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Se desejamos que tudo permaneça como está, precisamos que tudo mude1:

rumores sobre a origem neocolonial do bitcoin.

O surgimento da criptomoeda Bitcoin é uma controvérsia muito comentada nos


meios online, sobre a qual se produzem rumores de todos os tipos; o objetivo deste
ensaio é analisar um rumor específico: que o traficante, programador e supremacista
branco Paul le Roux seria o criador da criptomoeda. Defendo que a análise dos
rumores a respeito de Paul le Roux e sua relação com o Bitcoin podem indicar para
certas mudanças importantes na geopolítica global, notadamente o uso da internet
como um espaço auxiliar fundamental para a consolidação de fato de uma classe
capitalista transnacional (TCC, do inglês); presto atenção em como tais rumores podem
ser associados a um conteúdo latente ideológico específico que possui raízes
históricas, potencialmente parte de um processo recente de consolidação de uma
imagem pública dessa nova classe.
Seguimos a suposta história de Paul le Roux a partir de artigo com seu nome na
Wikipédia de língua inglesa2. A Wikipédia é uma plataforma de armazenamento e
busca de informações online, uma enciclopédia digital mantida pela própria
comunidade, financeiramente e editorialmente. Boa parte dos artigos da Wikipédia
podem ser editados de maneira anônima e instantânea - o que é o caso do artigo
analisado - mas uma parte deles tem certas restrições a respeito das permissões de
edição, impondo a esse conteúdo um regime de revisão por pares. No momento em
que escrevo este ensaio, em Junho de 2019, o artigo de Paul le Roux é baseado em 36
fontes externas e foi editado 158 vezes por 68 editores com nicknames como
michael-stanton, Blythwood ​ou mesmo o número de IP ​97.115.70.159,​ segundo o
relatório disponível na própria página3. A página foi criada em 2015 e foi visualizada
342.079 vezes, com 221.591 dessas visualizações desde Janeiro de 2019; pode-se

