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Qualidade

TEMAS AVANÇADOS EM

de Vida VOLUME 1
Alberto José Niituma Ogata
Organizador

Qualidade
TEMAS AVANÇADOS EM

de Vida VOLUME 1

Ana Claudia Assis Pinto


Ana Cristina Limongi
Liliana Guimarães
Marilda Lipp
Mario Cesar Ferreira
Markus Nahas

2015
TEMAS AVANÇADOS
EM QUALIDADE DE VIDA
Alberto José Niituma Ogata

Capa, projeto gráfico


e editoração eletrônica:
Studio Moons
studiomoons@uol.com.br

Impressão: Copyright © 2015


Midiograf by Alberto José Niituma Ogata

Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida


ou transmitida de qualquer forma ou por quaisquer
meios eletrônico, mecânico, fotocopiado, gravado
ou outro, sem autorização prévia por escrito dos
autores.

Catalogação elaborada pela Bibliotecária Roseli Inacio Alves


CRB 9/1590

T278 Temas avançados em qualidade de vida / Alberto José Niituma Ogata


organizador. – Londrina : Midiograf, 2015.
184 p. : il.

Vários colaboradores
Inclui bibliografia.

1. Qualidade de vida no trabalho. 2. Promoção de saúde. 3. Saúde


ocupacional. 4. Saúde e trabalho. 5. Psicologia ocupacional. I. Título.

CDU 658.3.018:61

Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Sumário

INTRODUÇÃO................................................................................................7

AUTORES........................................................................................................13

GESTÃO INTEGRADA DE SAÚDE E


QUALIDADE DE VIDA NAS ORGANIZAÇÕES.......................................19
Ana Claudia Assis Pinto

GESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO:


EVOLUÇÃO, APLICAÇÃO E SOLUÇÕES DA METODOLOGIA
BIOPSICOSSOCIAL E ORGANIZACIONAL – BPSO96...........................65
Ana Cristina Limongi-França

QUALIDADE DE VIDA E PSICOLOGIA


DA SAÚDE OCUPACIONAL.......................................................................87
Liliana A. M. Guimarães

QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE EMOCIONAL: O IMPACTO DOS


RELACIONAMENTOS INTERPESSOAIS NO SÉCULO XXI...............109
Marilda E. Novaes Lipp

CONCEITO DE VIDA NO TRABALHO DE SERVIDORES


PÚBLICOS: FUNDAMENTOS EMPÍRICOS PARA
FORMULAÇÃO DE POLÍTICA E PROGRAMA DE QVT .................... 141
Mário César Ferreira

QUALIDADE DE VIDA NA ADOLESCÊNCIA........................................169


Markus Nahas
Introdução

7
Q ualidade de vida é um termo que tem sido utilizado cada vez com
maior frequência. Uma rápida busca no portal Google aponta
mais de 46 milhões de resultados, somente na língua portugue-
sa. A qualidade de vida tem sido citada nas propagandas de alimentos,
lançamentos imobiliários, dentre outros inúmeros produtos e serviços
e, frequentemente, está associada a comportamentos de consumo. Neste
contexto, as pessoas ficam um pouco perdidas pela falta de informações
consistentes e bem embasadas cientificamente.
A coleção “Temas Avançados em Qualidade de Vida” visa trazer
contribuições de pesquisadores renomados e profissionais experientes
com especial ênfase na questão da qualidade de vida no trabalho e no
bem-estar (“wellness”) subjetivo.
Neste contexto, a qualidade de vida e o bem-estar vão muito além
dos fatores de risco em saúde, dos exames laboratoriais e dos check-ups
que, ainda hoje, são utilizados por alguns profissionais como parâmetros
de avaliação e orientação. Da mesma maneira, está bem estabelecido que
a qualidade de vida de uma nação não se mede pelo seu Produto Interno
Bruto (PIB), mas está condicionada a muitos outros determinantes sociais
e econômicos.
Por exemplo, desde 2007 as empresas Gallup e Healthways avaliam
o estado de percepção de bem-estar em âmbito que é definida como as pes-
soas pensam e experimentam as suas vidas no dia-a-dia. Já se comprovou
que esta métrica está correlacionada com indicadores como custos em as-
sistência médica e produtividade. Este indicador possui cinco elementos:
propósito, social, financeiro, comunitário e físico. No nível global, na úl-
tima pesquisa publicada em 2014, apenas 17% da população está lidando

9
bem com três ou mais elementos. Em nosso país, um percentual bastante
alto de pessoas responderam não estar conseguindo lidar com o elemento
financeiro, principalmente entre as mulheres (46% versus 36%). Por outro
lado, um percentual maior (52%)refere estar enfrentando bem o elemen-
to social, demonstrando que muitos brasileiros estão conseguindo manter
relações próximas com familiares e amigos. A crescente urbanização tem
impactado negativamente no elemento comunitário em nosso país.
De acordo com a pesquisa citada, o parâmetro propósito está eleva-
do quando as pessoas gostam do que fazem a cada dia e estão motivados a
atingir os seus objetivos. Este elemento está relacionado, por exemplo, no
nível organizacional, com profissionais mais engajados, com mais energia
para enfrentar os desafios e influenciando positivamente as pessoas ao
seu redor. Neste contexto, diferentes aspectos da qualidade de vida no
trabalho, nas áreas pública e privada, serão discutidos neste livro por Ana
Cristina Limongi e Mario Cesar Ferreira.
Uma ampla pesquisa de base populacional realizada pelo IBGE e
Ministério da Saúde, denominada Pesquisa Nacional de Saúde, divulgada
em 2014, após ter visitado cerca de 80.000 domicílios em 1600 municí-
pios de todo o país, em 2013, estimou que o Brasil tem 31,3 milhões de
hipertensos, 27,0 milhões de pessoas com problemas na coluna e 2,2 mi-
lhões de adultos que já sofreram um Acidente Vascular Cerebral (AVC).
Cerca de 12,5% da população foi diagnosticada com colesterol alto, 6,2%
com diabetes e 4,2% com alguma doença cardiovascular. Eram fumantes
diários 12,7% dos adultos e 17,5% eram ex-fumantes. Em 2013, pouco
mais de um terço (37,3%) da população com 18 anos ou mais de idade
consumia frutas e hortaliças na porção recomendada pela OMS. Quase o
mesmo percentual (37,2%) consumia carne ou frango com excesso de gor-
dura. Cerca de 24,0% dessa população adulta ingeriam bebida alcoólica
uma vez ou mais por semana. A frequência desse hábito entre os homens
(36,3%) era quase três vezes maior do que entre as mulheres (13,0%).
Além disso, 11 milhões de adultos foram diagnosticados com depressão
por um profissional de saúde mental, mas apenas 46,4% deles receberam

10 Temas Avançados em Qualidade de Vida


assistência médica nos últimos 12 meses. Entre os adultos, 46,0% não
praticavam atividade física em nível suficiente no lazer, no trabalho, nos
afazeres domésticos e nos seus deslocamentos diários, e 28,9% assistiam à
televisão por três ou mais horas diárias. Sabe-se que atualmente, as doen-
ças crônicas não transmissíveis (DCNT) respondem por mais de 70% das
causas de morte no país. As doenças cardiovasculares, câncer, diabetes, en-
fermidades respiratórias crônicas e doenças neuropsiquiátricas, principais
DCNT, têm respondido por um número elevado de mortes antes dos 70
anos de idade e perda de qualidade de vida, gerando incapacidades e alto
grau de limitação das pessoas doentes, no trabalho ou no lazer. Lançando
mão de sua experiência prática e acadêmica, Markus Nahas escreve um
capítulo sobre a questão do estilo de vida e a importância da vida saudável
para as pessoas e a sociedade e Ana Claudia Pinto aponta a importância
da avaliação e acompanhamento dos indicadores de saúde no âmbito or-
ganizacional.
A revista britânica “The Economist” realizou em 2014 um seminá-
rio denominado “The Global Crisis of Depression”, pois se considera que
a depressão é um dos principais problemas de saúde pública no mundo
no século XXI e já é a principal causa de incapacidade. Ela atinge hoje
quase 7% da população mundial e incapacita os atingidos pela doença,
coloca enorme peso em suas famílias e rouba da economia a energia e o ta-
lento das pessoas, de acordo com uma das conclusões do simpósio. Ainda
hoje, muitos gestores de organizações públicas e privadas não entendem o
impacto do stress nas vidas dos trabalhadores e as suas consequências na
produtividade. Esta é uma questão que exige uma abordagem multifaceta-
da e que envolve diferentes stakeholders. Neste livro, Marilda Lipp e Lilia-
na Guimarães abordam esta questão fundamental, sob diferentes olhares.
Finalmente, é urgente que façamos uma reflexão mais profunda
sobre qualidade de vida pois se trata de um tema basilar para a nossa so-
ciedade atual, conforme destacam Richard Wilkinson e Kate Pickett, em
seu livro “The Spirit Level”- “ é um paradoxo notável que, no ápice do
desenvolvimento material e tecnológico, nós nos enxergamos carregados

11
de ansiedade, predispostos à depressão, preocupados como as outras pes-
soas nos enxergam, inseguros sobre nossas amizades, levados ao consumo
exagerado e com baixa (ou nenhuma) vida comunitária. Com a falta de
contato social informal e satisfação emocional que todos necessitamos,
nós buscamos conforto na alimentação em excesso, nas compras e gastos
obsessivos e ficamos presos ao uso abusivo do álcool, drogas psicoativas e
ilegais”. Não há respostas mágicas ou receitas comerciais simples a serem
utilizadas. Este livro busca trazer contribuições para a discussão do tema.

Boa leitura!

Alberto José Niituma Ogata


Organizador

12 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Autores

13
ALBERTO JOSE NIITUMA OGATA – Diretor da Associação Brasileira
de Qualidade de Vida (ABQV) e do International Association of Worksite
Health Promotion (IAWHP), Coordenador do Laboratório de Inovação
Assistencial da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e Organi-
zação Panamericana da Saúde (OPAS) e do MBA em Gestão de Progra-
mas de Promoção de Saúde Nas Organizações do Centro Universitário
São Camilo (SP), Membro do Conselho Editorial do American Journal
of Health Promotion (AJHP), Membro da Câmara Científica do Instituto
de Estudos em Saúde Suplementar (IESS). Autor dos livros “Wellness”,
“Guia Prático de Qualidade de Vida” e “Profissionais Saudáveis Empresas
Produtivas” da Editora Campus Elsevier e co-autor em várias outras obras.
Médico com Mestrado em Medicina e Economia da Saúde e certificação
em gestão de programas (“Certified Wellness Pratitioner – CWP”) pelo
National Wellness Institute (NWI).

ANA CLÁUDIA DE ASSIS ROCHA PINTO - Médica com especializa-


ção em Endocrinologia, doutorado em Medicina pela UNIFESP e MBA
executivo pelo IBMEC-SP. Especialista em Gestão de Qualidade de Vida
no trabalho pela FIA-USP, com grande experiência em Prevenção e Pro-
moção à Saúde. Professora responsável pela Disciplina de Prevenção de
Doenças Crônicas do MBA Gestão de Programas de Promoção de Saúde
e Qualidade de Vida – Centro Universitário São Camilo. Possui várias pu-
blicações científicas, larga experiência em operadoras de saúde e consul-
torias onde assumiu cargos de liderança e direção. Tem experiência como
palestrante nacional e internacional e atualmente é Diretora de Produtos
e Serviços da Healthways International.

15
ANA CRISTINA LIMONGI-FRANÇA - Professora Titular da Uni-
versidade de São Paulo no Departamento de Administração da FEA,
onde coordena o Núcleo de Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho
– GQVT. Atua também nas seguintes instituições: Associação Brasileira
de Qualidade de Vida – Membro-fundador, Fundação Instituto de Admi-
nistração – FIA: Coordenadora de Projetos, Treinamento e Consultoria
em Gestão de Pessoas e Estratégias de Qualidade de Vida no Trabalho, As-
sociação Brasileira de Medicina Psicossomática – ABMP: Presidente Na-
cional, Autora de Qualidade de Vida no Trabalho: práticas e conceitos na
sociedade pós-industrial, Psicologia do Trabalho: psicossomática, valores
e práticas organizacionais, e mais uma dezena de livros, capítulos, artigos
acadêmicos e técnicos. Participou do CPCL 2008 na Harvard Business
School,  Cambrigde/ USA; Instituto Superior Politecnico Universitário, 
Maputo/MZ, Universidade Del Valle,  Cali/CO, entre outras atuações
nacionais e internacionais.

LILIANA A. M. GUIMARAES - Psicóloga no Brasil e na Austrália,


membro da Australian Psychological Association- APA; Mestre em Psicolo-
gia da Saúde, Doutora em Saúde Mental pela UNICAMP, Pós-doutora
em Medicina do Estresse pelo Instituto Karolinska, Estolcomo, Suécia e
em Saúde Psíquica do trabalhador pela Faculdade de Medicina da UNI-
CAMP. Atualmente, é Profa Dra. Titular do curso de Mestrado e Douto-
rado em Psicologia, da Universidade Católica Dom Bosco- UCDB/MS,
pesquisadora sênior do SAMPO, IPq, FMUSP e do CNPq; ex-docente do
Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciên-
cias Médicas da UNICAMP; pesquisadora associada da New South Wales
University, Austrália; representante da seção de Psiquiatria Ocupacional da
Associação Internacional de Psiquiatria- WPA, para a região da Austrália;
organizadora da Série Saúde Mental e Trabalho em seu volume 4 e de
outros 12 livros. Autora de inúmeros artigos e capítulos de livro nacio-
nais e internacionais em Saúde Mental do Trabalhador e Psicologia da
saúde ocupacional. Áreas de interesse: Psicologia da Saúde Ocupacional,

16 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Saúde psíquica do trabalhador. Temas de interesse: estresse ocupacional,
síndrome de burnout, fatores psicossociais de risco e proteção à saúde do
trabalhador: diagnóstico, manejo e gerenciamento; transtornos mentais
relacionados ao trabalho e seus custos: humano, familiar, social, econô-
mico, assédio psicológico, qualidade de vida, resiliência, engajamento no
trabalho, trabalhos que envolvem intensa carga emocional- emotional work;
comportamento contraproducente no trabalho, presenteísmo, entre ou-
tros temas.

MARILDA EMMANUEL NOVAES LIPP - Graduada em Psicologia


pela American University, Estados Unidos, mestrado e PhD em Psicolo-
gia Experimental e Clínica  pela George Washington University, Estados
Unidos, e pós-doutorado pelo National Institute of Health, Estados Uni-
dos. Foi professora titular da Pontifícia Universidade Católica de Campi-
nas (PUC-Campinas). É diretora do Instituto de Psicologia e Controle do
Stress (IPCS), membro da Academia Paulista de Psicologia e presidente
emérita da Associação Brasileira de Stress (ABS). Tem atuado como pales-
trante e consultora de grandes empresas particulares e públicas e Secreta-
rias de Segurança Pública de vários estados. É autora/organizadora de 25
livros na área de stress e qualidade de vida.

MÁRIO CÉSAR FERREIRA - Psicólogo do trabalho, Doutor pela École


Pratique des Hautes Études (EPHE, França), com pós-doutorado Univer-
sité Paris 1 Sorbonne (França) em Ergonomia da Atividade Aplicada à
Qualidade de Vida no Trabalho. Professor associado 3 no Departamento
de Psicologia Social e do Trabalho do Instituto de Psicologia da Univer-
sidade de Brasília (UnB) e no Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Social, do Trabalho e das Organizações (PPG-PSTO) do Instituto de Psi-
cologia. Foi Diretor do Programa de Iniciação Científica da Universidade
de Brasília (2009-2012). Co-coordenador do Grupo Trabalho e Saúde da
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPE-
PP). Coordenador do Grupo de Pesquisa no Diretório do CNPq “Desen-

17
volvimento de Pessoal e Qualidade de Vida no Trabalho no Setor Públi-
co (DViTra)”, do Núcleo de Ergonomia da Atividade, Cognição e Saúde
(ECoS), do Grupo de Estudos em Ergonomia Aplicada ao Setor Público
(ErgoPublic). É bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq - Nível
2, onde executa projeto (2014-2017) na temática “Contexto de Trabalho e
Práticas de Gestão em Organizações Brasileiras: Impactos Sobre a Quali-
dade de Vida no Trabalho”. É autor do livro “Qualidade de Vida no Tra-
balho. Uma Abordagem Centrada no Olhar dos Trabalhadores” (2012)
Editora Paralelo 15, co-organizador dos livros: “Qualidade de Vida no Tra-
balho: Questões Fundamentais, Perspectivas de Análise e Intervenção”
(2013), Editora Paralelo 15; “Trabalho e riscos de adoecimento: o caso dos
auditores-fiscais da Previdência Social brasileira” (2003) Edições Ler, Pen-
sar, Agir - LPA; “Dominação e Resistência no Contexto Trabalho-Saúde”
(2011) Editora Mackenzie; “A regulação social do trabalho” (2003), publi-
cado pela Editora Paralelo 15 e “Trabalho em transição, saúde em risco”
(2002) Editora da UnB.

MARKUS VINICIUS NAHAS - Professor Titular aposentado da Univer-


sidade Federal de Santa Catarina (1977 – 2012), onde atuou nos progra-
mas de graduação e pós-graduação em Educação Física, além de coordenar
o Núcleo de pesquisa em Atividade Física e Saúde. Graduado em Educa-
ção Física (1976), possui mestrado nesta área pela Vanderbilt University
(1980) e doutorado pela University of Southern Califórnia (1985). Reali-
zou dois estágios de pós-doutorado - em 1991 na Arizona State University
e em 2000 na University of South Carolina (ambos na área de Atividade
Física relacionada à Saúde). É sócio fundador e foi o primeiro presidente
da Sociedade Brasileira de Atividade Física e Saúde (2008-2009). Autor
de diversos livros e capítulos de livros, com destaque para “Atividade Fí-
sica, Saúde e Qualidade de Vida” (sexta edição em 2013). Atualmente é
consultor em promoção de estilos de vida saudáveis e qualidade de vida.
Casado, pai de dois filhos, tem como lazer ativo o voleibol geriátrico das
sextas-feiras e as pescarias na baía sul, em Florianópolis.

18 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Gestão Integrada
de Saúde e Qualidade de
Vida nas Organizações
Ana Claudia Assis Pinto

19
GESTÃO INTEGR ADA DE SAÚDE E
QUALIDADE DE VIDA NAS
ORGANIZAÇÕES

Q uando fui convidada pelo Dr. Alberto Ogata para participar des-
ta publicação, além de ficar muito honrada, refleti sobre como
eu deveria abordar o tema sobre o qual escreveria. Pensei então
em criar uma espécie de conversa, para tentar levar o assunto de forma
mais leve. Foi aí que surgiu a ideia de fazer sob a forma perguntas que nor-
malmente são feitas quando se fala sobre este tema. Achei que seria uma
forma interessante de dividir alguma experiência e a paixão por gestão de
saúde.
O formato escolhido também ajudou a tornar o texto mais infor-
mal, permitindo uma discussão mais prática sobre o assunto. Foi possível
dividir algumas experiências das quais tive oportunidade de participar e
aprender, como alguns estudos de casos desenvolvidos aqui no Brasil.
A Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organiza-
ções, apesar de bastante discutida em nosso meio, é um tema ainda em
construção na literatura em termos de melhores práticas e resultados con-
sistentes.
O público alvo principal foram os profissionais da área de Recursos
Humanos, que têm o atual desafio de participar ativamente desta gestão.
O objetivo foi trazer conhecimento e subsídios para que estes profissionais

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 21


possam coordenar o time e interagir, de uma forma mais estratégica com
a diretoria executiva da empresa pois gestão de saúde significa, na prática,
aumento de competitividade.

Índice das perguntas


1. Por que fazer Gestão da Saúde? Qual o cenário atual e os prin-
cipais desafios das empresas?
2. Qual foi a evolução dos custos em saúde ao longo do tempo
e quais as tendências para os próximos anos? Qual o impacto
para as empresas?
3. Qual a relação entre o custo e qualidade da assistência médica?
Onde está o “paciente” neste cenário?
4. Os custos da saúde estão apenas nos gastos com a operadora?
Quais são os custos indiretos da saúde? Qual o custo total da
saúde para as empresas?
5. Integração entre Saúde Ocupacional, Promoção da Saúde e
Bem-estar.
6. Qual a importância da Tecnologia da Informação na saúde?
Qual será o papel de eHealth num cenário onde a tecnologia só
tem elevado o custo da saúde nos últimos anos?
7. Quais as estratégias e ferramentas para a Gestão Integrada de
Saúde e Qualidade de Vida dentro das empresas na prática? O
que é Gestão de Saúde Populacional?

Considerações Finais

1. Por que fazer Gestão da Saúde? Qual o cenário atual e os prin-


cipais desafios das empresas?
O contexto do aumento da competitividade no mercado e a cres-
cente necessidade de utilizar-se bem os recursos disponíveis, tem impul-

22 Temas Avançados em Qualidade de Vida


sionado as empresas a entenderem melhor os riscos e custos que podem
comprometer o bom andamento de seus negócios.
Dentro deste cenário existe uma preocupação crescente com o be-
nefício saúde, pois os custos crescem mais do que os índices de inflação
econômica e são expressivos para a maioria das empresas. Além disso, o
benefício saúde é um dos que mais contribui para a atração, retenção, en-
gajamento e satisfação dos colaboradores, tendo portanto papel na com-
petitividade pelos melhores profissionais. Isto justifica a preocupação com
a sua manutenção pelas empresas.
O benefício saúde tem impacto tanto nos custos diretos – que aqui
definiremos como o desembolso objetivamente percebido pela empresa,
ou seja, ligado diretamente à assistência à saúde (ex. plano de saúde, pla-
no odontológico, ambulatório próprio, check-up etc.) – como nos custos
indiretos – que definiremos como aqueles custos que não são claramente
relacionados à saúde, pois não estão ligados a ela de forma clara e intuitiva
(ex. absenteísmo, perda de produtividade, seguro acidente de trabalho,
processos contra empresa por acidentes de trabalho, etc.). Parte destes
custos estão sob a responsabilidade da área de Recurso Humanos (RH),
outros estão na área financeira, no departamento jurídico, na segurança
do trabalho, e estando dispersos, normalmente não são contabilizados
nos custos da saúde. O somatório dos custos diretos e indiretos é que
perfazem o desembolso total da empresa com saúde.
A falta de conhecimento do custo total ocorre por várias razões,
mas o fator principal é a falta de integração das informações da saúde
assistencial com a saúde ocupacional, que é feita pela gestão integrada
de saúde. Esta gestão bem executada pode contribuir muito para melhor
entendimento e consequente gestão do benefício saúde dentro das empre-
sas, auxiliando na sua sustentabilidade.
Este cenário é um grande desafio aos profissionais de RH, que pre-
cisam compreender de forma sistêmica não só os custos, mas os riscos, que
comprometem o bom andamento dos negócios, e ainda lidar com o capi-
tal humano - que é frequentemente o ativo mais importante - de forma a

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 23


minimizar os riscos e maximizar o desempenho da empresa, melhorando
a produtividade e bem-estar de seus colaboradores
Deve-se aproveitar esta oportunidade que o desafio atual da gestão
de saúde nos têm imposto para utilizar o potencial total dos trabalhadores
como a maior fonte de vantagem competitiva, tanto para as empresas,
como para os países (1).

2. Qual foi a evolução dos custos em saúde ao longo do tempo


e quais as tendências para os próximos anos? Qual o impacto
para as empresas?
No Brasil e em vários locais no mundo, as despesas com saúde cres-
cem com taxas superiores ao crescimento do PIB. Os custos médicos avan-
çam mais que o índice de preços ao consumidor, impulsionados tanto por
aumento dos custos unitários como pela maior utilização dos recursos.
Paralelamente, sabemos dos efeitos do desenvolvimento econômico na
morbidade e na mortalidade das populações.
Os custos da assistência à saúde crescem desde os anos 80 (2). Os
principais causadores deste aumento de custos no setor são a incorporação
de novas tecnologias, o envelhecimento populacional e o desperdício de
recursos (3; 4). Nos Estados Unidos diversos estudos reportam que os
gastos desnecessários representam entre 20% e 30% do dispêndio total
com saúde. Esse fenômeno está relacionado a uma série de distorções
observadas no mercado de bens e serviços de saúde, como falhas assisten-
ciais, de coordenação e de precificação, uso desnecessário, complexidade
administrativa e práticas fraudulentas e abusivas (2).
Este crescimento dos custos, corrobora com os argumentos do tópi-
co 1 sobre a necessidade da atenção, cada vez maior, dos profissionais de
RH para a gestão de saúde nas empresas.
No Brasil observamos que o valor da inflação médica cresce desco-
lada da inflação econômica (Gráfico 1).
O VCMH expressa a variação do custo per capita das operadoras
de planos de saúde entre dois períodos consecutivos de 12 meses cada, e

24 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Gráfico 1 Variação dos custos médico-hospitalares (VCMH) e do IPCA. Fonte: IESS.

capta a variação da frequência de utilização e o preço médio dos serviços


de assistência à saúde, sendo portanto, diferente dos índices de inflação
geral ao consumidor.
A inflação geral ao consumidor, demonstrada acima pelo índice
de inflação econômica divulgado pelo IBGE (IPCA), é um indicador do
aumento dos preços de uma determinada cesta de produtos e serviços em
um determinado país ou região.
Segundo estudos da Mercer Marsh, o gasto com a saúde dos colabo-
radores em 342 empresas pesquisadas aumentou 155% de 2003 a 2011,
enquanto que a inflação econômica neste período cresceu 87%. Isto gera
uma sobrecarga cada vez maior para as empresas em relação à folha de pa-
gamento. Em 2012 os gastos com o plano de saúde representavam, em mé-
dia, 10,38% da folha de pagamento, variando entre 5 a mais de 20% nas
empresas pesquisadas. Em 2009 a inflação médica correspondia a 9,5%
da folha. Portanto, se este ritmo de crescimento for mantido o percentual
do custo com a operadora pode chegar a 13% da folha de pagamento em
2022.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 25


Dentro desta realidade, as ações de gestão de saúde são fundamen-
tais.
Recapitulando o que foi mencionado acima, os custos com plano
de saúde fazem parte dos custos diretos. Discutiremos na seção 4, mais
adiante, sobre qual é o impacto e o que compõe os custos indiretos em
saúde.

3. Qual a relação entre o custo e qualidade da assistência? Onde


está o “paciente” neste cenário?
A melhoria do desempenho de qualquer setor está ligada à existên-
cia de um objetivo comum, que una os interesses e as atividades de todos
os stakeholders. No mercado de Assistência Médica, no Brasil e no mun-
do, as partes interessadas são inúmeras, com objetivos distintos e muitas
vezes conflitantes. Isso gerou a fragmentação do sistema, que resultou em
alto custo associado à baixa qualidade assistencial, com lentos progressos
na melhoria do desempenho ao longo dos anos.
Para ilustrar a questão da qualidade, há cerca de 800.000 mortes
por ano nos Estados Unidos devido à doença cardiovascular. Entretanto,
segundo o CDC, cerca de 200.000 mortes poderiam ser evitadas se as pes-
soas deixassem de fumar, mantivessem um peso saudável, fizessem mais
atividade física, consumissem menos sal e controlassem a pressão arterial,
o diabetes e os níveis de colesterol. Isto significa que precisamos melhorar
no quesito prevenção.
Dentro deste sistema fragmentado, os interesses do paciente não
são o foco principal da cadeia, situação que contibui para desfechos ruins,
como os descritos acima. Este tipo de dado demonstra que não consegui-
mos ainda realmente trazer resultados que agreguem valor em saúde ao
paciente.
Segundo Michael Porter, agregar valor ao paciente deve ser o prin-
cipal objetivo comum de toda a cadeia de prestação de serviços da saúde
(5, Fig. 1).

26 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Figura 1 A melhoria da saúde do paciente deveria ser o interesse comum da cadeira
de atenção à saúde.

Dentro deste assunto, outro ponto que vale uma pequena aborda-
gem, é sobre qual seria a forma correta de medirmos o valor em saúde.
Segundo Porter, o valor é definido como os resultados em relação aos
custos, o que engloba a eficiência. Buscar apenas a redução de custos sem
a preocupação com a qualidade é perigoso. Isso pode levar a falsas eco-
nomias com cuidados de baixa qualidade e prejuizos à saúde das pessoas.
Conforme mencionamos, o valor em saúde deve ser sempre centra-
do no paciente. Num sistema de saúde que funcione bem, a criação de
valor para as pessoas é que deve determinar as recompensas para todos os
outros atores do sistema. Como o valor depende de resultados, e não dos
recursos utilizados, o valor de cuidados de saúde deve ser medido pelos
resultados alcançados, e não pelo volume de serviços prestados.
Como podemos perceber, não é fácil oferecer e nem medir valor
em saúde. O sistema de saúde, da forma como está estruturado hoje, não
está preparado para ofertar a melhor solução e nem para medir resultados
corretamente.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 27


Figura 2 Equação de valor em saúde, segundo Porter.

O valor para o paciente é criado através dos esforços em conjunto


das partes envolvidas ao longo do ciclo completo de cuidado com a saúde.
A responsabilidade e os resultados devem ser compartilhados com todos
os envolvidos. Portanto, podemos perceber que há necessidade de mudan-
ças profundas e estruturais em todo o sistema de saúde para atingirmos os
objetivos mencionados acima.

4. Os custos da saúde estão apenas nos gastos com a operadora?


Quais são os custos indiretos da saúde? Qual o custo total da
saúde para as empresas?
Conforme mencionamos anteriormente, usaremos neste texto a
definição de custos indiretos da saúde para as empresas como aqueles
custos que não são claramente relacionados à saúde dos colaboradores,
pois não estão ligados a ela de forma clara e intuitiva. Para agravar a situa-
ção, estes custos encontram-se em diferentes áreas da empresa. Parte está
sob a responsabilidade da área de Recurso Humanos (RH), outros estão
na segurança do trabalho, na área financeira, no departamento jurídico,
e estando dispersos, normalmente não são contabilizados nos custos da
saúde.

28 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Em muitas empresas não existe um bom relacionamento entre a
área de RH e a segurança do trabalho, pelo contrário, existe competição
por recursos.
No entanto, o custo sai de um só “bolso”, que é o da empresa. A
falta de conhecimento e comunicação entre as áreas pode levar a prejuízos
financeiros expressivos que poderiam ser evitados, caso houvesse o conhe-
cimento do custo total da saúde nestas empresas.
Esta é a principal razão pela qual este assunto deve ser levado à
mais alta direção, pois, em última análise, a responsabilidade é do diretor
executivo ou CEO, uma vez que os custos podem ser bastante expressivos.
Temos observado na prática, que o diretor financeiro tem se envol-
vido cada vez mais nas decisões finais sobre os fornecedores de saúde nas
empresas. Isto acontece porque o custo tem se tornado muito expressivo.
Entendemos que este processo pode ser coordenado pelo RH, que
passa, desta forma, a se tornar estratégico para a competitividade da em-
presa. Por esta razão, mencionamos anteriormente que o papel do RH em
saúde precisa ser estratégico, pois ele pode melhorar a competitividade de
sua empresa no mercado. Para isto, é importante que ele compreenda e
conheça o custo total da saúde para a empresa. Desta forma, ele poderá
alertar e agir em conjunto com a alta direção para encontrar as melhores
soluções em cada caso, resguardando o interesse dos colaboradores, que é
parte do seu desafio enquanto RH.
Mas, quais são estes custos indiretos? E os intangíveis?

