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VISENTINI, Paulo

Fagundes. A Revolução
Sobre o autor: Paulo
Angolana. In: ________.
Gilberto Fagundes
As Revoluções Africanas:
Visentini é historiador
Angola, Moçambique e
brasileiro e acadêmico de
Etiópia. São Paulo:
Relações Internacionais.
Unesp, 2012. p. 45-88.
Atualmente, é Professor
Titular da Universidade
O COLONIALISMO
Federal do Rio Grande do PORTUGUÊS E OS
SulMOVIMENTOS
(UFRGS). DentreDE seus RESISTÊNCIA
ARMADA
livros publicados estão
- História da África
A população e dosaté
de Angola, 2018 contando com
Africanos,
30,8 milhões deO habitantes,
Grande é originária dos povos
Oriente
bakongos, Médio, A
kimbundus, ovibundos (do grupo
Revolução
bantu) Vietnamita.
e outros.
- O português é o idioma oficial, mas ainda
existem línguas africanas de línguas africanas de origem bantu muito faladas.
O LONGO MAS LIMITADO COLONIALISMO PORTUGUÊS
- O território de Angola era habitado por povos koisans e bantus, como bakongos,
kicongos e outros.
- O primeiro contato com os portugueses ocorreu por volta de 1482. Com uma presença
maior no território angolano por volta de 1570, os portugueses “deram início ao
sistemático aprisionamento e tráfico de escravos”.
- Apenas no final do século XVIII que houve tentativa de diversificar a economia de
Angola plantando algodão e café. Mas não deu certo e o país continuo sendo usado
apenas como fonte de escravos.
- No final do século XIX, por causa das pressões internacionais e do tratado de Berlim,
em 1884, Angola deixa de ter um regime escravocrata, embora isso não tenha
significado o fim da exploração:
“A resposta portuguesa, então, foi a instituição do trabalho forçado em Angola,
que vigorou de 1878 até 1961. A base desse sistema estava assegurada por uma
legislação que estipulava que os africanos que estivessem sem ocupação
poderiam ser submetidos a contratos de trabalho compulsório.” (p. 47)
- Ao contrário do que se pensa, essa exploração não foi passiva e houve contrarreação
angolana: nos próximos 30 anos, o país veria insurgências contra o governo português
que, por sua vez, respondeu com as “campanhas de pacificação” (p. 47), “cujo o
objetivo era subjugar os povos de Angola, eliminando toda a resistência.” (p. 47)
- Em 1910, Portugal deixou de ser monarquia e passou a ser república. A administração
das colônias foi, então, alterada, dando mais autonomia a cada uma delas. Isso permitiu,
como no caso de Angola, que seu dirigente, o governador “expansionista” Norton de
Matos, engrossasse a desmobilização local:
“[...] procedeu à destruição de todas as autoridades tradicionais africanas
restantes através do estabelecimento de povoamentos controlados e da
manutenção das diferenças entre os grupos étnicos.” (p. 47)
- O período republicano de Portugal (1910 – 1926) permitiu com que surgissem os
primeiros movimentos políticos africanos: o Partido Reformista de Angola (1910) e a
Liga Angolana (1912). Mas Visentini ressalta que:
“Entretanto, tais partidos promoviam apenas o avanço dos interesses africanos
no âmbito da colônia, principalmente em relação à abolição do trabalho forçado,
sem reivindicar a descolonização. De fato, o nacionalismo africano – como uma
base de ideias coerente, e que contasse com um movimento organizado para
promovê-las – só emergiu em meados da década de 1950.” (p. 48)
- Mais tarde, a partir do contato com outras colônias africanas, os angolanos foram
fortalecendo o movimento nacionalista. Fundaram o Partido Comunista de Angola