1
Frase do personagem Tancredi Falconeri, no Filme Il Gattopardo (Visconti, 1963)
2
​https://en.wikipedia.org/wiki/Paul_Le_Roux​, visto em 6 de Julho de 2019.
3
​https://xtools.wmflabs.org/articleinfo/en.wikipedia.org/Paul_Le_Roux​, visto em 6 de Julho de 2019.
perceber ao mesmo tempo, que desde Maio de 2018 a página teve 280.392
visualizações, indicando que nos últimos 25% de seu tempo de existência, ela teve por
volta de 80% de suas visualizações totais. Detive-me um pouco sobre essas
informações, para evidenciar como muitas das características que o historiador da
revolução francesa Timothy Tackett utiliza para definir sociologicamente o rumor
parecem estar presentes nesse artigo da Wikipédia:
“First, rumors only rarely move through a population in a unilinear, unidirectional manner.
They entail, rather, a collective exchange of “news” through multiple and complex
interactions and discussions, so that any one individual may hear several different
accounts from several different sources. (…) Second, through a process of continual
dialogue and readjustment among individuals touched by such multiple interactions, the
content of rumors frequently evolves over time toward a “consensus.” Nevertheless, the
consensus itself may be fleeting and metamorphose as circumstances themselves
evolve. Third, there is considerable evidence that the content of rumors, especially as
they move toward a consensus, is shaped in part by previously held opinions and general
attitudes. Fourth, rumors commonly develop when there is a general absence of reliable
information or a lack of trust in the institutions and individuals disseminating that
information. Rumors have been described as alternative forms of news, “improvised
news,” engendered as a community struggles to ascertain the reality of its situation. Fifth,
rumors can communicate general moods and feelings as well as specific interpretive
messages. Sixth, while rumors are sometimes limited to specific classes, cultural groups,
or factional affiliations in a given society, they frequently spread across such class or
factional lines. This is especially the case when the anxiety accompanying the rumor is
exceptionally intense and when the rumor is repeated frequently – for repetition has been
shown to increase credibility.” (TACKETT, 2011, P. 56)
Os pontos primeiro, segundo e quarto do resumo de Tackett parecem estar
presentes na situação referida, por analisarmos uma história cheia de segredos,
contada pela wikipédia, escrita através da contagem e recontagem de pedaços de uma
história impressionante e com elementos cinematográficos; por ser um rumor sobre
uma série de crimes, a maior parte das fontes que compõem a história são anônimas e
com a pele ou a reputação em jogo, tornando-as não totalmente confiáveis. Os pontos
terceiro, quinto e sexto são pontos que dependem da análise do conteúdo do rumor e
de seus modos específicos de propagação, tornando um estudo completo sobre
determinado rumor um trabalho mais complexo e mais extenso que o que a presente
proposta. Proponho focar-me na análise do conteúdo do rumor e pensar quais as
possíveis implicações geopolíticas dos sentimentos e imagens expressos nesse rumor,
portanto não examinei a questão da propagação desse rumor e passarei rapidamente
pela questão de em quais círculos tal rumor circula, apesar dessas serem questões
importantes.
Sigo portanto agora o artigo da wikipedia, o conteúdo do rumor, com alguns
comentários meus. Paul Calder le Roux, ou Paul Solotshi Calder Le Roux, nasceu em
1972 em Bulawayo, então Rodésia. Paul é deixado bebvcbê em um orfanato e é
adotado por uma família branca ligada ao ramo da mineração de carvão. Desde 1889
até por volta dos anos 20 território da Companhia da África do Sul Britânica,
propriedade do grande colonizador e minerador Cecil Rhodes - que morre como uma
das pessoas mais ricas do mundo em 1902 - a partir de 1923 se organiza como um
país semi independente, com parlamento próprio e integrante como colônia do
Commonwealth Britânico. Durante toda a sua existência, a Rodésia foi governada por
um governo supremacista branco dirigido pela minoria branca dos habitantes, com
ideais racistas e estruturas legais aos moldes do apartheid sul-africano, país com que
faz fronteira ao sul. Vale a pena comentar a importância desse território para a
formação do que é hoje a disciplina antropologia, pois o domínio colonial inglês, que se
estendia desde a Cidade do Cabo até o Egito, passando por Rodésia, Somália,
Zululândia, Sudão e Nigéria, tem vínculo íntimo com o os caminhos de pesquisadores
como J. Clyde Mitchel, Max Gluckman, Evans Pritchard e Radcliffe Brown, tendo eles
seguido essas rotas geralmente com anuência e em conexão com os anseios coloniais
britânicos pela região; veremos que a história contada de Le Roux envolve vários dos
mesmos territórios, como se ele mesmo incorporasse contemporaneamente um pouco
das ambições do próprio Cecil Rhodes. Voltando então à Paul, em 1980 os
movimentos armados negros pela libertação do Zimbabwe – novo nome negro
escolhido para a branca Rodésia – ganham o controle e derrubam o governo da
minoria branca; um pouco após a subida de Mugabe ao poder, em 1984 a família de
Paul sente-se ameaçada e decide mudar-se para a mais controlada e ainda firmemente
racista África do Sul, onde o pai de Paul realoca-se para outra mina. A vida de Paul na
África do Sul parece ter sido uma vida de adolescente normal branco de classe
média-alta, porém distanciando-se gradualmente do convívio social devido à seu
apreço por seu computador e pela programação, e a um incidente na qual Paul foi
preso pela venda e distribuição de conteúdo pornográfico. Após essa prisão, e com
dificuldades na escola, onde supostamente se recusa a aprender afrikaans por
considerá-la uma língua morta, Paul decide com 17 anos se mudar para a Inglaterra,
onde começa a trabalhar como programador de computadores, conhece uma garota
chamada Michelle, se casa e muda com ela para os EUA e depois para a Austrália,
chegando a obter a cidadania australiana. Enquanto mora na Austrália, na segunda
metade da década de 90, Le Roux deixa um forte rastro público online no sistema de
fóruns pré internet chamado Usenet. O rastro é composto principalmente por dois tipos
de mensagens: uma grande quantidade de posts e respostas de cunho racista em
fóruns de política, religião e de notícias e uma forte participação em fóruns de
criptografia e segurança de dados. Entre 1997 e 1998 Paul codifica e publica o
software E4M – ​Encryption 4 the masses - de graça, com o código fonte aberto e
acessível por qualquer um, publicando em conjunto com o software um manifesto a
favor do que ele chama de ​Strong Cryptography como solução à uma crescente
vigilância de dados por parte de governos e corporações:
“Privacy is becoming harder to find in the world. Today everyone, everywhere is
monitored all the time, by everything from the close circuit recording system at
the local store, to digital imaging systems at banks, the subway, and street
corners.
Governments issue social security numbers, national insurance numbers,
medicare numbers, ID numbers, passport numbers, tax numbers, and so on.
Some governments even go as far as fingerprinting citizens, as part of the
numbering regime. Combine the two and governments have access to large
pools of information about you and your lifestyle. The battle for privacy has long
since been lost in the real world. As more and more human activity becomes
computerised, governments are scrambling to preserve and extend their powers
in the era of the information age and beyond. No one is saying that national
security unimportant, that child pornographers should not be stopped, or that
crimes should not be punished. It's just that the same tired catch phrases are
used time and time again to diminish everyone’s rights. You might be thinking
that your government will not abuse it's powers, and that your legal system
guarantees your rights! WRONG, Project ECHELON[1] shows the extent to
which major world governments have gone to invade everyone’s privacy. The
UKUSA agreement between the U.S, U.K, Canada, Australia & New Zealand
facilitated project ECHELON, which intercepts global phone calls, faxes, and
email messages transmitted via satellites, if certain "key words" are detected the
communication is recorded for later analysis by the intelligence agencies of the
respective governments. Theoretically global spying such as ECHELON is to
combat "rouge nations"[sic] and "terrorists". However there is proof that the U.S
government has used the system to spy on European and Japanese
companies[3], and passed that sensitive information back to those companies
U.S competitors, clearly winning a particular deal in the automobile or software
industry cannot possibly have "National security implications". Multinational
agreements such as Wassenaar[2] simply preserve and extend government
surveillance and interception capabilities to the detriment of all the worlds
citizens. Strong Encryption is the mechanism with which to combat these
intrusions, preserve your rights, and guarantee your freedoms into the
information age and beyond.
Paul Le Roux, Author Encryption for the Masses.”4
O software de Paul passa a ser o software de criptografia mais utilizado no
mundo à época, sendo atualizado por programadores anônimos em 2000 - o que pode
ou não ter envolvido Le Roux - gerando o software TrueCrypt, que até hoje é o software
de criptografia mais prático e mais utilizado do mundo, sendo um dos únicos softwares
que a National Security Agency estadunidense não conseguiu comprometer, fazendo
os dados protegidos pelo software praticamente invioláveis. O software de Paul permite
guardar arquivos digitais ocultamente dentro de outros arquivos, protegendo o
conteúdo com uma senha. Um usuário normal ou força da lei que não saiba que
determinado arquivo foi encriptado utilizando E4M ou Truecrypt não saberá que tal

