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Universidade Federal de Ouro Preto

Escola de Minas
Departamento de Engenharia de Produção, Administração e Economia
Professor Jaime Antonio Sardi
Disciplina: Psicologia Social das Organizações e Org e Administração I.

Cultura Organizacional

Segundo Maria Ester de Freitas, ex-professora da Escola de Minas da UFOP e


atualmente lecionando na EAESP/FGV, os anos 80, no mundo da Teoria das Organizações,
enfatizou estudos na área de Cultura Organizacional; assim como nos anos 60 houve ênfase
no Estruturalismo, nos 70 houve ênfase em Estratégia, nos 50 em Administração por
Objetivos. Em sua Dissertação de Mestrado, publicada pela McGraw-Hill, em 1991, com o
nome de “Cultura Organizacional: formação, tipologia e impacto”, Ester de Freitas faz
uma extensa revisão dos estudos sobre o assunto, os quais parcialmente adaptamos para
este texto.
De uma forma simples, o que é Cultura Organizacional?

1ª - “A maneira como fazemos as coisas por aqui.”


2ª - “São as regras do jogo da cultura que fornecem significado, direção e mobilização – é a
energia social que move a corporação à ação.”
3ª - “Fonte de significados.”
4ª - “Uma moeda social.”
5ª - “O conhecimento adquirido que as pessoas usam para interpretar experiências e gerar
comportamento social.”

Já uma definição mais elaborada pode ser encontrada em Edgard Schein (1984):

“A Cultura Organizacional é o modelo dos pressupostos básicos, que determinado


grupo tem inventado, descoberto ou desenvolvido no processo de aprendizagem
para lidar com os problemas de adaptação externa e integração interna. Uma vez
que os pressupostos tenham funcionado bem o suficiente para serem considerados
válidos, são ensinados aos demais membros como a maneira correta para se
perceber, se pensar e sentir-se em relação àqueles problemas”.

Os Elementos da Cultura Organizacional


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Valores - Crenças e Pressupostos - Rituais e Cerimônias - Estórias e Mitos – Tabus –


Heróis - Normas.

1 – Valores: representam a essência da filosofia da organização para se atingir sucesso,


fornecem um senso de direção coletivo, uma referência para o comportamento cotidiano
dos empregados e dirigentes.
Os valores podem ser comunicados para fora da Companhia através de slogans: Sears –
“Qualidade a um bom preço”; McDonald’s – “Qualidade, serviço, limpeza e produto a um
bom preço”; Delta Airlines – “the Delta family feeling”; Tam – “Orgulho de ser
brasileira”.

Através dos valores expressados podemos saber quais questões são tratadas com prioridade
naquela empresa: algumas priorizam a exportação, outras priorizam estratégias de longo
prazo, outras preferem rentabilidade imediata, etc...

Também através dos valores se pode saber quão longe alguém pode ascender numa
organização: Se o desenvolvimento de produtos é a área dominante, as pessoas mais
talentosas irão trabalhar nos laboratórios de desenvolvimento de novos produtos. Se o
serviço de atendimento ao consumidor é um valor importante, os empregados de maior
ambição e agressividade não irão preferir a área financeira. As recompensas nas áreas
valorizadas são mais atraentes.

Via de regra, a despeito de que cada empresa “personalize” seus valores, as seguintes
características são comumente encontradas:
- Importância do consumidor.
- Padrão excelente de desempenho.
- Qualidade e inovação.
- Importância da motivação intrínseca (que vem de dentro da empresa) dos empregados.

2 – Crenças e Pressupostos: Considera-se como sendo a VERDADE na organização.


Acabam por virar inquestionáveis.
Quando um grupo ou uma organização resolve problemas coletivos, este processo inclui
alguma visão de mundo, algum mapa cognitivo, algumas hipóteses sobre a realidade, e, se o
sucesso na resolução dos problemas ocorre, aquela visão de mundo passa a ser considerada
como sendo correta e válida. (Schein: 1984)

3 – Ritos, Rituais e Cerimônias: Segundo Deal & Kennedy (1982), “Os ritos, rituais
e cerimônias são exemplos de atividades planejadas que têm consequências práticas e
expressivas, tornando a cultura organizacional mais tangível e coesa.”