(PCA), que trouxe “a ideologia marxista para as ideias revolucionárias” (p. 49), e, em
meados dos anos 1950, Luanda assistiu ao surgimento do Partido de Luta Unida dos
Africanos de Angola (PLUA), um agrupamento nacionalista clandestino responsável
por um manifesto convocando os africanos a organizar um movimento de emancipação.
A PRIMEIRA GUERRA DE LIBERTAÇÃO
- A importância dos centros e movimentos culturais para o movimento de libertação. A
Liga Nacional Africana e o Grêmio Africano, fundados na década de 1920 são
exemplos dessa contribuição, principalmente depois da Segunda Guerra Mundial
quando criaram as revistas Mensagem e Cultura. Portugal também assistiu ao
crescimento dos movimentos culturais com o surgimento do Centro de Estudos
Africanos e da Casa dos Estudantes do Império fundados na década de 1950 e ativos até
meados da década seguinte. Visentini traz o pensamento do professor e militante
Amílcar Cabral sobre a importância da cultura no contexto africano:
“Para Amílcar Cabral, muitos movimentos de independência nas colônias
africanas tiveram suas origens em movimentos culturais, o que evidenciou a
importância do elemento cultural nas lutas de libertação, não só como forma de
mobilização, mas também como arma própria dessas populações.” (p. 49)
- A luta pela independência de Angola teve três grupos protagonistas:
MPLA (Movimento Pela Libertação de Angola): Organizado em 1956, teve
como líder Agostinho Neto e era de orientação marxista e urbano. Entre seus
integrantes estavam mestiços, assimilados e brancos, bem como a população
Ovimbundu de Luanda. Era um movimento mais organizado que contou até com
uma escola de formação para seus membros e contatos com a União Soviética.
FNLA: Criado em 1962, era liderado por Holden Roberto e declaradamente
racial, contra brancos e portugueses, mas também anticomunistas. Era
sustentado pela população Bakongo do norte de Angola, majoritariamente rural.
Não havia orientação ideológica certa, era fortemente centrado na figura de
Roberto e seus membros tinham pouco treinamento militar.
Unita: Criado em 1964 por Jonas Savimbi, o movimento era composto por
etinias do sul – Ngangela, Chokwe e Ovimbundu. Sua base ficava na Zâmbia,
visava o apoio popular e a mobilização das massas. “Embora se declarasse
maioísta, a Unita variava sua posição ideológica de acordo com o apoio externo
a ser recebido” (p. 51).
- As primeiras ações revolucionárias pela independência de Angola começaram em
1959 com o MPLA. A polícia repreendeu os manifestantes e isso deu visibilidade para o
movimento.
- O líder do MPLA foi preso em 1960 e isso deu início a uma série de insurreições.
- Em 1961, para conter a reação popular, o governo português aboliu o trabalho forçado
e criou os aldeamentos, locais controlados por militares para os quais os camponeses
foram obrigados a se mudar.
- Agostinho Neto foi preso no Congo em 1963.
- Distribuição geográfica do conflito no fim da década de 1960:
“o MPLA concentrava-se no Noroeste do país, na região entre Luanda e
Malange e no Leste, na fronteira com a Zâmbia, além do Norte da região de
Cabinda; a FNLA ocupava a região Nordeste do país, fronteira com Zaire, e uma
pequena área do Leste, na região de Luanda, também fronteira com o Zaire; a
Unita encontrava-se na região Centro-leste do país, entre as forças do MPLA e
do FNLA a Leste, e as forças portuguesas a Oeste.” (p. 53)
- O MPLA manteve alianças com Cuba, URSS, Frelimo (Moçambique) e PAIGC
(Guiné-Bissau).