Segue abaixo alguns exemplos de custos indiretos, que podem ser


conhecidos ou não:
• Alíquota do seguro acidente de trabalho (RAT) e impacto do
fator acidentário de prevenção (FAP)
• Absenteísmo
• Perda de produtividade por questões de saúde
• Custo da substituição do funcionário afastado ou perdido
• Demandas judiciais por questões de saúde/ acidente de trabalho

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 29


• Agravamento dos custos com o seguro de vida*
• Modelo de financiamento da operadora (pré ou pós pagamento)
• Elegibilidade por cargo ou função do tipo de plano de saúde
para as diferentes atividades da empresa
• Conhecimento e contabilização de passivos atuariais**
• Legislação que regula o setor***
• Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho

Custos intangíveis:
• Relacionados ao engajamento do colaborador e à retenção de
talentos.
• Riscos de imagem por questões de saúde na empresa.

* Custo indireto por pior experiência acidentária.


** Compromissos assumidos com atuais empregados e que serão pagos
após o desligamento (benefícios pós-emprego) e portanto devem ser re-
conhecidos (provisionados) no balanço contábil ao longo da carreira
ativa do empregado na empresa, conforme metodologia definida pelas
Normas Contábeis relacionadas a benefícios pós-emprego (IAS19r/
CVM695/ FASB (FAS-87 – FAS-158 – FAS-88).
*** Principalmente a 9656/98 e as Resoluções Normativas que afetam
os empregadores, principalmente 37/06, alterada pelas 148/07 e
272/11; 195/09, alterada pelas 200/09 e 204/09; 279/11, altera-
da pelas 287/12 e 297/12 (artigos 30 e 31 da Lei 9656/98 – ma-
nutenção de ex-empregados e aposentados), 338/13 (revogou 211/10,
262/11, 281/11 e 325/13) – rol de procedimentos

Podemos observar que, de acordo com os custos indiretos descri-
tos acima, grande parte está ligado à saúde ocupacional. Portanto, iremos
discorrer logo abaixo um pouco mais sobre este assunto e os tributos liga-
dos a ele, como o seguro acidente de trabalho e o FAP.

30 Temas Avançados em Qualidade de Vida


A Constituição brasileira torna obrigatório que todos os funcioná-
rios sejam incluídos em uma apólice de seguro de compensação dos traba-
lhadores, que cobre salários e tratamento médico, decorrente à lesão ou
doença ocupacional no curso de seu emprego. A conseqüente morte ou
deficiência do empregado concede o pagamento de uma pensão para a sua
família ou para o empregado em caso de deficiencia permantente.
O Seguro Acidente de Trabalho, anteriormente SAT, atualmente
denominado de RAT (ou GIILRAT - grau de incidência de incapacidade
laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho) é realizado em
regime de monopólio pela Previdência Social no Brasil, e está em vigor
desde 1965. Este tributo é recolhido pelo INSS desde 1991, mas passou a
ser fonte maior de preocupação para as empresas a partir de 2010 devido à
mudança na legislação específica. O que chamou a atenção das empresas
foram as modificações das alíquotas de contribuição e a cobrança do Fator
Acidentário de Prevenção (FAP). Este último entrou em vigor a partir de
2010, e analisa a frequência, gravidade e custo dos afastamentos ano após
ano, referente ao exercício de 2 anos anteriores. Explicaremos melhor: o
RAT incide percentualmente sobre a folha de pagamento, variando de
1 a 3%, de acordo com o ramo de atividade econômica (CNAE). Já o
FAP é um fator multiplicador (variando de 0,5 a 2), sobre a alíquota do
RAT para diferenciar os riscos oferecidos por cada empresa dentro de uma
mesma área econômica (mesmo CNAE). O RAT multiplicado pelo FAP
constitui o RAT ajustado.
O FAP fundamenta-se no disposto na Lei Nº 10.666/2003, e é
um instrumento das políticas públicas relativas à saúde e segurança no
trabalho e permite a flexibilização da tributação coletiva do RAT segundo
o desempenho de cada empresa no interior da respectiva subclasse do
CNAE.
O FAP anual reflete a aferição da acidentalidade nas empresas rela-
tiva aos dois anos imediatamente anteriores ao processamento (exemplo:
o FAP 2010 tem como período-base de cálculo janeiro/2008 a dezem-
bro/2009). Tem como período de vigência o ano imediatamente posterior

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 31


ao ano de processamento (exemplo: o FAP 2010 terá vigência de janeiro a
dezembro de 2011). O processamento do FAP, a partir do processamento
no ano 2010 segue o padrão metodológico definido na resolução CNPS
Nº 1.316/2010.
A modificação das alíquotas do RAT e a incidência do FAP poderão
elevar significativamente os encargos trabalhistas em alguns setores empre-
sariais. Além disso, a instituição do FAP poderá interferir na competitivi-
dade de cada empresa dentro de seu próprio setor, aumentando o custo
para a empresa com experiências acidentárias ruins.
Esta mudança também trouxe a inversão do ônus da prova sobre
o agravo ocupacional. Anteriormente à alteração da lei, o funcionário é
quem deveria provar que a lesão ocupacional foi causada pela empresa. Na
atual circunstância, o ônus da prova passa a ser da empresa, ou seja, a em-
presa é que tem que provar que não foi ela quem incapacitou o trabalhador.
Outro motivo de preocupação das empresas é com os dados sobre
acidente de trabalho e de doenças ocupacionais. Existe algum histórico so-
bre os acidentes de trabalho e de trajeto, mas já não observamos o mesmo
em relação às doenças ocupacionais.
As doenças ocupacionais são caracterizadas por exposição laboral
a agentes físicos, químicos, biológicos, e mais recentemente, emocionais,
que podem causar algum tipo de agressão ao organismo humano. Como
exemplo, podemos citar desde o LER/ DORT ligados à digitação, e a per-
da auditiva causada pelo excesso de exposição ocupacional aos ruídos, até
as alergias respiratórias e o estresse. Este conceito abrangente nos permite
imaginar como a lista de doenças ligadas ao trabalho pode ser grande.
O Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário (NTEP) é uma me-
todologia com o objetivo de identificar quais doenças e acidentes estão
relacionados à prática de determinada atividade profissional. Partindo de
um estudo estatístico, determina-se se aquela doença ou lesão correlacio-
na-se com o setor de atividade econômica do trabalhador. O nexo epide-
miológico determinará se trata-se de um benefício acidentário e ou de um
benefício previdenciário normal.

32 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Dados sobre afastamentos causados por doenças ocupacionais ain-
da são muito escassos. A Marsh Risk Consulting Brasil, através do traba-
lho do Sr. Sérgio Cruz, divulgou dados da 18º edição da Pesquisa sobre a
experiência de Acidentes do Trabalho no Brasil.
De acordo com esta pesquisa, apesar dos registros consistentes da
Saúde Ocupacional sobre acidentes de trabalho, apenas 6 das 80 empresas
pesquisadas tinham dados sobre doenças ocupacionais. Nestas 6 empre-
sas, o número médio de dias perdidos por doenças ocupacionais foi 6
vezes maior que o de afastamentos relacionados aos acidentes de trabalho
típicos ou de trajeto.
Conforme já havíamos mencionado, a Saúde Ocupacional é pratica-
da nas empresas há muito tempo por tratar-se de uma obrigatoriedade legal.
No entanto, não representava uma grande preocupação do ponto de vista
do negócio. As mudanças nas alíquotas do RAT e a implantação do FAP
vêm contribuir para esta mudança de visão sobre a Saúde Ocupacional.
É importante ressaltar que o cálculo das alíquotas inclui, como
doenças ocupacionais, enfermidades que incidem também na população
em geral, muitas vezes dificultando a correlação clara com o trabalho. Esta
dificuldade, conforme mencionado anteriormente, tem levado a uma sé-
rie de contestações por parte das empresas, pois, como dissemos, outra
mudança ocorrida foi em relação ao ônus da prova, que anteriormente
cabia ao funcionário e agora passou a ser da empresa.
As doenças ocupacionais causam sofrimento físico e emocional
aos trabalhadores e trazem prejuízos às empresas. Além do aumento da
alíquota do RAT, existem outros custos diretos que incluem gastos com
assistência médica e aumento do custo com seguro de vida. Também pre-
cisamos relacionar os custos indiretos, ligados à perda de produtividade,
absenteísmo, tempo de substituição do funcionário afastado, treinamento
de um substituto, risco de ações judiciais contra empresa, sem contar os
prejuízos de imagem e na retenção de talentos.
O desafio das empresas, além de manter uma melhor gestão de
seus afastados, será identificar condições que possam conduzir às doenças

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 33


ocupacionais, e os possíveis portadores destas condições dentro de sua
população. Feito o trabalho de identificação, passamos a estabelecer uma
árvore de causas para identificar as exposições, para em seguida, adotar-
mos medidas preventivas.
Diante deste cenário, estabelece-se a necessidade de maiores esfor-
ços por parte da empresa para redução de frequência, gravidade e custo
relacionados às doenças ocupacionais, que passam pelo investimento em
prevenção. Como frutos, as empresas colherão melhoria no bem estar e
na produtividade de seus trabalhadores, maior controle sobre os custos
relacionados à saúde, maior competitividade e até uma possível redução
nas alíquotas do RAT.

Principais desafios dos profissionais de RH em relação às doenças


ocupacionais:
• Identificar condições que possam conduzir às doenças ocupa-
cionais
• Identificar possíveis portadores de doenças ligadas aos CIDs do
NTEP para poder atuar preventivamente:
• Análise do banco de dados de utilização em saúde
• Integração de dados com a Saúde Ocupacional e outros presta-
dores, para facilitar a compreensão do cenário particular de cada
empresa.
• Estabelecimento de uma árvore de causas para identificar as
exposições
• Definir quais medidas preventivas precisam ser adotadas
• Gestão dos afastados

Tendo discorrido sobre os principais custos indiretos da saúde, e


confirmado que boa parte deles estão ligados à saúde ocupacional, vamos
discutir o conceito do custo total em saúde para as empresas, que engloba
os custos diretos e os indiretos e verificar o que existe na literatura sobre
o assunto.

34 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Como já é sabido, há dificuldade em encontrar dados que expressem
um “custo total da saúde” para as empresas. Isto é compreensível frente
à complexidade do assunto e à multidimensionalidade das variáveis
envolvidos, incluindo fatores próprios de cada país como legislação do
setor, por exemplo.
Encontrar uma única forma de medir saúde é um grande desafio.
As dúvidas começam com a definição do conceito em si. Há um de-
bate sobre a melhor forma de definir e medir a “saúde” dentro das empre-
sas. Conceitos como satisfação, bem-estar, produtividade, aspectos emo-
cionais e espirituais, começam a integrar o conceito saúde no trabalho.
Recentemente, algumas publicações dentro de um guarda chuva de-
nominado “Total Work Health™” (TWH) têm impulsionado este debate
com o objetivo de enxergar a saúde do trabalhador de uma forma holísti-
ca, com uma visão mais integrada da Saúde Ocupacional e Qualidade de
Vida. Esta visão inclui a prevenção de doenças relacionadas ao trabalho
mas também de hábitos de vida que oferecem risco à saúde. Este formato
é distinto da abordagem tradicional da saúde do trabalhador, que separa a
saúde ocupacional de sua contraparte não ocupacional. Embora os alvos
dos programas sejam diferentes, os objetivos finais são os mesmos, ou seja,
saúde e bem-estar do trabalhador (6).
Neste novo campo de pesquisa e prática, uma das questões que tem
ganhado importância é a busca da melhor forma de compreender a efi-
cácia econômica ou relação custo-eficácia de tais programas integrados.
Embora os benefícios dos programas de TWH estejam embasados por
justificativas teóricas, há ainda a busca pela validação em termos de resul-
tados clínicos e financeiros.
Apesar da escassez de estudos sobre custo total, o Gráfico 2 mostra
um estudo feito no Brasil que demonstra o custo total em saúde em uma
empresa metalúrgica. Para este case utilizamos o conceito de custo total da
saúde, que é a soma dos custos diretos e indiretos na empresa. É importan-
te ressaltar que o conceito utilizado para este case brasileiro é diferente do
exposto acima para o TWH. Além dos custos indiretos obtidos através da

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 35


Gráfico 2 Custo total em saúde, que é a soma dos custos diretos e indiretos.

Indústria do setor de fundição, construção e mineração com unidades no Brasil e no Exterior, atendendo
mais de 35 países. Mais de 10.000 colaboradores. Custos das cirurgias ortopédicas correspondem a
14% do gasto total. 78% das cirurgias ortopédicas ocorreu no grupo dos titulares. Ortopedia e trauma
são responsáveis por 47% dos afastamentos até 15 dias e 69% dos afastamentos acima de 15 dias.

saúde ocupacional, outros também foram computados, como por exem-


plo, provisionamentos ou reservas financeiras.
Discutiremos mais sobre o conceito de TWH a frente.

Este case pode servir de inspiração para uma reflexão dos gestores
sobre os componentes do custo total em saúde em suas empresas.

5. Integração entre Saúde Ocupacional, Promoção da Saúde e


Bem-estar
Segundo o Instituto Nacional de Saúde e Segurança Ocupacional
nos EUA (NIOSH) as empresas são o local com o maior potencial de pre-
venção em larga escala, pois uma grande parte da população está dentro
das corporações. Elas também valorizam uma força de trabalho saudável

36 Temas Avançados em Qualidade de Vida


e produtiva, e têm potencial para se tornar um bom “laboratório” para
as nações na busca de adequação dos custos e melhoria da qualidade da
assistência (6). Sendo assim, existem razões para a ação conjunta entre
programas de saúde e segurança do trabalho com programas de promoção
de saúde ou bem-estar. Estas razões são fundamentada em 4 princípios
baseados em evidências e destacados por Sorensen and Barbeau (7). São
eles:
1. O risco de adoecimento da força de trabalho é potencializado
pela exposição conjunta às lesões ocupacionais e pelos hábitos
que trazem risco para doenças crônicas.
2. Os trabalhadores com maior exposição para condições de riscos
ocupacionais são aqueles que mais comumente possuem com-
portamentos e hábitos de risco para a saúde. (ex. pessoas com
menores níveis educacionais têm os maiores graus de obesida-
de, bem como têm as maiores chances de trabalhar em funções
de maior exposição aos riscos ocupacionais).
3. A integração de ações de promoção de saúde com as tradicio-
nais ações de saúde e segurança no trabalho podem aumentar a
participação e a efetividade nos trabalhadores de alto risco (ex.
os trabalhadores tendem a ficar menos desconfiados das ações
de promoção de saúde se elas vierem junto com as ações de saú-
de e segurança no trabalho, e desta forma, tendem a aumentar
sua participação).
4. Saúde e segurança no trabalho mais ações de promoção de
saúde em conjunto podem beneficiar a organização de forma
mais abrangente, evitando a competição por recursos (coorde-
nação ao invés de competição por recursos podem multiplicar
seu impacto).

Junto com a saúde ocupacional, há a possibilidade de se implemen-


tar programas mais abrangentes que reduzam lesões e doenças causadas
pelo trabalho, mas também que controlem os fatores de risco para o de-

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 37


senvolvimento de doenças crônicas e promovam o bem-estar, criando o
conceito de Total Worker Health (TWH) ou Saúde Total do Trabalhador,
em uma tradução simples em Português.
Conforme mencionado anteriormente, vamos discorrer um pou-
co mais sobre TWH. O termo Total Worker Health (TWH) foi criado
e registrado em 2011 pelo NIOSH para formalizar a expansão do con-
ceito tradicional de saúde e segurança no trabalho incluindo o conceito
de bem-estar. Traduzido para o Português podemos entender como uma
“estratégia que integra saúde e segurança no trabalho juntamente com a
promoção à saúde para evitar acidentes, doenças ocupacionais e promo-
ver a saúde e o bem-estar dos colaboradores” (http://www.cdc.gov/niosh/
twh/totalhealth.html).
O Colégio Americano de Medicina Ocupacional e Ambiental ex-
pandiu a definição: “. . . proteção e promoção da saúde no local de traba-
lho é a integração estratégica e sistemática de políticas ambientais, de saú-
de e segurança, de forma continuada e progressiva, que melhora a saúde
geral e o bem-estar da força de trabalho, evitando acidentes de trabalho
e doenças profissionais.” (http://www.cdc.gov/niosh/twh/totalhealth.
html) (8).
Existem algumas evidencias na literatura que as intervenções con-
juntas, no conceito de TWH, podem mellhorar a saúde da força de tra-
balho mais rapido e efetivamente do que as intervenções separadamente
(6). No entanto, a literatura sobre TWH ainda está sendo desenvolvida.
Por esta razão, ainda tem natureza muito heterogênea. Não há evidências
suficientes para identificar intervenções baseadas em melhores práticas.
De qualquer forma, os autores são unânimes em dizer que os resultados
devem ser focados na melhoria da saúde e redução de acidentes e não na
redução de custos para a indústria, que deve ser consequência, se as in-
tervenções forem eficazes. Mais estudos serão necessários para confirmar
estas hipóteses e verificar se através da aplicação do conceito de TWH será
possível melhorar a saúde integral do trabalhador.

38 Temas Avançados em Qualidade de Vida


6. Qual a importância da Tecnologia da Informação na saúde?
Qual será o papel de eHealth num cenário onde a tecnologia
só tem elevado o custo da saúde nos últimos anos?
Já é de domínio público que a incorporação de novas tecnologias
médicas é um dos fatores que mais aumenta os custos em saúde. Estima-
-se que desde 1990, a maior parte do crescimento nos gastos com saúde
tenha sido gerado por tecnologias caras e que trazem pouco benefício ao
paciente. Portanto, a incorporação de novas tecnologias pode ser onerosa
e sem necessariamente beneficiar o paciente e melhorar os indicadores de
saúde da população (9).
Ao passo que os custos na saúde dobram nos Estados Unidos a cada
13 anos os custos na área da computação caem pela metade a cada dois
anos. Esta última é a Lei de Moore (10) .
Apesar do aumento de custo que a TI trouxe à saúde, existem mui-
tas facetas positivas. A TI tem um importante papel na gestão integrada
de saúde e qualidade de vida, tanto para as empresas, como para os países.
Alguns autores relatam que a melhor forma que a TI pode ajudar no
controle de custos é se ela for usada para organizar melhor o sistema de
saúde (10). Demonstraremos no tópico 7 como utilizá-la para integrar as
informações de várias fontes, principalmente entre medicina assistencial
e ocupacional.
Existem evdências mais recentes de que a tecnologia pode ajudar a
controlar os custos ao mesmo tempo que melhora a qualidade da assistên-
cia. Por exemplo, é possível, através da telemedicina, fornecer assistência
médica para populações remotas e desassistidas, e ao mesmo tempo, redu-
zir os custos do sistema de saúde em geral.
O intercâmbio remoto de dados entre um paciente e um profis-
sional de saúde acompanhamento de doentes crônicos comprovou que
é possível melhorar a assistência médica ao paciente e reduzir os custos.
No Reino Unido, o Departamento de Saúde lançou o programa WSD –
Whole System Demonstrator, com a finalidade de criar um conjunto de
evidências para a integração das coberturas de assistência médica e social

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 39


por meio dos serviços de telessaúde e teleassistência. De qualquer forma, a
telessaúde está em constante desenvolvimento e os resultados deste estudo
e de outros podem ajudar a comprovar e melhorar sua eficácia.
Além de auxiliar pessoas portadoras de doenças, também existem
recursos para a população de risco e saudável.
A medida que vamos entendendo toda a gama de recursos que a TI
pode nos proporcionar, percebe-se que ela pode nos ajudar, e muito, na
gestão de todas as fases de saúde de uma população, desde os pacientes
mais complexos, passando por gestão de doentes crônicos, até à popula-
ção saudável, que se beneficia, principalmente, com ações de qualidade de
vida e bem-estar, agora potencializadas por recursos de eHealth.
De acordo com a HIMSS (Healthcare Information and Management
Systems Society), eHealth é qualquer aplicação de Internet, utilizada em
conjunto com outras tecnologias de informação, focada na melhoria do
acesso, da eficiência, da efetividade e da qualidade dos processos clínicos
e assistenciais necessários a toda a Cadeia de Atendimento à Saúde. Dessa
forma, o conceito de eHealth inclui muitas funções, que vão desde a troca
de informações clínicas entre os vários atores da cadeia de atendimento,
passando pelas facilidades de interação entre todos os seus membros, até
a disponibilização desta mesma informação nos lugares mais difíceis e re-
motos.
Logo, a pergunta a ser feita seria se as pessoas estão preparadas para
toda esta tecnologia. Parece que sim. Segundo pesquisa da Towers Watson
de 2014, que envolveu 22.347 pessoas em 12 países, foi demonstrado que
39% destas pessoas usam aplicativos para gerenciar sua saúde e bem-estar.
Deste total, 74% consideram o recurso muito efetivo. As principais razões
para o uso são, em 55% dos casos, para obter informações sobre saúde e
bem-estar (Fig. 3).
Existem hoje recursos disponíveis para auxiliar as pessoas a man-
terem uma vida mais saudável, através de experiências via web, com pe-
quenas ações diárias que estimulam a saúde física, emocional e espiritual,

40 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Figura 3 Uso de aplicativos para gerenciamento da saúde e bem-estar.

utilizando-se de redes sociais como apoio para motivar e inspirar as mu-


danças (11).
Esse leque de serviços disponíveis atualmente, tem potencial para
auxiliar as pessoas a mudarem seu comportamento e seus hábitos. A maio-
ria sabe o que precisa ser feito, apenas precisa saber como implantá-lo na
prática em suas vidas, e de modo permanente.
As tecnologias pessoais de Saúde, até há pouco tempo, eram consi-
deradas novidades e poderiam ser passageiras. No entanto, não foi o que
aconteceu. Agora, elas podem se tornar um bom instrumento de transfor-
mação.
Hoje, podemos considerar que existe um novo paciente, que bus-
ca mais autonomia através de sua plataforma tecnológica pessoal. A ca-
deia de assistência à saúde precisará se adaptar a este novo paciente, e
em contra partida, como benefício, espera-se ter mais instrumentos para

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 41


enfrentar a dificuldade de promover mudanças no estilo de vida das pes-
soas. Estas mudanças são fundamentais para obtermos melhores resulta-
dos clínicos e diminuição da incidência de doenças crônicas. Existe uma
conduta médica, mas o nosso atual desafio é fazer com que as pessoas
consigam implementar definitivamente estas mudanças em suas vidas.
Isso demonstra claramente o espaço para novas abordagens que integrem
pessoas e tecnologia, e sejam capazes de mostrar resultados e agregar valor
em saúde às pessoas.

7. Quais as estratégias e ferramentas para a Gestão Integrada de


Saúde e Qualidade de Vida dentro das empresas na prática?
O que é Gestão de Saúde Populacional?
Segundo definição da Population Health Alliance, principal entidade
mundial em gestão de saúde populacional (GSP), “um programa de GSP
se esforça para atender as necessidades de saúde, em todos os pontos, ao
longo da atenção continuada pela participação, engajamento e interven-
ções de saúde e wellness dirigidas à população. O objetivo de um progra-
ma de gestão de saúde populacional é manter ou melhorar o bem estar
físico e psicossocial de indivíduos por meio de soluções customizadas de
saúde e de bom custo benefício” (caderno 1 – ASAP – Aliança para Saúde
Populacional)
De acordo com a definição acima, a GSP busca integrar o cuidado
em todos os níveis de saúde, desde os saudáveis até os mais complexos.
A Fig. 4 nos auxilia a compreender melhor o escopo de atuação
da GSP.
Desta forma, percebemos que existe afinidade entre os conceitos de
GSP e gestão integrada de saúde e qualidade de vida nas organizações, que
é o objeto de discussão desse capítulo. Podemos dizer o mesmo em relação
ao conceito de TWH citado anteriormente nos tópicos 4 e 5. A diferença
básica está no público alvo. Gestão integrada de saúde e qualidade de vida
nas organizações, bem como TWH, tem um foco ampliado em saúde ocu-

42 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Fonte: ASAP – Aliança para a Saúde Populacional. Adaptado do Center for Disease Control and
Prevention.

Figura 4 Representação esquemática da Gestão de Saúde Populacional (GSP).

pacional, pois destinam-se diretamente ao mercado corporativo, ao passo


que GSP pode ter um escopo mais abrangente enquanto conceito.
Para facilitar a compreensão e aplicação prática da gestão integrada
de saúde e qualidade de vida numa empresa, serão citados alguns exem-
plos práticos de empresas brasileiras que podem inspirar as pessoas que
buscam tal integração em suas organizações.
Inicialmente, é necessário entender como se distribui uma popu-
lação, em termos de número de pessoas, condições de saúde e custo. O
mesmo raciocínio pode ser aplicado à população de uma empresa.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 43


Condição de Saúde & Custo
O Gráfico 3 demonstra hipoteticamente, e de forma simplificada, a
distribuição de uma população comum em termos de número de pessoas,
condição de saúde e respectivo custo direto com a operadora de saúde. A
linha azul demonstra o número de pessoas e a linha vermelha os custos
correspondentes ao nível de saúde em que esta população se encontra.
A maior parte das pessoas está na condição de saudável. Como
percebemos no gráfico esquematizado no Gráfico 3, o custo direto da
população saudável (Saudáveis) tende a ser menor. Na ponta oposta, en-
contramos a parte da população que apresenta maior complexidade (Fase
Terminal), e cujos custos assistenciais, consequentemente, tendem a ser
bem mais elevados.
Para facilitar o entendimento, o gráfico foi dividido em 4 quadran-
tes por 3 linhas pontilhadas, que definem o tipo principal - mas não o
único tipo - de ação em gestão de saúde que pode ser realizada em cada
um dos 4 quadrantes.

Iniciando da esquerda para a direita:


• Promoção de Saúde – para a população saudável, na forma de
ações de promoção de saúde, qualidade de vida e bem-estar.
• Prevenção – focada na população que apresenta algum risco ou
está em fases iniciais da doença crônica.
• GMDC – programas focados na gestão da população portadora
de alguma doença crônica, com a presença ou não do médico
na equipe que faz o acompanhamento à distância.
• Case Management – gestão caso a caso, que precisa ser adapta-
da aos casos mais complexos.

O gráfico esquematizado do Gráfico 3 será usado como modelo


durante todo este tópico para facilitar o entendimento do conjunto das
ações em nível populacional.

44 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Gráfico 3 Esquema simplificado da distribuição de uma população em termos de
número de pessoas, condição de saúde e respectivo custo direto com a
operadora de saúde. Na parte superior de cada quadrante, está o tipo de
ação mais comum para o respectivo quadrante de população.

Seguindo em nosso raciocínio baseado na Gráfico 3 além das qua-


tro divisões descritas acima, que nos sugerem o tipo de ação a ser reali-
zada, separamos a figura didaticamente em duas metades: do meio para
a direita vemos uma seta para a direita e os dizeres Custo; do meio para
a esquerda vemos outra seta para esquerda e os dizeres Produtividade
(Gráfico 4).

Produtividade & Custo


Cada um dos lados nos indica o tipo de indicador que deve-se utili-
zar para cada quadrante do gráfico. Explico: é muito importante desenvol-
ver iniciativas compatíveis com o tamanho, orçamento e cultura das em-
presas. Por exemplo, como a população saudável tem custos assistenciais,
via de regra, menores, se utilizarmos apenas os indicadores de custo tere-
mos maior dificuldade em mostrar resultados. Portanto, para a metade da

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 45


Gráfico 4 O gráfico foi, didaticamente, separado em duas metades: do meio para a
direita vemos uma seta para a direita e os dizeres Custo; do meio para a
esquerda vemos outra seta para esquerda e os dizeres Produtividade. Em
linhas gerais, este são os tipos de indicadores que devemos usar para medir
resultados em cada um dos quadrantes.

esquerda do gráfico, deve-se acrescentar os indicadores de produtividade,


que é um custo indireto conforme a definição usada neste texto. Mos-
traremos exemplos práticos mais abaixo. Isto é importante porque existe
uma expectativa de retorno sobre investimento da alta gerência das ações
implementadas. Devemos então considerar os custos diretos e os indiretos
para calcular o retorno sobre o investimento.
Baseados nas premissas da Figura 4 e Gráfico 3, vamos daqui em
diante discutir algumas ações em gestão de saúde, utilizando alguns dados
de cases reais de empresas aqui no Brasil.
Já foi discutido no tópico 6 a importância que a Tecnologia da In-
formação tem na gestão integrada de saúde para a utilização cruzada de da-
dos de diversas fontes complementares de informações. Existem algumas
etapas básicas nas quais a TI pode auxiliar:
1. Produção da Informação no formato adequado;
2. Cruzamento de várias fontes de informação;

46 Temas Avançados em Qualidade de Vida


3. Cálculo dos valores financeiros;
4. Comparação com as melhores práticas (quando existirem);

A produção da informação no formato adequado, refere-se à qualifi-


cação do dado assistencial que utilizaremos para obter as primeiras medidas
fidedignas de frequência e custo, que é o primeiro passo prático para co-
nhecermos as características de uma população de interesse. Os dados que
recebemos das diversas operadoras do mercado não foram projetados com
o objetivo de se fazer gestão de saúde. Na época em que os sistemas foram
desenhados, muitos em uso até os dias de hoje, o objetivo principal era a
prestação de contas. Portanto, há a necessidade de alocarmos os dados em
“caixinhas” adequadas para poder analisá-los e tirar conclusões corretas.

As “caixinhas” sugeridas são:


- consultas de ambulatório
- exames complementares
- utilização de pronto socorro ou emergência
- internação por especialidade médica
- terapias do grupo 1 (fonoaudiologia, fisioterapia, psicologia, etc)
- terapias do grupo 2 (terapias oncológicas)

Ferramentas de ação para controle de


custos – lado direito do gráfico 4

Após a qualificação do dado, podemos obter a frequência e custo de


cada um dos procedimentos acima. Desta forma, podemos entender como
se distribuem os procedimentos e onde se concentram os maiores custos.
A situação ideal seria ter um padrão de comparação relacionado às
melhores práticas. No entanto, para se conseguir esse dado é necessária
uma base grande de dados para ser estudada. As consultorias podem dis-
por desse recurso.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 47


Utilizando o mesmo gráfico para melhor entendimento, vamos dis-
cutir abaixo algumas das ações que as empresas podem fazer, em cada um
dos quatro quadrantes, para abranger toda sua população.
As ações têm como alvo, do ponto de vista da empresa, principal-
mente a melhoria da produtividade da força de trabalho e o controle de
custos com o plano de saúde. Podemos focar em ações para redução dos
custos diretos, que normalmente encontram-se ao lado direito do gráfico,
e referem-se a um grupo de doentes crônicos mais severos e casos comple-
xos que exigem abordagem individualizada. As internações normalmente
encontram-se neste lado e representam a maior parte do custo (de 40 a
70%, dependendo principalmente da faixa etária e tipo de plano). Portan-
to, nesta metade existe um potencial maior para redução de custo direto
através de ações de gestão de saúde.

a. Foco em gerenciamento de casos de maior custo (Gráfico 5)

Ações mais comuns:


• Acompanhamento das internações em tempo real e no pós
alta imediato;
• Case Management – que é a gestão individual dos casos mais
complexos.
A operadora pode fornecer o dado para estes acompanhamentos, se
a empresa tiver uma estrutura interna de suporte.
Podemos esperar com esta ação:
• Atenção especial ao paciente internado pelos profissionais de
saúde da empresa. Esta ação normalmente é vista de forma po-
sitiva, como um cuidado que a empresa tem com seus colabora-
dores num momento difícil para eles.
• Atuar ativamente junto à Operadora, estreitamento o relaciona-
mento com ela e com seus prestadores, como Home Care por
exemplo, agilizando assim o processo para evitar desperdícios
de recursos e tempo precioso para o paciente internado.

