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SP Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

Um só é o vosso Mestre,
todos sois irmãos
Roteiros Homiléticos do Tempo Comum
Ano À - 2º parte

Projeto Nacional de Evangelização


Queremos Ver Jesus
Caminho, Verdade e Vida

EB. PAULUS
1º edição — 2005

Capa: Ilustração de Dom Ruberval Monteiro, osb


(Mosteiro da Ressurreição — Ponta Grossa — PR)

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O Pia Sociedade Filhas de São Paulo — São Paulo, 2005
Apresentação

À preparação da homilia é garantia de uma frutuosa parti-


cipação da assembléia à mesa da Palavra. A experiência tem de-
monstrado que, quanto mais orante for essa preparação, maior
será sua eficácia.
Os que se dedicam ao ministério da Palavra sabem que a
homilia não pode prescindir de um horizonte maior, que é a di-
nâmica própria da ação litúrgica. A homilia deve nos ajudar a
viver o mistério eucarístico na sua totalidade, em todas as suas
dimensões. Com esses cuidados, pe. Gustavo Haas e sua equipe
elaboraram os Roteiros Homiléticos do Tempo Comum, usando
OS CINCO passos:
e Situando-nos brevemente;

e Recordando a Palavra;

e Atualizando a Palavra;

e Ligando a Palavra com a ação eucarística;

* Preparando a celebração:
1. Sentido litúrgico;
2. Sugestões para a celebração.
A solicitude de proporcionar uma dupla perspectiva — um
olhar dirigido à assembléia e outro à mensagem bíblica — faz
com que Palavra seja contextualizada. Isso possibilita uma
homilia encarnada voltada para a realidade. E, ao mesmo tempo,
aberta às diversas partes da ação litúrgica, o que facilita o traba-
lho das equipes de celebração.
O esquema desenvolvido permite uma unidade entre as
duas mesas, a da Palavra e a da Eucaristia. E, naturalmente, nos

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ajuda a explicitar melhor o conteúdo da mensagem bíblica ao
longo da ação litúrgica, oferecendo-nos sugestões práticas para
resgatarmos a dimensão mistagógica da liturgia.
Mais uma vez, as equipes de celebração, empenhadas na
participação ativa e frutuosa de suas comunidades, recebem um
precioso subsídio do Projeto Nacional de Evangelização: Que-
remos Ver Jesus, Caminho, Verdade e Vida.

Possa este instrumento animar pastores e agentes de pas-


toral a viver uma espiritualidade litúrgica transformadora,
centrada no evento pascal.

Pela Comissão Episcopal Pastoral para a Liturgia,


t Joviano de Lima Júnior, sss

Bispo de São Carlos


Introdução

Um só é o vosso Mestre, todos sois irmãos!


À partir do 23º Domingo do Tempo Comum, entramos no
último período do Ano Litúrgico de 2005, que inclui os meses
de setembro, outubro e novembro. Neste ano somos conduzidos
pelo evangelista Mateus.
À Igreja no Brasil, com o Projeto de Evangelização “Que-
remos Ver Jesus, Caminho, Verdade e Vida”, se faz discípula fiel
e atenta do seu Mestre, apresentado como Messias, Mestre, Guia
e Vida para seu povo.
Como introdução a este subsídio, recordamos o conteúdo
e o espírito do Evangelho de Mateus. Ele foi escrito para uma
comunidade vinda do judaísmo, os assim chamados judeo-cris-
tãos. Aos poucos, essa comunidade entrou em conflito com os
próprios irmãos de sangue, por causa do testemunho de Cristo.
Essa realidade que a comunidade de Mateus vivia não é muito
diversa daquela que nós, hoje, vivemos.
Diz o biblista Johan Konings: “No catolicismo tradicional
em que vivemos, transformado em mera grandeza sociológica,
identificada com o sistema sociocultural do Ocidente, os verda-
deiros seguidores de Cristo estão, muitas vezes, na mesma situa-
ção que os antigos judeo-cristãos no meio de seus irmãos de
sangue. À mensagem de Mateus para seus contemporâneos era:
também os “filhos de Abraão” precisam de conversão e renova-
ção, mediante a graça de Deus manifestada no amor radical de
Jesus de Nazaré e no triunfo de sua ressurreição. Para nós, hoje,
basta substituir “filhos de Abraão” por “bons cristãos”, para ver a
atualidade deste evangelho. O mesmo impacto que a palavra de

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Mateus causou em seu ambiente pode renovar-se em nosso am-
biente: a salvação nunca é um direito adquirido; fé não é segu-
rança, mas confiança, uma forma de amor!”.!
Continua Konings, na sua introdução ao Evangelho de
Mateus: este evangelho “nos mostra que os verdadeiros segui-
dores de Cristo, de algum modo, terão de ser “pequenos” neste
mundo. Dá mais chances aos que estão fora da Lei do que aos
bem instalados. Proclama a felicidade escatológica dos pobres,
dos que são capazes de receber. E, no último ensinamento de
Jesus, apresenta “gente do nada” como representantes do Cristo
em nossas relações humanas (Mt 25,31-46)”.?
O Evangelho de Mateus, especialmente os capítulos que
acompanhamos na 2º parte do Tempo Comum do Ano À (caps.
18 a 25), nos apresenta o modelo de comunidade cristã e nos
mostra o modelo que Jesus mesmo quis. À vivência desse mode-
lo fará com que a comunidade seja reconhecida como cristã, como
o novo povo de Deus, aquele que realiza hoje o seu projeto na
história.
Apresentamos uma proposta de divisão da estrutura do
Evangelho de Mateus, com o objetivo de ajudar na preparação
de nossas celebrações, não uma isolada da outra, mas dentro de
uma caminhada, de um caminho progressivo é orgânico. É pre-
Ciso, às vezes, retomar um texto já proclamado num domingo
precedente ou mesmo fazer uma referência a um texto que será
proclamado em um domingo seguinte.
e Infância de Jesus: 1-2

e Preparação de Jesus: 3-4

| KoniNcs, J. Liturgia dominical: mistério de Cristo e formação dos fiéis (Anos


A-B-C). Petrópolis, Vozes, 2003. p. 36.
2 Ibid,, p. 36.

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e Ministério na Galiléia (4 a 13)
— Sermão da Montanha: 5-7

Dez milagres (curas): 8 a 9


Missão dos apóstolos: 10
— Reino escondido: 11-12
Parábolas: 13

* Ministério em Jerusalém (14 a 26)

— O Reino se desenvolve, formação dos discípulos:


14-17

Instruções à comunidade: 18 | É aqui que se encontram os


A caminho da paixão: 19-23 | textos que serão proclama-
Discurso escatológico: 24-25 | dos nos meses de setembro,
Paixão e morte: 26 e 27 outubro e novembro deste
Ressurreição e envio: 28 ano.

Estamos empenhados na evangelização, engajados no Pro-


jeto “Queremos Ver Jesus”. Nesse Projeto, são reafirmados os
três serviços básicos e permanentes da vida da Igreja: a Palavra,
a liturgia e a caridade. Diz-nos o Projeto Nacional de Evan-
gelização (2004-2007): “O anúncio querigmático da Palavra de
Deus há de ganhar centralidade, cada vez maior, e investimentos
significativos, sobretudo na sólida formação da fé e na sua
vivência, por meio de uma linguagem direta, simples e eficaz. [...]
O Evangelho, proclamado durante o Ano Litúrgico, com um lema
próprio, deve levar à conversão pessoal e à edificação da comuni-
dade, permeando todas as ações da pastoral” (pp. 11 e 12).
O Evangelho de Mateus nos oferece um critério para essa
evangelização: estaremos evangelizando quando nós, cristãos,
mostrarmos aos que não o são que nossa vida é plena de sentido

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e quando nossas comunidades cristãs viverem relações de amor
com Deus e com os irmãos.
O Evangelho que escutamos representa uma pedra desse
belo mosaico que estamos construindo, uma comunidade que
reconhece a presença do Senhor em seu meio.
Cantos e músicas para as celebrações litúrgicas deste Tem-
po Comum: não apresentamos indicações específicas. Recomen-
damos o uso do Hinário Litúrgico, da CNBB, que oferece reper-
tório rico e variado. Escolham-se os cantos de acordo com o
critério do memorial da Páscoa, e não com o das chamadas mis-
sas “temáticas” ou catequéticas.
O Ofício Divino das Comunidades também traz inúmeras
alternativas de refrões, aclamações, hinos e versões de quase
todos os salmos com melodias populares, garantindo caráter
litúrgico e fidelidade aos textos bíblicos.
Concluímos com o texto-base do Projeto Nacional de Evan-
gelização: “Encontrar e “ver' Jesus, através da Palavra de Deus
nos evangelhos, ajudará, com certeza, a encontrá-lo mais facilmen-
te na liturgia e no rosto dos irmãos, através da caridade” (p. 18).
Que este subsídio nos ajude a seguir o Mestre como ir-
mãos.
23º Domingo do Tempo Comum
4 de setembro de 2005

Leituras: Ezequiel 33,7-9; Salmo 94(95),1-2.6-7.8-9 (R/. 8);


Romanos 13,8-10; Mateus 18,15-20 (Entre irmãos)

Início do mês da Bíblia e Semana da Pátria

“Eu creio no amor e na compaixão!”


(Madre Teresa de Calcutá)

1. Situando-nos brevemente

No seguimento do Cristo Mestre, o Ano Litúrgico continua


a nos orientar, agora, especificamente, no Tempo Comum, já em
seu 23º Domingo. O mês de setembro, conhecido como o mês da
Bíblia, é um momento importante para nossas comunidades.
No Brasil, mais de 70% das comunidades não celebram a
Eucaristia aos domingos. Quase todas, porém, se reúnem em torno
da Palavra de Deus e fazem a experiência do Senhor ressuscita-
do que lhes fala e as orienta no caminho.
No domingo passado, ouvimos o convite do Senhor: “Se
alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e
me siga...”. Hoje e no próximo domingo, vamos refletir, rezar e
celebrar a realidade do perdão, atitude característica de quem
quer “seguir o Senhor”.
O Evangelho de hoje propõe uma comunidade na qual,
ante a infidelidade de um de seus membros, alguém vai ao seu

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encontro e o convida para reconsiderar sua atuação. É uma co-
munidade que se une para todos juntos pedirem ao Pai e que está
convicta de que Jesus a move e está no meio dela. É daí que
brota o desejo: “Queremos Ver Jesus!”.
Em um tempo em que muitos propõem a “tolerância zero”,
nada melhor que escutarmos o ensinamento de nosso Mestre.

2. Recordando a palavra
O capítulo 18 de Mateus inicia uma seção importante do
seu Evangelho que é o “sermão (discurso) à comunidade”. O tre-
cho anterior ao Evangelho de hoje é justamente a parábola da ove-
lha perdida (vv. 10 a 14). Podemos distinguir três orientações bá-
sicas para a comunidade. Na primeira, Jesus nos orienta para
como devemos proceder quando percebemos que um membro
da comunidade comete um pecado. Ele aconselha três tempos
ou três instâncias na vivência da correção fraterna: uma pessoa
apenas, duas ou mais e por fim toda a comunidade. O convite à
correção fraterna começa pelo encontro direto, franco e parti-
cular com aquele irmão. Não sendo possível resolver a questão
dessa forma, pede-se para mais alguém ajudar. Se ainda não der
resultado, apela-se para a Igreja. Caso o pecador não reconheça
sua falta, será ele mesmo quem estará escolhendo deixar a
comunidade.
A Igreja, sacramento de Cristo, tem a tarefa de “desligar”
pessoas e projetos que não constroem o Reino de Deus. À peda-
gogia a ser usada é a do amor dialogante e misericordioso.
À correção fraterna deve ser buscada não nas idéias ou nos
interesses pessoais, mas na oração em comum (“Se dois ou mais
estiverem reunidos em meu nome...”). Jesus afirma que sua pre-
sença sempre será visível e sensível numa assembléia orante.
Isto leva a entender a frase: “O perdão tem gosto de oração!”.

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A leitura de Ezequiel nos apresenta o profeta como “senti-
nela”, isto é, aquele que vigia pela fidelidade do povo à Lei.
Atento aos projetos de Deus e à realidade do mundo, o profeta
alerta para o que contradiz esses projetos e impede a felicidade
dos homens. É o que cantamos no Salmo responsorial 94(95),
que nos convida ao louvor e à observância da Lei do Senhor.
Na segunda leitura, são Paulo faz recomendações finais aos
romanos, especialmente na questão da relação dos cristãos com os
não-cristãos. Nos versículos que precedem o texto de hoje, ele fala
dos deveres do cristão perante as leis do Estado pagão, resumindo
todas as leis do Antigo Testamento num só versículo: “Amarás o
próximo como a ti mesmo” (v. 9). Aqui está a chave para colocar-
mos em prática o Evangelho do Senhor: o amor. “Quem ama o
outro, cumpriu a Lei.” O amor é uma “dívida” que temos para com
todas as pessoas e que nunca poderá ser saldada plenamente.

3. Atualizando a Palavra
É comum ouvirmos expressões, como: “É caso perdido”;
“Pau que nasce torto, morre torto”; “Cada um por si e Deus por
todos”; “Sou eu, por acaso, guarda de meu irmão?”; “Para que
criar mais um inimigo?”; “Roupa suja se lava em casa...”.
Jesus nos coloca hoje diante de uma questão delicada e
difícil de administrar.
Somos responsáveis uns pelos outros, sobretudo quando o
pecado está destruindo a santidade. Tal qual o profeta, identifi-
cado como “sentinela”, devemos ser pessoas responsáveis por
nós e pela comunidade. Diante do erro não podemos ficar cala-
dos. Ao deixarmos um irmão se perder, também nos perdemos.
“A promoção da pessoa acontece na comunidade”!

| Texto-base do Projeto de Evangelização “Queremos Ver Jesus”, p. 15.

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A sentinela deve estar sempre vigilante. A nossa presença
junto aos irmãos, especialmente aos que mais precisam de nós
na comunidade, não pode ser ocasional. O Evangelho insiste:
devemos esgotar todos os meios para a reconciliação. E um aler-
ta: não agir sempre sozinho, mas pedir o auxílio dos outros e da
própria comunidade. Não sou eu, mas a comunidade que tem o
poder de “ligar e desligar”.
A Igreja é sacramento de salvação porque torna presente o
Salvador. Tenhamos cuidado para não interpretar o Evangelho
de hoje num sentido jurídico, que pode lembrar a temida e mal
entendida “excomunhão”. Na liturgia, procuramos entender o
sentido eclesial, comunitário e essencialmente místico desse tex-
to. Lembremos o final da segunda leitura de hoje: “A caridade é
a plenitude da Lei”.
Se pensarmos numa doença, como o câncer, sabemos que,
quanto antes for descoberta, mais chances teremos de erradicá-
la ou ao menos de controlá-la eficazmente. Nossa Igreja e nossa
pátria não seriam mais sadias se tivéssemos coragem de afrontar
os problemas na sua raiz e no seu início? Não podemos confun-
dir cortesia com hipocrisia, silêncio com conivência e crítica com
destruição.
À comunidade não pode ser um tribunal, e sim um lugar
da ação divina. O que nos deve mover não é o nosso julgamento,
mas o coração de Deus (por isso, é bom não esquecer a parábola
da ovelha perdida que precede o Evangelho de hoje). (No próxi-
mo domingo, seguindo a leitura de Mateus, veremos o que signi-
fica o perdão em uma comunidade cristã.) Quando dois ou três
se reúnem para tomar uma decisão sobre um outro irmão, o pró-
prio Senhor se coloca no meio deles (!).
A dimensão eclesial do Evangelho de hoje nos leva a olhar
a realidade de nossas famílias, nas quais, em escala menor, per-
cebemos a necessidade da correção fraterna. Esta é indispensá-

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vel no relacionamento entre marido e esposa, entre pais e filhos,
dos filhos entre si e entre os demais membros da família.
Perdoar fraternalmente supõe uma outra qualidade origi-
nalmente cristã: saber receber o perdão.
Em nossas comunidades, não estamos demasiadamente
longe desse ideal? Quantas pessoas se conhecem de verdade, ao
menos pelo nome? Como colocar em prática esse ideal de Jesus,
se nos encontramos apenas na missa ou no culto dominical? O
que conhecemos da vida de nossos irmãos?
O que se pode fazer para criar mais grupos, comunidades,
movimentos em que as pessoas possam viver relações mais perso-
nalizadas e ajudar e ser ajudadas de verdade na vivência de sua fé”
À correção fraterna somente pode ser vivida onde houver uma
verdadeira relação cristã e comunitária. Tudo será mais fácil se crer-
mos e fizermos a experiência de que Jesus está no meio de nós.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Hoje se inicia o mês da Bíblia. A liturgia da Palavra duran-
te muito tempo não foi tão valorizada quanto a liturgia eucarística.
Passados quarenta anos do Concílio Vaticano II, a Palavra de
Deus ainda não está sendo proclamada no devido lugar que lhe
compete na liturgia.
Hoje a oração após a comunhão confirma a importância,
na celebração eucarística, das duas mesas, a da Palavra e a do
Pão: “Somos nutridos e fortificados com o alimento da Palavra e
do Pão”. Às vezes, reservamos a compreensão da “presença de
Jesus” no meio de nós apenas no momento da “consagração”.
Como diz o texto da constituição Sacrosanctum Concilium n. 7,
desde o momento da constituição da assembléia, o Senhor está
no meio de nós: “Cristo está sempre presente em sua Igreja,

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sobretudo nas ações litúrgicas. Presente está no sacrifício da mis-
sa, tanto na pessoa do ministro quanto sobretudo sob as espécies
eucarísticas. Presente está pela sua força nos sacramentos, pela
sua palavra e quando a Igreja ora e salmodia, pois ele prometeu:
*'Onde dois ou mais estiverem reunidos em meu nome, aí estarei
no meio deles””.
No Evangelho ouvimos o pedido da correção fraterna. É
importante ressaltar hoje o ato penitencial, tomando a primeira
fórmula, onde reconhecemos que somos pecadores diante de
nossos irmãos e pedimos que eles orem por nós: “Confesso a
Deus todo-poderoso e a vós, irmãos e irmãs [...] E peço à Vir-
gem Maria, aos anjos e santos e a vós, Irmãos e irmãs, que rogueis
por mim a Deus nosso Senhor !”.
Na oração sobre as oferendas pedimos: “Fazei que a nossa
participação na Eucaristia reforce entre nós os laços da amizade”.
Jesus afirmou que onde dois ou mais estiverem reunidos
em seu nome ele está presente. Essa profissão de fé na presença
do Senhor em nosso meio a fazemos várias vezes durante a cele-
bração: no Início, antes da proclamação do Evangelho, no diálo-
go inicial da prece eucarística e na bênção final: “O Senhor este-
ja convosco” — “Ele está no meio de nós!”.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
À Igreja não é uma “sociedade anônima”, mas uma comu-
nidade de irmãos e irmãs que quer “Ver Jesus, Caminho, Verda-
de e Vida”, caminhando lado a lado.

Reunimo-nos para celebrar a Páscoa de Jesus Cristo. A


primeira aclamação da assembléia dá o “tom” da celebração:

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“Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo!”. À pre-
sença de Cristo ressuscitado dá-se também em todas as pessoas
e grupos que vivem a caridade fraterna, dialogando sobre seus
acertos e erros, procurando viver na transparência e na verdade.

A liturgia é o momento em que a comunidade vive mais


intensa e explicitamente a presença do Ressuscitado. “Muito mais
do que outro sinal ou símbolo, a própria presença e o próprio
corpo de cada irmão e irmã revelam a presença do Ressuscitado
entre nós. A assembléia litúrgica torna-se, assim, O sacrário vivo
que abriga o corpo de Cristo, que é a comunidade reunida em
seu nome. É por essa razão que santo Agostinho podia dizer aos
membros de sua Igreja: “Através da comunhão recebemos aquilo
que somos, o corpo de Cristo”. E a Eucaristia, de uma maneira
especial, torna-se esse vínculo da caridade e esse sinal de comu-
nhão fraterna: alimentando-nos da mesa comum para permane-
cermos unidos entre nós.”?
Vamos criar entre todos nós uma comunidade de conver-
são. Ressoe profundamente em nossos corações o apelo do
salmista: “Oxalá ouvísseis hoje a sua voz: não endureçais os
vossos corações!”.
Santo Agostinho afirma: “Ama e faze o que queres. Se
calares, cala por amor; se falares, fala com amor; se corrigires,
corrige por amor; se perdoares, perdoa por amor. Esteja em ti a
raiz do amor, porque dessa raiz não poderá sair nada mais do
que o bem”.
Rezemos para que o Senhor, presente no meio de nós, ensi-
ne-nos essa difícil forma de amar que sabe corrigir sem desen-
corajar, avaliar sem ofender, repreender sem humilhar. Madre Te-
resa de Calcutá professava: “Eu creio no amor e na compaixão”.

2 GuiMaRÃES, M. & CARPANEDO, P. Dia do Senhor: guia para as celebrações das


comunidades. Tempo Comum (Ano A). São Paulo, Paulinas/Apostolado
Litúrgico, 2001. p. 211.

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2. Sugestões para a celebração
Cantar o refrão meditativo “Onde reina o amor, Deus aí
está”, antes de iniciar a celebração ou em outro mo-
mento oportuno.
Rezar a Prece Eucarística sobre Reconciliação II, mui-
to própria para fazer a ligação entre a Palavra e a Prece
de Ação de Graças no dia de hoje.
Valorizar o “abraço da paz”. Tal gesto é mais do que
uma saudação entre amigos. Representa um sinal sen-
sível de unidade que nos prepara para a participação na
mesa da comunhão.
Organizar, no início do mês da Bíblia, uma significati-
va procissão com o Evangeliário ou o Lecionário. Pode
ser no Início da celebração ou da liturgia da Palavra. O
lugar próprio para o Livro é o ambão. É em direção a
ele que a procissão deve conduzir o Livro, e não para
outro lugar diferente daquele de onde são proclamadas
as leituras. As leituras devem ser feitas desse Livro que
foi levado em procissão. Fica sem sentido levar um Li-
vro e proclamar de outro.
Nas comunidades em que ainda não se usa a veste
litúrgica própria para os leitores e salmistas, hoje seria
o momento significativo para introduzir essa prática com
a explicação de seu sentido: “Na Igreja, que é o Corpo
de Cristo, nem todos os membros desempenham a mes-
ma função. Essa diversidade de funções na celebração
da Eucaristia manifesta-se exteriormente pela diferen-
ça das vestes sagradas, que por isso devem ser um sinal
da função de cada ministro. Importa que as próprias
vestes sagradas contribuam também para a beleza da
ação sagrada. As vestes usadas pelos sacerdotes, os

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diáconos, bem como pelos ministros leigos são oportu-
namente abençoadas”.
* Preparar bem os leitores e salmistas, não só para hoje,
mas para todas as celebrações da Palavra e da Eucaristia.
É indispensável um ensaio das leituras, mesmo da pro-
cissão, para que os ministros saibam onde colocar o Li-
vro, as velas, as flores e também onde vão se posicionar
antes, durante e após as Leituras. Conforme diz frei
Ariovaldo: “A Palavra merece e a assembléia agradece!”.
e Não colocar cartazes em frente ao ambão ou ao altar. A
mesa da Palavra e a mesa da Eucaristia falam por si;
não precisam de enfeites para revelar sua dignidade.
* Lembrar a realização do 2º Congresso Vocacional do
Brasil que está acontecendo em Itaici, SP, com o lema:
“Ide também vós para a minha vinha!” (Mt 20,4). Pode
ser no início da celebração ou nas preces dos fiéis. Co-
locar o cartaz do Congresso em destaque no mural ou
na entrada da igreja.
e Lembrar, nos ritos iniciais ou na oração dos fiéis, o “Gri-
to dos Excluídos”. Pode-se também valorizar a bandei-
ra do Brasil.

* O Hinário Litúrgico II, p. 74, apresenta uma louvação,


“Elogio à Palavra”. Durante o mês de setembro, pode-
se aproveitá-la nas celebrações da Palavra.

3 Cf. RITUAL ROMANO. Ritual de bênçãos, bênção de objetos utilizados nas cele-
brações litúrgicas, n. 1070.

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Louvação “Elogio à Palavra”

E bom cantar um bendito,


um canto novo, um louvor!