4
Versão arquivada pela Internet Archive da página original que já não está no ar:
https://web.archive.org/web/20010408201122/http://e4m.net/pol.html​, visto em 6 de Julho de 2019.
arquivo é falso e que ele contém segredos; sabendo que determinado arquivo é falso e
foi encriptado com E4M/Truecrypt, abre-se o arquivo com o software e insere-se a
senha de acesso ao arquivo, revelando temporariamente (enquanto o software está
rodando) o conteúdo guardado no arquivo falso. Como a infância de Paul na Rodésia e
África do Sul, a história da criptografia moderna também é militarizada e em parte
britânica, tendo suas origens nos esforços aliados em quebrar os códigos que
encriptavam as mensagens entre bases e unidades dos países do eixo na segunda
guerra mundial. Tais esforços criaram os primeiros computadores modernos,
eletronicos, analogicos e mecanicos, como os de Vannevar Bush, Alan Turing, Von
Neumann, Norbert Wiener e Claude Shannon e contribuíram definitivamente para o
estabelecimento da matemática moderna, da cibernética, da teoria da informação e da
criptografia como uma subárea da matemática. Podemos observar que o software de
Paul evidencia, talvez inspirado pelo seu problema com a polícia na adolescência no
caso da pornografia, uma virada de paradigma na criptografia – da utilização por
governos em um ambiente primariamente militar para uma utilização civil e anônima
contra o “bisbilhotamento” de governos.
Por volta de 2000, dizem os rumores que o casamento de Paul e Michelle
termina de maneira violenta e Paul parece estar em dificuldades financeiras pois posta
uma mensagem em um fórum de criptografia na Usenet pedindo um emprego ou algum
trabalho temporário. Em 2003 Paul começa um novo negócio, uma série de farmácias
online com nomes similares, a maioria sob o controle de uma empresa baseada em
Hong Kong chamada RX Limited, que funcionam de maneira suspeita: os usuários
entram no site de alguma dessas farmácias, respondem a um questionário que
pergunta a respeito de sintomas que eles sentem e que medicamento esses usuários
preferem para seu próprio tratamento; esse questionário é redirecionado por meio de
um sistema automático para um médico americano, que assina uma receita com o
nome do paciente e com o medicamento escolhido pelo próprio paciente e a envia no
mesmo sistema; a receita então chega já “validada” por um médico à uma farmácia real
nos EUA, parceira da empresa RX Limited, que executa o pedido e manda a droga por
correio para os pacientes. Segundo dados vazados de uma investigação da Drugs
Enforcement Administration (DEA) estadunidense, uma das por volta de cem farmácias
parceiras de Le Roux havia até 2011 enviado mais de 700.000 pedidos provenientes do
sistema de sites de Paul. Le Roux resolve abrir centros de atendimento ao consumidor
(call centers) em Israel, pois a maioria dos israelenses fala fluentemente o inglês, fator
diferencial pois seu negócio se baseia em parte no atendimento constante de médicos,
farmácias e clientes e na resolução de pequenos problemas como problemas de
pagamento.
Conforme o fluxo de usuários cresce, baseado na infra estrutura que criou e
programou e na experiência com o call center israelense, Le Roux abre mais um ou
dois novos call centers em Manilla nas Filipinas. Le Roux também traz de israel uma
equipe de seguranças e uma equipe de gerentes de call center. Sua equipe de
seguranças, inicialmente todos ex-agentes de serviços como a Mossad (serviço secreto
israelense) e o Duvdevan (unidade antiterrorismo das forças de defesa de israel)
começa a ganhar proeminência, pois Le Roux começa a ganhar muito dinheiro e a se
preocupar mais. A equipe tem uma alta rotatividade e vai atraindo para perto de Le
Roux a comunidade de expatriados ex-militares e mercenários, eventualmente atraindo
como seus seguranças cidadãos da Polônia, EUA, Brasil e Alemanha. A equipe de
“segurança” é dividida em quatro funções principais: proteger Paul e sua família em
Manilla - onde agora mora em um dos condomínios mais caros do país, casado com
uma holandesa de nome asiático Lilian Cheng Phui, com que tem um filho; protegê-lo
em viagens de negócio internacionais; a obtenção de metais preciosos como ouro e
prata, que são comprados como forma de impedir o rastreio governamental e são
armazenados e monitorados principalmente em Hong Kong e em Manilla; por fim,
trabalhos de diversificação de negócios, principalmente na África. Nesse período,
segundo a wikipedia e sua seleção de fontes, Paul começa a ficar cada vez mais
ambicioso, mais ríspido e mais abertamente racista; também começa a diminuir sua
presença pública online, que cessa quase completamente por volta de 2008. A
ambição, o talento com sistemas computadorizados e com comunicações
criptografadas, o negócio crescente porém ilegal, o dinheiro acumulado e uma equipe
privada soldados bem treinados e bem equipados à sua disposição leva Paul a ter
outras idéias de negócios, cada vez mais duvidáveis eticamente.
Bem abastecido de dinheiro e de ambição, Le Roux volta a áfrica, agora com a
ajuda e proteção de uma equipe de mercenários de sua confiança, onde começa uma
operação de desmatamento e contrabando de madeira no Congo, país onde obtém
cidadania e um passaporte diplomático; além da operação madeireira, Le Roux
forneceria “garotas brancas” e armas para ministros e grupos paramilitares congoleses.
Paul também começa uma operação de compra de minérios como ouro e diamante de
garimpos e de grupos armados, principalmente na região do mencionado circuito
antropológico britânico, contrabandeando-os para Hong Kong – por coincidência ou
não uma outra ex-colônia britânica - por mar através de seus mercenários e propinas.
Le Roux retorna algumas vezes ao Zimbabwe, onde obtém um novo passaporte com
outro nome, e onde contrata um famoso lobista e contrabandista de armas israelense
amigo de Robert Mugabe, Ari Ben Menashe, para tentar convencer Mugabe a vender a
Le Roux uma grande quantidade de terra, onde Le Roux planeja reinstalar fazendeiros
brancos que tiveram suas terras confiscadas. Na sua única entrevista disponível, para
a revista The Hill, Le Roux fala em “correção de injustiças cometidas contra os brancos
no passado”, se referindo à expropriação de terras de brancos conduzidas pelo
governo Mugabe; por trás do plano oficial porém, rumores indicam para um desejo de
Paul da organização de um levante branco que tomaria de volta o governo, derrubando
Mugabe. O plano não dá certo e aparentemente Mugabe se apropria de parte do
dinheiro de Paul e volta atrás nas negociações, forçando a desistência de Le Roux. Na
somália Paul começa a montar uma força mercenária anti pirataria chamada Southern
Ace, que opera sem qualquer autorização governamental através de uma empresa de
pesca; forma-se um exército privado, que recebe armas, equipamentos e carros e
eventualmente estabelece quartéis generais pela área: um relatório da ONU a respeito
