Todos os anos, durante as férias, o Natal acontece com uma onda de compras
mega-frenética. Antes de prosseguir, deixe-me concluir a ação.fazer a mea culpa. Eu
admito. Sou um deles, a dessas uma compradoras de classe média que gasta quantias
ridículas em dinheiro para comprarcom presentes para outros destinatários da classe
média que realmente não precisam deles. No entanto, todo ano, eu me pego correndo
de um shopping para outro, tentando pensar em idéiasideias originais de presentes
que, de alguma forma, serão superiores ou, no mínimo, iguais às aos que dei no ano
passado.
Nenhum dos presentes impressionantes que compro, compro, compro são para
mim -– pelo menos não à primeira vista. Como outros compradores de férias, tudo o
que compro adquiro deve ser doado. Agora, antes de começarmos a nos dar um
tapinhas nas costas em aprovação de a nossa infinita generosidade, deixe-me lembrá-
lo de que, quando o Ano Novo chegar, minha pilha de presentes foi terá sido
substituída por uma nova pilha de presentes que outros compraram expressamente
para mim. Por um lado, os presentes que deixamos de lado voltam para nós através de
trocas altamente ritualizadas -– presentear e contra-presentear -– na confusão
comercial que chamamos de Natal. Então, por que enfrentar o problema de apenas
mudar as coisas de uma pessoa para a outra, ano após ano, em um ciclo interminável
de reciprocidade? A resposta é bastante simples: presentear é um ritual que consolida
laços entre amigos e familiares. Isso nos faz sentir É bom mNos faz bem mostrar às
pessoas que amamos o quanto nos importamos com elas. E, sim, me sintosinto-me
como uma criança de cinco anos quando abro meus presentes. É simplesmente
divertido.
Essa é uma das perguntas que inspirou o brilhante sociólogo francês Marcel
Mauss (1872-1950), que escreveu sobre isso em seu um ensaio seminal intitulado "O
presente: a forma e a razão do intercâmbio nas sociedades arcaicas", publicado em
1925. Quase um século atrás, Mauss mostrou que o que o presente faz -– a sua função
que ele serve -– é muito mais importante do que o presente em si. 1 Em queDe que
poder se reveste poder reside o objeto dado –, ele perguntou – , ao ponto de fazer
com que faz com que seu destinatário pagueo retribua.? Para responder a isso, ele se
aprofundou em casos históricos de solidariedade e nas relações sociais estabelecidas
em civilizações antigas e sociedades tribais.2 Isso não quer dizer que a própria
sociedade de Mauss não tivesse papel em sua trajetória intelectual; pelo contrário,
Mauss escreveu sobre o presente porque se inspirou nas rápidas mudanças que se
desenrolavam à sua volta na Europa do século XX. As desigualdades sociais e as
crises econômicas estavam aumentando, e o impulso para o individualismo, na
sequência da industrialização em massa, o levou-o a pensar sobre o papel da
solidariedade nos sistemas políticos e econômicos emergentes.
1
1 p. 4, tThe gift: the form and reason for exchange in archaic societies radução em inglês de seu livro
O presente: a forma e a razão da troca nas sociedades arcaicas (1923, p. 4), sem tradução para o
português..
2
Particularmente da Polinésia, da Melanésia, e do Noroeste do Canadá e dos Estados Unidos, e
em várias civilizações (escandinava, babilônica, romana, germânica e indiana).
O Potlatch: um "“serviço total"”
DEntre as várias práticas de presentear que Mauss descreveu, o potlatch
capturou a imaginação de gerações de leitores e veio a resumir a essência de seu
livro. O potlatch é uma complexa cerimônia de entrega de presentes
institucionalizada por algumas comunidades nativas americanas ao longo da costa
canadense e americana do Noroeste do Pacífico. Embora existissem variedades na
maneira em com que os potlatches eram estruturados, Mauss retirou-seextraiu da
ideia geral do potlatch e destacou uma característica comum: as festas cerimoniais
competitivas de presentear e contra-presentear, que ocorreram ocorriam no âmbito da
hospitalidade e da rivalidade. Em casos extremos, a rivalidade entre tribos opostas
levou ao combate, à violência e até à morte. Vamos chamar esta categoria mais
dramática de potlatches de "“extrema entrega de presentes".”.
3
3 RISDALE, Frank. 1997. Uma discussão sobre o potlatch e a estrutura social., TOTEM: The
University of Western Ontario Journal of Anthropology, vol. 3, edição n. 2, artigo 3, 1997..
Mauss usou as informações coletadas por outros estudiosos para reunir sua
análise do potlatch. Ele consultou documentos escritos por pessoas que
testemunharam em primeira mão como as tribos mencionadas em The gift
costumavam viver. Essas Esses contas relatos foram coletadas coletados, em grande
parte, do final do século XIX até o início do século XX, quando a interferência
colonial e o domínio europeu sobre as populações nativas começaram a sofrer
produzir mudanças importantes no sistema de potlatch. O presenteThe gift foi escrito
em um momento de enorme transformação e perda cultural para essas comunidades.
