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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS


CURSO DE DIREITO

PRINCIPAIS CONSEQUËNCIAS JURÍDICAS ACERCA DO


DESVIRTUAMENTO DOS CONTRATOS DE FACTORING NO
BRASIL

GUILHERME KRIEGER

Itajaí, Junho/2008
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO

PRINCIPAIS CONSEQUËNCIAS JURÍDICAS ACERCA DO


DESVIRTUAMENTO DOS CONTRATOS DE FACTORING NO
BRASIL

GUILHERME KRIEGER

Monografia submetida à Universidade


do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Doutor Diego Richard Ronconi

Itajaí, Junho/2008
AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus por me dar a


vida, uma família maravilhosa, e a possibilidade
de concluir este curso.
Agradeço aos meus pais, que foram
imprescindíveis em todos os momentos da minha
vida, em especial, durante curso desta
universidade, pois estiveram ao meu lado, me
apoiando, me incentivando, incondicionalmente.
Agradeço finalmente ao meu orientador, Prof.
Diego, que me conduziu durante a produção
deste trabalho, com muita eficiência, paciência e
dedicação.
DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, que são


fundamentais em minha existência, formaram
meu caráter, e, que se cheguei até aqui, foi por
dedicação, sacrifício e incentivo deles.
Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado
algumas vezes, mas não esqueço que a minha
vida é a maior empresa do mundo.
E que posso evitar que ela vá à falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver,
apesar de todos os desafios, incompreensões e
períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e
se tornar autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz
de encontrar um oásis no recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre
da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.
É saber falar de si mesmo.
É ter coragem para ouvir um "não".
É ter segurança para receber uma crítica, mesmo
que injusta.
Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou
construir um castelo.

Fernando Pessoa
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, Junho/2008

Guilherme Krieger
Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale


do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Guilherme Krieger, sob o título As
Principais Conseqüências Jurídicas Acerca do Desvirtuamento do Contrato de
Factoring no Brasil, foi submetida em 11/06/2008 à banca examinadora composta
pelos seguintes professores: __________________________________ e
aprovada com a nota ______________.

Itajaí, Junho/2008

Professor Doutor Diego Richard Ronconi


Orientador e Presidente da Banca
ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à


compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Contrato

Contrato é o negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas


pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos
patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias
vontades. 1

Deságio

Deságio consiste na contraprestação de compra de direitos creditórios e a


prestação de serviços prestada por empresas de factoring, sendo estes, a gestão
do crédito, cadastro de compradores, seleção de riscos, eliminação de maus
pagadores, e assessoria financeira nos custos operacionais, na contabilidade, no
cadastramento de fregueses, nas contas a pagar, na cobrança, além de outras
atividades.2

Factoring

Na legislação brasileira vigente, factoring, é a prestação cumulativa e contínua de


serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção de
riscos, administração de contas a pagar e a receber, compra de direitos
creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços. 3

1
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p. 11.
2
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 136.
3 BRASIL, Lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995. artigo 15, §1º, III, d.
Instituição Financeira

Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as


pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou
acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios
ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de
propriedade de terceiros. 4

Juros

Juros consiste no rendimento do capital pelo espaço de tempo compreendido


desde o pagamento até a data do recebimento do valor do título. 5

Negócio Jurídico

Negócio jurídico constitui todo o ato lícito, que tenha por fim imediato adquirir,
resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos. 6

4 BRASIL, Lei 4.595 de 31 de dezembro de 1964, artigo 17.


5
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 136.
6
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
p. 331.
x

SUMÁRIO

RESUMO ..........................................................................................XII

INTRODUÇÃO .................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ....................................................................................... 4

NOÇÕES GERAIS ACERCA DOS CONTRATOS NO BRASIL.......... 4


1.1 BREVE HISTÓRICO ACERCA DOS CONTRATOS........................................ 4
1.2 CONTRATO COMO "NEGÓCIO JURÍDICO".: REQUISITOS DO NEGÓCIO
JURÍDICO .............................................................................................................. 6
1.3 CONCEITO DE CONTRATO ......................................................................... 11
1.4 ALGUNS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS........................................................ 12
1.4.1 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DE VONTADE ....................................................................... 12
1.4.2 PRINCÍPIO DA SUPREMACIA DA ORDEM PÚBLICA......................................................... 13
1.4.3 PRINCÍPIO DA CONSENSUALISMO..................................................................................... 13
1.4.4 PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE DOS EFEITOS DOS CONTRATOS .................................. 14
1.4.5 PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO ............................................................. 15
1.4.6 PRINCÍPIO DA BOA FÉ OBJETIVA ...................................................................................... 17
1.5 EXTINÇÃO DOS CONTRATOS: DISTINÇÃO ENTRE RESOLUÇÃO,
RESILIÇÃO E RESCISÃO CONTRATUAL ......................................................... 18

CAPÍTULO 2 ..................................................................................... 21

CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS CONTRATOS DE FACTORING


NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ............................... 21
2.1 BREVE HISTÓRICO ACERCA DOS CONTRATOS DE FACTORING (OU
FATURIZAÇÃO) NO BRASIL............................................................................. 21
2.2 CONCEITO DE CONTRATO DE FACTORING ............................................. 22
2.3 ESPÉCIES DE FATURIZAÇÃO..................................................................... 24
2.3.1 COLLECTION TYPE FACTORING AGREEMENT ................................................................ 24
2.3.2 IMPORT-EXPORT FACTORING ............................................................................................ 25
2.3.3 INTERCREDIT......................................................................................................................... 26
2.3.4 OPEN FACTORING ................................................................................................................ 26
2.3.5 CONVENTIONAL FACTORING ............................................................................................. 27
2.3.6 MATURITY FACTORING........................................................................................................ 28
2.4 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA REGULAMENTADORA DO FACTORING NO
BRASIL ................................................................................................................ 29
2.5 OPERAÇÕES BANCÁRIAS X OPERAÇÕES DE FACTORING: DISTINÇÕES
............................................................................................................................. 34
2.6 EXTINÇÃO DO FACTORING ........................................................................ 37

CAPÍTULO 3 .................................................................................... 38

O DESVIRTUAMENTO DOS CONTRATOS DE FACTORING E


SUAS CONSEQUÊNCIAS ............................................................... 38
xi

3.1 OS ATOS PERMITIDOS ÀS FACTORINGS NO BRASIL............................. 38


3.2 O DESVIRTUAMENTO (SIMULAÇÃO) DOS CONTRATOS DE FACTORING
NA REALIZAÇÃO DE ADIANTAMENTOS (EMPRÉSTIMOS), POR SE TRATAR
DE OPERAÇÃO PRIVATIVA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ......................... 39
3.3 CONSEQÜÊNCIAS DA IDENTIFICAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS EM
CONTRATOS DE FACTORING .......................................................................... 44
3.3.1 A DESCONSTITUIÇÃO DE GARANTIAS (REAIS E FIDEIJUSSÓRIAS) EM FUNÇÃO DE
CONTRATOS DE MÚTUO REALIZADOS POR EMPRESAS DE FACTORING ........................... 46
3.3.2 A INVERSÃO DO ÔNUS DA P AUTORIZADA PELOAS ARTS. 1º E 3º DA MP Nº 2.172-32,
QUE TRATA DA NULIDADE DOS ATOS DE USURA PECUNIÁRIA ........................................... 47
3.4 SANÇÕES PREVISTAS EM LEI PARA QUEM ATUAR COMO INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA SEM AUTORIZAÇÃO DO BANCO CENTRAL E COBRAR JUROS
ACIMA DO PERMITIDO LEGALMENTE............................................................. 48
3.5 A JURISPRUDÊNCIA CATARINENTE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA ACERCA DO DESVIRTUAMENTO DAS OPERAÇÕES DE
FACTORING ........................................................................................................ 51

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................. 58

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS........................................... 59


xii

RESUMO

O contrato de factoring tem sua origem nos EUA, tendo se


expandido na Europa a partir da década de 60, pelo enorme incremento de
crédito nas relações comerciais e industriais, com a necessidade de administrar a
sua concessão. Conforme artigo15, §1º, III, d da Lei 9.249 de 26 de dezembro de
1995, a legislação brasileira vigente conceitua factoring como sendo: prestação
cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão
de crédito, seleção de riscos, administração de contas a pagar e a receber,
compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de
prestação de serviços. Existe uma grande distinção entre instituições financeiras e
factorings, sendo que as empresas de factorings não podem atuar como
instituições financeiras e, se desenvolverem tal atividade, estarão sujeitas às
sanções previstas em lei.
INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto o estudo do


contrato de factoring no Brasil.

O seu objetivo geral é investigar quais as atividades


permitidas as factorings no Brasil, sendo o objetivo específico identificar qual
responsabilidade das empresas de factoring que desvirtuam sua atividade
permitida legalmente, bem como, aprofundar os conhecimentos do autor deste
trabalho sobre o tema proposto, e, alertar a Sociedade quanto aos abusos
praticados por empresas que estão travestidas como factoring, mas que, não
cumprem o estabelecido na legislação vigente, pois, praticam atos exclusivos às
instituições financeiras, estando assim sujeitas as sanções legais.

Para o estudo do tema, foram formulados os seguintes


problemas:

ü Podem as empresas de factoring praticar as mesmas funções que


as instituições financeiras, principalmente quanto a adiantamentos ou
antecipações de faturamentos ou ainda desconto de duplicatas?

ü Quais as responsabilidades inerentes as companhias de factoring


sobre o juros remuneratórios cobrados em suas operações?

ü Existem sanções penais para factorings que praticam atos


exclusivos de instituições financeiras?

Dessa forma, principia–se, no Capítulo 1, tratando de


apresentar um breve histórico sobre os contratos, levantando o conceito de
negócio jurídico,conceito de contrato, alguns princípios contratuais e formas de
extinção.

O Capítulo 2, aborda inicialmente, um breve histórico


sobre os contratos de factoring, o conceito destes, algumas espécies de
faturização, a legislação brasileira regulamentadora do factoring, as distinções
2

entre operações bancárias e operações de factoring, e, finalmente as formas de


extinção desta modalidade contratual.

No Capítulo 3, tratando de identificar, os atos permitidos


as factorings no Brasil, as conseqüências jurídicas do desvirtuamento das
atividades destas quando atuam numa seara exclusiva de instituições financeiras,
as sanções previstas para quem pratica tal ato, finalizando este trabalho com a
apresentação de jurisprudência sobre o estudo feito nesta monografia.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as


Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre as conseqüências jurídicas acerca do desvirtuamento da conduta de
empresas de factoring.

Para a presente monografia foram levantadas as


seguintes hipóteses:

ü As empresas de factoring não podem praticar descontos de


duplicatas nem antecipações de faturamentos, pois estes atos são
exclusivos de instituições financeiras.

ü As responsabilidades inerentes às companhias de factoring e


bancos sobre os juros remuneratórios cobrados em suas operações os
quais são mensurados conforme o risco da operação e assim as
factorings e bancos assumem todo o risco da operação e dos títulos
comprados ou do faturamento adiantado, não tendo seus vendedores
qualquer responsabilidade sobre este.

ü Existem sanções penais para empresas que atuam como se fossem


instituições financeiras, cometendo estas, crime contra o sistema
financeiro nacional.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na


Fase de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de
Dados o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
3

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as


Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica
CAPÍTULO 1

NOÇÕES GERAIS ACERCA DOS CONTRATOS NO BRASIL

1.1. BREVE HISTÓRICO ACERCA DOS CONTRATOS

Quanto a origem histórica dos contratos, não se pode


distinguir um momento específico para o surgimento dos contratos, segundo
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, o que podemos tentar, sim, é
buscar um período em que sua sistematização jurídica se tornou mais nítida, mais
detectável pelo estudioso do direito ou pelo investigador da história7.

No antigo Egito existiam formas rudimentares de


contratos, uns disciplinando o casamento para fins de filiação, outros, para
transferência de propriedade que se completava em três atos, conforme Rizzardo:

Através do primeiro, denominado ‘ato para o dinheiro’,


realizava-se o acordo, entre o vendedor e o comprador,
sobre o objeto a ser vendido, com a sua designação; sobre o
preço o pagamento e a forma de completá-lo em
determinado tempo; e sobre a declaração do vendedor de
entregar em tempo prefixado o título de propriedade. Esta
era a etapa mais importante. Quanto ao juramento, tinha
caráter essencialmente religioso, firmando-o em parte,
perante sacerdote e o comprador. 8

No Direito Romano havia distinções entre pacto,


contrato e convenção, de acordo com Venosa:

convenção e pacto eram conceitos equivalentes e


significavam o acordo de duas ou mais pessoas a respeito
de um objeto determinado. O simples acordo, convenção ou
pacto, porém, não bastava para criar uma obrigação
juridicamente exigível. O simples pacto não criava obrigação.