Exemplos:
1 – Um trote (hazing rite) feito para um jovem engenheiro recém admitido na General
Electric é clássico na literatura organizacional. Formado no MIT, ele apresentou-se ao
trabalho no primeiro dia de serviço vestindo seu terno mais novo, anel de graduação, pasta
de executivo da melhor marca, etc. Foi cumprimentado por um supervisor idoso que
imediatamente lhe deu uma vassoura e disse-lhe para limpar o chão. Ele obedeceu. Mais
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tarde, quando o jovem ficou famoso, declarou que esta foi uma das melhores lições que
teve em sua vida.

2 – Um exemplo clássico em matéria de cerimônia é da Mary Kay Cosmetics. A empresa


distribui prêmios milionários, como Buicks e Cadillacs cor-de-rosa, diamantes e casacos de
pele para as funcionárias campeãs de vendas de cosméticos. A solenidade leva em média
13 horas, e nela as líderes de equipes de vendas e futuras diretoras fazem uma programação
que segundo a própria empresa: “educa, motiva, inspira e diverte.”

Os rituais e cerimônias tem um papel importante porque servem para tornar


expressiva a cultura organizacional:

- comunicam claramente de que maneira as pessoas devem se comportar na organização


e quais são os padrões de decoro aceitáveis;
- chamam a atenção para a maneira como os procedimentos são executados e
estabelecem como as pessoas podem “jogar” e/ou “divertir-se”;
- exercem uma influência visível e penetrante;
- apresentam o lado criativo da cultura, que libera tensões, encoraja inovações, reduz
conflitos, cria novas visões;
- guiam o comportamento, através da teatralização dos valores básicos, visto que por trás
de cada ritual está um mito que simboliza a crença central da empresa;
- exibem e fornecem experiências que devem ser lembradas pelos empregados. As
cerimônias são destacadas como eventos extraordinários, aos quais todas as luzes da
organização emprestam brilho. (Freitas; 1991: 23)

São os seguintes os ritos mais comuns (Freitas: 24-5):


a- Ritos de Passagem: usados para facilitar a mudança de status, tanto no caso de
introdução de pessoal quanto no caso de retreinamento de pessoal. Minimizam os impactos
das mudanças.

b – Ritos de Degradação: Usados para dissolver identidades sociais e retirar seu poder,
como nos casos de demissão, afastamento de alto executivo, “ encostar alguém”, denunciar
falhas ou incompetências publicamente.

c – Ritos de Reforço: celebração pública de resultados positivos, reforço de identidades


sociais e seu poder. Fornecem reconhecimento público a feitos individuais e motivam
esforços similares. Enfatizam o valor social da observância das regras.

d – Ritos de Renovação: visa renovar as estruturas sociais e aperfeiçoar seu funcionamento


com programas de desenvolvimento organizacional, assistência ao empregado. Reafirma
aos membros de que algo está sendo feito em relação aos problemas. Dirigem atenção para
certos problemas e permitem omitir outros, reforçam e legitimam os sistemas de poder e
autoridade existentes.
e – Ritos de Redução de Conflitos: Usados para restaurar o equilíbrio em relações sociais
perturbadas, reduzindo os níveis de conflitos e agressão, como nos casos de barganha
coletiva. Compartimentam e relativizam o conflito e seus efeitos de ruptura. Desviam a
atenção da resolução de problemas.
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f – Ritos de integração: Encorajam a viver e reviver sentimentos comuns e mantêm as


pessoas comprometidas com o sistema social. Comumente são usados nas festas de Natal,
rodada de cerveja, jogos, “12 de outubro”. Permitem a liberação de emoções e o
afrouxamento temporário das normas, atitude, que ao final reassegura e reafirma, através do
controle, a moral das normas.

As organizações podem, quando pretendem realizar mudanças culturais, introduzir


novos scripts a serem recomendados, aceitos, aprendidos, abraçados, fidelizados, etc...

A Administração de Recursos Humanos é, em geral, responsável, junto com a alta


direção, pelo manejo, e definição de rituais, ritos e cerimônias organizacionais como parte
do processo de socialização.