Ao Pai, criador do universo


por Cristo, Verbo de amor!
Ao Deus que faz o que diz
e o mundo inteiro criou.
Por sua santa Palavra
mulher e homem plasmou.
Por seus profetas falando
seu povo sempre alertou.
Por santas mãos escrevendo
dois testamentos deixou.

À Boa-Nova é o Verbo
que entre nós acampou.
Das Escrituras bebendo
contente o povo em louvor!
Santo, santo, santo...

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24º Domingo do Tempo Comum
| | de setembro de 2005

Leituras: Eclesiástico 27,33-28,9;


Salmo 102(103),1-2.3-4.9-10. 11-12 (R/. 8);
Romanos 14,7-9; Mateus 18,21-35 (Perdoar aos irmãos)

“O ódio é uma coisa morta.


Quem de vocês quer ser um túmulo?”
(Kahlil Gibran)

1. Situando-nos brevemente
No seguimento de Jesus, Mateus nos ajuda a perceber as
exigências do ser cristão. Assim como no domingo passado, que-
remos celebrar o perdão. Perdão que o Senhor nos oferece gra-
tuitamente e que somos convidados a também gratuitamente
partilhar com os irmãos e as irmãs.
A data de 11 de setembro está ainda marcada em nossas
mentes. Há exatamente três-anos um atentado destruiu símbolos
do poder, da ostentação e da economia capitalista, à custa de mui-
tas vidas inocentes. A resposta continuou a lógica da “lei do talião”.
No mundo em que vivemos, brota em nós a mesma per-
gunta de Pedro: “Senhor, quantas vezes devo perdoar ao irmão
que pecou contra mim” Até sete vezes?”.
Inúmeras vezes ouvimos as expressões: “Eu perdoei, mas
para mim fulano é como se não existisse!”; “Eu não levo desafo-
ro pra casa!”; “Perdôo, mas não esqueço!”.

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Muitas pessoas têm tendência para cobrança. E se um dia
fossem apresentadas àqueles que sempre “cobram” dos outros
uma atitude, registrando tudo o que agiientaram, perdoaram, fin-
giram que não viram”? Quantos casamentos fracassaram quando
o casal começou a fazer a “contabilidade” do que um fez para o
outro! As contas até podem estar certas, mas não sustentam um
relacionamento sadio e construtivo.
Na celebração, escutamos a Palavra. Ou seja, primeiro o
Senhor nos fala, para então respondermos a ele com nossos
cânticos, preces, pedidos e orações. Neste mês da Bíblia, especial-
mente, em todas as celebrações vamos com carinho abrir os ou-
vidos e o coração para a Palavra do Senhor. É através dela que
mais facilmente podemos “Ver Jesus”.

2. Recordando a Palavra

Continuamos a leitura do capítulo 18 de Mateus, o sermão


sobre a comunidade, no qual Jesus nos propõe e ensina seu ca-
minho. No domingo passado, vimos a necessidade e a importân-
cia do convite à autocorreção. Hoje, Pedro (e nele a Igreja toda)
faz uma pergunta para saber até onde estamos obrigados a per-
doar: “Quantas vezes devo perdoar o meu irmão?”. Como se lê
na nota explicativa da Bíblia do Peregrino, “à pergunta “mate-
mática” de Pedro, Jesus responde no mesmo terreno, saltando de
um número generoso a outro indefinido. E o explica com uma
parábola que se compraz em contrastes extremos”.
Jesus não apenas responde, porém aproveita para ensinar
seus discípulos. Ele não diz até “onde” ou “quanto” devemos
perdoar, mas sim porque devemos perdoar. Para que sua respos-
ta seja bem compreendida, Jesus conta a história do rei que quer
acertar as contas com seus servos. Ao maior devedor, inicial-
mente o rei é implacável, afinal de contas a dívida era altíssima

22
PNE - QV] - CVY nº 22
(valor equivalente a trinta toneladas de ouro). Contudo, o cora-
ção do rei também é grande e, por isso, diante do pedido de cle-
mência do servo, que não implorou perdão, mas a protelação da
dívida, perdoou-a toda. O final da história é triste. Esse mesmo
servo não foi capaz de perdoar, ou ao menos dar mais tempo, a
um companheiro que lhe devia uma pequena quantia (cerca de
dois salários mínimos). Mandou prendê-lo. O rei, ao saber da
história, e diante da atitude nada generosa do servo para com seu
companheiro, ordenou sua prisão até que pagasse a dívida.
O Pai perdoa a quem também perdoa! E não esqueçamos
uma característica do perdão, expressa no último versículo do
Evangelho de hoje: “Perdoar de coração ao seu irmão”, ou seja,
no mais íntimo de nós.
Jesus começa a história da seguinte forma: “O Reino dos
céus é semelhante...”. “Reino dos céus” é uma expressão de Je-
sus para significar um modo de viver neste mundo e que vai
continuar na vida eterna. O Reino se inicia aqui e vai se plenificar
na glória. Como podemos viver na plenitude, se não dermos os
primeiros passos aqui, agora”? À eternidade depende do tempo e
do modo como se vive na terra.
O conteúdo central da pregação de Jesus é o Reino de Deus.
Na primeira leitura, tirada do livro do Eclesiástico, está
claro que o rancor, a Ira e a vingança não podem ser cultivados.
É ridículo pedir perdão e não perdoar. Como o Senhor poderá
perdoar a quem não perdoa” Significativa a admoestação de Sirac:
“Pensa no teu fim, e deixa de odiar [...) lembra a aliança com o
Altíssimo e perdoa o erro”.
Como resposta a essa leitura, cantamos o Sl 102, profes-
sando: “O Senhor é misericordioso e clemente!”. Não podemos
nos esquecer de Deus que nos perdoa, nos cura, nos redime e
nos “coroa de amor e compaixão”. Se ele não nos trata segundo
nossos erros, como podemos julgar e condenar os outros”

23
PNE - QV)] - CVV nº 22
Em um programa de TV, chamado “reality show”, um grupo
de pessoas fica “confinado” numa casa e semanalmente um de-
Jes é “eliminado”. É um reforço da mentalidade de exclusão e
incompreensão que assola nossa sociedade. O Evangelho, em
vez do “paredão”, sugere e propõe a correção fraterna, em vez
da “eliminação”, a inclusão pelo perdão e pela reconciliação.
À carta de Paulo aos romanos recorda que: “Ninguém de
nós vive ou morre para si mesmo, porque se vivemos e morre-
mos é para o Senhor que vivemos e morremos”.

3. Atualizando a Palavra
O perdão é um dos pontos mais acentuados por Jesus na
sua pregação. Ele sabe que não é fácil perdoar, talvez por isso
insista tanto nesse tema, com palavras, parábolas e, acima de
tudo, com o exemplo pessoal: “Pai, perdoai-lhes...”.
Em geral as coisas que nos magoam não são tão graves
assim: às vezes, é um favor não agradecido, um reconhecimento
que não é feito, uma palavra ingrata que nos é dita... Coisas mais
graves — por exemplo, uma calúnia, uma injúria — podem exigir
de nós uma atitude mais heróica para perdoar.
À fim de perdoarmos pequenas ou grandes ofensas é preciso
ter um coração grande, orientado para Deus. Disse João Paulo II
em visita à Irlanda: “Mesmo quando a nossa crença na bondade
profunda de todo ser humano estiver abalada ou minada, há uma
nascente de força que leva vantagem a toda decepção, a toda
amargura ou desconfiança: Jesus Cristo, que trouxe ao mundo o
perdão!”.
O perdão ensinado por Jesus é alegre, ilimitado, generoso
e gratuito. Para ele não interessa “quanto” perdoar, mas “como”
perdoar.

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PNE - QV) - CVV nº 22
A história contada por Jesus serve para nos mostrar o fun-
damento do perdão fraterno. Devemos perdoar sempre e tudo,
porque é muito — e muito mesmo — o que Deus nos perdoou e
nos perdoa. Diante da misericórdia do Senhor, tudo o que deve-
mos perdoar aos outros é totalmente insignificante, mesmo que
isso nos custe muito.
A misericórdia é, de fato, um sentimento de piedade e com-
paixão que nasce no coração do homem diante da miséria da
condição humana.
João Paulo II, em uma alocução do Ângelus, disse: “No
sacramento da penitência, o Senhor concede-nos seu perdão de
modo muito pessoal. [...] Por meio do sacerdote ouvimos Cristo
que nos diz: 'São-te perdoados os teus pecados. Vai e não tornes
a pecar”. Porventura não podemos ouvir também que ele nos
diz: “Vai e derrama sobre os outros setenta vezes sete este mes-
mo perdão e misericórdia” 7”.
Não podemos, no entanto, apenas pensar em perdoar: “Eu
te perdôo”. Temos de aprender a dizer: “Perdoa-me”. E, outras
vezes, ter coragem de dizer: “Eu aceito teu perdão”.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


À primeira leitura é uma antecipação da doutrina do pai-
nosso e do Sermão da Montanha. Está superada a “lei do talião”
pela bem-aventurança da misericórdia e da paz.
O Evangelho de hoje é a exegese mais bela do quinto pe-
dido do pai-nosso (Mt 6,12) e completa o ensinamento de Mateus
sobre o perdão.
À oração da coleta pede que sintamos em nós a ação do
amor de Deus, Criador e Senhor de todas as coisas. Se fizermos
a experiência do amor de Deus em nossas vidas, conseguiremos

25
PNE - QV) - CW nº 22
viver esse amor na nossa relação com os irmãos, perdoando as-
sim como somos perdoados.
Convém lembrar novamente o ato penitencial, quando nos
reconhecemos pecadores diante dos irmãos e pedimos que eles
orem por nós...
A oração após a comunhão: “Ó Deus, que a ação da vossa
Eucaristia penetre todo nosso ser para que não sejamos movidos
por nossos impulsos, mas pela graça do vosso sacramento”, está
em plena sintonia com a Palavra proclamada. A “oração após a
comunhão” é a “ponte” entre a celebração da Palavra e a vida.
Ela conclui a liturgia eucarística e introduz os ritos finais.
Os “nossos impulsos” certamente são de perdoar “apenas
sete vezes”. O Senhor, porém, nos dá a graça de “perdoar setenta
vezes sete vezes”!

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
“Cada celebração litúrgica na sua totalidade, e não apenas
o chamado ato penitencial, é sinal de misericórdia de Deus e da
misericórdia que, em nome de Deus, exercemos uns com os ou-
tros e que desejamos que seja instituída na sociedade. [...] Há
uma dimensão de perdão e reconciliação que faz parte da pró-
pria essência da assembléia litúrgica. Foi pela misericórdia e
compaixão de Deus que fomos tirados das trevas à luz e reuni-
dos em comunidade para cantar, para sempre, as ternuras do seu
amor”.!

! RiruaL ROMANO, Ritual de bênçãos..., op. cit., p. 219.

26
PNE - QV) - CVV nº 22
Na celebração eucarística, recordamos o memorial da Pás-
coa de Jesus Cristo, que morreu por amor de todos, derramando
seu sangue para a remissão dos pecados.
Celebramos a Páscoa de Jesus Cristo que se manifesta em
tantas pessoas e grupos que assumem a prática da compaixão e
da misericórdia como norma de vida. Lembremos as iniciativas
e os projetos desenvolvidos a partir da Campanha da Fraternidade
Ecumênica de 2005 — Felizes os que promovem a paz!

2. Sugestões para a celebração


* Retomar as sugestões do domingo anterior sobre a
liturgia da Palavra.
* Proclamar a Prece Eucarística sobre a Reconciliação 1.
* Na homilia, fazer referência ao sacramento da penitên-
cia e reconciliação. É um bom momento para ajudar as
pessoas a valorizarem esse sacramento, superando a
concepção de que ele é apenas para quem cometeu um
pecado grave, ou recebido somente em certas ocasiões.
“O sacramento da reconciliação é uma alegria, não um
desagradável dever. É uma celebração da magnanimi-
dade de nosso Deus. “Confessar” significa proclamar
não só os pecados, mas sobretudo o louvor do Deus que
perdoa. O sacramento da reconciliação é um serviço
que Deus confiou à Igreja, comunidade de salvação, para
ajudar o irmão a corrigir seu caminho, a reconciliar-se
com Deus e com seus irmãos na fé, e a proclamar a
grandeza do amor de Deus. Para quem vivia em pecado
grave, é uma verdadeira ressurreição”.?

2 KonINGs, Liturgia dominical..., op. cit., p. 187.

27
PNE - QV) - CVVY nº 22
* Valorizar o gesto do abraço da paz.
* [Lembrar que no próximo dia 14 de setembro celebra-se
a festa da Exaltação da Santa Cruz e no dia 15 de se-
tembro, a festa de Nossa Senhora das Dores.

e Rezar ou cantar no final das preces dos fiéis a Oração


de São Francisco: “Senhor, fazei de mim um instrumento
de tua paz...”.

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PNE - QV) - CVV nº 22
25º Domingo do Tempo Comum
|8 de setembro de 2005

Leituras: Isaías 55,6-9; Salmo 144(145),2-3.8-9.17-18 (R/. 18a);


Filipenses 1,20c-24.27a; Mateus 20,1-l6a (Operários da vinha)

A surpresa da bondade de Deus:


um lugar para todos

1. Situando-nos brevemente

Quantas vezes ouvimos dizer: “Deus está sendo injusto


comigo!”; “Por que para aquela pessoa, tão boa, tudo dá errado
na vida?”; “Onde está a justiça de Deus? Eu sempre fui bom
para com todos, por que Deus me castigou com essa doença?”.
A gratuidade é uma das lições mais difíceis de entender e
viver. Somente com ela poderemos compreender um pouco do
mistério pascal de Jesus Cristo.
Ressoa ainda em nossa Igreja o 2º Congresso Vocacional
do Brasil, realizado no início deste mês, em Itaici, SP, com o
lema tirado do Evangelho de hoje: “Ide também vós para a mi-
nha vinha!”.
O Projeto “Queremos Ver Jesus” convida-nos para um tra-
balho evangelizador e missionário. É uma proposta missionária.
Muitos querem ser contratados para a vinha do Senhor. Muitos
dos que já trabalham querem aprofundar o seu encontro pessoal
com o Senhor.

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PNE - QV] - CVY nº 22
2. Recordando a Palavra

A primeira leitura foi escrita para o povo que retornava do


exílio. Talvez seus pensamentos fossem de vingança contra os
que haviam ocupado suas terras. Para Deus, no entanto, esse não
deve ser o momento de o povo vingar-se, mas de converter-se.
Converter-se significa procurar ser como o Senhor, invocá-lo,
abandonar o mau caminho e os maus pensamentos. Acima de
tudo, é conformar os próprios pensamentos aos pensamentos de
Deus, rico em misericórdia. Ele é alguém que não faz acepção
de pessoa.
A Boa-Nova do Evangelho revela a misericórdia e a bon-
dade infinitas de Deus para com todos. A parábola, narrada hoje,
encontra-se apenas no Evangelho de Mateus. É segiiência da pa-
rábola do jovem rico. A sua “moldura” é a afirmação: “Muitos
que são primeiros serão últimos, e muitos que são últimos serão
primeiros” (Mt 19,30 e 20,16).

À história começa cóm o “pai de família” que, no tempo


da colheita, vai contratar empregados. Encontrar pessoas desem-
pregadas era muito fácil. O trabalhador rural da Palestina traba-
lhava do nascer ao pôr-do-sol. Um denário, salário estipulado
para um dia de trabalho, equivalia ao preço de uma medida de
trigo ou três medidas de cevada, o indispensável para a alimen-
tação de uma família por dia.
O pai de família contrata os primeiros trabalhadores bem
cedo e acerta com eles uma moeda como pagamento. Por volta
das 8 horas contrata mais alguns, mas não diz quanto vai pagar.
Faz o mesmo ao meio-dia, às 15 e às 177 horas. Primeiro conver-
sa com eles e depois os manda para a vinha.
O inesperado acontece na hora do pagamento. Começa
pelos contratados no fim do dia, e dá-lhes um denário. Sucessi-
vamente, todos ganham a mesma quantia. Ao receberem o que

30
PNE - QV) - CVY nº 22
tinham combinado com o patrão, há murmuração e decepção
entre os que trabalharam desde de manhã cedo: “Bem que mere-
cíamos mais, afinal trabalhamos mais!”.

O dono da vinha não estava sendo injusto. O problema


emerge da inveja dos que trabalharam mais (“[...] ou o teu olho é
mau porque eu sou bom?”, v. 15). O “olho mau” indica aqui a
falta de amor daqueles trabalhadores murmuradores que se dei-
xaram levar pela inveja diante do bem que os seus companhei-
ros experimentavam. Eles não souberam participar da alegria do
bem vivido. Por outro lado, poderíamos dizer que os “últimos”
contratados foram humildes e confiaram, pois teriam direito a
receber muito pouco pelo trabalho. Mas foram e atenderam ao
convite.
Até o 28º Domingo do Tempo Comum (9/10), ouviremos
algumas partes da carta de Paulo aos filipenses. Paulo, priísio-
neiro e correndo perigo de morte, vive um dilema: estar com
Cristo ou trabalhar por ele permanecendo com sua comunidade”
Quer estar logo junto dele na eternidade, mas sabe que tem uma
missão aqui na terra: anunciar Cristo a todos. Paulo também deve
conformar o seu desejo ao pensamento de Cristo. No fim ele
entende que o seu viver já é Cristo: viverá em prol da comunida-
de, para que ela também viva conforme o Evangelho de Cristo.

3. Atualizando a Palavra
Ao escutarmos o Evangelho de hoje, ressoam duas inquie-
tantes perguntas: “Estás com ciúme por eu ser bom?”; “Por que
o senhor age assim?”.
O ponto forte da parábola não está na vinha, no dono da
vinha nem nos operários, mas sim no ajuste de contas ao final
do dia. Aí está a chave da Boa-Nova que o evangelista quer
mostrar.

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PNE - QV] - CVV nº 22
O senhor da vinha é justo, à maneira humana, com os pri-
meiros, porque paga conforme o combinado. No entanto, ele tam-
bém é justo com os últimos, só que à maneira divina.
A justiça de Deus não é contra a justiça humana, mas a
supera pela bondade que é incalculável, incomparável e eterna.
Deus não é injusto ao ser generoso.
“A lei do seu Reino parece ser o paradoxo, o inédito, o
inesperado. Deus escolhe as coisas frágeis e desprezíveis deste
mundo para confundir as fortes e bem consideradas. Não esco-
lhe o primeiro mas o último, não o justo mas o pecador, não o
sadio mas o doente. Faz mais festa pela ovelha perdida e reen-
contrada do que pelas 99 que estão na segurança do aprisco. O
Deus cristão é o “absolutamente Outro”, o imprevisível. Ele es-
capa a qualquer definição e revela continuamente novos aspec-
tos do seu mistério.”!
Para quem foi ou é dirigida essa parábola?
No tempo de Jesus, é evidente que ela dirigia-se aos
fariseus, aos escribas e aos demais que se julgavam salvos por
seus méritos, pelo cumprimento dos preceitos religiosos, pela
prática das orações. Jesus abre-lhes os olhos: o céu não é prê-
mio, mas sim dom.

Na comunidade para a qual Mateus escreve o Evangelho,


há o problema dos novos cristãos. Ele dirige-se aos judeus, que
poderiam se considerar os “operários da primeira hora”, portan-
to, com mais méritos diante de Jesus, e considerar os pagãos que
recentemente estavam acolhendo a Palavra como aqueles da “úl-
tima hora”, não tão merecedores dos bens eternos.
E hoje, para quem é dirigida a parábola?

| MissaL DominicaL. São Paulo, Paulus, 1987. p. 771.

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PNE - QV] - CVV nº 22
Como ouvimos na primeira leitura, “Os meus pensamen-
tos não são os vossos pensamentos, e os meus caminhos não são
os vossos caminhos!”. Deus não tem inimigos: não aceita que
alguém possa limitar sua bondade e decidir quem é por ele ou
contra ele. Os responsáveis pela religião não podem pretender
ser responsáveis também por Deus,
Sim, essa palavra é dirigida para nós, pessoas da Igreja,
cristãos praticantes. É ajuda para fazermos exame de consciên-
cia. Hoje, os “operários da última hora” têm outros nomes, ou
seja, os excluídos de qualquer espécie: física, política, econômi-
ca, material, espiritual, moralmente.

Se somos da “primeira hora”, saibamos acolher com o


mesmo amor que o Pai acolhe os da “última hora”. Os “certi-
nhos” não podem ter ciúme! O céu não é um “clube fechado”.
A Igreja do Brasil realizou o seu 2º Congresso Vocacional
com o lema tirado do Evangelho de hoje. Transcrevemos aqui
algumas reflexões apresentadas no texto-base,? especificamen-
te os itens 2 e 6 do segundo capítulo, que nos ajudam a refletir
sobre o Evangelho deste domingo.
1. A vinha do Senhor, uma parábola vocacional.

2. Igreja: comunidade vocacional.


a. Ainiciativa do chamado à santidade é sempre de Deus.
[...] Em sua pedagogia, o Senhor da Messe vai ao
encontro das pessoas, lá onde elas se encontram, e as
convoca para o trabalho da vinha. Ele está sempre
chamando: a qualquer hora e em todo lugar.
b. Cada vocacionado tem seu tempo, sua hora. Muitas
vezes a resposta é dada sem que se saiba muito bem

2 “Tde também vós para a minha vinha!”, texto-base do 2º Congresso Vocacional


do Brasil, CNBB, Brasília, 2004, pp. 23-26.

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PNE - QV) - CVV nº 22
o que é preciso fazer. A missão só vai ficando evi-
dente a partir do momento em que a pessoa inicia
uma resposta ao chamado. Somente quando se entra
na vinha é que se começa a saber o que precisa ser
feito e o que deve fazer. Isso mostra a necessidade de
uma participação ativa na vida da comunidade, con-
dição essencial para uma definição mais clara da
vocação específica.
c. A partir da parábola, compreende-se melhor a eclesio-
logia de comunhão e serviço. A Igreja é a comunidade
de chamados e enviados para trabalhar na vinha
d. São diversos os grupos que trabalham na vinha. Cada
um é chamado a contribuir, o que manifesta a diver-
sidade e a riqueza da Igreja em comunhão de minis-
térios e serviços.
e. Os grupos trabalham na mesma vinha. Não há lu-
gar para atitudes autoritárias e para o clericalis-
mo. Nenhum grupo pode considerar-se auto-sufi-
ciente. Também, nenhum grupo substitui o outro. À
missão é própria e intransferível. Os ministérios não
são “suplências”.
A praça: lugar vocacional.
Ds

O vocacionado que envia.


Ao

Da murmuração à gratuidade.
Na

A santidade dos trabalhadores da vinha.

a. Jesus alerta a todos os vocacionados e vocacionadas


que o importante não é o tempo ou a quantidade de
trabalho, mas o amor e a disposição para servir na
vinha. Diante de Deus, tem mais valor o espírito com
o qual se cumpre a missão do que os resultados ime-
diatos.

34
PNE - QV) - CVV nº 22
b. O chamado se dá na gratuidade e no amor. As dife-
rentes horas também equivalem aos diferentes ser-
VIÇOS.
c. Jesus quer uma Igreja que se considere como comu-
nidade de pessoas que são convidadas, vocacionadas,
dela participam e na participação descobrem a pró-
pria missão. Uma Igreja que não diz primeiro o que
tem de ser feito, mas apenas chama, deixando aos
vocacionados a liberdade de escolherem o caminho,
a partir da vivência do compromisso batismal. Por-
tanto, o primeiro chamado não é para um tipo de
vocação específica, mas para ser Igreja.
d. Se há pessoas fora da vinha é porque não foram cha-
madas. Elas não são culpadas, mas apenas vítimas
da omissão dos que deveriam convocá-las em nome
do Dono da vinha.

4. Ligando a Palavra com a acão eucarística


Na Eucaristia celebramos a bondade do Senhor, manifes-
tada na aliança que fez conosco através de Jesus.
À bondade e o amor de Deus são totalmente gratuitos. Ele
preparou a mesa e nos convida a dela participar. Não fazemos
um favor a Deus por estarmos aqui presentes a esta Eucaristia. É
ele quem nos oferece a possibilidade de recebermos os seus dons,
de ouvirmos sua palavra e de experimentarmos a bondade que
demonstra a todos os homens.
Qual é nosso trabalho? Para que fomos “contratados”? As
orações deste domingo nos ajudam a responder: “Amar a Deus e ao
próximo, observando os mandamentos” (coleta), “Proclamar a nossa
fé” (sobre as oferendas). Sendo bons operários, “colheremos os
frutos da redenção na liturgia e na vida” (após a comunhão).