7
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p 2.
8
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 8.
5

Essa noção, que vem do Direito clássico, atinge a época do


Justiniano. Para que se criasse uma obrigação, havia a
necessidade de certas formas que se exteriorizassem à vista
dos interessados. A solenidade dava forças às convenções.
Cada uma dessas convenções, sob certas formalidades
constituíam um contractus. Não conhecia, portanto, o Direito
Romano uma categoria geral de contrato, mas somente
alguns contratos em particular. 9

A vontade como elemento subjetivo apenas veio a ser


conhecida na época de Justiniano, que unificou o conceito de contrato com o de
convenção, ou seja, naquele momento histórico não mais se fazia necessária as
solenidades para a validação de um contrato, qualquer convenção poderia tornar-
se obrigatória, se revestida das formalidades legais.

Após esta fase histórica se tem o Código de Napoleão,


que, com a Revolução Francesa trouxe grande contribuição ao direito dos
contratos, pois nesta época a exemplo do direito romano se considerava a
convenção como um gênero o qual o contrato era uma espécie. Sendo que o
referido diploma disciplinou o contrato como mero instrumento para a aquisição
da propriedade. O acordo de vontades representava, em realidade, uma garantia
para os burgueses e para as classes proprietárias.10

Roberto de Ruggiero afirma que tudo se modificou no


direito moderno, pois qualquer acordo entre duas ou mais pessoas, que tenha por
objeto uma relação jurídica, pode ser indiferentemente chamado de contrato ou
convenção e as vezes pacto, visto que este termo ter perdido aquele significado
técnico e rigoroso que lhe atribuía a linguagem jurídica romana. 11

Atualmente os termos pacto, contrato, e convenção tem


no Direito Brasileiro, significados semelhantes, tendo perdido o conceito técnico a
cada dos termos como se tinha no direito romano.

9
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
7. ed. São Paulo : Atlas, 2007. p. 334.
10
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p 3.
11
RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito civil. 3. ed. Trad. De Ary dos Santos. São
Paulo: Saraiva, 1973. v. III. p. 185-188.
6

Em razão do desenvolvimento econômico, tecnológico


e industrial os contratos no Direito Brasileiro atual, modificaram-se sensivelmente,
pois, o princípio da igualdade formal entre as partes contratantes – baluarte da
teoria clássica contratual e que sempre serviu de lastro à regra (até então
absoluta) do pacta sunt servanda – começou a enfraquecer, descortinando falhas
no sistema social, e, sobretudo, afigurando-se, em muitos casos, como uma regra
flagrantemente injusta.12

Ainda, a economia de massa exige contratos


impessoais e padronizados, que não mais se coadunam com o princípio da
autonomia de vontade. O Estado intervêm, constantemente, na relação contratual
privada, para assegurar a supremacia da ordem pública, relegando o
individualismo a um plano secundário.13

1.2. CONTRATO COMO “NEGÓCIO JURÍDICO”: REQUISITOS DO NEGÓCIO


JURÍDICO

Quando a manifestação de vontade tem o objetivo de


gerar efeitos jurídicos, dá-se o negócio jurídico, segundo Venosa, toda e qualquer
manifestação de vontade com o objetivo de que estas gerem efeitos jurídicos,
constituem negócio jurídico, ou seja, quando o homem usa de sua manifestação
de vontade com a intenção precípua de gerar efeitos jurídicos, a expressão dessa
vontade constitui-se num negócio jurídico.14

Venosa ainda conceitua negócio jurídico como: todo o


ato lícito, que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou

12
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p 6.
13
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 4
14
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
7. ed. São Paulo : Atlas, 2007. p. 331.
7

extinguir direitos.15 O Código Civil Brasileiro define as regras para validade do


negócio jurídico em seu artigo 104 e seguintes.

Os requisitos para validade dos contratos podem ser


classificados em duas espécies, os de ordem geral e de ordem especial. De
ordem geral são aqueles indispensáveis para que sejam válidos todos os atos e
negócios jurídicos, sendo firmado por pessoa capaz, com objeto lícito, possível,
determinado ou determinável. O requisito de ordem especial se satisfaz pelo
consentimento recíproco do acordo de vontades das partes contratantes. Tais
requisitos estão previstos no artigo 104 do Código Civil: 16

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:


I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.

Conforme Gonçalves, os requisitos de validade do


contrato podem, ser distribuídos em três grupos: subjetivos, objetivos e formais.17

Os requisitos subjetivos consistem na manifestação de


duas ou mais pessoas e vontades, sendo estas pessoas capazes e com aptidão
para contratar, bem como consentimento. 18

A capacidade da pessoa física contratar consiste na


possibilidade jurídica dos agentes de firmarem contrato, ou seja, se for um dos
contratantes, incapaz absoluto ou relativo, pode ser o contrato nulo ou anulável,
conforme prevêem os artigos 166, I e, 171, I: 19

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


I – celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
15
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
p. 331.
16
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 13
17
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 13
18
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 13
19
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 13
8

(...)
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é
anulável o negócio jurídico:
I – por incapacidade relativa do agente;

Como acima exposto, tal capacidade de agir nada mais


é do que a maioridade, e o discernimento para contratar.

Quanto às pessoas jurídicas, a capacidade destas é


manifestada por seus representantes, que autorizados por estatuto, contrato
social ou procuração podem firmar contrato. 20

A aptidão específica para contratar conforme


Gonçalves:

Além da capacidade geral, exige a lei a especial para


contratar. Algumas vezes, para celebrar certos contratos,
requer-se uma capacidade especial, mais intensa que o
normal, como ocorre na doação, na transação, na alienação
onerosa, que exigem a capacidade ou poder de disposição
das coisas ou dos direitos que são objeto do contrato. Outras
vezes, embora o agente não seja um incapaz,
genericamente, deve exibir a outorga uxória ou o
consentimento dos descendentes e do cônjuge do
alienante.21

Quanto ao consentimento para contratar, este deve ser


espontâneo e livre, podendo ser sua validade questionada pelos vícios do negócio
jurídico, sendo estes o erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude,
conforme prevê o artigo 171, inciso II do Código Civil. 22

20
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 13
21
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 14.
22
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 13.
9

Os requisitos objetivos têm como preceito o objeto do


contrato, devendo ser este, possível determinado ou determinável, conforme
determina o artigo 104, inciso II do Código Civil. 23

Gonçalves conceitua objeto lícito como sendo o que


não atenta contra a lei, moral ou os bons costumes. Objeto imediato do negócio é
sempre uma conduta humana e se denomina prestação: dar, fazer ou não fazer.
Já o objeto mediato, são os bens ou prestações sobre os quais incide a relação
jurídica obrigacional. 24

A possibilidade física ou jurídica do objeto deve ser,


também possível. Quando impossível, o negócio é nulo (CC, art. 166, II). A
impossibilidade do objeto pode ser física ou jurídica. Impossibilidade física é a que
emana das leis físicas ou naturais. Deve ser absoluta, isto é alcançar a todos,
indistintamente, como, por exemplo, a que impede o cumprimento da obrigação
de tocar a Lua com a ponta dos dedos, sem tirar os pés da Terra. A relativa, que
atinge o devedor mas não outras pessoas, não constitui obstáculo ao negócio
jurídico, como proclama o art. 106 do Código Civil. Ocorre impossibilidade jurídica
do objeto quando o ordenamento jurídico proíbe, expressamente, negócios a
respeito de determinado bem, como a herança de pessoa viva (CC, art. 426), de
alguns bens fora do comércio, como os gravados com cláusula de inalienabilidade
etc. A ilicitude do objeto é mais ampla, pois abrange os contrários à moral e aos
bons costumes. 25

Ainda, a determinação do objeto do negócio jurídico


deve ser, igualmente, determinado ou determinável. Admite-se, assim, a venda de
coisa incerta, indicada ao menos pelo gênero e pela quantidade (CC, art. 243),
que será determinada pela escolha, bem como pela venda alternativa, cuja
indeterminação cessa com a concentração (CC, art. 252). Embora não

23
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 13.
24
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais p. 16.
25
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 16.
10

mencionado expressamente na lei, a doutrina exige outro requisito objetivo de


validade de contratos: o objeto do contrato deve ter algum valor econômico.26

Destarte, como visto, o objeto do contrato deve ser


lícito, possível, determinado ou determinável, pois, se este, não atender tais
requisitos é nulo ou anulável, não tendo valor jurídico.

E, finalmente, os requisitos formais, esta terceira


condição de validade do negócio jurídico é a forma (forma dat esse rei, ou seja, a
forma dá ser às coisas), que é o meio de revelação da vontade.27

No direito brasileiro a forma é, em regra, livre. As partes


podem celebrar o contrato por escrito, público ou particular, ou verbalmente, a
não ser nos casos em que a lei, para dar maior segurança e seriedade ao negócio
exija a forma escrita, pública ou particular.28

Gonçalves divide os requisitos formais em três, sendo


estes:

a) Forma livre – É a predominante no direito brasileiro (CC,


art. 107). É qualquer meio de manifestação de vontade, não
imposto obrigatoriamente pela lei (palavra escrita ou falada,
escrito público ou particular, gestos, mímicas, etc.).29

b) Forma especial ou solene – É a exigida pela lei, como


requisito de validade de determinados negócios jurídicos. Em
regra, a exigência de que o ato seja praticado com
observância de determinada solenidade tem por finalidade
assegurar a autenticidade dos negócios, garantir a livre
manifestação da vontade, demonstrar a seriedade do ato e
facilitar a sua prova.30

26
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 17.
27
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 17.
28
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 18.
29
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 18.
30
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 19.
11

c) Forma contratual – É a convencionada pelas partes. O art.


109 do Código Civil dispõe que, “no negócio jurídico
celebrado com a cláusula de não valer sem instrumento
público, este é da substância do ato”. Os contratantes
podem, portanto, mediante convenção, determinar que o
instrumento público torne-se necessário para a validade do
negócio.31

Dessa forma, estão caracterizados os requisitos do


negócio jurídico, sendo que, para que os contratos tenham validade no mundo
jurídico, estes têm que cumprir as exigências acima citadas, para estarem
revestidos de juridicidade.

Como visto, o negócio jurídico como contrato tem uma


série de requisitos para que seja válido, será visto em seguida o conceito de
contrato, bem como alguns de seus princípios basilares.

1.3. CONCEITO DE CONTRATO

O contrato consiste na principal ferramenta do direito


para que as partes firmem suas declarações de vontade e tenham obrigações e
direitos entre si. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho conceituam
contrato como um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes,
limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os
efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas
próprias vontades.32

Conforme Caio Mário da Silva Pereira o fundamento


ético do contrato é a vontade humana, desde que atue na conformidade da ordem
jurídica. Seu habitat é a ordem legal. Seu efeito, a criação de direitos e de
obrigações. O contrato é, pois, um acordo de vontades, na conformidade da lei, e
com a finalidade de adquirir e resguardar, transferir, conservar, modificar ou

31
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006.p. 19.
32
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p. 11.
12

extinguir direitos, ou, sinteticamente, um acordo de vontades com a finalidade de


produzir efeitos jurídicos. 33

Rizzardo concebe contrato como sendo a bilateralidade


do ato jurídico; exige-se o consentimento válido, emanado das vontades livres;
pressupõe a conformidade com a ordem legal; e tem por escopo objetivos
específicos, ou seja, a produção de direitos.34

1.4. ALGUNS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS

1.4.1. Princípio da autonomia da vontade

O princípio da autonomia de vontade compõe um dos


princípios basilares que regem os contratos, como destacam Pablo Stolze
Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, não se pode falar em contrato sem
autonomia de vontade35. O princípio da autonomia de vontade tem como principal
preceito a liberdade contratual, ou seja, contratar ou não, sem qualquer
interferência do Estado, Gonçalves ensina que:

O princípio da autonomia da vontade se alicerça exatamente


na ampla liberdade contratual, no poder dos contratantes de
disciplinar os seus interesses mediante acordo de vontades,
suscitando efeitos tutelados pela ordem jurídica. Têm as
partes a faculdade de celebrar ou não contratos, sem
qualquer interferência do Estado.36

A liberdade contratual está prevista no artigo 421 do


Código Civil Brasileiro, (C.C., art. 421. A liberdade de contratar será exercida em
razão e nos limites da função social do contrato.).

33
SILVA PEREIRA, Caio Mário. Instituições de direito civil. 11. ed. atual. por Regis Fichtner :
Rio de Janeiro: Forense, 2003. v. III. p. 7.
34
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 6.
35
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p. 33.
36
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 20.
13

Dessa forma, se tem como princípio da autonomia de


vontade, a liberdade contratual de contratar ou não, bem como a faculdade de
estipular preceitos entre as partes contratantes, sem a interferência do Estado,
sendo sempre observados os requisitos do negócio jurídico e a função social do
contrato.