48 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Gráfico 5 Ações para redução dos custos diretos, que normalmente encontram-se
ao lado direito do gráfico, e referem-se a um grupo de doentes crônicos
mais severos e casos complexos que exigem abordagem individualizada
(quadrante case management destacado).

• Prever o custo de maior impacto com cerca de 60 dias de ante-


cedência. Esta informação é de interesse principalmente para
aquelas empresas que optaram pelo modelo de pós pagamento
dos gastos com a operadora.

b. Foco em gerenciamento de doenças crônicas (Gráfico 6)

Nesta fase a gestão integrada de saúde traz uma série de benefícios,


tanto para as pessoas quanto para a empresa. Quanto maior o número
de fontes de informação, mais claro será o mapa de risco da população e
mais assertivas serão as ações. Por exemplo, através dos dados coletados na
Saúde Ocupacional, podemos antever os pacientes portadores de doenças
crônicas, mesmo que eles ainda não tenham utilizado o plano médico.
Um funcionário recém admitido pode se beneficiar de programas para
controle de doenças crônicas logo que entrar na empresa, melhorando
sua qualidade de vida, sua produtividade e, também, evitando internações

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 49


Gráfico 6 Ações para redução dos custos diretos, que normalmente encontram-se
ao lado direito do gráfico, e referem-se a um grupo de doentes crônicos e
algumas internações menos complexas por descompensação destes doentes.
Neste quadrante é onde parece haver maior possibilidade de retorno sobre
investimento (quadrante GMDC destacado).

desnecessárias por descompensar seu quadro por falta de cuidados ade-


quados. Pode também ser ativamente convidado - e estimulado - a utilizar
eventuais benefícios que a empresa ofereça, como orientação nutricional
ou prática de atividade física. E assim por diante.
O mapeamento de risco pelo cruzamento de diversas fontes permite
a melhor utilização dos benefícios já oferecidos pela empresa.

Ações mais comuns:


• Programa de Gerenciamento de Doentes Crônicos, desde es-
tágios iniciais até pacientes um pouco mais complexos.
• Integração com trabalho dos ambulatórios das empresas, caso
haja foco assistencial.
• Possibilidade de segunda opinião médica quando houver indi-
cação de procedimentos cirúrgicos.

50 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Ferramentas de ação para aumento de
produtividade – lado esquerdo do gráfico 4

Demonstraremos abaixo um exemplo de integração de dados as-


sistenciais e ocupacionais, onde poderemos observar os custos diretos e
indiretos na especialidade Ortopedia numa instituição financeira. A Or-
topedia foi escolhida por que constituía, isoladamente, o maior gasto em
internação desta carteira. Esta informação foi obtida após a qualificação
do dado, conforme mencionado anteriormente. Desta forma, obtivemos
o dado de que a Ortopedia foi responsável por 7% dos custos com a ope-
radora nos últimos 12 meses.
Em seguida, verificaremos os custos com absenteísmo obtidos da
saúde ocupacional (Gráficos 7 e 8). Estes dados nos ajudarão a compreen-
der melhor a importância da integração das fontes de informação.
De acordo com o Gráfico 7, podemos observar que a principal cau-
sa dos afastamentos foi Ortopedia.

Gráfico 7 Dados obtidos da saúde ocupacional. Afastamentos por período menor que
15 dias.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 51


Quando analisamos os atestados no período inferior a 15 dias basea-
dos no código internacional das doenças (CID-10), percebemos que 8,5%
dos atestados estão relacionados ao NTEP da empresa (Tabela 1). Ou seja,
essas doenças, de acordo com estudos epidemiológicos da Previdência,
têm relação com o trabalho nesta atividade econômica especificamente
(CNAE). Se causarem afastamento por período maior, na Previdência
haverá a correlação com o NTEP podendo agravar o FAP, e consequente-
mente, aumentar o custo do RAT para a empresa.
Segundo o guia de passos envolvendo a TI, citado anteriormente,
realizamos a etapa básica 2, através do cruzamento de dados assistenciais
(fonte: operadora) com os dados ocupacionais (fonte: atestados médicos)
O passo seguinte será o de atribuir valores financeiros aos dados
encontrados.
No case apresentado acima, observamos que os custos diretos com
Ortopedia na operadora totalizaram R$ 2.186.585,28. Já o custo com o
absenteísmo foi maior, no valor de R$ 2.529.024,00, ilustrado na Figura 5.
Vamos analisar agora os afastamentos por um período maior do
que 15 dias.
De acordo com a Tabela 2, a Ortopedia também foi responsável por
mais de 45% dos afastamentos por um tempo superior a 15 dias.

Tabela 1 Motivos do afastamento por tempo menor que 15 dias com CID-10
relacionado ao NTEP da atividade econômica da empresa do exemplo.

52 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Figura 5 Custos indiretos com absenteísmo – Podemos observar que o somatório do
custo de compensação salarial para afastamentos por causas ortopédicas
num período inferior a 15 dias é maior que os gastos com a operadora em
Ortopedia. Período avaliado de 12 meses.

Gráfico 9 Dados obtidos da saúde ocupacional. Afastamentos por período maior que 15
dias.

Veja na sequência os dados sobre a correlação com o NTEP para


esses afastamentos (Tabela 2). Podemos observar que quase 45% dos afas-
tamentos com mais de 15 dias, ou seja, que chegam à Previdência, tem

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 53


Tabela 2 Motivos do afastamento por tempo maior que 15 dias com CID-10
relacionado ao NTEP da atividade econômica.

o potencial de agravar o FAP. Ao agravar o FAP, que multiplica o RAT,


poderá haver aumento dos custos indiretos para a empresa relacionados
ao seguro acidente de trabalho.
No Gráfico 11, será demonstrado o custo total da Ortopedia para a
empresa, somando os custos diretos e os indiretos.
Pode-se verificar que os custos da Ortopedia ocupam fatia significa-
tiva do custo total. Esta informação é importante para direcionar ações de
gestão de saúde, principalmente pelas seguintes razões:

a) Na maioria das empresas, há necessidade de se justificar os in-


vestimentos em ações de gestão de saúde. Portanto, se fizermos
a opção por programas atrelados aos maiores custos para empre-
sa, será mais fácil conseguir o apoio da alta direção, tanto para
a implementação quanto para a manutenção dos programas.
Também será mais fácil mostrar resultados, o que dará maior
visibilidade e importância estratégica ao RH.
b) Os programas precisam ser integrados. Isto significa que se o
alvo escolhido for Ortopedia, como neste caso, as ações preci-
sam ter início na saúde ocupacional (exame admissional), pas-
sando por rastreamento de possíveis portadores (e no exame
periódico), até a possibilidade de segunda opinião médica, em
casos onde houver indicação cirúrgica.

54 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Custo total em Ortopedia: soma dos custos diretos e indiretos
que puderam ser identificados

Gráfico 10 Indústria do setor de fundição, construção e mineração com unidades


no Brasil e no Exterior, atendendo mais de 35 países. Mais de 10.000
colaboradores. Custos das cirurgias ortopédicas correspondem a 14% do
gasto total. 78% das cirurgias ortopédicas ocorreu no grupo dos titulares.
Ortopedia e trauma são responsáveis por 47% dos afastamentos até 15 dias
e 69% dos afastamentos acima de 15 dias.

Podemos observar com o exemplo do Gráfico 10, que, apesar dos


custos diretos com Ortopedia serem de cerca de 7% do custo total com a
operadora (R$ 2,8 milhões), quando somamos os custos indiretos com Or-
topedia, estes custos perfazem 14% do custo total em saúde da empresa (R$
4,3 milhôes). O custo indireto foi quase 55% maior do que o custo direto
com Ortopedia. Daí a importância de levar em consideração tanto os custos
diretos quanto dos custos indiretos, que são obtidos através da gestão inte-
grada de saúde. O conhecimento do custo total ajuda a calcular o retorno
real sobre o investimento das ações de prevenção que serão implantadas.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 55


Voltando ao gráfico e às medidas de produtividade, segue adiante
as ações que podem ser desenvolvidas para a fatia da população que apre-
senta riscos de adoecimento ou estão em fases bem iniciais de doenças
crônicas (Gráfico 11).

Ações mais comuns


• Possíveis Portadores de Doenças Crônicas – pode-se detectar
os possíveis portadores de doenças crônicas através de rastrea-
mentos específicos na base de dados da operadora
• Perfil de Saúde através da saúde ocupacional – pode-se utilizar
o momento do exame admissional ou periódico para realizar
um perfil de saúde dos colaboradores para detectar a presença
de fatores de risco à saúde, doenças crônicas e fatores de risco
para as doenças ocupacionais.

Gráfico 11 Ações para aumento de produtividade, que normalmente encontram-se ao


lado esquerdo do gráfico, e referem-se a um grupo de possíveis portadores
de doenças crônicas, em fases iniciais das doenças crônicos ou portadores
de comportamentos e hábitos de risco (quadrante Prevenção destacado).

56 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Por fim, discorreremos um pouco sobre as ações de promoção de
saúde e bem-estar, focando principalmente a população saudável.

Ações mais comuns


• Desenvolver Programas de Qualidade de Vida e bem-estar –
conforme mencionado anteriormente, é importante, especial-
mente nesta fatia da população que tenhamos ferramentas de
baixo custo para serem utilizadas em larga escala. Boas ferra-
mentas da TI podem ser bastante valiosas nesta parte do pro-
cesso.
• Reforçar a realização dos exames preventivos - como Papanico-
lau, mamografia, e pesquisa de sangue oculto nas fezes a partir
dos 50 anos. É importante ter em mente que os exames que
devem ser estimulados em nível populacional são aqueles onde
os níveis de evidência justifiquem sua aplicação para toda a po-
pulação.

Gráfico 12 Ações para aumento de produtividade, que normalmente encontram-se ao


lado esquerdo do gráfico, e referem-se a um grupo de pessoas saudáveis
com o objetivo de mantê-las saudáveis e modificar comportamentos e
hábitos de risco (quadrante Promoção de Saúde destacado).

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 57


Relação entre bem-estar e produtividade
Segundo dados da pesquisa da Mercer, “Talent Barometer Research”
realizada no Fórum Econômico Mundial de 2013 em Davos na Suíça,
empresas ao redor do mundo têm feito grandes investimentos em atração
e retenção de talentos por entenderem que o capital humano é um ativo
importante na competitividade de suas empresas. Segundo os dados da
pesquisa, 6 em 10 empresas tem aumentado seus investimentos nesse cam-
po, enquanto apenas 1 em 10 tem diminuído. Dentre estes investimentos,
as áreas de saúde e bem-estar estão na mira, juntamente com educação e
carreira. As ações de bem-estar têm sido entendidas como uma forma de
atração, engajamento e retenção de talentos. Através destes dados obser-
vamos que as ações de bem-estar estão sendo, cada vez mais, ligadas ao
aumento de produtividade do que propriamente ao controle de custo,
embora esse ainda seja um item relevante para as empresas.
Surge então a discussão de quais seriam as ferramentas que pode-
riam auxiliar neste desafio da melhoria do bem-estar. Também conforme
mencionamos anteriormente, o maior desafio atual na manutenção da
saúde e prevenção das doenças é fazer com que as pessoas tenham boa
alimentação e prática regular de atividade física.
As ferramentas precisam ser baratas, de fácil acesso e com boa dis-
persão geográfica. Daí a expectativa com as ferramentas de eHealth. Elas
possibilitam, na teoria, que os “e-pacientes” possam melhor assumir o
controle sobre sua saúde. Segundo especialistas, se as pessoas dedicarem
de 15 a 30 minutos do dia para cuidarem de sua saúde, poderia trazer
resultados positivos. Há portanto maior oportunidade na saúde digital,
que pode estar facilmente disponível no momento mais adequado para
cada pessoa.
Os recursos em sites específicos para esse fim têm sido alvo de inte-
resse em vários países. Os investidores estão particularmente interessados
no papel que as redes sociais podem assumir na melhoria da saúde. Exis-
tem indícios de que quando os pacientes trocam conhecimentos uns com

58 Temas Avançados em Qualidade de Vida


os outros, tendem a fazer menos exames, menos consultas desnecesárias,
e a exigir melhor qualidade no atendimento de saúde.
Do ponto de vista das corporações, existem dados demonstrando a
correlação entre bem-estar, melhoria da performance e redução do absen-
teísmo (Gráfico 12). Logo em seguida, correlacionando bem-estar, aumen-
to do engajamento e retenção dos colaboradores (Gráfico 13).

Gráfico 12 Correlação entre bem-estar, melhoria da performance e redução do


absenteísmo.

Para finalizar, é importante ressaltar que a saúde não é a única for-


ma de melhorar a qualidade de vida e o bem-estar do colaborador dentro
das corporações. As iniciativas precisam incluir, segundo os critérios de
Walton (simplificado):
1. Compensação Justa e Adequada
• Condições de Trabalho
• Ambiente Seguro e Saudável

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 59


2. Ausência de Insalubridade
3. Uso e desenvolvimento de capacidades
4. Possibilidade de crescimento e segurança
5. Integração social na empresa
6. Constitucionalismo - os direitos de proteção ao trabalhador
7. Trabalho e o espaço total de vida
8. Relevância social do trabalho na vida
WALTON.R.Criteria for quality life.In: DAVIS, L.E.CHERNS, A. B. The quality of working life: Problems, prospects and state of the
art. New York: The Free Press, 1975: v. 1, p. 43-97

Existem outros critérios para os programas de Qualidade de Vida


no Trabalho além dos critérios de Walton. Particularmente, gosto desta
lista pois me chama a atenção. Foi publicada em 1975 e continua valendo
ainda hoje em sua essência. Ou seja, estes quesitos não são apenas modis-
mos, mas algo necessário e inerente ao bem estar do ser humano.

Gráfico 13 Correlação entre bem-estar, aumento do engajamento e retenção dos


colaboradores.

60 Temas Avançados em Qualidade de Vida


8. Considerações Finais
Como pudemos verificar, não há solução fácil e nem “receita de
bolo” para a Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida. Existem ini-
ciativas reportadas na literatura mundial, mas ainda há um bom caminho
a percorrer até atingirmos o nível de atuação através das melhores práticas.
Outro ponto a ser considerado é que a literatura pode servir de
exemplo, mas sempre encontraremos situações que são próprias em nossa
cultura e legislação. Isto significa que não devemos esperar que uma solu-
ção pronta apareça para agirmos. Precisamos começar já, através da troca
de experiências entre nós, para que possamos encontrar nossas próprias
soluções.
De qualquer forma, percebemos que, dentro do atual contexto de
aumento das populações, de recursos escassos e das limitações financei-
ras há a necessidade de que governos e provedores de saúde criem novas
abordagens para a assistência médica. As empresas podem ter um papel
ativo nesta descoberta, como um laboratório onde as soluções inovadoras
possam ser testadas.
Este desafio envolve uma equipe multidisciplinar na empresa, e que
pode ser coordenada pelo RH. No entanto, existem problemas mais ime-
diatos que precisam ser endereçados. Os principais desafios imediatos são:

• Integração de informações entre a saúde assistencial e a saúde


ocupacional.
• Mudança de comportamento e hábitos de vidas das pessoas que
possibilite a prevenção de doenças.
• Força de trabalho produtiva, contribuindo na competitividade
da empresa.
• Atração, engajamento e retenção de talentos.
• Manter a boa imagem da empresa, através de uma força de tra-
balhos livre de riscos à sua saúde que possam ser evitados.
• Desenvolver iniciativas compatíveis com o tamanho, orçamen-
to e cultura das empresas.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 61


• Procurar associar objetivos financeiros e de saúde para facilitar
a concretização dos programas.

Ao escrever o capítulo me questionei sobre ter dado bastante aten-


ção à questão financeira num livro sobre Qualidade de Vida. Mas como
a proposta inicial foi dividir a vivência no assunto, na prática, custo é as-
sunto que surge sempre nestas discussões com os decisores nas empresas.
Portanto, o RH deve estar preparado para poder argumentar bem.
Por fim, as vantagens da Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de
Vida nas Organizações se evidenciam através do conhecimento abrangen-
te dos riscos e dos custos relacionados à saúde, o que possibilita à empresa
aumentar sua competitividade no mercado através da melhoria da produ-
tividade e bem-estar de seus colaboradores.

Referências

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2. Carneiro LA, Lara N, Leite, F. Variação dos custos médicos hospitalares e inflação
geral - Por que esses índices não são comparáveis no Brasil e no mundo?. IESS
0059/2014. Disponível em: http://www.iess.org.br
3. Kaiser Family Foundation. Health Care Costs: A Primer Key Information on Health Care
Costs and their Impact. May, 2012. Disponível em: http://kaiserfamilyfoundation.files.
wordpress.com/2013/01/7670-03.pdf
4. Chechin, José. A História e os desafios da saúde suplementar: 10 anos de regulação.
Saraiva: Letras & Lucros, São Paulo, 2008.
5. Porter, ME. What Is Value in Health Care?. N Engl J Med 363; 26 Perspective 2477-81.
December 23, 2010.
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mer, LB, & Montgomery, D. Effectiveness of Total Worker Health Interventions. Journal
of Occupational Health Psychology. December 22, 2014. Disponível em http://dx.doi.
org/10.1037/a0038340

62 Temas Avançados em Qualidade de Vida


7. NIOSH. (2012). Research Compendium: The NIOSH Total Worker Health™ Program:
Seminal Research Papers 2012. (DHHS [NIOSH] Publication No. 2012–146). Washin-
gton, DC: U.S. Department of Health and Human Services, Public Health Service, Cen-
ters for Disease Control and Prevention. http://www.cdc.gov/niosh/docs/ 2012-146
8. Hymel, PA, Loeppke, RR, Baase, CM, Burton, WN, Hartenbaum, NP, Hudson, TW, . . .
Larson, PW. Workplace health protection and promotion: A new pathway for a heal-
thier—and safer— Workforce. Journal of Occupational and Environmental Medicine,
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5, 2013.
10. Regalado, A. We need a Moore´s Law for Medicine. MIT Technology Review. Sep 3,
2013.
11. Cobb, NK and Poirier. Effectiveness of a Multimodal Online Well-Being Intervention: A
Randomized Controlled Trial, J American Journal of Preventive Medicine, 2013.

Gestão Integrada de Saúde e Qualidade de Vida nas Organizações 63


Gestão da Qualidade de
Vida no Trabalho:
evolução, aplicação e soluções
da metodologia biopsicossocial
e organizacional – BPSO96
Ana Cristina Limongi-França
GESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA
NO TR ABALHO: EVOLUÇÃO,
APLICAÇÃO E SOLUÇÕES DA
METODOLOGIA BIOPSICOSSOCIAL E
ORGANIZACIONAL – BPSO96

1. A importância da Gestão da Qualidade


de Vida no Trabalho GQVT

A
s pessoas que trabalham têm expectativas inspiradas a partir do
seu vínculo com uma ou mais organizações. São vínculos de na-
tureza jurídica e psicológica. Desejos, necessidades e vontades são
mediadas pelo contrato formal ou informal de trabalho. As organizações
– por sua vez – desenvolvem e realizam programas e ações de bem-estar e
redução do mal estar que se relacionam direta e indiretamente com a ges-
tão de pessoas, de forma segmentada ou geral com o objetivo de proteção
ocupacional, desenvolvimento pessoal e melhoria do ambiente coletivo de
trabalho. Desta dinâmica são implantadas atividades, estabelecidas metas
e criadas políticas sustentadas pela cultura organizacional. Os programas
e ações podem surgir das organizações, de pressões sindicais e legais e das
próprias pessoas.

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 67


O Ser Humano é “a liberdade em seu próprio ser”... o ser humano
é “o ser pelo qual os valores existem” , estas afirmações de Bornheim (1984,
ág.124), em ensaio sobre a filosofia existencialista de Sartre, fortalecem o
pressuposto de pessoas e organizações devem viver mais e melhor, com
visão consciente e qualificada das suas escolhas de bem-estar.
O Stress da Pessoa é o grande fenômeno da adaptação à vida: como
fato, direito, consciência e necessidade de transformação pessoal e coleti-
va. A Qualidade de Vida é uma condição interna e externa em que a pes-
soa nasce, cresce e se desenvolve neste processo de viver e adaptar-se com
elementos dinâmicos e inter-relacionais de bem-estar e mal-estar. Os fato-
res de percepção e enfrentamento são essenciais – de forma construtiva ou
nociva nas respostas de stress – tanto em “eustress” como em “distress”.
Neste enfrentamento há ganhos e perdas intrínsecos e extrínsecos, dentro
e fora do trabalho. Trataremos aqui especificamente das relações trabalho
e qualidade de vida. Na perspectiva de pessoa - que esta contratada em
uma organização - QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO é: a avalia-
ção de bem-estar e mal-estar no trabalho, alinhada às políticas, aos valores,
aos relacionamentos, aos produtos e aos serviços de Gestão de Pessoas.

2. Breve Retrospectiva Histórica


O termo Qualidade de Vida no Trabalho é localizável em relatos
e publicações os anos setenta, em continente americano e europeu asso-
ciado a políticas nacionais e também empresariais. Governos canadense
locais, universidades e editoras têm como linha de pesquisa e publicações
qualidade de vida, incluindo aspectos afetivo e do significado da vida e do
trabalho, especialmente nos estudos de Estelle Morin (2001). A França
tem uma das culturas mais críticas e dedicadas nos estudos de condições
de vida e trabalho. Especialistas franceses difundiram conceitos de psico-
patologia do trabalho, sofrimento desagregador e sofrimento criativo no
trabalho, questões do poder, mitos e inveja nas organizações. Introduzi-
ram também métodos de melhorias de condições de através de pesquisa-

68 Temas Avançados em Qualidade de Vida


-ação, pesquisa participante e práticas de discussão como o “espaço cole-
tivo”, para conscientização e mudança organizacional através de decisões
dos trabalhadores e da empresa sobre condições ergonômicas e doenças
ocupacionais. Dejours (1994) um dos principais estudiosos e lideres destes
pensamentos define condições de trabalho como “as pressões físicas, me-
cânicas, químicas e biológicas do posto de trabalho”. Segundo o mesmo
psicanalista francês e colegas de pesquisa “as pressões de trabalho têm
por alvo principal o corpo dos trabalhadores, onde elas podem ocasionar
desgaste, envelhecimento e doenças somáticas “(in Dejours, Abdoucheli,
Jayet, 1994, pág.125)”“. Dejours (op.cit.) refere-se especificamente à Quali-
dade de Vida no Trabalho como condições sociais e psicológicas do traba-
lho, indica o sofrimento criativo, o sofrimento patogênico, a psicodinâmi-
ca do trabalho, o trabalho vivo e a banalização do trabalho – pensamento
compartilhado por sociólogos do trabalho como Ricardo Antunes (2010).
Entre os primeiros estudos de gestão da qualidade de vida e condi-
ção humana o clássico Estudo de Hawtorne (Mayo, 1945 in Tragtenberg,
1985:88), onde foi relacionada moral positiva do grupo e produtividade e
na montadora de componentes elétricos. Nesta mesma época a Hierarquia
de Necessidades de Maslow com a tipologia das necessidades: a) básicas,
b) segurança, c) associação, d) prestígio e e) auto realização. Também nos
anos setenta, o modelo de gestão participativa denominado Sociotécnico
na fábrica de caminhões Volvo na Suécia, é emblemático.
Walton (1975), Qualidade de Vida no Trabalho refere-se a “valores
ambientais e humanos, negligenciados pelas sociedades industriais em favor do
avanço tecnológico, da produtividade e do crescimento econômico “os indicadores
de Richard Walton, foram publicados no artigo Quality of Working Life: what is
it”“? Publicado na Revista Sloan Management Review, Cambridge, v.5,
n.1, 1973, com seu Modelo de oito categorias: compensação justa e ade-
quada, condições de trabalho; uso e desenvolvimento das capacidades
pessoais; oportunidade de crescimento e segurança; integração social na
organização; cidadania, trabalho e espaço total de vida e relevância social
do produto ou serviço de uma organização

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 69


Valorizando o indicador participação, Werther e Davis (1983:70-87)
afirmam ser a QVT um dos grandes desafios da administração e do desen-
volvimento de pessoal. Os autores descrevem fatores que afetam a QVT:
“supervisão, condições de trabalho, pagamento, benefícios e projeto do cargo... uma
boa vida de trabalho significa um cargo interessante, desafiador e compensador”
que levam ao comprometimento e produtividade.
Nos anos noventa, junto com as ações de gestão da qualidade de
processos e produtos e a evolução da consciência social e do direito à
saúde - reforçada pela necessidade de renovação do estilo de vida, multi-
plicam-se ações, estudos, práticas e esforços gerenciais na direção da quali-
dade pessoal. Este cenário tem as abordagens sistêmicas, a administração
participativa, os diagnósticos de clima organizacional, a educação nutri-
cional, a promoção da saúde, o aprofundamento das propostas preven-
cionistas, ações ergonômicas e cuidados com a saúde mental do trabalho,
bem como a valorização das atividades de lazer, esporte e cultura. Mais
recentemente as questões de cidadania e responsabilidade social, têm sido
propostas nos programas de qualidade de vida das empresas.
Levering (1995 pág.18) cita os estudos de Arthur D. Little, publica-
dos originalmente em 1993, sobre as companhias com bom ambiente de
trabalho e que tendem a ter melhor desempenho financeiro. O jornalista
Levering aponta os tipos de relacionamento no trabalho com base nesses
motivadores: empregados que têm confiança na direção da empresa, em-
pregados que têm orgulho do trabalho e empregados que se relacionam
com camaradagem com outros empregados.
O professor Lúcio Flávio Renault MORAIS, nos anos noventa, e
os professores Jáder Sampaio, Zélia Kilimniki e Anderson Sant’Anna da
UFMG, desenvolveram estudos de qualidade de vida no trabalho rela-
cionando-a a stress ocupacional, tipos de personalidade, carreira, gênero.
Acrescente-se - neste mesmo ambiente mineiro - as contribuições sobre
ergonomia de Hudson de Araujo Couto e o Compêndio de Patologia do
Trabalho do médico do trabalho, membro do International Commission
on Occupational Health ICOH, professor René Mendes.

70 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Quadro 1 Motivadores-chave de um excelente lugar para se trabalhar, segundo
Levering (1995).

Motivador Dimensões Descrição


Qualidade que a direção da empresa tem junto ao
Credibilidade empregados, que passam a acreditar nela e a contar
com ela.
Confiança
“Jogo limpo” Regras justas nas relações com os empregados.
Atitudes básicas que os empregados vêem expressas
Respeito
nas ações da empresa com relação a eles.
Sentimento que os empregados têm em relação ao
Orgulho
seu trabalho e a empresa.
Camaradagem Qualidade das interações no ambiente de trabalho.
Fonte: Levering (1995:18).

Eda Conte FERNANDES foi uma das precursoras da QVT no


Brasil, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul – URGS, tratou
de modelos relacionados à auditoria de qualidade de vida no trabalho,
para a professora a “QVT está intimamente ligada à democracia industrial
e à humanização do trabalho, cuja corrente mais forte é a francesa, que utiliza
como metodologia científica o depoimento sistemático dos empregados sobre suas
atividades” (1996).
A Escala de Valores Organizacionais (Tamayo e Gondim, 1996:66)
traz um levantamento com 537 empregados de 16 empresas públicas e
privadas, na qual foram encontrados cinco fatores: fator 1: eficiência e
qualidade do produto; fator 2: relações interpessoais na organização; fator
3: estilo de gestão; fator 4: desenvolvimento técnico; fator 5: respeito ao
empregado. Este estudo da Universidade Federal de Brasília UnB é refe-
rência para os pesquisadores e consultores brasileiros.
Na Região Sul dezenas de pesquisadores, pesquisadores seniores
como José Carlos Zanelli, Valmiria Carolina Piccinini e Suzana da Rosa
Tolfo, que tem como linha de pesquisa qualidade de vida no trabalho,
associado a temas de interfaces.
Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 71
Os polos de estudos se multiplicam especialmente a partir dos anos
noventa nos Centros de Pesquisa relacionados à Promoção da Saúde –
como a Faculdade de Saúde Pública e Instituto de Enfermagem da Uni-
versidade de São Paulo e em na Faculdade de Medicina – Departamento
de Medicina Preventiva de São Paulo e Ribeirão Preto. A Universidade
Católica Dom Bosco com Liliana Guimarães e José Carlos Souza têm
realizado estudos e publicações agregando e difundindo o tema na região
Centro-oeste do Brasil.
Em São Paulo, várias frentes de consultoria e pesquisa apresentam
resultados com o pioneirismo do professor Aguinaldo Neri, em projetos
industriais de caráter nacional. No mesmo período Peter Kevin Spink for-
mam pesquisadores associados à visão dos Estudos do Tavistok Institute e
Sigmar Malvezzi e Humanização do Trabalho com professor Sigmar Mal-
vezzi. Fundada em 1995, a Associação Brasileira de Qualidade de Vida no
Trabalho (www.abqv.org.br) , é reflexo deste movimento cultural, empre-
sarial e associativo de difusão da qualidade de vida e saúde corporativa.
O Núcleo de Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho no De-
partamento de Administração da FEAUSP e Fundação Instituto de Ad-
ministração, com disciplinas nos cursos de mestrado e doutorado, cursos
de aperfeiçoamento e especialização de gestores de qualidade de vida no
trabalho. A Universidade Federal do Rio Grande do Norte, que sob a
coordenação do professor José Arimatés de Oliveira, em parceria com o
Governo do mesmo Estado, implantou programas e formação que disse-
minados nos hospitais públicos, com formação de especialistas em gestão
da qualidade de vida no trabalho. Diversas Universidades Brasileiras Pú-
blicas e Privadas tem realizado programas de capacitação e implantação de
melhorias para os servidores.
Na Universidade Federal de Brasília – UnB, o professor Mário Ce-
sar Ferreira vem atuando com ênfase na metodologia participativa e er-
gonomia da atividade, da Escola Francesa. Ainda na UnB destacam-se
estudos em Psicopatologia, Psicologia Organizacional e do Trabalho, que
disseminam formadores por todo Brasil, em instituições de dimensões as-

72 Temas Avançados em Qualidade de Vida


sociativas regionais e nacionais como o Serviço Social da Indústria – SESI
e o Serviço Social do Comércio – SESC, têm políticas, produtos e serviços
voltados para qualidade de vida dos trabalhadores.
A Fundacentro – Órgão do Ministério do Trabalho (www.fundacen-
tro.org.br) é a grande base de pesquisa que norteia as politicas de segurança
e saúde do trabalhador, fundada nos anos oitenta, atua de forma regional
e nacional, com uma das mais completas bibliotecas relacionadas ao tema.
O Aguinaldo Neri, da PUC de Campinas, é um dos mais pioneiros
e mais importantes consultor, pesquisador e professor de políticas e práti-
cas de qualidade de vida no trabalho, desde os anos oitenta. Atualmente
desenvolve, entre outras atividades a prática do conceito de senioridade,
cujos dados estão disponíveis no site: www.senioridade.org.br, relaciona-
do ao envelhecimento ativo, produtivo e saudável.