35
PNE - QV) - CVVY nº 22
Assim como os pais não medem o que gastam em excesso
de bondade por um filho doente ou portador de uma deficiência,
do mesmo modo ninguém pode acusar a Deus, que, na sua pura
liberdade de amor, nos abençoa segundo a necessidade de cada
um. O mistério está em Deus. Que a celebração de hoje nos faça
penetrar nesse mistério divino.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
O Senhor nos chama a aprofundar sua aliança para conosco
como dom gratuito do seu amor em Jesus Cristo.
Vamos celebrar a Páscoa de Jesus, que continua a se mani-
festar em tantas pessoas e grupos que não “calculam” sua doa-
ção e seu amor para com os mais pobres. Bendigamos ao Pai
porque ele não nos trata conforme a eficiência e o resultado de
nossos trabalhos, mas na proporção do seu amor terno e eterno.
Na Eucaristia de hoje, demos graças por todas as manifestações
da bondade de Deus e do próximo.
Na celebração litúrgica, “os trabalhadores e trabalhado-
ras do reino de hoje, não importa se da primeira ou da última
hora, são igualmente admitidos à mesa e recebem todos a mes-
ma Palavra e o mesmo Pão. De nossa parte, é importante que
nos libertemos e libertemos o culto de uma visão de mérito, de
prêmio e recompensa, seja a nosso respeito, seja a respeito dos
outros, para que possamos gozar o encanto da festa que é dada
indistintamente para todos”.

* GUIMARÃES & CARPANEDO, Dia do Senhor..., Op. cit., p. 227.

36
PNE - QV) - CVV nº 22
2. Sugestões para a celebração
e Continuar destacando o ambão e preparar o ambiente
com flores.
e Antes da liturgia da Palavra ou após a homilia, pode-se
fazer um momento de silêncio para que a assembléia
consiga mais facilmente abrir seu coração ao que o Se-
nhor nos fala. Somos “operários” que querem ouvir O
seu “chamado” para trabalhar em sua vinha.
e Rezar a Prece Eucarística para Diversas Circunstân-
cias I, “A Igreja a caminho da unidade”.
e Na homilia, aquele que preside pode lembrar ou mes-
mo motivar as pessoas a lerem a exortação apostólica
Christifidelis Laici, escrita por João Paulo II no final de
1988, justamente sobre a vocação e missão dos leigos.
* O Evangelho pode ser proclamado por diversas pessoas:
narrador, empregados, Jesus.
e Na oração dos fiéis, fazer uma prece especial pelos de-
sempregados.
e Relatar sobre o 2º Congresso Vocacional do Brasil, apre-
sentando as conclusões do Congresso.
e Em2]1 de setembro é comemorado o dia de são Mateus,
o evangelista do Ano À, que está nos orientando, a cada
domingo, no caminho do seguimento de Jesus. Em al-
gum momento da celebração, lembrar a vida de são
Mateus e motivar as pessoas a lerem o seu Evangelho
em casa.
Oração: “Ó Deus, que na vossa inesgotável misericór-
dia escolhestes o publicano Mateus para torná-lo após-
tolo, dai-nos, por sua oração e exemplo, a graça de vos
seguir e permanecer sempre convosco. PNSJC. Amém”.

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PNE - QV) - CVV nº 22
26º Domingo do Tempo Comum
25 de setembro de 2005

Leituras: Ezequiel 18,25-28;


Salmo 24(25),4bc-5.6-7.8-9 (R/. 6a); Filipenses 2,1-1lI;
Mateus 21,28-32 (Os dois filhos diferentes)

Nossas ações expressem


o que proclamamos

1. Situando-nos brevemente

No domingo passado, ouvimos a parábola dos trabalhado-


res da vinha (da primeira e da última hora). A parábola de hoje,
como também as dos próximos dois domingos, tem o mesmo
“tema”: a rejeição do povo judeu que não quis escutar Jesus. As
leituras chamam a atenção para a responsabilidade que temos
sobre nossos atos e suas consegiiências. Elas também apontam
para a importância de haver coerência entre o que pensamos,
dizemos e aquilo que fazemos. Como somos imperfeitos, nem
sempre conseguimos manter essa coerência; por isso, na oração
da coleta, pedimos ao Pai seu perdão e sua misericórdia: “Ó Deus,
que mostrais vosso poder sobretudo no perdão e na misericór-
dia, derramai sempre em nós a vossa graça”.
Talvez conheçamos uma pessoa que era viciada em bebi-
da e, de repente, converteu-se em “crente”, deixou de beber e até
se tornou pastora de alguma igreja? Ou sabemos de alguém que
era mau e, sem explicação, arriscou sua vida para salvar uma

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PNE - QV) - CVY nº 22
criança em perigo? Ouvimos, por vezes, pessoas importantes di-
zerem que fizeram “opção pelos pobres”, mas só têm tempo para
os ricos e cultos? Frequentemente, escutamos a famosa expres-
são: “Parece mas não é!”.
Que esta celebração nos leve a repensar como estamos es-
tabelecendo a relação entre o que dizemos e o que fazemos.
Estamos sendo coerentes? Como vemos os outros? Pelas apa-
rências ou buscamos vê-los como o Pai mesmo os vê? O Projeto
“Queremos Ver Jesus” nos desafia à busca da santidade como
condição para evangelizar.

2. Recordando a Palavra

A liturgia da Palavra centra-se nas consegiiências advindas


dos atos praticados, das atitudes manifestas pelas pessoas.
O profeta Ezequiel é muito claro ao mostrar que a conse-
quência de um ato não deriva das características da pessoa que o
realiza, mas da própria ação. O ato mau, mesmo praticado por um
justo, gera consegiiências más — que ele compara à morte: “Quan-
do um justo se desvia da justiça, é por causa do mal praticado que
ele morre”. Assim como o bem, mesmo se praticado por um ímpio,
gera consegiiências positivas — que o profeta denomina vida:
“Quando um ímpio observa o direito e a justiça, conserva a pró-
pria vida”. Segundo o comentário da Bíblia do Peregrino, o capí-
tulo 18 de Ezequiel é um dos mais importantes do livro. O versículo
central deste capítulo é o 23: “Acaso eu quero a morte do perver-
so, € não que se converta de sua conduta e viva?”. A leitura de
hoje, no entanto, começa no versículo 25, que apresenta a objeção
dos resignados e dos que não querem converter-se. Eles julgam
Deus a partir de si. A leitura apresenta a proposta de Deus.
O texto de Mateus, lido hoje, narra uma parábola presente
apenas em seu Evangelho. Resgata as imagens proféticas de

39
PNE - QV] - CVV nº 22
Ezequiel, através da parábola dos dois filhos. O que se conside-
rou aí, o que efetivamente se valorizou, não foram as palavras de
cada jovem, pois eram palavras vazias, incoerentes com o agir.
Julgaram-se, sim, as ações praticadas. Essa contraposição forte
de palavras/atos mostra-nos que palavras/ações formam um con-
junto indissociável, cujas partes não podem ser avaliadas sepa-
radamente. O primeiro filho disse: “Não quero”, e foi; o segun-
do disse: “Sim, eu vou”, mas não foi. Se nos detivéssemos ape-
nas nas respostas de cada um, erroneamente, pensaríamos que o
filho que fala de maneira positiva é o filho bom, que vai praticar
o bem, quando o contrário é que corresponde à verdade. São os
atos que validam as palavras.
Cristo, na cidade de Jerusalém, ao aproximar-se sua “hora”,
remete a parábola aos sumos sacerdotes e anciãos, assim como
já tinha falado aos fariseus. Ele responde a todos os que se es-
candalizam com sua predileção pelos pecadores, dizendo-lhes
que estes estão mais próximos da salvação do que os que se con-
sideram justos (lembremos a visita a Zaqueu, a prostituta que
lhe lava os pés, a adúltera perdoada etc.). A parábola se dirige,
pois, aos que se fecham para a Boa-Nova, aos que não querem
reconhecer a identidade de Deus em nome da própria justiça e se
consideram pagos por sua própria suficiência.
Nessa mesma linha, vai o pensamento de Paulo. A leitura
de hoje é continuação da leitura do domingo passado (lembra-
mos que essa leitura é feita também no Domingo de Ramos, como
introdução ao grande mistério da paixão e ressurreição do Se-
nhor). É um hino do culto cristão a Jesus Cristo Senhor e por ele
ao Pai. Todo o hino está estruturado pelo esquema da humilha-
ção e exaltação, descida e subida. Ele inicia-se apresentando cinco
condições (se existe consolação na vida em Cristo, se existe alen-
to no amor mútuo, se existe comunhão no Espírito, se existem
ternura e compaixão), que desembocam na indicação de como
os cristãos devem ser e agir, esforçando-se para seguir do modo

40
PNE - QV) - CVY nº 22
mais perfeito o exemplo do próprio Cristo: humildes, obedien-
tes à vontade do Pai, unidos no amor. A conclusão do hino, desse
“movimento” apresentado por Paulo, é a glória do Pai.
À Palavra de Deus, manifesta nessas três leituras, respon-
demos com nossa oração de confiança em sua bondade e miseri-
córdia, conforme expresso no salmo responsorial: “Sois o Deus
de minha salvação, em vós espero, ó Senhor, todos os dias!”.

3. Atualizando a Palavra
Há nas leituras de hoje um chamamento à prática do bem,
aquilo que é agradável a Deus, um convite para fazermos sua
vontade.
À rememoração desse chamado, que cada um recebe do
Pai, é muito oportuna neste Dia da Bíblia, pois é exatamente
nela que encontramos a orientação, a iluminação para atendê-lo.
A Bíblia contém a própria revelação da Palavra de nosso
Deus. A leitura bíblica, quer nas celebrações litúrgicas, quer nos
momentos de oração pessoal, conduz nosso espírito aos ensina-
mentos do Pai, nos abre a sua vontade.

Quando lemos a Bíblia, Deus fala conosco, e é uma forma


de escutá-lo em meio ao tumulto do dia-a-dia, à correria sem-
fim da vida moderna. À escuta, silenciosa, da voz do Pai leva-
nos à percepção de qual é sua vontade. À reflexão sobre a Pala-
vra abre-nos perspectivas de como praticar o bem, na concretude
de nossas vidas, pontilhadas de desafios e contradições. A leitu-
ra bíblica nos ajuda a parar, pelo menos num breve instante, a
fim de nos perguntarmos se existem consolação, alento, comu-
nhão, ternura e compaixão naquilo que fazemos habitualmente e
descobrir como podemos concretizar isso, como podemos mani-
festar o bem que vem de Deus em nossas atividades usuais, se-
jam elas no ambiente de trabalho, em casa, nos períodos de lazer.

41
PNE - QV) - CVV nº 22
Nossa prática religiosa não pode ser medida apenas exte-
rior € quantitativamente (participação nas missas, sacramentos,
devoções, esmolas...). Os resultados das pesquisas feitas sobre o
número de cristãos no Brasil evidenciam uma contradição quan-
do os relacionamos com a situação social em que vivemos. “O
cristão opera a Integração fé-vida. Isto é, o “sim” de sua fé se
torna o “sim” de sua vida; a palavra e a confissão dos lábios se
tornam ação e gesto das mãos. Assim, a discriminação entre o
“sim” e o “não” não passa através das práticas e da observância
das leis, mas através da vida.”! Somos chamados à coerência
pela interiorização, pela vivência da espiritualidade e pela reali-
zação de boas obras.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


À celebração eucarística articula-se em duas mesas: a da
Palavra (ambão) e a da Eucaristia (altar).
Na liturgia da Palavra, celebramos a presença de Cristo
entre nós pela escuta atenta e produtiva dos textos bíblicos.
Desde o Concílio Vaticano II, a Igreja revaloriza “os tesou-
ros da Bíblia” (Sacrosanctum Concilium, n. 48). A constituição
Sacrosanctum Concilium orienta: “Restaure-se o uso abundante
e variado e bem distribuído da Sagrada Escritura nas celebra-
ções litúrgicas” (n. 35); “Promovam-se celebrações da Palavra”
(n. 35); “Instruir-se com a Palavra de Deus, alimentar-se com o
corpo do Senhor” (n. 48).
Temos, desde então, a oportunidade de entrar em contato
direto com a revelação bíblica, de interiorizar os ensinamentos
de nosso Deus, bebendo na própria fonte.

| MissaL DOMINICAL, OP. cit., p. 777.

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PNE - QV) - CVY nº 22
Na liturgia eucarística, nos alimentamos do Corpo e do
Sangue de Cristo. Na liturgia da Palavra, o alimento apresenta-
se na fala de Deus, que usa os autores bíblicos para se comunicar
conosco. Palavra e Eucaristia estão intimamente ligadas. Por elas
Deus se torna presente em meio a seu povo, pois foi o Verbo que
se fez carne e habitou entre nós. Escutar a Palavra é tão essencial
quanto alimentar-se do Pão do Senhor, pois ambos nos fortale-
cem para que possamos praticar o bem em nossas vidas.
O Pão e o Vinho eucarísticos nos fazem participar da mor-
te e ressurreição de Cristo, prontos para ir com ele até a cruz.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Participar da celebração eucarística é atender ao chamado
do Pai. E dizer-lhe “sim, eu vou” e, efetivamente, colocar-se à
disposição € a serviço.
Na missa, revivemos a Páscoa de Cristo, sua morte e res-
surreição. Jesus veio para todos e não só para alguns, aparente-
mente melhores que outros. A salvação é oferecida a todos, sem
barreiras e sem discriminações.
Que possamos, na celebração de hoje, constituir-nos em
verdadeiro povo de Deus, irmanados a todas as mulheres e a
todos os homens de boa vontade que se propõem a seguir o ca-
minho de justiça, anunciado por João Batista.

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PNE - QV) - CVV nº 22
2. Sugestões para a celebração
Usar incenso durante a proclamação da Palavra, espe-
cialmente no Evangelho.
Acolher o Lecionário, acompanhado por velas, com can-
to de um refrão ou canto específico (“Pela palavra de
Deus”, do fr. Luiz Turra, ou “Toda a Bíblia é comunica-
ção”, do pe. José Cândido da Silva), no começo da ce-
lebração ou antes de liturgia da Palavra.
Destacar o ambão através de uma ornamentação especial.
Na profissão de fé, solicitar que a assembléia estenda a
mão direita em direção ao ambão e renove sua adesão à
Palavra que foi proclamada.
Nas celebrações eucarísticas, rezar o Prefácio VII dos
Domingos do Tempo Comum, n. 54, que tem como tí-
tulo “A salvação pela obediência de Cristo”.
Dar a bênção final com o Evangeliário ou o Lecionário.
Depois o Livro pode ser levado até a porta de entrada
para que cada pessoa, ao sair, faça um gesto de reverên-
cia diante dele. Pode-se cantar: “Tua Palavra é lâmpa-
da”, do pe. Josmar Braga.
Lembrar que, no próximo dia 29 de setembro, comemora-
se a festa dos arcanjos são Miguel (Quem é como Deus"),
são Gabriel (Força de Deus) e são Rafael (Deus curou).
No próximo dia 30, fazemos memória de são Jerônimo
(T 420). Este santo converteu-se ao cristianismo e deci-
diu ser monge. Nos últimos trinta e cinco anos de sua
vida viveu em Belém, na penitência e na oração. Tradu-
ziu os textos originais da Sagrada Escritura para o la-
tim, texto conhecido como “Vulgata”. São Jerônimo é
doutor da Igreja, com o título de Doutor Máximo das

44
PNE - QV) - CVY nº 22
Escrituras. E dele a afirmação: “Ignorar as Escrituras é
ignorar o próprio Cristo!”.
Oração: “Ó Deus, que destes ao presbítero são Jerônimo
profundo amor pela Sagrada Escritura, concedei ao vos-
so povo alimentar-se cada vez mais da vossa Palavra e
nela encontrar a fonte da vida. PNSJC. Amém”.
27º Domingo do Tempo Comum
2 de outubro de 2005

Leituras: Isaías 5,1-7;


Salmo 79(80),9.12.13-14.15-16.19-20 (R/. Is 5,7a); Filipenses 4,6-9;
Mateus 21,33-43 (Parábola dos vinhateiros)

O Reino será entregue a um


povo que produza frutos

1. Situando-nos brevemente
Em continuidade à leitura do capítulo 21 de Mateus, inicia-
da no domingo passado, hoje nos é apresentada a parábola dos
vinhateiros e do proprietário da vinha. Mais uma vez, Mateus
recorre a essa imagem para representar o Reino de Deus e para
nos indagar sobre a forma como vivemos o seguimento a Jesus.
No 26º Domingo, a parábola nos questionava sobre a coe-
rência entre o que dizemos e o que fazemos. Hoje, o questio-
namento visa à fidelidade, à nossa resposta fiel e frutuosa ao
chamado de Deus. No próximo domingo, na parábola da festa
das bodas, Jesus falará sobre quem realmente poderá participar
do Reino por ele inaugurado.
Na nossa vida, às vezes, nos perguntamos diante de pessoas
às quais dedicamos tempo e carinho: “Por que ele fez isso comi-
go?”. Até temos uma expressão muito popular: “Onde foi que eu
errei?”, parecida com a que está na primeira leitura de hoje: “Que
poderia eu ter feito a mais por minha vinha e não fiz?”.

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PNE - QV) - CVY nº 22
À participação na Eucaristia, vivência semanal da Páscoa
de Cristo, é expressão de nossa fidelidade ao Pai. Iniciando o
mês missionário, dentro do Projeto “Queremos Ver Jesus”, é
importante estarmos atentos ao que o Evangelho pede de uma
Igreja missionária.

2. Recordando a Palavra

Neste domingo do Tempo Comum, somos chamados a re-


fletir sobre a fidelidade.
A leitura do Antigo Testamento, do livro do profeta Isaías,
mostra como Deus prepara amorosamente o ambiente para rece-
ber seu povo escolhido. Esse texto foi escrito lfá cerca de sete-
centos anos antes de Cristo e o profeta quer ajudar o povo a
perceber as ambigiiidades de sua relação com Deus. O lagar é
um tanque de onde se retira o doce suco das uvas. À imagem de
sua construção pelo vinhateiro representa que Deus espera que
seus filhos produzam bons frutos, que possam ser aproveitados
no lagar da vida. Deus fez tudo de bom, no entanto, a resposta
que recebeu foi a injustiça e a iniqiidade. No texto do Antigo
Testamento, Deus ainda não é visto sob a ótica de sua infinita
bondade, por 1sso, a falta de fidelidade dos homens provoca a ira
de Deus, que será redimensionado pela nova mensagem trazida
por Cristo.
O Evangelho retoma a imagem da vinha, dos vinhateiros,
dos funcionários e do filho do proprietário. A narração de Isaías
é atualizada sob a forma de parábola, tão característica da peda-
gogia de Jesus. Nessa parábola, quem são os vinhateiros perver-
sos? Somos nós, quando nos afastamos de Deus, quando não
produzimos bons frutos. Aí, não se expressa mais a maldição.
Mas Deus retira a vinha dos que não souberam cultivá-la e a
passa a outros que saibam fazê-la produzir bons frutos. Vemos
assim a diferença entre a primeira leitura e o Evangelho. Desse
/ Ls 44
unha CS Leds Ra / mto do [re er,
x PP VIAON NA / + 47

PNE - QV) - CVV nº 22


modo é indicada a tarefa da Igreja depois da morte de Jesus: é o
novo povo que tem a missão de “dar frutos”.
Da prisão, Paulo escreve à comunidade de Filipos, ofere-
cendo pistas para que a vinha não seja entregue aos vinhateiros
perversos nem produza maus frutos: que a comunidade se ocupe
de tudo que é verdadeiro, justo, puro, amável e honroso; e reco-
menda a oração, isto é, que se apresentem ao Pai as próprias ne-
cessidades, com súplicas e ação de graças. Paulo sabe que Deus é
fiel mesmo para aqueles que lhe são infiéis. Quando há o arrepen-
dimento, ele está sempre pronto a acolher as orações e as súplicas.

3. Atualizando a Palavra
O núcleo das leituras de hoje é a fidelidade. O que signifi-
ca fidelidade?
Na sociedade atual, podemos compreendê-la como a lógica
do mercado a entende, pois houve uma apropriação de um termo
religioso (correspondente à fé — fides —, à relação entre o ser hu-
mano e Deus), o que contribui, como tantas outras situações pós-
modernas, para a confusão entre o mundano e o religioso.
Atualmente, no âmbito empresarial, fala-se que é necessá-
rio ter clientes fiéis, em fidelização da clientela. Isso sugere que
as pessoas sejam atraídas por marcas ou por produtos, de tal modo
que se sintam impelidas, constante e até irracionalmente, a con-
sumir produtos específicos ou a escolher determinada marca. Esse
comportamento, muitas vezes, é obtido pela manipulação, pela
criação artificial de desejos e necessidades, no que os departa-
mentos de marketing são muito competentes.
Na dimensão divina, na relação com o transcendente,
fidelidade apresenta outra significação. A fidelidade emanada
da fé é um vínculo que articula respeito, lealdade e compromisso.
É um vínculo de amor mútuo. É um vínculo entre pessoas

48
PNE - QV) - CV nº 22
(Deus <—> ser humano), não entre pessoa e objetos, coisas ou
mesmo abstrações. A fidelidade entre o Pai e seus filhos não
resulta da atuação de um departamento de marketing, mas da
ação do coração amoroso de Deus. A missão não é fácil. Suscita
opositores até entre “sócios” do dono.
Canta o salmista que Deus é fiel e justo, pois respeita nos-
sas opções e manifesta seu compromisso de amor conosco es-
tando sempre aberto a nos acolher.
E nós, como demonstramos nossa fidelidade ao Pai? Con-
taminados pela lógica do mercado, tratamos a ele como um pro-
duto, ao qual retornamos com fregiiência, mas que não requer
nenhum compromisso maior? Ou somos fiéis aos seus desígnios
amorosos de Pai, manifestando-lhe nosso respeito e lealdade,
observando os preceitos de nossa fé, assumindo o compromisso
inerente à relação pessoal e amorosa”
Sendo fiéis, produzimos bons frutos: o que é justo, respei-
tável, puro, amável, honroso — conforme nos indica a carta de
Paulo.

Ao pensarmos nesse vínculo de fidelidade que nos une ao


Pai e ao refletir sobre as leituras deste domingo, lembremos que,
na linguagem do Antigo Testamento, Deus, muitas vezes, é mos-
trado como violento e vingativo. Através de Cristo, porém, vemo-
lo de um modo diferente. Cristo nos mostra um Pai de miseri-
córdia, de bondade, que nos concede mais do que merecemos,
mais do que ousamos pedir — tal qual rezamos na oração da
coleta deste domingo.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Deus é fiel e justo. No S1 779, rezamos: “Nunca mais vos
deixaremos, Senhor Deus!”, porque somos nós que, muitas ve-
zes, por nossa imperfeição, falhamos e nos afastamos do Pai, o

49
PNE - QV) - CVV nº 22
abandonamos, não o escutamos. O Pai, ao contrário, afirma e
cumpre: “Eu estarei contigo” (Ex 3,12).
Em sua infinita fidelidade, o Pai está sempre pronto a nos
acolher; portanto, ao nos darmos conta de nossa infidelidade,
não devemos temer em pedir, como fazemos hoje na oração da
coleta: “Ó Deus eterno e todo poderoso [...] derramai sobre nós
a vossa misericórdia, perdoando o que nos pesa na consciência e
dando-nos mais do que ousamos pedir”; e também na oração
sobre as oferendas: “Ó Deus [...] pelos mistérios que celebramos
em vossa honra, completai a santificação dos que salvastes”.
Possamos incessantemente unir nossa voz aos louvores dos
anjos e santos para dar graças ao Pai pela magnitude de seu per-
dão, de sua bondade e de sua fidelidade.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
O domingo pode ser denominado de “domingo da fideli-
dade”. Deus nos chama a ser fiéis, a seguir o exemplo de Cristo
que foi totalmente fiel, mesmo nos momentos mais difíceis, mais
dolorosos, de maior confrontação. Cristo resistiu à tentação do
demônio, permaneceu fiel à missão para a qual o Pai o enviara.
Talvez contaminados pela lógica do mercado, pela confusão
de valores provocada pela sociedade de consumo, sejamos, tantas
vezes, infiéis. Nesse contexto, em especial na cultura urbana, fica
tão fácil leiloar a fidelidade, mudar o objeto de nossa fidelidade.
Deus, no entanto, nos privilegia com outro tipo de fideli-
dade, a que brota do vínculo amoroso.
Na celebração de hoje nos confortamos em experienciar a
fidelidade de Deus, sempre pronto a perdoar e a acolher, basta

50
PNE - QV) - CVY nº 22
que o peçamos, como está no salmo: “Convertei-nos, ó Senhor
Deus do universo, e sobre nós iluminai a vossa face! Se voltardes
para nós, seremos salvos!”.

