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HUNTINGTON, S. P., O Que?

In: ______ A terceira onda: a democratização no final do século


XX. São Paulo: Ática, 1994.

O Início da Terceira Onda


pp.13
A terceira onda de democratização no mundo moderno em 25 de abril (1974), em Lisboa, Portugal
quando unidades militares levaram adiante os planos para um golpe de Estado (Revolução dos
Cravos). O golpe foi levado com eficiência e sucesso, e com resistência mínima da polícia de
segurança. Assim morreu a ditadura (de Marcelo Caetano) que havia nascido de um golpe militar
semelhante, em 1926 (golpe liderado por Antônio Salazar).

pp.14
O golpe foi o começo de um amplo movimento mundial na direção da democracia (ainda que
involuntário) por que é mais frequente os golpes de Estado derrubarem do iniciarem os regimentos
democráticos. O levante revolucionário em Portugal parecia, uma repetição da Rússia de 1917.

pp. 15
No entanto Portugal se revelou diferente da Rússia. A democracia triunfou. Portugal não foi o único,
outras agitações democráticas menos óbvias se agitavam em outros lugares. Em 1973, membros do
governo Médice, no Brasil, já preparavam a distensão, ou “descompressão” política, e em 1974, o
general Ernesto Geisel a implementou. Na Espanha o primeiro-ministro Carlos Arias levou com
cautela, a ditadura de Franco numa direção libertadora. Na Grécia, aumentavam as tensões no
regime dos coronéis, o que levou a queda em 1974. Nos 15 anos seguintes a onda democracia
assumiu âmbito global: cerca de 30 países passaram do autoritarismo para a democracia.

O Significado da Democracia
pp.16
O significado de democracia remonta aos filósofos gregos. Seus usos modernos, entretanto, data
dos levantes revolucionários na sociedade ocidental no final do século XVIII. Em meados do século
XX três significados surgem nos debates: como forma de governo, propósitos de governo e
procedimentos para a constituição do governo. O procedimento central da democracia é a seleção
de líderes, através de eleições competitivas, pelo povo que governam. Segundo Schumpeter (“teoria
clássica de democracia) ela é a “vontade do povo” (fonte) o “bem comum” (propósito). Para ele o
“método democrático” é o arranjo institucional para se chegar a decisões políticas em que os
indivíduos adquirem poder de decidir através de uma luta competitiva pelos votos do povo.

pp.17
No presente estudo um sistema político do século XX é democrático na medida em que nele seus
principais tomadores de decisões coletivas sejam selecionados através de eleições periódicas,
honestas e imparciais em que os candidatos concorram livremente pelos votos e em que toda a
população adulta tenha direito de voto. Para Robert Dahl (democracia realista ou Poliarquia) implica
também a existência das liberdades civis de expressão, publicação, reunião e organização
necessárias para o debate político e para a realização de campanhas eleitorais. Ela envolve duas
dimensões: contestação e participação. (“Curva de nível” de Dahl=avaliação). Um sistema é não
democrático na medida em que a oposição não tem permissão de participar das eleições, seja
reprimida ou hostilizada nas ações que poderia realizar.

pp.18-19
O ponto crítico no processo de democratização é a substituição de um governo que não foi escolhido
deste modo, por um outro, selecionado através de eleições abertas, livres e imparciais.
pp.19
A definição de democracia em termos de eleições é uma definição mínima. Governos escolhidos
podem se tornar indesejáveis, mas não os tornam não-democráticos. A democracia é uma virtude
pública, mas só pode ser entendida dessa forma se a democracia for claramente separada de outras
características dos sistemas políticos.

pp.20
Na medida em que os mais poderosos tomadores de decisão (no caso de governantes marionetes)
não sejam eleitos, o sistema político não é democrático. Na democracia os tomadores de decisão
não exercem total poder, eles o partilham com outros grupos da sociedade. Democracias são
estáveis e institucionalizadas. No entanto elas podem ser mais ou menos democráticas ou mais ou
menos estáveis.

pp.21
Tratar Democracia e não-democracias como termos dicotômicos servem melhor ao interesse de se
estudar a transição de um regime não-democrático para um democrático. O presente estudo entende
que existem casos intermediários – “as semidemocracias”. Regimes autoritários não tem competição
eleitoral nem ampla participação na votação.

O Significado da Democracia
pp.22
Regimes totalitários (nascidos no século XX) tem como características: um partido único,
normalmente liderado por uma pessoa, polícia secreta poderosa e extensa, ideologia altamente
desenvolvida que descreve uma sociedade ideal, penetração governamental e controle da
comunicação de massa e de todas ou maior parte das organizações econômicas e sociais. Um
sistema autoritário tradicional é caracterizado por um líder único ou um pequeno grupo de líderes
(oligarquia), nenhum partido ou partidos fracos, nenhuma mobilização de massa, possivelmente uma
mentalidade, mas nenhuma ideologia, governo limitado, pluralismo político limitado, não responsável
e nenhuma tentativa de refazer a sociedade. Para fins semântico o estudo usa “autoritarismo” para
todo sistema não-democrático.

pp.23
A democracia moderna e a da nação-Estado e seu surgimento está associado ao desenvolvimento
da nação-Estado. Em 1900, tais instituições existiam em muitos poucos países. No final do século
XX muitos outros países possuíam instituições democráticas. Tais instituições surgiram em ondas de
democrátizações. Uma onda de democratização é um grupo de transições de regimes não-
democráticos para democráticos, que ocorrem em um período específico e que significativamente
são mais numerosas do que as transições na direção oposta durante tal período. Ondas
normalmente também envolvem liberalização ou democratização parcial. Três ondas ocorreram no
mundo moderno, cada uma delas afetaram um número pequeno de países e apresentaram a
transição de outros para não-democráticos no mesmo período. Nem todas as transições
democratizantes aconteceram em uma onda. A história não é unidimensional. A cada uma das duas
primeiras ondas de democratização se seguiram ondas reversas.
pp.25
A primeira onda de democratização teve suas origens nas revoluções americana e francesa, mas o
surgimento de instituições realmente democráticas nacionais é um fenômeno do século XIX.