Alguns dos principais centros Internacionais de Estudos relaciona-


dos à qualidade de vida no trabalho:

• Karolinska Institute, liderado pelo professor Lennart Levi


(http://www.stress.org/occupational-stress-part-1/) com a ênfa-
se na influência dos fatores psicossociais na saúde mental das
pessoas, e inspirados pelos estudos sobre Stress, desenvolvidos
por Hans Selye, desde os anos trinta.
• Finnish Institute of Occupational Health – FIOH em Helsink
– Finlandia um centro de excelência acadêmica especialmente
nos estudos sobre idade e trabalho e capacidade para o traba-
lho, desenvolvido pelo professor Juhani Ilmarinen. Este teste
foi traduzido pela professora Frida Marina Fischer, da Faculda-
de de Saúde Pública da USP e publicado pela Faculdade São
Carlos. http://www.ttl.fi/en/Pages/default.aspx, http://www.
juhaniilmarinen.com/publications/, ageing and work www.oc-
cuphealth.fi/Em cache - Similares 

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 73


• Tilburg University, na Holanda com estudos sobre choro em
adultos, emoções e stress, trabalho e lazer liderados pelo profes-
sor Ad Vingerhoets, com estudos do movimente internacional
da Medicina Psicossomática, desde os anos oitenta.
• The National Institute for Occupational Safety and Health (NIO-
SH) www.cdc.gov/niosh/ - é o órgão do governo equivalente à
Fundacentro no Brasil, e é responsável por conduzir pesquisas
e fazer recomendações para prevenção de acidentes, incidentes,
stress e outros fatores de risco no trabalho. Em cache - Similares.
• James McGlothlin um dos seus pesquisadores atua hoje na
Purdue University, estudando relações entre ergonomia, epide-
miologia e higiene industrial. McGlotlhin desenvolveu e aplica
programas de prevenção a doenças de desordens r lesões relacio-
nadas ao trabalho repetitivo - LER e Desordens osteomuscula-
res relacionadas ao trabalho e também produtividade e qualida-
de no local de trabalho.

Marcos da Qualidade entre a


Era Pós-industrial e Era Tecnológica 1980-2015

74 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Aplicações do Conceito Qualidade de Vida:

Qualidade de Vida é um termo de aplicação abrangente, dentre elas


pode-se listar:
1. Qualidade de Vida como percepção de bem-estar em múltiplas
dimensões humanas, como biológica, psicológica, social, men-
tal, física, espiritual, entre outras;
2. Qualidade de Vida como resultado da intervenção de políticas
e práticas coletivas, de natureza econômica ou organizacional,
como o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, Índice de
Desenvolvimento Social – IDS, Índice de Pobreza Humana –
IDS, Global Happy Index – HPI;
3. Qualidade de Vida como Política Pública Municipal: como o
Índice de Violência Urbana, Proteção ao meio ambiente, Reci-
clagem e reuso de recursos hídricos e de material de descarte;
4. Qualidade de Vida como resultado de boas práticas em gestão
de pessoas, especialmente nas áreas de segurança e saúde do
trabalho, promoção da saúde, inclusão e justiça social e respon-
sabilidade sócio-ambiental. Por exemplo: controle do colesterol,
sobrepeso, hipertensão, violência e assédio moral, ginastica la-
boral, orientação nutricional, apoio a pessoas com dependência
química, entre outros;
5. Qualidade de Vida como parte de outros processos de gestão
como os Programas de Qualidade e Produtividade no Brasil e
em outros Países, Certificações e Indicadores de Excelência Pro-
dutiva l, como as Certificações BS 8800 de Sustentabilidade,
OHSAS 18002 de Qualidade, Segurança e Produtividade, Siste-
ma Lean de Produção e Método Kaizen.
6. Qualidade de Vida com fundamentos da enfermagem e co-
nhecimentos relacionados, liderados pela International Society
Quality of Life Research ISOQOL que desenvolve e aplica tes-
tes e avaliações visando o máximo bem-estar do paciente.

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 75


Âncoras e especialidades de ações e
programas de GQVT

Estes fundamentos geram nas empresas diferentes ações e progra-


mas com ênfase em uma ou mais especialidades que denominamos ÂN-
CORAS GQVT, listadas a seguir:

Estes fundamentos e modelos com indicadores e índices específicos


têm sido incorporados nos modelos de gestão de qualidade de vida das
empresas, e incorporados em suas práticas de gestão organizacional, tanto
globalmente, como em nível regional e local.
O conjunto de escolhas de bem-estar para Gestão da Qualidade
de Vida no Trabalho – GQVT pressupõe uma visão interdependente,
multifuncional e dinâmica das necessidades biológica, psicológica, social

76 Temas Avançados em Qualidade de Vida


e organizacional, que se concretizam em programas, ações, ferramentas
gerenciais, inovações tecnológicas, melhorias ergonômicas, entre outros
elementos da cultura organizacional e das condições de vida de uma or-
ganização. A Visão BPSO foi inspirada no conceito de Saúde publicado
pela OMS em 1986, disseminado nos estudos de psicopatologia (como
Dejours, desde 1982) e também apropriado e ampliado para a análise dos
Programas e Ações de QVT. As dimensões BPSO tem os seguintes signifi-
cados, para fins de análise da qualidade de vida no trabalho:

1. Dimensão Biológica: ações relativas às características físicas


herdadas e adquiridas, bem como os aspectos metabólicos (ali-
mentação, atividades físicas) e ergonômicos. Referem-se espe-
cialmente aos hábitos saudáveis.
2. Dimensão Psicológica: afetos, emoções, memória, desejos, per-
sonalidade e necessidades. Sintetizada especialmente pela auto-
estima e reconhecimento.
3. Dimensão Social: crenças e valores compartilhados, grupos de
convivência e afinidades, suporte e acesso condições sociais e
econômicas. Associado principalmente a benefícios, educação,
consumo, comunidade e sustentabilidade.
4. Dimensão Organizacional: missão e valores da organização,
tecnologia, mercado e demandas de gestão, produtividade e
lideranças. Representado especialmente por lideranças, comu-
nicação e produtividade saudável, gestão de riscos, imagem or-
ganizacional interna e externa.

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 77


Estas dimensões BPSO são aplicadas através de ações especificas do
ambiente organizacional, como no exemplo a seguir relacionado na Ações
de GQVT nas dimensões BPSO:

Respostas Comparativas Esforço GRH (n: 55)


versus Satisfação dos Servidores (n: 4.639)

78 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Respostas quantitativas sobre o que significa
Qualidade de Vida no Trabalho
Em pesquisa realizada junto a 25 empresas (1996), relacionamos as
respostas obtidas junto a 450 pessoas, de fábricas com Certificação ISO
9000, a partir de escolha de palavras dadas, distribuídas com os critérios
biopsicossociais.

Quadro 2 Escolhas das palavras-chaves de qualidade de vida no trabalho.

Critério Palavra-chave Empregados Gerências RH


Investimento n = 48: 4% n= 3: 4%
Humanismo n = 99: 8% n= 08h11min%
Organizacional
Competitividade n = 42: 4% n= 4: 5%
16% n=15: 21%
Saúde n = 186: 15% n=6: 8%
Segurança n = 179: 15% n=5: 7%
Biológicas
Ausência de acidentes n = 62: 5% n=5:7%
35% n=16: 23%
Amor n = 38: 3% n=1: 1%
Paz n = 55: 5% n=1: 1%
Psicológica
Realização pessoal n = 148: 12% n=14h20min%
20% n=16: 23%
Confiança n = 138: 11% n=10h14min%
Amizade n = 56: 5% n=3: 4%
Social Responsabilidade n = 160: 13% n=10h14min%
29% n=23: 33%
Totais n= 1211: 100% n+ 70: 100%

Como se observa no Quadro 2, a escolha das palavras-chave foi


mais acentuada no critério biológico, enquanto o critério organizacional
foi pouco citado. A palavra saúde, embora colocada na primeira linha da

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 79


segunda coluna para não facilitar sua escolha impulsiva, foi a mais esco-
lhida, seguida de segurança, o que revela a visão bem tradicional da Qua-
lidade de Vida no trabalho. No critério psicológico, aparece a realização
pessoal, importante dado, já que a maioria das respostas provavelmente da
produção parece ter este aspecto poucas vezes atingido.

Níveis de Gestão da Qualidade de Vida no


Trabalho
Há pelo menos três níveis de aplicação e decisão nas questões de
qualidade de vida no trabalho:
• Estratégico, é o primeiro nível, que se referem à missão, valores,
imagem da organização, impacto e posicionamento na comuni-
dade e no mercado, especialmente, integração com os demais
eixos da organização de forma a garantir o bem-estar pessoal e
organizacional;
• Gerencial ou Tático, é o segundo nível, corresponde à formação
e desenvolvimento de competências, lideranças e equipes, me-
tas, atividades de mobilização, comunicação interna e externa,
enfim a implementação da Política, Diagnóstico, Ferramentas,
Orçamento e condições para difusão de um ambiente saudável
e controle dos fatores de mal-estar;
• Operacional, é o terceiro nível de processo decisório, que se
divide em duas categorias: Operacional Interno e Operacional
Externo.

O nível Operacional Interno se refere a produtos e serviços realiza-


dos com os profissionais e recursos da própria organização. Benefícios le-
gais, treinamentos com pessoal interno, compartilhamento de políticas de
equidade e justiça social, diversidade, inclusão de pessoas com deficiência,
paridade de gênero, integração geracional, primeiro emprego, habilidades
nutricionais, arte e lazer, reciclagem, por exemplo.

80 Temas Avançados em Qualidade de Vida


O nível Operacional Externo refere-se à contratação de especialis-
tas ou empresas especializadas em atividades de práticas saudáveis, como
ginástica laboral, orientação nutricional, teatro educativo, suporte psico-
terápico, apoia a consumo de drogas, semanas temáticas, consumo susten-
tável, competições esportivas, preparação para a aposentadoria, programas
de entre outros, como descrito na Figura 1: GQV e seus níveis de decisão
EGOO.

Estratégico:
Visão, Missão
e Valores

Gerencial: Capacitação,
Diagnóstico,
Metas e
Operacional: Resultados Operacional:
Produtos e Produtos e
Serviços Internos Serviços Contratados
de QVT de QVT

Figura 1 GQVT e seus níveis de decisão EGOO.

Sobre resultados gerenciais de qualidade de


vida no trabalho

Do ponto de vista da gestão de pessoas há sempre expectativas de


modificações positivas com relação às condições de vida na organização de
forma coletiva e também pessoal. Estes resultados em geral estão associa-
dos a cada tipo de ação associados a níveis comportamentais de redução
ou ampliação da ocorrência.

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 81


Os resultados de redução de ocorrência são: menor índice de ab-
senteísmo e presenteismo, redução ou eliminação do assédio moral e se-
xual, menor frequência do sentimento de desconfiança entre os colegas
e chefias, redução ou eliminação de comportamentos ligados à covardia,
sensação de pressão negativa (distress), ausência do sentimento de solidão
pessoal e desrespeito nos relacionamentos.
Os resultados comportamentais de aumento são: percepção de va-
lores relativos a humanismo, pluralidade de ideias, corresponsabilidade,
dignidade, ampliação da rede de amigos, otimismo das pessoas com rela-
ção ao trabalho e à própria vida, qualidade na comunicação, com ênfase
na assertividade, compreensão e sentido do trabalho com pressupostos
intrinsecamente autênticos e percepção pessoal de bem-estar.
Resultados de Qualidade de Vida no Trabalho no que se refere a
questões da psicologia organizacional e do trabalho: clima organizacional,
redução de acidentes e doenças, melhoria da imagem organizacional e
redução do distress.
Gary Karasek (2008) (http://www.karasek.org/) desenvolveu o mo-
delo de demanda e controle, a partir do qual propõe medidas preventivas,
inspiradas nos conceitos da abordagem sociotécnica, considera as seguin-
tes equações, adaptado por Frank Pot, 2002:
• Resolver discrepâncias entre: demandas do trabalho e número
de empregados e tempo disponível,
• Equilibrar demandas do trabalho e habilidades com as qualifi-
cações dos empregados,
• Dimensionar demandas do trabalho e apoio social de colegas
e chefes,
• Alinhar demandas do trabalho e capacidade de controle sobre
o próprio trabalho.
Considere-se que todos os esforços empresariais devem conduzir
à realização humana e ao bem-estar do empregado, isto é, a qualidade só
terá sentido se gerar qualidade de vida (metaqualidade), isto é, a qualidade
superior que leva a vida com qualidade. As chaves de satisfação no traba-

82 Temas Avançados em Qualidade de Vida


lho de Bolles (1981, pág. 85). São pontos de referência para a avaliação do
desempenho da qualidade de vida no trabalho. As chaves são baseadas nos
processos de qualidade, tempo, iniciativa, adaptabilidade, comunicação.

Proposta de Agenda BPSO para GQVT Pessoal

Perspectivas futuras
Há um cenário novo, diversificado e amplo para atuação da quali-
dade de vida no trabalho, tanto como valor, como ferramenta, produto,
serviço e resultados. O principal elemento desta mudança é a presença
ampla e irrestrita da tecnologia. Os desafios atuais no âmbito da quali-
dade é incorporar como processo, através de qualificação, definição de
competências e sempre que possível com gestão compartilhada. Outro
elemento importante neste cenário da Qualidade de Vida no Trabalho
para o Terceiro Milênio é a qualificação dos fornecedores, a maturidade
nas relações contratuais com os especialistas e a criação de áreas e serviços
específicos de qualidade de vida que não estejam como atualmente, no

Gestão da Qualidade de Vida no Trabalho 83


segundo plano das atividades de gestão de pessoas nas empresas públicas
e privadas.
Acreditamos que os principais desafios para consolidação das ações
e programas de GQVT nas empresas são:
• O fortalecimento das competências de bem-estar organizacional
integradas ao bem-estar pessoal,
• A adoção de elementos gerenciais próprios,
• Dotação orçamentária específica integrada ou não aos custos
médicos,
• Posicionamento estratégico nas metas de gestão organizacional,
• Consolidação de modelos, qualificação dos técnicos, gestores e
especialistas,
• Ajuste do foco da gestão como processo, em geral só se pensa
no resultado final,

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86 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Qualidade de Vida e
Psicologia da Saúde
Ocupacional
Liliana A. M. Guimarães
QUALIDADE DE VIDA E PSICOLOGIA
DA SAÚDE OCUPACIONAL

INTRODUÇÃO

O
trabalho ocupa na atualidade, grande parte da vida de uma sig-
nificativa parcela da população e é neste contexto que faz-se im-
perativo verificar de que maneira os fatores de risco e exposição
ou de proteção existentes, podem repercutir positiva ou negativamente
na Qualidade de vida do indivíduo e da organização (Guimarães, 2013).
Assim, a qualidade de vida no trabalho nas organizações é um componen-
te importante da Qualidade de vida geral (Lawler, Nadler & Cammann,
1980).
Na contemporaneidade, onde predominam trabalhadores e uma
sociedade do conhecimento, as atividades intelectuais têm precedência
sobre os esforços físicos. Alguns trabalhadores do conhecimento traba-
lham mais de 60 horas por semana . Como resultado disto, os hobbies e
interesses pessoais colidem com o trabalho. A vida é uma constelação que
contém inúmeras dimensões e, portanto, existe a necessidade de equili-
brar a dimensão profissional com outras áreas, pessoal, familiar e social.
Longe se vão os dias em que a prioridade dos funcionários costu-
mava ser voltada somente para as necessidades físicas e materiais . Com

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 89


o aumento do deslocamento da economia para uma economia do conhe-
cimento, o significado de Qualidade de vida no trabalho (QVT) sofreu
uma mudança drástica .

Qualidade de Vida no Trabalho (QVT)


A QVT como estratégia de Gestão de Recursos Humanos tem assu-
mido crescente interesse e importância. Cabe ressaltar que muitos outros
termos passaram a ser usados como sinônimo de QVT, como “humanisa-
ção de trabalho”, “qualidade de vida no trabalho” , “democracia indus-
trial “, “ trabalho participativo “ , entre outros.
A QVT refere-se à favorabilidade ou não de um ambiente de tra-
balho para as pessoas que trabalham em uma organização. O período de
gestão científica, que se concentrou exclusivamente na especialização e
eficiência, sofreu uma importante mudança. A gestão tradicional (como
a gestão científica ) não deu a devida atenção aos valores humanos. No
cenário atual , as necessidades e as aspirações dos trabalhadores estão mu-
dando e os empregadores estão agora redesenhando postos de trabalho
para que haja um melhor QVT
Existem, no entanto, pontos de vista divergentes quanto ao significa-
do exato da QVT , que podem ser observados em algumas definições a seguir:

Para Nadler e Lawler (1983, p, 23):


QVT é uma maneira de pensar sobre as pessoas o trabalho e as or-
ganizações e os seus elementos distintivos são: (i ) a preocupação com
o impacto do trabalho sobre as pessoas, bem como sobre a eficácia
organizacional, e ( ii ) a idéia de participação no problema organiza-
cional –resolução e tomada de decisão.

Já Koladney e van Neinum (1983, p. 88) entendem que:


A QVT é baseada em uma abordagem geral e uma abordagem da
organização. A abordagem geral inclui todos os fatores que afetam o

90 Temas Avançados em Qualidade de Vida


bem-estar físico, social, econômico, psicológico e cultural dos trabalha-
dores, enquanto que a abordagem organizacional refere-se à reformu-
lação e funcionamento das organizações, de acordo com o valor da
sociedade democrática.

Para Luthans. Youssef (2004, p. 145):


O principal objetivo da QVT é mudar o ambiente de trabalho para
que a interface humano-tecnológico-organizacional leve a uma melhor
qualidade de vida no trabalho.

A QVT ligada às teorias da Administração e Gestão é vista, portan-


to, como um guarda-chuva sob o qual os trabalhadores devam sentir-se sa-
tisfeitos com o ambiente de trabalho e assim aumentem a sua cooperação
incondicional e o apoio à gestão, para melhoria da produtividade.

Qualidade de Vida Relacionada à Saúde (QVRS)


Transitando da QVT para a Qualidade de Vida Relacionada à Saú-
de (QVRS), faz-se importante citar Ware (1987), para quem o termo QV é
um conceito abrangente e envolve questões como satisfação no emprego,
padrão de vida, qualidade de habitação, escola, entre outros. O autor aler-
ta ainda, que é comum associar qualidade de vida com saúde, no entanto
esta associação é equivocada, haja vista a saúde ser uma temática específica
do indivíduo e QV uma abordagem ampla.
A World Health Organization, por meio do grupo WHOQOL (1995,
p. 1404) define QV como “a percepção do indivíduo de sua posição na
vida no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em
relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. A partir
desta definição, Fleck (2000) cita três aspectos fundamentais que devem
ser considerados neste construto: subjetividade, multidimensionalidade e
aspectos positivos (e.g. mobilidade) e negativos (e. g. dor).

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 91


Para Minayo, Hartz e Buss (2000 p. 8) QV é “uma noção eminente-
mente humana que tem sido aproximada ao grau de satisfação encontrada
na vida familiar, amorosa, social e ambiental e à própria estética existen-
cial”. Os autores afirmam que este termo diz respeito a uma construção
social com a marca do relativismo cultural. Assim sendo, a QV está rela-
cionada a modos específicos, condições e estilo de vida. Dizem os autores
que, recentemente a QV passou a incluir ideias de desenvolvimento sus-
tentável, ecologia humana se relacionando com o campo da democracia e
do desenvolvimento dos direitos humanos e sociais.
Kimura e Silva (2009) afirmam que apesar de ser compreendido
pela população em geral, o construto QV é complexo, possui vários signi-
ficados, diversos métodos de avaliação e enfoque.
Considerando as definições citadas, observa-se que a percepção de
QV é individual e, portanto, subjetiva e está relacionada também com as
percepções culturais e sociais dos seres humanos. Além disso, é um termo
amplo que engloba questões sociais, ambientais, pessoais, políticas e hu-
manas e que sofre alterações ao longo do tempo, já que as apreensões da
realidade mudam no curso da vida e dos anos.
Assim, embora este assunto remeta a subjetividade das pessoas,
existem dois caminhos para avaliá-lo: um objetivo e outro subjetivo. O
caminho objetivo tem como indicadores, segundo Souza e Guimarães
(1999), a saúde, condições físicas, salário, trabalho, moradia, entre outros
indicadores quantificáveis. Já o caminho qualitativo, aborda percepções
qualitativas e pessoais das experiências de vida e o sentimento humano e
a avaliação que cada uma faz da sua qualidade de vida.
No que diz respeito ao conceito de QVRS, Ware (1987) afirma que
é necessário compreender primeiramente o significado do termo saúde,
pois muitas vezes esta terminologia é reduzida/expressa somente median-
te indicadores de expectativa de vida, taxa de mortalidade, e causas de
morte. O autor partindo então, da definição de saúde da OMS e de de-
finições encontradas em dicionário, que conotam saúde como bem estar
e vitalidade, define QVRS como os aspectos psicológicos, físicos, sociais,

92 Temas Avançados em Qualidade de Vida


papel social e percepção geral da saúde de um indivíduo, em decorrência
de sua condição de saúde e/ou tratamento.
Nesta mesma direção, Testa e Simon (1996) compreendem QVRS
como aspectos físicos, psicológicos e sociais da saúde, avaliados de dife-
rentes formas a partir da experiência pessoal, crenças, expectativas e per-
cepções.
Por outro lado, Auquier et al (1997 apud Minayo, Hartz e Buss,
2000), definem QVRS como o valor atribuído à vida a partir de deterio-
rações funcionais, percepções mediadas pelas condições sociais, doenças,
agravos e tratamentos; e organização política e econômica do sistema assis-
tencial. Em contrapartida, Minayo, Hartz e Buss (2000), definem QV no
âmbito da saúde como compreensão das necessidades humanas básicas,
materiais e espirituais; focalizada na capacidade de se viver sem doenças
ou convivendo da melhor forma possível com doenças e agravos.
Giachello (1996) diz que apesar da diferença metodológico/concei-
tual entre os estudiosos da área, esta temática adquiriu importância na
área de saúde, devido a três fatores:
1. Evolução tecnológica que aumentou a sobrevida;
2. Mudança no perfil epidemiológico das doenças, com grande
prevalência de doenças crônicas, onde não há cura e, sim neces-
sidade de se conviver com as limitações;
3. Necessidade de se considerar as pessoas como seres biopsicos-
sociais.
A partir das considerações feitas, sobre QV, QVT e QVRS que con-
tribuem e convivem historicamente com o desenvolvimento da Psicologia
da Saúde Ocupacional, viés pelo qual abordaremos a QV, não se pode
concluir que a QVT esteja preocupada em cuidar das necessidades de
ordem superior dos funcionários , além de suas necessidades básicas. O
clima global do local de trabalho é ajustado, de tal maneira que ele produ-
za trabalhos mais humanizados. É neste ponto que interessa saber como a
Psicologia, transversaliza estes construtos, por meio da Psicologia da Saú-
de Ocupacional (PSO).

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 93


Pode-se dizer que a PSO converge seus objetivos para a melhoria da
Qualidade de vida no trabalho e à proteção e promoção da segurança,
saúde e bem estar dos trabalhadores. A PSO está preocupado com a ampla
gama de riscos e mecanismos que afetam a Qualidade de vida no trabalho
e as respostas dos trabalhadores. These include individual psychological
attributes, job content and work organization, organizational policies and
practices, and the economic and political environments in which organi-
zations function. Estes incluem atributos individuais psicológicos, o con-
teúdo do trabalho e organização do trabalho, as políticas organizacionais
e práticas, e os ambientes econômicos e políticos em que as organizações
funcionam.
Portanto, ao abordar a relação entre Qualidade de Vida e Psico-
logia da Saúde Ocupacional, há que se mencionar, primeiramente, os
fatores que antecederam a necessidade da existência de uma nova especia-
lidade na área da Psicologia, a Psicologia da Saúde Ocupacional (PSO),
que viesse a atender às novas demandas sociais, econômicas, políticas, de
saúde, segurança e Qualidade de vida dos trabalhadores.

Psicologia da Saúde Ocupacional

Surgimento do Campo
No final da Década de 1960, o Departamento do Trabalho Ameri-
cano e o Instituto Nacional de Saúde e Segurança Ocupacional (NIOSH)
dos Estados Unidos, patrocinaram e empreenderam uma pesquisa sobre
“Qualidade do Emprego”, conduzida pela Universidade de Michigan.
Nos anos 1960 e 1970, cresce o movimento para Qualidade de Vida
e Bem-estar e nos ambientes de trabalho, contemplando a participação de
psicólogos nos seguintes campos:
• Planejamento e auxílio aos trabalhadores quanto ao gerencia-
mento e controle do estresse ocupacional,
• Promoção de saúde (aptidões e competências do empregado,
proteção de saúde, educação e saúde),
94 Temas Avançados em Qualidade de Vida
• Elaboração e implantação de programas no ambiente de trabalho.
• Segurança Ocupacional

No próprio campo de saúde, os psicólogos foram envolvidos em áre-


as de sub-especialização, como: a Toxicologia comportamental (Xintaras
& Johnson & De Groot, 1974) e a segurança comportamental (Cohen &
Colligan, 1998; Margolis & Kroes, 1975)
O termo Psicologia da Saúde Ocupacional apareceu primeiramente
em 1986, quando Everly atribuiu aos psicólogos, o papel de promoção da
saúde no ambiente de trabalho (Feldman, 1985; Everly, 1986). Em 1988,
em resposta ao dramático aumento do número de indenizações pedidas
nos Estados Unidos, o National Institute of Occupational Safety and Health
(NIOSH) adicionou os fatores psicológicos e colocou-os como o “princi-
pal risco para a saúde ocupacional” (Sauter et al, 1999; APA, 2002).
Quando esta constatação foi associada a um maior reconhecimento
do impacto do estresse sobre uma série de problemas no local de trabalho,
o NIOSH descobriu que seus programas relacionados ao estresse estavam
se destacando cada vez mais (Sauter et al, 1999). Raymond et al. (1999)
argumentaram que era hora, portanto, de existir um treinamento inter-
disciplinar em PSO, integrando a Psicologia da saúde e a Saúde pública e
que a criação de ambientes de trabalho saudáveis deveria ser um objetivo
deste campo.
Nos últimos anos, as empresas tiveram que se adaptar a inúmeras
exigências que o mercado e a sociedade pediram, como forma de justificar
a finalidade desses empreendimentos. A adequação do ambiente e das jor-
nadas de trabalho de modo que as mesmas se tornassem mais humanas,
foi fundamental para a configuração dos modelos de empreendimentos
atuais. Superadas essas exigências, surgiu a necessidade de identificar va-
riáveis patológicas de cunho psicológico dentro do ambiente de trabalho
e a PSO é a área responsável por esse diagnóstico.
A PSO é uma área interdisciplinar, em rápida expansão, cuja in-
vestigação e exercício prático advêm fundamentalmente dos domínios da

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 95


saúde pública, medicina preventiva, epidemiologia, psicologia da saúde
e psicologia do trabalho e das organizações. Fundamentalmente, a PSO
surge a partir de duas distintas disciplinas aplicadas dentro da psicologia:
a psicologia da saúde e a psicologia organizacional do trabalho. A PSO foi
planejada para lidar com as preocupações contemporâneas da sociedade
com a saúde e a segurança ocupacional. O termo “saúde” em PSO não
inclui apenas o estado físico dos trabalhadores, mas também os aspectos
emocionais, cognitivos, motivacionais e comportamentais.
A PSO envolve parcerias interdisciplinares de psicólogos, com pro-
fissionais da área da saúde ocupacional que buscam melhorar a QVT, a
segurança, a saúde e o bem estar dos trabalhadores em todas as ocupações.
A PSO faz interface com a ciência comportamental e disciplinas
saúde ocupacional, com conhecimentos e métodos da psicologia, da saú-
de pública/ocupacional, estudos organizacionais, fatores humanos, e áre-
as afins (como a sociologia do trabalho, engenharia industrial, de produ-
ção, economia e outros). A PSO está relacionada ao amplo espectro de
mecanismos e exposições que afetam a qualidade de vida no trabalho e as
respostas dos trabalhadores.
A pesquisa em PSO e as intervenções práticas visando o ambiente
de trabalho bem como o indivíduo para criar espaços e organizações mais
saudáveis e para aumentar a capacidade dos trabalhadores de proteger
sua saúde e segurança e maximizar a sua efetividade global. A pesquisa e
a prática da PSO exploram as intervenções orientadas para o ambiente
de trabalho, bem como o indivíduo, para criar postos de trabalho e orga-
nizações mais saudáveis ​​e melhorar a capacidade dos trabalhadores para
proteger sua segurança e saúde e para maximizar a sua eficácia global.
Enquanto referida à Psicologia da saúde, a PSO objetiva (i) o estudo
do papel dos comportamentos relacionados à saúde, na prevenção, desen-
volvimento, e/ou exacerbação de problemas de saúde e (ii) uma ênfase no
modelo biopsicossocial. Sua aplicação (operacionalização) se dá na avalia-
ção, no tratamento e na prevenção de problemas da saúde.

