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Glissant
(...) não há lugar para passividade na Relação. Sempre que um indivíduo ou uma
comunidade se esforçam por nele definir o seu lugar, mesmo que este lhes seja
disputado, contribuem para mudar a mentalidade geral, para desalojar às regras já
estafadas dos antigos classicismos, permitindo novas <observações> do caos-
mundo.
O filósofo camaronês Achille Mbembe1 diz que a raça só existe <por aquilo que
nós vemos>. Para além < do que não vemos>, não existe raça. Com efeito, o poder
racial exprime-se no fato de aquele que escolhemos não ver nem ouvir não
pode existir ou falar por si só. Em última instância, é preciso fazê-lo calar-se.
Em todos estes casos, a sua palavra é indecifrável ou, no mínimo, desarticulada. É
preciso fazê-lo calar-se. Em todos esses casos, a sua palavra é indecifrável ou, no
mínimo, desarticulada. É preciso que outra pessoa fale em seu nome e no seu
lugar, para que o que ele pretende dizer faça sentido completamente sentido na
nossa língua. Como muito bem mostrou Fanon e, antes dele, W.E.B. Dubois, aquele
a quem foi retirada a faculdade de falar por si só é constrangido a pensar-se
sempre como um <intruso>, pelo menos a surgir na esfera social apenas como um
<problema>. (p. 193-194)
(...) pouco se discute, se é que se discute o modo com que as atitudes e os valores
das classes materialmente privilegiadas são impostos a todos por meio de
estratégias tendenciosas. Essas parcialidades, refletidas na escolha dos assuntos e
(...) No começo, não percebia que a classe era muito mais que a condição
econômica da pessoa, que determinava seus valores, seus pontos de vista e seus
interesses. Partia-se do princípio de que todo aluno pobre ou proveniente da classe
trabalhadora abandonaria de boa vontade todos os valores e hábitos associados à
sua origem. Os que tinham uma origem étnica/ racial diferente aprenderam que não
podiam dar voz a nenhum aspecto de sua cultura popular nos ambientes de elite.
Isso valia especialmente para o modo que não se coadunasse com as idéias e
maneirismo da classe privilegiada sempre colocava a pessoa no papel de intrusa.
(241).
(...) O antagonismo de classe pode ser usado construtivamente, não para reforçar a
noção de que os alunos e professores originários da classe trabalhadora são
“corpos estranhos” e “intrusos”, mas para subverter e desafiar a estrutura
existente.
Quando freqüentei meus primeiros cursos de Estudos da Mulher em Stanford, as
professoras brancas falavam das “mulheres” quando na verdade definiam como
norma a experiência das mulheres brancas materialmente privilegiadas. Para mim,
era questão de integridade pessoal e intelectual questionar esse pressuposto
tendencioso. Questionando-o, eu me negava a ser cúmplice do apagamento das
mulheres negras e/ou das de classe trabalhadora de todas as etnias.
Pessoalmente, isso significava que eu não conseguia simplesmente ficar sentada
ante a aula, curtindo as boas vibrações feministas- essa foi a perda. O ganho foi
que seu estava honrando a experiência das mulheres pobres e de classe
trabalhadora da minha família, daquela mesma comunidade que havia encorajado e
apoiado meu esforço para adquirir uma educação melhor. Embora minhas
intervenções não fossem acolhidas de boa vontade, elas criaram um contexto para
o pensamento crítico, para o intercâmbio dialético. (244)
Qualquer tentativa da parte de um aluno para criticar os preconceitos burgueses
que moldam o processo pedagógico, especialmente na medida em que têm
relação com as perspectivas epistemológicas (os pontos de vista a partir dos
quais a informação é partilhada), será vista na maioria dos casos, sem sombra de
dúvida, como negativa e perturbadora. Dada a suposta natureza radical ou liberal
das primeiras disciplinas acadêmicas feministas, foi chocante para mim descobrir
que também aqueles ambientes estavam freqüentemente fechados para maneiras
diferentes de pensar. (245).
“(...) Um novo colega, um branco, com quem eu conversava pela primeira vez, fez
uma invectiva ao simplesmente ouvir falar do meu seminário sobre Toni Morrison.