1.4.2. Princípio da Supremacia da ordem pública

Conforme ventilado no subtítulo anterior, o princípio da


autonomia de vontade está vinculado à função social do contrato, esta para que
seja atendida na sua totalidade é passível de interferência do Estado, constituindo
assim a Supremacia da ordem pública, conforme Rizzardo:

Embora a regra mais importante seja a autonomia de


vontade, há várias restrições impostas por leis de interesse
social, impedindo as estipulações contrárias à moral, à
ordem pública e aos bons costumes, as quais ficam
subjugadas à vontade das partes.37

Tal princípio tem como principal objetivo a garantia que


o contrato contemple a função social, ou seja, que a lei está acima dos contratos,
e, que as partes contratantes não podem estipular regras entre elas que
ultrapassem o estipulado em lei, como por exemplo, o contrato de factoring que
transpõe os limites legais, tema este que será abordado no terceiro capítulo.

1.4.3. Princípio do consensualismo

O princípio do consensualismo se constitui na liberdade


quanto a forma que devem revestir os negócios jurídicos e, em especial os
contratos,38 ou seja, não é necessário um formalismo exagerado para que os

37
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 22.
38
SETTE, André Luiz Menezes Azevedo. Direito dos contratos: seus princípios fundamentais
sobre a ótica do Código Civil de 2002. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006. p. 107.
14

contratos tenham validade, opondo-se tal princípio ao princípio da história dos


contratos, Gonçalves afirma que:

De acordo com o princípio do consensualismo, basta, para o


aperfeiçoamento do contrato, o acordo de vontades,
contrapondo-se ao formalismo e ao simbolismo que
vigoraram em tempos primitivos. Decorre ele da moderna
concepção de que o contrato resulta do consenso, do acordo
de vontades, independentemente da entrega da coisa.39

Sette ainda ressalta que, a regra é a não exigência de


formalidades, bastando, pois, o consenso das partes para a formação de normas
jurídicas individuais40, ou seja, basta que para a formação do contrato exista
apenas o consenso entre as partes.

1.4.4. Princípio da relatividade dos efeitos dos contratos

O princípio da relatividade dos efeitos dos contratos tem


como principal preceito que seus efeitos apenas atingirão as partes contratantes,
conforme Gonçalves funda-se tal princípio na idéia de que os efeitos do contrato
só se produzem em relação às partes, àqueles que manifestarem a sua vontade,
vinculando-os ao seu conteúdo, não afetando terceiros nem seu patrimônio.41
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho ainda afirmam que:

Como negócio jurídico, em que há a manifestação


espontânea de vontade para assumir livremente obrigações,
as disposições do contrato, a priori, somente interessam às
partes, não dizendo respeito a terceiros estranhos à relação
jurídica obrigacional.42

39
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 22.
40
SETTE, André Luiz Menezes Azevedo. Direito dos contratos: seus princípios fundamentais
sobre a ótica do Código Civil de 2002. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006. p. 108.
41
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. p. 26.
42
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p. 40.
15

Em suma, o contrato realizado entre “A” e “B”, não pode


afetar “C”, objetivando assim, exclusivamente, a satisfação das necessidades
individuais e que, portanto, só produzia efeitos entre aqueles que o haviam
celebrado mediante acordo de vontades, havendo exceções, como por exemplo,
o contrato de seguro. 43

1.4.5. Princípio da Função Social do Contrato

O Princípio da Função Social do Contrato é um dos


pilares da relação contratual, pois, conforme o artigo 421 do Código Civil
Brasileiro “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função
social do contrato”, ou seja, o princípio da autonomia de vontade, acima
explanado, está vinculado ao princípio da função social do contrato, neste
momento, vê-se a importância de tal princípio no contexto contratual, Caio Mário
da Silva Pereira ensina que:

a função social do contrato serve precipuamente para limitar


a autonomia de vontade, tal autonomia esteja em confronto
com o interesse social e este deva prevalecer, ainda que
essa limitação possa atingir a própria liberdade de não
contratar, como ocorre nas hipóteses do contrato obrigatório.
Tal princípio desafia a concepção clássica de que os
contratantes tudo podem fazer, porque estão no exercício da
autonomia da vontade.44

A função social do contrato tem como principal objetivo


que este seja socialmente útil, prestando-se a fins socialmente relevantes, em
busca da justiça social e da dignidade da pessoa humana.45 Conforme Flávio
Tarnuce:

43
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 26.
44
SILVA PEREIRA, Caio Mário. Instituições de direito civil. 11. ed. Atual. por Regis Fichtner :
Rio de Janeiro: Forense, 2003. v. III. p. 7.
45
SETTE, André Luiz Menezes Azevedo. Direito dos contratos: seus princípios fundamentais
sobre a ótica do Código Civil de 2002. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006. p. 66.
16

A função social do contrato, preceito de ordem pública,


encontra fundamento constitucional no princípio da função
social do contrato lato sensu (arts. 5º, XXII e XXIII e 170, III)
bem como no princípio maior de proteção da dignidade da
pessoa humana (art. 1º, III), na busca de uma sociedade
mais justa e solidária (art. 3º, I) e da isonomia (art. 5º, caput).
Isso, repita-se, em uma nova concepção do direito privado,
no plano civil-constitucional, que deve guiar o civilista do
nosso século, seguindo tendência de personalização.46

Ainda, tem como objetivo tal princípio o tratamento igual


aos desiguais, conforme Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, em um
primeiro plano, a socialização da idéia de contrato, na sua perspectiva intrínseca,
propugna por tratamento idôneo das partes, na consideração, inclusive, de sua
desigualdade real de poderes contratuais. Em segundo plano, o contrato é
considerado não só como um instrumento de circulação de riquezas, mas,
também, de desenvolvimento social.47 Eduardo Sens Santos observa:

o contrato não pode mais ser entendido como uma mera


relação individual. É preciso atentar para os seus efeitos
sociais, econômicos, ambientais e até mesmo culturais. Em
outras palavras, tutelar o contrato unicamente para garantir a
eqüidade das relações negociais em nada se aproxima da
idéia de função social – uma função pela sociedade –
quando for dever dos contratantes atentar para as exigências
do bem comum, para o bem geral. Acima do interesse em
que o contrato seja respeitado, acima do interesse em que a
declaração seja cumprida fielmente e acima da noção de
equilíbrio meramente contratual, há interesse de que o
contrato seja socialmente benéfico, ou, pelo menos, que não
traga prejuízos à sociedade – em suma, que o contrato seja
socialmente justo.48

O exercício do direito de forma contrária aos fins a que


se destina ou sem considerar a sua função social, configura o abuso de direito –

46
TARNUCE, Flávio. A função social do contrato. São Paulo: Método, 2005. p. 315.
47
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2. ed. São
Paulo : Saraiva, 2006. p. 47.
48
SANTOS, Eduardo Sens. O novo código civil e suas cláusulas gerais: exame da função
social do contrato, in Revista Brasileira de Direito Privado, n. 10, São Paulo: RT, abr./jun. 2002, p.
29.
17

fraude ao direito -, sendo antijurídico, e não recebendo, por conseguinte, guarida


do ordenamento jurídico.49 Ainda conforme Sette com a aplicação do princípio da
função social dos contratos, as partes contratualmente mais fracas recebem,
assim, uma especial tutela do ordenamento jurídico, com vistas a reequilibrar a
posição dos sujeitos contratuais, promovendo-se a tão esperada igualdade
material, e, via de conseqüência, a justiça social.50

1.4.6. Princípio da Boa fé objetiva

O princípio da boa fé objetiva tem como preceito que,


durante a formação, o cumprimento, e, após o cumprimento do contrato, os
contratantes ajam com boa fé, Gonçalves conceitua:

O princípio da boa-fé exige que as partes se comportem de


forma correta não só durante as tratativas, mas também
durante a formação e o cumprimento do contrato. Guarda
relação com o princípio de direito segundo o qual ninguém
pode beneficiar-se da própria torpeza. Recomenda ao juiz
que presuma a boa-fé, devendo a má-fé, ao contrário ser
provada por quem a alega. Deve este, ao julgar demanda na
qual se discuta a relação contratual, dar por pressuposta a
boa-fé objetiva, que impõe ao contratante um padrão de
conduta, de agir com retidão, ou seja, com probidade,
honestidade e lealdade, nos moldes do homem comum,
atendidas as peculiaridades dos usos e dos costumes do
lugar.51

O princípio da boa fé nos contratos está prevista no


artigo 422 do Código Civil Brasileiro (C.C., art. 422. Os contratantes são
obrigados a guardar, assim na concluso do contrato, como em sua execução, os
princípios de probidade e boa-fé.), Venosa comenta que, a idéia central é no
sentido de que, em princípio, contratante algum ingressa em um conteúdo

49
SETTE, André Luiz Menezes Azevedo. Direito dos contratos: seus princípios fundamentais
sobre a ótica do Código Civil de 2002. Belo Horizonte: Mandamentos, 2006. p. 68.
50
SETTE, André Luiz Menezes Azevedo. Direito dos contratos. p. 69.
51
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 33.
18

contratual sem a necessária boa-fé. A má-fé inicial ou interlocutória em um


contrato pertence à patologia do negócio jurídico e como tal de ver examinada e
punida.52

1.5. EXTINÇÃO DOS CONTRATOS: DISTINÇÃO ENTRE RESOLUÇÃO,


RESILIÇÃO E RESCISÃO CONTRATUAL

Quando as partes contraem obrigações entre si, ou seja,


realizam um contrato, tem a previsão de seu término, conforme Venosa, ao
contrair uma obrigação, ao engendrar um contrato, as partes têm em mira, desde
o início, a possibilidade de seu término, ainda que não se fixe a priori um prazo
para cumprimento.53

Abordaremos neste momento três formas de extinção


dos contratos, a resolução, resilição, e a rescisão contratual. O termo resolução é,
geralmente, reservado para as hipóteses de inexecução do contrato por uma das
partes54. Normalmente, a inexecução conduz não apenas a conseqüências
indenizatórias, mas também á resolução. 55 Conforme Rizzardo:

De modo geral, todas as pessoas lesadas pelo


inadimplemento estão autorizadas a pedir a resolução,
conjuntamente com o pedido da indenização por perdas e
danos. Mais explicitamente, envolvendo a omissão no
cumprimento de uma obrigação bilateral, consubstanciada
em um contrato.56

Araken de Assis ainda conceitua que extingue-se o


vínculo contratual por motivo que apareceu depois da formação. Normalmente, tal

52
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
7. ed. São Paulo : Atlas, 2007. p. 347.
53
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
p. 463.
54
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
p. 468.
55
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 261.
56
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. p. 262.
19

motivo consiste no inadimplemento, que é um fato superveniente, ou que surge


após celebrado o contrato.57 Ou seja, resolução contratual constitui-se na extinção
de um contrato não adimplido por uma das partes.

Quanto a resilição contratual, esta consiste na


cessação do vínculo contratual pela vontade das partes, ou, por vezes, de uma
das partes. A resilição é, portanto, termo reservado para o desfazimento
voluntário do contrato58. Conforme Rizzardo, a resilição contratual consiste na
extinção do contrato por acordo mútuo ou decisão de um dos contratantes 59.

Consiste resilição contratual o desfazimento do contrato


com a anuência das partes ou por vontade delas, sendo esta a resilição bilateral,
a unilateral por sua vez, deverá estar prevista a possibilidade expressamente no
contrato.

E, finalmente a rescisão, esta, constitui extinção do


contrato quando na sua formação, existiu alguma nulidade, podendo por exemplo
entre as causas de nulidade, contrato celebrado por incapaz, ou nulidade por ser
o objeto ilícito. Conforme Rizzardo:

Por rescisão, assim denominada quando o contrato tem


formação nula, iníqua, ou anulável. Desconstitui-se o
negócio porque inexistiu um de seus elementos básicos, ou
porque um vício contamina sua origem. Há a falta de um dos
elementos ou um vício antecedente ou coevo ao consenso.
Na rescisão, incluem-se a inexistência, a nulidade, e a
anulação, causas que o vigente Código as engloba sob a
denominação de ‘invalidade do negócio jurídico’, Entra-se
em juízo com uma ação de rescisão porque inexistente, nulo
ou anulável o contrato, tendo em conta uma razão que
precedeu ou coexistiu com o momento da formação 60.

57
ASSIS, Araken. Resolução do Contrato por inadimplemento. Revista dos Tribunais, 1991,
p.66.
58
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
p. 465.
59
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 286.
60
RIZZARDO, Arnaldo. Contratos. p. 202.
20

Destarte, tem-se por rescisão a formação nula do


contrato, ou seja, não foram cumpridos os elementos básicos do negócio jurídico,
contaminando assim, sua origem, bem como sua validade.

