalidade
jurídica, uma vez concedida pelo direito, passa a ter ela uma função social, atendendo, assim, ao
princípio da socialidade, um dos pilares do Código Civil de 2002.
A teoria da realidade técnica se revela, basicamente, no artigo 45 do Código Civil, que
assim dispõe:
Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do
ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização
ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por
que passar o ato constitutivo.
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Matheus Zuliani
estabelecidos no estatuto social, obrigam a pessoa jurídica, que deverá cumpri-los. Contudo, se
o presentante extrapolar estes poderes, responderá pessoalmente por este excesso.
Para essas circunstâncias, temos a chamada teoria intra viris societatis e ultra vires
societatis.
A teoria intra viris societatis ocorrerá, quando a pessoa natural que a administra, o
sócio, atua de acordo com o previsto no ato constitutivo. Tais atos vinculam a pessoa jurídica. O
ato ultra vires societatis ocorrerá quando o sócio extrapola os poderes que lhes foram
concedidos através do contrato social, como consequência, o próprio sócio responde pelos atos
praticados. Não vincula a pessoa jurídica.
A questão do ato intra e ultra vires é bastante pertinente, no que tange à
desconsideração da personalidade jurídica. Isso porque quando o sócio pratica um ato intra vires
e não possui condições de arcar com essa responsabilização, ocorrerá o fenômeno da
desconsideração da personalidade jurídica (CC, art. 50).
Em regra, a pessoa natural é a indicada no ato constitutivo da pessoa jurídica. Na sua
omissão, a presentação será exercida por seus diretores. Se a pessoa jurídica tiver administração
coletiva, as decisões serão tomadas pela maioria dos votos, salvo se o ato constitutivo dispuser
de modo diverso (CC, art. 48).
O art. 53 diz que se constituem as associações pela união de pessoas que se organizem
para fins não econômicos. Por fins não econômicos entende-se pela ausência de finalidade
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lucrativa. Isso não significa que a pessoa jurídica não possa angariar dinheiro, o que é proibido é
a distribuição de dividendos.
Geralmente o estatuto de uma associação prevê, no que se refere à sua estrutura, uma
diretoria, uma presidência, um conselho fiscal, um conselho administrativo. No entanto, o órgão
máximo de toda e qualquer associação é a sua assembleia geral, cuja atribuição está delineada
no art. 59 do Código Civil, sendo resumidamente a destituição de administradores e a alteração
de estatuto.
Para as deliberações a que se referem os incisos do art. 59 é exigido deliberação da
assembleia especialmente convocada para esse fim, cujo quórum será o estabelecido no
estatuto, bem como os critérios de eleição dos administradores.
Em uma associação não existe entre os associados direitos e obrigações recíprocos.
Isso porque não há intuito de lucro. A diferença entre a associação e a sociedade é a de que
aquela não tem fins lucrativos e a sociedade sempre tem fins lucrativos. A diferença entre
associação e a fundação é a de que aquela é um conjunto de pessoas e a esta é um conjunto de
bens.
O Código Civil dispõe que dentro da associação deverão os associados ter iguais
direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens especiais. Quem não lembra
do sócio remido do clube. O que não se admite é que dentro de uma mesma categoria de sócios
haja diferenciação entre eles.
Há uma discussão sobre a intransmissibilidade da qualidade de associado. Dispõe o art.
56 do Código Civil que a qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o
contrário. Trata-se de uma definição de natureza personalíssima (intuito personae) da qualidade
de sócio. Todavia, essa característica não se reveste de natureza absoluta, podendo o estatuto
autorizar a transmissão.
No que tange as associações, é importante ressaltar sobre a possibilidade da expulsão
do associado. Explica o art. 57 do Código Civil que “a exclusão do associado só é admissível
havendo justa causa, assim reconhecida em procedimento que assegure direito de defesa e de
recurso, nos termos previstos no estatuto”.
A exclusão do associado só é possível se houver justa causa. Mesmo assim, é preciso
que a exclusão seja decorrente de um procedimento que assegure ampla defesa e recurso, nos
termos previstos no estatuto. Há, aqui, uma aplicação da eficácia horizontal dos direitos
fundamentais.
Outro tema importante envolvendo as associações é a possibilidade de cobrança de
taxa de manutenção criada por associações de moradores. Quando se envolve um bairro de uma
cidade a questão é simples, que não se associa não pode ser obrigado a pagar a referida taxa.
No entanto, a questão ganha contornos complexos quando se está diante de um condomínio de
fato, ou seja, irregular.
A matéria chegou ao Supremo Tribunal Federal que decidiu pela não obrigatoriedade
de pagamento se a pessoa não aderiu à associação. Sustenta que a Constituição Federal, em seu
art. 5°, incisos II e XX, não aceita a adesão compulsória à associação. Ademais, pelo fato da
associação de moradores não ser igual à associação de condôminos, a imposição compulsória
da mensalidade é ilegal, vez que a obrigação tem como fonte a lei ou a declaração de vontade.
Se não há amparo em nenhuma dessas duas fontes só resta reconhecer a mensalidade dentro
do campo da ilicitude. Assim, não está obrigado ao pagamento da mensalidade imposta pela
associação dos moradores aquele que não aderiu. O STJ firmou, em sede de repetitivo, a tese
(882) de que a taxa de manutenção não é obrigatória, com fundamento na Constituição Federal
de que ninguém é obrigado a associar-se (REsp 1439163 / SP).
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Matheus Zuliani
Por fim, não há como não tratar do tema da dissolução da associação. O tema vem
delineado no art. 61 do Código Civil. Se for dissolvida a associação, o patrimônio líquido
remanescente será destinado à entidade de fins não econômicos designada no estatuto. Caso o
estatuto seja omisso, os associados irão deliberar a respeito. O remanescente poderá ser
destinado à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.
Existe discussão em que se considera nula a previsão no Estatuto que determina que
nos casos de dissolução da associação, o patrimônio vai ser rateado entre os associados, eis que
haveria um esbarrar na vedação de lucro. Bastaria pensar numa associação que cresceu muito e
que tenha um patrimônio de 100 milhões de reais com 100 associados.
Maria Helena Diniz comenta que se a finalidade da associação não for altruística, “o
associado poderá receber uma quota de liquidação daquele acervo social, ante seu direito de
participante no patrimônio comum, de quota ideal, conforme os fins da associação, exceto se o
estatuto prescrever o contrário” (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – Editora
Saraiva).
Os que discordam dessa posição defendem que inexiste
21
Apelação Cível n. 994.09.287598-8, pela 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo – julgado
em 5/8/2010.
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63
Matheus Zuliani
O art. 64 do CC diz que constituída a fundação, num negócio jurídico entre vivos, o
instituidor é obrigado a transferir à fundação a propriedade, ou outro direito real, sobre os bens
dotados. Caso não o faça, os bens serão registrados em nome da fundação por mandado judicial.
A elaboração do estatuto é submetida à apreciação do Ministério Público, eis que ele
fiscaliza a fundação, cabendo a ele a função de aprovar a elaboração. No entanto, pode ser que
o Ministério Público tenha que, ele próprio, elaborar o estatuto. Isso acontece quando o estatuto
não é elaborado dentro do prazo assinado pelo instituidor, ou, não havendo prazo, em cento e
oitenta dias. É o que dispõe o art. 65, parágrafo único, do Código Civil. Nesse caso, a quem cabe
a aprovação do estatuto elaborado pelo Ministério Público? Caso o Ministério Público elabore o
estatuto, o art. 764, II do Código de Processo Civil estabelece que deverá o mesmo ser aprovado
pelo juiz.
É importante constar que Pablo Stolze critica essa norma. Ele defende que isso escapa
da função jurisdicional. Se o juiz aprovar um estatuto, ele não poderá julgar as lides que
envolvam esse estatuto, pois ele o aprovou. Assim, a aprovação do estatuto não parece ser uma
função jurisdicional.
Sobre a atribuição fiscalizatória do Ministério Público, explica o Código Civil, no art. 66,
que velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde estão situadas. Se funcionarem
no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao Ministério Público do Distrito Federal.
Se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao
respectivo Ministério Público. Quando se tratar de fundações instituídas ou mantidas pela União,
autarquia ou empresa pública federal, ou que destas recebam verbas, poderá o Ministério
Público Federal atuar22.
A alteração das normas estatutárias de uma fundação somente é possível pela
deliberação de 2/3 dos competentes para gerir e representar a fundação. Além disso, esta
alteração não pode contrariar ou desvirtuar o fim desta. Ademais, quando a alteração não se der
por votação unânime, os administradores, ao submeterem o estatuto à análise do Ministério
Público, irão requerer que seja cientificada a minoria vencida para impugnar a votação se quiser,
em 10 dias.
Por fim, tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou
vencido o prazo de sua existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe
promoverá a extinção, incorporando-se o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato
constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual
ou semelhante. É o art. 69 do Código Civil tratando da extinção da fundação.
2.9. DO DOMICÍLIO
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O Código Civil admite a pluralidade de domicílios, ou seja, a pessoa poderá ter duas ou
mais residências, o qual ela viva alternadamente, considerando-se domicílio seu qualquer delas.
É o que se extrai do art. 71 do código privado.
O art. 72 do Código Civil diz que o local em que a pessoa exercitar profissão também é
domicílio da pessoa natural, também sendo permitida a pluralidade domiciliar. Nesse caso, se a
pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio para as
relações que lhe corresponderem.
É possível a mudança de domicílio. Estabelece o art. 74 do Código Civil que se muda o
domicílio, transferindo a residência, com a intenção manifesta de mudar o domicílio. Para se
provar a intenção manifesta de mudar, basta que a prova da intenção resulte da declaração da
pessoa às municipalidades dos lugares, que deixa, e para onde vai, ou, se tais declarações não
fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a acompanharem.
Essa intenção é vislumbrada por meio das declarações da pessoa à municipalidade,
tanto de onde ela está saindo como onde ela está indo morar. Ex.: alteração do domicílio eleitoral
é exemplo de intenção manifesta de se mudar.
O domicílio pode ser voluntário, de eleição, legal ou necessário, contratual, e por fim,
o aparente.
O domicílio voluntário, também conhecido como convencional, é o que decorre de um
ato de escolha da pessoa como exercício da autonomia privada. O legal ou necessário é o fixado
pela lei.
O artigo 76, do Código Civil, apresenta um rol daqueles que possuem domicílio legal, e
em seu parágrafo único, define o local onde elas terão domicílio.
Dessa forma, o domicílio do incapaz é o do seu representante ou assistente. Vale
lembrar que a súmula 383, STJ, estabelece que a competência para processar e julgar ações
conexas de interesse de menor, em geral, é o foro do domicílio do detentor da sua guarda.
O domicílio do servidor público é o lugar em que ele exerce permanentemente as suas
funções. Até para o servidor público admite-se a pluralidade de domicílios.
O domicílio do militar é o do local onde ele servir e se for da marinha ou da aeronáutica
é da sede ou comando a que se encontrar imediatamente subordinado.
O domicílio do marítimo é o do lugar em que seu navio estiver matriculado.
Por fim, o domicílio do preso é o do lugar em que ele cumpre a sentença. E o preso
preventivo? Ele não está cumprindo sentença, então, não há para ele essa hipótese de domicílio
legal.
No que tange as pessoas que não tem domicílio, o Código Civil classifica esse como o
de domicílio aparente, ou seja, seu domicílio é o local em que elas forem encontradas (CC, art.
73).
Domicílio contratual é aquele que consta em contrato escrito especificando local para
cumprimento de deveres e obrigações contratuais. Nesse ponto, não podemos confundir
domicílio contratual com foro de eleição.
O foro de eleição é utilizado para aspectos processuais, para fins de definição de uma
determinada ação judicial. Por exemplo, em uma cláusula contratual consta que eventuais
conflitos resultantes do contrato serão discutidos na cidade “A”.
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Matheus Zuliani
Os bens podem ser classificados de diversas maneiras. O Código Civil divide os bens
em bens considerados em si mesmos e bens reciprocamente considerados.
Quando se fala em bens considerados em si mesmo, considera-se o bem
individualmente, sem a necessidade de ter outro bem atrelado. Nessa classificação encontramos
os bens imóveis, bens móveis, bens fungíveis e infungíveis, bens consumíveis, e ainda, bens
singulares e coletivos.
Nos termos do art. 79 do Código Civil, são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe
incorporar natural ou artificialmente. Noutro giro, bens móveis são os bens suscetíveis de
23Enunciado171 da Jornada de Direito Civil – “Art. 423: O contrato de adesão, mencionado nos artigos 423 e 424 do
novo Código Civil, não se confunde com o contrato de consumo”
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perderá no seu aspecto econômico. É relevante considerar que o Código Civil, no art. 88 autoriza
que os bens naturalmente divisíveis podem tornar-se indivisíveis por determinação da lei ou por
vontade das partes.
Os bens singulares são os que, embora reunidos, se consideram de per si,
independentemente dos demais. O livro, um boi, uma ovelha, são exemplos de bens singulares.
Os bens universais, por sua vez, são bens que se encontram agregados a um todo, constituído
por várias coisas singulares, mas considerados em seu conjunto, formando um todo
individualizado. Essa união poderá ser fática ou mesmo jurídica.
Neste sentido, de acordo com o artigo 90 do Código Civil, constitui universalidade de
fato a pluralidade de bens singulares que, pertinentes a mesma pessoa, tenham destinação
unitária. Um rebanho e uma frota de automóveis são exemplos dessa classificação. Já a
universalidade de direito é a união de bens materiais ou imateriais, corpóreas ou incorpóreas,
com natureza coletiva. A herança, a massa falida são exemplos de universalidade de direito.
Com relação à classificação que leva em conta a dependência em relação a outro bem,
temos o bem principal e o bem acessório. Principal é aquele que existe de forma autônoma e
independente, não dependendo de qualquer outro objeto. O acessório, por sua vez, é aquele
que a existência e finalidade depende de outro bem, que é denominado principal. Quando se
fala nessa particular classificação surge um princípio muito importante para o direito, sendo o
princípio da gravitação jurídica. Por ele, a regra é a de que o bem acessório segue o bem
principal. No entanto, essa regra não é absoluta.
Os frutos são classificados como bem acessórios.
Os frutos têm origem no bem principal, mas mantêm a integridade deste último, sem
diminuir a substância ou quantidade. Classificam-se como:
Frutos naturais: ex.: frutos de uma árvore, mas mantém a inteireza da coisa principal,
no caso a árvore; frutos industriais: decorrendo de uma atividade humana. Ex.: saco de balinhas
feita por uma fábrica; frutos civis: decorrendo de uma relação jurídica econômica, denominados
de rendimentos. Ex.: aluguel é fruto para o dono do imóvel, assim como os juros e dividendos.
Quanto ao estado que normalmente se encontram os frutos, podem ser classificados em: frutos
pendentes: são os frutos que ainda não foram colhidos. Ex.: fruta que está na árvore. Frutos
percebidos: são os frutos que já foram colhidos. Frutos estantes: são os frutos que já foram
colhidos e já estão armazenados. Ex.: maçãs colhidas e que estão armazenadas. Frutos
percipiendos: são os frutos que deveriam ter sido colhidos, mas não foram. Por fim, os frutos
consumidos: são os frutos que foram colhidos e não existem mais, pois foram consumidos.
Fruto não se confunde com produto. Produtos são bens acessórios que saem da coisa
principal, diminuindo a sua quantidade e substância. Neste ponto difere do fruto, pois este sai
da coisa principal, mas não diminui a sua substância ou quantidade. Ex.: pepita de ouro retirado
de uma mina. Explora-se a mina até que irá acabar o ouro.
Nos termos do art. 93 do Código Civil, são pertenças os bens que, não constituindo
partes integrantes, destinam-se, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento
de outro. A doutrina traz um exemplo que esclarecedor. Ex.: em uma fazenda, o sujeito compra
uma caminhonete para utilizar dentro da fazenda. Este bem é uma pertença, pois é destinado a
servir um bem principal, que é um imóvel, não perdendo a sua individualidade e não é parte
integrante desse bem.
As pertenças vieram para substituir a antiga classificação de bem imóvel por acessão
intelectual.
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A regra é a de que o bem acessório segue o bem principal (gravitação jurídica), todavia,
quando se trata de pertença, essa regra não prevalece. Nota-se que o Código Civil, no art. 94 diz
que os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo
se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso. Assim,
quando resultar da lei, da vontade manifestada, ou então, das circunstâncias do caso, ela pode
seguir o bem principal.
O STJ determinou a restituição, para o devedor fiduciário, de equipamento de
monitoração que havia sido acoplado ao caminhão apreendido por falta de pagamento do
contrato de financiamento. Segundo o colegiado, o equipamento é considerado uma pertença
e, portanto, pode ser retirado do caminhão sem causar prejuízos ao bem (STJ - REsp nº
1667227/RS).
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Seja qual for a espécie de bem público, nenhum deles está sujeito a usucapião (CC, art.
102; CF, art. 183, § 3°, e súmula 340 do STF).
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jurídico e do ato jurídico existe o negócio jurídico. Negócio jurídico é um ato jurídico, com
elemento volitivo e de conteúdo lícito, mas que há composição de interesse das partes, com
finalidade específica e desejada pelas partes.
O negócio jurídico é o ponto principal da parte geral do Código Civil, uma vez que é a
base de um contrato, a base de atos familiares e nas sucessões, estando presente, também, nas
obrigações.
O ato jurídico pode ainda ser classificado com ato jurídico stricto sensu, sendo aquele
ato jurídico com elemento volitivo, ou seja, com manifestação de vontade. Todavia, essa
manifestação de vontade já está pré-determinada na lei. É o caso do sujeito que adquire um bem
imóvel ou veículo. Como consequência desse ato ele terá que pagar o imposto que incide, ou
seja, no caso do bem imóvel, o IPTU, e no do bem móvel, o IPVA.
Por fim, ainda existe o ato-fato jurídico. Por esse, existe um ato ou um comportamento
humano sem vontade, mas que produziu um resultado. Carlos Roberto exemplifica bem esse
ato.
Muitas vezes o efeito do ato não é buscado nem imaginado pelo agente, mas decorre
de uma conduta e é sancionado pela lei, como no caso de uma pessoa que acha,
casualmente, um tesouro. A conduta do agente não tinha por fim imediato adquirir-
lhe a metade, mas tal acaba ocorrendo, por força do disposto no art. 1.264, ainda
que se trate de um louco (GONÇALVES, Carlos Roberto – Direito Civil Brasileiro –
volume 1 – parte geral – editora Saraiva jur).
O negócio jurídico tem origem no Código Civil alemão, trata-se de um ato ou uma
pluralidade de atos, entre si relacionados, quer sejam de uma ou de várias pessoas, que tem por
fim produzir efeitos jurídicos e modificações nas relações jurídicas no âmbito do direito privado.
No campo dos negócios jurídicos a autonomia privada é ampla, traduz uma declaração
de vontade limitada pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, pela qual o agente
pretende livremente alcançar determinados efeitos juridicamente possíveis. Tal situação,
segundo Judith Martins, vive-se a era da autonomia solidária.
Por fim, tem-se como negócio jurídico, a manifestação da vontade através de uma
finalidade negocial, que abrange a aquisição, conservação, modificação ou extinção de direitos.
Existem doutrinadores que trazem, dentro do negócio jurídico, teorias que explicam a
natureza jurídica do negócio jurídico. Assim, entende-se que existe a teoria da declaração e a
teoria da vontade.
Pela teoria da declaração (Erklärungstheorie), afirma-se que o negócio jurídico teria a
sua essência, não na vontade interna, mas na vontade externa ou declarada. Já pela teoria da
vontade (Willenstheorie), entende-se que o núcleo essencial do negócio jurídico seria a vontade
interna, a intenção do agente. Por ela, o negócio jurídico se explica pela intenção do agente.
A teoria adotada pelo sistema civilista é a teoria da vontade, que por sua vez, pode ser
dividida em: vontade externada e vontade interna. Via de regra, a vontade interna condiz com a
vontade exteriorizada (intenção do sujeito). Caso elas sejam destoantes poderá haver um vício
do consentimento.
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A escada ponteana foi pensada e idealizada por Pontes de Miranda, nos quais o
negócio jurídico perpassa por três planos/degraus: 1º plano de existência; o 2º plano de validade
e o 3º o plano de eficácia.
No plano de existência, observam-se os elementos que conferem a possibilidade de se
chegar à validade. Diante disso, para que o negócio jurídico exista é necessário: vontade, agente,
objeto e forma.
O plano de validade visa adjetivar os elementos de existência, para assim, verificar se
o negócio jurídico é válido ou inválido. Eles se encontram no art. 104 do Código Civil, ou seja, a
vontade tem que se livre e de boa-fé; o agente necessita ser capaz; o objeto tem que ser lícito,
possível, determinado ou determinável, e por fim, a forma tem que ser aquela prescrita ou não
defesa em lei.
Uma vez violado tais requisitos, o negócio jurídico poderá ser nulo ou anulável, a
depender da situação.
Por fim, no plano da eficácia, temos os elementos acidentais, ou seja, a condição, o
termo e o encargo.
No Código Civil, nas disposições gerais do negócio jurídico, há algumas questões que
precisam ser observadas e que tratam, especificadamente, sobre os elementos de existência e
de validade do negócio jurídico.
No art. 105 do Código Civil há regramento sobre a incapacidade. Explica que a
incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em benefício próprio,
nem aproveita aos cointeressados capazes, salvo se, nesse caso, for indivisível o objeto do
direito ou da obrigação comum.
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Matheus Zuliani
A primeira parte do art. 105 trata do venire contra factum proprium, instituto ligado a
boa-fé objetiva das relações negociais.
Venire contra factum proprium consiste na vedação de práticas antagônicas àquelas
praticadas anteriormente pelo próprio agente. Nada mais é do que um desdobramento do
princípio da boa-fé objetiva.
Também chamada de “teoria dos atos próprios” ou “proibição de comportamento
contraditório”.
No venire contra factum proprium, há uma sequência lógica de dois comportamentos.
Cada um deles, observados isoladamente, certamente se mostraria lícito; mas eles se tornam
ilícitos pela incoerência comportamental. Existe enunciado nesse sentido24.
O art. 106 do Código Civil, por sua vez, trata da impossibilidade inicial e relativa do
objeto. Assim, a impossibilidade inicial do objeto não invalida o negócio jurídico se for relativa,
ou se cessar antes de realizada a condição a que ele estiver subordinado. Desta forma, entende
a doutrina que para macular o negócio jurídico a impossibilidade do objeto deve ser absoluta,
ou seja, não ligada ao declarante, mas sim, a todas as pessoas que possam ter alguma relação
com tal objeto.
Sobre a vontade e a forma, o Código Civil explica, no art. 107 que a validade da
declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a
exigir. De acordo com Anderson Shreiber, “forma do negócio jurídico é o meio através do qual
o agente exprime a sua vontade” (Código Civil Comentado – Doutrina e Jurisprudência – Editora
Gen). Diante disso, o Código Civil diz que a regra, no negócio jurídico, é a do ato não solene. No
entanto, quanto à lei exigir o negócio jurídico passa a ser um ato solene, onde a desobediência
da forma macula a validade do ato. Cite-se como exemplo a compra e venda de uma casa, em
uma cidade do interior, localizada no bairro mais pobre. Se essa casa tiver o valor de R$
20.000,00 (vinte mil reais), o negócio jurídico de compra e venda envolvendo-a pode ser feito
por instrumento particular. Isso porque o Código Civil, no art. 108, diz que “não dispondo a lei
em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à
constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor
superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País”. Se superasse 30 salários a
compra e venda deveria ser por escritura pública, ou seja, um ato solene (formal).
No entanto, é importante constar que, nesse negócio envolvendo essa casa de R$
20.000,00, se as partes fizerem constar no contrato que o negócio não tem validade se não for
feito por escritura pública, passa a ser essa forma a substância do ato. Assim, o art. 109 do
Código Civil explica que “No negócio jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem
instrumento público, este é da substância do ato”.
O art. 110 do Código Civil traz a reserva mental. A redação do dispositivo legal expõe
que “a manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de
não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento”. A pouco, em
comentário supra, dizemos que o Código Civil, no âmbito do negócio jurídico, adotou a teoria
da vontade, onde a intenção manifestada interessa para o negócio. Assim, mesmo que o agente
manifeste uma vontade não condizente com a vontade desejada, esse negócio existe e será
válido. Para a doutrina, quando a outra parte, aquela que recebe a declaração de vontade,
conhece dessa divergência entre a vontade querida e a vontade externada, o negócio passa a
ter um vício na sua existência, sendo considerado um negócio jurídico inexistente.
24Enunciado 362 da IV Jornada de Direito Civil: “a vedação do comportamento contraditório (Venire contra factum
proprium) funda-se na proteção da confiança, tal como se extrai dos art. 187 e 422 do Código Civil”
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Matheus Zuliani
Sobre o silêncio como manifestação de vontade, o Código Civil, no art. 111 explica que
O silêncio importa anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for
necessária a declaração de vontade expressa. Nesse sentido, o silêncio, como regra, não produz
vontade. Ele apenas passa a ser considerado uma manifestação de vontade quando as
circunstâncias ou os usos o autorizarem, e ainda, desde que não seja necessária a declaração de
vontade expressa.
No que concerne a interpretação do negócio jurídico, o Código Civil traz três regras
importantes.
A primeira encontra-se no art. 112 do Código Civil que diz que “nas declarações de
vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da
linguagem”. Isso significa que, precisando o negócio jurídico de uma interpretação, buscará a
solução no que pretendiam as partes quando da celebração do negócio. Busca-se a essência do
negócio na visão dos personagens. Mais uma vez é o Código Civil sinalizando pela adoção da
teoria da vontade.
A segunda, por sua vez, está no art. 113 do Código Civil, que recentemente
experimentou uma modificação advinda da Declaração de Direitos de Liberdade Econômica (Lei
nº 13.874/2019). Assim dispõe o art. 113 do Código Civil: “os negócios jurídicos devem ser
interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração”. Nota-se que a boa-fé
objetiva é um elemento interpretativo do negócio jurídico, impondo um comportamento leal,
probo, baseado na confiança. Nesse sentido, entende-se que a interpretação deve levar em
conta o comportamento das partes após a celebração do contrato, obedecendo as práticas
costumeiras para aquele negócio, sem, contudo, se depreender da boa-fé, e ainda, ser mais
benéfico à parte que não redigiu o dispositivo, se identificável (CC, art. 113, § 1º).
Além disso, o Código Civil permitiu que as partes trouxessem para o negócio critérios
e regras de interpretação, de preenchimento de lacunas e de integração dos negócios jurídicos
diversas daquelas previstas em lei (CC, art. 113, § 2º).
A terceira e última regra de interpretação diz respeito aos negócios jurídicos benéficos
e a renúncia. Nessas duas modalidades o negócio jurídico deve ser interpretado estritamente,
ou seja, aquela interpretação que se revela menos ampla (CC, art. 114). Isso acontece porque
nessa modalidade de negócio a parte, em regra, já não aufere qualquer vantagem, não podendo,
ainda, sofrer uma interpretação extensiva.
O negócio jurídico nasce para ser perfeito e produzir efeitos jurídicos desejados entre
as partes. No entanto, pode ocorrer que, em razão de uma mácula nesse negócio, passe ele a
ser considerado viciado, e assim, podendo ser anulado ou declarado nulo, a depender do vício
apresentado.
Os vícios, também conhecidos como defeitos do negócio jurídico, podem ser
classificados em vícios do consentimento ou vícios sociais.
Vícios do consentimento são aqueles em que a manifestação de vontade interna do
agente não condiz com a manifestação externada ao outro negociante. Já o vício social consiste
naquele em que a manifestação de vontade querida pelo agente é a mesma externada, contudo,
praticada com o intuito de prejudicar terceiros.
São vícios do consentimento o dolo, o erro, o estado de perigo, a lesão e a coação. Por
sua vez, são vícios sociais a fraude contra credores e a simulação.
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25I Jornada de Direito Civil – enunciado 12: “Na sistemática do art. 138, é irrelevante ser ou não escusável o erro,
porque o dispositivo adota o princípio da confiança”.
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O Código Civil ainda permite que se anule por erro a transmissão errônea da vontade.
O art. 141 do Código Civil explica que “a transmissão errônea da vontade por meios interpostos
é anulável nos mesmos casos em que o é a declaração direta”. Se o declarante não se encontra
na presença do declaratório, valendo-se de interposta pessoa (mensageiro) ou de um meio de
comunicação (fax, telégrafo, e-mail) e a transmissão da vontade, não se faz com fidelidade,
estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foi transmitido erroneamente
(mensagem truncada), caracteriza-se o vício que torna anulável o negócio jurídico.
Por fim, o Código Civil permite que o negócio jurídico errôneo possa ser convalidado
(CC, art. 144). Desta forma, se a quem a manifestação de vontade se dirige, se oferecer para
executá-la em conformidade da vontade real do manifestante, o erro fica superado,
convalidando-se o negócio jurídico, tornando-se válido.
2.11.2.2. DO DOLO
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Matheus Zuliani
150 do CC que traz que “se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para
anular o negócio, ou reclamar indenização”. O dolo bilateral é reflexo do brocardo jurídico de
que ninguém pode se beneficiar da própria (Nemo auditur propriam turpitudinem allegans).
2.11.2.3. DA COAÇÃO
Coação é toda ameaça ou pressão injusta exercida sobre um indivíduo para forçá-lo,
contra sua vontade, a praticar um ato ou realizar um negócio. O que caracteriza é o emprego da
violência psicológica para viciar a vontade. Não é a coação em si um vício, mas o temor que ela
inspira, tornando defeituosa a manifestação de vontade de querer do agente.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, a coação é o vício mais grave e profundo que pode
afetar o negócio jurídico.
Dispõe o artigo 151, do Código Civil que:
A coação, para viciar a declaração da vontade, há de ser tal que incuta ao paciente
fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos
seus bens. Parágrafo único. Se disser respeito a pessoa não pertencente à família do
paciente, o juiz, com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.
Assim, nem toda ameaça configura a coação como vício, a não ser que tenha os
seguintes requisitos: causa determinante + grave + injusta + dizer respeito a dano atual ou
iminente + constituir ameaça de prejuízo à pessoa ou a bens da vítima ou pessoa de sua família.
A coação não é apreciada em juízo abstrato (critério do homem médio), mas em uma
análise concreta da condição da vítima, como se verifica dos elementos a serem analisados no
art. 152 do Código Civil, in verbis: “No apreciar a coação, ter-se-ão em conta o sexo, a idade, a
condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam
influir na gravidade dela”.
A coação pode ser absoluta (física), relativa (moral), sobre a pessoa e de sua família,
sobre os bens da pessoa, e por fim, sobre pessoa diversa da família.
A coação absoluta, também conhecida como vis absoluta, é aquela que a vantagem
decorre de violência física. Trata-se na hipótese de negócio jurídico inexistente, por ausência de
manifestação de vontade. Pense no caso em que se pega a mão da velhinha e força a assinatura
de um cheque. A relativa, que pode ser denominada de vis compulsiva, é a que torna o negócio
anulável. Neste caso, deixa-se opção de escolha à vítima: praticar o ato ou correr o risco. Trata-
se de uma coação psicológica. Nesse caso, aponta-se uma arma para a pessoa e manda que ela
assine o cheque. São casos diversos.
A coação pode ser ainda contra a própria pessoa, seus familiares, ou então sobre os
seus bens. Quando a coação é exercida sobre uma pessoa que não pertence à família do
contratante, é preciso analisar as circunstancias do caso. Nessa hipótese, é o juiz quem vai fazer
essa análise, verificando se aquela pessoa ameaçada é relevante para o coagido ao ponto de
causar nele um grave temor de dano.
Na coação, é preciso ressaltar que nem o temor reverencial e nem o exercício regular
de um direito, caracterizam vício do negócio jurídico. Dispõe o art. 153 do Código Civil que “não
se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor
reverencial”. Temor reverencial é o respeito à autoridade instituída (é a autoridade reconhecida
pela vítima). Isso não caracteriza coação. Pablo Stolze, Juiz do TJBA e professor de Direito Civil,
dá o seguinte exemplo: “pai de sua noiva, no início de namoro, pede R$ 10.000,00 emprestado
e diz “você confia em mim, não é?”– Você empresta sem pestanejar para não desagradar o
sogrinho. Porém, isso não caracteriza coação, mas mero temor reverencial”. O exercício regular
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Matheus Zuliani
de um direito, ato lícito pelo Código Civil, também não gera coação. Se alguém lhe ameaça
inscrever seu nome nos órgãos de proteção ao crédito porque você não paga a dívida, isso não
pode ser considerado uma coação, mas sim, o exercício regular de um direito.
A coação exercida por terceira pessoa tem previsão no art. 154 do Código Civil, in
verbis: “vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter
conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas
e danos”. Todavia, o negócio subsiste se a coação decorrer de terceiro, sem que a parte a que
aproveite dela tivesse ou devesse ter conhecimento, todavia, o autor da coação responderá por
todas as perdas e danos que houver causado ao coacto (CC, art. 155).
Desse modo, prevalece o princípio da boa-fé e a tutela da confiança da parte que
recebe a declaração de vontade. É importante se atentar para o caso de que nos atos unilaterais,
como testamentos e promessa de recompensa, a coação de terceiro continuará ensejando
sempre anulação, uma vez que ali não existem “partes”, mas sim, agentes e terceiros que se
dirigem a declaração de vontade.
O estado de perigo é um vício do negócio jurídico que não existia no Código Civil de
1916.
Dispõe o art. 156 do Código Civil que “configura-se o estado de perigo quando alguém,
premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela
outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa”.
O Estado de perigo é a situação de extrema necessidade (conhecido pela parte
contrária) que conduz uma pessoa a celebrar negócio jurídico em que assume obrigação
desproporcional e excessivamente onerosa. O exemplo clássico é do náufrago que doa seu
patrimônio para ser salvo.
O professor Carlos Roberto Gonçalves ensina que a anulabilidade do negócio jurídico
celebrado mediante estado de perigo encontra justificativa em diversos dispositivos do novo
código civil, principalmente, naqueles que consagram os princípios da boa-fé e da probidade, e
ainda, condiciona o exercício da liberdade de contratar a função social do contrato (artigos 421
e 422 do CC).
Há que se mencionar, ainda, os dizeres de Teresa Ancona Lopez:
Ao estudar o estado de perigo nota-se que o Código Civil não tratou, de forma expressa,
da possibilidade de se convalidar o negócio, a exemplo do que faz com a lesão. Assim, a doutrina
entendeu que a mesma situação prevista no art. 157, §2º do Código Civil, tem incidência, por
analogia, no caso de estado de perigo. Dispõe o no art. 157, §2º do Código Civil que: “não se
decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida
concordar com a redução do proveito”. Nesse mesmo sentido foi editado o Enunciado 158 da
Jornada de Direito Civil26.
26Enunciado 148 da III Jornada de Direito Civil: “Ao "estado de perigo" (art. 156) aplica-se, por analogia, o disposto
no § 2º do art. 157”.
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Da mesma forma que a coação, é possível que uma pessoa, sob a premente
necessidade de salvar alguém que não é da família, assume prestação onerosa. Seguindo o
mesmo raciocínio, o Código Civil, no art. 156, parágrafo único, diz que, em se tratandode pessoa
não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias. Portanto, fica
ao crivo do Magistrado o decreto do negócio viciado ou não.
Por fim, no estado de perigo é preciso que haja um requisito indispensável, qual seja,
o dolo de aproveitamento. Consiste no fato de uma das partes se aproveitar da outra para levar
vantagem, enquanto a outra experimenta prejuízo. O dolo de aproveitamento deve ser aferido
no instante da realização do contrato. Se posteriormente à sua subscrição a parte descobre que
está levando vantagem enquanto a outra experimenta prejuízo não se pode pleitear a anulação
pelo vício do negócio jurídico.
2.11.2.5. DA LESÃO
Igual ao estado de perigo, o instituto da lesão não tinha previsão no Código Civil antigo.
É inovação. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por
inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação
oposta. Lesão é, assim, o prejuízo resultante da enorme desproporção existente entre as
prestações de um contrato no momento de sua celebração, determinada pela premente
necessidade ou inexperiência de uma das partes. Dessa forma, não se contenta a lei com
qualquer desproporção, mas sim a manifesta.
O objetivo é reprimir a exploração usurária de um dos contratantes com o outro, que
não precisa ser de conhecimento da parte contrária, ao contrário do estado de perigo, que exige
o conhecimento da parte contrária.
O CC de 2.002 adotou a lesão especial ou lesão enorme, na qual apenas se verifica a
vantagem exagerada ou desproporcional, não se indagando a má-fé ou ilicitude do
comportamento da parte contrária (dolo de aproveitamento). O nosso código, neste caso, não
está preocupado em punir o sujeito, mas em proteger o lesado. Veja que a doutrina entende que
há dolo de aproveitamento para o estado de perigo, mas não para a lesão. Nesse sentido foi
editado o Enunciado 150 da Jornada de Direito Civil27.
Em suma: Ocorre lesão quando por premente necessidade ou por inexperiência, obriga
a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.
A desproporção das prestações será apreciada segundo os valores vigentes ao tempo
em que foi celebrado o negócio jurídico, conforme consagra o art. 157, § 1º do Código Civil.
O Código de Defesa do Consumidor trata a lesão como causa de nulidade absoluta do
negócio (arts. 6º, V; 39, V; e 51, IV, todos do Código de Defesa do Consumidor).
Por fim, é importante fazer a distinção entre a lesão e a onerosidade excessiva. A
diferença é que na lesão o negócio jurídico já nasce viciado, enquanto no caso da teoria da
imprevisão não. Na lesão o vício é congênito. Ao contrário da teoria da imprevisão, onde o
contrato nasce válido, e devido ao fato imprevisível e inevitável, que altera substancialmente a
base do contrato, acaba por tornar a prestação excessivamente onerosa para uma das partes. A
saída encontrada pelos protagonistas é a revisão do contrato (CC, art. 479), ou até mesmo a
extinção do negócio, essa como última medida. A resolução por onerosidade excessiva encontra-
se regulamentada no art. 478 do Código Civil28.
27 III Jornada de Direito Civil – enunciado 150: “A lesão de que trata o art. 157 do Código Civil não exige dolo de
aproveitamento”.
28 Art. 478. “Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar
excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e
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imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à
data da citação”.
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STJ - REsp nº 1294462/GO.
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2.11.2.7. DA SIMULAÇÃO
A simulação consiste em um vício social, ou seja, sempre visa prejudicar uma terceira
pessoa, ainda que não definida, enquanto na fraude contra credores a investida fraudulenta é
destinada a prejudicar o credor. Na simulação, ao contrário, o prejudicado pode não se
nominado, não se tratando de uma vítima especifica. No CC/16 era causa de anulabilidade; no
CC/2.002 passa a ser tratada como causa de nulidade absoluta do negócio jurídico.
Na simulação celebra-se um negócio jurídico aparentemente normal, mas que, em
verdade, não pretende atingir o efeito que juridicamente deveria produzir. Por essa razão, a
simulação será sempre bilateral, na qual, “A” e “B”, por exemplo, em conluio para enganar “C”
ou fraudar a lei.
Há duas espécies de simulação, a absoluta e a relativa. Na simulação absoluta as partes
não realizam qualquer ato, apenas fingem na criação de um negócio que não existe. Na
simulação relativa as partes pretendem realizar negócio jurídico prejudicial a terceiro ou para
fraudar a lei, mas realizam um diverso “simulado” para ocultar o “dissimulado”, oculto, mas
verdadeiramente desejado.
É o caso da velhinha e da cuidadora. A velhinha prometeu doação da casa em que ela
morava para sua cuidadora se ela cuidasse dela até o fim da vida. Passou uma procuração para
ela fazer a doação. A cuidadora, se valendo da procuração, faz uma escritura de compra e venda
com a própria filha, representando a velhinha. O negócio simulado é nulo, mas o dissimulado
pode ser válido se for na substância e na forma31.
Sobre a simulação relativa, existe enunciado da Jornada de Direito Civil sobre o tema32.
Por fim, a doutrina ainda fala em simulação inocente. Tal modalidade era prevista no
código civil de 1916 e tratava-se de uma simulação desprovida de intenção de prejudicar
30Súmula 195 do STJ: “Em embargos de terceiro não se anula ato jurídico, por fraude contra credores”.
31Autos n. 0702397-17.2017.8.07.0004 – sentença proferida Juiz Matheus Stamillo Santarelli Zuliani 11/12/2019.
32Enunciado 153, da III Jornada de Direito Civil: “Na simulação relativa, o negócio simulado (aparente) é nulo, mas o
dissimulado será válido se não ofender a lei nem causar prejuízos a terceiros”.
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terceiros ou violar a lei. Essa modalidade não se aplica mais, uma vez que qualquer simulação é
nula.
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2.11.4. DA REPRESENTAÇÃO
O Código Civil traz um capítulo sobre o negócio jurídico concluído por meio da
representação.
É importante constar que os poderes de representação conferem-se por lei ou pelo
interessado. Assim, a manifestação de vontade pelo representante, nos limites de seus poderes,
produz efeitos em relação ao representado (CC, art. 116).
O contrato consigo mesmo, também conhecido na doutrina como autocontrato, tem
regulamentação no art. 117 do Código Civil. Dispõe tal dispositivo legal que “salvo se o permitir
a lei ou o representado, é anulável o negócio jurídico que o representante, no seu interesse ou
por conta de outrem, celebrar consigo mesmo”. Dessa forma, o representante só pode fazer
contrato consigo mesmo (de um lado ele e do outro ele representando terceiro) quando a lei ou
quando o próprio representado der poderes específicos para tanto.
Alguns entendem que essa modalidade de contrato não tem validade. Silvio de Salvo
Venosa escreveu que:
Para muitos, o chamado autocontrato é vedado, ainda que o ordenamento não o faça
expressamente, porque faltaria o essencial acordo de vontades: uma única vontade
se imporia no negócio, podendo trazer enorme prejuízo ao mandante. (...)
verificamos que, para a configuração dos ditos autocontratos é essencial que o
negócio jurídico seja concluído por meio do representante (Cavalcanti, 1983:1).
Já Carlos Roberto Gonçalves defende a validade, desde que não haja conflito de
interesses, sendo essa a melhor posição a ser adotada. Assim, o Desembargador do TJSP, disse:
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2.11.5.1. DA CONDIÇÃO
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chegar caminhando até a lua. No segundo caso, temos a hipótese de fazer contrato de herança
de pessoa viva.
Quanto ao modo de atuação podem ser suspensivas ou resolutivas.
A condição suspensiva é aquela que impede a aquisição e o exercício do direito. Dessa
maneira, não haverá produção de efeitos até a realização do evento futuro e incerto. Por
exemplo, “te dou o carro se você for aprovado no vestibular do final do ano”. A aprovação é
incerta e o vestibular é futuro.
Se houver uma condição impossível e suspensiva, ela invalida todo o negócio jurídico.
A condição resolutiva é aquela que não desempenha suspensão da aquisição nem do
exercício. Após a ocorrência do evento futuro e incerto, ocorre a extinção do direito. Por
exemplo, “te dou o carro enquanto você for aluno CP IURIS”. Na hipótese de condição impossível
e resolutiva, é tida por não escrita, todavia, o contrato permanece válido, íntegro e produz seus
efeitos. Por exemplo, “te dou o carro se você não respirar”.
Sobre a retroatividade da condição, dispõe o art. 128 do Código Civil que
Tem-se como exemplo de negócio de execução continuada ou periódica: “te dou uma
mesada mensal enquanto você for aluno CP IURIS”. No momento em que a pessoa deixa de ser
aluno, a condição resolutiva resolve o negócio jurídico, mas não atinge os atos já praticados.
2.11.5.2. DO TERMO
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mês que vem”. Termo final não se confunde com condição resolutiva, porque esta pressupõe
incerteza, e aquela, certeza de que irá acontecer. Termo convencional é o aposto pela vontade
das partes. Termo de direito é o que decorre da lei. Termo de graça é a dilação de prazo
concedida ao devedor. Termo certo é o que tem data específica. Termo incerto, noutro giro, é o
que não tem data específica para ocorrer, mas é certo que ocorrerá – morte.
Encargo é uma determinação que, imposta pelo autor por liberalidade, obriga o
beneficiário. É utilizada em doações ou testamentos. Por exemplo, “te dou minha casa para que
você institua uma creche”. Não pode ser aposta em negócio oneroso, pois equivaleria a uma
contraprestação.
Dispõe o art. 136 do Código Civil que o encargo não suspende a aquisição nem o
exercício do direito, salvo quando expressamente imposto no negócio jurídico, pelo disponente,
como condição suspensiva. Nesse caso, é preciso fazer uma breve anotação relevante. Se a
pessoa doa uma casa em que vive para um cuidador com o elemento acidental dele cuidar do
doador até o fim da sua vida, esse elemento acidental é um encargo ou uma condição
suspensiva? Caso se entenda que é encargo, então o cuidador se torna dono da casa
imediatamente. No entanto, caso se entenda como condição suspensiva, o cuidador somente se
torna dono da coisa com a morte, atrelada ao elemento incerto de cuidar da idosa até o fim da
sua vida. Portanto, tem que ficar bem atento aos elementos do negócio, devendo vir
expressamente como condição suspensiva. E veja bem, não tem que vir que trata-se de condição
suspensiva, mas sim, que subordinou o negócio a fazer algo, como no caso de cuidar da idosa.
Se o beneficiário morrer antes do cumprimento do encargo a liberalidade prevalece,
mesmo se instituída causa mortis. Se o encargo não for cumprido, a liberalidade poderá ser
revogada. O terceiro beneficiário pode exigir o cumprimento do encargo, mas não está
legitimado a propor ação revocatória que é privativa do instituidor, podendo os herdeiros apenas
prosseguir na ação por ele intentada. O instituidor também pode reclamar o cumprimento do
encargo e o Ministério Público somente poderá fazê-lo, depois da morte do instituidor se este
não o tiver feito, e se o encargo foi imposto no interesse geral.
33“Por volta do final do século III a.C., um Tribuno da Plebe de nome Aquilius, dirigiu uma proposta de lei aos Conselhos
da Plebe, com vistas a regulamentar a responsabilidade por atos intrinsecamente ilícitos. Foi votada a proposta e
aprovada, tornando-se conhecida pelo nome de Lex Aquilia. A Lex Aquilia era na verdade plebiscito, por ter origem
nos Conselhos da Plebe. É lei de circunstância, provocada pelos plebeus que, desse modo, se protegiam contra os
prejuízos que lhes causavam os patrícios, nos limites de suas terras. Antes da Lei Aquília imperava o regime da Lei das
XII Tábuas (450 a.C.), que continha regras isoladas” (César Fiuza in Por uma nova teoria do ilícito civil].
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que diz que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
O ato ilícito é o ato que dá surgimento à responsabilidade civil extracontratual, gerando
o dever de indenizar. Se você, teclando no celular, não se atentar para o farol que ficou vermelho
logo a sua frente, e abalroar o carro a sua frente, terá infringido o dever jurídico imposto pelo
ordenamento jurídico de não lesar outrem (princípio alterum non laedere ou neminem laedere).
Nesse momento, terá cometido um ilícito civil, gerando a sua responsabilidade extracontratual,
que acarretará no dever de indenizar.
Além do ato ilícito extracontratual, é considerado um ato ilícito o ato emulativo. O ato
emulativo nada mais é do que o abuso do direito.
O abuso do direito encontra regulamentação no art. 187 do Código Civil e diz que
“também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
Abuso do direito é o exercício de forma abusiva ou irregular do direito. O ato é
originariamente lícito, mas foi exercício fora dos limites impostos pelos seus fins econômicos,
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Aqui há a consagração dos princípios da socialidade
e da eticidade.
A teoria do abuso de direito está consagrada em quatro conceitos jurídicos
indeterminados, ou seja, em cláusulas gerais que serão preenchidas pelo juiz (fins econômicos,
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes).
Para que o abuso do direito esteja configurado, é importante que a pessoa esteja
exercendo o direito de forma abusiva ou irregular. É a atuação do exercício irregular do direito.
Para tanto, não é necessário que se discuta ou que se levante o elemento culpa. Basta
que a conduta exceda manifestamente os parâmetros do art. 187 (fins econômicos, fins sociais,
boa-fé objetiva ou pelos bons costumes).
Em suma, o abuso de direito é causa de responsabilidade objetiva, não se discutindo a
presença ou não de culpa. Inclusive há um enunciado acerca desse tema34.
São considerados atos lícitos pelo art. 188 do Código Civil os praticados em legítima
defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido, e ainda, a deterioração ou destruição
da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Em resumo, são atos
lícitos o estado de necessidade, a legítima defesa, e ainda, o exercício regular de um direito.
A legítima defesa consiste no ato de se defender de uma agressão injusta e real, ou
seja, se ataca alguém quando está sendo atacado. O Código Civil permite isso, tanto como
excludente da responsabilidade civil como defesa da posse.
O estado de necessidade é a lesão a um bem ou a uma pessoa para remover-se de um
perigo iminente. Esse o ato somente será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem
absolutamente necessário e não exceder os limites do indispensável para a remoção do perigo.
Por fim, o exercício regular de um direito consiste na atuação amparada pelo
ordenamento jurídico, como o ato de inscrever o nome do devedor que não lhe paga nos órgãos
de proteção ao crédito.
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Enunciado 37 da I Jornada de Direito Civil: “A responsabilidade civil decorrente do abuso do direito
independe de culpa e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico”.
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Sobre os atos lícitos é preciso fazer uma explanação. A regra é a de que a prática do ato
lícito não gera o dever de indenizar. No entanto, existe uma pequena exceção, sendo a hipótese
em que um ato lícito gera o dever de indenizar. Quando a pessoa, para remover o perigo iminente
e real, volta-se contra o bem ou a pessoa de terceiro, ainda que tenha praticado um ato lícito,
terá que indenizar. Trata-se do estado de necessidade agressivo. É o que dispõe o art. 929 do
Código Civil, in verbis: “Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188,
não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram”.
Noutro giro, se a agressão ou lesão para remover perigo for contra o próprio causador
do perigo ou da agressão, nesse caso, não há o dever de indenizar. Nessa hipótese se está diante
de um estado de necessidade defensivo.
O art. 930 consagra o direito de regresso daquele que causou o dano em relação ao
causador do estado de perigo (hipótese de estado de necessidade agressivo). Portanto, indeniza-
se, mas tem o direito de regresso.
Embora os arts. 929 e 930 sejam aplicados para o caso de estado de necessidade, a
doutrina o aplica, de forma uníssona, para o caso da legitima defesa, por analogia.
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35 REsp 149.186/RS
36 STJ - REsp 1.250.583
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a prescrição, é importante ouvir as partes para tomar conhecimento se não houve, por parte do
devedor, a renúncia expressa, ou então, alguma conduta que possa levar a renúncia tácita.
Sabe-se que a prescrição é matéria de ordem pública, e com isso, pode ser reconhecida
de ofício pelo juiz. A atenção que se recomenda é imposta pelo Código de Processo Civil, uma
vez que, diante no novo código processual, se a prescrição não foi ventilada pelas partes durante
o curso do processo, o juiz tem que converter o julgamento em diligência, abrindo-se vista as
partes para que elas se manifestem sobre o instituto. Trata-se do princípio da vedação da
decisão surpresa, o qual estabelece o seguinte: “O juiz não pode decidir, em grau algum de
jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes
oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de
ofício”. Conclui-se que o juiz pode reconhecer de ofício a prescrição e a decadência legal, porém,
é necessário consultar as partes antes, a fim de promover o contraditório efetivo. O respectivo
contraditório é substancial/material, que tem por finalidade, além de ofertar a manifestação da
parte, influenciar na decisão do julgador. Além disso, o art. 487, parágrafo único, trata da
matéria de forma específica na sentença, quando diz que, ressalvada a hipótese do art. 332, §
1º, a prescrição e a decadência não serão reconhecidas sem que antes seja dada às partes
oportunidade de manifestar-se.
Ainda sobre a conduta das partes, é importante ressaltar que os prazos prescricionais
não podem ser alterados por vontade das partes (CC, art. 192). Isso porque a prescrição é norma
cogente, não podendo ser convencionado entre as partes.
Outra característica da prescrição é que ela não se curva ao instituto da preclusão.
Consoante dispõe o art. 193 do Código Civil, a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de
jurisdição, pela parte a quem aproveita. Nessa senda, embora o requerido não alegue a
prescrição da pretensão autoral na primeira oportunidade que fala no processo, ele pode alegar
em qualquer grau de jurisdição. Qual a interpretação que se dá “em qualquer grau de
jurisdição”? Entende-se que em qualquer grau de jurisdição se aplica somente as instâncias
ordinárias, uma vez que, para as extraordinárias, é imprescindível o prequestionamento.
Por fim, o antigo Código de Processo Civil continha uma regra de que o réu que, por
não arguir na sua resposta fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, dilatar
o julgamento da lide, será condenado nas custas a partir do saneamento do processo e perderá,
ainda que vencedor na causa, o direito a haver do vencido honorários advocatícios (art. 22 do
Código de Processo Civil de 1973). O novo Código de Processo Civil não repetiu essa regra. Com
isso, se arguir a prescrição em momento posterior ao da contestação, isso não acarretará a
extinção do direito de receber os honorários advocatícios de sucumbência, mesmo sendo
vencedor.
O Código Civil não deixou desamparado o sujeito que é prejudicado pela conduta
daquele que deixou um direito prescrever, ou então, que não alegou a alegou na oportunidade
correta. Assim, os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus
assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem
oportunamente. É o que dispõe o art. 195 do Código Civil.
Uma vez iniciada a prescrição contra uma pessoa ela continua a correr contra o
sucessor. É o que dispõe o art. 196 do Código Civil. Desta forma, a sucessão não interfere na
prescrição, nem suspendendo, nem interrompendo. O prazo prescricional flui sem ligação
subjetiva com os sujeitos envolvidos. Desse modo, ainda que haja a transferência do crédito por
ato inter vivos ou por causa mortis, o prazo prescricional não será alterado.
Não poderia deixar de comentar a prescrição intercorrente. O novo Código de Processo
Civil disciplina com muita precisão a denominada prescrição intercorrente, que constitui causa
de suspensão e de extinção da execução.
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Nota-se que o Código de Processo Civil, no art. 921, III, narra que uma vez não
encontrado bens penhoráveis de propriedade do executado o juiz determinará a suspensão do
processo pelo prazo de 1 (um) ano, ficando, também, suspensa a prescrição.
O § 4º do mesmo dispositivo legal explica que ultrapassado o prazo anuo inicia-se a
prescrição intercorrente.
José Rogério Tucci37 explica muito bem o procedimento:
Atingido tal interregno temporal, o juiz deverá determinar a intimação das partes
para que se manifestem no prazo de 15 dias (parágrafo 5º do artigo 921). Justifica-se
esta providência no princípio do contraditório efetivo, caro ao novo Código de
Processo Civil (artigo 10), evitando-se decisão escudada em fundamento-surpresa. O
exequente, em particular, terá oportunidade de explicar o motivo de sua prolongada
inércia. Em seguida, considerando a manifestação das partes, sendo injustificável a
paralisação do processo, o juiz, reconhecendo, de ofício, a prescrição intercorrente,
proferirá sentença extintiva do processo executivo.
O Código Civil elenca quais são as hipóteses em que o prazo prescricional não se inicia,
ou então, quando iniciado fica suspenso. Assim, as causas impeditivas obstam o início do prazo,
enquanto as causas suspensivas suspendem o prazo que já se iniciou. Nessa última, quando o
fato se encerra, o prazo continua seu curso, cessando a suspensão.
As causas que impedem ou suspendem a prescrição, encontram-se previstas nos
artigos 197, 198 e 199 do CC.
Em regra, essas causas não se aplicam aos prazos decadenciais; somente em casos
excepcionais existem causas que interferem no curso de prazo decadencial, que estão elencados
nos artigos 195 e 198, inciso I do Código Civil. São elas o regresso contra o representante e a
incapacidade absoluta.
Algumas dessas hipóteses merecem observação. Para as outras, basta a leitura simples
do dispositivo legal.
O art. 198, I, do Código Civil diz que não corre prescrição contra os incapazes que trata
o art. 3º do Código Civil. Quando se faz uma leitura acelerada do dispositivo em questão, pode-
se gerar uma interpretação, equivocada, diga-se de passagem, que não corre prescrição contra
qualquer incapaz, seja ele relativamente ou absolutamente. O art. 3º do Código Civil trata apenas
do absolutamente incapaz. Assim, corre prescrição contra o relativamente incapaz (CC, art. 4º).
O inciso III afirma que não corre prescrição contra os que se acharem servindo nas
Forças Armadas, em tempo de guerra. É importante mencionar que essa guerra é a declarada.
O art. 200 do Código Civil traz uma hipótese em que o prazo fica suspenso/obstando
até que a responsabilidade criminal seja definida. É um reflexo da independência das instâncias
prevista no art. 935 do Código Civil. Nesse sentido, quando a ação se originar de fato que deva
ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.
Entende-se por sentença definitiva o trânsito em julgado da sentença penal.
Por fim, é interessante mencionar que a tramitação de inquérito não tem força para a
suspensão do prazo prescricional. O sujeito não pode ficar aguardando a conclusão do inquérito
policial acreditando que o prazo prescricional da ação civil está suspenso.
37 TUCCI, José Rogério - A prescrição intercorrente no novo CPC e na atual jurisprudência do STJ in CONJUR – publicado
no dia 4/10/2016.
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O mesmo ocorre quando a denúncia é rejeitada pelo Juiz. Nesse caso, não ocorre a
suspensão do prazo prescricional.
A prescrição é uma exceção pessoal. Assim, pode ser que ela corra contra uma
determinada pessoa e não contra outra (incapaz, por exemplo). Desta forma, em se tratando de
diversos devedores, a suspensão da prescrição em favor de um não aproveita ao outro. O Código
Civil, no art. 201, segue essa linha dizendo que, mesmo em caso de solidariedade de credores, a
suspensão da prescrição em favor de um não aproveita o outro, salvo se a obrigação for
indivisível. Assim, a extensão da suspensão pressupõe a indivisibilidade do objeto.
Uma causa interruptiva da prescrição não tem o mesmo significado que uma causa
suspensiva da prescrição. Enquanto na suspensão o prazo volta a correr de onde parou, na
interrupção ele volta a correr desde o início. Outra diferença é que a suspensão do prazo pode
ocorrer por diversas vezes, enquanto a interrupção do prazo prescricional só acontece uma única
vez.
As causas interruptivas estão nos art. 202, 203 e 204, todos do Código Civil.
Da mesma maneira que as causas que obstam e suspendem a prescrição, algumas das
causas interruptivas merecem atenção doutrinária, enquanto outras se bastam com a simples
leitura da lei.
O art. 202, I, do Código Civil diz que a interrupção da prescrição dar-se-á por despacho
do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na
forma da lei processual.
Nesse ponto, faz-se necessária análise do disposto no artigo 240, §1º do CPC:
Veja, portanto, que a interrupção da prescrição não é efeito da citação válida, mas sim,
o despacho do juiz que manda citar.
Questiona-se: e a decisão que ordena a emenda da inicial? O art. 321 do Código Civil
prevê a possibilidade de o Magistrado ordenar a emenda da inicial para sanar determinado vício
da petição inicial. O STJ tem entendimento que a interrupção da prescrição no caso em que se
ordena a emenda da inicial ocorre na data em que se ordenou a emenda e não da data do
ajuizamento da ação. Sendo assim, entende que
Por fim, ainda tratando do inciso I, nos casos dos Juizados Especiais Cíveis e na Justiça
do Trabalho, onde não há o despacho inicial, uma vez que o juiz recebe os autos já em audiência,
já tendo sido citado o requerido, deve ser considerado como marco a interromper a prescrição
a data do ajuizamento da demanda.
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EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 1.527.154 – PR.
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O art. 202, VI, afirma que interrompe a prescrição por qualquer ato inequívoco, ainda
que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor. Nesse caso, pouco
importa se o ato é judicial ou extrajudicial, qualquer um deles tem o condão de interromper a
prescrição. Enquanto todos os demais comportamentos elencados no art. 202 são do credor,
nessa hipótese, o comportamento é do devedor, dispensando-se atitude do credor. Pense a
hipótese do devedor que paga a dívida, antes da prescrição, pedindo dilação de prazo para pagar
os juros de mora vencidos. Nesse caso, estamos diante de uma hipótese em que interrompe o
prazo prescricional desse valor.
É importante constar que a prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado
(CC, art. 203). Assim, o terceiro juridicamente interessado pode praticar ato tendente a
interromper a prescrição. Ademais, qualquer terceiro pode praticar tal ato, não necessitando ser
apenas o terceiro interessado, mas também o terceiro que tem interesse moral ou apenas
econômico.
Afirmamos, linhas acima, que a prescrição é uma exceção pessoal. Dessa forma, o art.
204 do Código Civil assevera que a interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos
outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o codevedor, ou seu herdeiro, não
prejudica aos demais coobrigados.
Todavia, ao contrário do que ocorre com a suspensão, a interrupção por um dos
credores solidários aproveita aos outros, assim como a interrupção efetuada contra o devedor
solidário envolve os demais e seus herdeiros (CC, art. 204, § 1º).
Além disso, existe mais uma regra quando se trata de interrupção e solidariedade. A
interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica os outros
herdeiros ou devedores, senão quando se trate de obrigações e direitos indivisíveis. Aqui, a ideia
do § 2º é a mesma do caso da suspensão prevista no art. 201 do Código Civil. Noutro giro, embora
o Código Civil não fale, presume-se que não havendo solidariedade a interrupção não alcança os
demais devedores.
O STJ entendeu que a citação válida contra devedor solidário interrompe-se a
prescrição contra todos (STJ – AgRg no AI 787.029/SP).
Por último, ainda dentro do art. 204, a interrupção produzida contra o principal
devedor prejudica o fiador.
O Código Civil elenca, nos artigos 205 e 206, todos os prazos prescricionais. Essa
facilitação veio somente com o Código Civil de 2002, em razão do princípio da operabilidade,
uma vez que no Código Civil de 1916 tais prazos estavam esparsos pelo Código. Para saber,
naquela época, se um prazo era prescricional ou decadencial era preciso se socorrer ao critério
de Agnelo Amorim Filho.
Agnelo Amorim Filho criou, durante a vigência do CC/16, um critério para fazer a
correta diferenciação entre os prazos considerados prescricionais e os prazos decadenciais. Pelo
critério desse jurista paraibano, os prazos prescricionais estão diretamente associados com as
ações condenatórias, enquanto os prazos decadenciais estão interligados com as ações
constitutivas, derivadas do direito potestativo. Por fim, para as ações declaratórias, ligadas à
nulidade absoluta, encontram-se os prazos imprescritíveis.
Com a entrada em vigor do Código Civil atual, o art. 205 trouxe o prazo residual
decenal, enquanto o art. 206 trouxe os prazos específicos, podendo ser de um ano, dois anos,
três anos, quatro anos, e por fim, quinquenal.
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2.13.5. DA DECADÊNCIA
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Nos primórdios do Direito Romano o devedor respondia pessoalmente com seu próprio
corpo por suas dívidas, podendo ser açoitado, escravizado ou até morto como forma de punição
pelo inadimplemento. Hoje impera a responsabilidade patrimonial do devedor, que não irá mais
responder com seu próprio corpo pelo inadimplemento, irá responder com seu próprio
patrimônio.
Podemos dividir a responsabilidade patrimonial de duas maneiras:
• Responsabilidade patrimonial primária (art. 391 do CC e 789 do CPC), que se revela
naquela em que o patrimônio do próprio devedor vai responder pela obrigação
(devedor é detentor do schuld e do haftung).
• Responsabilidade patrimonial secundária, que diz respeito àquela responsabilidade
que recai sobre o patrimônio de pessoa diversa do devedor (terceiro é detentor
somente do haftung). Tal modalidade de responsabilidade encontra-se disciplinada no
art. 790 do CPC.
Cumpre destacar que há um resquício de responsabilidade pessoal do devedor no nosso
ordenamento jurídico. É o caso do permissivo constitucional de prisão civil (leia-se prisão por
dívida) no caso de depositário infiel e devedor inescusável de alimentos (art. 5º LXVII da CRFB).
Lembre-se que apesar da previsão constitucional da prisão civil do depositário infiel, essa não é
mais possível em razão do controle de convencionalidade exercido em face do Pacto de São José
da Costa Rica, que só permite a prisão civil no caso de devedor inescusável de alimentos (SV. 25
do STF).
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2. ATOS UNILATERAIS
2.1. INTRODUÇÃO
O art. 854 diz que, aquele que, por anúncios públicos, se comprometer a recompensar,
ou gratificar, a quem preencha certa condição, ou desempenhe certo serviço, contrai
obrigação de cumprir o prometido.
A pessoa que cumpriu a tarefa, ainda que não tivesse movida pelo interesse da
promessa de recompensa, poderá exigir a recompensa (art. 855).
Se o ato contemplado na promessa foi praticado por mais de um indivíduo, terá direito
à recompensa quem primeiro executou a tarefa (art. 857).
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Na gestão de negócios há uma atuação sem poderes. Ou seja, a parte atua sem receber
a incumbência do sujeito que seria o mandatário.
O gestor de negócios não tem direito à remuneração e deve agir conforme a vontade
presumível da vontade do dono do negócio, pois, do contrário, responderá pelos danos que
causar.
Se a gestão foi iniciada contra a vontade manifesta ou presumível do interessado, o
gestor irá responder, inclusive por casos fortuitos ou força maior, não provando que teriam
sobrevindo, ainda quando se houvesse abatido.
Em regra, a responsabilidade é subjetiva. No entanto, caso aja contra a vontade do dono
do negócio, responderá objetivamente, inclusive força maior e caso fortuito.
Se os prejuízos da gestão excederem o seu proveito, o dono do negócio pode exigir do
gestor que ele restitua as coisas ao estado anterior, ou o indenize da diferença. Ex.: João viajou
e o seu vizinho percebeu que em sua casa estava pegando fogo. Com isso, arrombou a porta
(primeiro dano) e apagou o fogo com o tapete persa de João (segundo dano). No entanto, evitou
um prejuízo enorme, e agiu conforme a vontade presumível do seu dono, João.
Em regra, o gestor só será responsabilizado se tiver agido com culpa, conforme a
responsabilidade subjetiva do art. 866 do CC. Ou seja, o gestor envidará toda sua diligência
habitual na administração do negócio, ressarcindo ao dono o prejuízo resultante de qualquer
culpa na gestão.
Se o gestor se fizer substituir por outrem, responderá pelas faltas do substituto. Ou seja,
se o gestor eleger alguém para atuar, responderá pelas faltas do seu substituto. Atente-se que
a responsabilidade por fato de terceiro é objetiva e solidária.
Se a gestão for conjunta, prestada por várias pessoas ao mesmo tempo, existe
responsabilidade solidária entre todos os gestores, consagrada no art. 867, parágrafo único.
Quando o dono do negócio retorna, há duas opções:
• concordar e ratificar a gestão, convertendo a atuação do vizinho em mandato,
devendo ressarcir o gestor por todas as despesas necessárias e úteis pela sua
atuação. Essa ratificação retroage ao dia do começa da gestão, tendo efeito ex tunc
(art. 873);
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O pagamento indevido é o pagamento sem o débito. Segundo o art. 876, todo aquele
que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir. Portanto, o pagamento indevido,
que é um ato unilateral, faz nascer a obrigação de restituir. Pagamento indevido é espécie do
gênero enriquecimento sem causa.
O art. 878 dispõe que aos frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações sobrevindas à
coisa dada em pagamento indevido, aplica-se o disposto quanto ao possuidor de boa-fé ou de
má-fé, a depender da existência de boa-fé ou má-fé de quem recebeu o pagamento.
Ex.: alguém recebe o imóvel de boa-fé à título de pagamento. Nesse caso, terá direito
aos frutos colhidos na vigência em que ele teve o imóvel consigo. Em razão disso, terá direito de
indenização e direito de retenção quanto às benfeitorias úteis e necessárias. Questiona-se: e se
essa pessoa recebeu o imóvel como pagamento sabendo da inexistência da dívida, ou seja, de
má-fé? Nesse caso, não há direito aos frutos, nem direito de retenção, podendo ser indenizado
apenas quanto às benfeitorias necessárias.
Fica isento de restituir pagamento indevido quem, recebendo como parte de dívida
verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou abriu mão das garantias que
asseguravam seu direito (art. 880). Porém, aquele que pagou dispõe de ação regressiva contra
o verdadeiro devedor e seu fiador.
Atente-se que a regra é a restituição simples do valor pago, não em dobro. No entanto,
a lei consagra hipóteses em que cabe restituição em dobro:
• aquele que demanda por dívida já paga ficará obrigado a pagar em dobro o que
houver cobrado do devedor (art. 940);
• o CDC, no art. 42, p.ú., diz que o consumidor poderá pleitear a restituição do
pagamento indevido em dobro.
O CC afasta a possibilidade de repetição de indébito quando se tratar de obrigação
natural ou quando se tratar de pagamento de obrigação imoral.
Com relação à obrigação natural, não se pode repetir o que se pagou para solver dívida
prescrita, ou cumprir obrigação judicialmente inexigível, pois existe o schuld, apesar de não
existir o haftung.
Em relação à obrigação imoral, quem paga recompensa a alguém por ter matado
outrem, não tem direito a esta restituição. Isto é, não terá direito à repetição aquele que deu
alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei. Neste caso, o que se deu reverterá
em favor de estabelecimento local de beneficência, a critério do juiz.
Se o pagamento indevido tiver consistido no desempenho de obrigação de fazer ou para
eximir-se da obrigação de não fazer, aquele que recebeu a prestação fica na obrigação de
indenizar o que a cumpriu, na medida do lucro obtido.
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Segundo o art. 884, aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será
obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
São pressupostos para que haja direito à restituição:
• enriquecimento de quem recebe;
• empobrecimento de quem paga (não é pacífico);
• relação de causalidade entre o enriquecimento de um e o empobrecimento do
outro;
• inexistência de causa jurídica que justifique isso;
• inexistência de ação específica.
Não caberá a restituição por enriquecimento sem causa, se a lei conferir ao lesado
outros meios para se ressarcir do prejuízo sofrido. Isto é, a ação de enriquecimento sem causa
é subsidiária.
Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a
restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em
que foi exigido.
Portanto, a restituição é devida, não só quando não tenha havido causa que justifique o
enriquecimento, mas também se esta deixou de existir.
Quanto à classificação das obrigações, elas podem ser básica ou especial. A classificação
básica é dividida em:
• obrigação positiva - consubstanciada em uma obrigação de dar (coisa certa ou
incerta) e de fazer;
• obrigação negativa - trata-se da obrigação de não fazer.
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a) Alternativas: aquelas que têm por objeto duas ou mais prestações, sendo que o
devedor exonera-se cumprindo apenas uma delas.
b) Facultativas: aquelas que têm um único objeto e o devedor tem a faculdade de
substituir a prestação devida por outra de natureza diversa.
c) Cumulativas: aquelas que têm por objeto uma pluralidade de prestações a serem
cumpridas conjuntamente.
d) Divisíveis e indivisíveis: as obrigações divisíveis admitem o cumprimento fracionado
ou parcial da prestação; nas obrigações indivisíveis só podem ser cumpridas por inteiro.
e) Líquidas e ilíquidas: obrigações líquidas são aquelas certas quanto à existência e
determinadas quanto ao objeto; nas ilíquidas não há especificação do quantum para o
seu cumprimento.
4. OBRIGAÇÕES DE DAR
4.1. INTRODUÇÃO
É a obrigação que tem por objeto a prestação de COISA. A expressão “dar” se divide em
duas situações: (i) dar na modalidade entregar e; (ii) dar na modalidade restituir. Veja que nas
obrigações de dar, não é simplesmente dar de entregar, mas também como forma de restituição
da coisa.
Dessa forma, o verbo “dar” em direito civil tem o sentido de “entregar” (transferir a
propriedade ou posse) ou de “restituir” (devolução da coisa ao proprietário).
Na obrigação de dar, como na compra e venda de um celular, por exemplo, impõe-se o
dever de entregar o bem ao comprador. Noutro sentido, tem-se a obrigação de restituir, quando
a pessoa empresta o celular para outra, por exemplo, por pequeno período tempo, mas a
propriedade continua sendo do dono e, após o uso, deve-se restituir o celular ao proprietário.
OBS.: O CPC denomina ação de restituição de obrigação reipersecutória.
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A obrigação de dar pode ser dividida: obrigação de dar coisa certa e obrigação de dar
coisa incerta.
• Obrigação de dar coisa certa: envolve uma coisa já qualificada; quantificada;
especificada; individualizada. Por exemplo, “te darei este iphone”.
• Obrigação de dar coisa incerta: é aquela cuja incerteza é temporária, pois logo após,
conseguirei discriminar a coisa. Por exemplo, “vou te dar um iphone”.
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Art. 237 do CC. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus
melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o
credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação.
Veja que o dispositivo acima diz respeito à obrigação de dar na modalidade entregar e,
portanto, o dono é o devedor. Resolver a obrigação no direito civil significa desfazer a
obrigação, é o retorno do status quo ante.
Ex.: se na compra e venda de uma fazenda, por exemplo, mas antes da tradição, tem-se
a ocorrência da avulsão (deslocamento terra e acréscimo na propriedade), fazendo com que a
propriedade fique ainda maior. O vendedor pode exigir aumento no preço, mas se não houver
concordância do comprador, haverá devolução do valor, desfazendo-se o negócio. Isso porque,
os melhoramentos e os acrescidos da coisa autorizam o aumento do preço.
Obs.: frutos pendentes são aqueles que ainda não foram colhidos, pois não estão no
momento de serem retirados da coisa.
Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se
perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá,
ressalvados os seus direitos até o dia da perda.
Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo
equivalente, mais perdas e danos.
Art. 241. Se, no caso do art. 238, sobrevier melhoramento ou acréscimo à coisa, sem
despesa ou trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização.
Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não
mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.
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Deve-se observar que, na obrigação de dar coisa certa, envolvem-se os acessórios que
sejam frutos, produtos e benfeitorias (constituem partes integrantes do bem). As pertenças que
são bens móveis inseridos nos bens imóveis com caráter de definitividade, a qual assume as
características de imobilidade, não acompanham o principal (Informativo 629 do STJ).
Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor,
antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação
para ambas as partes; se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo
equivalente e mais perdas e danos.
Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver
a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.
A coisa incerta é indicada apenas pelo gênero e pela quantidade, não há uma indicação
da qualidade – são obrigações genéricas. Por exemplo, “vou te dar um (quantidade) iphone
(gênero)”. A coisa é incerta até que seja escolhida, pois se disser “vou te dar este iphone”, a
coisa já foi escolhida e, portanto, a coisa passa a ser certa. Conforme artigo 243 do CC.
Indeterminabilidade é temporária – há momento certo para escolha. No momento em
que a coisa passa a ser certa, aplicam-se as regras para as obrigações de dar coisa certa.
Via de regra, quando estivermos diante de coisa incerta, a escolha cabe ao devedor,
contudo, é possível que as partes convencionem de forma diversa. É o dispõe o artigo 244, do
CC.
No momento da escolha ou concentração da obrigação esta deve ser feita pela média,
não pode ser a pior e nem mesmo a melhor. É a chamada virtude da prestação média, art. 244
parte final do CC.
Via de regra, o gênero nunca perece. A partir disso, dispõe o artigo 246 do CC que “antes
da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que por força
maior ou caso fortuito”.
Contudo, o professor Pablo Stolze, nesse ponto, faz uma ponderação reflexiva, o qual
afirma que o artigo 246 é falho, pois quando se fala em gênero limitado na natureza, poderá
perecer. Por exemplo, obrigação de entregar determinada espécie em extinção. Caso ocorra a
morte do animal, não é possível fazê-lo substituir, tendo em vista o perecimento do gênero.
É a obrigação que tem por objeto a prestação de um fato, podendo ser, personalíssima
(infungível) ou não personalíssima (fungível).Abrange o serviço humano em geral, seja material
ou imaterial. Constitui-se de atos e serviços - qualquer atividade lícita, possível e vantajosa.
Por exemplo, a pessoa contrata um advogado para redigir um contrato; contrata cantor
para cantar na festa de casamento; contrata um pedreiro para construir uma casa, dentre outras
variadas possibilidades de obrigação de fazer.
• Obrigação personalíssima - Também chamada de obrigação infungível, trata-
se de uma obrigação de fazer que deva ser prestada exatamente por aquela
pessoa que foi contratada. Por exemplo, se contratada Ivete Sangalo para tocar
na festa de casamento, a cantora é insubstituível. A obrigação de fazer
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Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo
executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da
indenização cabível.
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A obrigação de não fazer tem por objeto uma prestação negativa, um comportamento
omissivo do devedor, e está regulada nos artigos 250 e 251 do CC. É um dever de abstenção de
um fato. Desse modo, a execução da obrigação de não fazer, é um fazer, e o credor requererá o
desfazimento daquilo que não deveria ser sido feito.
Obs.: o artigo 814 do CPC também é aplicado nas obrigações de não fazer.
“Art. 250. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do devedor, se
lhe torne impossível abster-se do ato, que se obrigou a não praticar.”
Art. 251. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor pode
exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o culpado
perdas e danos.
Art. 822 do CPC. Se o executado praticou ato a cuja abstenção estava obrigado por
lei ou por contrato, o exequente requererá ao juiz que assine prazo ao executado
para desfazê-lo.
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Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não
se estipulou.
§ 1º Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte
em outra.
Art. 254. Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações,
não competindo ao credor a escolha, ficará aquele obrigado a pagar o valor da que
por último se impossibilitou, mais as perdas e danos que o caso determinar.
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do devedor, caberá a este o pagamento do objeto escolhido (aquele objeto que havia sobrado),
mais perdas e danos.
Art. 255. Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se
impossível por culpa do devedor, o credor terá direito de exigir a prestação
subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos; se, por culpa do devedor,
ambas as prestações se tornarem inexequíveis, poderá o credor reclamar o valor de
qualquer das duas, além da indenização por perdas e danos.
As obrigações facultativas não estão previstas em lei, mas são reconhecidas pela
doutrina e jurisprudência. Na obrigação facultativa o devedor se compromete a cumprir uma
prestação, mas reservando-se a faculdade de se desobrigar cumprindo outra prestação.
Ex.: João se compromete a entregar um carro para Maria, podendo também se liberar
entregando uma lancha. Neste caso a faculdade de substituição será sempre do devedor.
Caso o objeto da prestação principal venha a se perder antes do cumprimento da
obrigação, sem culpa do devedor, a obrigação se resolve sem ônus para qualquer das partes.
Não há que se falar em concentração da prestação restante, uma vez que o devedor só se
obrigou ao cumprimento de uma prestação, a outra era facultativa.
Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância,
diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam. Por exemplo, o dinheiro,
saca de café etc. Já os bens indivisíveis são aqueles que não admitem fracionamento, pois, se
houver, perdem sua qualidade. Têm-se como exemplo de bens indivisíveis os animais.
Torna-se relevante o estudo das obrigações divisíveis e indivisíveis quando houver
pluralidade de credores. Desse modo, havendo um credor e um devedor, não há relevância em
sabermos se a obrigação é divisível ou indivisível. A problemática reside na situação em que
houver um credor com vários devedores ou vários credores com apenas um devedor – nessa
situação, é necessário sabermos se a obrigação é divisível ou não.
Desse modo, em uma obrigação divisível, por exemplo, em que três devedores devem
três mil reais ao credor, cada devedor está obrigado ao pagamento de mil reais – fracionam-se
as obrigações em quantos forem os sujeitos.
Por outro norte, se a prestação envolver uma obrigação indivisível, por exemplo, em
que dois devedores devem entregar ao credor um cavalo que custa dois mil reais, cada devedor
estará obrigado pela dívida toda.
No entanto, se a obrigação for cumprida por apenas um dos devedores, este se sub-roga
no direito do credor em relação ao outro devedor. A partir disso, aquele devedor que não
cumpriu a obrigação torna-se devedor daquele que pagou na quantia de mil reais – quota parte
na obrigação (art. 259, parágrafo único do CC).
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Art. 259. Se, havendo dois ou mais devedores, a prestação não for divisível, cada um
será obrigado pela dívida toda.
Art. 260. Se a pluralidade for dos credores, poderá cada um destes exigir a dívida
inteira; mas o devedor ou devedores se desobrigarão, pagando:
I - a todos conjuntamente;
“Art. 261. Se um só dos credores receber a prestação por inteiro, a cada um dos outros
assistirá o direito de exigir dele em dinheiro a parte que lhe caiba no total.”
Art. 262. Se um dos credores remitir a dívida, a obrigação não ficará extinta para com
os outros; mas estes só a poderão exigir, descontada a quota do credor remitente.
• Transação = acordo.
• Novação = extinção de uma obrigação, para criação de outra.
• Compensação = compensar as dívidas.
• Confusão = quando a pessoa do credor e do devedor se concentrarem na
mesma pessoa.
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morre, o devedor deverá pagar a quantia de dois mil reais (valor do bem). Tendo em vista que
dinheiro é divisível, aplicam-se as regras de divisibilidade.
“§ 1º Se, para efeito do disposto neste artigo, houver culpa de todos os devedores,
responderão todos por partes iguais.”
Seguindo o exemplo apresentado acima, havendo dois devedores obrigados na entrega
de um cavalo no valor de dois mil reais. Se a coisa vier a se perder por culpa dos devedores, cada
um responderá pelo valor de mil reais (equivalente - valor do animal) mais a importância
referente às perdas e danos.
“§ 2º Se for de um só a culpa, ficarão exonerados os outros, respondendo só esse pelas
perdas e danos.”
Havendo culpa apenas de um dos devedores, o valor sobre o equivalente continua sendo
dos dois devedores, mas o culpado na morte do cavalo deverá arcar com as perdas e danos.
8. OBRIGAÇÕES SOLIDÁRIAS
8.1. INTRODUÇÃO
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“Art. 269. O pagamento feito a um dos credores solidários extingue a dívida até o
montante do que foi pago.”
Art. 270. Se um dos credores solidários falecer deixando herdeiros, cada um destes
só terá direito a exigir e receber a quota do crédito que corresponder ao seu quinhão
hereditário, salvo se a obrigação for indivisível.
Por exemplo, em uma relação obrigacional composta por um devedor e quatro credores,
em virtude de um montante de quatro mil reais. Havendo falecimento do credor 1, deixando
como herdeiro seus dois filhos, estes terão direito de receber a quota parte que era devido ao
falecido. Desse modo, se a dívida era de quatro mil reais, cada credor poderá exigir o valor total
da dívida, mas os herdeiros não poderão exigir o montante integral, pois cada filho do de cujus
receberá a quota do crédito que corresponde seu quinhão hereditário, que no caso seria 500
reais.
Agora, se a obrigação for indivisível, tendo por objeto a entrega de um cavalo, por
exemplo, os filhos do de cujus poderiam exigir o bem – em razão da invisibilidade do objeto.
“Art. 271. Convertendo-se a prestação em perdas e danos, subsiste, para todos os
efeitos, a solidariedade.”
Em se tratando de obrigação solidária na entrega do cavalo, havendo morte do animal,
todos os devedores permanecem obrigados pelo valor integral do animal.
“Art. 272. O credor que tiver remitido a dívida ou recebido o pagamento responderá aos
outros pela parte que lhes caiba.”
Havendo o perdão da dívida por um dos credores solidários, significa que ele está
perdoando a dívida inteira, de modo que o respectivo credor se obriga ao pagamento da quota
parte dos demais.
“Art. 273. A um dos credores solidários não pode o devedor opor as exceções pessoais
oponíveis aos outros.”
Exceção pessoal é defesa pessoal. O devedor poderá apresentar defesa geral e defesa
pessoal. No entanto, a defesa pessoal fica atrelada ao devedor/demandado e o
credor/demandante. De modo que o devedor/demandado não poderá opor exceção pessoal de
outro co-devedor.
Art. 274. O julgamento contrário a um dos credores solidários não atinge os demais,
mas o julgamento favorável aproveita-lhes, sem prejuízo de exceção pessoal que o
devedor tenha direito de invocar em relação a qualquer deles.
Solidariedade passiva é aquela que possui pluralidade de devedores, e o credor, por sua
vez, pode exigir de qualquer devedor o cumprimento da obrigação por inteiro, seja o bem
divisível ou indivisível.
Art. 275. O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores,
parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os
demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.
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Art. 276. Se um dos devedores solidários falecer deixando herdeiros, nenhum destes
será obrigado a pagar senão a quota que corresponder ao seu quinhão hereditário,
salvo se a obrigação for indivisível; mas todos reunidos serão considerados como um
devedor solidário em relação aos demais devedores.
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“Art. 283. O devedor que satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada um dos
co-devedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do insolvente, se o houver,
presumindo-se iguais, no débito, as partes de todos os co-devedores.”
Havendo algum devedor insolvente – aquele que não tem bens para pagamento da
dívida – a quota parte que seria dele, devem ser partilhados entre os demais devedores
solidários para cumprimento da obrigação.
“Art. 284. No caso de rateio entre os co-devedores, contribuirão também os exonerados
da solidariedade pelo credor, pela parte que na obrigação incumbia ao insolvente.”
Quando o credor libera da solidariedade qualquer um dos devedores, a quota do
insolvente também integrará a quota daquele que foi exonerado da solidariedade.
“Art. 285. Se a dívida solidária interessar exclusivamente a um dos devedores,
responderá este por toda ela para com aquele que pagar.”
Havendo solidariedade entre o locatário e fiador (este somente é devedor em razão da
renúncia ao benefício de ordem da fiança, por exemplo). Se este paga a dívida por inteiro,
cobrará a integralidade da dívida do locatário, visto que a responsabilidade do fiador somente
ocorreu em razão do não cumprimento de uma obrigação que cabia ao locatário.
9.1. INTRODUÇÃO
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9.2.1.1. SOLVENS
É aquele que irá solver a obrigação, ou seja, é quem vai pagar. Via de regra, o solvens é
o devedor, mas outras pessoas também podem pagar.
O art. 304 do CC diz que qualquer interessado na extinção da dívida pode pagar, usando-
se, se o credor se opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor.
Quem é o terceiro interessado na dívida? É aquela pessoa que tenha interesse
patrimonial na extinção daquela dívida, como o fiador, avalista, herdeiro, etc.
Havendo o pagamento pelo interessado, ele irá se sub-rogar nos direitos do credor. Há
uma sub-rogação legal. O pai que paga a dívida do filho não é terceiro interessado, devendo
haver interesse jurídico.
Cabe ressaltar que o solvens poderá ser o terceiro não interessado. Se o terceiro não
interessado fizer o pagamento em seu próprio nome, terá direito ao reembolso, não se sub-
rogando nas posições do credor. Na verdade, terá direito apenas ao reembolso. Se pagar a dívida
antes do vencimento, só terá direito ao reembolso quando houver o vencimento daquela dívida.
Questiona-se: e se o terceiro não interessado fizer o pagamento em nome do devedor,
e em conta desse devedor? Não existindo oposição do devedor quanto a este pagamento, que
o terceiro não interessado faz em seu nome, este terceiro não interessado não terá direito a
nada. Nesse caso, considera-se como se tivesse feito uma doação, já que fez em nome do
devedor e não houve oposição desse devedor.
Diferente é o art. 306, que diz que realizado o pagamento por terceiro não interessado,
em seu próprio nome (terceiro), sem conhecimento ou havendo oposição do devedor, não
existirá a obrigação de reembolso em relação a este terceiro, se o devedor provar que ele tinha
meios para ilidir a ação do credor. Ex.: disser que a dívida estava prescrita, situação na qual não
poderá cobrar do devedor.
Por outro lado, se o devedor não prova que tinha meio para ilidir a ação do credor, aí é
claro que deverá pagar ao terceiro não interessado, a despeito de ter pagado com a oposição,
visto que o sujeito deveria ter de pagar de alguma forma ao credor. Porém, como o terceiro
pagou, terá esse direito ao reembolso. Isso porque a lei veda o enriquecimento sem causa.
O que obsta o direito ao reembolso é considerar que o devedor poderia dizer que não
pagaria o credor, pois ele era devia ao devedor, razão pela qual seria compensada a dívida, ou a
dívida estava prescrita, ou ainda havia confusão. Se o devedor conseguir provar que não iria
pagar a dívida, o terceiro não interessado não terá direito a reembolso.
O art. 307 estabelece que só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da
propriedade, quando feito por quem possa alienar o objeto em que ele consistiu. Isto é, veda-
se a venda a non domino, ou seja, alienação por quem não é dono.
O parágrafo único diz que, se a parte der em pagamento coisa fungível que pertença a
um terceiro, não será mais possível que este terceiro reclame do credor que recebeu de boa-fé
a coisa fungível e que a consumiu, ainda que o solvente não tivesse o direito de aliená-la.
9.2.1.2. ACCIPIENS
É quem vai receber o pagamento, ou seja, a quem se deve pagar. Quem recebe
normalmente é o credor, mas o pagamento pode ser feito a um representante do credor, que
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tenha poderes para receber o pagamento. Caso este representante não tenha poderes, este
pagamento só irá valer após uma ratificação do credor, ou ainda se o devedor provar que houve
a reversão do pagamento em proveito do credor.
O art. 309 do CC é válido o pagamento ao credor putativo, ou seja, aquele que parece
credor, mas que não o é, desde que o credor tenha agido com boa-fé. Este dispositivo aplica a
teoria da aparência.
Vamos pegar um exemplo, Eduardo é locatário de um imóvel e vem fazendo
pagamentos do aluguel na imobiliária X. Após um ano, o locador mudou para imobiliária Y, sem
informar ao locatário. Neste caso, Eduardo continuou depositando em favor da imobiliária X.
Este é credor putativo, pois o devedor fez pagamentos por meio da teoria da aparência.
Segundo o art. 310, não vale o pagamento cientemente feito ao credor incapaz de dar
quitação, salvo se o devedor provar que houve reversão do valor pago em favor daquele credor
incapaz de dar quitação.
É preciso conferir uma interpretação extensiva para esta incapacidade, não
abrangendo apenas a incapacidade stricto sensu (absoluta e relativa), funcionando também
como tal o credor que não tinha autorização para isso. Neste caso, o pagamento deve acontecer
novamente.
O art. 311 diz que deve ser autorizado para receber o pagamento quem está munido do
documento representativo da quitação. Presume-se autorizado a receber o pagamento quem
detém o recibo nas mãos, salvo se as circunstâncias contrariarem a presunção daí resultante.
Já o art. 312 enuncia que, se o devedor pagar ao credor, apesar de já ter sido intimado
da penhora feita sobre o crédito, ou sobre a impugnação feita sobre aquele crédito por uma
terceira pessoa, não deve ser tido como válido o pagamento perante o terceiro. Na verdade,
será considerado ineficaz, apesar de a lei falar em invalidade. Ex.: João é credor do Samer, tendo
um cheque de 30 mil reais. João está devendo José, o qual promove ação de execução contra
João. O cheque é penhorado, e Samer já tem ciência disso. Samer faz o pagamento da dívida em
favor de João. Este pagamento é inválido, segundo a lei, em face de José.
O art. 313 diz que o objeto da prova é a prestação, e o credor poderá se recusar a
receber o que não foi pactuado, ainda que esta coisa seja mais valiosa do que aquilo que foi
pactuado.
Além disso, se não tiver sido acordado o pagamento parceladamente, não se pode
obrigar o credor a receber de forma parcelada, e nem o devedor a pagar parceladamente, salvo
se o contrato tiver previsão nesse sentido.
Todavia, há uma exceção legal, conforme o art. 916, o qual diz que, no prazo para
embargos, reconhecendo o crédito do exequente, e comprovando o depósito de 30% do valor
da execução, acrescido de custas e honorários de advogado, o executado pode requerer que lhe
seja permitido pagar o restante em até 6 parcelas mensais. Trata-se de uma imposição legal de
recebimento parcelado da dívida.
O art. 314 enuncia que, ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não
pode o credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se
ajustou.
Já o art. 315 afirma que, as dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em
moeda corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subsequentes. Trata-se de
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O devedor que paga tem direito a quitação pelo credor, e pode reter o pagamento,
enquanto não lhe seja dada.
Essa quitação deverá ter os seguintes requisitos, previstos no art. 320:
• valor expresso da obrigação;
• dívida que está sendo quitada (especificidade);
• identificação do devedor, ou de quem está pagando em seu lugar;
• tempo e lugar do pagamento;
• assinatura do credor, ou de seu representante.
O parágrafo único do art. 320 diz que, ainda que a quitação não tenha os requisitos
estabelecidos, valerá a quitação, se de seus termos ou das circunstâncias conseguir se perceber
que a dívida foi paga.
Deve-se obstar o enriquecimento sem causa do credor.
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Existem algumas regras que fazem nascer a presunção de pagamento. Esta presunção
é relativa, admitindo prova em contrário:
• nas obrigações de trato sucessivo, a quitação da última estabelece a presunção
de que foram solvidas as prestações anteriores, salvo se houver ressalva
expressa da quitação;
• se for dada quitação ao capital, sem a reserva dos juros, presume-se que houve
o pagamento dos juros também. Trata-se de aplicação do princípio da
gravitação jurídica;
• a entrega do título ao devedor firma a presunção relativa do pagamento, mas
esta presunção de quitação fica sem efeito se o credor provar em 60 dias que
não houve o pagamento.
Flávio Tartuce diz que tal presunção se dará apenas em relação aos títulos de crédito,
pois se for outro instrumento contratual, será presumido o perdão da dívida.
• Presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a quitação.
Isto é, se o contrato não tratar sobre de quem serão as despesas, correrão por
conta do devedor. Agora, se houver um aumento dessas despesas por fato
imputado ao credor, em relação a este acréscimo, quem deverá suportar será o
credor.
• Se houver o pagamento por medida ou por peso, e havendo silêncio das partes,
presume-se que foram adotados os critérios do lugar da execução da obrigação.
Vamos pegar um exemplo, Samer compra 10 alqueires no Estado de SP, e ele mora em
Goiás. Porém, qual seria a metragem do alqueire? Não foi falado. Em São Paulo, 1 alqueire é
24.000m, enquanto no Goiás 1 alqueire é 48.000m. Dessa forma, presume-se que a medida
seguirá o critério do lugar da coisa.
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• Supressio: é uma supressão, por uma renúncia tácita de um direito pelo seu não
exercício pelo passar do tempo.
• Surrectio: é o nascimento de um direito para a parte em razão do não exercício
da outra parte.
Conceitua-se como um depósito feito pelo devedor da coisa devida, a fim de que o
devedor se libere de uma obrigação, podendo ocorrer na esfera judicial ou na esfera
extrajudicial, neste caso o dinheiro é depositado em estabelecimento bancário oficial.
O pagamento em consignação é um meio indireto de o devedor exonerar-se do liame
obrigacional que vincula o devedor ao credor.
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Está sempre relacionada a uma obrigação de dar, não podendo estar relacionada a uma
obrigação de fazer ou não fazer, visto que é necessário depositar a coisa.
O art. 335 estabelece um rol de situações em que a consignação poderá acontecer:
• poderá haver consignação em pagamento se o credor não puder, ou, sem justa
causa, recusar receber o pagamento, ou se recusar a dar quitação;
• poderá haver consignação em pagamento se o credor não for, nem mandar
representante para receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos
(obrigação quesível);
• poderá haver consignação em pagamento se o credor for incapaz de receber,
for desconhecido, declarado ausente, ou se o credor residir em lugar incerto
ou de acesso perigoso ou difícil;
• poderá haver consignação em pagamento se ocorrer dúvida sobre quem deva
legitimamente receber o objeto do pagamento;
• poderá haver consignação em pagamento se pender litígio sobre o objeto do
pagamento.
