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Guerra e Paz

Conflitos estiveram sempre presentes na nossa vida desde o início da história humana, por esse mesmo
motivo é que a existência de guerras e a sua declaração são planeadas cautelosamente. A 2ª Guerra
Mundial é o exemplo mais recente e massivo das consequências de uma guerra, da exigência de recursos e
esforço mental, daí a moralidade da guerra ser posta em causa. Karl Von Clausewitz define a guerra como
“a continuação da política por outros meios”, mas uma das maneiras filosóficas mais conhecidas para
definir o termo “guerra” é dada por Hugo Grócio, que a define como uma situação em que os indivíduos
resolvem as suas controvérsias através da violência. Esta definição revela três elementos essenciais da
guerra: o de estado de relação entre identidades, o de resolução de conflitos e o de dimensão violenta.
Como seres humanos, temos competências para organizar as nossas relações, fazendo uso da guerra e de
qualquer outro tipo de violência estrutural, cultural ou simbólica, que suponha a marginalização, exclusão
e morte de uns seres humanos pela mão de outros e a degradação do ambiente. A análise filosófica da
guerra examina-a do ponto de vista moral , perguntando não as suas causas, mas sim a possibilidade da
existência de uma justificação moral que trave um conflito.

Neste trabalho pretende-se definir a guerra como moral ou imoral. Devemos primeiro saber como se
classifica algo como moral ou imoral: algo moral é algo que está de acordo com bons costumes e regras
propostas por determinadas doutrinas e condições; algo imoral é algo que contraria as regras e costumes
da moralidade. Algumas pessoas acreditam que a guerra faz parte da biologia humana, que existe uma
necessidade de competir por território e que, portanto, é inevitável e até necessária. Outras pessoas não
acreditam em recorrer à violência para resolver problemas e veem a guerra como algo contornável e
opcional. No entanto não é fácil determinar se a guerra é moral ou imoral sendo criadas
consequentemente 3 teorias sobre a sua moralidade: realismo, pacifismo e a teoria da guerra justa.

 Guerra justa

As regras da guerra justa enquadram-se nos dois amplos princípios da discriminação e da


proporcionalidade. O princípio da discriminação diz respeito a quem constitui um alvo de guerra legítimo,
ao passo que o princípio da proporcionalidade relaciona-se com a quantidade de força que é moralmente
apropriada. Uma importante implicação do facto de constituírem para os teóricos da guerra justa um tema
de análise separado é que uma nação que combate com base numa causa injusta pode ainda assim
combater com justiça ou vice versa. Pode acrescentar-se um terceiro princípio aos dois tradicionais, a
saber, o princípio da responsabilidade, que exige que se examine de quem é a responsabilidade na guerra.

É considerado desleal e injusto iniciar uma guerra atacando indiscriminadamente, uma vez que se estima
que os não-combatentes ou os inocentes estão fora do campo da guerra. A sua imunidade à guerra pode
ser inferida do facto de a sua existência e atividade não fazer parte da essência da guerra, que é matar os
combatentes. Uma vez que matar é em si mesmo altamente problemático, a Teoria da Guerra Justa tem,
antes de mais nada, de dar uma razão para os combatentes constituírem alvos legítimos e dizer se o seu
estatuto altera conforme estejam a combater numa disputa justa ou injusta.

Em primeiro lugar, uma teoria pode sustentar que ser treinado e/ou armado constitui uma ameaça
suficiente para os combatentes do outro lado. Os voluntaristas podem invocar a analogia do ring de boxe:
não é moralmente aceitável numa comunidade civilizada que se esmurre outra pessoa, mas aqueles que
voluntariamente entram num ring de boxe renunciam ao seu direito de não serem atingidos.
Analogamente, aqueles que se juntam a um exército renunciam aos seus direitos de não serem alvejados
na guerra. Contudo, uma vez que os civis também podem aceitar as suas próprias mortes, o seu argumento
não é suficiente para defender o princípio da separação. As análises baseadas nos direitos são mais
produtivas, em particular as que incidem na renúncia de direitos por combatentes em virtude do seu
estatuto de guerra, deixando a esfera da imunidade para os civis.

A doutrina do duplo efeito fornece uma justificação para a morte de civis durante a guerra, desde que as
suas mortes não sejam intencionais, mas sim acidentais. Os civis são tanto quanto os combatentes
condições causais da máquina de guerra , portanto, não há distinção moral entre alvejar um combatente
armado e um civil que arma ou alimenta um combatente. Contudo, a distinção não é eliminada pela
natureza das economias modernas, uma vez que um combatente continua a ser uma entidade muito
diferente de um não-combatente, mais que não seja pela simples razão que o primeiro está
presentemente armado, enquanto que o civil não. Por outro lado, pode-se argumentar que ser civil não
significa necessariamente que não se seja uma ameaça e por isso que não se seja um alvo legítimo. As
questões subjacentes com que a análise ética tem de lidar envolvem a natureza lógica da cumplicidade
individual ou a ajuda e cooperação com a máquina de guerra, sendo imposto um maior peso àqueles que
estão logicamente mais próximos da máquina de guerra no seu trabalho.