Neste capítulo, observa-se o histórico dos contratos, os


requisitos do negócio jurídico, os conceitos de contrato, bem como alguns
princípios que regem os contratos. No próximo capítulo serão estudados os
contratos de factoring, seus conceitos e espécies, a regulamentação legal
existente a respeito no Brasil, a diferenciação entre factoring e instituição
financeira, bem como a extinção do contrato de factoring.
21

CAPÍTULO 2

CONSIDERAÇÕES ACERCA DOS CONTRATOS DE FACTORING


NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

2.1. BREVE HISTÓRICO ACERCA DOS CONTRATOS DE FACTORING (OU


FATURIZAÇÃO) NO BRASIL

O contrato de factoring tem sua origem nos Estados


Unidos, conforme Golçalves, o contrato em apreço tem sua origem recente na
prática comercial norte-americana, tendo-se se expandido na Europa a partir da
década de 60. Resultou enorme incremento do crédito nas relações comerciais e
industriais e da preocupação empresarial com a necessidade de administrar a sua
concessão61. Segundo Rizzardo:

No direito moderno, apareceu um tipo de comissão


mercantil, que talvez tenha levado ao aparecimento do
conteúdo hoje vigorante do factoring: foi quando o agente ou
factor passou a função de vender e cobrar os preços para a
posição de financiador dos comerciantes. Como estes não
recebiam de imediato os preços, o factor ou então o agente
iniciou a financiar ou adiantar o valor das mercadorias, que
vinha representado em títulos. 62

Ou seja, teve o contrato de factoring origem da


necessidade que as empresas tinham em fomentar seu negócio, pois compravam,
estocavam as mercadorias, industrializavam seu produto, e vendiam a prazo,
dessa forma se descaptalizando, tendo assim o factoring como solução para
gerenciar seu setor de contas a receber, adiantando os valores recebíveis para a
indústria e comércio.

61
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 669.
62
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo : Revista dos Tribunais,
2004. p. 23-24.
22

Seu surgimento, segundo Fran Martins, citando Fabio


Konder Comparato, serviu para atender às pequenas e médias empresas, na
obtenção do capital de giro, sem as dificuldades usualmente observadas no
desconto bancário, muitas vezes de difícil acesso aos pequenos comerciantes. 63

2.2. CONCEITO DE CONTRATO DE FACTORING

A palavra faturização, utilizada em nosso vernáculo,


não é tradução do termo original. Trata-se de neologismo cujo som se aproxima
do vocábulo inglês e nos dá idéia de fatura, faturamento, que, em sentido leigo, se
64
aproxima do sentido do instituto . Conforme Gonçalves ao realizar-se um
contrato de factoring:

o empresário desfruta da vantagem de transferir á empresa


de factoring, ou seja, ao factor, o trabalho de contrato dos
vencimentos dos títulos, o acompanhamento da flutuação
das taxas de juros, a adoção de medidas assecuratórias do
direito credilício, o contato com os inadimplentes e até
mesmo a cobrança judicial.65

Frans Martis conceitua factoring como aquele em que


um comerciante cede a outro créditos, na totalidade ou em parte, de suas vendas
a terceiros, recebendo o primeiro do segundo o montante desses créditos,
mediante o pagamento de uma remuneração.66

Conforme Caio Mário da Silva Pereira, pelo contrato de


factoring ou faturização, uma pessoa (factor ou faturizador) recebe de outra
(faturizado) a cessão de créditos oriundos de operações de compra e venda e
outras de natureza comercial, assumindo o risco de sua liquidação. Incumbe-se

63 MARTINS, Fran, Contratos e obrigações comerciais. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
p. 472.
64
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
7. ed. São Paulo : Atlas, 2007. p. 536.
65
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais. 2.
ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 669.
66
MARTINS, Fran, Contratos e obrigações comerciais. Rio de Janeiro: Forense, 1990. p. 559.
23

de sua cobrança e recebimento.67 Segundo o espanhol Jacobo Leonis em


tradução da Revista Forense:

A pessoa que pratica o factoring, que podemos chamar de


factor, proporciona uma série de serviços administrativos e
financeiros, a quem a solicita, que podemos chamar de
cliente, aceitando aquele a cessão que este lhe fez dos
créditos comerciais que possui, mediante a cobrança de uma
comissão. O cliente do factoring é em regra, o fabricante ou
distribuidor de uma mercadoria, o qual, em troca de
pagamento de uma comissão ao factor, entrega a este os
créditos comerciais que possui contra seus compradores, a
fim de que o factor se ocupe de sua administração,
contabilização e cobrança, ao mesmo tempo garantindo-o
contra a falta de pagamento, a insolvência ou a quebra dos
compradores, sem direito de repetição ou regresso, de tal
forma que o cliente não correrá qualquer risco pelo não-
pagamento dos créditos cedidos. 68

Rizzardo inicialmente conceitua factoring como sendo:

Cessão de títulos de crédito, mediante o pagamento de seu


valor, com uma remuneração por tal adiantamento de valor,
ou o mecanismo negocial por meio do qual uma pessoa
jurídica cede a outra pessoa jurídica seus direitos creditórios,
em caráter definitivo, sem possibilidade de exercer o
cessionário o direito de regresso 69.

Luiz Lemos Leite assim se refere sobre o instituto de


factoring:

O factoring é uma atividade de fomento mercantil que se


destina a ajudar, sobretudo, o segmento das pequenas e
médias indústrias a expandir seus ativos, a aumentar suas
vendas, sem fazer dívidas (...) Factoring é uma atividade
complexa, cujo fundamento é a prestação de serviços, ampla
e abrangente, que pressupõe sólidos conhecimentos de
mercado, de gerência financeira, de matemática e de

67
PEREIRA, Caio Mário da Silva. A nova tipologia contratual no direito brasileiro. RF 281/12.
68
LEONIS, Jacobo. O contrato de factoring. RF 253. p. 458-459.
69
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 16.
24

estratégia empresarial, para exercer suas funções de


parceiro dos clientes. O sentido da parceria é essencial ao
exercício efetivo do Factoring.70

Conforme Rizzardo, passou a espécie a atingir novos


rumos, como gestão financeira, administração do crédito ou de contas a receber e
a pagar, planejamento econômico e de mercados, seleção e cadastramento de
clientes, assessoria creditícia e até elaboração de política de conquista de
mercados, além de outros envolvimentos. 71

Dessa forma, factoring não é compra do faturamento.


Não é compra de duplicatas. Não é compra nem desconto de cheques pré-
datados. Não é empréstimo nem antecipação ou adiantamento de dinheiro.
Tampouco dinheiro fácil e rápido, como freqüentemente se vêem anúncios nos
jornais. Factoring é o conjunto de serviços oferecidos por empresas
especializadas a uma clientela composta exclusivamente de pessoas jurídicas
proporcionando-lhes a assistência indispensável à sua sobrevivência e ao seu
crescimento, sendo de notar que o mercado-alvo de factoring é o seguimento da
pequena e média empresa.

Assim sendo, observa-se que o contrato de factoring,


tem grandes proporções, sendo este uma prestação de serviços, com a
possibilidade de adiantamento de valores a receber, e não apenas um agente
financiador, tendo inclusive a factoring, como acima citado o compromisso de
aumentar as vendas de seu cliente, sem que haja o endividamento deste.

2.3. ESPÉCIES DE FATURIZAÇÃO

2.3.1. Collection type factoring agreement

70
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994. p. 22-23.
71
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 16-17.
25

O Collection type factoring agreement, é uma


modalidade que representa os serviços de mera cobrança pela empresa. Paga-se
ao cliente após o recebimento da fatura. 72

Nesse caso, a empresa de factoring simplesmente


realiza serviços de cobrança pagando a sua cliente um dia após o recebimento da
fatura, ou seja, nesta modalidade de factoring tem-se a responsabilidade de
controlar a cobrança do faturamento da empresa. 73

2.3.2. Import-export factoring

O factoring interno e factoring externo, conforme


conceituado por Rizzardo, que cita Fran Martins:

As operações podem ser realizadas dentro do mesmo país,


ou, neste, dentro de uma região: a esse tipo de faturização
dá-se o nome de faturização interna. Pode, entretanto, a
faturização se relacionar com operações a serem realizadas
fora do país, como em operações de importação e
exportação, dando-se a esse tipo o nome de faturização
exterior. 74

Conforme Donini, esta modalidade de factoring atua em


três frentes – importação, exportação, e a chamada ‘garantia’ ou securitização – e
onde o faturizador adquire, através de cessão, o crédito que o faturizado possui
com o importador.75

Para Lemos Leite, o export factoring surge:

como uma gama de serviços de inequívoca utilidade,


principalmente para os pequenos e médios industriais, que
não têm condições de exportar, e como mais uma alternativa

72
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 49.
73
FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 542.
74
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. p. 50.
75
DONINI, Antonio Carlos. Factoring: de acordo com o novo Código Civil. Rio de Janeiro:
Forense, 2002. p. 733.
26

que se oferece para estimular, facilitar e financiar as


exportações. O factoring exportação remove os problemas e
riscos com as exportações feitas pelos processos
convencionais76

Destarte, tem por objetivo esta espécie de factoring a


facilitação da importação e exportação de bens e serviços pela empresa de
factoring a pequena e média empresa, conforme Luiz Lemos Leite o factoring
exportação servirá para comercializar no exterior bens produzidos pelo segmento
de nossas pequenas e médias empresas, que não tem a menor possibilidade de
fazê-lo. 77

2.3.3. Intercredit

Conforme Fazzio Júnior, a empresa de factoring


garante o pagamento das faturas, mas somente realiza a cobrança dos títulos não
recebidos pela cliente para ressarcimento de seus adiantamentos.78

Ou seja, esta atividade tem como foco garantir o


pagamento das faturas. Recebendo as faturas, pode a empresa ingressar com a
cobrança.79

2.3.4. Open factoring

Tal modalidade de factoring tem como objetivo, o


financiamento da compra e venda mercantil e o compromisso em cobrar as
faturas. 80

76
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 9.ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 330.
77
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1994. p. 21.
78
FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 542.
79
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 49.
80
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. p. 49.
27

Dessa forma, a empresa de factoring financia a


transação comercial, e, aditivamente, se encarrega das cobranças.81

2.3.5. Conventional factoring

Tal espécie de factoring, consiste na mais ampla em


prestação de serviços, pois a instituição financeira ou empresa especializada
garante o pagamento das faturas, antecipando o seu valor ao faturizado. Ocorre
uma cessão, com pagamento á vista de créditos, realizada conjuntamente com a
prestação de serviços, gestão dos créditos, notificação da cessão etc.82 Conforme
Rizzardo que cita Newton de Lucca:

No conventional factoring, ou com antecipação, ou old line


factoring, há uma particularidade que logo sobressai: os
recursos são adiantados pela empresa faturizadora, ficando
ela com os títulos. Dá-se a antecipação sobre o valor dos
títulos cedidos. Vem a calhar a lição de Newton de Lucca,
quanto ao âmbito de aplicação: “É a forma mais tradicional
das operações de faturização, sendo oferecida ao faturizado
a mais variada gama de serviços e contratos,
compreendendo, geralmente, os seguintes: aquisição à vista
de créditos com renúncia do direito de regresso, gestão de
tais créditos, notificação da cessão ao devedor etc”.83

Lemos Leite, conceitua como:

Modalidade que consiste na prestação de serviços, em


caráter contínuo, realizada pela sociedade de fomento
mercantil, conjugada com a compra de créditos (direitos) ou
ativos representativos de vendas mercantis realizadas a
prazo, mediante a venda (cessão, alienação) desses direitos,
por suas empresas-clientes contratantes.84

81
FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Manual de direito comercial. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 542.
82
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 672.
83
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 48.
84
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 9.ed. São Paulo: Atlas, 2004. p. 330.
28

Conforme Golçalves:

No conventioonal factoring, a instituição financeira ou


empresa especializada, garante o pagamento das faturas,
antecipando o seu valor ao faturizado. Ocorre uma cessão,
com pagamento à vista de créditos, realizada conjuntamente
com prestações de serviços, gestão dos créditos, notificação
da cessão etc. Compreende, assim, três elementos: serviços
de administração do crédito, seguro e financiamento.85

Destarte, observa-se que esta espécie de factoring é a


mais completa, e que oferece mais serviços ao contratante, pois é oferecido ao
faturizado um leque de serviços que inclui a aquisição dos créditos, sua gestão,
administração de carteira, entre outros. 86

2.3.6. Maturity Factoring

Esta modalidade de factoring não confere antecipação


dos valores de títulos negociados em cessão de crédito, estes são pagos apenas
em seu vencimento, segundo Venosa:

Pelo maturity factoring (faturização de vencimento), a


empresa não financia, não adianta numerário, mas
encarrega-se da cobrança de créditos do faturizado,
garantindo seu pagamento nos vencimentos, assumindo o
risco pelo inadimplemento.87

Newton de Lucca assinala que:

está excluída a atividade de financiamento, subsistindo,


entretanto, tanto a gestão e a cobrança de faturas, como a
garantia dos pagamentos na data de seus vencimentos.