Para que a consignação em pagamento seja válida e eficaz, é necessário que o devedor
observe todos os requisitos do pagamento direto, como pessoas, objeto, modo e tempo do
pagamento e todos os requisitos sem os quais não é válido o pagamento.
Promovida a ação de consignação em pagamento, será citado o credor para que apresente
contestação. Na contestação, o credor poderá alegar:
• não houve recusa do pagamento;
• que houve justa recusa;
• que o depósito não foi efetuado no prazo e no lugar do pagamento;
• que o depósito não foi integral, situação na qual deverá indicar o valor.
O art. 546 do NCPC estabelece que, julgado procedente o pedido, o juiz declarará
extinta a obrigação e condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios. É o
princípio da causalidade.
O CC, no art. 339, diz que, julgado procedente o depósito, o devedor já não poderá
levantar o objeto da consignação, eis que o levantamento da quantia consignada só será possível
se os outros devedores concordarem e os fiadores concordarem. Tanto é que o art. 340 do CC
diz que o credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o depósito, aquiescer no
levantamento, perderá a preferência e a garantia que lhe competiam com respeito à coisa
consignada, ficando para logo desobrigados os codevedores e fiadores que não tenham
anuído.
Se o credor anuiu, a despeito da concordância dos fiadores, eles “lavaram as mãos”, não
respondendo mais em relação àquela dívida.
O art. 342 diz que, se houver a obrigação de dar coisa incerta, é preciso que se faça a
escolha (concentração). Se esta escolha couber ao credor, será ele citado para promover a
concentração, sob pena de não o fazendo perder o direito de escolha, e ser depositada a coisa
à escolha do devedor.
O devedor de uma obrigação litigiosa se exonerará através de consignação. Supondo
que o devedor pague a um dos pretendidos credores, tendo o conhecimento do litígio. Neste
caso, o devedor de obrigação litigiosa assumirá o risco do pagamento.
Se ele achou que João venceria e João vencer, não há problema. O problema surge se
Pedro pagou a João, mas quem venceu foi José. Então deverá pagar a José, visto que assumiu o
risco, a despeito do litígio que pesava sob o objeto.
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Se a dívida vencer, pendendo litígio entre os credores, pode qualquer dos credores
requerer a consignação. Veja, via de regra, a consignação é requerida pelo devedor, mas no caso
do art. 345 é o credor que pede a consignação (art. 345).
Se houver prestações sucessivas e houver consignação de uma delas, o devedor pode
continuar depositando as que forem se vencendo no curso do processo, sem maiores
formalidades.
Deverá fazer este depósito no prazo de 5 dias, contados da data do respectivo
vencimento de cada uma das prestações em que forem se vencendo no curso do processo.
O §1º do art. 539 do NCPC estabelece que em se tratando de obrigação em dinheiro, poderá o
valor ser depositado em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do
pagamento, cientificando-se o credor por carta com aviso de recebimento, dando o prazo de
10 (dez) dias para a manifestação de recusa.
Decorrido o prazo de 10 dias, contado do retorno do aviso de recebimento, sem a
manifestação de recusa, será liberado o devedor da obrigação, ficando à disposição do credor a
quantia depositada.
No entanto, se houver recusa, poderá ser proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação de
consignação, promovida pelo devedor, instruindo a inicial com o comprovante do depósito e
comprovante da recusa pelo credor. Não propondo a ação, o depósito ficará sem efeito,
podendo o devedor levantar este depósito.
Imputar é apontar para alguém ou para algo. Uma pessoa que está obrigada por dois
ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem a pessoa o direito de indicar a qual
deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos. Ex.: Samer deve a João 50 mil
reais de um cheque, outro de 50 mil reais e mais um de 50 mil reais. Cada um desses cheques
venceu em 3 meses, 2 meses e 1 mês, respectivamente. Samer deposita 50 mil reais.
A imputação é dizer qual é a dívida que está sendo paga. Esta escolha geralmente cabe
ao devedor, sendo possível ao contrato estabelecer que esta escolha caiba ao credor.
Caso o devedor não fazer qualquer declaração, transfere-se o direito de escolha ao
credor.
Caso não haja manifestação do credor, quem fará a imputação é a própria lei.
A ordem de imputação é a seguinte:
• havendo capital e juros, o pagamento será feito primeiro em relação aos
juros;
• havendo duas dívidas, será imputado o pagamento à dívida mais antiga;
• havendo as dívidas com mesmo vencimento, será imputada à dívida mais
onerosa;
• não havendo dívida mais onerosa, a imputação será feita a todas as dívidas,
na mesma proporção, apesar de ausência de previsão legal.
Perceba que há uma ordem legal quando o devedor e o credor não exercem esse direito
que a lei lhes concede. O ato de imputação é um ato unilateral, razão pela qual é consagrado
como uma regra especial de pagamento.
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Sub-rogar-se é substituir uma coisa por outra. Coloca-se uma coisa no lugar da coisa
primitiva. E esta nova coisa terá os mesmo ônus e mesmos atributos.
Porém, se fizer uma substituição não de uma coisa, mas de uma pessoa por outra, tendo
esta os mesmos direitos e as mesmas ações daquela pessoa antiga, haverá uma sub-rogação
pessoal.
Na sub-rogação pessoal ativa, troca-se o credor. O que se percebe é que não há extinção
da obrigação, só sendo trocado o credor. Isto é, uma terceira pessoa passa a ser o credor da
relação jurídica obrigacional.
A sub-rogação opera-se, de pleno direito, em favor:
• do credor que paga a dívida do devedor comum;
• do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como
do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre
imóvel;
• do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado,
no todo ou em parte.
O art. 349 afirma que a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações,
privilégios e garantias que o credor primitivo tinha, em relação à dívida, contra o devedor
principal e os fiadores.
A sub-rogação poderá ser classificada em:
• sub-rogação legal;
• sub-rogação convencional.
São as hipóteses de pagamento feitas por terceiro interessado, o qual irá se sub-rogar
na posição do credor. Ex.: o credor paga a dívida do devedor comum a outro credor. Samer e
João são credores de José de 100 mil reais. Samer dá 50 mil reais a João, passando a ter o crédito
de 100 mil reais de José. Neste caso, há sub-rogação legal.
Também tem sub-rogação legal o adquirente de um imóvel hipotecado que paga ao
credor hipotecário, situação na qual ficará sub-rogado na posição de credor hipotecário.
Também será possível a sub-rogação do terceiro interessado que paga a dívida pela qual
podia ser responsabilizado.
O pagamento efetivado por terceiro não interessado, via de regra, não gera sub-
rogação, mas poderá gerar se estiver previsto em contrato. Quando o credor recebe o
pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos, há aqui uma sub-
rogação convencional.
Quando uma terceira pessoa empresta ao devedor uma quantia necessária para que o
devedor solva sua dívida, mas com a condição de que deste que está emprestando (mutuante)
ficar sub-rogado nos direitos do credor satisfeito, também haverá sub-rogação convencional.
Segundo o CC, a sub-rogação é convencional:
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Supondo que o terceiro, devedor do título, não tenha sido notificado, é necessário
notificar, visto que é necessário saber quem é o credor do título. Na cessão ele seria notificado,
razão pela qual aqui na dação também o será.
Se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, a obrigação primitiva será
restabelecida e ficará sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros de boa-
fé. Ex.: João deve um cavalo a Pedro, mas este aceitou um lote de Pedro. Feita a dação. No
entanto, por conta de uma ação, houve evicção lote, voltando João a dever um cavalo a Pedro.
Ocorre que, no período, o cavalo havia sido vendido para um terceiro de boa-fé. Neste caso,
João deverá para Pedro um valor equivalente ao cavalo.
9.3.5. DA NOVAÇÃO
Art. 364. A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não
houver estipulação em contrário. Não aproveitará, contudo, ao credor ressalvar o
penhor, a hipoteca ou a anticrese, se os bens dados em garantia pertencerem a
terceiro que não foi parte na novação.
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Se a obrigação é nula, a novação é nula. Supondo que a obrigação anterior era válida, e
aí veio a novação, a qual seria nula. Nesse caso, se a novação é nula, vai prevalecer a obrigação
antiga, visto que deverá retroagir.
• Novação objetiva (real): o devedor vai contrair com o credor uma nova dívida, mas o
credor e devedor são os mesmos.
• Novação subjetiva (pessoal): há alteração dos sujeitos da relação, podendo ser
classificada em:
o Novação subjetiva ativa: há substituição do credor. Para isso, a lei traz alguns
requisitos: i) consentimento do devedor perante o novo credor; ii) consinta o
antigo credor; iii) consinta do novo credor. Todos precisam consentir.
o Novação subjetiva passiva: há a extinção da dívida anterior por uma nova, mas
com a substituição do devedor. Aqui também há uma subclassificação:
▪ novação subjetiva passiva por expromissão: em que o terceiro assume
a dívida do devedor originário, substituindo o devedor originário, mas
sem consentimento do devedor originário. E por isso expromissão.
▪ novação subjetiva passiva por delegação: nesse caso, é feita com
consentimento do devedor originário, concordando em ser substituído.
▪ novação subjetiva mista: há alteração do objeto e a alteração dos
sujeitos da relação jurídica. Ex.: Samer devia um cavalo a José. Agora,
quem deve é João, e não mais um cavalo, e sim um boi. Houve uma
novação subjetiva e objetiva.
No caso da novação subjetiva passiva: altera-se o devedor. A obrigação anterior está
extinta e se altera a obrigação com um novo devedor. Caso este novo devedor seja insolvente,
o credor não terá direito de regresso contra o antigo devedor, visto que a dívida anterior está
extinta. Isto, salvo se o credor demonstrar que o devedor originário obteve esta novação passiva
por má-fé.
Em outras palavras, se o novo devedor for insolvente, não tem o credor, que o aceitou,
ação regressiva contra o primeiro, salvo se este obteve por má-fé a substituição (art. 363).
Se não houver o consentimento do fiador, e for feita uma novação, estará ele exonerado, visto
que da nova ele não participou.
O art. 365 vai dizer que ocorrendo a novação entre o credor e um dos devedores
solidários, somente sobre os bens do que contrair a nova obrigação vão subsistir as
preferências e garantias do crédito novado. Isto é, os outros devedores solidários ficam, por esse
fato, exonerados.
Isto é, se os devedores solidários da obrigação primitiva estão exonerados, visto que
aquela dívida se extinguiu.
Cabe ressaltar que o STJ tem analisado o instituto da novação com as lentes do princípio
da função social do contrato. Esta forma de enxergar a novação fica evidenciada pela Súmula
286 do STJ, que diz que a negociação do contrato bancário, ou a confissão da dívida, não
impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores.
9.3.6. DA COMPENSAÇÃO
Compensação ocorre quando duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor
uma da outra, situação na qual as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.
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O art. 379 diz que, se a mesma pessoa for obrigada por várias dívidas compensáveis,
serão observadas, no compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação do
pagamento. Isto é, se há várias dívidas compensáveis, o devedor vai dizer qual é a dívida que
está compensando. Caso não o faça, quem irá dizer será o próprio credor.
Caso ninguém se valha dessa faculdade, quem vai decidir será a lei:
• havendo capital e juros, o pagamento será feito primeiro em relação aos
juros;
• havendo duas dívidas, será imputado o pagamento à dívida mais antiga;
• havendo as dívidas com mesmo vencimento, será imputada à dívida
mais onerosa;
• não havendo dívida mais onerosa, a imputação será feita a todas as
dívidas, na mesma proporção, apesar de ausência de previsão legal.
Por fim, não se admite a compensação em prejuízo de direito de terceiro. O devedor
que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste, não pode opor ao
exequente a compensação, de que contra o próprio credor disporia.
9.3.7. DA CONFUSÃO
Confusão está presente quando há, na mesma pessoa, credor e devedor. Isso pode
ocorrer tanto por ato inter vivos como por ato causa mortis.
A confusão operada na pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação
até a concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao mais a
solidariedade.
Confusão ocorre quando o credor e o devedor são a mesma pessoa, situação na qual
extinguiu a obrigação.
No caso de causa mortis, a confusão poderá ocorrer quando o filho deve ao pai, mas,
tendo aquele morrido, o filho recebeu a herança, extinguindo a dívida.
No caso do credor solidário, João deve com outros 3 indivíduos 100 mil reais ao pai. João
era o único herdeiro. Em relação a ele, houve a confusão. Portanto, 25 mil reais houve confusão,
faltando 75 mil reais, situação na qual persistirá a solidariedade, passando João ser o credor do
crédito.
Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a
obrigação anterior.
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10.1. INTRODUÇÃO
Transmitir é passar para frente. Quando há uma transmissão há uma cessão. E com isso
é possível extrair um conceito importante de que é o conceito de cessão.
Cessão é a transferência, a título oneroso ou gratuito, de uma posição na relação jurídica
obrigacional.
O direito brasileiro admite três formas de cessão:
• cessão do crédito;
• cessão do débito;
• cessão do contrato.
A cessão de crédito pode ser conceituada como um negócio jurídico bilateral, gratuito
ou oneroso, através do qual o credor transfere a outrem, totalmente ou parcialmente, a sua
posição na relação obrigacional.
Isto é, o credor passa para outra pessoa a posição de credor.
Há um credor primitivo que cede este crédito, denominado de cedente, bem como uma
pessoa que passa a ser credora, denominada cessionário. Há, ainda, o devedor, que é
denominado de cedido.
Com a cessão, são transferidos todos os elementos da obrigação, tanto os acessórios
como as garantias, visto que a obrigação é a mesma, pois há mudança dos sujeitos que
compõem a obrigação. No entanto, os acessórios poderão não ser abrangidos, caso haja
disposição em contrário.
Cabe ressaltar que o cessionário de crédito hipotecário tem o direito de fazer averbar
a cessão no registro do imóvel.
A verdade é que a cessão de crédito independe da anuência do devedor, mas ele deve
ficar sabendo que houve esta cessão.
O art. 286 vai dizer: o credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza
da obrigação, a lei, ou se não houver vedação no contrato (convenção) com o devedor.
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Essa cláusula proibitiva da cessão, que poderá estar prevista no contrato, não será
oponível ao cessionário de boa-fé, se ela não estiver escrita no contrato (instrumento da
obrigação).
Em regra, a cessão tem eficácia inter partes, e não exige sequer que seja escrita, ou
seja, poderá ser verbal.
Porém, para ter eficácia perante terceiros, será necessário que seja formulada por um
instrumento escrito, já que a cessão é negócio jurídico bilateral. Ou seja, é ineficaz, em relação
a terceiros, a transmissão de um crédito, se não celebrar-se mediante instrumento público, ou
instrumento particular revestido das solenidades do § 1º do art. 654.
Independentemente do conhecimento da cessão pelo devedor, pode o cessionário exercer os
atos conservatórios do direito cedido (art. 293).
Para a cessão ser válida, é desnecessária a anuência do devedor. Porém, o art. 290
dispõe que a cessão não tem eficácia em relação ao devedor se ele não for notificado. Todavia,
considera-se notificado o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da
cessão feita.
O devedor pode opor ao cessionário (que passou a ter a condição de credor) as
exceções que ele tinha em face do antigo credor ao novo credor, bem como as exceções que,
no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha contra o cedente. Isso significa
que quando o cedido for notificado da cessão, poderá alegar uma cessão em face do cedente.
A cessão de crédito pode ser onerosa (pode envolver lucro), situação na qual o cedente
ficará responsável pela existência do crédito ao tempo que cedeu (pro soluto).
Sendo a título gratuito, o cedente também terá responsabilidade, caso tenha procedido de
má-fé.
Ex.: contrato de faturização (factoring) é exemplo de cessão de crédito onerosa. Há um
cheque para receber 10 mil reais daqui a 30 dias, mas o sujeito busca a factoring para obter 9
mil reais hoje. Aqui houve uma cessão de crédito onerosa. O cedente só responderá pela
existência do crédito e não pela solvência. O credor originário não responde pela solvência, mas
apenas pela existência.
A cessão de crédito, em regra, é pro soluto, e não pro solvendo. Todavia, é possível
existir esta previsão contratual, no sentido de que a cessão é pro solvendo, ou seja, o cedente
terá responsabilidade pelo pagamento do crédito. Nesse caso, a cessão será pro solvendo.
Nessa hipótese, o cedente não responderá por mais do que recebeu com os seus
respectivos juros, mas tem de ressarcir as despesas da cessão e as que o cessionário houver
feito com a cobrança.
Ex.: supondo que no contrato com a factoring, Samer tenha recebido 9 mil reais pela
cessão do crédito de 10 mil reais. Daqui a 30 dias, se a factoring não receber os 10 mil reais,
Samer deverá pagar os 9 mil, mais os respectivos juros durante este intervalo de tempo à
factoring. Trata-se de cessão pro solvendo.
O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver
conhecimento da penhora. Todavia, o devedor que o pagar, não tendo notificação dela, fica
exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos de terceiro.
Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão, paga ao credor
primitivo, ou que, no caso de mais de uma cessão notificada, paga ao cessionário que lhe
apresenta, com o título de cessão, o da obrigação cedida; quando o crédito constar de escritura
pública, prevalecerá a prioridade da notificação.
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Segundo o art. 291, ocorrendo várias cessões do mesmo crédito, prevalece a que se
completar com a tradição do título do crédito cedido.
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No que toca ao terceiro, esta garantia que tinha prestado não volta, salvo se o terceiro
tivesse conhecimento desse vício anteriormente, situação na qual também voltará como
garantidor.
Na assunção de dívida, não poderá o novo devedor opor ao credor as exceções pessoais
que competiam ao devedor primitivo. Ou seja, o novo devedor não poderá opor exceções
pessoais pertencentes ao devedor primitivo.
Ademias, o adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do
crédito garantido. Se o credor, notificado, não impugnar em 30 dias a transferência do débito,
entender-se-á dado o assentimento.
A cessão contratual não está regulamentada em lei, mas ainda assim é válida. Trata-se
de um negócio jurídico atípico.
É a transferência da inteira posição ativa ou passiva na relação contratual. O que há é a
cessão da posição contratual.
Na maioria das vezes, nos contratos, as partes são mutuamente credores e devedores
de obrigações. Trata-se de uma relação complexa, já que se trata de uma cessão de um
complexo de direitos e obrigações.
Para que haja a cessão contratual, é indispensável que haja o consentimento do outro
contratante.
Isso porque o contrato faz lei entre as partes, obrigando as partes que contrataram. O
princípio que orienta os contratos é o princípio da relatividade.
Ex.: no mandato, o sujeito faz um substabelecimento, situação na qual cede a posição
de mandatário. Isto é, há uma cessão contratual.
11.1. INTRODUÇÃO
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Também chamado de mora debendi; mora solvendi; mora debitoris – configura-se mora
do devedor quando ocorre o descumprimento ou cumprimento imperfeito da obrigação por
parte deste, por causa a ele imputável.
Veja que somente haverá responsabilidade do devedor pela mora, quando houver culpa
deste em relação ao não cumprimento da obrigação.
É preciso dívida líquida e certa; dívida exigível e, vale lembrar que, se a obrigação tem
vencimento certo, a regra é de que a mora seja ex re, é preciso viabilidade do cumprimento
tardio da obrigação.
Sobre viabilidade, não é justo analisar se é viável mediante arbítrio do devedor, mas
deve partir de uma análise objetiva. O enunciado 162 da III Jornada de Direito Civil adverte que
a análise da viabilidade ou não do cumprimento tardio da obrigação deve ser feita
objetivamente e de acordo com a boa-fé. É o que preceitua o parágrafo único, do artigo 395 do
CC.
Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros,
atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
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Art. 400. A mora do credor subtrai o devedor isento de dolo à responsabilidade pela
conservação da coisa, obriga o credor a ressarcir as despesas empregadas em
conservá-la, e sujeita-o a recebê-la pela estimação mais favorável ao devedor, se o
seu valor oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e o da sua efetivação.
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integral daquela quantia inicial como se arras confirmatórias fosse, sendo legítima a
redução equitativa do valor a ser retido. STJ. 3ª Turma. REsp 1.513.259-MS, Rel.
Min. João Otávio de Noronha, julgado em 16/2/2016 (Info 577).
QUESTÕES
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e) João responderá apenas pela metade da dívida, ainda que Leopoldo não cumpra a obrigação
assumida perante Teresa.
7- (FCC– Promotor de Justiça Substituto– MT/2019) No tocante ao pagamento,
a) não é lícito convencionar o aumento progressivo de prestações sucessivas, pela insegurança
patrimonial causada ao devedor.
b) o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, salvo se mais
valiosa, pois nesse caso faltará interesse econômico à rejeição.
c) quando feito de boa-fé ao credor putativo é válido, salvo se provado depois que não era
credor.
d) em qualquer hipótese considera-se autorizado a receber o pagamento o portador da
quitação, pela presunção legal absoluta daí decorrente.
e) o terceiro não interessado, que paga a dívida em seu próprio nome, tem direito a
reembolsar-se do que pagar, mas não se sub-roga nos direitos do credor; se pagar antes de
vencida a dívida, só terá direito ao reembolso no vencimento.
8- (FCC – Promotor de Justiça Substituto – MT/2019) Em relação às obrigações de dar coisa
certa, é correto afirmar que,
a) como regra geral, a obrigação de dar coisa certa não abrange os acessórios, salvo se o
contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.
b) se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da
tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos
até o dia da perda.
c) sendo culpado o devedor, poderá o credor exigir o equivalente, ou aceitar a coisa no estado
em que se acha, nesses casos sem direito a reclamar perdas e danos.
d) até a tradição, pertence a coisa ao credor, com seus acréscimos, pelos quais poderá exigir
aumento do preço, com ou sem anuência do devedor.
e) deteriorada a coisa, sem culpa do devedor, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar
a coisa, nesse caso sem abatimento do preço pela referida ausência de culpa do devedor.
9- (MPE/SP – Promotor de Justiça Substituto – SP/2019) Gabriel Vieira, Paulo Martins, Carlos
Andrade e Marcelo Pereira emprestaram de Jorge Manuel a quantia de R$ 400.000,00
(quatrocentos mil reais) para a compra de um carro esportivo. As partes estabeleceram que
o referido valor seria dividido em quatro parcelas iguais e sucessivas bem como que todos
os devedores ficariam obrigados pelo valor integral da dívida.
Diante dessa situação, assinale a alternativa correta.
a) O pagamento parcial feito por Carlos e a remissão dele obtida pelo credor Jorge Manuel não
aproveitam aos outros devedores, senão até a concorrência da quantia paga ou relevada.
b) Se houver atraso injustificado no cumprimento da obrigação por culpa de Paulo, somente
este responderá perante Jorge Manuel pelos juros da mora decorrentes do atraso.
c) Se Gabriel falecer deixando herdeiros, o credor Jorge Manuel poderá cobrar de qualquer um
dos herdeiros a integralidade da dívida.
d) A propositura de ação pelo credor Jorge Manuel contra Paulo e Carlos importará na renúncia
da solidariedade em relação a Gabriel e Marcelo.
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e) Sendo Paulo demandado judicialmente pelo total da dívida, pode ele opor ao credor Jorge
Manuel as exceções que lhe forem pessoais, as comuns a todos, além das exceções pessoais
dos demais codevedores, por se tratar de obrigação solidária.
10- (MPE/SC – Promotor de Justiça – Matutina – SC/2019) Nos termos do Código Civil, quanto
ao lugar do pagamento, efetuar-se-á o pagamento no domicílio do devedor, salvo se as partes
convencionarem diversamente, ou se o contrário resultar da lei, da natureza da obrigação ou
das circunstâncias. Designados dois ou mais lugares, cabe ao devedor escolher entre eles.
( ) Certo
( ) Errado
11- (CESPE – Defensor Público – DF/2019) Tendo como referência as disposições do Código Civil
a respeito de sucessão provisória, perdas e danos e venda com reserva de domínio, julgue o item
subsecutivo.
As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, devem compreender as custas e
os honorários advocatícios e, além da atualização monetária, os juros de mora a partir do
descumprimento contratual.
( ) Certo
( ) Errado
12- (CESPE – Juiz Substituto – SC/2019) A multa estipulada em contrato que tenha por objeto
evitar o inadimplemento da obrigação principal é denominada
a) multa penitencial.
b) cláusula penal.
c) perdas e danos.
d) arras penitenciais.
e) multa pura e simples.
13- (CESPE – Juiz Substituto – PR/2019) De acordo com o Código Civil, nas consignações em
pagamento, o ato de depósito efetuado pelo devedor faz cessar
a) os riscos, mas os juros da dívida continuam a correr até a declaração de aceitação do credor.
b) os riscos e os juros da dívida, podendo o devedor requerer o levantamento do depósito
mesmo após a aceitação do credor.
c) os juros da dívida e impede o levantamento do valor depositado pelo devedor até que seja
aceito ou impugnado pelo credor.
d) os riscos e os juros da dívida; uma vez declarada a aceitação pelo credor, o depósito não
mais pode ser levantado pelo devedor.
14- (CESPE – Promotor de Justiça Substituto – PI/2019) Acerca do conceito, das formas e de
consequências das obrigações, é correto afirmar que
a) a lei é uma fonte de obrigações, porque estabelece o dever de cada indivíduo em função de
seu comportamento, o que não é viável pela vontade humana ou manifestação volitiva.
b) a responsabilidade objetiva cria obrigações que são verificadas independentemente da
configuração da ilicitude ou licitude da conduta do agente, bastando, para isso, verificar o
nexo causal entre a ação do ofensor e o dano.
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d) pode ser utilizada licitamente como meio de validar obrigações nulas ou extintas.
e) da obrigação principal não tem reflexos sobre as obrigações acessórias, tal como a fiança.
18- (VUNESP – Juiz Substituto – SP/2018) A solidariedade pode ser ativa ou passiva, mas não
se identifica com a indivisibilidade, pois,
a) nesta, a fim de que os devedores se exonerem para com todos os credores, exige-se o
pagamento conjunto ou mediante caução, enquanto naquela não se exige tal cautela; a
obrigação indivisível, quando se resolver em perdas e danos, torna-se divisível, enquanto a
obrigação solidária conserva sua natureza; a remissão de dívida não extingue a obrigação
indivisível para com os outros credores, entretanto, extingue-a a solidariedade até o
montante do que foi pago, e pode a obrigação ser solidária e divisível ou indivisível e não
solidária.
b) nesta, a fim de que os devedores se exonerem para com todos os credores, exige-se o
pagamento conjunto ou mediante caução, enquanto naquela não se exige tal cautela; a
obrigação indivisível, quando se resolver em perdas e danos, torna-se divisível, enquanto a
obrigação solidária conserva sua natureza; a remissão de dívida não extingue a obrigação
indivisível para com os outros credores, entretanto, extingue-a a solidariedade, até o
montante do que foi pago, não podendo, porém, a obrigação ser solidária e divisível ou
indivisível e não solidária.
c) naquela, para que os devedores se exonerem com todos os credores, exige-se o pagamento
conjunto ou mediante caução, enquanto nesta não se exige tal cautela; a obrigação
solidária, quando se resolver em perdas e danos, torna-se divisível, enquanto a obrigação
indivisível conservará sua natureza; a remissão de dívida não extingue a obrigação solidária
para com os outros credores, entretanto, extingue-a a obrigação indivisível, não podendo a
obrigação ser solidária e divisível ou não solidária e indivisível.
d) naquela, para que os devedores se exonerem com todos os credores, exige-se o pagamento
conjunto ou mediante caução, enquanto nesta não se exige tal cautela; a obrigação
solidária, quando se resolver em perdas e danos, torna-se divisível, enquanto a obrigação
indivisível conservará sua natureza; a remissão de dívida não extingue a obrigação solidária
para com os outros credores, entretanto, extingue-a a obrigação indivisível, e pode a
obrigação ser indivisível e não solidária ou divisível e solidária.
19- (VUNESP – Juiz de Direito Substituto – RS/2018) João emprestou a José, Joaquim e Manuel
o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais); foi previsto no instrumento contratual a
solidariedade passiva. Manuel faleceu, deixando dois herdeiros, Paulo e André. É possível
afirmar que João poderá
a) cobrar de Paulo e André, reunidos, somente até o valor da parte relativa a Manuel, ou seja,
R$ 100.000,00 (cem mil reais), tendo em vista que o falecimento de um dos devedores
extingue a solidariedade em relação aos herdeiros do falecido.
b) cobrar a totalidade da dívida somente se acionar conjuntamente todos os devedores, tendo
em vista que o falecimento de um dos devedores solidários ocasiona a extinção da
solidariedade em relação a toda a obrigação.
c) cobrar de Paulo e André a totalidade da dívida, tendo em vista que ambos, reunidos, são
considerados como um devedor solidário em relação aos demais devedores; porém,
isoladamente, somente podem ser demandados pelo valor correspondente ao seu quinhão
hereditário.
d) cobrar o valor da totalidade da dívida de José, Joaquim, Paulo ou André, isolada ou
conjuntamente, tendo em vista que, após o falecimento de Manuel, resultou numa
obrigação solidária passiva com 4 (quatro) devedores.
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GABARITO
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1. B
2. A
3. A
4. B
5. C
6. A
7. E
8. B
9. A
10. Errado
11. Errado
12. B
13. D
14. B
15. C
16. B
17. A
18. A
19. C
20. E
21. D
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1. PRINCÍPIOS CONTRATUAIS
Previsto a partir do artigo 421, do Código Civil, contratos é a mais comum e mais
importante fonte de obrigação ao lado das declarações unilaterais de vontade (testamento) e
os atos ilícitos (responsabilidade civil).
O contrato constitui uma das principais formas de movimentação da economia, sendo,
portanto, o responsável pela circulação de riquezas. Tudo que fazemos gira em torno de relações
contratuais, por exemplo, se você compra um livro da editora “X”, tem-se um contrato; se você
recebe sinal de TV a cabo, há uma relação contratual. Há quem diga, ainda, que na seara do
direito de família, o casamento é espécie contratual.
Notadamente, nesta oportunidade, estudaremos sobre um ato jurídico lícito, ou seja, a
vontade humana prevista na elaboração do contrato está direcionada para as consequências do
ato. Por exemplo, se “A” celebra contrato de compra e venda de um celular com “B”, o contrato
é assinado por ambas às partes. Contudo, faz-se necessário a seguinte indagação: a vontade de
vender o celular é exteriorizada por meio da assinatura do contrato? Não, a vontade de “A” está
voltada para as consequências, ou seja, a entrega do celular e o recebimento do dinheiro.
Dessa forma, tem-se como contrato, espécie de negócio jurídico, que depende, para
sua formação, da participação de pelo menos duas vontades, sendo, portanto, negócios jurídicos
bilaterais (manifestação de duas vontades) ou plurilaterais (manifestação de mais de duas
vontades).
Logo, levando-se em consideração a classificação de negócio jurídico, todos os
contratos são negócios jurídicos bilaterais, porém, admite-se negócio jurídico unilateral.
Negócio jurídico bilateral é aquele que está direcionado a produção de vantagens, como
no contrato de doação pura, que é unilateral no que diz respeito à vantagem, mas com relação
à manifestação de vontade, é bilateral. Isso porque o doador manifesta-se a vontade de doar e
o donatário a vontade de receber, com a prevalência do silêncio em algumas situações (art. 539
do CC).
Em resumo: Quando se fala em contrato, tem-se um negócio jurídico bilateral ou
plurilateral, não existe contrato formalizado com uma única manifestação de vontade, pois,
neste caso, estaremos diante de ato unilateral. Diante disso, sempre que na classificação de
contratos houver unilateralidade, estará relacionada à produção de vantagens.
Segundos os ensinamentos do professor Clóvis Beviláqua: “contrato é acordo de
vontades para o fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir relações jurídicas”.
A autonomia da vontade é um princípio clássico do direito contratual, tendo em vista
que a elaboração do contrato ocorre por meio da manifestação de vontade dos contratantes.
Consequentemente, o contrato de aperfeiçoa, pura e simplesmente, pela manifestação de
vontade, não há maiores formalidades.
Salienta-se ainda que, anteriormente, tínhamos a autonomia da vontade como um
princípio absoluto, o que não ocorre nos dias atuais. O anterior Código Civil (1.916) era um
sistema extremamente preocupado com questões patrimoniais, ou seja, buscava proteger tão
somente o patrimônio dos sujeitos. Havia figuras específicas neste código, por exemplo:
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(i) o homem que tomava as decisões nas relações familiares - o homem fixava domicílio
conjugal; ele que autoriza a esposa a trabalhar; o salário da esposa era regido pelo homem, bem
como, poderia ser retido por ele; o homem detinha o pátrio poder sob os filhos;
(ii) o testador nas relações sucessórias, poderia dispor livremente e da forma que
quisesse os seus bens;
(iii) os contratantes poderiam contratar da forma que melhor lhe convier; sobre o objeto
que quisesse; estipulavam as cláusulas contratuais; total ausência de aplicação da teoria da
imprevisão e aplicação do princípio pacta sunt servanda – o contrato faz lei entre as partes;
(iv) os proprietários poderiam utilizar a propriedade da maneira que pretendia.
Nesta seara, verificam-se alguns princípios basilares que regem o direito civil
contemporâneo, também chamado de “pedras de toque” do direito civil moderno, como:
princípio da socialidade, princípio da eticidade e princípio da operabilidade, concretude ou
simplicidade.
O princípio da função social dos contratos decorre do princípio da socialidade. Isto é,
continua-se presente a autonomia da vontade, mas, limitado pela “ética, boa-fé, probidade”. É
importante ponderar, que as expressões alhures mencionadas, encontra-se positivado no
Código Civil, em seu artigo 422, que diz: “os contratantes são obrigados a guardar, assim na
conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.
Ademais, informa o princípio da operabilidade, concreto ou simplicidade que o direito
deve ser concretizado. Assim, para não engessar o direito, o legislador insere no ordenamento
jurídico cláusulas/normas gerais, conceitos indeterminados, vagos ou abstratos, a serem
interpretados no caso concreto.
Tem-se, portanto, como função social dos contratos, transmitir um sentido social. Em
outras palavras, “é a retirada do sentido egoísta enraizado desde o CC/16, para algo
extremamente preocupado com a coletividade”. Ou seja, o princípio da socialidade coloca as
avenças em um plano transindividual.
Nesse sentido, dispõe o artigo 421, do CC:
“Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social
do contrato.”
A expressão “função social” é vaga, ou seja, trata-se de um conceito aberto, desse modo,
deve-se realizar uma interpretação do que venha a ser função social no caso concreto. É por isso
que é vedada a utilização do contrato como forma de “esmagamento social”. Por exemplo, não
é permitido em contrato de financiamento com instituição bancária, cláusulas que transcendem
os limites do egoísmo, ou seja, que rompe a função social do contrato e as bases do diploma
civilista, com utilização autoritária e exacerbada para satisfação da vontade das partes.
Com o advento do CC/2002 e segundo os ensinamentos de Judith Martins, atualmente,
vive-se a era da autonomia da vontade solidária, ou seja, os contratantes continuam tendo
autonomia da vontade, de modo que podem contratar com quem quiser; o objeto do contrato
é escolhido pelas partes; contratam quando querem e da forma que desejam, contudo, deve-se
observância a função social dos contratos.
Há uma grande probabilidade de ser cobrada em provas subjetivas a seguinte
indagação: Discorra acerca da função social do contrato e a autonomia da vontade contratual
Conclui-se, portanto, que a autonomia da vontade sempre esteve presente do campo
do direito civil, ao passo que se o sujeito não pode manifestar sua vontade, considera-se incapaz.
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Com efeito, enquanto a autonomia da vontade perante o sistema civilista revogado era absoluta,
hoje, continua-se coexistindo essa autonomia, mas com algumas limitações, o que não
descaracteriza o regime privado, mas aproxima-se com a preocupação com o coletivo, inerente
ao direito público.
Notadamente, nós tínhamos uma relação entre o direito público e direito privado
marcada por uma verdadeira dicotomia, ou seja, um não tinha relação com o outro. O direito
público era pensado para reger as relações de direito público, ou seja, do Estado. Por sua vez, o
direito privado, para reger as relações privadas, dos particulares. Tal dicotomia refere-se à
chamada summa divisio, e podemos citar como exemplo, a eficácia horizontal dos direitos
fundamentais nas relações privadas.
Em decorrência da função social do contrato, importante se faz algumas ponderações:
• o contrato deve ser concluído em benefício dos contratantes sem conflito com o
interesse público;
• o contrato não pode ser usado como instrumento de atividades abusivas, causando
dano à parte contrária ou terceiros;
• complementa a aplicação da boa-fé, pois, caso contrário, não se fala em preocupação
com o coletivo;
• questão de ordem pública, ou seja, verificando o magistrado que houve violação a
função social do contrato, ele poderá reconhecê-las de ofício. Tem-se como exemplo, a
boa-fé, função social do contrato, interpretação de cláusulas gerais, etc.;
• consoante às lições do professor Caio Mario: “A autonomia da vontade, à luz da função
social, somente sofrerá restrição quando em confronto com interesses sociais. Assim, é
fonte de equilíbrio social”.
2. PRINCIPIOLOGIA CONTRATUAL
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Enunciado 21: “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui
cláusula geral a impor a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação
a terceiros, implicando a tutela externa do crédito.”
• Tem-se como exemplo de terceiro atuando na relação contratual, na estipulação em
favor de terceiro.
Enunciado 22: “A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui
cláusula geral que reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e
justas.”
• Dessa forma, sempre que houver a possibilidade de desfazimento do contrato, pela
aplicabilidade da teoria da imprevisão, por exemplo, deve-se verificar a possibilidade
de conservação do contrato antes do seu desfazimento. A conservação do contrato
ocorre justamente em razão da função social do contrato.
Enunciado 23: A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo Código
Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o
alcance desse princípio quando presentes interesses metaindividuais ou interesse
individual relativo à dignidade da pessoa humana.
Enunciado 166: “A frustração do fim do contrato, como hipótese que não se confunde com a
impossibilidade da prestação ou com a excessiva onerosidade, tem guarida no Direito
brasileiro pela aplicação do art. 421 do Código Civil.”
Enunciado 167: Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação
principiológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor no que
respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma
nova teoria geral dos contratos.
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contratos privados que tenham uma atuação maior no direito público – coletividade - do que no
direito privado, é o que chamamos de dirigismo contratual. Por exemplo, os contratos de
telecomunicações, de seguros, de sistema financeiro, etc.
Acerca do seguro de vida, entendeu o STJ quando da edição do Informativo 594:
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Em regra, o contrato só produz efeitos em relação às pessoas que dele participam e que
manifestaram suas vontades. Todavia, de forma excepcional, pode atingir terceiro. Portanto,
trata-se de um princípio não absoluto.
O atingimento do terceiro ocorrerá, quando houver estipulação em favor de terceiro.
Exemplo disso ocorre no contrato de seguro de vida, em que os beneficiários do de cujus
poderão exigir o pagamento referente ao seguro.
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INAPLICABILIDADE.
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Contratos aleatórios, por sua vez, são aqueles que possuem a álea – risco - e envolvem
sorte ou azar aos contratantes. São modalidades de contrato aleatório: emptio spei – compra da
esperança – e emptio rei speratae – compra da coisa esperada.
Geralmente, no próprio contrato aleatório há a incidência de fatos imprevisíveis, desse
modo, se uma das partes propõe a outra, a entrega de sementes de tomates para plantio,
comprometendo-se a comprar todos os tomates que nascerem dessa safra, pelo valor de R$ 1,00
cada, na qual costumeiramente perfaz a produção de mil tomates. Independentemente da
quantidade de tomates que nascerem nesta safra, aquele que se obrigou, deve pagar pelo que
compactuou.
Obs.: se no contrato aleatório, o fato imprevisível não estiver inerente à álea, é
possível a aplicação da teoria da imprevisão, tendo em vista que esta teoria é implícita nos
contratos aleatórios.
Tem-se como exemplo, o preço. Desse modo, se a parte se compromete a pagar um
dólar por tomate, e a moeda esteja valendo R$ 3,15. Havendo modificação na economia e
passando o dólar a valer R$ 1,00, haverá prejuízo a uma das partes.
No novo CC, a matéria do abuso de direito tem real destaque; é o novo regime dos atos
ilícitos.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé
ou pelos bons costumes.
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Quando violada a boa-fé objetiva, ocorre à quebra da confiança, que tem como reflexo,
o cometimento do ato ilícito.
São vertentes da boa-fé objetiva em relação aos contratantes: dever de informação;
dever de proteção; dever de cooperação e dever de lealdade.
Atente-se, o inadimplemento não ocorre tão somente com o inadimplemento da
obrigação, mas também, com o adimplemento ruim da obrigação e, consequentemente, há
quebra da confiança, o que enseja o pagamento pelas perdas e danos. Convém mencionar ainda,
que a responsabilidade em decorrência de ato ilícito pelo abuso de direito, é objetiva, de forma
que o sujeito responderá independentemente de ter agido com culpa.
O dispositivo dispensa o “sentimento mau” e introduz o sistema da culpa social
residente no comportamento excessivo.
São figuras comuns que retratam o rompimento da confiança: venire contra factum
proprium; suppressio, surrectio, tu quoque, duty to mitigate the loss.
O supressio, expressão alemã verwirkun, é, a priori, a perda de um direito pelo seu não
exercício no tempo; um protelamento desleal do exercício de um direito.
Requisitos para caracterização da supressio:
• omissão no exercício de um direito;
• transcurso de um período de tempo;
• objetiva deslealdade;
• intolerabilidade do posterior exercício.
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Na surrectio, por sua vez, o raciocínio é o inverso; este configura o surgimento do direito
pelo costume ou comportamento de uma das partes; constituição de novo direitos.
São três os requisitos que caracterizam a surrectio:
• certo lapso de tempo;
• conjunção de fatores que apontem a criação deste novo direito;
• ausência de condições que impeçam a surrectio.
Verifica-se, portanto, que supressio e surrectio possuem o mesmo enfoque, onde tem
uma, tem-se presente a outra.
Ex.1: na convenção condominial de um prédio, ficou convencionado entre os
proprietários, que tais imóveis seriam utilizados para moradia, ou seja, imóveis residenciais –
quitinetes. Contudo, alguns proprietários passaram a alugar os referidos imóveis com o objetivo
de, ali, instalarem salas comerciais. Por longos anos, o condomínio era composto por salas
comercias e residenciais. Todavia, um ocupante das salas comerciais, passou a realizar
atividades com bastantes ruídos/barulhos, causando incomodo nos demais usuários. O
condomínio, por sua vez, ajuíza ação requerendo o cumprimento da convenção condominial, ou
seja, que tais imóveis fossem utilizados para fins de moradia, somente. O Tribunal entendeu que
já havia se passado muito tempo, para, só agora, requererem o cumprimento da convenção
condominial. De modo que, com o passar dos anos, a atividade comercial foi sendo tolerada
pelos condôminos, perdendo-se, portanto, o direito de exigir o disposto na convenção.
Ex. 2: em um contrato de locação ficou consignado que o locatário deveria realizar o
pagamento dos alugueres na imobiliária, no dia 10 de cada mês. Após a assinatura do contrato,
ficou estabelecido, verbalmente, que determinado funcionário da imobiliária passaria na
residência do locatário para recebimento dos alugueres, durante todos os meses de vigência do
contrato. Durante o primeiro ano, realizou-se dessa forma. Contudo, no 13º mês, o funcionário
não passou para receber o aluguel. Em contato com o locador, este alega ao locatário, que ele
deveria ir até a imobiliária realizar o pagamento, tendo em vista que haviam pactuado uma
dívida portável. Porém, veja que, consoante o disposto no artigo 330, do CC: “o pagamento
reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto
no contrato”. Dessa forma, não pode locatário cobrar multa em razão da mora.
Verifica-se, portanto, que o locador tem o direito de cobrar o aluguel, mas assim o faz,
com abuso do direito. Pois, para o locador ocorreu a supressio – perda do direito de exigir uma
dívida portável – e para o locatário, ocorreu a surrectio – direito de ter uma dívida quérable.
2.7.1.3. TU QUOQUE
A expressão tu quoque tem origem na frase dita pelo governante romano Júlio Cesar, a
seu filho adotivo Marcus Brutus: “Tu quoque, Brute, fili mi?”.
O fenômeno da tu quoque se encontra estampado no artigo 476 do CC, o qual se refere
à doutrina do exceptio non adimplente contractus, ou seja, exceção (defesa) do contrato não
cumprido.
Por exemplo, as partes convencionam que o veículo somente será entregue após o
pagamento de trinta mil reais. Porém, mesmo não efetuando o pagamento da obrigação, o
devedor ajuíza ação em face do credor, requerendo o adimplemento do contrato. O credor, por
sua vez, apresentará defesa alegando a tese da exceptio non adimplente contractus.
Dispõe o artigo 476 do CC:
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“Art. 476. Nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua
obrigação, pode exigir o implemento da do outro.”
Igualmente, no âmbito dos contratos, pode ser consignado, ainda, a chamada cláusula
solve et repete, que trata-se da renúncia à exceção do contrato não cumprido. Ou seja, as partes
pactuam que, mesmo havendo o não cumprimento da obrigação por uma delas, à outra se
submete ao cumprimento da obrigação que lhe cabe.
Ademais, temos ainda, a exceção ao contrato não cumprido em relação ao modo de
cumprimento da obrigação, que ocorrerá quando a parte cumpre a obrigação que lhe compete,
mas o faz de maneira diversa. Isto é, viola o meio pelo qual deva ser cumprida a obrigação
pactuada. (Tema já cobrado em prova subjetiva)
Prevê o artigo 477 do CC:
Art. 477. Se, depois de concluído o contrato, sobrevier a uma das partes contratantes
diminuição em seu patrimônio capaz de comprometer ou tornar duvidosa a
prestação pela qual se obrigou, pode a outra recusar-se à prestação que lhe
incumbe, até que aquela satisfaça a que lhe compete ou dê garantia bastante de
satisfazê-la.
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(vítima do dano). Trata-se de parcial inadimplemento contratual (dever anexo de reduzir o dano)
que gera uma compensação.
Exemplos:
1ª hipótese: João verifica algumas faíscas de fogo saindo do motor de seu veículo, muito
embora o automóvel tenha seguro, João tenta conter o incêndio (mesmo que tenha danificado
parte do veículo).
2ª hipótese: por outro lado, se João, deixar que o fogo se espalhe, nada fazendo para
minimizar os prejuízos. Mesmo que João tenha direito de acionar a seguradora, também possui
o dever de reduzir as próprias perdas.
Sendo devidamente comprovada esta última situação, João age com abuso do direito,
tendo em vista que o mesmo não procurou evitar um prejuízo maior - com inobservância da
boa-fé objetiva no caso concreto.
3.1. INTRODUÇÃO
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Obs.: as declarações que visem simplesmente à aproximação e o “convite a fazer oferta” não
configuram oferta.
Obs.: a oferta pode ser feita a pessoa indeterminada (oferta ao público), valendo, nesse caso,
como proposta e não como “convite a fazer oferta” (art. 429 do CC). Ex.: proposta realizada em
outdoor.
4. FORMAS CONTRATUAIS
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Por exemplo, João se desloca até uma construtora e relata sua intenção em adquirir um
apartamento alocado no décimo andar de determinado prédio que mesma construirá. João
celebra contrato preliminar com a construtora, por meio de um contrato de promessa de
compra e venda.
Não se trata de um contrato de compra e venda, pois, quando se trata de bem imóvel
cujo valor excede a trinta salários mínimos, faz-se necessário a escritura pública. Contudo, para
haver escritura pública, é preciso ter o bem, mas o imóvel ainda não foi construído (não existe).
Dessa forma, com intenção de criar vínculo entre as partes, o que pode ser feito no
momento, é um contrato de promessa de compra e venda – ou seja, promete-se que será
realizado um contrato definitivo posteriormente.
“Art. 464. Esgotado o prazo (para que efetive o contrato definitivo), poderá o juiz, a
pedido do interessado, suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo ao
contrato preliminar, salvo se a isto se opuser a natureza da obrigação.”
“Art. 465. Se o estipulante não der execução ao contrato preliminar, poderá a outra
parte considerá-lo desfeito, e pedir perdas e danos.”
“Art. 466. Se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma
sem efeito, deverá manifestar-se no prazo nela previsto, ou, inexistindo este, no que lhe for
razoavelmente assinado pelo devedor.”
O contrato preliminar, também conhecido como pactum de contrahendo ou contrato
promessa, é aquele que tem por objetivo garantir a realização de um contrato definitivo.
Tal contrato possui caráter provisório, interino e apenas é celebrado quando as partes
se comprometem a convencionar, posteriormente, um contrato definitivo.
Normalmente é utilizado nos casos em que as partes têm interesse recíproco no negócio
jurídico, porém, por algum inconveniente momentâneo, a contratação definitiva é efetivada em
circunstância oportuna subsequente.
Não se confunde com acordos provisórios – minutas, esboços ou cartas de intenção e
negociações preliminares.
Notadamente, os contratos preliminares possuem as mesmas regras e requisitos do
contrato definitivo, exceto quanto à forma.
Entendimento sumular e enunciado acerca do tema:
Súmula 84 do STJ: “É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de
posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do
registro.”
Súmula 308 do STJ: “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou
posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes
do imóvel.”
Súmula 413 do STF: “O compromisso de compra e venda de imóveis, ainda que não loteados,
dá direito à execução compulsória, quando reunidos os requisitos legais.”
Enunciado 30 da Jornada de Direito Civil: “A disposição do parágrafo único do art. 463 do novo
Código Civil deve ser interpretada como fator de eficácia perante terceiros.”
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O único vinculado é o que promete, assumindo obrigação de fazer que, não sendo
executada, resolve-se em perdas e danos. Dessa forma, ninguém pode vincular o terceiro a uma
obrigação. As obrigações têm como fonte somente a própria manifestação da vontade do
devedor, da lei ou eventual ato ilícito por ele praticado.
Inovação: art. 439, parágrafo único: “Tal responsabilidade não existirá se o terceiro for
o cônjuge do promitente, dependendo da sua anuência o ato a ser praticado, e desde que, pelo
regime do casamento, a indenização, de algum modo, venha a recair sobre os seus bens”.
Por exemplo, quando um dos cônjuges – casado sob o regime da comunhão um
universal de bens – se compromete a ser fiador em determinado imóvel e, garante ao
estipulante, que seu cônjuge também assinará o contrato na qualidade de fiador. Porém, ao
final, este último se recusa a assinar o contrato. Diante dessas situações, a regra é que aquele
que prometeu fato de terceiro responderá por perdas e danos, contudo, no caso apresentado,
tendo em vista que em decorrência dessa responsabilização, os bens do terceiro, que é cônjuge
do promitente, poderão ser atingidos na hipótese de eventual inadimplemento do contrato, não
haverá qualquer tipo de responsabilização em face do promitente.
Assim sendo, a proteção de um dos cônjuges contra desatinos do outro, negando
eficácia à promessa de fato de terceiro quando este for cônjuge do promitente, o ato a ser por
ele praticado depender da sua anuência e, em virtude do regime de casamento, os bens do casal
venham a responder pelo descumprimento da promessa.
Os contratos aleatórios são aqueles que possuem a álea – risco - e envolvem sorte ou
azar aos contratantes. Se no contrato aleatório, o fato imprevisível não estiver inerente à álea,
é possível a aplicação da teoria da imprevisão.
Em outras palavras, trata-se de contratos onerosos em que a prestação de uma ou mais
partes contém elementos de incerteza quanto à sua existência, verificação, quantidade ou
qualidade, ficando sua plena definição na dependência de fato futuro.
Nessa seara, importante se faz a distinção entre contratos comutativos e contratos
aleatórios. No contrato comutativo, sabe-se exatamente qual é o objeto do contrato – ou seja,
tem ciência do que vai receber e do que será pago. Noutro sentido, os contratos aleatórios
pressupõem incerteza, e podem ser divididos em naturalmente aleatórios e acidentalmente
aleatórios, vejamos:
• naturalmente aleatórios: contrato de seguro (o sujeito sabe quanto deverá pagar pelo
seguro, mas a seguradora não sabe quando irá indenizá-lo, em virtude de um sinistro,
por exemplo), jogo e aposta;
• acidentalmente aleatórios: trata-se de contratos naturalmente comutativos, mas em
razão de circunstâncias ou cláusula, tornou-se aleatório – contrato de compra e venda.
Obs.: o contrato pode ser aleatório para ambas as partes ou para apenas uma delas.
Obs.: o disposto no artigo 458, diz respeito tão somente dos contratos acidentalmente
aleatórios. Tendo em vista que os contratos naturalmente aleatórios serão estudados no campo
dos “contratos em espécie”. Ou seja, o contrato de seguro, por exemplo, encontra-se previsão
nos artigos 757 e seguintes; jogo e a aposta, nos artigos 814 e seguintes.
Assim sendo, os contratos acidentalmente aleatórios, podem ser de duas espécies:
1. Compra e venda de coisa futura:
a) Emptio spei - compra da esperança: assume o risco da coisa existir ou não (risco total).
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Por exemplo, João propõe a José que este pesque e pegue a quantia de mil peixes
(objeto do contrato), na qual pagará um real por peixe, totalizando o montante de mil reais
(valor do contrato). Naquele dia, José pescou dez mil peixes, em razão deste contrato, João deve
pagar a José a quantia mil reais. Por outro lado, se José tivesse pescado novecentos peixes, por
exemplo, ainda assim, João teria que lhe pagar a quantia pactuada, ou seja, mil reais. Outro
exemplo, é a compra de safra futura.
Tal modalidade de contrato encontra-se previsão no artigo 458 do CC.
b) Emptio rei speratae - compra da coisa esperada: não assume o risco da inexistência,
mas da quantidade (risco parcial).
Por exemplo, João quer mil peixes na qual pagará a quantia de mil reais. José lhe traz
dez mil peixes, João deve pagar a quantia de mil reais; se José trouxer dois mil peixes, João deve
pagar mil reais; se José não trouxer peixe, João não terá que pagar nenhuma quantia, pois, no
caso em comento, assume-se tão somente o risco da quantidade e não da existência.
Com efeito, a teoria da imprevisão poderá ser aplicada nessas modalidades de contrato,
mas desde que NÃO seja em relação ao emptio spei em razão da existência da coisa e no emptio
rei speratae, no que tange a quantidade da coisa. Dessa forma, se no contrato aleatório, o fato
imprevisível não estiver inerente à álea, como no caso do preço, por exemplo, é possível a
aplicação da teoria da imprevisão.
A parte somente não ficará obrigada pelo que pactuou se ficar definido que houve
desídia da parte contrária pelo não cumprimento do contrato.
2. Coisas existentes expostas a risco: coisa existe, mas está exposta a risco;
Assunção do risco pelo adquirente, ainda que a coisa não mais exista,
no todo em parte, no dia do contrato. Anulação caso o alienante tivesse conhecimento da
consumação do risco.
“Art. 460. Se for aleatório o contrato, por se referir a coisas existentes, mas expostas a
risco, assumido pelo adquirente, terá igualmente direito o alienante a todo o preço, posto que
a coisa já não existisse, em parte, ou de todo, no dia do contrato.”
Por exemplo, o adquirente faz compra pela internet de coisa sujeita a risco de
deterioração. O adquirente assume o risco do transporte. O alienante, nessa situação, não será
responsabilizado, caso o objeto, no destino, esteja danificado/deteriorado.
“Art. 461. A alienação aleatória a que se refere o artigo antecedente poderá ser anulada
como dolosa pelo prejudicado, se provar que o outro contratante não ignorava a consumação
do risco, a que no contrato se considerava exposta a coisa.”
Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por
vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a que é destinada, ou lhe
diminuam o valor.
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É possível que os contratos tenham, basicamente, três tipos de garantias: (i) garantias
materiais: que são os vícios redibitórios; (ii) garantias jurídicas: consiste na evicção e; (iii)
garantias atípicas: impostas/criadas pelas partes.
O vício redibitório trata-se de um defeito material da coisa (garantia material implícita)
existente nos contratos onerosos e comutativos ou, na doação onerosa (trata-se de doação com
encargo, por exemplo, “lhe dou este carro para você promova o transporte das crianças”). O
vício redibitório nunca pode ser aplicado nos contratos aleatórios ou gratuitos.
Este vício é um defeito grave que torna uma coisa inadequada a certos fins ou funções
a que se propõe - princípios de probidade e boa-fé. Dessa forma, aquele que aliena o bem de
forma onerosa, deve garantir a fruição da coisa, pois se houver algum vício sobre o bem objeto
da alienação, estamos diante de um vício redibitório, vício oculto, interiorizado na coisa.
Dessa forma, mesmo que no contrato não haja garantia do vício redibitório, ainda assim,
persistirá.
Paira mencionar que, nas relações consumeristas, a análise desses vícios difere do
campo civilista, porque naquele, tem-se os denominados vícios aparentes e não aparentes.
Redibir significa anular judicialmente uma venda ou outro contrato comutativo em que
a coisa negociada foi entregue com vícios ou defeitos ocultos, que impossibilitam o uso ao qual
se destina ou que lhe diminuem o valor.
São defeitos ocultos em coisa recebida – descobertos: ocorrerá a redibição da coisa, ou
seja, torna-se sem efeito o contrato, acarretando-lhe a resolução, com a restituição da coisa
defeituosa ao seu antigo dono ou sendo concedido um abatimento no preço, se preferir o
adquirente.
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Vamos fazer uma ponderação reflexiva: Nas ações quanti minoris – estimatória – não
se aplica o dispositivo acima mencionado, tendo em vista que a sentença é condenatória e a
relação entre credor e devedor é de direito subjetivo. Os direitos subjetivos, por sua vez, estão
sujeitos a prazos prescricionais, enquanto os prazos decadenciais estão ligados a direitos
potestativos.
Dessa forma:
• redibir o contrato → direito potestativo;
• cobrar o abatimento do preço → direito subjetivo.
Desta maneira, para a ação quanti minoris, aplicam-se as regras de prazo prescricional
– 03 anos -; e para ação redibitória, aplica-se o prazo decadencial previsto no artigo 445 do CC.
Nesse contexto, quando da leitura do artigo 445, deve-se excluir a expressão
“abatimento no preço”. Todavia, se em prova objetiva for cobrada a literalidade do dispositivo,
deve-se assinalar como correta.
Possibilidade de burlar o prazo: Se as partes num contrato de compra e venda de um
bem móvel, por exemplo, realizam a entrega desse bem na data de hoje, mas somente
formalizam o contrato de compra e venda no dia de amanhã. Tendo em vista que no momento
da formalização do contrato o adquirente já estava na posse do bem, o prazo para o ajuizamento
de redibitória cai para 15 dias. Essa redução é realizada, independentemente de quanto tempo
faz que o adquirente se encontre na posse do bem.
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Art. 125 do CPC. É admissível a denunciação da lide, promovida por qualquer das
partes:
“Art. 448 do CC. Podem as parte, por cláusula expressa, reforçar, diminuir ou excluir a
responsabilidade pela evicção.”
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1. COMPRE E VENDA
1.1. CONCEITO
O art. 481 conceitua compra e venda, pois estabelece que, pelo contrato de compra e
venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-
lhe certo preço em dinheiro.
Trata-se de um contrato translativo, mas o contrato de compra e venda por si só não
transmite a propriedade, pois a propriedade móvel se transfere através da tradição, e a
transferência da propriedade imóvel se dá por meio do registro no cartório de registro
imobiliário.
O contrato de compra e venda só traz o compromisso do vendedor de transmitir essa
propriedade e promover a tradição ou o registro.
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• preço por avaliação: o art. 485 permite que o preço seja arbitrado pelas partes
ou por um terceiro de sua confiança. Ex.: venda de um imóvel, mas chamarão
três imobiliárias para fazerem a avaliação;
• preço tabelado ou preço médio: não são a mesma coisa. O art. 488 do CC diz
que, convencionada a venda sem fixação do preço ou sem a fixação de
critérios para fixação do preço, senão houver tabelamento oficial (preço fixado
pelo Estado), entende-se que as partes se sujeitaram ao preço médio ou
corrente, nas vendas habituais do vendedor.
o O parágrafo único vai dizer que, não havendo acordo sobre o preço, vai
prevalecer o preço médio. Isto é, na falta de acordo sobre o preço, não
se presume que está concluída a compra e venda. O parágrafo único do
art. 488 somente se aplica se houver uma diversidade de preços
habitualmente praticado pelo vendedor. Se o vendedor possui diversos
preços praticados, vai valer o termo médio;
• preço unilateral: o art. 489 consagra a nulidade da compra e venda se a fixação
do preço for deixada ao livre arbítrio de uma das partes. No entanto, o preço
unilateral é o preço fixado por uma das partes unilateralmente, mas sem que
haja a arbitrariedade, sem a liberdade de arbítrio. O que o comando legal veda
é o preço manipulado por cartéis.
O conceito de sinalagma tem uma relação íntima com o equilíbrio contratual. O direito
do comprador é de receber a coisa, mas o devedor tem o direito de receber o preço.
Dessa estrutura sinalagmática é possível extrair que os riscos relacionados à coisa, ao
preço, ao transporte da coisa, ao registro, vão correr ora por parte do comprador ora por parte
do vendedor.
• Risco em relação a coisa correm por conta do vendedor: é o vendedor que tem a
obrigação de entregar a coisa ao comprador. Enquanto não ocorre essa tradição, a
coisa é do vendedor. É a tradição que transmite a propriedade (res perit domino).
• Risco do preço corre por conta do comprador: isso porque ainda não houve a
tradição.
• Despesas com transporte da coisa: via de regra correm por conta do vendedor,
salvo se estipularem de forma diferente.
• Despesas com escritura e despesas com o registro: são pagas pelo comprador.
O art. 491 do CC diz que não sendo a venda à crédito ou à prazo, o vendedor não é
obrigado entregar a coisa antes de receber o preço.
O art. 492 traz a regra que diz que, até o momento da tradição, os riscos correm por
conta do vendedor, e os riscos do preço peço comprador.
Os casos fortuitos que ocorrerem no ato de contar, marcar ou de assinalar as coisas (ex.:
gado marcado e pesado), se elas já estiverem à disposição do comprador, os riscos correrão
pelo comprador. Ex.: o vendedor já levou os gados para a fazenda do comprador, situação em
que ele já está marcando o gado. Se naquele momento ocorrer um caso fortuito e o gado vier a
se perder, os riscos do gado correrão por conta do comprador, visto que a coisa já estava à
disposição do comprador.
Também correrão os riscos por conta do comprador, se este estiver em mora de
receber as coisas, desde que estejam à sua disposição no tempo em que foi ajustado, no modo
e da forma ajustada.
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É possível que haja a compra e venda de bens entre cônjuges mesmo que se trate de
comunhão universal, pois existem bens excluídos do regime da comunhão universal, como são
os bens de uso pessoal e utensílios de trabalho dos cônjuges.
• Regime de comunhão parcial: a compra e venda poderá se dar desde que seja de
bens particulares.
• Regime de comunhão universal: a compra e venda poderá se dar desde que seja de
bens incomunicáveis.
• Regime de participação final nos aquestos: a compra e venda poderá se dar em
relação ao bens que não entram na participação.
• Regime de separação legal ou convencional: a compra e venda poderá se dar, desde
que não haja fraude ou ilicitude. Lembre-se que a má-fé não se presume. Não é
porque o indivíduo é casado sob o regime de separação que não poderá vender bens
ao seu cônjuge.
O art. 497 diz que não podem ser comprados, ainda que estejam em hasta pública,
pelos tutores, curadores, testamenteiros, administradores, os bens confiados à sua guarda ou
administração.
Neste caso, haveria um conflito de interesses. Ademais, é vedada a compra pelos
servidores públicos em geral dos bens e dos direitos da pessoa jurídica a que estes servidores
servirem ou dos bens que estiverem sob a sua administração direta ou indireta.
A lei está buscando impedir a ocorrência de situações nas quais a atividade funcional da
pessoa possa influir no negócio que será firmado, e o agente ser beneficiado pela influência que
sustenta.
É ainda vedada a compra pelos juízes e serventuários em geral dos bens a que se litigar
no tribunal em que servirem, tanto o juiz quanto os serventuários da justiça.
Também não poderá comprar os bens o leiloeiro ou seus pressupostos quanto aos bens
cuja venda esteja encarregado.
Perceba que há uma vedação de cunho moral.
Mais uma vez o STJ faz uma interpretação no sentido de que o juiz não pode comprar
um bem que esteja no seu tribunal, mas poderá comprar em outro tribunal, assim como os
servidores. Isso porque se não há risco da influência não há prejuízo e nem ilegalidade.
O art. 504 do CC diz que um condômino não pode, em relação ao condomínio de coisa
indivisível, vender a sua parte a estranhos se outro condômino quiser tanto por tanto, ou seja,
em igualdade de condições.
Há uma espécie de preempção legal. O condômino, se não tiver o conhecimento da
venda, poderá simplesmente depositar o preço, e haver para si a coisa vendida para um terceiro
ou estranho, desde que o faça em 180 dias. Este prazo é decadencial.
Contudo, o STJ julgou recentemente um caso em que, ao conceder o direito de
preferência aos demais condôminos, o que o legislador procurou foi conciliar objetivos
particulares do vendedor com o intuito da comunidade dos coproprietários. É a ideia de que a
função social recomenda que é mais cômodo manter a propriedade entre os seus titulares,
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evitando que haja desentendimentos naquele condomínio pela entrada de um estranho. É uma
hipótese de preferência legal.
O STJ entende que, se o imóvel se encontra em estado de indivisão, apesar de este
imóvel ser divisível, ainda assim há de se reconhecer o direito de preferência do condômino
que pretenda adquirir o quinhão do comunheiro. Há uma restrição da autonomia privada. Ou
seja, se o vendedor condômino quiser vender por 100 mil reais o imóvel a um terceiro, mas o
condômino oferecer 100 mil reais, deverá vender a este.
Parte da doutrina entende que, sendo preterido o condômino, deverá propor a ação
anulatória da compra e venda feita.
Porém, encontra-se um entendimento no sentido de que deve ser proposta uma ação
de adjudicação, pois o principal efeito da ação é constituir positivamente a venda para o
condômino que foi preterido.
Portanto, estaríamos diante de uma ação de adjudicação e não anulatória.
Questiona-se: o prazo de 180 dias é contado de quando?
A lei não diz. Maria Helena Diniz diz que esse prazo de 180 dias é contado da data da
alienação do bem. Sílvio Venosa diz que o prazo começa a correr da data em que o condômino
tomar ciência do negócio, ou do registro imobiliário, no caso de imóvel.
Sendo muitos os condôminos, como se saber qual tem a preferência?
A lei traz uma ordem que deve ser respeitada:
1. quem tiver benfeitoria de maior valor;
2. quem tiver o maior quinhão;
3. quem depositar judicialmente o preço.
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Aurélio Bouret
A venda a contento ou sujeita à prova são tratadas como cláusulas especiais no contrato
de compra e venda.
Muitas vezes serão presumidas em alguns contratos, não precisando de previsão
expressa algumas vezes. Ex.: no caso dos vinhos, o garçom coloca um pouco para que o cliente
verifique a qualidade do vinho. No momento em que concorda, a pessoa concorda com a venda,
estando implementada a condição suspensiva.
A venda não se aperfeiçoa enquanto o comprador não se declara satisfeito com o bem
que está sendo adquirido. Há uma condição suspensiva. Na venda a contento, a tradição não
transfere a propriedade, mas apenas da posse. Há a posse direta, pois, enquanto o comprador
não manifestar a vontade, as obrigações que ele teria é de simples comodatário.
A rejeição funcionará como uma condição resolutiva do contrato.
No caso de venda a contento, o prazo para manifestação do comprador, quando não for
de imediato (como no vinho), o vendedor tem o direito de intimar esse comprador, judicial ou
extrajudicialmente, para que se manifeste sobre a venda (art. 582).
Quando é intimado, surge para o comprador o dever de pagar até a restituição da coisa
um aluguel que será arbitrado pelo comodante a título de pena, e será cabível eventual
reintegração de posse.
Foi promovida uma venda a contento, mas o sujeito não se manifestou. O vendedor
interpelou o comprador para que ele se manifestasse em 2 dias, para que este se manifestasse
ou para que este pagasse a coisa. Se ele não paga e nem devolve, passados os 2 dias, considera-
se como se houve uma locação, havendo a necessidade de pagar um aluguel cabível, bem como
ação de reintegração de posse.
Qual a diferença entre venda a contento e a venda sujeita a prova?
Na venda a contento, o comprador não conhece o bem, sendo necessário provar e
manifestar a vontade de celebrar o contrato.
Na venda sujeita à prova, a coisa já é conhecida, mas o comprador somente necessita
da prova de que o bem é o mesmo que ele já conhece, tendo todas as qualidades assegurada ao
vendedor.
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Aurélio Bouret
• complementação da área;
• abatimento do preço (ação quanti minoris);
• resolução do contrato.
Nesse caso, se ficar evidenciada a má-fé do vendedor, vem cumulada com perdas e
danos, com uma indenização em razão do comportamento.
O prazo decadencial é de 1 ano, contado do registro do título, conforme art. 501 do CC.
O prazo não corre enquanto o interessado não for imitido na posse.
Se a venda for realizada ad corpus, ou seja, imóvel vendido como coisa certa, não
caberão os pedidos de complementação, abatimento do preço ou resolução do contrato.
Não se confunde com a venda casada, que é vedado. A prática do contrato de venda
permite a venda de coisas conjuntas permite. Ex.: compra de um rebanho bovino. Há uma
universalidade de fato.
Nas coisas vendidas conjuntamente, o defeito oculto de uma coisa não autoriza a
rejeição de todas. Se for comprado um rebanho bovino e somente uma vaca apresentar vício,
impede-se a rejeição de todos os bovinos.
O art. 503, que se refere a vendas conjuntas, não pode ser aplicado a casos em que a
venda seja coletiva, que é diferente daquelas.
No caso de venda coletiva, as coisas vendidas formam um todo só. Por exemplo, se a
compra de um par de sapatos, um deles apresentar problema, poderá devolver os dois para
adquirir novos, pois a venda é coletiva.
Há aqui previsões que alteram os efeitos da compra e venda, dando a ela uma feição
diferenciada.
O CC consagra:
• cláusula de retrovenda;
• cláusula de venda a contento ou venda sujeita à prova;
• cláusula de preempção convencional;
• cláusula de venda com reserva de domínio;
• cláusula de venda de documentos.
As cláusulas especiais, para que tenham eficácia e validade, devem estar
expressamente previstas no instrumento. Este é um ponto em que se diferenciam das regras
especiais.
Nas regras especiais não é necessário que conste expressamente esta previsão.
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O vendedor que tenha sido preterido no seu direito de preferência, caso seja a
preempção convencional, o vendedor não poderá anular a venda. Se fosse uma prelação legal
(ex.: condômino), poderá fazer a adjudicação do bem.
No entanto, no caso de preempção convencional, se o vendedor for preterido, caberá
apenas o direito de ação visando a reparação de danos, mesmo que o adquirente tenha
adquirido o bem por má-fé (art. 518).
O art. 519 diz que, se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública,
ou por interesse social, não tiver o destinado para que se desapropriou, ou não for utilizada em
obras ou serviços públicos, caberá ao expropriado o direito de preferência pelo preço atual da
coisa. Este dispositivo consagra o direito de retrocessão.
Indaga-se: esse direito de preferência terá natureza real ou natureza pessoal?
O STJ já entendeu que os efeitos são de natureza meramente pessoais, cabendo
portanto ao expropriado o direito de pleitear perdas e danos no caso de tredestinação.
Por outro lado, também há decisões do STJ reconhecendo eficácia real do direito de
retrocessão. Tartuce concorda que esse direito de retrocessão tem natureza real.
O art. 520 diz que o direito de preferência não se pode ceder, e também não passa aos
herdeiros. É, aqui, reconhecida a intransmissibilidade do direito de preferência, seja mortis
causa, seja inter vivos. A preferência convencional não se transmite aos herdeiros.
Pela cláusula de venda sobre documentos, que tem por objeto bens móveis, a tradição
será substituída pela entrega de um documento correspondente à propriedade (título
representativo do domínio), conforme art. 529 do CC.
Se estiver prevista essa cláusula de venda sobre documentos, e essa documentação
estiver em ordem, o comprador não pode recusar pagamento, alegando que há um defeito na
qualidade da cosia ou no estado da coisa, salvo se o defeito estiver efetivamente comprovado.
Veja, o parágrafo único do art. 529 diz que, achando-se a documentação em ordem, não
pode o comprador recusar o pagamento, a pretexto de defeito de qualidade ou do estado da
coisa vendida, salvo se o defeito já houver sido comprovado. Isso porque o comprador ainda
nem sequer tem a coisa consigo.
Com essa transferência do documento que transfere a propriedade, o pagamento
deverá ocorrer na data e no lugar em que ocorrer essa entrega do documento. Quando o
documento é entregue, o preço deverá ser pago.
O art. 532 diz que, estipulado o pagamento por intermédio de estabelecimento
bancário, caberá ao banco efetuar esse pagamento com a entrega dos documentos, não tendo
o banco a obrigação de verificar a coisa vendida, pela qual não responde.
O parágrafo único diz que, nesse caso, somente após a recusa do estabelecimento
bancário a efetuar o pagamento, poderá o vendedor pretendê-lo, diretamente do comprador.
Ocorre a cláusula de venda com reserva de domínio quando o vendedor vende a coisa,
mas continua tendo o domínio.
Por meio dessa cláusula, inserida no contrato de coisa móvel infungível, o vendedor
mantém o domínio da coisa, mas até que haja o pagamento integral pelo comprador.
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Terrenos de marinha são todos aqueles que, banhados pelas águas do mar ou dos rios e
lagoas navegáveis, vão até a distância de 33 metros para a parte da terra contados da linha do
preamar médio, medida em 1831.
Os terrenos de marinha são bens da União. Isso se justifica por se tratar de uma região
estratégica em termos de defesa e de segurança nacional.
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Segundo José dos Santos, em algumas regiões, a União permitiu que particulares
utilizassem, de forma privada, imóveis localizados em terrenos de marinha. Como essas áreas
pertencem à União, o uso por particulares é admitido pelo regime da enfiteuse (aforamento). A
enfiteuse funciona da seguinte forma, a União (senhorio direto) transfere ao particular
(enfiteuta) o domínio útil, este particular passa a ter a obrigação de pagar anualmente uma
importância a título de foro ou pensão.
O particular (enfiteuta) pode transferir para outras pessoas o domínio útil que exerce
sobre o bem. Todavia, a pessoa que transferir o domínio útil do imóvel deverá pagar 5% do valor
do domínio útil à União. Esse valor é chamado de laudêmio e seu pagamento está previsto no
art. 3º do Decreto-Lei nº 2.398/87.
O STJ entende que será nulo o contrato o contrato firmado entre particulares de compra
e venda de imóvel de propriedade da União quando ausente o prévio recolhimento do
laudêmio e a certidão da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), ainda que o pacto tenha
sido registrado no Cartório competente.
Vale ressaltar que a prévia autorização da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) não
é mera formalidade, pois, segundo entende o STJ, a comunicação do negócio jurídico
formalizado entre o ocupante e terceiro à SPU não se reveste de ato de mera formalidade, mas
se constitui em medida de essencial importância e que produz efeitos jurídicos relevantes, uma
vez que a União é a proprietária do terreno de marinha e, nessa qualidade, deverá estar sempre
a par e consentir com a utilização de bem que lhe pertence.
Tais bens públicos são da espécie “bens dominicais”, os quais, apesar de não estarem
sendo utilizados para a realização de uma finalidade pública, o regime jurídico dos bens
dominicais é híbrido, aplicando-se as normas de direito público e de direito privado. O contrato
de compra e venda de um bem dominical deve respeitar formalidades legais mais rígidas do que
se fosse um bem de um particular.
O tabelião de notas poderia ter lavrado a escritura de compra e venda e o oficial do
Registro de Imóveis não pode registrar o título sem a prova do pagamento do laudêmio. É dever
dos tabeliães e registradores, antes de lavrar ou registrar a escritura, exigir a certidão da SPU,
na qual estará declarado que houve o pagamento do laudêmio e cumprimento das demais
formalidades.
2. TROCA OU PERMUTA
2.1. CONCEITO
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O art. 533, II, diz que é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e
descendentes, se não houver o consentimento dos demais descendentes e do cônjuge do
alienante.
Veja que o art. 533 fala de trocas desiguais. Ou seja, se estiver diante de troca s coisas
iguais, não é necessário o consentimento dos demais descendentes e do cônjuge do alienante.
O raciocínio é o mesmo para o caso em que o descendente der coisa mais valiosa ao
ascendente e este dá a ele uma coisa menos valiosa, sendo desnecessário o consentimento
dos demais descendentes e do cônjuge.
3. CONTRATO ESTIMÁTORIO
3.1. CONCEITO
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O art. 537 diz que o consignante não pode dispor da coisa antes de lhe ser restituída
ou de lhe ser comunicada a restituição. Isso quer dizer que há exigência de um comportamento
de boa-fé, dentro do esperado pelo consignante.
Findo o prazo do contrato, o consignante tem duas opções: cobrar o preço de estima ou
promover a ação de reintegração da posse, a fim de reaver o bem cedido. Lógico que isto se
considerarmos a obrigação alternativa.
Caso seja considerada obrigação facultativa, o único dever que o consignatário tem é de
pagar a coisa. Findo o prazo, o credor poderia apenas propor a ação de cobrança e não poderia
propor a ação de reintegração de posse.
Daí a importância de se definir se a obrigação é alternativa ou facultativa.
O art. 535 diz que o consignatário não se exonera da obrigação de pagar o preço, se a
restituição da coisa, em sua integridade, se tornar impossível, ainda que por fato a ele não
imputável.
Percebe-se que deverá ter de pagar a coisa, já que não consegue devolver. Isso porque
passa a ser de sua responsabilidade.
4. DOAÇÃO
4.1. INTRODUÇÃO
Doação é um contrato benéfico, unilateral e gratuito. Por essa razão só será admitida
interpretação restritiva, conforme art. 114.
Em relação à doação com encargo (modal), entende-se que continua diante de um
contrato unilateral, mas unilateral imperfeito. Isso porque existe o encargo, mas este não
constitui uma contraprestação. O encargo é um ônus, mas que não tem o peso de uma
contraprestação. Existe entendimento em sentido diverso, mas este é o que prevalece.
A controvérsia existe em relação à aceitação do donatário. A aceitação do donatário é
requisito essencial do contrato de doação?
Maria Helena Diniz diz que a doação não se aperfeiçoa enquanto o donatário não
manifestar a sua aceitação.
Paulo Luiz Netto Lôbo vai dizer que a aceitação é simplesmente um elemento
complementar, ligado à eficácia da doação, não sendo elemento essencial da doação. Flávio
Tartuce concorda com esse entendimento, dizendo que a aceitação se encontra no plano da
eficácia e não da validade.
O art. 539 diz que o doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou
não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não se manifeste dentro dele a
declaração, entende-se que a aceitou, desde que a doação seja pura, ou seja, não seja sujeita a
encargo (modal).
Eventual silencio do doador traz uma presunção relativa de aceitação.
Inclusive, dispensa-se a aceitação expressa quando se tratar de doação pura, feita em
favor de absolutamente incapaz. É o que diz no art. 543.
A aceitação ainda pode ser tácita, na hipótese de doação feita em contemplação a
casamento futuro. Quando os nubentes se casam, há uma aceitação tácita. Pode ser feita de um
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nubente para eles, de um terceiro em favor dos nubentes, aos filhos que no futuro casamento
advierem, etc. Havendo casamento, há uma aceitação tácita.
O art. 546 diz que, nessa situação, a celebração do casamento gera uma presunção de
aceitação.
São características do contrato de doação o fato de ser um contrato consensual
(aperfeiçoa com o encontro de vontades), contrato formal (pode ser solene, escrito, e
eventualmente até pode ser verbal).
A doação solene ocorrerá nos casos de doação de imóvel com valor superior a 30 salários
mínimos. A doação será formal e não solene, nos casos envolvendo casos de imóvel inferior ou
igual a 30 salários mínimos e nos bens móveis.
O art. 541, parágrafo único, diz que a doação de bens móveis e de pequeno valor poderá
ser verbal seguida da tradição.
O art. 542 diz que a doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu
representante legal.
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Subvenção periódica é dar a alguém algo periodicamente. Há aqui uma doação de trato
sucessivo, situação na qual o doador vai estipular rendas a favor do donatário (art. 545).
Em regra, terá como causa extintiva a doação sob forma de subvenção periódica a morte
do doador ou do donatário. Quem morrer primeiro extinguirá a doação.
Atente-se que a doação sob forma de subvenção periódica poderá ultrapassar a vida do
doador, se houver previsão contratual nesse sentido. Nunca vai ultrapassar a vida do donatário,
tendo como característica intuito personae.
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A doação com cláusula de reversão é aquela em que o doador estipula que os bens
doados voltem ao patrimônio do doador, caso ele sobreviva ao donatário.
O que há aqui é uma condição resolutiva expressa (art. 547).
Atente-se que não se pode estipular que, se o donatário morrer, os bens serão
destinados a João, pois estaria havendo pacta corvina, discutindo herança de pessoa viva.
Se o doador morrer antes do donatário, esta condição jamais ocorrerá, incorporando-se
os bens definitivamente ao patrimônio do donatário, pois a condição resolutiva não se
implementará.
A cláusula de reversão não torna o bem inalienável, podendo o donatário alienar o bem.
Porém, se alienar o bem e vier a falecer antes do doador, essa alienação é sem efeito perante
o doador. Torna-se com a implementação da condição resolutiva, conforme art. 1.359.
A doação manual é a doação com a mão, situação em que há uma tradição imediata,
tratando-se da doação que se dá com a tradição.
Lembre-se que é o caso da doação verbal que se consuma com a tradição, sendo certo
que se trata de coisa de pequeno valor (art. 541, parágrafo único).
A doação inoficiosa é aquela prevista no art. 549, a qual estabelece que é nula a doação
quanto à parte que exceder o limite de que o doador, no momento da liberalidade, poderia
dispor em testamento.
É a doação que prejudica a legítima.
Não é toda doação que é considerada nula, atingindo somente a parte que exceder à
legítima.
Ex.: João tem um patrimônio de 1 milhão de reais, tendo 79 anos e dois filhos. Arrumou
uma namorada de 18 anos, decidindo doar a ela 700 mil reais. João não poderia doar 700 mil,
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pois 50% do seu patrimônio integra a legítima. Portanto se doou 700 mil, considera-se 200 mil
nulos, angariando 500 mil.
Segundo o STJ, aplicam-se às pretensões declaratória de nulidade de doações
inoficiosas o prazo prescricional de 10 anos para o ajuizamento dessa ação.
A ação só pode ser proposta por quem é interessado na declaração de nulidade, ou seja,
pelos herdeiros do doador.
O art. 550 diz que a doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice na traição é anulável,
desde que proposta a ação anulatória pelo outro cônjuge ou pelos herdeiros necessários, até 2
anos após a dissolução da sociedade conjugal. Essa dissolução vem com a separação judicial ou
divórcio.
Esse dispositivo não pode ser aplicado quando o doador vive em união estável com o
donatário. Isto ocorre quando o doador está separado de fato do cônjuge.
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No caso de revogação da doação por inexecução do encargo, apesar de existir uma certa
controvérsia, é majoritário o entendimento de que o prazo para revogação da doação por
descumprimento de encargo é prescricional de 10 anos, pois teria ocorrido a violação ao direito
subjetivo do doador de ver cumprido o encargo.
O art. 560 diz que o direito de revogar a doação não se transmite aos herdeiros do
doador e nem prejudica os herdeiros do donatário.
A verdade é que o direito de revogar a doação se transmite aos herdeiros do doador se
a ação já foi iniciada. O direito de revogar não foi transmitido ao herdeiros do doador, mas sim
a possibilidade de prosseguir a ação que foi iniciada pelo doador visando a revogação da doação.
Portanto, eles poderão continuar contra o donatário, inclusive continuar contra os herdeiros do
donatário, caso ele venha a falecer depois do ajuizamento do pleito revogatório.
A respeito da revogação da doação onerosa, por inexecução do encargo, não se pode
confundir o legitimado da revogação da doação com os legitimados para exigir a execução do
encargo, que pode ser o doador, terceiro ou até o Ministério Público, caso o encargo tenha
interesse geral.
Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar o donatário
judicialmente para que dentro de um prazo razoável cumpra a obrigação (art. 562). Após o
decurso do prazo, poderá começar o prazo para doação.
5.1. INTRODUÇÃO
O contrato de locação é um contrato por meio do qual uma das partes se obriga a ceder
a outra parte por um tempo o uso e gozo de uma coisa infungível, por meio de uma certa
remuneração que é denominado aluguel.
A primeira característica é que é um contrato bilateral, contrato oneroso (existe
remuneração, ou seja, o sacrifício por ambas), contrato comutativo (as partes já sabem as suas
prestações), contrato consensual (aperfeiçoa-se com o encontro das vontades), contrato
informal (não depende de forma escrita e nem escritura pública) e é um contrato de execução
continuada ou de trato sucessivo.
O Código Civil trata da locação de bens móveis e bens imóveis.
Em relação aos bens imóveis, o CC tratará das locações que não estejam sujeitas à Lei
nº 8.245/91, a qual trata da locação de imóveis urbanos, levando em consideração a destinação
desse imóvel. Se o imóvel for destinado à residência, indústria, comércio e para prestação de
serviços, será regido pela Lei nº 8.245/91.
Se for destinado para outros fins, será regido para outros fins, como agricultura,
pecuária, extrativismo, etc., incidindo o Estatuto da Terra ou o Código Civil.
Além disso, o art. 1º da Lei de Locações excluiu alguns imóveis do âmbito de aplicação,
como imóveis públicos (Lei nº 8.666), vagas autônomas de garagem, espaços publicitários,
locação de espaços de apart-hotel, flats, equiparados (CC e CDC), arrendamento mercantil e
leasing (resoluções do BACEN).
O que se percebe é que o Código Civil tem uma aplicação reduzida em relação aos
imóveis.
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O locador é obrigado a:
• entregar ao locatário a coisa com todas as suas pertenças e condições de ser
utilizadas;
• manter o bem no estado de utilização pacífica pelo locatário;
• se ocorrer a deterioração da coisa no prazo da locação e não sendo essa
deterioração culpa do locatário, poderá ele propor a redução do aluguel, ou até
mesmo resolver o contrato, pois a coisa não lhe serve mais (art. 567);
• resguardar o locatário contra turbações e esbulhos cometidos por terceiros. Tanto
o locador quanto o locatário serão legitimados para ações possessórias.
O locatário é obrigado a (art. 569):
• servir-se da coisa alugada para seus usos convencionados ou presumidos conforme
a natureza da coisa;
• pagar pontualmente o aluguel;
• levar ao conhecimento do locador as turbações feitas por terceiros ;
• restituir a coisa no estado em que há recebeu, salvo as deteriorações naturais da
coisa.
O art. 571 diz que se a locação for estipulada com prazo fixo, antes do vencimento prazo
não poderá ser reavida pelo locador, salvo se o locador indenizar o locatário pelas perdas e
danos resultantes da quebra contratual. Neste caso, o locatário terá o direito de retenção do
bem até que haja o seu pagamento.
Da mesma forma, o locatário somente pode devolver a coisa antes do pactuado pagando
a multa prevista no contrato, proporcionalmente ao tempo que restar para o término daquele
contrato.
O art. 572 vai dizer que a multa ou a obrigação de pagar o aluguel pelo tempo que restar
do contrato, se ela constituir uma obrigação excessiva, poderá o juiz reduzi-la em bases
razoáveis.
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para o locatário desocupar o bem, situação na qual começará a contar o prazo de notificação,
visando a desocupação do imóvel.
Em relação às benfeitorias, o locatário tem direito de retenção quanto às benfeitorias
necessárias, até ser indenizado por ela.
Em relação às benfeitorias úteis, terá direito de retenção se a implementação delas
tenha sido autorizada pelo locador.
O STJ vai trazer a Súmula 335 que vai dizer que nos contratos de locação é válida a
cláusula de renúncia às benfeitorias e ao direito de retenção.
6.1. INTRODUÇÃO
O contrato de empréstimo é um negócio jurídico pelo qual uma pessoa entrega uma
coisa a outra pessoa e de forma gratuita, situação na qual essa pessoa se obriga a devolver a
coisa emprestada ao final do contrato.
Se esta coisa for consumível, esta coisa deverá ser restituída na mesma espécie e na
mesma quantidade.
Há duas espécies de contrato de empréstimo:
• comodato: empréstimo de bem infungível;
• mútuo: empréstimo de bem fungível.
Os dois contratos de empréstimos, além de serem gratuitos e unilaterais, ou seja,
benéficos, como regra, também são comutativos e informais, e reais, percebendo a
características de unilateralidade.
6.1.2. COMODATO
O comodato, que é o empréstimo de bem infungível, pode ter por objeto tanto bens
móveis como imóveis.
A parte que empresta é o comodante e a parte que recebe é o comodatário.
O contrato é baseado na confiança. Por isso o contrato é intuito personae.
A doutrina aponta a possibilidade de comodato de bens fungíveis, desde que esses bens
sejam utilizados para enfeites ou para ornamentação. Trata-se do comodato ad pompam vel ad
ostentationem. Quer dizer que, por convenção das partes, um bem que, por sua natureza é
fungível, acaba se tornando infungível.
O art. 580 diz que tutores, curadores e administradores de bens alheios em geral não
podem dar em comodato, sem autorização especial, dos bens que estão sob sua guarda.
O contrato de comodato é temporário, pois do contrário seria doação. Esse prazo pode
ser determinado ou indeterminado.
Caso seja indeterminado, presume-se que o prazo é aquele para o uso a que se destinou
o empréstimo. Nesse caso, não pode o comodante, salvo necessidade urgente e imprevista,
assim reconhecida pelo juiz, suspender o uso ou gozo da coisa emprestada antes do
cumprimento do fim a que se propôs.
Essa regra também vale para o comodato com prazo determinado, visto que, antes do
prazo, o comodante não pode reaver a coisa, salvo necessidade e urgência imprevistas.
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A parte final do art. 582 do CC diz que o comodatário constituído em mora, além de por
ela responder, irá pagar até restituí-la o aluguel da coisa, que será aquele arbitrado pelo
comodante. É um aluguel-pena.
O STJ entende que esse aluguel é uma verdadeira pena privada e não será tido como
indenização pela ocupação. O objetivo aqui coagir o comodatário a fim de que ele restitua o
mais rapidamente possível a coisa emprestada.
Se houver um arbitramento exagerado, poderá ser objeto de controle judicial. Segundo
o STJ, o aluguel-pena não pode ser superior ao dobro do valor do aluguel cobrado em média
pelo mercado.
A primeira parte do art. 582 diz que o comodatário é obrigado a conservar, como se sua
fosse sua, não podendo usar a coisa emprestada em desacordo com o que prevê o contrato de
comodato ou da própria natureza da coisa. Se assim o fizer, responderá poder perdas e danos.
O art. 583 diz que, se caindo em risco a coisa emprestada, o comodatário deixar de salvar
essa coisa para salvar coisa própria, responderá pelo dano ocorrido na coisa objeto do
comodato, ainda que este dano seja fruto de caso fortuito ou força maior.
O comodatário não pode recobrar do comodante despesas que ele teve para usar e
gozar da coisa emprestada (art. 584).
Havendo pluralidade de comodatários, haverá responsabilidade solidária entre eles (art.
585). É um caso de solidariedade passiva legal.
6.1.3. MÚTUO
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7. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
7.1. INTRODUÇÃO
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O art. 594 diz que toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial,
pode ser contratado mediante remuneração.
Percebe-se que a prestação de serviço deve ser de um serviço lícito. A licitude deve ser
analisado em sentido amplo, bastando que haja uma contrariedade à função social do contrato,
à boa-fé, função econômica, etc. Dessa forma, o contrato, pelo menos em alguma parte, será
nulo.
Se a remuneração não estiver sido estipulada ou não tiver acordo entre as partes, a
fixação dessa remuneração será feita por arbitramento, levando em conta os costumes do local,
tempo de serviço e qualidade do serviço executado, e impedindo o enriquecimento sem causa
das partes.
O art. 597 diz que a retribuição será paga depois de prestado o serviço, se não houver
uma convenção ou costume que disponha de forma diversa, ou seja, que o pagamento será
adiantado ou que o pagamento será em prestações.
O art. 598 diz que prestação de serviço não se poderá convencionar por mais de 4 anos.
É um teto, pois não poderá ter caráter perpétuo.
Se houver um contrato em que o prazo da prestação de serviço é fixada em um período
superior a 4 anos, o contrato deverá ser reputado extinto em relação ao excesso. Preserva-se o
contrato, mas naquilo que ultrapassar 4 anos, será considerado extinto.
O CJF trouxe um enunciado estabelecendo que, nos contratos de prestação de serviço,
nos quais haja de um lado e de outro empresários, e sendo a função econômica relacionada à
exploração de uma atividade empresarial, as partes podem convencionar um prazo superior ao
prazo de 4 anos. Este prazo de 4 anos não será aplicado quando houver um contrato firmado
entre duas pessoas jurídicas no exercício de atividade empresarial. Flavio Tartuce discorda.
O art. 599 diz que, sendo o negócio da prestação de serviço celebrado sem prazo, não
podendo o elemento temporal ser retirado de sua natureza ou do costume do lugar, pode
qualquer uma das partes, mediante aviso prévio, resolver o contrato.
O parágrafo único do art. 599 vai consagrar prazos para essa denúncia do contrato:
• aviso com antecedência de 8 dias, se o salário se houver fixado por tempo de um
mês, ou mais;
• aviso com antecipação de 4 dias, se o salário se tiver ajustado por semana, ou
quinzena;
• aviso de véspera, quando se tenha contratado por menos de sete dias.
Decorrem esses prazos da boa-fé objetiva e do direito de informação.
O prestador de serviço contratado por um tempo certo ou contratado por uma obra
determinada deverá cumprir esse prazo, não podendo se ausentar ou se despedir sem justa
causa.
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Do contrário, apesar de ter direito à retribuição daquilo que prestou, deverá pagar
perdas e danos ao tomador (art. 602).
Isso vai se valer na hipótese de o prestador ter sido demitido por justa causa, visto que
neste caso está sendo despedido por uma falha dele. Terá direito à retribuição, mas deverá
pagar uma indenização ao tomador.
Por outro lado, se o prestador de serviço for demitido sem justa causa, o tomador deverá
pagar, além da retribuição vencida, a metade dos valores que teria direito até o termo final do
contrato.
O art. 605 do CC vai dizer que o tomador não pode transferir para outra pessoa o direito
aos serviços ajustados. E o prestador não pode, sem a concordância com tomador, se substituir
por outra pessoa. Há aqui a consagração de que a prestação de serviço tem o caráter intuito
personae.
A prestação de serviço é um negócio personalíssimo, motivo pelo qual, se uma das
partes morre, o contrato também será extinto. Também se extingue o contrato de prestação
de serviços pelo escoamento do prazo, se tiver prazo determinado; pela finalização da obra, se
for uma obra certa; pela rescisão do contrato, se tiver aviso prévio; por inadimplemento de
uma das partes; pela impossibilidade de continuidade do contrato por motivo de força maior.