da operação de forças paramilitares na região diz que a empresa de Le Roux é “one of
the strongest forces in south Mudug region, with the potential to change the balance of
power in the area”(UN, 2011, p. 269). O relatório também detalha esforços por parte da
empresa em começar uma plantação de maconha e de coca dentro dos quartéis
generais. Conforme essas histórias vão se desenvolvendo, um número não desprezível
de mortes vão acontecendo associadas aos desejos e negócios secretos de Le Roux,
que desposa mais uma garota asiática, por volta de 2010 se muda para o Brasil, onde
se instala no Rio de Janeiro, trazendo suas esposas e seus filhos, que são instalados
em casas diferentes. Le Roux, que é conhecido por ser mulherengo, arranja uma
amante brasileira e tem um filho com ela no Brasil, supostamente para proteger-se de
uma extradição – já que pais de crianças brasileiras são protegidos da extradição pelas
leis brasileiras.
Quando muda para o Brasil, Le Roux está envolvido com o negócio ilegal de
farmácias, com tráfico de drogas, tráficos de armas (incluindo para grupos terroristas
islâmicos indonésios e governos ditatoriais como os governos da Somália, Etiópia e
Irã), contrabando de metais preciosos, contrabando de madeira, potencialmente tráfico
de mulheres, além de diversos assassinatos. Nenhum governo parece conseguir fazer
qualquer coisa a respeito pois sua influência, capacidade de suborno, perícia em
manter comunicações e dados secretos e sua internacionalidade – em 2012, época de
sua prisão, Le Roux parecia deter cidadania australiana, zimbabweana (dois
passaportes), sul africana e congolesa, além de operar de Israel, Hong Kong, Filipinas,
Brasil e de boa parte da África - tornam quase impossível a coleta de evidências e uma
investigação aprofundada sobre os malfeitos. Não se sabe exatamente como Le Roux
acaba preso, mas parece certo que por volta de 2011 sua sorte muda: um
carregamento de armas proveniente da indonésia é interceptado pela polícia das
filipinas, e as empresas registradas como donas do carregamento e do navio aparecem
ligadas a personagens próximos a Le Roux; em outra ocasião, outro navio associado a
Le Roux naufraga com uma carga de cocaína proveniente do equador e também é
associado a pessoas próximas a Paul. Órgãos como o DEA e a CIA já investigam Paul
por distribuição ilegal de medicamentos em sua rede de farmácias e agora adicionam à
essa investigação os crimes de tráfico de drogas e armas, aumentando a prioridade do
caso e os recursos associados à ele. Através da cooperação e dos dados obtidos nas
investigações mencionadas logo acima, o DEA consegue grampear uma das casas do
chefe de segurança de Paul, Joseph Hunter, um ex soldado estadunidense. Através do
monitoramento dele, os agentes do DEA encontram o endereço de uma das casas no
Rio de Roux, e procedem, em acordo extra-legal com a polícia brasileira, a monitorar
Le Roux e sua família colocando outro aparelho de escuta ambiental em sua casa, o
que os leva a obter muita informação de qualidade a respeito de Paul e sua vida,
culminando em um plano bem sucedido do DEA para tirar Le Roux do Brasil. O DEA
cria, através de agentes disfarçados, um negócio falso de venda de metanfetamina
para um cartel colombiano a ser realizado na Libéria. A polícia liberiana em conjunto
com o DEA prende Le Roux logo após a realização do acordo falso e ele é levado aos
EUA, onde fecha um acordo e em troca de minoramento da pena, se torna um
informante e colaborador ativo do governo estadunidense. Entre 2012 e 2014, o
governos dos Eua supostamente utiliza-se de Le Roux para prender e julgar boa parte
dos envolvidos em suas operações, que não sabendo da prisão do chefe, continuam
seguindo ordens emitidas online, gerando evidências que ajudam os órgãos
estadunidenses a criar casos sólidos juridicamente. Até 2016 o caso recebe pouca
atenção da mídia e do público em geral, como mostram os indícios extraídos do
relatório de visualizações do artigo apresentados anteriormente. Em 2016 aparecem
pela internet uma série de reportagens a respeito de Paul Le Roux, mas será somente
no final de 2018 que a sua fama adquiriria aspectos “virais”, quando começam a sair
muitas pequenas reportagens e posts sobre Le Roux em sites e fóruns ligados à
comunidade de criptomoedas e em sites de tecnologia, relacionando-o à criação do
Bitcoin.
Surgido em 2009 e popularizado a partir de 2014, o Bitcoin é uma moeda digital
descentralizada mantida pelos usuários, sem o controle e intervenção de governos,
lançada anonimamente em um fórum da internet por alguém com o pseudônimo
Satoshi Nakamoto. Com Bitcoin pode-se anonimamente comprar bens e serviços,
normalmente em mercados digitais, legais ou ilegais; além de compras, pode-se pagar
diretamente Bitcoins a outro usuário, sem nenhuma taxa a não ser uma taxa de
manutenção da rede, que já será melhor explicada. O funcionamento do bitcoin é um
pouco complicado e por vezes até místico5, mas pode ser resumido através da
descrição de quatro conceitos/entidades e de suas relações. Em primeiro lugar é
importante o conceito de blockchain, um tipo específico de rede que é a base do
Bitcoin. Blockchain é uma tabela que descreve completamente a rede de usuários e
transações já ocorridas na história do Bitcoin: quem mandou dinheiro para quem,
quando ocorreram as transações e portanto quem tem quanto. Em segundo lugar
temos o conceito de carteira: todas as transações da rede blockchain tem como origem
ou destino uma carteira, que é identificada na rede blockchain por meio do que são
chamados de endereços de carteira (tais endereços são frases alfanuméricas de 36
caracteres como 3MB5fnL3wkzmHRjkH9QoiBUMcTaVeFp83s). Não há informação
gravada na rede blockchain sobre quem é o humano por trás de cada endereço hash;
para acessar e mover fundos, o usuário precisa saber o endereço de sua carteira, sua
senha e eventualmente o endereço do destinatário, além de precisar de um software
que acesse a rede através da internet. Em terceiro lugar, temos o conceito de nó
completo (full node), que denota um computador que guarda em si todas as transações
já realizadas na história do Bitcoin (no momento da escrita deste ensaio, o banco de
dados que contém a tabela blockchain tem cerca de 140 Gigabytes e existem cerca de
10130 full nodes pelo mundo)6. Os nós completos são consultados todas as vezes que
uma nova transação é requisitada, e eles são remunerados pela manutenção desse
banco de dados através da taxa de manutenção paga em cada transação de cada
usuário – a taxa não é fixa, sendo decidida por cada usuário na ocasião de uma
transação, e podendo ser maior ou menor, o que afeta a velocidade com que
determinada transação será efetivada no sistema. Por último, temos o conceito de
minerador, que denota um computador que trabalha ativamente recebendo as
transações que os usuários desejam realizar, consultando os full nodes por