pp.26
Os critérios que definiam um regime democrático no século XIX resumiam-se em apenas dois: a)
50% dos homens adultos com direito a voto e b) um executivo com apoio majoritário de um
parlamento eleito ou escolhido por eleições populares periódicas. Segundo esses critérios, os
Estados Unidos já eram considerados democráticos desde o ano de 1828. Nos anos seguintes
outros países ampliaram o sufrágio, introduziram o voto secreto e aumentaram a responsabilidade
dos governantes em relação à sociedade. A Suíça, França e Grã-Bretanha tornaram-se países
democráticos antes do final do século. Pouco depois da Primeira Guerra, a Itália e a Argentina
implementaram regimes democráticos em seus territórios e, na década de 30, o Chile e a Espanha
trilharam o mesmo caminho. No decurso de cem anos, mais de trinta países estabeleceram
instituições democráticas nacionais mínimas.

pp.26-27
A primeira onda reversa iniciou-se no momento em que o senso comum entendia a democracia
como uma tendência natural resultante do progresso social. Todavia, o desenvolvimento político
compreendido entre 1920 e 1930 provocou o distanciamento da democracia, acarretando o retorno
às formas autoritárias de governo tradicionais ou totalitaristas.

pp.27
As reversões aconteceram em países que haviam implementado a democracia poucos antes ou logo
depois da Primeira Guerra Mundial. A ascensão de Mussolini no governo italiano marcou o início da
primeira onda reversa e, poucos anos depois, as frágeis democracias da Lituânia, Polônia e Letônia
foram derrubadas por golpes militares. A conquista do poder por Hitler, erodiu a democracia alemã,
provocou o fim da democracia austríaca no ano seguinte e derrubou o governo democrata tcheco em
1938. A democracia grega, já debilitada por disputas internas, encontrou seu final em 1939. O
governo português sucumbiu a um golpe militar em 1926. O Uruguai voltou ao autoritarismo em 1936
e, as políticas domésticas do Brasil e da Argentina conviveram com golpes militares durante o ano
de 1930. Na Espanha, um golpe militar desencadeou uma guerra civil em 1936 e, em 1939, a
República espanhola estava definitivamente enterrada.

pp.28
A segunda onda de democratização iniciou-se com a Segunda Guerra Mundial, mas teve breve
duração quando comparada à primeira onda democratizadora. A vitória dos Aliados e a consequente
ocupação de território, promoveu a inauguração de instituições democráticas na Alemanha
Ocidental, Japão, Áustria, Itália e Coréia. Ao final da década de 1940, Turquia, Brasil, Grécia, Costa
Rica retornaram à democracia. Entre os anos de 1945-1946, a Argentina, Peru, Colômbia e
Venezuela, convocaram eleições e implementaram governos eleitos pelo povo. A descolonização
que se seguiu à Segunda Guerra fez surgir diversos novos países e, em muitos deles, não foi
despendido qualquer esforço no sentido de introduzir instituições democráticas em seus territórios.
No Paquistão, a democracia nunca encontrou raízes sólidas e foi abolida em 1958. A Indonésia teve
uma conturbada democracia parlamentar entre 1950 e 1957. Em outros Estados novos a democracia
durou pouco mais de uma década, como nos casos da Índia, Filipinas e Israel.

pp.28-29
A segunda onda reversa originou-se nos anos 1960, sendo as transformações mais relevantes
aquelas ocorridas na América Latina. O retorno ao autoritarismo iniciou-se no Peru em 1962, quando
militares intervieram a fim de modificarem o resultado das eleições. Em 1963 foi eleito um civil, mas
acabou deposto pelos militares peruanos em 1968. No ano de 1964 ocorreram golpes militares no
Brasil e na Bolívia, com a Argentina seguindo o mesmo exemplo em 1966, seguindo-se o Equador
em 1972. No Chile e no Uruguai os militares tomaram o poder em 1973.

pp.29
Na Ásia, em diversos países, os militares também impuseram regimes autoritários. O regime
democrático da Coréia foi solapado por um golpe militar em 1960. Em 1957, a Indonésia substituiu a
democracia parlamentar pela democracia dirigida que, por sua vez, foi derrubada e substituída por
um regime militar autoritário. As Filipinas retornaram ao autoritarismo em 1972. Em 1975 foi a vez da
Índia suspender as práticas democráticas em seu território. Na Grécia a democracia ruiu depois de
um golpe de Estado em 1965 e de um golpe militar em 1967. Militares turcos tomaram o governo em
1960 e restauraram a autoridade de um governo eleito em 1961. Uma nova intervenção turca
ocorreu em 1971, permitindo a instalação de um governo eleito em 1973, mas em 1980, os militares
levaram a cabo uma tomada militar total.

pp.30
A grande maioria dos países que se tornaram independentes depois da Segunda Guerra, situava-se
na África e, em sua quase maioria, submeteram-se a regimes não-democráticos. O único país que
permaneceu com um regime democrático foi Botsuana. Os outros trinta e três países passaram a ser
regidos por governos autoritários. O movimento global de afastamento da democracia nos anos 1960
e princípio dos anos 70 provocou um profundo pessimismo quanto a aplicação de democracias nos
países em desenvolvimento, além de contribuírem para o aumento da preocupação quanto a
viabilidade e funcionalidade de um regime democrático nos países desenvolvidos.