O art. 608 consagra a denominada tutela externa do crédito, estabelecendo que aquela
pessoa que aliciar outra pessoa que estava obrigada em contrato escrito a prestar serviço a
outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito,
houvesse de caber durante 2 anos.
Quem chega para aliciar a pessoa que está contratada por outrem para prestar o serviço
vai pagar a outra pessoa o valor que esse prestador teria direito durante 2 anos em face dessa
outra pessoa. Há uma fixação de uma indenização contra um terceiro que interfere numa
relação contratual que não celebrou.
Por isso, tutela externa do contrato, pois há responsabilização do terceiro que
desrespeitou o contrato. Há uma exceção muito clara ao princípio da relatividade.
O art. 609 estabelece que a alienação do prédio agrícola, onde a prestação dos serviços
se opera, não importa a rescisão do contrato, ressalvando-se ao prestador opção entre
continuar esse contrato com o adquirente da propriedade ou com o primitivo contratante.
A pessoa que comprou a propriedade agrícola deverá continuar com o sujeito que está
prestando o serviço até o término do serviço. Há aqui uma obrigação que assume uma eficácia
real perante o adquirente do prédio agrícola, pois terá de perceber esse contrato em relação à
pessoa que nem participou.
Trata-se de uma exceção ao princípio da relatividade.
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8. CONTRATO DE EMPREITADA
8.1. INTRODUÇÃO
A empreitada é o contrato por meio do qual uma das partes (empreiteiro) vai se obrigar
a fazer ou mandar fazer determinada obra mediante remuneração. Esta obra será feita em favor
de outra pessoa, que é denominado de tomador ou dono da obra.
A doutrina diz que são três as modalidades de empreitada, conforma art. 610:
• empreitada sob administração: o empreiteiro apenas administra as pessoas que
foram contratadas pelo dono da obra;
• empreitada sob mão de obra: o empreiteiro fornece a mão de obra, sendo o
material fornecido pelo dono da obra. Nesse caso, o empreiteiro não apenas
gerencia, mas contrata as pessoas;
• empreitada mista ou de lavor e materiais: o empreiteiro fornece a mão de obra e
também os materiais, se comprometendo a executar a obra inteira. Há aqui uma
obrigação de resultado. Por isso, é o empreiteiro que contrata o pessoal e fornece
os materiais.
Há, aqui, um contrato bilateral, oneroso, comutativo, consensual e informal.
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Poderá o dono da obra rejeitar quando o empreiteiro tiver se afastado das suas
instruções, ou de seus planos dados a ele, ou se tiver se afastado das regras técnicas para
construção.
Eventualmente, poderá o dono da obra requerer que haja o abatimento proporcional
do preço contratado. Isso se o serviço não tiver sido prestado a contento, evitando um
enriquecimento sem causa de quem prestou o serviço (art. 616).
Em relação ao pagamento da remuneração, o art. 614 vai dizer que se a obra constar de
partes distintas (ex.: 10 salas de um prédio comercial, e ele vai reformar as 10), ou for obra em
que se determina por medidas, o empreiteiro tem direito de receber ou de exigir o pagamento
na proporção em que a obra foi executada.
O preço da empreitada pode ser estipulado pela obra inteira, denominando-se preço
global.
O art. 614, §1º, cria uma presunção relativa, dizendo que tudo o que foi pago presume-
se verificado.
No §2º, o CC estabelece que o que se mediu presume-se verificado se, em 30 dias, a
contar da medição, não forem denunciados os vícios ou defeitos pelo dono da obra ou por quem
estiver incumbido da sua fiscalização. Essa presunção exige dois comportamentos: comissivo
(medir a obra) e omissivo (ausência de denúncia da obra no prazo de 30 dias, situação na qual
caso não seja denunciado haverá presunção de que foi verificado e que está de acordo com o
projeto).
O art. 619 trata da denominada empreitada com preço fixo. Essa empreitada pode ser
por preço fixado absoluto ou por preço fixo relativo.
O empreiteiro que se compromete a executar uma obra inteira, conforme o plano que
foi aceito, terá ele direito de receber a prestação que ele convencionou, mas não terá direito de
acréscimo do preço, pois houve uma empreitada com preço fixo absoluto.
Agora, se forem introduzidas modificações no projeto, a não ser que resultem de
instruções escritas pelo dono da obra, haverá a possibilidade de ser acrescido um valor ao
preço fixo originariamente fixado.
Eventualmente, ainda que não exista autorização escrita do dono da obra, será este
obrigado a pagar o empreiteiro todos os aumentos, se o dono da obra estiver sempre presente
na obra, e ele não podia ignorar o que estava sendo feito no local, não tendo jamais protestado
com o que estava ocorrendo.
Neste caso, ainda que não tenha dado instruções escritas, o parágrafo único do art. 619
diz que deverá o dono da obra pagar. Trata-se de aplicação da boa-fé. Haveria uma autorização
tácita.
Se houver uma diminuição do preço do material ou mesmo da mão de obra, que seja
superior a 10% do preço global convencionado, poderá o valor do preço global ser revisto, se
houver pedido do dono da obra nesse sentido.
8.3. SUB-EMPREITADA
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9. CONTRATO DE DEPÓSITO
9.1. INTRODUÇÃO
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enriquecimento sem causa. Neste caso, poderá haver direito de retenção do depositário caso
não seja ressarcido.
Maria Helena Diniz diz que são três as espécies de depósito necessário:
• depósito legal: decorre da lei;
• depósito miserável: decorre de calamidade;
• depósito do hospedeiro: o hospedeiro é o depositário das bagagens dos hóspedes,
de forma que os hospedeiros respondem como depositários se houver a perda da
bagagem dentro do hotel.
Em regra, o depósito necessário não se presume gratuito, diferentemente do
voluntário.
Não se admite que haja a prisão civil do depositário infiel, pois o Pacto de San José da
Costa Rica tem eficácia supralegal e não admite essa prisão.
10. MANDATO
10.1. INTRODUÇÃO
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O mandato verbal não pode ser admitido em casos em que a celebração do contrato
para qual o mandato foi celebrado exija a forma escrita. Ex.: mandato para alguém celebrar
um contrato de fiança em meu nome. Nesse caso, o mandato deverá ter forma escrita. Para
comprar um imóvel, deverá se dar por instrumento público.
Feita a nomeação do mandatário, será necessário que ele aceite este encargo. Essa
aceitação poderá ser tácita ou expressa. A aceitação tácita resultará do início do cumprimento
do contrato celebrado.
O contrato de mandato é personalíssimo, pois se baseia na confiança.
Primeiramente, atos praticados por quem não tem mandato ou por quem tenha e não
tenha poderes suficientes para a prática do ato, serão atos ineficazes em relação ao suposto
mandante.
Não vinculam o mandante, salvo se ele ratificar os atos praticados, conforme art. 662
do CC, caso em que esta ratificação retroagirá à data do ato. Portanto, essa ratificação terá
efeitos ex tunc.
Sempre que o mandatário realizar negócios expressamente em nome do mandante,
será o responsável o mandante, já que o mandatário não pratica o ato em seu nome.
Como o mandatário é um possuidor de boa-fé, poderá reter o objeto da operação que
firmou até o recebimento do pagamento de que lhe é devido por conta do mandato, desde que
seja oneroso.
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10.6. SUBSTABELECIMENTO
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No contrato de agência, uma pessoa vai assumir, em caráter perene e não eventual, a
obrigação de promover à conta de outra pessoa, mediante retribuição, a realização de certos
negócios.
Ou seja, dentro de uma zona determinada, alguém vai promover negócios à conta e em
nome de outra pessoa e será remunerado por isso.
Distribuição haverá quando o agente tiver à disposição a coisa que vai ser negociada.
Quando se está diante de contrato de agência, há um contrato bilateral, consensual,
comutativo, personalíssimo e informal.
É ainda uma característica do contrato de agência o fato de ser um contrato de trato
sucessivo, pois as obrigações vão sendo cumpridas periodicamente.
O contrato de distribuição terá as mesmas características do contrato de agência, sendo
consensual, comutativo, personalíssimo e informal, além de ser de trato sucessivo.
O contrato de agência e de distribuição são contratos de exclusividade. Tanto é que o
art. 711 diz que, salvo ajuste em contrário, o proponente não pode constituir, ao mesmo tempo,
mais de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência. Além disso, não pode o agente
assumir o encargo de nela tratar de negócios do mesmo gênero, à conta de outros proponentes.
O agente deve agir com toda a diligência possível e deve observar as instruções do
representado (proponente), sob pena de haver um descumprimento do contrato.
O agente e o distribuidor têm direito à remuneração pelos negócios concluídos dentro
da sua de exclusividade. Ainda que não tenha interferido naquele negócio, mas que tenha sido
celebrado na sua zona, terá ele direito à participação. A isso se dá o nome de comissão.
A remuneração é devida também ao agente quando o negócio deixa de ser realizada por
conta do representado (proponente). Ou seja, o agente ou distribuidor fez tudo e era para o
negócio ser celebrado, mas não foi, terá o proponente direito de receber a sua comissão.
Se o proponente sem justa causa cessa o atendimento das propostas ou reduz o
atendimento, começando a agir de forma antieconômica a continuação do contrato, o agente
ou distribuidor terá direito à indenização. Isso porque houve a quebra da boa-fé.
No tocante ao descumprimento do contrato, destacam-se duas regras:
• mesmo quando dispensado por justa causa, o agente tem direito de ser remunerado
pelos serviços úteis que prestou;
• se a dispensa se der sem culpa do agente, neste caso terá direito à remuneração
devida, mas terá direito dos negócios pendentes, pois trabalhou até o momento,
havendo a sua dispensa sem ter dado causa.
O art. 720 vai dizer que se o contrato for celebrado por tempo indeterminado, qualquer
das partes poderá resolver o contrato, desde que tenha aviso prévio de 90 dias de antecedência
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e que tenha havido prazo compatível com o investimento ou com a natureza do contrato
celebrado, ou com o investimento feito pelo agente.
Por fim, deve ser aplicado ao contrato de agência ou distribuição, naquilo que forem
compatíveis as regras do mandato ou da comissão que estejam no Código Civil ou regras de
representação previstas em lei especial.
11.3. CORRETAGEM
Corretagem é o negócio jurídico pelo qual uma pessoa (corretor) se obriga a obter para
outra pessoa (comitente) um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas pelo
comitente.
O corretor receberá uma remuneração chamada de comissão.
O contrato, portanto, é um contrato bilateral, oneroso, informal e consensual.
Trata-se de um contrato acessório, pois visa a celebração de outro contrato,
dependendo dessa celebração para surtir efeitos.
É um contrato aleatório, pois o corretor de imóveis só irá receber a comissão se o
negócio for firmado. Há sujeição do risco.
A comissão pode ser variável, fixa ou mista.
A obrigação de pagar a comissão de corretagem, segundo o STJ, é de quem contrata o
corretor. Se é o vendedor que contrata o corretor para vender o imóvel, quem paga é o
vendedor.
O art. 725 diz que a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha o corretor
conseguido o resultado previsto no contrato de corretagem, ainda que esse contrato não se
efetue em razão de arrependimento das partes.
O STJ entende que o corretor tem direito à remuneração mesmo tendo sido realizado
um negócio que ele intermediou posteriormente ao prazo do contrato de corretagem.
Ademais, o STJ entende que a remuneração é devida mesmo havendo inadimplemento
por qualquer das partes posteriormente. O que é fundamental é que o contrato de corretagem
tenha gerado um resultado útil.
O STJ também entende que, ainda que o negócio jurídico de compra e venda não se
concretize por inadimplemento do comprador, é devida a comissão de corretagem no caso em
que o corretor tenha intermediado esse negócio. As partes firmaram um contrato de promessa
de compra e venda, e um dos contratantes lançou um sinal, caso em que o corretor fará jus à
remuneração, pois realizada a intermediação.
O art. 726 diz que sendo iniciado e concluído o negócio diretamente entre as partes,
sem atuação do correto, não terá o corretor direito a nenhuma remuneração, mas se por escrito
tiver sido ajustado um contrato de corretagem de exclusividade, por meio de instrumento
chamado de opção, terá direito o corretor à remuneração, ainda que o negócio tenha sido
realizado sem a sua mediação.
Essa remuneração não será devida quando se estiver diante de uma comprovada inércia,
ociosidade ou descumprimento do contrato de corretagem pelo corretor.
Se houver corretagem conjunta, ou seja, por mais de um corretor, a remuneração será
paga a todos em partes iguais, salvo se o ajuste tiver sido feito de forma contrária.
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12.1. INTRODUÇÃO
O art. 732 diz que vão ser aplicadas as normas previstas em leis especiais e tratados e
convenções internacionais ao contrato de transporte, desde que essas normas não contrariem
aquilo disposto no Código Civil.
Há discussões sobre qual regra será aplicada quando há tratado regulamentando
transporte específico. Isso é importante em razão da Convenção de Varsóvia e em razão da
Convenção de Montreal. Essas duas convenções vão se relacionar a limitações de indenização
em caso de perda de voo ou de extravio de bagagens em viagens internacionais, relacionadas a
transporte aéreo.
A pergunta que se faz é: num contrato de transporte aéreo internacional haverá essa
limitação ou não para o estabelecimento de uma indenização? A reparação será proporcional
ao dano ou conforme prevê a convenção?
No presente caso, temos um conflito entre dois diplomas legais:
• o CDC, que garante ao consumidor o princípio da reparação integral do dano;
• as Convenções de Varsóvia e de Montreal, que determinam a indenização tarifada
em caso de transporte internacional.
Assim, a antinomia ocorre entre o art. 14 do CDC, que impõe ao fornecedor do serviço
o dever de reparar os danos causados, e o art. 22 da Convenção de Varsóvia, que fixa limite
máximo para o valor devido pelo transportador, a título de reparação.
Questiona-se: qual dos dois diplomas irá prevalecer? Em caso de extravio de bagagem
ocorrido em transporte internacional envolvendo consumidor, aplica-se o CDC ou a indenização
tarifada prevista nas Convenções de Varsóvia e de Montreal? As Convenções internacionais.
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Nesse caso, será considerado o trajeto como um todo para verificar se houve o
cumprimento tempestivo da obrigação de resultado ou não.
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No transporte de coisas não há passageiros, mas sim um expedidor, o qual irá entregar
um bem corpóreo ao transportador para que ele leve esse bem a um destinatário, que poderá
ser o próprio expedidor, recebendo uma remuneração denominado frete.
O art. 744 diz que ao receber a coisa, o transportador irá emitir o conhecimento, com a
menção dos dados que identificam aquela coisa recebida. Esse conhecimento é um título de
crédito, sendo este atípico.
O art. 745 diz que, no caso de informação inexata ou falsa descrição no documento que
o transportador emitiu com base nas informações prestadas pelo transportado, o transportador
indenizado pelo prejuízo que sofrer. Essa ação respectiva deve ser ajuizada no prazo de 120 dias,
a contar daquele ato, sob pena de decadência.
A doutrina afirma que neste caso o prazo seria prescricional, já que haveria a violação
de um direito que gera um prejuízo, situação em que o autor irá buscar a pretensão à
indenização.
Veja, se o expedidor informar que o transportador está expedindo tijolos, mas na
verdade se trata de maconha, o expedidor deverá arcar com o dano, tendo o transportador ter
o prazo de 120 dias para propositura dessa ação, a contar do momento em que a informação
falsa foi prestada.
O art. 750 vai dizer que a responsabilidade do transportador irá se limitar ao valor
constante do conhecimento, já que teria o dever de informar. Essa responsabilidade iniciará do
momento em que recebe a mercadoria e somente vai se encerrar no momento em que entregar
ao destinatário. Caso não encontre o destinatário, será depositada a mercadoria em juízo.
O art. 752 afirma que, desembarcadas as mercadorias, o transportador não é obrigado
a avisar o destinatário que desembarcou as mercadorias, salvo se houver convenção nesse
sentido. Ademais, devem constar do conhecimento de embarque as cláusulas de aviso ou de
entrega a domicílio.
Cabe mencionar que há uma crítica da doutrina com relação à possível violação da boa-
fé objetiva, em virtude de não haver a observância do direito de informação.
Ao final do percurso, as mercadorias serão entregues ao destinatário ou quem
apresente o documento de frete endossado. Essa pessoa deverá conferir as mercadorias,
hipótese em que, se não estiverem elas de acordo, deverá apresentar imediatamente a
reclamação, sob pena de decadência.
Se o vício da coisa não for perceptível icto oculi no momento de recebimento da
mercadoria. Nesse caso, o parágrafo único do art. 754 afirma que, se houver avaria ou perda
parcial não perceptível à primeira vista, o destinatário conserva a sua ação contra o
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transportador, desde que denuncie o dano em 10 dias a contar da entrega da mercadoria, sob
pena de decadência.
O art. 753 diz que, se o transporte não puder ser feito ou sofrer longa interrupção, o
transportador solicitará instruções ao remetente, e zelará pela coisa, por cujo perecimento ou
deterioração responderá, salvo força maior. Veja que a coisa estará sob responsabilidade do
transportador.
Se perdurar o impedimento, mas não sendo este imputável ao transportador e se não
houver manifestação do remetente, poderá o transportador fazer o depósito judicial da coisa
ou vender a coisa transportada, desde que sejam observados os preceitos legais e
regulamentares, ou os usos locais, depositando o valor em juízo ou em favor do expedidor.
Por outro lado, caso o impedimento se dê por responsabilidade do transportador,
poderá este depositar a coisa judicialmente, mas por sua conta e risco. Só será possível vender
a coisa transportada, quando o impedimento ser de sua responsabilidade, caso a coisa seja
perecível.
Seja qual for o caso, o transportador deve informar o remetente da efetivação do
depósito ou da venda.
Se o transportador mantiver a coisa depositada em seus próprios armazéns, continuará
a responder pela sua guarda e conservação, sendo-lhe devida, porém, uma remuneração pela
custódia, a qual poderá ser contratualmente ajustada ou se conformará aos usos adotados em
cada sistema de transporte.
Caso haja dúvida sobre quem seja o destinatário, o transportador deve fazer o depósito
judicial da coisa, caso não seja possível obter instruções do remetente. Se a demora puder
ocasionar a deterioração da coisa, o transportador deverá vender a coisa, depositando o saldo
em juízo.
13.1. INTRODUÇÃO
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Somente pode ser segurador uma entidade legalmente autorizada para esta finalidade
(art. 757). Ou seja, somente sociedades anônimas, grupos de seguro ou cooperativas. Para ser
seguradora é indispensável que haja autorização do governo federal.
Ressalta-se que as cooperativas para seguro terão por objeto apenas seguros agrícolas.
Segundo a lei, a prova do contrato de seguro se dá por meio da apólice ou bilhete de
seguro. Na falta, poderá ser comprovado por qualquer documento que comprove o pagamento
do prêmio.
Veja que a forma é livre, não sendo um contrato formal, pois a lei diz que irá prová-lo
por meio da apólice ou bilhete de seguro. Ou seja, se irá prová-lo é porque ele existe.
Isso mostra que o contrato de seguro é consensual, pois ele está aperfeiçoado desde o
momento em que o acordo de vontades ocorre.
A apólice é o instrumento do contrato de seguro. Ela irá conter as regras gerais do
negócio, e a sua emissão deverá ser precedida, segundo a lei, por uma proposta escrita com a
declaração dos elementos essenciais dos interesses e dos riscos a ser garantidos.
O bilhete do seguro é o instrumento mais simplificado do negócio, por meio do qual se
pode contratar o seguro.
Tanto a apólice quanto o bilhete de seguro podem ser nominativo, à ordem ou ao
portador, mencionando em relação a cada um deles os riscos assumidos, início e fim do seguro,
limite da garantia e prêmio devido.
• Apólice ou bilhete de seguro nominativo: menciona o nome do segurador e do
segurado. Neste caso, é transferido por meio de cessão civil.
• Apólice ou bilhete de seguro à ordem: será transmitido em endosso em preto,
dizendo quem é que irá receber.
• Apólice ou bilhete de seguro ao portador: quem portar é o segurado. Serão
transmissíveis por simples tradição.
O art. 761 vai tratar do denominado cosseguro. No cosseguro, há os riscos de um seguro
direto que são assumidos por várias segurados, sendo corresponsáveis pelo risco.
Nesse caso, a apólice vai indicar qual é a seguradora líder, dentre as corresponsáveis,
que irá administrar o contrato.
Não se pode confundir cosseguro com resseguro. Nessa hipótese, há uma seguradora
que faz um seguro, mas contrata outra seguradora, temendo os riscos desse contrato anterior.
O art. 762 diz que é nulo o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso
do segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro.
O art. 763 irá dizer que, não tem direito à indenização o segurado que estiver em mora
no pagamento do prêmio, se ocorrer o sinistro antes de sua purgação. Flávio Tartuce afirma
que este dispositivo deve ser interpretado conforme o adimplemento substancial. Como
exemplo, é o caso em que o indivíduo paga o seguro há 10 anos, mas no mês de atraso não paga
e a seguradora recusa a garantia. Nesse caso, deverá a seguradora garantir.
O fato de se não ter verificado o risco em previsão do qual se faz o seguro não exime o
segurado de pagar o prêmio, salvo disposição especial.
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medidas que possam amenizar os prejuízos da realização do risco, bem como a sua propagação.
Se não houver esta comunicação imediata, o segurado perderá o direito à indenização.
Todavia, o STJ decidiu que, para a perda do direito à indenização, é necessário que fique
demonstrada a omissão dolosa do segurado, que beire a má-fé, ou culpa grave, prejudicando,
de forma desproporcional, a atuação da seguradora. Ex.: se o segurado demorou 3 dias para
comunicar à seguradora sobre o roubo do veículo em razão de ameaças do criminoso, não
perderá a indenização, pois não poderia ser dele exigido comportamento diverso.
Em regra, a diminuição do risco no curso do contrato não acarreta a redução do prêmio
estipulado. Porém, se a redução do risco for considerável, o segurado poderá exigir a revisão do
prêmio, ou a resolução do contrato.
Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado deve informar o sinistro ao
segurador, logo que souber. E ainda o segurado deverá tomar as providências imediatas para
minorar a ocorrência do sinistro. Isso é a consagração do dever de mitigar as perdas (duty to
mitigate the loss).
O art. 773 do CC vai dizer que o segurador, que ao tempo do contrato sabia que o risco
estava superado, mas não obstante expediu a apólice irá pagar em dobro o prêmio estipulado.
Isso porque se não há risco, não há porque celebrar contrato de seguro. Por conta disso, a
doutrina afirma que o contrato é aleatório, pois o risco é elemento essencial do contrato de
seguro.
É possível que o contrato de seguro traga a cláusula de recondução tácita do contrato
pelo mesmo prazo. Se ficarem caladas as partes, o contrato será prorrogado no tempo pelo
mesmo prazo.
O prolongamento do contrato nas mesmas condições contratadas pelo mesmo prazo.
Tal cláusula é válida, mas não pode ocorrer por mais de uma vez (art. 774).
Ocorrendo o pagamento pela seguradora, é possível a ação regressiva em face do
culpado pelo evento danoso. A seguradora irá pagar o sujeito que está garantido, mas terá
direito de ressarcimento ou de regresso em face de quem efetivamente causou o dano.
Os agentes autorizados do segurador presumem-se seus representantes para todos os
atos relativos aos contratos que agenciarem.
O segurador é obrigado a pagar em dinheiro o prejuízo resultante do risco assumido,
salvo se convencionada a reposição da coisa.
No seguro de dano, a garantia não pode ultrapassar o valor da coisa garantida, ou seja,
do valor do interesse segurado. Se o valor segurado for superior ao bem garantido, estará
havendo enriquecimento sem causa.
Portanto, se o valor segurado for superior ao valor coisa, o segurado vai perder a
garantia e pagar o prêmio por quebra da boa-fé e enriquecimento sem causa (art. 778).
Em relação à indenização a ser recebida pelo segurado, o art. 781 diz que não poderá
ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro. Em hipótese alguma o limite
máximo da garantia fixada na apólice. Ex.: foi feito um seguro de um carro de 50 mil reais. Este
é o valor do seguro. Após um ano, o sujeito trocou o carro. Quando for avaliar, o segurador
pagou 40 mil reais, com base na tabela FIPE.
É possível a cumulação de seguros, no caso de seguro de dano, inclusive o seguro duplo.
Porém, o valor do seguro não poderá ser superior ao interesse segurado.
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O art. 783 autoriza o seguro parcial, assegurando o interesse por menos do que ele vale.
Se ocorrer um sinistro parcial, a indenização também será reduzida proporcionalmente.
Ex.: segura-se 50% do bem, ou seja, se fica segurado 10 mil, receberá 5 mil reais da seguradora.
É a denominada cláusula de rateio.
Em relação à garantia, esta não inclui o sinistro provocado por vício intrínseco à coisa
segurada. Portanto, se o segurado não declarou do vício quando da celebração do contrato, será
um vício não segurado. Dessa forma, o vício não é algo que aconteceu, mas sim por algo
intrínseco à coisa. A responsabilidade neste caso será do fornecedor.
Em regra, o contrato de seguro de dano não é personalíssimo, podendo transferir a
terceiro a condição de segurado do bem. Todavia, é possível que o contrato preveja a cláusula
proibitiva de cessão.
O STF entende que, sendo paga a indenização, o segurador vai se sub-rogar nos limites
do valor respectivo, nos direitos e ações que competem ao segurado, contra o autor do dano.
Essa regra não se aplica ao seguro de pessoas, pois o art. 800 do CC é explícito, estabelecendo
que, nos seguros de pessoa, o segurador não pode se sub-rogar nos direitos e ações do segurado
ou do beneficiado, contra quem causou o sinistro. Há aqui apenas a vedação legal à sub-rogação
para o seguro de pessoa.
O Código Civil prevê que a seguradora que paga a indenização sub-roga-se nos direitos
do segurado. Ou seja, o art. 786 estabelece que, paga a indenização, o segurador sub-roga-se,
nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o
autor do dano. Este inclusive já era o teor da Súmula 188 do STF, a qual diz que o segurador tem
ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto
no contrato de seguro.
Segundo o §2º do art. 786, é ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga,
em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo. Tal dispositivo previu, de forma
expressa e inequívoca, a ineficácia, perante o segurador, de atos de disposição praticados pelo
segurado juntamente ao autor do dano.
Desse modo, eventual termo de renúncia ou quitação outorgado pelo segurado ao
terceiro causador do dano não impede o exercício do direito de regresso pelo segurador. O
legislador buscou proteger o direito do segurador de ser ressarcido da quantia que gastou para
indenizar o segurado.
Assim, se o segurado optou por acionar o seguro, cobrando a garantia contratada, não
lhe cabe firmar com o causador do dano qualquer tipo de transação que possa importar na
extinção ou diminuição do direito de regresso do segurador. Se o fizer, o ato será absolutamente
ineficaz em relação ao segurador. Por exemplo, o acordo celebrado entre o causador do dano e
o segurado, em que este “fica com pena” da motorista e pede para que ela pague apenas a
franquia do seu seguro, é válido e eficaz entre eles (contratantes).
No entanto, não se pode admitir que os efeitos dessa avença sejam estendidos ao
segurador que, além de não ter participado do ajuste, possui, por força de lei, o direito de ser
reembolsado de todos os valores gastos com o reparo do bem sinistrado. Portanto, mesmo que
o segurado tenha outorgado termo de quitação ou renúncia ao causador do sinistro, o
segurador terá direito de ser ressarcido, em ação regressiva contra o autor do dano, pelas
despesas que efetuou com o reparo ou substituição do bem sinistrado.
Tudo que foi dito acima é a regra. Haverá exceção no caso de má-fé do segurado e boa-
fé do autor do dano. Ex.: Pedro, negligente, bateu no carro de João, que não revela que tem
seguro. Pedro paga o conserto a João e este assina a quitação integral. No entanto, João, de má-
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Aurélio Bouret
fé, aciona o seguro pedindo o conserto do carro, o que é feito. Após, a seguradora ajuíza ação
regressiva contra Pedro cobrando a quantia do conserto do carro segurado.
Nessa hipótese específica e excepcional, o STJ entende que o terceiro (Pedro), ao ser
demandado na ação regressiva, poderá se eximir do ressarcimento das despesas com o bem
sinistrado, bastando que, nos termos do art. 373, II do CPC, prove que já realizou a reparação
completa dos prejuízos causados, apresentando o recibo assinado pelo segurado ou eventuais
documentos que comprovem o custeio das despesas. Neste caso, o juiz deverá julgar
improcedente o pedido regressivo formulado, restando à seguradora a alternativa de
demandar contra o próprio segurado, por locupletamento ilícito, tendo em vista que, em
evidente ato de má-fé contratual, requereu, indevidamente, a cobertura securitária mesmo já
tendo sido indenizado diretamente pelo autor do dano.
Também merece destaque o art. 786, §1º, o qual estabelece que, salvo dolo, a sub-
rogação não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, ascendente ou
descendente, seja consanguíneo ou afim. Esse dispositivo fala que o segurador irá se sub-rogar
no direito do segurado e vai propor a ação contra o causador do dano. Porém, se o causador do
dano for a mulher, filho ou pai da pessoa, não haverá sub-rogação. A exceção é em relação ao
dolo.
O seguro de responsabilidade civil é uma modalidade de seguro de dano. No seguro de
responsabilidade civil, a seguradora se compromete a cobrir danos causados por atos ilícitos
cometidos pelo segurado ao terceiro.
O Código Civil é expresso ao proibir o segurado de reconhecer a sua responsabilidade
ou confessar a ação, ou mesmo transigir com o terceiro indenizado ou mesmo de indenizá-lo,
sem que haja a anuência expressa do segurador nos casos de seguro de responsabilidade civil.
No caso de seguro de responsabilidade civil, se foi intentado uma ação contra o
segurado, o segurado deverá dar ciência ao segurador a respeito da lide. Essa ciência será dada
através da denunciação da lide. Não havendo, poderá posteriormente em acionar o segurador.
O STJ, na súmula 537, estabelece que, em ação de reparação de danos, a seguradora
denunciada, se aceitar a denunciação ou contestar o pedido do autor, pode ser condenada,
direta e solidariamente junto com o segurado, ao pagamento da indenização devida à vítima,
nos limites contratados na apólice.
É bom lembrar que o fato de poder ser condenada diretamente e solidariamente não
autoriza que ela seja acionada unicamente e exclusivamente pelo terceiro. Tanto é que a súmula
529 estabelece que no seguro de responsabilidade civil facultativo, não cabe o ajuizamento de
ação pelo terceiro prejudicado direta e exclusivamente em face da seguradora do apontado
causador do dano.
Há seguros de responsabilidade civil que são obrigatórios, como é o caso do DPVAT.
Nesses seguros, a indenização pelo sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro
prejudicado (art. 788).
Vale mencionar a Súmula 246 do STJ, a qual diz que o valor do seguro obrigatório deve
ser deduzido da indenização judicialmente fixada.
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Aurélio Bouret
Qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por
sua carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os
motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros.
Para receber indenização, não importa quem foi o culpado.
O DPVAT não paga indenização por prejuízos decorrentes de danos patrimoniais,
somente danos pessoais.
O STJ já se manifestou no sentido de que o DPVAT não cobre os danos de acidente
ocasionado por trem.
Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na lei?
• no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima);
• no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima);
• no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como
reembolso a cada vítima.
A incidência de atualização monetária nas indenizações por morte ou invalidez do
seguro DPVAT opera-se desde a data do evento danoso, conforme súmula 580 do STJ.
Quem são os beneficiários do seguro DPVAT? Quem tem direito de receber a
indenização?
• No caso de morte: metade será paga ao cônjuge do falecido, desde que eles não
fossem separados judicialmente, e o restante aos herdeiros da vítima, obedecida a
ordem da vocação hereditária. Não havendo cônjuge nem herdeiros, serão
beneficiários os que provarem que a morte da vítima os privou dos meios
necessários à subsistência. Segundo o STJ, é válido o pagamento de indenização
aos pais do de cujus no caso em que os genitores, os quais se apresentaram como
únicos herdeiros, diante da apresentação da certidão de óbito que afirmava que o
falecido era solteiro e não tinha filhos. Nada impede, porém, que o filho exerça seu
direito de ingressar com ação cobrando a quantia dos pais do falecido que
receberam a indenização de forma indevida.
• No caso de invalidez permanente: a própria vítima.
• No caso de despesas de assistência médica e suplementares: a própria vítima.
O STJ decidiu que, se uma gestante envolve-se em acidente de carro e, em virtude
disso, sofre um aborto, ela terá direito de receber a indenização por morte do DPVAT, nos
termos do art. 3º, I da Lei nº 6.194/74. Segundo o Ministro Relator, “o ordenamento jurídico
como um todo se alinhou-se mais à teoria concepcionista para a construção da situação
jurídica do nascituro, conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina
contemporânea” (Inf. 547).
A ação de cobrança do DPVAT prescreve em 3 anos, iniciando o prazo da data em que
teve ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez ou da morte. O prazo prescricional
começa no dia que foi realizado o pagamento administrativo que o beneficiário considera que
tenha sido menor que o devido.
A súmula 573 do STJ estabelece que, nas ações de indenização decorrente de seguro
DPVAT, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez, para fins de contagem do prazo
prescricional, depende de laudo médico, exceto nos casos de invalidez permanente notória ou
naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução.
Para obter a indenização, a pessoa deverá procurar uma das empresas seguradoras que
seja consorciada ao DPVAT e apresentar a documentação necessária. Para requerer o seguro
DPVAT não é necessário advogado, despachante ou qualquer outra ajuda de terceiros. Segundo
o STJ, o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos
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Aurélio Bouret
individuais homogêneos dos beneficiários do seguro DPVAT, dado o interesse social qualificado
presente na tutela dos referidos direitos subjetivos.
Na ação de cobrança do seguro DPVAT, constitui faculdade do autor escolher entre:
• foro do domicílio do autor;
• foro do local do acidente; ou
• foro do domicílio do réu.
Caso a pessoa beneficiária do DPVAT não receba a indenização ou não concorde com o
valor pago pela seguradora, ela poderá buscar auxílio do Poder Judiciário, por meio de uma ação
de cobrança contra a seguradora objetivando a indenização decorrente de DPVAT.
Consoante o entendimento do STJ, em ação de cobrança de seguro DPVAT, a intimação
da parte para o comparecimento à perícia médica deve ser pessoal, e não por intermédio de
advogado (Info 589).
Segundo o STJ, o espólio, ainda que representado pelo inventariante, não possui
legitimidade ativa para ajuizar ação de cobrança do seguro obrigatório (DPVAT) em caso de
morte da vítima no acidente de trânsito.
Segundo a Lei do DPVAT, o valor indenizatório deve ser pago metade ao cônjuge não
separado judicialmente e o restante aos herdeiros da vítima, segundo a ordem de vocação
hereditária (art. 4º da Lei nº 6.194/1974). O valor oriundo do DPVAT não integra o patrimônio
da vítima de acidente de trânsito. Em outras palavras, o valor da indenização não é um crédito
da vítima falecida. Não integra o patrimônio deixado pelo morto. O valor da indenização do
DPVAT, em caso de morte, passa diretamente para os beneficiários (cônjuge supérstite e
demais herdeiros).
O contrato de seguro de pessoa visa assegurar a pessoa humana, protegendo ela contra
riscos de morte, comprometimento de saúde, incapacidades em geral, etc.
O art. 789 diz que nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado
pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o
mesmo ou diversos seguradores.
A primeira diferença entre o seguro de dano e o seguro de pessoa é de que este não
tem limites, pois a vida humana não é quantificável.
Se a pessoa quiser fazer 10 seguros de vida, será possível.
No seguro de vida e no seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a
declarar, sob pena de falsidade, o interesse de assegurar a vida do outro. Deve declarar qual é
o interesse para assegurar.
Presume-se esse interesse quando o segurado for ascendente, descendente ou cônjuge
do proponente, pois do contrário deverá explicar a razão de fazer o seguro.
O contrato de seguro de pessoas pode instituir um terceiro beneficiário, o qual receberá
a indenização em caso da morte do segurado. Na falta de indicação do terceiro, o capital será
pago metade ao cônjuge e a outra metade aos herdeiros do segurado.
Se não for casado e não tiver herdeiros necessários, vão ser beneficiados aqueles que
provaram que com a morte do segurado ficaram privados dos meios necessários à subsistência
(art. 792, parágrafo único).
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Por meio da constituição de renda uma pessoa (instituidor) entregará uma determinada
quantia em dinheiro, bem móvel ou imóvel, a outra pessoa (rendeiro).
O rendeiro fica obrigado a pagar ao instituidor, temporariamente, certa renda, a qual
poderá ser estipulada em favor do próprio rendeiro.
Perceba que, em regra, essa transmissão ocorre de forma gratuita, por meio de
atividade benevolente. Não há qualquer contraprestação por parte do rendeiro, pois ele seria o
beneficiário.
Em regra, o contrato é unilateral, gratuito, comutativo, real, temporário e solene.
Veja, o contrato de constituição de renda deve se dar por escritura pública.
A constituição de renda pode ser instituída por ato inter vivos ou por ato causa mortis
(testamento). Nesse caso, o testamento deve ser público, conforme a doutrina.
A constituição da renda pode se dar por meio de sentença judicial, como quando há o
pagamento de alimentos indenizatórios.
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A constituição de renda é feita por prazo certo, mas pode ser feito inclusive por vida,
ou seja, até que se ultime a vida do devedor (rendeiro), situação na qual que, ocorrendo,
retornará o bem ao instituidor.
Não pode a constituição de renda ser pela vida do instituidor, pois se este morrer, a
família daquele que necessitava dos alimentos ou da renda não poderá ficar sem nada.
Se o rendeiro deixar de cumprir uma obrigação estipulada, o credor (instituidor) poderá
acioná-lo. Esse credor também poderá ser terceiro, em benefício do qual a renda foi instituída.
Esse credor também poderá acioná-lo para que ele pague o que deve, ou para que apresente
garantias de que vai pagar o que deve, ou que deverá a partir daquele momento, sob pena de
rescindir o contrato de constituição de renda (art. 810).
Via de regra, não existe direito de acrescer entre os beneficiários da renda. Se falece o
rendeiro, o outro continuará recebendo a mesma coisa que recebida, sendo extinto o benefício
contra aquele que faleceu.
A exceção está na chamada constituição de renda gratuita em que há o direito de
acrescer entre os cônjuges. É o caso da constituição de renda legal, em que, morrendo um dos
cônjuges, o outro passar a receber a renda do outro.
Além desse direito de acrescer legal, é possível o direito de acrescer convencional, em
que haja previsão nesse sentido.
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222
Aurélio Bouret
15.1. INTRODUÇÃO
Fiança é um contrato pelo qual o fiador garante que vai satisfazer ao credor uma
obrigação que é assumida pelo devedor, caso este não cumpra a obrigação.
Perceba que a fiança é um contrato acessório, firmado entre fiador e credor. Por isso,
em regra, há o benefício de ordem do fiador.
O contrato de fiança traz duas relações jurídicas: uma que é interna do próprio contrato,
que é a relação entre o fiador e o credor do devedor, mas também há uma relação externa, que
é a relação entre o fiador e o devedor.
O art. 820 diz que a fiança pode ser estipulada, ainda que sem o consentimento do
devedor, e mesmo contra a sua vontade, visto que é um contrato diferente do contrato firmado
entre credor e devedor.
Na fiança, há um contrato unilateral, pois quem tem obrigação é apenas o fiador. Em
regra, é um contrato gratuito, salvo quando as instituições financeiras são as fiadoras, situação
em que serão remuneradas e o contrato passará a ser oneroso. A fiança será formal, pois exige
a forma escrita.
O art. 819 diz que a fiança não admite interpretação extensiva, pois se está diante de
um contrato benéfico.
O STJ, na Súmula 214, diz que o fiador na locação não responde por obrigações
resultantes de aditamento ao qual não anuiu. Há aplicação do princípio da relatividade do
contrato.
Segundo o STJ, a fiança limitada decorre da lei e do contrato, de modo que o fiador não
pode ser compelido a pagar valor superior ao que foi avençado, devendo responder tão somente
até o limite da garantia por ele assumida, o que afasta sua responsabilização em relação aos
acessórios da dívida principal e aos honorários advocatícios, que deverão ser cobrados apenas
do devedor afiançado.
Por se tratar de contrato benéfico, as disposições relativas à fiança devem ser
interpretadas de forma restritiva (art. 819 do CC), razão pela qual, nos casos em que ela é
limitada (art. 822), a responsabilidade do fiador não pode superar os limites nela indicados.
Ex: indivíduo outorgou fiança limitada a R$ 30 mil; significa que ele não terá obrigação de pagar
o que superar esta quantia, mesmo que esse valor a maior seja decorrente das custas
processuais e dos honorários advocatícios (Inf. 595).
Atente-se ao caso da fiança que garante a locação urbana (Lei de Locações). Salvo
disposição em contrário, qualquer das garantias da locação vai se estender até que o imóvel seja
devolvido, ainda que essa prorrogação tenha se dado por prazo indeterminado. Então a fiança
será prorrogada, conforme seja prorrogada automaticamente a fiança.
Por isso a lei diz que, passando a fiança a ter prazo indeterminado, o fiador poderá se
exonerar por uma notificação dirigida ao locador. Nesse caso, ficará garantida a dívida ainda por
mais 120 dias após a notificação.
Em julho de 2015 o STJ entendeu que essa tese da prorrogação da fiança se estenderá
também para fianças prestadas em contratos bancários. Nesse caso, o fiador poderá se exonerar
para não mais afiançar o débito.
Se o contrato principal for nulo, a fiança será nula, pois se trata de contrato acessório,
mas o contrário não ocorrerá da mesma forma.
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A fiança pode ser total ou parcial, podendo afiançar parte da dívida ou a dívida toda. O
que não se pode fazer é afiançar um valor superior ao valor do débito principal.
Em regra, a fiança será total, garantindo a dívida com todos os seus acessórios, juros,
multa, despesas judiciais com citação do fiador, etc., tendo ele direito de regresso contra o
afiançado.
Tornando-se insolvente ou incapaz o fiador, o credor pode exigir a sua substituição. Se
esta substituição do fiador não ocorrer, haverá o vencimento antecipado da dívida.
Lembre-se que o fiador não é devedor solidário e sim subsidiário, tendo benefício de
ordem. Regulamentando o benefício de ordem, o art. 827 diz que o fiador demandado pelo
pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro
executados os bens do devedor.
O fiador que alega o benefício de ordem deve indicar os bens do devedor principal que
bastem para a satisfação da dívida. Porém, ele irá nomear bens livre e desembaraçados
localizados no mesmo município em que haja a cobrança da dívida. Tartuce entende que essa
redação literal do dispositivo deve sofrer ponderações.
O art. 828 consagra hipóteses em que o fiador não pode alegar benefício de ordem:
• fiador renunciou expressamente ao benefício de ordem;
• fiador se obrigou como principal pagador ou como devedor solidário;
• devedor estiver insolvente ou devedor falido.
A renúncia ao benefício de ordem será nula quando estiver inserida em contrato de
adesão, conforme o Enunciado 364 do CJF.
O art. 829 diz que a fiança conjuntamente prestada a um só débito por mais de uma
pessoa importa em solidariedade entre os fiadores, se não reservarem o benefício da divisão.
A exceção a esta regra consta do fato em que se houver no contrato de fiança uma
distribuição de quanto cada um deles ficará responsável.
O art. 834 diz que, quando o credor sem justa causa deixar de dar andamento à
execução feita contra o devedor, o fiador poderá fazê-lo, pois caso não pague o devedor, o
fiador deverá pagar.
Tanto é que o art. 835 diz que o fiador poderá se exonerar da fiança que tenha celebrado
sem limitação de tempo sempre que lhe convier. Este dispositivo está dizendo que o fiador, se
foi prestada por prazo indeterminado, poderá se exonerar quando quiser.
Neste caso, ficará o fiador obrigado a todos os efeitos da fiança 60 dias após a
notificação do credor.
Atente-se que o fiador ficará por 120 dias obrigado quando se tratar de locação urbana.
No caso de contratos em geral, ficará o fiador obrigado por mais 60 dias a contar da
comunicação.
O art. 836 diz que a obrigação do fiador passa aos herdeiros, mas a responsabilidade da
fiança será limitada ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças
da herança.
O contrato de fiança depende da confiança, sendo personalíssimo, de forma que a
morte implica fim ao contrato de fiança.
O art. 837 diz que o fiador pode opor ao credor as exceções e defesas pessoais do
próprio fiador, que geram a extinção do contrato, mas também poderá alegar defesas extintivas
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Aurélio Bouret
da obrigação que competem ao devedor principal. Ex.: fiador não paga sob alegação da
prescrição, pagamento direto ou indireto, etc.
O fiador, mesmo que solidário, fica desobrigado se, sem o seu consentimento, o credor
conceder moratória ao devedor. O STJ entende que moratória ou transação entre devedor e o
credor exoneram o fiador, ainda que ele tivesse assumido a obrigação em caráter solidário, já
que não participou dessa nova celebração.
A fiança será extinta se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos direitos e
preferências do credor pelo fiador. Ex.: o credor é credor de garantia real (hipoteca) e garantia
fidejussória (existe um fiador), mas o credor renuncia a sua preferência sobre a coisa,
executando o fiador.
Neste caso, a fiança estará extinta por fato atribuível ao credor, visto que estará o fiador
impossibilitado de se sub-rogar aos direitos e preferências que ele tinha.
Ademais, a fiança será extinta se o credor, em pagamento da dívida, aceitar
amigavelmente do devedor, um conteúdo diverso da dívida obrigada. Isto é, a fiança está
extinta se houver dação em pagamento, mesmo que depois o credor venha a perder esse bem
em razão da evicção.
O art. 839 diz que se for invocado o benefício de ordem e o devedor, retardando-se a
execução, cair em insolvência, também ficará o fiador exonerado. Isso quer dizer que, quando
for executar o fiador, e ele indicar vários bens do devedor, alegando benefício de ordem, mas o
credor nada o fez.
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16.1. TRANSAÇÃO
16.1.1. ESPÉCIES
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16.2. COMPROMISSO
Compromisso é um acordo de vontades por meio do qual as partes decidem que não
vão submeter o litígio a uma decisão judicial, conferindo a solução de uma desavença a um
árbitro ou árbitros. Diante desse conflito de interesses de natureza disponível será feita por um
árbitro.
A arbitragem se restringe a direitos patrimoniais disponíveis, decidindo as próprias
partes a tarefa de retirar do judiciário e submete a um árbitro a decisão do fato em apreço.
O compromisso arbitral não se confunde com cláusula compromissória. A cláusula é
prevista em contrato para que a arbitragem seja solucionada. No compromisso arbitral ocorre
após o surgimento do conflito, situação em que as partes acordam em submeter o litígio ao
árbitro.
O compromisso é bilateral, oneroso, consensual e comutativo.
16.2.1. ESPÉCIES
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Aurélio Bouret
Vale ressaltar que essa questão da nulidade poderá ser apreciada pelo Poder Judiciário
em momento posterior. Isso porque, para fazer cumprir a sentença arbitral, o credor terá que
ajuizar uma execução judicial. Nesse momento, o devedor poderá se defender por meio de
embargos à execução alegando a nulidade da cláusula arbitral e, consequentemente, da
sentença arbitral.
Excepcionalmente, é possível que o Poder Judiciário, nos casos em que prima facie é
identificado um compromisso arbitral "patológico", isto é, claramente ilegal, declare a nulidade
dessa cláusula, independentemente do estado em que se encontre o procedimento arbitral.
Outro julgado importante do STJ foi o de que a franquia, ainda que não seja contrato de
consumo, é um contrato de adesão. Segundo o art. 4º, § 2º da Lei nº 9.307/96, nos contratos
de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente:
• tomar a iniciativa de instituir a arbitragem; ou
• concordar, expressamente, com a sua instituição, por escrito, em documento anexo
ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula.
Todos os contratos de adesão, mesmo aqueles que não consubstanciam relações de
consumo, como os contratos de franquia, devem observar o disposto no art. 4º, § 2º da Lei nº
9.307/96. Assim, é possível a instituição de cláusula compromissória em contrato de franquia,
desde que observados os requisitos do art. 4º, § 2º da Lei nº 9.307/96.
QUESTÕES
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d) somente são devidos os valores do período de aquisição abaixo dos mínimos previstos
no contrato, mas não os posteriores ao distrato verbal.
e) nenhum valor é devido, tendo em vista que incidiu a supressio em razão da concordância
tácita do posto em fornecer combustível em valores abaixo dos contratualmente
previstos, bem como ocorreu um distrato verbal válido.
2- (FCC – Juiz Substituto – AL/2019) Renato emprestou seu automóvel a Paulo. Quinze dias
depois, ainda na posse do veículo, Paulo o comprou de Renato, que realizou a venda
sem revelar que o automóvel possuía grave defeito mecânico, vício oculto que só foi
constatado por Paulo na própria data da alienação. Nesse caso, de acordo com o Código
Civil, Paulo tem direito de obter a redibição do contrato de compra e venda, que se
sujeita a prazo
a) prescricional, de trinta dias, contado da data em que recebeu o automóvel.
b) prescricional, de quinze dias, contado da data da alienação.
c) decadencial, de trinta dias, contado da data em que recebeu o automóvel.
d) decadencial, de quinze dias, contado da data da alienação.
e) decadencial, de noventa dias, contado da data em que recebeu o automóvel.
3- (FCC – Defensor Público – MA/2018) O vício redibitório e o erro substancial
a) geram a nulidade do negócio jurídico e, consequentemente, impõem a declaração de
nulidade e a indenização pelos danos causados.
b) constituem espécies de vício da vontade, uma vez que o negócio não teria sido realizado
se não se verificasse o vício ou erro.
c) são distintos uma vez que no primeiro o vício oculto pertence ao objeto adquirido, ao
passo que no segundo, o vício é da manifestação da vontade.
d) dizem respeito somente ao âmbito da eficácia do negócio jurídico e apresentam como
consequência o abatimento do valor pago.
e) constituem vício do objeto do negócio jurídico contraído, pois o objeto adquirido possui
algum vício que torna a coisa inútil para o fim a que se destina.
4- (VUNESP – Juiz Substituto – MT/2018) João e José são irmãos. José, em razão de um
acidente, necessitou de cuidados e de acompanhamento constante. João deixa seu
emprego, onde tinha uma remuneração de R$ 1.000,00 (mil reais) mensais, para se
dedicar totalmente aos cuidados de seu irmão José. Após dois anos, José se recuperou
e doou para João um apartamento de sua propriedade, avaliado em R$ 800.000,00
(oitocentos mil reais), como forma de retribuir a dedicação do irmão. Constou
expressamente da doação que ela se destinava a compensar João pelos serviços
prestados, equivalentes aos valores salariais que deixou de receber, por ter abandonado
o seu emprego para cuidar do doador. Após o recebimento da doação, João perdeu o
apartamento em razão de uma ação reivindicatória ajuizada por terceiro. É correto
afirmar que João
a) tem direito a ser indenizado pela evicção até o limite do valor dos serviços prestados.
b) não tem direito a ser indenizado pela evicção por ter recebido o bem por doação, tendo
em vista a inexistência do direito à evicção em negócios jurídicos gratuitos.
c) somente terá direito à indenização se provar que José sabia que iria perder a
propriedade.
d) poderá pleitear de José a indenização pela totalidade do valor do bem em até 180 dias.
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Aurélio Bouret
e) poderá pleitear de José a indenização pela totalidade do valor do bem em até um ano.
5- (CONSULPLAN – Juiz de Direito Substituto – MG/2018) Quanto aos contratos, segundo
o Código Civil, analise as afirmativas a seguir.
I. A parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir
exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos.
II. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este
o não executar, exceto se o terceiro for o cônjuge do promitente, dependendo da sua
anuência o ato a ser praticado, e desde que, pelo regime do casamento, a indenização, de
algum modo, venha a recair sobre os seus bens. III. É anulável a venda de ascendente a
descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante, independente do
regime de bens, expressamente houverem consentido. IV. O vendedor pode executar a
cláusula de reserva de domínio em razão do não pagamento integral do valor devido,
independente de constituir o comprador em mora pelo protesto do título ou interpelação
judicial.
Estão corretas as afirmativas
a) I, II, III e IV.
b) I e II, apenas.
c) III e IV, apenas.
d) I, II e III, apenas.
6- (CESPE – Juiz Substituto – CE/2018) Contrato de prestações certas e determinadas no
qual as partes possam antever as vantagens e os encargos, que geralmente se equivalem
porque não envolvem maiores riscos aos pactuantes, é classificado como
a) benéfico.
b) aleatório.
c) bilateral imperfeito.
d) derivado.
e) comutativo.
7- (VUNESP – Juiz de Direito Substituto – RS/2018) Sobre os vícios redibitórios, assinale a
alternativa correta.
a) O adquirente que já estava na posse do bem decai do direito de obter a redibição ou
abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for
imóvel.
b) No caso de bens móveis, quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais
tarde, se ele aparecer em até 180 dias, terá o comprador mais 30 dias para requerer a
redibição ou abatimento no preço.
c) Somente existe o direito de obter a redibição se a coisa foi adquirida em razão de
contrato comutativo, não se aplicando aos casos em que a aquisição decorreu de
doação, mesmo onerosa.
d) O prazo para postular a redibição ou abatimento no preço, quando o vício, por sua
natureza, só puder ser conhecido mais tarde, somente começa a correr a partir do
aparecimento do vício, o que pode ocorrer a qualquer tempo.
e) No caso de bens imóveis, quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais
tarde, o prazo é de um ano para que o vício apareça, tendo o comprador, a partir disso,
mais 180 dias para postular a redibição ou abatimento no preço.
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b) a natureza dos contratos é irrelevante, bem como a vantagem a uma das partes,
bastando a onerosidade excessiva à parte prejudicada e os acontecimentos
extraordinários e imprevisíveis.
c) os contratos devem ser bilaterais e as prestações sucessivas, bastando a onerosidade
excessiva a uma das partes, sem se cogitar de vantagem à outra parte mas exigindo-se
a imprevisibilidade dos acontecimentos.
d) na atual sistemática civil, basta a onerosidade excessiva, não se cogitando seja de
vantagem à outra parte, seja da imprevisibilidade dos eventos.
e) os contratos devem ser de execução continuada ou diferida; e à onerosidade excessiva
a uma das partes deve corresponder a extrema vantagem à outra, em virtude de
acontecimentos extraordinários e imprevisíveis.
11- (CESPE – Defensor Público – AL/2017) Jonatas adquiriu de Carlos, mediante contrato de
compra e venda, um veículo usado de alto valor, cujos acessórios eram de valor
insignificante. Seis meses após a aquisição do bem, Jonatas perdeu a propriedade do
veículo em virtude de sentença judicial transitada em julgado, em processo movido por
José contra Carlos. No que se refere a essa situação hipotética, assinale a opção correta.
a) A perda da propriedade somente dos acessórios do veículo abre a possibilidade de
Jonatas optar pela rescisão do contrato entabulado com Carlos.
b) Jonatas poderá demandar Carlos pela perda do veículo, requerer a restituição do valor
pago pelo bem e dos honorários do seu advogado, ainda que fique comprovado que,
desde a assinatura do contrato, ele sabia que o veículo era objeto de disputa judicial.
c) Carlos deverá responder, em favor de Jonatas, pela perda da propriedade do veículo, já
que essa responsabilidade somente não subsistiria se Jonatas tivesse adquirido o veículo
em hasta pública.
d) Jonatas, sem conhecer o risco da perda, terá o direito de receber o valor que pagou pelo
veículo, ainda que haja cláusula expressa no contrato que exclua qualquer
responsabilização pela perda.
e) Caso um meliante desconhecido pratique furto das quatro rodas do veículo no dia
anterior à entrega do carro a José, Jonatas não terá o direito de receber o valor integral
que pagou pelo carro.
12- (CESPE – Defensor Público – AC/2017) Em uma relação de consumo, foi estabelecido
que o pagamento deveria ser realizado de determinada maneira. No entanto, após certo
tempo, o pagamento passou a ser feito, reiteradamente, de outro modo, sem que o
credor se opusesse à mudança. Nessa situação, considerando-se a boa-fé objetiva, para
o credor ocorreu o que se denomina
a) venire contra factum proprium.
b) tu quoque.
c) surrectio.
d) supressio.
e) exceptio doli.
13- (CESPE – Defensor Público – AC/2017) Entre outros aspectos, é motivo capaz de ensejar
revisão ou rescisão contratual, com base na teoria da imprevisão,
a) o dolo do contratante que obtém vantagem excessivamente onerosa.
b) a onerosidade do contrato de natureza continuada ou diferida.
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a) Quem negocia com outrem para conclusão de um contrato deve proceder segundo as
regras da boa-fé, sob pena de responder apenas pelos danos que dolosamente causar à
outra parte.
b) A boa-fé a ser observada na responsabilidade pré-contratual é a objetiva, haja vista que
esta diz respeito ao dever de conduta que as partes possuem, podendo a empresa
desistente arcar com a reparação dos danos, se comprovados, sem qualquer obrigação
de contratar.
c) É assegurado o direito à contratação, em razão da boa-fé objetiva, e deverá a empresa
que pretendia desistir arcar com os danos comprovados, mas em razão da contratação,
estes poderão ser mitigados, principalmente quanto aos lucros cessantes.
d) Em razão de conveniência e oportunidade, podem as contratantes desistir do negócio,
por qualquer razão, considerando o princípio da liberdade contratual, o qual assegura
às partes a desistência, motivo pelo qual não há que se falar em indenização.
e) Não existe no direito brasileiro uma cláusula geral que discipline a responsabilidade pré-
contratual, de modo que não há que se falar em quebra de expectativa, vigorando o
princípio da livre contratação.
18- (FAURGS – Juiz de Direito Substituto – RS/2016) Sobre os efeitos da boa-fé objetiva, é
INCORRETO afirmar que
a) servem de limite ao exercício de direitos subjetivos.
b) resultam na proibição do comportamento contraditório.
c) qualificam a posse, protegendo o possuidor em relação aos frutos já percebidos.
d) servem como critério para interpretação dos negócios jurídicos.
e) reforçam o dever de informar das partes na relação obrigacional.
19- (FAURGS – Juiz de Direito Substituto – RS/2016) Sobre a extinção do contrato, assinale
a alternativa correta.
a) Implica, necessariamente, o fim de todos os efeitos decorrentes da relação obrigacional.
b) Será eficaz a partir da sentença que a declara, quando decorra do exercício do direito
de resolução por onerosidade excessiva, por meio da ação respectiva.
c) Pode ser impedida pela oposição de exceção de contrato não cumprido, que é meio de
autodefesa do devedor.
d) Será eficaz, em qualquer caso, a partir da notificação do outro contratante, quando
decorrente de denúncia unilateral.
e) Poderá decorrer do implemento de condição resolutiva, desde que esta não seja
impossível, caso em que deverá ser reconhecida a invalidade do negócio jurídico.
20- (VUNESP – Juiz Substituto – RJ/2016) Assinale a alternativa correta sobre o direito
contratual e os princípios que regem a matéria.
a) Em contrato que versa sobre coisa futura, é nula a disposição contratual pela qual o
alienante terá direito à integralidade do preço mesmo que o objeto da alienação venha
a existir em quantidade inferior à esperada.
b) É vedada na legislação brasileira a estipulação de cláusula limitativa do dever de
indenizar, por violação ao princípio da reparação integral.
c) A prolongada omissão de um dos contratantes em exigir da parte contrária o
cumprimento de determinada cláusula contratual, que não vinha sendo cumprida ou
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GABARITO
1. E
2. D
3. C
4. A
5. B
6. E
7. B
8. D
9. B
10. E
11. D
12. D
13. B
14. B
15. D
16. A
17. B
18. C
19. C
20. C
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1. INTRODUÇÃO
O Direito das Coisas, como já se pode antever, é o ramo do Direito Civil que regula as
relações jurídicas estabelecidas entre pessoas e coisas, determinadas ou determináveis.
Coisa é tudo aquilo que não é pessoa, física ou jurídica, nem entes despersonalizados
(condomínio edilício, espólio, massa falida). Contudo, coisa precisa ser considerado um bem
material. Toda coisa é bem, mas nem todo bem é coisa. Honra, liberdade, vida são bens, mas
não são coisas.
Assim, haverá uma relação material exercida pelo sujeito ativo em face da coisa. Esse
sujeito ativo poderá ser pessoa física, jurídica ou mesmo entes despersonalizados, como massa
falida e condomínio edilício.
No direito das coisas, o sujeito passivo é indeterminado, podendo ser determinável, e
sua eficácia se dá em face de toda a coletividade, podendo ser operada erga omnes, se atendidos
os requisitos legais para cada categoria de direito.
Contudo, Direito das Coisas não é sinônimo de Direitos Reais. O primeiro é mais
abrangente.
O Direito das Coisas é o Livro III do Código Civil, como dito, sendo mais abrangente, por
envolver também a posse. Assim, posse não é Direito Real, tanto que, no CC, não está no mesmo
Título dos Direitos Reais, no Livro III. A posse é uma relação fática de sujeição entre o possuidor
e a coisa móvel ou imóvel. Sendo assim, posse não é propriamente um direito real, mas sim um
fato que gera outros direitos.
Em relação aos Direitos Reais, há duas teorias que justificam a sua natureza:
• teoria personalista: o Direito Real é uma relação jurídica estabelecida entre
pessoas, mas intermediada por coisas, ainda que as pessoas sejam indeterminadas.
Essa teoria nega a realidade metodológica dos direitos reais ou das coisas;
• teoria realista: é também conhecida como teoria clássica. Nela, os Direitos Reais
constituem um poder imediato que a pessoa exerce sobre a coisa, e com eficácia
erga omnes. Para esta teoria, o Direito Real é imediato da pessoa sobre a coisa. Esta
é a teoria adotada pelo nosso CC.
Quanto aos Direitos Reais, eles incidem sobre a própria coisa ou sobre coisa alheia
(direito de gozo, de garantia, etc.). O mais amplo de todos os direitos reais é a propriedade,
possibilitando o uso, o gozo (extrair benefícios), reivindicação e disposição (esse último, só a
propriedade tem, pois possibilita alienar, gravar e alterar a substância).Decorrem dos Direitos
Reais as ações reais, as quais, se disseram respeito a imóveis, também têm natureza real
imobiliária.
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Paulo Batista
O rol dos direitos reais está no art. 1225 do CC. Segundo esse dispositivo, são direitos
reais:
• a propriedade;
• a superfície;
• as servidões;
• o usufruto;
• o uso;
• a habitação;
• o direito do promitente comprador do imóvel;
• o penhor;
• a hipoteca;
• a anticrese;
• a concessão de uso especial para fins de moradia;
• a concessão de direito real de uso;
• a laje.
Assim, os direitos reais estão descritos no art. 1.225 do Código Civil. Contudo, leis
extravagantes podem criar novos direitos reais, como ocorreu na Lei nº 11.977/2009, que
dispõe sobre o Programa Minha Casa Minha Vida, criando a legitimação da posse como direito
real (art. 59). Muito embora a doutrina majoritariamente lecione que os direitos reais precisam
estar previstos em lei, o STJ já entendeu que a multipropriedade imobiliária (time-
sharing)possuía natureza jurídica de direito real,embora naquela época não houvesse previsão
em lei. Contudo, posteriormente, a Lei nº 13.465/2017 introduziu esse instituto no Código Civil,
a partir do art. 1.358-B.
Para provas objetivas, deve ser adotada a concepção de taxatividade dos direitos reais,
ou seja, eles só existem se houver lei os prevendo.
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Paulo Batista
gera efeitos e devem ser respeitados por quem não participou da relação jurídica material,
havendo uma mitigação da relatividade dos contratos.
Ainda, não se deve confundir direitos reais com obrigações propter rem. Essas têm
caráter pessoal, mas perseguem a coisa. Ex.: se não foi pago o rateio do condomínio edilício pelo
locador, o locatário deverá pagá-lo. A taxa condominial, apesar de não ser um direito real, é uma
obrigação que persegue a coisa.
O abuso de direito no exercício da propriedade (ato emulativo) também é um conceito
híbrido, pois, quando há abuso no seu exercício, há uma repercussão dos direitos pessoais de
caráter patrimonial, gerando o dever de indenizar.
2. DA POSSE
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Paulo Batista
aquele que começou a se comportar do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem
e à outra pessoa, presume-se detentor, até que prove o contrário.
Exemplo do fâmulo da posse é o caseiro. Outro exemplo é o manobrista, conservando
a posse em nome de outra pessoa. Veja, o manobrista exerce detenção em relação à empresa;
esta é que é a possuidora, em razão de um contrato de depósito do carro no momento da
condução.
Outro exemplo ainda é o caso da ocupação irregular de área pública. O STJ entende que
a ocupação irregular de área pública não induz posse e sim mera detenção, quando houver litígio
entre o particular e o Poder Público. Contudo, mesmo se tratando de terras públicas, o STJ tem
entendido que é possível a discussão da posse,se isso ocorrer entre particulares.
É possível a conversão da detenção em posse, quando há a quebra do vínculo de
subordinação (Enunciado 301 do CJF).
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O art. 1.214do CC diz que o possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela, aos frutos
percebidos.
O parágrafo único do mesmo artigo diz os frutos pendentes ao tempo em que cessar a
boa-fé devem ser restituídos, mas apenas depois de serem deduzidas as despesas da produção
e custeio daquele fruto. Devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação, pois
não deveriam ser percebidos.
Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos logo que são
separados. No entanto, os frutos civis reputam-se percebidos dia por dia (juros).
Lembre-se que os frutos não implicam a mudança de substância da coisa. Já o produto
gera essa alteração.
O art. 1.216 do CC trata do possuidor de má-fé, estabelecendo que ele responde por
todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos frutos que, por culpa sua, deixou de
perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé. O possuidor de má-fé tem direito
às despesas da produção e custeio.
Já o possuidor de boa-fé só responde pelos frutos pendentes, pois aqueles já colhidos e
já percebidos integraram seu patrimônio.
Em relação ao produto, que implica diminuição da substância da coisa, há um dever de
restituição, ainda que o possuidor seja de boa-fé. Isso porque, quando se retira um produto, a
substância da coisa é modificada.
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O possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não
der causa. Veja, trata-se de dispositivo prevendo que o possuidor de boa-fé tem
responsabilidade subjetiva.
Já o art. 1.218 do CC diz que o possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração
da coisa, ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela
na posse do reivindicante. Em outras palavras, a responsabilidade do possuidor de má-fé é
objetiva. Ele só vai se eximir se comprovado que a deterioração da coisa ocorreria de qualquer
modo.
O art. 1.221 do CC prevê uma hipótese de compensação legal, ao dizer que as
benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao ressarcimento, se, ao tempo da
evicção, ainda existirem.
Três são as situações que possibilitam o manejo de ações possessórias (não confundir
com reivindicatórias, que discutem a propriedade):
• Ameaça à posse: promove-se ação de interdito proibitório.
• Turbação da posse: promove-se ação de manutenção de posse.
• Esbulho da posse: promove-se ação de reintegração de posse.
Assim, segundo o art. 1.210 do CC, o possuidor tem direito a ser mantido na posse no
caso de turbação, de ser restituído na posse no caso de esbulho e de ser segurado na posse no
caso de uma violência iminente. O possuidor esbulhado ainda pode utilizar do desforço
imediato (uso moderado da força).
Há no art. 554 do NCPC a consagração total do princípio da fungibilidade das ações
possessórias. Segundo este dispositivo, a propositura de uma ação possessória, no lugar de
outra, não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente
àquela cujos pressupostos estejam provados.
Se a ofensa à posse contar com menos de 1 ano e 1 dia, caberá uma ação de força nova,
cabendo a medida liminar para tutela imediata da posse.
Por outro lado, se houver uma ameaça, turbação ou esbulho com mais de 1 ano e 1 dia,
haverá uma ação de força velha, observando-se o procedimento comum.
Há precedente do STJ entendendo que particulares podem ajuizar ação possessória
para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo).
Ex: determinada empresa construiu uma indústria e invadiu a via de acesso (rua) que liga a
avenida a uma comunidade de moradores locais. Os moradores têm legitimidade para ajuizar
ação de reintegração de posse contra a empresa, alegando que a rua que está sendo invadida.
Atente-se que o ordenamento jurídico não permite a proteção possessória em caso de
particular que ocupe bens públicos dominicais, sendo esta situação caracterizada como mera
detenção. No entanto, como dito acima, é possível que particulares exerçam proteção
possessória para garantir seu direito de utilizar bens de uso comum do povo, como é o caso,
por exemplo, da tutela possessória para assegurar o direito de uso de uma via pública.
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Paulo Batista
O parágrafo único diz que pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária
e adequada para:
• evitar nova turbação ou esbulho;
• cumprir-se a tutela provisória ou final.
O que este dispositivo autoriza é que, além de condenação em perdas e danos e
indenização dos frutos, é possível fixar multa inibitória para que o réu não pratique nova ofensa
à posse.
Lembre-se que a ação possessória tem caráter dúplice, sendo possível que o réu, na
contestação, alegue que ele é o ofendido, devendo ele ser indenizado pelo autor. Trata-se do
pedido contraposto, espécie de pleito comum à ação dúplice (art. 556 do CPC). Assim, o réu
não precisa apresentar reconvenção, salvo se se tratar de pedido totalmente distinto do caráter
dúplice, o que será submetido ao crivo judicial.
Já o art. 557 do CPC afirma que, na pendência de ação possessória,é vedado, tanto ao
autor, quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a ação de
reconhecimento de domínio for deduzida em face de terceira pessoa.
O parágrafo único do mesmo artigo prevê que não obsta à manutenção ou à
reintegração de posse a alegação de propriedade, ou de outro direito real sobre a coisa.
Se o réu provar que o autor provisoriamente mantido ou reintegrado na posse carece
de idoneidade financeira para, caso perca, responder por perdas e danos, o juiz fixará o prazo
de 5 dias para que seja depositada caução, podendo ser real ou fidejussória. Essa caução pode
ser dispensada quando se está lidando com partes economicamente hipossuficientes, havendo
uma interpretação voltada para a função social e dignidade da pessoa humana.
Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a
expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração da posse. Caso não esteja
devidamente instruída, determinará que o autor justifique previamente o alegado, antes da
expedição do mandado de manutenção ou reintegração da posse, citando-se o réu para
comparecer à audiência que for designada.
Contra pessoas jurídicas de direito público não será deferida a manutenção ou a
reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais.
Há um regramento todo especial para litígios coletivos no novo CPC. Segundo o art. 565,
no litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação do imóvel tiver
ocorrido há mais de 1 ano e 1 dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida
liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 dias. Vale lembrar que,
na mediação, o mediador não propõe a solução às partes, mas a fomenta para que as partes
cheguem até ela.
Passado 1 ano e 1 dia, em regra, a lei não permite a liminar, pois a ação voltaria para o
procedimento comum. Todavia, o próprio NCPC traz uma exceção, por conta da necessidade de
audiência de mediação no prazo de 30 dias.
No caso de litígio coletivo pela posse de imóvel, caso tenha sido concedida a liminar, e
se essa não for executada no prazo de 1 ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz
designar audiência de mediação. Por seu caráter coletivo, o Ministério Público será intimado
para comparecer à audiência, assim como a Defensoria Pública, sempre que houver parte
beneficiária de gratuidade da justiça. O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando
sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional.
Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado
ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio poderão ser intimados
para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência
de possibilidade de solução para o conflito possessório. Aplica-se o disposto neste artigo ao
litígio sobre propriedade de imóvel.
Segundo o art. 1.211 do CC, quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-
se-á provisoriamente aquele que estiver na posse da coisa, se não for manifesto o vício. Esse
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dispositivo trata do chamado possuidor aparente. É uma das várias aplicações de um princípio
jurídico geral: o Princípio da Aparência.
O possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização, contra o terceiro que
recebeu a coisa esbulhada tendo ciência do vício que a contaminava, ou seja, o terceiro de má-
fé.
O art. 1.204 do CC afirma que a posse é adquirida desde o momento em que se torna
possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade. Vê-
se que a posse direta deve ser exteriorizada, um poder fático sobre a coisa que possa ser
constatado por terceiros (não pode ser clandestina).
A posse se transmite aos herdeiros ou legatários com os mesmos caracteres. O
sucessor universal continua de direito a posse do seu antecessor. Já ao sucessor singular é
facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais.
Sucessor universal é o caso de herança legítima. Sucessor singular é o caso de legado.
A posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a das coisas móveis que nele
estiverem, de forma que, havendo a transmissão da posse do imóvel, haverá também
transmissão da posse dos bens móveis que guarnecem o bem imóvel. Há aplicação do princípio
da gravitação jurídica.
Já a posse será perdida quando ela cessa, embora contra a vontade do possuidor. Será
considerada cessada a posse quando o possuidor perder o poder fático sobre o bem.
Só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo
notícia dele, abstém-se de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente
repelido.
2.9. COMPOSSE
Composse é posse conjunta. Uma situação na qual duas ou mais pessoas exercerão
poderes possessórios sobre a mesma coisa.
Se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela
atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros compossuidores.
É possível ação possessória do compossuidor contra o outro compossuidor.
A composse pode ser classificada em:
• Composse pro indiviso (indivisível): há compossuidores, com fração ideal das
posses, mas não se consegue determinar, no plano fático, qual é a parte de cada
um. Ex.: dois irmãos com a posse de uma fazenda, que plantam soja conjuntamente.
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• Composse pro diviso (divisível): cada compossuidor sabe qual é a sua parte, pois é
determinável no plano fático e real. Ex.: os dois irmãos têm um terreno, mas há uma
cerca dividindo metade do local.
3. PROPRIEDADE
3.1. CONCEITO
O §1º do art. 1.228 do CC afirma que o direito de propriedade deve ser exercido em
consonância com as suas finalidades econômicas e sociais, de modo que sejam preservados,
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Segundo o §4º do art. 1.228 do CC, o proprietário também pode ser privado da coisa se
o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de
5 anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou
separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico
relevante.
Essa é a denominada desapropriação judicial privada por posse-trabalho.
Assim, esse dispositivo diz que o proprietário poderá perder a área:
• se se tratar de uma área extensa;
• se várias pessoas estiverem morando lá;
• se essas pessoas estão de boa-fé e lá estão há mais de 5 anos ininterruptamente;
• se elas estão exercendo trabalho e moradia naquela área;
• se elas realizaram serviços e obras considerados relevantes pelo juiz, como de
interesse social e econômico.
Nesse caso, o juiz irá fixar uma justa indenização ao proprietário, pagando-se o preço
a ele, situação na qual a sentença poderá ser registrada no Registro de Imóveis,em nome
daqueles que se encontram na área.
Atente-se que isto não se trata de usucapião, que é forma originária de aquisição da
propriedade e sem pagamento de indenização. Neste caso da desapropriação judicial privada
por posse-trabalho, há esse pagamento, sendo então uma forma de desapropriação.
Há quatro diferenças básicas entre a desapropriação judicial privada por posse-trabalho
e a usucapião coletiva do Estatuto da Cidade:
• Na usucapião coletiva urbana, os ocupantes devem ser de baixa renda. Na
desapropriação judicial privada por posse-trabalho não há essa exigência.
• Na usucapião coletiva urbana, a área deve ter no mínimo 250m², enquanto na
desapropriação judicial privada por posse-trabalho se exige apenas uma extensa
área.
• A usucapião coletiva só se aplica a imóveis urbanos, enquanto a desapropriação
judicial privada por posse-trabalho pode ter por objeto imóveis urbanos ou rurais.
• Na usucapião coletiva urbana, não há indenização, enquanto na desapropriação
judicial privada por posse-trabalho há justa indenização.
Esse instituto representa a efetivação da função social da propriedade, pois a posse que
está sendo exercida sobre a área, somada ao desempenho da atividade positiva sobre o imóvel,
faz com que nasça o direito à propriedade, desde que paga uma justa indenização.
A boa-fé em matéria de posse, como acima afirmado, é subjetiva, estando relacionada
à conduta dos envolvidos.
A desapropriação judicial privada por posse-trabalho pode ser alegada, inclusive, como
matéria de defesa, bem como por ação autônoma.
A propriedade resolúvel é aquela que pode ser extinta pelo advento de uma condição
ou de um termo, ou mesmo por uma causa superveniente, que venha a desconstituir a relação
jurídica. Exemplo disso é a chamada compra e venda com cláusula de retrovenda, quando,
durante o período de até 3 anos (prazo decadencial), a propriedade do comprador é resolúvel,
podendo ser extinta se implementada uma condição ou termo.
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O Brasil adotou o sistema de aquisição de direitos reais, como regra, com a sua
inscrição junto à matrícula do imóvel no Cartório de Registro Imobiliário. Assim, o estudo dos
direitos reais imobiliários precisa ser feito com o devido exame dos Registros Públicos, tendo
em vista essa natureza constitutiva de direitos.
São formas de aquisição:
• Aquisição originária: independe que qualquer relação antecedente entre alienante
e adquirente, pois não existe propriamente uma transmissão de propriedade.
Ocorre, por exemplo, na acessão, na usucapião e na desapropriação. Acessões são
consideradas as ilhas, aluvião, avulsão, álveo abandonado, plantações, construções.
• Aquisição derivada: existe a transferência de propriedade, numa relação
antecedente entre alienante e adquirente, como a compra e venda, doação,
sucessão hereditária (saisine) etc.
O que há aqui é uma propriedade que inicia do zero, sem que haja transferência de
direitos e obrigações, ou mesmo vícios anteriores, como regra geral.
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abandono voluntário da posse do imóvel, somada à ausência da tutela da família. Não importa
a culpa do fim do casamento ou da união estável.
O imóvel tem que estar em condomínio comum (civil) com o cônjuge ou companheiro,
mas não precisa ser na fração de 50% para cada um. O cônjuge abandonado vai requerer a
usucapião da fração ideal daquele que abandou o bem.
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O art. 2.029 do CC diz que, até dois 2 após a entrada em vigor do Novo Código Civil, os
prazos estabelecidos no parágrafo único do art. 1.238 e no parágrafo único do art. 1.242, que
tratam da usucapião ordinária e extraordinária, serão acrescidos de 2 anos, qualquer que seja
o tempo transcorrido na vigência do antigo CC de 1916.
É uma regra de transição, apenas para as mencionadas espécies de usucapião.
Para os demais casos, valerá a regra do art. 2.028, o qual estabelece que serão os da lei
anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já
houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.
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3.7.1.1. OCUPAÇÃO
O art. 1.263 diz que aquele que se assenhorear de coisa sem dono desde logo lhe adquire
a propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei.
A ocupação é uma forma de aquisição originária da propriedade (res nullius – coisa de
ninguém).
Pode ser objeto de ocupação inclusive a coisa abandonada por outrem (res derelicta).
O art. 1.264, em sua primeira parte, conceitua o tesouro como sendo o depósito antigo
de coisas preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória.
Três são as regras que merecem destaque:
• o tesouro será dividido por igual entre o proprietário do prédio e o que achar o
tesouro casualmente, desde que tenha agido de boa-fé;
• o tesouro pertencerá por inteiro ao proprietário do prédio, se for achado por ele,
ou em pesquisa que o proprietário ordenou, ou se quem encontrou o tesouro foi
terceiro não autorizado (agiu de má-fé);
• sendo o tesouro encontrado em terreno aforado, o tesouro será dividido por igual
entre o descobridor e o enfiteuta, ou será deste por inteiro quando ele mesmo
seja o descobridor.
3.7.1.3. DESCOBERTA
Quem quer que ache coisa alheia perdida deve restituí-la ao dono ou legítimo possuidor.
Assim, a coisa perdida não é coisa sem dono.
Se o descobridor da coisa não conhecer o dono, deverá tomar todas as medidas
necessárias para encontrá-lo. Caso não o encontre, deverá entregar à autoridade competente.
A autoridade competente dará conhecimento da descoberta através da imprensa e
outros meios de informação, somente expedindo editais se o seu valor os comportar.
Após 60 dias da divulgação, caso o dono não se apresente, a coisa será vendida em hasta
pública, deduzidas as despesas, a recompensa do descobridor (que não pode ser inferior a 5%)
e o restante pertencerá ao município. Se o valor da coisa for diminuto, o município poderá
abandonar em favor de quem a achou. A recompensa é denominada achádego.
O art. 1.235 diz que o descobridor responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou
possuidor legítimo, quando tiver procedido com dolo. Não responderá por prejuízos que tenha
causado com culpa.
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• usucapião extraordinária.
Quem possui a coisa móvel como sua, de forma contínua e pacífica, durante 3 anos,
desde que tenha justo título e boa-fé, vai adquirir a propriedade.
Neste caso, se a posse da coisa se prolongar por 5 anos, haverá usucapião, sendo
dispensável a boa-fé e o justo título.
3.7.3. ESPECIFICAÇÃO
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3.7.5. TRADIÇÃO
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4. DIREITO DE VIZINHANÇA
4.1. CONCEITO
O direito de vizinhança são limitações impostas aos titulares de direitos reais, para que
exista uma boa convivência social. É um conjunto de normas de convivência entre titulares de
direitos ou possuidores que estejam fisicamente próximos uns aos outros.
As normas relativas aos direitos de vizinhança são claras limitações ao exercício da
propriedade, existindo pelo simples fato de uma propriedade ser vizinha de outra. Essas
obrigações estão vinculadas à coisa, perseguindo-a, ou seja, são obrigações propter rem
(ambulatoriais).
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A árvore limítrofe é aquela cujo tronco esteja na linha divisória, caso em que será
presumida, de forma relativa,que ela pertence em comum aos donos dos prédios confinantes.
Há uma presunção de condomínio.
As raízes e os ramos de árvore que ultrapassarem a estrema do prédio poderão ser
cortados (raiz ou galhos), até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido
(Art. 1.283 do CC). O direito de fazer a poda não pode comprometer a vida da árvore, já que a
propriedade também deve observar a sua função socioambiental.
Os frutos caídos da árvore do terreno vizinho pertencem ao dono do solo onde caíram,
se este for de propriedade particular.
O dono do prédio que não tiver acesso à via pública, nascente ou a porte, poderá,
mediante pagamento de indenização, constranger o vizinho para que ele dê acesso à passagem.
Tal acesso à via pública pelo imóvel encravado, mediante passagem forçada, se for feito
amigavelmente, será judicialmente fixado.
O imóvel que não tem acesso é o imóvel encravado.
Será constrangido o vizinho que tenha o imóvel que mais natural e facilmente se preste
a esta passagem, conforme o §1º do art. 1.285 do CC.
Se ocorrer a alienação parcial do imóvel serviente, ou seja, uma delas também perde
acesso à via pública e à nascente, o proprietário da outra parte também deverá tolerar essa
passagem. O acesso à via é a única forma de o imóvel efetivamente cumprir sua função social.
Não se deve confundir passagem forçada com servidão, em especial com a chamada
servidão de passagem.
• Passagem forçada: é um instituto de direito de vizinhança, sendo obrigatória. Aqui
há o pagamento de uma indenização, já que se está constrangendo o imóvel vizinho.
• Servidão de passagem: é um direito real de gozo, de fruição, não sendo, em regra,
obrigatória, ressalvadas algumas exceções, como as servidões administrativas.
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4.5. ÁGUAS
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É o direito que o proprietário tem de cercar, murar, valar ou tapar, de qualquer modo,o
seu prédio urbano ou rural.
A norma consagra o direito de constranger o confinante a proceder com ele a
demarcação entre os dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos
ou arruinados, repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as despesas para essa
tapagem.
Cria-se, assim, um condomínio necessário, entre os proprietários confinantes,
relativamente ao muro que deverão construir. Ou seja, os intervalos, muros, cercas e os
tapumes divisórios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas,
presumem-se, até prova em contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo
estes obrigados, de conformidade com os costumes da localidade, a concorrer, em partes
iguais, para as despesas de sua construção e conservação.
Atente-se que as sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco
divisório, só podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum acordo entre proprietários.
É possível a construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de
pequeno porte, ou para outro fim. Nesse caso, a construção pode ser exigida de quem
provocou a necessidade, pelo proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas.
Por fim, sendo confusos os limites entre as propriedades, se não houver outro meio,
serão determinadas conforme a posse justa. Não se achando posse justa provada, o terreno
contestado dividir-se-á por partes iguais, ou, não sendo possível a divisão cômoda, adjudicar-
se-á a um deles, mediante indenização ao outro.
O art. 1.299 do CC diz que o proprietário pode levantar em seu terreno as construções
que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos. São várias as
limitações que podem incidir sobre imóveis, muitas delas previstas em leis municipais, como
planos diretores, e outras no próprio registro de loteamentos e condomínios edilícios.
O proprietário construirá de forma a não permitir que o prédio despeje águas,
diretamente, sobre o prédio vizinho, pois, do contrário, haveria o uso abusivo da propriedade.
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O que ganha relevância é o direito de privacidade entre os vizinhos. Por isso, é proibido
abrir janelas, fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de 1.5 m do terreno vizinho.Na zona
rural, não será permitido levantar edificações a menos de 3 metros do terreno vizinho.
Desrespeitando essas regras, o proprietário prejudicado poderá propor ação
demolitória, sem prejuízo de reparação civil.
Em relação aos imóveis urbanos, as janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória,
bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de 0.75 centímetros.
Existe uma distinção quanto às aberturas de luz ou aberturas de ventilação.
As vedações de construção de 1.5 m, 3 m ou 0.75 cm não se aplicam quando as aberturas
não sejam maiores do que 0.10 cm de largura, 0.20 cm de cumprimento e estejam construídas
a mais de 2 metros de altura de cada piso.
Nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a alinhamento, o dono
de um terreno pode nele edificar, madeirando na parede divisória do prédio contíguo, se ela
suportar a nova construção.Nesse caso, o proprietário terá de embolsar ao vizinho metade do
valor da parede e do chão correspondentes explorados. Há o direto de travejamento ou direito
de madeiramento, que é o direito de colocar uma madeira ou viga no prédio vizinho para utilizar
da melhor forma possível o prédio.
O direito de travejamento ou madeiramento está previsto também no art. 1.305 do CC,
que estabelece que o confinante que primeiro construir o muro pode assentar a parede
divisória, até meia espessura no terreno contíguo, sem perder por isso o direito a haver meio
valor dela se o vizinho a travejar, caso em que o primeiro fixará a largura e a profundidade do
alicerce.
Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos, e não houver capacidade para ser
travejada pelo outro, não poderá o outro fazer um alicerce ao pé dessa parede sem prestar
caução, pelo risco a que expõe a construção anterior.
O condômino da parede-meia pode utilizá-la até ao meio da espessura, desde que não
ponha em risco a segurança ou a separação dos dois prédios, e avisando previamente o outro
condômino das obras que ali tenciona fazer.
O art. 1.307 do CC introduz o direito de alteamento, que serve para deixar o muro mais
alto, tendo o direito de aumentá-lo. Neste caso, o código estabelece que qualquer dos
confinantes pode altear a parede divisória, se necessário reconstruindo-a, para suportar o
alteamento, caso em que o dono da obra arcará com todas as despesas, inclusive de
conservação, ou com metade, se o vizinho adquirir meação também na parte aumentada.
Não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos ou quaisquer aparelhos
ou depósitos suscetíveis de produzir infiltrações ou interferências prejudiciais ao vizinho.
Não é permitido fazer escavações ou quaisquer obras que tirem ao poço ou à nascente
de outrem a água indispensável às suas necessidades normais.
O CC veda a realização de obras ou de serviços que sejam suscetíveis de provocar
desmoronamento ou deslocamento de terra, ou que comprometa a segurança do prédio
vizinho. Só poderá ser realizada esse tipo de obra após forem efetivadas obras acautelatórias
(art. 1.311 do CC). O proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos
que sofrer, ainda que tenham sido realizadas as obras acautelatórias.
O art. 1.313 do CC reconhece que o proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a
tolerar que o vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, em algumas hipóteses, tais como:
• Quando dele temporariamente usar, quando for indispensável à reparação,
construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;
• Quando for necessário se apoderar de coisas suas, inclusive animais que aí se
encontrem casualmente.
Estas regras se aplicam aos casos de limpeza ou reparação de esgotos, goteiras,
aparelhos higiênicos, poços e nascentes e ao aparo de cerca viva.
Na hipótese de o vizinho se apoderar de coisas suas, uma vez entregues, poderá ser
impedida a entrada do vizinho no imóvel.
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5. DO CONDOMÍNIO
5.1. CONCEITO
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A todo tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa comum, respondendo
o quinhão de cada um pela sua parte nas despesas da divisão. Veja-se que o CC estimula a
divisão do condomínio civil (não do edilício!), por já ser comum a tradição de que tal instituto é
a causa de inúmeras disputas entre os coproprietários. Se essa divisão não for amigável, deverá
ser proposta ação de divisão
Sendo o bem indiviso, caberá a alienação judicial da coisa, dividindo-se o valor
correspondente na proporção de cada quinhão.
Os condôminos podem acordar que fique indivisa a coisa comum por prazo não maior
de 5 anos, suscetível de prorrogação.
Atente-se que não poderá exceder de 5 anos a indivisão estabelecida pelo doador ou
pelo testador. Ou seja, não se permite a prorrogação.
Se houver o requerimento de qualquer interessado e se graves razões o aconselharem,
pode o juiz determinar a divisão da coisa comum antes do prazo de indivisão.
Se a coisa for indivisível, e os condôminos não quiserem adjudicá-la a um só dos
condôminos, esta coisa deverá ser vendida. Uma vez vendida, será repartido o apurado,
preferindo-se, na venda, em condições iguais de oferta, o condômino ao estranho, e entre os
condôminos, aquele que tiver na coisa benfeitorias mais valiosas, e, se não houver tais
benfeitorias (mais valiosas), o condômino que tiver o quinhão maior.
Se nenhum dos condôminos tiver benfeitorias na coisa comum e participam todos do
condomínio em partes iguais, realizar-se-á licitação especial.
Antes de adjudicada a coisa àquele que ofereceu maior lanço, a licitação será procedida
entre os condôminos, a fim de que a coisa seja adjudicada a quem afinal oferecer melhor lanço,
preferindo, em condições iguais, o condômino ao estranho.
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vez que a instituição do condomínio ocorre com o seu registro no Cartório de Registro de
Imóveis.
Se houver oferta de unidades autônomas à venda durante das obras (chamados de
“venda de imóveis na planta”), não haverá ainda condomínio edilício, mas sim a chamada
incorporação imobiliária (Lei nº 4.591/1964). Com o fim das obras, concedido o habite-se, o
condomínio pode ser registrado, passando a existir juridicamente. Em resumo, enquanto
houver obras, temos a incorporação imobiliária; após as obras, institui-se o condomínio
edilício. Ambos os procedimentos tramitam no Cartório de Registro de Imóveis, que fará exame
minucioso quanto à saúde financeira do incorporador e o atendimento de todas as regras legais
e administrativas destes institutos.
Segundo o art. 1.331 do CC, no condomínio edilício haverá duas modalidades de áreas:
• Áreas privativas: são unidades autônomas, como apartamentos, salas comerciais,
lotes no condomínio de lotes, etc. Essas partes podem ser alienadas, gravadas
livremente pelo seu proprietário, não havendo direito de preferência dessas áreas
exclusivas dentro do condomínio edilício.
• Áreas comuns: são as partes de propriedade comuns dos condôminos, como vigas,
estrutura do prédio, telhado, rede de distribuição de água, esgoto, quadras de
esportes, áreas de lazer, acesso até a rua, etc. Essas partes não podem ser objeto de
usucapião, ressalvadas, em algumas hipóteses, as vagas de garagem.
A jurisprudência é pacífica no sentido de que não há relação jurídica consumerista entre
condômino e condomínio.
Para a estruturação do condomínio edilício, são essenciais dois atos:
• instituição do condomínio edilício;
• constituição do condomínio edilício.
O art. 1.332 do CC diz que a instituição do condomínio edilício por ato entre vivos ou
testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis.
Da instituição de condomínio devem constar:
• discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva,
estremadas uma das outras e das partes comuns;
• determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno
e partes comuns;
• finalidade para que as unidades se destinam.
Em relação à convenção de condomínio, que constitui o estatuto coletivo que regula
os interesses dos condôminos, ela deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, 2/3 das
frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades,
ou para quantos sobre elas tenham posse ou detenção.
Para ela ser obrigatória perante terceiros (erga omnes) deverá ser registrada no Cartório
de Registro de Imóveis.
A convenção é regida pela força obrigatória da convenção (pacta sunt servanda), mas
esta convenção encontra limitações em preceitos sociais e normas de ordem pública.
A convenção de condomínio deve determinar basicamente o que está previsto no art.
1.334 do CC:
• determinará a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos
condôminos para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;
• determinará sua forma de administração;
• determinará a competência das assembleias, forma de sua convocação e quórum
exigido para as deliberações;
• determinará as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores;
• determinará o regimento interno.
A convenção poderá ser feita por escritura pública ou por instrumento particular.
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O §1º do art. 1.336 do CC diz que o condômino que não pagar o seu rateio ficará sujeito
aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de1% ao mês e multa de até
2% sobre o débito.
Essa norma é de ordem pública.
O §2odiz que 2/3 dos condôminos podem deliberar pela imposição de uma multa, no
montante de até 5 vezes o valor do rateio condominial, para o condômino que tenha realizado
obra que comprometeu a segurança da edificação, que tenha alterado a forma ou a cor da
fachada, tenha dado uma destinação diferente à sua fração ideal, ou, ainda, que tenha utilizado
a sua parte de forma indevida.
Se o condômino não observar os seus deveres, 2/3 dos condôminos poderão impor
multa cujo valor pode chegar a até 5 vezes o valor da cota condominial, além das perdas e danos
que se apurarem.
O condômino, ou possuidor, que não cumprir reiteradamente com os seus deveres
perante o condomínio poderá, por deliberação de 3/4 dos condôminos restantes, ser
constrangido a pagar multa de até ao 5 vezes do valor atribuído à contribuição para as
despesas condominiais, independentemente das perdas e danos que se apurem.
Ainda, o condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial,
gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá
ser constrangido a pagar multa correspondente ao10 vezes do condomínio, até ulterior
deliberação da assembleia.
A jurisprudência diverge, mas há entendimento no sentido de que, a depender da
incompatibilidade, poderia a assembleia deliberar pela expulsão do indivíduo, o que não é
pacífico na doutrina. Sem embargo, toda e qualquer infração, assim como a sua respectiva
punição, devem constar previamente da convenção do condomínio e ser precedida de ampla
defesa e contraditório.
Segundo o STJ, o condômino não pode, sem a anuência de todos os condôminos, alterar
a cor das esquadrias externas de seu apartamento para padrão distinto do empregado no
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restante da fachada do edifício, ainda que a modificação esteja posicionada em recuo, não
acarrete prejuízo direto ao valor dos demais imóveis e não possa ser vista do térreo, mas apenas
de andares correspondentes de prédios vizinhos.
O STJ também já entendeu que, ainda que tenha sido estipulado na convenção original
de condomínio ser irrevogável e irretratável cláusula que prevê a divisão das despesas do
condomínio em partes iguais, admite-se ulterior alteração da forma de rateio, mediante
aprovação de 2/3 dos votos dos condôminos, para que as expensas sejam suportadas na
proporção das frações ideais.