Exemplo: A GM – General Motors e a UAW – Union Automotive Workers,


em seminários em Blake Lake, realizam periodicamente uma cerimônia para discutir
questões relacionadas com o Programa de Qualidade de Vida no Trabalho (QWL).
Solberg (1985), ao analisar este evento, diz que os participantes ao retornarem às
atividades normais, se mostram entusiasmados, como se convertidos a uma religião, graças
ao trabalho de multiplicar as estórias, valores e o sentido de compartilhar experiências, que
acontece durante o seminário. O autor vê este seminário como uma demonstração cabal de
que a cultura pode ser mudada, alterando-se comportamentos e atitudes, desenvolvendo
uma nova visão de futuro. Os conceitos são repassados como se fossem uma bíblia ou uma
declaração de direitos. O Seminário de Black Lake, para os que dele participam, é uma
espécie de ponte ente o mundo velho e a visão da ordem mudada.

4 – Estórias e Mitos: As estórias de que se fala aqui são acontecimentos ocorridos na


organização que: 1 - dão informação sobre a empresa, 2 - reforçam o comportamento já
existente, 3 - enfatizam como este comportamento se ajusta ao interesse organizacional. Os
mitos são estórias consistentes contendo os valores da organização, mas não são fatuais,
como o mito de que a empresa é “uma grande família” , que “todos são iguais”, etc..

5 – Tabus: representam temas que não devem ser falados, de coisas que não funcionam,
ou que evocam lembranças trágicas para um grupo ou organização.

Exemplos:
1 - Deal & Kennedy falam de tabus envolvendo discriminação na sociedade americana.
Um caso é das mulheres que trabalham em ambiente tipicamente masculino. Não tendo
acesso a círculos restritos como drinques, jantares de negócio, acesso ao Presidente, elas
acabam por não conseguir desempenhar integralmente, em comparação aos homens, suas
atividades.
2 - Na Atari certa ocasião houve falsificação de video-games com apelos sexuais e depois
o logotipo foi associado com seitas demoníacas.
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6 – Heróis: Os heróis personificam os valores e condensam a força da organização.


Enquanto os administradores conduzem a organização, são os heróis os responsáveis pela
sua criação, pois estes têm a coragem e a força de vontade de “fazer aquilo que todos
almejam, porém têm medo de tentar”.

Há heróis natos: Tom Watson da IBM, Will Durant da GM, John Rockfeller da Standard
Oil, Henry Ford da Ford, Pierre DuPont da DuPont.

Há heróis criados: são pessoas que vencem desafios dentro da organização, assumindo o
palco durante um determinado tempo. São exemplos o “administrador do ano”, “campeão
de vendas”, “inventor do ano”, etc.

Função dos Heróis Organizacionais, segundo a Professora Ester de Freitas (1991:31):

- tornam o sucesso atingível e humano. Outros membros podem seguir seus exemplos;

- fornecem modelos. A fundadora da Mary Kay Cosmetics, Mary Kay Ash, acredita que
pode oferecer-se como modelo para as funcionárias, e o faz. Ela treina as vendedoras
não simplesmente para serem suas representantes de vendas, mas para fazê-las acreditar
que são Mary Kay.

- simbolizam a organização para o mundo exterior;

- preservam o que a organização tem de especial;

- estabelecem padrões de desempenho;

- motivam os empregados, fornecendo uma influência duradoura sobre eles.

Enquanto os heróis criados fornecem modelos para o dia-a-dia, os heróis natos têm uma
influência mais ampla, duradoura e filosófica.

Nas últimas duas décadas cresceu o número de livros sobre organizações, com
especial destaque para o papel dos seus fundadores. Muitos livros viraram best-sellers.
Constituem-se em fonte interessante para se pesquisar a cultura organizacional. Aqui na
nossa Universidade existe um livro apologético sobre a História da Escola de Farmácia e
seus fundadores.

Exemplo 1: A História da Folha de S. Paulo e seu fundador Olival.