96 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Na interface com a Psicologia Organizacional e do Trabalho, o cam-
po da Psicologia tradicionalmente relacionado à área do Trabalho, a PSO
deve estar atenta às seguintes áreas:
• Recrutamento e seleção de pessoal;
• Elaborar, executar e avaliar, em equipe multiprofissional pro-
gramas de treinamento e de formação de pessoal, com vistas ao
desenvolvimento dos recursos humanos;
• Participar no processo de avaliação do trabalho visando subsi-
diar decisões na área de pessoal;
• Elaborar programas e atividades na área de segurança do traba-
lho bem como programas educacionais, culturais, recreativos e
de higiene mental, visando assegurar a preservação da saúde do
trabalhador;
• Participar no desenvolvimento de ações destinadas a otimizar
pessoal de indivíduos e grupos, ergonomia e assessoramento
para formulação e implementação da política de recursos hu-
manos.
• Com algumas exceções (e.g., estudos em ergonomia, de fatores
humanos e fadiga industrial), a interface foi limitada até os úl-
timos anos.
• Recentemente, entretanto, têm ocorrido numerosos desenvol-
vimentos.
• Relações e condições de trabalho, no sentido da maior produti-
vidade e da realização
A PSO compartilha conhecimentos e práticas da Saúde Ocupacio-
nal, ou seja, com o conjunto de técnicas que visa a prevenção dos aciden-
tes de trabalho, da higiene do trabalho (conjunto de técnicas que visam a
prevenção das doenças profissionais) e da saúde no trabalho (conjunto de
técnicas de vigilância médica e de promoção da saúde no trabalho
Da Saúde Coletiva, a PSO incorpora uma noção de trabalhador
considerado como um sujeito de mudanças, com conhecimentos e vivên-
cias sobre seu próprio trabalho, compartilhadas coletivamente (Laurell,

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 97


Noriega, Martinez, & Villegas, 1992), englobando o conceito de processo
de trabalho como uma categoria explicativa que também se inscreve nas
relações sociais de produção (Navarro, 1982).
Este enfoque permite uma visão do trabalho que vai além do am-
biente e seus agentes e da saúde como uma adaptação constante, colocan-
do-a numa perspectiva de interação entre o biológico e o psíquico, cons-
tituindo um nexo psicofísico indissociável, cujo desequilíbrio, mediado
pelas relações sociais, pode expressar-se numa ampla e variada gama de
distúrbios, classificados como doenças, mal-estares difusos, sofrimentos
e danos que se somam às doenças ocupacionais clássicas, acidentes do
trabalho e às doenças relacionadas ao trabalho (Breilh, 1994 apud Sato,
2006). São patologias de nexo laboral mais complexo do que as doenças
ocupacionais, como as doenças cardiovasculares (Siegrist, 1996), psicosso-
máticas (Levi, 1998) e os transtornos mentais (Kalimo et al., 1987; Lacaz,
2000; Marmot & Theorell, 1988). Também importa desvendar as media-
ções entre trabalho e o trabalhador. É sob esta ótica também que a psicolo-
gia vai se apropriar do estudo das relações trabalho e saúde-doença. Nesta
interface com o campo da saúde do trabalhador, realiza estudos, ações
de prevenção, assistência e vigilância aos agravos à saúde relacionados ao
trabalho. As realizações em prol da saúde do trabalhador visam principal-
mente reduzir as doenças ocupacionais e acidentes de trabalho e propor-
cionar melhor qualidade de vida aos trabalhadores (Lacaz, 1996; 2000).
O tema “Qualidade de vida no trabalho” enquanto linha de pesqui-
sa da Administração é recente, apesar das demandas de bem-estar serem
antigas. Atualmente, as maiores contribuições teóricas estão nas interfaces
de saúde e segurança ocupacional, gestão da qualidade e produtividade,
visão biopsicossocial da pessoa no trabalho coletivo e sustentabilidade so-
cioeconômica.
São necessários alguns esclarecimentos adicionais. Em primeiro
lugar, a saúde é um termo usado em PSO como um conceito positivo,
que inclui recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas.
De acordo com a visão da Organização Mundial da Saúde, criada após a

98 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Segunda Guerra Mundial, a PSO aborda a saúde como um estado de com-
pleto físico, mental e bem-estar social, e não apenas como a ausência de
uma doença ou enfermidade. Em segundo lugar, a PSO não se preocupa
apenas com os trabalhadores, mas também com a questão do desemprego
e a relação trabalho-casa. Em terceiro lugar, a PSO leva em conta quatro
níveis fortemente interligados de análise. Assim, tem-se: 1) nível individu-
al: maneiras de lidar, sintomas diferentes, etc., 2) ambiente de trabalho:
a sobrecarga de trabalho, falta de controle sobre o trabalho, etc. 3) nível
organizacional: conflito de papéis, injustiça organizacional, etc. 4) nível
externo: os eventos de vida, estresse familiar, entre outros. Por último, mas
não menos importante, a PSO é tanto uma disciplina científica como de
campo, aplicada. A PSO opera na intersecção entre ciência e sociedade, o
que significa que o futuro desta nova especialização é moldado por ambas
as dinâmicas internas ao nível científico, bem como pelo desenvolvimento
da sociedade em geral
Assim sendo, a PSO é, atualmente, uma área emergente na ciência
e na prática da psicologia, que pretende promover um ambiente de tra-
balho onde as pessoas possam produzir, crescer e serem valorizadas e, ao
mesmo tempo, com mais competência, produtividade e mais satisfação no
trabalho, com uma melhor qualidade de vida.

Algumas Definições da PSO


“A Psicologia da Saúde Ocupacional é a aplicação dos princípios da
psicologia à prevenção dos acidentes de trabalho e doenças profissionais”
(Sauter; Hurrel Jr et al.,1999).
“A Psicologia da Saúde Ocupacional é o ramo da psicologia que visa
promover a qualidade de vida no trabalho, e proteger e promover a
segurança, a saúde e o bem-estar dos trabalhadores” (NIOSH. 2000, p.2;
APA 2004). Embora ambos os tipos de intervenção (proteção e promoção)
possam ser definidos como prevenção primária, as definição do NIOSH
prioriza a proteção da saúde e a definição desta se remeta à Intervenção

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 99


no ambiente de trabalho, visando reduzir a exposição do trabalhador aos
fatores psicossociais de risco no trabalho e outros. A promoção se refe-
re a intervenções em nível individual para equipar os trabalhadores com
conhecimentos e recursos que visem uma melhoria na saúde por meio
do adequado enfrentamento dos riscos no ambiente de trabalho. Para
o NIOSH, o objetivo de pesquisadores e profissionais neste campos são:
(i) planejar sistemas de trabalho e organizações saudáveis e (ii) proteger
e melhorar a saúde, a segurança, a qualidade de vida e o bem estar dos
trabalhadores
Para a European Academy of Occupational Health Psychology, a PSO
é “A aplicação da Psicologia à saúde e à segurança ocupacional” (Cox,
Baldursson & Rial-Gonzales, 2000). Para a Academia, a PSO tem seu
foco principal nos fatores organizacionais e no delineamento do trabalho
que contribuem para a incapacitação e doença no trabalho, incluindo os
transtornos relacionados ao estresse; preocupa-se com os fatores sociais e
familiares; contempla características individuais, tais como capacidades,
competências, habilidades, personalidade, entre outros e sua contribuição
para as doenças e incapacitações ocupacionais.

Objetivos da PSO
O campo da PSO estuda as características psicossociais relacionadas
aos locais de trabalho que contribuem para o desenvolvimento de proble-
mas de saúde nos funcionários. O campo também se refere aos meios de
efetuar mudanças no ambiente ocupacional que beneficiem e promovem
a saúde, a qualidade de vida e o bem-estar do trabalhador, melhorando
sua produtividade.
A PSO busca identificar as variáveis psicológicas que possam com-
prometer o desenvolvimento satisfatório das funções do trabalhador na
organização e além disso, esse profissional deve elaborar estratégias que
permitam o funcionário realizar-se profissional e pessoalmente na empre-
sa, focalizando-se na avaliação, promoção e desenvolvimento da saúde,

100 Temas Avançados em Qualidade de Vida


bem-estar e qualidade de vida no local de trabalho, aliadas a iniciativas
de segurança ao nível organizacional tendo como objetivo a promoção da
saúde, bem estar e qualidade de vida dos indivíduos em contexto laboral,
e no interface Família/Trabalho/Família.
O campo da PSO também está preocupado com os fatores psicos-
sociais de risco relacionados ao trabalho e que contribuem para o desen-
volvimento de problemas de saúde nos funcionários (Guimarães, 2013).
O campo também se refere aos meios de efetuar mudanças no ambiente
ocupacional que beneficiem e promovem a saúde e o bem-estar do traba-
lhador, melhorando sua produtividade. Portanto, pesquisadores e profis-
sionais que em Psicologia da Saúde Ocupacional estão interessados em
estudar e analisar uma ampla variedade de características psicossociais do
trabalhador e do ambiente laboral que pode estar atrelada à integridade
física e à saúde mental do funcionário. Os problemas de saúde do ponto
de vista físico, variam desde ferimentos acidentais até doenças cardiovas-
culares; já os problemas de saúde mental incluem estresse psicológico, an-
siedade, pânico, depressão e até o desenvolvimento de doenças psíquicas,
como a esquizofrenia e outras psicoses.
Entre outras questões abordadas pela área Psicologia da Saúde Ocu-
pacional, na Medicina do Trabalho e na Segurança do Trabalho, quer seja
nas indústrias ou em empresas de outros ramos, estão a relação psicosso-
cial das condições de trabalho com os comportamentos de saúde (e.g.,
tabagismo e consumo de álcool) e a moral no local de trabalho (e.g., nível
de satisfação ou insatisfação no ambiente ocupacional).
O campo da Psicologia da Saúde Ocupacional também é útil no
desenvolvimento de procedimentos operacionais padronizados. Algumas
regras relativas à segurança no trabalho, à ergonomia, à organização e à éti-
ca são planejadas, pensadas e executadas em consulta com os profissionais
do ramo e com a ajuda de guias escritos que abordam estas questões. Indo
além do trabalho, a PSO tem sido mais útil na concepção de leis referen-
tes a questões como o assédio moral no trabalho e o desenvolvimento de
normas fundamentais de segurança no trabalho.

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 101


Muitas empresas deliberadamente empregam o conhecimento ad-
quirido em anos de pesquisa prática em PSO para criar ambientes de
trabalho inovadores, que não só atraiam funcionários de qualidade, mas
que também promovam a melhora da produtividade global neste cenário.
Algumas das formas com que essas informações podem ser incorporadas
ao ambiente de trabalho abrangem ideias como a implementação de cre-
ches no local para os pais de crianças pequenas, além de refeitórios para
os funcionários, instalações para ginástica laboral, atividades recreativas e
de grupo.
Vale a inclusão de mecanismos que permitam aos funcionários uti-
lizarem redes sociais nos momentos de intervalo e no horário de almoço,
por exemplo, facilitando a comunicação deles com outras pessoas que não
sejam as mesmas do local de trabalho. Pesquisas indicam que esses bene-
fícios oferecidos ajudam os funcionários a descobrir um equilíbrio entre
trabalho e vida pessoal mais confortável, bem como diminui o estresse,
melhora a lealdade em relação à empresa, retém talentos e eleva a produ-
tividade, tudo isso ao mesmo tempo.
Assim, a PSO focaliza a sua atenção na organização e ambiente
do trabalho (fontes de estresse e de riscos profissionais para a saúde), no
comportamento individual e na interface trabalho/ família, constituin-
do-se como um domínio do conhecimento psicológico indispensável na
consideração de todas as questões relacionadas com a saúde ocupacional
(Carvalho Teixeira, 2000).
A Psicologia da Saúde Ocupacional como a aplicação como a apli-
cação dos princípios e das práticas da psicologia aplicada aos aspectos da
saúde ocupacional, tem o objetivo de aumentar a compreensão dos as-
pectos psicológicos, sociais e organizacionais da relação dinâmica entre o
trabalho e a saúde.
A Psicologia da Saúde Ocupacional visa promover ambientes de
trabalho saudáveis, que incluam pessoas saudáveis e interações saudáveis
entre o trabalho e a família/ambientes fora do trabalho. Onde isto não
exista, a Psicologia da Saúde Ocupacional concebe e implementa inter-

102 Temas Avançados em Qualidade de Vida


venções preventivas e terapêuticas que visem esse objetivo (Guimarães et
al, 2008).

Principais Áreas de Atuação do Psicólogo


da Saúde Ocupacional

Como se pode observar no quadro 1, a Qualidade de vida o bem


estar no trabalho encontram-se sob a rubrica da PSO:

Relevância do campo da PSO


(a) o reconhecimento que os transtornos psicológicos relacionados
ao trabalho, relacionam-se à Saúde Ocupacional e representam
um alto custo humano e econômico;
(b) a aceitação de que os fatores psicossociais exercem um impor-
tante papel na origem de problemas emergentes em Segurança
e Saúde Ocupacional, tais como, as DORT-LER;
(c) a recente e dramática mudança na organização do trabalho que
repercute na Saúde e na Segurança do Trabalho

Competências do psicólogo da saúde ocupacional


Treinamento clinico para detecção das ocorrências ligadas a aspec-
tos comportamentais, emocionais, psicológicos e psiquiátricos;
Treinamento em saúde ocupacional ou em programas da comuni-
dade, melhorando as habilidades destes profissionais para detectar estres-
se e transtornos psicológicos de origem ocupacional e trabalhar no acon-
selhamento e auxilio ao empregado;
Treinamento organizacional e experimental para que cooperem e
empreendam estudos epidemiológicos em saúde e segurança ocupacional,
emprestando sua perícia em psicometria para os projetos e na interpreta-
ção de aspectos psicossociais dos mesmos

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 103


Quadro 1 Principais área de atuação do psicólogo da saúde ocupacional.

• Qualidade de Vida e Bem-Estar no trabalho


• Empowerment e desenvolvimento de recursos organizacionais e humanos
• Intervenção em situações de Distress e Burnout
• Diferenças individuais, crenças e variáveis positivas na Saúde e Bem-estar no trabalho
• Gestão e organização de fatores ligados à Saúde e Doença nas organizações
• Programas de reabilitação vocacional
• Avaliação e intervenção em situações de Agressão, Violência e Violência sexual (Bully-
ing e Mobbing) em contexto laboral
• Gestão de tempo
• PSO e mudanças na organização do trabalho
• Desenvolvimento da psicologia da saúde ocupacional na Europa
• Prevenção da violência no local de trabalho
• Tele trabalho e qualidade de vida no trabalho
• Estresse ocupacional: Conceito e formas de intervenção
• Estresse no trabalho por turnos
• Saúde dos profissionais da saúde
• Estratégias e programas de intervenção no estresse ocupacional
• Fatores psicossociais e doenças músculo-esqueléticas
• Promoção da saúde dos trabalhadores mais velhos

O Futuro da PSO
Envolve três aspectos fundamentais: (i) vigilância às características
do ambiente de trabalho; (ii) pesquisa sobre os efeitos das práticas orga-
nizacionais; (iii) pesquisas de intervenção, e.g., avaliação de custo-efetivi-
dade: (iiia) pesquisa explicativa (desenvolvimento de modelos conceituais
de estresse no trabalho, e.g.), (iiib) pesquisa descritiva (estudos epidemio-
lógicos, relações com parâmetros, metas e objetivos organizacionais), (iiic)
desenvolvimento de instrumentos (e.g. estandartização de questionários

104 Temas Avançados em Qualidade de Vida


de mensuração de estresse ocupacional, medições sistemáticas de projetos
de mudança e mais atenção à implementação de projetos).
Intervenções futuras poderão se beneficiar de uma atuação conjun-
ta da PSO com a Medicina e a Segurança no Trabalho. No Brasil, a atu-
ação do psicólogo da saúde ocupacional ainda não é legalmente exigida,
como é a atuação de profissionais de Medicina, Enfermagem, Engenharia
e técnicos em segurança no trabalho. Pode-se dizer que a ausência de psi-
cólogos na equipe de Segurança e Medicina do trabalho é contraditória,
dado que, entende-se que as doenças ocupacionais podem ser causadas,
ainda que em parte, por fatores psicossociais, mas ainda não existem nor-
mas para seu controle, como há para os demais fatores de risco.

CONSIDER AÇÕES FINAIS

A satisfação dos trabalhadores já é vista pelos empresários como


um dos principais responsáveis pelo sucesso de qualquer negócio e essa
conclusão não está pouco equivocada, dado que o funcionário satisfeito
e motivado possui maiores índices de produtividade, menor índice de
absenteísmo e carrega os valores da empresa consigo. Esta questão passa
pela Qualidade de vida dos trabalhadores.
Elaborar estratégias que permitam que os aspectos positivos do tra-
balho se destaquem em detrimento dos aspectos negativos, faz parte da
função do psicólogo da saúde ocupacional e dos demais profissionais da
equipe de saúde e segurança no trabalho, dado que é fundamental que
o trabalhador tenha um saldo positivo no ambiente organizacional, ou
seja, um equilíbrio entre esforço e recompensa no trabalho (Siegrist, 1996;
Guimarães; Martins e Siegrist, 2008). Dinamizar esse processo por meio
de ações conjuntas com os demais setores da empresa (DP, RH, Marketing
entre outros) também é essencial para que o trabalhador se sinta parte
de um todo, não apenas uma peça que será trocada ao primeiro sinal

Qualidade de Vida e Psicologia da Saúde Ocupacional 105


de falha. Nesta direção, trabalhar a saúde incluída no RH é estratégia
necessária para uma ação eficaz.
Uma melhor compreensão e controle por parte da PSO acerca dos
fatores organizacionais de risco (Guimarães, 2008), parece ser o principal
foco para sua Proteção, Promoção e Prevenção, o que implicará em reper-
cussões positivas na qualidade de vida relacionada à saúde do trabalha-
dor e das organizações.

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108 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Qualidade de Vida e
Saúde Emocional:
o impacto dos relacionamentos
interpessoais no século XXI
Marilda E. Novaes Lipp
110 Temas Avançados em Qualidade de Vida
QUALIDADE DE VIDA E SAÚDE
EMOCIONAL: O IMPACTO DOS
RELACIONAMENTOS INTERPESSOAIS
NO SÉCULO XXI

"Adding life to years, and not just more


years to life!"

Motto of The Gerontological Society of America, citado em Rejeski, W


Jack. and Mihalko, Shannon L.(2001) ‘Physical Activity and Quality of Life in
Older Adults’, Journals of Gerontology: Series A: Biological Sciences & Medical
Sciences, Vol. 56, No. 11, p. 33.

A
força que impulsiona a humanidade tem sido, frequentemente,
o desejo subjacente pela busca da qualidade de vida. Análise his-
tórica revela que, quando os princípios de geometria de Euclides
(300 a. C.) foram utilizados para facilitar o trabalho dos agricultores nas
margens do Nilo, procurava-se melhorar a qualidade de vida no trabalho
daqueles agricultores. O mesmo pode se dizer quanto ao uso dos princí-
pios da Lei das Alavancas de Arquimedes (287 a. C.), que vieram reduzir,
significativamente, o esforço físico dos construtores da época. Muitos
outros exemplos poderiam ser citados, enfatizando o esforço de alguns
líderes de épocas passadas que visavam facilitar o trabalho e, de um modo

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 111


ou de outro, objetivavam melhorar as condições de vida de comunidades,
muito embora o termo “qualidade de vida no trabalho “ só tenha sido
cogitado, de passagem, a partir da década de 50 e mais intensamente na
década de 70.
No plano pessoal também não é nova a busca pelo que hoje se
designa de qualidade de vida. Na verdade 2.300 anos atrás, Aristóteles em
Nicomachean Ethics já apresentava a teoria da felicidade, questionando
“Qual o propósito da vida ?” e concluindo que a busca da eudaimonia
(felicidade) era o propósito maior da existência humana. Através dos anos
esta ideia tem sido, às vezes, defendida com vigor e outras vezes rejeitada
em favor da busca de riqueza, poder e defesa de crenças ideológicas ou
religiosas.

Conceituação de Qualidade de Vida


A grande dificuldade no estudo científico do que seja qualidade
de vida, bem estar ou felicidade, ou outro termo que se deseja usar, é a
definição elusiva e fugidia do que ela se constitui. Não há como definir
qualidade de vida em termos puramente objetivos, nem, por outro lado,
levando em consideração somente aspectos subjetivos. Considere-se, por
exemplo, o caso de uma criança da favela, pobre, descalça, não vacinada,
convivendo com bandidos e com as drogas, sem alimentação adequada,
mas que se sinta “feliz”. Em termos subjetivos puramente, ela pode estar
bem, porem, por padrões comparativos da sociedade no geral, poderia
se considerar que ela tem boa qualidade de vida? Por outro lado, uma
mulher rica, casada, com filhos, que viaja constantemente, que tenha to-
das as joias que deseja, mas que se encontra depressiva e infeliz, pode ser
considerada como tendo boa qualidade de vida?
Embora as definições variem, basicamente, cada ser humano pa-
rece ter o desejo profundo da busca do bem estar, da felicidade ou em
palavras mais fáceis de utilizar na comunicação universal - a qualidade de
vida.

112 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Apesar de que a conceituação de QV atualmente mais referenciada
é a da OMS que explicita que qualidade de vida não é somente a ausência
de doenças, não há consenso a não ser quanto ao fato de que se refere a
natureza multifacetada do conceito, conforme citado por Pereira, Teixeira
e Santos (2012) e Limongi-França, Castro, Oliveira e Silva (2013), entre
outros autores de renome.
Outras visões existem, como a do Centro de Promoção da Saúde
da Universidade de Toronto, citado por Ogata e Simurro (2009) que a
define como um Modelo Conceitual que contempla:

• Bem estar e saúde:


• Física,
• Psicológica,
• Espiritual.
Aliados ao meio ambiente adequado e a oportunidades de desen-
volvimento intelectual.

Em nossa ótica, qualidade de vida pode ser definida como a in-


teração entre saúde - física e psicológica, recursos materiais disponíveis,
compatíveis com o estado sócio cultural e o nível de satisfação com o viver
que o individuo mantem por longos períodos de tempo. Neste conceito
se inclui a necessidade da pessoa estar bem nos quadrantes da vida, ou
seja, em quatro áreas fundamentais -: afetiva, profissional, social e saúde.
Como condição subjacente, permeando todo o funcionamento humano,
se encontra a dimensão da espiritualidade. Dois aspectos importantes de-
vem ser explicitados quanto a esta definição. Primeiramente está explícito
que não é suficiente se estar bem em somente um quadrante, de modo
que um executivo muito bem sucedido profissionalmente não poderia se
considerar como tendo uma boa qualidade de vida, se não estiver com um
bom funcionamento nos outros quadrantes. A qualidade de vida global
seria, assim, sucesso na gestão das quatro áreas como um todo. Em segun-
do lugar, deve-se atentar para a dimensão da temporalidade. Estar bem,

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 113


ter sucesso nos quadrantes deve ter um aspecto de permanência por um
tempo mais prolongado.

Espiritual

Social Afetiva

Profissional Saúde

Figura 1 Modelo de Qualidade de vida de Lipp.

Não é, por exemplo, suficiente estar bem na área afetiva em um


encontro, mas sim manter elos afetivos mais duradouros que assegurem
plenitude nesta área. A busca do bem-estar pleno é algo íntimo, indele-
gável, totalmente dentro da responsabilidade individual, embora fatores
externos possam ter uma contribuição (Lipp, 2009).
Assim sendo, a visão que parece mais parcimoniosa é a de uma
interação de diversos fatores que, em certos momentos, e em quantidades
variáveis, determinam o nível de qualidade de vida de um ser humano.
Embora o peso de vários aspectos possa variar, no tempo e nas circunstan-
cias presentes em dado momento, o nível de qualidade de vida não deve
ser sujeito à efemeridade. Contrária a sensação de alegria, que pode ter
caráter transitório e efêmero, qualidade de vida, embora mutável, necessi-
ta ter em sua essência a qualidade de permanência e estabilidade.

114 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Figura 2 Influência de fatores objetivos e subjetivos na determinação da qualidade de
vida.

De acordo com a Figura 2, qualidade de vida situar-se-ia na parte


conjunta, na intersecção, de certos fatores de natureza objetiva e outros
de natureza subjetiva.

A Hierarquia das Necessidades Humanas e a


Qualidade de Vida

AUTO-REALIZAÇÃO

STATUS - ESTIMA

SOCIAIS

SEGURANÇA

FISIOLÓGICAS

Figura 3 A hierarquia das necessidades humanas de acordo com Abraham Maslow.

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 115


A necessidade de auto - realização, a mais pura das motivações, que
significa estar em contato consigo mesmo, sentir-se pleno e feliz, como
indicado na pirâmide da Figura 3, é alcançada por poucos. Pelo que se
constata, na atuação clínica com dezenas de pessoas cultas, inteligentes,
bem sucedidas e competentes, nem sempre a auto realização é vista como
meta. Analisando esta constatação, verifica-se que talvez a fluidez do con-
ceito interfira na sua busca. Como citado por Lipp (2008, 2009 ), pode-se
comparar a obtenção da felicidade com a de sucesso profissional. Existem
parâmetros claros de competência e realização. Metas são ou não preen-
chidas, projetos são ou não concluídos, contratos são ou não fechados e
peças são ou não fabricadas. Critérios objetivos de realização de trabalhos
levam à possibilidade de estabelecimento de planos para atingir as me-
tas e também ao desenvolvimento de procedimentos que possibilitem, de
modo preciso, como avaliar o desempenho.
Mas, por quais parâmetros vamos medir felicidade e bem estar? São
sentimentos pessoais, ocultos, de conhecimento somente da pessoa, ina-
cessíveis a outros e, portanto, difíceis de serem mensurados e avaliados.
O observador do bem estar próprio é um caso único, não há pressão de
fora que tenha o poder de mudar o que sentimos, a não ser que o permi-
tamos, pois somos donos de nossos sentimentos. O poder e o controle,
envolvidos, são enormes: somente nós podemos viver a nossa vida, ela é
indelegável e somente a própria pessoa pode avaliar plenamente a sua feli-
cidade e bem estar. Somos donos absolutos da nossa vida. Talvez devido à
dificuldade de se medir bem estar e felicidade seja tão difícil para algumas
pessoas se deterem neste aspecto e investirem na arte de ser feliz.
Outra razão que talvez explique porque muitas pessoas não colocam
“ser feliz” como sua meta principal na vida e relevam a busca do bem es-
tar, a um segundo plano, seja o fato de que, nas realizações, a pessoa tem
o reconhecimento externo, de chefe, da família e da sociedade, mas no
bem estar este reconhecimento tem que ser de foro interno. Infelizmente,
ninguém recebe uma medalha por ser feliz.

116 Temas Avançados em Qualidade de Vida


A busca do bem estar pleno tem que ser algo íntimo, indelegável,
totalmente dentro da responsabilidade individual, embora fatores exter-
nos possam contribuir para que se tenha motivação na busca do bem
estar. Se ninguém pode criar felicidade para o outro, é sim possível atra-
palhar a felicidade em alguns aspectos, como com assédio moral por parte
de chefes, injustiças, relacionamentos conturbados, etc. É justamente por
isto que ações corporativas, visando a promoção de um clima empresarial
adequado, são fundamentais para colaborar na obtenção de um estado
de bem estar do quadro de funcionários. O ideal seria que a pessoa pos-
suísse bastante harmonia interior para fazer em face de todas as situações
estressantes e manter o seu bem estar interior, mas isto se torna muito
desafiador quando a demanda do mundo externo ultrapassa a habilidade
de coping (de lidar com a situação) ou a resiliência (a resistência) da pessoa.

A Evolução como Fator que Afeta a


Qualidade de Vida das Nações
A multifatoriedade do conceito de qualidade de vida, sua ampla
abrangência, desafia uma definição precisa que facilite experimentos cien-
tíficos, porem, justamente a fluidez do conceito, que de um lado tanto
dificulta sua mensuração, também facilita que seja utilizado por varias
disciplinas e em situações multivariadas. O numero de artigos e trabalhos
científicos na área de bem estar, felicidade e qualidade de vida aumen-
ta potencialmente a cada ano. Todos os campos do saber abrem espaço
para a discussão sobre vários aspectos do tema. Este interesse universal
contribui para o estabelecimento de ações governamentais, em termos de
políticas de saúde e bem estar, valorizando o ser humano em suas relações
entre o mundo produtor e o consumidor e possibilitando formas mais
adequadas de enfrentamento das mudanças societais, tecnológicas e éticas
que o mundo, como um todo globalizante, atravessa durante seu inexorá-
vel desenvolvimento.

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 117


O século XXI esta sendo definido como marcado pelo progresso
tecnológico e pela mudança de valores sociais, familiares e até éticos, gera-
das pela facilidade de acesso a informações de culturas diversas e praticas
diferenciadas. Curiosamente na década de 70 surgiu também uma onda
de preocupações que assustaram. Embora o desenvolvimento econômico
estivesse presente e se verificasse um esforço para melhorar nível educa-
cional, atenção à saúde e moradia da população, no geral, havia um medo
crescente de uma crise social iminente devido a um aumento da taxa de
crimes, uso de drogas, fragmentação familiar e, como ressaltado por Cam-
pell, 1976 (p.117), um aumento em “ alienação social e publica”.
Armstrong e Caldwell (2004) mencionam um editorial do Journal of
the American Osteopathic Association que descreveu o clima de mal estar so-
cial em termos “de ‘um desespero crescente em todo o país...’ (Editorial,
1970, p. 13) a medida que referencias sociais pareciam estar desaparecen-
do e um novo, básico, materialismo emergia. Neste clima, a solução pro-
posta era a implantação de vários programas para melhorar a qualidade
de vida das pessoas. Este foi um dos fatores, dentre outros, que deram
impulso aos estudos e trabalhos sobre qualidade de vida.
Na década de 70 surge a tentativa de integrar os interesses dos em-
pregados e empregadores, através de práticas gerenciais capazes de reduzir
os conflitos. Outra tentativa era a de tentar criar maior motivação nos
empregados. Quando surgiu a ênfase em qualidade total dos produtos
industriais a mesma se generalizou para outras dimensões, tais como:

• maior participação dos funcionários nos processos de trabalho,


ou seja, uma tentativa de eliminação da separação entre pla-
nejamento execução, promovida principalmente pelos sistemas
tayloristas e fordistas;
• descentralização das decisões;
• redução de níveis hierárquicos;
• supervisão democrática;
• ambiente físico seguro e confortável;

118 Temas Avançados em Qualidade de Vida


• além de condições de trabalho capazes de gerar satisfação; opor-
tunidade de crescimento e desenvolvimento pessoal.

Bem Estar e a Promoção de Saúde no


Ambiente Corporativo
Nos últimos anos, programas de qualidade de vida, envolvendo
ações, muitas vezes totalmente diversificadas, tem sido planejados e im-
plantados nas empresas. Infelizmente, são ainda poucas as empresas que
iniciam e mantem projetos assim. Há de se entender que o ambiente de
trabalho é o melhor cenário onde se possa instalar os programas de quali-
dade de vida uma vez que congrega um numero grande de pessoas, muitas
das quais não tem conhecimento da importância de hábitos saudáveis e
que, sem um evento motivador, provavelmente não se preocupariam com
esse aspecto do viver. Mesmo em situações, onde a adesão não atinge o
índice esperado, verifica-se que aqueles que aderem ao programa e dele
participam com regularidade tem um grande beneficio para a sua saúde
e bem estar.
A grande variabilidade dos programas de qualidade de vida no
trabalho ocorre justamente porque o conceito do que é qualidade de vida
é multifacetado e porque o campo de conhecimento ainda não está con-
solidado. Assim, quase tudo que é feito em favor dos empregados pode ser
designado de programa de qualidade de vida no trabalho. Gradualmente
as organizações estão descobrindo que é importante haver excelência nas
ações a fim de se promover adesão por parte dos trabalhadores. Progra-
mas de boa qualidade, mesmo que somente contemplem uma das dimen-
sões conceituais, agregam valor e motivam os participantes.
Segundo Ogata e Simurro (2009) os programas de QVT “melho-
ram o estilo de vida, diminuem os fatores individuais de risco, aumentam
sua capacidade de controle da própria saúde, gerenciam melhor os fatores
pessoais e profissionais de stress, o ambiente fica mais saudável, os relacio-
namentos se estabelecem de maneira mais adequada, melhorias na estabi-

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 119


lidade emocional, aumentam a motivação para o trabalho e para a vida,
melhoram a autoimagem e autoestima, aumentam o bem-estar geral”.
Chapman (2012) classifica os benefícios dos Programas tangíveis e
intangíveis:
• Benefícios tangíveis: redução do absenteísmo por doença, di-
minuição do uso do sistema de saúde, redução das perdas por
presenteísmo, diminuição do turnover.
• Benefícios intangíveis: melhoria da imagem da organização,
aumento da moral e lealdade dos funcionários, diminuição dos
conflitos na organização, aumento da produtividade dos fun-
cionários.

Objetivo principal: Melhorar o Viver e Prevenir o Stress no am-


biente de trabalho e suas consequências, além de:
• Melhorar o Perfil de Saúde dos servidores;
• Melhorar a Motivação;
• Reduzir índices de absenteísmo
• Reduzir índice de doenças mentais.