Também decidiu que, em assembleia condominial, o condômino proprietário de
diversas unidades autônomas, ainda que inadimplente em relação a uma ou algumas destas,
terá direito de participação e de voto relativamente às suas unidades que estejam em dia com
as taxas do condomínio.
O condômino que tenha sido demandado pelo condomínio em ação de cobrança deve
participar do rateio das despesas do litígio contra si proposto.
Por fim, o condomínio, em regra, só responde por atos ilícitos praticados por terceiros
em seu interior (furtos, danos, roubos) se houver previsão expressa na convenção autorizando
essa responsabilização.
O art. 1.338 do CC estabelece que, resolvendo o condômino alugar área no abrigo para
veículos, haverá preferência, em condições iguais, de qualquer dos condôminos a estranhos, e
entre todos os possuidores.
O que há aqui é a garantia do direito de preferência entre os condôminos.
É preciso que haja na convenção do condomínio autorização expressa para que a vaga
de garagem possa ser alegada para um terceiro, nos termos do art. 1.331 do CC. Para alienação
da vaga de garagem para um terceiro, é preciso autorização da convenção e inexistência de
contrariedade pela assembleia-geral.
As despesas (rateio) condominiais são obrigações propter rem. Isso quer dizer que o
adquirente responderá pelos débitos de quem alienou a unidade, inclusive com multas e com
juros, conforme o art. 1.345 do CC.
É obrigatório o seguro de toda a edificação contra o risco de incêndio ou destruição,
total ou parcial. Trata-se de uma norma de ordem pública.
5.4.5.1. SÍNDICO
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5.4.5.2. ASSEMBLEIA
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metade das frações ideais.Em 2ª convocação, a assembleia poderá deliberar por maioria dos
presentes, salvo quando exigido quórum especial.
O conselho fiscal pode ser criado ou não. É um órgão consultivo financeiro, composto
por 3 membros, dando parecer às contas do síndico. Os membros serão eleitos pelo prazo não
superior a dois anos.
Tal modalidade de condomínio foi criada pela Lei nº 13.777/2018 e está prevista a partir
do art. 1.358-B do Código Civil. Voltemos a lembrar que a lei pode criar novos direitos reais,
como ocorreu nesse caso.
A multipropriedade é o regime de condomínio em que cada um dos proprietários de um
mesmo imóvel é titular de uma fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo,
com exclusividade, da totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma
alternada. Veja-se, assim, que há um condomínio civil (frações ideias da área) e uma divisão
também de tempo (frações de tempo). É muito comum aos contratos de temporada. Essas
disposições vão regular as relações jurídicas entre os condôminos.
Constitui-se a multipropriedade por ato entre vivos ou testamento, registrado no
competente cartório de registro de imóveis, devendo constar daquele ato a duração dos
períodos correspondentes a cada fração de tempo.
Sendo assim, para a criação ou alienação da multipropriedade, valem as regras gerais
quanto ao instrumento, que precisará ser público, salvo as exceções legais.
Cada fração de tempo é considerada indivisível e o período correspondente a cada
fração de tempo será de, no mínimo, 7 (sete) dias, seguidos ou intercalados.
Já a transferência do direito de multipropriedade e a sua produção de efeitos perante
terceiros dar-se-ão na forma da lei civil e não dependerão da anuência ou cientificação dos
demais multiproprietários. Nem sempre haverá direito de preferência na alienação de fração de
tempo, salvo se estabelecido no instrumento de instituição ou na convenção do condomínio em
multipropriedade em favor dos demais multiproprietários ou do instituidor do condomínio em
multipropriedade.
A administração do imóvel e de suas instalações, equipamentos e mobiliário será de
responsabilidade da pessoa indicada no instrumento de instituição ou na convenção de
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Assim, vencida e não paga a prestação, o contrato será considerado rescindido se, 30
dias após ser constituído em mora o devedor, ele não purgar a mora.
A Súmula 543 do STJ, estabelecendo que, na hipótese de resolução de contrato de
promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deverá
ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador– integralmente,
em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha
sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.
O STJ entende que é nula cláusula contratual que preveja a perda de todas as parcelas
pagas pelo compromissário comprador.
Merece atenção também a súmula 308 do STJ, a qual diz que, no caso de
construção/incorporação, a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, seja
anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os
adquirentes dos imóveis.
Como decorrência da súmula, a jurisprudência do STJ admite que a ação proposta pelo
compromissário comprador seja em face do agente financeiro e do promitente vendedor, em
litisconsórcio passivo necessário, para a outorga da inscrição definitiva e liberação da hipoteca.
7.1. INTRODUÇÃO
Os direitos reais de gozo ou fruição são aqueles em que há uma divisão dos atributos
da propriedade, quando haverá uma transmissão a uma outra pessoa do direito de usar, gozar
ou fruir da coisa.
Assim, são direitos reais de gozo ou fruição:
• superfície;
• servidão;
• usufruto;
• uso;
• habitação;
• concessão de direito real de uso;
• concessão de uso especial para fins de moradia.
7.2. SUPERFÍCIE
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O superficiário deve responder pelos encargos e tributos que incidem sobre o bem,
conforme art. 1.371 do CC.
Pode haver ainda a transferência da superfície para terceiros, inclusive para os
herdeiros, caso o superficiário venha a morrer. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a
nenhum título, qualquer pagamento pela transferência.
Se ocorrer a alienação do imóvel ou do direito de superfície, o superficiário ou o
proprietário tem direito de preferência, em igualdade de condições.
O Enunciado 510 do CJF diz que, ao superficiário que não tenha sido previamente
notificado pelo proprietário para exercer o seu direito de preferência, é assegurado, no prazo
de 6 meses (decadencial), contados do registro da alienação, adjudicar para si o bem, mediante
o depósito do preço.
Essa mesma ideia vale para o fundieiro, se for vendido o direito de superfície, tendo o
prazo de 6 meses para adjudicar a coisa para si, em igualdade de condições.
Existem correntes em sentido diverso, que discordem desse enunciado.
A superfície poderá se extinguir antes do termo final previsto no contrato. Isso ocorrerá
se o superficiário der ao terreno uma destinação diversa da pactuada, daquela que motivou a
concessão do direito de superfície (art. 1.374 do CC).
Com a extinção da superfície, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o
terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não
houverem estipulado o contrário.
Atente-se à diferença entre a superfície do Código Civil e a superfície do Estatuto da
Cidade.
• Superfície do Código Civil: poderá recair sobre imóvel urbano ou rural. Além disso,
poderá ter exploração para construções ou plantações. Em regra, não existe
autorização para utilização do subsolo ou do espaço aéreo. Aqui, há uma cessão que
se dá por prazo determinado, como regra.
• Superfície prevista no Estatuto da Cidade: poderá recair sobre imóvel urbano. Não
traz restrição sobre exploração para construções ou plantações, podendo ser
qualquer utilização compatível com a política urbana. Não proíbe a utilização para o
subsolo ou espaço aéreo. Aqui, a cessão poderá ser por prazo determinado ou
indeterminado, a depender do contrato.
No caso de extinção do direito de superfície em consequência de desapropriação, a
indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de
cada um.
7.3. SERVIDÕES
Por meio da servidão, um prédio proporciona a utilidade para outro prédio, sendo este
último gravado. Trata-se de um prédio (serviente) servindo a outro prédio (dominante).
Segundo o art. 1.378, a servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava
o prédio serviente, que pertence a dono diverso, e constitui-se mediante declaração expressa
dos proprietários, ou por testamento, e subsequente registro no Cartório de Registro de
Imóveis.
A servidão não se presume, tendo uma origem clara, sendo este um negócio jurídico
inter vivos (contrato) ou negócio mortis causa (testamento), ou ainda usucapião. Isso porque é
possível a usucapião de servidão aparente, que, segundo o CC, ainda pode durar 20 anos
(extraordinária).
Há uma crítica da doutrina quanto a isso, pois, se em 15 anos o sujeito já adquire a
propriedade por meio da usucapião extraordinária não faria sentido adquirir a servidão em 20
anos. Porém, é isso que diz a lei.
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Além disso, servidão poderá ser instituída por meio de sentença judicial, no caso de
reconhecimento de servidão que está sendo discutido.
Em síntese, são formas de constituição da servidão:
• declaração expressa do proprietário;
• testamento;
• destinação do proprietário;
• sentença judicial.
Não se pode esquecer que a servidão não se confunde com passagem forçada, como
dito acima.
O art. 1.380 do CC diz que o dono de uma servidão pode fazer todas as obras
necessárias à sua conservação e ao seu uso, e, se a servidão pertencer a mais de um prédio,
serão as despesas rateadas entre os respectivos donos.
Essas obras devem ser feitas pelo dono do prédio dominante, se o contrário não
dispuser expressamente o título.
A servidão pode ser removida, de um local para outro, podendo ser feita:
• pelo dono do prédio serviente à sua custa, desde que não diminua as vantagens do
prédio dominante;
• pelo dono do prédio dominante à sua custa, se houver considerável incremento
para sua utilidade e não prejudicar o prédio serviente.
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Por isso, constituída para um certo fim a servidão, não poderá ela se ampliar para outro
fim. Ex.: servidão para passagem de gado não poderá ser ampliada para cultura agrícola.
Nas servidões de trânsito, a servidão maior inclui a servidão de menor ônus, e a servidão
menor exclui a servidão mais onerosa. Ex.: Se a servidão é de passagem de carro, inclui a
passagem de pessoas, pois esta é menos onerosa do que aquela. Porém, se a servidão é para
passagem de pessoas, não incluirá a passagem de carro, que é mais onerosa.
Se as necessidades da cultura, ou da indústria, do prédio dominante impuserem àquela
servidão uma maior largueza, ou seja, se mostrando necessárias, o dono do serviente é obrigado
a se submeter, mas deverá ser indenizado pelo excesso.
7.4. USUFRUTO
• Usufruto legal: quando decorre da lei. Não precisa ser registrado nesse caso. Ex.:
usufruto do pai em relação ao bem do filho menor.
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• Usufruto voluntário: é feito pela convenção das partes. Pode ter origem em
testamento ou em contrato. Ex.: doação de um bem pelo pai ao filho, mas reserva
o usufruto para si.
• Usufruto misto: é o que decorre da usucapião, pois há o efeito da lei e o efeito da
vontade do usucapiente.
Havendo justo título e boa-fé, o prazo para a usucapião de usufruto é de 10 anos. Se não
houver, o prazo é de 15 anos.
Quanto ao seu objeto, o usufruto poderá ser:
• Usufruto próprio: recai sobre bens infungíveis e inconsumíveis. Ao final do usufruto,
o usufrutuário vai restituir o bem ao nu-proprietário.
• Usufruto impróprio: recai sobre bens fungíveis ou consumíveis. O usufrutuário se
torna proprietário da coisa. Ao final do usufruto, irá restituir o equivalente, já que a
coisa era consumível. Se o equivalente não existir, será restituído em dinheiro.
Em relação à duração:
• Usufruto temporário: há um certo prazo de duração estabelecido. Sendo pessoa
jurídica, o prazo máximo do usufruto é de 30 anos.
• Usufruto vitalício: há usufruto enquanto o usufrutuário viver. Caso seja para uma
pessoa natural, e não existindo prazo para o término, o usufruto é vitalício. A morte
do nu-proprietário não é causa de extinção do usufruto, e sim a morte do
usufrutuário. Os herdeiros do nu-proprietário continuarão com a propriedade
limitada (direito de reaver e de dispor), mas o usufruto continuará com o
usufrutuário.
O art. 1.393 do CC diz que não se pode transferir o usufruto por alienação. O que pode
fazer é ceder o seu exercício, seja a título gratuito ou oneroso. Assim, o usufruto em si é
inalienável.
Sendo inalienável o direito real de usufruto, há que se considerar que o usufruto
também é impenhorável, mas não se confundirá a impossibilidade de se penhorar o usufruto,
com a possibilidade de se penhorar os frutos que decorrem o usufruto.
Veja, não pode penhorar o direito de usufruir, mas o produto desse seu direito pode
ser penhorado.
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7.5. USO
É direito personalíssimo de uso do bem, não sendo possível a sua fruição. O art. 1.412
do CC diz que o usuário apenas usará a coisa e perceberá os seus frutos, quanto o exigirem as
necessidades suas e de sua família.
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7.6. HABITAÇÃO
Aqui o titular do direito só poderá habitar o bem. Trata-se do mais restrito dos direitos
reais sobre coisas alheias.
De um lado, há o proprietário, do outro, o habitante.
Esse direito real pode ser legal ou convencional.
O caráter gratuito da habitação é claro, conforme o art. 1.414 do CC, que estabelece
que, quando o uso consistir no direito de habitar gratuitamente coisa alheia, o titular deste
direito não poderá alugá-la, nem emprestá-la, mas simplesmente ocupá-la com sua família.
Há um caráter personalíssimo ao direito real de habitação, não sendo viável que o
habitante institua um benefício semelhante em favor de terceiro.
É proibido o direito real de habitação de 2º grau, tendo em vista seu caráter
personalíssimo.
Se houver um direito real de habitação simultâneo, qualquer uma das partes pode
habitar, podendo haver uma convivência compulsória.
São aplicáveis à habitação, no que não for contrário à sua natureza, as disposições
relativas ao usufruto.
Esses direitos reais se referem a áreas públicas, normalmente invadidas e tomadas por
favelas, a fim de regularizar juridicamente essa situação. Estão previstos nos arts. 7º e 8º do DL
271/67, atualizado pela Lei nº 11.481/07.
Segundo o art. 7o, é instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares,
remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para
fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização,
edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das
comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de interesse
social em áreas urbanas.
A concessão do direito de uso para fins de moradia consta da MP 2.220/01, que continua
em vigor.
O seu art. 1º afirma que, aquele que ocupou como seu, por 5 anos ininterruptamente, e
sem oposição, imóvel urbano de até 250m², utilizando-o como moradia, terá direito à concessão
de uso especial para fins de moradia, desde que não seja proprietário ou concessionário, seja
urbano ou rural.
8.1. INTRODUÇÃO
Existem direitos reais de garantia sobre coisa própria e sobre coisa alheia.
As características básicas dos direitos reais de garantia são:
• Preferência: o credor hipotecário e o pignoratício têm preferência no pagamento
em relação aos outros credores, em razão da coisa reservada como garantia.
Contudo, a lei cria outras categorias de credores preferenciais.
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8.2. PENHOR
O penhor é um direito real de garantia, em regra, sobre coisa alheia móvel (mas há
exceções para imóveis, como será visto) ou sobre direitos.
Nunca se deve confundir “penhorar” com “empenhar”. Penhorar é um termo
processual, em execução ou cumprimento de sentença, quando um bem do devedor, móvel ou
imóvel, sofre uma constrição judicial para garantir o pagamento. Já empenhar, isso sim, é dar a
coisa em garantia de alguma obrigação, nada tendo a ver com a existência de uma ação judicial.
O penhora é constituído, em regra, sobre bens móveis, podendo ser constituído sob
bens de acessão intelectual. Ocorre também, em regra, a transferência da posse de bem. A
exceção está no penhor rural, industrial, mercantil e de veículos, quando a coisa empenhada
continua na posse do devedor.
As partes do penhor são:
• Credor pignoratício: pode ser o credor da obrigação ou o terceiro.
• Devedor pignoratício: é o devedor da obrigação.
A instituição do penhor pode se dar por instrumento público ou particular, a ser levado
a registro no Cartório de Registro de Títulos e Documentos.
O registro é elemento essencial para que o penhor tenha eficácia real e erga omnes. Se
não for levado a registro, o negócio tomará uma feição contratual, gerando apenas efeito inter
partes.
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• penhor agrícola;
• penhor pecuário.
O penhor agrícola e o penhor pecuário não podem ser convencionados por prazos
superiores aos das obrigações garantidas. Embora vencidos os prazos, permanece a garantia,
enquanto subsistirem os bens que a constituem.
A prorrogação do penhor deve ser averbada à margem do registro respectivo,
mediante requerimento do credor e do devedor.
Se o prédio estiver hipotecado, o penhor rural poderá constituir-se independentemente
da anuência do credor hipotecário, mas não lhe prejudica o direito de preferência, nem restringe
a extensão da hipoteca, ao ser executada. O art. 1.441 do CC diz que tem o credor direito a
verificar o estado das coisas empenhadas, inspecionando-as onde se acharem.
Penhor agrícola
O penhor agrícola poderá ter como objeto:
• máquinas e instrumentos de agricultura;
• colheitas pendentes, ou em via de formação;
• frutos acondicionados ou armazenados;
• lenha cortada e carvão vegetal;
• animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.
Esses bens são considerados imóveis por acessão física industrial ou por acessão física
intelectual.
Consoante o art. 1.443 do CC, o penhor agrícola que recai sobre colheita pendente, ou
em via de formação, abrange a imediatamente seguinte, no caso de frustrar-se ou ser
insuficiente a que se deu em garantia.
Se o credor não financiar a nova safra, o devedor poderá constituir com outrem um novo
penhor, em quantia máxima equivalente à do primeiro. O segundo penhor terá preferência
sobre o primeiro, abrangendo este apenas o excesso apurado na colheita seguinte.
Penhor pecuário
Segundo o art. 1.444do CC, podem ser objeto de penhor animais que integram a
atividade pastoril, agrícola ou de lacticínios.
Esses animais serão considerados imóveis por acessão intelectual.
O devedor pignoratício não poderá alienar os animais empenhados sem prévio
consentimento, por escrito, do credor.
Quando o devedor pretender alienar o gado empenhado ou, por negligência, ameace
prejudicar o credor, este poderá requerer que se depositem os animais sob a guarda de
terceiro, ou exigir o pagamento imediato da dívida.
Os animais da mesma espécie, comprados para substituir os mortos, ficam sub-rogados
no penhor.
Presume-se a substituição, mas não terá eficácia contra terceiros, se não constar de
menção adicional ao respectivo contrato, a qual deverá ser averbada.
Penhor industrial e mercantil
Esse penhor terá por objeto:
• máquinas, aparelhos, materiais, instrumentos instalados e em funcionamento, com
os acessórios ou sem eles;
• animais utilizados na indústria;
• sal e bens destinados à exploração das salinas;
• produtos de suinocultura, animais destinados à industrialização de carnes e
derivados;
• matérias-primas e produtos industrializados.
Os bens aqui serão considerados imóveis por acessão intelectual e permanecerão na
posse do devedor.
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O penhor de veículos não é efetivado sem que eles sejam previamente segurados contra
furtos, avarias, perecimentos, ou danos causados por terceiros.
Se houver a alienação ou a mudança de titularidade do veículo, sem prévia comunicação
ao credor pignoratício, haverá o vencimento antecipado da dívida.
O prazo máximo do penhor de veículos é de 2 anos, prorrogável por igual tempo.
Extingue-se o penhor:
• pela extinção da obrigação;
• pelo perecimento da coisa;
• pela renúncia do credor;
• pela confusão da mesma pessoa como credor e dono da coisa;
• pela a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada, feita pelo
credor ou por ele autorizada.
Há uma presunção de renúncia do credor quando:
• consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço;
• restituir a sua posse ao devedor; ou
• anuir à sua substituição por outra garantia.
Exemplo de confusão é o caso em que alguém recebe o bem empenhado como herança.
Nesse caso, o devedor pignoratício é herdeiro do credor pignoratício, havendo confusão.
8.3. HIPOTECA
A hipoteca também é direito real de garantia sobre coisa alheia, caso em que, via de
regra, vai recair sobre bens imóveis. Não há a transferência da posse da coisa imóvel entre as
partes. A coisa imóvel continua na posse do devedor.
A hipoteca se constitui pelo seu registro na matrícula do imóvel no cartório de registro
de imóveis.
Os registros e as averbações seguirão a ordem em que forem requeridas, conforme o
princípio da anterioridade registral ou da prioridade. Assim, o título que for protocolado
primeiro no registro de imóveis terá preferência sobre todos os demais títulos contraditórios.
O registro terá validade e eficácia enquanto a obrigação principal perdurar. Após isso,
não haverá falar mais em hipoteca.
A especialização da hipoteca deve ser renovada a cada 20 anos.
A hipoteca legal não terá prazo máximo, perdurando enquanto vigorar a situação
descrita na lei.
Por outro lado, a hipoteca convencional terá o prazo máximo de 30 anos.
O art. 1.473 do CC diz o que pode ser objeto do direito real de garantia hipotecária:
• os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles;
• o domínio direto;
• o domínio útil (direito do usufrutuário);
• as estradas de ferro;
• os recursos naturais a que se refere o art. 1.230 do CC, independentemente do solo
onde se acham;
• os navios;
• as aeronaves.
• o direito de uso especial para fins de moradia;
• o direito real de uso;
• a propriedade superficiária;
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• propriedade fiduciária;
• direitos oriundos da imissão provisória na posse, quando esta é concedida ao poder
público.
A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel.
Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmo
imóvel.
O art. 1.475 do CC diz que é nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel
hipotecado. Portanto, o imóvel hipotecado não se torna bem fora do comércio e pode ser
vendido ou doado, mas a hipoteca irá acompanhá-lo, sendo um direito de sequela.
É possível que as partes convencionem que, sendo alienado o bem, haverá o vencimento
antecipado do crédito hipotecário. Assim, embora seja proibido vedar a alienação, é possível
constar que, se ela ocorrer, haverá o vencimento antecipado da dívida.
O dono do imóvel hipotecado pode constituir outra hipoteca sobre ele, mediante novo
título, em favor do mesmo ou de outro credor. Ou seja, é possível a chamada hipoteca de
segundo grau (art. 1.476 do CC). Assim, é possível mais de uma hipoteca sobre o mesmo
imóvel, mas a primeira terá preferência. O titular da segunda hipoteca, quando vencida a sua
dívida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a dívida da primeira hipoteca.
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O art. 1.485 do CC diz que há a extinção da hipoteca pelo decurso do prazo máximo de
30 anos, a contar da constituição do negócio.
Hipoteca legal não tem prazo máximo, apenas a hipoteca convencional.
Admite-se a instituição convencional da hipoteca para dívida futura ou dívida
condicional, que dependa de evento futuro e incerto. No entanto, isso só será possível se for
determinado o valor máximo do crédito no ato de instituição.
A execução da hipoteca, neste caso, vai depender de uma prévia concordância do
devedor quanto à verificação da condição do evento futuro e incerto, ou ainda haver uma prévia
concordância do dever quanto ao montante da dívida.
Havendo divergência entre o credor e o devedor quanto à ocorrência do fato ou do
montante da dívida, o credor deverá provar o seu crédito, o qual, provando, terá a garantia do
bem.
O art. 1.488 do CC inovou por meio da possibilidade de fracionamento da hipoteca, o
que é uma exceção à regra da indivisibilidade do direito real de garantia.
O fracionamento da hipoteca será possível se o imóvel, dado em garantia hipotecária,
vier a ser loteado, ou se nele se constituir condomínio edilício, quando poderá ser dividido o
ônus, gravando cada lote ou unidade autônoma, se o credor, o devedor ou os interessados
assim requererem ao juiz o credor, obedecida a proporção entre o valor de cada um deles e o
crédito.
O credor só poderá ser contrário ao pedido de desmembramento do ônus se provar que
isso ocasionará diminuição de sua garantia.
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8.4. ANTICRESE
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Possui regulamentação:
• no Código Civil (art. 1361 e seg.), que dispõe sobre a propriedade fiduciária de bens
móveis infungíveis;
• no DL 911/1969, que trata dos bens móveis, dados em alienação fiduciária;
• na Lei nº 9.514/1997, que trata da alienação fiduciária em garantia sobre bens
imóveis.
8.5.1. CONCEITO
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Este dispositivo diz que a alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel
confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário do fiduciante ou sucessor do
fiduciante.
Isso fez com que a alienação fiduciária se tornasse de natureza mista, sendo direito real
de garantia sobre coisa própria, mas também é direito real de aquisição.
O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da
garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual
lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos
sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos,
tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser
imitido na posse direta do bem.
Está prevista na Lei nº 9.514/1997 e atualmente a execução da garantia pode ser feita
integralmente no Cartório de Registro de Imóveis. Ela pode ser contratada por uma pessoa física
ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no sistema financeiro imobiliário.
É um contrato de garantia que sempre será vinculado a um contrato principal. Não há
contrato de alienação fiduciária sem que haja algum outro contrato principal.
Não é obrigatório que o contrato principal seja de mútuo. Ela pode garantir qualquer
obrigação principal.
Assim, poderá ser objeto de alienação fiduciária em garantia:
• bens enfitêuticos, hipótese em que será exigível o pagamento do laudêmio, se
houver a consolidação do domínio útil no fiduciário;
• direito de uso especial para fins de moradia;
• direito real de uso, desde que suscetível de alienação;
• propriedade superficiária.
Esses bens podem ser alienados fiduciariamente em garantia de bem imóvel.
A propriedade fiduciária de coisa imóvel se constitui mediante registro no competente
Registro de Imóveis do contrato que lhe serve de título.
Com a constituição da propriedade fiduciária dar-se-á o desdobramento da posse,
tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.
São requisitos do instrumento (que nada mais é que o contrato) a ser registrado:
• constar o valor do principal da dívida;
• constar o prazo e as condições de reposição do empréstimo ou do crédito do
fiduciário;
• constar a taxa de juros e os encargos incidentes;
• constar a cláusula de constituição da propriedade fiduciária, com a descrição do
imóvel objeto da alienação fiduciária e a indicação do título e modo de aquisição;
• constar a cláusula assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre
utilização, por sua conta e risco, do imóvel objeto da alienação fiduciária;
• constar a indicação, para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos
critérios para a respectiva revisão;
• constar a cláusula dispondo sobre os procedimentos de que trata o art. 27 da
referida lei (execução extrajudicial da dívida).
Ocorrendo o pagamento, no prazo de 30 dias, a contar da data de liquidação da dívida,
o fiduciário fornecerá o respectivo termo de quitação ao fiduciante, sob pena de multa em favor
deste, equivalente a meio por cento ao mês, ou fração, sobre o valor do contrato.
À vista do termo de quitação, o oficial do competente Registro de Imóveis efetuará o
cancelamento do registro da propriedade fiduciária, por ato de averbação.
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O art. 26 da lei diz que,vencida e não paga, no todo ou em parte a dívida, e constituído
em mora o fiduciante, a propriedade vai se consolidar em nome do credor fiduciário.
O devedor fiduciante, ou seu representante legal, será intimado, a requerimento do
fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de 15 dias, a
prestação vencida.
Segundo o STJ, é nula a intimação do devedor para oportunizar a purgação de mora
realizada por meio de carta com aviso de recebimento quando esta for recebida por pessoa
desconhecida e alheia à relação jurídica (Inf. 580).
Portanto, no caso de bens imóveis, a purgação da mora é feita no Registro de Imóveis.
O oficial, nos 3 dias seguintes à purgação da mora, entregará ao fiduciário as importâncias
recebidas, deduzidas as despesas de cobrança e de intimação.
Se passados os 15 dias, e o devedor não fez a purgação da mora, então o oficial de
registro de imóveis irá promover a averbação na matrícula do imóvel da consolidação da
propriedade plena em nome do credor fiduciário.
Consolidada a propriedade em nome do fiduciário, no prazo de 30 dias, contados da
data da averbação, ele promoverá público leilão para a alienação do imóvel, já que é vedado o
pacto comissório real, não sendo permitido ao credor fiduciário ficar com a propriedade do
imóvel.
No primeiro público leilão, o maior lance oferecido deve ser pelo menos superior ao
valor contratual do bem. Todavia, sendo inferior ao valor do imóvel, será realizado o segundo
leilão, nos 15 dias seguintes.
No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao
valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos,
e das contribuições condominiais.
Nos 5 dias seguintes à venda do imóvel, o credor fiduciário vai entregar ao devedor
fiduciante aquilo que sobrar. Esse fato vai importar em recíproca quitação.
Se no segundo leilão não for igual ou superior ao valor da dívida e dos encargos, será
considerada a dívida extinta. Ou seja, frustrados os dois leilões, o devedor estará exonerado da
dívida.
9. DA LAJE
A laje é direito real criado pela Lei nº 13.465/2017, que a incluiu no CC.
Ela é uma unidade imobiliária autônoma, com registro e matrícula própria no Cartório
de Imóveis, mas vinculada ao terreno onde se localiza a construção-base. Ela será sobreposta
ou subterrânea a esta construção-base. Assim, embora vinculadas, a laje e o terreno são imóveis
juridicamente diversos. O proprietário da laje terá direito real autônomo ao proprietário do
terreno (e da construção-base).
O proprietário do terreno e da construção-base poderá ceder a superfície superior ou
inferior de sua construção a fim de que o titular da laje mantenha unidade distinta daquela
originalmente construída sobre o solo.
Tal direito foi criado para regularizar situações urbanas, dando autonomia urbanística e
econômica às lajes já consolidadas e a serem construídas, mas também pode ser usada como
soluções para incorporações em áreas antes impossibilitadas de aproveitamento econômico.
A laje não se confunde com condomínio edilício, pois não consiste em áreas comuns e
áreas privativas, possuindo natureza jurídica distinta.
Os titulares da laje, unidade imobiliária autônoma, poderão dela usar, gozar e dispor, mas
deverá haver regras de convivência, direitos e obrigações entre o dono do terreno e o da laje.
QUESTÕES
1 – Quanto às características dos Direitos Reais, assinale a alternativa INCORRETA
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a) Direitos Reais têm oponibilidade erga omnes, o que significa que, em regra, não
haverá efeitos apenas entre as partes da relação jurídica material.
b) Como regra geral, todos os Direitos Reais, para que tenham eficácia erga omnes,
precisam estar inscritos no serviço extrajudicial de registro de imóveis.
c) Nos direitos reais há direito de sequela, ou seja, o direito de reivindicar o bem aonde
quer que ele esteja. Tal direito segue a coisa, onde quer que ela esteja (móvel) ou na
posse de quem estiver (imóvel).
d) No direito real há direito de preferência, tendo caráter taxativo na lei (tipicidade).
2 – Quanto aos Direitos Reais previsto no art. 1225 do CC, assinale aquele que NÃO se
enquadra no rol do referido artigo:
a) os direitos propter rem.
b) o penhor.
c) a propriedade.
d) a concessão de uso especial para fins de moradia.
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8- Os Direitos Reais imobiliários, como regra geral, são constituídos pelo seu ingresso
no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição na qual o bem está
territorialmente localizado. Sobre o registro de imóveis, é INCORRETO afirmar:
a) O registro do título aquisitivo é a principal maneira derivada e originária de aquisição
da propriedade imóvel. É o registro que implica transferência da propriedade,
possuindo, portanto, natureza constitutiva de direitos. Por isso é muito importante o
estudo de Registros Públicos, em especial a Lei 6.015/73, além de vários diplomas
normativos que regulam aspectos extrajudiciais.
b) Os contratos constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis devem ser
feitos por escritura pública, se o valor do imóvel for superior a 30 salários mínimos. Do
contrário, basta que seja um contrato particular. Ou seja, quando a lei fala “instrumento
público” está se referindo a escritura pública, lavrada perante um Tabelião de Notas.
c) Pelo sistema adotado no Brasil, a escritura pública, por si só, não transfere a
propriedade. Ela é o instrumento do contrato celebrado.
d) O Código Civil afirma que o registro é eficaz desde o momento em que se apresentar
o título ao oficial do registro, e este o prenotar no protocolo. A partir desse momento,
o registro é eficaz, ou seja, consagra-se o princípio da prioridade, tendo ela quem
primeiro protocolou o título junto ao registrador.
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10- O direito de vizinhança são limitações impostas aos titulares de direitos reais, para
que exista uma boa convivência social. É um conjunto de normas de convivência entre
titulares de direitos ou possuidores que estejam fisicamente próximos uns aos outros.
A seu respeito, é INCORRETO afirmar que:
a) As normas relativas aos direitos de vizinhança são claras limitações ao exercício da
propriedade, existindo pelo simples fato de uma propriedade ser vizinha de outra. Essas
obrigações estão vinculadas à coisa, perseguindo-a, ou seja, são obrigações propter rem
(ambulatoriais).
b) O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as
interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam o
prédio, provocadas pela utilização de propriedade vizinha. Existe para cessar
interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde, evitando-se o abuso do
direito.
c) São proibidas as interferências externas, considerando-se a natureza da utilização, a
localização do prédio. Além disso, é necessário que sejam atendidas as normas que
distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores
da vizinhança.
d) O proprietário tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a
reparação do prédio, quando ele estiver ameaçado de ruína, bem como poderá exigir
que seja prestada caução pelo perigo de dano iminente. Contudo, tal direito não se
estende aquele que seja apenas o possuidor sob ameaça de ruína do prédio vizinho.
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12- A respeito das novas figuras de Direitos Reais introduzidas por leis extravagantes
nos últimos anos, é INCORRETO afirmar que:
a) O Condomínio em multipropriedade foi criado pela Lei 13.777/2018, sendo regime de
condomínio em que cada um dos proprietários de um mesmo imóvel é titular de uma
fração de tempo, à qual corresponde a faculdade de uso e gozo, com exclusividade, da
totalidade do imóvel, a ser exercida pelos proprietários de forma alternada. Veja-se,
assim, que há um condomínio civil (frações ideias da área) e uma divisão também de
tempo (frações de tempo).
b) O condomínio de lotes, modalidade criada pela Lei 13.465/2017, consiste em haver,
em terrenos, partes designadas de lotes (unidades autônomas), que são propriedade
exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos. Funcionam como se
fossem condomínios edilícios, mas sem a obrigatoriedade de construção das áreas
exclusivas, apenas das partes comuns.
c) Constitui-se a multipropriedade imobiliária por ato entre vivos ou testamento,
registrado no competente cartório de registro de imóveis, devendo constar daquele ato
a duração dos períodos correspondentes a cada fração de tempo. Já a transferência
deste direito e a sua produção de efeitos perante terceiros dar-se-ão na forma da lei civil
e não dependerão da anuência ou cientificação dos demais multiproprietários. Nem
sempre haverá direito de preferência na alienação de fração de tempo, salvo se
estabelecido no instrumento de instituição ou na convenção do condomínio em
multipropriedade em favor dos demais multiproprietários ou do instituidor do
condomínio em multipropriedade.
d) O condomínio de lotes assemelha-se aos loteamentos urbanos, regidos pela Lei
6.766/1979, em apenas alguns pontos, dentre eles, o fato de que ambos se dividem em
áreas públicas (ruas, equipamentos, áreas verdes, áreas institucionais) e lotes (unidades
imobiliárias).
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usufruto por alienação. O que pode fazer é ceder o seu exercício, seja a título gratuito
ou oneroso. Assim, o usufruto em si é inalienável.
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COMENTÁRIOS
1 - Gabarito: B
É preciso lembrar que, ao tratar de Direitos Reais, podemos estar falando sobre coisas
móveis e imóveis. Existe uma tendência a se imaginar que apenas imóveis são objeto de
Direitos Reais. Assim, a alternativa está errada porque a regra de necessidade de registro
na serventia imobiliária se aplica a imóveis, mas direitos reais sobre coisas móveis não
se sujeitam a esta regra.
2 - Gabarito: A
Os direitos decorrentes de obrigações propter rem possuem natureza obrigacional,
pessoal. Assim, muito embora estejam vinculados a uma coisa, eles não possuem
natureza real.
3 - Gabarito: C
A Teoria Objetiva foi defendida por Ihering, não por Savigny, e foi ela a adotada pelo CC,
no seu art. 1.196.
4- Gabarito: D
5- Gabarito: C
É possível haver posse justa e de má-fé. A posse pode não ser violenta, clandestina e
precária, mas pode conter algum vício. Nesse caso, haverá uma posse justa e de má-fé.
6- Gabarito: A
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Paulo Batista
8-Gabarito: A
9- Gabarito: A
10- Gabarito: D
11- Gabarito: B
296
299
Paulo Batista
12 - Gabarito: D
Não se deve confundir condomínio de lotes com loteamento urbano.
Basicamente, os loteamentos urbanos são regidos pela Lei 6.766/1979 e se dividem em
áreas públicas (ruas, equipamentos, áreas verdes, áreas institucionais) e lotes (unidades
imobiliárias). Já no condomínio de lotes, toda a área é privada, dividida em áreas
privativas e comuns. São institutos juridicamente distintos em absoluto, mas tal
distinção somente é constatada ao examinar os atos de sua criação no Cartório de
Registro de Imóveis. Olhando ambos apenas pelo seu aspecto físico, não será possível
saber se se trata de loteamento ou de condomínio de lotes.
13- Gabarito: C.
14- Gabarito: D
O art. 1.475 do CC é expresso ao dizer que é nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar
imóvel hipotecado. Portanto, o imóvel hipotecado não se torna bem fora do comércio e pode
ser vendido ou doado, mas a hipoteca irá acompanha-lo, sendo um direito de sequela.
15- Gabarito: A
Está prevista na Lei 9.514/1997 e atualmente a execução da garantia pode ser feita
integralmente no Cartório de Registro de Imóveis.
297
300
Matheus Zuliani
Não custa enfatizar que o modo de se obter justiça foi aperfeiçoado, para melhor,
com as novas técnicas processuais, graças aos tipos de tutelas que são possíveis de
serem emitidas para garantir o resultado prático protegido pelo direito. Todavia, e
quando, apesar de tudo, o dano se evidencia com a sua força perturbadora,
remanesce ao lesado a oportunidade de alcançar a indenização que reconstrua o
patrimônio deficitário ou que compense a dor moral em caso de ofensa a direitos da
personalidade. A tutela indenizatória é instituída pela sentença condenatória, o que
anima escrever ser fruto de uma reprovação da conduta. O juiz condena porque
reconhece como devida a obrigação de ressarcimento, e isso, invariavelmente,
decorre de valoração da antijuridicidade, quer no aspecto subjetivo (culpa) ou
objetivo (fato e serviços que pressupõem responsabilidade).
42
ZULIANI, Ênio Santarelli – Tutelas e prescrição in Responsabilidade Civil na Área da Saúde – Série GV
law Editora Sairava.
43A lex Poetelia Papiria foi consequência de uma revolta da plebe, uma insurreição contra os maus-tratos infligidos a
um jovem, Lúcio Paírio, que estava em estado de nexus (quase escravidão], devido a um empréstimo que seu pai
contraíra e não pagara, porque este, no exercício da pátria potestas, o entregara ao credor” Obrigações no direito
romano. Texto de ALFREDO BUZAID (do concurso de credores no processo de execução, Saraiva, 1952, p. 43]
298
301
Matheus Zuliani
aquiliana44, é a ofensa a um dever jurídico de não lesar outrem (princípio alterum non
laedere ou neminem laedere). Encontra previsão no art. 186 do Código Civil que diz: “Aquele
que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Essa classificação retrata o modelo
dual ou binário, e sua tendência é não mais existir, passando a unificação, uma vez que princípios
e regramentos básicos são os mesmos, a exemplo do que já faz o Código de Defesa do
Consumidor.
Além da responsabilidade contratual e extracontratual, existe também a
responsabilidade subjetiva e a responsabilidade civil objetiva. A responsabilidade civil subjetiva
é a regra do nosso ordenamento jurídico, enquanto a responsabilidade civil objetiva é a exceção.
Veremos, mais adiante, os pressupostos da responsabilidade civil. Em resumo, são quatro: a ação
ou omissão, dolosa ou culposa, o nexo de causalidade e o dano. Na responsabilidade civil
subjetiva é preciso que esses quatro elementos estejam presentes. No que tange a
responsabilidade civil objetiva, o Código Civil, no art. 927, parágrafo único, dispõe que ela terá
vez quando a lei dispuser, ou então, quando envolver atividade de risco. Para que haja a
responsabilidade objetiva se faz necessário apenas três dos pressupostos da responsabilidade
civil, dispensando-se a comprovação da culpa, uma vez que, nessa modalidade, ela é presumida.
No que tange a responsabilidade civil objetiva, é preciso que se façam algumas
observações.
O parágrafo único do art. 927 do Código Civil diz que haverá obrigação de reparar o
dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos
de outrem.
Perceba aqui que a responsabilidade poderá independer de culpa, e ser objetiva,
quando a lei disser que ela é objetiva, ou então, quando a atividade for de risco. O que é uma
atividade perigosa? Trata-se de uma cláusula geral, em que o seu conceito será preenchido pelo
juiz diante do conceito social da época em que ocorrer o fato. Trata-se da aplicação da teoria das
janelas abertas ou das cláusulas abertas.
Risco é uma iminência de dano ou de prejuízo. Trata-se de uma situação acima da
normalidade. O risco está acima de uma situação de normalidade, mas está abaixo de uma
situação de perigo. Veja que a lei não exige o perigo, mas tão somente o risco. Se houver perigo,
certamente há risco.
Sobre a teoria do risco, é possível se falar em risco administrativo, risco criado, risco do
proveito, risco integral.
Embora pareça não existir unanimidade na doutrina no que tange aos elementos que
estruturam a responsabilidade civil, o que prevalece é que são eles a ação ou omissão, a culpa
ou dolo do agente (culpa em sentido amplo), o nexo de causalidade e o dano ou prejuízo.
44“Por volta do final do século III a.C., um Tribuno da Plebe de nome Aquilius, dirigiu uma proposta de lei aos Conselhos
da Plebe, com vistas a regulamentar a responsabilidade por atos intrinsecamente ilícitos. Foi votada a proposta e
aprovada, tornando-se conhecida pelo nome de Lex Aquilia. A Lex Aquilia era na verdade plebiscito, por ter origem
nos Conselhos da Plebe. É lei de circunstância, provocada pelos plebeus que, desse modo, se protegiam contra os
prejuízos que lhes causavam os patrícios, nos limites de suas terras. Antes da Lei Aquília imperava o regime da Lei das
XII Tábuas (450 a.C.), que continha regras isoladas” (César Fiuza in Por uma nova teoria do ilícito civil].
299
302
Matheus Zuliani
3. DA CONDUTA HUMANA
Para que se possa falar em responsabilização, mesmo que na esfera civil, é preciso que
haja uma conduta humana voluntária, comissiva ou omissiva. Dessa afirmação se extrai que não
se admite a responsabilização civil por conduta de animais.
Esse comportamento humano precisa ter uma carga de consciência. Sem que a pessoa
esteja consciente, não há como existir o dever de indenizar. Nesse sentido, o ato praticado pelo
sonâmbulo é desprovido de consciência, e, por isso, não gera o dever de indenizar.
Da mesma forma, além da consciência, é preciso que haja voluntariedade. Muitos
doutrinadores citam o exemplo do doutrinador Italiano Giuseppe Bettiol, que escreveu sobre o
direito penal:
Pessoa está no museu apreciando uma obra de arte. Naquele momento um vaso em
seu nariz se rompe e essa pessoa, instintivamente, espirra no quadro o sangue,
causando dano. Isso não é uma conduta humana. Não há voluntariedade na resposta
que o organismo deu ao nariz do agente.
A culpa lato sensu, também conhecida como culpa em sentido amplo ou genérica,
engloba tanto dolo quanto a culpa em sentido estrito.
Dolo é a violação intencional, ou seja, é a vontade e consciência de praticar uma
conduta. No direito civil, o dolo tem o mesmo tratamento da culpa grave, respondendo o
indivíduo pelos danos que causou em sua totalidade.
A culpa em sentido estrito, apesar de existir o desrespeito a uma norma, não há a
violação intencional desse dever. Portanto, na culpa há uma conduta voluntária, mas se chega a
um resultado involuntário. Todavia, o resultado era previsível, razão pela qual houve uma
violação aos deveres objetivos de cuidado.
A doutrina fala em graus de culpa, divisão essa que nasceu diante da redação do art.
944 do Código Civil, permitindo-se, diante da gravidade, a redução equitativa da indenização.
Também existe a divisão em modalidades de culpa. Desta feita, podemos dizer que a
culpa em sentido estrito se traduz nos conceitos de negligência, imprudência e imperícia.
45BANDEIRA, Paula Greco in A evolução do Conceito de Culpa e o artigo 944 do Código Civil - Revista da EMERJ, v. 11,
nº 42, 2008.
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Matheus Zuliani
A negligência é a falta de cuidado pela omissão. É o sujeito que causa dano, porque o
carro derrapa na pista, batendo no carro estacionado, eis que os pneus estavam carecas, ainda
que estivesse em baixa velocidade. A imprudência é falta de cuidado somado a uma ação. É o
agir sem tomar as cautelas necessárias. É o sujeito que emprega velocidade acima do permitido.
Por fim, a imperícia é falta de habilidade, própria dos profissionais liberais. Ex.: médico que faz
cirurgia sem ter habilitação para fazer cirurgia. A presença de uma dessas modalidades não
exclui a outra. É possível que haja na mesma situação negligência e imprudência, como é o caso
em que o sujeito corre a 200 km/h na avenida, chovendo e com pneus carecas.
Pergunta-se: porque o art. 186 do Código Civil não fala explicitamente sobre a
imperícia?
A imperícia é a imprudência técnica, diante disso, o fato de o artigo não a ter
mencionado não faz falta para fins de responsabilização.
O Código Civil de 2002 aboliu a característica subjetivista que tinha o Código de
Beviláqua. É claro que a responsabilidade baseada na culpa ainda existe, sendo ela a regra,
inclusive. No entanto, a objetividade ganhou espaço. O Código Civil trouxe a responsabilidade
por atos de terceiros, que será estudada em tópico próprio. No Código Civil de 1916, esse tipo
de responsabilidade era baseada na culpa in eligendo, in vigilando e in custodiano. A culpa in
eligendo era a culpa ao eleger, ou seja, a culpa do empregador em relação à conduta do
empregado. A culpa in vigilando era a culpa daquele que tinha o dever de vigiar, como a conduta
dos pais em relação aos filhos, do tutor e curador em relação aos pupilos e curatelados. Por fim,
a culpa in custodiano se caracterizava pela ausência de atenção e cuidado em relação a coisa ou
animal que se encontrasse sob a guarda do agente.
Por último, ainda tratando do tema da culpa, existe a questão da compensação de
culpa. Essa compensação de culpas é avaliada na fixação da indenização. O art. 945 do Código
Civil dispõe que “se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do
autor do dano”.
O juiz aplica muito a compensação de culpa em casos de acidente de trânsito, onde há
culpa de ambos os condutores.
5. DO NEXO DE CAUSALIDADE
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Matheus Zuliani
evento danoso gera a responsabilidade civil, devendo a indenização ser fixada de acordo com a
contribuição causal. Essa teoria foi desenvolvida por um jurista alemão chamado Von Kries.
Existe um enunciado da Jornada de Direito Civil que não exclui a aplicação de tal
teoria46.
No que tange a teoria do dano direito e imediato, somente devem ser reparados os
danos que decorrem dos efeitos necessários da conduta do agente. Os efeitos necessários
decorrentes daquela conduta são os que podem ser imputados àquele sujeito. É a ideia do art.
403 do Código Civil. Alguns doutrinadores entendem que é essa a teoria que se aplica.
Agostinho Alvim, jurista responsável pelo livro do direito das obrigações, explica sobre
a teoria:
Dessa forma, para Agostinho Alvim, mesmo que remota, indireta ou mediata, uma
condição é considerada causa necessária se o dano “a ela se filia necessariamente”, ou seja, se a
condição for “causa única” do dano, se “opera(r) por si, dispensadas outras causas”. Em outras
palavras, causa necessária é a que explica o dano: “Assim, é indenizável todo o dano que se filia
a uma causa, ainda que remota, desde que ela lhe seja causa necessária, por não existir outra
que explique o mesmo dano” (ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas
consequências, 4 ed. São Paulo: Saraiva, 1972, p. 372).
Art. 393: O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou
força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
46Enunciado 47 da I Jornada de Direito Civil: “O art. 945 do novo Código Civil, que não encontra correspondente no
Código Civil de 1916, não exclui a aplicação da teoria da causalidade adequada”.
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Essas excludentes do nexo de causalidade devem ser analisadas caso a caso. É preciso
verificar se naquele evento se está diante de um caso fortuito ou força maior, ou se decorre do
risco do empreendimento, o chamado risco proveito, ou seja, se não há relação com a atividade
do suposto causador do dano. Nessa hipótese não há exclusão do nexo de causalidade. Também
são denominados de eventos internos (fortuito interno).
Nesse sentido, o STJ editou a Súmula 479, que dispõe: “As instituições financeiras
respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos
praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.
Já o fortuito externo é aquele que não tem qualquer relação com a atividade
desenvolvida ou risco do empreendimento. Dessa forma, podem ser consideradas com
excludentes da responsabilidade (do nexo de causalidade).
Esse tema de fortuito interno e fortuito externo gera muita polemica na jurisprudência.
Nesse sentido, é importante acompanhar o que o STJ tem entendido a respeito do rompimento
do nexo de causalidade, e por consequência, a quebra do dever de indenizar.
Roubo a ônibus: havia divergência entre a 3ª e a 4ª turmas do STJ. Alguns diziam que a
empresa podia evitar. Porém, como a empresa poderia fazê-lo? Colocando detector de metais?
O STJ passou a entender, e consolidou o entendimento, de que o assalto a ônibus é um evento
externo e se enquadra nos casos de caso fortuito e força maior, caso em que a empresa não
responde (STJ - REsp 783.743/RJ).
Roubo a banco: o Roubo no interior da instituição financeira se encaixa no risco do
empreendimento. O banco tem um ambiente de risco, assim é seu dever oferecer segurança aos
consumidores. Assalto a banco é evento interno, entra no risco do empreendimento, portanto,
o banco tem responsabilidade STJ - REsp. 694.153/PE).
Roubo em Shopping: o roubo dentro de shopping center é um caso bem divergente na
jurisprudência. O cidadão que é vítima de roubo dentro do shopping deve ser indenizado, uma
vez que a empresa deve providenciar segurança aos clientes, afinal, é esse o diferencial que eles
vendem no cotejo com o comércio aberto. Segundo jurisprudência do STJ, o assalto a shopping
é evento interno, portanto, a empresa responde (STJ - REsp. 582.047/RS).
Ainda dentro do tema, existem questões que atenuam o nexo de causalidade, sem,
contudo, excluí-lo. Nesse caso, há responsabilidade civil, contudo, com redução do quantum
indenizatório.
O principal fator atenuante é a culpa ou fato concorrente da vítima. Dispõe o art. 944
do Código Civil que “a indenização mede-se pela extensão do dano”. O parágrafo único
complementa dizendo que “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o
dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”.
Por fim, o art. 945 do Código Civil explica que “se a vítima tiver concorrido
culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a
gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano”.
7. DO DANO OU PREJUÍZO
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8. DO DANO MATERIAL
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anos. Nesse caso, o filho não vai ficar recebendo do pai até o fim da vida provável, mas apenas
até os 24 ou 25 anos, que é o limite da relação de dependência.
Existe, ainda, a hipótese em que o falecimento é de filho menor impúbere. Neste caso,
a Súmula 491 do STF estabelece que é indenizável o acidente que cause a morte de filho menor,
ainda que não exerça trabalho remunerado47.
O cálculo dessa indenização é feito com base num salário mínimo, contabilizando 2/3
no período em que o menor teria entre 14 a 24 anos, supondo que ajudaria a família.
No entanto, existem julgados que defendem alimentos indenizatórios aos pais,
inclusive após este período. Nessa situação, em que o indivíduo atinge 24 ou 25 anos, presume-
se que ele teria casado, hipótese que passará a contribuir com 1/3 de seus rendimentos.
Flávio Tartuce critica essa visão do STJ, alertando que isto não é a realidade brasileira.
Para ele, a pessoa com 25 anos, como regra geral, não contribui com mais nada para sua família.
Segundo o STJ, na responsabilidade civil extracontratual, se houver a fixação de
pensionamento mensal, os juros moratórios deverão ser contabilizados a partir do vencimento
de cada prestação, e não da data do evento danoso ou da citação.
Não se aplica ao caso a Súmula 54 do STJ, que somente tem incidência para
condenações que são fixadas em uma única parcela. Se a condenação for por responsabilidade
extracontratual, mas o juiz fixar pensão mensal, neste caso, sobre as parcelas já vencidas
incidirão juros de mora a contar da data em que venceu cada prestação. Sobre as parcelas
vincendas, em princípio não haverá juros de mora, a não ser que o devedor atrase o pagamento,
situação na qual os juros irão incidir sobre a data do respectivo vencimento. Esse tema foi objeto
do informativo 580 do STJ.
O dano moral é a lesão ao direito de personalidade da pessoa.
A angústia, o sofrimento ou a dor são efeitos do dano moral. Esses eram os requisitos
imprescindíveis para a existência do dano moral. No entanto, a jurisprudência foi banalizando o
dano moral, permitindo-se que situações em que não houve angustia, sofrimento ou dor
gerassem indenização. Isso porque o dano moral é configurado a lesão de direitos da
personalidade. Tanto é que a indenização por danos morais, quando começou a ser aplicada no
Brasil, tinha a finalidade de amenizar a dor sofrida com a pecúnia recebida, sabendo que o
dinheiro nunca iria fazer a dor passar, mas sim, ajudar a esquecê-la, proporcionando momentos
de prazer.
Se estiver presente o sentimento negativo, poderá ou não gerar dano moral.
Demonstrada a ocorrência da ofensa, não é preciso comprovar que essa ofensa gerou
dor, angústia ou sofrimento para configuração do dano moral. Diante disso, em algumas
situações entende-se que o dano moral é presumido. Esse dano moral presumido recebe o nome
de dano moral in re ipsa.
No dano moral não existe uma finalidade de acréscimo patrimonial, tanto é que não
incide imposto de renda sobre esta indenização. Esse entendimento, inclusive, é sumulado pelo
STJ.48
Alguns doutrinadores defendem o dano moral e dano moral direto e indireto. No dano
moral direto a lesão atinge a própria pessoal, diretamente. O sujeito inscreveu o nome do lesado
nos cadastros de inadimplentes. Noutro giro, no dano moral indireto há um dano em ricochete,
atingindo, também, uma terceira pessoa. Isto é, o dano moral que atinge a pessoa de forma
47 Súmula 491 do STF: “É indenizável o acidente que cause a morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho
remunerado”.
48 Súmula 498 do STJ: “Não incide imposto de renda sobre a indenização por danos morais”.
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Matheus Zuliani
reflexa. Por exemplo, por conta da atitude imprudente alguém é morto. Há um dano moral à
família do lesado. Veja, um terceiro experimentou o dano moral por um fato ocasionado a outra
pessoa. Ex.: uso indevido da imagem do morto ou lesão à honra do morto.
É preciso tecer comentários acerca do arbitramento do dano moral. Nota-se que não
há, no nosso ordenamento jurídico, o tabelamento do dano moral. Se a indenização por dano
moral fosse tabelada isso facilitaria o ofensor a prever a sua conduta e colocar na balança os pós
e os contras da prática de um ilícito. Nesse contexto, ficou a cargo do Magistrado arbitrar a
indenização quando ocorrer ofensa ao direito de personalidade.
Acerca da fixação da indenização o Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo Ênio Santarelli Zuliani, pai do autor que vos escreve, ensina:
49
STJ - REsp nº 1152541 / RS e REsp nº 710879 / MG.
50“Em 1.990, Gore comprou um automóvel novo numa Concessionária BMW, na cidade de Montgomery, Alabama.
Nove meses após a compra, detectou que o veículo passara por uma repintagem parcial antes de ser vendido como
novo. Revoltado com a descoberta Gore demandou judicialmente contra a BMW, alegando falha no dever de
informação. A montadora BMW admitiu tal prática em 1.000 (um mil) veículos para revenda nas concessionárias da
marca sem informações aos distribuidores. Na sua demanda, Gore conseguiu provar uma desvalorização inicial do
veículo em US$ 4.000 dólares com a repintura e foi recompensado nesse montante pela não informação da BMW. E,
a montadora alegou o dano presumido que fora causado por chuva ácida durante o transporte do veículo da
Alemanha para os Estados Unidos. Mas, a demanda de Gore incluía um pedido de indenização punitiva de US$ 4
milhões de dólares (valor da desvalorização unitária multiplicado pelo número de veículos repintados), que foi
acolhido pelo júri do Tribunal de Birmingham, restando na condenação da BMW nesse valor, a título de punitive
damages pela política de não informação e omissão fraudulenta. Inconformada, a BMW apelou perante a Suprema
Corte do Estado do Alabama, pleiteando a modificação da decisão quanto à imposição da indenização punitiva. Esta
corte reduziu a condenação para US$ 2 milhões, por entender que caberia deliberar somente pelos veículos vendidos
no Estado de Alabama. Novo recurso interposto na Suprema Corte dos Estados Unidos, que para resolver a questão
e ratificar entendimento a ser aplicado a futuros casos de punitive damages estabeleceu três parâmetros gerais
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a BMW pela morte do Cantor João Paulo (aquele que fazia dupla com Daniel), para R$ 300 mil
reais, por um suposto defeito na roda. O STJ ainda não analisou o caso, embora o TJSP tenha
reconhecido uma culpa parcial do cantor na condução do veículo. Veja a gravidade dos fatos e
o valor da indenização. Conclui-se que o Brasil não adota essa teoria.
Por fim, a terceira defende que a indenização por danos morais tem caráter
compensatório, caráter reparatório, mas também tem um caráter pedagógico, disciplinador,
visando coibir novas condutas. Não pode ser ínfima a indenização a fim de fomentar a prática
ilícita pelo ofensor. Esta é a corrente que prevalece.
Por fim, para concluir a indenização por danos morais, segue alguns casos que o STJ
tem enfrentado.
A presença de corpo estranho dentro de embalagens gera o dever de indenizar?
A presença de corpos estranhos encontrados dentro das embalagens de alimentos
gera ao consumidor o direito à indenização. A concessão de danos materiais é pacífica na
doutrina e na jurisprudência, tendo o consumidor o direito de ser reparado pelo valor pago no
produto viciado. A questão ganha certa controvérsia no que concerne à concessão de danos
morais. A jurisprudência majoritária tem concedido indenização por danos morais quando o
consumidor se depara com corpos totalmente estranhos ao alimento que ali deveria constar. O
Colendo Superior Tribunal de Justiça concedeu indenização por danos morais à consumidora
que encontrou um preservativo masculino dento do frasco de molho de tomate51. Em outro caso
a mesma corte superior concedeu indenização ao consumidor que se deparou com uma barata
dentro da lata de leite condensado52. O STJ tinha posição de que a indenização por danos morais
apenas tinha sentido se o alimento era ingerido pelo consumidor. Agora, o STJ fez a revisão de
sua posição, adotando a posição que já era firmada pela Ministra Nancy Andrighi, ou seja, de
que a compra de produto alimentício que contenha corpo estranho no interior na embalagem,
ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, expõe a saúde do consumidor a risco e, como
consequência, dá direito à compensação por dano moral, em virtude da ofensa ao direito
fundamental à alimentação adequada, resultante do princípio da dignidade da pessoa
humana53.
Questiona-se: a espera na fila do banco gera indenização por dano moral?
O ordenamento jurídico vigente autoriza que se legisle acerca do tempo máximo
permitido ao consumidor para aguardar em fila de atendimento de instituição financeira, sob
pena de ultrapassado esse tempo o banco indenizar o consumidor lesado. Entretanto, a
jurisprudência, de forma acertada, concluiu que não basta apenas ultrapassar o tempo máximo
de limite imposto pela legislação. Deve-se, todavia, existir algum fato atrelado à demora no
atendimento que possa causar ao consumidor lesão ao seu direito de personalidade, como
colocar em risco à saúde do consumidor. Apenas a espera por atendimento bancário, por tempo
superior ao previsto na legislação municipal ou estadual, não gera indenização por dano moral,
(incorporados na Due Process Clause of the Fourteenth Amendment to the United States Consitutition) para aferição
do quantum indenizatório: o grau de repreensão da conduta, a relação entre os danos compensatórios e os punitivos
e, por fim, a magnitude de sanções civis e criminais por condutas similares (que na época eram de US$ 2 mil dólares).
Ao final, a condenação reformada ficou em US$ 50 mil dólares, correspondente ao valor de um novo veículo. Tal
decisão confirmou um “enorme exagero” (gross excessiveness) na condenação e pacificou entendimento sobre a
matéria, constituindo um relevante precedente judicial, ao admitir a limitação do valor das punitive damages a bases
constitucionais. (Moraes, op. Cit., p. 240-245)”. SAMPAIO, Carla A. B. Aplicação da Teoria dos Punitive Damages às
Relações Trabalhistas. Monografia de Graduação em Direito. Faculdade Baiana de Direito, Salvador/BA, 2016.
51 STJ - REsp 1.317.611/RS – Relatora. Ministra. Nancy Andrighi – julgado em 12/6/2012 – informativo n. 499.
52 STJ – REsp 1.239.060/MG – Relatora Ministra - Nancy Andrighi - publicado no DJe de 10/5/2011.
53 STJ – REsp 1768009 – julgado em maio de 2019 – Ministra Nancy Andrghi.
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9. DANO ESTÉTICO
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admitindo a cumulação dos pedidos de indenização por danos morais e por danos estéticos, in
verbis: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral”.
O dano estético consiste na lesão direcionada a parte física do corpo humano,
transformando a parte bela em algo repugnante, repulsivo.
Para Teresa Ancona Lopes, professora da USP, quando se fala em dano estético
“estamos querendo significar a lesão à beleza física, ou seja, á harmonia das formas externas de
alguém”. (LOPEZ, Teresa Ancona. O Dano Estético – São Paulo: RT, 1980).
Estes danos estão presentes quando a pessoa tem uma ferida, uma cicatriz, um corte
na pele, quando sofre uma lesão ou a perda de um órgão, podendo ser inclusive interno, desde
que seja visível. A imputação também pode ser dano estético.
O dano estético é presumido, pois está exteriorizada a lesão (in re ipsa). Portanto, cabe
ao Magistrado analisar a lesão. Uma vez constatada o dano moral é presumido.
Dano moral coletivo é o dano que atinge ao mesmo tempo vários direitos da
personalidade de pessoas uma determinada categoria jurídica. Os danos morais coletivos não
têm caráter difuso.
O dano moral coletivo tem previsão no Art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor
e art. 1º, IV, Lei nº 7.347/85, in verbis:
(...)
Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações
de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:
(...)
Há uma diferença entre interesse difuso e coletivo. Difuso é o que é de todos e não é
de ninguém, ou seja, que pertence a coletividade. Coletivo, por sua vez, é aquilo que pertence
a uma determinada categoria jurídica.
O dano moral é in rei psa, ou seja, presumido. No entanto, assim atestou o STJ:
O dano moral coletivo se dá in rei psa, contudo, sua configuração somente ocorrerá
quando a conduta antijurídica afetar, intoleravelmente, os valores e interesses
coletivos fundamentais, mediante conduta maculada de grave lesão, para que o
instituto não seja tratado de forma trivial, notadamente em decorrência da sua
repercussão social56.
Nesse mesmo julgado acima, o STJ reconheceu o dano moral coletivo por abuso do
direito em razão de ter a emissora de televisão exibido filme fora do horário recomendado pelo
56
STJ - REsp 1840463 / SP – julgado em 19/11/2019.
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órgão competente, já que verificada a conduta que afronte gravemente os valores e interesses
coletivos fundamentais (Informativo de jurisprudência n. 663 de fevereiro de 2020).
O dano moral difuso ou coletivo só pode ser pleiteado por meio de ação civil pública.
Esse é o mecanismo para pleitear dano moral difuso e coletivo.
Por fim, o valor da condenação a título de dano moral coletivo vai para um Fundo
previsto no art. 13 da LACP. É um fundo para recompor o bem jurídico lesado.
A teoria da perda de uma chance ocorre quando a pessoa vê frustrada uma expectativa
que ela tinha e que, dentro da lógica do razoável, ela teria, caso as coisas tivessem seguido o
seu curso normal. É a perda da chance séria e real que justifica a indenização. Essa chance de
vitória deve ser séria e real.
Essa teoria foi importada da França (perte d’une chance).
O caso mais emblemático de aplicação a teoria da perda de uma chance foi no
julgamento de um caso envolvendo o programa famoso de uma emissora de televisão
denominado de “Show do Milhão” (REsp. 788.459, BA). Não obstante esse caso, essa mesma
teoria tem muita incidência em casos de responsabilidade civil por erro médico e do advogado.
Nesse tema de responsabilidade civil do advogado escreveu o Desembargador do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Ênio Santarelli Zuliani:
Perda de uma chance é uma expressão feliz que simboliza o critério de liquidação do
dano provocado pela conduta culposa do advogado. Quando o advogado perde
prazo, não promove a ação, celebra acordos pífios, o cliente, na verdade, perdeu a
oportunidade de obter, no Judiciário, o reconhecimento e a satisfação integral ou
completa de seus direitos (art. 5º, XXXV, da CF). Não perdeu uma causa certa; perdeu
um jogo sem que lhe permitisse disputá-lo, e essa incerteza cria um fato danoso.
Portanto, na ação de responsabilidade ajuizada por esse prejuízo provocado pelo
profissional do direito, o juiz deverá, em caso de reconhecer que realmente ocorreu
a perda dessa chance, criar um segundo raciocínio dentro da sentença condenatória,
ou seja, auscultar a probabilidade ou o grau de perspectiva favorável dessa chance.
Resulta que, em se confirmando que a ação não examinada (por erro do advogado)
era fadada ao insucesso, se fosse conhecida e julgada, o advogado, mesmo errando
no antecedente, não responde pela consequência. Isso porque equivale a afirmar
que a obrigação, mesmo mal desempenhada, terminou produzindo, por vias
oblíquas, o único resultado que dela se esperava, ou seja, absolutamente nada. No
entanto, concorrendo um mínimo de probabilidade de êxito (jurisprudência
favorável ao direito do cliente, embora não uniformizada), o juiz deverá considerar
310
313
Matheus Zuliani
essa possibilidade, dentro de critério jurídico razoável, e, com isso, fixar o quantum
(art. 944, do CC)57.
Sobre a teoria da perda de uma chance, nos termos da doutrina mais conceituada, sua
natureza é de direito material especial, estando entre o dano emergente e o lucro cessante.
Nesse sentido é a posição do STJ quando do julgamento do REsp Nº 1.757.936 – SP, que acolheu
o pedido de indenização pela perda de uma chance de um participante do programa Amazônia
– reality show, exibido pela TV Record em 2012.
Não existe critério determinado na lei para o arbitramento dessa indenização. No
entanto, sabe-se que o valor da indenização será sempre inferior ao da vantagem perdida, pois
caso fosse, estar-se-ia indenizando o próprio dano, que não é o propósito da indenização.
A responsabilidade civil por ato de terceiro está prevista nos artigos 932 e 933, ambos
do Código Civil.
É importante mencionar que as pessoas que são responsáveis respondem
objetivamente, desde que comprovada a culpa das pessoas por quem eles respondem (CC, art.
933).
Por isso que Álvaro Villaça de Azevedo fala em responsabilidade objetiva impura.
No inciso I do art. 932 temos a responsabilidade civil dos os pais, pelos filhos menores
que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia. Verifica-se pela redação do Código Civil
que o filho menor deve estar sob a autoridade de um dos pais e em sua companhia.
Os pais têm responsabilidade objetiva pelo ato culposo do filho. Assim, não precisa
provar a culpa dos primeiros, mas precisa demonstrar a dos segundos.
No inciso II art. 932 há a responsabilidade do tutor e do curador, pelos pupilos e
curatelados, que se acharem nas mesmas condições. Quando diz “nas mesmas condições”,
refere-se ao “sob sua autoridade e em sua companhia” do inciso antecedente. Nesse caso
também há responsabilidade objetiva impura, ou seja, comprovada a culpa do tutelado ou do
curatelado, tem a responsabilidade objetiva do tutor e do curador.
O inciso III, por sua vez, elenca a responsabilidade do empregador ou comitente, por
seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão
dele. Sobre essa responsabilidade, entende-se que não há necessidade de relação de emprego,
bastando a relação de pressuposição, baseada na confiança. Desta forma, a jurisprudência tem
dado uma interpretação ampliativa a essa relação de confiança. Pense na hipótese do sujeito
que empresta seu carro a outrem. Nota-se que essa conduta configura um contrato de
comodato. Se o comodatário atropelar alguém de forma culposa, o comodante será
responsabilizado com fundamento nesse inciso do art. 932 do Código Civil.
57ZULIANI, Ênio Santarelli in Responsabilidade Civil do Advogado apud James Eduardo de Oliveira – Código Civil
Comentado e Anotado – Doutrina e Jurisprudência – 2ª Edição – Editora Forense
311
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Matheus Zuliani
Por fim, o inciso V diz que são responsáveis os que gratuitamente houverem
participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia. O dispositivo diz uma regra clara,
se houve proveito do crime, certamente haverá a responsabilização até a quantia recebida.
Conjugado com o tema da responsabilidade civil por ato de terceiro, existe a questão
do direito de regresso. Nesse sentido, dispõe o art. 934 do Código Civil que diz: “Aquele que
ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou,
salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz”. A exceção
é a ausência do regresso do ascendente contra o descendente incapaz.
Todavia, poderá providenciar o que se chama de adiantamento de legítima, como se
nota do art. 2.010 do Código Civil. O adiantamento da legítima é a possibilidade de ser
descontado na herança um gasto extraordinário que o pai teve com o filho, por meio da colação.
Por fim, o Código Civil trata da responsabilidade solidária dos causadores do dano na
hipótese geral e também na hipótese da responsabilidade por ato de terceiro. Dispõe o 942 que
“os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação
58Enunciado 191 da III Jornada de Direito Civil: “A instituição hospitalar privada responde, na forma do art. 932, III,
do Código Civil, pelos atos culposos praticados por médicos integrantes de seu corpo clínico”.
312
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Matheus Zuliani
do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela
reparação”. Complementa o parágrafo único que são solidariamente responsáveis com os
autores os coautores e as pessoas designadas no art. 932 do Código Civil.
Dispõe o art. 936 do Código Civil que o dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano
por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.
Não havendo culpa exclusiva da vítima ou força maior, haverá uma causa excludente
do nexo de causalidade.
Na verdade, a responsabilidade civil do dono ou detentor do animal é objetiva.
Não se fala mais em culpa in custodiendo.
A lei não prevê mais a excludente do “máximo cuidado na guarda”, que trazia a ideia
de culpa presumida (Sérgio Cavalhieri Filho). Pelo CC/16, se o dono do animal provasse que
tivesse tomado o máximo cuidado na guarda, ele não respondia. Se provar hoje que teve esse
máximo cuidado na guarda, ele responde. Hoje, para não responder, deve-se provar culpa
exclusiva da vítima ou força maior.
A jurisprudência tem aplicado esse dispositivo ao lado do Código de Defesa do
Consumidor, em diálogo das fontes. O STJ, no caso do menor que foi morto por leões durante
espetáculo de circo instalado na área contígua a shopping center, decidiu aplicar tanto o Código
Civil quanto o Código de Defesa do Consumidor59.
É possível reconhecer culpa concorrente da vítima para atenuar a responsabilidade do
dono ou detentor do animal. Isso seria uma calibração do nexo de causalidade.
O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína,
se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta. É o que dispõe o art. 937
do Código Civil.
Essa é uma primeira hipótese de responsabilidade civil pelo fato da coisa.
Neste caso, o dono da construção responde objetivamente por dois motivos. O
primeiro é pelo risco criado ou pelo risco proveito. A segunda é pela aplicação do Código de
Defesa do Consumidor, quando for o caso.
Essas situações, na imensa maioria dos casos, estarão inseridas dentro da
responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor. Isso porque o morador do prédio
59
REsp 1.100.571-PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 7/4/2011 - Informativo de jurisprudência n. 468
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Matheus Zuliani
será considerado como consumidor direto (quem comprou o apartamento) e a vítima do evento
serão consideradas consumidores por equiparação (bystander).
Perceba que não é defenestração, ou seja, não se trata de coisas jogadas da janela.
Aqui é o prédio em ruínas. O Código exige que essa necessidade de reparos seja manifesta.
Por falar em objetos que caem da janela, dispõe o art. 938 que “aquele que habitar
prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem
lançadas em lugar indevido”.
Fenestra é janela. Defenestrar é jogar pela janela.
Trata-se de mais um caso de responsabilidade civil objetiva em razão da coisa.
Fala-se também em responsabilidade civil por effusis et dejectis (effusis é líquido e
dejectis é sólido).
O responsável pela conduta é aquele que habitar o prédio. Nesse sentido, ainda que o
imóvel esteja alugado, a responsabilidade é do locatário.
A responsabilidade é objetiva diante de um risco criado.
E se a coisa for lançada de um condomínio edilício, quem responde caso não se consiga
identificar o responsável?
O entendimento majoritário é no sentido de que responderá todo o condomínio,
assegurado o direito de regresso contra o culpado. Nesse sentido, REsp. 64682/RJ. Venosa
chama isso de “pulverização de responsabilidade” (responde todo o condomínio).
314
317
CAPÍTULO 8 – DIREITO DAS FAMÍLIAS
1. DIREITO DE FAMÍLIA
Para quem atua da área de Direito de Família, ou mesmo para preparação para
concursos públicos, a exata compreensão dos princípios que a seguir serão expostos ajudará na
solução de questões para as quais, numa análise inicial, parece não haver regra aplicável.
Conhecê-los e, sobretudo, compreendê-los fará a diferença na hora da prova e na prática
jurídica, para solução de casos concretos.
É importante, então, traçar as diferenças entre princípios e regras, o que, ao final,
evidenciará a importância dos princípios até para correta compreensão e aplicação da regra.
Sobre o tema, Maria Berenice Dias explica que
os princípios são normas jurídicas que se distinguem das regras, não só porque têm
alto grau de generalidade, mas também por serem mandatos de otimização.
Possuem um colorido axiológico mais acentuado do que as regras, desvelando mais
nitidamente os valores jurídicos e políticos que condensam. Devem ter conteúdo de
validade universal. Consagram valores generalizantes e servem para balizar todas as
regras, as quais não podem afrontar as diretrizes contidas nos princípios (DIAS, 2020,
p. 58).
Como se extrai das palavras de Maria Berenice, os princípios têm esse grau
generalizante, de modo que sua violação é mais ampla e, por conseguinte, mais grave que a
violação de uma regra. As regras, por sua vez, e como também ensina Maria Berenice,
315
318
são normas que incidem sob a forma “tudo ou nada”, o que não sucede com os
princípios. Quando, aparentemente, duas regras incidem sobre o mesmo fato, é
aplicada uma ou outra, segundo critérios hierárquico, cronológico ou de
especialidade. Aplica-se uma regra e considera-se a outra inválida. As regras podem
ser cumpridas ou não, contêm determinações de âmbito fático e jurídico com baixa
densidade de generalização. Quando são admitidas exceções, não se está frente a
um princípio, mas de uma regra concorrente ou subordinada à outra que lhe é
incompatível ou contrária (DIAS, 2020, p. 59).
316
319
Entretanto, a igualdade dos filhos, protegida pela Constituição, não impede que haja,
por exemplo, diferenciação de valores na fixação dos alimentos. É que a igualdade deve ser
compreendida a partir da consideração das eventuais desigualdades existentes, sob pena de
amparar tratamentos desiguais. Este foi, inclusive, o entendimento do STJ, no voto conduzido
pela Ministra Nancy Andrighi (Recurso Especial nº 1.624.050/MG, 18/06/2018), que muito bem
ponderou que o princípio da igualdade não tem natureza inflexível e que, a depender do caso
concreto, a fixação do mesmo valor a proles distintas, sem uma análise criteriosa, acabaria, em
essência, por dar tratamento desigual.
c) Princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros: o artigo 226, § 5º, da
Constituição Federal, ao demonstrar a preocupação quanto à igualdade entre os cônjuges e
companheiros de uma entidade familiar, estabelece a isonomia substancial entre eles, de modo
que, por exemplo, havendo divergência na condução da família, nenhuma das vontades
prevalecerá sobre a outra, devendo a questão ser, então, resolvida pelo poder judiciário. Isso
porque, diferentemente do que ocorria na legislação de 1916, atualmente a condução do lar é
exercida de forma igualitária.
Em decorrência dessa igualdade, a escolha do domicílio compete a ambos os
cônjuges/companheiros; um cônjuge pode adotar o sobrenome do outro; há reciprocidade do
direito aos alimentos entre os cônjuges e companheiros e ambos os genitores exercem de forma
igualitária o poder familiar.
d) Princípio da não intervenção na família: também conhecido como princípio da
liberdade, encontra fundamento no artigo 226, caput, CF, que estabelece que a família é a base
da sociedade, tendo especial proteção do Estado e nela não podendo haver intervenção. Na
mesma linha, o art. 1.513 do CC diz que é proibido a qualquer pessoa de direito público ou
privado interferir na comunhão de vida instituída pela família.
Ainda relacionado ao princípio da não intervenção, temos que o § 7º da CF, seguido do
art. 1.565, §2º, estabelecem que o planejamento familiar é de livre decisão do casal, sendo
vedada qualquer tipo de coerção. Essa vedação, entretanto, não impede que o Estado incentive
o controle de natalidade, planejamento familiar ou eduque as famílias por meio de políticas
públicas. Porém, a decisão final deve ser sempre do casal. O dispositivo constitucional que trata
do planejamento familiar foi regulamentado pela Lei nº 9.623/1996.
e) Princípio do maior interesse da criança e do adolescente: é clara a opção
constitucional pela garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes em todos os níveis de
convivência; ou seja, tanto no espaço familiar como no meio social, de forma a garantir que se
buscará sempre aplicar o que for melhor para a criança e para o adolescente.
Assim é que a ideia do princípio do maior interesse da criança e do adolescente vem
consagrada no art. 227, caput da CF. A Constituição diz que é dever da família, da sociedade e
do Estado, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem (entre 15 e 29 anos), com absoluta
prioridade, o direito à vida, saúde, alimentos, educação, lazer, profissionalização, cultura,
dignidade, direito ao respeito, liberdade, convivência familiar e comunitária, além de colocá-los
a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
Veja que a proteção é conferida não só à criança e ao adolescente, como também ao
jovem em geral, sendo de se destacar que é possível ser adolescente e jovem ao mesmo tempo.
Dos 12 aos 16, o enquadramento é como adolescente e, de 15 a 29 anos, o indivíduo é tido como
jovem. Em sendo assim, um menor com, por exemplo, 15 anos, é considerado adolescente e
jovem.
A extensão, ao jovem, da proteção conferida à criança e ao adolescente é claramente
exposta no caput do artigo 227 da CF, que diz:
317
320
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e
ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à
liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
318
321
por qualquer dos pais e seus descendentes, dentre outras, consideradas todas no amplo
conceito de família constitucionalmente protegida (art. 226,CF);
d) o direito à convivência familiar como prioridade absoluta da criança e do adolescente
(art. 227, CF).
f) Princípio da função social da família: é extraído do art. 226 da CF, que estabelece que
a família é a base da sociedade, recebendo uma especial proteção do Estado. Em assim sendo,
as relações familiares serão analisadas dentro do contexto social, dentro daquilo que a
sociedade hoje apresenta ao Estado. Se a sociedade muda, é preciso que a concepção de família
também seja alterada, para, assim, atender ao ideal de realização de todos os integrantes da
entidade familiar. Em assim fazendo, estará atendendo a essa função social da família.
O princípio da função social da família é, por assim dizer, um reflexo do movimento de
mudança do paradigma liberal-individualista, apoiado fortemente na teoria positivista, para o
paradigma social-personalista, representado por teorias pós-positivistas que colocam a pessoa
humana no centro das atenções.
A pessoa passa a ocupar o lugar que outrora foi destacado ao patrimônio, de forma que
são incorporados valores éticos e sociais para a interpretação e aplicação do Direito.
Temos, então, que a família é a base da sociedade e que, além disso, tem uma função
social que deve ser considerada nas mais diversas interpretações que se façam sobre esse
instituto.
g) Princípio da paternidade responsável: impõe a observância quanto à obrigação dos
pais de respeitarem, educarem, criarem e auxiliarem material e imaterialmente os filhos,
podendo decorrer, da sua ausência, responsabilização cível e criminal.
Como reforço a esse princípio, o Estado, embora não possa impor o planejamento
familiar, confere instrumentos de educação e preparação para esse planejamento, a fim de que
pais e mães tenham consciência de que o exercício da maternidade e da paternidade deve
ocorrer de forma responsável, com vistas ao respeito à dignidade da pessoa do(a) filho(a).
319
322
significa dizer que suas normas (do Código Civil) hão de ser interpretadas em
conformidade com os princípios e regras que a Constituição estabeleceu para a
família no ordenamento jurídico nacional, animados de valores inteiramente
diferentes dos que predominavam na sociedade brasileira, na época em que se deu
a redação do capítulo relativo ao pátrio poder do Código de 1916, que, em grande
medida, manteve-se no capítulo destinado ao poder familiar para a família do século
XXI. As palavras utilizadas pelo legislador de 1916, reaproveitadas pelo legislador do
novo Código, são 70 apenas signos, cujos conteúdos deverão ser hauridos dos
princípios e regras estabelecidos pela Constituição (LÔBO, 2004, p. 182).
320
323
Vejamos, então, os tipos de famílias:
a) Família matrimonial: é aquela oriunda do casamento. O casamento, conforme
estudaremos mais a frente, pode ser classificado em avuncular, nuncupativo, por procuração,
consular, civil e religioso com efeitos civis. Qualquer que seja a forma adotada, o casamento dá
origem à denominada família matrimonial.
b) Família convivencial ou informal/união estável: é aquela decorrente da união
de pessoas com objetivo de constituição de família. Como visto, a partir dos importantes
julgados ADI 4.277 e ADPF 132, do STF, se caracterizam pela união pública e notória entre
pessoas do mesmo sexo ou de sexos diversos, com o objetivo de constituírem família. A união
estável, no tópico próprio, será objeto de estudo mais aprofundado, tendo em vista a sua
complexidade e o número considerável de questões dos últimos certames que abordam essa
temática.
c) Família homoafetiva (ADPF n° 132/RJ, ADI n° 4.277/DF e REsp. 1183378/RS):
essa conceituação se aplica tanto à união estável quanto ao casamento entre pessoas do mesmo
sexo. A partir da leitura conforme a Constituição Federal dos dispositivos que versam sobre
esses institutos, houve um alargamento do conceito de família, para atender ao princípio da
dignidade da pessoa humana. Conforme será mais bem analisado em tópico próprio, as uniões
de pessoas do mesmo sexo eram tratadas como sociedades de fato e analisadas pelo Estado,
quando promovidas ações judiciais para tanto, apenas no aspecto material, desconsiderando-
se todo o afeto existente a sua própria função social. Os julgados mencionados constituem,
assim, um marco na evolução do conceito de família e a realização do princípio da dignidade da
pessoa humana.
d) Família monoparental: é a entidade familiar constituída por qualquer um dos
genitores com sua respectiva prole. A Constituição Federal, de forma expressa, em seu artigo
226, § 4º, faz referência a esse tipo de família para fins de proteção do Estado.
e) Família anaparental: é a família caracterizada pela ausência dos genitores. Um
exemplo que pode ser citado é a entidade familiar constituída dos netos e avós, sem a presença
dos pais. Ainda podemos citar irmãs ou irmãos que vivam juntos sem os pais, dentre outros.
f) Família mosaico ou reconstituída: é uma conceituação que decorre da
constatação da existência de famílias que são reconstituídas, sendo formadas a partir de entes
oriundos de outras famílias que foram desfeitas pelos mais variados motivos. Pode-se, aqui, usar
a expressão que diz: “os meus, os seus e os nossos”, indicando que essas famílias formam-se,
portanto, quando pais ou mães solteiros/viúvos contraem novas relações, levando seus
respectivos filhos para a nova entidade familiar. Tem-se uma “mistura” de vínculos e relações
anteriores. Venosa trata dessa modalidade de família, esclarecendo que “a proteção do Estado
deve ser dirigida às famílias reconstituídas, que com frequência abrangem filhos de duas
estirpes, padrastos e madrastas, depois de uma nova união dos cônjuges. O Código Civil não
traçou um desenho claro dessas famílias, cujas questões ficam a cargo dos tribunais que sempre
devem ter em mira a afetividade e a dignidade da pessoa humana” (VENOSA, 2016, p. 24).
g) Família unipessoal, solitária, single ou celibatária: essa é uma classificação nem
sempre aceita, na medida em que para grande parte da doutrina, a família envolve pelo menos
duas pessoas. O professor Conrado Paulino, em sua obra “Direito de Família Contemporâneo”,
assevera que apesar de não haver uma uniformidade na jurisprudência quanto ao tema, não
podemos esquecer o papel da família unipessoal. O jurista cita, como exemplo, o entendimento
sumular do STJ que estabelece proteção para o bem de família da pessoa solteira, viúva e
divorciada (Súmula 364/STJ: “O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange
também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.”) Para alguns autores, a
exemplo de Paulo Lôbo (LÔBO, 2018, p. 1),
321
324
preenchido o requisito da afetividade para caracterização como entidade familiar
não expressa na Constituição, pois a afetividade somente pode ser concebida em
relação ao outro.
322
325
eudemonista, que busca a felicidade individual vivendo um processo de emancipação de seus
membros” (DIAS, 2015, p. 52).
323
326
à vida privada, as quais seriam direito da personalidade e, por último, dever-se-ia
considerar a âncora normativa do § 1º do art. 5º da CF. Destacou, outrossim, que
essa liberdade para dispor da própria sexualidade inserir-se-ia no rol dos direitos
fundamentais do indivíduo, sendo direta emanação do princípio da dignidade da
pessoa humana e até mesmo cláusula pétrea. Frisou que esse direito de exploração
dos potenciais da própria sexualidade seria exercitável tanto no plano da intimidade
(absenteísmo sexual e onanismo) quanto da privacidade (intercurso sexual).
Asseverou, de outro lado, que o século XXI já se marcaria pela preponderância da
afetividade sobre a biologicidade. Ao levar em conta todos esses aspectos, indagou
se a Constituição sonegaria aos parceiros homoafetivos, em estado de prolongada
ou estabilizada união — realidade há muito constatada empiricamente no plano dos
fatos —, o mesmo regime jurídico protetivo conferido aos casais heteroafetivos em
idêntica situação.
ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADI-4277)ADPF 132/RJ, rel. Min.
Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132) (INF. 625/2011).
324
327
institucional que permitisse a proteção dos direitos fundamentais em apreço
contribuiria para a discriminação. No ponto, ressaltou que a omissão da Corte
poderia representar agravamento no quadro de desproteção das minorias, as quais
estariam tendo seus direitos lesionados. O Presidente aludiu que a aplicação da
analogia decorreria da similitude factual entre a união estável e a homoafetiva,
contudo, não incidiriam todas as normas concernentes àquela entidade, porque não
se trataria de equiparação. Evidenciou, ainda, que a presente decisão concitaria a
manifestação do Poder Legislativo. Por fim, o Plenário autorizou que os Ministros
decidam monocraticamente os casos idênticos ADI 4277/DF, rel. Min. Ayres Britto, 4
e 5.5.2011. (ADI-4277)ADPF 132/RJ, rel. Min. Ayres Britto, 4 e 5.5.2011. (ADPF-132)
(INF. 625/2011).
325
328
2. CASAMENTO
O casamento pode ser conceituado pela união de duas pessoas, de forma reconhecida
e regulamentada pelo Estado, em que se objetiva estabelecer uma família, baseada no vínculo
de afeto, estabelecendo comunhão plena de vida entre os cônjuges. Para estabelecimento da
família, por meio do casamento, há certa formalidade em obediência às disposições legais, que
se enquadram como normas de ordem pública.
Como dito anteriormente, o direito de família é um ramo com marcante evolução de
interpretação em razão da própria evolução da sociedade. Quando analisamos o conceito de
casamento, percebemos bem essa evolução na interpretação, já que, ao se analisar os manuais
de Direito Civil mais antigos, constataremos que a conceituação passa pelo reconhecimento da
união entre um homem e uma mulher. Esse era, inclusive, um dos requisitos de existência do
casamento, ou seja, a diversidade de sexos.
Com as já mencionadas decisões do STF, que deram nova interpretação ao conceito de
união estável, houve ampla discussão acerca da ampliação, nos mesmos termos, da
interpretação do conceito de família matrimonial. Assim é que o STJ, enfrentando a matéria,
decidiu que o requisito da diversidade de sexos deveria ser afastado, para se reconhecer a
possibilidade de casamento homoafetivo. No referido julgado, entendeu-se que
(...) as famílias formadas por pessoas homoafetivas não são menos dignas de
proteção do Estado se comparadas com aquelas apoiadas na tradição e formadas
por casais heteroafetivos (...) o mesmo raciocínio utilizado tanto pelo STJ quanto
pelo STF para conceder aos pares homoafetivos os direitos decorrentes da união
estável deve ser utilizado para lhes proporcionar a via do casamento civil, ademais
porque a CF determina a facilitação da conversão da união estável em casamento
(art. 226, § 3º) (STJ, REsp 1.183.378-RS, 4ª T., rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 25-10-
2011).
326
329
b) Concepção institucionalista ou teoria da instituição: como o próprio
nome diz, para os adeptos dessa teoria, o casamento seria uma instituição, já que, não
obstante a manifestação inicial de vontade, todos os seus efeitos decorrem da lei e não
propriamente da vontade dos nubentes. Como bem explica Carlos Alberto Gonçalves,
“para essa corrente o casamento é uma ‘instituição social’, no sentido de que reflete
uma situação jurídica cujos parâmetros se acham preestabelecidos pelo legislador”
(GONÇAVES, 2017, p. 46).
c) Concepção mista ou eclética ou teoria mista: nascida da divergência
das teorias anteriores, essa corrente mescla o entendimento das teorias contratualista
e institucionalista, entendendo, então, que o casamento é um contrato quando
analisado na sua formação (acordo de vontade) e uma instituição quanto à análise de
seus efeitos, já que decorrentes da lei e não da vontade dos contraentes. Sobre essa
natureza mista, Caio Mário esclarece que “considerado como ato gerador de uma
situação jurídica (casamento-fonte), é inegável a sua natureza contratual; mas, como
complexo de normas que governam os cônjuges durante a união conjugal (casamento-
estado), predomina o caráter institucional” (PEREIRA, 2018, p. 59).
327
330
de outro lado, argui-se o leitmotiv da verificação das condições matrimoniais
(PEREIRA, 2018, p. 96).
328
331
A menção à classificação da legislação revogada é feita aqui em razão de alguns
concursos ainda usarem essa nomenclatura antiga quando da cobrança dessa temática. Então,
deve ficar claro que na legislação de 1916, tínhamos a seguinte previsão: impedimentos
dirimentes públicos; os impedimentos dirimentes privados e os impedimentos impedientes. Na
legislação vigente, os impedimentos dirimentes públicos correspondem aos impedimentos,
previstos no artigo 1.521 do CC; os impedimentos dirimentes privados foram incluídos entre as
causas de anulação do casamento, previstas no artigo 1.550, CC, e os impedimentos impedientes
correspondem às causas suspensivas, previstas no artigo 1.523 do CC.
Como dito, os impedimentos referem-se a situações específicas dos nubentes, de forma
que uma pessoa pode ter capacidade para o casamento, por já ter alcançado a idade núbil, mas
estar impedido para o casamento com determinado pretendente (por exemplo, não pode se
casar com o padrasto).
Passemos, então, ao estudo da teoria dos impedimentos matrimoniais, considerando a
legislação vigente. O Código Civil traz a seguinte classificação:
a) Impedimentos matrimoniais: previstos no artigo 1.521 do CC. O rol das pessoas que
não podem casar é taxativo, tratando-se de matéria de ordem pública. Caio Mário esclarece a
razão de ser desses impedimentos, ensinando que
na primeira ordem dos impedimentos vêm aqueles que, por motivos de moralidade
social, a ordem jurídica inscreve como portadores de maior gravidade, envolvem
causas que condizem com a instituição da família e a estabilidade social. Por isto
mesmo, pode sua existência ser acusada por qualquer pessoa e pelo órgão do
Ministério Público na sua qualidade de representante da sociedade. É nulo o
matrimônio celebrado com a sua infração (PEREIRA, 2018, p. 105).
Assim, o artigo 1.521 do CC traz um rol taxativo dos que não podem se casar,
considerando, para tanto:
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do
adotante;
VI - as pessoas casadas;
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no Brasil, esse impedimento tem sofrido variações: no direito pré-codificado
compreendia apenas o segundo grau, sendo frequentes as uniões conjugais entre tio
e sobrinha; o Código Civil de 1916 levou-o ao terceiro, com aplausos da doutrina,
mas o Decreto-Lei nº 3.200, de 19 de abril de 1941, admitiu possa levantá-lo o juiz e
autorizar o casamento, à vista de laudo proferido por dois médicos por ele
designados, que examinem os nubentes e atestem a inexistência de motivos que o
desaconselhem (PEREIRA, 2018, p. 107).
Assim, o Decreto-Lei 3.200 autorizou o casamento entre tios e sobrinhos, desde que
houvesse o laudo atestando a inexistência de motivos que desaconselhassem o enlace. O
mencionado Decreto-Lei é anterior a 2002 e sua redação não foi reproduzida no vigente Código
Civil, de modo que houve discussão sobre a permanência de sua aplicação com a entrada em
vigor do novo Código Civil.
Com efeito, a discussão passava pela consideração de que se o legislador do Código de
2002 quisesse autorizar o casamento dessas pessoas, teria feito a ressalva expressa, o que não
ocorreu, de modo que, para alguns juristas, não teria ocorrido a recepção do Decreto-Lei 3.200.
Sobre esse tema, na obra de Caio Mário, verificamos a seleção de posicionamentos de
diferentes juristas. Para tanto, há citação de juristas: “Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo
Pianovski Ruzik esclarecem: “não altera, portanto, o novo Código Civil o regime de casamento
entre tios e sobrinhos; haverá vedação legal, somente, se comprovada a inconveniência das
núpcias no que tange à saúde da prole” (PEREIRA, 2018, p.107).
Assim, esse tem sido um entendimento adotado, no sentido de que o atual Código Civil
Brasileiro não revogou o Decreto-Lei de 1941, ou seja, o Decreto de 1941 ainda está em vigor.
Ainda sobre esse tema, o enunciado aprovado pelo Conselho da Justiça Federal diz que
o inciso IV do art. 1.521 do novo Código Civil deve ser interpretado à luz do Decreto-Lei n.
3.200/41 no que se refere à possibilidade de casamento entre colaterais de 3º grau (En. 98, I
Jornada de Direito Civil).
Permite-se, então, o denominado casamento avuncular, desde que observado o
disposto no Decreto-Lei 3.200/41.
De forma geral, em relação aos efeitos, a existência de impedimentos matrimoniais
impossibilita que o casamento seja celebrado. A oposição dos impedimentos pode ocorrer até
o momento da celebração e por qualquer pessoa capaz (art. 1.522/CC).
Caso o oficial do registro tenha conhecimento da existência de algum impedimento,
deve reconhecê-lo de ofício.
A consequência do casamento eventualmente realizado com algum impedimento é a
nulidade absoluta.
b) Causas suspensivas do casamento: em algumas situações específicas, previstas no
artigo 1.523, do CC, o legislador não proíbe o casamento das pessoas ali elencadas, de modo
que, se realizado o matrimônio, não estará sujeito à nulidade absoluta e nem relativa.
Entretanto, em decorrência das situações excepcionais ali previstas, o casamento estará sujeito
à consequência específica, diretamente relacionada ao regime de bens. Estabelece o artigo
1.641, I, CC, que passa a ser obrigatório o regime da separação de bens para o casamento
celebrado com inobservância das causas suspensivas.