85
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
4. ed. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 672
86
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
7. ed. São Paulo : Atlas, 2007. p. 537.
87
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: contratos em espécie. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p.
607-608.
29

Conforme ensina Donini, o objeto do contrato é a


prestação de serviços convencionais. Eventualmente e opcionalmente poderá o
faturizador adquirir, através de cessão de créditos, títulos oriundos das operações
mercantis da faturizada antecipadamente. 88

De acordo com Arnoldo Wald:

O maturity factoring caracteriza-se pelo pagamento do valor


das faturas somente no seu vencimento. Essa modalidade
não inclui a atividade de financiamento, estando presentes
apenas a prestação de serviços de administração do crédito
e o seguro. É assegurado, porém, o risco de inadimplemento
do devedor, pois o pagamento deve ser feito pela
faturizadora independendo recebimento das faturas.89

Dessa forma, o maturity factoring tem como principal


característica a garantia pela empresa de factoring do recebimento dos valores
oriundos de faturamento de seu cliente, ou seja, o faturizado transfere todo o risco
de inadimplemento para a empresa de factoring.

2.4. A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA REGULAMENTADORA DO FACTORING


NO BRASIL

No Brasil não existe uma legislação específica que


regulamenta o factoring. No Código Civil em seu artigo 286 define que o credor
pode ceder o seu crédito, se, a isso não opuser a natureza da obrigação, a lei, ou
a convenção com o devedor, a cláusula proibitiva da cessão não poderá ser
oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da obrigação. O
artigo 295 do Código Civil ainda define que na cessão por título oneroso, o
cedente, ainda que não se responsabilize, fica responsável ao cessionário pela
existência do credito ao tempo em que lhe cedeu; a mesma responsabilidade lhe
cabe nas cessões por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.

88
DONINI, Antônio Carlos. Factoring: regulamentação, funções desempenhadas, modalidades e
o direito regresso. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 802, n. 91, p. 734.
89
WALD, Arnoldo. Obrigações e contratos. 14. ed. São Paulo Revista dos Tribunais, 2000. p.
564.
30

Identificamos na legislação cível brasileira, a


possibilidade de cessão de título oneroso, mas, para que tal possibilidade se torne
uma atividade específica com remuneração para tal cessão de crédito, se tem um
longo caminho a percorrer.

A atividade de fomento mercantil, ou seja, factoring, tem


como objeto auferir lucro sobre a compra de títulos de créditos a vencer. Tal
definição por mais simplória que seja, é tacitamente o objeto do factoring
atualmente no Brasil, mas, tal afirmativa será abordada com mais propriedade no
próximo capítulo.

A prática de factoring no Brasil por um tempo foi


simplesmente vedada por empresas as quais não possuíam autorização do
Banco Central do Brasil, conforme o artigo 17 da Lei 4.595, de 31.12.1964,
“consideram-se instituições financeiras, para efeitos da legislação em vigor, as
pessoa jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou
acessória, a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios
ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de
propriedade de terceiros”.

Tal autorização é exigida pelo artigo 18 da mesma Lei:


“as instituições financeiras somente poderão funcionar no País mediante prévia
autorização do Banco Central do Brasil ou Decreto do Poder Executivo, quando
forem estrangeiras”.

Assim, não era admitida que nenhuma atividade


privativa de instituições financeiras fossem exercidas por empresas de outra
natureza. Se houvesse infração a tal preceito o § 7º. do Artigo 44 da Lei
4.595/1964, que previa a quaisquer pessoas físicas ou jurídicas que atuem como
instituição financeira, sem estar devidamente autorizadas pelo Banco Central do
Brasil, ficam sujeitas à multa referida neste artigo e detenção de 1 (um) a 2 (dois)
anos, ficando a esta sujeitos, quando pessoas jurídicas, seus diretores
administradores.
31

Em 16/06/1982 o Banco Central do Brasil emitiu a


Circular nº. 703 com o seguinte texto:

Circular nº 703 da diretoria do Banco Central, de 16/06/1982

Em face das disposições da lei nº 4.595, de 31-12-64, em


especial as contidas em seus artigos 2º e 3º inciso V, 4º
incisos VI e VIII, 10 Inciso V, 11 Inciso VII, e 44, § 7º, o
banco Central do Brasil, ouvindo o Conselho Monetário
Nacional, em sessão realizada nesta data, decidiu tornar
público os seguintes esclarecimentos:

I – As operações conhecidas por factoring, “compra de


faturamento” ou denominações semelhantes – em que, em
geral, ocorrem a aquisição, a administração e garantia de
liquidez dos direitos creditórios de pessoas jurídicas,
decorrentes do faturamento da venda de seus bens e
serviços – apresentam, na maioria dos casos, características
e particularidades próprias daquelas privativas de instituições
financeiras autorizadas pelo Banco Central.

II – Assim, e até a matéria seja regulamentada pelo


Conselho monetário Nacional as pessoas físicas ou jurídicas
não autorizadas a realizarem tais operações continuam
passíveis, na forma prevista no § 7º do artigo 44 da Lei
4.595, de 31-12-64, das penas de multa pecuniária e
detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos, ficando a estas sujeitas
quando pessoas jurídicas, seus administradores.

Brasília (DF), 16 de junho de 1982. Carlos Geraldo Langoni.


Presidente.90

Tal circular não proíbe a atividade de factoring no


Brasil, apenas adverte aos que tem a referida operação como objeto comercial,
que observe as práticas privativas de instituições financeiras, sendo que, tais
atividades, estarão sujeitas as penas previstas no artigo 44, §7º da Lei 4.595/64.

90
LEITE, Luiz Lemos. Factoring no Brasil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 12.
32

A circular nº 703 do Banco Central do Brasil foi


revogada em 03/10/1988 pela Circular 1.359, tendo por finalidade esta última,
apenas invalidar a primeira.

Depois desta revogação não existia nenhuma proibição


a atividade de factoring, apenas se exigia autorização do Banco Central do Brasil,
fato que, tornava-se praticamente impossível a constituição de empresas neste
setor. Conforme Rizzardo:

Não passando o factoring de uma atividade comercial, em


que não se atua na captação, coleta ou intermediação de
recursos financeiros, decorre daí que para a constituição de
empresas ou firmas se procede normalmente como nos
demais casos dos mais diversos ramos de empresas e
firmas comerciais. Suficiente o arquivamento dos estatutos
ou dos atos formais na Junta Comercial. 91

Atualmente o factoring sem sendo reconhecido em


regulamentos administrativos e leis especiais. A Resolução 2.144 de 22/02/1995,
do Banco Central do Brasil, esclarece que:

RESOLUÇÃO 2.144

Esclarece sobre operações de "factoring" e operações


privativas de instituições financeiras.

O BANCO CENTRAL DO BRASIL, na forma do art. 9º da


Leinº 4.595, de 31.12.64, torna público que o CONSELHO
MONETÁRIO NACIONAL, em sessão realizada em
22.02.95, tendo em vista o disposto no art. 4º, inciso VI, da
referida Lei, e face ao contido no art. 28, parágrafo 1º,
alínea "c.4", da Lei nº 8.981, de 20.01.95, que conceitua
como "factoring" a atividade de prestação cumulativa e
contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica,
gestão de crédito, seleção e riscos, administração de
contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios
resultantes de vendas mercantis aprazo ou de prestação de
serviços,

91
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo : Revista dos Tribunais,
2004. p. 80.
33

RESOLVEU:

Art. 1º Esclarecer que qualquer operação praticada por


empresa de fomento mercantil ("factoring") que não se ajuste
ao disposto no art. 28, parágrafo 1º, alínea "c.4", da Lei nº
8.981, de 20.01.95, e que caracterize operação privativa de
instituição financeira, nos termos do art 17, da Lei nº 4.595,
de 31.12.64, constitui ilícito administrativo (Lei nº 4.595, de
31.12.64) e criminal (Lei nº7.492, de 16.06.86).
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua
publicação.

Brasília, 22 de fevereiro de 1995


Persio Arida
Presidente

Mesmo tal Resolução advertindo aos limites de


operação do factoring, admite esta, como atividade lícita.

O factoring veio a ser previsto legalmente apenas com


a lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995, seu artigo 15, §1º, inciso III, alínea d:

alínea d. prestação cumulativa e contínua de serviços de


assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito,
seleção de riscos, administração de contas a pagar e a
receber, compra de direitos creditórios resultantes de vendas
92
mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).

Este instituto é conceituado como atividade de


prestação contínua e cumulativa de serviços de assessoria credilícia,
mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contas a
pagar e receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis
a prazo ou de prestação de serviços.

Neste momento identificamos a primeira previsão legal


para a atividade do factoring, entretanto, não havendo atualmente
regulamentação específica.

Ora, se observa nesta previsão legal que, tal instituto


tem como objetivo a prestação contínua e cumulativa de serviços de assessoria

92 BRASIL, lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995, seu artigo 15, §1º, inciso III, alínea d.
34

creditícia, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contras a pagar


e receber e compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a
prazo ou de prestação de serviços, tal afirmativa é taxativa, prestação contínua e
cumulativa, não podendo ser exploradas estas atividades isoladamente.

Existem em tramite no Congresso Nacional projetos de


lei que regulamentam a atividade de factoring, sendo uma destas o projeto de lei
nº Lei nº 230/95, de autoria do Senador José Fogaça, que além de definir o
instituto, caracteriza este como atividade mercantil e veda a prática de operações
privativas de instituições financeiras, prevê ainda tal projeto a criação do
Conselho Federal de Fomento Mercantil, que disciplinará e fiscalizará as
atividades concernentes ao factoring.

2.5. OPERAÇÕES BANCÁRIAS X OPERAÇÕES DE FACTORING:


DISTINÇÕES

Conforme abordado no título anterior há uma grande


distinção entre operações de factoring e operações bancárias, sendo que, as
empresas de factoring não podem praticar atividades privativas de instituição
financeira.

As operações bancárias estão definidas no artigo 17 da


Lei 4.595 de 31.12/1964, que define:

Art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os


efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas
ou privadas, que tenham como atividade principal ou
acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos
financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou
estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de
terceiros.

Ainda o artigo 18 da mesma Lei:

Art. 18. As instituições financeiras somente poderão


funcionar no País mediante prévia autorização do Banco
35

Central da República do Brasil ou decreto do Poder


Executivo, quando forem estrangeiras.

Então, para que sejam exercidas atividades


concernentes a instituições financeiras é necessário autorização do Banco Central
do Brasil.

Destarte, as operações bancárias consistem na coleta,


intermediação ou aplicação de recursos financeiros. Rizzardo conceitua as
operações bancárias como sendo aquelas que:

Executam operações que envolvem a captação de dinheiro,


a intermediação do crédito e a aplicação de recursos
próprios ou de terceiros. Em termos mais extensos, captam
recursos no mercado, emprestam dinheiro a juros,
descontam títulos, concedem empréstimos pessoais,
efetuam financiamentos e prestam serviços de cobrança de
títulos e guarda de valores.93

De outro norte, as operações de factoring estão


previstas no artigo15, §1º, III, d da Lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995, alínea
esta, instituída pela Medida Provisória nº 232 de 2004, que define:

alínea d. prestação cumulativa e contínua de serviços de


assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito,
seleção de riscos, administração de contas a pagar e a
receber, compra de direitos creditórios resultantes de vendas
mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring).

Conforme prevê a legislação acima exposta a operação


de factoring consiste a prestação contínua e cumulativa de serviços de assessoria
credilícia entre outros e a compra de direitos creditórios resultantes de vendas
mercantis a prazo ou de prestação de serviços, não podendo o factoring coletar,
intermediar e aplicar recursos financeiros.

Conforme abordado no título anterior, a legislação é


específica e taxativa, não deixando dúvidas quanto ao campo de atuação das

93
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 141.
36

empresas de factoring, pois não pode esta, simplesmente descontar cheques ou


duplicatas, ou ainda, comprar os direitos resultantes de vendas mercantis a prazo
apenas, ou, tão somente, gerir os créditos.

O início da alínea d, do inciso III, do § 1º, do artigo 15


da Lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995 é cristalino, prestação cumulativa e
contínua de serviços, os quais estão acima elencados, não havendo a
possibilidade de realizá-los separadamente, sendo que, se tal fato ocorrer,
descaracteriza-se o serviço de factoring ingressando assim, numa seara exclusiva
das instituições financeiras, e, então, passível da aplicação das sanções previstas
em lei, as quais serão abordadas no próximo capítulo.

Outra distinção que se traça entre as atividades de


empresas de factoring e instituições financeiras é o direito de regresso do
cessionário de título executivo em face ao cedente, pois, nas operações de
instituição financeira, tem esta o direito de regresso ao cedente do título, pois este
garante a solvência do crédito, sendo que, neste caso se trata de um empréstimo
com garantia. Já nas operações de factoring, que não podem atuar como
instituições financeiras e, muito menos conceder empréstimos, não tem direito de
regresso em face do cedente, pois, se, ela tem a opção de escolha dos títulos a
serem comprados, corre o risco da inadimplência, e ainda, se tratando de uma
cessão de crédito não responde o cedente pela solvência do devedor.