pp.30-31
A terceira onda de democratização começou a manifestar-se na Europa meridional. Ao final da
década de 1970, a onda democrática propagou-se para a América Latina. Em 1977, os militares
equatorianos iniciaram sua retirada do poder e, em 1978, uma nova constituição foi elaborada. No
Peru, a afastamento dos militares permitiu a eleição de uma Assembleia Constituinte em 1978 e a
elaboração de uma nova constituição em 1979. Na Bolívia, a saída dos militares do governo produziu
um ambiente político confuso que se estabilizou somente em 1982, com a eleição de um
representante civil.

pp.31
A derrota do governo Argentino na Guerra das Malvinas resultou na eleição de um civil em 1983. O
Uruguai retornou à prática democrática em 1984, quando elegeu um presidente civil. Também em
1984, o Brasil elegeu o primeiro presidente civil desde 1964. (Em 1988, o povo chileno decidiu, em
um plebiscito, acabar com o domínio autoritário do general Augusto Pinochet.)

pp.32
O mesmo movimento espalhou-se em países da América Central. Honduras empossou um
presidente civil em 1982, enquanto El Salvador elegeu um novo presidente depois de uma eleição
intensamente disputada. A Guatemala elegeu uma Assembleia Constituinte em 1984 e um
presidente civil em 1985. Na África e no Oriente Médio o impacto da terceira onda democratizante foi
limitado. Em 1979, a Nigéria passou a ter um governo eleito que, entretanto, foi deposto em 1984.
Em 1978, a África do Sul começou a reduzir a política de segregação racial e expande a participação
para minorias não-brancas, embora a maioria negra continuasse excluída das decisões políticas do
país. Somente em 1990, novas negociações foram iniciadas com a intenção de transformar a
realidade política sul-africana. A o final da década de 1980 e a década seguinte, 1990 verá ruir o
socialismo científico em todo o leste europeu até que finalmente a onda atinge a URSS levando ao
seu desaparecimento.
As questões da democratização
pp. 35
Todos os estudos que buscaram entre as décadas de 1950 e 1960 estudar as inadequações da
democracia nos países pobres, as vantagens do autoritarismo para a ordem pública, como o
crescimento e desenvolvimento econômico prolongavam governos autoritários burocráticos e as pré-
condições para a democratização, aumentaram o conhecimento disponível dos processos de
democratização e a compreensão geral desses processos.

pp.35-36
Na década de 1980, as transições democráticas aumentaram o otimismo quanto as perspectivas da
democracia. O socialismo foi visto como um “grande fracasso” o que pareceu a imperturbável vitória
do liberalismo.

pp. 36
Afinal existe uma tendência global, fundamentalmente irreversível e longa, como propõem
Tocqueville e Bryce para a extensão de sistemas políticos democráticos pelo mundo? A forma de
governo não é a única coisa importante num país, nem mesmo a mais importante. A distinção entre
ordem e anarquia é.

pp. 37
A democracia política está diretamente ligada a liberdade do indivíduo. De um modo geral a
correlação entre existência de liberdade individual é muito alta. O efeito a longo prazo das operações
políticas democráticas é ampliar as liberdades individuais. A liberdade é uma virtude peculiar a
democracia. Democracia são raramente violentas, permitem o espaço para dissidência e da
oposição ao sistema. A democracia contribui para a estabilidade, mudanças raramente acontecem
da noite para o dia. A democracia é mais imune a levantes revolucionários.

pp.37-38
A democracia tem implicações nas relações internacionais. No século XX, desde 1990, democracias
não lutaram guerras contra outras democracias. Desta forma se este processo continuar teremos
algumas zonas de paz no mundo.

HUNTINGTON, S. P., Por que? In: ______ A terceira onda: a democratização no final do século
XX. São Paulo: Ática, 1994.

Explicação para as ondas


pp.40
Ondas de democratização e ondas reversas são manifestações de
um fenômeno mais geral em política, que ocorrem em certas
épocas históricas de maneira mais ou menos simultânea em
diferentes países/sistemas políticos. O problema é identificar as
possíveis causas de ondas como estas na política.

pp.41
Considerando-se democratização como x, o que poderia ter
causado o desencadeamento de xx? Causa única: todos os xx
tem uma causa única (A) que ocorreu à parte dos acontecimentos
em cada um dos países analisados. Essa causa única é um
acontecimento importante que tenha impacto sobre muitas outras sociedades. Exemplo: Segunda
Guerra Mundial (A) – América Latina (XX).

pp. 41
Desenvolvimento paralelo: os xx podem ser causados por
desenvolvimentos semelhantes nas mesmas variáveis
independentes (a1, a2, etc) manifestando-se mais ou menos
simultaneamente em todos os países analisados. Exemplo: um
país tende a ser democrático quando atinge certo
desenvolvimento econômico; o progresso democrático é
causado por algo interno e particular de tal país, mas causas
semelhantes podem estar em ação simultaneamente (ou quase)
em outros países produzindo mesmos resultados.

pp.42
Bola-de-neve (snowballing): uma causa única (a1) em um país
pode causar x1 nesse mesmo país, mas a partir daí x1 pode causar eventos comparáveis em outros
países, que podem sofrer o efeito bola-de-neve. Isso porque o acontecimento x em um país é cada
vez mais capaz de disparar um evento comparável quase simultaneamente em um país diferente.

pp.42-43
Panaceia predominante (prevailing nostrum): causas imediatas
do acontecimento x em diferentes países pode ser
significativamente diferentes, entretanto podem provocar uma
resposta comum, caso as elites dos diferentes países partilharem
uma crença comum na eficácia daquela resposta (panaceia). As
causas individuais específicas (a1, b2, c3, etc) de mudança política agem sobre um conjunto comum
de crenças políticas (zeigeist) produzindo respostas semelhantes.

