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Oi Mauro.
Aquele nosso último encontro no ‘Heights’ foi uma mistura de Becket com Goethe.
O absurdo e o idealismo se encontraram. A projeção dos desejos num futuro
hipotético balizaram a conversa para além de uma visão fixada em fatos correntes,
do agora. Vi um discurso fruto da ansiedade, da solidão, somada a uma visão
idealista e até mesmo utilitarista das relações.
Apesar de achar real a existência do “fall in love” – literalmente cair no amor, ser
tragado por ele inesperadamente –, acredito as relações autênticas são construídas
no tempo da confiança. Mais paciência que imediatismo, mais entrega que
cobrança, perdão que julgamento, descoberta que projeção, mais agora que o
amanhã.
Para mim, ser tragado pelo amor é ser embebido pela alteridade, ver-se no outro
na máxima compassiva. Não é projetar no outro o que achamos ser, o que
esperamos ser, ou induzir a exposição da intimidade alheia como prova mecânica
de troca profunda. Qual a atenticidade disso?
Nos vimos e comunicamos quase que diariamente ao longo das duas semanas
passadas. Dentre os artifícios discursivos usados - dizer que te rejeito. Não é só
injusto, como incongruente. Critério objetivos pra julgar, critérios subjetivos para
cobrar. Isso revela uma postura utilitarista (amor-produto).
Fiquei perplexo com a pretensão de algumas das suas falas. Com apenas duas
semanas de convivência achei certos comentarios muito precipitados. Senti tristeza
por ver certo nível de objetificação de mim, ambos como objeto-análise, ou objeto-
desejado. Uma profunda despreocupação em cuidar, em comunicar, uma pressa
por analizar e tirar conclusões sobre o objeto. Prazer, sou o Eduardo-cú, Eduardo-
Pintão, Eduardo-marido-ideal, Eduardo-pornstar, Eduardo-o-que-quero-que-ele-
seja. Projetar a análise para cobrar, comunicar sem medo de ferir, o produto que o
objeto oferece por cima da troca e o mistério-gozozo de explorar o sujeito-desejo.
O amor nao é violento nem julgador. O idealismo transforma indivíduos em
produtos dos anseios do Ego.
Amar pra mim é ver o outro como sujeito, nas suas imperfeições, limitações e
potências. Amar é ser paciente e disfrutar das minuciocidades. Amar pra mim é
trocar acima de usufruir. Amar é espotâneo, nao induzido. Amar é uma construção,
nao um relampejo do que o Ego projeta no mundo. Goethe escrevia bem pra
caralho, mas as representações dele eram doentís e trágicas. O idealismo objetifica
o outro, nao respeita o indivíduo na sua pluralidade. Assim como para o livro do
Stendhal que você citou (O Vermelho e o Negro). Nessa conversa me senti a pessoa
que recebe a carta fake-hipnótica, e se dá conta do feitiço.
(...)
Entendo sua vida ter sido repleta de restrições depois de tantos anos servindo o
setor humanitário em lugares barra pesada. Gostaria de respeitar as suas reações
daquele dia, se você realmente reconhecer as reais causas. Se quiser me explicar as
razoes dessas atitudes que me magoaram. Quero ver em você um homem gentil e
bem intencionado, mas a constelação de atos naquele dia me deixaram
desconcertado. Prefiro pensar que você é esse cara legal, culto e talvez racional
demais e que apenas se precipitou. Mas saiba: ficou no ar pra mim uma impressao
de tentativa de manipulação utilitalista deliberada.