Para as autoridades canadenses, o potlatch representou um dos obstáculos mais
importantes à tentativa de para matar as culturas nativas e "“tirar o índio do índio".4
”.5 Em sua tentativaCom o intento de "“civilizar" ” a população indígena do Canadá,
o governo proibiu o potlatch entre 1884 e 1951, tornando-se-o uma ofensa
legalilegal. A destruição de objetos valiosos como o cobre apenas reforçou seu
objetivo de matar o potlatch trinco de uma vez por todas. As autoridades não
conseguiram entender o ato de se livrar deliberadamente da riqueza material de uma
pessoa através de sua aniquilação. Isso contrariou contrariava a própria idéiaideia da
sociedade capitalista que os euro-americanos estavam tão interessados em construir.
Em nossa sociedade, obtém-se sucesso e fortuna através da acumulação, e não da
distribuição de riqueza. O potlatch representa o oposto polar. Agora, para aqueles de
nós ansiosos demais para evocar a idéiaideia cansada e romântica do ““selvagem
nobre” ”, altruísta e altruísta abnegado, que realmente trata de paz e partilha, Mauss
ofereceu um poderoso antídoto. Parece que o objetivo de doar riqueza era ganhar
mais na forma de honra, poder e prestígio. Mais uma vez, Mauss mostrou que dar
presentes é realmente um sistema de troca, e que presentear não é um ato aleatório de
bondade, mesmo no caso do potlatch.
Mais uma vez, como no potlatch, Mauss aplicou se valeu do princípio do kula
para desvendar a idéiaideia de um contrato no que diz respeito à oferta de presentes.
O contrato do presente vai contra nossa suposição geral de que o ato de dar
presentespresentear é um ato voluntário, divorciado de interesse, reciprocidade e
expectativas. Os exemplos do kula e do potlatch nos mostram que o que parece ser
um dom à primeira vista um presente, na sua forma mais pura, ou seja, sem
necessidade de amarrascontrapartidas, está realmente ligado a interesses e obrigações
que regulam a vida espiritual, a economia, o parentesco e as alianças políticas entre
doador e receptor.
Como Malinowski, que aplicou o exemplo dos kula para demonstrar que os
nativos eram realmente seres de pensamento racional, o estudo de Mauss sobre o
presente ofereceu um comentário sobre aum contraponto à ideologia capitalista da
riqueza através da acumulação, apresentando tanto o potlatch quanto o kula como
uma alternativas ao mercado capitalista. Nas sociedades ocidentais, consideramos que
obter mais, mais, e mais se traduz em riqueza e sucesso. Para as comunidades nativas
que praticavam o potlatch, a riqueza era traduzida no valor e no prestígio do que se
doava ou do que se dava através da destruição. Fazer isso foi era um reflexo direto do
valor,r e do prestígio e da posição social da pessoa doadora. valor e posição social.
Ao contrário da lógica do mercado capitalista, os bens trocados na economia de
presentes não eram para maximizar o lucro econômico e material.
9
7 Pp 84, Rússia RUS, 2008, p. 84.
Vamos recuperar a proibição do potlatch por um minuto. É bastante seguro
dizer que a prática de destruir bens valiosos, particularmente cobre, vai contra todas
as fibras do nosso ethos hiper-consumidor. Se dermos uma olhada mais de perto no
nosso próprio carnaval de presentes de Natal, não é difícil ver como as despesas de
milhares e milhares de dólares a cada ano são, bem, meio tolas. Não estou levantando
esse ponto para sugerir que devemos parar de nos presentear ou de mostrar apreço
por aàqueles que amamos por meio de presentes. O que estou apontando, no entanto,
é que a maneira como fazemos isso é através do comercialismo, e que isso é um
sintoma das sociedades baseadas no consumo em que vivemos. É claro que existem
alternativas às práticas canônicas de presentear status quo, ainda mas nenhuma deles
delas ainda se tornou popular. Por um lado, poderíamos fazer nossos próprios
presentes, mas, novamente, quem em sã consciência faria isso? Imagine ter que fazer
presentes sempre que seu filho tiverteve uma festa de aniversário para ir! Apenas o
pensamento é suficiente para fazer uma mãe que trabalha enlouquecer. Outra opção
seria re-passar presentes, o que traz o risco de recebermos a pecha para que não
sejamos rotulados comode "“re-presentarepassadores", ”, como no episódio de
Seinfeld, no qual em que Jerry recebeu um uma máquina de etiquetas rótulo do
dentista Tim Whately, apenas para descobrir que Elaine havia originalmente dado a
Tim esse mesmo presente. O passeio de Tim como um repassador de p-presenteador s
que reciclou o criadora máquina de etiquetas foi tudo menos um elogio.