pp.43-44
Explicação para as ondas de democratização
Variável dependente deste estudo: democratização. Objetivo do estudo: explicar por que alguns
países autoritários tornaram-se democráticos num determinado período de tempo, com foco
na mudança do regime.

pp.44
Para explicar uma mudança na variável dependente, precisamos de alguma forma de mudança na
variável independente, no entanto a mudança na variável independente pode tomar a forma de
persistência dessa mesma variável. Assim, o efeito cumulativo da variável independente ao longo do
tempo acaba produzindo mudanças na variável dependente. A variável dependente não é apenas
dinâmica, mas também complexa. O fatores que levam ao fim de um regime não-democrático podem
diferir significativamente dos que levam à criação de um regime democrático.

pp.44-45
A democratização envolve: 1) o fim de um regime autoritário; 2) a instalação de um regime
democrático; 3) a consolidação do regime democrático; sendo que esses desenvolvimentos podem
ter causas diferentes e contraditórias.

pp.45
A análise da variável independente “causas possíveis da democratização” também apresenta
problemas. Por que as elites políticas alteram/derrubam regimes autoritários e instalam
democráticos? A variável explicativa mais importante diz respeito às crenças e ações das elites
políticas, porém não é satisfatória, já que a democracia poderia ser criada mesmo que as pessoas
não quisessem. A distinção entre variável independente e variável dependente fica mais clara
quando são de ordens diferentes, por exemplo usar uma variável econômica para explicar uma
variável política.

pp.45-46
O problema da sobredeterminação (múltiplas teorias para explicar um acontecimento e a
problemática de se estabelecer a validade relativa destas) não existe para quem está preocupado
em explicar os acontecimentos. Para ocorrer historicamente, um acontecimento quase tem que ser
teoricamente sobredeterminado, o que acontece claramente com a democratização.

pp.46-47
Variáveis que se acredita que contribuam para a democracia e para a democratização: alto
nível global de riqueza econômica, distribuição de renda, economia de mercado, desenvolvimento
econômico e modernização social, aristocracia feudal em algum ponto da história, ausência de
feudalismo, burguesia forte, classe média forte etc.

pp.47
Cada variável e cada teoria, entretanto, muitas vezes têm relevância apenas para um pequeno
número de casos. Não adianta buscar uma variável independente comum (universalmente presente)
para explicar o desenvolvimento político em países tão diferentes, isso porque as causas da
democratização diferem substancialmente de um lugar/momento pra outro. Existe uma cadeia de
causação, além de fatores internacionais, sociais, econômicos, culturais e políticos, todos em
operação, ora conflitivos ora convergentes, para a criação da democracia ou a sustentação do
autoritarismo, por isso as causas da democratização são variadas e seu significado no tempo
também tende a variar bastante.

pp.48-49
Principais causas da primeira onda de democratização: desenvolvimento econômico e social,
ambiente econômico e social das colônias de povoamento britânicas e vitória dos Aliados na I
Guerra Mundial. Principais causas da segunda onda de democratização: predomínio de fatores
políticos e militares, podendo dividir os países em três categorias – 1) aliados impuseram a
democracia (Alem. Ocid., Itália, Japão, Coreia do Sul etc); 2) moveram-se na direção democrática
em razão da vitória dos Aliados (Grécia, Turquia, Brasil, Colômbia etc); 3) enfraquecimento dos
Estados ocidentais e o crescente nacionalismo nas colônias desencadeou o processo de
descolonização, muitos adotando a democracia.

Explicação para a terceira onda

pp.49-50
Por que cerca de 30 países com regimes autoritários mudaram para sistemas democráticos, mas
aproximadamente 100 outros não? Devemos analisar as histórias de mudanças de regime nestes
países.

pp.50
Padrões de mudança de regime, considerando-se A (regimes autoritários), D (regimes democráticos)
estáveis e duradouros e “a” e “d” para regimes menos estáveis e de curta duração: 1. padrão cíclico
(a – d – a – d – a – d): América Latina (Argentina, Brasil, Peru, Bolívia e Equador), Turquia e Nigéria
– a mudança de regime desempenha, assim a mesma função que a mudança de partido num
sistema democrático estável. O país não alterna entre sistemas políticos democráticos e autoritários:
a alternância é o sistema político do país.
pp.51
2. segunda tentativa (A – d – a – D): Segunda
onda democrática na Europa (Alemanha, Itália,
Áustria, Japão, Venezuela, Colômbia) 3.
democracia interrompida (A – D – a – D): Índia,
Filipinas, Uruguai, Chile (década de 1970) –
tradição democrática pressionou a aberta ao voto e
acabaram por retornar ao regime democrático.

pp.51-52
4. transição direta (A – D): típico da primeira onda

pp.52
5. padrão de descolonização (D/a – D): quando uma antiga metrópole democrática impõem
instituições democráticas as suas colônias e essas permanecem assim.

pp.53
Por que as mudanças ocorreram entre 1970 e 1980 e não em outra época? Mudanças nas variáveis
independentes plausíveis, nos anos 1960 e 1970, produziram a variável dependente “mudanças para
regime democrático” nos anos 1970 e 1980. Quais foram essas mudanças?

pp.54
1. aprofundamento dos problemas de legitimidade dos sistemas autoritários num mundo
onde valores democráticos eram amplamente aceitos e o solapamento desta por derrotas
militares, fracassos econômicos e os choques do petróleo (1973-74 e 1978-79).
2. crescimento econômico global sem precedentes na década de 1960, elevando padrão
de vida, aumentando nível de instrução e expandindo a classe média urbana em muitos
países;
3. profundas mudanças na doutrina e atividades da Igreja católica: transformação das
igrejas nacionais, passando de defensoras do status quo a opositoras.
4. mudanças nas políticas de atores externos: nova atitude da CE (1960), mudança na
política externa americana a partir de 1974, política de Gorbatchev no final dos anos 1980.
5. efeitos bola-de-neve, possibilitados pelos novos meios de comunicação internacional,
das primeiras transições para democracia na terceira onda, estimulando e fornecendo
modelos para mudanças de regime em outros países.