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Em 1981, a direção do jornal Folha de S. Paulo convidou os historiadores Carlos


Guilherme Mota e Maria Helena Capelato, para elaborar a História da empresa.
Observemos como se referem ao fundador:

“A primeira fase da história da “Folha” se confunde com a figura de


Olival Costa, seu fundador. Muitos são os depoimentos da verdadeira ‘escola’ que
se formou em torno dessa personalidade mansa, mas firme e esclarecida. Pequeno
e frágil, ‘sempre com uma pilhéria à flor dos lábios’, destacava-se por intensa
agilidade mental e física, que aliás o fez envelhecer precocemente. Nos primeiros
cinco anos, a “Folha” foi composta e impressa ora nas oficinas do “Estado”, ora
nas do “Jornal do Commercio”. A redação, sempre muito longe das oficinas,
obrigava Olival a deslocar-se para elas, onde ficava até a saída dos jornais para as
ruas.
Do ponto de vista jornalístico propriamente, Olival Costa ajudou a
conceber em São Paulo um novo tipo de jornal, em que tudo é notícia. ‘Só os
‘focas’ se queixam de falta de assunto’, dizia. Mas tudo é notícia, desde que saiba
ver, entender e explicar. Não mais ‘assuntos literários’ , distantes e tratados em
linguagem sofisticada para um círculo fechado.
Olival abriu seu jornal para um novo tipo de leitorado de ‘classe média’ ,
que indistintamente chamava de ‘povo’. Imaginava até abranger o operariado.
Não mais um jornal que sobrepairasse à sociedade, mas que internalizasse,
veiculando-as, essas novas e difusas aspirações de setores intermediários da
população.
Como sintetizou Pati, o companheiro de redação de Olival em 1946:
“A Folha da Noite (nome do jornal na origem) revelou aos homens o mais belo
dos assuntos: o povo. O povo ‘existiu’ na suas próprias páginas. Impôs-se à
consideração dos governantes. Entrou a ser objeto de cogitações. Um jornal não
fala ou não deve falar nunca em ‘seu’ nome. Fala invariavelmente em nome dos
que lêem. Fala em nome do povo.”

Dessa ideologia ficará a imagem do “Juca Pato” criada por Belmente,


caricaturista inigualável. Juca Pato, um pequeno-burguês calvo, terno e gravata,
“white-collar” típico mas não massificado, perplexo com o mundo e mordaz com
os poderosos. A figura de Juca Pato, expressão de São Paulo na Primeira
República, traduzirá essa personagem irônica e indefinida, cheia de contradições,
exigências, aspirações e frustrações constantes, imobilidade social e insegurança.
Apesar do que, Olival conseguiria por em andamento um projeto de imprensa que
atendesse a frações dessas classes médias urbanas, pretendendo criar um ‘jornal
popular’. “Jornal popular é um desabafo”, como conceituou Francisco Pati em
1946, ao traçar o perfil do fundador das “Folhas”.

Em síntese, desse primeiro período, a “Folha”, procuirou ser a ponte, tal como
ele a concebia, e o Governo. A ‘obrigação’ de criticar servia de pedra angular da
filosofia de trabalho de Olival e seu grupo.

As campanhas por ele encetadas definem com nitidez o perfil do periódico de


São Paulo, concentrando-se em temas populares e urbanos. Através dessas
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campanhas, a “Folha” procurava sensibilizar, por um lado, setores da classe


média: exigindo, por outro lado, que o Estado se incumbisse de providenciar
habitações condignas para os operários, a melhoria dos transportes urbanos, o
direito de férias, a ampliação da rede escolar, o combate aos cortiços (focos de
tuberculose e outras doenças), as estações de repouso e cura, a fundação de
hospitais, maternidades, creches e postos de saúde e assistência à infância, a
fiscalização e regulamentação do trabalho de menores nas fábricas. Além disso, o
jornal era portador de uma visão urbanística modernizadora, preocupado com o
alargamento de ruas e avenidas, além de implementação de obras de infra-
estrutura como água, luz e esgoto.
Portanto, o traço fundamental do jornal, que o marcará indelevelmente, será o de
fiscal doGoverno. “Fazer política não é só governar, nem é só concorrer às
eleições para uma cadeira de deputado. É principalmente fiscalizar o Governo.”
Nessa medida, a verdade eleitoral desponta como base na purificação dos
costumes políticos e fator de estabilidade dos regimes. Eis o núcleo de sua
ideologia política.
Para Olival, um jornal deveria ser a escola de civismo, em que se cultivaria a
integridade nas colunas, a elegância nos métodos de combate e disciplina
vernacular.
Morreu o fundador da “Folha” a 13 de dezembro de 1932, com 56 anos de idade,
quase todos dedicados ao jornalismo. “A maior de todas as advocacias”, como
costumava dizer.” (1981: 23-4)