As causas suspensivas são, assim, previstas no artigo 1.523/CC, que estabelece que não
devem casar:
I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário
dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;
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II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado,
até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;
III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos
bens do casal;
A leitura das causas suspensivas, previstas no artigo 1.523/CC, bem demonstra que o
que se objetiva é evitar a confusão patrimonial dos(as) viúvos(as) que ainda não fizeram o
inventário dos bens do casal, bem como dos divorciados(as) que ainda não resolveram a partilha
do casamento anterior, e, ainda, evitar a confusão de sangue na hipótese de viuvez ou
desfazimento anterior da sociedade conjugal. Busca, ainda, evitar que o(a) tutor(a) se case com
a(o) tutelado(a) e adote um regime de bens que possa comprometer as contas relativas ao
período de tutela.
Em todas essas hipóteses mencionadas, o parágrafo único do artigo 1.523/CC prevê que
a causa suspensiva desaparece se for provada a ausência de prejuízo aos envolvidos.
É importante ressalvar que há limitação das pessoas que podem arguir a presença de
uma causa suspensiva. Somente poderá ser feita essa arguição até o momento da celebração
do casamento por parentes em linha reta de um dos cônjuges e pelos colaterais até o 2º grau
(irmão ou ascendente – pais, avós, sogros, irmãos e cunhados) (art. 1.525, CC).
Ademais, as causas suspensivas não podem ser conhecidas de ofício pelo juiz ou oficial
do registro civil, pois têm natureza privada.
Ainda no que tange à oportunidade da oposição, deve ser feita no processo de
habilitação: anunciadas as núpcias pela publicação dos proclamas, abre-se o prazo de 15 dias,
dentro do qual os interessados podem objetar contra o casamento. Decorrido in albis o lapso, e
passada a certidão de habilitação, é ainda lícita a apresentação da causa suspensiva, até o
momento da cerimônia. Com uma diferença, todavia: enquanto não certificada a habilitação, o
interessado dirige-se ao escrivão; depois dela, ao juiz. Formulada a oposição, suspende-se a
cerimônia (PEREIRA, 2018, p. 113).
O casamento celebrado com causa suspensiva, como se viu, tem, por imposição, o
regime da separação obrigatória de bens. Todavia, uma vez cessada a causa suspensiva, os
cônjuges poderão requerer a mudança de regime, cujo pedido será processado na forma do
artigo 1.639, § 2º do Código Civil.
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forma pessoal ou por meio de procurador. O requerimento deverá estar instruído com os
documentos arrolados na lei.
O processo de habilitação para o casamento desenvolve-se em quatro fases:
documentação, proclamas, certidão e registro.
a) Fase de documentação: estabelece o artigo 1.525/CC que o requerimento de
habilitação do casamento é firmado por ambos os cônjuges de próprio punho ou
por procurador e deve ser instruído com: certidão de nascimento ou documento
equivalente de ambos os pretensos cônjuges; autorização por escrito, se for o caso
em cuja dependência legal estiverem ou ato judicial que supra essa autorização;
declaração de duas testemunhas que atestem e conhecem os pretensos cônjuges, e
que não existam impedimentos entre eles; declaração de estado civil; declaração de
domicílio; declaração de residência atual dos pais dos contraentes; declaração de
residência atual dos próprios contraentes; se for o caso, juntar certidão de óbito do
cônjuge falecido ou da sentença que declarou a nulidade ou a anulação do
casamento anterior, transitada em julgado ou do registro da sentença de divórcio.
O art. 1.526/CC estabelece que essa habilitação será feita perante o Oficial de
registro civil, com audiência do MP. Já o parágrafo único do mesmo artigo, diz que
se houver impugnação do oficial ou do MP, ou de uma terceira pessoa, essa
habilitação será submetida ao juiz. Ou seja, se não houver a oposição ou essa
impugnação, não será necessária a submissão do processo de habilitação ao juiz,
prevalecendo, aqui, a ideia de desjudicialização da habilitação.
b) Fase de proclamas: conforme estabelece o artigo 1.527/CC, estando em ordem a
documentação, o oficial extrairá o edital, que se afixará durante 15 (quinze) dias nas
circunscrições do Registro Civil de ambos os nubentes e publicará na imprensa local
se houver. São os denominados proclamas do casamento. Esse edital deverá conter
um resumo do intento matrimonial dos nubentes, com seus nomes e dados, e
convocará terceiros a apontarem eventual impedimento de que tiverem
conhecimento. Para a confecção desse edital, o Oficial do Registro irá analisar
apenas a regularidade da documentação apresentada. Como se verá, existem
situações específicas em que a lei dispensa os proclamas, como, por exemplo, ocorre
no denominado casamento nuncupativo. Nessa fase dos proclamas, o artigo 1.528
estabelece que é dever do oficial do registro “esclarecer os nubentes a respeito dos
fatos que podem ocasionar a invalidade do casamento, bem como sobre os diversos
regimes de bens”. Nessa fase, poderão ser opostos os impedimentos e causas
suspensivas, que, conforme artigo 1.529/CC, deverão ser apresentados em
declaração escrita e assinada, instruída com as provas do fato alegado ou com a
indicação do lugar onde possam ser obtidas. Se houver oposição de impedimentos,
cumpre ao Oficial do Registro dar aos nubentes ou seus representantes nota da
oposição, indicando os fundamentos, as provas e o nome de quem a ofereceu (art.
1.530/CC). Com isso, cumprirá aos nubentes fazer prova contrária à arguição. Será
ouvido o Ministério Público e, ao final, a decisão caberá ao juiz.
c) Fase de certidão: findo o prazo dos proclamas, inexistindo oposição, ou sendo ela
julgada improcedente, e cumpridas as demais formalidades presentes em lei, será
extraída a certidão de habilitação, que é um certificado que habilita os nubentes ao
casamento, com prazo de 90 (noventa) dias. Nesse prazo, o casamento deverá ser
celebrado. O art. 1.532/CC indica que a certidão de habilitação tem validade por
noventa dias a contar o prazo da data em que foi extraído o certificado. Neste
período de tempo, os nubentes podem casar-se sem renovação do processo.
Escoado que seja, a sua revalidação depende de novo requerimento, podendo-se,
contudo, aproveitar a mesma prova apresentada no anterior (PEREIRA, 2018, p.
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125). Se a habilitação for indeferida, por qualquer motivo, caberá aos interessados
recorrer à via judicial, observando a Lei de Organização Judiciária local.
d) Fase de registro: com a celebração do casamento, que observará as disposições
previstas no artigo 1.533 e seguintes do CC, lavrar-se-á o assento no livro de registro.
Diz o artigo 1.536/CC que o assento será assinado pelo presidente do ato, pelos
cônjuges, as testemunhas e o oficial do registro. Esse assento destina-se a dar
publicidade ao casamento e servir de prova de sua realização e do regime de bens.
A celebração do casamento segue o regramento previsto no artigo 1.533 e seguintes do
Código Civil.
Conforme previsão legislativa, o casamento ocorrerá no dia e lugar previamente
designados pela autoridade que presidirá o ato.
O art. 98, II, da CF diz que a União, Estados, DF e territórios vão criar a Justiça de Paz, a
qual é remunerada, composta por cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, que
terão mandato de 4 anos, tendo competência para, dentre outras, celebrar casamentos. A Lei
de Organização Judiciária de cada Estado é que designa a referida autoridade. Em alguns
Estados, chama-se juiz de paz; em outros, o próprio juiz de direito é incumbido desse mister.
O ato solene do casamento será, em regra, realizado na sede do cartório com as portas
abertas, presentes pelo menos 2 testemunhas (art. 1.534, CC). O casamento poderá, entretanto,
ser realizado fora do cartório, com a concordância da autoridade, hipótese em que o edifício
escolhido para a celebração deverá permanecer com as portas abertas durante o ato. Neste
caso, sendo celebrado fora do cartório, o número de testemunhas que deverão estar presentes
será de no mínimo 4 testemunhas (art. 1.534, §2º, CC).
Também serão necessárias 4 testemunhas se algum dos contraentes for analfabeto, não
souber ou não puder escrever (art. 1.534, §2º, parte final).
As testemunhas, em qualquer dos casos, não são meramente instrumentárias, mas
participam do ato como representantes da sociedade, sem qualquer suspeição pelo fato de
serem parentes dos nubentes, uma vez que têm interesse, mais até que qualquer outra pessoa,
em que o enlace matrimonial se realize validamente (GONÇALVES, 2017, pg. 124).
Os nubentes deverão manifestar, de forma inequívoca, a vontade de se casarem, sendo
que, ocorrendo uma das hipóteses previstas no artigo 1.538/CC, a cerimônia será suspensa, não
sendo admitida retratação no mesmo dia. Assim é que se, brincando, um dos nubentes disser
que não quer se casar, não poderá se retratar no mesmo dia e a cerimônia será suspensa, só
podendo ser realizada em outra data. É o que estabelece o parágrafo único do artigo 1.538/CC.
Se esse não for o caso, o Oficial do Registro, após ouvir dos nubentes sobre a pretensão
do casamento por livre e espontânea vontade, vai declará-los casados, nos seguintes termos:
“De acordo com a vontade que ambos acabais de afirmar perante mim, de vos receberdes por
marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro casados” (arts. 1.514 e 1.535 do CC).
A discussão que se trava em relação a essa declaração do Oficial de Registro diz respeito
à sua natureza, ou seja, se seria declaratória ou constitutiva. Em outras palavras, a discussão gira
em torno de se saber qual o momento em que se considera aperfeiçoado o casamento: no
momento da manifestação de vontade dos nubentes (hipótese em que a declaração do Oficial
deve ser considerada apenas declaratória da vontade dos nubentes) ou somente após a
manifestação do Oficial de Registro (caso em que essa declaração seria constitutiva do
casamento).
A importância da discussão se refere à situação, por exemplo, de os nubentes
manifestarem inequivocamente a vontade de se casarem e um deles morrer antes da declaração
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do Oficial do Registro. Pergunta-se, nessa hipótese, se pode-se considerar celebrado ou não o
casamento?
Sobre o tema, Caio Mário explica que
já o Romano dizia que nuptias consensus facit: o que faz o matrimônio é o consenso.
O celebrante ouve a manifestação dos contraentes, e os declara casados. Como
representante do Estado, pronuncia a declaração de estarem unidos em matrimônio
aqueles que emitiram a manifestação de suas vontades neste sentido. A presença do
juiz é fundamental, mas sua declaração, sem embargo de boas opiniões em contrário
não é indispensável à validade do casamento (PEREIRA, 2018, pag. 130).
Em nossa opinião, a leitura dos artigos 1.514 e 1.535 do CC indica que o nosso Código
Civil considerou que é a vontade dos nubentes que determina o momento do casamento, sendo
que a manifestação do celebrante se revela como meramente declaratória.
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putatividade implicaria na prevalência do regime de bens e, consequentemente, haveria a
partilha do imóvel, na proporção de 50% para cada (comunhão parcial de bens).
O casamento putativo configura, assim, uma exceção à teoria das nulidades, conferindo
produção de efeitos mesmo na hipótese de nulidade. Configura uma indulgência com o cônjuge
de boa-fé, permitindo, mesmo com a declaração de invalidade, a produção de efeitos, até a
sentença, para o cônjuge de boa-fé, lembrando que, para a prole, o casamento mesmo
invalidado, sempre produzirá efeitos.
A apuração da boa-fé, como foi visto, ocorre no momento da celebração do casamento.
A boa-fé conceitual do matrimônio putativo é a ignorância da causa de sua nulidade,
não se exigindo a análise sobre a escusabilidade ou não do erro.
b) Casamento em caso de moléstia grave (art. 1.539/CC): estabelece a legislação que,
se um dos nubentes estiver acometido por uma moléstia grave, o presidente do ato, oficial de
registro, vai celebrar o casamento onde estiver a pessoa, podendo, inclusive, ser celebrado à
noite, se houver urgência.
O casamento é celebrado perante 2 testemunhas, e a urgência pode dispensar o
processo prévio de habilitação.
Prevê, ainda, a legislação que na falta ou impedimento da autoridade competente do
local, essa falta ou impedimento será suprida por qualquer dos substitutos legais do juiz de paz.
Se a falta for do oficial de registro, ela será suprida por um oficial ad hoc, nomeado pelo
juiz de paz para aquele ato.
c) Casamento nuncupativo ou extremis vitae momentis ou in articulo mortis (art.
1.540/CC): seria o casamento realizado na situação extrema, ou, como popularmente se diz, “à
beira da morte”.
O art. 1.540/CC diz que quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida,
não obtendo a presença da autoridade, a qual incumbiria presidir o ato, este casamento poderá
ser celebrado na presença de 6 testemunhas, que não tenham parentesco em linha reta ou
colateral com os nubentes.
Realizado o casamento nessa situação, as 6 testemunhas deverão comparecer perante
a autoridade judicial no prazo de 10 dias, pedindo que essa autoridade judicial tome por termo
suas declarações. Elas irão dizer, então, que foram convocadas por parte do enfermo. E que o
enfermo estava realmente em perigo de vida, mas estava em seu juízo, sabendo o que estava
fazendo, além de que, em sua presença, declararam os contraentes, livre e espontaneamente
receber-se por marido e mulher.
O pedido será autuado e, após a tomada das declarações das testemunhas, o juiz
procederá às diligências necessárias para verificar se os contraentes podiam ter-se habilitado.
Verificada a idoneidade dos cônjuges para o casamento, ele será tido como válido.
Essas formalidades todas serão dispensadas se o enfermo convalescer e puder ratificar
o casamento na presença do juiz e da autoridade competente (juiz de paz eventualmente, e o
oficial de registro).
d) Casamento por procuração (art. 1.542/CC): o casamento pode ser celebrado por
procuração, sendo esta por instrumento público, com poderes especiais. A eficácia desse
mandato não pode ultrapassar 90 dias. Inclusive, os dois nubentes podem se fazer representar
por procuradores na cerimônia de casamento. A pergunta que se coloca é: podem os dois
nubentes ter o mesmo procurador?
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Sobre o tema, Carlos Roberto Gonçalves explica que “Se ambos não puderem
comparecer, deverão nomear procuradores diversos. Como a procuração é outorgada para o
mandatário receber, em nome do outorgante, o outro contraente, deduz-se que ambos não
podem nomear o mesmo procurador, até porque há a obrigação legal de cada procurador atuar
em prol dos interesses de seu constituinte, e pode surgir algum conflito de interesses”
(GONÇALVES, 2017, p. 133).
Outorgada procuração para o casamento, posterior revogação do mandato deve ser por
instrumento público. No caso de se realizar a cerimônia, sem a ciência do mandatário e do outro
contraente acerca da revogação feita, o Código considera o casamento anulável (art. 1.550, V).
Neste caso, responde o mandante por perdas e danos.
e) Casamento avuncular: como já esclarecido em tópico próprio, o casamento de tio(a)
com sobrinho(a) é permitido desde que haja atendimento ao disposto no Decreto-Lei 3.200/41.
O casamento entre esses colaterais de terceiro grau é denominado avuncular.
f) Casamento religioso com efeitos civis: o art. 226, §2º da CF, diz que o casamento
religioso tem efeitos civis nos termos da lei. Essa matéria é regulamentada pelo art. 1.515/CC,
que estabelece que o casamento religioso, que atender às exigências da lei para validade do
casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos
a partir da data da sua celebração.
Portanto, esse registro terá efeitos retroativos à data da celebração do casamento
religioso.
Duas são as situações possíveis do casamento religioso com efeitos civis:
- 1ª situação: o casamento religioso foi precedido de habilitação, hipótese em que
deverá ser registrado no prazo decadencial de 90 dias, sob pena de nova habilitação.
- 2ª situação: o casamento religioso ocorreu sem prévia habilitação. Nessa hipótese, o
registro poderá ser feito a qualquer momento, desde que haja prévia habilitação, nos
termos já estudado.
Em qualquer hipótese, o registro do casamento retroagirá seus efeitos à data da
celebração do casamento.
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Além disso, é preciso que haja uma autoridade absolutamente competente, em razão
da matéria, para celebração do ato.
Nesse sentido, a partir desses dois requisitos, temos duas hipóteses de casamento
inexistente, a saber:
- casamento em que não há manifestação de vontade dos nubentes (ou vontade
decorrente de coação física); e
- casamento celebrado por autoridade absolutamente incompetente em razão da
matéria (pessoa que não era juiz de paz, por exemplo).
É importante destacar que antes da mudança de entendimento acerca do casamento
homoafetivo, constituía hipótese de inexistência do casamento a identidade de sexos dos
nubentes, porquanto se entendia que um dos requisitos de existência era exatamente a
diversidade de sexos. Como foi visto, essa hipótese perdeu a razão de ser em decorrência das
decisões do STF que trataram da união homoafetiva, reconhecendo-a como entidade familiar
com proteção do Estado. Após as decisões do STF, o CNJ, por meio da Res. 175/13, veda às
autoridades competentes de todo o Brasil a recusa à habilitação, celebração ou conversão de
união estável em casamento das pessoas do mesmo sexo.
b) Casamento nulo: o casamento nulo é aquele celebrado com infringência a
impedimento matrimonial, ou seja, a uma das hipóteses previstas no artigo 1.521/CC. Assim
sendo, qualquer casamento celebrado com violação aos impedimentos previstos no artigo
1.521/CC será nulo, ressalvando-se apenas a hipótese do casamento entre colaterais de terceiro
grau que, como visto, pode ser realizado, com observância ao disposto no Decreto-Lei 3.200/41.
A nulidade, aqui analisada, diferencia-se da anulabilidade porque não admite
convalidação, de modo que o casamento nulo não será aproveitado, devendo ser declarada a
nulidade, que retroage à data da celebração. A sentença, na hipótese, é declaratória, com
efeitos ex tunc.
São efeitos e características da competente ação cabível para declaração de nulidade do
casamento:
• imprescritível: a nulidade não vai se convalescer com o decurso do tempo;
• promovida por ação direta: pode ser proposta por qualquer interessado, e como se
trata de ordem pública, pode ser proposta pelo MP. Além disso, o próprio juiz, de
ofício, pode declarar a nulidade em questão;
• sentença que declara a nulidade tem efeitos retroativos à data de celebração do
casamento:não poderá prejudicar terceiros de boa-fé, tampouco aquisição de
direitos onerosos resultantes de sentença transitada em julgado. Deve-se, ainda,
observar o que foi dito acerca do casamento putativo, no qual, em razão da boa-fé
dos nubentes, haverá reconhecimento de direitos patrimoniais, mesmo com a
nulidade do casamento.
c) Casamento anulável: o casamento anulável é aquele sujeito à convalidação. As
hipóteses de anulabilidade estão previstas no artigo 1.550/CC e são elas:
- casamento de quem não completou a idade mínima para casar;
- casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante
legal;
- casamento por vício da vontade;
- casamento do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o
consentimento;
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- casamento realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da
revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
- casamento por incompetência da autoridade celebrante.
c.1) Casamento de quem não completou a idade mínima para casar: como vimos, após
a mudança legislativa que alterou a redação do artigo 1.520/CC, a idade mínima para casar
passou a ser 16 anos. Entretanto, se eventualmente o menor com idade inferior a 16 anos
conseguir se casar, esse casamento será anulável e não nulo.
O prazo decadencial para ação de anulação é de 180 dias (artigo 1.560, §1º, CC) e deve
observar que:
- se proposta pelo próprio menor, começa a contar da data em que completar 16 anos;
- se proposta pelos demais legitimados, começa a contar da data do casamento.
A ação anulatória, no caso, pode ser proposta (art. 1.552/CC):
- pelo próprio cônjuge menor;
- pelos seus ascendentes.
c.2) Casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu
representante legal: o casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu(s)
representante(s) legal(is), também é um casamento anulável.
O prazo para propositura da ação anulatória é de 180 dias (art. 1.555/CC) e deve
observar que:
- se proposta pelo menor, começa a contar da data em que cessar a incapacidade;
- se proposta pelo representante legal, começa a contar a partir da data da celebração
do casamento;
- se, por fim, proposta por um herdeiro necessário, começa a contar da data do óbito do
menor.
O transcurso do prazo decadencial, sem que haja anulação, importará em sua
convalidação para todos os efeitos.
É importante destacar o disposto no §2º do artigo 1.555/CC, que estabelece que não se
anulará o casamento quando à sua celebração houverem assistido os representantes legais do
incapaz ou tiverem, por qualquer motivo, manifestado sua aprovação.
c.3) Casamento com coação moral: a lei prevê também que o casamento realizado com
coação moral será anulável. A coação moral, conforme artigo 1.558/CC, ocorre quando o
consentimento de um ou de ambos os cônjuges houver sido captado mediante fundado temor
de mal considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares.
Nessa situação, o prazo decadencial para a ação anulatória será de 4 anos, contados da
celebração do casamento (art. 1.560,IV/CC).
A ação, no caso da coação moral, é personalíssima, somente podendo ser proposta pelo
coagido (art. 1.559/CC).
O artigo 1.559/CC prevê, ainda, que na hipótese de coação, a coabitação, havendo
ciência do vício, valida o ato. É mais uma hipótese de convalidação.
c.4) Casamento com erro essencial: o vício de vontade consistente no erro essencial
também é hipótese de anulação do casamento. É importante destacar que para anulação do
casamento nessa hipótese de erro, é preciso que estejam reunidos os seguintes requisitos de
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forma cumulativa: erro essencial anterior ao casamento (hipóteses previstas no artigo 1.557/CC)
+ descoberta após o casamento + a descoberta torna a vida em comum insuportável.
Consoante artigo 1.557/CC, considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro
cônjuge:
i) O erro que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal
que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado. A
doutrina costuma citar, como exemplos de erro sobre a pessoa: casamento com um dos gêmeos
quando se pretendia com o outro; atividades de prostituição do homem ou da mulher;
perversão do instinto sexual; homossexualidade desconhecida;
ii) A ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne
insuportável a vida conjugal: um exemplo dessa hipótese seria o caso de a mulher descobrir,
após o casamento, que o marido era traficante de drogas;
iii) A ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não
caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz
de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência: a doutrina cita, como
exemplo, a hipóteses de hermafroditismo. Cabe destacar que o defeito físico, citado nesse
inciso, que enseja a anulação do casamento é o defeito que impede o ato sexual, ou seja, a
incapacidade denominada coeundi ou incapacidade instrumental. Isso significa que a chamada
incapacidade generandi ou incapacidade de fecundação (incapacidade para ter filhos) não é
hipótese de anulação do casamento
O prazo decadencial para anular o casamento por erro in persona é de 3 anos, contados
da celebração do casamento (art. 1.560, III/CC). Essa ação também é personalíssima (art.
1.559/CC).
A coabitação posterior, sabendo do vício, convalida o casamento, salvo nas hipóteses de
defeito físico irremediável ou a moléstia grave (art. 1.559/CC).
c.5) Casamento do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o
consentimento: o casamento do incapaz de consentir ou de manifestar a sua vontade de modo
inequívoco pode ser anulado. Essa situação engloba o casamento dos ébrios habituais,
alcoólatras, viciados em tóxicos e daquelas que por causa transitória não puderem exprimir a
sua vontade. Nestes casos, o casamento será considerado anulável.
Dessa forma, percebe-se que o inciso IV do artigo 1.550 não foi revogado pelo Estatuto
do Deficiente, o qual acrescentou o § 2º ao mesmo artigo, segundo o qual “a pessoa com
deficiência mental ou intelectual em idade núbia poderá contrair matrimônio, expressando sua
vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador”.
Nesses casos, o prazo decadencial para anulação do casamento também é de 180 dias,
contados da celebração do casamento (art. 1560, I/CC).
c.6) Casamento realizado por procuração com revogação antes da celebração, mas
sem conhecimento do mandatário e do outro cônjuge: pode acontecer de a revogação
outorgada para o casamento ser revogada sem que o mandatário e o outro cônjuge tomem
conhecimento da revogação. Nessa hipótese, realizada a celebração, o casamento será anulável.
O prazo da ação anulatória será decadencial de 180 dias, contados do momento em que
o mandante toma o conhecimento de que o casamento, a despeito da revogação do mandato,
foi celebrado (art. 1.560, §2º/CC).
A legitimidade para a ação de anulação, nessa hipótese, é apenas do mandante, em
caráter personalíssimo, sendo o ato convalidado pela coabitação (art. 1.550, V, parte final/CC).
339
342
c.7) Casamento realizado por autoridade relativamente incompetente: foi visto,
quando da análise do plano da existência do casamento, que a celebração feita por autoridade
absolutamente incompetente importa em inexistência do casamento. Já a celebração realizada
por autoridade relativamente incompetente ensejará a anulabilidade do ato.
A incompetência relativa do celebrante está relacionada à região em que pode celebrar
casamentos. Assim, um juiz de paz é investido pelo Estado dos poderes para celebração de
casamentos, tornando-se autoridade absolutamente competente para o ato. Porém, sua
competência tem limitação territorial, que, uma vez não observada, enseja a anulabilidade do
casamento.
O prazo será decadencial de 2 anos, contados da data da celebração do casamento (art.
1.560,II/CC).
Sobre a incompetência da autoridade celebrante, é importante destacar o disposto no
art. 1.554/CC que trata da denominada teoria da aparência, aplicável ao celebrante. Diz o
referido artigo que subsiste o casamento celebrado por aquele que, sem possuir a competência
exigida na lei, exercer publicamente as funções de juiz de casamentos e, nessa qualidade, tiver
registrado o ato no Registro Civil.
d) Casamento eficaz: vimos que os três primeiros planos de análise do casamento são
os planos da existência e da validade. Isso significa que antes de analisarmos a eficácia do
casamento, é preciso verificar se ele existe e se é válido. Em outras palavras, é preciso antes
verificar se houve consentimento livre de coação física e se o celebrante era absolutamente
competente para a celebração. Preenchidos esses requisitos, o casamento será existente e
poder-se-á analisar sua validade, com a verificação de há hipótese de nulidade (violação aos
impedimentos) ou anulabilidade (art. 1.550/CC). Não sendo o caso de nulidade ou anulabilidade,
a análise será, então, quanto a eficácia do casamento.
A eficácia de qualquer fato jurídico em sentido amplo refere-se à produção dos efeitos.
No caso do casamento, superados os planos da existência e da validade, o casamento
está apto a produzir todos os efeitos previstos em lei.
O casamento válido produz, então, vários efeitos, tanto no plano pessoal, quanto no
social e patrimonial.
Podemos resumir os efeitos no seguinte esquema:
- fidelidade mútua;
- coabitação;
- mútua assistência e respeito e consideração mútuos;
- igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges;
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343
- sustento, guarda e criação dos filhos.
pode faltar, contudo, este meio probatório, pela perda ou perecimento do livro, pela
destruição do próprio cartório, ou mesmo se o oficial não tiver lavrado o termo por
desleixo ou má-fé. Nestes casos, é admissível outro meio qualquer, como seja o título
eleitoral, o registro em repartição pública, mediante justificação requerida ao juiz
competente. Alguns fazem, todavia, uma distinção: quando o interessado pretende
provar o casamento, reclamando em proveito próprio os seus efeitos, deve dar prova
cabal do ato; mas se se trata de prová-lo para qualquer outro fim, aceitam-se todos
os meios ordinários de prova, a exemplo do registro em repartição pública. O Código
Civil, no parágrafo único do art. 1.543, determina que, além da certidão do registro,
admita-se outra espécie de prova na falta ou perda do registro civil. A justificação
poderá ser “tomada por termo” e deverá ser apreciada pela autoridade judicial
(PEREIRA, 2018, pg. 13).
341
344
instâncias ordinárias. O Min. Relator aduziu que, nos dias de hoje, diferentemente
das constituições pretéritas, a concepção constitucional do casamento deve ser
plural, porque plurais são as famílias; ademais, não é o casamento o destinatário
final da proteção do Estado, mas apenas o intermediário de um propósito maior,
qual seja, a proteção da pessoa humana em sua dignidade. Assim sendo, as famílias
formadas por pessoas homoafetivas não são menos dignas de proteção do Estado se
comparadas com aquelas apoiadas na tradição e formadas por casais heteroafetivos.
O que se deve levar em consideração é como aquele arranjo familiar deve ser levado
em conta e, evidentemente, o vínculo que mais segurança jurídica confere às famílias
é o casamento civil. Assim, se é o casamento civil a forma pela qual o Estado melhor
protege a família e se são múltiplos os arranjos familiares reconhecidos pela
CF/1988, não será negada essa via a nenhuma família que por ela optar,
independentemente de orientação sexual dos nubentes, uma vez que as famílias
constituídas por pares homoafetivos possuem os mesmos núcleos axiológicos
daquelas constituídas por casais heteroafetivos, quais sejam, a dignidade das
pessoas e o afeto. Por consequência, o mesmo raciocínio utilizado tanto pelo STJ
quanto pelo STF para conceder aos pares homoafetivos os direitos decorrentes da
união estável deve ser utilizado para lhes proporcionar a via do casamento civil,
ademais porque a CF determina a facilitação da conversão da união estável
em casamento (art. 226, § 3º). Logo, ao prosseguir o julgamento, a Turma, por
maioria, deu provimento ao recurso para afastar o óbice relativo à igualdade de
sexos e determinou o prosseguimento do processo de habilitação
do casamento, salvo se, por outro motivo, as recorrentes estiverem impedidas de
contrair matrimônio. REsp 1.183.378-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
25/10/2011. (INF. 486).
3. REGIME DE BENS
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• Princípio da indivisibilidade do regime de bens: o regime de bens é indivisível em
relação aos cônjuges, não podendo ser um regime de bens para um dos cônjuges e
outro regime para o outro cônjuge.
• Princípio da variedade do regime de bens: a legislação prevê, de forma expressa,
quatro regimes de bens: comunhão parcial, comunhão universal, separação total e
participação final nos aquestos. Além de poder, em regra, escolher qualquer um
desses regimes, é possível aos nubentes mesclá-los para criar um regime novo,
desde que não viole norma de ordem pública.
• Princípio da mutabilidade justificada: o Código Civil possibilita a alteração
justificada do regime de bens, desde que haja autorização judicial nesse sentido. O
juiz apreciará as razões de justificação de alteração do regime de bens, ficando
ressalvados os direitos de terceiros, os quais não experimentarão o regime de bens
inicialmente fixado (art. 1.639,§2º/CC). O NCPC, no art. 734, trata das possibilidades
e procedimentos especiais quanto à alteração de regime de bens. Para promover a
alteração de regime de bens, é preciso que a petição inicial seja proposta por ambos
os nubentes, sendo uma hipótese de jurisdição voluntária. O §1º do art. 734 diz que,
ao receber a petição inicial, o juiz vai determinar a intimação do MP e a publicação
de edital em que se divulgue essa pretendida modificação do regime de bens. Após
30 dias da publicação do edital, o juiz poderá decidir sobre a modificação do regime
de bens. Os efeitos da alteração do regime de bens são ex nunc, não retroagindo,
portanto, tendo efeito a partir do trânsito em julgado da decisão que alterou o
regime de bens. Note-se que o Código anterior não permitia a alteração do regime
de bens. Entretanto, ainda que o casamento tenha sido celebrado na vigência da
legislação anterior, poderá haver a alteração, porquanto o regime de bens, como se
viu, está no plano da eficácia do casamento e, conforme art. 2.035/CC, em relação
à eficácia, aplicam-se as normas da atualidade.
O regime legal de bens é o da comunhão parcial. Isso significa que, na falta de pacto
antenupcial ou sendo este nulo ou ineficaz, prevalecerá o regime da comunhão parcial de bens
(art. 1.640/CC).
O art. 1.640, parágrafo único, do CC, diz que poderão os nubentes, no processo de
habilitação, optar por qualquer dos regimes que o código regula. Quanto à forma, será reduzido
a termo a opção pela comunhão parcial, sendo que, se a opção for por outro regime de bens,
será necessário fazer o pacto antenupcial por escritura pública.
Veja que a lei exige escritura pública para a realização do pacto antenupcial (ato solene),
que nada mais é do que um contrato bilateral que trata do regime de bens escolhido pelo casal.
Temos, então, que não havendo convenção, o regime legal é o da comunhão parcial.
Pretendendo, entretanto, outro regime, os nubentes terão que se valer do pacto antenupcial,
observando sua forma solene.
Entretanto, em algumas hipóteses, a lei impõe o regime da separação obrigatória de
bens. Estas hipóteses estão previstas no art. 1.641/CC, que impõe, assim, o regime de separação
obrigatória de bens para:
- pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do
casamento;
- pessoa maior de 70 (setenta) anos;
343
346
- todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
Há uma forte discussão quanto à constitucionalidade da imposição do regime da
separação obrigatória para os maiores de 70 anos. Parte da doutrina alega que essa imposição
discrimina o idoso. Entretanto, não houve declaração de inconstitucionalidade do dispositivo,
de modo que prevalece a imposição.
Os artigos 1.642 e 1.643/CC consagram atos que podem ser praticados por qualquer dos
cônjuges, sem a necessidade de autorização do outro, independentemente do regime de bens
adotado pelos consortes.
Assim é que um dos cônjuges poderá fazer sem autorização do outro:
• praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho
de sua profissão;
• administrar os bens próprios;
• desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o
seu consentimento ou sem suprimento judicial;
• demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do aval,
realizados pelo outro cônjuge;
• reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro
cônjuge ao concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo
esforço comum destes, se o casal estiver separado de fato por mais de 5 anos;
• praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente;
• comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia doméstica;
• obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas coisas possa exigir.
O art. 1.647 diz que alguns atos e negócios jurídicos vão exigir a outorga conjugal. Se for
da esposa, essa é denominada outorga uxória. Sendo do marido, chama-se outorga marital.
A outorga é dispensada na hipótese de casamento celebrado com o regime da separação
absoluta de bens (art. 1647, caput, 1ª parte/CC).
Em relação à separação absoluta de bens, a doutrina diz que é possível a alienação de
bens, imóveis e móveis, sem a necessidade de outorga do outro cônjuge.
No entanto, em relação à separação obrigatória, é preciso ficar atento ao que dispõe a
súmula 377 do STF, que estabelece que, no regime de separação legal de bens, comunicam-se
os bens adquiridos na constância do casamento. A redação dessa súmula aproxima o regime da
separação legal de bens do regime de comunhão parcial de bens.
No caso do regime da separação obrigatória de bens, que decorre da lei, prevalece o
entendimento de que é necessária a outorga do outro cônjuge para alienar bens, já que há bens
passíveis de partilha.
A Súmula 377 do STF é anterior ao Código Civil de 2002 e a pergunta que se faz é se ela,
com a nova legislação, ainda deve ser aplicada. Essa pergunta decorre do fato de o legislador de
2002, tendo podido incluir de forma expressa sua redação no Código Civil, não o fez, o que
ensejou o entendimento de que, se assim não ocorreu, é porque não queria adotar seu
entendimento. Com isso, a súmula estaria superada.
Entretanto, conforme jurisprudência atualizada do STJ, esse entendimento não
prevaleceu, tendo aquela Corte entendido que o artigo 1.641/CC deve ser interpretado em
conjunto com a Súmula 377/STF, em especial porque ao se ler a redação original do artigo
164/CC, verificamos que o caput continha a expressa menção a “sem comunhão de aquestos”.
Ou seja, a redação original afastava de forma expressa a aplicação da súmula 377/STF. Com a
retirada da expressão, pode-se entender que o legislador quis permitir a comunicação.
344
347
Assim, sendo aplicável a súmula 377/STF, temos que possível a comunicação dos
denominados aquestos e, por conseguinte, torna-se necessária a outorga do outro cônjuges nas
hipóteses previstas no artigo 1.647/CC.
O referido artigo estabelece a necessidade de outorga nas seguintes hipóteses:
- para alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis
- para pleitear, como autor ou réu, os direitos que recaem sobre bens imóveis;
- para prestar fiança ou aval;
- para fazer uma doação, desde que não seja remuneratória.
São consideradas válidas as doações núpcias feitas aos filhos, quando estes se casarem,
ou então quando os filhos estabelecerem uma economia separada.
Para as demais, será necessária a outorga conjugal ou marital.
A falta de outorga conjugal pode ser suprida pelo juiz, podendo se dar quando (art.
1.648/CC):
- o cônjuge não puder conceder essa outorga;
- o cônjuge denega essa outorga de forma injusta.
A ausência de outorga conjugal, se não houver suprimento pelo juiz, gera anulação do
negócio jurídico, sendo uma nulidade relativa. Para anular o negócio jurídico, será necessário
propor ação anulatória, que terá prazo decadencial de 2 anos, contados da dissolução da
sociedade conjugal.
Essa ação poderá ser proposta tanto pelo cônjuge preterido como pelos herdeiros.
Em relação à administração dos bens do casamento, ambos os cônjuges administrarão
conjuntamente. Todavia, é possível que apenas um deles exerça essa administração, quando um
deles não puder exercê-lo. Nesse caso, cabe ao cônjuge que exerce a administração dos bens
sozinho gerir os bens comuns e os bens do consorte (art. 1.651/CC).
Caberá a este consorte administrar os bens comuns, podendo alienar os bens imóveis
comuns, e, quanto aos bens móveis ou imóveis do consorte, dependerá de autorização judicial.
Pacto antenupcial é um contrato celebrado antes das núpcias, ou seja, antes que o
casamento seja celebrado. O pacto antenupcial é um contrato formal e solene (escritura
pública), pelo qual as partes irão regulamentar as questões patrimoniais relativas ao casamento.
Deve ser feito por escritura pública, sendo considerado nulo quando não é observada essa
formalidade legal (art. 1.653/CC).
Ressalte-se que o pacto celebrado de forma regular, sem que haja posterior casamento,
é considerado válido, porém ineficaz. Isso significa que a ausência de casamento não torna nulo
o pacto antenupcial, mas tão somente ineficaz.
A nulidade do pacto antenupcial não contamina o casamento. Assim, se o pacto
antenupcial for considerado nulo, persiste a validade do casamento. Porém, o regime de
casamento será o da comunhão parcial de bens. É o que dispõe o artigo 1.640, caput/CC.
O art. 1.655/CC diz que é nula a convenção ou cláusula do pacto antenupcial que conflite
com norma de ordem pública. Um exemplo de nulidade de convenção é a previsão de cláusula
que exclui o direito à sucessão no regime de comunhão parcial de bens ou a cláusula que
consagra que a administração dos bens será exercida exclusivamente pelo marido.
345
348
Diante de uma nulidade de apenas uma cláusula do pacto antenupcial, não haverá a
nulidade do pacto por inteiro, por conta do princípio da conservação dos negócios jurídicos.
Para que o pacto antenupcial tenha efeitos erga omnes, deverá ser averbado no livro
especial do Registro de Imóveis do domicílio dos cônjuges.
O Código Civil prevê, de forma expressa, quatro regimes de bens, sem prejuízo da
possibilidade de criação de um outro modelo, desde que não haja violação à norma de ordem
pública.
Os regimes regulamentados e previstos pelo Código Civil são:
• regime da comunhão parcial de bens;
• regime da comunhão universal de bens;
• regime de participação final dos aquestos;
• regime da separação de bens.
Como dito, esse rol não é taxativo, mas meramente exemplificativo.
O regime da comunhão parcial de bens é o regime legal, que prevalece na falta de pacto
antenupcial ou na hipótese de nulidade ou ineficácia dessa convenção (art. 1.640/CC).
A regra básica do regime de comunhão parcial de bens é a de que se comunicam os bens
havidos, a título oneroso, na constância do casamento. Os bens comunicáveis formam os
denominados aquestos. Em relação a estes aquestos, o outro cônjuge terá direito à metade
(meação), independentemente de qualquer tipo de contribuição para a aquisição.
Existem bens que, entretanto, não se comunicam (incomunicáveis), estando excluídos,
portanto, da comunhão, conforme o art. 1.659/CC. São eles:
• bens que cada cônjuge já possuía ao se casar e os bens havidos por doação ou
sucessão, bem como os sub-rogados em seu lugar não se comunicam;
• bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em
sub-rogação dos bens particulares;
• obrigações anteriores ao casamento;
• obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
• bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
• proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
• Pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
Como se percebe, prevalece a regra de que os bens adquiridos, a partir do casamento e
a título oneroso, entrarão na comunhão. Em razão disso é que os bens recebidos, por apenas
um dos cônjuges, por doação ou sucessão, não entrarão na comunhão, já que recebidos a título
gratuito e, por conseguinte, fora da regra geral da onerosidade. Assim é que, caso o doador
queira beneficiar os dois cônjuges, casados pelo regime da comunhão parcial de bens, deverá
fazer a doação ao casal.
Pela mesma razão da regra geral, os bens sub-rogados no lugar dos particulares
conservam a natureza de bens particulares e por isso não entram na comunhão. Se uma pessoa
possui um apartamento antes de se casar e adota o regime da comunhão parcial de bens, esse
imóvel será bem particular daquele que o detinha antes do casamento. Caso venda o
apartamento e compre uma casa pelo mesmo valor, o bem adquirido conservará a natureza de
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bem particular. O que vale ressaltar aqui é o ônus da prova quanto à sub-rogação, já que numa
eventual separação/divórcio, a se considerar a data da aquisição do bem (durante o casamento),
o outro cônjuge poderá formular pedido de partilha, competindo então ao proprietário do bem
particular provar que, não obstante adquirido na constância do casamento, trata-se de bem sub-
rogado no lugar de um imóvel adquirido antes do casamento.
Além da previsão do artigo 1.659/CC, a lei considera incomunicáveis os bens cuja
aquisição tenha por título uma causa anterior ao casamento (art. 1.661/CC). Ou seja, não irá se
comunicar um bem aquele que tenha por motivo uma causa anterior ao casamento.
Dessa forma, se uma pessoa, solteira, vende um terreno e parcela a venda em, por
exemplo 10 prestações. Caso venha a se casar durante o período do parcelamento, essa quantia
recebida pela alienação de bem particular não entrará na comunhão, pois se trata de um bem
que tem por título uma causa anterior à celebração do casamento.
O art. 1.660/CC traz um rol de bens comunicáveis, que são:
• bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em
nome de um;
• dos cônjuges;
• bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa
anterior;
• bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
• benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
• frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na
constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Vê-se que no inciso I, o legislador expõe a regra geral do regime de comunhão parcial,
pela qual todos os bens adquiridos a título oneroso, na constância da união, são comunicáveis.
O inciso II trata da hipótese do fato eventual, cujo exemplo mais comum seria o prêmio
de loteria. Assim, ainda que apenas um tenha comprado o bilhete premiado, o prêmio entra na
comunhão.
Já no inciso III, temos o reforço à regra geral de que somente os bens adquiridos a título
oneroso entram na comunhão. Assim é que, para que bens recebidos a título gratuito
comuniquem-se entre os cônjuges, é preciso que a doação seja feita ao casal. A mesma regra
vale para a herança e o legado.
No inciso IV, encontramos a previsão de comunhão das benfeitorias feitas no bem
particular. Se é certo que os bens adquiridos antes do casamento não se comunicam, certo
também que se houver alguma benfeitoria nesses bens durante a união, quanto a essas, haverá
comunicação.
Por fim, o inciso V trata dos frutos dos bens comuns e dos particulares. Relativamente
aos bens comuns, nenhuma dúvida há quanto à comunhão porquanto o bem que os gera já
pertence ao casal. Maior atenção deve ser dada à questão dos bens particulares. Não obstante
pertencentes a apenas um dos cônjuges, caso esses bens produzam frutos, quanto a estes
haverá comunhão. O exemplo mais comum é o do aluguel. Se um dos cônjuges possuir um
imóvel alugado, os valores decorrentes da locação, recebidos durante o casamento, são
comunicáveis.
É possível acrescentar ao rol de bens comunicáveis as verbas trabalhistas cujo fato
gerador tenha ocorrido durante o casamento. Assim, se, por exemplo, uma pessoa casada em
regime da comunhão parcial de bens, durante o casamento faz horas extras e não recebe por
elas, promovendo, por conseguinte, uma ação trabalhista, caso a ação seja finalmente julgada
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350
quando já divorciado, ainda assim o outro cônjuge fará jus à meação dos valores daí decorrentes.
Isso porque o fato gerador ocorreu durante o casamento.
Relativamente aos bens móveis, o Código Civil consagra uma presunção relativa de que
estes bens foram adquiridos na constância da sociedade conjugal (art. 1.662/CC), motivo pelo
qual deve haver a comunicação desses bens, salvo prova de que adquirido antes do casamento.
Conforme estabelece o artigo 1.663/CC, a administração do patrimônio comum do casal
compete a qualquer um dos cônjuges (princípio da igualdade).
Os bens da comunhão respondem por obrigações contraídas pelo marido ou pela
mulher, desde que tenham sido contraídas para atender aos encargos da família.
As dívidas contraídas no exercício dessa administração vão obrigar os bens comuns do
casal, como também os bens particulares do cônjuge que está administrando os bens comuns.
Além disso, conforme estabelece o artigo 1.663, §1º do Código Civil, obrigarão também os bens
do outro cônjuge, que não está na administração dos bens, na medida do proveito auferido.
Por outro lado, vale a advertência do artigo 1.666/CC no sentido de que as dívidas
contraídas por qualquer dos cônjuges, na administração de seus bens particulares e em
benefício destes, não obrigam os bens comuns.
É que a administração desses bens particulares fica a cargo do proprietário, salvo
previsão expressa em sentido contrário que poderá constar do pacto antenupcial.
No regime da comunhão parcial, a anuência de ambos os cônjuges é necessária para que
determinados atos tenham efeitos e sejam válidos. É o que dispõe o artigo 1.663, §2º, CC, que
estabelece essa necessidade para os atos a título gratuito que importem na cessão do uso ou
gozo dos bens comuns.
Esse artigo deve ser lido em conjunto com o artigo 1.647/CC, que estabelece a
necessidade de autorização do outro cônjuge para as seguintes hipóteses:
• para alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
• para pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;
• para prestar fiança ou aval;
• para fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos possam
integrar futura meação.
É interessante perceber que no inciso I do artigo 1.647/CC, o legislador não faz ressalva
de que a outorga será necessária apenas quanto aos bens comuns. Assim é que, mesmo em se
tratando de bem particular, para que haja alienação dele na constância do casamento em
regime de comunhão parcial, é preciso também a autorização do outro cônjuge. É certo que, em
havendo discordância injustificada, o proprietário do bem particular poderá valer-se do disposto
no artigo 1.648/CC.
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• bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados
em seu lugar;
• bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de
realizada a condição suspensiva;
• dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus
aprestos, ou reverterem em proveito comum;
• doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de
incomunicabilidade;
• bens de uso pessoal, livros, instrumentos de profissão, proventos de cada dos
cônjuges, pensões, etc.
• em relação aos frutos, assim como a comunhão parcial, aplica-se a regra da
comunhão parcial, mesmo que retirados de bens incomunicáveis.
Embora omissa a lei, Carlos Roberto Gonçalves adverte que também não se comunicam
os bens doados com a cláusula de reversão (CC, art. 547), ou seja, com a condição de, morto o
donatário antes do doador, o bem doado voltar ao patrimônio deste, não se comunicando ao
cônjuge do falecido (GONÇALVES, 2017, p. 631).
Quanto à primeira hipótese prevista no artigo 1.668/CC, como se vê, caso o doador
queira fazer a doação a apenas um dos cônjuges casado em regime de comunhão universal de
bens, deverá incluir a cláusula de incomunicabilidade, pois, caso não o faça, ainda que a doação
seja a apenas um dos cônjuges, haverá a comunhão.
A segunda hipótese prevista de incomunicabilidade é o fideicomisso. Conforme previsão
do artigo 1.951/CC, o fideicomisso ocorre quando o testador institui herdeiros ou legatários,
estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário,
resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de
outrem, que se qualifica de fideicomissário.
O fideicomisso é, assim, uma forma de substituição testamentária, prevendo um
primeiro herdeiro, denominado fiduciário, o qual será substituído por outro herdeiro, que é o
fideicomissário. Quando o bem estiver com o herdeiro fiduciário, haverá uma
incomunicabilidade deste bem, pois a propriedade, nesse caso, é uma propriedade resolúvel. A
finalidade é, então, proteger o direito do fideicomissário.
O fideicomissário possui um direito eventual, de forma que a aquisição do domínio
depende da morte do fiduciário, do decurso do tempo fixado pelo testador ou do implemento
da condição resolutiva por ele imposta. O seu direito também não se comunica, por razões de
segurança, nas relações sociais. Se falecer antes do fiduciário, caduca o fideicomisso,
consolidando-se a propriedade em mãos deste último (GONÇALVES, 2017, pg. 631).
O inciso III refere-se à hipótese de dívidas anteriores ao casamento, pelas quais, em
regra, só responde o cônjuge que as contraiu. Todavia, a própria lei abre exceções: 1ª)
comunicam-se as dívidas contraídas com os aprestos ou preparativos do casamento, como
enxoval, aquisição de móveis etc.; 2ª) comunicam-se as dívidas que reverterem em proveito
comum. O exemplo dessa última hipótese seria o da aquisição de um imóvel para residência do
casal.
O inciso IV trata da incomunicabilidade decorrente da cláusula expressa feita quando da
doação antenupcial de um para o outro cônjuge.
No inciso V, o legislador se reporta aos incisos V a VII do artigo que trata da comunhão
parcial de bens. Assim é que, também na comunhão universal, não se comunicam os proventos
do trabalho pessoal de cada cônjuge e as pensões, meios soldos, montepios e outras rendas
semelhantes.
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Quanto aos frutos dos bens incomunicáveis, é importante destacar que, conforme bem
adverte Carlos Roberto Gonçalves,
Passados quase 20 anos desde a vigência do Código Civil de 2002, é possível dizer que o
regime da participação final nos aquestos ainda tem pouquíssima aplicação.
Nesse regime, a regra é de que, durante o casamento, há uma espécie de separação
convencional de bens. E quando o casamento se encerra, há algo próximo à comunhão parcial
de bens. Ou seja, é um regime que mistura regras da separação convencional e da comunhão
parcial de bens.
É o que se extrai do art. 1.672 do Código Civil, que diz que
Pode-se dizer, então, que é um regime híbrido e que, durante a sociedade conjugal, vige
a regra geral aplicável ao regime da separação convencional de bens, aplicando-se, entretanto,
quando da dissolução do casamento, as regras da comunhão parcial.
Sobre o tema, Carlos Roberto Gonçalves ensina que
350
353
e de separação. A comunhão de bens não se verifica na constância do casamento, mas terá
efeito meramente contábil diferido para o momento da dissolução (PEREIRA, 2018, pg. 223).
Nesse regime, os bens anteriores ao casamento e os adquiridos em sua constância
integram os patrimônios particulares e ficam sob a administração do respectivo cônjuge que o
adquiriu, mas, como regra geral, sem autonomia para alienação de imóveis.
Nesse particular, é importante destacar o disposto no artigo 1.673 do Código Civil,
segundo o qual a liberdade de alienação dos bens sem autorização do outro cônjuge ocorre em
relação aos bens móveis. Quanto aos imóveis, a regra é a necessidade de autorização do outro
cônjuge. Todavia, é importante ressalvar o disposto no artigo 1.656/CC, que estabelece que no
pacto antenupcial, que adotar o regime da participação final nos aquestos, poder-se-á
convencionar a livre disposição dos bens imóveis, desde que particulares.
Quando da dissolução do casamento, partilham-se os bens adquiridos, a título oneroso
e por ambos os cônjuges, na constância do casamento (aquestos).
Na constância do casamento, cada cônjuge conserva, como no regime da separação, a
propriedade e a gestão de seus bens.
O artigo 1.674/CC dispõe que, sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal (art.
1.571), apurar-se-á o montante dos aquestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios:
“I – os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram; II – os que
sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade; III – as dívidas relativas aos bens.”
Com a dissolução do casamento, far-se-á um balanço contábil, na forma do artigo 1.674
que dá as linhas gerais do como fazer o cálculo para efeito de partilha.
Citando Zeno Veloso, a obra de Caio Mário adverte que “Zeno Veloso considera que no
novo regime não se forma uma massa a ser partilhada; o que ocorre é um crédito em favor de
um dos cônjuges, contra o outro, para igualar os acréscimos, os ganhos obtidos durante o
casamento” (PEREIRA, 2018, pg. 224).
Com isso, diferentemente do que ocorre, por exemplo, no regime de comunhão parcial
de bens, a partilha de bens imóveis não importará, aqui, em estabelecimento de condomínio
entre os ex-cônjuges, porquanto não se formará massa a ser partilhada. O que se fará é um
balanço contábil para apuração de eventual crédito em favor de um dos cônjuges.
Carlos Roberto Gonçalves destaca as vantagens desse regime, afirmando que ele
apresenta a vantagem de permitir a conservação da independência patrimonial de cada cônjuge,
até mesmo no tocante à elevação ocorrida durante o casamento, proporcionando, ao mesmo
tempo, por ocasião da dissolução da sociedade conjugal, proteção econômica àquele que
acompanhou tal evolução na condição de parceiro, sem ter, no entanto, bens em seu nome
(GONÇALVES, 2017, pg. 642).
Para se entender como se faz a apuração contábil nesse tipo de regime, Sílvio Rodrigues,
citado por Carlos Roberto Gonçalves, ensina que
351
354
O art. 1.682 diz que o direito da meação no regime de participação final dos aquestos é
irrenunciável, incessível e impenhorável.
352
355
3.5. INFORMATIVOS DE JURISPRUDÊNCIA
353
356
VI, do CC/2002 - segundo o qual "Excluem-se da comunhão: (...) "os proventos do
trabalho pessoal de cada cônjuge" -, os proventos de cada um dos cônjuges não se
comunicam no regime da comunhão parcial de bens. No entanto, apesar da
determinação expressa do CC no sentido da incomunicabilidade, realçou-se, no
julgamento do referido REsp 848.660-RS, que "o entendimento atual do Superior
Tribunal de Justiça, reconhece que não se deve excluir da comunhão os proventos
do trabalho recebidos ou pleiteados na constância do casamento, sob pena de se
desvirtuar a própria natureza do regime", visto que a "comunhão parcial de bens,
como é cediço, funda-se na noção de construção de patrimônio comum durante a
vigência do casamento, com separação, grosso modo, apenas dos bens adquiridos
ou originados anteriormente". Ademais, entendimento doutrinário salienta que
"Não há como excluir da universalidade dos bens comuns os proventos do trabalho
pessoal de cada cônjuge (CC, art. 1.659, VI) (...) sob pena de aniquilar-se o regime
patrimonial, tanto no casamento como na união estável, porquanto nesta também
vigora o regime da comunhão parcial (CC, art. 1.725)", destacando-se ser
"Flagrantemente injusto que o cônjuge que trabalha por contraprestação pecuniária,
mas não converte suas economias em patrimônio, seja privilegiado e suas reservas
consideradas crédito pessoal e incomunicável". Ante o exposto, tem-se que o
dispositivo legal que prevê a incomunicabilidade dos proventos (isto é, o art. 1.659,
VI, do CC/2002) aceita apenas uma interpretação, qual seja, o reconhecimento da
incomunicabilidade daquela rubrica apenas quando percebidos os valores em
momento anterior ou posterior ao casamento. Portanto, os proventos recebidos na
constância do casamento (e o que deles advier) reforçam o patrimônio comum,
devendo ser divididos em eventual partilha de bens. Nessa linha de ideias, o marco
temporal a ser observado deve ser a vigência da relação conjugal. Ou seja, os
proventos recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento compõem
o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a
formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges,
independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do
outro. Dessa forma, deve-se considerar o momento em que o titular adquiriu o
direito à recepção dos proventos: se adquiridos durante o casamento, comunicam-
se as verbas recebidas; se adquiridos anteriormente ao matrimônio ou após o
desfazimento do vínculo, os valores pertencerão ao patrimônio particular de quem
tem o direito a seu recebimento. Aliás, foi esse o raciocínio desenvolvido no
julgamento do REsp 421.801-RS (Quarta Turma, DJ 15/12/2003): "Não me parece de
maior relevo o fato de o pagamento da indenização e das diferenças salariais ter
acontecido depois da separação, uma vez que o período aquisitivo de tais direitos
transcorreu durante a vigência do matrimônio, constituindo-se crédito que integrava
o patrimônio do casal quando da separação. Portanto, deveria integrar a partilha".
Na mesma linha, a Terceira Turma do STJ afirmou que, "No regime
de comunhão universal de bens, admite-se a comunicação das verbas trabalhistas
nascidas e pleiteadas na constância do matrimônio e percebidos após a ruptura da
vida conjugal" (REsp 355.581-PR, DJ 23/6/2003). No mais, as verbas oriundas do
trabalho referentes ao FGTS têm como fato gerador a contratação desse trabalho,
regido pela legislação trabalhista. O crédito advindo da realização do fato gerador se
efetiva mês a mês, juntamente com o pagamento dos salários, devendo os depósitos
serem feitos pelo empregador até o dia 7 de cada mês em contas abertas na CEF
vinculadas ao contrato de trabalho, conforme dispõe o art. 15 da Lei n. 8.036/1990.
Assim, deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos
durante a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja
realizado imediatamente à separação do casal. A fim de viabilizar a realização
daquele direito reconhecido, nos casos em que ocorrer, a CEF deverá ser comunicada
para que providencie a reserva do montante referente à meação, para que, num
momento futuro, quando da realização de qualquer das hipóteses legais de saque,
seja possível a retirada do numerário. REsp 1.399.199-RS, Rel. Min. Maria Isabel
Gallotti, Rel. para acórdão Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 9/3/2016, DJe
22/4/2016. (INF. 581).
354
357
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. Dissolução de união estável. Partilha de bens.
Companheiro sexagenário. Súmula 377 do STF. Bens adquiridos na constância da
união estável. Partilha igualitária. Demonstração do esforço comum dos
companheiros para legitimar a divisão. Necessidade. Prêmio de loteria. Fato
eventual ocorrido na constância da união estável. Necessidade de meação. O
propósito recursal consiste em definir se, numa dissolução de união estável de
companheiro sexagenário, é necessário, para fins de partilha, a prova do esforço
comum, bem como se o prêmio de loteria, ganho no período da relação conjugal, é
comunicável ao parceiro. No caso em exame, a lide ganha especial relevo por
envolver sexagenário ao qual, por força do art. 258, parágrafo único, inciso II, do
Código Civil de 1916 (equivalente, em parte, ao art. 1.641, inciso II, do Código Civil
de 2002), era imposto o regime de separação obrigatória de bens (recentemente, a
Lei n. 12.344/2010 alterou a redação do art. 1.641, II, do CC, modificando a idade
protetiva de 60 para 70 anos). Nos ditames da súmula 377 do STF, aplicada ao caso
em concreto, "no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos
na constância do casamento" e, por conseguinte, apenas os bens adquiridos na
constância da união estável devem ser amealhados pela companheira. A partir de
uma interpretação autêntica, percebe-se que o Pretório Excelso também
estabeleceu que somente mediante o esforço comum entre os cônjuges (no caso,
companheiros) é que se defere a comunicação dos bens, seja para o caso de regime
legal ou convencional (RTJ 47/614). Dessa forma, a ex-companheira fará jus à
meação dos bens adquiridos durante a união estável, desde que comprovado o
esforço comum. No entanto, em relação ao prêmio lotérico, por se tratar de bem
comum, em regra, ocorre sua comunicabilidade em favor do casal, sendo que tal
benesse não se confunde com as aquisições a título gratuito, por doação, herança
ou legado, que integram o patrimônio pessoal do donatário (CC, art. 1.659). A loteria
ingressa na comunhão sob a rubrica de "bens adquiridos por fato eventual, com ou
sem o concurso de trabalho ou despesa anterior" (CC/1916, art. 271, II; CC/2002, art.
1.660, II). Com isso, no caso em que o prêmio de loteria foi recebido por sexagenário
durante relação de união estável, é de se observar que este deve ser objeto de
partilha com a ex-companheira pelas seguintes razões: a) é bem comum que ingressa
no patrimônio do casal, independentemente da aferição do esforço de cada um,
pouco importando se houve ou não despesa do accipiens; b) o próprio legislador
quem estabeleceu a referida comunicabilidade; c) a comunicabilidade é a regra, que
admite exceções, a depender do regime de bens, sendo que aquele de separação
legal do sexagenário é diverso do regime de separação convencional; d) a partilha
dos referidos ganhos com a loteria não ofenderia o desiderato da lei, já que o prêmio
foi ganho durante a relação, não havendo falar em matrimônio realizado por
interesse ou em união meramente especulativa. REsp 1.689.152-SC, Rel. Min. Luis
Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 24/10/2017, DJe 22/11/2017. (INF.
616).
355
358
regime de bens) mas persiste a proibição de novo casamento, porquanto ainda existente o
vínculo do matrimônio.
Nesse sentido, temos que o vínculo matrimonial só se dissolve, ou seja, o efetivo fim do
casamento somente ocorre nas seguintes hipóteses: morte de um dos cônjuges; anulação do
casamento e divórcio.
Assim, a separação judicial põe fim à sociedade conjugal, mas não põe fim ao vínculo
matrimonial.
É importante dizer que, no Brasil, até o ano de 1977, o casamento era considerado
indissolúvel, tendo essa situação mudado a partir da Emenda Constitucional n. 9, de 28 de julho
de 1977, que alterou a Constituição Federal então vigente (CF de 1969), abrindo espaço para o
divórcio, ao ser alterado o § 1º do art. 175, que passou a permitir a dissolução do matrimônio
nos casos previstos em lei.
Na sequência, a denominada Lei do Divórcio (Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977)
representou um marco importante no Direito de Família ao admitir, de forma expressa, o
divórcio como forma de dissolução do vínculo matrimonial.
Entretanto, era marcante a exigência de lapso temporal de separação para que o
referido divórcio pudesse ocorrer. A lei dispunha, inicialmente, que o divórcio poderia ser
deferido desde que houvesse separação judicial por mais de três anos.
Essa situação persistiu com a Constituição Federal, que somente diminuiu o prazo de
separação de fato ou de separação judicial, mas manteve a exigência de lapso temporal mínimo
de separação (fática ou judicial) para deferimento do divórcio.
Nessa análise da evolução histórica do divórcio, teve muita importância a Emenda
Constitucional n. 66, de 2010, que alterou o art. 226 da CF/88, permitindo o divórcio,
independentemente de qualquer lapso temporal.
Assim, na atualidade o vínculo matrimonial pode ser dissolvido pelo divórcio, não se
exigindo qualquer lapso temporal de separação de fato ou judicial para tanto. Não se exige,
igualmente, tempo mínimo de casamento para que o divórcio possa ser deferido.
356
359
judicial ou administrativo, este último introduzido no Brasil pela Lei nº 11.441, de
2007 (PEREIRA, 2018, pg. 248).
como primeiro impacto da Emenda do Divórcio a ser apontado, verifica-se que não
é mais viável juridicamente a separação de direito, a englobar a separação judicial e
a separação extrajudicial, banidas totalmente do sistema jurídico. A partir das lições
de Paulo Lôbo, extraídas do texto por último citado, verifica-se que os fins sociais da
norma, nos termos do art. 5.º da Lei de Introdução e do art. 8.º do CPC/2015, são de
justamente colocar fim à categoria. Pensar de forma contrária torna totalmente
inútil o trabalho parlamentar de reforma da Constituição Federal (TARTUCE, 2020,
pg. 1874).
Sobre essa tema, entretanto, a V Jornada de Direito Civil aprovou enunciados que
concluíram pela manutenção da separação jurídica (ou de direito) no sistema jurídico.
Assim é que o Enunciado 514 diz que a EC 66/10 não extinguiu a separação judicial ou
extrajudicial.
Já o Enunciado 517 diz que a EC 66/10 extinguiu os prazos previstos no código civil,
sendo mantido o divórcio por conversão.
Nessa mesma linha, o NCPC, que é posterior à EC 66, reafirmou a existência do instituto
da separação de direito. Em seu art. 53, I, fixa a competência da ação de separação da seguinte
forma:
1. foro do domicílio do guardião do filho incapaz;
2. não havendo filho incapaz, a ação de separação terá como órgão competente o
último domicílio do casal;
3. caso nenhum dos ex-cônjuges residir no antigo domicílio do casal, será competente
o foro do domicílio do réu.
O entendimento atualizado do STJ é no sentido de que a Emenda Constitucional n.
66/2010 não revogou, expressa ou tacitamente, a legislação ordinária que trata da separação
judicial. Nesse sentido, confira-se: REsp 1.431.370-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por
unanimidade, julgado em 15/8/2017, DJe 22/8/2017 (Informativo nº 0610, de 27/9/2017).
No âmbito do STF, Flávio Tartuce nos lembra que “o tema pende de análise pelo
Supremo Tribunal Federal que, nos autos do Recurso Extraordinário 1.167.478/RJ, reconheceu
a repercussão geral de questão constitucional, o que se deu em junho de 2019 – Rel. Min. Luiz
Fux. O STF deve examinar, portanto, se o instituto da separação judicial permanece ou não no
ordenamento jurídico brasileiro, resolvendo definitivamente esse debate” (TARTUCE, 2020, pg.
1882).
Dentre os doutrinadores, Tartuce elenca aqueles que são favoráveis à manutenção da
separação no sistema pátrio, in verbis: “entre outros, Mário Luiz Delgado, Luiz Felipe Brasil
357
360
Santos, João Baptista Villela, Regina Beatriz Tavares da Silva, Gustavo Tepedino, Maria Celina
Bodin de Moraes e Heloísa Helena Barboza” (TARTUCE, 2020, pg. 1883).
Enquanto não resolvida a questão definitivamente pelo STF, temos os julgados recentes
do STJ, entendendo pela manutenção da separação judicial, que se abre como uma opção para
as partes que não pretendam o caminho do divórcio direto.
Ademais, para os adeptos desse posicionamento, a manutenção da separação se
sustenta pela possibilidade de discussão de culpa nessa via processual, o que, em princípio, não
ocorre no divórcio. Destaque-se, aqui, que como se verá mais a frente, também há discussão
sobre a constitucionalidade da discussão de culpa diante do princípio da dignidade da pessoa
humana. De qualquer forma, para aqueles que defendem a possibilidade de discussão de culpa,
essa seria uma das justificativas para manutenção da separação no ordenamento, já que na ação
de divórcio não haveria espaço para essa discussão.
Com efeito, pela leitura dos artigos do Código Civil, verifica-se que somente na
separação há a previsão de discussão de culpa (vide artigo 1.572 e 1.573/CC).
É bem verdade que alguns autores discutem também se, diante do ordenamento pátrio
atual, haveria ainda espaço para discussão de culpa, já que esta poderia violar o princípio da
dignidade da pessoa humana e direitos da personalidade e, por conseguinte, não deveria ser
objeto de apreciação do judiciário.
Lembremos, antes, como já colocamos, que o entendimento atual do STJ é no sentido
de que, mesmo após a EC 66, persiste no ordenamento pátrio a possibilidade de separação
judicial. Com isso, o passo seguinte é analisar se essa separação judicial poderá ser decretada
com a imputação de culpa a um dos cônjuges. Em outras palavras, a indagação passa pela
constitucionalidade da discussão de culpa na separação diante do princípio da dignidade da
pessoa humana.
Importa destacar que a discussão acerca da possibilidade ou não de discussão de culpa
na separação judicial tem relevância, na medida em que o seu reconhecimento tem
consequências quanto aos seguintes pontos atinentes ao desfazimento da sociedade conjugal:
a) Quanto aos alimentos: o art. 1.704, caput e parágrafo único, do CCB/02
estabelecem que se um dos cônjuges separados judicialmente vier a
necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão
a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de
separação judicial. Par único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar
de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão
para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz
o valor indispensável à sobrevivência. Vê-se, pelo artigo transcrito, que,
reconhecida a culpa de um dos cônjuges pela separação, o outro pode até ser
obrigado a pagar alimentos, mas somente aqueles indispensáveis à
sobrevivência e desde que o alimentando não tenha outros parentes em
condições de prestá-los.
b) Quanto ao nome: o artigo 1.578/CC diz que o cônjuge declarado culpado na
ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro,
desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração
não acarretar: I - evidente prejuízo para a sua identificação; II - manifesta
distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união
dissolvida; III - dano grave reconhecido na decisão judicial. Por esse
dispositivo, estabelece-se a possibilidade de perda do nome de casado(a) em
razão do reconhecimento da culpa.
c) Quanto à eventual indenização por dano moral: seguindo a regra geral
quanto à responsabilidade civil, pode haver pedido de indenização por
358
361
eventuais danos morais decorrentes do grave descumprimento de dever
conjugal (grande polêmica sobre essa possibilidade).
Para Daniel Carnacchioni, os dispositivos que versam sobre a culpa na separação estão
em desacordo com os valores sociais constitucionais. Para ele, “o Direito Civil deve ser
interpretado à luz desses valores e não o contrário. Os arts. 1.572 e 1573, que permitem a
discussão da culpa, são de duvidosa constitucionalidade” (CARNACCHIONI, 2018, pg. 1.536).
Para o mesmo autor, não há sentido jurídico para a discussão da culpa, pois mesmo que
reconhecida, nenhum efeito daí decorre, pois para ele, em relação aos efeitos acima
mencionados, tem-se que “os alimentos são fundamentados na solidariedade familiar,
necessidade e possibilidade. O uso do nome depende do interesse do cônjuge e da necessidade
de manutenção para fins de vínculo de filiação ou trabalho” (CARNACCHIONI, 2018, pg. 1.536).
O autor conclui que essas hipóteses tidas como consequências do reconhecimento da culpa,
previstas no artigo 1.578/CC, devem ser relidas à luz dos valores sociais constitucionais.
Assim, com essa leitura à luz da CF, tem-se que o sobrenome não pode ser perdido pois,
com o casamento e com a sua adoção, passa a integrar o nome do outro cônjuge e, como direito
fundamental da personalidade, somente poderá ser desincorporado por opção ou caso a pessoa
que seja a titular o esteja violando (CARNACCHIONI, 2018, pg. 1.536).
Continua o autor, referindo-se à outra suposta consequência do reconhecimento da
culpa, que seria relativa aos alimentos. Para ele, neste particular, “também não tem relação
direta com a demonstração da violação de qualquer dos deveres conjugais, porque os alimentos
são fundamentados na solidariedade familiar” (CARNACCHIONI, 2018, pg. 1.537).
Para o mesmo autor, a perda do direito aos alimentos, nessa hipótese, representaria
uma violação aos princípios da solidariedade social e familiar, valores constitucionais que
norteiam os alimentos (CARNACCHIONI, 2018, pg. 1.537).
Independentemente da posição adotada, é preciso dizer que ainda que se considere a
manutenção da possibilidade de discussão de culpa na separação, o Enunciado n. 254 da Jornada
de Direito Civil concluiu que “formulado o pedido de separação judicial com fundamento na
culpa (art. 1.572 e/ou art. 1.573 e incisos), o juiz poderá decretar a separação do casal diante da
constatação da insubsistência da comunhão plena de vida (art. 1.511) – que caracteriza hipótese
de outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum – sem atribuir culpa
a nenhum dos cônjuges”.
Por tudo o que até aqui foi exposto, é possível extrair que, em se partindo da ideia de
que persiste a separação no ordenamento jurídico pátrio, para aqueles que adotam
posicionamento favorável à culpa, temos que a separação judicial poderá ser consensual ou
litigiosa e, uma vez litigiosa, poderá basear-se na sustentação da culpa de um dos cônjuges pela
ruptura da sociedade (separação sanção – arts 1.572, caput e 1.573/CC) ou na impossibilidade
da vida em comum (separação falência – art. 1.572, §1º) ou ainda em decorrência de
enfermidade consistente em doença mental grave de um dos cônjuges (separação remédio –
art. 1.572, §2º).
Em resumo, podemos, então, tomando como premissa a posição que defende a
manutenção da separação no ordenamento pátrio, elencar as formas de término da sociedade
conjugal da seguinte forma:
a) Separação jurídica consensual:
• judicial; ou
• extrajudicial.
b) Separação jurídica litigiosa:
• separação-sanção;
359
362
• separação-falência; e
• separação-remédio.
Sobre a ação de separação judicial, trata-se de procedimento que tramita em segredo
de justiça, tendo a ele acesso apenas as partes e advogados, podendo eventualmente, com
autorização judicial, um terceiro ter acesso ao dispositivo da sentença.
Ainda em relação ao trâmite da ação de separação consensual, o art. 731 do NCPC
estabelece que poderá ser requerida a homologação de acordo, em petição assinada por ambos
os cônjuges, da qual constarão disposições relativas à descrição e partilha dos bens comuns do
casal, disposições entre a pensão alimentícia entre os cônjuges, acordo em relação à guarda dos
filhos incapazes, regime de visitas e valor da contribuição para criar e educar os filhos. Poderá
ser feita esta partilha após a homologação do divórcio. A propósito, diz o artigo 1.581/CC que
“o divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha dos bens”. A mesma regra vale
igualmente para a separação judicial.
É importante destacar que, nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos
para alcançar uma solução consensual da controvérsia, dispondo o juiz de profissionais de outras
áreas, com conhecimentos específicos que favoreçam a mediação e/ou conciliação.
O Ministério Público, nas ações de família, só irá intervir quando houver interesse de
incapaz. Neste caso, o MP deverá sempre ser ouvido, inclusive, antes da homologação de
eventual acordo.
Como a separação judicial coloca fim apenas à sociedade conjugal e não ao vínculo
matrimonial, é possível que, mesmo com a separação decretada judicialmente, haja
restabelecimento da sociedade conjugal. É o que diz o artigo 1.577/CC, verbis: “Seja qual for a
causa da separação judicial e o modo como esta se faça, é lícito aos cônjuges restabelecer, a
todo tempo, a sociedade conjugal, por ato regular do juízo”.
O pedido será formulado, então, nos próprios autos da separação judicial e independe,
assim, de nova ação.
Uma importante inovação acerca da separação judicial (e aplicável também ao divórcio
e à dissolução de união estável) foi introduzida pela Lei nº 11.441. A Lei nº 11.441, de 04 de
janeiro de 2007, que trouxe a possibilidade da separação, do divórcio e da dissolução de união
estável serem realizados por via extrajudicial. Tal previsão também está disposta no artigo 733
do novo Código de Processo Civil, que diz: “o divórcio consensual, a separação consensual e a
extinção consensual de união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados
os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura pública”.
Pelo dispositivo transcrito, vê-se que são requisitos para esse procedimento
extrajudicial, além do acordo entre os cônjuges/conviventes, os seguintes:
• não se trate de cônjuges/conviventes com nascituro (mulher grávida);
• não haja filhos incapazes.
Nessas hipóteses, ou seja, havendo nascituro ou filhos incapazes, a separação deve
ocorrer de forma judicial.
Conforme estabelece a legislação mencionada, o tabelião só irá lavrar a escritura pública
de separação judicial ou divórcio se ambos os cônjuges estiverem assistidos por advogado,
podendo, entretanto, apenas um advogado representar ambos.
Ressalte-se que foi a Resolução nº 35 do CNJ que incluiu a impossibilidade de lavratura
de escritura pública de separação, divórcio ou dissolução de união estável na hipótese de
gravidez de um dos cônjuges/conviventes. Antes dessa resolução, a previsão era apenas para o
caso de filhos incapazes.
360
363
Sobre esse tema, Tartuce esclarece que
tanto nos casos de divórcio quanto de dissolução de união estável, houve alteração
na Resolução 35 do Conselho Nacional de Justiça, que regulamenta a atuação dos
Tabelionatos de Notas na lavratura dessas escrituras públicas. Com a modificação,
de abril de 2016, passou a citada resolução do CNJ a estabelecer que, na condição
de grávida, não é possível utilizar da escritura pública para formalização de divórcio
e de dissolução de união estável em cartório, assim como já ocorria nas hipóteses de
existência de filhos menores ou incapazes. Esclareça-se que, quando dos debates
dessa alteração, os conselheiros do CNJ firmaram o entendimento de que o estado
de gravidez, caso não seja evidente, deve ser declarado pelos cônjuges. Assim, não
cabe ao Tabelião investigar essa condição, o que exigiria um documento médico e
burocratizaria o processo, além de poder representar desrespeito à intimidade das
partes (TARTUCE, 2020, pg. 1893).
O divórcio é uma das formas de dissolução do vínculo matrimonial. Ele coloca fim ao
casamento. Como o vínculo matrimonial é mais amplo que a sociedade conjugal, temos que a
dissolução daquele importa, consequentemente, no término desta.
Como vimos, a legislação prevê, na atualidade, além do divórcio judicial, o divórcio
extrajudicial, atendendo a um movimento denominado de desjudicialização, ou seja, até mesmo
para desafogar o judiciário, tem-se criado vias que possibilitam a solução de algumas questões
pela via extrajudicial. Os requisitos para esse procedimento extrajudicial já foram vistos no
tópico anterior e se aplicam também ao divórcio.
Como colocado também no tópico anterior, o art. 1.581 do CC diz que o divórcio pode
ser concedido sem que haja prévia partilha de bens. Porém, é preciso que se destaque que, em
havendo o divórcio sem partilha, novo enlace matrimonial de um ou ambos os cônjuges
importará em imposição do regime da separação obrigatória de bens, conforme estabelece o
artigo 1.641, I, c/c art. 1.523, III, ambos do Código Civil.
A ação de divórcio é personalíssima, cabendo somente aos cônjuges. No entanto, se o
cônjuge estiver numa situação de incapacidade, como interdição, poderá o curador, ascendente
ou irmão propor essa ação. É o que se extrai do artigo 1.582 e seu parágrafo único, do Código
Civil.
Ainda sobre o divórcio, antes da EC 66, fazia toda diferença o estudo que considerava os
tipos de divórcio, sendo certo que todo profissional que atuava na área de família tinha que
conhecer bem os prazos para que o divórcio pudesse ocorrer. Assim é que, a depender da
hipótese, o divórcio classificava-se da seguinte forma:
a) divórcio consensual: direto ou por conversão;
b) divórcio litigioso: direto ou por conversão.
Com a EC 66, que excluiu todos os prazos para o divórcio, esse estudo perdeu a
importância, já que a regra, na atualidade, é o divórcio direto, com a advertência de que, para
aqueles que entendem que não há mais separação jurídica no ordenamento pátrio, o divórcio
só pode ser direto, salvo aqueles cuja separação já ocorra antes da emenda, casos em que será
possível a conversão.
Ainda em relação ao divórcio, é importante colocar que, para aqueles que sustentam a
impossibilidade de manutenção da separação diante do ordenamento jurídico pátrio, o divórcio
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364
comportaria a discussão de culpa. Todavia, prevalece o entendimento de que não se pode
discutir culpa no divórcio. Nesse sentido, Tartuce elenca os seguintes doutrinadores que se
opõem à discussão da culpa no divórcio:
Assim, se posicionam, por exemplo, Rodrigo da Cunha Pereira, Paulo Lôbo, Maria
Berenice Dias, Rolf Madaleno, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, José
Fernando Simão, Antonio Carlos Mathias Coltro, Pablo StolzeGagliano, Rodolfo
Pamplona Filho, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, em trabalhos
escritos e manifestações pessoais a este autor (TARTUCE, 2020, pg. 1914).
O mesmo autor explica sua posição intermediária, sustentando que “se deve admitir a
discussão da culpa em casos excepcionais, de maior gravidade. Por essa forma de pensar estão
mantidos os deveres do casamento (art. 1.566 do CC), pela sua aceitação pelo senso comum em
geral. Conserva-se ainda um modelo dualista, com e sem culpa, como ocorre com outros ramos
do Direito Civil, caso do direito contratual e da responsabilidade civil. Em reforço, a culpa gera
consequências para a responsabilidade civil dos cônjuges e os alimentos, conforme ainda será
aprofundado. Por esse caminho de conclusão, o divórcio poderá ser litigioso – com pretensão
de imputação de culpa – ou consensual – sem discussão de culpa. Deve ficar claro que, para este
autor, está mantida a ideia de mitigação da culpa – na esteira da doutrina e da jurisprudência
anterior –, em algumas situações, como nos casos de culpa recíproca dos cônjuges ou de sua
difícil investigação, a tornar o processo tormentoso para as partes. Do mesmo modo, é possível
a mitigação da culpa em situações de fim do amor ou de deterioração factual do casamento,
decretando-se agora o divórcio por mera causa objetiva” (TARTUCE, 2020, pg. 1914).
Extrai-se da letra expressa da lei que para que o cônjuge culpado não perca o nome do
outro cônjuge, deverá estar presente uma das seguintes hipóteses:
• quando a alteração do sobrenome implicar verdadeiro prejuízo para a sua
identificação;
• quando houver uma manifesta distinção entre o nome do cônjuge culpado e os
filhos havidos da união dissolvida;
• quando houver um dano grave, que deverá ser reconhecido na decisão judicial,
causado pela retirada do sobrenome do ex-cônjuge.
362
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Porém, mesmo com a previsão expressa das exceções admitidas para manutenção do
nome pelo cônjuge culpado, há discussão na doutrina no sentido de que a opção pela não
manutenção deve sempre ser daquele que o adotou, independentemente de culpa pela
separação.
Sobre esse tema, Tartuce ensina que
ora, com a aprovação da EC 66/2010, entendo que não há mais qualquer influência
da culpa para a manutenção do nome de casado após o divórcio. Primeiro porque o
art. 1.578 do CC deve ser tido como totalmente revogado, por incompatibilidade
com o Texto Maior, uma vez que faz menção à separação judicial, retirada do
sistema. Segundo, pois a norma é de exceção, não admitindo aplicação por analogia
ao divórcio. Terceiro, porque o nome incorporado pelo cônjuge constitui um direito
da personalidade e fundamental, que envolve a dignidade humana, havendo relação
com a vida privada da pessoa natural (art. 5.º, inc. X, da CF/1988). Sendo assim, não
se pode fazer interpretação jurídica a prejudicar direito fundamental (TARTUCE,
2020, pg. 1921).
Como foi exposto antes, Flávio Tartuce entende que não persiste no ordenamento
pátrio a separação jurídica, o que lhe dá mais motivos para sustentar que também não persiste
a possibilidade de perda do nome em razão de culpa.
Todavia, mesmo para aqueles que sustentam a manutenção da separação judicial, é
possível dizer que ainda que haja culpa pela separação, o cônjuge culpado que adotara o nome
do outro pode, caso seja esse o seu desejo, manter o nome de casado(a) pois esse nome, com o
casamento, incorporou-se ao seu patrimônio, constituindo direito da personalidade e protegido
inclusive constitucionalmente, diante do princípio da dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido, o STJ já se posicionou pela manutenção do nome de casado pelo cônjuge
declarado culpado (STJ, REsp 241.200/RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 04.04.2006).
Pode, entretanto, o cônjuge renunciar ao direito de usar o sobrenome do outro cônjuge.
Antes de mais nada, é preciso relembrar que a morte presumida pode ser reconhecida
com ou sem a decretação de ausência. O artigo 6º/CC estabelece que “A existência da pessoa
natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei
autoriza a abertura de sucessão definitiva”.
O artigo em destaque trata, na parte final, da morte presumida com decretação de
ausência.
Já o artigo 7º/CC refere-se à morte presumida, porém sem necessidade de decretação
de ausência, que ocorrerá nas hipóteses ali elencadas. Diz o referido artigo que: “Pode ser
declarada a morte presumida, sem decretação de ausência: I - se for extremamente provável a
morte de quem estava em perigo de vida; II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito
prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra. Parágrafo único. A
declaração da morte presumida, nesses casos, somente poderá ser requerida depois de
esgotadas as buscas averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.
Nos exatos termos do artigo 1.571, §1º, o casamento do ausente se desfaz no caso de
morte presumida, de forma que seu ex-cônjuge estará livre para casar com terceiro. Em outras
palavras, na hipótese de reconhecimento de morte presumida, com ou sem decretação de
ausência, o outro cônjuge fica livre para se casar novamente, como se viúvo fosse para todos os
efeitos.
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Como o próprio nome diz, a morte, na hipótese, é apenas presumida e pode ocorrer
daquele que foi declarado morto retornar. A pergunta que surge, então, é acerca de quais as
consequências jurídicas especificamente relacionadas ao casamento surgem em razão desse
retorno.
Sobre o tema, Tartuce explica que há dois posicionamentos doutrinários relação à
matéria:
O tema será melhor aprofundado quando do estudo dos alimentos, mas valem ser
consideradas aqui algumas observações sobre a prestação de alimentos na hipótese de
separação e divórcio do casal.
O tratamento dos alimentos na hipótese da ruptura da vida conjugal mudou ao longo
do tempo, fruto da própria mudança social. Se antes, em regra, o homem era o provedor da casa
e a mulher se dedicava aos afazeres domésticos, não tendo renda própria, certo é que, na
atualidade, essa situação não persiste. A mulher hoje ocupa um lugar no mercado de trabalho,
concorrendo diretamente com o homem na obtenção de renda. Assim, já não podemos
considerar a situação antiga de que, quando da ruptura da vida conjugal, a mulher que sempre
se dedicara aos afazeres domésticos, precisava de ajuda financeira para se manter. Os alimentos
devem, então, ser analisados à luz da sociedade moderna. Por isso, uma primeira conclusão que
surge é no sentido da sua temporalidade.
Com efeito, os alimentos, em regra, são temporários, sendo, por conseguinte, fixados
por tempo certo. Não se afasta, entretanto, a possibilidade de fixação sem prazo, mas essa não
é mais a regra.
Com relação à culpa, como vimos, não há espaço para essa discussão no divórcio, e,
mesmo em relação à separação jurídica, tem-se entendido que os alimentos se baseiam na
solidariedade, de forma que são devidos mesmo que haja reconhecimento da culpa.
Para alguns autores, dentre eles, como vimos, Daniel Carnacchioni, mesmo com a culpa,
os alimentos são devidos àquele que deles necessita, devendo ser observado apenas o
parâmetro da necessidade/possibilidade.
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divórcio a prévia separação judicial ou de fato. Por sua vez, a EC n. 66/2010
promulgada em 13 de julho de 2010 conferiu nova redação ao § 6º do art. 206 da
Constituição Federal de 1988, a saber: "o casamento civil pode ser dissolvido pelo
divórcio". A alteração constitucional não revogou, expressa ou tacitamente, a
legislação ordinária que regula o procedimento da separação, consoante exegese do
art. 2º, §§ 1° e 2°, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-Lei
n. 4.657/1942). Como se afere da sua redação, a Emenda apenas facultou às partes
dissolver direta e definitivamente o casamento civil, por meio do divórcio – objeto
de nova disciplina, tendo em vista a supressão do requisito temporal até então
existente. A supressão dos requisitos para o divórcio pela Emenda Constitucional não
afasta categoricamente a existência de um procedimento judicial ou extrajudicial de
separação conjugal, que passou a ser opcional a partir da sua promulgação. Essa
orientação, aliás, foi ratificada: (i) pelos Enunciados n.s 514, 515, 516 e 517 da V
Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (CJF), ocorrida em 2010; (ii)
pela nova codificação processual civil (Lei n. 13.102/2015), que manteve, em
diversos dispositivos, referências ao instituto da separação judicial (Capítulo X – Das
Ações de Família – art. 693 e Capítulo XV – dos Procedimentos de Jurisdição
Voluntária – arts. 731, 732 e 733); (iii) pela Quarta Turma desta Corte Superior, por
ocasião do julgamento do REsp 1.247.098-MS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, DJe
16/5/2017 – o que denota a pacificação da matéria pelos órgãos julgadores
responsáveis pela uniformização da jurisprudência do STJ no âmbito do direito
privado. Portanto, até que surja uma nova normatização, não se pode dizer que o
instituto da separação foi revogado pela Emenda n. 66/2010. REsp 1.431.370-SP, Rel.
Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 15/8/2017, DJe
22/8/2017 (INF. 610).
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interpretação de todos esses dispositivos infraconstitucionais deverá observar a
nova ordem constitucional e a ela se adequar, seja por meio de declaração de
inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, seja como da interpretação
conforme a constituição ou, como no caso em comento, pela interpretação
sistemática dos artigos. REsp 1.483.841-RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em
17/3/2015, DJe 27/3/2015 (INF. 558).
5. PARENTESCO
Todo profissional do direito deve entender como são contados os graus de parentesco,
pois em diversas situações, nas mais diferentes áreas de atuação, encontramos referência a
esses graus. Assim, a título de exemplo, como vimos no estudo do casamento, o artigo 1.521/CC
diz que não podem se casar os parentes colaterais até terceiro grau. Para entender até onde vai
a proibição, é preciso saber quem são os parentes colaterais e entender como se contam os
graus. Esse será o objeto do nosso estudo nesse tópico.
É importante, preliminarmente, diferenciar os parentes em linha reta daqueles
denominados colaterais. Essa diferenciação é facilmente compreendida pela leitura dos artigos
1.591 e 1.592/CC, que dizem in verbis:
“Art. 1.591. São parentes em linha reta as pessoas que estão umas para com as outras
na relação de ascendentes e descendentes.”
“Art. 1.592. São parentes em linha colateral ou transversal, até o quarto grau, as pessoas
provenientes de um só tronco, sem descenderem uma da outra.”
O artigo 1.591/CC, por sua vez, diz que são parentes em linha reta:
• os ascendentes; e
• os descendentes.
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Ainda em relação ao vínculo de parentesco, o art. 1.594/CC explica como se contam, na
linha reta e na linha colateral, os graus de parentesco pelo número de gerações. Diz o referido
artigo: “contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na
colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum,
e descendo até encontrar o outro parente”.
Na linha reta, é muito simples a contagem das gerações. A questão que causa maior
cuidado é em relação aos colaterais. Para tanto, como diz o artigo mencionado, é preciso
encontrar o ascendente comum para se fazer a contagem. Exemplificando, se quero saber o
grau de parentesco entre os primos “A” e “B”, procuramos o ascendente comum, que, no caso,
são os avós. Então, conta-se: do primo “A” até o respectivo(a) pai/mãe, temos uma geração (1ª);
do pai/mãe até o(a) avô(ó), temos outra geração (2ª). Até aqui fizemos o caminho de “subida”
para achar o ascendente comum, que no caso são os avós. Agora vamos “descer”. Do(a) o(a)
avô(ó) até o pai/mãe do primo “B”, temos mais uma geração (3ª) e, finalmente, do o pai/mãe
do primo “B” até o próprio primo “B”, temos outra geração (4ª). Assim, primos são parentes
colaterais em quarto grau.
É bom destacar que o artigo art. 1.592/CC estabelece que o parentesco colateral ou
transversal só vai até o quarto grau e diz respeito às pessoas provenientes de um só tronco, sem
descenderem uma da outra.
Do exemplo dado, em que contamos o parentesco dos primos, podemos extrair que não
há parentesco colateral de 1º grau. Veja que o primeiro grau contado para se encontrar o
parente comum é um parentesco em linha reta (filho(a) e pai/mãe). Se tivermos uma família
com dois filhos, podemos subir de um filho para os pais e aí contar um grau (que, no caso é em
linha reta) e depois descer para o outro filho, contando o segundo grau. Ou seja, entre dois
irmãos, os ascendentes comuns são os pais. Conta-se um grau de um filho até os pais e o
segundo grau dos pais para o outro filho. Os irmãos são, assim, parentes colaterais de segundo
grau, disto resultando que o parentesco colateral mais próximo é de segundo grau.
5.3. FILIAÇÃO
Assim, o estudo da filiação diz respeito a essa relação que liga os pais aos filhos, ou seja,
uma relação de parentesco em linha reta de 1º grau, de pai e filho. A filiação pode decorrer do
casamento ou pode ser fora dele. Essa classificação importa em razão das presunções
estabelecidas em lei quando a filiação decorre do casamento.
Assim, temos:
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5.3.1. FILIAÇÃO DECORRENTE DO CASAMENTO
Sobre a filiação, o art. 1.597/CC traz algumas presunções de filiação. Diz o referido
artigo, que se presumem concebidos na constância do casamento os filhos:
• nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência
conjugal;
• nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por
morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;
• havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;
• havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários,
decorrentes de concepção artificial homóloga;
• havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização
do marido.
Desse rol, é importante destacar as hipóteses decorrentes dos avanços tecnológicos
que, na atualidade, permitem fecundação homóloga ou heteróloga.
Conforme visto, também nesses casos, há presunção de paternidade na hipótese de
casamento, sendo que, em relação à fecundação heteróloga, deve ter havido autorização prévia
do marido.
Cabe aqui a diferenciação entre a fecundação homóloga e heteróloga. Tratam-se de
reproduções assistidas, sendo que na fecundação homóloga, o material genético pertence ao
marido e à mulher. Já na heteróloga, o material genético não é do marido e, por isso, para
aplicação da presunção, a lei fala em prévia autorização do marido.
O Código Civil diz, ainda, que se presumem concebidos na constância do casamento os
filhos havidos a qualquer tempo, quando se tratarem de embriões excedentários, decorrentes
de concepção artificial homóloga. Sobre o tema, em Caio Mário encontramos a explicação no
sentido de que “consideram-se embriões excedentários aqueles resultantes de manipulação
genética, mas não introduzidos no ventre da mãe, permanecendo em armazenamento próprio
de entidades especializadas” (PEREIRA, 2018, pg. 303).
O STJ entende que essas presunções de concepção sobre quem é o pai também são
aplicáveis, por analogia, à união estável (STJ – Embargos de Divergência em REsp. nº 18223 de
2003/SP).
Nas hipóteses de técnica de reprodução assistida heteróloga, prevalece o entendimento
da impossibilidade de quebra do sigilo do doador. Ou seja, a identidade de quem doou o material
genético não poderá ser revelada, ainda que a criança esteja desamparada. É uma questão que
passa pela ponderação de princípios constitucionais, dentre os quais o da dignidade da pessoa
humana. Sobre esse tema, o Enunciado n. 111 do CJF/STJ, da I Jornada de Direito Civil, prevê
que
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afastará a presunção de paternidade dos casos mencionados acima. A impotência mencionada
na legislação é a impotência generandi, ou seja, a impotência para gerar um filho.
Ainda em relação a essa temática, é importante destacar o disposto no art. 1.600/CC,
no sentido de que o simples adultério da mulher não é suficiente para afastar a presunção legal
da paternidade. Como destacado em Caio Mário, “a infidelidade (provada ou confessada) não
ilide a presunção, porque, não obstante, o filho pode ser do marido, e não se recusa o status
baseado apenas na dúvida” (PEREIRA, 2018, pg. 306).
Em razão dos avanços científicos na área de reprodução, também aqui temos reflexos
dessa evolução, no que se refere à possibilidade de pai contestar a paternidade decorrente de
inseminação homóloga. Sobre esse tema, em Caio Mário temos que
Ainda no campo das presunções decorrentes de lei, o art. 1.602/CC diz que não basta a
confissão materna para excluir essa presunção de paternidade. Isso significa que não é
suficiente, para fins de superação da presunção estabelecida em lei, a alegação de que o marido
não é o suposto pai. Necessário se faz, então, outro meio de prova apto a afastar a presunção
de paternidade.
O art. 1.601/CC confere ao marido a legitimidade para impugnar a paternidade dos filhos
havidos com a presunção estabelecida em lei. A ação, no caso, é imprescritível. Ademais, caso o
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presumido pai conteste a paternidade e venha a falecer, seus herdeiros poderão prosseguir na
ação (parágrafo único do artigo 1.601/CC).
A leitura do artigo 1.601/CC índica que a legitimidade, no caso, é só do marido, mas uma
vez exercido o direito de ação, os herdeiros poderão prosseguir com ela.