O declínio da legitimidade e o dilema do desempenho


pp. 55
“O mais forte nunca é forte o bastante para ser sempre o senhor, a não ser que transforme a força
em direito e a obediência em dever.” Rosseau. Nos tempos modernos o autoritarismo tem sido
justificado através do nacionalismo e pela ideologia. No entanto a eficácia destes dependem de um
inimigo verossímil. Pós Segunda Guerra Mundial passou a existir um ethos democrático que muitas
vezes foi utilizado para justificar ações claramente antidemocráticas.

pp.56
Muitos regimes autoritários dos anos 1970 enfrentaram problemas de legitimidade devido às suas
experiências democráticas prévias; isso levou muitos governantes autoritários a venderem uma
retórica democrática. O problema da legitimidade varia de acordo com o regime. Sistemas de partido
único produto de desenvolvimento nativo: ideologia e nacionalismo são utilizados conjuntamente pra
sustentar o regime. (Estados comunistas revolucionários, México e China), sistemas onde o
comunismo e o sistema de partido único foram impostos por forças externas: nacionalismo torna-se
empecilho e a ideologia inicialmente conferiu legitimidade, mas ao mesmo tempo foi um entrave ao
desenvolvimento econômico, afetando a legitimidade.

pp.57
A legitimidade das maiorias dos regimes declina com o tempo, porém na democracia há renovação
através das eleições, já nos regimes autoritários não há autorrenovarão, o que contribui para erodir
sua legitimidade. Em alguns casos, regimes autoritários desenvolveram mecanismos de renovação –
sucessão rotinizada – (México e Brasil), o que trazia alguns benefícios: 1) levava as principais figuras
do establishment a ter a esperança que da próxima vez que ascendessem o poder reduziriam as
turbulências ou tentativas de derrubar a liderança existente (cada novo presidente era uma
promessa); 2) a sucessão regular tornava possíveis e prováveis as mudanças políticas. (Seria o
governo de longa duração do PT o desencadeador do processo de mudança no PSDB?)

pp.58
Legitimidade negativa: inicialmente os regimes militares beneficiavam-se de uma legitimidade
negativa derivada dos fracassos do regime democrático anterior. Essa legitimidade declinava com o
tempo.

pp.59-60
Dilema do desempenho: os regimes autoritários (1960-1970) encaravam o desempenho como
principal fonte de legitimidade, assim os governantes perdiam legitimidade quando não satisfaziam
as expectativas de desempenho. O desempenho econômico insatisfatório, causa pelas duas crises
do petróleo (1974 e 1979) contribuiu para a crise dos regimes autoritários na década de 1970, pois
levou países como Peru e Filipinas a abandonarem suas promessas de reformas social e
econômica.

pp.61
As políticas adotadas pelos governos autoritários para lidar com as crises do petróleo e da dívida
pioraram a situação econômica dos países, logo, solaparam ainda mais a legitimidade do regime. Foi
o que aconteceu nas Filipinas, Argentina, Uruguai, Grécia, Portugal, Peru e Brasil.

pp.62-63
Os regimes comunistas não foram tão abalados com os acontecimentos da economia mundial,
embora Polônia e Hungria tivessem contraído altas dívidas. A estagnação econômica nesses
regimes, nos anos 1970-1980 é vista como resultada das economias de comando impostas pela
URSS e não foi suficiente pra provocar movimento na direção democrática. Fracassos militares
também contribuíram para queda/enfraquecimento de cinco regimes autoritários (1974-1989):
Portugal (que enfrentou a guerra colonial), Filipinas (oposição comunista), URSS (fracasso no
Afeganistão), Grécia e Argentina (Malvinas).

pp.63
Mas a legitimidade de um regime autoritário também era abalada quando ele cumpria suas
promessas, pois ao alcançar seu propósito, ele perdia seu propósito, já que as razões para se apoiar
o regime diminuíam dado os altos custos (ex. falta de liberdade etc). Caso da Argentina
(Montoneros) e Brasil (dado o estabelecimento da ordem, o regime foi forçado a se institucionalizar,
logo, levou a liberalização gradual). Como a legitimidade estava baseada no desempenho, os
regimes perdiam legitimidade quando não tinha bom desempenho e também quando apresentavam
um.

pp.63-64
Como os líderes respondiam à erosão da legitimidade?
 recusavam-se a reconhecer seu enfraquecimento, convictos de que se manteriam no
poder e porque havia fracos mecanismos de feedback na maioria dos regimes autoritários.
 respondia tornando-se mais repressivo, baseado na obediência obrigatória e mudando-
se a liderança. Caso da Grécia (1973), Argentina (1981), China (1989).
 provocar um conflito externo e recuperar a legitimidade pelo nacionalismo: isso
enfrenta um obstáculo, que é o fato de que as forças militares dos regimes militares estão
muito envolvidas na política, sem estrutura efetiva de comando para operações militares
externas. Casos da Grécia (1974) e Argentina (1982).
pp.65
 tentar dar uma aparência de legitimidade democrática ao regime: a maioria dos
regimes autoritários dos anos 1970 prometia restaurar a democracia em algum momento,
mas aí caíam no dilema das eleições e a imprevisibilidade do seu resultado.
 assumir a tarefa de liderar a transição para o sistema democrático, o que poderia exigir
primeiro uma mudança de liderança no interior do sistema autoritário.

pp.66
A queda da legitimidade de um regime autoritário não necessariamente leva imediatamente a um
regime democrático. Caso do Irã (1978) e Nicarágua (1979) que passaram de ditaduras
personalistas para outras formas autoritárias. Na África e outros lugares do Terceiro Mundo
ocorreram transições para regimes marxistas-leninistas. Na América Latina, ditaduras de direita
estimularam o movimento revolucionário de esquerda, contido pelos militares, mas que gerou uma
nova intelectualidade na esquerda pró-democracia.