7 – Normas: Referem-se aos comportamentos esperados, bem aceitos e apoiados pelo


grupo. Pode estar fixado formalmente ou não. As pessoas podem ser recompensadas ou
punidas, confrontadas ou encorajadas, ou postas em isolamento ou ostracismo quando as
violam. (Freitas; 1991:33)

Exemplo 1 - O caso BRADESCO

Nos anos 80, durante as greves de bancários na praça financeira paulistana, ficavam os
analistas, sociólogos, psicólogos e sindicalistas intrigados sobre as razões que faziam com
que os funcionários pior remunerados, exatamente do BRADESCO, fossem os últimos a
aderir às greves, quando aderiam. Ao inverso, os funcionários do BANESPA, BB, CEF, e
NOSSA CAIXA, melhor remunerados, eram os primeiros a aderir às greves.

Em uma Tese de Doutorado à PUC-SP, Liliana Segnini, estudou em profundidade o


assunto, e chegou a um conjunto de elementos, que a seguir resumimos:

A – O recrutamento é feito sobre indivíduos oriundos das classes médias baixas e que
tenham alguma religião. O motivo tem a ver com a crença de que os empregados das
classes médias baixas serão ‘eternamente’ gratos ao Banco BRADESCO que lhes proveu
um meio de ganhar a vida: o emprego. No caso da religião, o pressuposto é que quem
possui uma já tem um ‘treinamento’ em autodisciplina, “domesticação”, submissão, está a
meio caminho para uma completa integração ao mundo trabalho.
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B - Todos os candidatos a emprego passam por cursos de treinamento nas Fundações


BRADESCO onde são repassados os principais valores da cultura organizacional do
BRADESCO, especialmente de fidelidade.

C – A direção do Banco nega que realize lucros sobre o trabalho dos empregados. Afirma
que sempre reinveste os lucros. Vejamos o seguinte relatório da presidência:

O BRADESCO não se locupleta com os lucros. Sempre reinvestimos


em aplicações sociais. A Fundação BRADESCO é um exemplo disto. Em
1982 teremos 17 mil crianças para educar, além de dar toda a assistência
odontológica e médica. Para mim o grande problema das crianças está nos
dentes e na alimentação adequada. (Jornal do Brasil: 08.11.1981)

D – Há uma prática comum no sentido de alardear que há um investimento em


solidariedade e na formação de “homens virtuosos’, ‘limpos moral e fisicamente’, como
forma de evitar conflitos trabalhistas, uma autodefesa, visto que o BRADESCO paga o
pior salário do setor.

E – Há recompensas para quem delatar colegas. Inclusive muitas vezes rompendo as


relações de hierarquia, o que faz com que permanentemente todos se vigiem entre si, sem
despesas adicionais com grande número de supervisores. O delator é promovido posto que
seu gesto foi uma prova de fidelidade ao Banco.

F – Há, segundo Segnini, ações e olhares disciplinadores que se pretendem totalizantes,


uma vez que o funcionário é vigiado tanto dentro quanto fora da organização, na sua vida
privada, inclusive.

G – A Escolaridade formal é pouco enfatizada (O fundador só tinha curso primário, diz-se),


e no outro lado são valorizados os cursos relacionados com o ‘dever profissional’ da
Fundação BRADESCO. O símbolo do Banco até recentemente era um burrico submisso e
trabalhador.

H - Amador Aguiar, natural de Marília-SP, fundador e presidente do BRADESCO, até sua


morte em 1998, exigia dos novos funcionários a assinatura da seguinte declaração de
princípios, condição sine qua non para admissão:

Eu, .................., prometo, solene e fielmente, com otimismo e entusiasmo que


seguirei e defenderei os princípios que a seguir declaro:

1 – Amar o Brasil, dedicando-me integralmente a ele e trabalhando sempre mais e


melhor, até onde minhas forças permitirem;
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2 – Colocar os interesses públicos, os do Banco e demais organizações


BRADESCO acima dos meus próprios interesses;