Vale ressalvar que o enunciado 520/CJF diz que o conhecimento da ausência de um
vínculo biológico e a posse do estado de filho obsta essa contestação posterior da paternidade
presumida.
Ademais, conforme veremos em tópico próprio, diante do novo Direito das Famílias, em
que o afeto ganha destaque, a ausência de vínculo biológico não é suficiente para afastar a
paternidade, diante da possibilidade de existência de vínculos socioafetivos, que justificam a
manutenção do vínculo entre pai e filho(a).
O Código de 2002, em seu art. 1.603, estabelece que “a filiação prova-se pela certidão
do termo de nascimento registrada no Registro Civil”. Assim é que, a regra é a prova da
paternidade e maternidade pela apresentação da certidão extraída do Registro de Nascimento.
Como destacado em Caio Mário,
o que dele consta, pro veritate habetur, vale como verdade em relação à data do
nascimento, a menção de quem são os pais, e, por via de consequência, não pode
este pretender ou ostentar estado diverso do que do registro resulta. Mencionados
os nomes dos pais, ou o que mais seja, tem força probante enquanto subsistir o
registro, cujo conteúdo é indivisível (PEREIRA, 2018, pg. 308).
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5.3.2. FILIAÇÃO FORA DO CASAMENTO
I - no registro do nascimento;
Como deixa claro o parágrafo único deste artigo, o reconhecimento pode preceder o
nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.
É importante destacar essa parte final do parágrafo único do artigo 1.609/CC, no sentido
de que o pai somente pode reconhecer voluntariamente filho morto (reconhecimento post
mortem), se este houver deixado descendentes. Essa exigência busca preservar a finalidade do
reconhecimento, afastando qualquer interesse escuso na herança.
Consoante previsão do art. 1.610/CC, o reconhecimento do filho é irrevogável, ainda
que este reconhecimento conste de testamento. Isto é, mesmo em se considerando que o
testamento é revogável, prevalece a irrevogabilidade do reconhecimento feito em seu bojo.
O reconhecimento de filho é um ato jurídico stricto sensu, de modo que seus efeitos
decorrem da lei.
Atente-se que esse reconhecimento voluntário, conforme o art. 1.614/CC, não pode ser
feito sem o consentimento do filho a ser reconhecido, caso este seja maior de idade. E, nos
termos do mesmo artigo, o filho, ainda que menor de idade, poderá impugnar o reconhecimento
nos 4 (quatro) primeiros anos após a sua maioridade ou emancipação.
A necessidade da aceitação e do consentimento do filho maior e possibilidade de
impugnação do filho menor, assim que tenha se tornado capaz, não desnaturam a natureza do
reconhecimento que é ato jurídico.
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O art. 1.614/CC, no que toca à previsão de 4 anos após a maioridade do filho menor para
impugnar a sua paternidade, tem sido interpretado à luz do ordenamento jurídico como um
todo e da própria CF, de modo a considerar que não se pode fixar um período rígido de 4 anos
para que venha a juízo e conteste esse reconhecimento da paternidade.
Tem-se entendido, então, que poderá ser ajuizada ação para contestar essa paternidade
a qualquer tempo. Isso porque se trata de ação que impugna o estado da pessoa. E, como
sabido, as ações de estado não estão sujeitas a prazo decadencial ou prescricional.
Nesse sentido, ensina Flávio Tartuce que
372
375
A) Foro competente: o foro competente para o processamento e julgamento da ação
de investigação de paternidade, consoante artigo 46 do CPC/2015, como regra geral,
é o do domicílio do investigado, porquanto se trata de ação de direito pessoal.
Quando o pedido de investigação de paternidade for cumulado com alimentos,
estabelece a Súmula nº 1 do Superior Tribunal de Justiça, que “o foro do domicílio
ou residência do alimentando é o competente para a ação de investigação de
paternidade quando cumulada com a de alimentos”.
B) Legitimidade para ação de investigação de paternidade: em relação à legitimidade
ativa, a ação, por ser personalíssima, deve ser proposta pelo(a) próprio(a) filho(a).
Como vimos, o Ministério Público também tem legitimidade extraordinária para a
ação de investigação de paternidade, lembrando que a legitimação extraordinária
ocorre quando o Ministério Público defende, em nome próprio, interesse de
terceiro, agindo como substituto processual (Lei nº 8.560/1992). Para aqueles que
adotam, quanto ao início da personalidade, a teoria concepcionista, o nascituro
também teria legitimidade para propositura da ação. O STJ admite a ação de neto
contra o avô, para ver reconhecida a relação avoenga (STJ, REsp 603.885/RS, 3.ª
Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 03.03.2005, DJ 11.04.2005, p.
291). No que toca à legitimidade passiva da ação investigatória, será proposta em
face do suposto pai ou da suposta mãe. Na hipótese de falecimento do suposto pai
ou da suposta mãe, a ação será proposta contra os herdeiros da pessoa investigada,
pois esta ação tem caráter pessoal e não patrimonial, de forma que, nesse sentido,
não seria correta a inclusão do espólio no polo passivo (REsp 1667576/PR, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/09/2019, DJe
13/09/2019). Tartuce chama a atenção para hipótese de o suposto pai não deixar
herdeiros, caso em que “a ação será proposta contra o Estado (Município ou União),
que receberá os bens vagos” (TARTUCE, 2020, pg. 2038). Proposta a ação, é possível
a contestação. O art. 1.615/CC prevê que qualquer pessoa que tenha justo interesse
poderá contestar a ação investigatória. Ou seja, o cônjuge, o companheiro ou os
herdeiros, têm legitimidade para contestar a ação de paternidade. Em relação aos
alimentos, a súmula 277 do STJ diz que, julgada procedente a ação de investigação
de paternidade, o pagamento dos alimentos são devidos desde a citação.
C) Exame de DNA na ação de investigação de paternidade: Na ação de investigação
de paternidade, diante dos avanços da ciência, hoje é possível, com certa facilidade,
a realização do exame de DNA, para comprovação dos vínculos genéticos. Quando
o suposto pai aceita a realização, o resultado gera segurança para o pretendido
reconhecimento. Porém, é possível que o suposto pai se recuse a se submeter ao
exame, hipótese em que entram em conflito dois interesses igualmente protegidos
pela CF: de um lado, temos o direito do(a) filho(a) de buscar a realidade genética;
de outro, do suposto pai, de preservar sua intimidade e sua integridade corporal.
Ponderando esses dois valores, o STF entende que o direito à intimidade do suposto
pai prevalece sobre o direito da busca da verdade biológica ou da identificação
genética do suposto filho, de forma que não se pode conduzir o pai à
obrigatoriedade da realização do exame. Todavia, ainda em ponderação aos valores,
não obstante a não obrigatoriedade de condução ao exame, em caso de recusa, essa
sua negativa conduz à presunção relativa de paternidade. Nesse mesmo sentido, os
arts. 231 e 232 do CC dizem que aquele que se nega a se submeter ao exame médico
necessário não poderá se aproveitar da sua recusa. O art. 232 diz que a recusa à
perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia se obter
com aquele exame. Sobre a matéria, a Súmula 301 do STJ diz que, em ação de
investigação de paternidade, a recusa do suposto pai a se submeter ao exame de
DNA induz à presunção iuris tantum de paternidade.
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D) Relativização da coisa julgada na ação de investigação de paternidade: a
jurisprudência dos tribunais superiores têm relativizado a coisa julgada em casos de
ações de ações investigatórias em que o pedido tenha sido julgado improcedente
por falta de provas em época que não havia o exame de DNA. Nesse sentido, o
Enunciado 109 do CJF diz que a restrição da coisa julgada oriunda das demandas
reputadas improcedentes por insuficiência de provas não devem prevalecer para
inibir a busca da identidade genética do investigando. Ainda, a verdade biológica,
com relação direta com a dignidade humana do suposto filho, vai prevalecer sobre
a coisa julgada.
Muitas questões têm sido discutidas, em sede de ações judiciais, em razão dos avanços
tecnológicos e científicos. Novas técnicas de reprodução implicam em novas discussões e de
enfrentamento, pelo Judiciário, dessas questões, que devem sempre ser apreciadas à luz da
Constituição Federal.
Um dos pontos de enfrentamento é a denominada “barriga de aluguel” ou gestação de
substituição.
No Brasil, esse tipo de gestação não é admitida na modalidade onerosa. A chamada
gestação de substituição vem regulamentada por uma Resolução 2.121/2015 do CFM, só
podendo ser realizada de forma gratuita.
Consoante referida resolução, o “empréstimo” da barriga ou do útero para gestação é
admitido apenas no âmbito familiar, e no parentesco até o 4º grau.
A mãe, nesse caso, será quem foi a doadora do material genético. Esta é considerada a
genetrix. Já aquela que empresta a barriga é considerada gestatrix e não é tida, para nenhum
efeito, como mãe.
5.3.4. MULTIPARENTALIDADE
O autor prossegue, dizendo que, dessa forma “entende-se que o ser humano é, a um só
tempo, biológico, afetivo e ontológico, de modo a existir uma trilogia familiar, o que, por
consequência, possibilita o estabelecimento de três laços paternos e três maternos, a um só
tempo” (CARNACCHIONI, 2018, 1.564).
A multiparentalidade está atrelada, então, em especial, à possibilidade de coexistência
da paternidade biológica e socioafetiva.
O Supremo Tribunal Federal, sobre a multiparentalidade, em sede de repercussão geral,
afetou a questão sob o tema n. 622. Em setembro de 2016, o plenário, por maioria de votos,
fixou a tese de repercussão geral com a seguinte redação: “A paternidade socioafetiva,
374
377
declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação
concomitante baseado na origem biológica, com efeitos jurídicos próprios”.
Com essa decisão, o STF passou a admitir, então, a multiparentalidade, considerando a
afetividade como um valor jurídico e um princípio da ordem civil-constitucional brasileira. Esse
foi o entendimento citado nos votos da maioria dos Ministros do Supremo.
Com isso, a socioafetividade cria laços de parentesco civil, na forma do artigo 1.593/CC,
em situação de igualdade com o parentesco biológico. Esse vínculo, conforme se extrai do
julgado citado, é reconhecido para todos os fins, inclusive alimentares e sucessórios.
Merece destaque, nesse particular, a conclusão da VIII Jornada de Direito Civil,
promovida pelo Conselho da Justiça Federal em abril de 2018, que, pelo Enunciado n. 632,
destacou que “nos casos de reconhecimento de multiparentalidade paterna ou materna, o filho
terá direito à participação na herança de todos os ascendentes reconhecidos”.
Como visto no reconhecimento voluntário de filho, é possível que ele ocorra de forma
extrajudicial. A pergunta, então, que surge é se a multiparentalidade também pode ser
reconhecida extrajudicialmente.
Quanto a esse ponto, temos que o Provimento 63/2017, que, dentre outras coisas,
dispõe sobre o reconhecimento voluntário e a averbação da paternidade e maternidade
socioafetiva no Livro “A”, teve algumas alterações decorrentes do Provimento 83/2019.
Esse último provimento altera a Seção II, que trata da paternidade socioafetiva, do
Provimento 63.
As alterações, de extrema importância para análise do reconhecimento extrajudicial da
multiparentalidade, são as seguintes:
Art. 10-A. A paternidade ou a maternidade socioafetiva deve ser estável e deve estar
exteriorizada socialmente.
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III – o § 4º do art. 11 passa a ter a seguinte redação:
“art. 11 …………………………..…………………………………..
III – Eventual dúvida referente ao registro deverá ser remetida ao juízo competente
para dirimi-la.
“art. 14 …………………………..…………………………………..
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Sobre a matéria, o Enunciado n. 29, aprovado no XII Congresso Brasileiro do IBDFAM,
em outubro de 2019, concluiu que: “em havendo o reconhecimento da multiparentalidade, é
possível a cumulação da parentalidade socioafetiva e da biológica no registro civil”.
Parece, então, que as modificações feitas pelo Provimento 83/2019 permitem o
reconhecimento da multiparentalidade, desde que a inclusão do vínculo socioafetivo se limite a
um pai e a uma mãe, em concomitância com o vínculo biológico. Se o caso for de inclusão de
mais de um ascendente socioafetivo, a via necessariamente terá que ser a judicial.
5.3.5. ADOÇÃO
Conforme se extrai da leitura do Capítulo IV, do Subtítulo II, do Título I, do Livro IV, do
Código Civil, houve uma limitação no tratamento da adoção do maior de 18 anos, porquanto o
legislador dedicou apenas 12 artigos a essa matéria, sendo certo que a Lei nº 12.010/1009
revogou dez deles. Assim, remanescem apenas dois artigos, que acabam por remeter a questão
ao Estatuto da Criança e do Adolescente.
Com efeito, enquanto o art. 1.618/CC estabelece que a adoção de crianças e
adolescentes será feita na forma prevista no ECA, o subsequente art. 1.619/CC diz que a adoção
de maior dependerá de uma assistência efetiva do Poder Público, de sentença constitutiva, mas
serão aplicadas, no que couber, as regras previstas no ECA.
Assim, o regramento deve seguir as previsões do Estatuto da Criança e do Adolescente,
no que couber, estando a matéria regulada a partir do artigo 39 daquele diploma legal.
A adoção é, pois, o ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho,
independentemente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim.
Todos os autores lhe reconhecem o caráter de uma fictio iuris (PEREIRA, 2018, pg. 377).
Sua importância é destacada pela Carta Magna que prevê, no art. 227, § 5º, que “a
adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições
de sua efetivação por parte de estrangeiros”.
Pela adoção, temos, assim, a criação de um vínculo fictício de maternidade e/ou
paternidade e a filiação, entre pessoas originariamente estranhas. Para que ocorra, sempre
depende de uma sentença judicial, a qual será inscrita no registro civil, mediante mandado
judicial (art. 47,ECA).
Como estabelece o §1º do artigo 39, do ECA, “a adoção é medida excepcional e
irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da
criança ou adolescente na família natural ou extensa (...)”.
Há diferença entre a adoção de pessoa menor e de pessoa maior de idade. Quando a
adoção é de pessoa menor de 18 anos, seu trâmite será perante a Vara da Infância e Juventude
(art. 148, caput, III, ECA). Já em se tratando de adotando(a) maior de 18 anos, o trâmite passa a
ser em Vara de Família.
A intervenção do Ministério Público será sempre obrigatória, pois se está tratando de
questão de estado da pessoa, ou seja, de ordem pública.
Poderá adotar apenas aqueles que tiverem mais de 18 anos (art. 42, caput, ECA).
A adoção pode ser tanto unilateral quanto conjunta. Para a adoção conjunta, é
indispensável que o casal seja casado civilmente ou ao menos mantenham união estável (art.
42, §2º, ECA).
No entanto, o §4º do art. 42 diz que os divorciados, judicialmente separados ou os ex-
companheiros podem adotar conjuntamente, desde que acordem sobre a guarda, regime de
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380
bens e o estágio de convivência com a criança ou adolescente tenha se iniciado anteriormente,
na constância do período de convivência do casal.
O art. 42, §3º, do ECA diz que o adotante deve ser ao menos 16 anos mais velho que o
adotando. Sendo um casal, deverá o membro mais jovem do casal ser ao menos 16 anos mais
velho que o adotando.
O tutor ou curador pode adotar o tutelado ou curatelado, mas antes deverá prestar
contas de sua administração, ou seja, saldar eventuais débitos (art. 44, ECA).
Como regra geral, para a adoção, é preciso o consentimento dos pais ou representantes
legais do menor a ser adotado (art. 45, caput, ECA). Merece, entretanto, destaque o Enunciado
259 da III Jornada de Direito Civil do STJ, que determina que “a revogação do consentimento
não impede, por si só, a adoção, observado o melhor interesse do adotando”.
Vale lembrar que o consentimento dos pais será dispensado se eles forem
desconhecidos ou tiverem sido destituídos do poder familiar (art. 45, §1º, ECA).
Caso o adotando já tenha 12 anos, ele também será ouvido quanto à adoção (art. 45,
§2º, ECA). É importante destacar que a lei é omissa quanto à oitiva e manifestação de
consentimento do menor de 12 anos.
O art. 41 do ECA diz que a adoção atribui a condição de filho ao adotado, tendo ele os
mesmos direitos, deveres e direitos sucessórios, desfazendo qualquer vínculo com os pais e
parentes anteriores, salvo em relação aos impedimentos matrimoniais.
A adoção, como se vê, corta todos os vínculos do adotado com sua família de origem,
salvo na hipótese em que um dos cônjuges ou companheiros adota o filho do outro (adoção
unilateral).
A decisão que defere a adoção vai conferir ao adotado o sobrenome do adotante.
Conforme prevê o art. 47, §5º, ECA, tanto o adotante como o adotado podem pedir a
modificação do prenome do adotado, sendo que, se o pedido de alteração for formulado pelo
adotante, o adotado será ouvido na forma do artigo 47, §6º, ECA.
Em relação aos efeitos da adoção, o art. 47, §7º, ECA, estabelece que a produção de
efeitos começa, em regra, a partir do trânsito em julgado da decisão que concede a adoção.
Todavia, na hipótese de o adotante falecer no curso do procedimento (adoção post mortem), a
sentença terá efeitos a partir da data do óbito (art. 47, §7º, parte final, ECA).
Isso porque o art. 42, §6º, do ECA diz que a adoção pode ser deferida ao adotante que
depois de inequívoca manifestação de vontade falecer no curso do processo, antes de prolatada
a decisão. É a chamada adoção post mortem.
Se, no curso da ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e outro
vier a falecer sem ter manifestado inequívoca intenção de adotar unilateralmente, não poderá
ser deferido ao interessado falecido o pedido de adoção unilateral post mortem.
Tratando-se de adoção em conjunto, um cônjuge não pode adotar sem o consentimento
do outro. Assim, se proposta adoção em conjunto e um dos autores (candidatos a pai/mãe)
desiste da ação, a adoção deve ser indeferida, especialmente se o outro vem a morrer antes de
manifestar-se sobre a desistência.
O art. 39, §2º, do ECA veda a adoção por procuração, pois a adoção tem caráter
personalíssimo. É vedada ainda a adoção por ascendente ou por irmão. Veja que a limitação,
quanto à adoção por parentes, não se estende a tios, sobrinhos e outros.
Excepcionalmente, entretanto, o STJ já deferiu a adoção de descendente por
ascendente em razão das peculiaridades do caso concreto, como no caso em que a pessoa ficou
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381
grávida em tenra idade, em decorrência de abuso sexual. Nesta situação, o STJ entendeu por
bem admitir a adoção pelos avós do seu neto, em virtude de que a mãe e o filho haviam sido
criados como se irmãos fossem (REsp 1.635.649).
Nesse caso, podemos dizer que houve colisão entre a regra prevista no art. 42, §1º, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, e o princípio do melhor interesse da criança, tendo o STJ,
com sua decisão, dado primazia ao princípio do melhor interesse da criança.
O art. 46 do ECA diz que a adoção será precedida de um estágio de convivência. Essa é
a regra, entretanto, pode ocorrer a dispensa do estágio de convivência se o adotando já estiver
sob tutela ou guarda legal do adotante.
É importante destacar que, nos termos da lei, a simples guarda de fato não dispensa o
estágio de convivência (art. 46, §2º, ECA).
Ainda, se estivermos diante de uma adoção internacional, esse estágio de convivência
terá o prazo mínimo de 30 dias e sempre ocorrerá.
O art. 48 do ECA diz que o adotado tem direito de conhecer a sua origem biológica. Em
sendo assim, mesmo adotado, ele terá direito a obter o acesso irrestrito ao processo no qual
fora deferida a adoção, inclusive quanto aos eventuais incidentes processuais, desde que tenha
completado 18 anos.
É importante destacar aqui a diferença dessa situação à daquela em que a paternidade
é decorrente de doação de sêmen. Na hipótese da doação de material genético, como vimos,
há proteção quanto à identidade do doador.
Destaque-se, ademais, que esse acesso à verdade biológica/genética é um direito do
adotado. Porém, de suas certidões do registro não poderá constar nenhuma observação sobre
a origem do ato de adoção (art. 47, §4º, ECA).
Encerrado o processo de adoção, eventual morte do adotante não restabelece o poder
familiar dos pais naturais (art. 49, ECA).
Como consequência da ruptura com a família biológica, a adoção põe termo a todos os
direitos e obrigações dela decorrentes. A substituição assenta em que o adotado ingressa no lar
do adotante na condição de filho, e, por conseguinte, opera-se em substituição no campo do
poder familiar, da prestação de alimentos, dos direitos da personalidade e no direito sucessório.
Portanto, o adotante poderá ser herdeiro do adotado, assim como, na forma do art. 1.839, o
adotado poderá ser herdeiro dos parentes do adotante. Mantém-se a orientação estatutária do
art. 41 do ECA, que atribui a condição de filho ao adotado, desligando-o de qualquer vínculo
com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais (PEREIRA, 2018, pg. 401).
379
382
adotando; e não havia predominância de interesse econômico na pretensão
de adoção. De fato, a adoção de descendentes por ascendentes passou a ser
censurada sob o fundamento de que, nessa modalidade, havia a predominância do
interesse econômico, pois as referidas adoções visavam, principalmente, à
possibilidade de se deixar uma pensão em caso de falecimento, até como ato de
gratidão, quando se adotava quem havia prestado ajuda durante períodos difíceis.
Ademais, fundamentou-se a inconveniência dessa modalidade de adoção no
argumento de que haveria quebra da harmonia familiar e confusão entre os graus
de parentesco, inobservando-se a ordem natural existente entre parentes. Atento a
essas críticas, o legislador editou o § 1º do art. 42 do ECA, segundo o qual "Não
podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando", visando evitar que o
instituto fosse indevidamente utilizado com intuitos meramente patrimoniais ou
assistenciais, bem como buscando proteger o adotando em relação a
eventual confusão mental e patrimonial decorrente da transformação dos avós em
pais e, ainda, com a justificativa de proteger, essencialmente, o interesse da criança
e do adolescente, de modo que não fossem verificados apenas os fatores
econômicos, mas principalmente o lado psicológico que tal modalidade geraria no
adotado. No caso em análise, todavia, é inquestionável a possibilidade da mitigação
do § 1º do art. 42 do ECA, haja vista que esse dispositivo visa atingir situação distinta
da aqui analisada. Diante da leitura do art. 1º do ECA ("Esta Lei dispõe sobre a
proteção integral à criança e ao adolescente") e do art. 6º desse mesmo diploma
legal ("Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se
dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e
a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em
desenvolvimento"), deve-se conferir prevalência aos princípios da proteção
integral e da garantia do melhor interesse do menor. Ademais, o § 7º do art. 226 da
CF deu ênfase à família, como forma de garantir a dignidade da pessoa humana, de
modo que o direito das famílias está ligado ao princípio da dignidade da pessoa
humana de forma molecular. É também com base em tal princípio que se deve
solucionar o caso analisado, tendo em vista se tratar de supraprincípio
constitucional. Nesse contexto, não se pode descuidar, no direito familiar, de que as
estruturas familiares estão em mutação e, para se lidar com elas, não bastam
somente as leis. É necessário buscar subsídios em diversas áreas, levando-se em
conta aspectos individuais de cada situação e os direitos de 3ª Geração. Dessa
maneira, não cabe mais ao Judiciário fechar os olhos à realidade e fazer da letra do
§ 1º do art. 42 do ECA tábula rasa à realidade, de modo a perpetuar interpretação
restrita do referido dispositivo, aplicando-o, por consequência, de forma estrábica e,
dessa forma, pactuando com a injustiça. No caso analisado, não se trata de mero
caso de adoção de neto por avós, mas sim de regularização de filiação socioafetiva.
Deixar de permitir a adoção em apreço implicaria inobservância aos interesses
básicos do menor e ao princípio da dignidade da pessoa humana. REsp 1.448.969-
SC, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 21/10/2014. (INF. 551).
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383
ação "quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular"
deve se aplicar, por lógica, coerência e simetria, também à adequada
configuração da legitimação passiva da ação rescisória. Por essa razão, o
falecimento da parte após o trânsito em julgado da sentença a ser rescindida
implica sucessão processual não apenas no polo ativo, mas também no polo
passivo. Como se sabe, a legitimidade passiva decorre de uma relação lógica e
abstrata entre quem pede, o que se pede e contra quem se pede, devendo
figurar no polo passivo a pessoa indicada pelo autor que possa ser compelida e
reúna condições de satisfazer o pedido inicial. Tendo em mira essa premissa,
conclui-se que, evidentemente, o espólio não é parte legítima para responder à
ação rescisória em que se pleiteie a rescisão de sentença e o rejulgamento de
ação investigatória de paternidade post mortem, seja como legitimado
exclusivo, seja como litisconsorte passivo necessário, na medida em que, nessa
ação, nada será pedido contra o espólio, que tão somente é um ente
despersonalizado apto a titularizar a universalidade jurídica denominada
herança até que se efetive a partilha dos bens. Sublinhe-se que as eventuais
repercussões econômicas ou patrimoniais derivadas do reconhecimento, ou não,
da filiação que se pretende alcançar por intermédio da ação investigatória
de paternidade é que poderão, hipoteticamente, ser objeto de pretensões
autônomas que serão deduzidas contra o espólio, como já se consignou em
precedentes desta Corte em relação à petição de herança (AgRg no Ag
580.197/SP, Quarta Turma, DJe 04/05/2009) e à execução de dívidas do de
cujus (REsp 1.559.791/PB, Terceira Turma, DJe 31/08/2018). REsp 1.667.576-
PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em
10/09/2019, DJe 13/09/2019. (INF. 653)
O artigo 1.630/CC estabelece que “os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto
menores”.
Percebe-se, então, desde já, que o poder familiar é instituto que vincula os pais aos filhos
ainda menores, atribuindo àqueles o exercício de direitos e deveres em relação à pessoa dos
filhos e seus bens, sempre se levando em consideração o melhor interesse da criança e do
adolescente.
Como bem adverte Flávio Tartuce, “o poder familiar é uma decorrência do vínculo
jurídico de filiação, constituindo o poder exercido pelos pais em relação aos filhos, dentro da
ideia de família democrática, do regime de colaboração familiar e de relações baseadas,
sobretudo, no afeto” (TARTUCE, 2020, p. 2057).
O artigo 1.631/CC estabelece que, durante o casamento e união estável, o exercício do
poder familiar compete aos pais em igualdade de condições, de forma que, consoante parágrafo
único do mesmo artigo, se houver divergência entre os genitores, poderá qualquer um deles
recorrer ao judiciário para buscar a solução do desacordo.
O poder familiar perdurará enquanto menores os filhos, podendo cessar antes em caso
de emancipação (art. 5º, CC).
O art. 1.632/CC deixa claro que a separação judicial, o divórcio ou a dissolução de união
estável não alteram relações de pais e filhos, inclusive o direito à convivência, ainda que haja
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384
alguma alteração na situação. Em outras palavras, a separação, o divórcio ou a dissolução da
união estável não afetam o exercício do poder familiar.
Como dito, o poder familiar confere aos genitores não só direitos, mas também deveres,
que podem ser extraídos da leitura do art. 1.634/CC.
Estabelece o referido artigo, alterado pela Lei nº 13.058/2014, as atribuições desse
exercício que compete aos pais, verdadeiros deveres legais, a saber:
a) dirigir a criação e a educação dos filhos;
b) exercer a guarda unilateral ou compartilhada, nos termos do art. 1.584;
c) conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
d) conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;
e) conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência
permanente para outro Município;
f) nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não
lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
g) representá-los, judicial ou extrajudicialmente até os 16 anos, nos atos da vida civil e
assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
h) reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
i) exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e
condição.
A última das atribuições do poder familiar, elencada no artigo transcrito, merece
atenção diante do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Com isso, é de se
considerar que a obediência que os filhos devem prestar aos pais, detentores do poder familiar,
tem que ser interpretada de acordo com o princípio da razoabilidade. Em outras palavras, caso
os pais exijam dos filhos obediência em ações desarrazoadas, haverá violação ao princípio da
dignidade da pessoa humana, a justificar o seu não cumprimento.
Sobre essa questão, é importante lembrar a Lei da Palmada, que tem por objetivo dar
concretude à ideia de razoabilidade na educação e no dever de obediência do filho. Ela é
conhecida também como a Lei Menino Bernardo.
Essa lei alterou dispositivos do ECA e inseriu o art. 18-A, que diz ter a criança ou
adolescente o direito de ser criado sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou
degradante como forma de correção, disciplina ou educação.
Como é de conhecimento geral, a lei causou e ainda causa muita polêmica por
estabelecer uma forte intervenção do Estado no modo de educação dos filhos. É de se considerar
que seu escopo não é proibir a atuação de educação e correção dos pais no exercício do poder
familiar, mas sim vedar o tratamento degradante, cruel e humilhante do filho.
Ainda em relação ao exercício do poder familiar, os pais estão proibidos de explorar
economicamente os filhos, não podendo imputar a estes serviços que não sejam compatíveis
com a sua idade e a sua condição.
O exercício abusivo do poder familiar poderá implicar na suspensão ou mesmo na sua
extinção (arts. 1.635 e seguintes do Código Civil).
Em relação aos efeitos do poder familiar, pai e mãe são tratados como usufrutuários dos
bens dos filhos. No entanto, os pais não poderão alienar os bens dos filhos e tampouco gravar
com ônus reais, salvo se houver necessidade ou se for melhor para o filho, caso em que será
indispensável a autorização judicial, com intervenção do Ministério Público.
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Se estes atos de alienação ou disposição forem realizados sem autorização judicial, o ato
de disposição será tido como nulo.
Ainda em relação ao exercício do poder familiar e, considerando que nele estão
abrangidos não só direitos, como também deveres, uma questão que se coloca aqui diz respeito
à obrigatoriedade dos genitores de darem afeto aos filhos. Em outras palavras, o que se lança à
discussão neste ponto é acerca da possibilidade de condenação de um genitor pelo denominado
“abandono afetivo”.
Um dos fundamentos para essa responsabilização poderia ser extraído do artigo
1.632/CC, que estabelece o direito dos pais a terem os filhos em sua companhia. Esse direito
geraria, na contrapartida, a expectativa dos filhos quanto ao efetivo exercício da manutenção
da companhia recíproca. Com o abandono afetivo, haveria uma quebra desse dever de
companhia. Por essa linha de raciocínio, se há a quebra do dever, haveria um direito à
indenização em decorrência dessa quebra, ou seja, responsabilidade civil pelo abandono afetivo.
Essa matéria é, ainda, bem polêmica. Daniel Carnacchioni entende que não se pode
extrair consequências jurídicas da falta de afeto. Para o autor, “se não existe, não se pode dele
extrair efeito jurídico algum, pois um núcleo de pessoas anafetivas é apenas um núcleo ou uma
reunião de pessoas, mas não uma família”. Ele continua, alertando que
Como bem lembra o mesmo autor, o STJ já admitiu a tese do abandono afetivo como
princípio a justificar a tese do abandono afetivo (REsp 1159242/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi).
Diz o artigo 1.635 do Código Civil que a extinção do poder familiar ocorrerá:
• pela morte dos pais;
• pela morte dos filhos;
• pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único;
• pela maioridade;
• pela adoção;
• pela decisão judicial, na forma do artigo 1.638 (que trata da perda do poder
familiar).
É importante ficar claro que o artigo 1.638/CC trata da “extinção do poder familiar”,
elencando como uma das hipóteses dessa extinção a denominada “destituição do poder
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familiar” ou “perda do poder familiar”. Então, tem-se que a destituição é uma das hipóteses de
extinção do poder familiar e ocorrerá nos casos elencados no artigo 1.638/CC.
Considerando, então, o disposto nesse art. 1.638 do CC, temos hipóteses que
fundamentam a decisão de destituição do poder familiar por sentença judicial. São elas:
a) o castigo imoderado do filho;
b) o abandono do filho;
c) a prática de atos contrários à moral e aos bons costumes;
d) a incidência reiterada nas faltas previstas no art. 1.637 do CC; e
e) a entrega, de forma irregular, do filho a terceiros para fins de adoção. Essa última
previsão foi incluída pela Lei nº 13.509/2017.
Após essa alteração de 2017, houve ainda uma alteração datada de 2018, para inclusão
do parágrafo único ao artigo 1.638/CC, trazendo novas hipóteses de destituição do poder
familiar, por força da Lei nº 13.715.
Com a inclusão desse novo parágrafo único, perderá também por ato judicial o poder
familiar aquele que praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar:
a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte,
quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou
discriminação à condição de mulher;
b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão.
É de se lembrar, ademais, do disposto no art. 1.637 do CC/2002, pelo qual temos que
“se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou
arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público,
adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até
suspendendo o poder familiar, quando convenha.” Ademais, conforme parágrafo único do
mesmo artigo “suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe
condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de
prisão”.
A Lei nº 12.318/2010 caracteriza a alienação parental no seu artigo 2º, dizendo que:
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autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao
estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Extrai-se, então, que a alienação parental se caracteriza pela ação daquele que exerça
alguma forma de atuação sobre a criança ou adolescente, interferindo na sua formação
psicológica, podendo ser promovida ou induzida por um dos pais, pelos avós, ou por qualquer
adulto que tenha a criança ou o adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância.
O objetivo da conduta, na maior parte dos casos, é prejudicar o vínculo da criança ou do
adolescente com o(a) genitor(a).
Como se percebe da legislação invocada, temos que o sujeito ativo da alienação, ou seja,
o alienador pode ser tanto um dos genitores, avós ou qualquer outra pessoa que tenha sob sua
autoridade, guarda ou vigilância criança ou adolescente. Já o sujeito passivo (alienado), em
princípio a vítima, é a criança e o adolescente, aquele que é manipulado e sofre interferência
psicológica. No entanto, começa-se a discutir na doutrina e na jurisprudência a possibilidade de
o idoso também ser vítima de alienação parental.
A alienação parental fere o direito fundamental da criança e do adolescente (e para
alguns, para o idoso também) à convivência familiar saudável, sendo, ainda, um
descumprimento dos deveres relacionados à autoridade dos pais ou decorrentes de tutela ou
guarda.
A alienação parental é um ato ilícito, podendo gerar responsabilidade civil do alienador.
Conforme previsão da própria lei, ficando caracterizada a alienação parental, o juiz
poderá:
• declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
• para compensar isso, poderá aumentar o regime de convivência familiar com
genitor que sofreu os efeitos decorrentes da alienação parental;
• estipular uma multa ao alienador;
• determinar o acompanhamento psicológico ou biopsicossocial da criança, do
genitor alienador e do genitor alienado;
• alterar a guarda;
• declarar a suspensão da autoridade parental do genitor.
Percebe-se que, diferentemente do que muitas vezes propagado, a alienação parental
não necessariamente implicará em suspensão da autoridade parental ou mudança de guarda.
Essas medidas extremas serão tomadas se atenderem ao melhor interesse da criança e do
adolescente. Aliás, esse é o princípio que sempre norteará o julgador na análise dos
procedimentos que envolvam menores.
Ainda em relação à alienação parental, na perspectiva de aprimoramento do
protecionismo legislativo, a Lei nº 13.431/2017, em vigor desde 05/04/2018, que estabelece
sistemas de proteção aos direitos de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de
violência, veio traçar novos rumos também ao tema da alienação. Reconhece, assim, como
violência psicológica o ato de alienação (art. 4, II, b), assegurando o direito de pleito de medida
protetiva à luz da conexão com os dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente.
A guarda, como forma de proteção aos filhos, é disciplinada a partir do artigo 1.583 do
Código Civil, sendo admitidas, então, duas espécies de guarda:
385
388
• guarda unilateral: que seria aquela concedida a apenas um dos pais, exercendo
o outro o direito à visitação; ou
• guarda compartilhada: quando deferida a ambos os genitores.
Daniel Carnacchioni lembra que
Muito embora o autor faça referência a esses dois tipos de guarda, asseverando que
decorrem da doutrina e jurisprudência, certo é que a legislação somente disciplina a guarda
unilateral e a compartilhada, havendo muita resistência, mesmo pela jurisprudência, de
deferimento das demais por não parecerem, em regra, atender ao melhor interesse da criança
e do adolescente. Todavia, em situações especiais, comprovado o benefício ao menor, é possível
o deferimento desses modelos não previstos em lei. Há, inclusive, julgados do STJ nesse sentido.
Confira-se: REsp 1591161/SE RECURSO ESPECIAL 2015/0048966-7, Rel. Min. Ricardo Villas Boas
Cueva, 3ª Turma, data do julgamento: 21/2/2017)).
De acordo com a legislação vigente, na atualidade, então, estão regulamentadas as
guardas unilateral e compartilhada, sendo que, conforme se extrai da leitura do artigo 1.584,
§2º, do CC, “quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho,
encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda
compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do
menor”.
Percebe-se, então, que a regra é o estabelecimento da guarda compartilhada, ainda que
não haja acordo entre os genitores. Há diversas manifestações jurisprudenciais do STJ no sentido
de que não é necessária a transigência dos genitores para que haja o deferimento da guarda
compartilhada, podendo ela, como se viu da leitura do artigo transcrito, ser imposta pelo
julgador em benefício da criança e do adolescente.
O art. 1.583, §2º, CC, diz que, na guarda compartilhada, o tempo de convivência com o
filho deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e o pai, sempre tendo em vista as
condições fáticas e o interesse dos filhos.
Já o §3º do mesmo artigo estabelece que na guarda compartilhada a cidade considerada
base da moradia do filho é aquela que atender à necessidade dos filhos.
A leitura desses dois dispositivos leva a certa confusão porquanto parecem tratar, em
essência, da guarda alternada, mencionando questões como divisão equilibrada de tempo de
convivência e base de moradia.
Sobre essa aparente confusão, Tartuce faz uma crítica, dizendo que
com o devido respeito ao pensamento contrário, a este autor a novel legislação traz
dois principais problemas. De início, como primeiro problema, quando há menção a
uma custódia física dividida, parece tratar de guarda alternada e não de guarda
compartilhada, conforme classificação que ainda será exposta (TARTUCE, 2020, p.
1928).
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389
com a Lei 13.058/2014 passou-se a estabelecer que ‘na guarda compartilhada, a
cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos
interesses dos filhos’. Mais uma vez a confusão entre guarda compartilhada e
alternada fica clara, pois se reconhece a viabilidade de o filho residir em lares e
cidades distintas, ao se considerar uma cidade como base da moradia (TARTUCE,
2020, p. 1928).
Essa questão foi objeto de debate na VII Jornada de Direito Civil/2015, tendo surgido daí
os seguintes enunciados importantes sobre o tema: o primeiro deles estabelece que
a divisão, de forma equilibrada, do tempo de convívio dos filhos com a mãe e com
o pai, imposta para a guarda compartilhada pelo § 2.º do art. 1.583 do Código Civil,
não deve ser confundida com a imposição do tempo previsto pelo instituto da guarda
alternada, pois esta não implica apenas a divisão do tempo de permanência dos
filhos com os pais, mas também o exercício exclusivo da guarda pelo genitor que se
encontra na companhia do filho (Enunciado n. 604).
Por fim, outro enunciado conclui que “a guarda compartilhada não exclui a fixação do
regime de convivência” (Enunciado n. 605).
Estando estabelecida a diferenciação entre guarda compartilhada e guarda alternada,
segue-se que na guarda compartilhada, não havendo essa alternância de residências, mas sim a
fixação de um lar de referência com estabelecimento de regime de convivência entre os
genitores, é possível concluir que a guarda compartilhada não exclui a fixação de prestação
alimentícia, baseada sempre na necessidade do alimentando e possibilidades do alimentante.
Dessa forma, temos que na guarda compartilhada, ambos os genitores terão o exercício
da guarda, mas será fixado o lar de referência, com regime de convivência em relação ao outro
genitor, que, em regra, ficará obrigado a prestar alimentos com base no binômio
necessidade/possibilidade.
O art. 1.583, §5º, CC diz que a guarda unilateral obriga o pai e a mãe, que não detenha
a guarda, a supervisionar os interesses do filho. A fim de possibilitar essa supervisão, qualquer
dos genitores que não tenha a guarda terá a legitimidade para prestar informações e prestar
contas de assunto que interessa ao filho, direta ou indiretamente.
É a ideia de fiscalização da atuação do ex-cônjuge que tenha a guarda do menor.
O art. 1.584/CC diz que a guarda unilateral ou compartilhada pode ser efetivada por dois
meios:
• requerida por consenso pelo pai ou pela mãe, ou qualquer deles numa ação
autônoma; ou
• por decisão judicial, decretada pelo juiz, observando os interesses do menor e
levando em conta o tempo que cada um dos pais possui.
A legislação alerta para a necessidade de o juiz, em audiência de conciliação de processo
que verse sobre a guarda dos filhos menores, esclarecer os genitores sobre o significado e a
importância da guarda compartilhada.
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390
Como já mencionado anteriormente, se, entretanto, os genitores não chegarem a um
consenso quanto à guarda compartilhada, o §2º, do artigo 1.584/CC estabelece que, “se não
houver acordo entre os pais quanto à guarda do filho, e se ambos estiverem aptos a exercer o
poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um deles expressamente declarar
que não deseja a guarda do menor”.
É com base nisso que a guarda compartilhada passa a ser a modalidade compulsória e
regra da guarda. Portanto, se os dois podem exercer o poder familiar, o juiz fixará a guarda
compartilhada, passando a ser a regra.
O STJ tem vários julgados sobre o tema, concluindo que a guarda compartilhada é a
regra e somente deixará ser aplicada se houver inaptidão de um dos ascendentes para o
exercício do poder familiar, fato que deverá ser declarado, prévia ou incidentalmente à ação de
guarda, por meio de decisão judicial (Inf. 595/STJ).
Sendo a guarda compartilhada regra, o seu não estabelecimento somente ocorrerá em
casos específicos, que, nos termos da lei (§ 2º do art. 1.584/CC), seriam na hipótese de
declaração de um dos genitores quanto ao não desejo de exercício da guarda do menor e na
hipótese de não exercício, por parte de um deles, do poder familiar.
Todavia, o STJ está dividido sobre a possibilidade de relativização desse dispositivo legal.
Temos, então, dois posicionamentos principais:
1ª Posição: entende que, pela redação do art. 1.584 do CC, a guarda compartilhada
apresenta força vinculante, devendo ser obrigatoriamente adotada, salvo se um dos genitores
não estiver apto a exercer o poder familiar ou se um deles declarar ao magistrado que não deseja
a guarda do menor. Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp 1626495/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi,
julgado em 15/09/2016.
2ª Posição: compreende que outras questões devem ser analisadas, de forma que
peculiaridades do caso concreto podem servir como argumento para que não seja
implementada a guarda compartilhada. Ex: se houver dificuldades geográficas (pai mora em
uma cidade e mãe em outra, distante (STJ. 3ª Turma. REsp 1605477/RS, Rel. Min. Ricardo Villas
Bôas Cueva, julgado em 21/06/2016).
Se houver o descumprimento imotivado da guarda, seja unilateral ou compartilhada,
haverá redução das prerrogativas atribuídas ao seu detentor.
Se o juiz perceber que o filho não deve permanecer na guarda dos pais, poderá deferir,
excepcionalmente, essa guarda a uma terceira pessoa, que demonstre essa compatibilidade
com a natureza da guarda. O juiz vai considerar preferencialmente as relações de parentesco,
afinidade e principalmente relações de afeto entre a criança ou adolescente e a pessoa que irá
deter a guarda do menor.
O art. 1.584, §6º, CC diz que qualquer estabelecimento público ou privado é obrigado a
prestar informações a qualquer dos genitores sobre seus filhos, sob pena de multa de 200 reais
a 500 reais por dia de não atendimento. O que a legislação está a estabelecer nesse artigo é que,
mesmo sem ter a guarda, os pais tenham acesso a informações sobre o(a) filh0(a), porquanto,
para além da guarda, os genitores são detentores do poder familiar.
O artigo 1.588, CC estabelece que “o pai ou a mãe que contrair novas núpcias não perde
o direito de ter consigo os filhos, que só lhe poderão ser retirados por mandado judicial, provado
que não são tratados convenientemente”.
Em relação às novas núpcias dos genitores, as Jornadas de Direito Civil concluíram que:
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Enunciado n. 337: “O fato de o pai ou a mãe constituírem nova união não repercute no
direito de terem os filhos do leito anterior em sua companhia, salvo quando houver
comprometimento da sadia formação e do integral desenvolvimento da personalidade destes”.
Enunciado n. 338: “A cláusula de não-tratamento conveniente para a perda da guarda
dirige-se a todos os que integram, de modo direito ou reflexo, as novas relações familiares”.
Importante previsão está no art. 1.589, parágrafo único, CC, que estende o direito de
visita aos avós.
Além da previsão legal, é possível estender o direito de visitação a outras pessoas que
guardem uma afinidade com o menor. Ex.: é o caso do padrasto que sempre cuidou da criança.
É possível regulamentar essa visitação pelo juiz, a despeito de inexistência de previsão legal,
sempre tendo como princípio norteador o melhor interesse da criança e do adolescente.
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disposto no art. 1.584, § 2º, do CC. O texto de lei, feito com a melhor técnica
redacional, por trazer um elemento positivo: a condição necessária para a guarda
compartilhada, aponta, em via contrária, para a circunstância que impedirá a
imposição dessa mesma guarda compartilhada: a inaptidão para o exercício do
poder familiar. E aqui reside uma outra inovação neste texto legal, de quilate
comparável à própria imposição da guarda compartilhada, que consiste na
evidenciação dos únicos mecanismos admitidos em lei para se afastar a imposição
da guarda compartilhada: a suspensão ou a perda do poder familiar. A suspensão
por gerar uma inaptidão temporária para o exercício do poder familiar (art. 1637 do
CC); a perda por fixar o término do Poder Familiar. Ocorre, porém, que ambas as
situações exigem, pela relevância do direito atingido, que haja uma prévia
decretação judicial do fato, circunstância que, pela íntima correlação com a espécie,
também deverá ser reproduzida nas tentativas de oposição à guarda
compartilhada. É dizer, um ascendente só poderá perder ou ter suspenso o seu
poder/dever consubstanciado no poder familiar por meio de uma decisão judicial e,
só a partir dessa decisão, perderá a condição essencial para lutar pela guarda
compartilhada da prole, pois deixará de ter aptidão para exercer o poder familiar.
Essa interpretação, que se extrai do texto legal, embora não crie uma exceção
objetiva à regra da peremptoriedade da guarda compartilhada, tem o mérito de
secundar o comando principal, pois se passa a exigir, para a não aplicação da guarda
compartilhada, um prévio ou incidental procedimento judicial declarando a
suspensão ou perda do poder familiar, com decisão judicial no sentido da suspensão
ou da perda. REsp 1.629.994-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado
em 6/12/2016, DJe 15/12/2016. (INF. 595).
7. ALIMENTOS
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393
todo o aparato necessário à obtenção do mínimo necessário à sobrevivência de cada um
(CARNACCHIONI, 2018, p. 1.582).
Recorde-se que a Constituição de 1988 determinou, em seu art. 229, que “os pais têm
o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e
amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
Assim, os alimentos, decorrentes das relações familiares, possuem base constitucional,
fundando-se no próprio princípio da dignidade da pessoa humana, como também no princípio
da solidariedade.
Como bem esclarece Paulo Nader, entre os direitos subjetivos mais invocados em juízo,
incluem-se os alimentos, que se acham ligados, umbilicalmente, aos valores de sobrevivência.
Consistem numa prestação periódica, decorrente do vínculo familiar, declaração de vontade ou
ato ilícito, devida pelo alimentante, que dispõe de recursos, ao alimentando, que deles carece
para prover as necessidades vitais próprias (NADER, 2016, p. 503).
Para o nosso estudo, interessa os alimentos decorrentes do vínculo familiar, ou seja,
decorrentes do parentesco ou do casamento e união estável.
Diz o art. 1.694/CC que
A partir da leitura do artigo, já é possível extrair os requisitos para fixação dos alimentos,
que, em suam, podem assim ser elencados:
- as necessidades do(a) alimentando(a); e
- as possibilidades do(a) alimentante.
Fala-se, então, em binômio necessidade/possibilidade, tendo, para alguns
doutrinadores, que se observar, ademais, a proporcionalidade nessa fixação. Nesse contexto,
para essa parte da doutrina, teríamos, em verdade, o trinômio
necessidade/possibilidade/proporcionalidade.
Os alimentos são prestações destinadas à satisfação de necessidades pessoais do
alimentando. Essas necessidades que a pessoa tem, mas que não consegue prover por si mesma.
São pressupostos para que exista o direito a alimentos:
• Vínculo entre alimentante e alimentando (casamento, união estável ou parentesco);
• Necessidade do alimentando;
• Possibilidade do alimentante.
Conforme evolução da sociedade, que acabou por interferir na própria visão dos
tribunais sobre os alimentos devidos entre cônjuges e companheiros, o STJ consolidou
entendimento no sentido de que os alimentos entre os cônjuges têm caráter excepcional,
porquanto a regra na atualidade é de que todos trabalham, diferentemente do tempo em que
a mulher era a chamada “dona de casa” e dependia financeiramente do marido ou do
companheiro.
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394
Os tempos mudaram e a jurisprudência pátria acompanhou essa mudança. Nesse
sentido, confira-se posicionamento do STJ sobre a matéria: AgInt no AREsp 1256698 / RS, Rel.
Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma).
Assim, excepcionalmente, os alimentos serão fixados entre ex-cônjuges e ex-
companheiros. Ademais, possuem, em regra, natureza transitória.
Em relação aos alimentos devidos em decorrência da relação de filiação, o art. 1.703/CC
diz que, para manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente irão contribuir na
proporção de seus sustentos. Ou seja, os pais serão obrigados a contribuir proporcionalmente
com os alimentos e é importante lembrar que isso acontecerá ainda que a guarda seja fixada de
forma compartilhada. Em outras palavras, é preciso dizer que a guarda compartilhada, como se
viu, não exclui o dever de pagar alimentos.
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395
sendo que, conforme artigo 206, §2º, CC, o prazo prescricional seria de 2 anos, com
a ressalva quanto ao seu não transcurso enquanto perdurar o poder familiar (art.
197, II, CC). Assim, admite-se a prescrição, mas não do direito em si, e sim da
cobrança das prestações vencidas.
• Irrepetibilidade: doutrina e jurisprudência reconhecem que os alimentos não estão
sujeitos à repetição do indébito. Uma vez pagos, não serão devolvidos.
• Alternatividade da prestação: a prestação de alimentos pode ser satisfeita
mediante pagamento de valores ou fornecimento de meios que suprirão
diretamente as necessidades do alimentando (ex. pagamento direto das
mensalidades escolares, cursos, fornecimento de vestuário, etc.).
• Divisibilidade: a obrigação alimentar é divisível entre os vários devedores, na
medida de suas possibilidades. Se os devedores possuem recursos iguais, o quantum
da prestação deverá ser igualmente partilhado. Não se instaura solidariedade entre
os devedores, salvo se o alimentando for pessoa idosa, consoante previsão do art.
12 da Lei nº 10.741/03. Nesse particular, merece destaque o posicionamento do STJ
sobre a obrigação dos avós. É orientação do STJ que a responsabilidade dos avós de
prestar alimentos é subsidiária, e não sucessiva. Essa obrigação tem natureza
complementar e somente exsurge se ficar demonstrada a impossibilidade de os
genitores proverem os alimentos de seus filhos. “A obrigação alimentar dos avós
tem natureza complementar e subsidiária, somente se configurando no caso da
impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais.” (Súmula 596/STJ).
• Não sujeito à arbitragem: essa proibição está expressa na disposição do art. 852 do
NCPC.
393
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que o cônjuge culpado pela dissolução da sociedade conjugal, caso deles necessite
e não existam outros obrigados, terá direito apenas a esse tipo de alimentos.
• Alimentos civis (côngruos): os alimentos fixados para além daqueles tidos como
necessários, são considerados alimentos civis. Eles não se limitam a suprir as
carências fundamentais, mas propiciam melhor qualidade de vida, atendendo às
condições sociais da partes, observado o binômio necessidade-possibilidade. No
caso de separação, por exemplo, terão por objetivo manter o statusa quo,
mantendo o padrão de vida anterior.
Quanto à forma de pagamento, os alimentos podem ser:
• Alimentos próprios (in natura): são os alimentos pagos na forma de prestações
materiais, como fornecimento dos alimentos, vestuário, moradia, etc.
• Alimentos impróprios: são os mais comuns, pagos com valores em dinheiro.
Quanto à finalidade, os alimentos podem ser:
• Alimentos definitivos: são aqueles fixados definitivamente. Há um acordo de
vontades ou uma sentença judicial transitada em julgado. Não obstante o caráter
definitivo, é preciso sempre ter em conta que a sentença na ação de alimentos
transita apenas formalmente, já que é possível rediscutir os valores, sempre que
houver alteração substancial nas condições de quem paga os alimentos ou daquele
que recebe.
• Alimentos provisórios: são os alimentos fixados antes da sentença, seguindo o rito
especial da Lei de Alimentos (Lei nº 5.478/68). Assim, os alimentos provisórios são
aqueles fixados em ação principal, cujo pedido final seja a própria fixação definitiva
de alimentos. Os alimentos provisórios dependem da prova pré-constituída do
vínculo existente entre alimentante e alimentado (com ressalva aos alimentos
gravídicos).
• Alimentos provisionais: são alimentos que decorrem de outras ações que não
propriamente a ação de alimentos, que possui rito próprio (Lei 5.478/68). Em outras
ações, a fixação de alimentos terá esse caráter provisional. É a hipótese de fixação
de alimentos na ação de separação de corpos. Para a fixação dos alimentos
provisionais, a lei exige a prova do fumus boni iures e periculum in mora. É
importante lembrar que, no caso de violência doméstica, o juiz, ao analisar os
pedidos de medidas protetivas, poderá fixar os alimentos provisionais.
• Alimentos transitórios: são os alimentos em que são fixados por um período de
tempo em prol do ex-cônjuge ou ex-companheiro, a fim de que consiga se reajustar
e se realocar no mercado de trabalho. Tem o termo pré-determinado. Como vimos,
de acordo com a jurisprudência dominante, na atualidade, essa é a regra.
A análise dos artigos 1.696 e 1.697 do Código Civil nos mostra qual é a ordem
preferencial no pagamento dos alimentos. Consoante referidos artigos, temos:
- primeiro a obrigação recai sobre pais e filhos entre si (reciprocidade);
- na falta destes, a obrigação cabe aos demais ascendentes, na ordem de sua
proximidade;
- na falta de ascendentes, a obrigação cabe aos descendentes, na ordem da sucessão;
- na falta de descendentes, a obrigação cabe aos irmãos.
Nessa análise da ordem preferencial, é preciso destacar a situação dos avós, os quais,
conforme entendimento jurisprudencial consolidado, possuem obrigação subsidiária
complementar (Súmula 596/STJ).
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Ainda sobre a ordem preferencial, questiona-se se, em não havendo ascendentes,
descendentes e irmãos, seria possível estender a obrigação aos demais colaterais que não
somente aos irmãos. Exemplificando, se João não tem ascendentes vivos e nem tampouco
descendentes, inexistindo ainda irmãos. Nesse caso, tomando conhecimento de um tio com
boas condições financeiras, poderá exigir alimentos dele?
A pergunta tem razão de ser porquanto, em caso de sucessão, esses colaterais, na
ausência de descendentes, ascendentes e irmãos, irão se beneficiar em termos sucessórios. Se
podem se beneficiar, não poderiam também ser obrigados ao pagamento dos alimentos?
O STJ enfrentou a questão, concluindo que a obrigação alimentar decorre da lei, que
indica os parentes obrigados de forma taxativa e não enunciativa, sendo devidos os alimentos,
reciprocamente, pelos pais, filhos, ascendentes, descendentes e colaterais até o segundo grau,
não abrangendo, consequentemente, tios e sobrinhos (CC, art.1.697). 2.- Agravo Regimental
improvido. (AgRg no REsp 1305614/DF, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado
em 17/09/2013, DJe 02/10/2013).
A lei civil não prevê a solidariedade nos alimentos e esta não pode ser presumida. O que
há é a divisibilidade entre os vários eventuais devedores. Essa divisibilidade não se verifica
apenas entre devedores de uma mesma classe. Isto porque, conforme se extrai da leitura do
artigo 1.698/CC, vemos que esse dispositivo prevê a hipótese de o obrigado, em primeiro lugar,
não dispor de recursos para prover, integralmente o encargo, caso em que os parentes de outra
classe devem ser chamados para complementação do quantum debeatur.
Não obstante a regra, quanto à obrigação alimentar, seja a divisibilidade, o Estatuto do
Idoso inovou ao prever, no artigo 12, a solidariedade em favor do alimentando. Diz o referido
artigo que “a obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores”
(artigo 12 do Estatuto do Idoso).
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7.1.7. A PRISÃO CIVIL COMO CONSEQUÊNCIA PELO NÃO PAGAMENTO DOS ALIMENTOS
Se o alimentante não paga os alimentos, será ele chamado a pagar, provar que o fez ou
comprovar a impossibilidade do não pagamento, limitada a cobrança, pelo rito da prisão, às
parcelas vencidas nos três meses imediatamente anteriores (súmula 309/STJ). Com o pedido,
todas as demais prestações que se vencerem estarão abrangidas no rito da prisão. Essa prisão
tem natureza coercitiva e não propriamente punitiva.
É o que se extrai da leitura do caput do artigo 528/NCPC que determina que no
cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão
interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o
executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a
impossibilidade de efetuá-lo.
É importante destacar que diferentemente do que é erroneamente divulgado, o credor
de alimentos não precisa aguardar três meses para promover a cobrança das prestações em
atraso. Nesse sentido, confira-se Enunciado n. 147, aprovado na II Jornada de Direito Processual
Civil do Conselho da Justiça Federal, em setembro de 2018: “basta o inadimplemento de uma
parcela, no todo ou em parte, para decretação da prisão civil prevista no art. 528, § 7.º, do CPC”.
O artigo 528, §2º, do NCPC prevê que somente a comprovação de fato que gere a
impossibilidade absoluta de pagar justificará o inadimplemento. Aqui se vê a construção trazida
há tempos pela doutrina e consolidada pela jurisprudência, que sempre caminhou
majoritariamente no sentido de que somente a impossibilidade do executado prover as próprias
expensas, definitiva ou temporariamente, e principalmente, de forma involuntária, é que
serviria como justificativa para o não pagamento de um valor cobrado em execução. Neste
sentido se posiciona LOBO (2017, p.388).
Se promovida a cobrança, o devedor optar por justificar o não pagamento, caso essa
justificativa não seja aceita, o juiz poderá, em se tratando de alimentos legais, além de
determinar o protesto da decisão judicial (novidade que não existia na legislação processual
anterior), decretar a prisão civil do devedor de alimentos.
Essa prisão será cumprida em regime fechado, ficando, entretanto, o alimentante
separado dos presos comuns. Segundo o STJ, o advogado que tenha contra si decretada prisão
civil por inadimplemento de obrigação alimentícia não tem direito a ser recolhido em sala de
Estado Maior ou, na sua ausência, em prisão domiciliar (Informativo 551/STJ).
Quanto ao prazo de prisão do devedor de alimentos, o Código de Processo Civil prevê
que poderá ser decretada pelo prazo de 1 a 3 (art. 528, §3º, NCPC). Esse prazo reproduz a
previsão do Código de Processo Civil anterior, mas diverge da previsão da Lei de Alimentos, para
a qual o limite máximo seriam 60 dias.
Sobre a divergência dos prazos previstos em diferentes legislações ainda em vigor, Flávio
Tartuce faz importantes observações ao afirmar que
396
399
Federal. Sendo assim, parece-nos que os alimentos provisionais continuam no
sistema, aplicando-se para tais verbas a regra do art. 19 da Lei de Alimentos,
especialmente pelo uso do termo para a instrução da causa. Em apurada síntese, a
nosso ver, para os alimentos provisionais a prisão deve ser de até 60 dias (TARTUCE,
2020, p. 2099).
397
400
No julgado REsp 1415727 / SC, o STJ utiliza os alimentos gravídicos para fundamentar a
existência de direitos do nascituro (nascituro como pessoa), afirmando que a titularidade desse
direito seria do nascituro e não da genitora.
A fixação desses alimentos não exige prova cabal da paternidade: apenas a existência
de meros indícios.
Com o nascimento, os alimentos convertem-se em favor da criança.
Como já dito, a obrigação avoenga não é uma obrigação solidária, já que a solidariedade
deve sempre ser expressa e não há dispositivo legal prevendo que avós são solidários no dever
de pagar alimentos. Somente o Estatuto do Idoso traz previsão de solidariedade em benefício
do idoso, o que não é a hipótese da obrigação avoenga. Para esse tipo de obrigação, prevê a
súmula 596/STJ que “A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária,
somente se configurando no caso da impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos
pais.”
Ademais, o STJ já decidiu que a ação contra os avós não precisa, necessariamente, ser
proposta contra todos os avós. Não se trata, nesse caso, de litisconsórcio necessário. Na
hipótese da ação ser promovida apenas em desfavor de um dos avós, o demandado poderá
indicar os demais, caso em que ter-se-á um litisconsórcio passivo ulterior facultativo simples.
Esse é o entendimento do TJDFT esboçado no julgado de Relatoria da Des. Simone, segundo o
qual a possibilidade de convocação de outros co-devedores, configura modalidade autônoma
de intervenção de terceiros promovida pelo ré (intervenção coacta e autônoma) (TJDFT,
Acórdão n.933198, 20150020268552AGI, Relator: SIMONE LUCINDO 1ª TURMA CÍVEL, Data de
Julgamento: 06/04/2016, Publicado no DJE: 27/04/2016. Pág.: 112-132).
398
401
os ALIMENTOS que puderem ser prestados pelo réu por ele indicado na petição
inicial, sem prejuízo de eventual e futuro ajuizamento de ação autônoma
de ALIMENTOS em face dos demais coobrigados. Contudo, nas hipóteses em que for
necessária a representação processual do credor de ALIMENTOS incapaz, cabe
também ao devedor provocar a integração posterior do polo passivo, a fim de que
os demais coobrigados também componham a lide, inclusive aquele que atua como
representante processual do credor dos ALIMENTOS, bem como cabe provocação
do ministério público, quando a ausência de manifestação de quaisquer dos
legitimados no sentido de chamar ao processo os demais coobrigados possa causar
prejuízos aos interesses do incapaz. No que tange ao momento processual adequado
para a integração do polo passivo pelos coobrigados, cabe ao autor requerê-lo em
sua réplica à contestação; ao réu, em sua contestação; e ao ministério público, após
a prática dos referidos atos processuais pelas partes, respeitada, em todas as
hipóteses, a impossibilidade de ampliação objetiva ou subjetiva da lide após o
saneamento e organização do processo, em homenagem ao contraditório, à ampla
defesa e à razoável duração do processo. RESP 1.715.438-RS, rel. Min. Nancy
Andrighi, por unanimidade, julgado em 13/11/2018, dje 21/11/2018. (INF. 638).
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. Prisão civil por ALIMENTOS. Obrigação alimentar avoenga.
Natureza complementar e subsidiária. Existência de meios executivos e técnicas mais
adequadas. Desnecessidade da medida coativa extrema. Rata-se de HABEAS
CORPUS em que se discute a possibilidade de ser mantida ordem de prisão civil em
virtude de dívida de natureza alimentar assumida espontaneamente pelos avós,
relacionada ao custeio de mensalidades escolares e de cursos extracurriculares dos
netos. Com efeito, não se pode olvidar que, na esteira da sólida jurisprudência desta
corte, a responsabilidade pela prestação de ALIMENTOS pelos avós possui,
essencialmente, as características da complementariedade e da subsidiariedade, de
modo que, para estender a obrigação alimentar aos ascendentes mais próximos,
deve-se partir da constatação de que os genitores estão absolutamente
impossibilitados de prestá-los de forma suficiente. O fato de os avós terem assumido
uma obrigação de natureza complementar de forma espontânea não significa dizer
que, em caso de inadimplemento, a execução deverá obrigatoriamente seguir o rito
estabelecido para o cumprimento das obrigações alimentares devidas pelos
genitores, que são, em última análise, os responsáveis originários pela prestação
dos ALIMENTOS necessários aos menores. Não há dúvida de que o inadimplemento
causou transtornos aos menores; todavia, sopesando-se os prejuízos que seriam
causados na hipótese de manutenção do decreto prisional dos idosos, conclui-se que
a solução mais adequada à espécie é autorizar a conversão da execução para o rito
da penhora e da expropriação, o que, a um só tempo, homenageia o princípio da
menor onerosidade da execução (art. 805 do cpc/15) e também o princípio da
máxima utilidade da execução. Registre-se, por fim, que, a depender do grau de
recalcitrância manifestado pelos pacientes, poderá o juízo de 1º grau empregar
outros meios de coerção ou sub-rogação, tais como aqueles estabelecidos nos arts.
528, § 3º, 529, 831 e seguintes da novel legislação processual civil. HC 416.886-SP,
rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 12/12/2017, dje 18/12/2017.
(INF. 617).
399
402
automaticamente em pensão alimentícia em favor da criança, logo após seu
nascimento. Nesse ponto, o parágrafo único do artigo 6º da Lei n 11.804/2008 é
expresso ao afirmar que, com o nascimento com vida da criança,
os alimentos gravídicos concedidos à gestante serão convertidos em pensão
alimentícia em favor do recém-nascido. Interpretando o referido texto da lei, tem-
se que tal conversão dar-se-á de forma automática, sem necessidade de
pronunciamento judicial, tendo em vista que o dispositivo legal acrescenta ao final:
"até que uma das partes solicite a sua revisão". Portanto, os alimentos gravídicos
ficam convertidos em pensão alimentícia até eventual ação revisional em que se
solicite a exoneração, redução ou majoração do valor dos alimentos ou até mesmo
eventual resultado em ação de investigação ou negatória de paternidade. Tal
conversão automática não enseja violação à disposição normativa que exige indícios
mínimos de paternidade para a concessão de pensão alimentícia provisória ao
menor durante o trâmite da ação de investigação de paternidade. Isso porque, nos
termos do caput do art. 6º da Lei n. 11.804/2008, para a concessão
dos alimentos gravídicos já é exigida antes a comprovação desses mesmos indícios
da paternidade. O intuito da lei foi garantir a preservação do melhor interesse do
menor em ter mantido os alimentos, já concedidos na gestação, enquanto se
discute a paternidade na ação investigatória. A conversão automática da obrigação
e a transferência da titularidade dos alimentos, sem a necessidade de
pronunciamento judicial ou de pedido expresso da parte, garantem maior celeridade
na prestação jurisdicional, além de facilitar o acesso à Justiça e favorecer de logo a
solução de mérito da demanda, buscada pelo novo Código de Processo Civil que, em
seu art. 4º, dispõe que "as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução
integral do mérito, incluída a atividade satisfativa". Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze,
por unanimidade, julgado em 6/6/2017, dje 22/6/2017. (INF. 606).
8. TUTELA E CURATELA
Em uma análise preliminar, importante traçar a diferença entre institutos que, por
vezes, são confundidos, quais sejam: a tutela e a curatela. A tutela tem por escopo resguardar
os interesses do menor ainda não emancipado enquanto a curatela refere-se à proteção do
maior, em situações excepcionais.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência promoveu uma série de alterações em matéria de
capacidade da pessoa maior de 18 anos, de forma que a pessoa com deficiência, para todos os
efeitos, é capaz. Com o Estatuto do Deficiente, somente os menores de 16 anos são, na
atualidade, considerados absolutamente incapazes para os atos da vida civil.
8.1.1. TUTELA
O art. 1.728/CC estabelece que os filhos menores são postos sob tutela quando:
• os pais falecem;
• os pais estão ausentes;
• os pais estão destituídos do poder familiar.
Assim, a tutela pressupõe a perda ou a suspensão do poder familiar, por parte dos pais.
Vê-se, então, que uma primeira conclusão é de que a tutela é incompatível com o exercício do
poder familiar, de forma que ambos não podem ser exercidos simultaneamente em relação às
mesmas crianças e/ou adolescentes.
400
403
Em sendo a hipótese de tutela, a criança ou adolescente terá, em sua proteção, a figura
de um tutor.
Em relação à origem, a tutela pode ser dividida em três categorias:
• Tutela testamentária: que, como o próprio nome diz, decorre da manifestação em
testamento, no sentido de se nomear um tutor para a hipótese de falecimento dos
pais.
• Tutela legítima: não havendo nomeação testamentária de tutor, e estando a criança
ou adolescente órfã(o) ou não mais sob o poder familiar dos genitores, a tutela
decorrerá da previsão da lei. Nesse sentido, diz o art. 1.731/CC diz que incumbe aos
parentes consanguíneos do menor na seguinte ordem: ascendente e colateral até o
3º grau, do mais próximo ao mais remoto.
• Tutela dativa: não tendo parentes, e nem colateral até o 3º grau, ou seja, na falta
de tutela testamentária e legítima, o juiz irá nomear tutor idôneo e que resida no
domicílio do menor.
Quando a situação abrange mais de um irmão em situação de tutela, a legislação prevê
a nomeação de apenas um tutor para todos (art. 1.733/CC). É a aplicação do denominado
princípio da unicidade da tutela.
O art. 1.735/CC diz que não podem ser tutores e serão exonerados da tutela, caso a
exerçam:
• quem não tiver a livre administração de seus bens (ex.: pródigo);
• aqueles que tiverem obrigação para com o menor, ou tiverem crédito contra o
menor, ou estiver em demanda contra o menor, ou ainda que seus parentes estejam
com demanda contra o menor;
• inimigos do menor, ou de seus pais, ou que tiverem sido por estes expressamente
excluídos da tutela;
• condenados por crime de furto, roubo, estelionato, falsidade, contra a família ou os
costumes;
• pessoas de mau procedimento, ou falhas em probidade, e as culpadas de abuso em
tutorias anteriores;
• aqueles que exercerem função pública incompatível com a boa administração da
tutela (ex.: juiz, MP, delegado, etc.).
O art. 1.736/CC diz que podem se escusar da tutela:
• mulheres casadas;
• maiores de 60 anos;
• aqueles que tiverem sob sua autoridade mais de 3 filhos;
• impossibilitados por enfermidade;
• aqueles que habitarem longe do lugar onde se haja de exercer a tutela;
• aqueles que já exercerem tutela ou curatela;
• militares em serviço.
Quando o menor tiver parentes que possam exercer a tutela, aquele que, não sendo
parente, for indicado para tanto, pode recusar o múnus, não estando, portanto, obrigado a
aceitar a condição de tutor. É o que estabelece o artigo 1.737/CC.
O art. 1.738/CC diz que o prazo decadencial é de 10 dias para manifestação de escusa
por parte do nomeado tutor. Entretanto, o NCPC, sobre a mesma matéria, no art. 760,
estabelece prazo menor de 5 dias. Como se trata de legislação posterior de mesma hierarquia,
deve-se entender que o NCPC revogou, nesse particular, o CC, devendo prevalecer o prazo do
NCPC.
401
404
O art. 1.740/CC traz as incumbências do tutor no exercício do seu múnus público, a
saber:
• dirigir a educação do menor, defendê-lo e prestar-lhe alimentos, conforme os seus
haveres e condição;
• reclamar do juiz que providencie, como houver por bem, quando o menor haja
mister correção;
• cumprir com os demais deveres que normalmente cabem aos pais, ouvida a opinião
do menor, se este já contar 12 anos de idade.
A atuação do juiz em feitos que versem sobre tutela é ainda mais importante porquanto
é ele quem fiscaliza a atuação do tutor. Entretanto, é possível a nomeação, para essa fiscalização
do tutor, de um pró-tutor (art. 1.742/CC).
O artigo 1.744/CC trata da responsabilidade do juiz, nos processos de tutela. Consoante
esse artigo, essa responsabilidade será direta e pessoal, quando não tiver nomeado o tutor, ou
não o houver feito oportunamente; podendo ser subsidiária, quando não tiver exigido garantia
legal do tutor, nem o removido.
Entende-se que nesses dois casos de responsabilização do juiz, é preciso a comprovação
de culpa e não necessariamente de dolo.
Os bens do menor serão entregues ao tutor, através de um inventário de bens (art.
1.745/CC). Se o patrimônio for de considerável valor, o parágrafo único desse artigo 1.745/CC
diz que o juiz poderá exigir a caução para o exercício da tutela.
Se o menor possuir bens, será o menor sustentado por esses bens.
O tutor representará o menor até os 16 anos deste e, após os 16 anos, irá assisti-lo. O
artigo 1.747/CC traz outras competências do tutor no exercício da tutela.
Algumas incumbências do tutor, entretanto, exigem anuência do juiz, tais como (art.
1.748/CC):
• pagamento de dívida do menor;
• aceitação, pelo menor, de herança, legado ou doação, com ou sem encargo;
• transação ou celebração de contrato visando extinguir dívida;
• venda de bens móveis ou imóveis do menor;
• propositura de ações em juízo e promoção de todas as diligências a bem deste,
assim como a defesa nos pleitos contra ele movidos.
Ainda que com autorização do juiz, o tutor não poderá praticar, ou seja, são atos
vedados ao tutor (art. 1.749/CC):
• adquirir para si bens móveis ou imóveis pertencentes ao menor;
• dispor dos bens do menor a título gratuito;
• constituir o tutor como cessionário de crédito ou de direito, contra o menor.
A prática de qualquer dessas hipóteses importará em nulidade absoluta do ato.
Antes de assumir a tutela, o tutor declarará tudo que o menor lhe deve, sob pena de
não poder lhe cobrar posteriormente, enquanto estiver exercendo a sua tutoria. A única exceção
é a hipótese de o tutor não ter conhecimento desse débito à época da tutoria.
Em matéria de responsabilidade, o artigo 1.752/CC estabelece que o tutor responde
pelos prejuízos que, por sua culpa ou dolo de sua parte, causar ao tutelado. Há uma
responsabilidade subjetiva do tutor pelo tutelado, ressaltando o §2º do mesmo artigo que há
solidariedade entre as pessoas às quais competia fiscalizar a atividade do tutor e as que
concorreram para o dando.
402
405
Assim é que, quem tinha o dever de fiscalizar o tutor, como é o caso do pró-tutor e do
juiz, ou qualquer pessoa que tenha concorrido culposamente para o prejuízo experimentado
pelo tutelado, será solidariamente responsável pelos prejuízos. Lembre-se que a solidariedade
não pode ser presumida e, na hipótese, há previsão expressa de sua ocorrência.
Pelos atos do tutelado em face de terceiros, o tutor responde objetivamente. É a
responsabilidade objetiva indireta, visto que, no caso, a lei não exige a prova da culpa do tutor,
mas é preciso demonstrar que houve culpa do tutelado.
Por outro lado, o tutor tem direito de ser pago pelo que gastar no exercício de sua
tutoria. É o direito de reembolso previsto no artigo 1.752/CC, que prevê também, em benefício
do tutor, um montante que vai receber a título de compensação pela atuação e administração
dos bens do tutelado, guardando uma proporcionalidade com o valor dos bens do tutelado.
Conforme artigo 1.755/CC e seguintes, o tutor deverá prestar contas, mas, além disso,
a lei exige que o tutor faça um balanço anual, a ser demonstrado ao juiz, cabendo a este, após
análise, aprovar o balanço.
Além desse balanço anual, a legislação prevê que a cada dois anos seja apresentada a
prestação de contas ao juiz. Esse procedimento tem trâmite nos próprios autos da nomeação
da tutoria. A competência dependerá da Lei de Organização Judiciária, sendo que, em regra,
tramitará perante a Vara da Infância, mas não existindo essa Vara na Comarca, a competência
será da Vara de Família ou mesmo Vara Cível.
Encerrada a tutela, ainda que dê quitação, essa quitação não produzirá efeitos enquanto
não forem aprovadas as contas pelo juiz.
No art. 1.763/CC, o legislador trata de situações de extinção da tutela, a saber:
• maioridade do tutelado;
• emancipação do tutelado;
• menor cair sob o poder familiar em razão de reconhecimento
paternidade/maternidade ou em razão de adoção;
Já no artigo 1.764/CC, o CC trata da hipóteses em que cessam as funções do tutor:
• ocorrer o termo final da tutoria;
• por uma escusa legítima do tutor;
• houver a remoção do tutor pelo juiz.
A remoção ou destituição do tutor caberá quando ele for negligente, prevaricador ou
incurso numa incapacidade (art. 1.766/CC).
O art. 1.761 do CC diz que incumbe ao MP, ou a quem tenha o legítimo interesse,
requerer a remoção do tutor ou curador. O parágrafo único desse dispositivo diz que o tutor ou
curador será citado para contestar essa alegação no prazo de 5 dias, e após seguirá o rito
comum.
Havendo extrema gravidade, o juiz poderá suspender, antes da decisão, o tutor ou
curador e nomear um tutor em caráter interino.
Nos termos do art. 1.765/CC, o tutor nomeado é obrigado a servir por espaço de dois
anos, podendo continuar no exercício da tutela, para além desse prazo, se o quiser e o juiz julgar
conveniente para o menor.
8.1.2. CURATELA
Se, como vimos, a tutela tem por escopo a proteção de pessoa ainda menor de idade, a
curatela, por sua vez, é um instituto que visa defender os maiores que tenham reconhecida
403
406
alguma incapacidade, havendo de um lado um curador e do outro um curatelado.
Sobre esse sistema de proteção àqueles que não têm condição de administração dos
próprios interesses e bens, vale a transcrição dos ensinamentos constantes de Caio Mário, no
sentido de que
com o instituto da curatela completa o Código, o sistema assistencial dos que não
podem, por si mesmos, reger sua pessoa e administrar seus bens. O primeiro é o
poder familiar, em que incorrem os menores sob direção e autoridade do pai e da
mãe; o segundo é a tutela, concedida aos órfãos e àqueles cujos pais foram
destituídos do poder familiar; o terceiro é a curatela, “encargo cometido a alguém,
para dirigir a pessoa e administrar os bens de maiores incapazes (PEREIRA, 2018, p.
472).
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua
vontade;
IV - os pródigos.
A incapacidade é matéria de ordem pública e não se presume. Deve, dessa forma, ser
objeto de ação própria para sua constatação e tomada de devidas providências.
A ação para curatela tem procedimento previsto no NCPC, que estabelece a legitimidade
para sua promoção.
O art. 747 do novo CPC prevê que a ação de curatela pode ser promovida:
404
407
Em relação a essa questão, vemos em Caio Mário que
apesar de o art. 747 não prever a possibilidade de a própria pessoa requerer sua
curatela – previsão esta feita pelo Estatuto –, não se pode negar tal iniciativa, em
razão da própria lógica de autodeterminação trazida pelo Estatuto da Pessoa com
Deficiência. Assim, não obstante a revogação do art. 1.780, que previa a curatela-
mandato, a possibilidade de requerimento da curatela pela própria pessoa se
mantém com a inclusão do inciso IV no art. 1.768 do CC pelo Estatuto, ainda que o
novo CPC não traga tal previsão (PEREIRA, 2018, p. 482).
Temos, dessa forma, que o pedido de nomeação de curador poderá ser promovido:
• pelo cônjuge ou companheiro;
• pelos parentes ou tutores;
• pelo representante da entidade que se encontra abrigado o curatelando;
• pelo próprio Ministério Público;
• pela própria pessoa (art. 1.768) – fazendo-se aqui as considerações constantes do
parágrafo anterior.
O art. 748 do NCPC diz que o MP só irá promover a ação em caso de doença mental
grave se as pessoas designadas acima não existirem ou não promoverem o procedimento de
nomeação de curador, ou se, estas pessoas existirem, não estiverem aptas para tanto por
eventual situação de curatela também.
Portanto, o MP terá uma legitimidade subsidiária.
O art. 752/NCPC diz que o MP intervirá como fiscal da ordem jurídica nas ações de
interdição as quais ele não propõe.
Se houver urgência, o juiz poderá nomear um curador provisório para o curatelando, a
fim de praticar determinados atos.
Nessa linha, o curatelando será citado para no dia designado comparecer ao juiz, sendo
entrevistado acerca de sua vida, negócios, parentes, bens, vontades, preferências, etc. A ideia é
para que o juiz possa perceber o nível de discernimento do curatelando.
Caso o curatelando não possa se deslocar até o juízo, o juiz irá ouvi-lo no local onde
estiver,
No prazo de 15 dias da entrevista, o curatelando poderá impugnar o pedido de curatela.
Caso não tenha constituído um advogado, nomeará o juiz um curador especial.
Passados 15 dias, o juiz determinará a produção de prova pericial para avaliar a efetiva
situação do curatelando. O laudo pericial vai indicar para quais atos que o curatelado necessitará
da participação do curador.
A ideia é a de que o exercício da curatela seja o menor possível, e segundo as
potencialidades da pessoa, conferindo-se ao curatelado o mais amplo exercício dos direitos, em
especial aqueles ligados a sua existência como pessoa humana.
Para a escolha do curador, o juiz levará em conta a vontade e as preferências do
curatelando.
O art. 1.775/CC estabelece que o cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente
ou de fato, é de direito o curador do outro. É o curador escolhido pela lei.
Se o curador é o cônjuge, e estão eles casados sob o regime universal de bens, esse
cônjuge não é obrigado a prestar contas, salvo se houver uma determinação judicial
fundamentada em sentido contrário.
405
408
Na ordem de preferência, não sendo o curatelando casado e ainda não vivendo em
união estável, a nomeação de curador será preferencialmente de um de seus ascendentes.
Não havendo ascendentes, o curador será o descendente que se mostrar mais apto.
Não havendo descendentes, o curador será dativo, nomeado pelo juiz.
Essa ordem legal pode, entretanto, ser desconsiderada, sempre em observância ao
melhor interesse do curatelado.
O art. 1.775-A/CC inovou, trazendo a possibilidade da denominada curatela
compartilhada.
O art. 754/NCPC diz que, apresentado o laudo, produzidas as demais provas e ouvidos
os interessados, o juiz proferirá sentença. Na sentença, o juiz deverá nomear o curador. Na
mesma sentença, o juiz irá fixar os limites da curatela.
Conforme o NCPC, art. 757, a autoridade do curador vai se estender à pessoa e aos bens
do incapaz que se encontrava sob guarda e responsabilidade do curatelado. Ex.: o curatelado
tem 40 anos e o filho tem 12 anos. O curador do curatelado vai assumir a tutela do menor, salvo
se o juiz entender outra situação mais conveniente. É o princípio da unicidade de curatela/tutela.
O §3º do art. 755 do NCPC diz que a sentença de interdição será inscrita no Registro de
Pessoas Naturais, publicada no site do Tribunal, na plataforma do CNJ e deverá permanecer por
6 meses. Visa assegurar o princípio da publicidade.
Grande discussão gira em torno dos efeitos da sentença que reconhece a incapacidade
de uma pessoa. A pergunta refere-se à nulidade ou não dos atos praticados antes do
reconhecimento da incapacidade.
Em recentes julgados, o STJ entendeu que os efeitos da sentença, no caso, são ex nunc,
de modo que prevalecem os atos jurídicos praticados antes do reconhecimento da incapacidade
(AgInt no AREsp 1480137 / MG AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
2019/0093218-9). Nesses julgados, o STJ consagrou a tese da natureza constitutiva da sentença
de interdição, de modo que produz efeitos ex nunc, salvo expresso pronunciamento judicial em
sentido contrário (AgInt no REsp 1705385/SP
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2014/0345411-3).
As pessoas que não puderem exprimir a sua vontade serão relativamente incapazes, as
quais receberão todo o apoio para manter a sua convivência familiar.
A convivência comunitária e familiar são prioritárias, de forma que o recolhimento de
uma pessoa em estabelecimento que afaste a convivência familiar e comunitária é excepcional,
ou seja, será a última medida. Caso não haja essa necessidade, poderá ficar em casa e conviver
com a família e a comunidade.
O art. 758 do NCPC diz que o curador deverá buscar o tratamento e o apoio apropriados
à conquista da autonomia daquele considerado relativamente incapaz.
Se houver a recuperação, haverá o levantamento da curatela.
Além disso, poderá a curatela ser levantada parcialmente, quando a incapacidade
daquele interdito, que era uma incapacidade maior, agora se restringiu. Quando demonstrada
a recuperação parcial, haverá o levantamento parcial da curatela. Tudo isso na ideia de que a
curatela somente deve ser utilizada nos limites do que efetivamente é necessário.
O Código Civil determina a aplicação residual das regras da tutela à curatela das. Isso
porque os fundamentos são os mesmos, conforme colocado no início do capítulo.
406
409
8.2. TOMADA DE DECISÃO APOIADA
a tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege
pelo menos duas pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de
sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil,
fornecendo-lhe os elementos e informações necessários para que possa exercer sua
capacidade. (CARNACCHIONI, 2018, p. 1.637).
O §1º do art. 1.783-A, CC, diz que, para formular pedido de tomada de decisão apoiada,
a pessoa com deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites
do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do
acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que devem apoiar.
O pedido de tomada de decisão será requerido pela pessoa que deseja ser apoiada,
indicando quais as pessoas aptas a prestarem esse apoio. Antes de se decidir sobre o pedido, o
juiz irá ouvir pessoalmente o requerente e também as pessoas indicadas para lhe prestar apoio.
Como adverte Carnacchioni,
407
410
É importante trazer à colação os dois enunciados aprovadas nas Jornadas de Direito Civil
– CJF, com o seguinte teor:
Enunciado 639 CJF: “A opção pela tomada de decisão apoiada é de legitimidade
exclusiva da pessoa com deficiência. A pessoa que requer o apoio pode manifestar,
antecipadamente, sua vontade de que um ou ambos os apoiadores se tornem, em caso de
curatela, seus curadores.”
Enunciado 640: “Art. 1.783-A: “A tomada de decisão apoiada não é cabível, se a
condição da pessoa exigir aplicação da curatela.”
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411
resguardar ao estabelecer regras especiais para o processo de interdição, bem como
ao próprio art. 129, IX, da Constituição Federal, em vista da antinomia existente
entre a função de fiscal da lei e os interesses particulares envolvidos. Tanto é assim
que, de forma a dirimir a incompatibilidade de funções, a Lei Complementar n. 80,
de 12/1/1994 dispôs, em seu art. 4º, XVI, ser a curadoria especial função da
Defensoria Pública. No mesmo sentido, o Código de Processo Civil de 2015 também
endossou o entendimento pela incompatibilidade, tendo retirado do ordenamento
a possibilidade de o Ministério Público participar do processo de interdição como
curador especial e incluído o art. 72, parágrafo único, segundo o qual: “A curatela
especial será exercida pela Defensoria Pública, nos termos da lei”. Desta forma – e
considerando que a ausência da referida nomeação constitui vício insanável em
razão da vulnerabilidade presumida do interditando – configura-se a nulidade
absoluta do processo de interdição. No que tange à necessidade de interrogatório,
em que pese o disposto no art. 1.109 do CPC/73 – que dispõe não ser o juiz obrigado
a observar critério de legalidade estrita na hipótese de procedimentos especiais de
jurisdição voluntária – é importante que o magistrado proceda ao exame pessoal por
meio de interrogatório, ainda que não possua conhecimentos que permitam a
elaboração de um diagnóstico. O exame a ser feito mediante interrogatório em
audiência pessoalmente pelo juiz não é mera formalidade. Ao contrário, é medida
que garante a participação e a própria defesa do interditando no processo. O Novo
Código de Processo Civil, inclusive, reformou o instituto, que passou a ser chamado
de “entrevista”, ampliando os temas a serem perquiridos pelo juiz quando do exame
pessoal, para que o interditando, sujeito de direito mais importante da demanda,
seja melhor compreendido e ressignificado. Nessa senda, não se extrai do art. 1.109
do CPC/73 autorização para que o juiz deixe de praticar os atos processuais inerentes
ao procedimento, máxime quando se tratar daquele que representa o direito de
defesa da parte.
REsp 1.686.161-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em
12/9/2017, DJe 15/9/2017 (INF. 611).
9. UNIÃO ESTÁVEL
“Não há lei, nem de Deus nem dos homens, que proíba o ser humano de buscar a
felicidade.” (DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias – 9ª edição, Editora RT, São
Paulo, 2013).
O texto extraído da obra de Maria Berenice bem nos elucida a ideia que deve nortear
toda interpretação acerca do reconhecimento dos mais diversos modelos de família.
Por algum tempo, a união estável não teve reconhecimento e delineamento no
ordenamento jurídico pátrio, de forma que os direitos eventualmente reconhecidos em relação
às pessoas que se uniam sem o vínculo matrimonial giravam em torno da questão patrimonial e
não propriamente da consideração da existência de uma família.
Assim é que quando imaginamos que até 1977, não era possível o divórcio, as pessoas
que se separavam de fato e mantinham novo relacionamento eram denominadas concubinas e,
quando buscavam o judiciário para resguardo de direitos, não havia o reconhecimento dessa
entidade familiar. O que ocorria, era uma análise, na Vara Cível, à luz do direito obrigacional,
como sendo uma sociedade de fato.
Veremos a evolução da legislação acerca da união estável, mas desde já, é possível dizer
que o não reconhecimento da entidade familiar formada pela união de pessoas, inclusive do
mesmo sexo, representava uma séria violação a valores baseados no afeto, que se justificam
para além da questão patrimonial.
409
412
A Constituição Federal de 1988 foi um grande marco quanto ao reconhecimento da
união estável como entidade familiar, mas depois dela ainda houve um longo caminho
percorrido até chegarmos à configuração atual, que, respeitando a dignidade da pessoa
humana, reconhece igualmente como família a união de pessoas do mesmo sexo.
Como dito nas considerações gerais, a Constituição Federal foi um grande marco para o
reconhecimento da união estável como entidade familiar.
Antes da Constituição Federal de 1988, tínhamos que as relações ditas informais, que se
estabeleciam sem o vínculo matrimonial, eram consideradas sociedades de fato, expressão que
bem demonstra a importância dada unicamente à questão patrimonial. Em sendo sociedade de
fato, os bens adquiridos em comum eram divididos na medida do esforço de cada convivente.
Nesse período, as uniões que se estabeleciam com o impedimento para o casamento,
como na hipótese do separado de fato que não podia se divorciar por ausência de previsão legal
(antes de 1977), eram consideradas concubinato, expressão que carregava certa dose de
discriminação.
Ainda nesse período, temos a aplicação da Súmula 380 do STF, surgida para tentar
resolver as questões patrimoniais relativas aos casais que estabeleciam essa convivência até
então não reconhecida pela lei. Estabelecia a súmula, in verbis: “Comprovada a existência de
sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do
patrimônio adquirido pelo esforço comum.”
Na ausência de legislação específica e aplicando-se o teor da súmula mencionada, o que
se vislumbrava, na época, nas hipóteses de desfazimento da relação, é que era muito difícil, em
especial para a mulher, provar a participação na aquisição do patrimônio. Recorde-se que nesse
período, a mulher ainda não tinha alcançado o grau de independência que vislumbramos na
atualidade. Em regra, cuidava dos afazeres do lar e, para os fins da súmula 380/STF, não tinha
participação na aquisição do patrimônio, de forma que saia da relação sem qualquer direito.
Em razão dessa flagrante injustiça, a jurisprudência da época passou a admitir pedidos
de indenização pelos serviços domésticos prestados,numa espécie de compensação em favor
da mulher (STJ, REsp 855.963/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado
em 19/05/2011, DJe 26/05/2011).
Se hoje esse tipo de pedido parece violar os valores maiores da entidade familiar, em
especial o valor do afeto que não poderia ser trocado por qualquer quantia em dinheiro
(representada no caso pela indenização pelos serviços prestados), certo é que para o contexto
em que foram admitidas e fixadas essas indenizações, essa parecia a única forma de garantir
algum direito à mulher que saía de relações longas, porém não reconhecidas pela legislação da
época.
Só com a Constituição Federal de 1988, houve uma mudança positiva no sentido de
reconhecimento das uniões estáveis como entidades familiares. A Carta Magna de 1988, então,
em seu artigo 226, §3º, estabeleceu de forma expressa que:
Art. 226, § 3º, CF: “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável
entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.”
Todavia, é de se considerar que, muito embora a Constituição Federal tenha
representado uma grande conquista para o reconhecimento das uniões estáveis como entidade
familiar, certo é que logo após a promulgação da Carta Magna, passou-se a discutir se a norma
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do §3º do artigo 226 seria autoaplicável ou dependeria de regulamentação. Em razão disso,
muitas ações que buscavam o reconhecimento da entidade familiar continuavam tramitando
em varas cíveis e tendo a abordagem apenas patrimonial.
Foi, então, necessária a regulamentação por leis posteriores para efetiva aplicação do
comanda constitucional.
Assim é que temos a Lei nº 8.971/94 e a Lei nº 9.278/96, subsequentes à Constituição
Federal e que buscaram regulamentar o artigo 226, §3.
A primeira lei, de nº 8.971/94, estabeleceu o direito aos alimentos entre os
companheiros e ainda trouxe previsão de participação dos companheiros na sucessão do outro,
além do direito ao usufruto sobre bens do(a) falecido(a) companheiro(a).
Dispunha o artigo 1º da referida lei que:
Extrai-se do artigo transcrito que a lei em questão trouxe um requisito temporal para a
configuração da união estável. Para tanto, era necessário o prazo mínimo de cinco anos de
convivência, salvo se tivessem filho(s) em comum, caso em que não havia exigência de prazo
mínimo
Com a posterior Lei nº 9.278/96, houve previsão de requisitos gerais para configuração
da união estável. Estabelecia o artigo 1º que: “É reconhecida como entidade familiar a
convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com
objetivo de constituição de família”.
Vê-se que os requisitos, então, seriam a convivência duradoura, pública e contínua,
entre um homem e uma mulher, com o objetivo de constituição de família. Excluiu-se, todavia,
o lapso temporal mínimo para reconhecimento da união estável.
Com essa lei, criaram-se, ainda, à semelhança do matrimônio, direitos e deveres,
consistentes em respeito e consideração mútuos, assistência moral e material recíproca e
guarda, sustento e educação dos filhos comuns.
Uma importante inovação nessa legislação foi o estabelecimento de presunção relativa
de condomínio de partes iguais para os bens adquiridos a título oneroso na constância do
relacionamento (art. 5º), salvo estipulação em contrário realizada em contrato escrito. Previa o
§ 1º que essa presunção cessaria se a aquisição fosse realizada com bens sub-rogados adquiridos
antes do relacionamento.
O Código Civil de 2002, que teve vigência a partir de janeiro de 2003, disciplinou por
completo a matéria, estabelecendo em seu artigo 1.723, que “É reconhecida como entidade
familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua
e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
Nessa conceituação, reproduziu-se o que já dispunha a legislação anterior.
Já nos parágrafos do referido artigo, o legislador detalhou mais a disciplina aplicável à
união estável, estabelecendo que:
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§ 1º A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521;
não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar
separada de fato ou judicialmente.
Assim, não obstante tenha mantido o mesmo conceito da Lei nº 9278/96, o CC/2002
estabeleceu os impedimentos para o seu reconhecimento.
Quanto ao regime de bens a ser considerado na união, o Código Civil estabeleceu que,
não havendo acordo em sentido contrário, o regime que regerá os bens do casal será o da
comunhão parcial de bens. Essa é a inteligência do artigo 1.725/CC.