Adultos passam uma grande parte de suas vidas no trabalho e cada


vez mais a atenção se volta para a responsabilidade das empresas quanto
à promoção da saúde e a prevenção do stress nas organizações (Ferreira,
Ferreira, Antloga & Bergamaschi, 2009; Ferreira , 2011; Limongi-Fran-
ça 2009, 2010; Limongi-França, Castro, Oliveira & Silva, 2013 e Lipp ,
2014). O stress criado por fatores relacionados ao trabalho tem recebido
muita atenção não só de pesquisadores, mas também por parte de insti-
tuições governamentais em nível internacional. Por exemplo, o Instituto
Americano de Segurança e Saúde tem publicado recomendações sobre o
stress ocupacional, enfatizando que a natureza do trabalho está mudando
radicalmente em velocidade vertiginosa e que medidas profiláticas devem
ser tomadas a fim de prevenir o impacto do stress ocupacional não só nos
trabalhadores, mas também na sociedade como um todo!. O Governo do

120 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Japão também tem sugerido estudos e medidas preventivas neste sentido,
bem como o governo da Bélgica que assinou um acordo com a associação
de trabalhadores sobre ações preventivas na área do stress no trabalho.
Recentemente, o governo dos Estados Unidos publicou um documen-
to onde especificamente torna a promoção da saúde uma prioridade e
relata que uma analise das empresas, em âmbito nacional, que oferecem
programas de promoção de saúde e redução de fatores de risco, envolven-
do ações antitabagismo, incentivo para controle de obesidade e redução
do stress, revelou uma redução significativa de problemas mais graves de
saúde.
A Carta de Bangkok escrita durante a 6ª. Conferencia mundial de
promoção da Saúde, em Bangkok, Tailândia, faz um apelo para o avanço
das ações de promoção da saúde em nível mundial, tanto no âmbito pes-
soal, empresarial como governamental. No que se refere a ações empre-
sariais, a Carta de Bangkok sugere tornar a promoção de saúde (PS) uma
exigência para a boa prática corporativa, como se segue:

“O setor empresarial tem um impacto importante na saúde


das pessoas e sobre os determinantes da saúde através de
sua influência em:
• Cenários locais
• Culturas nacionais
• Meio ambiente, e
• Distribuição da riqueza.
O setor privado assim como outros empregadores e o
setor informal têm a responsabilidade de assegurar a saúde
e segurança no local de trabalho, e de promover a saúde e
o bem estar de seus empregados, suas famílias e Comunidades..”
Carta de Bangkok, 11 de agosto de 2005.

Em consonância com estas recomendações, ações empresariais e


governamentais têm sido tomadas com o objetivo de promover melhores

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 121


condições para que o trabalhador atinja um nível adequado de bem estar
no trabalho e fora dele. Porem a iniciativa é ainda incipiente consideran-
do-se que um vasto numero de empresas e setores governamentais não
possuem ainda tais iniciativas. Nos locais onde esses programas existem,
tem-se verificado uma redução significativa de absenteísmo e de licenças
médicas, maior produtividade e também uma maior retenção de funcio-
nários sadios e motivados. O nível de stress é reduzido e o clima organiza-
cional melhora.

Stress Ocupacional e seu impacto na


Qualidade de Vida
De três a quatro brasileiros em cada 1dez tem sintomas significati-
vos de stress. O índice de stress avaliado em 2014 por testes psicológicos
validados é de 35% no Brasil. Em uma pesquisa on-line com 2495 pesso-
as, o auto diagnóstico de stress elevou este índice para 52%.
Na década de 80, quando se começou a falar de stress no Brasil,
algumas empresas anteviram a necessidade de trabalhos nesta área e inicia-
ram algumas ações anti-stress para seus funcionários. Poucas eram elas e as
campanhas tinham duração curta, se atendo mais a algumas palestras para
a classe diretiva. A ideia era bastante revolucionária e a iniciativa destas
ações partia dos setores de Recursos Humanos ou Médico. Na atualidade,
já não é mais do âmbito exclusivo desses setores a iniciativa de proposta
de trabalhos anti stress, hoje, o funcionário pede e espera que as empresas
tomem tais ações para beneficio dos empregados e para que estes possam
trabalhar de forma mais tranquila. À medida que se intensifica o conheci-
mento sobre o stress emocional e suas repercussões para a saúde e a pro-
dutividade do ser humano, mais a demanda por programas de controle se
manifesta sempre que o corpo de funcionários é consultado sobre medi-
das que gostariam de ver implementadas no âmbito das empresas. Deste
modo, medidas organizacionais passam a ser iniciadas em vários âmbitos,
muitas vezes até sem o planejamento necessário para o seu sucesso.

122 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Por que se preocupar com o stress?
Primeiramente, é importante enfatizar o que, de fato, pode ocorrer
em função de níveis altos de stress ocupacional, tanto no que se refere
ao trabalhador, quanto ao que tange aos aspectos corporativos. Existem
estatísticas internacionais bem precisas quanto a isto e também já temos
algumas estatísticas brasileiras quanto a alguns aspectos do stress que pre-
cisam ser levadas em consideração, a fim de que se possa ter uma noção
mais referenciada da responsabilidade empresarial nesta área. Existe acor-
do entre estudiosos quanto a que há uma associação clara entre stress e
doenças e quanto ao impacto de níveis altos de stress na qualidade de vida
do ser humano. Muitos sintomas podem ocorrer, dependendo da gravida-
de da situação. Os Quadros 1 e 2 mostram, respectivamente, os sintomas
psicológicos e físicos mais frequentes entre os trabalhadores.
O índice de afastamento por doenças relacionadas ao stress nos
trabalhadores brasileiros cresceu 28%no primeiro semestres de 2011 com-
parado com o primeiro semestre de 2010. Foram 100 mil pessoas afastadas
por esse problema, comparadas com 85 mil no primeiro semestre do ano

Quadro 1 Sintomas de Stress na Área Emocional.

Desmotivação no trabalho
Queda de produtividade
Relações interpessoais conturbadas
Divórcios
Ansiedade
Depressão
Baixa qualidade de vida
Farmacodependência
Irritabilidade
Infelicidade no âmbito pessoal

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 123


Quadro 2 Sintomas de Stress na Área Física.

Tensão Muscular
Problemas cardiovasculares
Problemas gástricos
Problemas dermatológicos
Tontura
Aumento de colesterol
Problemas odontológicos

anterior, de acordo com os dados do Boletim Estatístico da Previdência


Social (Vol. 16 Nº 07 julho/2011).
Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Psicologia e Controle do
Stress (IPCS) com 1000 adultos mostrou claramente o impacto do stress
na qualidade de vida. Na Figura 4 pode-se observar que o stress tem efeito
negativo nas esferas social, afetiva, profissional e principalmente na área
da saúde.

Figura 4 Enunciado?

124 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Qualidade de Vida na Saúde Física
Inúmeros estudos tem comprovado a relação significativa entre má
qualidade de vida e doenças físicas. A evidência é abundante tanto no que
se refere a doenças crônicas como doenças infectocontagiosas. O processo
do adoecer, frequentemente ligado a adoção de hábitos de vida inadequa-
dos e enfraquecedores, é muitas vezes gradual e o aparecimento de doen-
ças surge muito depois de se ter dado inicio a este processo. De modo que
ele passa despercebido e, assim sendo, não recebe a atenção necessária em
termos de prevenção. O ser humano voltado para a competitividade, para
as realizações e alimentado, na época atual, por uma pressa inigualável,
se impõe com frequência o que se poderia chamar de silencio corporal,
que se refere a uma ação sistemática, através do tempo, de ignorar os sin-
tomas e mal estar que vão sinalizando o enfraquecimento da saúde, não
promovendo assim ações reparadoras, que poderiam prevenir as doenças
silenciosamente, sendo estabelecidas dentro do seu organismo.
Embora na área de qualidade de vida haja uma grande divergên-
cia sobre sua definição e os componentes críticos nela envolvidos, existe
acordo entre cientistas e clínicos quanto a que hábitos inadequados re-
dundam em doença e, consequentemente, em má qualidade de vida. Essa
evidencia se refere não só à saúde física, mas também à saúde mental do
ser humano.

Qualidade de Vida e Saúde Emocional


Se, como já discutido, na década de 70 já havia a preocupação, que
hoje ainda permanece presente, da iminência de crise social devido a mu-
danças sociais e tecnológicas, atualmente, novas variáveis estão clamando
por atenção. Dentre elas, a dimensão emocional da qualidade de vida
ganha realce, devido as comprovações cientificas de suas implicações e
consequências.
A saúde emocional de um ser humano depende de múltiplas variá-
veis, algumas genéticas e outras ambientais que interagem para determina-

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 125


rem como o individuo reage frente à vida. Do lado negativo, pode haver
a vulnerabilidade ao stress que predispõe a pessoa a ser sensível a even-
tos do dia a dia que se tornam grandes fontes de angustia e debilitam o
emocional. Pode também adquirir a forma de predisposições à depressão,
ansiedade e doenças mentais que permanecem latentes até serem desenca-
deadas de acordo com a programação genética ou por eventos estressores
significativos que precipitam o seu desenvolvimento.

Vulnerabilidade
Vulnerabilidade envolve a noção de que as pessoas são diferentes e
reagem de modo diferenciado a eventos aparentemente semelhantes. O
que leva as pessoas a reagirem de modo tão diferente é uma constante área
de pesquisa. A visão mais aceita é de que essa diversidade seja oriunda
não só da constituição biológica e do ambiente social, mas também do
mecanismo de percepção do mundo ao seu redor.
Vulnerabilidade, no sentido mais amplo, é o produto da interação
de diferentes fatores em uma proporção própria de cada indivíduo. O
modelo de vulnerabilidade está diretamente ligado à sensibilidade indivi-
dual ao stress emocional e certos traços podem ser desenvolvidos para ser-
virem como verdadeiros buffers (fatores de proteção) que fazem a mediação
entre a vulnerabilidade biológica e os eventos estressantes da vida.
Há também que se considerar que a vulnerabilidade e seu oposto,
que seria a resiliência, não são conceitos exclusivos, mas sim parte de um
mesmo continuo, ficando em um extremo os indivíduos altamente sensí-
veis, os super- vulneráveis aos eventos vitais, e no outro extremo ficariam
as pessoas altamente resilientes.

Resiliência
Do lado positivo, a contribuição biológica pode ser na forma de
uma grande resiliência aos reveses da vida que contribui para a sensação

126 Temas Avançados em Qualidade de Vida


de bem estar e felicidade do ser humano mesmo em momentos difíceis e
desafiadores.
Resiliência pode ser definida como a capacidade que permite que
uma pessoa, grupo ou comunidade, previna, minimize ou supere os efei-
tos nocivos das adversidades. Segundo Ralha-Simões (2001), a resiliência
caracteriza-se por um modo flexível de manejar circunstâncias adversas,
presentes ao longo do desenvolvimento humano. Em suas palavras: “O
indivíduo resiliente parece de fato salientar-se por uma estrutura de personalidade
precoce e adequadamente diferenciada, a par com uma acrescida abertura a novas
experiências, novos valores e a fatores de transformação dessa mesma estrutura que,
apesar de ser bem estabelecida, é flexível e não apresenta resistência à mudança”
(p.108).
Estudos mais recentes sobre o tema têm demonstrado que a resi-
liência ou comportamentos resilientes dependem das relações do indiví-
duo com o ambiente, definindo resiliência como a habilidade de perseve-
rar e adaptar-se quando as coisas não estão bem e de manter a regulação
emocional.

Regulação Emocional
Regulação emocional é a habilidade do indivíduo em manter-se cal-
mo diante de adversidades. Um bom repertório nesta direção favorece o
desenvolvimento de habilidades sociais, sucesso profissional e pessoal e
auxilia o indivíduo quanto a cuidados com a saúde física. Pessoas com
dificuldade em regular suas emoções podem se tornar exaustivos para seus
companheiros e colegas de trabalho. Reivich e Shatté (2002) ressaltaram
que há pesquisas que mostram sua importância nas relações interpessoais,
na medida em que um déficit comportamental nesta área ocasiona maior
dificuldade na manutenção de relacionamentos estáveis, em face das fre-
quentes oscilações de humor. A regulação emocional depende muitas ve-
zes da competência social do individuo.

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 127


A Noção de Competência Social
Existem pessoas que parecem ter uma habilidade inata para culti-
varem bons relacionamentos. São pessoas socialmente hábeis, que conse-
guem manter relacionamentos pessoais e profissionais mais satisfatórios,
elas conseguem a colaboração de colegas e familiares com maior facilida-
de. Possuem o que se chama de inteligência prática. Há, porém, algumas
pessoas que encontram grandes dificuldades nas relações. Segundo dois
pesquisadores de renome nesta área (A. Del Prette Del & Z. Del Prette,
2001), um repertório variado de habilidades sociais pode contribuir para
uma competência social e qualidade nas relações interpessoais. Trata-se de
modos de agir que ajudam a pessoa a lidar com o outro de tal modo que
possam resolver problemas e chegar a um acordo, ao mesmo tempo em
que conseguem estabelecer um clima de cooperação que gera a sensação
de justiça e boa vontade no interlocutor. Elas produzem harmonia na con-
vivência seja familiar ou profissional. Essas habilidades, tão valiosas, em
geral, são aprendidas durante a infância e adolescência, porem, quando
, devido a praticas parentais ineficientes ou por outros problemas, não
são desenvolvidas cedo na vida, podem ainda ser aprendidas a qualquer
tempo. A habilidade de se relacionar é importante em todo contexto e as
empresas já estão se sensibilizando quanto à necessidade de treinamen-
to nesta área devido a sua importância para o bom trabalho em equipe.
Programas de treinamento são importantes para promover a competência
social de empregados em todos os níveis. Além do aspecto relacionado
ao bom convívio empresarial, há de se considerar que pesquisas mostram
que as pessoas socialmente hábeis apresentam melhor saúde física e psi-
cológica.

Relacionamentos Interpessoais
no Ambiente Corporativo

Importante é se observar o caráter recíproco da díade stress-rela-


cionamentos ruins, em que a pessoa estressada tem dificuldade em se

128 Temas Avançados em Qualidade de Vida


relacionar, adequadamente no trabalho e em casa devido aos sintomas
gerados pelo stress e, por outro lado, ela pode se estressar pela qualidade
das relações que tem com colegas, chefes e subordinados. Relacionamen-
tos conflitivo frequentemente geram um grande nível de tensão, criam a
sensação de rejeição, de abuso e falta de respeito. O dano emocional que
isto pode causar só é mesmo conhecido de psicólogos que atendem a pes-
soas com esta dificuldade. Muitas vezes são diretores de empresas, pessoas
muito bem sucedidas na área profissional e que tem a sensação de ina-
dequação devido a dificuldades interpessoais. Estas às vezes são causadas
por elementos dispersivos, maldosos que parecem existir na maioria das
organizações, ou podem ser geradas pelas próprias dificuldade pessoais, a
falta de competência social da própria pessoa. Um bom relacionamento
interpessoal, trás mais satisfação para o trabalhador, de qualquer nível, e
produz o desenvolvimento pessoal e da equipe. Quanto menos conflito,
maior é o crescimento individual e maior é a coesão e comprometimento
da equipe como um todo.
È fácil perceber que a qualidade de vida é profundamente afetada
pelos relacionamentos que a pessoa tem. Qualidade de vida, stress e re-
lacionamentos interpessoais adequados estão necessariamente associados,
pois ao se envolver em relacionamentos satisfatórios, o indivíduo pode
sentir-se mais aceito e apoiado, obter maior realização pessoal, sucesso pro-
fissional, melhor saúde física e mental. Ser capaz de desenvolver e manter
relacionamentos interpessoais de bom nível é decisivo para o sucesso das
organizações e para a qualidade de vida das pessoas.
A pesquisa on-line realizada em 2014 pelo Instituto de Psicologia e
Controle do Stress (IPCS), com 2.495 adultos de varias regiões do país,
revelou que a maior fonte de stress para um grande numero de pessoas era
o relacionamento com familiares e colegas de trabalho. Esses dados são
impressionantes, considerando que a dificuldade financeira foi apontada
como a segunda maior fonte de preocupação no Brasil. Pesquisa anterior,
com 1.550 trabalhadores de dez empresas brasileiras de varias regiões do
país, também realizada pelo IPCS já havia revelado que o maior estressor

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 129


dentro de uma instituição não é o trabalho em si, mas sim as relações
entre colegas e com o chefe (IPCS, 2014).
Na nossa sociedade pós-moderna, os relacionamentos são definidos
essencialmente pela sua efemeridade. Atualmente as relações refletem o
fato de que nada é permanente, tudo se modifica, e o que nos parece tão
precioso em um dia, nada mais vale em outro. Existe uma ânsia de se tocar
em frente, de se substituir aquilo que não preenche todas as nossas expec-
tativas por outras que ilusoriamente, naquele exato momento, tudo nos
oferece. È o que o filósofo Bauman chamou de “sociedade líquida” (Bau-
man, 2004). Liquida porque é fluida, imprevisível, em constante mutação.
Um mundo constituído de objetos descartáveis, como computadores, im-
pressoras, celulares e carros, o ser humano perde também a qualidade de
permanência na memória um do outro. Ele se torna também temporário
nas relações que estabelece. O trabalhador que se mantinha por muitos
anos na mesma empresa, agora troca sucessivamente, buscando cada vez
mais rápido uma ascensão profissional e, por isso, não cria raízes. Neste
contexto, manter relacionamentos afetivos duradouros é uma arte, pois
envolve dar e receber, é aceitar que existem modos diferentes de pensar e
de agir, é abrir-se para o novo, é também respeitar quem pensa diferente
do nosso modo de ver o mundo, mas para que possamos aceitar o outro e
sua individualidade, é importante que aceitemos a nossa própria manei-
ra de ser, nossas idiossincrasias, potenciais e falhas. Isto é o que poderia
se chamar de relacionamento intrapessoal. Muitas vezes a relação com o
outro é difícil porque a que se tem consigo mesmo, também está preju-
dicada. Em situações em que o tumulto interior está ocorrendo, difícil se
torna a relação com o outro e com o mundo ao nosso redor.
A dificuldade interpessoal nos dias modernos está tão grande e tal
é a solidão que dela advém que um fenômeno capaz de causar pasmo está
ocorrendo, que são os anúncios de venda de tempo com cobrança por
minuto que estão aparecendo no eBay. Um dos anúncios “de venda de
tempo” oferece até um leilão para ver quem está disposto a pagar mais
pelo tempo no telefone com o anunciante. No anuncio citado neste texto,

130 Temas Avançados em Qualidade de Vida


o anunciante cobra ou $25 por 30 minutos de conversa ou solicita que fa-
çam lance para ter o melhor preço. Como exemplos, dois destes links são:

http://www.ebay.com/itm/Conversation-for-30-minutes-/201251751808?pt=LH_DefaultDomain_0&
hash=item2edb8a0780

http://www.ebay.com/itm/Skype-conversation-for-lonely-person-30-minutes-
-/201248213681?pt=LH_DefaultDomain_0&hash=item2edb540ab1

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 131


Nos anúncios não aparecem qualificações do anunciante, trata-se
somente de uma conversa sem parâmetros que reduz a sensação de soli-
dão de quem procura o serviço. Infere-se que as redes sociais não estão
satisfazendo plenamente a necessidade que todo ser humano tem de calor
humano, de atenção e de ser ouvido.
Como citado por Lipp (2014), a competitividade por bons empre-
gos, por salários e posições privilegiadas no mundo empresarial tem le-
vado a uma busca, quase que frenética, por treinamentos, quer seja no
próprio país ou no exterior, resultando em uma mudança interessante
no perfil que as empresas procuram em seu recrutamento de profissio-
nais. Atualmente não se busca somente um profissional competente, isto
a maioria que se candidata a um cargo mais elevado o é. A competência
social, definida como a habilidade de lidar com o outro e trabalhar em
grupo é apontada como uma competência essencial. No mundo da com-
petência é importante vivenciar, refletir e adquirir instrumentos e técnicas
para melhorar a capacidade de se comunicar e se relacionar. A Moderni-
dade exige que se tenha um diferencial, sendo que saber línguas, conhe-
cer informática etc muitos já o fazem, o que, então, faz a diferença na
contratação e manutenção do emprego? Procura-se, além da competência
técnica, aquele que consegue trabalhar em equipe. Equipe não é somente
o conjunto de pessoas que trabalham juntas num determinado projeto.
Uma verdadeira equipe é como uma orquestra que toca em sintonia. To-
dos seus membros têm o seu valor e fazem uma contribuição, mas não se
buscam contribuições individualistas que quebrem a sintonia do grupo
inteiro. Um alimenta o outro, fornecendo ideias e sugestões, fazendo a
sua parte e se sentindo uma peça importante na engrenagem do projeto.
O líder da equipe tem o papel de um maestro garantindo que cada um
dê o melhor de si mesmo para produzir uma musica de excelente quali-
dade, com orgulho e prazer. Mas todos os membros precisam colaborar,
todos são importantes e todos tem um papel ativo na manutenção da
harmonia grupal sem perder o objetivo comum que é o cumprimento
das metas organizacionais. Para tal, é importante que haja cumplicidade,

132 Temas Avançados em Qualidade de Vida


aceitação um do outro, empatia, comunicação adequada, colaboração e
confiança entre os membros da equipe. Quando isto não ocorre no dia
a dia, problemas sérios podem ocorrer, comprometendo, não só o clima
organizacional, mas também a qualidade de vida e o nível de satisfação
na vida e no trabalho de todos. Outra consequência da dissintonia nas
relações interpessoais é o stress emocional.

A Noção de Competência Social


Não há duvida que os relacionamentos, dentro do ambiente cor-
porativo, podem ser uma fonte poderosa de stress. Mas também se sabe,
com certeza absoluta, que o apoio de colegas pode se constituir em uma
magnifica fonte de alento em momentos difíceis. A pessoa que tem apoio
recupera-se muito mais rapidamente de episódios de stress, depressão e
até de infarto. A harmonia no dia a dia contribui significativamente para
o bom transcorrer dos trabalhos e dos projetos e esta harmonia só pode
ser atingida quando há relações respeitosas entre as pessoas da equipe.
Relações onde o respeito não existe serão sempre uma fonte em potencial
de stress, ansiedade e descompromisso com a empresa.

Doenças Mentais
A inter-relação entre mente-corpo é uma das mais fascinantes.
Quando o ser humano se encontra em um estado crônico de ansiedade,
quando está sob a ação de um estressor agudo, sua saúde física e mental
sofre consideravelmente e a qualidade de vida, a sensação de bem estar e
de plenitude também são muito afetadas. As doenças mentais afetam mais
de 400 milhões de pessoas em todo o mundo, conforme dados da OMS.
No Brasil, estima-se que 23 milhões de pessoas sofram com algum tipo
de distúrbio mental, e que, aproximadamente, cinco milhões sofram de
nível moderado a grave. Cinco das 10 doenças que geram afastamento do
trabalho no mundo são de natureza mental. Estima-se que 81% do tempo

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 133


produtivo fica comprometido absenteísmo que leva a queda de produtivi-
dade (Pizotti, citado em BMC, 2014).
A Previdência no período de janeiro até junho de 2011 desembol-
sou R$ 147 milhões em auxílio-doença para portadores de doenças re-
lacionadas ao stress emocional. No total, se gasta mais de R$30 bilhões
ao ano com acidentes e doenças ligadas ao trabalho. No que se refere a
doenças mentais separadamente, os afastamentos dobraram de 1999 a
2002 no Brasil e aumentaram mais ainda este ano. Estima-se que o custo
direto, contados em dias perdidos, seja de 27,2 dias de trabalho ano por
cada empregado com depressão, que frequentemente e um dos sintomas
do stress excessivo. Se o custo indireto da deste transtorno for considera-
do, verifica-se que o empregado depressivo perde de tempo produtivo de
5,6 hrs por semana se comparado com aquele que não tem depressão, que
é ao redor de 1,5 hrs semanais.

Ansiedade, Depressão e a Relação com o Stress

Ansiedade
A prevalência de ansiedade no Brasil foi estimada em 19%, equi-
valente às taxas de ansiedade em países em guerra (BMC Medicine 2014
). Na pesquisa on-line realizada pelo IPCS esse percentual se eleva para
23,2%.
A ansiedade é um distúrbio que causa grandes prejuízos sociais e
econômicos. A estimativa é que os EUA gastam cerca de US$63.1 bilhões
de dólares com custos associados a distúrbios e transtornos de ansiedade
por ano. Ela afeta 15% dos americanos. Em pessoas predispostas a rea-
girem ao mundo com ansiedade, esta condição pode se tornar um estres-
sor interno, isto é um estimulo subjetivo capaz de gerar stress emocional.
Por outro lado, mesmo a pessoa que não tem uma grande predisposição
para experimentar ansiedade, pode vir a desenvolvê-la devido a um estado
avançado de stress. Neste caso, o tratamento psicológico do stress elimina

134 Temas Avançados em Qualidade de Vida


a ansiedade. Importante no tratamento é levar a pessoa a distinguir entre
ansiedade passageira, e normal a todos os indivíduos, e a ansiedade pato-
lógica.
Outro aspecto a considerar é que muito frequentemente a ansie-
dade e a depressão ocorrem juntas causando grande sofrimento para a
pessoa e prejuízo para as empresas. Juntas, elas afetam uma em cada 10
pessoas em algum momento em suas vidas. Quando bem tratadas as duas
condições tem controle e o trabalhador pode reaver sua qualidade de vida
e voltar a produzir do modo esperado. Algumas vezes, em ambas os casos,
o tratamento envolve uma parte medicamentosa e a outra psicoterápica,
embora, em muitos casos, quando ocasionadas pelo stress, o tratamento
psicológico seja suficiente.

Depressão
Recentemente, a revista BMC Medicine publicou uma pesquisa
realizada pela OMS, sob a responsabilidade do Dr. Ronald Kessler, da
Universidade de Harvard, com dados de 18 países sobre prevalência de
depressão. O maior índice, referente aos 12 últimos meses, foi verificado
no Brasil atingindo 10,4% dos 5.037 adultos entrevistados. Deve-se ana-
lisar esta alta prevalência em relação à taxa mundial que é de 7%, o que
coloca o Brasil acima da media de outros países.
Por causa das suas consequências, às vezes devastadoras, é muito im-
portante que atenção especial seja dada a este assunto. A depressão é con-
siderada como a condição que mais sofrimento gera. É capaz de destruir
a felicidade e a qualidade de vida de qualquer pessoa. Reduz a criatividade
e a produtividade do ser humano, tira a vontade de viver e interagir com
os outros. Pessoas com depressão vivem a vida pela metade, como se todas
as cores, todas as alegrias ao seu redor estivessem cobertas por um tecido
escuro. O depressivo sabe que as cores estão ali embaixo desta coberta de
névoa, porém ele não consegue usufruir de sua beleza. Como a habilidade
intelectual é inafetada, a pessoa sofre mais ainda por saber que a alegria
está ali disponível e que ele dela não consegue usufruir.

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 135


O número de pessoas com depressão está aumentando tanto que
o Século XXI está sendo designado como “o Século da Depressão”. Um
possível fator contribuinte talvez seja o stress ocupacional que também pa-
rece estar se maximizando nos dias atuais. Mas a depressão sempre existiu
e o primeiro que a descreveu foi o médico e filósofo grego Hipócrates, que
a chamou de melancolia e sugeriu que sua causa fosse a bile negra e venosa
. No século II, Plutarco lhe atribuiu uma conotação religiosa, dizendo que
“ ele se olha como um homem que os deuses odeiam e perseguem...”
Depressão e stress se confundem e tornam o diagnóstico diferencial
muito difícil em certos momentos. Na verdade a depressão, como sintoma
do stress, está relacionada às condições de adaptação do momento. Quan-
do a necessidade de adaptação ultrapassa os recursos internos da pessoa,
o quadro do stress evolui para a fase de quase exaustão e, posteriormente,
para a exaustão. Para tornar claro o processo de desenvolvimento do stress
é necessário considerar que o quadro sintomatológico do stress varia de-
pendendo da fase em que se encontre. Na fase do alerta – considerada a
fase positiva do stress- o ser humano se energiza através da produção da
adrenalina, a sobrevivência é preservada e uma sensação de plenitude é
frequentemente alcançada. Na segunda fase—a da resistência—a pessoa au-
tomaticamente tenta lidar com os seus estressores de modo a manter sua
homeostase interna. Se os fatores estressantes persistirem em frequência
ou intensidade, há uma quebra na resistência da pessoa e ela passa a fase
de quase exaustão. Nesta fase o processo do adoecimento se inicia e os
órgãos que possuírem uma maior vulnerabilidade genética ou adquirida
passam a mostrar sinais de deterioração. Em não havendo alivio para o
stress através ou da remoção dos estressores ou através do uso de estraté-
gias de enfrentamento, o stress atinge a sua fase final—o da exaustão- onde
doenças graves podem ocorrer nos órgãos mais vulneráveis, como enfarte,
úlceras, psoríase, dentre outros. A depressão passa a fazer parte do quadro
de sintomas do stress na fase de quase exaustão e se prolonga na fase de
exaustão.

136 Temas Avançados em Qualidade de Vida


A permanência em estado de sofrimento psíquico diminui a capa-
cidade de identificação de reforçadores no ambiente e a probabilidade
de que o indivíduo se comporte de modo a produzir outros, levando-o a
quadros depressivos e ansiosos.
O stress ocupacional pode criar impactos para o próprio trabalho
do indivíduo e para todas as outras áreas de sua vida, na medida em que
há uma inter-relação entre todas elas. É importante aprender a identificar
os fatores de sofrimento no trabalho: o cargo, os colegas e a própria pessoa
como fontes de stress ocupacional. É igualmente importante diferenciar
o stress ocupacional do stress familiar e pessoal a fim de que medidas
adequadas possam ser implementadas pelo próprio trabalhador e pela em-
presa no âmbito geral.
Considerando-se que o stress emocional é provavelmente o maior
obstáculo para que se possa usufruir de boa qualidade de vida, importante
se torna desenvolver programas de prevenção e controle de stress no am-
biente corporativo. Os especialistas concordam que programas de promo-
ção de saúde e redução do stress dentro do âmbito empresarial, quando
bem elaborados e implementados, resultam em mudanças significativas
no numero de fatores de riscos para a saúde e uma grande melhoria do
bem estar e da qualidade de vida dos trabalhadores.

CONCLUSÃO

A qualidade de vida, seja no âmbito pessoal, seja no empresarial,


significa sucesso em quatro áreas afins interligadas pelas exigências do dia
a dia, que são, a social, a afetiva, a profissional e ligada à saúde permeadas
pela espitualidade. Espiritualidade não se refere à religião, mas sim a uma
atitude ética, pró-comunidade. Fatores externos e internos se somam e
interagem para determinarem o nível de qualidade do viver. Dentre os fa-
tores que mais determinam se a qualidade será boa ou ruim se encontram
os relacionamentos interpessoais no ambiente de trabalho e na família.

Qualidade de Vida e Saúde Emocional 137


Os relacionamentos podem ser uma fonte poderosa de apoio ou , no lado
negativo, podem também gerar níveis muito altos de stress. Stress é outro
fator que impacta de modo extremamente significativo a qualidade do
viver. A relação entre stress e qualidade de vida está bem estabelecida,
bem como seu papel no desencadeamento de doenças físicas e mentais.
Episódios de depressão e ansiedade são, em geral, precedidos de situações
estressantes crônicas ou agudas. Doenças mentais podem ser desencadea-
das pelo stress e seu impacto na qualidade de vida e na produtividade dos
trabalhadores é inegável.
Saúde mental ocorre em condições de vida harmoniosas, indepen-
dente da situação financeira ou profissional do ser humano. Em um país
em desenvolvimento como o Brasil, no qual o povo no geral não se atenta
para a importância de medidas de prevenção e promoção de hábitos de
vida saudáveis, cabe as empresas se conscientizarem do seu papel transfor-
mador e promover no ambiente empresarial a oportunidade dos trabalha-
dores aprenderem práticas saudáveis a serem utilizadas no trabalho e na
família. Como a empresa congrega um numero de trabalhadores, a ação
empresarial tem o poder exponencial de melhorar a qualidade de vida e a
saúde física e mental do povo brasileiro.