Desenvolvimento econômico e crises econômicas


pp.67
Os fatores econômicos têm um impacto sobre a democratização, mas não são determinantes; assim,
não há um nível de desenvolvimento econômico que seja necessário ou suficiente para provocar a
democratização. As democratizações da terceira onda foram afetadas por alguns fatores
econômicos: 1. saltos nos preços do petróleo em uns países e restrições marxistas-leninistas em
outros provocaram turbulências econômicas que enfraqueceram os regimes autoritários. 2. no início
dos anos 1970 muitos países alcançaram níveis globais de desenvolvimento econômico que deram
base econômica para a democracia, facilitando a transição. 3. em alguns países o crescimento
econômico acelerado desestabilizou os regimes autoritários, forçando-os a liberalizar ou aumentar a
repressão.

pp.68
Há uma correlação, desenvolvida no séc. XIX, entre riqueza e democracia. “A maioria dos países
ricos é democrática e a maioria dos países democráticos, com exceção da Índia, é rica”. As
transições para a democracia ocorrem primeiramente em países situados em um nível médio de
desenvolvimento econômico.

pp. 68-69
Entre os países ricos e os pobres existe uma zona de transição política: países nesta zona têm
maior tendência a transitar para a democracia. Assim, à medida que se desenvolvem
economicamente passam para essa zona e são passíveis de democratização.

pp.69
O surto de crescimento econômico pós-II Guerra, que durou até o choque do petróleo (1973-74)
levou muitos países para a zona de transição, criando condições econômicos para desenvolver a
democracia; assim, a onda de democratização que começou em 1974 foi produto do crescimento
econômico das décadas anteriores. As transições tinha maior tendência a ocorrer em países de nível
médio e médio-superior de desenvolvimento econômico, concentrando-se na zona de renda um
pouco acima da observada antes da II Guerra.

pp.70-71
Os países da terceira onda variaram muito quanto ao nível de desenvolvimento econômico, tendo
Índia e Paquistão com renda per capita inferior a $250 e Tchecoslováquia e Alemanha Oriental com
mais de $3.000.

pp.71
A democratização não é determinada apenas pelo desenvolvimento econômico, depende também da
política e de forças externas. Ex. os países da Europa Oriental, que apresentavam condições já nos
anos 1970 para se democratizar, mas contavam com os controles soviéticos, só removidos nos anos
1980.

pp.72-73
Por que o desenvolvimento econômico e a passagem para o grupo dos países com níveis de renda
média-superior promovem a democratização? Apenas a riqueza não foi um fator crucial, mas o
desenvolvimento econômico de base ampla, envolvendo industrialização significativa, pode contribuir
para a democratização, porque ele promove mudanças na estrutura e nos valores sociais,
encorajando a democratização.

pp.73
1. “o nível de bem-estar econômico no interior da própria sociedade modela os valores e as atitudes
de seus cidadãos, estimulando o desenvolvimento de sentimentos de confiança interpessoal, de
satisfação com a vida e de concorrência, que, por sua vez, têm uma forte correlação com (…)
instituições democráticas”. 2. desenvolvimento econômico aumenta os níveis de instrução da
sociedade, logo, desenvolvem “características de confiança, satisfação e concorrência que
acompanham a democracia”.

pp.73-74
3. desenvolvimento econômico gera mais recursos para serem distribuídos, facilitando “a
acomodação e compromisso”.

pp.74-75
4. nas décadas de 1960-70 o desenvolvimento econômico promoveu e exigiu “abertura das
sociedades ao comércio, ao investimento e à tecnologia externos, o turismo e as comunicações”,
abrindo a sociedade para o impacto das ideias democráticas dominantes no mundo industrializado.
5. desenvolvimento econômico promove a expansão da classe média, que foi a verdadeira
protagonista dos movimentos de democratização de terceira onda, a partir do momento em que não
se viu mais ameaçada pela democracia e passou a acreditar nela. No Brasil, Argentina, Filipinas,
Espanha, Taiwan, Coreia do Sul, Peru e Equador a classe média foi crucial para promover a
transição democrática.

pp.76
Portanto, a passagem dos países para faixas de renda média da zona de transição levou a
mudanças nas estruturas sociais, crenças e cultura favoráveis ao surgimento da democracia (apoio à
democratização).

pp. 77
Taxas de crescimento econômico extremamente altas geraram insatisfações com os governos
autoritários existentes, casos de Portugal, Espanha, Grécia e Brasil. Isso porque o crescimento
econômico rápido cria rapidamente base econômica para a democracia, ou seja, eleva as
expectativas, escancara as desigualdades, criando tensões no tecido social, que estimulam a
mobilização e as demandas por participação política. Os arranjos políticos mostraram-se
anacrônicos diante das tensões de uma sociedade industrializada.

pp.78
No Brasil, após o “milagre econômico”, os líderes militares estavam cientes das pressões geradas
pelo rápido crescimento (desigualdade) e, por isso, Médici já considerava modos de produzir uma
distensão, processo conduzido por Geisel até 1978 e ampliado por Figueiredo, através da abertura;
ou seja, a ação dos dois presidentes evitaram um conflito social maior e abriram caminho para a
democracia.

pp.79
Nos casos de Taiwan e Coreia do Sul, também houve rápido crescimento econômico até 1980,
porém a democratização ocorreu de forma mais lenta, pois as pressões eram menores do que na
Europa e América Latina. Razões: 1) tradições culturais confucionistas, “atrasaram a articulação (…)
de demandas mais intensas sobre o governo”; 2) o crescimento nesses países ocorreu num contexto
de maior distribuição de renda.

pp.80
Na terceira onda, a combinação de níveis substanciais de desenvolvimento econômico e crise
econômica de curto prazo foi a fórmula para a transição de governos autoritários para democráticos.