5
O protocolo exato de funcionamento é entendido por poucas pessoas, sendo uma mistura complexa de
códigos computacionais e matemática, muitas vezes sem um documento guia fácil de entender a
respeito.
6
​https://bitnodes.earn.com/​, visto em 6 de Julho de 2019.
informações, empacotando os dados em um block de informações de transações que
se encaixa no topo do blockchain e transmitindo as informações já processadas para
os full nodes que incorporam o novo bloco de transações ao blockchain, validando tais
transações. Uma espécie de banco central autônomo e descentralizado gera a cada
tantos minutos um novo Bitcoin – até um limite arbitrário de 21 milhões de bitcoins -
que é sorteado para os computadores que mais cederam poder computacional para a
criação de blocks, ou seja, os computadores que mais contribuíram com a manutenção
da rede Bitcoin eventualmente são mais remunerados. A criação dos blocks envolve
além de juntar as informações das requisições de transações e consultar os full nodes
por históricos de transações, que os mineradores provem que eles realmente
processaram tal informação, o que acontece através de um protocolo de consenso
entre miners e nodes que prevê a geração de um prova numérica que associa blocks à
mineradores e uma também distribuição ordenada pelo mundo – para todos full nodes -
dessa prova e do conteúdo do block. O sistema de mineração base do Bitcoin, envolve
portanto o consumo de quantidades avassaladoras de energia, pois exige um grande
número de computadores funcionando no máximo de sua potência esperando serem
recompensados com dinheiro; em termos de consumo de energia, a rede bitcoin gasta
hoje mais do que 176 países consomem. Um bitcoin – que é divisível infinitamente,
diferentemente das moedas tradicionais – vale hoje cerca de U$10 mil, e existem por
volta de 17.800.000 bitcoins em circulação, totalizando ao menos 178 bilhões de
dólares circulando em Bitcoin. Finalizando o resumo, além da transferência direta
usuario-usuario de bitcoins, pode-se trocar bitcoins por dólares e bitcoins por outras
criptomoedas (desde 2009 surgiram milhares de outras) por meio de bolsas virtuais
(crypto exchanges), em sua maioria não reguladas e sediadas em paraísos fiscais
como Seychelles, Suíça ou Ilhas Virgens Britânicas.
Não precisamos ir muito longe para observar que as existências de Le Roux e
do Bitcoin exibem certa sinergia. Os rumores sugerem que Paul Le Roux seria Satoshi
Nakamoto, criador do bitcoin e dono de cerca de 700.000 bitcoins iniciais (equivalentes
hoje a U$7 bilhões). Me parece que esses rumores baseiam-se principalmente no fato
do passaporte diplomático congolês de Le Roux mostrar o nome Paul Solotschi Calder
Le Roux, aproximando Solotschi a Satoshi. É claro que sua fama como programador,
criptologista, fraudador internacional e traficante também contribuem para o rumor, pois
Le Roux não só teria os meios de como programar algo assim, como também teria
motivos de sobra para tal – prisão na adolescência, manifesto do Encryption 4 the
Masses, esconder dados sobre seus negócios, necessidade de transferencias
monetarias internacionais anônimas sem taxas, necessidade de uma reserva de valor
não rastreável. Mais importante na minha opinião é o fato do rumor associar Le Roux
ao Bitcoin mesmo sem nenhuma prova ou indício forte: o que parece haver é uma
vontade latente de relacionar o bitcoin à uma figura sombria e poderosa, ao mesmo
tempo consciente do Grande Problema Contemporâneo da Vigilância Total. Tal relação
também liga ao bitcoin, de forma intencional ou não, o supremacismo branco, a
objetificação da mulher asiática e brasileira, e a relação de exploração constante
neocolonial praticados por Le Roux no âmbito doméstico de sua vida.
Gostaria de destacar, não no sentido de confirmar ou não Le Roux como Satoshi
mas com finalidade analitica, alguns elementos desse rumor que fazem alusão à outras
dimensões, relacionando-os com uma série de movimentos geopolíticos, alguns
recentes e outros não tanto. Em primeiro lugar, como mencionei acima, a dimensão
doméstica do rumor é muito interessante e me parece ser central. Anne McClintock,
estudiosa da invenção da raça e do doméstico define:
“Domesticity denotes both a space (a geographic and architectural
alignment) and a social relation to power. The cult of domesticity -
far from being a universal fact of "nature" - has an historical
genealogy. The idea of "the domestic" cannot be applied willy-nilly
to any house or dwelling as a universal or natural fact. So often
vaunted as involving a naturally occurring, universal space -
ensconced within the innermost interiors of society, yet lying
theoretically beyond the domain of political analysis –the cult of
domesticity involves processes of social metamorphosis and
political subjection of which gender is the abiding but not the only
dimension.
Etymologically, the verb to domesticate is akin to dominate, which
derives from dominus, lord of the domum, the home. Until 1964,
however, the verb to domesticate also carried as one of its
meanings the action "to civilize". In the colonies (...), the mission
station became a threshold institution for transforming domesticity
rooted in European gender and class roles into domesticity as
controlling a colonized people. Through the rituals of domesticity,
increasingly global and more often than not violent, animals,
women and colonized peoples were wrested from their putatively
“natural" yet, ironically, "unreasonable" state of “savagery" and