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138 Temas Avançados em Qualidade de Vida


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140 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Conceito de Vida
no Trabalho de
Servidores Públicos:
fundamentos empíricos
para formulação de política e
programa de QVT
Mário César Ferreira
CONCEITO DE VIDA NO TR ABALHO
DE SERVIDORES PÚBLICOS:
FUNDAMENTOS EMPÍRICOS PAR A
FORMULAÇÃO DE POLÍTICA E
PROGR AMA DE QVT¹

D
efinir o que é Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) não é uma
tarefa simples. Nem fácil. Ela parece, inexoravelmente, convo-
car outra questão conexa: QVT sob a ótica de quem? Definir
este “quem” assume, por sua vez, uma centralidade, pois explicita de qual
protagonismo estamos nos referindo. Isto, portanto, desvela algo que ha-
bitualmente costuma ficar “submerso” em muitas abordagens da temá-
tica: QVT para que? QVT para quem? QVT a serviço de quem? Assim,
responder o que vem a ser a Qualidade de Vida no Trabalho é fornecer
argumentos para uma questão contemporânea, atual e relevante (GAULE-
JAC, 2005; GOODMAN, ZAMMUTO,& GIFFORD, 2001). Relevante
por diversas razões. Cabe evocar algumas delas.
No período pós Segunda Guerra Mundial do século XX, o mundo
viveu um “clima de reconstrução” com profundas mudanças sociais, eco-

1. Este texto é uma versão revista e atualizada do capítulo, intitulado "QVT é quando acordo... penso em vir tra-
balhar e o sorriso ainda continua no rosto!" Sentidos da qualidade de vida no trabalho na ótica dos servidores
públicos, publicado em Mário César Ferreira; Carla Antloga; Tatiane Paschoal; Rodrigo R. Ferreira. (Org.). Qua-
lidade de Vida no Trabalho. Perspectiva de Análise e Intervenção. 1ª ed. Brasília: Paralelo 15, 2013, p. 19-38.

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 143


nômicas, culturais e, principalmente, tecnológicas. Atualmente, estamos
vivendo uma época de aceleradas mudanças no planeta. Mudanças em
todas as esferas da vida em sociedade. Mudanças que, igualmente, im-
pactam no meio ambiente da terra, cujos efeitos negativos têm ameaçado
a própria sobrevivência humana. A crise que se instalou, especialmente,
na passagem das décadas de 1960-1970 no sistema produtivo da socieda-
de ocidental, desencadeou um processo de metamorfoses que invadiu os
“muros das fábricas”, das repartições públicas e, até mesmo, o mundo ru-
ral. Estas mudanças aceleradas são bem visíveis nos contextos de trabalho.
Nos últimos trinta anos, na passagem do milênio, o processo de
reestruturação produtiva vem mudando, paulatinamente, o perfil das
organizações, os modos de se trabalhar e, em conseqüência, desenhado
também um novo perfil dos trabalhadores (DAL ROSSO, 2008; DE
TONI, 2006, CASTEL, 2003). Neste cenário de mudanças, o uso das
Novas Tecnologias da Informação e da Comunicação (NTIC) tem desem-
penhado um papel de “carro-chefe” no campo das inovações corporativas
em parceria com as “inovações” no campo da gestão organizacional e,
sobretudo, no da gestão do trabalho (NISKANEN, LEHTELA, KETOLA,
& NYKYRI, 2010; CARR, 2011). As aspas no verbete “inovações” busca
chamar a atenção de que tais inovações foram mais, repito mais, de forma
que de conteúdo. Os pressupostos que fundamentam a concepção de “ser
humano, trabalho e organização” guardam forte sintonia, alinhamento e
aderência com os preceitos da chamada “administração científica” que,
desde o final do século XIX, presidem a gestão do trabalho nas organiza-
ções públicas e privadas no mundo ocidental. Dai deriva um paradoxo
bem típico de nossa época.
O paradoxo consiste no fato de que estamos vivendo, regra geral, no
cotidiano das organizações uma espécie de coabitação entre o “moderno
e o jurássico”. O “moderno” são as novas tecnologias da informação e da
comunicação – com destaque para o uso dos computadores, da internet e
do celular– que, cada vez mais, são ferramentas estruturantes do modo de
se trabalhar e, em especial, do modo de se operacionalizar a gestão do tra-

144 Temas Avançados em Qualidade de Vida


balho. O “jurássico” fica por conta de uma cultura organizacional já bem
conhecida de viés autoritário que se expressa por meio de valores, crenças,
mitos e ritos e que, por sua vez, separam, por exemplo, a concepção (pla-
nejamento) da execução (produção), que distribuem os trabalhadores em
“caixinhas” de organogramas verticais e que desenham tarefas repetitivas,
monótonas e entediantes.
É, principalmente, a radicalização deste paradoxo – coabitação do
“moderno e jurássico” – que vem produzindo um cenário de impactos
negativos para a esfera das organizações públicas e privadas. Trabalhar
em nossa época, mais que no passado, não é indolor. Se no passado os
impactos eram mais fortemente visíveis no corpo, por meio dos acidentes
e doenças ocupacionais, agora além destes clássicos efeitos sobre o cor-
po entra em cena, cada vez mais, os transtornos mentais. Os “males da
alma” assumem um protagonismo preocupante como território prevalen-
te de agravos à saúde mental dos trabalhadores. Embora, no caso brasi-
leiro, ainda padecemos de dados epidemiológicos amplos e confiáveis, a
literatura científica (SELIGMANN-SILVA, 2012; DABABNEH, SWAN-
SON,& SHELL, 2001; FROST, & ANDERSEN, 1999), principalmente,
em ciências do trabalho e da saúde vem apontando o aumento dos casos
de transtornos psicológicos (prevalência da depressão), de Distúrbios Os-
teomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort), da síndrome de esgota-
mento profissional (burnout) e de suicídios com nexo com o trabalho. Eis,
portanto, uma forte razão, combinando com as transformações que se
operam no mundo do trabalho, que torna a promoção da Qualidade de
Vida no Trabalho também um desafio contemporânea, atual e relevante.
A rigor, um desafio impostergável.
É este cenário de fundo, delineado de forma rápida e panorâmica,
que torna a QVT um ponto de pauta nas agendas de dirigentes e gestores.
Não basta só cuidar da Qualidade Total dos produtos e serviços é “tarefa
para ontem” cuidar também da qualidade de vida daqueles que geram a ri-
queza das nações. Um cuidado estratégico também para se alcançar outra
meta, igualmente estratégica no caso dos órgãos públicos: cidadania para

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 145


os usuários dos serviços públicos. A promoção da QVT nas organizações
públicas tem forte potencial para configurar, portanto, um cenário em que
todos ganham: dirigentes, gestores, servidores, cidadãos-usuários. Neste
contexto, explicitar o conceito de QVT, discutir seus atributos constituin-
tes e mostrar as implicações deste conceito para gestão organizacional e
do trabalho são questões instigantes que convocam a reflexão coletiva de
todos que se interessam, em face de distintas implicações, pela temática
(LIMONGI-FRANÇA, 2003; SUCESSO, 2002; ABDEEN, 2002). Esta
é uma questão muito relevante, pois, infelizmente, temos constatado a
existência de muitos programas e práticas de QVT sendo conduzidos nas
organizações sem nenhum lastro teórico, sem nenhuma fundamentação
conceitual que lhe sirva de suporte.
Resultados recentes de nossas pesquisas em Qualidade de Vida no
Trabalho (QVT), com o uso do aplicativo de análise de conteúdo IRaMu-
TeQ, mostram que a noção estruturante ou a palavra-chave de QVT de
servidores públicos é exatamente o “trabalho”. A representação gráfica
em função da frequência das palavras dos respondentes, formato de “nu-
vem de palavras”, com base nas respostas dadas à questão “Na opinião
Qualidade de Vida no Trabalho é...” fornece evidência empírica do papel
estruturante do trabalho no conceito de Qualidade de Vida no Trabalho
por parte dos servidores. Ele é o nosso ponto de partida para aprofundar
o sentido de QVT para os servidores públicos e, sobretudo, identificar
quais são os elementos constituintes do conceito de QVT na ótica destes.
O objetivo deste capítulo consiste, portanto, em debater o que é
Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) tendo como “âncora” de refle-
xão a ótica dos servidores públicos federais. Para alcançar esse objetivo,
vamos nos apoiar nos resultados de pesquisas empíricas conduzidas1 nos
últimos cinco anos pelo Grupo de Estudos em Ergonomia Aplicada ao
Setor Público (ErgoPublic) da UnB¹. Pesquisas que deram origem à diver-
1 Ao final do capítulo o(a) leitor(a) encontrará uma nota metodológica na qual se descreve, resumida-
mente, a abordagem metodológica que dá origem aos resultados empíricos apresentados e discutidos
neste capítulo.

146 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Figura 1 Nuvem de palavras resultante da questão “Na minha opinião Qualidade de
Vida no Trabalho é...”. Tratamento IRaMuTeQ.

sas dissertações de mestrado e algumas teses de doutorado no Programa


de Pós-Graduação do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho
(PST) do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB).

QVT na Ótica dos Servidores: Montando o


“Quebra-Cabeça”
Ao longo dos últimos cinco anos, ao provocar a reflexão de servi-
dores públicos federais com a questão aberta “Na minha opinião, Qualida-
de de Vida no Trabalho é...”, obtivemos um volume considerável de dados
(N=8.164), cujo tratamento possibilitou identificar, por meio do uso do
aplicativo Alceste, cinco núcleos temáticos estruturantes do conceito de
QVT na ótica dos servidores. O Gráfico 1 mostra tais núcleos e suas res-
pectivas contribuições para os eixos estruturantes do “olhar coletivo” de
QVT dos servidores.
Esses núcleos temáticos, por sua vez, dão origem a dois eixos de
respostas estruturantes do conceito de QVT. Tais eixos se complementam

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 147


Gráfico 1 Distribuição dos eixos estruturantes e núcleos temáticos na ótica de QVT dos
Servidores Públicos Federais (N=8164).

e fornecem uma visão panorâmica dos atributos essenciais de QVT sob a


ótica dos servidores participantes de nossos diagnósticos em Ergonomia
da Atividade Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho (EAA_QVT).
Construir essa visão panorâmica é como montar, por analogia, um “que-
bra-cabeça”. Um “quebra-cabeça” que pode contribuir para ampliar e re-
novar a concepção de QVT de dirigentes, gestores e técnicos no trato des-
ta questão no serviço público brasileiro. Vejamos, mais detalhadamente,
no consiste os eixos e respectivos núcleos temáticos.
Eixo 1 – Há Qualidade de Vida no Trabalho Quando o Funcio-
namento da Organização Combina Gestão Humanizada, Ambiente de
Trabalho Saudável e Desenvolvimento Pessoal e Profissional
Neste “Eixo 1”, os servidores quando falam de QVT enfatizam for-
temente o desejo de que as organizações devam se constituir em lugares
que possibilitem a realização pessoal e profissional com nítida associação
com as questões da “gestão humanizada do trabalho” e do “ambiente de
trabalho saudável”. Encontramos neste eixo três Núcleos Temáticos Estru-
turadores do Discurso (NTED) sobre o conceito de QVT com contribui-

148 Temas Avançados em Qualidade de Vida


ções quantitativas distintas na produção do “olhar coletivo” dos servido-
res. Eles são os seguintes:
• Núcleo 1 – Desenvolvimento Pessoal e Profissional (34%)
• Núcleo 2 – Ambiente de Trabalho Saudável (22%)
• Núcleo 3 –Gestão do Trabalho Humanizada (16%)

Esses núcleos representam três peças importantes na montagem de


nosso “quebra-cabeça” de QVT. Juntos eles somam 72% da produção do
discurso sobre o que é a QVT na ótica dos servidores públicos federais.
Peso representacional realmente considerável. Vejamos mais em detalhes
o conteúdo de cada um destes núcleos que constituem o “Eixo 1” do
conceito de QVT.

Núcleo 1 – Desenvolvimento Pessoal e


Profissional
Olhando de perto essa peça do nosso “quebra-cabeça” é possível
identificar os atributos constituintes de QVT que agregam sentido à deno-
minação do Núcleo 1 como sendo “Desenvolvimento Pessoal e Profissio-
nal”. O conteúdo das falas está, fundamentalmente, focado nos seguintes
aspectos:

• Foca a gestão do trabalho na avaliação da qualidade,


eficiência e eficácia das tarefas executadas sem a exacer-
bação de controle e fiscalização.
Há QVT quando o • Possibilita a progressão na carreira e ascensão profis-
estilo de gestão sional.
possibilita o
• Investe na atualização de conhecimentos, no aprendizado
“Desenvolvimento
de novas competências e na formação continuada.
Pessoal e
Profissional”. • Incentiva a participação, a autonomia, a criatividade e a
integração das pessoas.
• Busca o equilíbrio entre bem-estar e produtividade, preser-
vando a saúde.

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 149


A Figura 2 apresenta algumas falas dos servidores que são represen-
tativas do Núcleo 1 deste eixo estruturante do conceito de QVT na ótica
dos servidores.

Figura 2 Verbalizações Típicas que ilustram a Qualidade de Vida no Trabalho em


Núcleo 2 –deA“Desenvolvimento
Termos mbiente de T Pessoal Saudável
e Profissional”
rabalho

Nesta peça do “quebra-cabeça”, os atributos constituintes de QVT


expressam distintos e diversos aspectos sobre o que, na ótica dos servido-
res, vem a ser um “ambiente de trabalho saudável”. O exame do conteúdo
das falas, indicadas pelo aplicativo Alceste, revela que os aspectos caracte-
rísticos deste núcleo são os seguintes:

• Estimula interações cooperativas, solidárias, cordiais,


Há QVT quando as harmoniosas, confiáveis e respeitosas com chefias e
práticas de gestão colegas.
proporcionam um • Possibilita aos servidores a liberdade de expressão de
“Ambiente de idéias, opiniões.
Trabalho Saudável”. • Instaura um espírito de trabalho em equipe.
• Disponibiliza condições de trabalho ergonômicas.

150 Temas Avançados em Qualidade de Vida


A Figura 3 apresenta falas dos servidores que são representativas do
Núcleo 2 deste eixo estruturante do conceito de QVT na perspectiva dos
servidores.

Figura 3 Verbalizações Típicas que ilustram a Qualidade de Vida no Trabalho em


Termos de “Ambiente de Trabalho Saudável”

Núcleo 3 – Gestão do Trabalho Humanizada


Quanto ao Núcleo 3, os atributos constituintes de QVT estão cen-
trados na temática de gestão do trabalho. Nesse caso, a ênfase se volta para
a necessidade de sua humanização e os conteúdos das falas ressaltam os
aspectos que caracterizam e também são fundamentais para a dita huma-
nização.

• Adota prática administrativa baseada no planejamento


Há QVT quando participativo e focada na autonomia, no tratamento isônomico,
na organização no suporte organizacional e no produto do trabalho.
se pratica • Flexibiliza o uso do tempo na execução das tarefas (prazos, pausas).
uma “Gestão
do Trabalho • Possibilita a realização do trabalho com zelo, segurança,
Humanizada”. qualidade, apreço, presteza, sem sobrecarga.
• Disponibiliza meios adequados para a execução das tarefas.

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 151


A Figura 4 dá visibilidade para algumas falas dos servidores que são
representativas do Núcleo 3 deste eixo estruturante do conceito de QVT
na ótica dos servidores.

Figura 4 Verbalizações Típicas que ilustram a Qualidade de Vida no Trabalho em


Termos de “Gestão do Trabalho Humanizada”

Eis, portanto, no Eixo 1 (72%) os três núcleos temáticos e seus res-


pectivos pesos na produção do conceito de QVT com base no tripé “Ges-
tão Humanizada, Ambiente Saudável e Desenvolvimento Profissional”.
Vejamos a agora o Eixo 2, igualmente estruturante do conceito de QVT.
Eixo 2 – Há Qualidade de Vida no Trabalho Quando o Trabalho é
Fonte de Felicidade e Proporciona Sentido Existencial Positivo
Neste “Eixo 2”, os servidores quando falam de QVT enfatizam o
papel da atividade trabalho como fonte promotora de fecilidade e, ao
mesmo tempo, de vetor de sentido existencial. O tratamento feito pelo
aplicativo Alceste do corpus que constitui a fala dos servidores deu origem
a dois Núcleos Temáticos Estruturadores do Discurso (NTED)que estru-
turam este eixo do conceito de QVT. Ambos apresentam contribuições
quantitativas distintas na produção do “olhar coletivo” dos servidores.
Eles são os seguintes:

152 Temas Avançados em Qualidade de Vida


• Núcleo 1 – Sentimentos de Prazer com o Trabalho (16%)
• Núcleo 2 – Trabalho: Tempo Valioso de Vida (12%)

Esses núcleos representam, por sua vez, as outras duas peças funda-
mentais na tarefa de fechamento/conclusão de nosso “quebra-cabeça” de
QVT. Tais núcleos, juntos,representam 28% da produção do discurso, ou
seja, cerca de 1/3 do que vem a ser a QVT na ótica dos servidores públi-
cos federais. Peso representacional não negligenciável para dar conta do
objetivo deste capítulo que visa debater o que é Qualidade de Vida no Tra-
balho (QVT). Tal qual no Eixo 1, vejamos mais em detalhes o conteúdo
de cada um destes núcleos que integram o “Eixo 2” do conceito de QVT.

Núcleo 1 – Sentimentos de Prazer com o


Trabalho
Aqui os atributos estruturantes do conceito de QVT que revelam
aderência ao título deste núcleo, desvelam uma teia de sentimentos que
nascem do “fazer o que gosta” e, em conseqüência, são fontes promotoras
de prazer. A análise do conteúdo das falas dos servidores públicos são
reveladores dos seguintes aspectos:

• Sentir alegria, disposição, felicidade, satisfação e prazer


Há QVT quando as com o trabalho realizado e o contexto organizacional
atividades realizadas (feliz consigo mesmo)
são produtoras de
“Sentimentos de Prazer • Se sentir produtivo, compromissado, respeitado, recon-
com o Trabalho”. hecido, recompensado, útil e em hamonia social (feliz
com os outros).

A Figura 5 apresenta algumas falas dos servidores que são represen-


tativas do Núcleo 1 do Eixo 2 estruturante do conceito de QVT com base
no ponto de vista dos servidores.

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 153


Figura 5 Verbalizações Típicas que ilustram a Qualidade de Vida no Trabalho em
Termos de “Sentimentos de Prazer com o Trabalho”

Núcleo 2 – Trabalho: Tempo Valioso de Vida


Finalmente, o último núcleo estruturante do conceito de QVT
neste Eixo 2, aborda os distintos significados que o tempo de vida no
trabalho parece assumir do ponto de vista existencial. Ao “olhar de perto”
do que falam os servidores públicos federais neste núcleo, constatam-se
traços bem característicos do conceito de QVT. Eles são os seguintes:

• Vivenciar o tempo de trabalho como expressão de sentimen-


Há QVT quando tos de: produtividade, bem-estar aos outros, ânimo, bom-
as vivências no humor, felicidade, prazer, auto-estima e tempo fugaz.
contexto de trabalho
significam “Tempo • Vivenciar o tempo de trabalho como expressão de sentimen-
Valioso de Vida”. tos: de dever cumprido, de voltar feliz para casa, de desejar
voltar ao trabalho e de voltar com saúde para casa.

A Figura 6 apresenta algumas falas dos servidores que são represen-


tativas do Núcleo 2 deste eixo estruturante do conceito de QVT na ótica
dos servidores.

154 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Figura 6 Verbalizações Típicas que ilustram a Qualidade de Vida no Trabalho em
Termos de “Tempo Valioso de Vida”

Eis, portanto, os cinco núcleos temáticos e respectivos eixos que


permitem ter uma visão de totalidade de como os servidores públicos fe-
derais respondem à questão “Na minha opinião, Qualidade de Vida no
Trabalho é...”. Essa totalidade produz um fechamento (gestalt) da metáfora
“quebra-cabeças”, conforme ilustrado pela Figura 7.

Sentimentos de Prazer Trabalho: Tempo


com o Trabalho Valioso de Vida
(Eixo 2, núcleo 1, 16%) (Eixo 2, núcleo 2, 12%)

Desenvolvimento
Pessoal e Profissional
(Eixo 1, núcleo 1, 34%)

Ambiente de Gestão do Trabalho


Trabalho Saudável Humanizada
(Eixo 1, núcleo 2, 22%) (Eixo 1, núcleo 3, 16%)

Figura 7 Temáticas Estruturantes do Conceito de QVT sob a Ótica de Servidores


Públicos Federais

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 155


O conteúdo da Figura 7 responde, empiricamente, o que é a Qua-
lidade de Vida no Trabalho com base na perspectiva dos servidores pú-
blicos Federais brasileiros. É ora, portanto, de refletir sobre esses resulta-
dos, buscando identificar aspectos téoricos no campo da Ergonomia da
Atividade Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho e, sobretudo, suas
implicações de natureza aplicada para a promoção da QVT no contexto
das organizações públicas federais.

QVT na Ótica dos Servidores:


Reflexões Teóricas
Os resultados produzidos com o uso do aplicativo Alceste forne-
cem fundamentos empíricos, a nosso ver consistentes, para subsidiar um
elenco de reflexões teóricas a propósito da QVT nos limites do recorte de
campo estabelecido (serviço público federal). Nesse sentido, cabe destacar:
• Os eixos estruturantes de QVT desvelam um olhar focado em
duas dimensões interdependentes. O Eixo 1 explicitam repre-
sentações do tipo “expectativas sobre o mundo do trabalho”.
Aqui os ingredientescaracterísitcos dos núcleos temáticos re-
velam como os servidores gostariam que o seus contextos de
trabalho fossem para materializar a QVT. Nesse caso, os verbos
fortemente presentes (ter, haver, poder), reforçam esse traço de
expectativas. O Eixo 2, por sua vez, desvela representações do
tipo “efeitos do mundo do trabalho” sobre os servidores. Nes-
sa dimensão, os elementos constituintes dos núcleos temáticos
mostram como as vivências positivas dos servidores com o con-
texto de trabalho que se traduzem por felicidade e sentido exis-
tencial positiva em relação ao tempo passado no trabalho. Aqui
os verbos fortemente presentes (estar, ser) agregam significado
nesse traço característico.
• A distribuição diferenciada dos percentuais na produção do
discurso dos servidores (Eixo 1 = 72%; Eixo 2 = 28%) mostra

156 Temas Avançados em Qualidade de Vida


que, embora os eixos sejam interdependentes, cerca de 2/3 do
“olhar coletivo” enfatiza que a promoção da QVT está, inequi-
vocamente, associada ao funcionamento da organização em ter-
mos de “Gestão Humanizada, Ambiente Saudável e Desenvol-
vimento Profissional”. Achados diversos de estudos nas ciências
do trabalho e da saúde mostram como o funcionamento crítico
das organizações nestas dimensões impactam negativamente
nas vivências de mal-estar no trabalho e repercutem no estado
geral de saúde dos trabalhadores. Neste sentido, os resultados
consolidam a importância da conciliação do bem-estar no tra-
balho e com a efetividade organizacional.
• O Eixo 2 “Trabalho Produtor de Felicidade e Promotor de Sen-
tido Existencial Positivo”, estruturante de QVT, é revelador dos
atributos de natureza mais ontológica da atividade trabalho. Es-
ses resultados nos faz pensar sobre as razões mais profundas que
dão sentido ao fazer humano nos contextos organizacionais. A
afirmação do prazer, da satisfação, da alegria... (enfim, da felici-
dade com e por meio das atividades de trabalho e dos múltiplos
significados do tempo passado no e com o trabalho) nos convoca
a refletir o quanto o trabalho contemporâneo, submerso nes-
te processo acelerado de reestruturação produtiva, se afastou e
vem se afastando destes atributos ontológicos. O crescimento
do número de suicídios nas últimas décadas faz um contrapon-
to trágico com tais atributos.
• Por fim, cabe assinalar que as temáticas que estruturam o con-
ceito de QVT na ótica dos servidores em certa medida mostram
uma espécie de “ponta do iceberg” dos fatores que, de fato,
o compõem. O processo dinâmico que pode estar no origem
da produção de tais temáticas e, em especial, as estratégias de
mediação dos servidores (modos de lidar com as contradições
vivenciadas) permanecem por serem conhecidas. Portanto, des-
vendar, por meio da Análise Ergonômica do Trabalho (AET), o

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 157


custo humano do trabalho e as estratégias operatórias dos servi-
dores constituem um outro nível analítico de investigação que
é fundamental para se construir cenários explicativos sobre a
ocorrência de vivências de bem-estar e de mal-estar no trabalho
que, por sua vez, impactam no processo saúde-doença.

Os achados empíricos – núcleos temáticos e as relações intra-nú-


cleos e inter-eixos constatados – fornecem algumas importantes pistas
para novos estudos e pesquisas. Neste sentido, cinco questões podem ser
úteis: (a) há uma hierarquia estrutural entre os núcleos temáticos e, em
conseqüência, entre os próprios eixos estruturantes de QVT?; (b) um de-
lineamento metodológico de investigação com o universo de servidores
públicos federais brasileiros ratificaria os resultados aqui encontrados?;
(c) tais temáticas estruturantes do conceito de QVT dos serviços públicos
federais se confirmaria entre servidores da esfera estadual/distrital e mu-
nicipal no contexto brasileiro?; (d) tais resultados encontrados entre servi-
dores públicos federais são divergentes com a realidade de trabalhadores
do setor privado brasileiro?; e (e) em que medida os núcleos constatados e
seus respectivos conteúdos são, efetivamente, fatores de prevenção de agra-
vos à saúde dos servidores? Estas são algumas das possíveis questões que
podem contribuir para se avançar no conhecimento da QVT no contexto
das organizações públicas federais e privadas.
Por fim, cabe agora refletir sob o ponto de vista da aplicação destes
resultados empíricos no contextos organizacionais do serviço público fede-
ral brasileiro, explicitando seus possíveis desdobramentos e implicações.

QVT na Ótica dos Servidores:


Perspectivas de Aplicação
É pertinente, à luz da base empírica e das análises empreendidas,
refletir sobre possíveis implicações e/ou aplicações desta ótica dos servi-
dores públicos federais no contexto organizacional das repartições públi-

158 Temas Avançados em Qualidade de Vida


cas. Quais são as efetivas contribuições que esta perspectiva analítica pode
contribuir para a promoção da QVT no setor público federal brasileiro?
As contribuições podem ser muitas, mas em face do espaço reduzido de
redação deste capítulo, cabe assinalar cinco proposições principais:
• QVT não é Ofurô Corporativo: Olhando de perto os resulta-
dos obtidos com a questão “Na minha opinião, Qualidade de
Vida no Trabalho...” cabe, de entrada, destacar que os traba-
lhadores não evocam nos conteúdos de suas respostas projetos
e ações do tipo anti-estresse que tem caracterizado, de modo
hegemônico (Ferreira, 2006; Ferreira, Pereira, Magalhães e
Wargas, 2012), os programas de QVT nas organizações públicas
federais. Ao responderem à questão posta, os servidores não
mencionam ações que tem caracterizado o “cardápio” assisten-
cialista de QVT que oferece aos trabalhadores ações do tipo,
por exemplo, terapias corpo-mente (ex. geocromoterapia), abor-
dagens holísticas-orientais (ex. yoga, Tai Chi Chuam); ativida-
des culturais e lazer (ex. dança de salão), suporte psicológico (ex.
oficina de relaxamento) e suporte físico-corporal (ex. mergulho
técnico e recreativo). No lugar deste tipo de cardápio de QVT,
uma espécie de ofurô corporativo, os servidores evocam fatores
e dimensões que, efetivamente, parecem estar na origem das
vivências de bem-estar ou de mal-estar no trabalho. Daí deriva
um pressuposto central da abordagem Ergonomia da Atividade
Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho (EAA_QVT): per-
guntar aos trabalhadores o que vem a ser a QVT deve se cons-
tituir ponto de partida para se operacionalizar uma abordagem
de QVT com vocação sustentável.
• Subsídios para Política e Programa de QVT: Os núcleos temá-
ticos e os eixos identificados fornecem bases empíricas sólidas
e confiáveis que podem auxiliar na concepção de “Política e
Programa de QVT” para as organizações. A política de QVT
deve ter a vocação de “política de Estado” (ex. estar inscrita no

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 159


planejamento estratégico) e explicitar os seus (a) fundamentos
normativos (ex. alinhamento com decisões institucionais no
campo da saúde e segurança no trabalho), (b) o conceito de
QVT dos servidores (ex. atributos empíricos constituintes do
conceito) e (c) os princípios norteadores da promoção de QVT
(ex. equidade no tratamento de oportunidades de ocupação de
funções comissionadas). O programa de QVT, por sua vez, tem
vocação para ser “política de governança” e deve explicitar os
projetos e as ações a serem implementados a curto, médio e lon-
go prazos para a promoção da QVT no âmbito organizacional.
• Temáticas Norteadoras das Mudanças Organizacionais: Esse
“olhar coletivo” de QVT fornece preciosos elementos de res-
postas para questões corriqueiras de dirigentes, gestores e téc-
nicos que atuam no campo da QVT nas organizações e que,
frequentemente, se perguntam: Como lidar com a evasão de
participantes em projetos de QVT do tipo ofurô corporativo?
Como garantir o comprometimento dos servidores com os pro-
gramas de QVT implementados pela organização? Quais são os
fatores que integram a QVT que, de fato, podem ser do interes-
se dos servidores? As cinco temáticas (ex. ambiente de trabalho
saudável) podem servir de “bússola” para o desenho e a imple-
mentação de mudanças organizacionais que podem alavancar
a QVT nos contextos de trabalho. Elas podem, ainda, fornecer
elementos para uma agenda de trabalho que repense fatores da
cultura organizacional que podem estar na origem das vivências
de mal-estar no trabalho e, em conseqüência, dos riscos de ado-
ecimento no âmbito organizacional.
• Indicadores de Monitoramento da Evolução de QVT: Polí-
tica e Programa de QVT que não venham acompanhados da
identificação, definição e modos de monitoramento de indica-
dores de QVT tem vocação para “vida curta”. O prazo de vali-
dade que tenha a pretensão de se inscrever numa perspectiva

160 Temas Avançados em Qualidade de Vida


sustentável de QVT deve combinar, num só tempo, o papel
de protagonismo do coletivo de servidores e a identificação de
indicadores empíricos – tanto qualitativos quanto quantitativos
– que permitam monitorar a evolução de QVT na organização
(ex. N de licenças-saúde, taxas de absenteísmo). Os atributos
que constituem os núcleos temáticos estruturadores do concei-
to de QVT dos servidores fornecem, portanto, valiosas pistas e
dimensões para se avançar na identificação e definição de indi-
cadores que podem contribuir estrategicamente no monitora-
mento de QVT nos contextos organizacionais.
• Fortalecimento da Prevenção e da Promoção de QVT: Os re-
sultados fornecem também importantes contribuições empíri-
cas para se repensar a tríade “vigilância, assistência e promoção”
no campo da saúde e segurança no trabalho. Os subsídios empí-
ricos sobre QVT que se originam do “olhar dos trabalhadores”
reforçam o pressuposto da centralidade das ações de prevenção
e de promoção no campo da saúde e segurança como caminhos
mais eficientes e eficazes para melhor situar e reconfigurar as
ações de vigilância e de assistência no âmbito organizacional.
Operacionalizar, por exemplo, o que preconiza os servidores
na temática “Ambiente de Trabalho Saudável”, estabelecendo
programa de ações e indicadores de monitoramento, pode pro-
duzir uma forte contribuição para prevenir problemas de saúde
e, em conseqüência, reduzir custos com assistência de saúde.