Relativamente à sucessão dos bens em caso de morte de um dos companheiros, o
Código Civil manteve o direito de participação do(a) companheiro(a) na sucessão do outro, mas
disciplinou essa matéria dando tratamento diferenciado entre companheiros e cônjuges. Esse
foi um ponto de amplos debates após a vigência do CC/02, que culminou no reconhecimento,
por parte do STF, da inconstitucionalidade do artigo 1.790, que disciplina de forma diferenciada
a sucessão dos companheiros. O STF decidiu, nos Recursos Extraordinários 646721 e 878694,
ambos em regime de repercussão geral, equiparar cônjuges e companheiros para fins de
sucessão, inclusive em uniões homoafetivas.
Outro ponto de debate diz respeito ao direito real de habitação que, no Código Civil de
2002, não encontrou proteção relativamente ao(a) companheiro(a). Enquanto a Lei nº 9.278
conferia expressamente esse direito ao(a) companheiro(a), o CC/02 foi silente sobre essa
matéria, cabendo à jurisprudência a correção dessa distorção tão prejudicial ao(a)
companheiro(a).
Além dessas questões, o Código Civil de 2002 perdeu uma grande oportunidade de
dispor também sobre as uniões homoafetivas. Embora essa matéria já fosse amplamente
discutida pela jurisprudência, o legislador de 2002 manteve a conceituação das uniões estáveis
limitada aos casais heterossexuais.
Coube, assim, ao STF corrigir essa flagrante inconstitucionalidade, entendendo que
nenhuma interpretação ao artigo 226, §3º, da CF pode excluir o reconhecimento de uniões
homoafetivas como entidades familiares.
Sobre essa matéria, vale uma leitura mais cuidadosa das ações que tramitaram perante
o STF (ADI 4.277 e ADPF 132, de 5/5/2011), as quais, então, deram interpretação conforme a CF
ao artigo 1.723/CC, para excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união
entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.
A partir desses julgados, o STJ reconheceu a possibilidade de casamento direto de
pessoas do mesmo sexo. Há também diversas decisões autorizando a conversão da união estável
de pessoas do mesmo sexo em casamento. Por fim, o CNJ editou a Resolução 175 que trata
sobre os casamentos homoafetivos.
Ainda em matéria de evolução da união estável no Brasil, tivemos recentemente um
movimento para reconhecimento do denominado poliamor. Nesse sentido, algumas escrituras
foram lavradas em cartórios extrajudiciais, com menção a uniões entre mais de duas pessoas.
Essa matéria foi levada ao CNJ e apreciada no Pedido de Providências (PP 0001459-
08.2016.2.00.0000), cujo relator fora o Min. Corregedor Nacional de Justiça, João Otávio de
Noronha. Na decisão, o CNJ determina que as Corregedorias-Gerais de Justiça proíbam os
cartórios de seus respectivos estados de lavrar escrituras públicas para registrar uniões
poliafetivas.
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Assim, temos que o sistema pátrio não reconhece uniões poliafetivas.
Como vimos, o Código Civil de 2002 disciplinou a união estável, estabelecendo, na sua
conceituação, os requisitos necessários para sua conceituação. Estabeleceu, dessa forma, que
essa união deve ser pública, contínua e duradoura e, principalmente, com o objetivo de
constituir família.
A partir dessa conceituação, extraímos os seguintes requisitos:
• Convivência pública é aquela que é de conhecimento no meio social, de forma que os
companheiros são vistos pela sociedade como se casados fossem, apresentando-se
como verdadeira entidade familiar.
• Convivência contínua e duradoura entende-se como sendo uma relação estável, sem
intervalos.
• Affectio Maritalis, que consiste nesse objetivo de constituir família. A affectio é, dessa
forma, o elemento subjetivo da união estável e está na intenção dos conviventes.
Se, por um lado, extraímos esses requisitos da conceituação trazida pelo Código Civil,
por outro lado temos que essa mesma conceituação não exige a convivência sob o mesmo teto
para configuração da união estável, assim como não exige a existência de filhos em comum.
Pelo § 1º do artigo 1.723/CC, tem-se que a união estável não se constituirá se ocorrerem
os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa
casada se achar separada de fato ou judicialmente. Isto é, se separado de fato ou judicialmente,
a pessoa poderá constituir e ver reconhecida a união estável.
O § 2º do mesmo artigo diz que as causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a
caracterização da união estável.
Sobre o regime de bens, o art. 1.725/CC diz que, na união estável, salvo contrato escrito
entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da
comunhão parcial de bens. Isso significa que se os conviventes não firmarem nenhum acordo
em sentido contrário, prevalecerá entre eles o regime da comunhão parcial. Podem, entretanto,
estabelecer contrato de convivência, dele fazendo constar a vontade expressa quanto ao regime
de bens que regerá a relação patrimonial. Entretanto, é preciso dizer que o regime somente
pode produzir efeitos a partir da data da escritura pública (efeito ex nunc). Não produz efeitos
retroativos quanto a este regime escolhido.
O Código Civil, de forma expressa e reproduzindo comando constitucional, prevê, no art.
1.726, que a união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos
companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.
Nesse particular, é importante mencionar discussão sobre interpretação que pode se
extrair da Constituição Federal quando diz que “será facilitada a conversão da união estável em
casamento”. Numa rápida leitura, pode-se concluir que há uma diferenciação do casamento em
relação à união, parecendo que aquele estaria acima deste. Entretanto, essa conclusão é
equivocada, em especial quando analisamos as decisões do STF que reconheceram total
igualdade entre casamento e união estável (ADI 4.277 e ADPF 132, de 5/5/2011).
Ainda sobre a disciplina do Código sobre a união estável, importante mencionar o
disposto no artigo 1.727/CC, pelo qual as relações não eventuais entre o homem e a mulher,
impedidos de casar, constituem concubinato.
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Por esse artigo, temos a diferenciação feita entre a união estável, que recebe a proteção
a título de entidade familiar, e o concubinato, que ocorre quando se vislumbra impedimento
para o casamento e, consequentemente, para união estável.
No estudo da união estável, é importante analisar as teses fixadas, sobre essa entidade
familiar, pelo Superior Tribunal de Justiça.
Constituem teses fixadas pelo STJ sobre a união estável:
• Os princípios legais que regem a sucessão e a partilha não se confundem: a sucessão é
disciplinada pela lei em vigor na data do óbito; a partilha deve observar o regime de
bens e o ordenamento jurídico vigente ao tempo de aquisição de cada bem a partilhar.
Essa tese tem extrema importância quando da análise da partilha dos bens do casal. Por
ela, temos que, ainda que a dissolução da união ocorra agora, sob a vigência do Código
Civil, a legislação aplicada deve ser a da data da aquisição do bem. Com isso, uma
dissolução que vem a ser resolvida hoje que envolva partilha de bem adquirido em 1994,
deve considerar a lei que vigorava naquela data e não a comunhão parcial de bens que
vigora como regra com o Código Civil de 2002.
• A coabitação não é elemento indispensável à caracterização da união estável;
• A vara de família é a competente para apreciar e julgar pedido de reconhecimento e
dissolução de união estável homoafetiva. Essa tese, na atualidade, parece óbvia mas
antes do reconhecimento das uniões homoafetivas como entidades familiares, ações
que envolviam casais homoafetivos tramitavam em varas cíveis e se referiam a
sociedades de fato.
• Não é possível o reconhecimento de uniões estáveis simultâneas. Essa tese trata da
impossibilidade de reconhecimento do poliamor.
• A existência de casamento válido não obsta o reconhecimento da união estável, desde
que haja separação de fato ou judicial entre os casados. Assim, estando separado de
fato ou judicialmente, não obstante não possa se casar ainda em decorrência de
impedimento, a pessoa pode estabelecer união estável reconhecida como entidade
familiar.
• Na união estável de pessoa maior de setenta anos (artigo 1.641, II, do CC/02), impõe-se
o regime da separação obrigatória, sendo possível a partilha de bens adquiridos na
constância da relação, desde que comprovado o esforço comum. Entende-se, assim, que
tal como ocorre com o casamento de pessoa maior de 70, na união também há
imposição do regime da separação total de bens.
• São incomunicáveis os bens particulares adquiridos anteriormente à união estável ou ao
casamento sob o regime de comunhão parcial, ainda que a transcrição no registro
imobiliário ocorra na constância da relação. Quando só a transcrição ocorre após o início
da união, esse bem permanece como bem particular, não comunicável.
• Comprovada a existência de união homoafetiva, é de se reconhecer o direito do
companheiro sobrevivente à meação dos bens adquiridos a título oneroso ao longo do
relacionamento. Como corolário do reconhecimento das uniões homoafetivas como
entidades familiares, segue-se o direito à meação tal como ocorre com a união estável
heteroafetiva.
• Não há possibilidade de se pleitear indenização por serviços domésticos prestados com
o fim do casamento ou da união estável, tampouco com o cessar do concubinato, sob
pena de se cometer grave discriminação frente ao casamento, que tem primazia
constitucional de tratamento. O entendimento do STJ é no sentido da inaplicabilidade
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atual da jurisprudência que deferia pedidos de indenização por serviços prestados no
âmbito doméstico.
• Compete à Justiça Federal analisar, incidentalmente e como prejudicial de mérito, o
reconhecimento da união estável nas hipóteses em que se pleiteia a concessão de
benefício previdenciário. Quando o pedido de reconhecimento de união estável tiver
por escopo apenas benefício previdenciário negado administrativamente, não é preciso
prévia ação perante a vara de família. Os interessados poderão se valer de ação para
pleito do benefício, perante a justiça federal, e nessa ação, incidentalmente, o juiz
analisará a configuração da união estável, enfrentando posteriormente o pedido do
benefício dali decorrente.
O aumento crescente das uniões estáveis, que embora iguais ao casamento, dele se
diferenciam pela informalidade, fez crescer o número de ações em que se enfrenta a temática
“namoro qualificado”.
É que em razão da informalidade das uniões estáveis, o seu reconhecimento, na
hipótese de litígio, depende de decisão judicial, e, não raras vezes, uma das partes tenta
demonstrar a não configuração da união, em especial quanto ao não preenchimento do
requisito do intuito de constituir família.
Como visto em tópico próprio, a união estável se configura pela convivência de duas
pessoas, de forma pública, contínua e com a finalidade de constituir família. Nesse último
aspecto é que se debate a diferenciação entre a união estável e o namoro qualificado.
No namoro qualificado, temos, então, que o casal, não obstante a convivência pública e
duradoura, não tem por escopo, “ainda”, a constituição de família. Seria, dessa forma, o
chamado “namoro sério”.
Sobre esse tema, o STJ já se manifestou no sentido de que “o fato de namorados
projetarem constituir família no futuro não caracteriza união estável, ainda quehaja
coabitação”. (REsp 1.257.819-SP, Terceira Turma, DJe 15/12/2011). REsp 1.454.643-RJ, Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 3/3/2015, DJe 10/3/2015).
Na prática, nem sempre é fácil essa diferenciação, mas o ponto central, a ser analisado
em cada caso, é o objetivo do casal quando da convivência pública e duradoura. Se ficar
demonstrado que havia objetivo de constituição de família, configurada estará a união estável.
Caso contrário, teremos o denominado namoro qualificado.
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união estável (art. 1647 do CC). Para solucionar essa temática, o STJ tem prezado pela boa-fé
objetiva (e seus deveres anexos), a publicidade, a confiança e lealdade. Dessa forma, se o
terceiro desconhecia a condição de convivente do contratante, não há que se falar em
invalidação do ato (REsp 1299866/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA,
julgado em 25/02/2014, DJe 21/03/2014 - INFORMATIVO 535 DO STJ).
Outra questão polêmica que envolve a união estável diz respeito à possibilidade
excepcional de reconhecimento de uniões estáveis simultâneas.
Como vimos, o CNJ vedou a lavratura de escrituras que envolvam uniões de mais de
duas pessoas, proibindo, dessa forma, escrituras que tragam em seu bojo a ideia do poliamor.
Nosso sistema, como um todo, veda essas relações para fins de reconhecimento de entidade
familiar. Inclusive, esse entendimento consta das teses do STJ.
Entretanto, é possível que haja uniões simultâneas com boa-fé de alguns dos
conviventes. Exemplificando, é possível que um homem, solteiro, mantenha união duradoura e
pública com uma mulher e, paralelamente, mantenha outra união da mesma natureza com
outra mulher. Se, nesse caso, as duas mulheres, objetivando constituir, cada uma, com esse
mesmo homem, uma família, mas desconhecendo cada uma a existência da paralela união da
outra, poder-se-á reconhecer as uniões simultâneas a partir da ideia de putatividade.
Com efeito, essas mulheres, estando cada uma de boa-fé, ou seja, desconhecendo cada
uma a existência de outra união, poderão ter o reconhecimento da união estável putativa com
os efeitos legais. Já esse homem do exemplo, estando em evidente má-fé, não será beneficiado
com o reconhecimento das uniões, porquanto nosso sistema não reconhece o denominado
poliamor.
Com o mesmo raciocínio, podemos imaginar a situação de união estável putativa
paralela ao casamento. como exemplo, citemos a hipótese de um homem casado e não
separado de fato ou judicialmente, que, paralelamente ao casamento, mantenha união
duradoura e pública com outra mulher, que desconhece a situação de matrimônio do
convivente. Nessa situação, essa mulher, estando de boa-fé, poderá ter reconhecida em seu
favor a união estável, com os efeitos legais.
Perceba que se a hipótese for de união mantida em concomitância com o casamento,
conhecendo a convivente a situação de casado do homem (ausência de boa-fé), ter-se-á um
concubinato, conforme estabelece o artigo 1.727/CC.
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419
sempre sob a ótica do melhor interesse do menor, observar todas as circunstâncias
presentes no caso concreto e as perícias e laudos produzidos no decorrer do
processo de adoção. Nesse contexto, o bom desempenho e bem-estar da criança
estão ligados ao aspecto afetivo e ao vínculo existente na unidade familiar, e não à
opção sexual do adotante. Há, inclusive, julgado da Terceira Turma do STJ no qual se
acolheu entendimento doutrinário no sentido de que "Estudos feitos no âmbito da
Psicologia afirmam que pesquisas '(...) têm demonstrado que os filhos de pais ou
mães homossexuais não apresentam comprometimento e problemas em seu
desenvolvimento psicossocial quando comparados com filhos de pais e mães
heterossexuais. O ambiente familiar sustentado pelas famílias homo e
heterossexuais para o bom desenvolvimento psicossocial das crianças parece ser o
mesmo'" (REsp 1.281.093-SP, DJe 4/2/2013). No mesmo sentido, em precedente da
Quarta Turma do STJ (REsp 889.852, DJe 10/8/2010), afirmou-se que "os diversos e
respeitados estudos especializados sobre o tema, fundados em fortes bases
científicas (realizados na Universidade de Virgínia, na Universidade de Valência, na
Academia Americana de Pediatria), 'não indicam qualquer inconveniente em que
crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do
vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga
a seus cuidadores'". REsp 1.540.814-PR, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado
em 18/8/2015, DJe 25/8/2015. (INF. 567).
QUESTÕES
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II – Regime da separação obrigatória de bens para idosos aplica-se mesmo se o casamento foi
precedido de união estável iniciada antes da idade-limite.
III – Diante do divórcio de cônjuges que viviam sob o regime da comunhão parcial de bens, não
deve ser reconhecido o direito à meação dos valores que foram depositados em conta vinculada
ao FGTS em datas anteriores à constância do casamento e que tenham sido utilizados para
aquisição de imóvel pelo casal durante a vigência da relação conjugal.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
2- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – Na separação judicial, sujeitam-se à partilha as quotas de sociedade de advogados adquiridas
por um dos cônjuges, sob o regime da comunhão universal de bens, na constância do
casamento.
II – A extinção de medida protetiva de urgência diante da homologação de acordo entre as
partes não afasta a competência da Vara Especializada de Violência Doméstica ou Familiar
contra a Mulher para julgar ação de divórcio fundada na mesma situação de agressividade
vivenciada pela vítima e que fora distribuída por dependência à medida extinta.
III – Se um bem for doado para um dos cônjuges, em um casamento regido pela comunhão
parcial dos bens, a regra é que esse bem pertence apenas ao cônjuge que recebeu a doação.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
3- De acordo com as disposições do Código Civil, assinale a alternativa INCORRETA a respeito do
casamento.
a) Será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos consorciados
houver contraído com outrem casamento civil.
b) O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil,
equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data
de sua celebração.
c) É nulo o casamento do o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa
de homicídio contra o seu consorte.
d) A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos,
emolumentos e custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.
e) O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz,
a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal.
4- De acordo o Código Civil, é nulo o casamento contraído:
a) com vício da vontade.
b) pelas as pessoas casadas.
c) por incompetência da autoridade celebrante.
d) por de quem não completou a idade mínima para casar.
e) por incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento.
5- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA de acordo com o entendimento
jurisprudencial.
I – O “cúmplice” (amante) da esposa não tem o dever de indenizar o marido traído. Em que pese
o alto grau de reprovabilidade da conduta daquele que se envolve com pessoa casada, o
“cúmplice” da esposa infiel não é responsável a indenizar o marido traído, pois ele não era
obrigado, por lei ou contrato, a zelar pela incolumidade do casamento alheio. I
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II – A esposa infiel tem o dever de restituir ao marido traído os alimentos pagos por ele em favor
de filho criado pelo casal, quando a adúltera tenha ocultado do marido o fato de que a referida
criança era filha biológica sua e de seu “cúmplice” (amante).
III – A esposa que traiu pode ser condenada a indenizar por danos morais o marido traído em
hipóteses excepcionais, como o caso no qual, além de a traição ter ocorrido com um amigo do
cônjuge, houve o nascimento de uma criança registrada erroneamente como descendente do
marido, mas que era filho biológico do amante.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
6- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA a respeito da mutabilidade do
regime de bens no casamento.
I – A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que é possível a alteração do regime de bens,
mesmo nos matrimônios contraídos ainda sob a égide do CC/16.
II – Para haver a autorização judicial quanto à mudança do regime de bens, é necessária a
aferição da situação financeira atual dos cônjuges, com a investigação acerca de eventuais
dívidas e de interesses de terceiros potencialmente atingidos.
III – O Código Civil não exige dos cônjuges justificativas exageradas ou provas concretas do
prejuízo na manutenção do regime de bens originário, sob pena de se ter que analisar
indevidamente a própria intimidade e a vida privada dos consortes.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
7- Assinale a alternativa CORRETA de acordo com o Código Civil.
a) As causas suspensivas da celebração do casamento podem ser arguidas pelos parentes em
linha reta de um dos nubentes, sejam consanguíneos ou afins, e pelos colaterais em segundo
grau, sejam também consanguíneos ou afins.
b) Os impedimentos para o casamento podem ser opostos, até o momento da celebração do
casamento, por qualquer pessoa.
c) O requerimento de habilitação para o casamento será firmado por ambos os nubentes, de
próprio punho, sendo vedada a habilitação por procuração.
d) A solenidade do casamento realizar-se-á na sede do cartório, com toda publicidade, a portas
abertas, presentes pelo menos quatro testemunhas, parentes ou não dos contraentes.
e) Extingue-se, em dois anos, o direito de anular o casamento dos menores de dezesseis anos,
contado o prazo para o menor do dia em que perfez essa idade.
8- De acordo com as disposições do Código Civil, assinale a alternativa INCORRETA.
a) Constituem concubinato as relações não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de
casar.
b) A união estável não se constituirá se ocorrerem as causas suspensivas do casamento previstas
no Código Civil.
c) As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e
assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
d) Salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais na união
estável, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
e) É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada
na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de
família.
9- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
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I – Na dissolução de entidade familiar, é possível o reconhecimento do direito de visita a animal
de estimação adquirido na constância da união, demonstrada a relação de afeto com o animal.
II – O casal não é obrigado a formular pedido extrajudicial antes de ingressar com ação judicial
pedindo a conversão da união estável em casamento.
III – No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a diferenciação de regimes sucessórios
entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime
estabelecido no art. 1.829 do Código Civil.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
10- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – Na dissolução de união estável, não é possível a partilha dos direitos de concessão de uso
para moradia de imóvel público.
II – O benefício de previdência privada fechada é excluído da partilha em dissolução de união
estável regida pela comunhão parcial de bens.
III – É de quatro anos o prazo de decadência para anular partilha de bens em dissolução de união
estável, por vício de consentimento (coação), nos termos do art. 178 do Código Civil.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
COMENTÁRIOS
1. Gabarito: C
I – CORRETA – Segundo a jurisprudência do STJ (Info 614):
420
423
intentada pela ex-esposa. Posteriormente, foi proposta ação de separação judicial
litigiosa que, em 19.04.2001, foi convertida em consensual. A divisão do acervo
patrimonial comum, por sua vez, foi objeto de ação própria, ajuizada em maio de
2001, processada sob a forma de inventário. Revela-se, outrossim, incontroverso
que os bens e direitos comuns do casal sempre estiveram sob a administração
exclusiva do ex-marido, que, em 27.11.2001, veio a assumir o encargo de
inventariante do patrimônio. 5. Em caráter geral, a jurisprudência desta Corte já
consagrou o entendimento de que a prestação de contas é devida por aqueles que
administram bens de terceiros, não havendo necessidade de invocação de qualquer
motivo para o interessado tomá-la. 6. No tocante especificamente à relação
decorrente do fim da convivência matrimonial, infere-se que, após a separação de
fato ou de corpos, o cônjuge que estiver na posse ou na administração do patrimônio
partilhável - seja na condição de administrador provisório, seja na de inventariante -
terá o dever de prestar contas ao ex-consorte. Isso porque, uma vez cessada a
afeição e a confiança entre os cônjuges, aquele titular de bens ou negócios
administrados pelo outro tem o legítimo interesse ao pleno conhecimento da forma
como são conduzidos, não se revelando necessária a demonstração de qualquer
irregularidade, prejuízo ou crédito em detrimento do gestor. 7. Recurso especial
provido para restabelecer a sentença de procedência. (REsp 1274639/SP, Rel.
Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 12/09/2017, DJe
23/10/2017)
421
424
enfrentou a questão, estabelecendo que o FGTS é "direito social dos trabalhadores
urbanos e rurais", constituindo, pois, fruto civil do trabalho. (REsp 848.660/RS, Rel.
Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, DJe 13/05/2011) 4. O
entendimento atual do Superior Tribunal de Justiça é o de que os proventos do
trabalho recebidos, por um ou outro cônjuge, na vigência do casamento, compõem
o patrimônio comum do casal, a ser partilhado na separação, tendo em vista a
formação de sociedade de fato, configurada pelo esforço comum dos cônjuges,
independentemente de ser financeira a contribuição de um dos consortes e do outro
não. 5. Assim, deve ser reconhecido o direito à meação dos valores do FGTS auferidos
durante a constância do casamento, ainda que o saque daqueles valores não seja
realizado imediatamente à separação do casal. 6. A fim de viabilizar a realização
daquele direito reconhecido, nos casos em que ocorrer, a CEF deverá ser comunicada
para que providencie a reserva do montante referente à meação, para que num
momento futuro, quando da realização de qualquer das hipóteses legais de saque,
seja possível a retirada do numerário. 7. No caso sob exame, entretanto, no tocante
aos valores sacados do FGTS, que compuseram o pagamento do imóvel, estes se
referem a depósitos anteriores ao casamento, matéria sobre a qual não
controvertem as partes. 8. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp
1399199/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/03/2016, DJe 22/04/2016).
2. Gabarito: A
I – CORRETA – Segundo o STJ:
422
425
sociais da sociedade de advogados pelo recorrido deu-se na constância do
casamento, cujo regime de bens era o da comunhão universal. Desse modo, se a
obtenção da participação societária decorreu naturalmente dos esforços e
patrimônios comuns dos então consortes, sua divisão entre os cônjuges, por ocasião
de sua separação, é medida de justiça e consonante com a lei de regência. 3.2
Naturalmente, há que se preservar o caráter personalíssimo dessas sociedades,
obstando-se a atribuição da qualidade de sócio a terceiros que, nessa condição, não
detenham com o demais a denominada affectiosocietatis. Inexistindo, todavia, outro
modo de se proceder à quitação do débito ou de implementar o direito à meação ou
à sucessão, o direito destes terceiros (credor pessoal do sócio, ex-cônjuge e
herdeiros) são efetivados por meio de mecanismos legais (dissolução da sociedade,
participação nos lucros, etc) a fim de amealhar o valor correspondente à participação
societária. 3.3 Oportuno assinalar que o atual Código Civil, ao disciplinar a partilha
das quotas sociais em razão do falecimento do cônjuge ou da decretação da
separação judicial ou do divórcio, apenas explicitou a repercussão jurídica de tais
fatos, que naturalmente já era admitida pela ordem civil anterior. E, o fazendo,
tratou das sociedades simples, de modo a tornar evidente o direito dos herdeiros e
do cônjuge do sócio em relação à participação societária deste e, com o notável
mérito de impedir que promovam de imediato e compulsoriamente a dissolução da
sociedade, conferiu-lhes o direito de concorrer à divisão períodica dos lucros. 4.
Recurso especial provido, para, reconhecendo, em tese, o direito da cônjuge, casada
em comunhão universal de bens, à partilha do conteúdo econômico das quotas
sociais da sociedade de advogados então pertencentes ao seu ex-marido (não se lhe
conferindo, todavia, o direito à dissolução compulsória da sociedade), determinar
que o Tribunal de origem prossiga no julgamento das questões remanescentes
veiculadas no recurso de apelação. (REsp 1531288/RS, Rel. Ministro MARCO
AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/11/2015, DJe 17/12/2015)
423
426
expressamente previstas na Lei n. 11.340/2006, sob pena de banalizar a
competência das Varas Especializadas. 2. Na espécie, a ação de divórcio foi
promovida em 16/6/2013, em meio à plena vigência de medida protetiva de
urgência destinada a neutralizar a situação de violência a que a demandante
encontrava-se submetida, a ensejar a pretensão de dissolução do casamento. Por
consectário, a posterior extinção daquela (em 8/10/2013), decorrente de acordo
entabulado entre as partes, homologado pelo respectivo Juízo, afigura-se irrelevante
para o efeito de se modificar a competência. 3. Recurso Especial provido. (REsp
1496030/MT, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado
em 06/10/2015, DJe 19/10/2015)
3. Gabarito: E
a) Correta, segundo o art. 1.516. § 3º, CC:
(...)
§3º Será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos
consorciados houver contraído com outrem casamento civil.
b) Correta, segundo o art. 1.515, CC: “O casamento religioso, que atender às exigências da lei
para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio,
produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.”
c) Correta, segundo o art. 1.548, CC: “É nulo o casamento contraído: I - (Revogado); II - por
infringência de impedimento.”
424
427
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do
adotante;
VI - as pessoas casadas;
d) Correta, segundo o art. 1.512, parágrafo único do CC: “A habilitação para o casamento, o
registro e a primeira certidão serão isentos de selos, emolumentos e custas, para as pessoas cuja
pobreza for declarada, sob as penas da lei.”
e) Incorreta, segundo o art. 1.514, CC. “O casamento se realiza no momento em que o homem
e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz
os declara casados.”
4. Gabarito: B
I - (Revogado);
III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do
adotante;
VI - as pessoas casadas;
II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;
III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;
425
428
V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da
revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
5. Gabarito: C
I – CORRETA
II – INCORRETA
III – CORRETA
Segue julgado do STJ sobre o tema:
6. Gabarito: A
I – CORRETA
II – CORRETA
III – CORRETA
Segue julgado do STJ a respeito do tema
426
429
esquadrinhar indevidamente a própria intimidade e a vida privada do consortes. 3.
No caso em exame, foi pleiteada a alteração do regime de bens do casamento dos
ora recorrentes, manifestando eles como justificativa a constituição de sociedade de
responsabilidade limitada entre o cônjuge varão e terceiro, providência que é
acauteladora de eventual comprometimento do patrimônio da esposa com a
empreitada do marido. A divergência conjugal quanto à condução da vida financeira
da família é justificativa, em tese, plausível à alteração do regime de bens,
divergência essa que, em não raras vezes, se manifesta ou se intensifica quando um
dos cônjuges ambiciona everedar-se por uma nova carreira empresarial, fundando,
como no caso em apreço, sociedade com terceiros na qual algum aporte patrimonial
haverá de ser feito, e do qual pode resultar impacto ao patrimônio comum do casal.
4. Portanto, necessária se faz a aferição da situação financeira atual dos cônjuges,
com a investigação acerca de eventuais dívidas e interesses de terceiros
potencialmente atingidos, de tudo se dando publicidade (Enunciado n. 113 da I
Jornada de Direito Civil CJF/STJ). 5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp
1119462/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
26/02/2013, DJe 12/03/2013).
7. Gabarito: E
a) Correta, segundo o art. 1.524, CC: “As causas suspensivas da celebração do casamento podem
ser arguidas pelos parentes em linha reta de um dos nubentes, sejam consanguíneos ou afins, e
pelos colaterais em segundo grau, sejam também consanguíneos ou afins.”
b) Incorreta, segundo o art. 1.522, CC: “Os impedimentos podem ser opostos, até o momento
da celebração do casamento, por qualquer pessoa capaz.”
c) Incorreta, segundo o art. 1.525, CC: “O requerimento de habilitação para o casamento será
firmado por ambos os nubentes, de próprio punho, ou, a seu pedido, por procurador, e deve ser
instruído com os seguintes documentos: (...)”
d) Incorreta, segundo o art. 1.534, CC: “A solenidade realizar-se-á na sede do cartório, com toda
publicidade, a portas abertas, presentes pelo menos duas testemunhas, parentes ou não dos
contraentes, ou, querendo as partes e consentindo a autoridade celebrante, noutro edifício
público ou particular.”
e) Incorreta, segundo o art. Art. 1.560, § 1º, CC:
Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da
data da celebração, é de:
8. Gabarito: B
a) Correta, segundo o art. 1.727, CC: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher,
impedidos de casar, constituem concubinato.”
b) Incorreta, segundo o art. 1.723, § 1º, CC: “A união estável não se constituirá se ocorrerem os
impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa
casada se achar separada de fato ou judicialmente.”
“§ 2º As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão a caracterização da união estável.”
c) Correta, segundo o art. 1.724, CC: “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão
aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”
d) Correta, segundo o art. 1.725, CC: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os
companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial
de bens.”
427
430
e) Correta, segundo o art. 1.723, CC: “É reconhecida como entidade familiar a união estável
entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e
estabelecida com o objetivo de constituição de família.”
9. Gabarito: A
I – CORRETA – Em consonância com a jurisprudência:
428
431
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. FAMÍLIA. AÇÃO DE CONVERSÃO DE UNIÃO ESTÁVEL EM
CASAMENTO. OBRIGATORIEDADE DE FORMULAÇÃO EXCLUSIVAMENTE PELA VIA
ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA. CONVERSÃO PELA VIA JUDICIAL. POSSIBILIDADE. O
propósito recursal é reconhecer a existência de interesse de agir para a propositura
de ação de conversão de união estável em casamento, considerando a possibilidade
de tal procedimento ser efetuado extrajudicialmente. Os arts. 1726, do CC e 8º, da
Lei 9278/96 não impõem a obrigatoriedade de que se formule pedido de conversão
de união estável em casamento exclusivamente pela via administrativa. A
interpretação sistemática dos dispositivos à luz do art. 226 § 3º da Constituição
Federal confere a possibilidade de que as partes elejam a via mais conveniente para
o pedido de conversão de união estável em casamento. Recurso especial conhecido
e provido. (REsp 1685937/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA,
julgado em 17/08/2017, DJe 22/08/2017
429
432
vedação do retrocesso. 4. Com a finalidade de preservar a segurança jurídica, o
entendimento ora firmado é aplicável apenas aos inventários judiciais em que não
tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha, e às partilhas extrajudiciais
em que ainda não haja escritura pública. 5. Provimento do recurso extraordinário.
Afirmação, em repercussão geral, da seguinte tese: “No sistema constitucional
vigente, é inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e
companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime estabelecido no
art. 1.829 do CC/2002”. (RE 878694, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal
Pleno, julgado em 10/05/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-021 DIVULG 05-02-2018
PUBLIC 06-02-2018)
10. Gabarito: D
I – INCORRETA – Segundo já decidiu o STJ:
430
433
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. REGIME DE BENS.
COMUNHÃO PARCIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA. MODALIDADE FECHADA.
CONTINGÊNCIAS FUTURAS. PARTILHA. ART. 1.659, VII, DO CC/2002. BENEFÍCIO
EXCLUÍDO. MEAÇÃO DE DÍVIDA. POSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. PRECLUSÃO
CONSUMATIVA. FUNDAMENTO AUTÔNOMO. 1. Cinge-se a controvérsia a identificar
se o benefício de previdência privada fechada está incluído dentro no rol das
exceções do art. 1.659, VII, do CC/2002 e, portanto, é verba excluída da partilha em
virtude da dissolução de união estável, que observa, em regra, o regime da
comunhão parcial dos bens. 2. A previdência privada possibilita a constituição de
reservas para contigências futuras e incertas da vida por meio de entidades
organizadas de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social.
3. As entidades fechadas de previdência complementar, sem fins lucrativos,
disponibilizam os planos de benefícios de natureza previdenciária apenas aos
empregados ou grupo de empresas aos quais estão atrelados e não se confundem
com a relação laboral (art. 458, § 2º, VI, da CLT). 4. O artigo 1.659, inciso VII, do
CC/2002 expressamente exclui da comunhão de bens as pensões, meios-soldos,
montepios e outras rendas semelhantes, como, por analogia, é o caso da previdência
complementar fechada. 5. O equilíbrio financeiro e atuarial é princípio nuclear da
previdência complementar fechada, motivo pelo qual permitir o resgate antecipado
de renda capitalizada, o que em tese não é possível à luz das normas previdenciárias
e estatutárias, em razão do regime de casamento, representaria um novo parâmetro
para a realização de cálculo já extremamente complexo e desequilibraria todo o
sistema, lesionando participantes e beneficiários, terceiros de boa-fé, que assinaram
previamente o contrato de um fundo sem tal previsão. 6. Na partilha, comunicam-
se não apenas o patrimônio líquido, mas também as dívidas e os encargos existentes
até o momento da separação de fato. 7. Rever a premissa de falta de provas aptas a
considerar que os empréstimos beneficiaram a família, demanda o revolvimento do
acervo fático-probatório dos autos, o que atrai o óbice da Súmula nº 7 deste Superior
Tribunal. 8. Recurso especial não provido. (REsp 1477937/MG, Rel. Ministro
RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe
20/06/2017)
431
434
CAPÍTULO 9 – DIREITO DAS SUCESSÕES
432
435
sempre em consonância com o princípio constitucional maior da dignidade da pessoa humana,
pelo qual temos que qualquer interpretação deve considerar a pessoa humana no centro de
todo agir e o patrimônio a serviço daquela.
Como veremos, há importantes mudanças introduzidas pelo CC/02 na parte referente
ao Direito das Sucessões, ficando, desde um primeiro momento, clara essa alteração quando
notamos a ampliação do número de capítulos do Título I – Da Sucessão em Geral.
Se confrontarmos o CC/02 com o anterior, constataremos que, enquanto o CC de 1916,
tratava da matéria em cinco capítulos, o atual dedica sete capítulos a essa disciplina.
No entanto, como dito, a principal mudança é a forma de interpretação da nova
disciplina do direitos das sucessões, a partir desse olhar voltado para a dignidade do ser humano
e não propriamente para o patrimônio.
O direito das sucessões disciplina a substituição do sujeito em relação jurídica de
natureza patrimonial porque o titular do direito (subjetivo ou potestativo) ou dever jurídico veio
a óbito. Tal sub-rogação subjetiva causa mortis (substituição de sujeitos) pressupõe a morte do
titular (CARNACCHIONI, 2018, p. 1640).
Vê-se, desde já, que esse ramo do direito trata apenas da sucessão em decorrência do
falecimento de alguém, que como veremos, poderá ser real ou presumido. Na parte geral do
Direito Civil, são estudadas as formas de morte, como fim da personalidade da pessoa natural.
Estuda-se, então, que essa morte, nos termos do artigo 6º/CC, pode ser real ou presumida,
sendo que a morte presumida ou ficta pode ser com ou sem decretação de ausência. Em todas
essas hipóteses, uma vez declarada a morte (real ou presumida), haverá a transmissão do
patrimônio.
No caso da morte presumida com decretação de ausência, como estudado na parte
geral, existe todo um trâmite do processo para resguardo do patrimônio, para a hipótese da
pessoa retornar. Por isso, há prazos que devem ser respeitados. No caso do ausente, como
exposto na parte geral, a pessoa que desapareceu somente é considerada morta por presunção
após a abertura da sucessão definitiva.
433
436
- o legatário também recebe a propriedade dos bens individualizados, porém a posse é
apenas indireta.
Suceder significa ocupar o lugar que antes era ocupado por outro. No caso do direito
das sucessões, estamos tratando da sucessão da titularidade de um patrimônio em decorrência
da morte de seu antigo titular. Assim, o emprego da palavra sucessão, no nosso campo de
estudo, refere-se a essa transmissão do patrimônio apenas em razão da morte. Outra ou outras
pessoas passam a ocupar o lugar que outrora era ocupado pelo falecido.
Nessa ideia de transmissão, merece destaque o disposto no artigo 1.784/CC, segundo o
qual “aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e
testamentários”.
Trata-se, na hipótese, do princípio de saisine, segundo o qual, com a morte do autor da
herança, a transmissão do patrimônio é imediata aos herdeiros legítimos e testamentários,
sendo o posterior processo de inventário apenas um meio de regularizar essa transmissão que
já ocorreu no exato momento da morte.
O princípio de saisine faz com que o inventário tenha um intuito ou natureza meramente
declaratória, pois já houve a transmissão com a morte. O inventário simplesmente regulariza a
situação. Com isso, temos que há continuidade da titularidade da dos bens que compõem a
herança. Em outras palavras, em nenhum momento, a herança fica sem titular (CARNACCHIONI,
2018, p. 1642).
Essa transferência de titularidade acontece de forma imediata para os herdeiros e
legítimos e testamentários. Quanto ao legatário, temos que ele recebe, desde a abertura da
sucessão, a propriedade dos bens individualizados que lhe foram destinados, mas a posse
dependerá da solvência do espólio (art. 1.923/CC).
O estudo das espécies de sucessões leva, por via de consequência, à análise das espécies
de herdeiros. Assim, temos como espécies de sucessões:
• sucessão a título universal: ocorre quando uma pessoa morre e os sucessores
assumem a posição jurídica desse falecido, denominado autor da herança. Os
sucessores, no caso, investem-se totalmente nos direitos que são transmitidos
em face da morte do titular. Isto é, há transferência da totalidade dos direitos e
obrigações relacionados ao patrimônio do falecido, de forma que esses
herdeiros sub-rogam se na posição do falecido, em relação à totalidade do
patrimônio ou parte ideal dele. Diferentemente do que ocorre na sucessão a
titulo particular, que veremos no tópico seguinte, nesse tipo de sucessão, o
patrimônio daquele que morreu será transmitido como um todo ao seu(s)
sucessor(es), o que significa dizer que abarcará o ativo e passivo. Os sucessores
a título universal são, dessa forma, denominados herdeiros, pois recebem, no
todo ou em parte, a herança, considerada essa uma universalidade que abrange
eventuais créditos e também débitos e obrigações;
• sucessão a título singular ou particular: ocorre quando o beneficiário é
chamado a suceder um(ns) bem(ns) determinado(s), individualizado(s), que
pode ser bem móvel, imóvel, créditos ou direitos. Nesse tipo de sucessão, o
falecido, em vida, por manifestação de última vontade, deixa o(s) bem(ns), de
forma individualizada, ao(s) beneficiário(s), valendo-se, para tanto, de um
434
437
testamento. Nessa hipótese, o sucessor, a título singular, é chamado de
legatário, sendo que o bem ou bens deixados constituem o denominado legado.
Como visto, o legatário sucede ao falecido a título singular, de modo que o bem
deixado é determinado, certo e individualizado, incorporando-se ao patrimônio
do legatário;
• sucessão legítima: é aquela que decorre da lei, a qual enuncia, então, a ordem
a ser observada na vocação hereditário;
• sucessão testamentária: decorre da possibilidade de disposição de patrimônio.
Assim, nesse tipo de sucessão, ter-se-á um testamento, o qual se configura
como ato de última vontade do falecido. Há uma voluntariedade expressada em
testamento, codicilo ou legado.
É preciso dizer que é possível que ocorram, simultaneamente, a sucessão legítima e a
testamentária, bem como alguns sucessores recebam bens a título universal e outros recebam
bens individualizados. Como exemplo, podemos citar a hipótese do autor da herança deixar
testamento, individualizando bens que ficarão para determinadas pessoas, e , a par disso,
também houver herdeiros necessários. Esses herdeiros necessários sucederão a título universal
enquanto os beneficiários do testamento herdarão a título individual.
A ordem vocacional ou vocação hereditária diz respeito à ordem estabelecida pela lei a
ser observada na sucessão hereditária, ou seja, na sucessão aberta que não decorre de
testamento. Essa ordem refere-se aos herdeiros, que sucedem o falecido a título universal. Eles
serão, assim, chamados, uns na falta dos outros em ordem preferencial, podendo, em alguns
casos, conforme expressa previsão legal, existir concorrência entre eles.
Então, esse chamamento será feito consoante uma ordem estabelecida em lei,
denominada ordem de vocação hereditária. Esse chamamento é feito por classes, sendo que a
mais próxima exclui a mais remota.
O artigo 1.829/CC trata da ordem preferencial, estabelecendo in verbis:
IV - aos colaterais.
435
438
Disso resulta, uma classificação importante quanto aos sucessores do falecido:
• herdeiros legítimos necessários: são aqueles que têm a seu favor a proteção da
“legítima”. Essa legítima é constituída por metade do patrimônio do autor da
herança e se caracteriza pela sua indisponibilidade. Carnacchioni explica que o
fundamento histórico da legítima é a proteção do patrimônio em favor de
pessoas próximas ao autor da herança (CARNACCHIONI, 2018, p. 1642). O
cálculo da legítima é feito com base nos bens da época da abertura da sucessão
(morte do de cujos). Sendo assim, para fins de legítima e proteção dos herdeiros
necessários, calcula-se o que corresponde à metade dos bens do falecido no
momento da morte do autor da herança. O resultado desse cálculo será a parte
indisponível. Porém, é preciso destacar que nesse cálculo, considerar-se-ão os
bens sujeitos à colação, que o herdeiro eventualmente recebeu, sendo
considerado adiantamento de herança. Ou seja, os bens recebidos como
antecipação da legítima retornarão ao acervo total para fins de cálculo da
legítima. Conforme estatui o art. 1.789/CC, se houver herdeiros necessários, o
autor da herança só pode dispor de metade da herança, ficando a outra
indisponível. Já o art. 549 do CC diz que é nula a doação na parte que exceder à
legítima. São herdeiros necessários: ascendentes, descendentes e cônjuge e
companheiro (esse em decorrência dos julgados do STF);
• herdeiros legítimos facultativos: são considerados herdeiros facultativos
aqueles que, não obstante previstos em lei na vocação hereditária, não estão
protegidos pela legítima, podendo, por conseguinte, ser preteridos por força de
testamento. Assim é que, não tendo herdeiros necessários, pode o autor da
herança dispor de todo seu patrimônio em testamento, hipótese em que
preterirá os eventuais herdeiros facultativos acaso existentes. Se, por outro
lado, não tendo herdeiros necessários e não deixando testamento, os bens
deixados passarão a esses herdeiros facultativos. São herdeiros facultativos:
colaterais até o 4º grau. Ainda tendo em conta os possíveis herdeiros, temos a
classificação que considera aqueles instituídos por testamentos. São eles:
o herdeiros testamentários: são aqueles indicados como beneficiários da
herança por disposição de última vontade. É importante destacar que
os herdeiros testamentários podem ser aqueles que já são
estabelecidos em lei, ou seja, aqueles considerados herdeiros legítimos.
Como o autor da herança pode dispor de metade dos bens (na hipótese
de ter herdeiros necessários), segue-se que pode pretender deixar para
os herdeiros legítimos uma parcela diferenciada daquela instituída em
lei, e poderá fazer isso através do testamento. Por meio de testamento,
o autor da herança deixa para o herdeiro testamentário parcela do
patrimônio, não identificando exatamente quais bens serão
transmitidos. A transmissão se faz, assim, de percentual do patrimônio
total;
o legatários: os legatários também são herdeiros beneficiados pela
liberalidade do autor da herança, que pode dispor de metade dos bens,
quando tem herdeiros necessários, e da totalidade, quando não há
herdeiros necessários. Porém, diferentemente do que ocorre no
testamento, no legado, o autor da herança deixa para o legatário um
bem determinado, certo e individualizado, e a título singular.
Ainda em relação aos herdeiros, é importante destacar quem são os legitimados a
suceder. A legitimação é uma capacidade especial para um determinado ato. Neste caso, o ato
é a sucessão.
436
439
O art. 1.798 diz que são legitimados a suceder:
- pessoas nascidas;
- pessoas já concebidas no momento da abertura da sucessão, ou seja, da morte
(nascituro);
Sobre o nascituro, temos que a maior parte da doutrina defende a teoria natalista
quanto ao início da personalidade, de forma a considerar que só com o nascimento com vida,
temos o início da personalidade civil. Não obstante, a própria lei põe a salvo os direitos do
nascituro. Assim é que o nascituro pode receber herança, que constituirá um direito condicional.
Está condicionado ao nascimento com vida. Para os natalistas, assim, caso o nascituro não venha
a nascer com vida, não haverá transferência da herança e, com isso, o direito sucessório não se
perfaz. É como se nunca o nascituro nunca tivesse existido.
Por isso, Flávio Tartuce esclarece em sua obra ter mudado de posicionamento sobre o
tema. Ele esclarece que
Existe uma discussão na doutrina a respeito dessa regra, quanto a ela se estender ou
não aos embriões, havidos por meio de técnica de reprodução assistida.
Não existe entendimento pacífico. Flávio Tartuce entende que devem ser estendidos aos
embriões, reproduzidos por meio de técnica de reprodução assistidas, as mesmas regras
deferidas aos nascituros. Para reforçar seu posicionamento, cita que
Essa é uma temática nova que ainda não teve o devido enfrentamento.
O art. 1.799/CC diz que na sucessão testamentária ainda podem ser chamados a suceder
os filhos, mesmo que não concebidos de pessoas indicadas pelo testador (prole eventual), desde
que estas estejam vivas ao tempo da sucessão.
Esse comando legal estabelece, então, que o autor da herança poderá deixar herança
para uma prole eventual de outrem. Ex.: o autor da herança deixa uma casa de praia para o
primeiro filho de João e Maria.
No entanto, se decorridos 2 anos após a abertura da sucessão, o herdeiro não for
concebido, os bens reservados, salvo se houver uma disposição diversa, caberão aos herdeiros
legítimos.
Por outro lado, o art. 1.801/CC diz que não podem ser nomeados herdeiros ou
legatários, ou seja, não têm legitimação sucessória:
- as pessoas que, a rogo, tenham escrito o testamento, nem mesmo o cônjuge ou
companheiro, ascendentes, descendentes ou irmãos dessa pessoa;
437
440
- as testemunhas do testamento;
- o concubino do testador casado (lembrando que o concubinato refere-se à união com
impedimento), salvo se estivesse separado de fato, pois, neste caso, não haveria concubinato, e
sim união estável;
- o tabelião civil ou militar, ou comandante ou escrivão, perante o que se fizer ou se
aprovar o testamento.
Vimos a distinção entre a sucessão a título universal e a título singular, bem como
diferenciamos os tipos de herdeiros, elencando, ainda, o legatário.
Importa, então, deixar claras as diferenças entre a herança e o legado, conceitos que
estão diretamente ligados aos tipos de herança e de sucessores causa mortis.
Pois bem, a herança é uma universalidade de bens e direitos, os quais, com a morte do
autor da herança, permanecem indivisos até a sua individuação pela partilha. Ou seja, somente
com a efetiva partilha é que haverá individualização dos bens para cada herdeiro. Já no legado,
os bens deixados para o legatário são certos e determinados. Assim é que quem recebe herança
sucede a título universal, enquanto quem recebe o legado sucede a título singular, coisa certa e
individuada.
Por conseguinte, quem recebe herança é denominado herdeiro e quem recebe legado
é chamado de legatário.
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O art. 23, II, NCPC diz que compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de
qualquer outra, proceder a confirmação do testamento particular e inventário e partilha de bens
situados no Brasil. O caso é de competência absoluta.
Para evitar confusão, lembremos que a regra do artigo 23 do NCPC refere-se à
competência para processamento do inventário, enquanto a regra do artigo 10 da LINDB refere-
se à qual lei será aplicada para solução de transmissão de bens deixados por estrangeiro. Em
outras palavras, ainda que determinada a competência da justiça brasileira, conforme
regramento do artigo 23, II do NCPC, é possível que seja aplicável legislação estrangeira mais
benéfica ao cônjuge e/ou filhos brasileiros.
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ocasião do casamento com a adoção de regime de bens que exclua da comunhão os
bens particulares de cada um. Com efeito, o regime de bens tal qual disciplinado no
Livro de Família do Código Civil, instituto que disciplina o patrimônio dos nubentes,
não rege o direito sucessório, embora tenha repercussão neste. Ora, a sociedade
conjugal se extingue com o falecimento de um dos cônjuges (art. 1.571, I, do CC),
incidindo, a partir de então, regras próprias que regulam a transmissão do
patrimônio do de cujus, no âmbito do Direito das Sucessões, que possui livro próprio
e específico no Código Civil. Assim, o regime de bens adotado na ocasião do
casamento é considerado e tem influência no Direito das Sucessões, mas não
prevalece tal qual enquanto em curso o matrimônio, não sendo extensivo a situações
que possuem regulação legislativa própria, como no direito sucessório (REsp
1.472.945-RJ, Terceira Turma, DJe de 19/11/2014). Por fim, ressalte-se que essa linha
exegética é a mesma chancelada no Enunciado 270 do Conselho da Justiça Federal,
aprovado na III Jornada de Direito Civil. Precedente citado: REsp 974.241-DF, Quarta
Turma, DJe 5/10/2011. REsp 1.368.123-SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, Rel. para acórdão
Min. Raul Araújo, julgado em 22/4/2015, DJe 8/6/2015 (INF. 563).
2. SUCESSÃO HEREDITÁRIA
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2.2. ADMINISTRAÇÃO DA HERANÇA
O Código Civil estabelece o prazo de 30 dias, a contar da abertura da sucessão, para que
haja a abertura do inventário do patrimônio hereditário (art. 1796/CC).
O NCPC, no art. 611, estabelece que o processo de inventário e partilha deve ser
instaurado dentro de 2 meses, o que dá aproximadamente 60 dias, a contar da abertura da
sucessão, devendo ser finalizado nos 12 meses subsequentes, podendo esse prazo,
justificadamente, ser prorrogado de ofício ou a requerimento das partes.
Como se vê, o NCPC estabelece prazo diferenciado do CC. Considerando que o Código
de Processo Civil é norma de igual hierarquia do Código Civil, porém posterior, temos uma
revogação da disposição do Código Civil, prevalecendo o prazo do Código de Processo Civil
(revogação tácita).
A administração do inventário cabe ao inventariante.
O art. 1.797/CC diz que até que haja o compromisso do inventariante, a administração
caberá a um administrador provisório, de acordo com uma ordem sucessiva que é estabelecida
pela lei:
- primeiramente, esta administração provisória caberá ao cônjuge ou companheiro;
- caso não seja a hipótese, pelo herdeiro que estiver na posse ou na administração
daquele bem;
- se houver mais de um herdeiro na posse daquele bem, será o administrador provisório
o mais velho;
- se não for o caso, será o testamenteiro o administrador provisório;
- não havendo testamenteiro, será administrador provisório uma pessoa de confiança
do juiz.
É importante destacar que esse rol é meramente exemplificativo, pois, no caso concreto,
outra pessoa poderá se mostrar mais adequada para administrar provisoriamente os bens.
Vimos a vocação hereditária, pela qual a lei estabelece quem são as pessoas que serão
chamadas para suceder o falecido, na titularidade dos bens deixados por aquele. Ocorre que,
por vezes, o falecido pode não ter deixado herdeiros para receber esses bens. Assim, prevê a lei
que, nessa hipótese, os bens passarão ao município ou Distrito Federal.
Nessa linha de raciocínio, o estudo da herança jacente e vacante refere-se às etapas
pelas quais a herança passa quando inexistem herdeiros legítimos (ou estes tenham renunciado
à herança), de forma que os bens deixados pelo falecido são devolvidos ao Município ou ao
Distrito Federal.
É importante destacar que é possível a convivência da herança jacente com a herança
testamentária. Isso ocorrerá quando o falecido, que não tenha qualquer herdeiro, deixar
testamento que contemple apenas parte dos bens.
Quando não há herdeiros habilitados ou os que poderiam ser renunciam o direito, a
herança fica sem titularidade, já que para o Poder Público não se aplica o princípio de saisine.
Como corolário, segue-se a possibilidade de usucapião desses bens durante o período em que
estão na condição de jacente (1ª etapa), ou seja, até ser declarada a vacância (2ª etapa), os bens
estão sujeitos à usucapião. Com a declaração de vacância, os bens passam à propriedade
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resolúvel do Poder Público e ficam nessa condição por 5 anos. Somente após o prazo de 5 anos,
a contar da sentença que declara a herança vacante, é que os bens passam ao patrimônio
definitivo do Poder Público.
Assim, temos:
a) Herança jacente: o art. 1.844/CC estabelece que, não sobrevivendo cônjuge, ou
companheiro, nem parente algum sucessível, ou tendo sobrevivido, mas tendo havido a
renúncia à herança, será devolvido ao Município ou ao Distrito Federal, se localizada nas
respectivas circunscrições, ou à União, quando situada em território federal a propriedade à
herança.
Nessa hipótese, os bens deixados pelo falecido ficarão sob a guarda de um curador até
a sua entrega a um sucessor que venha a se habilitar. Se não houver ninguém para se habilitar,
os bens ficarão com esse curador até a última etapa de devolução dos bens ao Município ou DF,
que é a etapa em que a herança é declarada vacante. Antes disso, ela é considerada jacente,
pela ausência inicial de cônjuge, companheiro, descendentes ou ascendentes, bem como de
colaterais, sendo, então, submetida aos cuidados do curador. Se não aparecer ninguém
habilitado a suceder, a herança é declarada jacente.
O art. 738 do NCPC estabelece que nos casos em que a lei considerar jacente a herança,
o juiz, em cuja comarca tinha domicílio o falecido, procederá imediatamente à arrecadação dos
respectivos bens.
Já o art. 740 do NCPC determina ao oficial de justiça, acompanhado de testemunhas,
que arrole os bens do falecido, descrevendo-os num auto circunstanciado.
Eventualmente, se o juiz não puder comparecer ao local por meio do oficial de justiça,
irá requisitar que a autoridade policial proceda à arrecadação e ao arrolamento desses bens com
a presença de duas testemunhas.
Se for por oficial de justiça, basta que esteja acompanhado do curador. Se for por
autoridade policial, serão necessárias duas testemunhas.
O §2º do art. 740 do CPC prevê que não estando ainda nomeado um curador, o juiz irá
designar um depositário para cuidar dos bens. Durante a arrecadação, o juiz ou a autoridade
policial que estiver fazendo a arrecadação, vai inquirir os vizinhos e moradores da vizinhança
para saber quem era o falecido, onde estão ou se existem sucessores, além de saber se há mais
bens em nome do de cujos.
O art. 740, §5º, NCPC diz que, se constar a existência de bens em outra comarca, deverá
o juiz determinar a expedição de carta precatória para que tais bens sejam arrecadados também.
Feitas essas diligências, serão expedidos editais para tentativa de localização de
sucessores legítimos.
Perceba-se que, com todas essas diligências, ainda estamos na fase da herança jacente.
O art. 741 do CPC diz que, ultimada a arrecadação, o juiz mandará expedir edital, o qual
será publicado na internet, permanecendo nos sítios de tribunal, CNJ, por 3 meses, a fim de que
os sucessores venham a se habilitar no prazo de 6 meses a contar do início da publicação.
Se for verificada a existência de um sucessor ou de um testamenteiro em lugar certo,
será feita sua citação, sem prejuízo do edital que procurará outros sucessores também.
Quando o falecido for estrangeiro, este fato deverá ser comunicado à autoridade
consular. A ideia é de que haja outros mecanismos para encontrar ou procurar outros herdeiros.
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445
b) Herança vacante: decorrido 1 ano da publicação dos editais, sem que haja herdeiros
que tenham se habilitado, ou que estejam pendentes de habilitação, a herança jacente será
declarada vacante.
Essa declaração de vacância tem caráter de definitividade, de forma que, transitada em
julgado a sentença que declarou a vacância, o cônjuge ou companheiro, os herdeiros, ou
credores do falecido só poderão reclamar o seu direito numa ação direta, não podendo mais se
habilitarem no autos do procedimento de vacância.
Em outras palavras, temos que, com a sentença que declara a vacância da herança, os
bens são transferidos ao ente público, só podendo ser reclamados em ação própria. A
propriedade, no caso, é resolúvel, já que os interessados poderão buscar o direito em ação
própria. Porém, esse direito somente poderá ser perseguido no prazo de 5 anos da sentença de
vacância, já que após esse prazo, os bens passam ao patrimônio definitivo do Poder Público
(Município, Distrito Federal ou da União, conforme o caso).
A transferência, no caso, só ocorre com a sentença de vacância (propriedade resolúvel),
não se aplicando, como já visto, o princípio de saisine.
Pelo princípio de saisine, temos que desde a abertura da sucessão, ou seja, desde a
morte do autor da herança, há transmissão imediata da titularidade dos bens e obrigações que
constituem a herança. Todavia, ninguém é obrigada a permanecer na titularidade desses bens
e/ou obrigações. Daí que a lei faculta a aceitação ou não da transmissão da herança.
Nesse sentido, aceitar significa confirmar a transmissão da herança.
O art. 1.804/CC diz que aceita a herança, a transmissão ao herdeiro torna-se definitiva.
Por outro lado, não haverá a transmissão quando há renúncia à herança feita pelo
herdeiro.
A aceitação pode assumir diferentes formas:
• aceitação expressa: ocorre quando o herdeiro ou testamenteiro faz uma
declaração expressa de que aceita a herança;
• aceitação tácita: pode ser que o herdeiro ou testamenteiro não faça essa
declaração expressa no sentido de aceitar a herança, mas atue, no mundo dos
fatos, como se herdeiro fosse. Assim, a aceitação tácita decorre da prática de
atos próprios da qualidade de herdeiro;
• aceitação presumida: o art. 1.807/CC diz que o interessado em que o herdeiro
declare se aceita, ou não, a herança, poderá, 20 dias após a abertura da
sucessão, requerer ao juiz que num prazo razoável, não superior a 30 dias,
venha nele a se manifestar o herdeiro sobre a aceitação ou não da herança.
Neste caso, o silêncio importa em aceitação.
Quando a hipótese for de renúncia à herança, ela deverá ser expressa e constar de
escritura pública ou termo judicial, lembrando que, como visto, a herança é considerada bem
imóvel, e, como tal, a transferência depende de forma especial.
Existem duas modalidades de renúncia à herança:
• renúncia abdicativa: é aquela em que o herdeiro, não querendo a herança, dela
abre mão em favor do monte, ou seja, favorecendo todos os demais coerdeiros.
Nesse caso, não existe a incidência do ITBI contra o renunciante;
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• renúncia translativa: nessa hipótese, o herdeiro, não pretendendo a herança,
cede os seus direitos em favor de determinada pessoa, incidindo o ITBI neste
caso.
O art. 1.808/CC estabelece que não se pode aceitar ou renunciar a herança em partes,
de forma fracionada (Ex.: não há como aceitar apenas o ativo e recusar o passivo), bem como
não se pode aceitar ou recusar herança sob condição ou a termo (Ex.: aceita a herança se tiver
um filho nos próximos 2 anos).
Existe exceção à regra sobre impossibilidade de fracionamento na aceitação, senão
vejamos:
- O §1º do art. 1.808 diz que o herdeiro, a quem se testarem legados, pode aceitar o
legado e renunciar a herança, ou mesmo aceitar a herança e renunciar o legado.
- O §2º diz que o herdeiro, chamado na mesma sucessão a mais de um quinhão
hereditário, sob títulos sucessórios diversos, pode livremente deliberar quanto aos
quinhões que aceita e aos que renuncia.
Tanto a aceitação e como a renúncia são atos irrevogáveis (art. 1.812) do Código Civil.
O principal efeito da renúncia está no art. 1.810/CC, que estabelece que, na sucessão
legítima, a parte do renunciante vai acrescer aos outros herdeiros da mesma classe. Se ele for o
único herdeiro da classe, será devolvida aos da classe subsequente.
Exemplificando, pensemos a hipótese de Maria, solteira, sem descendentes ou
ascendentes, que falece deixando três irmãos: João, Pedro e José. Nessa hipótese, caso Pedro
renuncie a sua parte na herança, será redistribuída sua parte para os outros dois irmãos. Se
todos os irmãos renunciarem as suas respectivas partes, serão chamados os sobrinhos, que
integram a próxima classe.
A renúncia gera um tratamento ao renunciante como se ele nunca tivesse existido como
pessoa (relativamente aos bens da herança). Logo, quando há renúncia, os herdeiros do
renunciante não podem exercer o direito de representação, pois para a herança, é como se o
renunciante nunca tivesse existido. Se nunca existiu, seus herdeiros não o representam. Com
isso, se Pedro renuncia à herança, seus filhos não podem representá-lo. Isso porque para a
herança passar aos seus filhos, ainda que por direito de representação, seria necessário que ele
tivesse existido e morrido (e para a herança, aquele que renuncia é considerado como se nunca
tivesse existido). Feita a renúncia, aquele que renunciou é apagado como se nunca tivesse
existido. Os bens passam, então, para os demais herdeiros de mesma classe
Se o renunciante for o único legitimado de sua classe, ou se todos de uma mesma classe
renunciarem à herança, vem a sucessão por direito próprio, vindo a sucessão por cabeça da
classe subsequente. Ex.: na hipótese narrada, se todos os irmãos de Maria renunciarem a
herança, os sobrinhos de Maria herdarão por direito próprio.
Na hipótese de um herdeiro renunciar à herança, prejudicando terceiro que é seu
credor, esse credor prejudicado poderá, com autorização judicial, aceitar a herança em nome
daquele que havia renunciado. É o que dispõe o artigo 1.813 do Código Civil, que visa evitar
fraudes. Haverá, na hipótese, habilitação do credor no inventário.
Pagas as dívidas do renunciante aos seus credores habilitados no inventário, prevalecerá
a renúncia quanto ao remanescente, lembrando que a renúncia é irrevogável.
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2.5. EXCLUÍDOS DA SUCESSÃO: INDIGNIDADE SUCESSÓRIA E DESERDAÇÃO
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Temos, assim, que a deserdação, repita-se, é instituto próprio para afastar herdeiros
necessários, que seriam beneficiados pela legítima, da sucessão. Essa exclusão somente pode
ser feita por meio de testamento, com expressa menção da causa.
O artigo 1.814, do CC, traz hipóteses indignidade sucessória, quais sejam:
- herdeiros que tenham sido autores, coautores ou partícipes de um homicídio doloso
ou de tentativa de homicídio de cuja pessoa sucessão se tratar, ou então de seu cônjuge,
companheiro, ascendente ou descendente;
- herdeiro que tiver acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou o herdeiro
que incorrer em crime contra a honra do autor da herança, do seu cônjuge ou
companheiro;
- herdeiros que, por violência ou por meio fraudulento, tiver inibido ou obstado o autor
da herança a dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.
Já os artigos 1.962 e 1.963 do CC trazem hipóteses que poderão ser indicadas pelo autor
da herança para exclusão do herdeiro necessário da sucessão. São hipóteses que autorizam a
deserdação dos descendentes por seus ascendentes ou ascendentes por seus descendentes:
- quando houver a prática de ofensa física a essas pessoas;
- quando houver injúria grave entre essas pessoas;
- quando houver relações ilícitas com madrasta, padrasto, companheiro, esposa, do filho
ou do neto;
- quando houver o desamparo praticado por essas pessoas, em decorrência de uma
alienação mental ou de grave enfermidade do prejudicado.
As hipóteses elencadas no art. 1.814 do CC podem ser indicadas no testamento para
deserdação dos herdeiros necessários, mas as hipóteses de deserdação indicadas nos arts. 1.962
e 1.963 do CC não se aplicam à indignidade sucessória.
Ao herdeiro instituído, ou a quem aproveite essa deserdação, vai incumbir o ônus de
provar a veracidade da causa que foi alegada pelo testador para confirmar a deserdação na ação
de confirmação de deserdação. A deserdação deve necessariamente ser confirmada em juízo.
O prazo decadencial para essa ação de confirmação é de 4 anos, a contar da abertura
do testamento.
Em relação à indignidade, o art. 1.816 do CC estabelece que são pessoais os efeitos da
exclusão. Isto significa que os descendentes do herdeiro excluído vão sucedê-lo, como se ele
estivesse morto antes da abertura da sucessão.
Isto também acontecerá se os filhos forem menores, mas, nesse caso, o excluído da
herança não terá direito ao usufruto dos bens recebidos na herança, tampouco direito à
sucessão eventual desses bens, caso um de seus filhos venha a morrer.
Essa regra também será aplicada ao caso de deserdação.
Vale ressaltar que são válidas as alienações onerosas e os atos de administração
praticados pelo herdeiro antes da sentença que o excluiu da qualidade de herdeiro, tutelando-
se, assim, a boa-fé de terceiros.
Admite-se ainda a reabilitação do indigno por força de testamento ou por outro ato
autêntico, evidenciando-se o perdão pelo autor da herança.
O art. 1.818 do Código Civil prevê a reabilitação tácita, a qual se dá quando o autor da
herança contempla o indigno como testamenteiro, quando ele já conhecia a causa dessa
indignidade.
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2.6. AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA
A ação de petição de herança é o meio pelo qual a pessoa pode reclamar sua condição
de herdeiro. Trata-se, portanto, de ação que tem por escopo ver-se reconhecido como herdeiro
para participação na sucessão por morte de alguém. Essa ação pode ser promovida mesmo
quando já tenha havido a efetiva divisão dos bens deixados pela morte do autor da herança. A
ação de petição de herança destina-se, então, ao reconhecimento da qualidade sucessória de
quem a intenta. Tem por escopo o reconhecimento de um status, do qual deriva a aquisição da
herança.
Estabelece o artigo 1.824/CC que “o herdeiro pode, em ação de petição de herança,
demandar o reconhecimento de seu direito sucessório, para obter a restituição da herança, ou
de parte dela, contra quem, na qualidade de herdeiro, ou mesmo sem título, a possua”.
Acrescenta o art. 1.825/CC, que essa ação de petição de herança, ainda que exercida
por um só dos herdeiros, poderá compreender todos os bens hereditários.
Diz o artigo 1.827/CC que o herdeiro pode demandar os bens da herança, mesmo em
poder de terceiros, sem prejuízo da responsabilidade do possuidor originário pelo valor dos bens
alienados. E isso decorre do fato de a herança ser bem imóvel para os efeitos legais, de modo
que a ação, na hipótese, tem natureza real, permitindo que o herdeiro demande os bens mesmo
que estejam em poder de terceiros.
A regra, então, é a possibilidade de o herdeiro real (reconhecido como tal na ação de
petição de herança) buscar os bens da sucessão em poder de quem quer que estejam, inclusive
de terceiros. Porém, a própria legislação faz ressalva à hipótese do terceiro de boa-fé que tenha
adquirido o bem a título oneroso (art. 1.827, parágrafo único, CC). Nesse caso, são eficazes as
alienações feitas, a título oneroso, pelo herdeiro aparente a terceiro de boa-fé. Em outras
palavras, se a pessoa que detinha a posse da herança for um herdeiro aparente, os atos que este
praticou a título oneroso e de boa-fé são considerados válidos e eficazes. Aplica-se, aqui, a teoria
da aparência, pela qual há que se reconhecer válido e eficaz o ato praticado por aquele que
aparentava ser o detentor do direito. A alternativa que resta ao herdeiro real (reconhecido como
tal na ação de petição de herança) é pleitear do herdeiro aparente o que recebeu da venda do
bem para o terceiro de boa-fé.
A ação de petição de herança está sujeita ao prazo prescricional de 10 anos.
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL. DIREITO CIVIL. TERMO INICIAL DO PRAZO
PRESCRICIONAL DA AÇÃO DE PETIÇÃO DE HERANÇA EM RECONHECIMENTO
PÓSTUMO DE PATERNIDADE. Na hipótese em que
ação de investigação de paternidade post mortem tenha sido ajuizada após o
trânsito em julgado da decisão de partilha de bens deixados pelo de cujus, o termo
inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de petição de herança é a
data do trânsito em julgado da decisão que reconheceu a paternidade, e não o
trânsito em julgado da sentença que julgou a ação de inventário. A petição de
herança, objeto dos arts. 1.824 a 1.828 do CC, é ação a ser proposta por herdeiro
para o reconhecimento de direito sucessório ou a restituição da
universalidade de bens ou de quota ideal da herança da qual não participou. Trata-
se de ação fundamental para que um herdeiro preterido possa reivindicar a
totalidade ou parte do acervo hereditário, sendo movida em desfavor do detentor
da herança, de modo que seja promovida nova partilha dos bens. A teor do que
447
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dispõe o art. 189 do CC, a fluência do prazo prescricional, mais propriamente no
tocante ao direito de ação, somente surge quando há violação do direito subjetivo
alegado. Assim, conforme entendimento doutrinário, não há falar em petição de
herança enquanto não se der a confirmação da paternidade. Dessa forma, conclui-
se que o termo inicial para o ajuizamento da ação de petição de herança é a data do
trânsito em julgado da ação de investigação de paternidade, quando, em síntese,
confirma-se a condição de herdeiro. REsp 1.475.759-DF, Rel. Min. João
Otávio de Noronha, julgado em 17/5/2016, DJe 20/5/2016. (INF. 583)
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da indignidade, não comportar interpretação extensiva, o desamparo à pessoa
alienada mentalmente ou com grave enfermidade comprovados (arts. 1.744, V, e
1.745, IV, ambos do CC) redunda em atentado à vida a evidenciar
flagrante indignidade, o que leva à exclusão da mulher da sucessão
testamentária. REsp 334.773-RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 21/5/2002.
(INF. 135)
3. SUCESSÃO LEGÍTIMA
Como foi visto em tópico anterior, com a morte de alguém, há imediata transmissão dos
bens para os sucessores, conforme aplicação do princípio de saisine. Pela sucessão legítima,
também denominada sucessão ab intestato (sem testamento), ocorre a transmissão causa
mortis do autor da herança aos herdeiros indicados em lei. A indicação é feita por classes, por
meio da vocação hereditária, estabelecendo-se, como já visto, uma ordem preferencial, de
modo que a classe mais próxima exclui a classe mais remota.
Nessa ordem preferencial, é sempre bom lembrar as decisões do STF que estabeleceram
total equiparação do cônjuge e companheiro, inclusive para fins de sucessão (RE 646.721-RS e
RE 878.694-MG).
O art. 1.829 do CC diz que a sucessão será deferida na seguinte ordem:
- aos descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se esse cônjuge
estivesse casado com o falecido em comunhão universal de bens ou no regime de
separação obrigatória de bens, ou no de comunhão parcial de bens e o autor da herança
não tiver deixado bens particulares;
- aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
- ao cônjuge sobrevivente;
- aos colaterais.
Em que se lê “cônjuge”, leia-se sempre “e companheiro”, interpretando-se o dispositivo
conforme a Constituição Federal.
Relembrando que, havendo herdeiros necessários, obrigatoriamente teremos a
sucessão legítima. É que, como vimos, morrendo uma pessoa e deixando herdeiros ditos
necessários, é obrigatória a reserva da legítima, não podendo o autor da herança dispor de todos
os bens por testamento. Como não pode dispor da legítima, ao menos metade de seus bens será
objeto da sucessão conforme disposição legal que estabelece uma ordem a ser observada
(vocação hereditária). Trata-se, então, de sucessão legítima que pode coexistir com a sucessão
testamentária (no caso do autor da herança, tendo herdeiros necessários, dispor de metade de
seus bens por testamento).
Na sucessão legal, a regra é que a existência de herdeiros de uma classe afasta os da
classe subsequente. É importante destacar que temos que analisar, num primeiro momento, as
classes de herdeiros, dispostas na forma do artigo 1.829/CC, ou seja, primeiro os descendentes
em concorrência com o cônjuge ou companheiro; depois dos ascendentes em concorrência com
o cônjuge e o companheiro; depois o cônjuge ou companheiro sobrevivente e por fim os
colaterais.
Todavia, mesmo na mesma classe, temos também uma ordem que se refere ao grau de
parentesco, de forma que, os mais próximos afastam os mais distantes. Assim, na classe dos
descendentes, a existência de filhos afasta, como regra geral, a concorrência dos netos.
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Fala-se em regra geral porque, conforme veremos, é possível que ocorra o direito de
representação, hipótese em que um herdeiro com grau de parentesco mais afastado representa
um herdeiro pré-morto, concorrendo com herdeiros que não têm o mesmo grau de parentesco
que ele.
Ex.: João, viúvo, pai de Pedro e José, falece. Ocorre que José, pai de Henrique, já era pré-
morto quando do falecimento de João. Nesse caso, com a morte de João, são chamados, na
ordem de vocação hereditária, primeiro seus descendentes. Na hipótese, os descendentes mais
próximo são os filhos, o que afasta os de grau mais afastados (netos). Porém, como José era pré-
morto, seu filho o representará, concorrendo com o tio Pedro. Se Pedro tiver filhos, esses não
participarão da sucessão de João, pois são netos e por isso afastados em razão da existência de
herdeiros mais próximos. A exceção ocorre, no caso, em decorrência do direito de
representação. Henrique sucederá por representação e não por direito próprio.
Ressalte-se que a concorrência do cônjuge e companheiro com os herdeiros de cada
ordem será estudada em tópico próprio.
450
453
Exemplificando a hipótese: João, casado com Maria pelo regime da comunhão parcial
de bens, tinha com esta 3 filhos comuns. Com o falecimento de João, no tocante aos bens
particulares deixados por ele, Maria concorre em igualdade de condições com os descendentes,
por cabeça. Nesse caso, está assegurado a Maria ¼, como decorrência da divisão desses bens
por 4 (ela e os três filhos).
Agora, supondo que João tenha quatro filhos com Maria. Nesse caso, no tocante aos
bens particulares de João, Maria concorrerá por cabeça com os filhos, mas terá direito a 25%
(1/4), devendo os outros 4 dividirem os 75% remanescentes. Isto porque, conforme previsão
expressa em lei, o cônjuge, quando concorre na herança, tem garantido ¼ quando for
ascendente de todos os filhos do casal.
Imaginemos, entretanto, que Maria não seja ascendente de todos os filhos deixados
pelo falecido. Nesse caso, ela receberá em igualdade de condições, mas não existirá o resguardo
de ¼ da herança, no tocante aos bens particulares.
Situação mais complexa e que gera maior debate na doutrina ocorre quando há a
denominada sucessão híbrida, situação em que o cônjuge ou companheiro concorre com filhos
comuns e filhos exclusivos do falecido. Neste caso, questiona-se, então, se há o resguardado ¼
da herança.
Sobre esse tema, temos duas posições. Uma primeira, majoritária, entende que se
houver a sucessão híbrida, não se deverá fazer a reserva da ¼ da herança. Ex.: se houver 5 filhos,
3 do segundo casamento e 2 do primeiro casamento, mais o cônjuge, a herança deveria ser
dividida igualmente por 6, sem resguardo de ¼ para o cônjuge ou companheiro.
Uma segunda posição, minoritária, entende que neste caso deveria ser feita a reserva
da ¼ ao cônjuge sobrevivente, porquanto há concorrência do cônjuge ou companheiro com
filhos comuns. Para essa corrente, só seria afastada a garantia do mínimo de ¼ quando não
houvesse nenhum filho comum.
Em relação aos descendentes, o descendente de grau mais próximo excluirá o
descendente de grau mais remoto, salvo o direito de representação. Ex.: João, viúvo, deixou 3
filhos, sendo que cada um tem dois filhos (netos de João – no total de 6 netos). João morrendo,
os 3 filhos herdam, e os netos não herdam nada, já que os descendentes de grau mais próximo
(filhos) afastam os de grau mais remoto (netos). Porém, supondo que um dos filhos de João era,
ao tempo da morte de João, pré-morto. Nesse caso, os 2 netos, filhos do filho pré-morto de
João, herdarão por representação e serão considerados conjuntamente para fins de divisão da
herança. Em outras palavras, na hipótese tratada, 1/3 da herança vai para cada um dos filhos
vivos de João, sendo que a parte do filho pré-morto de João será dividida pelos dois netos,
descendentes do pré-morto.
Vê-se, então, que no direito de representação, os herdeiros, todos reunidos,
representarão o herdeiro pré-morto, recebendo o que àquele competiria. Entre os
representantes, será feita a divisão igualitária do montante que caberia ao herdeiro pré-morto.
Assim é que, no caso proposto, os dois netos, conjuntamente, receberão o que competiria ao
filho de João pré-morto (no caso, ele receberia 1/3 da herança, montante esse que será dividido
entre os dois netos, filhos do pré-morto).
3.2.1. DIREITO PRÓPRIO DE SUCESSÃO E DIREITO DE REPRESENTAÇÃO
Como vimos, na sucessão legítima, pode ocorrer o direito de representação quanto aos
descendentes. É importante, então, fazer a correta diferenciação entre a sucessão por direito
próprio e a sucessão por representação.
- sucessão por direito próprio: o sucessor é chamado a receber a herança em razão da
sua qualidade própria de herdeiro, concorrendo apenas com outros herdeiros da mesma
451
454
qualidade ou até não concorrendo com ninguém por ser único da qualidade preferencial
chamada a suceder. O chamamento é, dessa forma, direto ou por direito próprio.
Na sucessão legítima, vimos que a regra é o recebimento da herança por direito próprio,
de forma que a lei fala que, morrendo alguém, primeiro serão chamados a suceder os
descendentes, sendo que os de grau mais próximo afastam os de grau mais remoto.
Exemplificando, se uma pessoa morre deixando cinco filhos, estes receberão por direito próprio
ou por cabeça. Nesse tipo de sucessão, a divisão se fará, então, de forma igualitária, cada um
recebendo um quinhão igual ao outro herdeiro de mesma qualidade.
É de se considerar apenas a possibilidade de o cônjuge ou companheiro, conforme
vimos, concorrer com os descendentes ou ascendentes na sucessão, hipóteses em que, embora
herdem, no caso, também por direito próprio, a legislação prevê que receberão quinhão
diferenciado. Essa situação configura exceção à regra de que os herdeiros por direito próprio
receberão todos o mesmo quinhão.
Em linhas gerais, temos que a partilha da herança por cabeça ou direito próprio será
feita em partes iguais entre os herdeiros de uma mesma classe, com a ressalva da possibilidade
de concorrência do cônjuge ou companheiro.
Veremos que, na classe dos ascendentes, ocorre a chamada sucessão por linhas, na qual
os sucessores herdam por direito próprio, mas os valores são divididos em linhas e não
propriamente por cabeça. Tal ocorre quando uma pessoa morre sem deixar descendentes. Em
sendo assim, serão chamados os ascendentes.
Suponhamos que o falecido tenha deixado apenas dois avós paternos e um materno. No
caso, estão todos os avós no mesmo grau, mas em linhas diferentes. Divide-se, então, a herança
pelas duas linhas, na proporção de 50% para cada linha. Como a linha materna só tem um avô,
esse receberá a totalidade que coube à linha materna (50% do valor total da herança). Já na
linha paterna, há dois sucessores, de modo que cada um ficará com 50% do que coube à linha
paterna. Cada um terá, dessa forma, direito a 25% do valor total da herança.
Observe que somente haverá a divisão por linhas se houver ascendentes do mesmo grau
em linhas diferentes (art. 1.836/CC), porque se os graus forem diversos, aplicável a regra de que
o grau mais próximo afasta o grau mais remoto (art. 1.836, § 2º/CC).
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455
Ainda sobre esse direito, a regra é que a representação ocorre quando o representado
é pré-morto, mas pode ocorrer a representação de pessoa viva na hipótese do representado ser
considerado indigno (art. 1.816, CC).
Em resumo, podemos dividir o direito de representação da seguinte forma:
- linha reta descendente: na linha reta, vimos que os parentes mais próximos afastam
os mais distantes. Porém, a legislação prevê a possibilidade da representação entre
descendentes, de forma que, por exemplo, filhos do falecido poderão concorrer com os
netos, quando estes estiverem representando um filho do falecido pré-morto. Na linha
ascendente, não há o direito de representação.
- linha colateral ou transversal: na linha colateral, a legislação prevê a possibilidade de
representação, porém somente em relação aos filhos do irmão falecido, quando
concorrerem com outros irmãos do autor da herança. Quanto aos demais colaterais,
não há o direito de representação.
O direito de representação é concedido aos filhos de herdeiro pré-morto.
Uma discussão importante quanto ao direito de representação refere-se à hipótese de
comoriência. Em outras palavras, discute-se se a sua aplicação na hipótese do herdeiro falecer
em situação de comoriência com o autor da herança. Como ficaria a situação? Exemplificando,
se João morre por ocasião de um acidente, juntamente com seu filho Pedro, não se podendo
estabelecer qual morte precedeu a outra. A hipótese é, então, de comoriência. No caso, os filhos
de Pedro o representariam, nesse caso, quanto aos bens de João?
O entendimento predominante tem sido em sentido positivo. A jurisprudência tem se
manifestado nesse sentido em conceder aos filhos dos que morreram em comoriência o direito
de sucessão por representação.
Sobre o tema, a VII Jornada de Direito Civil/CJF, em 2015, entendeu que também nos
casos de comoriência entre ascendentes e descendentes, ou entre irmãos, reconhece-se o
direito de representação aos descendentes e aos filhos dos irmãos (Enunciado n. 610).
Ainda em relação ao direito de representação, o art. 1.856/CC estabelece que o
renunciante à herança de uma pessoa pode representá-la na sucessão de outra. Exemplificando,
José, viúvo, é pai de João, Pedro e Antonio. Antonio, por sua vez, tem duas filhas. Imaginemos
que Antonio morra e suas filhas renunciem à herança por ele deixada. Nesse caso, quando da
morte de José, as filhas de Antonio poderão exercer o direito de representação, representando
o pai pré-morto na sucessão dos bens de José. No caso, mesmo tendo renunciado à herança
deixada por Antonio, poderão representá-lo quando do falecimento de José, recebendo, por
direito de representação, o quinhão que caberia a Antonio. Na situação narrada, a herança será
repartida inicialmente em três quinhões, ou seja, entre os filhos vivos de José e o quinhão do
filho pré-morto, sendo este último repartido entre as duas filhas de Antonio.
O art. 1.829, no inciso II do CC diz que na falta de descendentes são chamados para
suceder os ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, sem haver qualquer
ressalva com relação ao regime de bens.
Veja, os ascendentes são herdeiros de 2ª classe, pois só são chamados a suceder quando
os de 1ª classe faltarem.
Com relação à concorrência dos ascendentes com o cônjuge sobrevivente, não há
nenhuma ressalva da legislação quanto ao regime de bens, o que indica que ele é absolutamente
indiferente, pois concorrerá da mesma forma.
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456
Igualmente como ocorre com os descendentes, os ascendentes de grau mais próximo
excluem o de grau mais remoto. Na sucessão dos ascendentes, não há a denominada sucessão
por representação. Em sendo assim, sempre os parentes ascendentes mais próximos excluirão
os mais remotos.
Exemplificando, João, solteiro e sem filhos, morreu sem deixar quaisquer descendentes,
mas com os dois avós paternos vivos e uma bisavó materna também viva. Neste caso, a bisavó
não herdará por estirpe para representar a avó materna de João. Os parentes de grau mais
próximo, neste caso, são os avós paternos, o que afasta a bisavó materna da sucessão de João.
Assim, somente os avós paternos receberão a herança, pois não se vislumbra a representação
na sucessão dos ascendentes, de forma que a bisavó não poderá representar avó pré-morta.
Se houver igualdade em graus e diversidade em linhas, os ascendentes da linha paterna
irão receber metade e os da linha materna receberão a outra metade (art. 1.836). Ex.: João,
solteiro e sem descendentes, morreu, deixando avós maternos e um avô paterno. Nesta
hipótese, 50% vai para o avô paterno e 50% vai para os avós maternos.
O art. 1.837/CC diz que, concorrendo o cônjuge com dois ascendentes de 1º grau (pai e
mãe), terá o cônjuge (ou companheiro de acordo com interpretação constitucional) direito a 1/3
da herança. Concorrendo o cônjuge (ou companheiro de acordo com interpretação
constitucional) com somente um ascendente de 1º grau, ou com ascendentes de grau diversos,
terá ele direito a metade da herança. Ex.: João morre e deixa pai, mãe e esposa, cada um
receberá 1/3. Se, entretanto, João morre e deixa mãe e esposa, cada uma receberá metade. Se,
por fim, João morre e deixa avô e avó (paternos) e esposa, esta receberá metade e a outra
metade será dividia entre os demais.
no remanso de sua linguagem uma tormenta sem precedentes para o Direito das
Sucessões, que há anos jazia sob certezas cristalinas e quase aritméticas, alheio às
polêmicas e mudanças que se operavam, de um modo geral, no Direito Civil. O
mencionado artigo 1.830 do novo Código Civil, objeto da presente reflexão, cuida de
especificar as condições ou requisitos para que ao cônjuge supérstite seja
reconhecido o direito sucessório. Para suceder, o cônjuge não pode, à época da
abertura da sucessão: (i) estar separado judicialmente; (ii) estar separado de fato há
mais de dois anos. Todavia, o codificador consignou uma exceção ao final do artigo
em comento: "...salvo prova, neste caso, (estar separado de fato há mais de dois
anos), de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.Não
é necessária muita imaginação para antever o desencadeamento de controvérsias
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que tal disposição legal irá gerar. A realidade das famílias brasileiras é pródiga em
casos de separações de fato, seguidas de novas uniões informais, que se tornam
estáveis. Nessas circunstâncias, as consequências jurídicas que advirão da aplicação
do disposto no art. 1.830 do novo Código Civil são, no mínimo, preocupantes.
cumpre, ainda, registrar que constitui indiscutível contra-senso o que fez o legislador
ao excepcionar: "salvo prova, neste caso (separação de fato há mais de dois anos),
de que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente."
Consagrou um kafkiano absurdo: a presunção da culpa. Ao que se infere da leitura
do texto, o ônus da prova é imputado ao cônjuge que se pretende herdeiro. Se
separado de fato do de cujus há mais de dois anos, a lei presume que ele foi o culpado
da separação e atribui-lhe o ônus de provar que a convivência com o falecido,
tornou-se impossível sem sua culpa. O que ocorreu, nesse caso, foi uma inaceitável
inversão do princípio da presunção da inocência, um dos fundamentos do Estado
Democrático de Direito.
o art. 1.830 do Código Civil passa a incidir também para as hipóteses fáticas relativas
à união estável, diante da recente decisão do Supremo Tribunal Federal, de
equiparação sucessória das entidades familiares (Informativo n. 864 da Corte).
Assim, deve-se considerar, em vez do divórcio ou da separação de direito, a
dissolução da união estável, que pode ser feita de forma judicial ou extrajudicial,
litigiosa ou consensual, conforme o tratamento que consta do Código de Processo
Civil de 2015 (arts. 693 a 699; 731 a 733). Também nos casos de união estável deve-
se considerar que a separação de fato do casal põe fim ao relacionamento e afasta
o direito sucessório do companheiro, na mesma linha da leitura idealizada que aqui
propusemos, seguindo farta doutrina (TARTUCE, 2020, p. 2248).
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458
funda-se na ideia da dignidade da pessoa humana que deve ser considerada inclusive quanto ao
patrimônio mínimo que uma pessoa necessita para ter uma vida digna.
Sobre esse direito, o STJ já entendeu, também, que o direito real de habitação é
conferido por lei, independentemente de o cônjuge ou companheiro sobrevivente ser
proprietário de outros imóveis (REsp 1.249.227/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em
17/12/2013, DJe 25/3/2014).
Para maioria da doutrina, o direito real de habitação consubstancia um direito
personalíssimo, voltado para a pessoa do cônjuge sobrevivente (e companheiro conforme
interpretação conforme a CF), de forma que esse titular não pode valer-se desse direito quando
empresta ou aluga o imóvel para terceiro.
Consoante esse entendimento, então, o direito real de habitação é o direito para
habitar, não podendo, em tese, alugar o imóvel, ceder em comodato, etc.
Entretanto, Flávio Tartuce, apresentando posição diferente, esclarece que pode haver
a quebra dessa regra
aplicando-se a ponderação a favor da moradia. Vale lembrar, mais uma vez, que a
técnica da ponderação está prevista no art. 489, § 2.º, do CPC/2015. E, conforme
Enunciado n. 17 do IBDFAM, aprovado no seu X Congresso Brasileiro, em 2015, “a
técnica de ponderação, adotada expressamente pelo art. 489, § 2.º, do Novo CPC, é
meio adequado para a solução de problemas práticos atinentes ao Direito das
Famílias e das Sucessões (TARTUCE, 2020, p. 2249).
Para o autor, então, poder-se-ia entender como direito real de habitação a utilização do
imóvel dado em aluguel para, com o dinheiro obtido, alugar outro de menor tamanho, que
atenda às efetivas necessidades do cônjuge (ou companheiro) sobrevivente. Para alcançar esse
resultado, o autor aplica a técnica de ponderação a favor da moradia. Entretanto, é o próprio
autor quem indica recente julgado do STJ, no qual entende que não se deve reconhecer o direito
real de habitação quando o imóvel estiver locado ou cedido em comodato a terceiros (STJ, REsp
1.654.060/RJ, 3.ª Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 02.10.2018, DJe 04.10.2018).
Ainda sobre o direito do cônjuge sobrevivente à participação na sucessão, importante
destacar os julgados do STF que entenderam pela total igualdade de tratamento em relação ao
companheiro (RE 646.721-RS e RE 878.694-MG, julgados publicados no informativo 864/STF).
Essa plena igualdade de tratamento tem aplicação também no que diz respeito ao direito real
de habitação. O STJ já vinha reconhecendo esse direito e agora, com as decisões do STF, fica
mais clara a plena equiparação entre os direitos dos cônjuges e dos companheiros.
O enunciado 117 do CJF diz que o direito real de habitação deve ser estendido ao
companheiro em razão da interpretação analógica do art. 1.831 do CC. Embora o enunciado diga
que se trata de interpretação analógica, entendemos que a hipótese é de analogia, forma de
colmatação da norma, de integração do sistema.
Percebam que todas as regras aplicáveis ao cônjuge foram estendidas ao companheiro,
de modo que o art. 1.790 do CC, que estabelecia regramento diferenciado na sucessão do
companheiro, foi tido como inconstitucional.
Com o entendimento do STF acerca da inconstitucionalidade do artigo 1.790/CC (ver RE
878.694), é de se concluir que é aplicado ao companheiro, portanto, o mesmo regime sucessório
dos cônjuges.
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3.5. SUCESSÃO DOS COLATERAIS
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. Direito das sucessões. Direito real de habitação. Art. 1.831
do Código Civil. União estável reconhecida. Companheiro sobrevivente. Patrimônio.
Inexistência de outros bens. Irrelevância. O reconhecimento do direito real
de habitação, a que se refere o artigo 1.831 do Código Civil, não pressupõe a
inexistência de outros bens no patrimônio do cônjuge/companheiro sobrevivente.
Registre-se inicialmente que o art. 1.831 do Código Civil e o art. 7º da Lei n.
9.278/1996 impôs como a única condição para garantia do cônjuge sobrevivente
ao direito real de habitação é que o imóvel destinado à residência do casal fosse o
único daquela natureza a inventariar, ou seja, que dentro do acervo hereditário
deixado pelo falecido não existam múltiplos imóveis destinados a fins residenciais.
Nenhum dos mencionados dispositivos legais impõe como requisito para o
reconhecimento do direito real de habitação a inexistência de outros bens,
seja de que natureza for, no patrimônio próprio do cônjuge sobrevivente. Não é por
outro motivo que a Quarta Turma, debruçando-se sobre controvérsia semelhante,
entendeu que o direito real de habitação é conferido por lei,
independentemente de o cônjuge ou companheiro sobrevivente ser
proprietário de outros imóveis (REsp 1.249.227/SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 17/12/2013, DJe 25/3/2014). Com efeito, o objetivo da lei é permitir que
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460
o cônjuge sobrevivente permaneça no mesmo imóvel familiar que residia ao tempo
da abertura da sucessão como forma, não apenas de concretizar
o direito constitucional à moradia, mas também por razões de ordem humanitária e
social, já que não se pode negar a existência de vínculo afetivo e psicológico
estabelecido pelos cônjuges com o imóvel em que, no transcurso de sua convivência,
constituíram não somente residência, mas um lar. Além disso, a norma protetiva é
corolário dos princípios da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar
que tutela o interesse mínimo de pessoa que, em regra, já se encontra em idade
avançada e vive momento de inconteste abalo resultante da perda do consorte.
REsp 1.582.178-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por maioria, julgado em
11/09/2018, DJe 14/09/2018 (INF. 633).
458
461
4. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA
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Daniel Carnacchioni nos alerta para o fato de ao testamento, como negócio jurídico que
é, ter aplicação a teoria do negócio jurídico em relação aos pressupostos de existência e validade
e também, sob alguns aspectos regras sobre obrigações e direitos reais (CARNACCHIONI, 2018,
p. 1689).
São características do testamento:
- aperfeiçoa-se com uma única manifestação de vontade, e a renúncia ou a aceitação da
herança é irrelevante do ponto de vista jurídico para validade do testamento;
- o testamento é um negócio jurídico gratuito, pois o testador não aufere qualquer
vantagem;
- é um negócio mortis causa, pois somente produz efeitos após a morte;
- é revogável, pois o testador poderá modificá-lo ou revogá-lo a qualquer tempo. Por
outro lado, a despeito de ser revogável, o reconhecimento de filho irrevogável. Em sendo assim,
quando há reconhecimento de filho em um testamento, ainda que o testamento seja, por
qualquer motivo, revogado, persiste o reconhecimento nele constante;
- é vedado o testamento conjuntivo, sendo nulo e vedado por lei o testamento por meio
de mais de uma pessoa conjuntamente;
- toda pessoa capaz poderá dispor por testamento da totalidade de seus bens para
depois da morte (lembrando que se houver herdeiros necessários, essa disposição se limitará à
metade da herança). Como dito, o testamento segue, em linhas gerais, os pressupostos dos
negócios jurídicos. Em relação ao plano da validade, especificamente quanto à capacidade do
testador, a lei não permite que menores de 16 anos (absolutamente incapazes) testem e o art.
1.860/CC diz que também não podem testar as pessoas que no ato de fazer o testamento não
estiverem no pleno discernimento (Ex.: bêbado, drogas, etc.). Quanto ao maior de 16 anos e
menor de 18 anos (relativamente incapaz), entretanto, a lei estabelece expressamente que eles
podem testar, mesmo sem assistência. É o que diz expressamente o artigo 1.860/CC.