inducted through the domestic progress narrative into a hierarchical
relation to white men.” (McClintock, 1995, p. 34-35)
Le Roux é um senhor do lar e um grande dominador dos negócios e dos investimentos,
o que pode ter a ver com sua criação no zimbabwe e a adolescência na África do Sul
do apartheid, onde seu pai, o chefe da família, parece ter enriquecido gerenciando
mineradoras. Paul muda-se para a Austrália onde depois de um tempo termina seu
casamento “violentamente”; podemos verificar publicamente ainda hoje seu
comportamento racista à época; casa se com duas asiáticas, aparentemente ao
mesmo tempo; estabelece seus negócios, várias vezes envolvendo armamentos e
mercenários, principalmente em ex colônias, como as Filipinas, Zimbabwe, Somália,
Congo e Brasil, onde aparentemente trata mal seus funcionários nativos - chama os de
macacos e tenta ao máximo explorá-los; tem um filho com uma brasileira para evadir a
possibilidade de extradição; cerca a si e a sua família com mercenários ex militares de
várias nacionalidades - todos os gerentes, inclusive das equipes de segurança são
brancos. É interessante notar como a mineração se faz presente nesse rumor Le
Roux-Bitcoin: Paul cresce em duas cidades mineradoras, Bulawayo e Krugersdorp, e
volta à África onde compra minérios em vários países. Em Hong Kong suas equipes
tem uma rotina de transformação de dólares em ouro e prata, materiais tidos como
mais seguros. O bitcoin por sua parte precisa ser minerado para que as transações se
efetivem e remunerem os mineradores, que são essenciais para a manutenção do
funcionamento da moeda; no bitcoin não é questionada a distribuição da riqueza pois
quem detém capital detém também possibilidades de dominar a mineração de bitcoin e
a propriedade da moeda. Voltando à herança moral de outro grande minerador, Cecil
Rhodes, um jornalista e historiador importante da época vitoriana e da história colonial,
Sidney Low, sumariza da seguinte forma as crenças de Rhodes a partir de encontros
com o último:
"First, that insular England was quite insufficient to maintain, or
even to protect, itself without the assistance of the Anglo-Saxon
peoples beyond the seas of Europe. Secondly, that the first and
greatest aim of British statesmanship should be to find new areas
of settlement, and new markets for the products that would, in due
course, be penalised in the territories and dependencies of all our
rivals by discriminating tariffs. Thirdly, that the largest tracts of
unoccupied or undeveloped lands remaining on the globe were in
Africa, and therefore that the most strenuous efforts should be
made to keep open a great part of that continent to British
commerce and colonisation. Fourthly, that as the key to the African
position lay in the various Anglo-Dutch States and provinces, it was
imperative to convert the whole region into a united, self-governing
federation, exempt from meddle some interference by the home
authorities, but loyal to the Empire, and welcoming British
enterprise and progress. Fifthly, that the world was made for the
service of man, and more particularly of civilised, white, European
men, who were most capable of utilising the crude resources of
Nature for the promotion of wealth and prosperity. And, finally, that
the British Constitution was an absurd anachronism, and that it
should be remodelled on the lines of the American Union, with
federal self-governing Colonies as the constituent States.” (STEAD,
1902, p. 73)
Vemos no rumor de Paul uma remanescência de vários dos pontos morais
principais do projeto colonial (como descritos por McClintock e Rhodes), agora
devidamente alterados e transnacionalizados para lidar com a desmoronamento das
fronteiras que marcaram o projeto colonial em seus primórdios7. O mundo muda, se
torna online, interligado e globalizado, mas a sede por minerais, trabalho barato e pela
sujeição de mulheres e povos “inferiores” aos “cuidados competentes” europeus e
brancos custa a passar. Em seu testamento, e em escritos anteriores, Rhodes postula
a criação de um império global liderado pelo que ele chama de raça anglo-saxônica,
prevendo já uma certa transnacionalidade branca e vendo nela um possível futuro para
o império britânico: “The furtherance of the British Empire, for the bringing of the whole
uncivilised world under British rule, for the recovery of the United States, for the making
the Anglo-Saxon race but one Empire. What a dream! but yet it is probable. It is
possible” (STEAD, 1902, p. 59). Podemos dizer que em última instância o sonho de
Rhodes se tornou pelo menos em parte realidade, com a consolidação do que
chamamos de ​global information economy​, onde o crescimento econômico mundial
depende da criação, da curadoria e da vigilância de dados digitais, sob o comando de
empresas e pessoas majoritariamente americanas ou europeias. A história de Paul
está inserida fortemente nas entranhas da ​global information economy,​ mesmo que de
maneira criminosa; o próprio bitcoin surge como uma ferramenta de consolidação de
fortunas além do controle dos estados, fortemente ligada ao circuito global financeiro
que funciona hoje descentralizado e pela internet. Nos fóruns online da comunidade
bitcoin, a moeda é tido como o clímax da utilização da internet para a liberdade
pessoal, sem interferência de ninguém, seja uma pessoa ou um estado. A quem
favorece a utilização do bitcoin e para quê, são perguntas associadas a um conjunto de
histórias que estão se desenvolvendo e sendo contadas no momento, mas o imaginário