O artigo 296 do Código Civil Brasileiro estabelece que:

Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não


responde pela solvência do devedor.

Rizzardo assevera:

Não é sem razão que se faculta ao factor a escolha dos


créditos. Ao receber o borderô dos títulos, tem ele a
faculdade de rejeitar os que não lhe interessam. Com os
títulos, acompanham e podem ser exigidos os comprovantes
37

da entrega das mercadorias, o que infunde maior garantia ao


negócio.94

Ademais, se leva em conta na cessão de crédito o


custo de quem os vende, pagando um ágio, em relação ao valor inserido nos
títulos. Dessa forma, não haveria sentido permitir, o cessionário, ir contra aquele
que pagou pela cessão, sendo que, se admitindo o direito de regresso, não existe
qualquer justificativa a remuneração a empresa de factoring.95

2.6. EXTINÇÃO DO FACTORING

A extinção do contrato de factoring se dá da mesma


forma que as outras espécies de contrato, sendo pelo vencimento do prazo
previsto para sua duração, pelo distrato ou resilição bilateral, pela mudança de
estado de um dos contratantes, pela resilição unilateral, desde que precedida de
aviso prévio, pelo inadimplemento de obrigações contratuais, pela morte de uma
das partes se esta for comerciante individual.96

Venosa ainda acrescenta que desfeito o contrato,


devem ser liquidadas as operações pendentes, sob pena de responsabilização
das partes por perdas e danos97.

Neste capítulo foram abordados os temas referentes ao


histórico, conceito do contrato, espécies, regulamentação brasileira existente
sobre o instituto do factoring, bem como, as distinções existentes entre empresas
de factoring e instituição financeira. No próximo capítulo, será visto quais são os
atos permitidos às empresas de factoring, bem como as conseqüências jurídicas,
cíveis e criminais, em razão do

94
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 121.
95
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. p. 121.
96
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume III : contratos e atos unilaterais.
2. ed. São Paulo : Saraiva, 2006. p. 672.
97
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil: teoria geral das obrigações e teoria geral dos contratos.
7. ed. São Paulo : Atlas, 2007. p.611.
38

CAPÍTULO 3

O DESVIRTUAMENTO DOS CONTRATOS DE FACTORING E


SUAS CONSEQUÊNCIAS

3.1. OS ATOS PERMITIDOS ÀS FACTORINGS NO BRASIL

Conforme previsto no artigo 15, §1º, III, d da Lei 9.249


de 26 de dezembro de 1995, os atos permitidos às empresas de factoring são:
prestação contínua e cumulativa de serviços de assessoria creditícia,
mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contas a
pagar e receber, compras de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis
a prazo ou de prestação de serviços.

Se constata, com a previsão legal acima exposta, que,


a atividade de factoring permitida no Brasil, se dá com a prestação contínua e
cumulativa de serviços de assessoria de avaliação de mercado, gestão de
créditos, riscos, administração de contas a pagar e receber, bem como, compra
de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação
de serviços.

A legislação é taxativa: prestação contínua e cumulativa


de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção de
riscos, administração de contas a pagar e receber, compras de direitos creditórios
resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços., sendo que,
não podem ser exercidos isoladamente, fato este que habitualmente ocorre em
empresas de factoring, desvirtuando assim sua finalidade.

A compra isolada de direitos creditórios resultantes de


vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços é de objeto exclusivo de
instituições financeiras, não havendo previsão legal para que as empresas de
factoring exerçam tal atividade, fato que, ocorrendo, é passível de sanções
39

administrativas, cíveis e penais previstas em lei, tema que será abordado em


título próprio.

3.2. O DESVIRTUAMENTO (SIMULAÇÃO) DE CONTRATOS DE FACTORING


NA REALIZAÇÃO DE ADIANTAMENTOS (EMPRÉSTIMOS), POR SE TRATAR
DE OPERAÇÃO PRIVATIVA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA

Conforme amplamente abordado no capítulo anterior,


existe uma profunda diferença entre instituição financeira e factoring, sendo que
esta segunda não pode praticar atos privativos da primeira.

Superior Tribunal de Justiça se manifestou sobre o


tema, conceituando que o empréstimo e o desconto de títulos, a teor do art. 17,
da Lei 4.595/64, são de operações típicas, privativas das instituições financeiras,
dependendo sua prática de autorização governamental.98

Rizzardo expõe que o factoring distancia-se da


instituição financeira justamente porque seus negócios não se abrigam no direito
de regresso e nem na garantia representada pelo aval ou endosso. 99

A concessão de empréstimos ou mútuos, sem dúvida, é


atividade própria dos bancos. Ocorre que muitas empresas têm apenas a
denominação ou a fachada de factoring, dedicando-se, no entanto, à concessão
de crédito, ou de pequenos empréstimos pessoais, numa típica atividade
bancária. Embora camuflando o exercício de assessoramento financeiro, ou de
compra de ativos, na verdade atua com o crédito, cobrando altos juros, numa
verdadeira prática de agiotagem. 100

Se a empresa de factoring praticar atos privativos das


instituições financeiras, ou seja, realizar adiantamentos, empréstimos, ou demais
atos exclusivos de bancos, se sujeita esta, a aplicação das sanções previstas no
artigo 44 , § 7º, da lei 4.595 de 31 de dezembro de 1964, ou seja:

98
RHC 6.94-RS, j.09.06.1997, DJ 30.06.1997, rel. Min. Fernando Gonçalves
99
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 141.
100 RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. p. 170-171.
40

Art. 44. As infrações aos dispositivos desta lei sujeitam as


instituições financeiras, seus diretores, membros de
conselhos administrativos, fiscais e semelhantes, e gerentes,
às seguintes penalidades, sem prejuízo de outras
estabelecidas na legislação vigente:

I - Advertência.
II - Multa pecuniária variável.
III - Suspensão do exercício de cargos.
IV - Inabilitação temporária ou permanente para o exercício
de cargos de direção na administração ou gerência em
instituições financeiras.
V - Cassação da autorização de funcionamento das
instituições financeiras públicas, exceto as federais, ou
privadas.
VI - Detenção, nos termos do § 7º, deste artigo.
VII - Reclusão, nos termos dos artigos 34 e 38, desta lei.
§ 1ºA pena de advertência será aplicada pela inobservância
das disposições constantes da legislação em vigor,
ressalvadas as sanções nela previstas, sendo cabível
também nos casos de fornecimento de informações inexatas,
de escrituração mantida em atraso ou processada em
desacordo com as normas expedidas de conformidade com
o art. 4º, inciso XII, desta lei.
§ 2º As multas serão aplicadas até 200 (duzentas) vezes o
maior salário-mínimo vigente no País, sempre que as
instituições financeiras, por negligência ou dolo:
a) advertidas por irregularidades que tenham sido praticadas,
deixarem de saná-las no prazo que lhes for assinalado pelo
Banco Central da República do Brasil;

(...)

§ 7º Quaisquer pessoas físicas ou jurídicas que atuem como


instituição financeira, sem estar devidamente autorizadas
pelo Banco Central da Republica do Brasil, ficam sujeitas à
multa referida neste artigo e detenção de 1 a 2 anos, ficando
a esta sujeitos, quando pessoa jurídica, seus diretores e
administradores.
41

Faz-se necessário neste momento, distinguir a


diferença entre o deságio e os juros, sendo que os juros representam o
rendimento do capital pelo espaço de tempo compreendido desde o pagamento
até a data do recebimento do valor do título. 101

Não podem as empresas de factoring cobrar juros


remuneratórios pelo desconto de títulos, pois, esta atividade é exclusiva de
instituições financeiras. Rizzardo ainda assevera que sequer, a rigor, podem ser
exigidos separadamente, já que não constitui factoring um mútuo. 102

Quanto ao deságio, este compreende a remuneração


pelo serviço prestado pelas empresas de factoring,os quais foram abordados no
título anterior.

Rizzardo conceitua esta contraprestação como:

uma atividade empresarial, mais propriamente comercial,


cuja mercadoria se constitui do crédito, e paga-se o preço
em consonância com a qualidade do produto. Nesta
dimensão deve conceber-se o factoring.103

Esta contraprestação pode ser dividida em dois setores


básicos: a compra de direitos creditórios e a prestação de serviços – estes
consistentes na gestão do crédito, cadastro de compradores, seleção de riscos,
eliminação de maus pagadores, e assessoria financeira nos custos operacionais,
na contabilidade, no cadastramento de fregueses, nas contas a pagar, na
cobrança, além de outras atividades.104

Quanto ao valor do deságio neste deve estar embutido


a correção monetária, a taxa de juros permitida, a taxa de risco, os custos
operacionais e o montante de impostos. O deságio é calculado em face da

101
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 136.
102
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. p. 136.
103
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring p. 136.
104
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring p. 136.
42

natureza do negócio, do risco e outras circunstancias, razão pela qual leva a se


distanciar a empresa de factoring da instituição financeira. 105

Neste momento se depara com uma possível


legalização das taxas, juros ou deságio cobrado pelas empresas de factoring. E,
conforme Rizzardo é difícil se não impossível uma revisão dos encargos
embutidos no contrato.106

Ora, mas para que seja legal a cobrança de deságio, é


necessário que a empresa de factoring preste todos os serviços a ela
competentes, os quais estão previstos no artigo15, §1º, III, d da Lei 9.249 de 26
de dezembro de 1995, sendo estes a prestação contínua e cumulativa de serviços
de assessoria credito, mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos,
administração de contas a pagar e receber, compras de direitos creditórios
resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços.

A remuneração pelos serviços prestados leva em conta


os fatores acima expostos, pois o empresário recebe assessoramento na área de
crédito, envolvendo planejamento, cobrança de títulos, gestão de crédito entre
outros.107

Destarte, se, tais serviços não forem prestados


cumulativamente e continuamente, não se trata de factoring, e sim, de um
desvirtuamento desta, assim, estando sujeita as penalidades previstas em lei.

Quanto a taxa de juros ou deságio cobrado pelas


empresas de factoring para a remuneração da prestação de seus serviços, e, pelo
risco de não receber os valores supostamente adiantados em razão da
antecipação de faturamento por esta praticada em empresas a qual presta
serviços, deve esta, sujeitar-se ao previsto na legislação civil vigente no Brasil.

O artigo 591 do Código Civil prevê:

105
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring p. 137-138.
106
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 137.
107
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring p. 138.
43

Art. 591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos,


presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução,
não poderão exceder a taxa que se refere o art. 406,
permitida a capitalização anual.108

Ao remeter-se ao artigo 406 do Código Civil:

Art. 406. Quando os juros moratórios não forem


convencionados, ou forem sem taxa estipulada, ou quando
provierem de determinação de lei, serão fixados segundo a
taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de
impostos devidos à Fazenda Nacional.109

O Código Tributário Nacional, que foi instituído pela Lei


5.172, de 25.10.1966, em seu artigo 161, §1º, fixa os juros devidos a Fazenda
Nacional:

§1º. Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora


são calculados à taxa de 1% (um por cento) ao mês. 110

Dessa forma, observa-se que o deságio, ou, juros


cobrados pelas empresas de factoring para a prestação de seus serviços, não
pode ultrapassar o limite estipulado em lei de 1% (um por cento) ao mês. Mas, o
Código Civil Brasileiro em seu artigo 406, que foi acima reproduzido regula que na
falta de estipulação de porcentagem de juros entre as partes não se pode
ultrapassar o limite abaixo citado

Eis que, o Decreto 22.626, de 1933, em seu artigo 1º:

Art. 1º. É vedado, e será punido nos termos da lei, estipular


em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobre
da taxa legal. 111

108
BRASIL, Código civil. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
p. 319.
109
BRASIL, Código civil. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
p. 301.
110 BRASIL, Código tributário. Lei 5.172, de 25.10.1966, artigo 161, §1º.
111 BRASIL, Decreto 22.626, de 1933, artigo 1º.
44

Destarte, conclui-se com o acima exposto que os juros


remuneratórios cobrados pela compra de créditos, que é calculado entre a data
da venda do título e o vencimento deste, ficará no limite máximo de 24% (vinte e
quatro por cento) ao ano ou, 2% (dois por cento) ao mês, sendo que, o Decreto
22.626 de 1933 que regulamenta a cobrança de juros na pode ultrapassar o dobro
da taxa legal.112

A tais relações, tanto as bancárias, quanto as de


factoring, estão condicionadas a aplicação do Código de Defesa do Consumidor,
ou seja, a Lei 8.078, de 11.09.1990, bem como à seus princípios, podendo assim,
numa possível revisão de contrato, invocar a aplicação do Código consumerista.