A INDEPENDÊNCIA, AS INTERVENÇÕES EXTERNAS E A SEGUNDA


GUERRA DE LIBERTAÇÃO | A REVOLUÇÃO DOS CRAVOS E SEUS
IMPACTOS EM ANGOLA
- A independência das colônias veio com a Revolução dos Cravos de julho de 1974, em
Portugal. O MPLA, a FNLA e a Unita foram convocados e, em 1975, com os Acordos
de Alvor, estabeleceram uma coalizão para governar Angola. Esse governo assumiria
até a proclamação oficial da república angolana em 11 de novembro de 1975.
- Quem apoiava quem:
“A FNLA tinha suporte dos Estados Unidos e do Zaire, enquanto a Unita era
apoiada pela África do Sul e por colonos portugueses; já o MPLA foi auxiliado
pelos países socialistas, particularmente por Cuba e União Soviética.” (p. 56)
- A guerra entre os partidos teve início em fevereiro de 1975.
INDEPENDÊNCIA, GUERRA CIVIL E INTERVENÇÕES ESTRANGEIRAS
- O desmembramento do país recém-independente:
“Ao mesmo tempo em que o MPLA proclamava em Luanda (com a retirada das
autoridades e das últimas tropas portuguesas) a República Popular de Angola, a
FNLA e a Unita proclamavam, em Huambo, a República Democrática de
Angola, constituindo, assim, dois governos paralelos. Portugal não reconheceu a
legitimidade de nenhum dos dois, mas os demais países reconheceram
gradativamente o governo do MPLA.” (p. 57, grifos do autor)
- A guerra de independência estagnou completamente o país. Os colonos brancos
evadiram e consigo levaram o aparato técnico do país:
“Sem quadros formados e divididos internamente, os angolanos viviam numa
situação econômica desesperadora, com a produção e a administração
literalmente paralisadas.” (p. 58)
- O FNLA recebeu apoio da CIA de Kissinger e da China (p. 58). Já o MPLA recebeu
auxílio do Leste europeu o que fez com que Angola ficasse cada vez mais dependente
do bloco socialista (p. 59).
- O MPLA foi ganhando espaço e desenhando sua orientação ideológica:
“O movimento liderado por Agostinho Neto governaria sozinho o país declarado
uma República Popular de inspiração marxista-leninista.” (p. 59)
- Agostinho Neto morre em 1979, vítima de câncer, sendo sucedido por José Eduardo
dos Santos.
- A Unita recebeu amplo apoio da África do Sul e dos EUA. Isso tornava Angola um
palco de polarizações entre socialistas e capitalistas.
REGIME SOCIALISTA: POLÍTICA, ECONOMIA E SOCIEDADE | A
SITUAÇÃO INTERNA
- O MPLA assumiu o poder com a pretensão de reconstruir o país fortalecendo a aliança
entre operários e campesinato e de manter uma política externa não alinhada, mas o
período pós-colonial de Angola seria marcado por dificuldades crônicas:
“A tarefa do novo governo, entretanto, era bastante complexa, tendo em vista
que o país havia passado por uma guerra de libertação e a guerra civil
prosseguia. A economia angolana estava em ruínas, havia grande escassez de
mão de obra qualificada, resultante do êxodo português e das políticas coloniais,
que negaram educação à grande maioria dos africanos.” (p. 62)
- O governo implanta medidas de austeridade para conduzir a reconstrução do país. Isso
faz com que, em 1976, grupos ultraesquerdistas se manifestem e a polícia secreta
angolana, a DISA, os reprima. A situação geral era de descontentamento,
principalmente pelas:
“Em maio de 1977, a situação de Angola estava marcada pela escassez de
alimentos, pelo colapso do sistema de distribuição e pelo crescente
ressentimento entre os negros pobres que viviam nas favelas de Luanda quanto
ao papel desempenhado pelos mestiços no âmbito do governo.” (p. 62-63)
- Em 27 maio de 1977, Nito Alves, ex-ministro do interior e membro da administração
do MPLA, tenta dar um golpe junto de alguns seguimentos militares e fracassam. O
movimento de Alves, chamado de Fraccionismo, surge de um descontentamento com a
postura governamental e ideológica do MPLA de Agostinho Neto e começa a se
fortalecer nos musseques de Luanda. Em maio, esses dissidentes atacam e matam vários
dirigentes do MPLA, mas são reprimidos pelo governo. A empreitada, porém, marcava
a desestruturação do governo.
*No livro de Visentini, a descrição desse golpe diz que Nito Alves se encontrava
na cadeia desde 20/05/1977, e que seus seguidores tentaram libertá-lo em
27/05/1977. Isso não consta na descrição de outros autores. Ao que sugerem,
Alves estava livre, sendo preso somente após a reprimenda ao golpe e, depois,
fuzilado.
A ESTRUTURA SOCIAL
- Das divisões étnicas do conflito:
“Basicamente, o MPLA era composto pelos assimilados mulatos e pelo povo
Kimbundu, o FNLA baseava-se na etnia Bakongo, e a Unita, de Jonas Savimbi,
formou-se nas terras dos Ovimbundu.” (p. 65)
- O MPLA procurava criar uma aliança entre operários e camponeses, visto que grande
parte do povo estava na zona rural (em 1986, 80% vivia no campo).