7
Anne McClintock discute também essa obsessão por fronteira rígidas como um elemento chave do
projeto de poder colonial (MCCLINTOCK, 1995, p. 33).
envolvido no rumor Le Roux-Bitcoin pode fornecer algumas pistas de situações que
poderiam ter sido financiadas por pessoas que estão além do controle de estados e
que detém uma moral perturbada, como a moral de herança colonial e racista.
Gostaria agora de por último, tecer um comentário a respeito do estilo de vida de Le
Roux e sua conexão com o estabelecimento de uma classe capitalista transnacional e
de uma classe auxiliar de mercenários transnacionais. A formação da dita classe
capitalista transnacional é um assunto estudado desde os anos 70, mas mais
intensamente a partir do crescimento da internet, por autores como William Robinson e
Terry Harris, entre outros:
“We argue (..) that the transnational capitalist class (TCC) is the
segment of the world bourgeoisie that represents transnational
capital. The old international alliance of national bourgeoisies has
mutated into a transnational bourgeoisie in the new epoch, and this
transnational bourgeoisie has become the hegemonic class fraction
globally. Here fraction denotes segments within classes determined
by their relation to social production and the class as a whole. This
TCC is comprised of the owners of transnational capital, that is, the
group that owns the leading worldwide means of production as
embodied principally in the trans- national corporations and private
financial institutions. What distinguishes the TCC from national or
local capitalists is that it is involved in globalized production and
manages globalized circuits of accumulation that give it an
objective class existence and identity spatially and politically in the
global system above any local territories and polities” (ROBINSON,
2000, p. 22)
Fala-se bastante dos novos capitalistas, principalmente dos ligados ao mercado
de alta tecnologia, mas em geral fala-se menos a respeito de como eles mantém sua
segurança física e patrimonial. No caso de Le Roux, temos alguns indícios de como a
classe capitalista transnacional poderia lidar com essas questões; a segurança dos
negócios de Paul, mesmo antes de se tornarem violentos e abertamente criminosos,
envolve figuras mercenárias, profissão que vem ganhando a atenção da opinião pública
internacional nos anos pós 9/11. Diferentemente do tipo de segurança normalmente
empregado em situações como guarda costas e vigilância, a classe dos mercenários
transnacionais vem crescendo associada às guerras no oriente médio (travadas
amplamente por forças privadas) e à consolidação de um mercado privado
transnacional de segurança de pessoas ricas. Essa classe militar privada transnacional
(muitos desses mercenários são ex-veteranos de guerras ou provenientes das forças
de segurança de elite nacionais) parece ganhar importância acoplada ao surgimento de
uma classe capitalista transnacional. Le Roux no rumor utiliza tais soldados como
serviçais resolvedores de problemas em geral, à semelhanças dos jagunços e
pistoleiros brasileiros. Certamente bitcoin e a internet favorecem o funcionamento de
tais negócios, já que facilitam o anonimato e a realização de qualquer tipo de negócio
que precise deixar poucos traços. Somando-se a questão capitalista transnacional,
legal ou ilegal, com a utilização de serviços militares privados transnacionais fica
evidente uma aplicação onde a internet e o bitcoin podem facilitar não só a circulação
global de dinheiro e de feitos questionabilíssimos, mas também podem garantir a
segurança e a execução desses feitos por alguém com elevada capacidade
militar/tática.
E nós, aqueles sem capital nem nacional nem transnacional, estaríamos
condenados à exploração e à perpetuação, agora online, do esquema podre
neocolonial? Ainda é cedo para saber, mas os sinais não são bons. Em seus gritos de
desespero, os donos da ordem e da herança colonial tentam por todos os meios
garantir seus privilégios. Enquanto à guerra às drogas no Brasil fornece tanto os
soldados (ex-BOPE, ROTA, ROTAM, GOEs)8 para a classe mercenária transnacional,
quanto o soldo de parte dos capitalistas transnacionais ligados ao tráfico de armas e