Rizzardo ainda assevera que, não é possível olvidar a


composição da taxa remuneratória, máxime no que tange aos juros e correção
monetária. Há o direito em conhecer se os índices estão corretos e correspondem
aos legalmente admitidos.113

Dessa forma, se observa que, além da aplicação do


Código de Defesa do Consumidor as relações com empresas de factoring o juros
ou deságio por estas cobradas não pode ultrapassar o dobro do limite legal, ou
seja, 2% (dois por cento) ao mês, sendo que, em relações de empresas
consumidoras de empresas que prestam serviços de factoring é possível a
revisão de juros e deságio se estes ultrapassarem o limite estipulado em lei.

3.3. CONSEQÜÊNCIAS DA IDENTIFICAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS EM


CONTRATOS DE FACTORING

Conforme previsto no artigo 17 da Lei 4.595 de 31 de


dezembro de 1964 são atividades bancárias ou seja, exclusivamente de
instituições financeiras, operações que envolvem captação de dinheiro,
intermediação do crédito e a aplicação de recursos próprios ou de terceiros. Em
termos mais extensos, captam recursos no mercado, emprestam dinheiro a juros,

112
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 143
113
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring p. 147
45

descontam títulos, concedem empréstimos pessoais, efetuam financiamentos e


prestam serviços de cobrança de títulos e guarda de valores, e, conforme o artigo
18 desta mesma lei, dependem de autorização do Banco Central para
funcionar.114

Se estas atividades são de exclusividade de instituições


financeiras, não podem as empresas de factoring praticá-las. As conseqüências
de tal ato estão previstas no artigo 44, §7º, da Lei 4.595 de 31 de dezembro de
1964:

Art. 44. As infrações aos dispositivos desta lei sujeitam as


instituições financeiras, seus diretores, membros de
conselhos administrativos, fiscais e semelhantes, e gerentes,
às seguintes penalidades, sem prejuízo de outras
estabelecidas na legislação vigente:

(...)

§ 7º Quaisquer pessoas físicas ou jurídicas que atuem como


instituição financeira, sem estar devidamente autorizadas
pelo Banco Central da Republica do Brasil, ficam sujeitas à
multa referida neste artigo e detenção de 1 a 2 anos, ficando
a esta sujeitos, quando pessoa jurídica, seus diretores e
administradores 115

Dessa forma, se for identificado empréstimos em


contratos de factoring estarão sujeitas estas, bem como seus diretores e
administradores a detenção de 1 a 2 anos, bem como multa.

Ademais, se, o contrato de empréstimo realizado por


empresas que não são instituições financeiras, o mesmo é nulo. Veja-se o
disposto nos artigos 104 e 166, incisos II, VI e VII do Código Civil Brasileiro:

Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:


I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;

114
RIZZARDO, Arnaldo. Factoring. 3. ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 2004. p. 141
115 BRASIL, Lei 4.595, artigo 44, §7º, de 31 de dezembro de 1964.
46

III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:


(...)
II – for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
(...)
VI – tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII – a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a
prática, sem cominar sanção;

Ora, sendo nulo o contrato, pois não pode factoring


emprestar dinheiro, nem praticar qualquer outra atividade, a não ser as previstas
no artigo15, §1º, III, d da Lei 9.249 de 26 de dezembro de 1995, tal contrato se
torna inexigível.

3.3.1. A Desconstituição de Garantias (Reais e Fidejussórias) em Função de


Contratos de Mútuo Realizados por Empresas de Factoring.

Em muitos casos, para que seja garantido o crédito


concedido por empresas de factoring, sendo que o fazem de forma ilegal, estas,
também ilegalmente, exigem como garantia, bens ou títulos de crédito, como
cheques e notas promissórias. Ou ainda, em alguns casos, contratos de confissão
de dívida.

A exigência de tais garantias é ilegal, pois, conforme


abordado no título 2.5. estas operações são privativas de instituições financeiras,
e, alem das empresas de factoring, estarem sujeitas a sanções previstas em lei,
as quais serão abordadas no título 3.4., estas garantias são inexigíveis.

Ora, se as empresas de factoring, não podem fazer


empréstimos ou outras operações pertinentes a instituições financeiras, muito
menos, podem exigir contratos de confissão de dívida, bens ou títulos de crédito
para garantir a operação ilegal.

Quando, no momento da execução de tais títulos ou


bens que garantem a dívida junto a empresas de factoring, estes são inexigíveis,
47

pois, conforme o artigo 586 do Código de Processo Civil, a execução para


cobrança de crédito deve ser fundada em título de obrigação certa, líquida e
exigível, sendo que no caso em apreço, tal obrigação não é líquida, assim,
inexigível.

3.3.2. A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA AUTORIZADA PELOS ARTS. 1º E


3º DA MP N.º 2.172-32, QUE TRATA DA NULIDADE DOS ATOS DE USURA
PECUNIÁRIA.

A Medida Provisória nº 2.172-32, de 23 de agosto de


2001, prevê que são nulas as estipulações contratuais usuárias bem como em
seu artigo 3º, prevê a inversão do ônus da prova, conforme segue:

Art. 1º São nulas de pleno direito as estipulações usurárias,


assim consideradas as que estabeleçam:
I - nos contratos civis de mútuo, taxas de juros superiores às
legalmente permitidas, caso em que deverá o juiz, se
requerido, ajustá-las à medida legal ou, na hipótese de já
terem sido cumpridas, ordenar a restituição, em dobro, da
quantia paga em excesso, com juros legais a contar da data
do pagamento indevido;
II - nos negócios jurídicos não disciplinados pelas legislações
comercial e de defesa do consumidor, lucros ou vantagens
patrimoniais excessivos, estipulados em situação de
vulnerabilidade da parte, caso em que deverá o juiz, se
requerido, restabelecer o equilíbrio da relação contratual,
ajustando-os ao valor corrente, ou, na hipótese de
cumprimento da obrigação, ordenar a restituição, em dobro,
da quantia recebida em excesso, com juros legais a contar
da data do pagamento indevido.
Parágrafo único. Para a configuração do lucro ou vantagem
excessivos, considerar-se-ão a vontade das partes, as
circunstâncias da celebração do contrato, o seu conteúdo e
natureza, a origem das correspondentes obrigações, as
práticas de mercado e as taxas de juros legalmente
permitidas.
(...)
48

Art. 3º Nas ações que visem à declaração de nulidade de


estipulações com amparo no disposto nesta Medida
Provisória, incumbirá ao credor ou beneficiário do negócio o
ônus de provar a regularidade jurídica das correspondentes
obrigações, sempre que demonstrada pelo prejudicado, ou
pelas circunstâncias do caso, a verossimilhança da
alegação.

Destarte, observa-se que, nos casos em que empresas


de factoring cobrarem juros acima do permitido legalmente, além de sofrer as
penas da lei, terá que provar suas alegações, sendo exclusivamente desta o ônus
da prova.

3.4. SANÇÕES PREVISTAS EM LEI PARA QUEM ATUAR COMO


INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SEM AUTORIZAÇÃO DO BANCO CENTRAL E
COBRAR JUROS ACIMA DO PERMITIDO LEGALMENTE

Neste capítulo foram abordadas várias formas de


desvirtuamento do contrato de factoring, sendo que, esta, apenas pode praticar
cumulativamente e continuamente as atividades previstas no, §1º, III, d da Lei
9.249 de 26 de dezembro de 1995, pois, esta é a única legislação existente no
Brasil que sucintamente regula a atividade.

Assim, as penas previstas para as pessoas físicas e


pessoas jurídicas, bem como seus diretores e administradores que desvirtuarem o
factoring, tanto na sua área de atuação, quanto na cobrança ilegal de juros, são
as seguintes:

Para a cobrança de juros além do permitido legalmente


os artigos 1º e 2º da Medida Provisória nº 2.172-32:

Art. 1o São nulas de pleno direito as estipulações usurárias,


assim consideradas as que estabeleçam:

I - nos contratos civis de mútuo, taxas de juros superiores às


legalmente permitidas, caso em que deverá o juiz, se
requerido, ajustá-las à medida legal ou, na hipótese de já
terem sido cumpridas, ordenar a restituição, em dobro, da
quantia paga em excesso, com juros legais a contar da data
do pagamento indevido;
49

(...)

Art. 2o São igualmente nulas de pleno direito as disposições


contratuais que, com o pretexto de conferir ou transmitir
direitos, são celebradas para garantir, direta ou
indiretamente, contratos civis de mútuo com estipulações
usurárias.

Nos casos em que, empresas cobrarem juros acima do


permitido legalmente, deverá o juiz ajustar as taxas legais praticadas no mercado,
bem como os valores pagos a maior, deverão ser restituídos em dobro. Também
serão consideradas nulas de pleno direito as garantias dadas para a realização de
empréstimos. Ainda, o artigo 4º da lei 1.521 de 26 de dezembro de 1951, tem a
seguinte redação:

Art. 4º. Constitui crime da mesma natureza a usura


pecuniária ou real, assim se considerando:
a) cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre
dívidas em dinheiro superiores à taxa permitida por lei;
cobrar ágio superior à taxa oficial de câmbio, sobre quantia
permutada por moeda estrangeira; ou, ainda, emprestar sob
penhor que seja privativo de instituição oficial de crédito;
b) obter, ou estipular, em qualquer contrato, abusando da
premente necessidade, inexperiência ou leviandade de outra
parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente
ou justo da prestação feita ou prometida.
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa,
de cinco mil a vinte mil cruzeiros.
§ 1º. Nas mesmas penas incorrerão os procuradores,
mandatários ou mediadores que intervierem na operação
usuária, bem como os cessionários de crédito usurário que,
cientes de sua natureza ilícita, o fizerem valer em sucessiva
transmissão ou execução judicial.
§ 2º. São circunstâncias agravantes do crime de usura:
I - ser cometido em época de grave crise econômica;
II - ocasionar grave dano individual;
III - dissimular-se a natureza usurária do contrato;
IV - quando cometido:
50

a) por militar, funcionário público, ministro de culto religioso;


por pessoa cuja condição econômico-social seja
manifestamente superior à da vítima;
b) em detrimento de operário ou de agricultor; de menor de
18 (dezoito) anos ou de deficiente mental, interditado ou não.

Assim, além das sanções administrativas previstas,


existe pena de detenção de seis meses a dois anos para quem cobrar juros acima
do legalmente admitido.

O artigo 44 em seu § 7º, da Lei nº 4.595, De 31 de


dezembro de 1964, e o artigo 16 Lei 7.492 de 16 de junho de 1.986 dispõe para
quem praticar atos privativos de instituições financeiras:

Art. 44. As infrações aos dispositivos desta lei sujeitam as


instituições financeiras, seus diretores, membros de
conselhos administrativos, fiscais e semelhantes, e gerentes,
às seguintes penalidades, sem prejuízo de outras
estabelecidas na legislação vigente:

(...)

§ 7º Quaisquer pessoas físicas ou jurídicas que atuem como


instituição financeira, sem estar devidamente autorizadas
pelo Banco Central da Republica do Brasil, ficam sujeitas à
multa referida neste artigo e detenção de 1 a 2 anos, ficando
a esta sujeitos, quando pessoa jurídica, seus diretores e
administradores

(...)

Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com


autorização obtida mediante declaração (Vetado) falsa,
instituição financeira, inclusive de distribuição de valores
mobiliários ou de câmbio:

Pena - Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

A empresa de factoring que praticar quaisquer atos


exclusivos de instituições financeiras, sendo empréstimos, desconto de
duplicatas, entre outros, estarão sujeitos seus diretores e administradores a
51

detenção de um a dois anos, bem como, multa, ou ainda, pena de reclusão de um


a quatro anos, conforme lei 7.492/86.

E finalmente o Código Penal Brasileiro em seu artigo


160:

Extorsão indireta

Art. 160 - Exigir ou receber, como garantia de dívida,


abusando da situação de alguém, documento que pode dar
causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra
terceiro:

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

Destarte, vê-se que várias são as sanções previstas


para quem praticar atos exclusivos de instituições financeiras, bem como aquele
que cobrar juros além do legalmente permitido, incorrendo, assim, em infrações
penais e cíveis as empresas de factoring que dessa forma procederem.