2. Sugestões para a celebração


e Fazer uma acolhida especial, lembrando a acolhida do
Pai para conosco.
e Criar um bonito arranjo com uvas (naturais!) que, des-
de o início, leve a pensar em bons frutos. Se não houver
uvas naturais, colocar na entrada da Igreja um cartaz
em que apareçam cachos de uva ou cenas da vindima,
da elaboração artesanal do vinho.
e Escolher um canto de comunhão relacionado ao Evan-
gelho lido.
e Nas preces dos fiéis, lembrar o início da Assembléia
Ordinária do Sínodo dos Bispos, em Roma, que vai até
o dia 29 de outubro, quando se concluirá o Ano da Eu-
caristia. O tema do Sínodo é: “A Eucaristia, fonte e cume
da vida e da missão da Igreja”.
e Valorizar os ritos finais, lembrando o sentido missionário
da despedida: “Ide em paz!”, como envio missionário.
* Nesta semana, comemoramos dois santos muito queridos:
são Francisco de Assis (dia 4) e são Benedito (dia 5).
São Francisco era um jovem de posses que sonhava
com as glórias militares. Um dia teve um sonho re-
velador que o levou a abandonar tudo e seguir uma vida
de humildade, pobreza e castidade. Dedicou-se aos po-
bres e doentes. Com alguns amigos, iniciou a Ordem
dos Frades Menores (franciscanos). Com santa Clara,
fundou a Ordem das Clarissas. Sob sua inspiração, sur-

91
PNE - QV) - CVV nº 22
giu a Ordem Terceira, para leigos e leigas consagrados.
São Francisco foi uma pessoa de paz e bem.
Oração: “Ó Deus, que fizestes são Francisco de Assis
assemelhar-se ao Cristo por uma vida de humildade e
pobreza, concedei que, trilhando o mesmo caminho,
sigamos fielmente o vosso Filho, unindo-nos convosco
na perfeita alegria. PNSJC. Amém”.
São Benedito era mouro e por causa de sua cor também
é denominado de “O Negro”. Aos 21 anos foi viver com
os monges eremitas de São Francisco de Assis. Depois,
viveu no Convento dos Capuchinhos. Apesar de anal-
fabeto, foi eleito, por sua santidade e sabedoria, supe-
rior do convento. Várias pessoas o procuravam, pedin-
do conselhos, orações, e alcançavam muitas curas. No
Brasil, ele é muito amado, e chamado com fregiiência
de “O Santinho Preto”. Seu culto está associado aos
padecimentos do negro brasileiro.
Oração: “Ó Deus, que em são Benedito, o Negro,
manifestais as vossas maravilhas, chamando à vossa
Igreja homens de todos os povos, raças e nações,
concedei por sua intercessão que todos, feitos vossos
filhos e filhas pelo batismo, convivam como verdadei-
ros irmãos. PNSJC. Amém”.

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PNE - QV) - CVV nº 22
28º Domingo do Tempo Comum
9 de outubro de 2005

Leituras: Isaías 25,6-10a; Salmo 22(23),1-3a.3b-4.5-6 (R/. 6cd);


Filipenses 4,12-14.19-20; Mateus 22,1-14 (Convite às núpcias)

Felizes os convidados
para a ceia do Senhor!

1. Situando-nos brevemente

“Já preparei o banquete.” Somos convidados ao banquete


que o Pai nos preparou. Banquete é refeição, alimento que, ser-
vido à mesa, é dado e partilhado. Quando sabemos que uma fes-
ta vai ser boa e importante, costumamos dizer: “Vamos lá, ami-
go. Você não sabe o que está perdendo!”. Quantas vezes nos
arrependemos: “Puxa vida! Por que não fui? Não sabia que seria
tão bom!”. Parafraseando Chico Buarque, às vezes, o amor nos
chama pra ver a banda passar, mas a gente acaba perdendo a
banda e até o amor.
Queremos entrar em sintonia com a Assembléia Ordinária
do Sínodo dos Bispos que está se realizando em Roma, com o
tema: “A Eucaristia, fonte e cume da vida e da missão da Igreja”.

53
PNE - QV) - CVV nº 22
2. Recordando a Palavra

Na liturgia da Palavra, tanto a leitura do Antigo Testamen-


to quanto o Evangelho se amparam na figura de um banquete, de
uma festividade celebrada com alimentos.
O profeta Isaías lembra o capítulo 21 do Apocalipse. A
exemplo das festas de Israel, comemoradas com uma refeição
ritual, o profeta conta que Deus oferecerá, no alto de uma mon-
tanha, um banquete a seu povo. Nessa mesma montanha, Deus
destruirá o véu/a mortalha e assim acabará com a morte e enxu-
gará as lágrimas de todas as faces. Liberto da desonra, o povo
responderá com confiança e alegria.
O Evangelho de Mateus apresenta uma parábola, desenhan-
do uma cena próxima à vida do povo judeu. O cenário em que se
desenrola a narrativa é um banquete nupcial. Entretanto, os con-
vidados não comparecem. Alguns, indiferentes ao convite for-
mulado, permanecem em suas atividades corriqueiras, quer no
campo, quer nos negócios. Outros, sentindo-se incomodados,
recorrem à violência e matam os portadores do convite. O rei, ao
constatar que seus convidados não eram dignos da festa, estende
o convite a outras pessoas. Entre os presentes, um não estava
adequadamente preparado e por 1sso foi expulso. À narrativa
conclui com uma frase extremamente forte: “Muitos são os cha-
mados e poucos os escolhidos”.
A intenção da parábola não é criticar a preocupação com o
trabalho e com as coisas pessoais. Quer apenas apontar para aquilo
que dá sentido a todos os nossos trabalhos e ocupações: a festa
do Reino. Recusar um convite do rei é uma estupidez. A festa vai
acontecer com os outros convidados. E era uma festa especial: o
casamento do filho.
A festa do Reino não é exclusiva ou excludente. Mas há
condições. À primeira é a liberdade da pessoa; ela pode aceitar ou

54
PNE - QV) - CVV nº 22
recusar o convite. À segunda condição é interior. O convidado
deve estar em sintonia com os sentimentos daquele que o convi-
dou. A festa do Reino não é um piquenique irresponsável. É uma
festa consegiiente com as opções daqueles que participam.
Paulo, na conclusão de sua epístola aos filipenses, retoma
a idéia final do texto de Isaías que expressa a confiança em Deus,
ao dizer: “Tudo posso naquele que me dá força”, e, mais adiante,
“O meu Deus proverá magnificamente todas as vossas necessi-
dades”. Ele finaliza a carta, louvando a Deus: “Ao nosso Deus e
Pai, a glória pelos séculos dos séculos. Amém”.
No contexto dessas leituras, o salmo responsorial é um
salmo de confiança e traz uma das mais belas imagens bíblicas,
expressa na frase: “O Senhor é meu pastor, nada me faltará”.

3. Atualizando a Palavra
Três dos quatro textos lidos na liturgia da Palavra falam
em banquete/refeição.
No presente, em especial nas cidades médias e grandes, a
refeição perdeu seu sentido de comunhão e de partilha. Ora é
feita às pressas (muitas vezes a mesa do alimento passa a ser
extensão da mesa do trabalho), ora acontece na frente da TV,
cada um com seu prato servido, sem perceber o outro ao lado,
sem um gesto de partilha, todos enfeitiçados pela “telinha”. Os
alimentos, predominantemente industrializados ou preparados
de um modo impessoal, não contêm mais o sabor dado pelo ca-
rinho e dedicação de quem faz a refeição para pessoas que co-
nhece. As festas, com fregiiência, ainda se realizam em torno da
mesa. Raras vezes, porém, na mesa do lar, com pratos tradicio-
nais, com base em receitas familiares passadas de geração a ge-
ração. Hoje, vai-se a restaurantes e a pizzarias, tudo afetivamente
insípido.

55
PNE - QV) - CVV nº 22
Fica difícil entendermos a profundidade e a amplitude
trazida pela imagem do banquete e da refeição comemorativa/
celebrativa. Para que a compreensão se efetive, é preciso resga-
tar a dimensão simbólica da ceia/refeição/banquete como oferta
e acolhimento, seguidos da gratidão de quem convidou e de quem
é convidado; partilha do alimento, fonte de vida. Só após essa
retomada de sentido, entenderemos os banquetes de que falam
Isaías e Mateus, os quais significam a própria vida.
O convite para deles participar é adesão ao Reino de Deus.
Aceitá-lo representa uma opção de vida. É um lançar-se con-
fiante nos braços do Pastor, pois, desde então, será ele a guiar,
conduzir, estar junto e dar segurança. À graça de Deus vai acom-
panhar o convidado todos os dias de sua vida. E, especialmente,
vai comprometê-lo a um viver coerente com o convite aceito.
Por isso rezamos, após a comunhão: “Ó Deus todo-poderoso,
nós vos pedimos que, alimentando-nos com o Corpo e o Sangue
de Cristo, possamos participar da vossa vida”.
Um detalhe da parábola: a veste própria para participar do
banquete. Ensina-nos o Catecismo da Igreja Católica que “nos-
so Senhor adverte-nos de que seremos separados dele se deixar-
mos de ir ao encontro das necessidades graves dos pobres e dos
pequenos que são seus irmãos” (n. 1033). Esta é veste digna que
deveremos usar: a solidariedade com os irmãos e irmãs que pre-
cisam de nós.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Diz a Dei Verbum que “a Igreja sempre venerou as divinas
escrituras da mesma forma como o próprio corpo do Senhor:
ambos alimentam e dirigem toda a vida cristã” (n. 21).
A celebração da santa missa encontra, pois, unidade na
articulação de seus dois grandes e essenciais momentos: a mesa

56
PNE - QV) - CVV nº 22
da Palavra e mesa da Eucaristia. A missa é toda ela alimento
concretizado na Palavra e nas espécies sagradas do Pão e do
Vinho.

Os ritos iniciais preparam para essa dupla refeição. Inicia-


mos pedindo perdão a Deus por nossas faltas, buscando purifi-
car nosso coração para acolher a Palavra e receber o Pão sagra-
do. Ao glorificarmos a Deus, a ele elevamos todo nosso ser e
assim procuramos ficar mais disponíveis para ouvir sua Palavra
e a ela responder, na celebração, com nossa oração confiante e,
na vida, com ações que a ponham em prática, conforme dizemos
na oração da coleta: “Ó Deus, sempre nos preceda e acompanhe
a vossa graça para que estejamos sempre atentos ao bem que
devemos fazer”.
À preparação mais específica para a mesa eucarística in-
clui a oração em que chamamos a Deus de Pai Nosso e a oração
da paz. Unidos pela fraternidade e pela paz, buscamos ficar pre-
parados para participar dignamente do banquete eucarístico, ali-
mento que dá sustento e força para testemunharmos Cristo em
nosso tão complicado dia-a-dia.
A Eucaristia é o banquete da nova aliança que reúne os
homens. Aqui já saboreamos a ceia eterna em que Deus estará
sempre conosco. Todos são convidados para entrar na sala do
banquete.
Na celebração eucarística, participamos de uma festa em
duas mesas: a mesa da Palavra e a mesa da Eucaristia.
Que nossa participação em ambas as mesas seja fonte de
vida. Que ela nos fortaleça, a fim de podermos, por nossas ações
diárias, anunciar a todos que o banquete está preparado, que o
Pai a todos convida e a todos deseja acolher.

57
PNE - QV) - CVV nº 22
PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Somos convidados para o banquete nupcial. E o Pastor quem
prepara a mesa. “Felizes os convidados para a ceia do Senhor!”
Cada domingo é Páscoa, a festa da vida que vence a morte.
Aceitar o convite é fazer uma opção, aceitar a amizade
que transborda da taça e dar uma resposta plena de confiança.
Participar do banquete, no entanto, requer preparo para não ser
dele excluído, como aquele que não portava o traje adequado.
Nesse caso, estar preparado é ter as mãos limpas e o coração
puro. Na oração da coleta pedimos que estejamos “sempre aten-
tos ao bem que devemos fazer”. Não podemos recusar o chama-
do que o Senhor constantemente nos faz para participarmos de
seu Reino realizando o bem.
Nossa atitude, quer na mesa da Palavra, quer na mesa da
Eucaristia, deve ser semelhante à dos primeiros cristãos: “Toman-
do o alimento com alegria e simplicidade de coração” (At 2,42).
Na celebração de hoje, recebemos o alimento sagrado —
Pão e Palavra — em fraterna comunhão. Contemplamos Cristo
que se faz presente no meio de nós no alimento da Palavra e no
alimento do Pão (e do vinho).

2. Sugestões para a celebração


e Criar um clima festivo, alegre e acolhedor desde o iní-
cio da celebração. Valorizar o abraço da paz.
* Por ser a semana em que comemoramos a festa de Nos-
sa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, e o dia das
crianças, dar um destaque à imagem da padroeira e fa-

58
PNE - QV) - CVV nº 22
zer um convite especial para as crianças participarem
da missa do dia 12 de outubro.
Durante a liturgia da Palavra, deixar o ambiente na pe-
numbra e uma luz forte iluminando a mesa da Palavra.
Uma alternativa à sugestão anterior é colocar um can-
delabro próximo ao ambão.
Proclamar o Evangelho, cantando.
Rezar o Prefácio da Santíssima Eucaristia II, n. 57, que
tem como título “Os frutos da Santíssima Eucaristia”
(unidade na caridade em redor da ceia).
Destacar (ou cantar) as palavras que antecedem a co-
munhão: “Felizes os convidados para a ceia do Se-
nhor...”.
Possibilitar a comunhão sob as duas espécies, usando
pão ázimo.
Entoar a canção “Pão em todas as mesas”, de Zé Vicente.
Nas celebrações da Palavra, abençoar o pão e partilhá-lo.

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SOLENIDADE DE
NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO APARECIDA
12 de outubro de 2005

Leituras: Ester 5,1b-2; 7,2b-3;


Salmo 44(45),11-12a.12b-13.14-15a.15b-16 (R/1Il e 12a);
Apocalipse 12,1.5.13.15-16a; João 2,1-1 (Bodas de Caná)

“Fazei tudo o que ele vos disser!”

1. Situando-nos brevemente
Em 1717, ao lançarem a rede de pesca no Rio Paraíba, três
pescadores resgataram a pequena imagem (36 cm) de Nossa
Senhora da Conceição. Foi construído um oratório, onde o povo
reunido rezava o terço em torno dela. Com a ocorrência de mila-
gres, a devoção começou a ser divulgada e a imagem, a ser cha-
mada de Nossa Senhora Aparecida.
A devoção e o amor dos fiéis à Mãe de Deus aproximam-
nos do Pai. Pelo exemplo de Maria buscamos sempre mais viver
o nosso sim ao seu plano de amor. Por isso, a Igreja fez do pe-
queno oratório a Basílica Nacional de Nossa Senhora Aparecida,
solenemente dedicada pelo papa João Paulo II, em 4 de julho de
1980. Em 16 de julho de 1929, o papa Pio XI já havia declarado
e proclamado Nossa Senhora Aparecida padroeira do Brasil.
Como os pescadores que sentiram, através da imagem que
encontraram, a presença da Mãe de Deus em suas vidas, pedi-
mos sempre seu amor maternal e sua constante intercessão:

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PNE - QV) - CVY nº 22
“Mostrai ser nossa Mãe, levando a nossa voz a quem, por nós
nascido, dignou-se vir de vós” (Liturgia das Horas IV, Véspe-
ras, 12 de outubro, p. 1376).
Se a Igreja no Brasil está firmemente empenhada na reali-
zação do Projeto “Queremos Ver Jesus”, hoje é o dia de darmos
mais um passo na sua execução, olhando para Maria, nossa pa-
droeira, que nos indica o caminho para vermos e sentirmos a sua
presença no meio de nós: “Fazei tudo o que ele vos disser!”.

2. Recordando a Palavra

Na primeira leitura, vemos a rainha Ester, judia, que in-


tercede a Deus pela vida do seu povo dominado. Temos o des-
fecho de um episódio que poderia ter terminado no massacre
do povo eleito, exilado e cativo na Pérsia. Ester, graças às suas
reais qualidades e à presença de Deus em sua vida, se identifi-
ca com a atitude de Maria, através de quem Deus nos enviou a
salvação. Na leitura do Apocalipse, temos a descrição do povo
de Deus, por meio de uma simbologia bíblica tradicional: a
mulher adornada com todo o seu esplendor — o sol, a lua e as
doze estrelas. O dragão, Satanás, é descrito com os símbolos
do domínio. O menino, Messias, é o início do novo povo de
Deus. Desde os primeiros tempos da Igreja, esse texto foi apli-
cado a Maria. Mais do que ser fiel aos mandamentos de Deus
para alcançar a salvação, ela gera para o mundo a salvação,
dizendo sim ao Senhor. De sua humanidade, podemos conhe-
cer o nosso Deus, que se revela mediante seu Filho, imagem
visível do Deus invisível.
Maria antecipa, como narra o Evangelho, o primeiro sinal
de Jesus ao mundo. Trata-se do início dos sinais da presença do
Filho de Deus entre nós e revelação do amor misericordioso
do Pai.

61
PNE - QV] - CVY nº 22
E importante percebermos alguns aspectos desse primeiro
sinal, que não são mero acaso. Eles revelam escolhas significati-
vas de Deus.
O primeiro sinal de Jesus, por intercessão de Maria, acon-
tece em uma festa de casamento. Na origem da família, Deus
demonstra seu amor à humanidade que ele criou. As bodas de
Caná são símbolo da família humana. E hoje, para nós, da famí-
lia brasileira. Notemos a ligação entre a criação, o Gênesis, e a
figura de Maria, a “Nova Eva”.
Maria estava atenta ao que se passava na festa. E, numa
atitude cuidadosa, vendo que o vinho havia terminado, demons-
tra sua preocupação com tudo e com todos. A Mãe intercede. E
Jesus transforma água em vinho. Água que é trazida pelos ser-
ventes. Serventes, que podemos ser todos nós, ao atendermos ao
pedido da Mãe: “Fazei tudo o que ele vos disser” (Jo 2,5).
Mesmo sem saber que enchendo as talhas de água pode-
riam resolver o problema da falta de vinho, os serventes atende-
ram ao pedido de Maria e tornaram possível o milagre, cuja
centralidade está em fazer o que o Mestre disser.

3. Atualizando a Palavra
Uma primeira questão que nos intriga é por que Jesus cha-
ma Maria de “mulher” e não de “mãe”? O biblista J. Konings
nos ajuda a esclarecer a questão:
“Mulher significa isso — que se sente responsável pelo
que diz respeito à sua família: a presença de Jesus e de seus
amigos a fez sentir-se responsável pelo abastecimento de vinho.
Ora, este Evangelho não é propriamente mariológico, mas cristo-
lógico. Mostra Jesus dando início aos sinais da sua grande obra,
antes que se realize a sua “hora”. A abundância de vinho é um
sinal de que Jesus vem cumprir a sua missão messiânica (cf. a

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PNE - QV) - CVY nº 22
abundância de vinho no tempo messiânico, em Am 9,13-14 etc.),
mas essa missão só é levada a termo na “hora” da morte e glorifi-
cação (cf. Jo 13,1ss; 17,5 etc.)”.!

Quantas vezes, em nossa vida, pedimos a intercessão de


Maria para o milagre que queremos, mas não atendemos o que
Jesus nos pede e não trazemos a água. Gostamos de questionar e
pensar que as situações que Deus nos propõe nada tem a ver com
o milagre que pedimos; não conseguimos ser como os serventes
que, mesmo sem imaginar que fosse possível a Jesus transformar
água em vinho, encheram as talhas, fizeram o que o Mestre pediu.

Queremos o milagre, mas deixamos nossas talhas vazias,


não ficamos atentos ao chamado da Mãe, como os serventes, e
muito menos fazemos o que o mestre nos pede. Queremos antes
que ele atenda a nossos desejos, que primeiro ele conceda o mila-
gre, depois pensamos em recompensá-lo de alguma forma, esco-
lhendo sempre o mais cômodo para nós. É aí que esquecemos o
maior ensinamento que Maria nos deixou: fazer o que Jesus nos
disser. Como podemos querer, então, que ela interceda por nós?

Maria é, sim, nossa maior intercessora, mas é Jesus quem


faz o milagre, e ele quer a nossa participação, ele quer que
ofertemos a nossa água, que não deixemos nossas talhas vazias,
para que ele possa transformar, em nós, toda a água que precisa
ser vinho,
O milagre depende de nós!
Jesus disse que não é aquele que diz: “Senhor, Senhor...”,
que vai entrar no céu. Podemos dizer o mesmo em relação a
nossa devoção para com Maria. “Não é aquele que vive gritando
“minha Nossa Senhora”, que é amigo e devoto de Maria, mas
aquele que, como ela (Lc 8,12), faz a vontade de Deus; aquele

| KonINGs, Liturgia dominical..., op. cit., p. 498.

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que tem a coragem de, como ela, dizer com consciência: “Faça-
se a tua vontade” (Lc 1,38); aquele que, esquecido do próprio
proveito, procura, como ela, na casa de Isabel (Lc 1,39-56) ou
nas bodas de Caná (Jo 2,1-11) o proveito dos outros; aquele que,
como ela, tem coragem de ficar de pé ao lado da cruz de Cristo
(Jo 19,25), prolongada no nosso sofrimento diário; aquele que,
como ela no dia de Pentecostes (At 1,14), se abre ao Espírito San-
to e faz da sua pequena história pessoal de cada dia uma exemplar
história cristã, que se estende até o encontro definitivo e amoroso
na casa do Pai, onde termina a nossa história da salvação”.?

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Na oração, pedimos que a pátria definitiva do povo brasi-
leiro seja junto a Maria: “Concedei que o povo brasileiro, fiel a
sua vocação e vivendo na paz e na justiça, possa chegar um dia à
pátria definitiva” (coleta). Vale lembrar ainda o Prefácio próprio
da festa de hoje, que louva a Deus pela figura de Maria na histó-
ria da salvação.
“No início da liturgia eucarística são levadas ao altar as
oferendas que se converterão no Corpo e Sangue de Cristo”
(IGMR, n. 37). O pão e o vinho tornam-se presença real do pró-
prio Jesus, fazem memória do seu sacrifício e entrega na cruz. A
presença de Jesus é sempre transformadora. Todos os milagres
de Jesus transformam: água em vinho, o que não vê para alguém
que enxerga, o que não anda naquele que caminha. Na Eucaris-
tia, o próprio Jesus se torna presente na conversão do pão e do
vinho, seu corpo e sangue que vão nos alimentar e, também,
transfigurar. Mas para isso é preciso que nos deixemos modhifi-
car, abrindo nosso coração e aceitando o que Jesus nos pede.

2 Neorri, €. Ministério da Palavra. Petrópolis, Vozes, 2001. p. 265.

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PNE - QV) - CVV nº 22
Por isso, antes de recebermos Jesus no pão da Eucaristia,
precisamos pedir perdão, transformar-nos em pessoas cada vez
melhores, mais atentas à sua Palavra, mais próximas de Maria,
do seu sim, do seu modelo de ser humano, que soube interceder
por nós, aceitando gerar a salvação para o mundo. Necessitamos
buscar diariamente a mudança que nos torna sempre abertos aos
conselhos de Maria, procurando fazer tudo o que Jesus espera
de nós.
Que a Eucaristia não seja só para nós. Alimentemo-nos a
fim de anunciar a Palavra de Deus ao mundo. Participemos da
comunhão: “Alimentados com o Corpo e Sangue de vosso Fi-
lho, nós vos suplicamos, ó Deus: dai ao vosso povo, sob o olhar
de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, irmanar-se nas tare-
fas de cada dia para a construção do vosso Reino”.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
A Solenidade de Nossa Senhora da Conceição Aparecida
lembra a presença silenciosa e significativa de Maria na história
da salvação. Ela é mãe do nosso Redentor, intercessora desde o
início da vida pública de Jesus. Missionária, ela é mãe da Igreja.
Reunidos em comunidade para a celebração da Eucaristia,
estamos ligados a Maria. Ao seu lado, queremos estar atentos e
dispostos, como os serventes, ao que vamos ouvir na Palavra: as
leituras, o salmo e o Evangelho.
Ao lado de Maria, fazemos memória do sacrifício de Je-
sus. E, como o discípulo que a recebeu como mãe, nós, também,
a recebemos em nossa vida. Na Palavra e na Eucaristia, a pre-
sença e o modelo de Maria nos ajudam a caminhar cada vez

65
PNE - QV) - CVY nº 22
mais próximos de Jesus e a nos comprometermos com o seu
seguimento, certos de que somos acolhidos como filhos e filhas
no seu amor.

