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Ficha informativa

CURSO Assistente Administrativo/a - Percurso A

UFCD Linguagem e Comunicação

FORMADOR(A)

FORMANDO(A)

DATA

Leia atentamente a crónica que se segue.

Crónica das palavras


Há muito se perdeu a noção de que as palavras têm honra. Políticos servem-se delas para mentir, ocultar, dissimular a
verdade dos fatos e as evidências da realidade. Mas também escritores e jornalistas as debilitam e as entregam às suas
pessoais negligências. Não é, somente, uma questão de gramática e de estilo; mas é, também, uma questão de gramática
e de estilo. Há escritores e jornalistas que o" não são à força de o querer ser. A confusão instalou-se, com a cumplicidade
leviana de uma crítica pedânea1 e de um noticiário predisposto a perdoar a mediocridade e a fraude.

As palavras possuem cores secretas, odores subtis, densidades ignoradas. O discurso político conduz-nos ao nojo da
frase. Pessoalmente, tento limpar o reiterado registo da aldrabice e da ignorância com a releitura dos nossos clássicos.
Recomendo o paliativo2. Eis-me às voltas com as Viagens na Minha Terra. Garrett3 não era, propriamente, uma flor
imaculada. Mas foi um mestre inigualável na arte da escrita. Lembro-o porque, a seguir, revisitei o terceiro volume de As
Farpas, onde Ramalho3 reproduz uma conversa com Herculano3. O historiador retratou assim o seu companheiro das
lutas liberais: "Por cem ou duzentas moedas, num dia de apuro, o Garrett seria capaz de todas as porcarias que quiserem,
menos de pôr num papel, a troco de todo o ouro do mundo, uma linha mal escrita."

Desaprendeu-se (se é que, vez alguma, foi seriamente aprendido) o vocabulário da língua. Lê-se-o por aí publicado; a
pobreza lexical chega a ser confrangedora. Não se trata de simplicidade; antes, desconhecimento, incultura, ausência de
estudo. "Foge de palavras velhas; mas não receies o uso de palavras antigas." Recomendava Garrett. Palavras velhas,
travestidas de 'modernidade', são, por exemplo: expetável, incontornável, enfatizar, implementar, recorrente, elencar,
fatível, plafonamento, exequível, “checar”, fraturante, imperdível, abrangente, atempadamente, alavancar, empolamento -
e há mais.
Reconheço o meu verdete por certas palavras e expressões. Não é embirração de caturra, nem rabugice de um reta-
pronúncia. Será o gosto da palavra, a alegria de com elas trabalhar há longuíssimos anos, a circunstância de ser um leitor
com fôlego, o fato de ter tido professores como o gramático e linguista Emílio Menezes, goês paciente, sábio e afável; e de
haver frequentado alguns dos maiores escritores do século passado, para os quais o ato de escrever representava moral
em ação. Lembro, com emoção e orgulho, Aquilino, José Gomes Ferreira, Migueis, Sena, Mário Dionísio, Carlos de
Oliveira, Manuel da Fonseca, Abelaira. Esta crónica foi, também, um pretexto para os lembrar.
Baptista Bastos, Diário de Notícias, 4 de Fevereiro de 2009

Notas:
1. pedâneo: apressado, aligeirado.

2. paliativo: que serve para remediar ou esconder um problema em vez de o resolver.

3. Almeida Garrett, Ramalho Ortigão e Alexandre Herculano: escritores portugueses do século XIX.
1. Das afirmações seguintes, identifique, para cada ponto, aquela que completa a frase, de acordo com o sentido do texto.

1.1. Esta crónica é uma reflexão acerca

a. da forma como os políticos são vistos pela população.

b. da beleza das palavras bem escolhidas.

c. do facto de a língua portuguesa ser frequentemente maltratada.

d. das vantagens e desvantagens do novo Acordo Ortográfico.

1.2. Para combater os maus-tratos que a nossa língua sofre frequentemente, o cronista recomenda a leitura

a. dos escritores portugueses clássicos.

b. de discursos políticos.

c. da História de Portugal.

d. de livros estrangeiros em versão original.

1.3. A pobreza lexical que aflige o autor deve-se

a. à procura da simplicidade por parte de quem escreve.

b. às próprias limitações do vocabulário da língua portuguesa.

c. à ignorância, falta de cultura e falta de estudo de quem fala e escreve.

d. à falta de qualidade dos programas da nossa televisão.

1.4. Com esta crónica o escritor pretende, para além do mais,

a. reconhecer, perante os leitores, a sua teimosia.

b. homenagear alguns dos seus professores e vários grandes escritores portugueses do século XX.

c. mostrar aos seus leitores a importância da 'modernidade'.

d. chamar a atenção dos leitores para a necessidade de dobrar os filmes em português.

2. Complete as frases do grupo A com quatro elementos do grupo B, de modo a obter afirmações verdadeiras.

Grupo A

1. No excerto "Não é, somente,  uma questão de gramática e de estilo; mas  é,  também, uma questão de gramática e de


estilo", a locução sublinhada...
1.1 Com a frase entre parênteses, o autor do texto...

1.2 Na passagem "Não se trata de simplicidade;  antes,  desconhecimento...", o vocábulo assinalado...

Grupo B

a. ... introduz uma opinião do escritor.

b. ... anuncia uma ideia de causa,

c. ... é um advérbio com valor temporal.

d. ... marca uma adição.

e. ... é um marcador discursivo equivalente a "mas".

f. ... manifesta dúvida em relação ao que afirmou imediatamente antes.

3. Releia o texto e responda às questões que se seguem.

3.1. Explique por que razão os políticos contribuem para que falte a honra às palavras.

3.2. Explique o sentido da frase: "As palavras possuem cores secretas, odores subtis, densidades
ignoradas.".

3.3. Justifique a escolha do título: "Crónica das palavras".

4. Proponha um sinónimo para o seguinte vocábulo sublinhado: "Palavras velhas, travestidas  de 'modernidade'”.

5. Resuma o texto informativo a seguir transcrito, num texto entre cinquenta e setenta palavras.

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