Mudanças religiosas
pp.80-81
Há uma forte correlação entre cristianismo ocidental e democracia e parece plausível a hipótese de
que a expansão do cristianismo encoraja o desenvolvimento democrático. Porém, nos anos
1960/1970 o cristianismo se expandiu em poucos lugares, como na Coreia do Sul, onde a militância
cristã substituiu o budismo e confucionismo.

pp.82
O mais importante desenvolvimento religioso em favor da democratização foram as profundas
mudanças na doutrina, lideranças, envolvimento popular e alinhamento político da Igreja católica. O
protestantismo era mais associado à democracia, por três razões: 1.por sua doutrina;

pp.83.
2.porque as igrejas protestantes eram mais democráticas, enquanto a Igreja católica era uma
organização autoritária; 3. tese de Weber: protestantismo encoraja a empresa econômica,
desenvolvimento da burguesia, o capitalismo e a riqueza, que facilitam o aparecimento de
instituições democráticas. A terceira onda de democratização dos anos 1970/1980 foi
essencialmente uma onda católica. Caso de Portugal, Espanha, América Latina, Filipinas, Polônia
e Hungria. Três quartos dos países que transitaram para a democracia entre 1974 e 1989 eram
católicos. Por quê? Resposta parcial: no início da década de 1970 a maioria dos países protestantes
já tinha se tornado democrática.
pp.84-85
Por que católicos? A causa mais abrangente foi a mudança na Igreja católica nos anos 1960, que
ocorreu em dois níveis: 1. nível global: mudança realizada pelo papa João XXIII → Concílio Vaticano
II (1962-65), nova orientação da Igreja mais engajada em questões de ordem política. 2. bases da
Igreja: mudanças no envolvimento popular e nas atividades eclesiásticas, maior papel das igrejas
nacionais na oposição ao autoritarismo.

pp.86
As relações entre a Igreja católica e os governos autoritários atravessaram três fases: aceitação,
ambivalência e oposição. A posição da Igreja ia se modificando conforme o regime se mantinha no
poder e intensificava a repressão, aliado às tendências convergentes dos movimentos de base e do
Vaticano. No Brasil, nas Filipinas, no Chile, nos países da América Central e outros, desenvolveram-
se duas correntes de pensamento e ação oposicionistas no interior da Igreja católica: 1. corrente
socialista: pregava justiça social, os males do capitalismo, ajuda aos pobres, incorporando elementos
marxistas da “teologia da libertação”. 2. corrente moderada ou amarela: enfatizava os direitos
humanos e a democracia (Filipinas).

pp.87-88
Em algum momento, na maioria dos países, a Igreja católica rompeu com o Estado, colocando-se
em explícita oposição ao regime: Chile (1976), Brasil, Espanha (1971), Filipinas (1979), Argentina
(1981), Guatemala (1983), El Salvador (1977). A única exceção foi a Polônia, onde a Igreja católica
apenas desempenhava papel de mediador entre governo e oposição.

pp.88
As igrejas nacionais trouxeram muitos recursos materiais e humanos para lutar contra o
autoritarismo: usavam os veículos de comunicação da Igreja, sua popularidade, sua máquina política
nacional (milhares de padres, freiras, ativistas leigos), seus líderes (que também eram políticos
hábeis) e a influência do Vaticano.

pp.89
Com a ascensão de João Paulo II, então fica clara a posição da Igreja na luta contra o autoritarismo,
através das visitas papais de fundo político em diversos países com regimes autoritários, a partir de
1979.

pp.90
Em certos momentos também os líderes e organizações da Igreja católica intervieram politicamente
em momentos críticos no processo de democratização de alguns países. Caso da República
Dominicana, Panamá, Chile, Coreia do Sul e Filipinas.

pp.91
Se não fossem as mudanças no interior da Igreja católica e as ações resultantes contra o
autoritarismo, teria ocorrido um número menor de transições para a democracia na terceira onda.
Assim, o catolicismo perde apenas para o desenvolvimento econômico como força em prol da
democracia.

Novas políticas de atores externos


pp.91
Além do catolicismo e do desenvolvimento econômico, a democratização também pode ser
influenciada de forma decisiva por ações de governos e instituições externas.
pp.92
Os atores estrangeiros são importantes na aceleração/retardamento dos efeitos do desenvolvimento
econômico e social sobre a democratização, logo, eles podem influenciar os países a atingirem
democratização até mesmo antes de entrar na zona de transição (onde aumenta a probabilidade de
tomar a direção democrática), ou impedir/atrasar esse movimento. Os atores externos ajudaram de
maneira significativa as democratizações da terceira onda. No final da década de 1980 as
principais fontes de poder no mundo (Vaticano, CE, EUA, URSS) promoveram ativamente a
liberalização e a democratização.