ECONOMIA
- O êxodo português de 1975 teve importante impacto na economia angolana:
“A maioria dos imigrantes portugueses, administradores econômicos e
governamentais, ao deixarem o país, levaram consigo capital, veículos de
transporte, boa parte da frota pesqueira e – o que era ainda mais importante – a
experiência gerencial e a maioria dos trabalhadores qualificados e técnicos que
administravam a máquina estatal de forma monopolista. Ainda que o novo
governo dispusesse dos meios materiais para reerguer a economia angolana, ele
tinha sérias dificuldades para encontrar pessoal qualificado para geri-la.” (p. 68)
- Em 1976 a moeda deixou de ser o escudo e passou a ser o Kwanza.
- De 1976 a 1978 se daria o processo de estatização dos empreendimentos antes
providos pela administração portuguesa (bancos, agricultura, indústrias, mineradoras e
comércios).
“É significativo também que, em fins de 1978, o governo controlasse 51% da
indústria de petróleo (através da estatal Sonangol), a 61% da indústria de
mineração de diamantes (através de Diamang, que foi nacionalizada) e 100% da
indústria têxtil.” (p. 69)
- Havia escassez de mantimentos devido às guerras, de maneira que foi necessário
aumentar a importação de víveres.
- A grande saída para reerguer a economia foi ampliar a exportação de petróleo. Em
segundo lugar, o maior rendimento de Angola estava nas exportações de diamantes. Os
grupos, principalmente MPLA e Unita, disputavam o controle dos recursos minerais.
“Já o petróleo não era apenas o maior produto de exportação do país, mas
também o produto que sustentou a guerra civil.” (p. 72)
- Apesar do MPLA pretender um governo não alinhado e de ter estabelecido
“importantes laços cooperativos” com países socialistas (p. 73), algumas de suas ações
levaram o país à dependência de outras potências.
O ESTADO E O REGIME POLÍTICO
- Centralismo:
“Ficava claro, portanto, que o MPLA não tinha intenção de dividir o poder com
outras forças políticas, pretendendo instaurar, em nome da aliança entre
operariado e campesinato, uma ditadura democrática revolucionária.” (p. 74)
“Nesse sentido, foi declarado que membros da burguesia e intelectuais só seriam
admitidos no partido se provassem seu comprometimento ideológico.” (p. 74)
“[...] embora a prerrogativa de tomada de decisão pertencesse ao congresso, ao
Comitê Central e ao Bureau Político, Neto era claramente a força dominante,
conduzindo o trabalho dos órgãos de liderança do partido e do governo.”
(SOOMERVILLE apud VISENTINI, 2012, p. 75).
- Sobre as ações e as características da questão da fragmentação angolana pós-colonial:
“O MPLA tinha também tinha um forte discurso contra o tribalismo, o racismo e
o regionalismo. Tais convicções visavam assinalar a intenção do MPLA de
derrotar a Unita e a FNLA, os quais baseavam suas campanhas de guerrilha e
propaganda política em diferenças étnicas. Pretendia-se, portanto, forjar uma
unidade nacional do povo angolano e, para tanto, utilizava-se não só a campanha
de retificação, mas também um trabalho educacional que visava educar
ideologicamente os membros do partido e das forças armadas (FAPLA), além de
uma campanha da mídia.” (p. 76)
“A dissidência política em Angola tomou três formas básicas após a
independência
EDUCAÇÃO, RELIGIÃO, DEFESA E DIPLOMACIA
- Principais tópicos da revolução prometida pelo MPLA, embora isso representasse uma
“difícil tarefa”:
“Duas das principais metas eram a construção de um sistema nacional de
educação – para combater o analfabetismo – e a criação de um sistema de saúde
eficiente.” (p. 79)
“90% da população era analfabeta, principalmente nas áreas rurais.” (p. 80)
- Sobre a religião:
“A atitude básica adotada pelo regime em relação à religião era ambígua: por um
lado, o comprometimento do movimento com a ideologia marxista significava
que a religião era vista como uma herança maligna do colonialismo, que não
deveria estar presente na construção de um Estado socialista; por outro, devido à
relevância da religião na sociedade angolana (principalmente cristã), ela não
podia ser ignorada e o MPLA era tolerante, desde que não se envolvesse em
questões políticas.” (p. 80)
- A união com URSS e o problema com a África do Sul.

TRANSIÇÃO, TERCEIRA GUERRA CIVIL, PAZ E RECONSTRUÇÃO


- Em 1991 o governo introduziu um sistema multipartidário e liberalizou a economia.
- Na sequência, em 1992, foram realizadas eleições. Holden Roberto e Jonas Savimbi
haviam retornado para Luanda para fazerem suas campanhas eleitorais, mas quem
ganhou foi Santos.
- Savimbi não reconheceu a vitória de Santos e deu-se início à terceira guerra civil. Só
em 2002 que o líder da Unita foi morto e conflito deu-se por encerrado.
“Encerrava-se, dessa forma, uma das mais longas guerras civis da história
contemporânea (1961 – 2002). Restavam, entretanto – assim como em
Moçambique – milhões de refugiados e de minas terrestres dispersas e não
detonadas, milhares de mutilados, além do fato de infraestrutura angolana estar
completamente destruída.” (p. 88)

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