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Conveniência, valor e experiência

A análise da evolução do comportamento de canais, segmentos e formatos de lojas no var


ejo norte-americano ao longo dos últimos 18 anos é uma das formas mais claras de ent
ender os movimentos que determinaram as mudanças de hábitos dos consumidores ao long
o do tempo e como isso foi incorporado pelo varejo e seus fornecedores.
Algumas conclusões podem ser apresentadas quando se observa o comportamento do set
or varejista norte-americano, o maior varejo do mundo e o principal gerador de i
novações ao longo do tempo. Em especial quando se compara com a realidade brasileira
.
* Nos últimos dez anos, de 2000 a 2010, o varejo norte-americano apresentou um cre
scimento real de 44,2%, impactado pela crise que se iniciou em 2000 e pela mais
recente, de 2007, que teve seu maior impacto nos anos de 2008 e 2009 e da qual o
país começou a se recuperar em 2010.
* No mesmo período o Brasil teve um crescimento real nas vendas do varejo de cerca
de 60%, beneficiado pelo forte crescimento do consumo nos últimos anos. No período
de 2000 a 2005 havia crescido 7,8%, impactado pela crise mundial e seus próprios p
roblemas; no período de 2005 a 2010, esse crescimento alcançou projetados 48%.
* Nos Estados Unidos, os formatos orientados para valor e o varejo não-loja, em es
pecial a internet, foram os que tiveram maior crescimento e aumento de sua parti
cipação no total do varejo, mesmo nos períodos de maior euforia consumista. O primeiro
período ficou conhecido como a Exuberância Irracional e terminou na explosão da bolha
da internet em 2000, bem como o que se seguiu entre 2003 e 2008, esse último com
um crescimento total das vendas do varejo de 32,5% em apenas cinco anos.
* As vendas do setor de material de construção, formado principalmente pelos home ce
nters e lojas especializadas, foram as que melhor retrataram o comportamento rec
ente da crise nos Estados Unidos. No período de 2003 a 2006 cresceram 26% para, im
pactados pela crise recente que se iniciou no setor imobiliário, terem um comporta
mento negativo estimado de 17% no período de 2006 a 2010. Entre 2003 e 2010, no Br
asil o crescimento deverá ser de 30%, uma vez que o setor sofreu “soluços” em seu ritmo
de crescimento em 2005 e 2009.
* Os setores de Saúde e Cuidados Pessoais têm comportamento bastante distinto nos Es
tados Unidos e no Brasil. Na realidade norte-americana, o setor acompanha o comp
ortamento geral do varejo, com um crescimento de 30% no período de 2003 a 2010, en
quanto no mesmo período no Brasil cresceu 80%, com concentração desse crescimento entr
e 2007 e 2010.
* Os setores de Móveis e Eletrodomésticos nos Estados Unidos tiveram um crescimento
total de apenas 6% no período de 2000 a 2010, impactados fortemente pela crise imo
biliária, financeira e econômica mais recente. No Brasil, como um dos setores mais b
eneficiados pelo crescimento do consumo das famílias, o crescimento estimado para
o mesmo período é de 154%, com forte propensão à continuidade de sua expansão nos próximos
nos;
* O varejo não-loja teve nos Estados Unidos, no período de 2000-2010, expansão estimad
a de 188%, puxado principalmente pela expansão da internet, seu mais importante ca
nal, enquanto o varejo total teria crescido 38%. No Brasil não existe um dado cons
olidado do crescimento do varejo não-loja, mas somente a internet teve uma expansão
estimada de 225% no período 2004-2010, com a expectativa de que possa ter alcançado
vendas de R$ 14,3 bilhões em 2010.
* Nos Estados Unidos o segmento de Clubes de Compra e Supercenters, como os mais
significativos formatos de lojas representantes do Varejo de Valor, foi aquele
que apresentou maior expansão em todo o período de 2000 a 2010, tendo alcançado estima
dos 169% de crescimento, mais de quatro vezes o crescimento do varejo total.
* O setor de Lojas de Departamentos é, nos Estados Unidos, aquele que mais vem sen
do prejudicado em seu comportamento pelas mudanças de hábitos dos consumidores, reor
ientando sua preferência para os formatos e canais mais focados em valor e pela pe
rcepção de preços menos competitivos e baixa inovação. Sua história recente é de sucessivas
rdas de participação para os formatos e marcas especializados e para os orientados a
valor, tendo no período de 2000 a 2010 apresentado queda de 20% nas vendas. Situação
totalmente diversa da realidade brasileira, onde as lojas de departamentos orien
tadas para moda têm aumentado suas vendas e participação de mercado.
* Situação bem particular ocorre nos setores de alimentos e bebidas nos Estados Unid
os, formado principalmente pelos supermercados e lojas de alimentos. No período de
1992 a 2010, o setor teve um crescimento estimado acumulado de 59% enquanto o v
arejo total cresceu 124%, refletindo em parte a mudança de hábitos dos consumidores,
com migração mais forte para alimentação fora de casa. Nessa crise mais recente, pressi
onados pelo quadro econômico adverso, os consumidores voltaram a comprar alimentos
em supermercados, aumentando a participação dos alimentos consumidos em casa e faze
ndo com que o setor tivesse estimados 2,4% de crescimento de vendas em 2010 em r
elação a 2009.

Essa análise comparativa permite a percepção mais geral de que Valor e Conveniência têm si
do os fatores mais preponderantes no comportamento do consumidor norte-americano
, situação que pudemos também confirmar nos trabalhos e análises realizados recentemente
na Europa, segundo maior mercado de varejo no mundo, no qual os hipermercados f
ocados na oferta de preços mais competitivos têm se destacado positivamente no seu c
omportamento, apesar dos desafios que envolvem o setor de hipermercados em todo
o mundo.
As experiências nas lojas e nos pontos de contato com os consumidores, destacadas
como alternativa à crescente racionalidade do comportamento de consumo, de fato se
constituem em um caminho opcional, se não o único, mas não conseguem envolver e serem
traduzidas em resultados relevantes, em especial em períodos de crise como o que
os mercados mais maduros têm vivido.
Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br), diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza

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