2. Sugestões para a celebração


Na procissão de entrada, levar uma imagem de Nossa
Senhora Aparecida e colocar em lugar previamente pre-
parado. À imagem pode ser incensada.
No ato penitencial, fazer a aspersão do povo, recordan-
do o batismo nas águas. Ou usar uma simbologia da
água, lembrando que o Espírito é a água que nos trans-
forma, e o nosso coração deve ser como a água que foi
transformada. A imagem de Maria foi resgatada das
águas. Toda a Igreja nasce das águas do batismo.
Próximo ao ambão, colocar talhas com água.
Nas preces dos fiéis ou na recordação da vida, lembrar
fatos, pessoas e situações de nossa pátria e de nossa
Igreja no Brasil.
Nos ritos finais, antes da bênção, entoar o Magnificat,
o louvor de Maria a Deus. Convidar as crianças para
aproximarem-se da imagem de Maria. Fazer uma ora-
ção e bênção especial por elas.
Usar a bênção própria do Missal Romano (p. 527):
O Deus de bondade, que pelo Filho da Virgem Maria
quis salvar todos, vos enriqueça com sua bênção.
R.: Amém.

Seja-vos dado sentir sempre e por toda parte a proteção


da Virgem, por quem recebestes o autor da vida.
R.: Amém.

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E vós, que vos reunistes hoje para celebrar sua solenida-
de, possais colher a alegria espiritual e o prêmio eterno.
R.: Amém.

Abençoe-vos o Deus todo-poderoso, Pai e Filho e Es-


pírito Santo.
R.: Amém.
29º Domingo do Tempo Comum
|6 de outubro de 2005

Leituras: Isaías 45,1.4-6;


Salmo 95(96),1.24.3.4-5.7-8.9-10a.c (R/. 7ab); 1 Tessalonicenses 1,1-5b;
Mateus 22,15-21 (O que é de César e o que é de Deus)

Dar a cada um o que é seu!

1. Situando-nos brevemente
Estamos celebrando e aprendendo os ensinamentos de Je-
sus, transmitidos pelo evangelista Mateus. Hoje, veremos que
os chefes do povo, especialmente os fariseus e os herodianos,
tramam uma cilada contra Jesus.
E o domingo de “dar a cada um o que é seu”. O Senhor
renova em nós a disposição de segui-lo e construir o seu Reino,
animados pelo Espírito, sendo justos, generosos e solidários.
Quantas vezes ouvimos interpretações equivocadas da fa-
mosa frase de Jesus, “Dai a César o que é de César e a Deus o
que é de Deus”. A partir disso se diz: “Negócio é negócio, Igreja
a parte!”; “Lugar de padre é na sacristia e dos políticos, no Con-
gresso!”. Temos até a famosa expressão de um ex-presidente da
República: “Se os padres falarem em política, eu vou começar a
dar catequese!”. Será mesmo assim? Foi isso que Jesus quis nos
ensinar?
O Projeto de Evangelização “Queremos Ver Jesus, Cami-
nho, Verdade e Vida” nos pede a participação na construção da

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PNE - QV) - CVV nº 22
sociedade justa e solidária. Diz o texto-base: “Há de se compreen-
der e definir profeticamente a necessidade de uma participação
política efetiva dos cristãos, como exigência da fé, atentos aos
apelos de Cristo. Assim, a ação evangelizadora da Igreja levará
em consideração as necessidades que interpelam a sensibilidade
cristã, com o dever de colaborar para a superação das contradi-
ções do crescimento econômico, cultural e tecnológico, contra a
miséria, a fome e a exclusão. É também necessário tomar posi-
ção séria e assumir compromissos em favor do equilíbrio ecoló-
gico” (p. 16).
Ao nos aproximarmos do encerramento do Ano Eucarístico,
é bom lembrar as palavras do saudoso papa João Paulo II aos
sacerdotes, por ocasião de Quinta-feira Santa: “[...] sempre que
celebramos a Eucaristia, a memória de Cristo no seu mistério
pascal, torna-se presente o anseio do encontro pleno e definitivo
com ele. Vivemos na expectativa de sua vinda [...]”.
Que, por esta celebração dominical, no mês missionário, O
Senhor nos ilumine, para que na expectativa de sua vinda seja-
mos obedientes e fiéis ao seu plano de amor.

2. Situando a Palavra
No Evangelho de hoje, cresce a tensão existente entre Je-
sus e as autoridades judaicas.
O questionamento deste domingo é político:
e À quem se deveria pagar os impostos (sinal da domina-
ção romana)?
Jesus é argiido por discípulos dos fariseus (grupo religio-
so nacionalista) e por herodianos (partidários de Herodes que
costumavam ficar “sobre o muro” nas questões com Roma, mas
que estavam sempre à procura de um pretexto para condenar
Jesus), com a clara intenção de enfrentá-lo.

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PNE - QV) - CVV nº 22
Iniciam o questionamento elogiando “Mestre, sabemos que
és verdadeiro” (v. 16), sugerindo que irão aceitar a infinita sabe-
doria de Jesus. Pretendem, entretanto, que Jesus justifique a lei
dos impostos, posicionando-se contra o povo.
Além dos impostos indiretos (pedágios, taxas, alfândegas),
as províncias pagavam ao Império Romano tributos que eram iguais
para todos, excetuando-se crianças e anciãos que eram isentos.
Toda essa tributação demonstrava a grande submissão do povo à
dominação romana.
Jesus, habilmente, percebe a intenção dos questionadores
e não responde à pergunta, mas demonstra a supremacia do Rei-
no de Deus (necessidade de justiça diante da força do mal sem-
pre presente no mundo), que é independente de políticos e poli-
ticagens.
“Mostrai-me a moeda dos impostos. [...] De quem é a fi-
gura e inscrição desta moeda?” (vv. 19s).
Ão questionar o que está escrito na moeda, Jesus leva-os a
reconhecer o sistema econômico estabelecido e por eles mes-
mos aceito. A moeda é o instrumento de poder, e no centro está o
rosto de César demonstrando não só a prepotência social e polí-
tica, mas sobretudo uma explícita profissão de ateísmo, pois em
toda forma de poder injusto e arrogante há uma radical negação
de Deus. À moeda não tinha apenas valor real/representativo,
mas também simbólico. Usar a moeda significa admitir também
o valor daquele que ela simboliza.
Estão todos no Templo, onde não deve entrar imagem algu-
ma. Jesus não possuía moeda com imagem. Mas os questiona-
dores, sim. Bastava dizer: “Tirem do Templo esta imagem!”.
Jesus aponta para a profunda liberdade que tem cada dis-
cípulo para construir o seu caminho de fidelidade a Deus, pois,
acima de qualquer poder humano, político, social está Deus. O

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PNE - QV) - CVY nº 22
homem é sua imagem. “A Deus o que é de Deus” (v. 21). Jesus
não exclui César de dar a Deus o que é seu, pois sob o ponto de
vista de Deus não há distinção entre governantes e governados.
O poder real é um serviço em vista do bem comum. Quem tem
poder deve sempre buscar realizar os projetos de Deus: “Dai a
Deus o que é de Deus”.
“A resposta de Jesus não justifica, como muitos podem
deduzir, a separação entre um mundo profano e um mundo sa-
grado, o de Deus e o do César. Nem, como muitos no seu tempo
esperavam, um governo teocrático, que subjuga tudo à tirania
dos chefes religiosos. Jesus parece querer um outro ponto dife-
rente, tanto da separação total entre Deus e César como da fusão
indiscriminada entre os dois mundos.”!
“Seja como for, o que era de César, no caso aqui narrado,
era uma moeda, instrumento do poder econômico do Império
Romano e, além do mais, preço do reconhecimento civil da co-
munidade judaica, com os privilégios que isso implicava. Tratan-
do-se disso, os interrogadores tinham de tirar as conseqiiências:
quem quer usufruir do Império tem de alimentar-lhe o tesouro...
Mas isso não é o mais importante; o peso recai sobre a última
parte da frase: “Dai a Deus o que é de Deus”. Jesus parece estar
dizendo aos seus interlocutores: “Importunais-me com questões
de César — bom, sede consequentes nessas questões —, mas O
que eu devo lembrar-vos é das questões de Deus.”?
À supremacia da vontade de Deus também aparece na pri-
meira leitura. Ciro (rei pagão da Pérsia, o qual conquistou a
Babilônia e permitiu que os judeus voltassem a Israel, em torno
de 550 a.C.) é o pagão escolhido e ungido por Deus para ser seu
instrumento de libertação. O poder é exercido em favor do povo.

| GUIMARÃES & CARPANEDO, Dia do Senhor..., Op. cit., p. 253.


? Konincs, Liturgia dominical..., op. cit., p. 199.

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PNE - QV] - CVV nº 22
Esse é o Deus aclamado no Sl 95(96), a quem se canta um
canto novo, adora-se e se estremece diante dele clamando: “Rei-
na o Senhor, pois os povos ele julgará com justiça”.
São Paulo está refugiado em Atenas e de lá recebe notícias
da comunidade. Resolve então escrever para eles uma mensa-
gem de ânimo, válida para nossas comunidades hoje. À carta de
Paulo aos tessalonicenses é o primeiro escrito do Novo Testa-
mento (em torno do ano 40). Ele esteve em Tessalônica poucas
semanas, pois teve de fugir por causa de uma perseguição. Por
isso, ele ressalta que a fé, o amor e a esperança os reúnem como
escolhidos, cuja conversão não foi fruto de simples palavras hu-
manas, mas da eficácia do Espírito Santo.
Nos próximos domingos continuaremos a ler essas duas
cartas de Paulo aos tessalonicenses.

3. Atualizando a Palavra

O questionamento político que o Evangelho deste domin-


go nos propõe é atualíssimo. Basta olharmos para o mundo em
que vivemos. Quanta submissão ao poder político, social, cultu-
ral que muitas nações sofrem.
Hoje o mundo oferece, em nome da liberdade, um leque
de entendimentos para a verdade. Considera que a verdadeira
felicidade vem da alegria estritamente pessoal e particular. Sob
esse enfoque, somos bombardeados pela sociedade, pela econo-
mia, pela política, pela cultura... O que devemos fazer? Enten-
der, aceitar, experimentar e realizar o que nos fizer individual-
mente felizes?
O Evangelho de hoje questiona: nossas ações e realiza-
ções concorrem para a construção do Reino? São aceitas por
Deus? Seguem o ensinamento de Jesus?

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Somente serão lícitas as ações que auxiliem na construção
do Reino, as quais convergem para a vida em comunhão, em
fraterna união.

E verdade que um outro mundo é possível, pois Jesus veio


mostrar isso. Mas é preciso que cada um contribua para esse
mundo novo.
As Igrejas cristãs têm dado importante colaboração para a
construção da paz e de um mundo mais justo. Fora da Igreja
também há iniciativas que se colocam na direção dos valores do
Reino (organismos que trabalham na promoção da vida, que se
preocupam com o respeito aos direitos humanos, das crianças,
dos idosos...).
São Paulo diz aos tessalonicenses que foi a ação do Espírito
Santo que permitiu o anúncio da Palavra traduzido em fé ativa,
amor, sacrifício, perseverante esperança. Daí a necessidade de
examinarmos se deixamos o Espírito Santo orientar nossas ações.
A história contada a seguir ajuda a entender que, nos dias de
hoje, o que mais precisamos é buscar um novo mundo possível.

O frio que vem de dentro


Seis homens ficaram bloqueados numa caverna por uma
avalanche de neve. Teriam de esperar até o amanhecer para
receberem socorro.
Cada um deles trazia um pouco de lenha e havia uma pe-
quena fogueira ao redor da qual eles se aqueciam. Se o fogo
apagasse, eles sabiam que morreriam de frio antes de o dia cla-
rear. Chegou a hora de cada um colocar sua lenha na fogueira.
Era a única maneira de poderem sobreviver.
O primeiro homem era racista, e olhou demoradamente
para os outros cinco e descobriu que um deles tinha a pele escu-
ra. Raciocinou:
73
PNE - QV) - CVV nº 22
“Aquele negro! Jamais darei minha lenha para aquecer
um negro”.
E guardou-a, protegendo-a dos olhares dos demais.
O segundo homem era um rico avarento. Estava ali pois
queria receber os juros de uma dívida. Olhou ao redor, viu um
homem da montanha, que trazia sua pobreza no aspecto rude do
semblante e nas roupas velhas e remendadas. Ele fez as contas
do valor da lenha e, enquanto sonhava com o lucro, pensou:
“Eu, dar minha lenha para aquecer um preguiçoso?”.
O terceiro homem era negro. Seus olhos faiscavam de ira
e ressentimento. Não havia qualquer sinal de perdão ou mesmo
aquela superioridade moral que o sofrimento ensinava. Seu pen-
samento era muito prático:
“E bem possível que eu precise desta lenha para me de-
fender. Além disso, eu jamais daria minha lenha âqueles que me
oprimem”.
O quarto homem era o pobre da montanha. Ele conhecia
mais do que os outros os caminhos, os perigos e os segredos da
neve. Ele pensou:
“Esta nevasca pode durar vários dias, vou guardar minha
lenha”.

O quinto homem parecia alheio a tudo. Era um sonhador.


Olhando fixamente para as brasas, nem lhe passou pela cabeça
oferecer a lenha que carregava. Ele estava preocupado demais com
suas próprias visões (ou alucinações) para pensar em ser útil.
O último homem trazia nos vincos da testa e nas palmas
calosas das mãos sinais de uma vida de trabalho. Seu raciocí-
nio foi curto e rápido:
“Esta lenha é minha. Custou o meu trabalho. Não darei a
ninguém nem mesmo o menor de meus gravetos”.

74
PNE - QV] - CV nº 22
Com esses pensamentos, os seis homens permaneceram imó-
veis. A última brasa se cobriu de cinzas e finalmente se apagou.
Ão alvorecer, quando os homens do socorro chegaram à
caverna, encontraram seis cadáveres congelados, cada qual se-
gurando um feixe de lenha.
Olhando para aquele triste quadro, o chefe da equipe de
socorro disse:
— O frio que os matou não foi o frio de fora, mas o de
dentro.
O evangelho nos conduz ao discernimento entre o lícito e
o ilícito. Qualquer coisa é lícita se compatível com o projeto de
Deus. Aquilo que fere esse projeto é ilícito e deve ser rejeitado
por quem optou pelo Reino e procura pautar-se por ele.
Decidir-se pela fé cristã é ser seguidor de Jesus, é aceitar
seu caminho que foi conflituoso. Optar pela fé cristã é não apar-
tar-se da realidade, mas, fortalecido pelo Espírito, enfrentá-la e
os conflitos que vão surgindo ao longo de cada dia. Vencer o frio
que vem de dentro, jogando todo o ilícito para o lado de fora.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


A celebração litúrgica revive em nós, que clamamos pela
realização do Reino, a memória dos feitos maravilhosos de Deus
em favor dos eleitos. Na recordação da paixão, morte e ressur-
reição de Jesus, o Espírito nos dá a certeza de que Deus orientará
aqueles que buscarem agir para construir o Reino. Cada celebra-
ção litúrgica forma nossa consciência e fornece os critérios para
que possamos julgar e decidir no dia-a-dia.
Participando da oração de louvor e súplica da Igreja, rea-
firmamos a decisão de pautar nosso agir pelos princípios da fé
que nos anima.

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PNE - QV) - CVY nº 22
O que temos, nossos bens materiais, nossas “moedas”,
devem ser usadas como dons. É o que rezamos na oração sobre
as oferendas: “Dai-nos, ó Deus, usar os vossos dons servindo-
vos com liberdade”. A oração após a comunhão pede que “os
bens terrenos nos auxiliem a conhecer os valores eternos”.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Bendizemos o Pai que faz Jesus vencer toda armadilha
maldosa. Como Jesus, o Pai nos fortalece para sermos fiéis a seu
projeto. Celebramos a Páscoa de Jesus Cristo. Ela se manifesta
em pessoas e grupos que enfrentam ciladas e calúnias, mas com
a graça de Deus permanecem firmes em sua opção pelo Reino.
Celebramos a memória da morte e ressurreição de Cristo.
Ela se completa na maneira como vivemos: nas ações que esco-
lhemos, somos por elas levados a participar da construção do
Reino.
A Palavra de Deus exorta-nos a não nos deixar influenciar
pelas dominações, mas sim a nos levar pelo Espírito que mostra
o que é de Deus.

2. Sugestões para a celebração


e (Ornar o mural de entrada do local da celebração com
imagens que mostrem a união entre os continentes sob
a ação e/ou olhar de Deus, preparando assim a comuni-
dade para aquilo que a Palavra vai apresentar, e lem-
brando também o mês missionário.

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Usar, no arranjo, flores coloridas, a fim de demonstrar
a harmonia desejada para o Reino (evitar excessos, mas
caprichar na harmonia).
O Evangelho poderá ser proclamado em várias vozes e/
ou dramatizado. Tanto uma como outra opção, que seja
muito bem organizada.
Fazer a profissão de fé dialogada, para ressaltar o com-
promisso com a construção do Reino.
Dar especial atenção à prece eucarística e à entoação
das respostas.
Nas preces dos fiéis, lembrar o Sínodo dos Bispos so-
bre a Eucaristia que está sendo realizado em Roma.
30º Domingo do Tempo Comum
23 de outubro de 2005

Leituras: Éxodo 22,20-26; Salmo 17(18),2-3a.3bc-4.47.5lab (R/. 2);


1 Tessalonicenses 1,5c-10; Mateus 22,34-40 (O maior mandamento)

O encontro de dois amores

1. Situando-nos brevemente

No Dia Mundial das Missões, celebramos o amor ao Pai e


ao próximo.
Embora com duas faces, é o único e mesmo amor, vindo
da mesma fonte e a ela voltando: Deus é amor. Duas perguntas
sempre nos inquietam: “É possível amar a Deus sem amar ao
próximo?”; “É possível amar ao próximo sem amar a Deus?”.
O que seria um católico praticante? Qual a prática que iden-
tifica um cristão?
Somos convidados, neste domingo, a compartilhar o amor
a Deus. Esse amor nos permite discernir como amar ao próximo.
Deus está no próximo.
Viver o amor, eis o caminho para ver Jesus, eis a verdade
que nos orienta, eis a vida que nos anima.

78
PNE - QV) - CVV nº 22
2. Recordando a Palavra

O Evangelho de hoje é continuação do capítulo 22 de


Mateus, no qual encontramos três discussões de Jesus: com os
herodianos, com os saduceus e com os escribas e fariseus. Eles
se mantêm buscando desacreditar Jesus diante do povo, tentando
deixá-lo em apuros. À questão que colocam é de cunho ético: “Qual
o maior mandamento da Lei?”. Esta pergunta é feita em Jerusa-
lém, na porta do Templo, isto é, no coração da espiritualidade e da
religiosidade judaica. O ensinamento de Jesus quer mexer com
pontos fundamentais da mentalidade judaica. No Evangelho de
Lucas, essa passagem serve de introdução para a parábola do Bom
Samaritano (Lc 10,25ss). Em Marcos, o texto não tem caráter po-
lêmico. Em Mateus, porém, a polêmica é violenta, como vimos
no Evangelho do domingo passado (29º Domingo).
A Lei judaica contava com 613 preceitos, dos quais 365
eram proibições e 248, mandamentos. Era necessário, pois, bus-
car seu cumprimento.
O grande conflito, nesse Evangelho de Mateus, acontece
porque Jesus estava sempre entre os pobres, os pecadores e os
simples. Isto indignava os doutores, os fariseus e os saduceus,
que eram religiosos e detalhistas em relação à Lei. Mas os po-
bres não conseguiam cumpri-la em detalhes.
Entretanto, o que os surpreende? Quando Jesus lhes respon-
de com tranquilidade e perfeitamente dentro da tradição judaica:
“Amarás o Senhor teu Deus com todo teu coração, com toda tua
alma e com todo teu espírito” (Dt 6,5), os seus interlocutores fi-
cam estupefatos. Não há contradição nem novidade. Jesus apenas
aproxima os dois mandamentos distantes: o amor ao Pai (Dt 6) e
ao próximo (Lv 19). Jesus coloca esses mandamentos em equiva-
lência, em igual importância. O que vem complicar suas vidas,
uma vez que se proclamavam cumpridores da Lei e não viviam o
amor ao próximo (Lv 19,18) com relação ao povo que para eles

79
PNE - QV) - CVV nº 22
era impuro, indigno e merecedor de desprezo. “Jesus não propõe
a distinção entre leis obrigatórias e leis facultativas, entre leis
maiores e menores, como faziam os fariseus e os rabinos, mas
vem afirmar que a alma e a razão da lei é o amor. Jesus toma
posição clara e até mesmo faz uma descrição perfeita do equilí-
brio humano, que consiste na correta valorização e desenvolvi-
mento da dimensão para Deus, da dimensão para o próximo e da
dimensão da própria consciência. Ou, como se costuma dizer, para
o alto, para fora, para dentro. No equilíbrio dessas três dimensões
91
estão a sabedoria e a santidade”.

A primeira leitura do Livro do Êxodo é parte do Código da


Aliança (19-25). O texto proclamado, hoje, é uma antiga cole-
ção de normas a partir da aliança. São leis que mostram como,
numa sociedade, deve se expressar a aliança com Deus, que dá
proteção a seu povo e dele espera justiça. Quem despreza os
pobres está longe de Deus.
A essa Palavra, o Sl 18 expressa nosso amor e reconheci-
mento ao Senhor que nos fortalece, abriga-nos e salva-nos. Diante
de um Deus que é justo e pede justiça, cantamos: “Eu vos amo,
Senhor, sois minha força e salvação!”.
A comunidade de Tessalônica é apresentada por Paulo
como aquela que vence a tribulação com a alegria do Espírito,
tornando-se modelo de vida no amor.

3. Atualizando a Palavra
Amar para o alto, para fora e para dentro. Como é difícil
amar. Amar é uma arte.

! NeortI, Ministério da Palavra..., op. cit., p. 201.

80
PNE - QV) - CV nº 22
A Palavra deste domingo salienta o amor a Deus acima de
tudo e o compromisso com o amor ao irmão próximo. Jesus não
diz que é para amar ao próximo bonzinho, o que fez por mere-
cer, mas amar e dar atenção ao próximo que necessita. É nessa
vivência que podemos mostrar o quanto levamos a sério o pri-
meiro mandamento.
O problema maior está justamente no “próximo”, isto é, a
quem amar. “Próximo” não pode ser uma realidade abstrata. Não
é uma realidade apenas de proximidade, mas de condição. “Próxi-
mo” são as vítimas do tsunâmi e também o pobre que dorme na
calçada em frente a nossa casa. “Próximo” é aquele que pensa
diferente de mim, tem uma religião distinta da minha e também
aquele que pensa e reza do mesmo jeito que eu. Não há diferença.
No meio das lutas pela integração racial, o pastor Martin
Luther King lamentava que em muitas igrejas do sul dos Esta-
dos Unidos as pessoas estivessem dispostas a mandar grandes
somas de dinheiro para ajudar os negros da África, mas jamais
permitiriam que seu vizinho negro partilhasse com eles o mes-
mo banco de igreja.
A história a seguir ilustra a experiência do amor caracte-
rístico do cristão.

O mestre e o escorpião
Mestre e discípulos iam por uma estrada e, quando passa-
vam por uma ponte, viram um escorpião sendo arrastado pelas
águas. O mestre correu pela margem do rio, meteu-se na água e
tomou o bichinho na mão.
Quando o trazia para fora, levou uma picada e, devido à
dor, o homem deixou-o cair novamente no rio.