Destacou que Cantares de Salomão era uma versão piorada de Por quem os sinos
dobram, de Hemingway. Apaixonadamente hostil a Morrison e estudioso de
Heingaway, ele parecia estar manifestando a preocupação, tantas vezes repetida
de que as escritoras e pensadoras negras são imitações baratas de “grandes”
homens brancos. Como não queria, naquele momento, entrar nos assuntos
Desaprender o Colonialismo, Despojar-se do Racismo e Primeira Aula sobre
Sexismo, optei pela estratégia que havia aprendido num livro de autoajuda que
nega a existência do patriarcado institucionalizado, Mulheres que amam demais:
simplesmente disse “Ah”. Mais tarde, lhe garanti que leria Por quem os sinos
dobram de novo para ver se fazia a mesma relação. Ambos os incidentes,
aparentemente banais, revelam como é profundo o medo de que qualquer
descentralização das civilizações ocidentais , do cânone do homem branco, seja na
realidade um ato de genocídio cultural. Certas pessoas acham que todos os que
apóiam a diversidade cultural querem substituir uma ditadura do conhecimento
por outra, trocar um bloco de pensamento por outro. Talvez seja essa a
percepção mais errônea da diversidade cultural. Embora haja entre nós um
pessoal excessivamente zeloso que pretende substituir um conjunto de absolutos
por outro, mudando simplesmente o conteúdo essa perspectiva não representa
com precisão as visões progressistas de como o compromisso com a diversidade
cultural pode transformar construtivamente a academia. (página 49 -50)
(...) Muitos educadores nos estados Unido têm dificuldade para imaginar como
ficará a sala de aula quando se confrontarem com os dados demográficos que
indicam que “ser branco” pode deixar de ser a etnia normal em todos os níveis
educacionais. Logo, os educadores estão mal preparados quando confrontam
concretamente a diversidade. É por isso que muitos se aferram obstinadamente
aos velhos padrões. Trabalhando para criar estratégias de ensino que abrissem
espaço para o aprendizado multicultural, constatei a necessidade de reconhecer
aquilo que em outros textos de pedagogia chamei de diferentes “códigos culturais”.
(...) Muitas vezes , os professores e os alunos no contexto multicultural têm de
aprender a aceitar diferentes maneiras de conhecer, novas epistemológicas. (59)
Muniz Sodré situa a concepção de minoria inscrita na questão da voz. Diz o autor
que,
- minoria, portanto, não apenas como sujeito coletivo, mas como o lugar
operador de um fluxo de transformação que visa a novas identificações com
relação ao mundo do trabalho e das representações urbanas por meio do
trabalho cultural, esse tipo de trabalho que, muito mais do que o de natureza
econômica, revela o que somos como povo nacional.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Investigar... encontrar... refletir...buscar alternativas para ajudar na melhor formação do
professor de língua estrangeira foi o que moveu este estudo. Como docente num curso de
formação de professores, inquietações são constantes a esse respeito.
Sabemos que a formação do professor vai além da aprendizagem durante o período de
tempo do curso de licenciatura, uma vez que não podemos pensar que o aluno está pronto,
soube o que deveria saber para desempenhar a profissão. Na verdade, neste tempo, os
professores estão legalmente e institucionalmente habilitados para lecionar. Mas, sempre
há a falta em relação ao conhecimento, há a necessidade de aperfeiçoamento, do estudo e
da pesquisa constante, e isso não é apenas delegado pela ordem social. Muitos discursos
confirmam que a sociedade “exige”, está “desse jeito” e, por isso é que o professor (e não
só ele) precisa estar sempre se atualizando, continuando a sua formação. No entanto, é
necessário reconhecer que o ser humano é incompleto, é um ser sempre ávido de desejos.
Então, as vontades do próprio indivíduo e do meio onde se encontra determinam a natureza
da formação.
Partindo disso é que surge a questão que vai nortear este trabalho: em que os estudos da
enunciação feitos por Benveniste poderiam contribuir para a formação do profissional de
Letras, principalmente, na área do ensino de línguas (estrangeiras)? Trabalhando com
discurso e enunciação, essa inquietude é constante. Sendo assim, pretendo explicitar
conceitos e concepções dos estudos da enunciação de Benveniste que venham a contribuir
positivamente para o professor de línguas em formação e refletir sobre a implicância disso
na prática docente desses futuros professores. Acredito que os estudos da enunciação de
Benveniste contribuíram e contribuem significativamente não só para a lingüística moderna,
mas também para a formação do professor de línguas com conceitos fundamentais como o
de subjetividade (que antes fora marginalizado) e com a revisão da noção de
língua/linguagem e sentido. Desse modo, conhecer essas noções que deram uma
reviravolta nos estudos lingüísticos, mudando o modo de pensar dos lingüistas, é importante
para o professor de línguas, uma vez que podem ajudá-lo a definir uma concepção de
língua/linguagem, de sujeito, de sentido e de ensino e aprendizagem para a sua prática
pedagógica.
-a autodeterminação, a decisão de definir a nós mesmas, de dar nomes, de falar por nós
em vez de sermos nomeadas e expressadas por outros.
-cada uma de nós está hoje aqui porque de um modo ou outro compartilhamos um
compromisso com a linguagem e com o seu poder, também com a recuperação dela que
foi utilizada contra nós.
- na transformação do silêncio em linguagem e em ação, é de uma necessidade vital para
nós estabelecer e examinar a função dessa transformação e reconhecer seu papel
igualmente vital dentro dessa transformação. Para quem escrevemos, é necessário
examinar não só a verdade do que falamos mas também a verdade da linguagem em que o
dizemos. Para outras, se trata de compartilhar e difundir aquelas palavras que significam
tanto para nós.
- a transformação do silêncio em linguagem e em ação é um ato de auto revelação
Referências
FANON. Frantz. Peles Negras, Máscaras Brancas. Bahia: Editora Edufba, 2008.