Embora a consideração da discriminação se concentre em quem é um alvo de guerra legítimo, o princípio


da proporcionalidade lida com o tipo de força que é moralmente permissível. É possível violar a moralidade
ao combater uma guerra justa na qual apenas alvos militares são atacados, empregando uma força
desproporcional contra um inimigo. Os princípios da proporcionalidade e da discriminação visam moderar
a violência e o alcance da guerra.

 Pacifismo

O pacifismo, ao contrário do realismo, não separa a ética da guerra. Segundo o ponto de vista realista, a
guerra justifica-se quando serve o interesse nacional, não se justifica quando é contra o interesse nacional.
Os interesses dos outros estados e nações são considerados em larga medida irrelevantes. Mas, tal como
os indivíduos não podem normalmente ignorar os interesses dos outros indivíduos, também os estados
têm de dar alguma importância aos interesses dos outros estados (ou, antes, aos interesses das pessoas
dos outros estados). Contudo, não parece plausível supor que os estados têm de ser totalmente imparciais,
dando tanta importância aos interesses das pessoas dos outros estados como dão aos interesses dos seus
próprios cidadãos. Determinar em que condições e até que ponto um estado tem o direito de dar
prioridade aos seus próprios interesses e preocupações sobre os dos outros estados ou grupos nacionais
continua a ser um problema por resolver em teoria moral. Algumas formas de parcialidade parecem-nos
moralmente justificadas. Por exemplo, aos pais não só se permite, mas exige-se que sejam parciais, pelo
menos em relação a algumas coisas, a favor dos seus próprios filhos. Mas outras formas de parcialidade,
como favorecer os interesses dos membros da sua própria raça, são moralmente arbitrárias. Parece que o
nacionalismo e o patriotismo são em alguns aspetos análogos à lealdade familiar, mas noutros análogos ao
racismo. Uma investigação mais profunda destas analogias pode ajudar a iluminar o problema de
determinar o alcance e os limites da parcialidade nacional justificada.

A maior parte das pessoas acredita que a justificabilidade da guerra depende, não só de considerações
sobre consequências reais ou esperadas, mas também daquilo a que frequentemente se chama questões
de princípio. Deste ponto de vista, a correção ou incorreção de um ato pode ser, pelo menos em parte,
uma função da natureza intrínseca do próprio ato, que é independente das suas consequências. Algumas
pessoas (chamadas “absolutistas”) acreditam até que, há certos atos que, simplesmente devido ao seu
género, nunca podem ter justificação. Chama-se pacifistas às pessoas que são absolutistas a respeito de
atos de guerra. Os pacifistas consideram em geral que a guerra está dentro da esfera moral, mas o
problema está que, no seu ponto de vista, nenhuma guerra pode ser moralmente justificada. Acreditam
que nunca é legítimo fazer a guerra.

Embora quase toda a gente acredite que há uma forte presunção contra a violência e o matar que ocorrem
na guerra, os pacifistas diferem da maior parte de nós na sua crença em que esta presunção não pode ser
superada, que o desafio de fornecer uma justificação moral para a guerra nunca pode ser satisfeito.

O pacifismo moderno é de dois tipos, consequencialista e deontologista. O pacifismo consequencialista


baseia-se normalmente na alegação que os benefícios da guerra nunca superam os seus malefícios,
enquanto que o pacifismo deontologista parte da ideia de que a guerra é intrinsecamente errada porque
viola deveres absolutos como o de não matar seres humanos.

 Realismo

O realismo é uma teoria muito debatida entre os cientistas políticos. Os diversos filósofos da área (como
Thomas Hobbes, Maquiavel e Hans Joachim) consideram a política internacional uma anarquia, onde os
homens vivem sem autoridade máxima sendo incapazes de impor ordem. Aqui cada um é responsável pela
sua própria preservação, e como a ideologia da busca do poder absoluto e do domínio de algo para manter
a sua integridade é compartilhada por todos, ocorre uma disputa constante pelo poder. O realismo
sustenta a opinião de que o mundo físico existe independentemente do pensamento e da perceção
humana e apenas considera como válidas as variáveis políticas (diplomáticas e militar-estratégicas).

Esta teoria acredita que não existe moralidade na guerra e separa a ética desta (ao contrário do pacifismo),
considerando a moralidade um fator irrelevante para julgar uma guerra.