3.5. A JURISPRUDÊNCIA CATARINENSE E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE


JUSTIÇA ACERCA DO DESVIRTUAMENTO DAS OPERAÇÕES DE
FACTORING

Quanto à jurisprudência sobre o desvirtuamento do


contrato de factoring no Brasil, pode-se obter vários posicionamentos, tanto no
âmbito do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, quanto no Superior
Tribunal de Justiça. Sendo que no STJ, colhe-se o que segue:

COMERCIAL - "FACTORING" - ATIVIDADE NÃO


ABRANGIDA PELO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL -
INAPLICABILIDADE DOS JUROS PERMITIDOS AS
INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS.
I - O "FACTORING" DISTANCIA-SE DE INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA JUSTAMENTE PORQUE SEUS NEGOCIOS
NÃO SE ABRIGAM NO DIREITO DE REGRESSO E NEM
NA GARANTIA REPRESENTADA PELO AVAL OU
52

ENDOSSO. DAÍ QUE NESSE TIPO DE CONTRATO NÃO


SE APLICAM OS JUROS PERMITIDOS AS INSTITUIÇÕES
FINANCEIRAS. E QUE AS EMPRESAS QUE OPERAM
COM O "FACTORING" NÃO SE INCLUEM NO AMBITO
DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL.
II - O EMPRESTIMO E O DESCONTO DE TITULOS, A
TEOR DE ART. 17, DA LEI 4.595/64, SÃO OPERAÇÕES
TIPICAS, PRIVATIVAS DAS INSTITUIÇÕES
FINANCEIRAS, DEPENDENDO SUA PRATICA DE
AUTORIZAÇÃO GOVERNAMENTAL.
III - RECURSO NÃO CONHECIDO. 116

No presente caso, houve uma execução de notas


promissórias emitidas para empresa de factoring, em substituição de duplicadas
que foram descontadas e canceladas, sendo que, a empresa de factoring
executou as notas promissórias, e, a empresa emissora das mesmas, ajuizou
embargos a execução, sendo estes em primeiro grau julgados improcedentes,
conseguindo em segundo grau, a empresa emissora das duplicatas reverter tal
decisão, a empresa de factoring, inconformada com tal decisão, ajuizou recurso
especial junto ao Superior Tribunal de Justiça.

O ministro relator deste processo justificou seu voto


com base no artigo 17 da lei 4.595/64, sendo que, os atos de desconto de
duplicadas e cobrança de juros, e, direito de regresso na cobrança de duplicatas,
são privativos de instituições financeiras, dessa forma a turma julgadora do
Superior Tribunal de Justiça, não conheceu o recurso aforado pela empresa de
factoring.

No Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, se


encontra o seguinte entendimento:

APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS DO DEVEDOR - NOTA


PROMISSÓRIA - TÍTULO EMITIDO EM FAVOR DE
EMPRESA DE FACTORING - NECESSIDADE DE
DEMONSTRAÇÃO, NA INICIAL DA EXECUÇÃO, DA

116STJ, Recurso Especial 119705/RS, 1997/0010587-3, Relator, Ministro WALDEMAR ZVEITER,


3ª Turma, em 07/04/1997.
53

ORIGEM DA DÍVIDA - EMBARGOS JULGADOS


IMPROCEDENTES - SENTENÇA REFORMADA - APELO
PROVIDO PARA ACOLHER OS EMBARGOS E DECLARAR
EXTINTA A EXECUÇÃO Não sendo instituição financeira,
lhe é vedada toda e qualquer prática comercial não
relacionada à atividade específica, pelo que "A sociedade
de factoring, quando ajuizar execução contra o possível
emitente do título de crédito, deverá comprovar que este
decorreu efetivamente de uma venda mercantil ou de
uma prestação de serviços, sob pena de a ação ser
julgada improcedente; a cobrança judicial pela sociedade
de factoring de cheques que não decorram efetivamente de
uma venda mercantil fica prejudicada" (Apelação Cível n.
199.012778-8, da Capital, rel. Des. Alcides Aguiar). 117

No acórdão em apreço, a empresa de factoring, ajuizou


ação de execução de notas promissórias dadas em garantia por pessoa física
para desconto de cheques de seu estabelecimento comercial, e, esta última
aforou ação de embargos a execução que foi julgada improcedente pelo juízo a
quo. Inconformada com a decisão a executada interpôs recurso de apelação.

A decisão do relator da apelação em analise, foi


fundamentada na vedação de empresas de factoring atuar como instituições
financeiras, bem como, na falta de comprovação da prestação de serviços da
empresa de factoring para que houvesse a execução dos títulos em discussão.

Dessa forma, a turma deu provimento ao recurso de


apelação da decisão que julgou improcedente os embargos a execução.

APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO -


FACTORING - INSTRUMENTO PARTICULAR DE
TRANSAÇÃO E CONFISSÃO DE DÍVIDA - ORIGEM EM
VENDA MERCANTIL OU PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
NÃO COMPROVADOS - JULGAMENTO CONVERTIDO EM
DILIGÊNCIA - DEFEITO NÃO SANADO -
IMPOSSIBILIDADE DE EQUIPARAÇÃO DAS
OPERAÇÕES DE FACTORING ÀQUELAS PRIVATIVAS
DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS - VEDAÇÃO À

117
TJSC, Apelação Cível nº 2004.017311-3, Relator Desembargador Paulo Roberto Camargo
Costa, em 27/07/2006.
54

TUTELA JURISDICIONAL ANTE A ILEGITIMIDADE DO


CRÉDITO EXECUTADO - INSTRUMENTO DE CONFISSÃO
DE DÍVIDA SEM A RESPECTIVA JUNTADA DOS TÍTULOS
OBJETO DE COMPRA E VENDA OU DA
CORRESPONDENTE DEVOLUÇÃO AO TEMPO DO
PACTO DE RENEGOCIAÇÃO - INTELIGÊNCIA DO
ARTIGO 17 DA LEI N. 4.595/64 ALTERADO PELO ARTIGO
1o DA LEI N. 7.492/86 - FALTA DE LIQUIDEZ E CERTEZA
DOS TÍTULOS EXECUTIVOS - NULIDADE DA EXECUÇÃO
- EXEGESE DOS ARTIGOS 586 E 618, INCISO I, AMBOS
DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - AUSÊNCIA DA
ADEQUAÇÃO DA TUTELA NA MODALIDADE DE
INTERESSE DE AGIR - ARTIGO 267, INCISO VI, DO
CÓDIGO DE RITOS - EXECUÇÃO EXTINTA - RECURSOS
PREJUDICADOS. Não há aceitar que a operação comercial
realizada entre a empresa de factoring e seus clientes seja
realmente a obtenção de direitos de crédito que
correspondem à compra e venda de mercadorias a terceiros
ou de prestação de serviço quando inexistem provas ou
sequer indícios atestando a ocorrência do factoring
propriamente dito, remanescendo, portanto, dúvida sobre
a origem da obrigação, o que torna ilíquido e incerto o
título executivo. O procedimento execucional deve ser
instruído com o título líquido, certo e exigível do crédito que
se busca satisfazer, a teor do preceituado pelo artigo 586 do
Código de Processo Civil. Assim sendo, a execução do
contrato de confissão de dívida representativo da compra e
venda de faturamento, derivado de títulos autônomos
emitidos por clientes da empresa faturizada, impõe ao factor
o dever de anexar aos autos os instrumentos que deram
origem à dívida, ou prova de sua restituição à empresa
faturizada, sob pena de eventual pagamento representar um
enriquecimento. Não atendidas essas exigências, é nula a
execução, conforme disciplinado no artigo 618, inciso I, do
mesmo Código. 118

O presente caso se trata de uma apelação interposta


em embargos de execução, o qual foi julgado improcedente, sendo que este teve
origem de uma ação de execução de contrato de confissão de dívida, de duas
pessoas físicas com uma empresa de factoring.

118 TJSC, Apelação Cível nº 2002.017623-6, Relator Desembargador Fernando Carioni, em


16/06/2005.
55

O relator deste caso baseou sua decisão na falta de


liquidez do contrato de confissão de dívida, pois não foi comprovada pela
empresa de factoring, a prestação dos serviços inerentes a sua seara, dessa
forma, havendo dúvida sobre a origem da obrigação, e, sendo o título executivo
ilíquido e incerto, o relator julgou extinta a ação de execução interposta pela
empresa de factoring.

EMBARGOS À EXECUÇÃO FUNDADA EM CHEQUES


EMITIDOS COMO GARANTIA DE MÚTUO FENERATÍCIO.
APELAÇÃO INTERPOSTA PELO EXECUTADO/AVALISTA -
ARGÜIÇÃO DE PRÁTICA DE AGIOTAGEM - PRESENÇA
DE ELEMENTOS NOS AUTOS QUE REMETEM À
AUSÊNCIA DE LIQUIDEZ DOS TÍTULOS POSTOS EM
COBRANÇA - CÁRTULAS DESPROVIDAS DE FORÇA
EXECUTIVA - NULIDADE (ART. 618, I, DO CPC) -
EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO EXPROPRIATÓRIO -
INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO
ADESIVO DO EXEQÜENTE INTENTADO COM O FIM
EXCLUSIVO DE MAJORAR A VERBA HONORÁRIA
ARBITRADA NA SENTENÇA - EXAME PREJUDICADO EM
DECORRÊNCIA DA EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO
EXPROPRIATÓRIO.119

Colhe-se desde acórdão:

No ponto, vale ressaltar que o rigorismo do tratamento


conferido às operações desenvolvidas por pseudo-
empresas factoring não contraria ou desconstitui o
entendimento desta colenda Câmara, que admite a
legitimidade da obrigação pecuniária decorrente de
mútuo feneratício entre particulares, mesmo quando há
comprovação da cobrança de juros usuários, restringindo
tão-somente a cobrança desse encargo a 12% ao ano, pois,
enquanto na primeira hipótese, está-se diante da prática
comercial que se aproxima aos lindes da ilicitude, e
assim, o título expedido representa mera simulação de
uma prática comercial que de fato não está sendo

119
TJSC, Apelação Cível nº 2000.011056-6, Relator Desembargador Gastaldi Buzzi, em
24/04/2004.
56

desenvolvida e, já na segunda hipótese, se cuida excesso


passível de balizamento, sem prejuízo da legalidade da
obrigação subjacente de empréstimo. 120

O caso em tela teve origem em ação de execução de


título executivo extrajudicial, sendo estes, cheques, que foram dados em garantia
de empréstimo. O avalista, também executado, interpôs embargos à execução,
sendo estes julgados improcedentes. Inconformado com a decisão o executado
ajuizou recurso de apelação.

O relator do presente caso norteou seu voto na falta de


força executiva dos títulos ora ajuizados, pois, estes tratam-se de mera simulação
de relação comercial, sendo que, a constatação realizada pelo relator em analise
ao material probatório dos autos, foi a realização um contrato de empréstimo,
dessa forma, a empresa de factoring não tem autorização governamental para
praticar tais atos. Assim sendo, a câmara, por votação unânime, extinguiu a ação
de execução que deu origem a presente demanda.

Observa-se das ementas acima destacadas que, além


da incidência da lei da usura, nos casos em que empresas de factoring cobram
juros acima do permitido legalmente, os Tribunais tem se manifestado quanto à
execução de títulos, contratos ou quaisquer garantias dadas a empresas de
factoring, sendo que, se não comprovarem que a origem de tais títulos são de
prestação de serviço conforme previsto no §1º, III, d da Lei 9.249 de 26 de
dezembro de 1995, estes são inexigíveis, pois não preenchem os requisitos do
artigo 586 do Código de Processo Civil.

120 TJSC, Apelação Cível nº 2000.011056-6, Relator Desembargador Gastaldi Buzzi, em


24/04/2004.
57

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a produção do presente trabalho se constata que, o


serviço de factoring, em sua essência, por ser abrangente, no assessoramento de
empresas de pequeno e médio porte, se torna, importantíssimo para o
crescimento e desenvolvimento sustentável destas.

Foram levantadas as seguintes hipóteses:

ü As empresas de factoring não podem praticar descontos de


duplicatas nem antecipações de faturamentos, pois estes atos são
exclusivos de instituições financeiras.

ü As responsabilidades inerentes às companhias de factoring e


bancos sobre os juros remuneratórios cobrados em suas operações os
quais são mensurados conforme o risco da operação e assim as
factorings e bancos assumem todo o risco da operação e dos títulos
comprados ou do faturamento adiantado, não tendo seus vendedores
qualquer responsabilidade sobre este.

ü Existem sanções penais para empresas que atuam como se fossem


instituições financeiras, cometendo estas, crime contra o sistema
financeiro nacional.

Todas as hipóteses levantadas foram confirmadas, pois, não


podem empresas de factoring praticar atos exclusivos de instituições financeiras,
como, antecipação de faturamentos, desconto de duplicatas e outros, sendo que,
os contratos de factoring que assim versarem são nulos e inexigíveis.

Quanto as responsabilidades inerentes as empresas de


factoring sobre os juros cobrados em suas operações, observou-se que, factoring,
não pode cobrar juros, sendo a contraprestação de seus serviços o deságio, e, a
cobrança de juros remuneratórios por desconto de títulos executivos, constitui ato
exclusivo de instituições financeiras, sendo que, as empresas de factoring que
praticarem tais atos, estarão sujeitas a sanções penais por usura, e crime contra o
sistema financeiro
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O factoring, como é praticado atualmente, travestido de


instituição financeira, exercendo atividade exclusiva destas, além de ilegal, nada
contribui para o desenvolvimento das empresas tomadoras de seus serviços,
pois, além de locupletarem à custa da difícil situação das empresas de pequeno e
médio porte, que em razão de não terem cadastro para operarem com instituições
financeiras, não prestam os serviços inerentes à sua seara.
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