3 – Dentro da convicção de que ‘só o trabalho pode produzir riquezas’, agir com
plena dedicação ao mesmo, com todo meu amor, minha disciplina e justa
humildade;

4 – Respeitar e manter o princípio da hierarquia, condição essencial, quer no


Estado, na Família e na Sociedade, para o aprimoramento do homem;

5 – Com o mais sincero sentimento de amor à Pátria e inspirado sempre nos


princípios cristãos, colaborar para a formação de um Brasil melhor, através das
Fundações mantidas pelo Banco e associados, educando, alimentando, curando,
vestindo, formando melhores técnicos e, dentro das possibilidades permitidas,
promovendo oportunidades aos brasileiros desafortunados que, através dos tempos,
pela inconsciência de alguns e pela indiferença e criminosa de omissão de outros,
ainda não puderam sair da miséria do analfabetismo;

6 – Dedicar-me a atividades construtivas e de bem coletivo, entrosadas com as que


o BRADESCO vem mantendo, ou a outras, com a aprovação do Conselho de
Administração do BRADESCO;

7 – Responder, moral e materialmente, pelos eventuais e involuntários erros que


venha a cometer;

8 – tratar a todos com urbanidade e respeito, principalmente os mais humildes e


necessecitados;

9 – Integração total à filosofia de vida e do trabalho do Banco, respeitando e


fazendo respeitar seus estatutos e Regulamento Interno, bem como os de sues
associados.

Local, data:

Assinatura do Empregado

Obs – A despeito de todas as críticas possíveis, este documento tem a vantagem (para
efeitos de estudar a cultura organizacional do maior Banco privado do país) de ser
registrado escrituralmente. É um documento que fala por si. Em outras organizações
acontece ‘capturas’ e ‘moralização’ das classes de baixa renda de forma menos explícitas,
não documumentadas.

Entre as conclusões a que chegou a profe0ssora Maria Ester de Freitas, na sua


Dissertação de Mestrado, podemos destacar:
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- A Cultura Organizacional exerce funções de controle extremamente sofisticadas sobre


os indivíduos participantes, funções exercidas de forma “doce”.
- Através do desenvolvimento e sedimentação de uma cultura forte e coesa, as
organizações restauram perdas psicológicas nos indivíduos que nela trabalham, repondo
um quadro de valores, crenças e pressupostos orientador de um comportamento coletivo
conveniente aos objetivos.
- Ao enfatizar exemplos e práticas de heróis, bem como a reprodução de estórias de
sucesso, mitos e rituais, consagram o já consagrado, legitimando o poder e a ordem
existente.
- Inibem-se comportamentos desviantes.
- A Cultura Organizacional ajuda a conformar o indivíduo às normas e regras
estabelecidas, conquistando-lhe a adesão e a lealdade.

Bibliografia

SEGNINI, Liliana Petrilli – A Liturgia do Poder: trabalho e disciplina. S. Paulo: EDUC,


1998.

ROCHA FILHO, Milton – Amador Aguiar pede maior desconcentração econômica. In:
Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 8 nov. 1981.

FREITAS, Maria Ester de – Cultura Organizacional: formação, tipologias e impacto. S.


Paulo: Makron/McGraw-Hill, 1991.

SMIRCICH, Linda – Concepts of Culture and Organizational Analysis. In: Administrative


Science Quarterly, vol. 28, nº3, 1983.

MOTA, C. Guilherme & CAPELATO, Maria Helena – História da Folha de S. Paulo


(1921-1981). S. Paulo: IMPRES, 1981.

OUCHI, William – Teoria Z: como as empresas podem enfrentar o desafio japonês. S.


Paulo: Nobel, 1987.

DEAL, Terrence & KENNEDY, Alan – Corporate Culture: the rites and rituals of corporate
life. Massachusets: Addison-Wesley, 1982.

SCHEIN, Edgard – Coming to a New Awareness of Organizational Culture. Sloan


Management Review, 1984. In: KILMANN et alii, “Gaining Control of the Corporate
Culture”. San Francisco: Jossey-Bass, 1985.

SOLBERG, S. – Human Resource Management in Action: changing culture through


ceremony – an example from GM. In: Human Resource Management, vol. 24, nº 3, 1985.

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