O realismo opera sob a suposição de que os estados são os únicos agentes na política (estatismo/
individualismo) - o interesse do estado encontra-se acima de tudo e de todos. Adicionalmente, os
indivíduos ,na busca de poderio, acabariam por se organizar em estados que também agiriam em prol do
próprio interesse nacional.

 Como é que o realismo auxilia na explicação da guerra?

Esta teoria oferece-nos uma explicação cínica, dizendo-nos que estamos destinados a guerras salariais e
que é considerada uma luta pelo poder e pela sobrevivência por todos os políticos. As guerras podem ser
lutadas para proteger ou para expandir a segurança dos estados (ambos o agressor e o atacado podem
lutar para proteger a sua segurança - um pode defender o seu território diretamente e outro pode fazer
isso através da eliminação de uma ameaça, para os seus interesses ou para o seu território, que o outro
possui)

Um exemplo claro pode ser a Segunda Guerra Mundial e os eventos que precedem à “explosão” da guerra.
A violação da Tratado de Versalhes, a anexação político-militar da Áustria e a incorporação dos Alemães
dos Sudetos podem ser entendidas como formas diretas de sustentar a sobrevivência da Alemanha como
um estado. Começar uma guerra com a Polónia e a Europa Ocidental deve ser encarado simplesmente
como um movimento ideológico, embora a Operação Barbarossa (guerra com a Rússia) tenha tido como
objetivo assegurar os recursos de petróleo em Baku e Cáucaso.

A referência à lei do comportamento humano é provavelmente um dos argumentos mais fortes dos
realistas. É indiscutível que na história da espécie humana existiram diversos líderes ou generais que
lutaram batalhas pelo único propósito de alimentar as suas ambições pessoais (Alexandre, O Grande; Júlio
César; Napoleão Bonaparte; Adolf Hitler e Benito Mussolini). Assim o realismo aparenta ser uma teoria
factível e plausível.

O cinismo do realismo vem da suposição de que a guerra é inevitável e é um elemento constante na nossa
natureza, enquanto que as ideias e ideologias são irrelevantes. Podemos sentirmo-nos insultados por esta
visão e mesmo que seja Alexandre, O Grande chamar os seus soldados para lutar pela Grécia; ou Átila, o
Huno persuadir os seus soldados para saquearem as cidades da Roma Ocidental e Oriental – uma coisa
permanece constante – nós combatemos guerras. Portanto mesmo que haja um desenvolvimento no
pensamento humano, as verdadeiras intenções permanecem as mesmas ao longo dos anos, e as guerras
continuam como extensões da política. É difícil não apreciar o realismo e a sua consideração para com a
guerra, visto que a história o favorece.

Conclusão

Revendo os argumentos apresentados, a perspetiva pacifista é o argumento mais correto a defender e,


como tal, a guerra deve ser considerada imoral. A ideia deste argumento consiste na defesa da não
recorrência a qualquer forma de violência ou guerra, independentemente das circunstâncias, e apela à
recorrência de meios não violentos como a mobilização de massas, mobilização de pressão, marchas e
protestos pacíficos, boicotes e greves para fazer a diferença. 
 Contudo, como o realismo, o pacifismo é uma posição difícil de sustentar. Embora não seja inaceitável
afirmar que o peso da justificação recai na pessoa que pretende ser legítimo fazer a guerra, a situação
muda no caso de certos usos da violência ao nível individual. Se sou vítima de um ataque injusto e
potencialmente letal, o peso da justificação não recai naqueles que acreditam que tenho o direito de usar a
violência para me defender, mas naqueles que o negam. Muitos pacifistas responderiam que o que
rejeitam é a guerra e não todos os usos da violência; por conseguinte, a autodefesa individual pode ter
justificação embora a guerra não a tenha. Contudo, é duvidoso que uma rejeição absoluta da guerra possa
ser coerentemente fundamentada em algo diferente de uma proibição absoluta de certos tipos de atos
necessariamente presentes na guerra (ex: violência e morte intencional). E qualquer proibição de certos
tipos de ação que rejeitam a guerra em todos os casos irá, quase de certeza, rejeitar o uso da violência na
autodefesa individual. De facto, a própria aceitação de atos individuais de autodefesa pode implicar a
aceitação em princípio de certos tipos de guerra, uma vez que certas guerras podem simplesmente
consistir, de um dos lados, no exercício coletivo de direitos individuais de autodefesa e não num conflito
armado como é normalmente generalizado.
Mesmo com contra-argumentos, o pacifismo é suportado por vários, incluindo Nelson Mandela, Madre
Teresa, Mahatma Gandhi e o Papa no mundo atual. Immanuel Kant é também conhecido como o apoiante
do pacifismo do tempo antigo e defende a paz perpétua (sendo esta, de acordo com Kant, possível com a
existência de empenho dos Estados), ideia ainda não concretizada no mundo de hoje. 

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