Foi então à terra, tomou um ramo de árvore, adiantou-se


outra vez a correr pela margem, entrou no rio, colheu o escor-
pião e o salvou.
81
PNE - QV) - CVV nº 22
Voltou o mestre e juntou-se aos discípulos na estrada. Eles
haviam assistido à cena e o receberam perplexos e penalizados.
— Mestre, deve estar doendo muito! Por que foi salvar
esse bicho ruim e venenoso? Que se afogasse! Seria um a me-
nos! Veja como ele respondeu à sua ajuda! Picou a mão que o
salvara! Não merecia compaixão.
O mestre ouviu trangiiilamente os comentários e respondeu:
— Ele agiu conforme sua natureza e eu de acordo com a
minha.
O amor resume a Lei. Tudo mais é detalhamento, conse-
quência, maneira diferente de expressar essa diretriz básica que
é amar. De vez em quando, é bem útil avaliarmos o que fazemos
em nossas múltiplas atividades — quer profissionais, quer pasto-
rais, quer pessoais — com a pergunta: de que jeito meu agir está
me levando a amar melhor a Deus e ao próximo?

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Na Eucaristia, somos convocados por Deus. E unidos a
ele, pelo amor, somos seus filhos. Na celebração eucarística, o
amor torna-se alimento. E os dois mandamentos se reúnem no
coração do homem, habitado pelo amor. Socorrendo ao próxi-
mo, ou seja, à pessoa concreta, é que se cumpre o único manda-
mento. Como comungar o corpo de Cristo, sem comungarmos
as preocupações do irmão?
Nesta Páscoa semanal, tornamos presente a maneira de
Cristo viver o amor total. Suplicamos a Deus todo-poderoso:
“Aumentai em nós a fé, a esperança e a caridade e dai-nos amar
o que ordenais para conseguirmos o que prometeis” (oração da
coleta). Gostaríamos que ele ordenasse o que deveríamos amar.
Mas reconhecemos que seu critério é melhor que o nosso.

82
PNE - QV) - CVY nº 22
Somos fortalecidos para cumprir o mandamento do amor
mesmo em meio às tensões e conflitos do cotidiano, assim como
fizeram os cristãos de Tessalônica (cf. segunda leitura). Somen-
te assim nossa celebração “será para a glória de Deus” (cf. ora-
ção sobre as oferendas).
Este é o domingo para nos lembrarmos de tantos irmãos e
irmãs que vivem esse mandamento, sobretudo em atividades
missionárias verdadeiras e em legítimas experiências de doação
ao próximo.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Celebramos a Páscoa de Jesus que continua se realizando
no testemunho de pessoas e de comunidades que vivem de di-
versos modos o amor a Deus e aos irmãos.
Hoje escutamos de Jesus seu único mandamento que se
expressa de duas maneiras: na comunhão amorosa com Deus e
na alegria da comunhão fraterna.
Que o Espírito Santo venha nos fortalecer para podermos
cumprir a vontade de nosso Deus e Pai de amor.

2. Sugestões para a celebração


e Por ser Dia das Missões, preparar para o mural de en-
trada um cartaz e/ou painel que exiba o trabalho missio-
nário especialmente da comunidade ou que mostre a
disposição que todo batizado deve ter em colocar a ser-
viço os seus dons, presente de amor do Pai.

83
PNE - QV) - CV nº 22
Atenção especial à acolhida (primeiro sinal da disposi-
ção de amar ao próximo). Destacar, para esta função,
pessoas da equipe de celebração ou missionários da
comunidade.
Procissão de entrada com os missionários da comuni-
dade e/ou em visita a esta.

Incluir nas preces da comunidade intenção pelas mis-


sões no mundo inteiro e da paróquia. Lembrar as pes-
soas que mais sofrem, a partir das categorias apresenta-
das na primeira leitura (o estrangeiro, o órfão, a viúva,
o pobre).
Ressaltar toda a liturgia eucarística, memorial do gesto
de Jesus, através de respostas bem cantadas. Fazer a
comunhão sob as duas espécies.
Na homilia, preparar a assembléia para o momento de
silêncio após a comunhão, salientando o deliciar-se com
a presença do Senhor no templo pessoal.
Deixar o abraço da paz para o final da celebração, a fim
de que todos possam, através desse gesto, expressar seu
amor fraterno e comprometer-se a viver o amor.
Lembrar o Sínodo dos Bispos e o encerramento, no pró-
ximo domingo, do Ano da Eucaristia.
31º Domingo do Tempo Comum
30 de outubro de 2005

Leituras: Malaquias 1,14b-2,2b.8-10;


Salmo 130(131),1.2.3; 1 Tessalonicenses 2,7b-9.13;
Mateus 23,1-12 (O maior é o que serve)

Amar ao Pai e servir aos irmãos

1. Situando-nos brevemente
Nos últimos domingos, a Palavra de Deus vem sugerindo
ao nosso coração a prática do amor e do serviço.
Nesta celebração da Páscoa semanal, o Senhor nos ilumi-
na e alimenta para que nossas ações sejam pautadas pela humil-
dade e igualdade no tratamento do irmão.
Orienta-nos para que unamos nossa palavra à ação, supe-
rando toda tendência humana à vaidade e à busca de prestígio
pessoal, colocando-nos a serviço do irmão, sem nos afastarmos
do único Mestre e Guia.
Neste domingo, encerra-se o Ano da Eucaristia, iniciado
com o Congresso Eucarístico Internacional, realizado no Méxi-
co, em outubro de 2004. No Brasil, este domingo também é o Dia
Nacional da Juventude. Milhares de jovens reúnem-se para rezar,
cantar, refletir e celebrar sua juventude na Páscoa de Cristo.

85
PNE - QV) - CVV nº 22
2. Situando a Palavra

O texto de Malaquias, que apresenta uma ligação direta


com o texto do Evangelho de hoje, fala dos muitos sacerdotes
que se tinham afastado do caminho reto e, por seu ensinamento,
tornavam-se pedra de tropeço para o povo, além de denuncia-
rem estar havendo privilégio a uma classe. No tempo de Mala-
quias, o Templo estava restaurado, mas o culto era apenas exte-
rior, sem a sinceridade do coração. O profeta relembra a aliança
e que um só é o Pai de todos. Ao esquecerem essa verdade, as
autoridades, querendo postos e prestígio, entram em um carrossel
de vaidades e com seus maus exemplos desencadeiam toda sorte
de deturpação dos valores do plano de Deus.
No Evangelho, constatamos que Jesus tem um enorme zelo
pelo projeto do Pai, pela religião na qual foi educado, e exige,
com muita energia, um comportamento mais adequado daqueles
que, teoricamente, deveriam dar o exemplo.

Jesus não busca desacreditar o valor das autoridades cons-


tituídas (escribas e fariseus), mas recomenda que o povo faça o
que ensinam, uma vez que eles ocupam a cátedra de Moisés (sig-
nifica: o ensinamento autorizado por Moisés para as gerações
sucessivas — Dt 4,2; 32,46). Apresenta, no entanto, uma ressal-
va — não é para imitar o que eles fazem. A crítica mais dura que
Jesus lança é justamente contra a hipocrisia.
O confronto de Jesus com os chefes do povo é violento.
Ele reclama das regras impostas ao povo que não são cumpridas
pelos doutores da Lei. Lamenta que estes se preocupem em apa-
recer, privilegiando as honrarias e buscando os lugares especiais.
O capítulo 23 prepara a narração da paixão (cap. 26). Apresenta
a culminância da polêmica entre a comunidade cristã e as autori-
dades religiosas judaicas.
Tenhamos cuidado, porém! O objetivo do Evangelho de
hoje não é falar mal ou julgar os chefes dos judeus. Seu propósi-

86
PNE - QV] - CW nº 22
to é o ensinamento contra a hipocrisia. A palavra “hipocrisia”
tem origem na língua grega, mais precisamente no teatro grego.
Hipócrita era uma pessoa que fazia os gestos Interpretativos de
um texto declamado por outro participante. Diríamos hoje: são
os atores de novelas e filmes. São eles mas, ao mesmo tempo,
não o são. O significado da palavra “hipócrita”, que nomeava
um papel do teatro grego, passou então a identificar uma pessoa
que é uma coisa, mas representa outra; que diz uma coisa, mas
pensa outra; que manda praticar uma coisa, mas ela mesmo não
a pratica.
Para os seus discípulos, Jesus tem uma orientação diferen-
te (vv. 8-12). Eles devem ser sinais do Reino não só nos discur-
sos e ensinamentos, porém, especialmente, no modo de viver
em comunidade. Jesus apresenta o caminho a ser seguido para a
superação de toda vaidade: o serviço. O único valor absoluto é a
fraternidade que se põe a serviço. “O maior de vocês deve ser
aquele que vos serve” (v. 11).
No versículo 5, Jesus observa o costume dos judeus de
colocarem fragmentos escritos da Lei na testa e nos braços (cf.
Dt 11,18-19 e Nm 15,37-39). Ele não condena esse costume.
Como atualmente não se condena o portar medalhas, fitinhas,
anéis, escapulários, terços etc. O que Jesus condenou e condena
ainda hoje é usar esses objetos, que deveriam significar compro-
misso religioso, para expressar vaidade pessoal, chamar a aten-
ção e ser admirado.
Nada pode nos desviar das quatro coisas essenciais apon-
tadas no Evangelho: “Um só é o vosso Mestre”; “Um só é o
vosso Par”; “Um só é o vosso Guia”; “Sois todos irmãos”.

À segunda leitura, da carta aos tessalonicenses, apresenta


uma comunidade em que as orientações de Jesus foram postas
em prática. É uma contraposição às duras críticas feitas por
Malaquias e por Jesus. Paulo se apresenta como agente pastoral

87
PNE - QV) - CVVY nº 22
que vive entre o povo e que o instrui, não sendo peso para este,
ressaltando no seu modo de agir o carinho da mãe no trato aos
filhos. Lembra ainda que a Palavra anunciada é Palavra de Deus,
único Mestre.

3. Atualizando a Palavra

Vivemos um momento da história da humanidade em que


o econômico estende-se a todas as dimensões da vida. Tudo é
pensado a partir de categorias econômicas. A sociedade, dentro
desse contexto econômico-cultural, desencadeia novos modelos
de comportamento. As pessoas com ou sem recursos buscam
avidamente se preparar para a competição em todas as áreas.
Temos assim uma geração inteira marcada por egoísmo, compe-
titividade extrema, ânsia pelo lucro a qualquer custo, como trans-
parece em expressões do tipo: “É melhor ser rico doente do que
ser pobre com saúde”; “Agora é vencer ou vencer”.
Há ainda a preocupação de ser aceito e, para isso, não há
limites, visando conseguir o que, de modo geral, a mídia apre-
goa fazer parte do ser bem-sucedido, do ser aceitável. Surgem
questionamentos sobre o valor da pessoa e dos relacionamentos
humanos, os quais se refletem na estrutura familiar e, por conse-
guinte, na comunitária.
No Evangelho, Jesus trata esta questão: se a vaidade e a
fome por privilégios se estabelecem na sociedade, os valores do
projeto de Deus se deturpam e o poder transformador dos operá-
rios do Reino se perde.
Todo batizado é chamado a evangelizar com seu testemu-
nho e com sua vida.
A denúncia de Jesus é atual, pois fregiientemente vemos
pessoas discursarem, pedirem sacrifícios para salvar a econo-
mia, a fauna, a flora, a atmosfera e a liberdade de um país, e

88
PNE - QV) - CVV nº 22
testemunharem o contrário. Nós mesmos, quantas vezes, não nos
damos conta de que buscamos diversas justificativas para ficar
isentos de responsabilidades, embora exijamos do irmão uma
outra postura.
Jesus lamenta que algumas autoridades estejam só preo-
cupadas com as honrarias, afastando-se assim da verdadeira mis-
são de ser sinal da fidelidade a Deus.

Somos todos irmãos, um só é o Pai, um só é o Mestre e ele


nos dá o modelo de humanidade e de igualdade de tratamento
que deve reinar entre nós para a organização de uma comunida-
de mais cristã. A tentação de dominar está sempre presente tam-
bém entre os discípulos de Cristo, tanto entre os chamados a
exercer os diversos serviços na Igreja de Cristo como nos dife-
rentes ministérios dos cristãos leigos.
Orígenes (f 254) ensinava que “toda religião fingida é mor-
ta”. Também santo Antônio pregava que “a santidade fingida é
dupla iniquidade”. Paulo VI, em sua carta apostólica Evangelii
Nuntiandi, afirma: “Ouve-se repetir hoje que este nosso século
tem sede de autenticidade. A propósito dos jovens, sobretudo,
afirma-se que eles têm horror ao fictício, aquilo que é falso e que
procuram, acima de tudo, a verdade e a transparência. Eles nos
perguntam: * Acreditais verdadeiramente naquilo que anunciais?
Viveis aquilo em que acreditais? Pregais vós verdadeiramente
aquilo que viveis?”. Mais do que nunca, portanto, o testemunho
da vida tornou-se uma condição essencial para a eficácia pro-
funda da pregação. Sob este ângulo, somos, até certo ponto,
responsáveis pelo avanço do Evangelho que nós proclamamos”
(n. 76).
E preciso atenção redobrada, pois o primeiro pecado veio
do desejo de competir com o próprio Criador.
O símbolo da cruz, presente em nossa celebração, deve
nos manter vigilantes em contínua e permanente conversão.

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PNE - QV) - CVV nº 22
4. Ligando a Palavra com ação eucarística
Após ouvirmos e meditarmos a Palavra, reforçamos o que
pedimos e lembramos na oração da coleta: “Ó Deus de poder e
misericórdia, que concedeis a vossos filhos a graça de vos servir
como devem”, isto é, sem hipocrisia, sem falsidade, mas com
amor. Em nós deve “frutificar a vossa graça” (oração após a co-
munhão), e não os sentimentos humanos.
No salmo responsorial, cantamos o que aspiramos na cele-
bração de hoje: não desejar o que não é nosso, ser humilde, cal-
mo, sereno, trangiilo, saber-se amparado na maternal ternura de
Deus. Essas são condições para ser um líder que só procura ser-
vir e não se autofirmar.
Damos graças ao Senhor neste domingo na vivência do
amor: amor que se faz serviço, comunhão, união e doação.
O fato acontecido nas Olimpíadas Especiais de Seattle pode
ser um belo exemplo para nós, hoje.
Há alguns anos, nas Olimpíadas Especiais de Seattle, nove
participantes, todos com deficiência mental ou física, alinha-
ram-se para a largada da corrida dos 100 metros rasos. Ão si-
nal, todos partiram, não exatamente em disparada, mas com
vontade de dar o melhor de si, terminar a corrida e ganhar.
Todos, com exceção de um garoto, que tropeçou no asfal-
to, caiu rolando e começou a chorar. Os outros oito ouviram o
choro. Diminuíram o passo e olharam para trás. Então eles vi-
raram e voltaram. Todos eles.
Uma das meninas, com síndrome de Down, ajoelhou-se,
deu um beijo no garoto e disse: “Pronto, agora vai sarar!”. E
todos os nove competidores deram os braços e andaram até a
linha de chegada.
O estádio inteiro levantou e os aplausos duraram muitos
minutos.

90
PNE - QV) - CVV nº 22
As pessoas que estavam ali, naquele dia, continuam repe-
tindo esta história até hoje.
Por quê?
Porque, lá no fundo, nós sabemos que o importante nesta
vida é mais do que ganhar sozinho. O que vale é ajudar os outros
a vencer, mesmo que isso signifique diminuir o passo e mudar
de curso.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Hoje, recordamos Jesus que, ao contrário dos fariseus e
escribas, é Mestre que honra sua palavra até as últimas conse-
quências. Ele mesmo é a realização da Palavra, o Verbo do Pai.
Glorificamos ao Pai por Cristo, que, mesmo sendo Deus,
se rebaixou a nossa condição e se fez servo.
Que esta celebração nos ajude a vencer a pretensão de ser-
mos vistos e elogiados por nosso trabalho e bom desempenho.

2. Sugestões para a celebração


e Na entrada da igreja, colocar algo que lembre a conclu-
são do Ano da Eucaristia; pode ser um cartaz no mural,
um arranjo etc. Usar um ícone dos discípulos de Emaús,
com a carta apostólica de João Paulo II, Mane nobiscum
Domine, especialmente escrita para o Ano da Eucaristia.

e Fazer uma acolhida afetuosa aos jovens e adolescentes


da comunidade. Convidá-los a participar, na celebra-
ção de hoje, dos ministérios litúrgicos e da procissão de

91
PNE - QV) - CVV nº 22
entrada, levando a cruz, o Lecionário, velas, flores e
símbolos ligados à realidade da juventude. Na hora do
pai-nosso, pedir aos jovens que se aproximem do altar.
Assim como os jovens discípulos de Emaús, eles são os
convidados de honra para a “fração do pão”.
Por ser hoje também a conclusão do mês missionário,
recordar a conclusão da carta apostólica Mane nobiscum
Domine, na qual João Paulo II pede: “Vós todos, fiéis,
redescobri o dom da Eucaristia como luz e força para
vossa vida cotidiana no mundo, no exercício das res-
pectivas profissões e no contato com as mais diversas
situações. Redescobri-o, sobretudo, para viver plena-
mente a beleza e a missão da família”. Lembrar esta
frase antes da bênção e do envio final.
Recordar que, na procissão das oferendas, além do pão,
do vinho e da água, a comunidade, unindo-se ao sacri-
fício de Cristo, pode ofertar sua disposição de colocar-
se a serviço. Reservar um tempo de silêncio entre o
comentário e o canto de ofertório.
Rezar o pai-nosso de mãos dadas, reforçando o com-
promisso de irmãos em Cristo.
Realizar a comunhão sob as duas espécies, lembrando
de maneira especial hoje a Igreja do mundo inteiro que
encerra o Ano da Eucaristia.

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PNE - QV) - CVV nº 22
COMEMORAÇÃO DE TODOS OS FIÉIS DEFUNTOS
2 de novembro de 2005

“Todos, em Cristo, terão a vida!”

Para a comemoração de hoje, o Lecionário nos propõe uma


rica variedade de textos bíblicos, elencados no final deste roteiro.

Como estamos no Ano À, ano do Evangelho de Mateus,


sugerimos que seja escolhido um dos textos desse Evangelho
ainda não proclamados; portanto, os textos de Mt 11,25-30
(“Vinde a mim e eu vos darei descanso” — este evangelho não foi
proclamado no 14º Domingo, pois celebramos nele a Solenida-
de de são Pedro e são Paulo — 3/7) ou Mt 25,1-15 (parábola das
jovens prudentes e imprudentes — do 32º Domingo, quando cele-
braremos a Solenidade de Todos os Santos).

1. Situando-nos brevemente

No dia 2 de novembro, celebramos todos os fiéis defuntos.


Finados é o dia dos que “findaram”, dos que chegaram ao fim de
seu tempo aqui na terra. Reservar um dia para rezar pelos mor-
tos é um costume que vem desde o século XI, dos monges do
mosteiro de Cluny, na França. Eles começaram a realizar uma
missa por todos os mortos no dia seguinte à festa de Todos os
Santos, justamente para ressaltar a unidade que existe entre os
cristãos que vivem na terra e os mortos e os santos que estão na
glória. Essa prática do mosteiro foi se espalhando pela Europa
inteira e hoje é adotada por toda a Igreja.

93
PNE - QV) - CVV nº 22
Este dia faz com que muitas lembranças tornem-se mais
vivas. E, dependendo da história de vida de cada um e de cada
família, às vezes, nele relembram-se dores e sofrimentos. Mas,
se professamos a fé cristã, esta comemoração não deve celebrar
a morte, porém a ressurreição, a esperança de que todos aqueles
que já partiram deste mundo possam contemplar a face do Se-
nhor, alcançando a vida eterna.

2. Recordando a Palavra

O mistério pascal de Jesus Cristo é o centro da fé cristã, ou


seja, sua paixão, morte e ressurreição. São Paulo, na carta aos
tessalonicenses, nos diz que, “se Jesus morreu e ressuscitou — e
esta é a nossa fé —, de modo semelhante Deus trará de volta, com
Cristo, os que através dele entraram no sono da morte” (1Ts 4,14).
Portanto, Jesus nos trouxe a salvação, a esperança da vida
eterna. É o próprio Jesus quem nos diz: “Esta é a vontade de
meu Pai: que todo aquele que vê o Filho e nele crê, tenha a vida
eterna; e eu o ressuscitarei no último dia. Em verdade, em verda-
de vos digo: quem crê em mim tem a vida eterna” (Jo 6,40-47).
Assim nossa salvação depende de nossa fé em Jesus Cris-
to. Os que morreram com Cristo, ou seja, os que viveram sua fé,
acreditaram na sua Palavra e passaram a vida testemunhando o
seu amor, alcançarão a vida eterna.
Por isso, em especial, neste dia, lembramos o que Jesus
nos pediu: viver o amor e o perdão, acolher a todos — os que
amamos e os que nos fizeram algum mal —, vivenciar a frate-
rnidade e a paz.
Nós também queremos ser acolhidos, um dia, pelo Pai e
receber seu perdão. Sabemos, porém, que seremos perdoados na
medida em que também nós soubermos perdoar.

94
PNE - QV) - CVV nº 22
Por isso, na celebração deste dia, possamos trazer o cora-
ção livre de qualquer ressentimento, seja para com aqueles que
Já partiram, seja para com aqueles que causaram a morte dos que
amamos.
Se temos esperança de um dia estarmos juntos na presença
do Pai, devemos viver nessa certeza e de forma a merecer isso.

Assim, certos do perdão e da misericórdia de Deus, caminhe-


mos sempre com nosso coração voltado para Jesus, com fé e amor
sincero: “Ressurreição e vida nossa, Cristo, esperança do perdão
quando nos fere a dor da morte, a vós se volta o coração” (Liturgia
das Horas, Hino das Laudes, ofício dos fiéis defuntos, p. 1576).

3. Atualizando a Palavra

Sabemos o quanto é difícil para nós enfrentar a dor causa-


da pela morte de alguém querido. É impossível não sofrer. No
entanto, esse sofrimento não pode ser maior do que a alegria
gerada pela vida que passou e, muito menos, será capaz de aba-
far a alegre esperança da ressurreição, na promessa de Jesus.
Menos ainda será atitude cristã revoltar-se contra Deus,
pois a vida transformada na hora da morte foi por ele mesmo
concedida.

Para explicar o mistério da morte, o Novo Testamento usa a


imagem do “parto”. O dia da morte é o dia em que termina a ges-
tação da “nova criatura” (Gl 6,15). É o dia do nascimento do “ho-
mem novo” (Ef 4,24). Por isso, a morte não é ocaso, mas aurora.

Em nosso mundo, há muita morte de inocentes causada


pela violência, pelo descaso da sociedade e pelo domínio dos
que querem sempre mais para si próprios. Com certeza, é muito
difícil enfrentar a morte gerada pelo egoísmo humano. Contudo,
ao contrário da revolta que torna de pedra o coração de quem

95
PNE - QV) - CVY nº 22
não perdoa, devemos, sim, lutar contra toda injustiça, sair do
comodismo e buscar a paz, desde as coisas mais simples.
E importante desarmar as mãos, mas antes disso é preciso
desarmar o coração.
Aquele que tem o espírito armado para a violência não
precisa de armas, porque pode matar com as próprias mãos. Aque-
le que não sabe perdoar, aquele que levanta falso testemunho
contra o irmão também pode promover a morte. A exclusão e a
palavra falsa podem ser tão violentas para com a dignidade hu-
mana como o são as armas que matam o corpo.
Saibamos viver o amor e a paz, lutar pela vida aqui na
terra e pensar na morte como a passagem para uma nova vida,
para a vida eterna!

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


À confirmação da grande promessa de Jesus já é rezada na
antífona de entrada da celebração eucarística: “Como Jesus mor-
reu e ressuscitou, Deus ressuscitará os que nele morreram. E,
como todos morrem em Adão, todos, em Cristo, terão a vida”
(cf. 1Ts 4,14; 1Cor 15,22).

À oração do dia suplica a Deus que nossa fé no Cristo res-


suscitado aumente sempre, para que se torne mais viva nossa
esperança na ressurreição de todos nós.
Na sequência de todas as orações da celebração (oração
sobre as oferendas, prece eucarística, oração após a comunhão),
renovamos nosso pedido ao Pai para que todos que partem desta
vida alcancem a vida eterna.
Na antífona de comunhão, quando partilhamos a vida do
próprio Cristo que se dá a nós na Eucaristia, encontramos a pro-
messa definitiva da Palavra do Senhor, conforme reafirma o

96
PNE - QV) - CVVY nº 22
Evangelho de são João: “Eu sou a ressurreição e a vida, diz O
Senhor. Aquele que crê em mim, ainda que tenha morrido, vive-
rá; e todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá para sem-
pre” (Jo 11,25s).