Com a Lei nº 11.346/2015, tivemos uma grande alteração quanto à teoria das
incapacidades. A partir dessa legislação, em consonância com pactos internacionais de que o
Brasil é signatário, somente os menores de 16 anos são considerados absolutamente incapazes.
Além dessa incapacidade absoluta, o artigo 4º prevê quem são os relativamente incapazes.
Vimos que daqueles elencados no artigo 4º, o Código Civil faz expressa menção à possibilidade
de o maior de 16 e menor de 18 anos testar, mesmo sem assistência. Quanto aos demais ali
elencados, surge o questionamento sobre a possibilidade de exercício do direito de testar.
Daniel Carnacchioni, ao tratar do tema, diz que
os incapazes não podem testar (art. 1.860, caput, CC). Mas quem é considerado
incapaz para o testamento? Incapazes são os menores de 16 anos, atualmente os
únicos absolutamente incapazes (art. 3º do CC), assim, como todos os arrolados no
art. 4º do CC (pródigos, aqueles que por causa permanente ou transitória não podem
exprimir vontade, os ébrios habituais e viciados em tóxicos), que são relativamente
incapazes. Tais pessoas, por não terem o pleno discernimento, não possuem
capacidade testamentária ativa (art. 1.860 do CC) (CARNACCHIONI, 2018, p. 1.689).
Daí se concluir que os absolutamente incapazes não podem testar (menores de 16 anos).
Quanto aos relativamente incapazes, tratando-se de incapacidade decorrente da idade (maiores
de 16 e menores de 18 não emancipados), poderão testar mesmo sem assistência, por expressa
previsão legal. Os demais relativamente incapazes entram na regra geral de impossibilidade de
testar.
460
463
Remanesce, ainda, dúvida quanto àquelas pessoas que, sendo deficientes, não são
consideradas incapazes.
Como dito, com a Lei nº 11.346/2015, tivemos uma grande alteração quanto à teoria
das incapacidades. Assim, agora, a regra é a plena capacidade, sendo a declaração de
incapacidade relativa sempre excepcional. Consoante a legislação, a incapacidade relativa será
reconhecida judicialmente quando a pessoa tiver comprometido o pleno discernimento por
conta de alguma enfermidade. Daí decorre que a simples deficiência não é suficiente para o
reconhecimento da incapacidade. É preciso que, em razão dessa deficiência, haja
comprometimento do pleno discernimento.
Em sendo assim, uma pessoa deficiente, que não tenha comprometida a plena
capacidade de discernimento, poderá testar.
Questiona-se: e o deficiente que tem o comprometimento do pleno discernimento,
poderá testar?
Respondendo a essa indagação, Daniel Carnacchioni diz que
Por esse entendimento, não fica afastada a possibilidade de o deficiente testar. Se tiver
plena capacidade de discernimento, poderá livremente testar, sem maiores problemas. Se tiver
algum comprometimento, a análise será feita caso a caso, de modo a se perquirir se o
comprometimento da plena capacidade compromete a compreensão do negócio que se
pretende fazer. Se não comprometer, poderá fazê-lo com a participação do curador ou colaborar
que participe da tomada de decisão apoiada.
Esse é ainda um tema bastante novo, em decorrência da mudança relativamente
recente, e ainda suscita muitas discussões não completamente resolvidas pela jurisprudência.
A regra geral a ser observada é a do artigo 1.860 do Código Civil que estabelece que
pode testar quem está em pleno gozo do discernimento.
O art. 1.859/CC diz que se extingue em 5 anos o direito de impugnar a validade do
testamento, contado o prazo da data do seu registro. Este prazo se aplica aos casos de nulidade
relativa e também aos casos de nulidade absoluta.
A capacidade para testar é analisada no momento da manifestação de vontade. Em
sendo assim, se quando da exteriorização de vontade, o testador tinha pleno gozo da capacidade
de discernimento, o testamento será plenamente válido, ainda que em momento posterior, haja
comprometimento desse discernimento. Por outro lado, se há comprometimento do
discernimento por ocasião da exteriorização de vontade, posterior recuperação da plena
capacidade não retroage para tornar válido o testamento.
Quanto à capacidade testamentária passiva, ou seja, relativa a quem pode receber a
herança, tem-se uma amplitude de possibilidades. Conforme estabelece a legislação, além das
pessoas naturais nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão (art. 1.798,
CC), podem ser chamados a suceder, em razão do testamento, a prole eventual, as pessoas
jurídicas e as pessoas jurídicas cuja organização for determinada pelo testador sob a forma de
fundação (art. 1.799, CC).
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Assim, vê que, em relação à capacidade para testar, somente as pessoas naturais
poderão fazê-lo. É assim um instituto que não se aplica às pessoas jurídicas, quanto à capacidade
para testar. Sendo assim, as pessoas jurídicas não podem testar, mas, como vimos, podem ser
beneficiadas por testamento ou legado. Isso significa que não podem testar, mas podem ser
nomeadas herdeiras ou legatárias.
O próprio Código Civil estabelece as modalidades de testamento. Diz o art. 1.862 que
são modalidades ordinárias de testamento:
• testamento público;
• testamento cerrado;
• testamento particular.
a) Testamento público: é aquele lavrado pelo tabelião de notas. Ele recebe as
declarações do testador, observa os requisitos essenciais do art. 1.864/CC e lavra o testamento.
São requisitos para o testamento público:
- testamento deve ser escrito pelo tabelião em seu livro de notas, de acordo com as
declarações do testador;
- o testamento deverá ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a 2 testemunhas
ao mesmo tempo;
- poderá ser lido pelo testador na presença das testemunhas e do oficial (tabelião);
- o instrumento deve ser, em seguida a esta leitura, assinado pelo testador, pelo tabelião
e pelas testemunhas.
A jurisprudência superior tem mitigado a observância desses requisitos formais do
testamento público. De acordo com essa jurisprudência, privilegia-se a vontade do testador, de
modo que, se ficar evidente que a pessoa foi quem efetivamente manifestou a vontade (testou),
ainda que na presença de apenas uma testemunha, poder-se-á mitigar o formalismo para fazer
valer a vontade do testador.
Se o testador não souber ou não puder assinar, neste caso o tabelião irá declarar isso no
instrumento, e, além disso, uma das testemunhas instrumentárias irá assinar pelo testador, a
seu rogo.
Assim, confirma-se a tese pela qual o analfabeto poderá testar por meio de testamento
público, já que quem não souber assinar poderá pedir que uma pessoa assine a seu rogo.
O art. 1.866/CC diz que o indivíduo inteiramente surdo, se souber ler, poderá testar.
Nesses casos, o sujeito irá ler o seu testamento ou, se não souber ler, irá designar alguém que o
leia, presente as testemunhas.
Em relação aos cegos, somente é possível testar por meio do testamento público, caso
em que será lido em voz alta por duas vezes: uma pelo tabelião e outro por uma das
testemunhas (art. 1.867, CC).
Ocorrendo o falecimento do testador, segundo o CPC 2015, qualquer interessado,
exibindo o traslado e a certidão de testamento público, poderá requerer ao juiz que ordene o
cumprimento do testamento.
b) Testamento cerrado: é também chamado de testamento místico, pois não se sabe
qual é o seu conteúdo até que o sujeito morra. Na prática, o testamento cerrado não tem muita
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aplicação. Se é certo que o brasileiro não tem o hábito de fazer testamentos, pode-se dizer que
menos ainda nessa forma cerrada.
O art. 1.868/CC estabelece que o testamento cerrado, escrito pelo testador ou por outra
pessoa, a seu rogo, e assinado pelo testador, será válido se aprovado pelo tabelião ou seu
substituto legal, observadas as formalidades da lei.
São formalidades para o testamento cerrado:
- testamento deve ser escrito pelo próprio testador ou por alguém a seu rogo, mas, de
qualquer forma, assinado pelo testador. Se for redigido mecanicamente, cabe ao testador
rubricar todas as páginas. O artigo 1.870/CC permite que o tabelião escreva o testamento a rogo
do testador e, na sequência, o aprove;
- testador deve entrega o testamento ao tabelião em presença de 2 testemunhas;
- testador deve declarar que aquele é o seu testamento e que quer que seja aprovado;
- tabelião deve lavrar, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas
testemunhas, lendo-o, em seguida, ao testador e testemunhas;
- o auto de aprovação deverá ser assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e pelo
testador.
Após, a legislação estabelece que o tabelião irá cerrar e coser (costurar) o documento
aprovado, tudo isso com 5 pontos de retrós, sendo lacrado nos pontos de costura (art. 1.689). A
jurisprudência, entretanto, tem mitigado essas exigências.
O testamento cerrado poderá ser escrito em língua nacional ou em língua estrangeira
(art. 1.871). Não pode dispor de seus bens no testamento cerrado quem não sabe ler ou
escrever, pois é necessário que o próprio testador escreva o seu testamento ou pelo menos o
assine. Dessa forma, não obstante o analfabeto tenha capacidade ativa testamentária, não
poderá manifestar sua última vontade por esse tipo de testamento.
Quanto ao surdo ou o mudo, poderão fazer o testamento cerrado desde que saibam
escrever.
Após a aprovação e cerrado o testamento, este será entregue ao testador, lançando o
tabelião no seu livro o dia, lugar, hora, ano, etc. em que o testamento foi aprovado e entregue
ao testador.
Quando ocorrer a morte do testador, o testamento cerrado será apresentado ao juiz e
este, constatando que não vício externo que torne o testamento nulo ou suspeito de falsidade,
irá abri-lo, determinando que se registre para que seja cumprido.
Do termo de abertura do testamento, constará o nome de quem apresentou o
testamento cerrado, ainda de forma secreta, e como essa pessoa obteve o testamento.
O Ministério Público será ouvido e, não havendo dúvidas a serem esclarecidas, o juiz
mandará registrar, arquivar e cumprir o testamento. Feito o registro, será intimado o
testamenteiro para que ele venha a assinar o termo da testamentaria.
O art. 1.980/CC estabelece que o testamenteiro é obrigado a cumprir as disposições
testamentárias no prazo marcado pelo testador. Além disso, terá que dar conta do que recebeu
e despendeu, com responsabilidades que perduram durante a execução do testamento.
c) Testamento particular: é também chamado de testamento hológrafo, pois é escrito
pelo próprio testador, sem maiores formalidades. Estabelece o art. 1.876 do CC que o
testamento particular poderá ser escrito de próprio punho ou por processo mecânico. Quando
o testador opta pelo testamento particular escrito de próprio punho, necessariamente o
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testamento deverá ser lido e assinado na presença de, pelo menos, três testemunhas, as quais
também deverão subscrever esse testamento.
Sendo elaborado por um processo mecânico, não poderá conter rasuras e nem espaços
em branco. Da mesma forma, deverá ser assinado pelo testador, após ter sido lido na presença
de ao menos três testemunhas, as quais irão assiná-lo.
A jurisprudência mitiga os rigores formais estabelecidos em lei. A ideia é buscar a real
vontade do testador, a qual, ficando comprovada, deverá ser respeitada com o cumprimento do
testamento. Privilegia-se, então, a vontade do testador em detrimento das formalidades legais.
Falecido o testador, publica-se em juízo o testamento particular, e, na sequência, citam-
se os herdeiros. Caso as testemunhas confirmem a disposição de última vontade ou pelo mesmo
a leitura perante elas, reconhecendo as próprias assinaturas, assim como a do testador, o
testamento será confirmado.
O NCPC estabelece, no art. 737, que a publicação do testamento particular poderá ser
requerida pelo herdeiro, legatário, pelo testamenteiro ou por um terceiro que detenha o
testamento.
O §1º desse dispositivo diz que serão intimados os herdeiros que não tiverem requerido
a publicação do testamento, a fim de que possam ser inquiridos em juízo.
No §2º, o legislador estabelece que se o juiz perceber a presença dos requisitos previstos
em lei, depois de ouvir o MP, vai confirmar o testamento.
O art. 1.878 do Código Civil diz que se as testemunhas forem contestes sobre o fato da
disposição ou sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem essas testemunhas as suas
próprias assinaturas, assim como a assinatura do testador, o testamento será confirmado.
Agora, se faltar uma testemunha porque morreu ou está ausente, mas pelo menos a
que resta reconhecer a sua assinatura do testamento e a assinatura do testador, esse
testamento poderá ser confirmado a critério do juiz se se perceber suficiente a prova da sua
veracidade.
Assim, ainda que falte uma testemunha, por morte ou outro motivo, caso as
testemunhas remanescentes reconheçam o testamento, este poderá ser confirmado,
privilegiando-se, sempre, a busca do cumprimento da última vontade do autor da herança.
Caberá ao juiz analisar a presença de provas suficientes de veracidade da exteriorização de
vontade do testador.
Daniel Carnacchioni chama a atenção para a possibilidade de, em circunstâncias
excepcionais, declaradas na cédula testamentária, é possível que o testamento particular de
próprio punho e assinado pelo testador assim seja feito sem testemunhas, situação na qual
poderá ser confirmado desde que situações excepcionais justifiquem a ausência de
testemunhas. É o caso do testamento particular de emergência (CARNACCHIONI, 2018, p. 1694).
Exemplificando, poderíamos citar a hipótese de alguém, sequestrado e em risco de
morte, pegar um papel e uma caneta e exteriorizar sua última vontade, descrevendo como
gostaria que seus bens fossem distribuídos. Feito isso, guarda o papel no bolso. Caso seja
efetivamente morto, em sendo encontrado o papel com a devida assinatura do falecido,
excepcionalmente, poder-se-á considerar a vontade do autor da herança, ainda que sem
nenhuma testemunha do ato. Como dito, privilegia-se a vontade exteriorizada em detrimento
das formalidades exigidas em lei e que, no caso concreto, seria impossível sua observância.
O art. 1.880/CC diz que o testamento particular pode ser escrito em língua estrangeira,
desde que as testemunhas compreendam essa língua.
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4.3. MODALIDADES ESPECIAIS DO TESTAMENTO
• testamento marítimo;
• testamento aeronáutico; e
• testamento militar.
É importante destacar que esse rol é taxativo, não possibilitando, por conseguinte, uma
interpretação extensiva.
Essas modalidades estão submetidas às mesmas regras de publicação e confirmação do
testamento particular. Em verdade, não há praticamente nenhuma aplicação prática.
a) Testamento marítimo e aeronáutico: o art. 1.888/CC estabelece que aquele que
estiver em viagem a bordo de um navio nacional pode testar perante o comandante e na
presença de duas testemunhas. Esse testamento poderá ser público ou cerrado, de próprio
punho, lacrado, etc. Para fazer a manifestação de última vontade por esse meio de testamento
não é preciso ser militar, bastando que a pessoa, militar ou civil, esteja a bordo de um navio.
O registro desse testamento será feito no diário de bordo.
O art. 1.889/CC segue a mesma linha, mas se refere ao testamento a bordo de aeronave.
Quem estiver a bordo de aeronave poderá testar na presença de pessoa designada pelo
comandante e outras duas testemunhas, adotando a forma de um testamento público ou
testamento cerrado, devendo ser registrado no diário de bordo.
Esse testamento ficará sob a guarda do comandante. Quando o navio atracar ou quando
a aeronave pousar, caberá ao comandante entregar o testamento às autoridades do primeiro
porto ou aeroporto, conforme o caso.
O testamento marítimo ou aeronáutico caducará se o testador não morrer naquela
viagem e nos próximos 90 dias subsequentes ao seu desembarque em terra no lugar em que
possa fazer o testamento de forma ordinária, não fizer outro testamento.
Então, na verdade, o testamento marítimo e o aeronáutico vão caducar, se o testador
não tiver morrido na viagem, em 90 dias subsequentes ao seu desembarque em terra em lugar
que se possa fazer de forma ordinária outro testamento, e assim não o confirmar.
O art. 1.892 estabelece que é inválido o testamento marítimo se, ao tempo que se fez,
o navio estava em porto, onde o testador pudesse desembarcar e testar de forma ordinária.
b) Testamento militar: o testamento militar poderá ser feito, não havendo tabelião,
perante duas testemunhas.
Se o testador não souber escrever, por estar ferido ou se for analfabeto, serão
necessárias três testemunhas, visto que uma delas irá assinar a rogo, a pedido do testador.
Se o testador pertencer a corpo ou a cessão de corpo destacado, o testamento será
escrito pelo comandante daquele corpo.
Se o testador estiver em tratamento em hospital, o testamento será escrito pelo oficial
de saúde ou pelo diretor daquele hospital.
Já no caso de o testador ser oficial mais graduado, o testamento será escrito por aquele
que o substituir, ou seja, o próximo na linha sucessória.
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Conforme estatui o art. 1.891/CC, caducará o testamento marítimo ou aeronáutico, se
o testador não morrer na viagem, nem nos noventa dias subsequentes ao seu desembarque em
terra, onde possa fazer, na forma ordinária, outro testamento.
Vale ressaltar que os militares, se estiverem em combate, e forem feridos, poderão
testar oralmente, confiando as suas últimas palavras a duas testemunhas. É o denominado
testamento nuncupativo especial, sendo este o testamento militar feito oralmente por quem
está em meio a uma guerra, ferido e confia sua última vontade a duas testemunhas.
Essa modalidade de testamento não terá efeito se o testador não morrer naquela
guerra, bem como se houver convalescência do ferido.
4.4. CODICILO
Como vimos, do artigo 1.857 a 1.896, o Código Civil trata dos aspectos formais do
testamento. A partir do artigo 1.897 do CC, a preocupação do legislador é disciplinar os aspectos
substanciais do testamento.
Ensina Daniel Carnacchioni que “em termos gerais, disposições testamentárias são as
cláusulas de um testamento, isto é, seu conteúdo. É a maneira ou modo pelo qual o autor da
herança manifesta sua derradeira vontade, que será realizada para depois de sua morte (evento
futuro)” (CARNACCHIONI, 2018, p. 1.695).
Conforme o conteúdo do testamento, podemos classificar as disposições testamentárias
da seguinte forma:
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Perceba que não há possibilidade de disposição com termo, pois o art. 1.898/CC proíbe
de forma expressa a designação do tempo em que deva começar ou cessar o direito do herdeiro,
salvo nas disposições fideicomissárias. Assim é que, salvo nas disposições fideicomissárias,
qualquer termo constante de disposição de última vontade ter-se-á por não escrito.
Outra regra quanto ao aspecto substancial do testamento é que, quando a cláusula
testamentária for suscetível de diferentes interpretações, dada a sua dubiedade, prevalecerá
sempre a interpretação que se assegure a vontade do testador.
O art. 1.900/CC estabelece hipóteses de nulidade da disposição de última vontade.
Consoante referido artigo será considerada nula a disposição:
I - que institua herdeiro ou legatário sob a condição captatória de que este disponha,
também por testamento, em benefício do testador, ou de terceiro;
A hipótese do inciso I diz respeito à condição captatória, que visa evitar que o testador
condicione a disposição testamentária ao fato de o herdeiro ou legatário vir a beneficiá-lo ou a
terceiro, em testamentos destes.
Os incisos II e III tratam da vedação de disposição testamentária que se refira a uma
pessoa absolutamente indeterminada, indeterminável, incerta, etc.
Pelo inciso IV, temos que também é nula a disposição que estabeleça, ao arbítrio de
herdeiro ou de outrem, a fixação do valor do legado.
Por fim, o inciso V estabelece a nulidade da disposição testamentária que favoreça a
pessoa que, a seu rogo, assinou o testamento, as outras testemunhas, companheiros, cônjuge,
descendentes ou irmão dessas pessoas, ou ainda o concubino do testador, que é casado,
tabelião, etc. Nesses casos, será nulo o favorecimento.
Não obstante a impossibilidade de disposição em favor de pessoa incerta, cuja a
identidade não se possa averiguar, é válida a disposição testamentária em favor de pessoa
incerta que deva ser determinada por terceiro, dentre duas ou mais pessoas mencionadas pelo
testador, ou que pertençam a uma família ou coletividade definida. A pessoa é indeterminada,
mas é determinável, situação, portanto, em que não há absoluta indeterminação subjetiva.
O art. 1.903 do Código Civil estabelece que o erro na designação da pessoa do herdeiro,
do legatário, ou da coisa legada anula a disposição, salvo se, pelo contexto do testamento, por
outros documentos, ou por fatos inequívocos, se puder identificar a pessoa ou coisa a que o
testador queria referir-se. No caso, sendo determinável a pessoa, buscar-se-á privilegiar a
vontade do testador.
Se o testador nomeia certos herdeiros individualmente e outros herdeiros
coletivamente, a herança será dividida em tantas quotas quanto forem os indivíduos e os
grupos.
Ainda no plano da validade, temos que a legislação estabelece que são anuláveis as
disposições testamentárias inquinadas de erro, dolo ou coação, estando sujeitas ao prazo
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470
decadencial. As hipóteses referem-se aos vícios do consentimento que se sujeitam a prazos
decadenciais, findos os quais, não havendo impugnação, ocorre a convalidação do ato.
O prazo decadencial é contado a partir do momento em que o interessado tiver
conhecimento do vício que inquina o testamento (art. 1.909, parágrafo único, do CC).
O testamento pode, também, ter cláusulas restritivas de inalienabilidade,
impenhorabilidade e incomunicabilidade. Essas cláusulas encerram restrições impostas pelo
testador, relativamente aos bens deixados em herança. Tais cláusulas, conforme artigo
1.848/CC, não podem ser inseridas nos bens que compõem a legítima, salvo na hipótese de justa
causa declarada no testamento.
Essas cláusulas, quando inseridas no testamento, poderão ser temporárias ou vitalícias.
Sendo vitalícias, a morte do beneficiado (legatário ou herdeiro) importará em extinção da
cláusula e consequente extinção da restrição.
Conforme previsão do art. 1.911/CC, a cláusula de inalienabilidade implica em
impenhorabilidade e incomunicabilidade.
4.6. LEGADO
Ao abordar os legados, Flávio Tartuce faz a divisão de suas espécies de forma bastante
didática, a saber:
a) Legado de coisa alheia – tratado pelo art. 1.912 do CC, pelo qual é ineficaz o
legado de coisa certa que não pertença ao testador no momento da liberalidade.
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471
b) Legado de coisa comum – se a coisa legada pertencer somente em parte ao
testador, só quanto a essa parte valerá o legado em benefício do legatário (art. 1.914
do CC).
c) Legado de coisa genérica – se o legado for de coisa que se determine pelo gênero,
será o mesmo cumprido, ainda que tal coisa não exista entre os bens deixados pelo
testador (art. 1.915 do CC).
i) Legado de imóvel – se aquele que legar um imóvel lhe ajuntar depois novas
aquisições, estas, ainda que contíguas, não se compreendem no legado, salvo
expressa declaração em contrário do testador (art. 1.922, caput, do CC). Tal premissa
não se aplica às benfeitorias necessárias, úteis ou voluptuárias feitas no prédio
legado, que devem ser tidas como incorporadas ao legado (parágrafo único).
j) Legado de dinheiro – tratado pelo art. 1.925 do CC, vencendo os juros desde o dia
em que se constituir em mora a pessoa obrigada a prestá-los.
469
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4. 6.2. EFEITOS DOS LEGADOS
Uma importante discussão sobre o legado diz respeito à aplicação ou não a ele do
princípio de saisine.
Conforme artigo 1.923/CC, desde a abertura da sucessão, pertence ao legatário a coisa
certa, existente no acervo, salvo se o legado estiver sob condição suspensiva. Já o § 1 do mesmo
artigo diz que não se defere de imediato a posse da coisa, nem nela pode o legatário entrar por
autoridade própria.
Depreende-se, do artigo transcrito, que também na hipótese do legado, há aplicação
sim do princípio de saisine, porquanto há a imediata transferência da propriedade assim que
aberta a sucessão. A ressalva é que, não obstante a imediata transferência, a posse da coisa não
será transferida de imediato.
Havendo litígio em torno do testamento em que fora realizado o legado, não será
possível o cumprimento do legado enquanto pendente referido litígio.
Igualmente, não é possível o pedido de cumprimento de legado enquanto pendente a
condição ou se ainda não ocorreu o vencimento do prazo estabelecido. É que o legado pode ser
estabelecido com encargo ou a termo, situações em que fica mitigado o exercício imediato do
direito de pedir o cumprimento do legado.
No caso de legado em dinheiro, somente começará a correr os juros se o legatário
constituir em mora a pessoa obrigada a prestá-lo. É o que estabelece o artigo 1.925, CC.
III - se a coisa perecer ou for evicta, vivo ou morto o testador, sem culpa do herdeiro
ou legatário incumbido do seu cumprimento;
Essas são hipóteses legais de caducidade do legado, ou seja, nessas hipóteses o legado
perde a eficácia, não produzindo os efeitos que dele se esperavam.
470
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quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária, forem
conjuntamente chamados à herança em quinhões não determinados, e qualquer
deles não puder ou não quiser aceitá-la, a sua parte acrescerá à dos co-herdeiros,
salvo o direito do substituto.
O parágrafo único do mesmo artigo vai arrematar, estabelecendo que “os co-herdeiros
ou co-legatários, aos quais acresceu o quinhão daquele que não quis ou não pôde suceder, ficam
sujeitos às obrigações ou encargos que o oneravam”.
O artigo 1.945/CC veda ao beneficiário do acréscimo repudiá-lo separadamente da
herança ou legado que lhe caiba, salvo se o acréscimo comportar encargos especiais impostos
pelo testador; nesse caso, uma vez repudiado, reverte o acréscimo para a pessoa a favor de
quem os encargos foram instituídos.
Já o art. 1.946/CC refere-se ao legado especial consistente no usufruto. Por esse artigo,
fica estabelecido que “legado um só usufruto conjuntamente a duas ou mais pessoas, a parte
da que faltar acresce aos co-legatários”. Não somente, conforme seu parágrafo único, “se não
houver conjunção entre os co-legatários, ou se, apesar de conjuntos, só lhes foi legada certa
parte do usufruto, consolidar-se-ão na propriedade as quotas dos que faltarem, à medida que
eles forem faltando”.
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De acordo com o Código Civil, a substituição testamentária poderá ser vulgar ou
fideicomissária.
Substituição vulgar ou ordinária: nessa modalidade de substituição, o testador já faz
constar do testamento que, caso o primeiro nomeado não possa receber a herança, será
chamada outra pessoa já indicada por ele no testamento. Assim, o testador substitui
diretamente uma pessoa por outra, se o herdeiro ou legatário nomeado não quiser ou
não puder aceitar a herança ou legado.
- Substituição fideicomissária: nesse tipo de sucessão, o testador institui herdeiros ou
legatários, estabelecendo que por ocasião de sua morte a herança ou o legado vai se
transmitir ao fiduciário e o direito dessa pessoa vai se resolver quando essa pessoa
morrer ou quando ocorrer certa condição ou certo termo, situação em que esse direito
irá se resolver em favor de outra pessoa, que é chamado de fideicomissário. O fiduciário
tem, via de regra, uma propriedade resolúvel. A previsão da substituição fideicomissária
está no artigo 1.951, CC. Ademais, a legislação estabelece que esse tipo de substituição
fideicomissária somente é permitida em favor dos não concebidos ao tempo da morte
do testador. É o que dispõe o art. 1.952. O parágrafo único do artigo em questão ressalta
que se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, adquirirá
este a propriedade dos bens fideicometidos, convertendo-se em usufruto o direito do
fiduciário. O fideicomisso caducará se o fideicomissário morrer antes do fiduciário. É a
chamada premoniência. Nos termos do artigo 1.958/CC, também caducará o
fideicomisso se o fideicomissário morrer antes de realizar-se a condição resolutória do
direito do fiduciário; nesse caso, a propriedade consolida-se no fiduciário, nos termos
do art. 1.955 .Se houver renúncia da herança ou do legado pelo fiduciário, nesse caso o
fideicomissário poderá aceitá-la. Essa autorização de aceitação do fideicomissário em
caso de renúncia pelo fiduciário está amparada no art. 1.954 do CC. Ainda sobre a
substituição fideicomissária, o art. 1.959/CC diz que são nulos os fideicomissos além do
2º grau.
O professor Flávio Tartuce, além dessa classificação, elenca ainda a denominada
substituição recíproca, esclarecendo que ela acontece quando
um herdeiro substitui o outro e vice-versa (art. 1.948 do CC). Pelo que consta de tal
comando, a substituição recíproca pode ser assim subclassificada, na esteira de
melhor doutrina:
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4.8. REDUÇÃO DAS DISPOSIÇÕES TESTAMENTÁRIAS
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testamento posterior não contiver cláusula revogatória expressa, o anterior subsiste em tudo
que não for contrário ao posterior.
Ademais, a revogação poderá ser expressa ou tácita. Considera-se revogação expressa
aquela em que o testador declara expressamente sua vontade de revogar e tácita, quando
houver um novo testamento que está em conflito com o testamento anterior.
Embora a lei fale que a revogação deve ser feita pelo mesmo modo e forma como foi
feito, entende-se que o testamento público pode ser revogado por meio de testamento
particular.
Prevê a lei, ademais, que, consoante o art. 1.971/CC, a revogação produzirá seus efeitos,
ainda quando o testamento, que a encerra, vier a caducar por exclusão, incapacidade ou
renúncia do herdeiro nele nomeado; não valerá, se o testamento revogatório for anulado por
omissão ou infração de solenidades essenciais ou por vícios intrínsecos.
Recorde-se que a caducidade de um testamento refere-se à perda de sua eficácia. Daí
que um testamento, mesmo caduco, terá o condão de revogar o anterior. Se a hipótese é de
anulação do testamento revogador (plano da validade), não terá ele o condão de anular o
anterior.
É hipótese de revogação do testamento cerrado a sua abertura ou dilaceramento pelo
testador ou com o seu consentimento.
O rompimento de testamento está previsto no artigo 1.973/CC que diz que, sobrevindo
descendente sucessível ao testador, que não o tinha ou não o conhecia quando testou, rompe-
se o testamento em todas as suas disposições, se esse descendente sobreviver ao testador. Já o
artigo 1.974/CC estabelece que também haverá rompimento quando o testamento for feito na
ignorância de existirem outros herdeiros necessários.
A ruptura é, por assim dizer, uma revogação presumida, decorrente da lei. É considerada
presumida essa revogação porque parte da concepção de que se o testador soubesse da
existência do descendente, não faria a disposição dos seus bens ou, pelo menos, não do modo
que o fez.
Perceba que o que a lei prevê, nessas hipóteses, não é a redução das disposições
testamentárias, mas o rompimento por completo do testamento. Se o testador dispuser de seus
bens sem ter conhecimento do herdeiro necessário, entende-se que há uma revogação ficta por
completo (de toda disposição de vontade) e não meramente uma redução para proteção da
legítima.
O testamento é rompido porque feito na ignorância ou na inexistência de
descendentes, ou de outros herdeiros necessários (ex.: achou que o pai havia morrido).
O art. 1.975/CC diz que não se rompe o testamento se testador dispuser de sua metade
não contemplando os herdeiros necessários de cuja existência saiba, ou quando os exclua dessa
parte. Neste caso, preserva-se a vontade do testador.
Ou seja, se o testador sabia da existência de herdeiros necessários e, ainda assim, quis
dispor de metade de seu patrimônio, nesse caso não haverá razão para o rompimento.
Na VIII Jornada de Direito Civil foi aprovado o seguinte enunciado sobre a limitação do
rompimento de testamento, in verbis: “O rompimento do testamento (art. 1.973) se refere
exclusivamente às disposições de caráter patrimonial, mantendo-se válidas e eficazes as de
caráter extrapatrimonial, como o reconhecimento de filho e o perdão do indigno”.
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4.11. TESTAMENTEIRO
Diz o art. 1.976/CC que o testador pode nomear um ou mais testamenteiros, conjuntos
ou separados, para que dê cumprimento às disposições de última vontade do testador.
Percebe-se, então, que a testamentaria, ou seja, o trabalho do testamenteiro é um
múnus privado.
Flávio Tartuce, invocando o entendimento doutrinário acerca do tema, elenca os tipos
de testamenteiros, in verbis:
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solidariamente responsáveis, e tendo que dar contas dos bens que lhes foram confiados (art.
1.986/CC).
Como retribuição, o testamenteiro que não for herdeiro, ou não for legatário, terá
direito a um prêmio, sendo denominado de vintena, sendo esta de 1% a 5% do valor da herança
líquida, a depender do trabalho que o testamenteiro exercer.
Ainda, segundo o art. 1.989/CC, reverterá à herança o prêmio que o testamenteiro
perder, por ser removido ou por não ter cumprido o testamento. Nesse caso, aquela vintena
será revertida à herança.
Em relação às hipóteses de remoção do testamenteiro, a verdade é que será removido
em situações em que o juiz percebe ou conclui que ele não tem cumprido o seu múnus, ficando
a análise a critério do magistrado.
O testamenteiro, quando não for herdeiro ou não for legatário, terá direito a um prêmio,
mas nada impede que, sendo herdeiro ou legatário o testamenteiro, ele renuncie à herança ou
ao legado para receber o prêmio, podendo escolher um ou outro. O que não se permite é que o
herdeiro que seja testamenteiro ou legatário que seja testamenteiro receba duplamente à
herança ou legado e o prêmio (vintena).
Ainda em relação às funções do testamenteiro, diz o artigo 1.990/CC que, se o testador
tiver distribuído toda a herança em legados, exercerá o testamenteiro as funções de
inventariante.
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479
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. Cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e
impenhorabilidade. Vigência da restrição. Vida do beneficiário. Transmissão causa
mortis do bem gravado. Testamento. Validade. As cláusulas de inalienabilidade,
incomunicabilidade e impenhorabilidade não tornam nulo o testamento, que dispõe
sobre transmissão causa mortis do bem gravado. Inicialmente, importante pontuar
que a jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que, por força do
princípio da livre circulação dos bens, não é possível a inalienabilidade perpétua,
razão pela qual as cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e
impenhorabilidade se extinguem com a morte do titular do bem clausulado,
podendo a propriedade ser livremente transferida a seus sucessores. Por seu turno,
a doutrina ensina que a disposição patrimonial realizada em testamento somente se
efetiva após o óbito do testador. Assim, a elaboração do testamento não acarreta
nenhum ato de alienação da propriedade em vida, senão evidencia a declaração de
vontade do testador, revogável a qualquer tempo. Dessa forma, as cláusulas de
inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade não tornam nulo
o testamento que dispõe sobre transmissão causa mortis de bem gravado, haja vista
que o ato de disposição somente produz efeitos após a morte do testador, quando
então ocorrerá a transmissão da propriedade. REsp 1.641.549-RJ, Rel. Min. Antonio
Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 13/08/2019, DJe
20/08/2019. (INF. 654).
5. INVENTÁRIO E PARTILHA
Inventário é o procedimento legal de caráter obrigatório para que haja a atribuição dos
bens deixados pelo falecido aos seus sucessores. Como vimos, pelo princípio de saisine, com a
morte de uma pessoa, há transmissão imediata dos bens. Porém, é necessário um procedimento
para regularização dessa transmissão. O inventário revela, então, o procedimento necessário
para divisão dos bens deixados pelo de cujus.
Inaugurando o capítulo que trata do inventário e da partilha, Flávio Tartuce esclarece
que o estudo se refere à instrumentalização concreta do Direito Sucessório, que se dá pelo
inventário, pela partilha e por temas correlatos, tratados tanto pela lei privada quanto pela lei
processual (TARTUCE, 2020, p. 2.358).
O inventário pode ser judicial ou extrajudicial, sendo que a possibilidade de inventário
extrajudicial surge como forma de desafogamento do judiciário, possível, como melhor
veremos, em hipóteses em que haja consenso entre os herdeiros e não haja nenhum incapaz.
O art. 1.991/CC estabelece que desde a assinatura do compromisso até a homologação
da partilha, a administração da herança caberá ao inventariante, o que significa que, não
obstante o princípio de saisine estabelecer a imediata transmissão dos bens aos herdeiros, a
administração durante o inventário é incumbência do inventariante. Portanto, o inventariante
é o administrador do espólio.
É importante destacar que o espólio, em linhas gerais, é o conjunto de bens que se forma
com a morte de uma pessoa. É a universalidade jurídica que, embora despersonalizada, tem
capacidade para estar em juízo, representada pelo inventariante (art. 75, VII, NCPC). A ressalva
que se faz é para o inventariante dativo, conforme será mais bem explicado em tópico próprio.
Falecendo alguém, há imediata transmissão de seus bens para seus sucessores, mas
antes que haja sua distribuição, é necessário um procedimento durante o qual os bens serão
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administrados pelo inventariante. Esse procedimento denomina-se inventário e, sendo judicial,
pode assumir as seguintes formas:
• inventário judicial pelo rito tradicional;
• inventário judicial pelo rito do arrolamento sumário; e
• inventário judicial pelo rito do arrolamento comum.
O estudo de cada um dos tipos de inventário deve ser feito confrontando as normas de
direito material com as normas de direito processual. Assim, temos:
a) Inventário judicial pelo rito tradicional: tem previsão a partir do artigo 615, NCPC,
que estabelece que legitimado para requerer a abertura do inventário, será aquele que estiver
na posse ou administração do espólio. A partir desse artigo, tem início a previsão de como se
desenvolverá o inventário judicial pelo rito tradicional. Não sendo a hipótese de outro tipo de
inventário, aplicar-se-ão as disposições do inventário pelo rito tradicional.
O artigo 616, complementando a previsão do artigo 615/CPC, estabelece legitimidade
concorrente a outras pessoas:
• cônjuge ou companheiro;
• herdeiro;
• legatário;
• testamenteiro, se houver testamento;
• cessionário de um herdeiro ou de legatário;
• credor de um herdeiro ou de legatário, ou ainda do autor da herança.;
• ministério público, se houver incapazes;
• fazenda pública, se houver interesse;
• administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou
de seus respectivos cônjuges ou companheiros também têm legitimidade.
Conforme se extrai da leitura do artigo, não existe mais menção à possibilidade de
abertura de inventário de ofício pelo juiz. Embora houvesse essa previsão na legislação
revogada, igual disposição não foi reproduzida pelo NCPC.
A partir do momento que se inicia o inventário, a administração do espólio é feita pelo
inventariante, o qual é também responsável pela representação do espólio em juízo. Essa
administração tem como marco inicial a data do compromisso prestado como inventariante e
vai até o momento de homologação da partilha.
Até que o inventariante preste o compromisso na forma da lei, o espólio será
administrado pelo administrador provisório, nomeado pelo juiz, o qual terá direito ao reembolso
das despesas necessárias e úteis que fizer (art. 613, NCPC). Esse administrador provisório, assim
como acontece com o inventariante, será quem representará ativa e passivamente o espólio
enquanto durar sua administração.
O administrador provisório, a teor do que estabelece o artigo 614 do NCPC, deve trazer
para o acervo os frutos que perceber desde a abertura da sucessão. Por sua administração, tem
direito a reembolso das despesas com benfeitorias necessárias e úteis. Por outro lado, responde,
quando demonstrado dolo ou culpa, pelos danos que vier a causar.
A nomeação de um inventariante pelo juiz segue uma ordem preferencial, conforme
artigo 617/NCPC. Essa ordem é estabelecida da seguinte forma:
• cônjuge ou companheiro;
• se não for o caso, o herdeiro que tiver na posse ou na administração do espólio;
• se não for o caso, qualquer dos herdeiros. Sendo menor, por meio de seu
representante legal;
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• se não for o caso, poderá ser o testamenteiro;
• se não for o caso, poderá ser o cessionário do herdeiro ou do legatário, o
inventariante judicial, no local onde houver inventariante judicial, ou ainda uma
pessoa estranha que se mostre idônea e que seja nomeada pelo juiz.
É importante destacar que, não obstante a ordem estabelecida pelo legislador no artigo
617/NCPC, tem-se que essa não é uma ordem absoluta, de modo que, na análise do caso
concreto, o juiz pode entender necessária a nomeação de inventariante, preterindo essa ordem.
Em outras palavras, temos que a ordem estabelecida é preferencial e o julgador, sempre de
acordo com o caso concreto, poderá nomear inventariante não observando essa ordem.
Uma vez nomeado, o inventariante será intimado, tendo o prazo de 5 dias para prestar
o compromisso de exercício da inventariança.
Prestado o compromisso, como se viu, o inventariante representará o espólio passiva e
ativamente em juízo. Entretanto, há casos em que se torna necessária a nomeação de
inventariante dativo. Nessas hipóteses, o §1º, do artigo 75, do CC, estabelece que “quando o
inventariante for dativo, os sucessores do falecido serão intimados no processo no qual o espólio
seja parte”.
Em algumas situações, dada a litigiosidade entre os herdeiros ou a impossibilidade
daqueles que se encontram na ordem preferencial de exercerem a inventariança, o juiz terá,
então, que nomear inventariante dativo, que será um terceiro estranho, conforme previsão do
inciso VIII do artigo 617/NCPC. Exatamente por se tratar de terceiro estranho, sem vínculo com
o autor da herança e sem interesse econômico, é que não representará o espólio judicialmente.
Nesse caso, a representação será dos sucessores, de forma que, havendo ação judicial de
interesse do espólio, todos os herdeiros e sucessores do falecido serão autores ou réus nas ações
em que o espólio for parte.
De toda forma, assim como os demais inventariantes nomeados, o inventariante dativo
também deve cumprir com os demais deveres da inventariança.
Nos termos do artigo 618, do NCPC, incumbe ao inventariante:
- representar o espólio ativa e passivamente, judicialmente ou extrajudicialmente
(ressalva para o inventariante dativo);
- administrar o espólio;
- prestar as primeiras informações (primeiras declarações);
- prestar as últimas declarações;
- exibir em cartório, em qualquer tempo, para que as partes possam examinar, os
documentos relativos ao espólio;
- trazer à colação no inventário os bens recebidos pelo herdeiro ausente ou pelo
herdeiro renunciante, ou ainda pelo herdeiro excluído;
- prestar contas de sua gestão;
- requerer, se for o caso, a declaração de insolvência do falecido.
O art. 619 do NCPC traz outras incumbências ao inventariante, as quais demandarão
autorização judicial para serem exercidas:
- alienação de bens de qualquer espécie;
- transação, judicial ou extrajudicialmente;
- pagamento de dívidas do espólio;
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- pagamento de despesas necessárias para conservação ou melhoramento dos bens do
espólio.
Na hipótese de quaisquer desses atos praticados sem a observância da autorização
judicial necessária, o ato será nulo.
No prazo de 20 dias, contados do momento em que prestou o seu compromisso, o
inventariante fará as primeiras declarações, sendo que dessas primeiras declarações será
lavrado um termo circunstanciado. No termo circunstanciado, deverão constar alguns dados
(art. 620, NCPC):
c) os semoventes, seu número, suas espécies, suas marcas e seus sinais distintivos;
g) direitos e ações;
Feito isso, diz o § 1º do mencionado artigo 620, NCPC, que o juiz determinará que se
proceda:
“I - ao balanço do estabelecimento, se o autor da herança era empresário individual; II -
à apuração de haveres, se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima.”
O inventariante, como se viu, tem deveres em decorrência da inventariança e, em razão
disso, o NCPC elenca algumas penas que podem ser aplicadas ao inventariante:
• Pena de sonegados: somente poderá ser invocada contra o inventariante quando
encerrada a descrição dos bens e tendo feito uma declaração de que não existam
outros a inventariar. Se o inventariante assim declarar e depois se descobrir que
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havia outro bem que havia sido sonegado, será o caso de aplicação da pena de
sonegado. Sobre o tema, Flávio Tartuce ensina que
vale lembrar que a pena de sonegados é imposta ao herdeiro que deixa de informar
o inventário sobre a existência de um bem a ser partilhado, caso daqueles recebidos
em doação, sem a dispensa de colação. A penalidade é a perda do direito em relação
a tal bem, como determina o art. 1.992 do Código Civil (TARTUCE, 2020, p. 2382).
Exemplificando, se uma pessoa recebeu em doação do pai uma casa no valor de 500
mil reais. Essa casa, em tese, deverá ser colacionada. Supondo que o pai tenha
deixado 3,5 milhões de patrimônio para 2 filhos. Porém, como ele havia doado a um
dos filhos a casa de 500 mil reais, o certo seria esse filho colacionar a casa, caso em
que a herança ficaria em 4 milhões, ficando cada um dos filhos com 2 milhões. Se
esse herdeiro (que recebeu a doação) é o inventariante, e ainda assim não colaciona
esse bem, aí é aplicável a pena de sonegado, consistente na perda do direito em
relação àquele bem. O inventariante herdeiro é citado, tendo a oportunidade de
informar e de descrever os bens do falecido que estão na sua posse, mas se assim
não o fizer, estará sujeito à pena de sonegados. Nesse caso, como pena, o bem
passará integralmente ao outro(s) herdeiro(s), não havendo a compensação dos
valores. E os outros bens serão divididos metade-metade. No caso, o herdeiro que
recebeu a pena ficará com 1.750.000 e o irmão receberá 2.250.000 (1.750.000 + 500
mil da casa, que fora sonegada).
• Remoção do inventariante: o inventariante poderá ser removido, conforme
hipóteses elencadas no art. 622 do NCPC, in verbis:
III - se, por culpa sua, bens do espólio se deteriorarem, forem dilapidados ou
sofrerem dano;
IV - se não defender o espólio nas ações em que for citado, se deixar de cobrar
dívidas ativas ou se não promover as medidas necessárias para evitar o perecimento
de direitos;
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Concluídas essas citações, as partes terão vista do processo no prazo comum de 15 dias,
podendo se manifestar sobre as primeiras declarações.
Na hipótese de impugnações com fundamento em omissão julgada procedente, o juiz
mandará retificar as primeiras declarações.
Pode ocorrer também pedido de reclamação da nomeação do inventariante, situação
mais grave, porquanto, uma vez acolhido, implicará na nomeação de outro inventariante,
sempre que possível observando a ordem estabelecida em lei (art. 627, §2º, NCPC).
Já o §3º, do art. 627, NCPC, prevê que, verificando que a disputa sobre a qualidade de
herdeiro a que alude o inciso III (do artigo 627, caput, NCPC) demanda produção de provas que
não a documental, o juiz remeterá a parte às vias ordinárias e sobrestará, até o julgamento da
ação, a entrega do quinhão que na partilha couber ao herdeiro admitido.
A situação se refere à hipótese de as partes questionarem a possibilidade de
determinada pessoa ser herdeiro(a). Neste caso, o juiz, se da análise das alegações, constatar
que há prova documental da qualidade de herdeiro da pessoa invocada, seguirá o inventário.
Todavia, inexistindo essa prova documental da qualidade de herdeiro da pessoa indicada,
tornar-se-á necessária essa comprovação de que é herdeiro, tornando-se imperiosa a produção
de outras provas que não documentais, já que inexistentes. Nesta situação, remetem-se as
partes para a via ordinária.
Conforme previsão legal, aquele que se julgar preterido poderá demandar sua admissão
no inventário, requerendo-a antes da partilha (art. 628).
Com o requerimento, serão ouvidas as partes no prazo de 15 (quinze) dias, para depois
o juiz decidir. Se, entretanto, para solução da questão for necessária a produção de provas que
não a documental, o juiz remeterá o requerente às vias ordinárias, mandando reservar, em
poder do inventariante, o quinhão do herdeiro excluído até que se decida o litígio (§2º, art. 628,
NCPC).
Percebe-se que a ideia trazida pela legislação processual é de que o juiz do inventário
solucionará as demandas que puderem ser comprovadas documentalmente de plano e apenas
remeterá as que exigirem análise mais complexa para outro feito, para outra ação ou para outro
juízo. A base dessa ideia está no art. 612 do NCPC que diz que “o juiz decidirá todas as questões
de direito desde que os fatos relevantes estejam provados por documento, só remetendo para
as vias ordinárias as questões que dependerem de outras provas”.
Após o prazo concedido no artigo 627, NCPC, para manifestação acerca das primeiras
declarações, diz o art. 629, NCPC, que a Fazenda Pública, no prazo de 15 (quinze) dias, informará
ao juízo, de acordo com os dados que constam de seu cadastro imobiliário, o valor dos bens de
raiz descritos nas primeiras declarações.
Após o prazo de 15 dias das primeiras declarações, ou tendo sido julgadas e decididas
as reclamações eventualmente opostas, o juiz nomeará um perito para avaliar os bens do
espólio, se na comarca não houver um perito judicial.
O perito é dotado de fé pública, motivo pelo qual, em regra, não será necessária mandar
repetir a avaliação. No entanto, o art. 873 do NCPC trata dessa possibilidade de determinar que
seja refeita ou reiterado a avaliação feita pelo perito, nas seguintes hipóteses:
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III - o juiz tiver fundada dúvida sobre o valor atribuído ao bem na primeira avaliação.
Havendo bens situados fora da comarca por onde tramita o inventário, não será
expedida carta precatória de avaliação para os bens de pequeno valor e para os bens que são
conhecidos do perito nomeado (art. 632, NCPC).
Busca-se, com isso, conferir uma maior agilidade ao processo de inventário.
Ademais, ainda no espírito de maior agilidade do processo de inventário, permite o art.
633 do NCPC que, em sendo as partes capazes e estando a Fazenda Pública expressamente de
acordo com o valor atribuído nas primeiras declarações aos bens do espólio, não seja necessária
avaliação.
Para os casos em que realizada a avaliação, entregue o laudo, o juiz mandará que as
partes se manifestem sobre ele no prazo de 15 dias (art. 635, NCPC).
As partes podem aceitar esse laudo e, se não aceitarem, poderão apresentar
impugnações, as quais serão resolvidas. Após a resolução, será lavrado em seguida o termo das
últimas declarações.
Nessas últimas declarações, feita pelo inventariante, poderá ele emendar, aditar ou
completar, se for o caso, as primeiras declarações que prestou.
As partes serão ouvidas, no prazo de 15 dias, sobre as últimas declarações prestadas
pelo inventariante.
Após, é calculado o tributo a ser recolhido pelas partes. Sobre esse, valor serão ouvidas
as partes no prazo de 5 dias, e depois será ouvida a Fazenda Pública. Findo o prazo concedido
às partes, haverá o recolhimento dos impostos.
b) Inventário judicial pelo arrolamento sumário: está previsto no artigo 659 do NCPC,
que diz que a partilha amigável, celebrada entre partes capazes, será homologada de plano pelo
juiz.
O §1º do mesmo artigo acrescenta que essa homologação de plano pelo juiz também
ocorrerá na hipótese de pedido de adjudicação formulado por herdeiro único.
A leitura do artigo mencionado já indica que esse tipo de inventário tem forma
abreviada, exatamente em decorrência do consenso entre os herdeiros ou pela existência de
um único a suceder os bens do falecido, independentemente do valor dos bens que integram o
espólio.
Tartuce, citando Dimas Messias de Carvalho e Dimas Daniel de Carvalho, esclarece que
se trata de
Não somente, arrematando, o autor diz que “em suma, pode-se dizer que o seu fator
predominante é justamente o acordo entre as partes envolvidas e a sua capacidade plena”
(TARTUCE, 2020, p. 2.400).
Transitada em julgado a decisão homologatória da partilha ou de adjudicação, será
lavrado o formal de partilha, ou será elaborada a carta de adjudicação.
Lavrado o formal de partilha, intima-se o fisco para que seja feito o lançamento
administrativo dos impostos e de outros tributos eventualmente cabíveis.
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Percebe-se, então, que nessa modalidade de inventário, o formal de partilha ou carta
de adjudicação antecedem o recolhimento do tributo, visando, com isso, a celeridade, que é
própria desse tipo de inventário.
Trata-se, assim, de um procedimento de jurisdição voluntária, no qual os herdeiros
apresentam um plano de partilha ao juiz, que apenas irá homologá-lo.
Exatamente por essa celeridade própria do arrolamento sumário, temos que nesse tipo
de inventário, não serão apreciada questões relativas a lançamento, a pagamento, quitação de
taxas judiciais e de tributos, pois incompatíveis com a celeridade.
A taxa judiciária, se for devida, será calculada com base no valor atribuído pelos
herdeiros.
Se o fisco entender de forma diferente quanto ao valor, caberá ao Fisco, por meio de
processo administrativo, atribuir valor diverso do valor que foi estimado pela parte, e exigir
eventual diferença pelos meios adequados através do lançamento de créditos tributários.
O ITCMD será objeto de processo administrativo. Ou seja, as autoridades fazendárias
não ficam vinculadas aos valores dos bens atribuídos pelos herdeiros.
O art. 663, NCPC, estabelece que a existência de credores do espólio não prejudicará a
homologação da partilha e nem mesmo a adjudicação, se forem reservados bens suficientes
para o pagamento da dívida.
c) Inventário judicial pelo rito do arrolamento comum: nesse tipo de inventário,
importa considerar o valor dos bens que integram o espólio. Se no caso do arrolamento sumário,
o acordo entre os herdeiros era o fator determinante para aquela modalidade de inventário,
neste o que se considera é o valor dos bens.
Assim é que estabelece o art. 664 do NCPC que quando o valor dos bens do espólio for
igual ou inferior a mil salários mínimos, o inventário será processado na forma de arrolamento.
Neste caso, caberá ao inventariante, que foi nomeado, independentemente da
assinatura do termo de compromisso, apresentar, com suas declarações, a atribuição de valores
de bens do espólio e o plano de partilha.
Perceba que o interesse está no valor dos bens deixados até mil salários mínimos.
Se qualquer das partes ou o Ministério Público impugnar esse valor apresentado pelo
inventariante, caberá ao juiz nomear um avaliador que oferecerá um laudo em 10 dias.
Nesse tipo de arrolamento, é possível a nomeação de avaliador, diferentemente do
arrolamento sumário, porquanto a necessidade de avaliador naquele tipo de inventário decorre
da discordância e essa é incompatível com a modalidade sumária de arrolamento.
Estabelece a legislação processual que, apresentado o laudo pelo avaliador, o juiz, na
audiência, deliberará sobre a partilha, decidindo na mesma audiência, de plano, todas as
reclamações, mandando pagar dívidas não impugnadas (art. 664, §2º, NCPC).
Provada a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e suas rendas, o juiz julgará
a partilha. Essa é mais uma diferença entre esse tipo de arrolamento e o sumário. Enquanto no
arrolamento sumário, o pagamento dos tributos é postergado para depois da homologação da
partilha, nesse ele deve ser prévio.
Tudo isso decorre, repita-se, do fato de o arrolamento sumário considerar o consenso
entre os herdeiros e interessados. Já o arrolamento comum leva em conta o valor dos bens
inventariados.
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O NCPC, no art. 665, diz que será possível o caminho do arrolamento comum para o
inventário, ainda que haja incapaz entre os herdeiros, desde que todas as partes estejam de
acordo e que o Ministério Público também concorde.
Portanto, passa-se a permitir que haja o procedimento de arrolamento comum quando
os valores dos bens não superarem mil salários mínimos, e, ainda que haja herdeiros incapazes,
desde que todos estejam de acordo e o Ministério Público também concorde.
Vale, então, relembrar que no arrolamento sumário não há limite de valores para os
bens, mas também não há possibilidade de seu processamento para as hipóteses em que há
herdeiros incapazes.
O destaque é feito para ressaltar as diferenças entre o arrolamento sumário e o
arrolamento ordinário.
• inexistência de testamento;
• todos os herdeiros devem ser capazes e devem estar acordo;
• elaboração por meio de escritura pública.
Ademais, é preciso que as partes estejam acompanhadas de advogado para elaboração
da escritura pública de inventário.
Especificamente sobre a exigência de não existência de testamento para que o
inventário seja extrajudicial, merece destaque decisão do STJ, no sentido de ser possível o
inventário extrajudicial, ainda que exista testamento, se os interessados forem capazes e
concordes e estiverem assistidos por advogados, desde que o testamento tenha sido
previamente registrado judicialmente ou se tenha a expressa autorização do juízo competente
(REsp nº 1808767 / RJ, REl.Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, STJ) .
A opção pela via extrajudicial, nas hipóteses em que permitida em lei, é uma faculdade
da parte. No entanto, a assistência de advogado é obrigatória. A leitura do artigo 610, §2º diz
que o tabelião vai lavrar a escritura pública se todas as partes de um advogado ou de um
defensor público.
A Resolução 35 do CNJ de 2007, em seu art. 1º, estabelece que é livre a escolha do
tabelião que vai lavrar o inventário, não havendo que se falar em competência territorial para
isso.
O inventário extrajudicial pode ser solicitado a qualquer tempo, sendo, inclusive,
possível a desistência da via judicial, para que as partes promovam o inventário pela via
extrajudicial. O prazo de 60 dias não é próprio, mas o tabelião observará, no tocante aos bens,
eventual multa na legislação tributária.
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É importante destacar que essas escrituras públicas de inventário não dependem de
homologação judicial para que produzam efeitos, configurando título hábil para registro civil,
imobiliário, transferência de bens e levantamento de valores.
Na escritura de inventário extrajudicial, será obrigatória a nomeação de um interessado
para representar o espólio, tendo poderes de inventariante, cumprindo as obrigações ativas e
passivas que tiverem pendentes (art. 11 da Resolução).
Em relação ao recolhimento de tributos, incidente será o ITCMD. Seu recolhimento
deverá anteceder a lavratura da escritura pública de inventário (art. 15 da Res. 15), consagrando
uma preferência para Fazenda Pública.
Ainda de acordo com a Resolução 35 do CNJ, os cônjuges dos herdeiros deverão
comparecer ao ato de lavratura da escritura pública de inventário e partilha quando houver
renúncia ou algum tipo de partilha que importe em transmissão, exceto se o casamento se der
sob o regime da separação absoluta (art. 17).
É que, como vimos, o direito à herança (sucessão aberta) é um direito imobiliário, sendo
necessário, em tese, da outorga conjugal. Essa outorga, contudo, não é necessária quando os
cônjuges estiverem casados em regime de separação absoluta de bens.
No caso do(a) companheiro(a) com direito à sucessão, será necessária ação judicial se o
autor da herança não deixar outro sucessor ou não houver consenso de todos os herdeiros,
inclusive quanto ao reconhecimento da união estável (art. 18 da Resolução). Já a meação do(a)
companheiro(a) pode ser reconhecida na escritura pública, desde que todos os herdeiros e
interessados na herança, absolutamente capazes, estejam de acordo (art. 19, da Resolução).
Os artigos 20 e 21 da Resolução 35 do CNJ dispõem sobre os dados que deverão constar
da escritura pública de inventário.
É admissível uma sobrepartilha, ou seja, uma partilha depois da partilha realizada. Essa
sobrepartilha também poderá ser feita por escritura pública, ainda que a partilha tenha sido
originariamente judicial, ou seja, se à época havia um herdeiro incapaz, mas agora não exista
mais (art. 25).
Se houver somente um herdeiro, desde que seja maior e capaz, terá ele direito à
totalidade da herança. Nesse caso, não haverá partilha, por óbvio. Na hipótese, será lavrada
uma escritura pública de inventário e uma adjudicação de bens (art. 26, da Resolução).
A Resolução 35 do CNJ trata, ademais, da possibilidade de inventário negativo. Esse
inventário se presta a demonstrar que o falecido não deixou qualquer bem. Um inventário
negativo pode ser útil, por exemplo, para que o cônjuge sobrevivente possa se casar pelo regime
que desejar, afastando-se assim, a incidência da causa suspensiva prevista no artigo 1.523, I, do
CC.
Pode-se, então, fazer inventário negativo por meio de escritura pública (art. 28, da
Resolução).
Com efeito, estabelece o mencionado artigo 1.523, I, CC, que o casamento da viúva,
enquanto não der partilha dos bens deixados pelo falecido, deve ser feito com o regime da
separação obrigatória de bens (art. 1.641, I, CC). Assim, com o inventário negativo, busca-se
afastar a referida causa suspensiva para livre escolha do regime de casamento em vista do novo
matrimônio.
Por fim, o tabelião poderá se negar a lavrar a escritura pública de inventário e partilha
se houver fundados indícios de fraude ou se houve dúvida sobre a condição de herdeiro do
interessado.
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5.4. PENA DE SONEGADOS
Vimos que uma das penalidades que podem ser aplicadas ao inventariante é a pena de
sonegados. Entretanto, essa penalidade não é exclusiva do inventariante, podendo ser aplicada
a qualquer herdeiro que sonegue bens da herança, não os descrevendo no inventário ou os
omitindo da colação. É o que se extrai do artigo 1.992, do CC, que estabelece in verbis: “O
herdeiro que sonegar bens da herança, não os descrevendo no inventário quando estejam em
seu poder, ou, com o seu conhecimento, no de outrem, ou que os omitir na colação, a que os
deva levar, ou que deixar de restituí-los, perderá o direito que sobre eles lhe cabia”.
Vê-se que o artigo em questão, além de descrever quem são os sujeitos à pena de
sonegação, já traz também a consequência que é a perda do direito sobre o bem sonegado. A
pena de sonegados gera, assim, ao herdeiro sonegador, a perda do direito àquele bem.
Falando sobre o tema, Flávio Tartuce ensina que
sonegados são os bens que deveriam ter sido inventariados ou trazidos à colação,
mas não o foram, pois ocultados pelo inventariante ou por herdeiro. Como
consequência, a pena de sonegados constitui uma sanção ou penalidade civil
imposta para os casos de ocultação de bens da herança, gerando a perda do direito
sobre os bens ocultados. Sonegados são os bens que deveriam ser inventariados ou
trazidos à colação, mas não o foram, pois foram ocultados por aquele que deveria
ter trazido o bem, e não trouxe (TARTUCE, 2020, p. 2420).
Todavia, é importante destacar que não basta a demonstração da ocultação, para fins
de aplicação da pena de sonegados. Esse é o elemento objetivo que deve ser associado ao
subjetivo, consistente na demonstração do dolo de ocultar.
Isto é, para pena de sonegados, são exigidos dois elementos concomitantes:
• elemento objetivo: ocultar o bem; e
• elemento subjetivo: dolo de ocultar, ou seja, a intenção de não contar aos demais
herdeiros que não há o bem.
Já vimos que, em sendo o inventariante o responsável pela ocultação dolosa, além da
pena de sonegados, será removido da inventariança (art. 1.993, CC).
O artigo 1.994/CC estabelece que a pena de sonegados só se pode requerer e impor em
ação movida pelos herdeiros ou pelos credores da herança, sendo que a sentença que se proferir
nessa ação de sonegados aproveita aos demais interessados.
Constatada a sonegação, diz o art. 1.995 do CC, que se não se restituírem os bens
sonegados, por já não os ter o sonegador em seu poder, pagará ele a importância dos valores
que ocultou, mais as perdas e danos.
Quando uma pessoa falece, há transmissão imediata de seus bens aos sucessores.
Entretanto, é preciso observar a regra do art. 1.997, CC, que estabelece que a herança responde
pelo pagamento das dívidas do falecido, autor da herança.
Na hipótese de dívidas cobradas após a partilha dos bens, cada herdeiro responderá por
elas, porém na proporção da parte que lhes coube na herança. Isso significa dizer que nenhum
herdeiro responderá além das forças da herança.
O §1º do art. 1.997 diz que “quando, antes da partilha, for requerido no inventário o
pagamento de dívidas constantes de documentos, revestidos de formalidades legais,
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constituindo prova bastante da obrigação, e houver impugnação, que não se funde na alegação
de pagamento, acompanhada de prova valiosa, o juiz mandará reservar, em poder do
inventariante, bens suficientes para solução do débito, sobre os quais venha a recair
oportunamente a execução”.
O credor, neste caso, será remetido às vias ordinárias para cobrança da dívida, por meio
de ação própria, a qual deverá se dar no prazo de 30 dias, sob pena de cair a reserva do bem.
Não proposta a ação de cobrança no prazo de 30 dias, ficará sem nenhum efeito a reserva de
bens feita pelo juiz (art. 1.997, §2º).
Sobre o mesmo tema, a legislação processual, estabelece que, antes da partilha, os
credores podem requerer ao juízo do inventário o pagamento das dívidas vencidas e exigíveis.
A petição será distribuída por dependência e é autuada em apenso aos autos de inventário (art.
642 do NCPC).
Trata-se, na hipótese, de pedido de habilitação de crédito. Se as partes do inventário
concordarem, o juiz declarará o credor habilitado, determinando que ocorra a separação dos
valores e bens para pagamento da dívida.
Sobre esse pedido de habilitação de credor, nem sempre os donatários serão sempre
chamados a se manifestarem. A previsão legal é que serão chamados quando houver a
possibilidade de redução das liberalidades em decorrência do valor da dívida (art. 642, §5º,
NCPC).
Se não houver concordância de todas as partes, o pedido de habilitação de crédito será
encaminhado às vias ordinárias. O juiz, nesse caso, mandará reservar, em poder do
inventariante, bens suficientes para pagar o credor quando a dívida constar de um documento
e a impugnação não se referir à quitação daquela dívida.
O legatário também poderá ser chamado a se manifestar sobre dívidas do espólio. Isso
acontecerá aplicando-se a mesma lógica aplicada ao donatário, ou seja, chamar-se-á o legatário
a se manifestar sobre dívidas do autor da herança quando (art. 645, NCPC):
• toda a herança for dividida em legítima; ou
• reconhecimento da dívida importar redução do legado.
Ainda em relação ao pagamento das dívidas, diz o artigo 646, NCPC, que “sem prejuízo
do disposto no art. 860 , é lícito aos herdeiros, ao separarem bens para o pagamento de dívidas,
autorizar que o inventariante os indique à penhora no processo em que o espólio for
executado”.
a colação é o ato pelo qual o descendente, que concorre com outros descendentes
à sucessão de ascendente comum ou com o cônjuge do falecido, confere o valor das
doações que do autor da herança recebeu em vida. O descendente tem o dever legal
de indicar e relacionar, no inventário, o valor das doações recebidas, com a
finalidade de igualar as legítimas, e não a herança (CARNACCHIONI, 2018, p. 1714).
488
491
sob pena de sonegação”. Já o parágrafo único do mesmo artigo completa,
estabelecendo que “para cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos será
computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível.
Esse artigo está alinhado com o disposto no artigo 544, CC, pelo qual temos que “a
doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do
que lhes cabe por herança.”
Assim, a regra é que as doações feitas em vida pelo ascendentes a descendes e de um
cônjuge a outro são adiantamento da legítima e, em sendo assim, devem ser colacionados
quando do inventário. Entretanto, é possível afastar essa necessidade de colação. Para tanto,
pode o donatário, no ato de liberalidade, indicar que se trata de doação de sua parte disponível.
É o que dispõe o artigo 2005, CC, segundo o qual “são dispensadas da colação as doações que o
doador determinar saiam da parte disponível, contanto que não a excedam, computado o seu
valor ao tempo da doação”.
Diz o art. 2.006, que a dispensa da colação pode ser outorgada pelo doador em
testamento, ou no próprio título de liberalidade.
Sobre a colação dos bens doados em vida pelo autor da herança, temos que o nosso
ordenamento jurídico adotou a chamada colação em substância. Sobre o tema, Tartuce, citando
Maria Helena Diniz, esclarece que
Assim, temos que a mesma coisa doada como adiantamento da legítima deve ser trazida
à colação. Se foi dado um quadro, este deverá ser trazido à colação, e não o valor do quadro. Só
será trazido o valor do quadro quando este já não mais existir. Se os donatários não mais tiverem
o bem, trarão à colação o valor daquele bem.
Sobre o cálculo que deverá ser feito para se determinar o valor da legítima, diz o
parágrafo único do artigo 2.002, que “para cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos será
computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível”.
Buscando esclarecer o que quer dizer esse parágrafo único do artigo 2.002, Daniel
Carnacchioni exemplifica nos seguintes termos
Diz o parágrafo único do artigo 2.003, CC, que se, computados os valores das doações
feitas em adiantamento de legítima, não houver no acervo bens suficientes para igualar as
legítimas dos descendentes e do cônjuge, os bens doados, na forma do caput do mesmo artigo,
489
492
serão conferidos em espécie, ou, quando deles já não disponha o donatário, pelo seu valor ao
tempo da liberalidade.
Já o artigo 2.004, CC, estabelece que o valor de colação dos bens doados será aquele,
certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade.
Esse artigo parece estar em contradição com o NCPC, já que este estabelece que na
impossibilidade de trazer o bem à colação, deverá trazer seus valores. O parágrafo único do art.
627, NCPC, diz que os bens a serem conferidos na partilha, assim como as acessões e as
benfeitorias que fez o donatário, vão ser calculados pelo valor que tiverem ao tempo da abertura
da sucessão.
Percebam que enquanto o Código Civil fala do bem na época da liberalidade da doação,
o CPC se refere ao valor do bem ao tempo da abertura da sucessão, que, conforme vimos, é
quando o autor da herança morreu.
A solução para essa aparente contradição não é ainda pacífica. O Enunciado 119 do CJF
diz que
para evitar o enriquecimento sem causa, a colação será efetuada com base no valor
da época da doação, nos termos do caput do art. 2.004, exclusivamente na hipótese
em que o bem doado não mais pertença ao patrimônio do donatário. Se, ao
contrário, o bem ainda integrar seu patrimônio, a colação se fará com base no valor
do bem na época da abertura da sucessão, nos termos do art. 1.014 do CPC, de modo
a preservar a quantia que efetivamente integrará a legítima quando esta se
constituiu, ou seja, na data do óbito (resultado da interpretação sistemática do art.
2.004 e seus parágrafos, juntamente com os arts. 1.832 e 884 do Código Civil).
Flávio Tartuce nos adverte do acolhimento à sugestão feita por Gustavo Tepedino, feita
por ocasião da VIII Jornada de Direito Civil, realizada em 2018, pela qual se aprovou uma nova
ementa doutrinária, em complemento a essa anterior e em atualização ao CPC/2015, segundo
a qual
os arts. 2.003 e 2.004 do Código Civil e o art. 639 do CPC devem ser interpretados de
modo a garantir a igualdade das legítimas e a coerência do ordenamento. O bem
doado, em adiantamento de legítima, será colacionado de acordo com seu valor
atual na data da abertura da sucessão, se ainda integrar o patrimônio do donatário.
Se o donatário já não possuir o bem doado, este será colacionado pelo valor do
tempo de sua alienação, atualizado monetariamente (Enunciado n. 644) (TARTUCE,
2020, p. 2.430).
Também os netos podem ser obrigados à colação quando, representando os seus pais,
sucederem aos avós, caso em que serão obrigados a trazer à colação, ainda que não o hajam
herdado, o que os pais teriam de conferir (art. 2009, CC).
As doações remuneratórias de serviços feitos ao ascendente também não estão sujeitas
a colação (art. 2.011, CC).
Quando estudamos a herança legítima, vimos que quando o autor da herança deixa
herdeiros necessários, não poderá haver disposição dos bens para além da parte disponível. É
que, também como vimos, a legítima é protegida pela lei. Assim é que, em caso de disposição
que exceda a legítima, será necessário proceder à redução.
Em outras palavras, havendo doação que exceda à parte disponível, tratar-se-á de
doação inoficiosa, sujeita à redução. Perceba que a redução difere-se da colação, já que nesta
490
493
última, o bem é devolvido pelos herdeiros para fins de recálculo para igualar a legítima. Na
redução, vislumbra-se uma doação que excede o que o doador poderia fazer quando da
liberalidade.
O art. 549 do CC estabelece que é nula a doação inoficiosa na parte que exceder, pelo
doador aquilo que, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.
Pela leitura do art. 2.007, §1º, CC, temos que o excesso será apurado considerando os
valores dos bens doados no momento da liberalidade. Já o §2º do mesmo artigo diz que a
redução da liberalidade far-se-á pela restituição ao monte do excesso assim apurado; a
restituição será em espécie, ou, se não mais existir o bem em poder do donatário, em dinheiro,
segundo o seu valor ao tempo da abertura da sucessão, observadas, no que forem aplicáveis, as
regras deste Código sobre a redução das disposições testamentárias.
É importante destacar a regra do artigo 2.008, CC, segundo o qual aquele que renunciou
a herança ou dela foi excluído, deve, não obstante, conferir as doações recebidas, para o fim de
repor o que exceder o disponível.
5.8. PARTILHA
491
494
- Prevenção de litígios futuros (mediação ou conciliação): a qualquer momento é
possível que as partes se valham de mediação ou conciliação para facilitar a partilha. Se estiver
ocorrendo uma dificuldade, será tentada uma conciliação ou mediação.
- Máxima comodidade dos coerdeiros do cônjuge ou do companheiro: na verdade, o
art. 649 do NCPC estabelece que se o bem for susceptível de uma divisão cômoda, será feita
dessa forma. Ex.: há um terreno de 1500 metros, podendo ser fracionado em 3 terrenos de 500
metros para cada herdeiro. Diante disso, será feito dessa forma, pois é mais cômoda a divisão.
Se não for suscetível de uma divisão cômoda, que não couberem na parte do cônjuge ou do
companheiro, ou no quinhão de um só dos herdeiros, esses bens serão licitados entre os
interessados, ou ainda serão vendidos judicialmente. A ideia é de que serão vendidos os bens e
os valores serão partilhados, já que não pode haver uma divisão cômoda dos bens, salvo se
houver um acordo sobre o condomínio do bem, situação em que o bem será atribuído a todos.
Em consonância com a proteção conferida pelo Código Civil ao nascituro, o art. 650 do
NCPC estabelece que, se um dos interessados for nascituro, o quinhão que cabe a ele será
reservado em poder do inventariante até o seu nascimento. Caso não nasça, será redistribuído
o bem entre os herdeiros.
Recorde-se que, quanto ao início da personalidade, muito embora ainda haja
divergências quanto à teoria adotada pelo Código Civil (teoria natalista ou concepcionista), certo
é que a lei põe a salvo os direitos do nascituro, de forma que o mencionado artigo 650 do NCPC
reforça essa proteção, que, entretanto, fica na dependência do nascimento com vida. Se não
nascer com vida, não há transmissão.
O art. 661 do NCPC trata da figura do partidor, que nada mais é que o agente responsável
pela organização da partilha. Trata-se de servidor do Poder Judiciário, que organizará o esboço
da partilha, de acordo com aquilo que foi decidido pelo juiz. No entanto, o partidor deverá
observar uma ordem estabelecida pelo artigo 651, o qual reza que o partidor organizará o
esboço da partilha de acordo com a decisão judicial, observando nos pagamentos a seguinte
ordem:
“I - dívidas atendidas; II - meação do cônjuge; III - meação disponível; IV - quinhões
hereditários, a começar pelo coerdeiro mais velho.”
Feito o esboço, as partes irão se manifestar no prazo comum de 15 dias. Eventuais
reclamações serão resolvidas, situação em que a partilha será lançada nos autos.
Em seguida, é pago o ITCMD, sendo juntada aos autos a certidão negativa de dívida para
com a Fazenda Pública, julgando o juiz a partilha por sentença homologatória, conforme art.
664, caput, NCPC.
Transitada em julgado essa sentença, o herdeiro receberá os bens que lhe tocarem e
receberá um formal de partilha, do qual deverá constar as seguintes peças:
“I - termo de inventariante e título de herdeiros; II - avaliação dos bens que constituíram
o quinhão do herdeiro; III - pagamento do quinhão hereditário; IV - quitação dos impostos; V -
sentença.”
Para fins de registro da aquisição da propriedade do imóvel junto ao Cartório de Registro
de Imóvel, esse formal de partilha é fundamental.
O formal de partilha poderá ser substituído eventualmente por uma certidão de
pagamento de quinhão hereditário, desde que o quinhão hereditário não exceda o valor de 5
vezes o salário mínimo.
c) Partilha em vida: é uma partilha feita pelo ascendente a descendente por atos inter
vivos ou por ato de última vontade, podendo ser total ou parcial, desde que se respeite os
492
495
parâmetros legais. Falando sobre o tema, Flávio Tartuce ensina que “essa constitui a forma de
partilha feita por ascendente a descendentes que por ato inter vivos ou de última vontade,
abrangendo os seus bens de forma total ou parcial, desde que respeitados os parâmetros legais,
caso da reserva da legítima (art. 2.018 do CC/2002). (TARTUCE, 2020, p. 2.446).
Citando Zeno Veloso, Tartuce complementa seu estudo sobre a partilha em vida,
invocando a classificação feita Veloso para o qual:
O art. 2.027/CC diz que a partilha é anulável pelos mesmos vícios e defeitos que vão
invalidar os negócios jurídicos em geral. O parágrafo único do mesmo artigo estabelece que esse
direito de anulação da partilha decai no prazo de 1 ano.
493
496
Nessa mesma linha, o artigo 658, do NCPC, trata das hipóteses em que a partilha julgada
por sentença será rescindível, a saber:
“I - nos casos mencionados no art. 657 do NCPC (partilha amigável); II - se feita com
preterição de formalidades legais; III - se preteriu herdeiro ou incluiu quem não o seja.”
Em sendo amigável a partilha, diz o art. 657, do NCPC, que poderá ser anulada por dolo,
coação, erro essencial ou intervenção de incapaz. Esse direito à anulação de partilha amigável
extingue-se em 1 (um) ano, contado esse prazo:
“I - no caso de coação, do dia em que ela cessou; II - no caso de erro ou dolo, do dia em
que se realizou o ato; III - quanto ao incapaz, do dia em que cessar a incapacidade.”
Sobre o prazo para ser requerida a anulação da partilha com preterição a herdeiro,
Flávio Tartuce adverte que
a única ressalva que deve ser feita é que o jurista, ao lado de outros e da posição
largamente prevalecente, defende a aplicação da regra geral dos prazos de
prescrição, que antes era de vinte anos (art. 177 do CC/1916), e agora é de dez anos
(art. 205 do CC/2002). Nessa linha, aliás, do Superior Tribunal de Justiça e por todos:
“Regimental. Inventário. Partilha. Anulação. Vintenário. Precedentes. Súmula 07. É
de vinte anos o prazo para o herdeiro que não participou da partilha pedir sua
anulação em juízo” (STJ, AgRg no Ag 719.924/RJ, 3.ª Turma, Rel. Min. Humberto
Gomes de Barros, j. 20.04.2006, DJ 15.05.2006, p. 205) (TARTUCE, 2020, p. 2.453).
Para o autor, então, o prazo para que o herdeiro excluído proponha a anulação da
partilha em juízo é de 10 anos.
494
497
definição precisa dos seus termos) ou haja a expressa autorização do juízo
competente (ao constatar que inexistem discussões incidentais que não
possam ser dirimidas na via administrativa). A mens legis que autorizou o
inventário extrajudicial foi justamente a de desafogar o Judiciário, afastando a
via judicial de processos nos quais não se necessita da chancela judicial,
assegurando solução mais célere e efetiva em relação ao interesse das partes.
Deveras, o processo deve ser um meio, e não um entrave, para a realização do
direito. Se a via judicial é prescindível, não há razoabilidade em proibir, na
ausência de conflito de interesses, que herdeiros, maiores e capazes,
socorram-se da via administrativa para dar efetividade a um testamento já
tido como válido pela Justiça. REsp 1.808.767-RJ, Rel. Min. Luis Felipe
Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2019, DJe
03/12/2019 (INF. 633).
QUESTÕES
495
498
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
2- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – O prêmio de loteria, recebido por ex-companheiro septuagenário durante a relação de união
estável, deve ser objeto de meação entre o casal em caso de dissolução do relacionamento.
II – De acordo com o entendimento prevalente, o casal deve formular pedido extrajudicial antes
de ingressar com ação judicial pedindo a conversão da união estável em casamento
III – No sistema constitucional vigente, é inconstitucional a diferenciação de regimes sucessórios
entre cônjuges e companheiros, devendo ser aplicado, em ambos os casos, o regime
estabelecido no art. 1.829 do Código Civil.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
3- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – Ainda que casado sob o regime da separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente
é herdeiro necessário e concorre com os descendentes.
II – Nas ações de divórcio e de dissolução da união estável, a regra deve ser o julgamento parcial
do mérito (art. 356 do Novo CPC),2 para que seja decretado o fim da conjugalidade, seguindo a
demanda com a discussão de outros temas.
III – Em pacto antenupcial ou contrato de convivência podem ser celebrados negócios jurídicos
processuais.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
4- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – Na dissolução de união estável, não é possível a partilha dos direitos de concessão de uso
para moradia de imóvel público.
II – O benefício de previdência privada fechada entra na partilha em dissolução de união estável
regida pela comunhão parcial de bens.
III – O bem imóvel adquirido a título oneroso na constância da união estável regida pelo estatuto
da comunhão parcial, mas recebido individualmente por um dos companheiros, através de
doação pura e simples realizada pelo outro, deve ser incluído no monte partilhável.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
5- Assinale a alternativa INCORRETA de acordo com as disposições do Código Civil
a) As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e
assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.
b) Mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil, a união estável poderá
converter-se em casamento.
c) Salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais na união
estável, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
d) As causas suspensivas do casamento impedirão a caracterização da união estável.
496
499
6- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – É de quatro anos o prazo de decadência para anular partilha de bens em dissolução de união
estável, por vício de consentimento.
II – É válido, desde que escrito, o pacto de convivência formulado pelo casal no qual se opta pela
adoção da regulação patrimonial da futura relação como igual ao regime de comunhão
universal, desde que tenha sido feito por meio de escritura pública.
III – Não é lícito aos conviventes atribuírem efeitos retroativos ao contrato de união estável, a
fim de eleger o regime de bens aplicável ao período de convivência anterior à sua assinatura.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
7- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – O fato de namorados projetarem constituir família no futuro não caracteriza união estável,
ainda que haja coabitação.
II – A invalidação da alienação de imóvel comum, fundada na falta de consentimento do
companheiro, dependerá da publicidade conferida à união estável, mediante a averbação de
contrato de convivência ou da decisão declaratória da existência de união estável no Ofício do
Registro de Imóveis em que cadastrados os bens comuns, ou da demonstração de má-fé do
adquirente.
III – Na hipótese de dissolução de união estável subordinada ao regime da comunhão parcial de
bens, não deve integrar o patrimônio comum, a ser partilhado entre os companheiros, a
valorização patrimonial das cotas sociais de sociedade limitada adquiridas antes do início do
período de convivência do casal.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
8- Com relação à União Estável, assinale a alternativa INCORRETA nos termos do Código Civil.
a) Não se constituirá a união estável se ocorrerem os impedimentos para o casamento, salvo no
caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.
b) Constituem união estável as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos
de casar.
c) Obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação
dos filhos as relações pessoais entre os companheiros.
d) É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada
na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de
família.
9- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – Não há hierarquia entre casamento e união estável, sendo apenas entidades familiares
diferentes, que contam com a proteção constitucional.
II – São considerados elementos essenciais para a constituição da união estável: a publicidade,
a continuidade, a estabilidade e o objetivo de constituição de família.
III – A lei não exige prazo mínimo para a sua constituição da união estável, devendo ser
analisadas as circunstâncias do caso concreto.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
497
500
10- Analise as assertivas abaixo e assinale a alternativa CORRETA.
I – Para o reconhecimento da união estável exige-se que os companheiros ou conviventes vivam
sob o mesmo teto.
II – Não há qualquer requisito formal obrigatório para que a união estável reste configurada,
como necessidade de elaboração de uma escritura pública entre as partes ou de uma decisão
judicial de reconhecimento.
III – Os impedimentos matrimoniais previstos impedem a caracterização da união estável,
havendo, na hipótese, concubinato, mas o Código Civil passou a admitir que a pessoa casada,
desde que separada de fato ou judicialmente constitua união estável.
a) Todas estão corretas.
b) Apenas I e II estão corretas.
c) Apenas I e III estão corretas.
d) Apenas II e III estão corretas.
e) Todas estão incorretas.
COMENTÁRIOS
1. Gabarito: B
I – CORRETA – De acordo com o Enunciado 03 do IBDFAM - Em face do princípio da igualdade
das entidades familiares, é inconstitucional o tratamento discriminatório conferido ao cônjuge
e ao companheiro.
II – CORRETA – De acordo com o Enunciado 11 do IBDFAM- Na ação destinada a dissolver o
casamento ou a união estável, pode o juiz disciplinar a custódia compartilhada do animal de
estimação do casal.
III – INCORRETA – Segundo o Enunciado 04 do IBDFAM - A constituição de entidade familiar
paralela pode gerar efeito jurídico.
http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfam/enunciados-ibdfam
2. Gabarito: C
I – CORRETA – De acordo com o entendimento jurisprudencial:
498
501
ou despesa anterior" (CC/1916, art. 271, II; CC/2002, art. 1.660, II). 5. Na hipótese, o
prêmio da lotomania, recebido pelo ex-companheiro, sexagenário, deve ser objeto
de partilha, haja vista que: i) se trata de bem comum que ingressa no patrimônio do
casal, independentemente da aferição do esforço de cada um; ii) foi o próprio
legislador quem estabeleceu a referida comunicabilidade; iii) como se trata de
regime obrigatório imposto pela norma, permitir a comunhão dos aquestos acaba
sendo a melhor forma de se realizar maior justiça social e tratamento igualitário,
tendo em vista que o referido regime não adveio da vontade livre e expressa das
partes; iv) a partilha dos referidos ganhos com a loteria não ofenderia o desiderato
da lei, já que o prêmio foi ganho durante a relação, não havendo falar em matrimônio
realizado por interesse ou em união meramente especulativa. 6. Recurso especial
parcialmente provido. (REsp 1689152/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe 22/11/2017)
499
502
CC/2002”. (RE 646721, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:
Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2017, ACÓRDÃO
ELETRÔNICO DJe-204 DIVULG 08-09-2017 PUBLIC 11-09-2017)
3. Gabarito: A
I – CORRETA – De acordo com o Enunciado 15 IBDFAM: “Ainda que casado sob o regime da
separação convencional de bens, o cônjuge sobrevivente é herdeiro necessário e concorre com
os descendentes.”
II – CORRETA – De acordo com o Enunciado 18 IBDFAM: “Nas ações de divórcio e de dissolução
da união estável, a regra deve ser o julgamento parcial do mérito (art. 356 do Novo CPC),2 para
que seja decretado o fim da conjugalidade, seguindo a demanda com a discussão de outros
temas.”
III – CORRETA – De acordo com o Enunciado 24 IBDFAM: “Em pacto antenupcial ou contrato de
convivência podem ser celebrados negócios jurídicos processuais.”
500
503
http://www.ibdfam.org.br/conheca-o-ibdfam/enunciados-ibdfam
4. Gabarito: E
I – INCORRETA – De acordo com a jurisprudência:
501
504
III – INCORRETA – De acordo com entendimento do STJ:
5. Gabarito: D
a) CORRETA, segundo o art. 1.724, CC: “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão
aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”
b) CORRETA, segundo o art. 1.726, CC: “A união estável poderá converter-se em casamento,
mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil.”
c) CORRETA, segundo o art. 1.725., CC: “Na união estável, salvo contrato escrito entre os
companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial
de bens.”
d) INCORRETA, segundo o art. 1723, § 2º, CC: “As causas suspensivas do art. 1.523 não impedirão
a caracterização da união estável.”
6. Gabarito: C
I – CORRETA – De acordo com o STJ:
502
505
II – INCORRETA – De acordo com a jurisprudência do STJ, não é exigível escritura pública:
503
506
II, 104, 145 e 171 do CC/02 atrai a incidência da Súmula nº 284 do STF. 5. Apesar do
inciso II do art. 1.641 do CC/02 impor o regime da separação obrigatória de bens
somente no casamento da pessoa maior de 60 anos (70 anos após a vigência da Lei
nº 12.344/2010), a jurisprudência desta egrégia Corte Superior estendeu essa
limitação à união estável quando ao menos um dos companheiros contar tal idade à
época do início do relacionamento, o que não é o caso. Precedentes. 6. O fato do
convivente ter celebrado acordo com mais de sessenta anos de idade não torna nulo
contrato de convivência, pois os ex-companheiros, livre e espontaneamente,
convencionaram que as relações patrimoniais seriam regidas pelo regime da
separação total de bens, que se assemelha ao regime de separação de bens.
Observância do disposto no inciso II do art. 1.641 do CC/02. 7. A jurisprudência desta
Corte firmou o entendimento de que o apelo nobre não constitui via adequada para
análise de eventual ofensa a enunciado sumular por não estar ele compreendido na
expressão "lei federal" constante da alínea a do inciso III do art. 105 da CF.
Precedentes. Some-se o fato da ausência de demonstração e comprovação do
dissídio jurisprudencial na forma legal exigida. 8. No curso do período de
convivência, não é lícito aos conviventes atribuírem por contrato efeitos retroativos
à união estável elegendo o regime de bens para a sociedade de fato, pois, assim, se
estar-se-ia conferindo mais benefícios à união estável que ao casamento. 9. Recursos
especiais não providos. (REsp 1383624/MG, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 12/06/2015)
7. Gabarito: A
I – CORRETA – De acordo com o STJ:
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proclamação, para o futuro, da intenção de constituir uma família. É mais
abrangente. Esta deve se afigurar presente durante toda a convivência, a partir do
efetivo compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material entre os
companheiros. É dizer: a família deve, de fato, restar constituída. 2.2. Tampouco a
coabitação, por si, evidencia a constituição de uma união estável (ainda que possa
vir a constituir, no mais das vezes, um relevante indício), especialmente se
considerada a particularidade dos autos, em que as partes, por contingências e
interesses particulares (ele, a trabalho; ela, pelo estudo) foram, em momentos
distintos, para o exterior, e, como namorados que eram, não hesitaram em residir
conjuntamente. Este comportamento, é certo, revela-se absolutamente usual nos
tempos atuais, impondo-se ao Direito, longe das críticas e dos estigmas, adequar-se
à realidade social. 3. Da análise acurada dos autos, tem-se que as partes litigantes,
no período imediatamente anterior à celebração de seu matrimônio (de janeiro de
2004 a setembro de 2006), não vivenciaram uma união estável, mas sim um namoro
qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento projetaram
para o futuro - e não para o presente -, o propósito de constituir uma entidade
familiar, desiderato que, posteriormente, veio a ser concretizado com o casamento.
4. Afigura-se relevante anotar que as partes, embora pudessem, não se valeram, tal
como sugere a demandante, em sua petição inicial, do instituto da conversão da
união estável em casamento, previsto no art. 1.726 do Código Civil. Não se trata de
renúncia como, impropriamente, entendeu o voto condutor que julgou o recurso de
apelação na origem. Cuida-se, na verdade, de clara manifestação de vontade das
partes de, a partir do casamento, e não antes, constituir a sua própria família. A
celebração do casamento, com a eleição do regime de comunhão parcial de bens, na
hipótese dos autos, bem explicita o termo a partir do qual os então
namorados/noivos, maduros que eram, entenderam por bem consolidar, consciente
e voluntariamente, a relação amorosa vivenciada para constituir, efetivamente, um
núcleo familiar, bem como comunicar o patrimônio haurido. A cronologia do
relacionamento pode ser assim resumida: namoro, noivado e casamento. E, como é
de sabença, não há repercussão patrimonial decorrente das duas primeiras espécies
de relacionamento. 4.1 No contexto dos autos, inviável o reconhecimento da união
estável compreendida, basicamente, nos dois anos anteriores ao casamento, para o
único fim de comunicar o bem então adquirido exclusivamente pelo requerido. Aliás,
a aquisição de apartamento, ainda que tenha se destinado à residência dos então
namorados, integrou, inequivocamente, o projeto do casal de, num futuro próximo,
constituir efetivamente a família por meio do casamento. Daí, entretanto, não
advém à namorada/noiva direito à meação do referido bem. 5. Recurso especial
provido, na parte conhecida. Recurso especial adesivo prejudicado. (REsp
1454643/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em
03/03/2015, DJe 10/03/2015)
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comum, realizada sem o consentimento do companheiro, dependerá da publicidade
conferida a união estável mediante a averbação de contrato de convivência ou da
decisão declaratória da existência união estável no Ofício do Registro de Imóveis em
que cadastrados os bens comuns, ou pela demonstração de má-fé do adquirente. 5.
Hipótese dos autos em que não há qualquer registro no álbum imobiliário em que
inscrito o imóvel objeto de alienação em relação a co-propriedade ou mesmo à
existência de união estável, devendo-se preservar os interesses do adquirente de
boa-fé, conforme reconhecido pelas instâncias de origem. 6. RECURSO ESPECIAL A
QUE SE NEGA PROVIMENTO. (REsp 1424275/MT, Rel. Ministro PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2014, DJe 16/12/2014)
8. Gabarito: B
a) CORRETA, segundo o art. 1723§ 1º, CC: “A união estável não se constituirá se ocorrerem os
impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa
casada se achar separada de fato ou judicialmente.”
b) INCORRETA, segundo o art. 1.727, CC: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher,
impedidos de casar, constituem concubinato.”
c) CORRETA, segundo o art. 1.724, CC: “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão
aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”
d) CORRETA, segundo o art. 1.723, CC: “É reconhecida como entidade familiar a união estável
entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e
estabelecida com o objetivo de constituição de família.”
9. Gabarito: A
I – CORRETA – De acordo com Tartuce:
Qualquer estudo da união estável deve ter como ponto de partida a CF/1988, que
reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
prevendo que a lei deve facilitar a sua conversão em casamento. Duas conclusões
fundamentais poderiam ser retiradas do Texto Maior. A primeira é que a união
estável não seria igual ao casamento, eis que categorias iguais não podem ser
convertidas uma na outra. A segunda é que não há hierarquia entre casamento e
união estável. São apenas entidades familiares diferentes, que contam com a
proteção constitucional.
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A lei não exige prazo mínimo para a sua constituição, devendo ser analisadas as
circunstâncias do caso concreto (nesse sentido: TJSP, Apelação com Revisão
570.520.5/4, Acórdão 3543935, São Paulo, 9.ª Câmara de Direito Público, Rel. Des.
Rebouças de Carvalho, j. 04.03.2009, DJESP 30.04.2009).
Tartuce, Flávio. Manual de direito civil : volume único. – 8. ed. rev, atual. eampl. –
Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018, p. 1295 e 1297.
10. Gabarito: D
I – INCORRETA – Segundo a doutrina:
Não se exige que os companheiros ou conviventes vivam sob o mesmo teto, o que
consta da remota Súmula 382 do STF, que trata do concubinato e que era aplicada à
união estável. A jurisprudência atual continua aplicando essa súmula (por todos: STJ,
REsp 275.839/SP, 3.ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, Rel. p/ Acórdão Min. Nancy
Andrighi, j. 02.10.2008, DJe 23.10.2008). No mesmo sentido, estabelece a premissa
2, publicada na Edição 50 da ferramenta Jurisprudência em Teses, que “A coabitação
não é elemento indispensável à caracterização da união estável”.
Não há qualquer requisito formal obrigatório para que a união estável reste
configurada, como necessidade de elaboração de uma escritura pública entre as
partes ou de uma decisão judicial de reconhecimento. A propósito, em importante
precedente, entendeu o Ministro Luís Roberto Barroso, do STF, que “não constitui
requisito legal para concessão de pensão por morte à companheira que a união
estável seja declarada judicialmente, mesmo que vigente formalmente o casamento,
de modo que não é dado à Administração Pública negar o benefício com base neste
fundamento. (...). Embora uma decisão judicial pudesse conferir maior segurança
jurídica, não se deve obrigar alguém a ir ao Judiciário desnecessariamente, por mera
conveniência administrativa. O companheiro já enfrenta uma série de obstáculos
decorrentes da informalidade de sua situação. Se ao final a prova produzida é
idônea, não há como deixar de reconhecer a união estável e os direitos daí
decorrentes” (Supremo Tribunal Federal, julgamento do Mandado de Segurança
330.008, originário do Distrito Federal, em 3 de maio de 2016).
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Tartuce, Flávio. Manual de direito civil : volume único. – 8. ed. rev, atual. eampl. –
Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018, p. 1297/1298.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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