8
​https://istoe.com.br/30395_MERCENARIOS+MADE+IN+BRAZIL/​ e
http://psm.du.edu/media/documents/reports_and_stats/think_tanks/privwar_national-report_bordin-dolgan
ova.pdf​, vistos em 6 de Julho de 2019
drogas, cidades supremacistas brancas na África do Sul9 se organizam através de
criptomoedas e grupos racistas levantam fundos online para ações terroristas10.
Precisamos urgentemente discutir, inclusive tecnicamente, as possibilidades para
construir o nosso próprio futuro, pois o nosso passado não nos permite seguir sendo
escravos e sem nenhuma dúvida será dos hoje explorados que surgirá a inspiração
para seguirmos.

Referências

STEAD, W. T. ​The last will and testament of Cecil John Rhodes with elucidatory
notes​. Review of Reviews, London, 1902.

MCCLINTOCK, Anne. ​Imperial Leather: race, gender and sexuality in the colonial
contest​. Routledge, New York, 1995.

TACKETT, Timothy. ​Rumour and Revolution: the case of the September


massacres​. In: French History and Civilization, vol 4, p. 54-64, 2010.

SECURITY COUNCIL, United Nations. ​Letter dated 18 July 2011 from the Chairman
of the Security Council Committee pursuant to resolutions 751 (1992) and 1907
(2009) concerning Somalia and Eritrea addressed to the President of the Security
Council​. New York, 2011.

ROBINSON, William et al. ​Towards a Global Ruling Class? Globalization and the
Transnational Capitalist Class​. In: ​Science & Society, ​Vol. 64, No. 1 (Spring, 2000),
pp. 11-54

9
​https://www.wired.com/story/inside-an-all-white-towns-divisive-experiment-with-cryptocurrency/​, visto em
6 de Julho de 2019
10

https://www.forbes.com/sites/janetwburns/2018/01/03/cut-off-from-big-fintech-white-supremacists-are-usi
ng-bitcoin-to-raise-funds/​ visto em 6 de Julho de 2019
Referências

Giddens

Clausewitz

Becker

Lupton digital sociology

Lupton panic computing

Veena das rumour

Gluckman zululandia

Latour reassembling

Latour jamais fomos

Hobsbawm
Durkheim

Foucalt

Nortje marres

TOMASSINI ACHO

Castell

Referencias nas notas

Paper dos coreanos

Site 1

Site 2

Site 3

Site 4

Site 5

Senador Esperidiao Amim: Criamos 40 dias atras um grupo de trabalho pra acompanhar a
guerra cibernetica. Se houve excesos na lava jato, vai ter que investigar, mas isso eh do passado,
queremos que a lava jato melhore, melhore alguns graus. O brasil tem que acordar ministro (moro), e ai
me dirijo ao ministro. Ministro, da justica e da seguranca, o brasil nao pode dormir, sem considerar que
existe uma guerra cibernetica no mundo. E o brasil e importante demais pra ficar fora dela. Nao pode
declarar neutralidade, este fato, eu que vivi no ano passado, quando alguem em curvelo em minas
gerais, em curvelo, em uma loja e se adulou do meu telefone, e do meu whatsapp, em janeiro do ano
passado, tem boletim de ocorrencia tem acao judicial, eu tambem achei que era o motorista que virou
passageiro (fazendo cara de lamento), só no dia seguinte que pude desativar na loja meu telefone,
enquanto isso, sofri algumas turbulencias (encolhendo os ombros, enquanto paulo teixeira olha e aprova
com a cabeca). Entao agora imagina uma agencia, isso foi uma agencia, uma empresa, contratatada.
Contratada com um objetivo, tanto é que ela so grampeou um lado, ou não foi? Ou ela grampeou
universalmente os pesquisados pela lava jato, e os pesquisadores tambem? Nao, so um lado, so um
lado. Todo esse escandalo, que vai nos atualizar, vai nos fazer bem. Pode prejudicar alguns momentos
nossos mas vai nos fazer bem, vamos amadurecer. Ele tem que ser pesquisado, tem que ser rastreado
as agencias, nao foram garotos nerds, hackers, no sentido romantico da palavra, que obteram essas
informacoes, e tudo isso tem que ser tranformado em conjunto de informacoes, pra ser autenticado,
legitimado, conferido se nao tem manipulacao, por que e possivel manipular parte de mensagens, isso
nós vamos amadurecer, e eu espero que isso aconteca na esteira do amadurecimento institucional do
brasil em materia de guerra cibernetica. Nos nao podemos imaginar que todos os que agem com
tecnologia da informacao e inteligencia artificial sejam bem intencionados, por isso eu faco a pergunta,
qual eh a providencia que o governo esta tomando para democraticamente investigar a origem desse
grande hackeamento?

Moro: punir criminosos, novos padroes, mudanca de legislacao - pena muito baixa (nao serve
como anteparo suficiente para esse tipo de ataque), mais singelos (dados de cartao de credito ) esse
nao, ataque serio, que ataca instituicoes. Nao sabemos o alcance total, nos nao sabemos. O que temos
noticia eh que ate mesmo os jornalistas sofeream tentativas de ataque e tambem ja ouve referencias a
parlamentares. Nao posso relevar especificamente, pois as investigacoes sao sigilosas, mas seria bom
que os atingidos viessem a publico.

Esperidiao amim: fui o relator da cpi de crimes ciberneticos, uma extraordinaria execucao da
camara dos deputados, concluida a tres anos, de la pra ca os chamados crimes ciberneticos tiveram
evolucao exponencial da ameaca dos crimes ciberneticos, nao geometrica, sofisticacao das formas de
invasao e apropriacao de dados esta alcancando um grau de refinamento, que impoe sim que na
seguranca pessoal questa oes individuais e na seguranca de um pais, com as dimensoes do nosso, seja
a questao sistematicamente tratada pelo governo parlamento e judiciario, por isso gostaria de recolher
nesse momento de escandalo, um aprendizado que nos sirva em carater permanete por que agora nos
estamos vindo o espamso do escandalo, isso mexe conosco, mexe com nossas emocoes, com as
nossas tendencias politico partidarias, so que daqui a pouco isso vai de alguma forma desaniviar, e nos
nao podemos perder e persistencia pela busca de nos atualizar.

Moro: eu concordo senador, mas tambem conordo com o titulo daquele artigo que mencionei a
pouco daquele professor americano, o incrivel escandalo, quem colheu? Pq na analise fria, exatamente,
poderiamos citar uma frase em latim reveladora que eh a montanha pariu um rato, pelo menos (fazendo
cara de duvidando contraindo o queixo) nao se vislumbra, para alem do sensacionalismo todo, a
gravidade dos fatos alardeada de forma sensacionalista por esse site envolvido.

(Transcrição minha de sessão do Senado Nacional dia 19 de junho 2019 por volta

deplªª@.,mmm m aa
12:00, da ocasião do roubo de dados do ministro e ex-juiz Sérgio Moro, que levantaram dúvidas quanto
a sua imparcialidade na condução da operação Lava Jato)

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