Tais proposições buscam destacar a aplicabilidade dos resultados


concenentes ao conceito de QVT na ótica dos trabalhadores. Aplicabili-
dade potencial que pode integrar uma agenda de trabalho voltada para a
promoção de QVT. Dito isto, é hora de explicitar algumas idéias a título
de “ponto de chegada”.

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 161


QVT: “Quando o sorriso ainda continua no rosto!”
É hora também de se retomar o objetivo deste capítulo que
consistiu em debater o que é Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) ten-
do como “âncora” de reflexão a ótica dos servidores públicos federais.
Para alcançar tal objetivo, o nosso trajeto argumentativo buscou, portan-
to, desvelar os atributos que aparecem fortemente nas falas dos servidores
sobre o que é QVT presente na base de dados de diversas pesquisas con-
duzidas pelo Grupo de Estudos e Pesquisas Aplicadas ao Setor Público
(ErgoPublic) na Universidade de Brasília (UnB). Revisitando tais atribu-
tos explicitados pelos servidores, eles autorizam a responder à questão “O
que é Qualidade de Vida no Trabalho?”, esboçando um conceito de QVT
da seguinte forma:
“Qualidade de Vida no Trabalho expressa as vivências dos trabalha-
doresque são marcadas por sentimentos de felicidade com o trabalho, de
prazer com o tempo passado no trabalho e de experiências positivas rela-
cionadas com a gestão humanizada do trabalho, o ambiente de trabalho
saudável e odesenvolvimento pessoal e profissional.”
Tal conceito com fundamentação empírica pode contribuir para
preencher uma lacuna teórica, infelizmente fortemente presente, tanto
na literatura científica quanto no desenho de programas de QVT nas or-
ganizações. Autores brasileiros e estrangeiros que, de fato, definem o que
é QVT ou mesmo adotam um conceito são raros na literatura. Embasa-
mento teórico aumenta consideravelmente as chances de sucesso tanto
no estudo de QVT quanto de sua promoção nas organizações. A máxima
popular “para uma boa prática nada melhor que uma boa teoria” perma-
nece atual e pertinente.
Cabe assinalar, que o enfoque aqui adotado para fornecer elemen-
tos de respostas sobre o que é QVT se inscreve no campo da “Ergonomia
da Atividade Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho (EAA_QVT).
Uma abordagem em construção pelo Grupo de Estudos em Ergonomia
Aplicada ao Setor Público (ErgoPublic) no Instituto de Psicologia da Uni-

162 Temas Avançados em Qualidade de Vida


versidade de Brasília. Uma perspectiva que se apoia na centralidade do
olhar dos trabalhadores para investigar e intervir em QVT e que, episte-
mologicamente, tem sua base conceitual no campo da Ergonomia Cogni-
tiva (LEPLAT, & HOC, 1992; WEILL-FASSINA, RABARDEL, & DU-
BOIS, 1993).
Cabe destacar que no conjunto, o olhar dos trabalhadores sobre
QVT permite também depreender os conceitos subjacentes de três catego-
rias analíticas que teoricamente são fundantes de uma perspectiva crítica
de referência para se pensar o mundo do trabalho contemporâneo. As
três categorias analíticas são o “ser humano”, o “trabalho” e a “organiza-
ção”. A questão que se coloca, portanto, consiste em indagar como apa-
rece tais categorias no universo representacional de QVT, expresso pelos
servidores. Assim, os atributos de QVT presentes nas temáticas apontam
no sentido de:
• Uma afirmação do ser humano como protagonista de sua histó-
ria individual e social no contexto organizacional, se afastando
da concepção ideológica dominante expressa na compreensão
de ser humano reificada. Nessa acepção, os trabalhadores ten-
dem a ser tratados como “coisas” (ex. equivalentes a `recursos´
conforme designa a clássica denominação de `recursos huma-
nos’). Nela os papéis estão pré-definidos e formatados no inte-
rior das organizações, onde cada trabalhador é tido como peça
de uma engrenagem que deve contribuir para o alcance da mis-
são, dos objetivos e das metas.
• Uma afirmação do papel ontológico da atividade de trabalho
como vetor de desenvolvimento pessoal, profissional e social,
se afastando do pragmatismo instrumentalista que preside o
modo de tratar e denominar a práxis humana do trabalho. Nes-
sa perspectiva, o pensar, o fazer e o sentir dos trabalhadores
nos ambientes de trabalhos encontram limites determinados e
determinantes no cotidiano das organizações que devem estar,

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 163


nesta ótica, alinhados primordialmente às premissas de produ-
tividade, rentabilidade, ganhos, superavits.
• Uma afirmação de uma concepção de organização como lugar
e tempo de felicidade, de alegria, de satisfação e de prazer, se
afastando de um juízo utilitarista de organização. Nessa ótica
utilitarista, as organizações são unidades de produção, focadas
exclusivamente no alcance de suas missões que, no modo de
produção capitalista, estão voltadas para o lucratividade. As or-
ganizações, nesse caso, caracterizam o seu funcionamento e sua
história na produção cultural simbólica de valores, crenças, mi-
tos e ritos que buscam, fundamentalmente, a manutenção do
status quo, a exacerbação da competitividade, a consagração do
individualismo, o enaltecimento do culto de personalidade e a
alienação sociohistórica.

Enfim, a QVT sob a ótica dos servidores, trabalhada ao longo deste


capítulo, fornece elementos empíricos para se pensar uma outra ética do
trabalho que no contexto organizacional deve ter um caráter antropocên-
trico. Uma ética tão importante e necessária nesta época de agravamento
dos indicadores críticos em face dos efeitos do processo de reestruturação
produtiva. Uma ética que aumenta de importância no caso do setor públi-
co brasileiro, sobretudo, em face de seu papel republicano.
Para concluir, é pertinente retomar a fala de um respondente do
nosso Inventário de Avaliação de Qualidade de Vida no Trabalho (IA_
QVT) que integra o título deste capítulo: “QVT é quando acordo... penso
em vir trabalhar e o sorriso ainda continua no rosto!”. Ela é bastante em-
blemática da importânciada promoção de QVT nos ambientes de traba-
lho, pois simboliza a alegria e a felicidade que deve servir de fermento para
a vida nas organizações.

164 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Referências

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Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 165


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louse, France: Éditions Octarès, 1993.

166 Temas Avançados em Qualidade de Vida


¹ Nota Metodológica
Os dados empíricos apresentados neste capítulo são frutos da aplicação da abordagem intitulada Er-
gonomia da Atividade Aplicada à Qualidade de Vida no Trabalho (EAA_QVT), publicada por Ferreira
(2012). Trata-se uma abordagem de natureza quanti-quali e multimétodo em construção que tem ser-
vido de suporte para a condução de diversas pesquisas no setor público federal brasileiro cujos artigos
seminais são Ferreira (2008) e Ferreira (2011). Para uma visão detalhada da abordagem metodológica
recomendamos a leitura do capítulo 7 da obra “Qualidade de Vida no Trabalho. Uma abordagem cen-
trada no olhar dos trabalhadores”, (2012, Editora Paralelo 15). Os dados foram coletados em nove
organizações públicas brasileiras dos poderes executivo e judiciário no período de 2008-2012. Eles
fazem parte de um banco de dados mais amplo que resultaram de pesquisas da abordagem (EAA_QVT)
que combina dois níveis analíticos complementares: macrodiagnóstico (delineamento quantitativo de
pesquisa com uso do Inventário de Avaliação de Qualidade de Vida no Trabalho – IA_QVT, validado por
Ferreira, 2009) e microdiagnóstico (delineamento qualitativo de pesquisa com o uso da Análise Ergo-
nômica do Trabalho, AET). A base empírica deste capítulo resulta, portanto, da etapa de macrodiag-
nóstico. O perfil dos participantes dos macrodiagnósticos efetuados tem as seguintes características:
discreto predomínio do sexo masculino (53%); média de idade de 37,8 (DP=5,44); escolaridade com
predomínio de nível superior; tempo médio de trabalho no órgão de 6,5 anos (DP=6,35). Globalmente,
esse perfil indica que se trata de trabalhadores experientes e conhecedores dos contextos de trabalhos
no qual estão inseridos. O IA_QVT é um instrumento do tipo quanti-quali que permite, globalmente,
conhecer as representações dos trabalhadores relativas ao contexto de trabalho no qual eles estão
inseridos e, ainda, como eles concebem a QVT e a fontes de bem-estar e de mal-estar no trabalho. O
IA_QVT é constituído por duas dimensões instrumentais que se complementam. A fonte de referência
deste capítulo foi a dimensão qualitativa. Ela é constituída por quatro questões abertas: (a) Na minha
opinião qualidade de vida no trabalho é... ; (b) Quando penso no meu trabalho [nome do órgão], o que
me causa mais bem-estar é... ; (c) Quando penso no meu trabalho [nome do órgão], o que me causa
mais mal-estar é... ; e (d) Comentário e sugestões. Tendo em vista o objeto (QVT) e o objetivo deste
capítulo (conhecer o ponto de vista dos trabalhadores), apenas os dados empíricos, provenientes da
questão aberta “Na minha opinião qualidade de vida no trabalho é...” na etapa de macrodiagnóstico,
constitue o foco de análise. Os dados obtidos foram tratados com o uso do aplicativo ALCESTE (Analyse
Lexicale par Contexte d’un Ensemble de Segments de Texte). Esse aplicativo de análise estatística de
dados textuais foi concebido por Max Reinert (1990), com o apoio do Conseil National de Recherche
Scientifique (CNRS). O aplicativo permite identificar as palavras mais freqüentes de um texto (ex.
entrevistas, questões abertas, obra literária), indicando as estruturas lexicais mais significantes por
meio da geração de classes temáticas. O pressuposto subjacente é que tais estruturas lexicais estão
intimamente associadas por meio da distribuição das palavras em um texto. Portanto, tal distribuição
não se dá ao acaso.

Conceito de Vida no Trabalho de Servidores Públicos 167


Qualidade de Vida
na Adolescência
Markus Nahas
QUALIDADE DE VIDA NA
ADOLESCÊNCIA

“Adolescentes não são crianças grandes, nem futuros adultos.


São sujeitos, com direitos específicos,
vivendo uma fase extraordinária de sua vida.”
Marie-Pierre Poirier
Representante do UNICEF no Brasil - 2011

S
empre foi uma aspiração humana viver por muitos anos, com a me-
lhor condição de saúde e autonomia possíveis até os últimos dias.
Diversos fatores têm possibilitado avançar nessa direção, destacan-
do-se: algumas mudanças positivas no ambiente, principalmente a quali-
dade da água e o tratamento de esgotos; os avanços das ciências médicas
e o atendimento primário em saúde; e, mais recentemente, as mudanças
positivas no estilo de vida.
Mais do que nunca, nossas escolhas e decisões cotidianas – nosso
estilo de vida - têm afetado a maneira como vivemos e por quanto tempo
vivemos. Isso vale para todas as etapas e transições que compõem a vida
humana, incluindo a infância, a adolescência, a vida adulta jovem, a meia-
-idade, a velhice ativa e a velhice dependente.

Qualidade de Vida na Adolescência 171


Sabe-se que não existe uma receita mágica que possa garantir boa
saúde e longevidade a todos. Entretanto, existem evidências da ciência e
de observações milenares do dia-a-dia das pessoas, que, além da carga he-
reditária e do ambiente em que se vive, certos comportamentos e decisões
aumentam as chances de se atingir uma idade avançada, conservando a
autonomia e o bem-estar possíveis.
O objetivo deste capítulo é apresentar minhas ideias para ação numa
área carente de proposições efetivas: a qualidade de vida na adolescência.

Adolescência no Brasil
Para efeito didático, a Organização Mundial da Saúde (OMS) consi-
dera a adolescência como a fase do desenvolvimento humano compreen-
dida entre 10 e 19 anos de idade, com um primeiro período (10 a 14 anos)
referido como pré-adolescência.
No Brasil, dados do IBGE (2010) indicam que os adolescentes
(10 a 19 anos) representavam aproximadamente 18% da população e
que, com o rápido envelhecimento populacional, não teremos uma
proporção como essa no futuro. Dez anos antes (2000), representavam
20,8% da população brasileira. Ou seja, a proporção de adultos e ido-
sos tende a crescer, enquanto as crianças e os adolescentes represen-
tarão uma fatia menor na distribuição etária da população brasileira.
Por volta de 2030, os idosos (pessoas com 60 anos ou mais) superarão
o grupo com idade até 14 anos.
Mesmo com essa tendência, não se pode negligenciar a atenção aos
mais jovens, com especial cuidado àqueles na adolescência, uma vez que
são alarmantes os dados indicativos de qualidade de vida ruim neste gru-
po da população brasileira. Excesso de peso, depressão, violência, escolas
ruins, reduzidas opções de lazer, condições de trabalho precárias e falta
de perspectiva profissional interessante, gravidez precoce e indesejada, e
o uso cada vez mais precoce do fumo, álcool e outras drogas são alguns
desses indicadores preocupantes em anos recentes. Tais fatores de risco

172 Temas Avançados em Qualidade de Vida


comprometerão, certamente, a vida adulta e o próprio envelhecimento
com boa qualidade de vida.
A OMS sugere que, na adolescência, aspectos como a condição de
saúde, acesso à educação, acesso e condições de trabalho, e a qualidade de
vida em geral, devem ser constantemente avaliados neste grupo populacio-
nal. O trabalho na adolescência, em particular, é um tema complexo e ge-
ralmente associado à pobreza e desigualdade social, podendo, em muitos
casos, excluir o direito à educação, o convívio com os pares no contexto
do lazer e afetar o pleno desenvolvimento e a qualidade de vida – atual e
futura desses jovens (Barker, 2007).
Em 2011, a UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância)
divulgou um importante documento intitulado O Direito de ser Adolescen-
te, que traça um perfil preocupante da situação da adolescência brasileira,
com o propósito de reduzir as vulnerabilidades e superar as desigualda-
des observadas. Os dados representam 21 milhões de brasileiros na faixa
etária de 12 a 17 anos (11% da população na época da pesquisa – 2009).
Entre as principais sugestões apresentadas pela equipe da UNICEF, está
o fortalecimento das políticas públicas com foco na adolescência, parti-
cularmente para os mais desfavorecidos: adolescentes negros, Indígenas,
jovens com deficiência, jovens que vivem nas comunidades populares das
grandes cidades, no Semiárido e na Amazônia. Mais ainda, sugere o docu-
mento, que especial atenção deve ser dada às vítimas da exploração sexual,
meninas mães, adolescentes chefes de famílias, meninos e meninas que
vivem nas ruas. Ações imediatas deveriam ocorrer em relação a dois indi-
cadores muito preocupantes: (a) a taxa de homicídios, que era de 43,2 por
100 mil na faixa etária de 15 a 19 anos em 2009, enquanto na população
em geral esse valor era de 20 por 100 mil); e (b) 15% dos jovens entre 15
e 17 anos estavam fora da escola em 2009.
Dados mais recentes (UNODC, 2013), mostram um aumento na
taxa de homicídios entre os jovens de 15 a 19 anos (53,8 por 100 mil),
assim como na população em geral (29 homicídios por grupo de 100 mil
habitantes). Para nosso espanto, ocorreram em 2012 no país mais de 56

Qualidade de Vida na Adolescência 173


mil homicídios (154 por dia!). Uma verdadeira guerra não declarada, com
um particular massacre de jovens na faixa de 15 a 29 anos – 53,4% do
total -, negros e pobres, em sua maioria. Há um crescimento astronômico
desse índice dos 13 anos (4 homicídios por 100 mil) até o pico de 75/100
mil aos 21 anos.
Nem as políticas públicas, nem os programas governamentais pare-
cem ser efetivos para reduzir esses indicadores vergonhosos. As iniciativas
criativas e efetivas são pontuais ou, muitas vezes, desconhecidas, uma vez
que faltam dados mais atuais e generalizados sobre as condições de vida e
os comportamentos desta parcela da população.

Modelos para Avaliação e Intervençao em


Qualidade de Vida
Diversos conceitos, modelos teóricos e instrumentos têm sido utili-
zados para caracterizar as dimensões e os indicadores de qualidade de vida
nos diversos grupos populacionais, seja com foco nos indivíduos ou nas
comunidades em geral (bairros, cidades, estados ou países). O conceito
certamente difere de pessoa para pessoa e tende a mudar ao longo da
vida; o que é consenso é a evidência de que são múltiplos os fatores de-
terminantes da qualidade de vida de pessoas e comunidades. Tais fatores
(ou indicadores) são, em geral, agrupados em dimensões mais abrangentes
como os ligados ao ambiente, às condições de vida ou aos comportamen-
tos das pessoas.
Na ausência de definições aceitas para todos os contextos, é neces-
sário que estudiosos da qualidade de vida estabeleçam com clareza a popu-
lação alvo de suas investigações, qual o conceito adotado e a base teórica
que o fundamenta. O modelo adotado deve apresentar os componentes
ou domínios incluídos no instrumento de medida da qualidade de vida
adotado. Indicadores epidemiológicos e estatísticas socioeconômicas das
populações são bastante objetivas e disponíveis em bancos de dados de
relativa facilidade de acesso, mas não se pode desconsiderar a percepção

174 Temas Avançados em Qualidade de Vida


subjetiva das pessoas relativas ao seu bem-estar, satisfação com a vida,
condição de saúde, doença ou incapacidade.
A abordagem pode focar especificamente doenças ou incapacida-
des (referida como Qualidade de Vida Relacionada à Saúde). Há muitos ins-
trumentos de medida nessa perspectiva, mas o conceito e o questionário
desenvolvido a partir de 1991 pelo Grupo de Qualidade de Vida da OMS
(WHOQOL) é, sem dúvida, o mais conhecido. Outra abordagem é centra-
da no trabalhador (QVT), observando diversas dimensões das condições
e ambiente de trabalho das pessoas. Nesse sentido, um desenvolvimento
recente foi o IQV–SESI/SC (Índice de Qualidade de Vida do Trabalha-
dor da Indústria em Santa Catarina), a partir do Modelo Proposto por
Nahas (2013).
Esse modelo simplificado proposto para avaliação e intervenção em
qualidade de vida é estruturado em duas dimensões (fatores socioambien-
tais e estilo de vida individual) e pode ser adaptado a qualquer grupo etá-
rio. Numa visão holística, qualidade de vida é definida como a percepção de
bem-estar resultante de um conjunto de parâmetros individuais e socioambientais,
modificáveis ou não, que caracterizam as condições em que vive o ser humano
(p.15). Tal abordagem pressupõe que a qualidade de vida é, em última
análise, uma percepção de bem-estar das pessoas, construída a partir de indi-
cadores ou características objetivas, da vida real, como sugere o modelo a
seguir (Nahas, 2013, p.16).
Na Figura 1, pretende-se destacar os fatores modificáveis determinan-
tes da qualidade de vida, principalmente os componentes do estilo de vida
que afetam nossa saúde e bem-estar, com foco na adolescência – uma faixa
etária geralmente negligenciada quando se trata deste tema.
Por estilo de vida entende-se o conjunto de ações habituais que refletem as
atitudes, os valores e as oportunidades na vida das pessoas (Nahas, 2013, p,22).
Nosso jeito de viver, portanto, é construído a partir de vontades e necessi-
dades pessoais, de acordo com as condições de vida presentes na sociedade
onde vivemos. As oportunidades decorrem de iniciativas do poder público
ou de instituições privadas e representam os itens disponíveis em nosso

Qualidade de Vida na Adolescência 175


Figura 1 Enunciado?

cardápio de vida, permitindo que escolhas inteligentes sejam feitas. Na


adolescência brasileira, observa-se um cardápio limitado, com poucas op-
ções interessantes e saudáveis para o desenvolvimento nesta fase da vida.

Estilo de Vida Saudável na Adolescência


A saúde é, certamente, um dos nossos atributos mais preciosos, mas
a maioria das pessoas só pensa em manter ou melhorar a condição de
saúde quando esta se acha ameaçada (com doenças ou sintomas bem esta-
belecidos). Na primeira metade da vida, em particular na adolescência, as
prioridades tendem a negligenciar as questões mais fundamentais associa-
das à saúde (atual e futura).
Nas sociedades industrializadas ou emergentes, as evidências se acu-
mulam mostrando a relevância do estilo de vida individual, em particular
a atividade física habitual, para o bem-estar e a prevenção de doenças em
todas as idades e condições (Topolski et al., 2001). Individualmente, a ati-
vidade física está associada à maior capacidade de trabalho físico e mental, mais
entusiasmo para a vida e positiva sensação de bem-estar. Socialmente, estilos
de vida mais ativos estão associados a menores gastos com saúde, menor
risco de doenças crônico-degenerativas e redução da mortalidade precoce
(Nahas, 2013, p.21).

176 Temas Avançados em Qualidade de Vida


A OMS aponta seis comportamentos de risco como os mais preo-
cupantes na adolescência:
1. Inatividade física e hábitos sedentários
2. Hábitos alimentares inadequados
3. Tabagismo
4. Consumo de álcool e outras drogas
5. Comportamento sexual de risco
6. Comportamentos que resultam em lesão e violência
Sobre esse tema, um estudo com escolares catarinenses de 15 a 19
anos (Projeto COMPAC) mostrou elevada prevalência agregada desses
comportamentos de risco, como se pode ver no Gráfico 1. A presença de
três ou mais comportamentos de risco era mais frequente entre alunos
com 18 e 19 anos, estudantes do período noturno e que tinham um traba-
lho regular (Farias Júnior et al., 2009).

Ambientes e oportunidades para uma vida plena & saudável

Gráfico 1 Comportamentos de Riscos em Adolescentes Catarinenses

Qualidade de Vida na Adolescência 177


Evidências de diversos países indicam que a proporção de adoles-
centes envolvidos na prática regular de atividades físicas moderadas a vigo-
rosas é baixa e vem diminuindo (Silva et al., 2013). No Projeto COMPAC
36,5% dos estudantes não atendiam à recomendação de 300 minutos de
atividades físicas moderadas a vigorosas por semana – índices mais negativos
foram observados entre moças, estudantes de 18 e 19 anos e aqueles no
período noturno. Além disso, aproximadamente um terço apresentava ex-
cesso de peso, não consumia sequer uma fruta ao dia e acumulava mais de
duas horas de uso de computador ou vídeo game por dia. Entre os jovens
que afirmaram ter relações sexuais, 38,5% não utilizavam preservativos
regularmente, o que os expunha a riscos maiores de gravidez indesejada e
doenças sexualmente transmissíveis (Farias Júnior et al., 2009).
A exposição simultânea a diferentes comportamentos de risco em
adolescentes tem sido descrita em estudos nacionais (Farias Júnior, 2009;
Silva et al., 2010) e internacionais (Felton et al., 1998; Ohene, 2005), sen-
do que tal combinação mostrou-se associada aos baixos níveis de quali-
dade de vida, presença de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez
indesejada, tentativas de suicídio, a acidentes de trânsito, envolvimento
em situações violentas e baixo desempenho escolar (Topolski et al., 2001;
Farias Júnior, 2009).
Diversas dificuldades são citadas quando se percebe a ineficácia das
ações promotoras da saúde na juventude: (a) os jovens em geral sentem-se
menos vulneráveis nas questões de saúde; (b) mesmo quando bem infor-
mados, muitos ignoram os riscos; (c) valorizam outros fatores psicossociais
e comportamentais mais imediatos; (d) falta-lhes uma perspectiva de vida
profissional interessante e compensadora, principalmente em decorrên-
cia da baixa qualidade dos programas escolares ou por estarem fora da
escola.

178 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Como Intervir para Melhorar a Qualidade
de Vida na Adolescência

Em primeiro lugar, precisamos de mais dados da realidade, evidên-


cias das condições de vida e do estilo de vida dos adolescentes brasileiros
para subsidiar políticas públicas específicas à essa faixa populacional nos
diferentes contextos sociais e regiões do país. Tais políticas necessariamen-
te devem levar em conta a cultura regional e incluir ações efetivas que
levem a uma transformação radical das escolas e do sistema escolar, que
deve ser sempre mais inclusivo (não deixar ninguém de fora) e de quali-
dade. Ao mesmo tempo, o ambiente comunitário deve ampliar as opor-
tunidades para uma vida plena e saudável, sempre com práticas baseadas
em evidências – nacionais, regionais e locais. Além disso, a efetividade
dessas práticas deverá ser continuamente avaliada, o que servirá como
novos dados da realidade, para correções nos rumos das políticas e progra-
mas desenvolvidos.
Nossos comportamentos habituais, caracterizadores do estilo de
vida individual, passaram a ser considerados fundamentais na promoção
da saúde e prevenção de doenças e incapacidades próprias de cada faixa etá-
ria, particularmente a partir da meia idade (45 anos, aproximadamente).
O que os nossos jovens, e a maioria dos gestores, não percebem com
o devido valor é que os sintomas e as doenças crônicas não transmissíveis
(responsáveis por mais de 60% das mortes no planeta) têm seu processo
degenerativo iniciado na infância e na adolescência. Atualmente, temos
indicadores preocupantes e crescentes de excesso de peso, diabetes, hi-
pertensão e doenças cardiovasculares, e câncer numa população adulta
que, quando criança e adolescente, era muito mais ativa fisicamente e
com percentuais bem menores de indivíduos com excesso de peso. Agora,
com os dados alarmantes e crescentes de indicadores ambientais e com-
portamentais de risco à saúde na população infanto-juvenil, como será a
população brasileira adulta daqui a duas ou três décadas? Seguiremos os
descaminhos e equívocos de outras sociedades? Há previsões de que, pela

Qualidade de Vida na Adolescência 179


primeira vez, crianças e adolescentes nos Estados Unidos viverão menos
do que seus pais, muito em função dos índices precoces de inatividade
física e excesso de peso.
Em geral, estamos perdendo a batalha contra a obesidade em todo
o planeta, mas há alguma luz no fim do túnel quando intervenções am-
bientais e comportamentais bem conduzidas (no ambiente escolar, no
contexto do trabalho ou na comunidade em geral) começam a evidenciar
mudanças pontuais. Em particular, a escola deveria oferecer um currículo
que também contemplasse a Educação para um estilo de vida ativo e saudável;
e a Educação Física Escolar tem a responsabilidade de liderar tal processo
de promoção de comportamentos saudáveis em crianças e adolescentes.
Especificamente em relação à dimensão estilo de vida, propõe-se uma
abordagem educacional e motivacional a partir de um modelo – o Pen-
táculo do Bem-estar (Nahas, 2013, p.24) -, apresentado a seguir. A partir
desse modelo, desenvolveu-se um uma escala para avaliar e orientar ações
ligadas ao estilo de vida individual em adultos e na adolescência. Deve-se
ter em mente, entretanto, que nenhum dos cinco fatores mencionados a
seguir pode, isoladamente, resultar em grandes benefícios para a saúde
individual, uma vez que um estilo de vida promotor de saúde pressupõe a
integração equilibrada de todos eles.

Figura 2 Pentáculo do Bem-estar. (Nahas, 2013)

180 Temas Avançados em Qualidade de Vida


Com base neste modelo da Figura 2, foi proposta uma escala deno-
minada Perfil do Estilo de Vida – Adolescente (Nahas, 2013, p.180) para auto
avaliação das cinco dimensões. A seguir apresentam-se os 15 itens avalia-
dos numa escala Likert (0 = não faz parte do seu estilo de vida; 1 = às vezes;
2 = quase sempre; e 3 = sempre faz parte do seu estilo de vida). Valores 0
e 1 são indicativos de um perfil negativo, enquanto escores 2 e 3 indicam
um comportamento positivo no item avaliado.

1. Alimentação
a. Você costuma se alimentar bem no café da manhã
b. Você ingere frutas e verduras diariamente
c. Você evita frituras e outros alimentos gordurosos
2. Atividade física
a. Você participa das aulas de Educação Física em sua escola
b. Você pratica algum tipo de exercício físico, esporte, dança
ou luta fora da Educação Física escolar
c. Você costuma caminhar ou pedalar no seu deslocamento
diário
3. Comportamento Preventivo
a. Você está informado e procura se prevenir de doenças sexu-
almente transmissíveis
b. Você evita situações de risco e pessoas violentas
c. Você conhece e evita os malefícios do fumo, álcool e outras
drogas
4. Relacionamentos
a. Você procura cultivar amigos e está satisfeito(a) com seus
relacionamentos
b. Seu lazer inclui encontro com amigos ou atividades recreati-
vas em grupo
c. O ambiente escolar e seu relacionamento com professores
são bons

Qualidade de Vida na Adolescência 181


5. Controle do estresse
a. Você está satisfeito(a) com seu corpo e com seu jeito de ser
b. Você acha normal o nível de cobrança de seus pais por resul-
tados escolares
c. Imaginar como será seu futuro é uma coisa estimulante

O resultado pode ser interpretado individualmente ou em grupo


(nesse caso considerando os escores médios do grupo em cada item ou di-
mensão da escala). A análise (individual ou coletiva) pode indicar fatores
comportamentais que podem ser modificados para, no geral, melhorar
o perfil do estilo de vida. As ações previstas para modificação comporta-
mental devem ser sugeridas a partir do interesse e necessidades das pesso-
as e levando em conta as oportunidades disponíveis, sempre priorizando a
facilidade, o prazer, a possibilidade de se ter companhia e incentivo nessas
atividades. A ideia geral é que pessoas ou grupos identifiquem aspectos
positivos e negativos em seu estilo de vida, recebendo orientações e po-
dendo refletir para tomada de decisões que possam levar a uma vida com
melhor qualidade. É um processo de pequenas mudanças (aparar arestas
e preencher lacunas, como costumo dizer) com grandes resultados para
nosso bem-estar geral.

CONSIDER AÇÕES FINAIS

Mais do que nunca, nossas escolhas e decisões cotidianas, nosso es-


tilo de vida, têm influenciado a qualidade de nossas vidas e por quanto
tempo viveremos com autonomia e uma percepção positiva de bem-estar.
Isso vale para todas as etapas da vida humana, da infância à idade mais
avançada.
Não é uma tarefa fácil promover a qualidade de vida das pessoas
num país com dimensão continental, tantas diferenças socioculturais e
reduzidas oportunidades de uma vida segura e plena de oportunidades

182 Temas Avançados em Qualidade de Vida


no futuro. Por ser essencialmente um constructo que tem relação com
o ser humano, a abordagem do tema qualidade de vida deve considerar a
cultura, os interesses e necessidades de cada grupo, em cada momento
histórico. Cabe aos gestores e formadores de opinião olhar para adiante
do momento atual, planejando com base em evidências e em consonância
com a realidade local. Afinal, em última instância, a melhor medida da
qualidade de vida é a percepção que cada um tem do seu bem-estar num
dado momento da vida.
Finalmente, lembro que, ao planejar ações de promoção da saúde,
de melhorias educacionais, de criação de oportunidades de lazer ou de
melhorias ambientais para pessoas e comunidades, deve-se sempre conside-
rar a indagação: a quem, possivelmente, estaremos excluindo quando essas ações
forem implementadas?

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184 Temas Avançados em Qualidade de Vida

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