É importante hoje rezarmos e refletirmos sobre a “comu-


nhão dos santos”, que professamos na oração do Credo. Diz a
Lumen Gentium, nn. 49 e 50: “A união dos que estão na terra
com os irmãos que descansam na paz de Cristo, de maneira ne-
nhuma se interrompe, ao contrário, conforme a fé perene da Igre-
ja, vê-se fortalecida pela comunicação dos bens espirituais. [...]
Reconhecendo essa comunhão de todo o corpo místico de Jesus
Cristo, a Igreja terrestre, desde os primórdios da religião cristã,
venerou com grande piedade a memória dos defuntos. Mas nos-
sa união com a Igreja celeste se realiza de modo nobilíssimo
especialmente na sagrada liturgia, em que a força do Espírito
Santo atua sobre nós por meio dos sinais sacramentais, quando
em comum exaltação cantamos os louvores de divina majesta-
de, e todos, redimidos no sangue de Cristo, de toda tribo e lín-
gua, e povo, e nação, congregados numa só Igreja, em um só
cântico de louvor, engrandecemos o Deus Uno e Trino. É, por-
tanto, na celebração do sacrifício eucarístico que certamente nos
unimos mais estreitamente ao culto da Igreja celeste, uma vez que
a ela nos ligamos sobretudo venerando a memória da gloriosa sem-
pre Virgem Maria, bem como do bem-aventurado José, dos bem-
aventurados apóstolos e mártires e todos os santos”,

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Nada tem mais sentido do que celebrar os fiéis defuntos
na Eucaristia, pois esta é a comemoração do mistério pascal de

97
PNE - QV) - CVV nº 22
Jesus, a certeza da nossa salvação e da vida eterna na sua ressur-
reição. Este é o destino eterno da criatura humana.
À sua presença viva no meio de nós, no pão da Eucaristia,
nos alimenta e sustenta em direção à casa do Pai.
Na celebração eucarística fazemos memória da última ceia
do Senhor com seus discípulos, quando ele anunciou sua morte,
sua doação na cruz, ao afirmar que ofereceria por nós seu corpo
e seu sangue, e quando pediu: “Fazei isso em memória de mim”.
E o momento que dá sentido à morte, e é apenas por isso
que faz sentido a vida! Celebramos hoje a esperança!

2. Sugestões para a celebração


e Conforme nos recomenda o Diretório Litúrgico, neste
dia, não se ornamenta o altar com flores e o toque do
órgão e de outros instrumentos só é permitido para sus-
tentar o canto.
* (Como Cristo é a luz da vida e com sua morte e ressur-
reição nos conduz à salvação, salientar a luz pela entra-
da do Círio Pascal, na procissão de entrada, acompa-
nhando a cruz processional, e mantê-lo em lugar de
destaque no presbitério.
e Escolher cantos próprios para os diversos momentos
da celebração, cuja melodia deve ser suave, sem ser
melancólica.
e Nosritos iniciais, motivar um momento de silêncio para
que todos, na assembléia, recordem as pessoas faleci-
das por quem desejam orar.
- Fazer a aspersão com água benta no momento do ato
penitencial, como memória de nosso batismo. A oração

98
PNE - QV) - CVV nº 22
para a bênção da água está no Missal Romano, pp. 1001-
1004.
Depois do momento de silêncio, após a comunhão, can-
tar um hino de louvor a Deus, agradecendo pela vida de
todos que já partiram. Sugestão: “Graças dou por esta
vida”, de J. A. Ultran.

Leituras próprias à escolha


2Mc 12,43-46; Jó 19,1.23-27a; Sb 3,1-9; Sb 3,1-6.9;
Sb 4,7-15; Is 25,6a.7-9; Lm 3,17-26; Dn 12,1-3.

S1 22023); SI 24025); S1 26(27); SI 41(42); SI 62(63);


SI 102(103); Sl 114(116a); SI 121(122); S1 129(130);
S1 142(143).
Rm 5,5-11; Rm 8,14-23; Ap 21,1-5a.6b-7; Rm 5,17-
21; Rm 6,3-9; Rm 8,31b-35.37-39; Rm 14,7-9.10c-12;
1Cor 15,20-24a.25-28; 1Cor 15,51-57; 2Cor 4,14-5,1;
1Cor 5,1.6-10; FI 3,20-21; 1Ts 4,13-18; 2Tm 2,8-13;
1Jo 3,1-2; 1Jo 3,14-16.
Jo 6,37-40; Mt 25,31-46; Mt 5,1-12; Mt 11,25-30; Mt
25,1-13; Mc 15,33-39; Mc 16,1-6; Lc 7,11-17; Lc 12,35-
40; Lc 23,33.39-43; Lc 23,44-46.50.52-53; Lc 24,1-6a;
Lc 24,13-35; Jo 5,24-29; Jo 6,51-58; Jo 11,17-27; Jo
12,23-28; Jo 14,1-6; Jo 17,24-26; Jo 19,17-18.25-39.
SOLENIDADE DE TODOS OS SANTOS
32º Domingo do Tempo Comum
6 de novembro de 2005

Leituras: Apocalipse 7,2-4.9-14; Salmo 23(24),1-2.3-4ab.5-6 (R/. 16);


1 João 3,1-3; Mateus 5,1-12a (Bem-aventurança)

“E assim a geração dos que


procuram o Senhor!”

1. Situando-nos brevemente
Há poucos dias celebramos o dia de Finados, quando re-
cordamos todos nossos irmãos falecidos. A celebração de hoje
tem ligação com essa recordação. Se no dia 2 lembramos os que
já partiram ao encontro do Pai, hoje celebramos a ressurreição e
nossa esperança de alcançar a vida eterna.
A Solenidade de Todos os Santos lembra o exemplo de
vida dos que, proclamados santos pela Igreja, são nossos
intercessores junto ao Pai: “Deus eterno e todo-poderoso, que
nos dais celebrar numa só festa os méritos de todos os santos,
concedei-nos por intercessores tão numerosos a plenitude de
vossa misericórdia” (oração do dia).
Ao celebrar Todos os Santos, referimo-nos a todos que glo-
rificaram a Deus com suas vidas e, reconhecidos como santos
ou não, alcançaram a santidade.

100
PNE - QV) - CVV nº 22
À festa de hoje une as três dimensões do tempo: o passado
(quando olhamos para os que já viveram antes de nós), o futuro
(aqueles com os quais queremos um dia conviver) e o presente
(precisamos de modelos e intercessores em nosso caminho).
Esta festa, unida à comemoração dos fiéis defuntos (2/11),
é um momento em que sentimos a unidade entre a Igreja pere-
grina (militante), padecente (purgatório) e triunfante (céu).
Todos somos convidados, por Jesus, ao caminho da santidade. To-
dos caminhamos motivados pelo desejo: Queremos Ver Jesus! A
liturgia nos mostra que ele é o Caminho, a Verdade e a Vida!

2. Recordando a Palavra

Na leitura do Livro do Apocalipse, são João narra sua vi-


são daqueles que “[...] vieram da grande tribulação. Lavaram e
alvejaram as suas roupas no sangue do Cordeiro” (Ap 7,14).
Lembremos o contexto de perseguição que as primeiras
comunidades sofriam. Muitos eram presos e torturados e os que
sobreviviam corriam o risco de desanimar e abandonar a comu-
nidade. A leitura de hoje não tem o objetivo de indicar “quantos”
serão salvos (144 mil), mas sim “quem” será salvo.
Testemunhar Jesus Cristo e ser fiel ao seu Evangelho fize-
ram com que muitos enfrentassem grandes tribulações. Os que
foram martirizados ofereceram também seu sangue, testemunhan-
do a doação de Cristo, sendo fiéis até a morte.
Na sua primeira carta, são João refere-se ao grande pre-
sente de amor que o Pai nos deu, que é o de sermos chamados
filhos de Deus, e afirma: “E nós o somos!”. Por isso, irmãos em
Cristo, temos nele a oportunidade de alcançar a santidade, se
dele não nos afastarmos: “Todo o que nele espera, purifica-se a
si mesmo, como também ele é puro” (1Jo 3,1-3).

101
PNE - QV] - CVV nº 22
A Lei do Antigo Testamento foi recebida por Moisés no
Monte Sinai. À Lei do Novo Testamento é revelada por Jesus
Cristo, também em um Monte, perto do Mar da Galiléia, chama-
do hoje “Monte das Bem-aventuranças”. É desse Monte que Je-
sus profere o mais famoso discurso que, segundo M. Gandhi, é
uma das mais belas e importantes páginas da literatura mundial.
O texto de Mateus nos dá a certeza de que podemos alcan-
çar a santidade, pois é o próprio Jesus quem nos fala que será
grande nossa recompensa no céu.
No entanto, é bom lembrar que toda recompensa pressu-
põe uma ação anterior, uma atitude, que é a fidelidade aos ensi-
namentos de Jesus.
Ele chama bem-aventurados todos os que se comprome-
tem com sua Palavra e a vivem, sendo misericordiosos, defenso-
res da justiça, promotores da paz, sem medo do que deve ser
enfrentado, pois, como o próprio Jesus nos diz, não serão pou-
cas as perseguições e dificuldades a serem vencidas, se quiser-
mos permanecer sempre fiéis aos valores do Evangelho.
Referindo-se às bem-aventuranças, Jesus resume no que
consiste a santidade, que, portanto, pode ser alcançada por todos
os que buscam viver o amor, a partilha, a misericórdia, a justiça
e a paz: “É assim a geração dos que procuram o Senhor” (SI
23/24).
Esse salmo era cantado nas procissões que o povo de Israel
fazia para o Templo de Jerusalém. Nós continuamos a cantá-lo
porque somos um povo a caminho da nova e eterna Jerusalém.

3. Atualizando a Palavra
Nós, hoje, queremos fazer parte da geração dos que bus-
cam o Senhor?

102
PNE - QV) - CVV nº 22
Essa geração não é identificada com um estilo de roupa,
com preferência musical ou com qualquer característica cultural
humana relacionada a algum tempo ou espaço.
A geração dos que buscam o Senhor não tem tempo nem
lugar determinados; possui, sim, uma única e necessária identi-
dade: a fidelidade à Palavra revelada por Jesus Cristo.
Anunciar e viver o grande mandamento do amor que Jesus
nos deixou identifica essa geração. O Evangelho das bem-
aventuranças resume toda a pregação de Jesus. Ele formula sua
mensagem não em forma de proibição, mas em forma de procla-
mação, dizendo que são felizes e bem-aventurados os que as
seguem.
Imperativos da cultura e da sociedade em que vivemos
podem, muitas vezes, levar-nos a esquecer de que queremos fa-
zer parte da geração que segue Jesus. É difícil nos mantermos
firmes, quando ridicularizados ou criticados à luz dos conceitos
culturais humanos. Temos, talvez, mais medo de ser excluídos
da geração da nossa época do que de nos afastar da geração que
está a caminho da santidade, e que se dirige ao encontro de Deus.
Costumamos pensar que Deus, na sua infinita misericór-
dia, pode sempre nos compreender e perdoar. Certamente ele
pode, mas, para isso, precisamos estar no seu caminho, e depen-
de de nós caminhar ao seu encontro.
O Pai acolhe a todos, porém é necessário Ir até ele; é preci-
so que queiramos fazer parte da geração que busca sua face, que
procura a santidade.

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Hoje, juntamos à memória do sacrifício de Jesus a geração
dos que procuram o Senhor. E colocamos sobre o altar a dispo-

103
PNE - QV) - CVV nº 22
nibilidade de assumir o caminho de santidade que eles percorre-
ram. É o que rezamos no Prefácio: “Festejamos, hoje, a cidade
do céu, a Jerusalém do alto, nossa mãe, onde nossos irmãos, os
santos, vos cercam e cantam eternamente o vosso louvor. Para
essa cidade caminhamos, pressurosos, peregrinando na penum-
bra da fé. Contemplamos alegres, na vossa luz, tantos membros
da Igreja, que nos dais como exemplo e intercessão”.
“Como aquela multidão na montanha, a assembléia reuni-
da no dia do Senhor recebe esta palavra como bênção que a con-
firma e pede novas atitudes. O caminho das bem-aventuranças é
certamente um programa de vida para a comunidade e a pessoa
que segue Jesus. A liturgia tem a função de sempre nos lembrar
disso, colocando-nos diante do próprio Jesus, o bem-aventurado
de Deus.”!
Entoamos o “Santo” com os anjos e santos. E unidos a
eles cantamos a uma só voz, ligando a liturgia da terra à liturgia
do céu (cf. Sacrosanctum Concililum, n. 8).
Sejam modelos de vida para nós. Fortalecidos por seus
exemplos, possamos viver na fidelidade o Evangelho e cami-
nhar rumo à santidade.

PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
A Páscoa de Jesus Cristo se manifesta na vitória de todos
os santos da humanidade. Reunidos em comunidade para cele-
brar a Solenidade de Todos o Santos, experimentamos a união

| GUIMARÃES & CARPANEDO, Dia do Senhor..., Op. cit., p. 333.

104
PNE - QV) - CVV nº 22
daqueles que já fazem parte do grande banquete celeste junto ao
Pai; podemos sentir-nos parte da geração dos que buscam a Deus,
como entoamos no salmo.
Vivendo o amor e a partilha aqui na terra, buscamos nos
colocar a caminho da santidade. Com os anjos e santos, louvemos
sempre ao Senhor, mesmo nas dificuldades, no sofrimento, assim
seremos chamados bem-aventurados, alcançando a promessa de
Jesus: “[...] será grande vossa recompensa no céu” (Mt 5,12).

2. Sugestões para a celebração


Na procissão de entrada, levar as imagens dos santos
que estão no oratório, capela ou igreja e colocá-las em
um lugar devidamente preparado.
Cantar a ladainha de Todos os Santos no momento das
preces da comunidade. Sugerimos o texto da ladainha
que se encontra no subsídio de Marcelo Guimarães
e Penha Carpanedo: Dia do Senhor, Tempo Comum,
Ano Á, São Paulo, Paulinas e Apostolado Litúrgico,
pp. 333 a 335.
Na homilia, esclarecer aos fiéis a diferença entre “ado-
ração” (dirigida a Deus) e “veneração” (dirigida aos
santos), visto que há muitas dúvidas referentes a esse
assunto. Muitos católicos sentem dificuldade de dialo-
gar com membros de outras religiões sobre o verdadei-
ro sentido da veneração aos santos. Como fonte para
reflexão, pode-se tomar os dois prefácios dos santos,
que se encontram no Missal Romano, pp. 451-452
O “Santo”, cantado, deve ter melodia solene e vibrante.

No final da celebração, invocar a bênção solene própria


para o dia de hoje (cf. Missal Romano, p. 529):

105
PNE - QV) - CVV nº 22
Deus, glória e exultação dos Santos que hoje celebrais
solenemente, vos abençoe para sempre.
R.: Amém.

Livres por sua intercessão dos males presentes, e inspi-


rados pelo exemplo de suas vidas, possais colocar-vos
constantemente a serviço de Deus e dos irmãos.
R.: Amém.

E assim, com todos eles, vos seja dado gozar a alegria


da verdadeira pátria, onde a Igreja reúne os seus filhos
e filhas aos santos para a paz eterna.
R.: Amém.

Abençoe-vos o Deus todo-poderosos, Pai e Filho e Es-


pírito Santo.
R.: Amém.
33º Domingo do Tempo Comum
|3 de novembro de 2005

Leituras: Provérbios 31,10-13.19-20.30-31;


Salmo 127(128),1-2.3.4-Sab(R/. la); 1 Tessalonicenses 5,1-6;
Mateus 25,14-30 (Os talentos recebidos e restituídos)

Tem as mãos limpas aquele que


“não lava suas mãos”!

1. Situando-nos brevemente
No próximo domingo, com a festa de Cristo Rei, encerra-
se o Ano Litúrgico.
Nesta época, sentimo-nos diferentes. No início do ano, de
janeiro a março, tudo tem que começar. Em novembro e dezem-
bro, tudo tem que terminar. Dentro de uma pedagogia de vida
celebrada dentro do tempo, neste final de ano a liturgia da Pala-
vra nos põe em contato com o fim da nossa vida. Assim como
nos damos conta de que o final do ano de 2005 já está chegando
e que é hora dos últimos encaminhamentos, assim também nos-
sa vida vai passando.
A vida é valiosa demais! Por isso o tempo é valioso. Não
podemos permitir que o tempo passe e a vida não seja vivida.
Mas o que é viver? Para viver, certamente não basta estar
vivo. Quando ouvimos alguém dizer: “Isso é que é vida!”; ou “Isso
não é vida!”; ou, ainda, “Essa vida não me serve!”, e outras ex-

107
PNE - QV) - CVV nº 22
pressões semelhantes, percebemos que existem diversas opiniões
sobre a vida. Não basta apenas viver, queremos viver bem!
Jesus é o Mestre da vida! Como autor, ele tem autoridade
para falar da vida e ensinar a viver. Na celebração dominical, va-
mos ao seu encontro para com ele aprender a viver, e viver bem.
Que bom se cada um sentir e ouvir também para si, em cada ce-
lebração e também no dia de seu juízo, o convite de Jesus: “Servo
bom e fiel! Como foste fiel na administração de tão pouco, eu te
confiarei muito mais. Vem participar da minha alegria!”.
2. Recordando a Palavra

Provérbios é um dos livros didáticos da Bíblia. O seu con-


teúdo, elaborado e reunido pelos sábios de Israel, quer ensinar a
bem viver. O poema da “Mulher virtuosa”, do qual a primeira
leitura faz parte, aparece no final do livro dos Provérbios, como
se fosse seu último ensinamento. A finalidade poderia ser ensi-
nar ao jovem, depois de ter frequentado a escola da sabedoria,
critérios para escolher bem sua esposa.! No contexto da liturgia
da Palavra, parece destacar a capacidade e a vontade de traba-
lhar entre os atributos de uma boa esposa.
A segunda leitura é tirada da primeira carta de são Paulo
aos tessalonicenses, o primeiro livro escrito do Novo Testamen-
to. Em Tessalônica, a comunidade cristã vivia um problema teo-
lógico quanto à parusia, a segunda vinda de Cristo: por que Je-
sus demorava tanto para voltar? Além do mais, se as pessoas que
se converteram a Jesus já estavam morrendo, como é que elas
poderiam participar dessa vitória de Cristo? A isso são Paulo
procurou responder. Para ele, o importante não é quando aconte-
cerá — será como a vinda de um ladrão à noite —, mas como viver
para estar preparado.

| Cf. Bíblia do Peregrino. São Paulo, Paulus, 2002. Ver comentário de L. A.


ScHÓKEL sobre Pr 31,10-31.

108
PNE - QV) - CVV nº 22
Já o discurso de Jesus, que Mateus conservou nos capítu-
los 24 e 25 de seu Evangelho, é conhecido como discurso
escatológico. Neste, o tema abordado é o mesmo de ITs: a se-
gunda vinda de Jesus e quais as atitudes com as quais o cristão
deve esperá-la. O texto do Evangelho deste domingo faz parte
desse discurso.
Quando o Evangelho de Mateus foi escrito — por volta dos
anos 80 —, muitos cristãos começavam a desanimar pelo mesmo
motivo dos tessalonicenses: a demora de Jesus em voltar. Além
disso, assumir a fé cristã trazia perseguição e até morte. Muitos
voltavam atrás! Aquele ardor por Jesus estava esfriando. Mateus
quer reaquecê-lo.
No texto de hoje, conhecido como a parábola dos talentos,
Jesus apresenta-se como um patrão que, antes de partir em via-
gem, reuniu seus servos e distribuiu-lhes sua fortuna. A um deu
cinco talentos, a outro dois e ao terceiro, um. Devido à dificulda-
de de calcularmos a quantia correspondente a esses valores, me-
lhor seria usarmos os termos que a Bíblia do Peregrino apresen-
ta: “A um deu cinco milhões, a outro dois, a outro um; a cada um
segundo a sua capacidade”. As partes mais importantes da pará-
bola são justamente o retorno desse patrão e o diálogo com os
servos, no qual cada um presta contas de como administrou os
bens do patrão em sua ausência.

3. Atualizando a Palavra
À liturgia da Palavra deve ajudar a preparar-nos para o dia
do juízo, o dia da prestação de contas diante de Deus, do dom da
vida que Dele recebemos e de como o administramos. Para quem
a minha vida foi boa? Para ninguém? Apenas para mim mesmo?
Ou para Deus e seu povo? Administro-a em proveito próprio ou
do crescimento do Reino. Minha presença produziu mais vida

109
PNE - QV) - CVV nº 22
nos lugares em que vivi? Uma vida vivida em vão ou apenas em
proveito próprio é um desperdício de um dom que não é nosso e
do qual nos será pedido que prestemos contas.
Para que a vida não seja desperdiçada, a leitura do Livro
dos Provérbios nos apresenta três virtudes a serem cultivadas. Pri-
meira: pelo trabalho, cuidar bem da própria casa, para que nada
lhe falte. Segunda: ter um coração generoso para partilhar o fruto
do próprio trabalho com o pobre. Terceira: não cultivar apenas a
aparência e a beleza física ou exterior, mas o temor de Deus. Essas
não são apenas virtudes de uma boa esposa, mas de todo cristão
que escolhe, com sabedoria, os caminhos para sua vida.
Falando em trabalhar... o Evangelho nos mostra duas atitu-
des diferentes com as quais se pode esperar o retorno do patrão,
a segunda vinda de Cristo. A primeira é a dos empregados que
receberam cinco e dois talentos: eles se empenharam, negocia-
ram, trabalharam para que os bens do seu patrão que lhes foram
confiados rendessem frutos a fim de que pudessem entregá-los
no dia de seu retorno. Ambos são elogiados e recompensados!
Já o terceiro, o que recebeu apenas um talento, é chamado de
mau e preguiçoso, porque não teve o mesmo empenho: enterrou
seu talento, escondeu-o e, por Isso, perdeu-o.

Jesus ressuscitado subiu ao céu, donde voltará. Na sua “au-


sência”, deixou a nós, cristãos, a tarefa de sermos suas testemu-
nhas e continuadores da missão que ele mesmo recebeu do Pai,
de salvar a humanidade (cf. At 1,6-11). “É com o nosso coração
que Jesus continua a amar os publicanos e os pecadores do nos-
so tempo; é com as nossas palavras que Jesus continua a conso-
lar os que estão tristes e desanimados; é com os nossos braços
abertos que Jesus continua a acolher os imigrantes que fogem da
muséria e da degradação; é com as nossas mãos que Jesus conti-
nua a quebrar as cadeias que prendem os escravizados e oprimi-
dos; é com os nossos pés que Jesus continua a ir ao encontro de

110
PNE - QV) - CVY nº 22
cada irmão que está sozinho e abandonado; é com a nossa soli-
dariedade que Jesus continua a alimentar as multidões famintas
do mundo e a dar medicamentos e cultura àqueles que nada têm.”
Esse é o talento que recebemos: é muito valioso porque é a nos-
sa salvação! Mas é também de grande responsabilidade, pois
enterrá-lo é privar nossos irmãos de um dom que é deles e do
qual somos apenas administradores.
Trabalhar ou enterrar os talentos”?

Ainda hoje temos os dois modelos, as duas atitudes. Se


existe tanto mal presente no mundo, muito se deve à omissão
dos bons. Enterrar o talento é contentar-se com o que já se tem,
não avançar para águas mais profundas (Lc 5,4), apenas fazer o
que está determinado, sem inovar. Significa acomodar-se, não
correr riscos. Onde está o erro em enterrar o talento? Quem en-
terra seu talento não fez nada de errado! Seu pecado é, justa-
mente, não fazer nada! É por não fazer nada que Jesus o chama
de mau e preguiçoso. Olhando para esse servo, podemos afirmar
que, diante de Jesus, para sermos aprovados como pessoas de
bem, não basta dizer “eu não matei nem roubei”.

Há também os que manifestam a ousadia de não contentar-se


com o que tem, de querer mais. Há risco nisso? Certamente!
Esses, porém, assim como os dois primeiros servos, têm cora-
gem de se arriscar.
Diante de Deus, no juízo, só terá as mãos limpas aquele
que, ante a necessidade de socorrer seu irmão, não “lavou as
mãos”.