pp.93
A comunidade europeia contribuiu para a democratização principalmente no sul da Europa (Grécia,
Portugal, Espanha) graças ao processo de ampliação do bloco (anos 1970), pois pertencer à
Comunidade reforçava o compromisso com a democracia e dava um apoio externo contra o
autoritarismo. Nos países mediterrâneos, o estabelecimento da democracia era necessário para
garantir os benefícios econômicos da integração e pertencer à CE era também uma garantia de
estabilidade da democracia.

pp.95
O começo da terceira onda coincide mais ou menos com a Conferência sobre Segurança e
Cooperação na Europa (CSCE) cujas resoluções ficaram conhecidas como Processo Helsinki.
Elementos nesse processo que afetaram o desenvolvimento dos direitos humanos e da democracia
na Europa oriental: 1.os objetivos evoluíram inicialmente de legitimidade internacional aos direitos e
às liberdades individuais e ao monitoramento internacional desses direitos (1975) à defesa de um
conjunto completo de liberdades e instituições democráticas (1990).

pp. 95-96
2.a resolução final de Helsinki foi criticada pelos EUA, que argumentavam que legitimava as
fronteiras estabelecidas pelos soviéticos na Europa Oriental, mas nas últimas conferências os EUA e
a Europa ocidental pressionaram a URSS e países do leste europeu quanto aos compromissos
assumidos e violações específicas.

pp.96
3.o processo criou em cada país comissões ou grupos de observação para monitorar o cumprimento
do acordo; na prática isso serviu para pressionar os governos comunistas à liberalização e legitimou
os esforços dos dissidentes internos e dos países estrangeiros a induzi-los a isso. Teve impacto
direito na Alemanha Oriental e na Bulgária.

pp.97
A política dos Estados Unidos para promoção de direitos humanos e da democracia começou a se
esboçar nos anos 1970, por iniciativa do Congresso, gerando emendas nas leis que previam
interdição de assistência a países culpados de violações dos direitos humanos.

pp.97-98
Avançou com o governo Carter (1977), que colocou os direitos humanos na agenda mundial, e
progrediu mais ainda com Reagan (1983), passando a atuar ativamente na promoção de mudanças
democráticas nas ditaduras comunistas e não-comunistas.

pp.98-99
O governo dos EUA usou uma série de meios para promover a democratização: defesa da
democracia através de meios de comunicação e declarações de presidentes e secretários de
Estado, pressões e sanções econômicas, ação diplomática (às vezes direta e crucial), apoio material
às forças democráticas (apoio financeiro ao Partido Socialista Português e ao Solidariedade na
Polônia), ação militar (República Dominicana, Espanha, Panamá, Filipinas, El Salvador), diplomacia
multilateral (através do Processo Helsinki, de pressões sobre a URSS e do uso da ONU).

pp.100
Sem dúvida o efeito mais significativo foi fazer dos direitos humanos e da democracia questões
importantes nas relações internacionais.

pp.103
“Não é possível fazer aqui qualquer avaliação do papel dos Estados Unidos nas democratizações da
terceira onda.” (p.103), entretanto assim como a Igreja católica, a ausência desse ator externo teria
significado menos transições democráticas e mais tardias.

pp.104
A democratização de fins dos anos 1980 na Europa oriental foi resultado de mudanças na política
soviética mais drásticas do que as adotadas pelos americanos nos anos 1970: revogação da
Doutrina Brejnev, aceno aos governos da Europa oriental e grupos de oposição de que não haveria
mais intervenção da URSS em seus países, pelo contrário iria favorecer a liberalização e reformas
políticas. Isso derrubou a velha guarda comunista, abriu as fronteiras para a Europa ocidental e
intensificou tentativas de criar uma economia de mercado. Não estava claro que grau de reforma
política Gorbatchev apoiava e antecipava, assim como não era claro se ele era favorável à completa
democratização dos países do leste europeu e ao colapso da influência soviética, entretanto foi isso
que suas ações produziram.

Efeitos-demonstração ou de bola-de-neve
pp.105
Outro fator que contribuiu para a terceira onda foi o efeito-demonstração: quando acontece uma
democratização bem-sucedida em um país, isso encoraja a democratização em outros países,
porque eles parecem enfrentar problemas semelhantes, porque a democratização é vista como
solução para os problemas do país ou porque o país que se democratizou é visto como modelo
político/cultural.

pp.106
Papel-geral dos efeitos-demonstração na terceira onda: 1. Os efeitos foram muito mais importantes
na terceira onda do que nas anteriores, pois agora havia avanços consideráveis nas comunicações e
nos transportes globais, assim os custos de se controlar a imprensa local para não serem
influenciados pelas democratizações de outros países tornaram-se imensos.

pp.107
2.Os efeitos-demonstração tornavam-se mais fortes nos países mais próximos geográfica e
culturalmente. Exemplo: a queda do autoritarismo em Portugal influenciou a democratização no sul
da Europa e no Brasil; já a democratização da Espanha influenciou os países da América Latina de
língua espanhola.

pp.108
A mudança, ao longo do tempo, da importância relativa das causas de uma onda de democratização,
ou seja, o impacto dos efeitos-demonstração não dependeu significativamente das condições criadas
por ondas anteriores, assim, à medida que avança o processo de bola-de-neve, o processo em si se
torna substituto para tais condições, o que promovia aceleração.
pp.110
“Quando as bolas de neve rolam morro abaixo elas não apenas aceleram e crescem, elas também
derretem em ambientes que não lhes são propícios”. Foi o que aconteceu com a China, que, por
mais que sofresse impacto de efeitos-demonstração, não havia cristianismo e a Igreja católica era
fraca, não tinha uma burguesia poderosa, a renda per capita era metade da filipina, nunca teve
experiência democrática prévia e sua cultura apresenta elementos autoritários, logo, estava longe da
zona de transição política.

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