2 «<http://ae.no-ip.org/ecclesiaout/dehonianos/800a/8
10acom33.htm>.

111
PNE - QV] - CVV nº 22
4. Ligando a Palavra com a ação eucarística
O trabalho (servir), que na liturgia da Palavra é tão elogia-
do e até mesmo apresentado como uma necessidade para a sal-
vação, nas orações deste domingo aparece como graça de Deus
(oração sobre as oferendas), fonte única da felicidade completa
(oração do dia) e como fruto da Eucaristia que celebramos: nos
faz crescer na caridade (oração depois da comunhão).
O pão e o vinho colocados sobre o altar constituem exem-
plos perfeitos do que são os talentos frutificados pelo trabalho
dos dois primeiros servos: dom e esforço. O pão e o vinho são
fruto da terra/videira (dom de Deus) e do trabalho humano. São
nossa vida: recebemos de Deus, mas construímos com o suor de
nosso rosto. Quando colocamos o pão e o vinho sobre o altar,
também ouvimos, como os dois servos, que receberemos muito
mais: eles serão o Corpo e o Sangue de Cristo.
Na Eucaristia, fazemos memória da morte e da ressurrei-
ção do Senhor. A morte e a ressurreição, e não somente a morte,
são consegiiência e coroamento de uma vida totalmente doada
pela vida de seu povo. Mas não é memória só da morte! Celebra-
mos também a ressurreição de Jesus como conseqiiência e
coroamento de uma vida totalmente doada pela vida de seu povo.
Na Eucaristia, fazemos a experiência de viver bem! Quem esco-
lhe viver não para si mesmo, mas para o bem do outro, encontra
a morte! Mas quem não morre”! Em Jesus aprendemos que vida
doada é vida que ressuscita para tornar-se eterna. Assim Jesus é
alimento para viver! Viver como Jesus viveu, viver para ressus-
citar, viver para a vida eterna. Isso é viver bem!

112
PNE - QV) - CVV nº 22
PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
O convite de Jesus é “vem participar da minha alegria!”,
não do seu velório. A missa (celebração) deve ser antecipação da
alegria eterna vivida, no céu, por todos aqueles que foram justifi-
cados. Desde agora, de forma sacramental, nós queremos partici-
par dessa festa. Não pode faltar alegria, nem na preparação, nem
na celebração, nem na vida, vivida em missão. Muitas pessoas
não se recordam do que foi dito na celebração, mas sempre lem-
bram como se sentiram. Que se sintam bem! Também os pecado-
res... Se esse não fosse o desejo de Deus, o céu seria um inferno!
Atenção! Não esquecer que o discurso escatológico de
Mateus é também Evangelho, Boa-Nova. Mais do que lembrar
que existe um lugar para os jogados fora, na escuridão, onde
haverá choro e ranger de dentes, a finalidade do discurso é apon-
tar um caminho seguro de salvação.

2. Sugestões para a celebração


* Fazer uma prece especial pela nossa pátria, lembrando
a data de 15 de novembro, aniversário da proclamação
da República.
* Valorizar o momento da preparação das ofertas — quem
sabe, em vez de simplesmente realizar a coleta, organi-
zar uma procissão, convidando cada um para que traga,
diante do Senhor, os frutos do seu trabalho. As comuni-
dades que hoje, no segundo domingo do mês, celebram
o Domingo do Dízimo podem ressaltar essa dimensão
do nosso dízimo: ele representa não simplesmente o que
é nosso, mas nossa gratidão por tudo o que consegui-

113
PNE - QV) - CVY nº 22
mos fazer frutificar com os talentos que recebemos de
Deus. Como os dois servos, também praticamos nossa
devolução.
Quem preside reze, em voz alta, as orações sobre as
ofertas. Nelas destaca-se que são fruto da terra (videi-
ra) e do trabalho humano (dom e trabalho), e se torna-
rão sacramento da nossa salvação.
Quais são os talentos deixados aos cuidados dos discí-
pulos de Jesus”? Fazer cartazes e preparar o mural para
lembrar esses dons no momento do ato penitencial (per-
dão porque nos omitimos e não cuidamos deles corre-
tamente).
Para a bênção final, sugerimos usar a do Sl 127(128).
É um dos cânticos das subidas, que os peregrinos entoa-
vam enquanto subiam para as festas de Jerusalém. A
partir dos 12 anos, Jesus deve tê-lo cantado todos os
anos, quando para lá subia para as festas. A parte final é
uma bênção dos sacerdotes, que certamente Jesus tam-
bém recebia. Pode ser assim formulada: “Que o Senhor
te abençoe de Sião cada dia de tua vida. Do trabalho de
tuas mãos hás de viver, serás feliz, tudo irá bem!”.

Escolher a Oração Eucarística para Diversas Circunstân-


cias III (“Jesus, caminho para o Pai”), na qual rezamos:
“Fazei que todos os membros da Igreja, à luz da fé, sai-
bam reconhecer os sinais dos tempos e empenhem-se, de
verdade, no serviço do Evangelho. Tornai-nos abertos e
disponíveis para todos, a fim de que possamos partilhar
as dores e as angústias, as alegrias e as esperanças, e an-
dar juntos no caminho do vosso Reino”.
No próximo domingo — Cristo Rei —, que cada um traga
para a missa/celebração alimentos não-perecíveis ou
roupas. “Tive fome... estive nu...”.

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FESTA DE CRISTO REI
20 de novembro de 2005

Leituras: Ezequiel 34,1-12.15-17; Salmo 22(23),1-2a.2b-3.5-6 (R/. 1);


1 Coríntios 15,20-26.28; Mateus 25,31-46 (O último julgamento)

“No entardecer de nossa vida, seremos


julgados pelo amor!”
(São João da Cruz)

1. Situando-nos brevemente

Um dia, Pilatos perguntou a Jesus: “És, portanto, rei?”.


Respondeu Jesus: “Sim, eu sou rei. E para dar testemunho da
verdade que nasci e vim ao mundo” (Jo 18,37).
Jesus afirmou que era rei. À Igreja sempre acreditou que
Jesus fosse rei. Mas somente em 1925 o papa Pio XI instituiu a
Solenidade de Cristo Rei. De início, celebrava-se Cristo Rei no
dia 31 de outubro. Mais tarde, com a reforma litúrgica do Concí-
lio Vaticano II, essa festa passou a ser comemorada para encer-
rar — e coroar — o Ano Litúrgico, um domingo antes do início do
Advento.
Essa festa é nossa alegria! Que hoje nosso coração se ale-
gre com a realeza de Cristo, o Salvador da humanidade. Que
essa salvação cresça em cada um de nós, para que cada vez mais
Cristo possa entregar ao Pai um Reino eterno e universal: “Rei-
no da verdade e da vida, Reino da santidade e da graça, Reino da

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justiça do amor e da paz” (Prefácio da Solenidade de Cristo Rei,
Missal Romano, p. 385).

Fim do ano litúrgico! Como foi nosso ano? Bom? Ruim?


No mundo, mede-se esse sucesso pelo crescimento econômico:
o PIB cresceu, as exportações, a colheita, a abertura de mais
uma filial, a troca de carro... Os critérios de Deus são diferentes,
porque ele é um rei diferente!
À nossa volta ainda há famintos, sedentos, estrangeiros, nus,
doentes e presos desatendidos em seu sofrimento? Então, ainda
não amamos o quanto deveríamos. Que o próximo ano seja me-
lhor... Não com mais “dinheiro no bolso”, mas com mais amor!

2. Recordando a Palavra

Ezequiel, de cujo livro foi extraída a primeira leitura, estava


junto com a primeira leva de deportados para a Babilônia, no ano
597 a.C. Foi no exílio que esse profeta exerceu seu profetismo.
Jerusalém caiu, e parecia que Deus tinha sido derrotado. No
exílio, longe de sua terra, sem o Templo, exposto à sedução da
fascinante cultura babilônica, o povo 1a perdendo a fé. A esses
exilados, Ezequiel anunciou a esperança: “Deus não nos abando-
nou nem nos esqueceu. Ele será nosso Salvador e Libertador”.
Para expressar isso, o profeta recorreu à imagem do pas-
tor: “O próprio Senhor virá e será Pastor de seu povo”. É uma
imagem muito expressiva! O pastor não abandona o rebanho na
hora do perigo. Antes, procura a ovelha perdida e reconduz a
que se extraviou. Enfaixa a perna quebrada e fortalece a ovelha
doente. Mas há também uma advertência ao rebanho. Esse Pas-
tor será juiz das ovelhas: vigiará a ovelha gorda e forte e fará
Justiça entre elas, a fim de que o direito das mais fracas perma-
neça diante das mais fortes.

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PNE - QV) - CVY nº 22
São Paulo vive em Corinto uma situação semelhante à de
Ezequiel no exílio. Nessa cidade, ele permaneceu dezoito me-
ses, entre os anos 50 e 52, durante sua segunda viagem
missionária. Não era um dos melhores lugares para se criar uma
comunidade cristã. O ambiente pagão que aí se respirava era
muito forte e sedutor. A nascente comunidade cristã até que era
muito fervorosa, mas ficava exposta demais aos atrativos de uma
cultura cujos valores estavam longe de ser cristãos. Quando es-
creveu para essa comunidade, são Paulo agiu como Ezequiel,
que procurava proteger um pequeno resto do povo de Deus, tam-
bém exposto aos perigos do ambiente em que se encontrava.
Aos coríntios, Paulo anunciou o reinado universal de Deus. Não
só as pessoas, mas todas as coisas serão renovadas em Cristo,
para que Deus seja tudo em todos.
O último ensinamento do Evangelho de Mateus é sobre o
juízo final. Jesus, como juiz, cumpre a profecia de Ezequiel, ao
separar “ovelhas e cabritos”. Usa o critério do amor aos irmãos.
Esse ensinamento é uma conclusão das três parábolas anterio-
res: a dos dois servos, o fiel e o infiel (Mt 24,45-51); a das dez
virgens (Mt 25,1-13); e a dos talentos (Mt 25,14-30).

As três parábolas apresentam dois grupos de pessoas que,


com atitudes distintas, esperam o retorno de Jesus: os vigilantes
e os “distraídos”. Na última parábola, aparece o fim de ambos os
grupos e fica explicada que “vigilância” significa viver o amor
para com os pobres, os pequenos, os excluídos. Amá-los é amar
o próprio Jesus; amá-los é a certeza de participação no reinado
de Cristo.

3. Atualizando a Palavra
A pergunta feita a Caim, no início da humanidade, retorna
nessa página do Evangelho: “Onde está o teu irmão?”. Se já na-
quele tempo a resposta de Caim não foi aceita, muito menos

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hoje podemos dizer: “Acaso sou guarda do meu irmão?”
(Gn 4,9). Por quê? Porque, uma vez que Jesus se identificou
com o sedento, com o nu, o faminto... servir o irmão é servir a
Deus. Não existe distinção entre esses dois serviços. “Não há
teologia da libertação sem o louvor de Deus, e nenhum louvor
de Deus sem a libertação dos oprimidos!”!
À participação no Reino de Cristo passa pelo amor miseri-
cordioso ao irmão menor que sofre. Viver o cristianismo é so-
correr o necessitado. O problema é que nós fazemos de Jesus um
rei poderoso no céu, para não identificá-lo com os pequenos na ter-
ra. Parece que, com Deus, preferimos ter uma relação de servos,
não de amigos e irmãos. Certamente, Jesus é o Kyrios, o Senhor,
Mas não podemos confundi-lo com os “senhores” deste mundo.
Jesus é um rei diferente. Não reina como os reis deste mundo.
* Então, em que consiste realmente essa diferença?
A diferença começa a aparecer quando Jesus decide viver
um messianismo diferente do que se esperava. Ele não anuncia-
va o reino de seu senhor ou de seu rei, mas o Reino de seu Pai!
“Nesse Reino Deus não é o senhor, mas o Pai misericordioso.
Nesse Reino não há servidores, mas apenas filhos de Deus, li-
vres. Nesse Reino não se pergunta pela obediência e submissão,
mas sim pelo amor e livre participação.””?
* Qual a imagem que temos de Jesus quando o festeja-
mos como Cristo Rei?
Uma das maiores traições da história é transformar Jesus,
que reinou do alto da cruz, num rei deste mundo. Jesus é um rei
diferente — sua coroa é de espinhos e seu trono, o madeiro.
Colocar Jesus em outro trono, com coroa de ouro, manto e cetro,

| MoLTMANN, Jiirgen. Trindade e Reino de Deus: uma contribuição para a Teo-


logia. Petrópolis, Vozes, 2000. p. 23.
2 Ibid,, p. 84.
118
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não seria o mesmo que pôr uma metralhadora nas mãos de
Ghandi”? Ou uma motosserra nas mãos de Lutzenberger? Detur-
pa-se e nega justo aquilo que morreram defendendo. O Reino de
Jesus não é deste mundo! Se fosse um reino, como são os deste
mundo, já outrora seus súditos teriam combatido para que Jesus
não fosse entregue aos judeus (Jo 18,36). Em nome do Rei que é
Jesus, pode-se morrer, mas nunca matar. Quando o tornamos um
rei como os outros reis, podemos pegar em armas para defendê-
lo contra quem o ameaça. No Reino de Jesus, a luta é contra o
mal, contra a opressão e a injustiça, contra a morte. Não contra
pessoas! Matando não se vence a morte.
e À diferença entre o reinado de Cristo e o dos outros reis
é a diferença entre o amor e o poder.
O Antigo Testamento destaca mais o poder de Deus. O
Novo Testamento, o amor. Ou melhor, deixa claro que é no amor,
e não na força, que reside o poder de Deus. No Novo Testamen-
to, um homem ou mulher de Deus é alguém que alimenta o fa-
minto, que veste o nu... que ama. Tudo isso porque Deus é amor
e onde existe amor, Deus aí está (cf. 1Jo 4,16). Não há diferença
entre o Cristo dos Evangelhos e o Cristo do juízo.
Em nossa pregação, por vezes, parece que um é o Jesus de
Nazaré, que entre nós espalhou e ensinou o amor, que nasceu,
viveu e morreu pequeno entre os pequenos. Outro é o Jesus do
juízo: forte, imparcial, justo. Dá a impressão que esquecemos
que, também como juiz, Jesus se identifica com os menores. Não
existe oposição entre o Jesus da Cruz e o Jesus do juízo, como se
a glória lhe subisse à cabeça de tal forma que agora ele não mais
se guiasse pela lógica do amor, mas do poder.
* No entardecer de nossas vidas, seremos julgados pelo
amor.
O Evangelho de hoje (último ensinamento de Jesus) é o
Evangelho das Bem-aventuranças (primeiro ensinamento de Je-

119
PNE - QV) - CVY nº 22
sus) para todos os que não são cristãos; ou, então, para todos
aqueles que, mesmo não professando nenhuma fé, também são
verdadeiros cristãos. Não é o que cremos ou deixamos de crer,
não é o que dizemos ou deixamos de dizer, não é o que rezamos
ou deixamos de rezar, não é o que temos ou deixamos de ter...
nada disso nos colocará à direita ou à esquerda de Jesus, mas
somente o amor exercido para com aqueles que necessitam de
nós. Assim podemos dizer com são João da Cruz: “No entardecer
de nossa vida seremos julgados pelo amor”! Pelo amor de Jesus,
pelo nosso amor!

4. Ligando a Palavra com a ação eucarística


Em cada celebração litúrgica já participamos da plenitude
desse Reino inaugurado por Jesus. Na liturgia, a Palavra nos re-
vela esse Reino, julga-nos, purifica-nos e nos incentiva para cons-
truir esse Reino agora. O “Pão da imortalidade” (oração após a
comunhão) nos sustenta nessa tarefa.
No Prefácio para a Solenidade de Cristo, Rei do Universo
estão muito bem elencados os valores desse Reino de Cristo: é
eterno e universal; Reino da verdade e da vida, da santidade e da
graça, da justiça, do amor e da paz. São os valores que nos con-
duzem ao banquete que Cristo nos preparou. “Vinde benditos do
meu Pai!”
O mistério de Cristo na Eucaristia ilumina o mistério de
Cristo no irmão. Nós que aprendemos a reconhecê-lo debaixo
das aparências do pão e do vinho, não podemos deixar de
identificá-lo e servi-lo no irmão necessitado.

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PNE - QV) - CVY nº 22
PREPARANDO A CELEBRAÇÃO

1. Sentido litúrgico
Celebramos hoje a soberania e o senhorio de Jesus Cristo.
Contemplamos a sua realeza não no poder e na dominação, mas
na doação de sua própria vida. Dele recebemos o mandamento
do serviço aos irmãos e irmãs, os mais pobres. Lembremos do
Documento de Puebla, especialmente os nn. 31 a 39, que falam
dos “rostos de Cristo hoje”.
Na Eucaristia, celebramos a Páscoa de Jesus Cristo que se
manifesta em todas as pessoas e grupos que se solidarizam e
servem aos famintos, aos presos e a todos os outros sofredores.

2. Sugestões para a celebração


e No início da celebração, enquanto se acende a vela, can-
tar: “Onde reina o amor, fraterno amor, Deus aí está”.

e Escolher bem os cantos para que todos estejam em


sintonia com a festa celebrada e cada momento da cele-
bração.
* Rezar o credo Niceno-constantinopolitano. Ele ressalta
e explicita a profissão de fé em Jesus. Acompanhar a
profissão de fé com um gesto, por exemplo, estenden-
do a mão em direção à cruz, ao Círio ou ao altar.
e Preparação das oferendas. Se, no domingo anterior, foi
pedido que se trouxessem ofertas de alimentos, de rou-
pas... organizar a procissão e depositá-las no local esco-
lhido. Enquanto isso, recordam-se as iniciativas pessoais
e comunitárias em favor dos pobres: creches, escolas,

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PNE - QV) - CVV nº 22
hortas comunitárias, mutirões etc. Tudo representa uma
“coroa” para o Cristo Rei que hoje celebramos.
* Reservar um momento para a divulgação e o convite ao
engajamento na Pastoral Social (Promoção Humana)
da comunidade.
e Antes da prece eucarística ou após a comunhão, cantar
o “Bendito”, sugerido por Marcelo Guimarães e Penha
Carpanedo, no subsídio Dia do Senhor, Tempo Comum,
Ano A. São Paulo, Paulinas e Apostolado Litúrgico,
pp. 288-289:

E bom cantar um bendito,


um canto novo, um louvor!
Pois Deus seu único Filho,
amado e querido,
rei consagrou.
Seu reino não é do mundo,
é muito profundo
e brota do amor.

Jesus não quis ser servido,


os pés dos amigos,
Cristo lavou.
Morrendo e ressuscitando,
aos céus se elevando,
a nós libertou!

Sentado ao lado do Pai,


o reino da paz
pra sempre firmou.

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PNE - QV) - CVWV nº 22
Jesus é o rei da verdade
e da liberdade,
arauto e Senhor.

De Cristo o reino é justiça,


e o canto da vida
eu canto co ardor.

À título de ilustração, transcrevemos uma história de Raoul


Follereau, um dos apóstolos modernos dos leprosos, citada por
frei Clarêncio Neotti, no seu livro Ministério da Palavra,
Petrópolis, Vozes, 2001, p. 215: “Escreveu R. Follereau: “So-
nhei que um homem se apresentava diante do Senhor, no juízo
final. Contente, ele apresentava as mãos e dizia: “Olha, Senhor,
observei a tua lei, nada fiz de desonesto, de mau, de impiedoso.
Senhor, as minhas mãos estão limpas!*. E o Senhor olhou para o
homem e disse: 'Sem dúvida, estão limpas, mas estão também
vazias!””.
Oração do Projeto Nacional
de Evangelização

Pai, /no início do Terceiro Milênio, / Queremos Ver


Jesus, Caminho, Verdade e Vida. / Dai-nos pela ação
do Espírito Santo /a graça de um encontro pessoal
com o Cristo Vivo, / presente na Igreja. / Sustentados
por esse encontro, / e pela intercessão materna de
Nossa Senhora Aparecida, / assumimos o compro-
misso missionário / de anunciar o Evangelho, / pro-
movendo cada pessoa, /na alegria plena de sua dig-
nidade, / renovando a comunidade / “para que todos
sejam um”, / e participando da construção de uma
sociedade justa e solidária / a caminho do Reino
definitivo. / Amém.

124
PNE - QV] - CVV nº 22
Sumário

Apresentação ............. rr seeeracreerereeaearenaranaaatra


eae rae ne aea cen aea nen ararenaarannaao

Introdução... irc reererrreererecoreeeaara narra canaaaa ares enaa near tan sena eaae ecran raaranaanaa

23º Domingo do Tempo Comum — 4 de setembro de 2005


(Ez 33,7-9; S1 94(95),1-2.6-7.8-9 (R/. 8); Rm 13,8-10; Mt 18,15-20)...............

24º Domingo do Tempo Comum — 11 de setembro de 2005


(Eclo 27,33-28,9:; S1 102(103),1-2.3-4.9-10.11-12 (R/. 8); Rm 14,7-9;
Mt 18,2135) e rrerertererrerenaraeneracrararaeacrass eae reanenaaaesernasaracanaana

25º Domingo do Tempo Comum — 18 de setembro de 2005


(Is 55,6-9; S1 144(145),2-3.8-9.17-18 (R/. 184); FI 1,20c-24.27a;
Mt20,1-168)......... re ernrenataeaaner arara ce aaatnaraeaenaranaena

26º Domingo do Tempo Comum — 25 de setembro de 2005


(Ez 18,25-28; SI 24(25),4bc-5.6-7.8-9 (R/. 6a); FI 2,1-11;, Mt 21,28-32)..........

27º Domingo do Tempo Comum — 2 de outubro de 2005


(Is 5,1-7; 81 79(80),9.12.13-14.15-16.19-20 (R'. Is 5,7a); FI 4,6-9;
Mt 21,33-43) ........ rir eerererrarrerane rear tanaerea ceara eonreereneranaaa

28º Domingo do Tempo Comum — 9 de outubro de 2005


(Is 25,6-10a; S1 22(23),1-3a.3b-4.5-6 (R/. 6cd); FI 4,12-14.19-20;
Mt22,1-14) ... si rrererareeraeacaeracraaeae
rea eacaner ana eacan aca sacana renaenesaarana

Solenidade de Nossa Senhora da Conceição Aparecida — 12 de outubro de 2005


(Est 5,1b-2; 7,2b-3; Sl 44(45),11-12a.12b-13.14-15a.15b-16 (R/. 11 e 129);
Ap 12,1.5.13.15-16a; Jo 2,41-11) ......... rea

29º Domingo do Tempo Comum — 16 de outubro de 2005


(Is 45,1.4-6; 51 95(96),1.2a.3.4-5.7-8.9-10a.c (R/. 7ab); ITs 1,1-5b;
Mt22,15-21) ..... re rerererererenaereaatanaaa
certa caninearacaanrana
30º Domingo do Tempo Comum — 23 de outubro de 2005
(Ex 22,20-26; Sl 17(18),2-3a.3bc-4.47.5lab (R/. 2); ITs 1,5c-10;
Mt 22,34-40) ...... eee reererereera crer eane cera eeerarrecereeeereererereenenrena 78

31º Domingo do Tempo Comum — 30 de outubro de 2005


(MI 1,14b-2,2b.8-10; SI 130(131),1.2.3; 1Ts 2,7b-9.13; Mt 23,1-12) ................. 85

Comemoração de todos os fiéis defuntos — 2 de novembro de 2005 .......................... 93

Solenidade de Todos os Santos — 32º Domingo do Tempo Comum —


6 de novembro de 2005
(Ap 7,2-4.9-14; 81 23(24),1-2.3-4ab.5-6 (R/. 16); 1Jo 3,1-3; Mt 5,1-12a) ........ 100

33º Domingo do Tempo Comum — 13 de novembro de 2005


(Pr 31,10-13.19-20.30-31; Sl 127(128),1-2.3.4-Sab (R/. 1a.); ITs 5,1-6;
Mt 25,14-30) e. eeeereereerereeeererereeereeereeeeereraerererraereereareseeneseeresneaes 107

Festa de Cristo Rei — 20 de novembro de 2005


(Ez 34,11-12.15-17; SI 22(23),1-2a.2b-3.5-6 (RJ. 1); 1Cor 15,20-26.28;
Mt 25,31-46) eee reereeeneraaerorrerenerrareanaareaersae
senna sa aaa nao cn casa ne sacas aneraseraaada 115

Oração do Projeto Nacional de Evangelização ............ciieeeereereseereeerererreres 124

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